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entre teorias e práticas Sidney Washington de Lima Melquiades Organizador ENSAIOS EDUCACIONAIS ENTRE TEORIAS E PRÁTICAS Este livro foi composto pela Editora Bagai. www.editorabagai.com.br /editorabagai /editorabagai contato@editorabagai.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129 E26 Ensaios educacionais: entre teorias e práticas 1.ed. [recurso eletrônico] / [org.] Sidney Washington de Lima Melquiades– 1.ed. – Curitiba-PR, Editora Bagai, 2022. Recurso digital. Formato: e-book Acesso em www.editorabagai.com.br ISBN: 978-65-5368-116-3 1. Educação. 2. Teorias e Práticas. 3. Ensino e aprendizagem. I. Melquiades, Sidney Washington de Lima. CDD 370 10-2022/20 CDU 37.01 Índice para catálogo sistemático: 1. Educação: Teorias e Práticas. R https://doi.org/10.37008/978-65-5368-116-3.23.09.22 Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização prévia da Editora BAGAI por qualquer processo, meio ou forma, especialmente por sistemas gráficos (impressão), fonográficos, microfílmicos, fotográficos, videográficos, repro- gráficos, entre outros. A violação dos direitos autorais é passível de punição como crime (art. 184 e parágrafos do Código Penal) com pena de multa e prisão, busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610 de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais). Sidney Washington de Lima Melquiades Organizador ENSAIOS EDUCACIONAIS ENTRE TEORIAS E PRÁTICAS 1.ª Edição - Copyright© 2022 dos autores Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai. O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões gramaticais, sistema de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es). Editor-Chefe Cleber Bianchessi Revisão Os autores Diagramação Brenner Silva Arte da Capa Sidney Washington de Lima Melquiades Adequação da Capa Alexandre Lemos Conselho Editorial Dr. Adilson Tadeu Basquerote – UNIDAVI Dr. Anderson Luiz Tedesco – UNOCHAPECÓ Dra. Andréa Cristina Marques de Araújo - CESUPA Dra. Andréia de Bem Machado – UFSC Dra. Andressa Graziele Brandt – IFC - UFSC Dr. Antonio Xavier Tomo - UPM - MOÇAMBIQUE Dra. Camila Cunico – UFPB Dr. Carlos Luís Pereira – UFES Dr. Claudino Borges – UNIPIAGET - CV Dr. Cledione Jacinto de Freitas – UFMS Dra. Clélia Peretti - PUCPR Dra. Daniela Mendes V da Silva – SEEDUCRJ Dra. Denise Rocha – UFC Dra. Elnora Maria Gondim Machado Lima - UFPI Dra. Elisângela Rosemeri Martins – UESC Dr. Ernane Rosa Martins – IFG Dr. Helio Rosa Camilo – UFAC Dra. Helisamara Mota Guedes – UFVJM Dr. Humberto Costa – UFPR Dr. Jorge Henrique Gualandi - IFES Dr. Juan Eligio López García – UCF-CUBA Dr. Juan Martín Ceballos Almeraya - CUIM-MÉXICO Dra. Karina de Araújo Dias – SME/PMF Dra. Larissa Warnavin – UNINTER Dr. Luciano Luz Gonzaga – SEEDUCRJ Dr. Luiz M B Rocha Menezes – IFTM Dr. Magno Alexon Bezerra Seabra - UFPB Dr. Marciel Lohmann – UEL Dr. Márcio de Oliveira – UFAM Dr. Marcos A. da Silveira – UFPR Dr. Marcos Pereira dos Santos - SITG/FAQ Dra. María Caridad Bestard González - UCF-CUBA Dra. Nadja Regina Sousa Magalhães – FOPPE-UFSC/UFPel Dra. Patricia de Oliveira - IF BAIANO Dr. Porfirio Pinto – CIDH - PORTUGAL Dr. Rogério Makino – UNEMAT Dr. Reginaldo Peixoto – UEMS Dr. Ricardo Cauica Ferreira - UNITEL - ANGOLA Dr. Ronaldo Ferreira Maganhotto – UNICENTRO Dra. Rozane Zaionz - SME/SEED Dra. Sueli da Silva Aquino - FIPAR Dr. Tiago Tendai Chingore - UNILICUNGO – MOÇAMBIQUE Dr. Thiago Perez Bernardes de Moraes – UNIANDRADE/UK-ARGENTINA Dr. Tomás Raúl Gómez Hernández – UCLV e CUM - CUBA Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS 5 SUMÁRIO CONTEXTO HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA NO BRASIL 11 Dinéia Ghizzo Neto Fellini | Elsa Midori Shimazaki | Raquel Franco Ferronato PROCESSO FORMATIVO NA PERSPECTIVA DA TEORIA CRÍTICA DA SOCIEDADE: UMA ANÁLISE DA POLÍTICA NACIONAL DE ALFABETIZAÇÃO (PNA) 25 Vanessa Freitag de Araújo | Gabriely Silveira Nogueira PRODUÇÃO DE TEXTO ESCRITA MULTIMODAL NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA DISCUSSÃO A PARTIR DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 43 Eurico Rosa da Silva Júnior | Tiago de Aguiar Rodrigues A ESCOLARIZAÇÃO DOS ALUNOS(AS)SURDOS-NEGROS(AS) 59 Helleni Priscille de Souza Ferreira Oliveira | Élida Soares de Santana Alves | Fernanda Marcelo Souza | Leia Silva Santos | André Luiz de Alcântara Brandão | Alan dos Santos Andrade Ferreira | Roselin Angelita Dantas Reis | Damaris Oliveira Souto UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DE LITERATURA SOBRE O CONCEITO DE FUNÇÃO USANDO A LENTE DA TEORIA ANTROPOLÓGICA DO DIDÁTICO 69 Jefferson Dagmar Pessoa Brandão | Iracema Campos Cusati UMA PROPOSTA TEÓRICO-METODOLÓGICO DE ENSINO DE LÍNGUA INGLESA COM BASE NA LINGUÍSTICA GERATIVA E NA ABORDAGEM DA APRENDIZAGEM ATIVA 83 Glaucyenne Cavalcante dos Santos | Jessé de Sousa Mourão COMO SURGIU O MODERNO ESTUDO DOS SEMICONDUTORES E QUAIS FORAM SUAS PRIMEIRAS APLICAÇÕES TECNOLÓGICAS? 99 Francisco Vadimar Bezerra Alves | João Erineudo Cavalcante | Marlene Francisca de Andrade A INTERNET NA SALA DE AULA E A SALA DE AULA NA INTERNET: AS NOVAS TECNOLOGIAS COMUNICACIONAIS E SUA INTERFACE EDUCADORA 117 Leonardo Freire Marino O FENÔMENO DA MONOTONGAÇÃO NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL 131 Julieta Vilar Medeiros | Marleide Maria Arruda Linhares Isaias | Samara Cornélio Fernandes dos Santos 6 CURRÍCULO ESCOLAR: REFERECIAL NA TRANSMISSÃO DA CULTURA E COMO PONTO DE PARTIDA PARA UMA APRENDIZAGEM CONSTRUCIONISTA 145 Moacir de Souza Júnior | Leila Melo Cajazeira | Maria do Socorro Furtado Silva Silveira | Maria do Carmo da Silva Souza | Maria Cristiane Raimundo da Costa | Maria Ivanilda Cassimiro de Brito | Célia Maria da Silva A PRODUÇÃO TEXTUAL ESCRITA EM LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO FUNDAMENTAL ANOS FINAIS 159 Benigna Soares Lessa Neta | Mônica de Souza Serafim PROPOSTA DE ENSINO DO CONJUNTO DOS RACIONAIS COM BASE NA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL COM ABORDAGEM GEOMÉTRICA 175 Sarah Galatto Cancillier | Mateus Bitencourt | Maxwel Fernandes Bernardes | Eloir Fátima Mondardo Cardoso LETRAMENTO LITERÁRIO: RELATO DE EXPERIÊNCIA DE LEITURA EM SALA DE AULA VIRTUAL 189 Adilma Gomes da Silva Machado | Antônia Caroline Alves da Silva Sidney Washington de Lima Melquiades AS TECNOLOGIAS DIGITAIS E O ENSINO DE QUÍMICA: QUAIS SÃO AS FERRAMENTAS GRATUITAS DISPONÍVEIS PARA O DESENVOLVIMENTO UMA PRÁTICA DOCENTE INOVADORA? 203 Maria Stella Nunes de Oliveira Nogueira O REFLEXO DO MOVIMENTO MIGRATÓRIO NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE CUIABÁ: A PRÁTICA DO PROFESSOR E SUA FORMAÇÃO CONTINUADA 217 Taysa Paganotto Lemes | Caique dos Santos Silva MEMÓRIAS DE VERÃO: O LUGAR DA AUSÊNCIA NO ROMANCE AO FAROL, DE VIRGINIA WOOLF 231 Francielle Aparecida Garuti de Andrade DOCUMENTÁRIO “NOSSO SAGRADO” NO COMBATE AO RACISMO RELIGIOSO NO ESPAÇO ESCOLAR 245 Jorge Santana RELATO DE EXPERIÊNCIA: REFLEXÕES SOBRE O PRODUTIVISMO ACADÊMICO, AVANÇOS E DESAFIOS259 Tânia Aparecida Soares SOBRE O ORGANIZADOR 294 ÍNDICE REMISSIVO 295 7 APRESENTAÇÃO As práticas educativas estão em constante processo de avaliação, adaptando-se as demandas e características da sociedade no decorrer do tempo. Desta forma, diversas práticas educacionais perpetuadas como tradicionais estão tornando-se gradualmente obsoletas, abrindo passagem para a inserção de novas metodologias de ensino mais bem adaptadas as características dos estudantes da atualidade. A obra “ENSAIOS EDUCACIONAIS: entre teorias e práticas” advem de pesquisas que envolvem teorias, inovações ou aperfeiçoamento de prá- ticas educativas tradicionais, com a finalidade de proporcionar melhores condições para o processo de ensino-aprendizagem em relação a tríade escolar: professores(as), estudantes e construção de conhecimento. No primeiro capítulo, intitulado Contexto Histórico das Políticas Públicas de Educação Especial e Inclusiva no Brasil, das autoras Dinéia Ghizzo Neto Fellini, Elsa Midori Shimazaki e Raquel Franco Fer- ronato, que objetivam fazer um giro histórico e epistemológico a respeito da educação especial e os encaminhamentos que resultaram na oficialização da educação inclusiva no Brasil. No segundo capítulo, Processo Formativo na Perspectiva da Teoria Crítica da Sociedade: uma análise da Política Nacional de Alfabetização (PNA), produzido pelas autoras Vanessa Freitag de Araújo e Gabriely Silveira Nogueira, que tem como objetivo analisar da Política Nacional de Alfabetização (PNA) lançada em 2019 pelo Ministério da Educação à luz da perspectiva da Teoria Crítica da Sociedade. No terceiro capítulo, cujo título é Produção de Texto Escrita Multimodal nos Anos Finais do Ensino Fundamental: uma discussão a partir da Base Nacional Comum Curricular, dos pesquisadores Eurico Rosa da Silva Júnior e Tiago de Aguiar Rodrigues, a pesquisa tem por objetivo investigar como tem sido colocada em prática a produção de textos multimodais para o ensino fundamental conforme prevista na Base Nacional Comum Curricular. 