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OAB EXAME DE ORDEM DIREITO AMBIENTAL Capítulo 08 1 CAPÍTULOS Capítulo 1– Princípios do Direito ambiental Capítulo 2 – Tutela Constitucional do Meio Ambiente e Responsabilidade Ambiental Civil e Administrativa. Capítulo 3 – Política Nacional do Meio Ambiente. Capítulo 4 – Licença Ambiental. Capítulo 5 – Código Florestal. Capítulo 6 – Unidades de Conservação da Natureza. Capítulo 7 – Política Nacional de Recursos Hídricos e Os Recursos Minerais. Capítulo 8 (você está aqui) – Tutela Processual Coletiva do Meio Ambiente e Tutela Penal e Processual Penal do Meio Ambiente. 2 SOBRE ESTE CAPÍTULO A apostila de número 08 do nosso curso de Direito Ambiental tratou sobre a Tutela Processual Coletiva do Meio Ambiente. Agora, vamos as nossas considerações: Este assunto apareceu apenas 1 VEZ nos últimos 3 anos, sendo considerado um assunto de baixa recorrência no Exame de Ordem. Mas isso não significa que devemos achar que esse assunto é irrelevante, muito pelo contrário! Por já ter sido objeto de questão, o seu aprendizado se torna essencial. Adicionamos questões de outros concursos que versam sobre esse tema para que você assimile ainda mais o conteúdo, tá? Vamos juntos! 3 SUMÁRIO DIREITO AMBIENTAL .............................................................................................................................. 5 Capítulo 8 .................................................................................................................................................. 5 10. Tutela Processual Coletiva do Meio Ambiente .......................................................................... 5 10.1 Introdução ................................................................................................................................................................ 5 10.2 Ação Civil Pública .................................................................................................................................................. 8 10.2.1 Inquérito Civil ....................................................................................................................................................... 14 10.2.2 Compromisso De Ajustamento de Conduta .......................................................................................... 15 10.3 Ação Popular ........................................................................................................................................................ 17 11. Tutela Penal e Processual Penal do Meio Ambiente .............................................................. 25 11.1 Lei de Crimes Ambientais ............................................................................................................................... 25 11.2 Responsabilidade penal................................................................................................................................... 27 11.2.1 Responsabilidade penal das pessoas jurídicas ...................................................................................... 28 11.2.2 Responsabilidade penal das pessoas jurídicas de direito público ............................................... 31 11.3 Aplicação da Pena ............................................................................................................................................. 32 11.3.1 Penas restritivas de direitos ........................................................................................................................... 35 11.3.2 Suspensão condicional da pena .................................................................................................................. 37 11.4 Princípio da insignificância nos crimes ambientais ............................................................................. 38 11.5 Processo penal de crimes ambientais ....................................................................................................... 38 11.5.1 Ação penal ............................................................................................................................................................ 38 11.5.2 Transação penal .................................................................................................................................................. 39 11.5.3 Suspensão condicional do processo ......................................................................................................... 40 11.5.4 Competência ........................................................................................................................................................ 41 QUADRO SINÓTICO .............................................................................................................................. 43 4 QUESTÕES COMENTADAS ................................................................................................................... 45 GABARITO ............................................................................................................................................... 55 QUESTÃO DESAFIO ................................................................................................................................ 