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2 SUMÁRIO 1. Normas de direito processual civil ......................................................................................................3 1.1. Norma jurídica ...................................................................................................................................3 1.2. Fontes formais da norma processual civil ........................................................................................4 1.3. Interpretação da lei ...........................................................................................................................6 1.4. Lei processual civil no espaço ...........................................................................................................6 1.5. A lei processual civil no tempo .........................................................................................................7 2. Princípios fundamentais do processo civil .........................................................................................8 2.1. Princípios gerais do processo civil na constituição federal .............................................................9 2.1.1 Princípio do devido processo legal.................................................................................................9 2.1.2 Princípio do acesso à justiça ou da inafastabilidade da jurisdição .............................................10 2.1.3 Princípio do contraditório .............................................................................................................10 2.1.4 Princípio da duração razoável do processo .................................................................................12 2.1.5 Princípio da isonomia ...................................................................................................................12 2.1.6 Princípio da imparcialidade do juiz ou do juiz natural ................................................................14 2.1.7 Princípio do duplo grau de jurisdição ..........................................................................................15 2.1.8 Princípio da publicidade dos atos processuais............................................................................15 2.1.9 Princípio da motivação das decisões judiciais ............................................................................16 2.2. Princípios infraconstitucionais do processo civil ..........................................................................17 2.2.1 Princípio da boa-fé, lealdade processual e cooperação ..............................................................18 2.2.2 Princípio dispositivo e inquisitivo ................................................................................................19 2.2.3 Princípio da instrumentalidade das formas.................................................................................20 2.2.4 Princípio da primazia do julgamento de mérito ..........................................................................21 3. Quadros exemplificativos dos princípios elencados pela doutrina .................................................21 4. Jurisprudência correlata ....................................................................................................................23 5. Leitura da lei .......................................................................................................................................23 6. Fontes .................................................................................................................................................23 3 1. Normas de direito processual civil 1.1. Norma jurídica Prevalece no nosso ordenamento jurídico o princípio da supremacia da lei, sendo a norma escrita emanada de uma autoridade competente. A norma poderá ser dividida em norma cogente e norma não cogente: • NORMA COGENTE será de ordem pública e não pode ser derrogada pela vontade das partes. A finalidade é resguardar o interesse coletivo. • NORMA NÃO COGENTE OU DISPOSITIVA Pode ser derrogada, pois não tem caráter absoluto. Sua imperatividade será relativa, e irá se dividir em duas: A permissiva, que autoriza o interessado a derrogá-la e a supletiva, que se aplica na falta de disposição em contrários das partes. Conforme tabela do professor Marcus Vinícius: NORMAS COGENTES NORMAS NÃO COGENTES OU DISPOSITI- VAS Ordem pública Não são de interesse público Inderrogáveis Podem ser derrogadas Interesse da sociedade Interesse específico dos litigantes Podem ser permissivas (permitem expres- samente a derrogação) ou supletivas (apli- cáveis quando não houver convenção con- trária). No direito processual civil, ramo do direito público, segundo Marcus Vinícius, predomi- nam as normas cogentes, apesar de existirem normas dispositivas. O Código de Processo Civil de 2015, por outro lado, trilha um caminho de aproximação com as normas do direito privado, am- pliando as hipóteses de derrogação pelas partes. Grande inovação nesse sentido é a previsão do art. 190 do CPC, a qual disciplina o negócio processual: Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocom- posição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a vali- dade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de 4 adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade. Mesmo que o novo Código caminhe nesta direção, ainda é inegável de que este ainda é predominante público, tanto que no próprio art. 190 estabelece-se a possibilidade de o magistrado controlar a validade das convenções realizadas, recusando a sua aplicação nos casos de nulidade, de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta si- tuação de vulnerabilidade. Além do art. 190, ainda podemos elencar outras previsões que privilegiam a vontade das partes: • Possibilidade de escolher, de comum acordo, o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de mediação (art. 168); • Calendário para a prática de atos processuais (art. 191); • Delimitação consensual das questões de fato e de direito relevantes para a decisão de mérito e sobre as quais recairá atividade probatória (art. 357, § 2º); • Inversão convencional do ônus da prova (art. 373, §3º); • Indicação consensual de perito (art. 471); • Suspensão do processo e da audiência de instrução; • Regras de competência relativa. 