8 No quarto capítulo, A Escolarização dos Alunos(as) Surdos-ne- gros(as), escrito por Helleni Priscille de Souza Ferreira Oliveira, Élida Soares de Santana Alves, Fernanda Marcelo Souza, Leia Silva San- tos, André Luiz de Alcântara Brandão, Alan dos Santos Andrade Ferreira, Roselin Angelita Dantas Reis e Damaris Oliveira Souto, onde objetivam discutir a pauta da educação de pessoas com sur- dez para a educação brasileira. No quinto capítulo, intitulado Uma Revisão Sistemática de Lite- ratura Sobre o Conceito de Função Usando a Lente da Teoria Antropológica do Didático, dos escritores Jefferson Dagmar Pessoa Brandão e Iracema Campos Cusati, que tem como objetivo identificar as contribuições da Teoria Antropológica do Didático nas investigações que adotaram o conceito de função como objeto de pesquisa. No sexto capítulo, com título Uma Proposta Teórico-Metodológico de Ensino de Língua Inglesa com Base na Linguística Gerativa e na Abor- dagem da Aprendizagem Ativa, escrito por Glaucyenne Cavalcante dos Santos e Jessé de Sousa Mourão, tem como objetivo apresentar uma proposta teórico-metodológica baseada no modelo de Pilati (2017) e adaptada para o contexto de ensino e aprendizagem de segunda língua, particularmente de língua inglesa. No sétimo capítulo, designado Como Surgiu o Moderno Estudo dos Semicondutores e Quais Foram Suas Primeiras Aplicações Tecno- lógicas?, produzido por Francisco Vadimar Bezerra Alves, João Eri- neudo Cavalcante, Marlene Francisca de Andrade, em que o objetivo do trabalho foi fazer um levantamento bibliográfico de como surgiu o moderno estudo dos semicondutores, como também as suas pri- meiras aplicações tecnológicas. No oitavo capítulo, nominado A Internet na Sala de Aula e a Sala De Aula na Internet: as novas tecnologias comunicacionais e sua interface educadora, escrito por Leonardo Freire Marino, com objetivo de apontar de que forma as tecnologias digitais e as redes infor- macionais têm contribuído para a construção de um novo arranjo pedagógico e, consequentemente, possibilitado o soerguimento de um novo arcabouço metodológico. 9 No nono capítulo, sob o título O Fenômeno da Monotongação nas Aulas de Língua Portuguesa nos Anos Finais do Ensino Fundamental, escrito por Julieta Vilar Medeiros, Marleide Maria Arruda Linha- res Isaias e Samara Cornélio Fernandes dos Santos, onde objetiva- ram apresentar um percurso possível de reflexão sobre o fenômeno de monotongação com alunos do 6º ano do ensino fundamental nas aulas de língua portuguesa. No décimo capítulo, Currículo Escolar: referecial na transmissão da cultura e como ponto de partida para uma aprendizagem construcio- nista, os pesquisadores Moacir de Souza Júnior, Leila Melo Caja- zeira, Maria do Socorro Furtado Silva Silveira, Maria do Carmo da Silva Souza, Maria Cristiane Raimundo da Costa, Maria Ivanilda Cassimiro de Brito e Célia Maria da Silva, objetivaram apresentar um levantamento sobre currículo e tem a intenção de provocar uma reflexão, a partir de debates que acontecem frequentemente entre os profissionais da área educacional. No décimo primeiro capítulo, A Produção Textual Escrita em Livros Didáticos do Ensino Fundamental Anos Finais, escrito por Benigna Soares Lessa Neta e Mônica de Souza Serafim, com objetivo de analisar as propostas de produção textual escrita presentes em livros didáticos de Língua Portuguesa da primeira e da última série do ensino Ginasial, atual Ensino Fundamental Anos Finais. No décimo segundo capítulo, nominado Proposta de Ensino do Conjunto dos Racionais com Base na Teoria Histórico-Cultural com Abor- dagem Geométrica, produzido pelo autores Sarah Galatto Cancillier, Mateus Bitencourt, Maxwel Fernandes Bernardes e Eloir Fátima Mondardo Cardoso, que objetivou-se desenvolver, aplicar e avaliar uma proposta de ensino dos conjuntos dos racionais com base na Teoria Histórico-Cultural - THC. No décimo terceiro capítulo, intitulado Letramento Literário: relato de experiência de leitura em sala de aula virtual, dos pesquisadores Adilma Gomes da Silva Machado, Antônia Caroline Alves da Silva e Sidney Washington de Lima Melquiades, com objetivo de trabalhar o 10 eixo de leitura e oralidade a partir do gênero conto, visando as práticas de leitura: antes, durante e depois da leitura. No décimo quarto capítulo, As Tecnologias Digitais e o Ensino de Química: quais são as ferramentas gratuitas disponíveis para o desenvolvi- mento uma prática docente inovadora?, escrito por Maria Stella Nunes de Oliveira Nogueira, tem como objetivo disponibilizar algumas tecnologias digitais importantes para o ensino de Química. No décimo quinto capítulo, designado O Reflexo do Movimento Migratório na Rede Municipal de Ensino de Cuiabá: a prática do pro- fessor e sua formação continuada, os autores Taysa Paganotto Lemes e Caique dos Santos Silva, objetivaram abordar os aspectos legais que asseguram aos imigrantes e refugiados, os direitos fundamentais que permeiam sua formação educacional dentro do Brasil e em seus estados e municípios, nos quais se encontra, e quais políticas educa- cionais estão propostas e eles. No décimo sexto capítulo, Memórias de Verão: o lugar da ausência no romance ao Farol, de Virginia Woolf, da pesquisadora Francielle Apa- recida Garuti de Andrade, que tem como objetivo analisar o lugar da ausência no romance Ao Farol de Virginia Woolf à luz dos conceitos de memória coletiva e individual. No décimo sétimo capítulo, intitulado Documentário “Nosso Sagrado” no Combate ao Racismo Religioso no Espaço Escolar, do pes- quisador Jorge Santana, objetivou trazer as experiências das exibições e rodas de conversas do documentário “Nosso Sagrado” em diversas escolas privadas e públicas no estado do Rio de Janeiro. No décimo oitavocapítulo, Relato de Experiência: reflexões sobre o produtivismo acadêmico, avanços e desafios, da autora Tânia Aparecida Soares, com objetivo de apresentar análises e reflexões sobre o produ- tivismo acadêmico, seus avanços e desafios postos pela quantificação de produções, amparada pela política de avaliação. Diante do exposto, esperamos que as leituras sejam alvo de boas reflexões e de transformação da realidade educacional brasileira. Organizador 11 CONTEXTO HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA NO BRASIL Dinéia Ghizzo Neto Fellini1 Elsa Midori Shimazaki2 Raquel Franco Ferronato3 INTRODUÇÃO A defesa pelo acesso de todos ao ensino, tornou-se bandeira dos organismos internacionais a partir da década de 1990, quando ganhou ênfase com a Declaração de Jomtien. A educação inclusiva passou a ser o centro das discussões, a partir da Declaração de Salamanca (1994) estando, posteriormente nos discursos e documentos de âmbito internacional, e leis e decretos de âmbito nacional, sendo preconizada como nova proposta de escolarização. Diante disso, as pessoas com deficiência, TGD e AH/SD, passaram a receber uma atenção maior, embora, os ideais que circundam tal proposta, nem sempre vão de encontro com a formação humana desejada e necessária defendidas pela Teoria Histórico-Cultural e pela Pedagogia Histórico-Crítica. Diante do cenário atual e fazendo uma comparação com o con- texto histórico da educação ofertada a esses sujeitos em tempos remotos, constata-se, evidentemente que melhorias ocorreram, inclusive no caráter de aceitação e acolhimento. Mas apenas isso, não é o suficiente, é a formação ofertada que devemos abordar como ponto de estudo. Para Orso (2008), atualmente defrontamo-nos com uma educação formal 1 Doutora em Educação (UEM). Professora Adjunta (UNILA). CV: http://lattes.cnpq.br/2603261007140303 2 Doutora em Educação (USP). Professora aposentada do Programa de Pós-Graduação em Educação (UEM). Professora (UNOESTE). CV: http://lattes.cnpq.br/9372609347074339 3 Doutora em Educação (UEM). Professora colaboradora (UENP). CV: http://lattes.cnpq.br/0978100384431802 12 voltada para a característica de adestramento, treinando os indivíduos, ofertando conteúdos abstratos e conformismo, ignorando a sua ver- dadeira função, a de promover uma transformação e revolução social. Diante dessa realidade pontuada pelo autor e reconhecendo a concepção de função da escola defendida por Saviani, logo, confron- tamo-nos com um problema maior, que não se remete apenas ao ato de incluir, mas reserva-se a formação que está sendo ofertada nestes espaços inclusivos de educação. Nesta perspectiva, o estudo aqui se propõe, a princípio, fazer um giro histórico e epistemológico a res- peito da educação especial e os encaminhamentos que resultaram na oficialização da educação inclusiva no Brasil. Logo, nosso foco será observar na região nordeste do Brasil, quais encaminhamentos as políticas do estado têm aplicado quanto ao processo inclusivo e seu caráter substancial de formação dos alunos, considerando a priori, os investimentos na área e as práticas pedagógicas de ensino DESENVOLVIMENTO A discriminação, a exclusão e o preconceito contra as pessoas com deficiência, são atitudes verificadas em diferentes civilizações no decorrer da história, sendo retratadas nas obras de Silva (1986), Mazzotta (2001), Bueno (1993), Bianchetti (1998), dentre outros autores. Cabe considerar nestas circunstâncias, duas questões principais, a adaptação social e a capacidade de produção, pois, a visão de inca- pacidade e anormalidade diante do socialmente “correto” e “normal”, foram motivos preconizados em muitas civilizações inóspitas. Em relação aos quatro estágios da Educação Especial, Miranda (2003) destaca que