56 GABARITO QUESTÃO DESAFIO ........................................................................................................... 57 LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................... 59 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................................... 60 MAPA MENTAL ...................................................................................................................................... 68 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................... 69 5 DIREITO AMBIENTAL Capítulo 8 10. Tutela Processual Coletiva do Meio Ambiente 10.1 Introdução O meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental transindividual, ou seja, todas as pessoas, independentemente de serem ou não residentes no País, brasileiros natos ou naturalizados, inclusive as futuras gerações, são interessadas na garantia da sua integralidade. Portanto, o meio ambiente ecologicamente equilibrado tem titularidade coletiva. Os direitos fundamentais não estão previstos exaustivamente no rol do art. 5º da CF/88, existem direitos fundamentais espalhados pelo texto constitucional. Por exemplo, são direitos fundamentais a anterioridade eleitoral (art. 16 da CF), a irretroatividade tributária (art. 150, III, a, da CF) e o meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225 da CF). É o que chamamos de direito fundamental material. Não custa nada recordar que o caput do art. 225 da CF/88 dispõe que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia 6 qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. De acordo com o dispositivo constitucional, podemos classificar o direito fundamental ao maio ambiente ecologicamente equilibrado como um interesse difuso e um direito de terceira geração. Interesse difuso: os direitos coletivos podem ser divididos em direitos difusos, coletivos propriamente ditos e individuais homogêneos. Todos eles tutelam interesses que extrapolam a esfera do indivíduo, mas cada um guarda as suas peculiaridades, que os diferenciam. Os interesses e direitos difusos, especificamente, são aqueles indivisíveis, que possui como titulares pessoas indeterminadas ligadas por uma circunstância de fato. O direito ao meio ambiente ecologicamenteequilibrado é classificado como um direito difuso porque é um bem indivisível e envolve a sociedade como um todo, já que não é possível determinar com precisão quem é ou não atingido por um dano ambiental. Direito de terceira geração: diante das classificações do constitucionalismo moderno, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um dos direitos de terceira geração, também chamados de direitos de fraternidade ou de solidariedade. A principal característica diferenciadora dos direitos de terceira geração é não se destinarem à proteção de interesses individuais de pessoas ou Estados, eles se destacam pela universalidade. Na tutela do meio ambiente o grande destinatário é a humanidade, o que consagra o princípio da solidariedade. Em sede de julgamento de um recurso em Ação Civil Pública que pleiteava a reparação de danos ambientais causados à uma comunidade indígena, decorrentes da extração ilegal de madeira, devido ao caráter transindividual e difuso do direito ao meio ambiente ecologicamente 7 equilibrado, o STJ entendeu que o direito à reparação por dano ambiental é imprescritível, nos seguintes termos: “a prescrição tutela interesse privado, podendo ser compreendida como mecanismo de segurança jurídica e estabilidade. O dano ambiental refere-se àquele que oferece grande risco a toda humanidade e à coletividade, que é a titular do bem ambiental que constitui direito difuso” (REsp. 1.120.117-AC). Independentemente de ser ou não expresso em texto legal, a hermenêutica exercida pelo Tribunal Superior entende que o direito ao pedido de reparação civil por dano ambiental é imprescritível porque se trata de direito inerente à vida, fundamental e essencial à firmação dos povos. Diante do conflito entre a segurança jurídica em favor do causador do dano ambiental, materializada pela prescrição, e a forma mais benéfica de tutelar do bem jurídico coletivo, indisponível, fundamental e que antecede todos os demais direitos (pois sem o meio ambiente ecologicamente equilibrado não há vida, saúde, trabalho ou lazer), obviamente o este último prevalece1. A reparação civil do dano ambiental vem ganhando destaque na jurisprudência brasileira, que encara a responsabilidade do degradador com firmeza e com maiores implicações, como por exemplo, imputando-lhe a responsabilidade objetiva fundamentada no simples risco de dano ambiental ou no simples fato de sua atividade ser danosa ao meio ambiente, independentemente da caracterização de culpa. Ademais, visando a reparação integral do dano ambiental, a responsabilidade civil é solidária entre os poluidores diretos e indiretos. No presente capítulo, passaremos a estudar os instrumentos processuais para a proteção do direito fundamental difuso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O sistema do Código de Processo Civil de 1973, nitidamente individualista, era insuficiente para tutelar interesses transindividuais que surgiam com a massificação social. Não adiantava a Constituição prever o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e garantir acesso à justiça, sem viabilizar técnicas processuais que viabilizassem a pretensão. Nesse contexto, foi criado o que chamamos de microssistema processual da tutela coletiva, composto pela Lei 1 Vide questão 7 e 10 desse material. 