1.2. Fontes formais da norma processual civil É normal a distinção entre fontes formais e não formais do direito. As fontes formais são as que expressam o direito positivo, as formas pelas quais ele se manifesta. Ou seja, a fonte formal é a lei (fonte formal primária). A analogia, os costumes e os princípios gerais do direito, são fontes formais acessórias, assim como, as súmulas do STF, com efeito vinculante, bem como as decisões definitivas de mérito, nas ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade e as hipóteses de precedentes vinculantes do art. 927 do CPC. Por sua vez, a doutrina e os precedentes jurisprudenciais não vinculantes são fontes não formais. Assim, esquematizando, temos: FONTE FORMAL PRIMÁRIA FONTE FORMAL ACESSÓRIA FONTE NÃO FORMAL Lei. 1. Analogia, costume e princípio gerais do direito (art. 4º da LINDB); 2. Súmulas vinculantes (art. 103-A da CF e Lei nº 11.417/2016); 3. Decisões definitivas de mérito preferidas pelo STF em controle direito de constitucionalidade (art. 102, §2º, da CF); 4. Precedentes vinculantes do art. 927 do CPC. Doutrina; Precedentes jurispru- denciais não vinculan- tes. 5 Conforme o art. 22, I, da Constituição Federal, compete privativamenteà União legislar sobre direito processual civil. Assim, em regra, é a lei federal que trata sobre o direito processual civil. Contudo, também estabelece o art. 24, XI, que compete à União, aos Estados e ao Distri- to Federal legislar concorrentemente sobre procedimentos em matéria processual. No âmbito da le- gislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais e esta com- petência não exclui a suplementar dos Estados. Mas no caso de inexistir lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. Assim, muito cuidado para não confundir: COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO Direito processual COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA UNIÃO, ESTADOS E DF Procedimentos em matéria processual E como saber se as regras são de processo ou de procedimento? É uma distinção, muitas vezes, complicada de ser feita, mas conforme o professor Marcus Vinícius: É possível dizer que, em regra, as normas procedimentais são as que versam exclusivamente sobre a forma pela qual os atos processuais se realizam e se sucedem no tempo. Diferem das que tratam das relações entre os sujeitos do processo, quanto aos poderes, faculdades, direitos e ônus atribuídos a cada um. Mas a qualificação de uma norma como processual ou procedimental pode gerar intermináveis discussões. 1.3. Interpretação da lei Não há especificidades em relação à hermenêutica das normas de direito processual civil, devendo ser aplicados os mesmos métodos clássicos dos demais ramos de direito. Para lem- brar os métodos clássicos de interpretação, vale conferir quadro indicativo elaborado por Marcus Vinícius: MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO Fontes Meios Resultados Autêntica — formulada pelo legislador Gramatical — texto literal da lei Extensiva — dá à lei aplica- ção de maior amplitude Doutrinária — formulada pelos estudiosos e douto- res Sistemática — a lei em sua relação com o ordenamen- to Restritiva — dá à lei aplica- ção de menor amplitude 6 Jurisprudencial — resulta- do de decisões judiciais Teleológica — a finalidade a ser alcançada pela lei Declarativa — dá à lei in- terpretação que não am- plia nem restringe Histórica — o processo le- gislativo e histórico que a antecedeu 1.4. Lei processual civil no espaço As normas de processo civil têm validade e eficácia, em caráter exclusivo, em todo o território nacional, conforme estabelece o artigo 16 do CPC. Diante disso, todos os processos que tramitam no Brasil devem respeitar o CPC, ressalvados os casos de disposições específicas previstas em tratado, convenções ou acordos internacionais de que o Brasil seja parte. ATENÇÃO! Não confundir as normas de direito processual com a de direito material. É possível que, em um processo, mesmo que se aplique as normas de direito processual do Brasil, aplique-se o direito material estrangeiro. Quanto aos processos que correm e as sentenças que são proferidas no estrangeiro, a regra será a da ineficácia em território nacional, salvo se for homologada pelo STJ. ATENÇÃO! A sentença estrangeira de divórcio consensual produz efeitos no Brasil, independen- temente de homologação pelo Superior Tribunal de Justiça (artigo 961, §5º, CPC/15). 1.5. A lei processual civil no tempo A lei processual civil irá ter incidência imediata, atingindo inclusive os processos já em curso. Não há direito adquirido a que um processo que se iniciou sob a égide de lei processual anti- ga, continue a ser por ela conduzido, a despeito da nova lei vigente. É o que se depreende do art. 14: Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamen- te aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Nesse contexto, a lei processual atinge os processos em andamento, tendo em vista o princípio do isolamento dos atos processuais. Conforme este princípio, o processo deve ser visto como uma sequência de atos isolados e a lei nova deverá respeitar os atos que já foram realizados e consumados conforme a lei antiga. 