o primeiro, apresenta-se na era pré-cristã, cuja visão estereotipada das pessoas em relação a deficiência, desencadeava o abandono ou a eliminação desses sujeitos. Na era cristã, existiam duas concepções a respeito, uma considerada como castigo, a outra, pelo caráter de piedade, lhes garantiam a existência. O segundo estágio surge entre os séculos XVIII e XIX, período descrito pela segregação dessas 13 pessoas em instituições residenciais. O terceiro estágio, período que compreende o final do século XIX e meados do século XX, onde escolas especiais de caráter público passam a atender essas pessoas, e por fim, o quarto e último estágio, a integração social nas escolas por volta de 1970. É importante, de acordo com Bianchetti (1998), compreender sob a visão do materialismo dialético, como as sociedades primitivas e as atuais abordaram e abordam esse tema. Nas antigas civilizações, se manter vivo e colaborar com o grupo nas funções da caça e da pesca era inevitável, sendo assim, algumas tribos abandonavam aqueles integrantes que não apresentassem condições para tal função (BIANCHETTI, 1998). Embora o homem tenha adquirido ao longo do tempo, maior conhecimento sobre o assunto, para Fonseca (1995), o julgamento que distingue pessoas com deficiência das demais, está implícito na relatividade cultural que afasta ou exclui aqueles cuja presença, perturba ou ameaça a ordem social vigente. Com a expansão do Cristianismo, aos poucos, hospitais cristãos foram sendo criados para atender os doentes e as pessoas com defi- ciência. O enclausuramento ao qual eram submetidos, os impedia do convívio social (CARVALHO, 2009). A fundação de novas institui- ções específicas para o atendimento de cegos, paralíticos, deficientes mentais, em sua maioria mutilados pelas guerras, foram surgindo. O modelo místico perde aos poucos suas características e questiona- mentos em torno do teocentrismo surgem (CARVALHO, ROCHA e SILVA, 2006). O Humanismo trouxe novas concepções no período Renascentista e foi neste período que a atenção com as pessoas com deficiência repercute e o poder público passa a prestar ajuda aos mos- teiros, paróquias e hospitais (SILVA, 1986). No Brasil, esse trabalho inicialmente era desenvolvido pelos Jesuítas, paralelamente a catequização e o ensino das primeiras letras, além da cura de enfermidades. A primeira instituição fundada no Bra- sil foi a Casa da Misericórdia, entre 1545 a 1567, logo, outras foram sendo criadas (Bahia – 1549; Rio de Janeiro – 1570; Recife – 1590; 14 Espírito Santo – 1595) (SILVA, 1986). Na área da surdez, destaca-se a criação do Instituto Nacional de Surdos-Mudos em Paris em 1770. No Brasil destaca-se dois períodos importantes. O primeiro período vai de 1854 a 1956 com iniciativas oficiais e particulares isoladas e o segundo período, de 1957 a 1993 com iniciativas oficiais de âmbito nacional (MAZZOTTA, 2001). O primeiro instituto criado em 1854 foi o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, atual Instituto Benjamin Constant. O segundo foi o Instituto dos Surdos-Mudos, atualmente, ou seja, Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), criado em 1857 (BUENO, 1993; MAZZOTTA, 2001). Na metade do século XIX, devido a dualidade na educação dos surdos, o uso de gestos e a oralidade, foi realizado um congresso em Milão, em 1880, cuja votação, optou-se pelo oralismo como método de trabalho nas instituições. É importante frisar que na segunda metade do século XIX, preocupações em torno do potencial das pessoas com deficiência no sistema de produção visando suprir suas necessidades de sobrevivência repercutiram (SILVA, 1986), a exemplo, fábricas Ford registravam em 1908, um total de 7.882 tarefas especializadas. Desse total, enfatizava que “670 tarefas podiam ser preenchidas por homens sem pernas, 2.637 por homens com uma perna só, duas por homens sem braços, 715 por homens com um braço só e 10 por homens cegos” (TOFFLER, 1980, p. 62 apud BIANCHETTI, 1998, p. 38-9). A institucionalização passou a ser contrariada, pois seus objetivos estavam distantes de desenvolverem uma vida independente a essas pessoas, destaca-se ainda, que esse modelo de atendimento não priori-zava a educação, que gerou muitos adeptos a concepção de integração que estava “[...] alicerçado na oferta de serviços, com a finalidade de “normalizar” as pessoas com deficiência” (CARVALHO, 2008, p. 110). Sendo assim, a integração, tida como novo paradigma, surge com a possibilidade de assemelhamento entre “normais” e “anormais”. A Educação Especial voltada ao desenvolvimento educacional dessas pessoas, passa a ser considerada e difundida. 15 Pesquisas em torno das pessoas com deficiência desencadearam múltiplas facetas. No Brasil, em 1883, ocorreu o 1º Congresso de Instrução Pública, tendo como pressupostos, a educação das pessoas cegas e surdas. A criação de um currículo, bem como, a formação de professores na área, estava entre as prioridades (MAZZOTTA, 2001). Esse movimento já não se caracterizava como reabilitação, mas apresentava outro viés, mais educacional. No aspecto produtivo, esse período se sobressaiu, muitas pes- quisas realizadas pela escola vygotskiana, iniciados em 1917 e, por conseguinte, nos anos seguintes, vieram a contribuir para as pessoas com e sem deficiência. A Teoria Histórico-Cultural foi construída num cenário de insatisfação da classe operária na Rússia, dos quais, visavam à socialização dos meios de produção e da propriedade privada. Vygot- sky procurou aprofundar seus conhecimentos no desenvolvimento da linguagem e do pensamento humano, mas seus estudos não se restrin- giam apenas ao contexto geral da educação, mas também, a educação das pessoas com deficiência. O objetivo é que a educação permita o desenvolvimento das funções psíquica superiores, por conseguinte, a compensação da deficiência (TULESKI, 2008). Para Ross, é importantíssimo refletir sobre as transformações que ocorreram e ocorrem na sociedade, principalmente na questão econômica, porém, “[...] não podemos dar primazia às interpretações de cunho econômico, sob o risco de negligenciar mudanças de men- talidade e de comportamento que também ajudam a compreender o papel da educação no processo de integração do portador de deficiência” (1998, p. 64). A marginalização das pessoas com deficiência ocorreu no mundo do trabalho nos diferentes períodos históricos, contudo houve, iniciativas para atender essas pessoas, devido ao processo de urbanização e industrialização, e nas áreas da saúde e da educação, foram introduzidas pela sociedade civil, criando assim, novas organizações com objetivos de trabalhos diferenciados (LANNA JUNIOR, 2010). 16 A partir de 1954, organizações filantrópicas foram sendo implan- tadas, como o das pessoas com Deficiência Física, devido ao surto de poliomielite que se desencadeou nesse período, entre elas, a Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AACD) de São Paulo (LANNA JUNIOR, 2010). O Brasil superou os demais países quanto ao aten- dimento, enquanto os demais países priorizavam os mutilados das guerras, no Brasil, atendia-se independente da causa de sua deficiência. Bueno (1993) adverte que enquanto essas entidades se formalizavam em instituições especializadas, atendendo às diferentes deficiências, o poder público inseria seus investimentos nas classes especiais em escolas regulares, restringindo-se à deficiência mental. Na década de 50, o Brasil continha inúmeras instituições públi- cas, filantrópicas e privadas na área. No período que segue até 1959, aumentou-se o número de estabelecimentos, em sua grande maio- ria de caráter público (MIRANDA, 2003). Outros movimentos a partir da década de 1960 foram surgindo, expansão de instituições privadas de caráter filantrópico sem fins lucrativos, isentando assim, o governo da obrigatoriedade na oferta desse atendimento na rede pública de ensino (MIRANDA, 2003). A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 4.024/61, criada em 1961, apresenta nas suas alíneas nos artigos 88 e 89, as pessoas com deficiência. Destaca-se que a educação dos excepcionais passa a ser enquadrada no sistema geral de educação, tendo como princípio a integração desses sujeitos a sociedade. A lei veio garantir tratamento especial por meio de empréstimos, subvenções e bolsas de estudo para as iniciativas privadas que tinham atendimentos eficientes na questão educacional dessas pessoas. Na LDBEN nº 5.692 de 1971, aparece em seu Art. 9º, com base nas normas fixadas pelos Conselhos de Educação, considerações acerca da educação de alunos com deficiência, principalmente os alunos com Deficiência Física e Intelectual. De acordo com Ferreira (2006), a lei veio atribuir definições para a educação das pessoas com deficiência, 17 entre elas, a efetivação de carreiras dos professores para atuarem com esses alunos e, por fim, a organização de equipes que trabalhem na reabilitação dessas pessoas, bem como, na educação formal. A influência da Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, aprovada pelas Nações Unidas em 1975 foi decisiva nas reformas de esfera educacional. Miranda (2003) aponta que a prática de inte- gração social ocorrida a partir da década de 80, teve repercussão no mundo todo, abrangendo também, a Constituição Federal (CF/88, artigo 208), estabelecia