8 4.717/65 (Lei de Ação Popular), Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública) e Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). Especificamente quanto ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a CF/88 elenca a Ação Civil Pública e a Ação Popular como os instrumentos para garantir a sua proteção: Art. 129, CF/88 – São funções institucionais do Ministério Público: (...) III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; Art. 5º, LXXIII, CF/88 – qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; Lembre-se: a proteção do meio ambiente abrange o meio ambiente natural, como a fauna e a flora; o meio ambiente artificial, como o espaço urbano; o meio ambiente cultural, como o patrimônio histórico; e o meio ambiente do trabalho. 10.2 Ação Civil Pública A Ação Civil Pública está disciplinada na Lei 7.347/85. Trata-se de um instrumento processual de extrema importância para a proteção do meio ambiente. Através dessa ação, os seus legitimados podem pleitear perante o judiciário a cessação de ato lesivo ao meio ambiente, 9 assim como a recuperação de áreas degradadas e eventual pagamento de reparação por dano ambiental2. As disposições da Lei de Ação Civil Pública aplicam-se à tutela preventiva ou reparatória, fundamentada em danos morais ou patrimoniais causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor histórico, turístico e paisagístico, à qualquer outro interesse difuso ou coletivo, à ordem econômica, à ordem urbana, à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos, e ao patrimônio público e social. Por outro lado, não será cabível Ação Civil Pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados. Através da Ação Civil Pública, o autor poderá pleitear, isolada ou cumulativamente, a cessação do ato lesivo ao meio ambiente, a recuperação de áreas degradadas e o pagamento de indenização pelo dano causado. É o entendimento do STJ na Súmula 629: “quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar”3. Entretanto, sendo possível a reparação do dano in natura, deve-se privilegiar a tutela específica. Portanto, apenas se não for possível a sua reparação integral é que caberá também a indenização. Apesar de ser possível a cumulação de pedidos na tutela do meio ambiente em respeito ao princípio da reparação integral do dano ambiental, a restauração completa e imediata do meio ambiente, que reestabeleça o seu estado anterior ao dano, dispensa a indenização. Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação 2 Vide questão 5 desse material. 3 Vide questões 1 e 2 desse material. 10 da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor. A legitimidade para propor a Ação Civil Pública é concorrente e disjuntiva, ou seja, um legitimado não precisa da autorização dos demais para atuar. Apesar de a Constituição Federal legitimar apenas o Ministério Público para propor a ação civil pública, o art. 5º da Lei 7.347/85 estabelece um rol taxativo de outros legitimados. Art. 5º da Lei 7.347/85 – Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente4: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimôniopúblico e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. A despeito de o cidadão não ser legitimado para propor ação civil pública, qualquer pessoa pode provocar a iniciativa do Ministério Público, e o servidor público tem o dever, informando sobre lesão ou ameaça de lesão ao meio ambiente (art. 6º da lei de ACP). Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis (art. 7º da lei de ACP). Perceba que não é qualquer associação que está legitimada a propor ação civil pública ambiental. De acordo com a lei, a associação deve cumprir, cumulativamente, os seguintes 4 Vide questão 1 desse material. 11 requisitos: existir a mais de um ano e que em seu estatuto social esteja previsto como sua finalidade a proteção do meio ambiente. Quanto ao primeiro requisito, o juiz pode dispensar que a associação esteja constituída a mais de um ano quando existir manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou características do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido5. Quanto ao segundo requisito, chamado de pertinência temática, a associação deve demonstrar no processo que representa legitimamente os interessados no direito objeto da ação. Ademais, quando uma associação cumpre os dois requisitos legais, o STF entende que ela não precisa de uma autorização especial de seus membros, nem mesmo em assembleia geral, para que possa atuar em ação civil pública. Nesse contexto, o Tribunal ainda destaca a necessidade de a matéria constar do estatuto, pois trata-se de substituição processual, instituto que condiciona a legitimação à defesa dos direitos ou interesses jurídicos da categoria que representa. Em caso de litigância de má-fé da associação, ela e os diretores responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos. Quanto ao Ministério Público, quando outro legitimado for o autor da ação civil pública, o Parquet deve atuar como fiscal da lei. E, em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa. Em sede de Ação Civil Pública, o litisconsórcio entre os legitimados ativos é facultativo. O Poder Público e outras associações colegitimadas podem se habilitar como litisconsortes de qualquer das partes. Ademais, admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados. 5 Vide questão 4 desse material. 