7 ATENÇÃO! No caso de nova lei que modifique a competência, como deverá se proceder? O artigo 43 do CPC elucida que a competência é apurada na data do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevante as alterações de fato ou de direito supervenientes. É o ins- tituto chamado de perpetuatio juisdictionis. Sob essa ótica, a lei processual nova, que altera competência, não se aplica aos processos em andamento. Contudo, existem algumas exceções no próprio artigo 43, quais sejam: • Quando suprimir o órgão do judiciário; • ou alterar a competência absoluta. Como exemplo, podemos tomar a emenda constitucional 45/2004, em relação às ações de in- denização fundada em acidente de trabalho, que antes tramitavam em justiça comum. O novo regramento alterou a competência da Justiça Comum, atribuindo a competência para a Justiça do Trabalho. Então, para afastar as dúvidas, o STF editou a súmula vinculante 22: A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de aci- dente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional 45/2004. Recurso contra a decisão que julga a impugnação à justiça gratuita A impugnação à justiça gratuita é feita nos autos do próprio processo ou em autos apartados? • Antes do CPC/2015: autos apartados. • Depois do CPC/2015: nos autos do próprio processo. Qual é o recurso cabível contra a decisão que acolhe a impugnação à gratuidade de justiça? • Antes do CPC/2015: apelação. • Depois do CPC/2015: agravo de instrumento. Se a parte ingressou com a impugnação antes do CPC/2015, mas esta somente foi julgada após a vigência do novo Código, qual é o recurso que deverá ser interposto contra essa decisão que rejeitou ou acolheu a impugnação? Agravo de instrumento. Cabe agravo de instrumento contra o provimento jurisdicional que, após a entrada em vigor do CPC/2015, acolhe ou rejeita incidente de impugnação à gratuidade de justiça instaurado, em autos apartados, na vigência do regramento anterior. Aplica-se aqui o princípio do tempus regit actum, no qual se fundamenta a teoria do isolamen- to dos atos processuais. STJ. 3ª Turma. REsp 1666321-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 07/11/2017 (Info 615). (Dizer o Direito). 8 2. Princípios fundamentais do processo civil O novo CPC estabelece, entre seus artigos 1 e 12, as normas fundamentais do processo civil. A norma será fundamental por estruturar o modelo do processo civil brasileiro, e então, servirá de norte para a compreensão de todas as demais normas jurídicas. Em complemento as normas processuais poderão ser classificadas ora como regras, ora como princípios. Nesse contexto, uma parte das normas processuais decorrerão da Constituição Federal, sendo então chamada de Direito Processual Fundamental Constitucional. Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado con- forme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constitui- ção da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições des- te Código. Nesse sentido, primeiramente iremos estudar os princípios de direito processual civil que decorrem diretamente da Constituição Federal. Em seguida, estudaremos aqueles que são ape- nas infraconstitucionais. ATENÇÃO! É comum a cobrança em concursos públicos o conhecimento da origem dos princípios, se são oriundos da Constituição Federal ou de normas infraconstitucionais. Por isso, tomem cuidado para este detalhe. 2.1. Princípios gerais do processo civil na constituição federal 2.1.1 Princípio do devido processo legal Esse princípio deriva da frase “due process of law” que anuncia sobre a necessidade de o processo estar em conformidade com o direito, este é um direito fundamental previstona Consti- tuição Federal. In verbis: Art. 5º: LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Funcionará como uma garantia contra o exercício abusivo do poder, e por ser uma cláu- sula geral, que teve seu significado modificado ao longo dos anos, ora entendido como instrumento contrário à tirania, outrora entendido como instrumento para igualdade processual. Atualmente é entendido como um princípio basilar do ordenamento jurídico brasileiro, onde, existem subprincípios derivados, como: a ampla defesa; o princípio do contraditório e o prin- cípio da igualdade processual. Portanto, esse princípio possuirá função integrativa do ordenamento. Logo, poderemos compreendê-lo de duas formas distintas: o devido processo legal formal ou procedimental e o devi- 9 do processo legal substancial ou material. O Devido processo legal formal ou procedimental será composto pelas garantias pro- cessuais, quais sejam: o direito do contraditório, ao juiz natural, a um processo com duração razoá- vel, etc. Portanto, trata-se do devido processo legal mais conhecido. Já o devido processo legal substancial desenvolveu-se nos EUA, com o fito de gerar um processo com decisões jurídicas substancialmente devidas. Assim, o processo deverá ter em seu conteúdo os deveres de razoabilidade e proporcionalidade, garantindo que as normas e decisões dos processos sejam aplicados, respeitando a esses deveres e não somente se compondo de nor- mais processuais. Analisemos uma decisão proferida pelo Min. Celso de Mello, publicada no informativo do STF n. 381: Não se pode perder de perspectiva, neste ponto, em face do conteúdo evidentemente arbitrário da exigência estatal ora questionada na pre- sente sede recursal, o fato de que, especialmente quando se tratar de matéria tributária, impõe-se, ao Estado, no processo de elaboração das leis, a observância do necessário coeficiente de razoabilidade, pois, como se sabe, todas as normas emanadas do Poder Público devem ajus- tar-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do “substantive due process of law” (CF, art. 5º, LIV), eis que, no tema em questão, o postulado da proporcionalidade qualifica-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Fede- ral (RTJ 160/140-141 - RTJ 178/22-24, v.g.) Portanto, a jurisprudência do STF já vem extraindo a referida cláusula geral do devido processo legal substancial. 