o direito de todos pela educação e o atendi- mento de pessoas com deficiência. Consolidaram-se, assim, até a década de 1990, as classes especiais nas escolas de ensino comum, e as salas de recursos para alunos com deficiência sensorial. Na constituição brasileira destaca-se a Educação Especial como modalidade educativa de abrangência desde a infância até o Ensino Médio. Esse período representou a disseminação de inú- meros documentos, propostos por organismos internacionais em defesa do direito de todos a educação, inclusive das pessoas com deficiência, fortalecendo assim, o processo da inclusão. A interferência constante de outros setores na esfera educacional como a política e a economia tornaram-se notórias. Os financiamentos no sistema educacional vão permitindo a participação do Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (BM), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD), além da Unesco, que aparece após a Segunda Guerra Mundial com o intuito de promover a paz e criar condições de acesso à educação. Entre as conferências realizadas, a de Jomtien na Tailândia, em 1990, representaria a proposta mais complementar para a reso- lução dos problemas sociais e, consequentemente, educacionais, mas a reunião entre os países latino-americanos e o Caribe, que ocor- reria no final de 1989 e início de 1990, no Equador, representou a possibilidade de reverter as condições dos países desestabilizados economicamente pela dívida externa em benefícios posteriores para a área educacional (GADOTTI, 1999). 18 A partir da década de 1990, observa-se um pacote de reformas do BIRD no que tange à descentralização dos estados. Trata-se de uma nova configuração nas políticas educacionais e na Reforma Estatal. Entre essas reformas, constavam aos governos em âmbito educacional: “(1) fixar padrões, (2) facilitar os insumos que influenciam o rendimento escolar, (3) adotar estratégias flexíveis para a aquisição e uso de tais insu- mos; e (4) monitorar o desempenho escolar” (ALTMANN, 2002, p. 80). No Brasil, a escola torna-se o espaço de mudanças e as políticas versam para a superação do déficit escolar. Paralelamente a esse discurso, dá-se ênfase a educação inclusiva e o acesso das pessoas com deficiência a escolarização. Na Lei nº 8.069/90 no Art. 54, no inciso III, preconiza o “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (BRASIL, 1990). Em 1994, à Declaração de Salamanca, reafirma e reconhece a necessidade urgente de providências na área educacional, além do compromisso com a educação de crianças, jovens e adultos com defi- ciência no sistema regular de ensino (UNESCO, 1994). Em janeiro de 1995, Fernando Henrique Cardoso assume a presidência da República, seu mandato reforçou algumas normatiza-ções e instrumentalizou novas, como “modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais” (BRASIL, 1996). Além disso, atribuem serviços e apoios especiais para o atendimento a esses alunos na rede regular, considerando as peculiaridades de cada um, e o AEE é necessário quando a deficiência impede a frequência na classe comum. Em 2001, a Declaração Internacional de Montreal sobre Inclu- são foi aprovada no Canadá pelo Congresso Internacional “Socie- dade Inclusiva”, cujo objetivo maior é a parceira de todos os estados, buscando soluções quanto aos estilos de vida que sejam sustentáveis, além de serem seguros, acessíveis, adquiríveis e úteis, destacando que “o desenho acessível e inclusivo de ambientes, produtos e servi- ços aumenta a eficiência, reduz a sobreposição, resulta em economia 19 financeira e contribui para o desenvolvimento do capital cultural, econômico e social” (CANADÁ, 2001). Em 2004, foi aprovado o Decreto nº 5.626, que enfatiza que o professor e instrutor de LIBRAS precisam ter formação em Letras/ Libras ou Pós-Graduação em LIBRAS, tanto para surdos quanto para ouvintes, porém dar-se-á prioridade para professores surdos (BRASIL, 2005). Em 2005, cria-se os Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/ Superdotação (NAAH/S) em todos os estados e no Distrito Federal, cujo objetivo era orientar os pais, capacitar profissionais, além de destacar o atendimento especializado desses alunos (BRASIL, 2010). De acordo com Solano e Rodrigues (2010), no ano de 2007, foi lançado pelo MEC o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), mais conhecido como “O PAC da Educação” e aprovado o Decreto nº 6.094/07 que dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, um regime colaborativo entre a União Federal, estados e municípios (BRASIL, 2007). Em 2008, foi aprovada a “Política Nacional de Educação Inclu- siva”, a qual se refere à distribuição de recursos do Fundo de Manuten- ção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB). Seguindo os objetivos dessa política, as escolas têm a obrigação de ofertar o AEE, ou seja, a organização dos serviços e recursos da Educação Especial de forma complementar ao ensino regular. Com base na Constitui- ção Nacional, a oferta busca superar a visão do caráter substitutivo da Educação Especial ao ensino comum, ofertado no turno inverso, garantindo ao aluno o acesso à educação comum. 0a forma, com vistas a apresentar orientações que devem nortear os sistemas de ensino para a efetivação do direito ao AEE, fica proposto na Resolução CNE/ CEB nº 4/2009 o financiamento via Fundeb. Diante dessas perspectivas, a inclusão comporta um novo modelo de atendimento que almeja reconhecer esses alunos como parte consti- tutiva histórica da sociedade. Da exclusão para a inclusão social foi um longo período, porém muito se tem a fazer, e oportunidades a oferecer. 20 A escola especial é necessária como suporte de atendimento às neces- sidades desses alunos, mas a inclusão de fato se dá pela possibilidade de serem reconhecidos como pessoas, de promover a interação entre seus pares e de se desenvolverem humanamente. CONSIDERAÇÕES FINAIS O contexto de construção histórica da Educação Especial nunca esteve desassociado das relações de poder econômico, social e religioso que afetaram a formação das pessoas com deficiência. As formas de discriminação ou tolerância, antes vivenciadas por essas pessoas nos grupos sociais ao qual pertenciam, denotam para paradigmas que hoje já foram desmistificados, demonstrando que independente da deficiência, cada sujeito com sua peculiaridade, apresenta capaci- dade de conviver em sociedade, e na maioria dos casos, apresentam condições de estudar e trabalhar. Entende-se, que o processo adotado como inclusão não se refere apenas a inserção desses sujeitos no meio social, é necessário reconhecer e respeitar a diferença do outro, a sua condição, limitações e potencia- lidades. O formato precedente a inclusão se efetivava pela reabilitação, e em sua grande maioria, tinham acesso, apenas os mais abastados financeiramente. Do período de abandono e eliminação dessas pes- soas até a segregação, poucas mudanças atitudinais foram observadas. Mudavam-se os termos, mas não se modificavam as práticas e atitudes. O assistencialismo que predominou por certo período, delimitava as pessoas com deficiência, tirando-lhes a autonomia e privando-os de demonstrar suas potencialidades na educação e no trabalho. O reconhecimento e a valorização decorreram da credibilidade de profis- sionais que reconheceram a capacidade desses sujeitos de participarem ativamente da sua própria formação cultural, social e linguística. Esse reconhecimento permitiu que amparos legais oportunizassem o acesso ao mercado de trabalho, a escolarização e a participação social 21 Embora se reconhece a influência política e econômica na tra- jetória das escolas públicas de um modo geral, e na Educação Espe- cial não seria diferente, cujo os propósitos, ocorrerão também no caráter profissionalizante de formação, assim como a transferência da Educação Especial para o setor privado, mas é relevante pontuar que todos esses encaminhamentos, também foram positivos, permi- tiram que muitos sujeitos antes ignorados e esquecidos, tivessem o direito ao trabalho e a escola. O retorno não foi tão imediato, mas foi o suficiente para que novas propostas fossem aprovadas e leis fossem promulgadas. Mesmo com uma abordagem voltada para atender ao mercado de trabalho, a Declaração de Salamanca, cujo princípio era a equalização de oportu- nidades para as pessoas com deficiência, reforçou o direito a educação. Posteriormente, as leis e normatizações oportunizaram o acesso, bem como, a escolha pela modalidade de ensino, oportunizando as pessoas com deficiência, o direito e a autonomia de escolha. O que deve ser primordial em ambas as modalidades, Educação Especial e Educação Inclusiva, é o acesso aos conteúdos sistematiza- dos e a formação ofertada. Nos três estados analisados, fica evidente que os documentos norteadores da educação inclusiva nos estados, seguem as normativas propostas na federação. Os estados do Ceará e Bahia reforçam o atendimento escolar desses alunos desde na edu- cação infantil, creches e pré-escolas, sempre que houver necessidade, mediante avaliação, o atendimento no AEE também. Essa atenção desde a educação infantil apresenta-se necessária, principalmente no caso dos surdos em cidades que não tenham escolas de surdos. Quanto a organização curricular, Pernambuco assegura