12 Em relação à legitimidade passiva, qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, direta ou indiretamente responsável pela lesão ambiental, pode ser réu em ação civil pública ambiental. Como a responsabilidade civil ambiental é solidária, o autor pode escolher formar o litisconsórcio passivo necessário entre os poluidores, ou intentar a ACP contra apenas um ou alguns deles6. A ação civil pública discute apenas a proteção do meio ambiente e as consequências de sua violação. Não é cabível discutir o direito de regresso entre os sujeitos passivos da ação, que devem ser discutidos em ação própria. Para instruir a inicial de uma Ação Civil Pública, o interessado poderá requerer às autoridades competentes as certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias. Especificamente quanto ao Ministério Público, trata-se do único legitimado ativo da Ação Civil Pública que poderá instaurar e presidir inquérito civil e, ao requisitar certidões, informações ou perícias de qualquer organismo público ou particular, deve ser respondido no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis. Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao juiz requisitá-los. Ademais, o art. 10 da Lei de Ação Civil Pública tipifica como crime a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura a Ação Civil Pública quando forem 6 Vide questão 9 e 10 desse material. 13 requisitados pelo Ministério Público, punido com pena de reclusão, de 1 a 3 anos, e multa de 10 a 1.000 Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional. As Ações Civis Públicas devem ser propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa7. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto (art. 2º da lei de ACP). Nas Ações Civis Públicas, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora em honorários advocatícios, custas e despesas processuais, salvo comprovada má-fé. O juiz poderá conceder liminar em sede de Ação Civil Pública, sujeita a agravo, com ou sem justificação prévia. A multa cominada liminarmente só é exigível após o eventual trânsito em julgado a favor do autor, entretanto, será devida desde o dia em que houver configurado o descumprimento8. Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. § 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato. § 2º A multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em julgado da decisão favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se houver configurado o descumprimento. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes nos limites da competência territorial do órgão judicial que a prolatou, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova. 7 Vide questão 3 desse material. 8 Vide questão 8 desse material. 14 Na fase recursal em sede de Ação Civil Pública, o juízo poderá conferir efeito suspensivo ao recurso para evitar dano irreparável à parte. Já na fase executória da sentença, o art. 15 da lei de ACP dispõe que, decorridos 60 dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, se a associação autora não promover a execução, o Ministério Público fica obrigado a promovê-la, sendo facultada a mesma iniciativa aos demais legitimados. 10.2.1 Inquérito Civil O inquérito Civil é um instrumento inquisitorial (não há contraditório nem ampla defesa) que serve para a apuração de fatos para a formação da convicção do membro do Ministério Público quanto ao dano ambiental e instruir futura ação civil pública. Art. 8º da Lei 7.347/85 – Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às autoridades competentes as certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias. § 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquerorganismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis. § 2º Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao juiz requisitá-los. Assim como no processo penal, a realização de um inquérito civil não é necessária para a propositura da demanda judicial que, existindo elementos de convicção suficientes, pode ser proposta de imediato. Se esgotadas as possibilidades de diligências e o Ministério Público não se convencer da existência de fundamento para propor a Ação Civil Pública, deve promover o arquivamento do Inquérito Civil de forma fundamentada. Art. 9º da Lei 7.347/85 – Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a propositura da ação civil, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente. 15 § 1º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação arquivadas serão remetidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público. § 2º Até que, em sessão do Conselho Superior do Ministério Público, seja homologada ou rejeitada a promoção de arquivamento, poderão as associações legitimadas apresentar razões escritas ou documentos, que serão juntados aos autos do inquérito ou anexados às peças de informação. § 3º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, conforme dispuser o seu Regimento. § 4º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de arquivamento, designará, desde logo, outro órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação. Apesar de a legitimidade para instaurar inquérito civil ser do Ministério Público, a legitimidade para propor ação civil pública é disjuntiva e concorrente! Portanto, a instauração do inquérito civil e até mesmo o seu arquivamento não são causas impeditivas para a propositura de ação civil pública sobre a mesma matéria pelos demais legitimados. 