2.1.2 Princípio do acesso à justiça ou da inafastabilidade da jurisdição Esse princípio trata do direito de ação no seu sentido amplo, isto é, de obter uma respos- ta aos requerimentos feitos ao Poder Judiciário, mesmo que a resposta seja pela impossibilidade de avaliar a pretensão por falta de condições obrigatórias. Art. 5º, XXXV da CF - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a di- reito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do proces- so judicial. 10 ATENÇÃO! Os parágrafos do art. 3º do CPC preveem métodos alternativos de solução consensual de conflitos. O STF já decidiu que não há inconstitucionalidade e nem ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. 2.1.3 Princípio do contraditório O princípio do contraditório é previsto no art. 5º, LV, da Constituição Federal: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusa- dos em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; Uma grade aplicação deste princípio no Código de Processo Civil de 2015 foi a criação da regra da vedação à decisão surpresa, previstas nos arts. 9º e 10 do CPC: Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportu- nidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. ATENÇÃO! Essa regra é aplicada ainda que a matéria possa ser decidida de ofício e essa é uma pe- gadinha muito comum em concursos. Quando o juiz pode decidir de ofício, isso significa que ele pode conhecer da matéria mesmo que ela não tenha sido alegada pelas partes. Contudo, isto não significa que o juiz poderá decidir sobre a matéria sem antes ouvir as partes. Deste modo, reconhecendo o juiz uma possível prescrição, por exemplo, mesmo que não tenha sido alegada pelas partes, deverá o magistrado ouvi-las antes de reconhecer a eventual prescrição. Outra observação importante em relação ao contraditório, é que ele não é obrigato- riamente prévio, o que explica a possibilidade de concessão das famosas liminares inaudita altera parte. Em determinadas situações, é possível a ocorrência do contraditório postergado ou dife- rido, nos casos em que há risco iminente de prejuízo irreparável, nos quais o contraditório prévio pode colocar em risco a prestação de um provimento jurisdicional efetivo. Nesses casos, o magistra- do primeiro irá determinar a medida e, apenas posteriormente, ouvirá a outra parte. Esses casos são exatamente os previstos nos incisos do parágrafo único do art. 9º do CPC: Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica: I - à tutela provisória de urgência; 11 II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; III - à decisão prevista no art. 701. expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou execução de obrigação de fazer ou não fazer, quando preenchidos os requisitos para o processamento da ação monitória. Por fim, cumpre comentar sobre o art. 332 do CPC, o qual prevê hipóteses em que o ma- gistrado poderá julgar liminarmente improcedente o pedido independentemente da citação do réu. Nestes casos, dispensa-se a citação do réu, pois ele não será prejudicado, visto que o julgamen- to só irá ocorrer quando for de total improcedência, não lhe trazendo qualquer prejuízo. Contudo, caso o autor apresente apelação, deverá o réu ser citado para apresentar con- trarrazões à apelação, efetivando-se o contraditório. Ademais, para que se respeite a regra da ve- dação às decisões surpresa, apesar de réu não precisar ser citado, o autor deverá ser intimado para se manifestar quando o juiz entender pela possibilidade de aplicar o art. 332, pois o autor não poderá ser surpreendido com a aplicação deste julgamento sem que antes tenha oportunidade de se manifestar. 2.1.4 Princípio da duração razoável do processo Encontra-se no art. 5º, LXXVIII, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Contudo, mesmo an- tes da EC 45, já se entendia pela sua aplicabilidade por derivar do devido processo legal e por tam- bém decorrer do Pacto de San José da Costa Rica. Art. 5º, LXXVIII, da CF - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Conforme o CPC, este princípio engloba uma solução integral do mérito, incluindo também a atividade satisfativa. Art. 4º. As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução inte- gral do mérito, incluída a atividade satisfativa. 2.1.5 Princípio da isonomia É encontrado no caput do art. 5º e no inciso I da Constituição Federal: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature- za, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações,nos termos desta Constituição; No direito processual civil, este princípio se manifesta na forma do art. 7º do CPC: Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos 12 ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório. Uma importante inovação do NCPC que visa efetivar o princípio da isonomia, foi a cria- ção do dever de observância da ordem cronológica, em caráter preferencial, conforme o art. 12 do CPC. ATENÇÃO! Na redação original do código, era previsto que os juízes e os tribunais deveriam obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Contudo, ainda durante o período de vacatio legis, o caput do art. 12 foi alterado, passando a prever que a ordem crono- lógica deve ser obedecida preferencialmente. A modificação conferiu flexibilidade ao art. 12, que antes admitida apenas as exceções do pará- grafo segundo. Agora, o juiz poderá deixar de observar a ordem cronológica em outras hipóte- ses além das do parágrafo segundo, mas deverá fundamentar a razão da não observância da regra, de modo a seguir observando o princípio constitucional da isonomia. A ordem cronológica não precisa ser observada em qualquer pronunciamento judicial, mas, conforme o caput do art. 12, nas sentenças e nos acórdãos. Deste modo, estão excluídas as decisões interlocutórias, despachos, decisões monocráticas nos tribunais, etc. Como forma de ga- rantir a fiscalização pela sociedade e o controle do dispositivo, o §1º determina que a lista de pro- cessos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores. Muito cobrado em concursos públicos é o §2º, por isso, é importante a sua memorização. Neste parágrafo é listado o rol exemplificativo de exceções ao julgamento cronológico. Vejamos as hipóteses: • as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improce- dência liminar do pedido; • o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em jul- gamento de casos repetitivos; • o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; • as decisões proferidas com base nos arts. 485 (extinção sem resolução de mérito) e 932 (decisões monocráticas do relator); • o julgamento de embargos de declaração; • o julgamento de agravo interno; • as preferências legais e as metas estabelecidas pelo CNJ; • os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal; • a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão funda- mentada. 