enca- minhamentos para uma ação interdisciplinar adequada, com proce- dimentos e instrumentos que orientem melhor o atendimento desse alunado. Esta é uma preocupação necessária e determinante para a formação desses alunos. No Ceará, destacou-se além de currículos, também métodos, técnicas e recursos educativos visando uma orga- nização específica. Essa ênfase ao currículo, embora seja contemplada nos documentos, na sala de aula da rede regular, se apresenta como um 22 desafio aos docentes, devido ao número de alunos e as peculiaridades que apresentam. No estado da Bahia, ressalta o documento norteador, a organização dos currículos escolares e em seus projetos pedagógicos as disposições necessárias para o atendimento desses alunos. O que se observa é que os projetos políticos pedagógicos das escolas nem sempre atendem as exigências que compreendem as nor- mativas na área do AEE, na maioria dos casos, esses documentos estão descontextualizados da realidade objetiva de suas escolas. Ademais, no quesito de serviços, materiais e recursos humanos, os documentos seguem à risca o que determina as leis federais, mas na prática, o desafio maior está em oferecer profissionais habilitados para atuarem na área. Segundo a Teoria Histórico-Cultural, a inclusão tem entre seus pontos positivos, a interação social e a mediação.Para Vygotski, a compensação da deficiência caracteriza-se pelas condições que o meio social propicia ao sujeito, e a educação intencional e dirigida corrobora positivamente para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, que no caso das pessoas com deficiência podem ser estimuladas por meio de instrumentos mediadores como os conhecimentos científicos. Dessa forma, os avanços adquiridos até então na Educação Especial e na Educação Inclusiva devem ser analisados pelo caráter educativo que cada modalidade tem oportunizado e é na prática escolar que se pode compreender, se realmente as lacunas de práticas excludentes estrão sendo sanadas com um ensino que oportunize a hominização desses sujeitos. REFERÊNCIAS BIANCHETTI, L. Aspectos históricos da apreensão e da educação dos considerados deficien- tes. In: BIANCHETTI, L.; FREIRE, I. M. (Orgs.). Um olhar sobre a diferença: Interação, trabalho e cidadania. Campinas: SP: Papirus, 1998, pp. 21- 51 (Série Educação Especial). BRASIL. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Ministério da Educação/ MEC. Brasília: 1971. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/L5692.htm. Acesso em: 23 jul. 2012. 23 BUENO, J. G. S. Educação especial brasileira: integração/segregação do aluno diferente. São Paulo: EDUC, 1993. CARVALHO, A. 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Ed. – Maringá: Eduem, 2008. 25 PROCESSO FORMATIVO NA PERSPECTIVA DA TEORIA CRÍTICA DA SOCIEDADE: UMA ANÁLISE DA POLÍTICA NACIONAL DE ALFABETIZAÇÃO (PNA) Vanessa Freitag de Araújo4 Gabriely Silveira Nogueira5 INTRODUÇÃO Trata-se de uma análise da Política Nacional de Alfabetiza- ção (PNA) lançada em 2019 pelo Ministério da Educação à luz da perspectiva da Teoria Crítica da Sociedade. O debate sobre a alfa- betização e as limitações do processo é uma questão presente desde o final do século XIX, quando o Brasil fazia os primeiros ensaios na busca de soluções para consolidar a estrutura educativa e aten- der a demanda social do período. Falar sobre o processo de alfabetização implica, necessariamente, situá-lo no quadro social, político e econômico mais amplo, a fim de promover uma reflexão crítica sobre as condições históricas que interferem em sua produção. É preciso enfatizar que a alfabetização, vincula-se a compreensão da educação na condição de movimento geral, presente na sociedade com a tarefa de moldar os indivíduos aos estágios históricos em desenvolvimento ou em manutenção. A história da alfabetização no Brasil conecta-se aos métodos de ensino. A disputa entre métodos, que objetivavam garantir a inserção dos educandos no mundo da cultura letrada, produziu uma variedade 4 Doutorado em Educação (UEM). Professora do Departamento de Teoria e Prática da Educação (UEM). CV: http://lattes.cnpq.br/8491095222648301 5 Pós-graduanda em Arteterapia, Musicalização e Contação de Histórias no Ambiente Escolar (Instituto Rhema). Pedagoga (UEM). CV: http://lattes.cnpq.br/9028291345523180 26 de teorizações apresentadas em estudos dedicados à investigação dessa problemática. Na primeira década republicana utilizou-se o método analítico, a partir da segunda metade da década de 1920, passou-se a empregar o método analítico-sintético. No início da década de 1980, observa-se no Brasil, “[...] a mudança conceitual a respeito da aprendizagem da língua escrita” (SOARES, 2004, p. 9), grande parte das escolas aderiram ao construtivismo, fruto das pesquisas de Emília Ferreiro e Ana Teberosky a respeito da Psicogênese da Língua Escrita. Na época citada, constatou-se um grave problema no processo de alfabetização, o elevado índice de pessoas consideradas “analfabetos funcionais”, ou seja, que decodificam os signos linguísticos, mas não conseguem fazer o uso social da linguagem escrita. Os estudos da área passam a discutir e promover reflexões que indicam ser fundamental a compreensão entre o processo de alfabetização e letramento. Soares (2004) aponta que o construtivismo, ao congregar o uso social da linguagem escrita, priorizando o processo de letramento em detrimento da alfabetização, trouxe outro problema à tona para o pro- cesso de aquisição da língua escrita no país. O processo de alfabetização dissociou-se do processo de letramento, gerando uma nova forma de fracasso escolar, alunos não alfabetizados ou semi alfabetizados que estão matriculadosno ensino fundamental. O hiato proveniente das falhas acumuladas durante o processo de alfabetização impacta na dimensão formativa dos indivíduos, levando a escola na contramão de sua função social de promoção do homem, uma vez que é função da educação tornar o indivíduo “[...] cada vez mais capaz de conhecer os elementos de sua situação a fim de poder intervir nela transformando-a no sentido da ampliação da liberdade, comunicação e colaboração entre os homens” (SAVIANI, 1980, p. 52). Tal temática não é inédita, contudo, ao realizar um levantamento bibliográfico conciso para conhecer a área de estudo e as produções 27 relativas ao tema, sinalizou-se a possibilidade de uma análise alicerçada nos pressupostos da Teoria Crítica da Sociedade, por constituir-se, “enquanto uma vertente metodológica fundamental para se com- preender as implicações da razão moderna e o contexto cultural da sociedade de massas no capitalismo tardio” (FABIANO, 2014, p. 126). HISTÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL: QUESTÃO DOS MÉTODOS Ao tomar a PNA como objeto de estudo pretende-se realizar uma reflexão crítica a respeito do conceito de alfabetização apresen- tado pelo documento. A relevância do estudo vincula-se ao alicerce teórico-metodológico, que será observado no sentido de assunção da dimensão crítica, que permitirá identificar os princípios e objetivos propostos para condução do processo de alfabetização nas escolas públicas. Objetiva-se então apresentar reflexões sobre a temática da alfabetização, com o intuito de responder a seguinte questão: por que o processo de alfabetização ainda é uma tarefa complexa para alunos e professores? Algumas hipóteses podem auxiliar na resposta a este questionamento. De acordo com estudos de Smolka (2003) a tarefa pedagógica de alfabetização nas escolas, tem favorecido o elevado índice de crianças que não consegue aprender a ler e escrever, colocando-as à margem de uma sociedade letrada, globalizada e dominada pela indústria cultural. Nessas perspectivas, a alfabetização atua enquanto: [...] instrumento e veículo de uma política educacional que ultrapassa amplamente o âmbito meramente escolar e acadêmico. A ideologia da ‘democratização do ensino’ anuncia o acesso à alfabetização pela escolarização, mas, efetivamente, inviabiliza a alfabetização pelas próprias condições da escolarização: oculta e se esconde nessa ideologia a ilusão e o disfarce da produção do maior número de alfabetizados no menor tempo possível. 