13 Quanto às preferências legais, é preciso também respeitar a ordem cronológica entre elas (§4º). Deste modo, observa-se que existirão duas listas: a) lista da ordem geral (§1º) e b) lista das preferências legais (§3º). Aduz o §6º que ocupará o primeiro lugar na lista geral ou, conforme o caso, na lista prefe- rencial, o processo que: a) tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessida- de de realização de diligência ou de complementação da instrução; ou b) se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II (publicado o acórdão paradigma, órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso ante- riormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior). 2.1.6 Princípio da imparcialidade do juiz ou do juiz natural É aquele encontrado no art. 5º, LIII e XXXVII da Constituição Federal: XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; Para obedecer ao princípio do juiz natural é necessário que a competência do magistra- do tenha sido determinada de acordo com regras previamente existentes e que não poderão ser modificadas a posteriori. Conforme Marcus Vinícius, são três os requisitos para a caracterização do juiz natural: • Julgamento deve ser proferido por alguém investido de jurisdição; • O órgão julgador deve ser preexistente, vedada à criação de juízos ou tribunais de exce- ção, instituídos após o fato, com o intuito específico de julgá-lo; • A causa deve ser submetida a julgamento pelo juiz competente, de acordo com regras postas pela Constituição Federal e por lei. Contudo, o art. 5º, LIII, da CF não fala apenas em ser sentenciado, mas também em ser processado pela autoridade competente. Em razão disso, iniciou-se uma discussão sobre a existên- cia do princípio do promotor natural, que é o de ser processado por autoridade com atribuições previamente estabelecidas e conhecidas para acompanhar determinado caso. Atualmente, prevale- ce tanto na doutrina como na jurisprudência que o Brasil também adotou este princípio. 2.1.7 Princípio do duplo grau de jurisdição O princípio do duplo grau de jurisdição não encontra previsão expressa na Constitui- ção Federal, mas pode ser inferido das suas disposições que criam órgãos responsáveis por julgar recursos contra decisões de primeiro grau, estabelecendo um sistema que, em regra, existe o duplo grau. Contudo, já vários casos em que não há duplo grau de jurisdição, e, nem por isso, haverá inconstitucionalidade. Seguem exemplos do professor Marcus Vinícius em que não há duplo grau e nem inconstitucionalidade: • as causas de competência originária do STF; • os embargos infringentes, previstos na lei de execução fiscal, que cabem contra a sen- tença proferida nos embargos de valor pequeno, e que são julgados pelo mesmo juízo 14 que prolatou a sentença; • a hipótese do art. 1.013, § 3º, do CPC, em que, havendo apelação contra a sentença que julgou o processo extinto sem resolução de mérito, o tribunal, encontrando nos autos todos os elementos necessários à sua convicção, poderá promover o julgamento de mé- rito. ATENÇÃO! Há previsão do duplo grau de jurisdição no art. 8º, 2, h, da Convenção Americana de Direitos Hu- manos, que possui eficácia supralegal. 2.1.8 Princípio da publicidade dos atos processuais É previsto em dois artigos da Constituição Federal: Art. 5º, LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; Art. 93, X - as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros; No CPC, é previsto na primeira parte do caput do art. 11: Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão pú- blicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públi- cos ou do Ministério Público. Observe que o próprio art. 5º, LX, da CF determina que a lei poderá restringir a publici- dade dos atos quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem. Nesse sentido, o art. 189 regulamenta as hipóteses em que os processos correrão em segredo de justiça: Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os processos: I - em que o exija o interesse público ou social; II - que versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separa- ção, união estável, filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescen- tes; III - em que constem dados protegidos pelo direito constitucional à inti- midade; IV - que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de car- ta arbitral, desde que a confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo. § 1º O direito de consultar os autos de processo que tramite em segredo de justiça e de pedir certidões de seus atos é restrito às partes e aos seus procuradores. § 2º O terceiro que demonstrar interesse jurídico pode requerer ao juiz 15 certidão do dispositivoda sentença, bem como de inventário e de parti- lha resultantes de divórcio ou separação. ATENÇÃO! CUIDADO COM A PEGADINHA Partes e aos seus procuradores: Terceiro que demonstrar interesse jurídico Direito de consultar os autos de processo e de pedir certidões de seus atos. Pode requerer ao juiz certidão do dispositivo da sentença, bem como de inventário e de par- tilha resultantes de divórcio ou separação. 2.1.9 Princípio da motivação das decisões judiciais Conforme esse princípio, todos os pronunciamentos judiciais precisam ser motivados, excepcionando-se apenas os despachos, pois não possuem conteúdo decisório. Pode ser encontra- do no art. 93, IX da Constituição Federal: Art. 93, IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, po- dendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preser- vação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; O CPC inovou na busca por efetivar esse princípio no parágrafo primeiro do art. 489, o qual estabeleceu que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocu- tória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato norma- tivo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem de- monstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de dis- tinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. 16 Princípio da fundamentação (art. 11) e validade da fundamentação per relationem O art. 489, § 1º do CPC/2015 previu uma série de exigências para a fundamentação das deci- sões judiciais. Diante disso, alguns autores sustentaram que, a partir da entrada em vigor desse novo diploma, teria sido proibida a motivação per relationem. Essa não foi, contudo, a conclu- são adotada pelo STJ. Para o Tribunal, mesmo com o novo CPC, continua sendo possível esta técnica de motivação: (...) a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, bem assim a do Supremo Tribunal Federal, admitem a motivação per relationem, pela qual se utiliza a transcri- ção de trechos dos fundamentos já utilizados no âmbito do processo. Assim, descaracterizada a alegada omissão e/ou ausência de fundamentação, tem-se de rigor o afastamento da suposta violação do art. 489 do CPC/2015, conforme pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (...) STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 1440047/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 11/06/2019. (Dizer o Direito). 2.2. Princípios infraconstitucionais do processo civil Aqui a doutrina lista uma série de princípios. Priorizaremos aqueles em que há precisão expressa no CPC, pois sua incidência em concursos públicos é mais provável. 2.2.1 Princípio da boa-fé, lealdade processual e cooperação O art. 5º do CPC impõe a todas as partes do processo o dever de comportar-se de acor- do com a boa-fé. Ou seja, exige das partes um comportamento íntegro, coerente e de acordo com outros princípios processuais. Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve com- portar-se de acordo com a boa-fé. Antes de adentrar neste princípio, importante distinguir a boa-fé objetiva e subjetiva: • Boa fé subjetiva é a intenção (interna), um estado psicológico, firme crença ou ainda por ignorância (desconhecimento de situação fática) de estar agindo corretamente. • Boa fé objetiva Trata-se de um dever de bom comportamento do agente. São conside- rados deveres anexos ou laterais às obrigações. Um comportamento esperado das par- tes, independentemente de seu estado anímico (subjetivo), pode-se citar com exemplos os deveres de lealdade, probidade, retidão, ética, informação, dentre outros. Nesse diapasão, o que será tratado no referido princípio está relacionado com a boa-fé objetiva, sendo uma cláusula geral que abrange diversas situações. Tal princípio não está previsto de forma expressa no texto constitucional, contudo mui- tos doutrinadores atribuem sua existência à interpretação do texto constitucional. O STF, entretanto, fundamenta que a boa-fé processual está atrelada ao conteúdo do devido processo legal, pois para que um processo seja devido é preciso que ele seja ético e legal. 17 Na realidade, o princípio da boa-fé processual atua como um meio de proibir a má-fé processual, a proibição do abuso de direitos, a proibição de venire contra factum proprium (proibi- ção de uma situação jurídica que seja contrária a um comportamento anterior), etc. Podemos citar como exemplos de dispositivos do CPC que dão concretude ao princípio da boa-fé: • Art. 77 que enumera outros deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo; • Art. 80 que estabelece o que se considera litigância de má-fé; • Art. 332, §2º e art. 489, §3º que determinam a interpretação dos pedidos e da sentença conforme a boa-fé. O princípio da cooperação, por sua vez, está descrito no art. 6º do CPC: Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. O art. 6º busca um processo baseado na cooperação. Assim, não basta que as partes sigam os conceitos da boa-fé processual objetiva, com a vedação de atos de má-fé por parte dos litigantes, mas também que as partes ajam de forma construtiva, positiva e efetiva no sentido de promover uma prestação jurisdicional justa, legítima e efetiva na consecução do melhor direito. Existem três principais métodos de andamento do processo: a) dispositivo ou adversa- rial; b) inquisitivo; ou c) cooperativo. O primeiro deles (adversarial) coloca as partes em situação de protagonismo, de forma que o andamento do processo se dá por maior autonomia da vontade das partes, é regulado em geral pelo autorregramento da vontade, ou seja, as partes preferem manter o conflito do que se ajudarem na busca de resolver a demanda. O segundo (inquisitivo) se baseia no protagonismo do juiz, ele interfere fortemente no andamento do processo, está sempre presente e não dá oportunidade as partes para convenciona- rem. O terceiro (cooperativo) é o adotado atualmente no Brasil e é uma mistura dos dois outros métodos, de forma que tanto as partes como o juiz devem cooperar entre si para o andamen- to do processo, une-se aqui o impulso oficial e o autorregramento da vontade. Assim, as partes, para que haja cooperação no processo, devem agir com lealdade, pro- teção e esclarecimento. O juiz para cooperar com as partes deverá agir com lealdade, prevenção, consulta e esclarecimento. Podemos listar como exemplos de aplicação do princípio da cooperação no novo CPC: Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os re- quisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. 