28 Nesse processo da produção do ensino em massa [...], as práticas pedagógicas não apenas discriminam e excluem como emudecem e calam (SMOLKA, 2003, p. 16). Ao reconhecer os limites impostos pelo paradigma contem- porâneo constituído sob a lógica do capitalismo tardio, almeja-se estabelecer relações para compreender a importância do processo de alfabetização, como auxiliar na formação da autonomia social dos indivíduos. Portanto, precisa ser concebido como “uma prática social e cultural em que se desenvolvem a formação da consciência crítica [...]” (GONTIJO, 2008, p. 198). Ao abordar sobre métodos de alfabetização, refere-se, em uma perspectiva histórica, a um processo cognitivo e social de aquisição inicial da leitura e da escrita que se respalda em conceitos metodoló- gicos. Para Soares (2016), é esse conjunto de procedimentos pautados em teorias e em princípios que encaminha a aprendizagem inicial da leitura e da escrita designada como alfabetização. Nesse sentido, quando pergunta-se qual a razão para o processo de alfabetização ainda ser uma tarefa complexa para alunos e professores, podemos nos assentar no entendimento de que, quando transformamos os métodos em questões a serem respondidas sobre diversas concepções, sempre priorizamos um determinado objeto: Uma reflexão sobre a questão dos métodos de alfabeti- zação evidencia que as causas de que métodos tenham sido, e continuem sendo, uma questão é que cada um deles privilegia determinada função, determinada faceta, determinados pressupostos teóricos ignorando ou mar- ginalizando os demais (SOARES, 2016, p. 32). É possível observar que perduram questionamentos sobre o que se ensina, sendo que a escolha do conteúdo, além da questão técnica, envolve uma questão política imbricada a interesses que ultrapassam a esfera pedagógica. Ela se relaciona a um projeto educativo amplo e 29 permeado por disputas e por interesse alinhados ao capital, portanto, marca-se a cada tempo uma espécie de tendência a ser adotada pelas escolas públicas na área da alfabetização. Tal conduta política, antes mesmo de ser pedagógica, apadrinha um só método deixando os outros isolados. Nessa perspectiva, a história da alfabetização conec- ta-se aos métodos ao longo dos períodos, para melhor entendermos de que forma a polêmica acerca da questão do método explicada por Soares (2016) permanece até hoje. A necessidade de um sistema público de ensino no início do Brasil República carregava junto a carência de um novo homem com valores republicanos, que resultaria, posteriormente, em um ensino público centrado na moral civil. O fim do Brasil Império deixou lacunas em sua organização com as poucas escolas que restavam. Nesse período, para ensinar a leitura era utilizado o método sintético. De acordo com Mortatti (2016), 1876 foi um marco na história da alfabetização, pois coincide com a publicação, em Portugal, da Cartilha Maternal ou Arte a Leitura, escrita por João de Deus. A partir de 1880, esse material didático passou a ser divulgado, ordenadamente, nas províncias de São Paulo e do Espírito Santo: Esse 1º. momento se estende até o início da década de 1890 e nele tem início uma disputa entre os defensores do ‘método João de Deus’ e aqueles que continuavam a defender e utilizar os métodos sintéticos: da soletração, fônico e da silabação. Com essa disputa, funda-se uma nova tradição: o ensino da leitura envolve necessaria- mente uma questão de método, ou seja, enfatiza-se o como ensinar metodicamente, relacionado com o que ensinar; o ensino da leitura e escrita é tratado, então, como uma questão de ordem didática subordinada às questões de ordem lingüística (da época) (MORTA- TTI, 2016, p. 6). 30 Mortatti (2016, p. 1) explica que a face mais visível da alfabeti- zação se relaciona aos métodos de alfabetização e a suas alternâncias, que desde o século XIX geram “[...] tensas disputas relacionadas com ‘antigas’ e ‘novas’ explicações para um mesmo problema: a dificuldade de nossas crianças em aprender a ler e escrever, especialmente na escola pública.” Nesse sentido, podemos compreender esse período da história da alfabetização em uma perspectiva de transformações sociais, econômicas, políticas e educacionais. Mendonça (2011) organiza, de maneira cronológica, a histó- ria da alfabetização em quatro períodos: o primeiro ocorreu entre a antiguidade e a idade média; o segundo, entre os séculos XVI e XVIII; o terceiro período teve início em meados da década de 1980 e, finalmente, o quarto período, denominado pela autora de “reinvenção da alfabetização”, que apresenta discussões sobre o contexto atual. Os denominados métodos sintéticos priorizavam a menor unidade existente, sucessivamente em direção à maior unidade, ou seja, dava-se maior importância ao valor sonoro das letras e sílabas, fazendo com que, da soletração, prosseguisse para os métodos fônicos e silábicos: Assim, os métodos da soletração, o fônico e o silábico são de origem sintética, pois partem da unidade menor rumo à maior, isto é, apresentam a letra, depois unindo letras se obtém a sílaba, unindo sílabas compõem-se palavras, unindo palavras formam-se sentenças e jun- tando sentenças formam-se textos. Há um percurso que caminha da menor unidade (letra) para a maior (texto) (MENDONÇA, 2011, p. 28). Surgem também os chamados métodos analíticos que, segundo Soares (2016, p. 24), “[...] passou-se a considerar a realidade psicoló- gica da criança”, no qual o percurso traçadoagora é da maior unidade sonora para a menor, isto é, parte-se da palavra escrita, segmentando-a até chegar ao menor valor sonoro: sílabas e grafemas. Soares (2016) afirma que dessas duas tendências nasceu a tão polêmica e controversa questão, a que predominou até a década de 1980, com o chamado 31 movimento pendular, pois ao longo do período ambas as concepções predominaram, em momentos distintos, durante quase todo o século. Apesar de serem consideradas distintas e antagônicas, elas estão inse- ridas nos mesmos moldes pedagógicos e psicológicos. A primeira transformação no paradigma do estudo da alfabetiza- ção ocorreu no final do século XIX. De acordo com Soares (2016), essa foi a primeira ruptura metodológica que ocorreria ao longo dos séculos; posteriormente, na década de 1980, temos uma segunda e decisiva mudança no paradigma da alfabetização, com a chamada psicogênese da língua escrita, difundida no Brasil pelo estudo de Emília Ferreira: A partir do início da década de 1980, essa tradição pas- sou a ser sistematicamente questionada, em decorrência de novas urgências políticas e sociais que se fizeram acompanhar de propostas de mudança na educação, a fim de se enfrentar, particularmente, o fracasso da escola na alfabetização de crianças. Como correlato teórico- metodológico da busca de soluções para esse problema, introduziu-se no Brasil o pensamento cons- trutivista sobre alfabetização, resultante das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita desenvolvidas pela pesquisadora argentina Emília Ferreiro e colaboradores (MORTATTI, 2016, p. 10). O novo paradigma que buscava evitar o fracasso escolar contras- tava com os métodos sintéticos e com os analíticos, trazendo consigo uma nova perspectiva a respeito da alfabetização: o centro da apren- dizagem agora é deslocado do professor para o aluno. Questionando os métodos e as cartilhas, o construtivismo buscava afastar-se das práticas tradicionais em que ambos se pautavam. Apesar do cons- trutivismo, o fracasso escolar persistia, trazendo em evidência outro problema que agora não mais atinge os anos iniciais, mas se alastra por todo o ensino fundamental. Mendonça (2011, p. 24), aponta que esse impasse consistia em priorizar o processo de letramento, consi- derando o uso social da linguagem escrita “[...] em detrimento dos 32 conhecimentos específicos, indispensáveis ao domínio da leitura e da escrita, que ficam diluídos no processo”. A controversa questão que acompanha o processo de alfabetização até os dias atuais com seus altos índices de reprovação escolar e de baixo desempenho estudantil nos exames nacionais e internacionais de proficiência na Língua Portuguesa. Para responder o questionamento essencial dessa pesquisa, Mendonça (2011) enfoca o quarto período da história da alfabetização, denominado “reinvenção da alfabetização”: Sabe-se, por meio de pesquisas institucionais que, hoje, no Brasil, apenas 15% dos alunos concluem a Educação Básica sabendo ler e escrever. Deste modo, se o fracasso até meados da década de 1980, quando se usava car- tilha era da ordem de 50% na 1ª série, hoje, é de 85% na 8ª série. Nesse contexto, uma nova metodologia, fundamentada na sociolinguística e na psicolinguística, propõe a organização do trabalho docente e a sistema- tização da alfabetização cujo objetivo é o de alfabetizar letrando. Sugere um trabalho que partindo da realidade do aluno desenvolva e valorize sua oralidade por meio do diálogo, que trabalhe conteúdos específicos da alfa- betização e utilize estratégias adequadas às hipóteses dos níveis descritos na psicogênese da língua escrita. Recomenda, também, a leitura de textos de qualidade, de diferentes gêneros, interpretação e produção tex- tual, estratégias indispensáveis ao desenvolvimento de aspectos específicos da alfabetização aliados a sua função social (MENDONÇA, 2011, p. 24). Tais informações referem-se aos dias atuais que, devido ao contexto histórico, pautam-se nas políticas voltadas à alfabetização, investigando uma resposta para tal fracasso. Fica evidente em ava- liações realizadas, sobretudo na Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA), que o Brasil enfrenta uma dificuldade em alfabetizar os alu- nos. As lacunas de aprendizagem podem ser observadas desde muito cedo no processo de escolarização das crianças. A partir das últimas 33 edições da ANA (2014 e 2016), é possível perceber que a maioria das crianças terminam a primeira etapa do ensino fundamental sem que estejam alfabetizadas, já que “em 2016, menos da metade dos alunos do 3º ano do Ensino Fundamental atingiram níveis de proficiên- cia suficientes em Leitura e Matemática: 45,3% e 45,5%, respecti- vamente” (BRASIL, 2019, p. 52). É importante ressaltar as desigualdades presentes no sistema escolar brasileiro. Segundo o documento, 14,1% das crianças que estão abaixo do nível socioeconômico possuem uma alfabetização aceitável no quesito leitura. No entanto, crianças com alto índice socioeconômico alcançam 83,5% nas competências de leitura. Em 2016, os resultados da ANA mostraram que 54,73 % dos 2 milhões de alunos que concluíram o 3° ano do ensino fundamental tiveram um desempenho insatisfatório em relação à compreensão da leitura. No quesito escrita, 33,95% apresentaram estar em níveis insufi- cientes (1, 2 ou 3), ou seja, entre as crianças de 8 anos, estimativamente 680 mil alunos identificados no nível 1 e 2 não conseguem produzir um texto coerentemente; já em relação às competências em matemática, 54,46% apresentaram estar em uma posição abaixo do esperado. Tais resultados demonstram que o objetivo de alfabetizar todas as crian- ças, no máximo, até o final do 3º ano do ensino fundamental não foi alcançado como propõe a meta 5. O Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (Pisa) tem como alvo os estudantes entre 15 anos e 2 meses e 16 anos e 3 meses. No ano de 2015, o Brasil ficou em 59° lugar em leitura e em 65° lugar em matemática nessa avaliação externa: Dos estudantes brasileiros, 51% ficaram abaixo do nível 2 em leitura, patamar mínimo necessário para o pleno exercício da cidadania, segundo a OCDE. Em matemática, 70,3% situaram-se abaixo do nível 2, sendo a pontuação média de 377 pontos, ao passo 34 que a média dos estudantes dos países membros da OCDE alcançou 490 pontos (BRASIL, 2019, p. 11). Com os dados expostos, é possível perceber que aquele percalço em relação à dificuldade de se alfabetizar observado nos textos que perduram por décadas, ainda é uma problemática presente. Segundo os resultados do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf ), do Instituto Paulo Montenegro, 3 a 10 brasileiros com idades entre 15 e 64 anos são considerados analfabetos funcionais. POLÍTICA NACIONAL DE ALFABETIZAÇÃO À LUZ DA TEORIA CRÍTICA DA SOCIEDADE Os conceitos da Teoria Crítica da Sociedade possibilitam uma análise sobre a crise da formação e nos dirigem a fatores contem- porâneos convergentes com uma educação pautada em princípios que se adequam ao capital e que perpetuam a semiformação. Nos termos de Adorno (1995, p. 21), a semiformação é um mecanismo da Indústria Cultural que ameaça a subjetividade, pois “ocorre uma interferência na apreensão da sociedade pelos seus ‘sujeitos’ pelo meca- nismo da ‘semiformação’: seja com conteúdos irracionais, seja com conteúdos conformistas”. Considerando o princípio contraditório que rege a sociedade burguesa, as classes sociais, Adorno (2005, p. 2, grifos nossos) afirma que a: [...] crise da formação cultural não é um simples objeto da pedagogia, que teria que se ocupar diretamente desse fato, mas também não pode se restringir a uma sociolo- gia que apenas justaponha conhecimentos a respeito da formação. Os sintomas de colapso da formação cultural que se fazem observar por toda parte, mesmo no estrato das pessoas cultas, não se esgotam com as insuficiências do sistema e dos métodos da educação, sob a crítica de sucessivas gerações. Reformas pedagógicas isoladas,indispensáveis, não trazem contribuições substan- 35 ciais Poderiam até, em certas ocasiões, reforçar a crise, porque abrandam as necessárias exigências a serem feitas aos que devem ser educados e porque revelam uma inocente despreocupação frente ao poder que a realidade extrapedagógica exerce sobre eles [ ] Assim, ao analisar as políticas educacionais que estão expressas nos programas e nas ações que devem ser executadas pela escola, verifi- ca-se a presença do dualismo presente na própria sociedade reproduzido via conteúdos curriculares e sob a forma de conhecimento relacionado à semiformação. Para Adorno (1996, p. 1), a semiformação é o reverso da formação; está relacionada ao “colapso da formação cultural que se fazem observar por toda parte, mesmo no estrato das pessoas cultas, não se esgotam com as insuficiências do sistema e dos métodos da educação, sob a crítica de sucessivas gerações”. Ao contrário disso, a formação deveria dizer respeito: [...] ao indivíduo livre e radicado em sua própria consciência, ainda que não tivesse deixado de atuar na sociedade e sublimasse seus impulsos. A formação era tida como condição implícita a uma sociedade autônoma [...]. Se na idéia de formação ressoam momentos de finalidade, esses deveriam, em consequência, tornar os indiví- duos aptos a se afirmarem como racionais numa sociedade racio- nal, como livres numa sociedade livre (ADORNO, 1996, p. 389). Em relação às políticas educacionais, a BNCC (BRASIL, 2017) representa uma forma de padronização do currículo escolar; inclusive, em seu contexto encontra-se a alfabetização. Ela parte de uma Política Educacional sincronizada com as demandas internacionais com vistas à “[...] lógica da mensuração de resultados e padronização mundial da educação”; sendo assim, o documento é “[...] ferramenta fulcral nessa edificação” (VENCO; CARNEIRO, 2018, p. 7). Nesse processo de elaboração da referida política de currículo estiveram envolvidos aspectos de ordem econômica e política que, por vezes, aparecem antes daqueles relacionados aos processos cognitivos de ensino e de 36 aprendizagem da língua escrita, sem que sejam relacionados à cultura como possibilidade de formação dos sujeitos. A PNA foi elaborada em consonância com a Base Nacional Comum Curricular que prevê os objetivos para a alfabetização que se desdobram em ações, em programas e em orientações para guiar a organização do trabalho pedagógico. No subtítulo denominado Os fundamentos pedagógicos da BNCC, a referência inicial está dire- cionada para o desenvolvimento de competências, com amparo no Art. 32 da Lei n.º 9.394/96 que define o ensino fundamental como “formação básica do cidadão”. Para isso, prevê: I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; II - a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da capacidade de aprendiza- gem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social (BRASIL, 1996, p. 12). É importante considerar que das orientações contidas na BNCC (BRASIL, 2017) para o ensino da linguagem e da escrita nos anos iniciais do ensino fundamental desdobram-se políticas e programas para a alfabetização, como é o caso da PNA, foco desta pesquisa, instituída pelo Decreto n.º 9.765, de 11 de abril de 2019. A referida política faz referência a conceitos, a princípios e objetivos, e diretrizes, ao público-alvo, à avaliação e ao monitoramento seguido das disposições finais. Por se tratar de normativa oficial, destaca-se o conceito adotado para orientar o processo de alfabetização, que deve se pautar “[...] em evidências científicas, com a finalidade de melhorar a qualidade da alfabetização no território nacional e combater o analfabetismo abso- 37 luto e o analfabetismo funcional [...]” (BRASIL, 2019, p. 1). Dentre os princípios, destacam-se os seguintes: III - fundamentação de programas e ações em evidên- cias provenientes das ciências cognitivas; IV - ênfase no ensino de seis componentes essenciais para a alfa- betização: a) consciência fonêmica; b) instrução fônica sistemática; c) fluência em leitura oral; d) desenvolvi- mento de vocabulário; e) compreensão de textos; f ) produção de escrita (BRASIL, 2019, p. 2). De forma articulada e complementar ao Decreto, no dia 15 de agosto de 2019, o Ministério da Educação (MEC) coordenou outras duas ações, quais sejam: o lançamento do caderno da PNA ‒ um guia detalhado ‒ e a Portaria n.º 1.460, de 15 de agosto de 2019, que institui a Conferência Nacional de Alfabetização Baseada em Evi- dências (CONABE), realizada de 22 a 25 de outubro de 2019, em Brasília, com o tema “A Política Nacional de Alfabetização e o estado da arte das pesquisas sobre alfabetização, literacia e numeracia”. O Caderno da PNA (BRASIL, 2019) está assim estruturado: Contex- tualização; Alfabetização, Literacia e Numeracia e Política Nacional de Alfabetização. A primeira seção aponta a alfabetização como tema relevante à sociedade brasileira e sinaliza para a “[...] urgência de mudança na concepção de políticas voltadas à alfabetização, à literacia e à numeracia” (BRASIL, 2019, p. 10). Tal proposta de mudança ancora-se nos dados da ANA, os quais revelam que 2 milhões dos estudantes concluintes do terceiro ano do ensino fundamental – aproximadamente 54,73% – apresentaram desempenho insuficiente em leitura (BRASIL, 2019), uma vez que “cerca de 450 mil alunos foram classificados no nível 1 da escala de proficiência, o que significa que são incapazes de localizar informação explícita em texto simples de até cinco linhas [...]” (BRASIL, 2019, p. 10). O Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf ) também é utili- 38 zado para demarcar que o Brasil não corresponde, de forma satisfatória, aos indicadores de qualidade do ensino e da leitura. Especificamente no que se refere à leitura, o indicador aponta para o analfabetismo fun- cional, uma vez que “[...] 