18 Art. 357, § 3º Se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar audiência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações. Juiz deve respeitar o princípio daboa-fé objetiva O princípio da boa-fé objetiva é aplicado ao direito processual civil. Se o processo estava suspenso, não era possível que fosse praticado nenhum ato processual, ressalvados os urgentes a fim de evitar dano irreparável. Desse modo, ao homologar a conven- ção pela suspensão do processo, o Poder Judiciário criou nas partes a legítima expectativa de que o processo só voltaria a tramitar após o prazo convencionado. Não se pode admitir que, durante o prazo de suspensão deferido pelo juiz, seja publicada a sentença (ato processual) e, o pior, que a partir de então comece a correr o prazo para recurso contra a decisão. Ao agir dessa forma, o Estado-juiz incidiu na vedação de venire contra factum proprium considerando que praticou ato contraditório, incompatível com a suspensão. STJ. 2ª Turma. REsp 1306463-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 4/9/2012 (Info 503). (Dizer o Direito). Aplica-se o venire contra factum proprium para atos praticados pelos serventuários A eventual nulidade declarada pelo juiz de ato processual praticado pelo serventuário não pode retroagir para prejudicar os atos praticados de boa-fé pelas partes. Dessa forma, no processo, exige-se dos magistrados e dos serventuários da Justiça conduta pautada por lealdade e boa-fé, sendo vedados os comportamentos contraditórios. Em outras palavras, aplica-se também o venire contra factum proprium para atos do juiz e dos serventuários da justiça. STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 91311-DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 6/12/2012 (Info 511). (Dizer o Direito). Boa-fé objetiva e a “nulidade de algibeira” A “nulidade de algibeira” ocorre quando a parte se vale da “estratégia” de não alegar a nulida- de logo depois de ela ter ocorrido, mas apenas em um momento posterior, se as suas outras teses não conseguirem ter êxito. Dessa forma, a parte fica com um trunfo, com uma “carta na manga”, escondida, para ser utilizada mais a frente, como um último artifício. Esse nome foi cunhado pelo falecido Ministro do STJ Humberto Gomes de Barros. Algibeira = bolso. Assim, a “nulidade de algibeira” é aquela que a parte guarda no bolso (na algibeira) para ser utilizada quando ela quiser. Tal postura viola claramente a boa-fé processual e a lealdade, que são deveres das partes e de todos aqueles que participam do processo. Por essa razão, a “nulidade de algibeira” é rechaça- da pela jurisprudência do STJ. STJ. 3ª Turma. REsp 1372802-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/3/2014 (Info 539). (Dizer o Direito). 2.2.2 Princípio dispositivo e inquisitivo O Brasil adota uma espécie de sistema misto entre o sistema inquisitivo e dispositivo. Antes, cumpre lembra no que consiste esses sistemas. Segundo Daniel Amorim: 19 SISTEMA INQUISITIVO SISTEMA DISPOSITIVO No sistema inquisitivo puro o juiz é colo- cado como a figura central do processo, cabendo a ele sua instauração e condição sem necessidade de qualquer provoca- ção das partes. A liberdade de atuação do juiz é ampla e irrestrita. No sistema dispositivo puro o juiz passa a ter uma participação condicionada à vontade das partes, que definem não só a existência e extensão do processo, como também o seu desenvolvimento, que dependerá de provocação para que prossiga. O art. 2º do CPC consagra um sistema misto, veja-se: Art. 2o O processo começa por iniciativa da parte (princípio dispositivo) e se desenvolve por impulso oficial (princípio inquisitivo), salvo as exce- ções previstas em lei. São exemplos de aplicação do princípio dispositivo e inquisitivo no processo civil: PRINCÍPIO INQUISITIVO PRINCÍPIO DISPOSITIVO Provas a respeito dos fatos podem ser determinadas de ofício pelo juiz (art. 370, caput); Pedidos implícitos e permissão de apli- cação do princípio da fungibilidade (ex.: pedida a reintegração de posse o juiz concede a manutenção de posse 0 art. 554). Magistrado vinculado aos fatos jurídicos componentes da causa de pedir, que de- pende da vontade da parte; Juiz vinculado aos limites do pedido autor, não se admitindo a concessão de algo diferente, o que poderia gerar uma sentença extra ou ultra petita. 2.2.3 Princípio da instrumentalidade das formas O princípio da instrumentalidade das formas reduz o apego ao formalismo, aduzindo que o importante é verificar se a violação da forma legal para a prática de um ato o afastou da sua finalidade. Assim, caso não tenha ocorrido nenhum prejuízo ao professo e à parte contrária, o ato deverá gerar seus efeitos normalmente, sem reconhecimento de nulidade. Este princípio pode ser encontrado em diversos dispositivos do CPC: Art. 188. Os atos e os termos processuais independem de forma determi- nada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial. Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade. Art. 283. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais. 20 Parágrafo único. Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte. Art. 1.029. § 3º O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou de- terminar sua correção, desde que não o repute grave. 2.2.4 Princípio da primazia do julgamento de mérito O princípio da primazia do julgamento de mérito vem disposto no artigo 4ª do CPC: Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução inte- gral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Tal princípio pode ser resumido na ideia de que, sempre que possível, o juiz deve em- preender esforços para dar uma decisão de mérito, ao invés de extinguir o processo sem resolução de mérito por questões meramente processuais. Assim, por exemplo, ao invés de inadmitir um recurso por algum vício formal, o magis- trado deve dar a parte a oportunidade de corrigir tal vício, visando possibilitar o julgamento do mérito (parágrafo único do art. 932). Art. 932. Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível. O julgamento do mérito procura garantir a tutela do direito material, ou seja, o foco está no conflito que envolve as partes. Dessa forma, o juiz deverá deixar de lado possíveis conflitos que surjam ao redor do foco principal do processo e priorizar o mérito da questão, a tutela do direito material. Para isso, o juiz deverá sanar todos os vícios que atrapalhem o andamento do processo e que dificultem o julgamento do mérito. ATENÇÃO. Segundo decidiu o STF no ARE 953221 AgR/SP, tal previsão do artigo 932, parágrafo único, não se aplica para o caso em que o recorrente não ataca todos os fundamentos da decisão recorri- da, pois, nesta hipótese, seria necessária a complementação das razões do recurso, o que não é permitido. Assim, o parágrafo único do artigo 932 só tem aplicação nos casos em que seja necessá- rio sanar vícios formais. Outro exemplo desse princípio é o artigo 1.032 do CPC: Art. 1.032. Se o relator, no Superior Tribunal de Justiça, entender que o recurso especial versa sobre questão constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral e se manifeste sobre a questão constitucional. 21 Parágrafo único. Cumprida a diligência de que trata o caput, o relator remeterá o recurso ao Supremo Tribunal Federal, que, em juízo de ad- missibilidade, poderá devolvê-lo ao Superior Tribunal de Justiça. 3. Quadros exemplificativos dos princípios elencados pela doutrina Seguem quadros elaborados pelo professor Marcus Vinícius: PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO PROCESSOCIVIL PRINCÍPIOS CF VALOR Devido Processo Legal Artigo 5º, LIV Assegura que ninguém perca os seus bens ou sua liberdade sem que sejam respeitadas a lei e as ga- rantias processuais. Acesso à Justiça Artigo 5º, XXXV A lei não pode excluir da apreciação do Judiciário nenhuma lesão a direito. Contraditório Artigo 5º, LV Deve-se dar ciência as partes sobre tudo do proces- so. Duração Razoável do processo Artigo 5º, LXXVIII Princípio relacionado ao legislador e ao Juiz, com o fito do processo chegar ao fim no menor tempo possível. Isonomia Artigo 5º, caput e I Deve-se tratar igualmente os iguais e desigualmen- te os desiguais na medida da sua desigualdade. Imparcialidade do Juiz Artigo 5º, LIII E XXX- VII Toda causa deverá ter o juiz natural, apurado de acordo com as regras prévias. Duplo Grau de Juris- dição - Decorre implicitamente da CF, no caso de julga- mento de recursos contra decisões inferiores. Publicidade Artigo 5º, LX Os atos processuais são públicos, assegurando a transparência da atividade jurisdicional. Motivação das Deci- sões Artigo 93, IX A atividade jurisdicional deve ser motivada, para que os litigantes entendam a justificação do Judi- ciário. 22 PRINCÍPIOS INFRACONSTITUCIONAIS DO PROCESSO CIVIL PRINCÍPIOS PREVISÃO VALOR DISPOSITIVO Não há dispositivo específico Nos processos que versam sobre interesses disponíveis, as partes podem transigir, o au- tor pode renunciar ao direito e o réu pode reconhecer o pedido. Cumpre ao interessado ajuizar a demanda e definir os limites objetivos e subjetivos da lide. Mas, no que concerne à condução do processo e à produção de provas, vigora o princípio inquisitivo, por força do art. 370 do CPC, sendo supletivas as regras do ônus da prova. IMEDIAÇÃO Art. 456 do CPC Derivado da oralidade, determina que o juiz colha diretamente a prova, sem intermediá- rios. CONCENTRAÇÃO Art. 365 do CPC A audiência de instrução e julgamento é una e contínua. Caso não seja possível concluí-la no mesmo dia, o juiz designará outra data em continuação. IRRECORRIBILIDADE, EM SEPARADO, DAS IN- TERLOCUTÓRIAS Art. 1.009, § 1º do CPC Em regra, contra as decisões interlocutórias, o recurso cabível — o agravo — não suspenderá o processo. PERSUASÃO RACIONAL Art. 371 do CPC Cabe ao juiz apreciar livremente as provas, devendo indicar, na sentença, os motivos de sua decisão, que devem estar amparados nos elementos constantes dos autos. 23 BOA-FÉ Art. 5º do CPC Todos aqueles que participam do processo de- vem comportar-se de acordo com a boa-fé. COOPERAÇÃO Art. 6º do CPC Exige que as partes cooperem para que o pro- cesso alcance bom resultado, em tempo razoá- vel. 4. Jurisprudência correlata Aplicação imediata de um novo entendimento jurisprudencial não viola a segurança jurídi- ca Não fere o princípio da segurança jurídica a aplicação imediata de novo entendimento jurispru- dencial. Isso porque não se trata de alteração normativa, mas apenas mudança de interpretação. Diante disso, a modificação de entendimento jurisprudencial deve ser aplicada aos recursos pendentes de análise, ainda que interpostos antes do julgamento que modificou a jurisprudên- cia. STJ. 3ª Turma. AgInt no REsp 1595438/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 13/12/2016. STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1205143/MT, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 17/11/2016. (Dizer o Direito). 5. Leitura da lei Novo Código de Processo Civil, arts. 1 a 15 e 1.045 a 1.072. 6. Fontes Serviram de base para a produção deste resumo: CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Súmulas do STF e do STJ: Anotadas e organizadas por assunto. 3. ed. Salvador: Juspodivm, 2018. CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Vade mecum de jurisprudência: Dizer o Direito. 4. ed. Salvador: Juspodivm, 2018. DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil – V.1: Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento. 20. ed. Salvador: Juspodivm, 2018. GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Direito processual civil esquematizado. 8. ed. São Paulo: Sarai- va, 2017. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil: Volume único. 10. ed. Sal- vador: Juspodivm, 2018.
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