3 de 10 brasileiros entre 15 e 64 anos podem ser considerados analfabetos funcionais [...]” (BRASIL, 2019, p. 13). Com base nesses índices insatisfatórios, o Caderno da PNA faz referência, de forma sintética, a estudos sobre alfabetização realizados no Brasil e em outros países. Quanto aos estudos brasileiros, destaca o relatório final “Alfabetização infantil: os novos caminhos da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados”, reeditado em 2007, que aponta o atraso do Brasil em relação às práticas de alfabetização e à formação de professores (BRASIL, 2019). Em síntese, a defesa é a de que a alfabetização de qualidade precisa pautar-se em cinco pilares: consciência fonêmica, instrução fônica sistemática, fluência em leitura, vocabulário e compreensão de textos. Assim, fica clara a indicação de que os países que reformularam as suas práticas de alfa- betização “incorporando instruções fônicas” apresentaram avanço na aprendizagem da leitura e da escrita (BRASIL, 2019). No entanto, a identificação dos “pilares” promotores da aprendi- zagem da leitura e da escrita, ainda que executados com eficiência via método ou protocolo específico, padronizados para todo o sistema, pode resolver somente uma parte do problema de aprendizagem, visto que a padronização do método encobre as condições objetivas de cada escola, de seus sujeitos e da própria desigualdade inerente à sociedade de classes. Na segunda seção, o Caderno da PNA apresenta os conceitos de alfabetização, de literacia e de numeracia. Quanto ao conceito de alfabetização, “a PNA, com base na ciência cognitiva da leitura, define alfabetização como o ensino das habilidades de leitura e de escrita em um sistema alfabético” (BRASIL, 2019, p. 18). A alfabetizaçãobaseada em evidências diz respeito à consulta por parte dos professores e dos 39 gestores da “[...] literatura científica nacional e internacional para conhecer e avaliar o conhecimento mais recente sobre os processos de ensino e de aprendizagem” (BRASIL, 2019, p. 20). Pode-se afirmar que, nesse sentido, desde o século XIX, a alfa- betização faz parte da produção científica acadêmica, revelando-se ampla e sempre utilizada para constituir os referenciais e as diretrizes pedagógicas da área. Destaca-se a dinâmica de cada contexto, ou seja, o fato de o referencial adotado estar coerente com os interesses daqueles que conduzem o processo de formulação das políticas para a alfabeti- zação. No contexto atual, o MEC considera que, “entre os ramos das ciências que mais contribuíram nas últimas décadas para a compreensão dos processos de leitura e de escrita, está aquele que se convencionou chamar ciência cognitiva da leitura” (BRASIL, 2019, p. 20). O conceito de ciência cognitiva da leitura apresentado na PNA (BRASIL, 2019) refere-se à utilização das imagens do cérebro para mapear o seu funcionamento durante o processo de aprendizagem da leitura e da escrita, cujos dados indicam o ensino explícito e sistemático como mais exitoso. Esses elementos teóricos não são distintos daqueles já apresentados na produção científica acadêmica da área, inclusive aqueles referenciados ao longo do nosso estudo. O avanço da ciência comprovou a plasticidade cerebral por meio de imagens tomográficas que permitem mapear as modificações cerebrais que ocorrem quando a criança aprende a ler e a escrever. De acordo com a PNA: Aprender a ler e a escrever faz criar no cérebro um caminho que liga as áreas de processamento fonológico com as de processamento visual, de modo que uma palavra, quando é vista, ativa no cérebro as mesmas áreas que uma palavra quando é ouvida [...]. As pesquisas em neurociências indicam que existe uma área do cérebro que passa a especializar-se no reconhecimento das letras quando se aprende a ler e a escrever. É a chamada Área da Forma Visual das Palavras (AFVP), situada na região 40 occipitotemporal esquerda, correspondente a uma área atrás da orelha esquerda, onde se conectam as regiões de processamento visual com as regiões de processa- mento fonológico e, por isso, é ideal para responder ao processo de leitura e de escrita (BRASIL, 2019, p. 26). Não é objetivo deste trabalho negar ou desconsiderar esses avan- ços que fundamentaram a elaboração do Caderno da PNA (BRASIL, 2019); não discorda-se da sua relevância e das possibilidades criadas para a atuação docente. Sabe-se que esta teoria será acompanhada de uma implementação prática. Nesse aspecto, teoria e prática, na sua relação, precisam de condições objetivas para serem efetivas e para colaborarem com os processos de ensino e de aprendizagem, sabendo-se que o processo de formação dos sujeitos é forjado no limite das contradições determinadas pelas condições objetivas da produção da vida material. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após a década de 1990, com a reforma da educação básica, a alfabetização passou a ser a questão central dos anos iniciais do ensino fundamental. Com o intuito de que as crianças sejam alfabe- tizadas até os 8 anos de idade, a PNA (2019) reafirma a centralidade e destaca que a alfabetização contribui para a promoção da cida- dania. Todavia, essa política precisa de meios objetivos e materiais viáveis para a sua implementação. Assim, quando trata dessa questão, afirma vagamente que “a implementação da PNA se dará por meio de programas, ações e instrumentos” (BRASIL, 2019, p. 44). Os ins- trumentos indicados no documento referem-se apenas a orientações curriculares e a materiais didáticos pautados em evidências científicas e na ciência cognitiva da leitura. A perspectiva da Teoria Crítica, concebida enquanto “[...] a teoria das relações sociais entre os homens apenas na medida em que também é a teoria da desumanidade dessas relações” (ADORNO, 1998, p. 32) 41 permite compreender o movimento histórico, bem como permite per- ceber e interpretar os fenômenos da educação para romper os determi- nismos e a linearidade que corrompe e conforma, gerando elementos de cunho ideológico. Tal ideologia permeia a educação que, como reflexo social fica à mercê de políticas de governo, que podem desconsiderar todos os avanços e conquistas de momentos históricos anteriores. Acredita-se que é tarefa da educação veicular estudos para apreender os conteúdos teóricos, instrumentalizar análises sobre as formas de manipulação cultural que são transpostas nos conteúdos escolares. Em virtude dessa compreensão teórica, os educadores pode- rão reavaliar hábitos alienantes e conformistas e diante dos meios e materiais de massificação, questionar os conteúdos, intervindo na reorientação dos seus usos, essa intervenção por vezes não aparece de forma imediata, mas ao causar pequenas rupturas no processo educativo, contribui para formação da vida social legítima. REFERÊNCIAS ADORNO, Theodor. Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. ADORNO, Theodor. Prismas: crítica cultural e sociedade. São Paulo: Ática, 1998. ADORNO, Theodor. Teoria da Semicultura. In: Educação & Sociedade, Campinas, SP, v.17, n.56, p.388-441, dez. 1996. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Educação é a Base. Brasília, DF: MEC; CONSED/ UNDIME, 2017. BRASIL. Ministério da Educação. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 20 dez. 1996. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Alfabetização. PNA Política Nacional de Alfabetização/Secretaria de Alfabetização. Brasília: MEC, SEALF, 2019. FABIANO, Luiz Hermenegildo. Escola de Frankfurt e educação: sociedade de massas e potencial formativo. In: MACIEL, Lizete Shizue Bomura, VIEIRA, Renata de Almeida, SOUZA, Fátima Cristina Lucas de. (Orgs). Pesquisas em educação: diferentes abordagens teórico metodológicas. Maringá, EDUEM, 2014. GONTIJO, Cláudia Maria. A escrita infantil, São Paulo: Cortez, 2008. 42 MENDONÇA, Onaide Schwartz. Percurso Histórico dos Métodos de Alfabetização. In: Sônia Maria Coelho. (Org.). Caderno de Formação: Formação de Professores Didática dos Conteúdos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, p. 23-35. MORTATTI, Maria do Rosário Longo. História dos métodos de alfabetização no Brasil. Brasília, 2006. SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Autores Associados, 1980. SMOLKA, Ana Luiza Bustamante. A criança na fase inicial da escrita: Alfabetização como processo discursivo. Ed. São Paulo: Cortez, 2003. SOARES, Magda. Alfabetização: a questão dos métodos. São Paulo: Contexto, 2016. SOARES, Magda. Alfabetização e letramento, 2° ed. São Paulo: Contexto, 2004. VENCO, Selma Borghi; CARNEIRO, Reginaldo. Para quem vai trabalhar na feira... essa educação está boa demais: a política educacional na sustentação da divisão de classes. Revista Horizontes, São Paulo, v. 36, n. 1, p. 7-15, jan./abr. 2018. 43 PRODUÇÃO DE TEXTO ESCRITA MULTIMODAL NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA DISCUSSÃO A PARTIR DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR Eurico Rosa da Silva Júnior6 Tiago de Aguiar Rodrigues7 INTRODUÇÃO A produção escrita na escola por muito tempo foi vista como obrigação, como cumprimento de uma demanda, algo engessado, desprovido de significado para o estudante-autor e distante de sua realidade. Estudos nesse direcionamento apontam que as aulas de língua portuguesa ainda estão distantes do real papel de língua enquanto um instrumento que ancore os indivíduos para as práticas reais no meio social; tais aulas são cansativas e constituem-se em meras repetições, descontextualizadas, da prescrição da gramática tradicional. Isso nos assegura Ferrarezi Jr. e Carvalho (2015) ao postular que “o ensino da escrita no Brasil tem sido assistemático,
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