10.2.2 Compromisso De Ajustamento de Conduta O Compromisso de Ajustamento de Conduta é um acordo (convergência de vontades) feito entre os órgãos públicos legitimados para propor a Ação Civil Pública (e não associações) e pessoa física ou jurídica, com eficácia de título executivo extrajudicial9. O intuito da celebração desse compromisso é reparar o dano ambiental, adequar a conduta lesiva à lei e compensar os danos que não possam ser recuperados. 9 Vide questão 6 desse material. 16 Art. 5º, § 6°, da lei 7.347/85 – Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. Vale salientar que não podemos falar em direito subjetivo de firmar um compromisso de ajustamento de conduta. Esse instrumento corresponde a uma solução extrajudicial de conflito, que precisa contar com o interesse de todos os envolvidos. A fiscalização do cumprimento do ajuste firmado como compromisso de ajustamento de conduta cabe ao órgão que o celebrou. Nem todos os legitimados para propor Ação Civil Pública também são legitimados para celebrar o compromisso de ajustamento de conduta. Como você já pode ter percebido, dentre eles, apenas os órgãos públicos possuem essa capacidade – ou seja, apenas o Ministério Público, a Administração Pública Direta e Indireta e a Defensoria Pública. Portanto, as associações privadas não podem firmar o referido compromisso. Caso seja celebrado um compromisso de ajustamento de conduta preliminar e o acordo firmado não abranja todos os elementos que devem ser protegidos, caberá Ação Civil Pública em relação aos fatos ou pessoas remanescentes. O compromisso de ajustamento de conduta é o conteúdo, formalizado por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta – TAC. O TAC não pode ser caracterizado como uma transação, que é um instrumento característico do direito civil individual, incompatível com a tutela dos direitos transindividuais, como a proteção do meio ambiente, que são direitos indisponíveis, de titularidade coletiva e de proteção obrigatória pelo Poder Público. 17 O compromisso previsto no TAC deve abranger a reparação de todo o dano ambiental causado, pois o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito indisponível, ou seja, o órgão público celebrante não pode renunciar a ele ou a parte dele. Visto isso, são requisitos para a celebração do TAC: Previsão da reparação integral do dano; Previsão das obrigações estipuladas; Anuência do Ministério Público, quando ele não for parte. Por se tratar de um título executivo extrajudicial, descumpridas as obrigações estipuladas, o TAC poderá ser executado por qualquer dos legitimados ativos da Ação Civil Pública, independentemente de qual deles o celebrou. 10.3 Ação Popular A Ação Popular – AP é um importante instrumento dentro da tutela processual do meio ambiente, pois permite que o cidadão utilize uma ação coletiva para proteger interesses transindividuais. Com isso, a Ação Popular é uma verdadeiro instrumento, com previsão constitucional (art. 5º, LXXIII), para o controle popular da legalidade e da lesividade de atos. A legitimidade ativa da Ação Popular é do cidadão. A qualidade de cidadão, comprovada por meio do título eleitoral ou documento correspondente, decorre do exercício e gozo dos direitos políticos pela pessoa física. A partir dessa afirmação, podemos extrair algumas conclusões importantes: O estrangeiro e o conscrito (inalistáveis) não têm legitimidade para propor Ação Popular; Se o analfabeto for alistado (pois o seu alistamento é facultativo), ele pode propor Ação Popular; Pessoa jurídica não pode propor Ação Popular (Súmula 365 do STF); O condenado criminalmente não pode propor Ação Popular em razão da suspensão dos seus direitos políticos; e O menor de 18 e maior de 16 anos que detenha capacidade eleitoral ativa pode propor Ação Popular independentemente de assistência. 18 Além do autor da Ação Popular, o seu polo ativo pode ser ocupado por qualquer outro cidadão que queira se habilitar no processo como litisconsorte ou assistente. A Lei 4.717/65 regulamenta a Ação Popular em nosso ordenamento jurídico. Segundo o seu art. 1º, a referida ação serve para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio: Dos entes políticos – União, Distrito Federal, Estados, Municípios; De entidades autárquicas; De sociedades de economia mista; De sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes; De empresas públicas; De serviços sociais autônomos; De instituições ou fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita ânua; De empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios; e De quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos. Como você pode notar, a Ação Popular serve para proteger o patrimônio público. Para tanto, consideram-se patrimônio público os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Em se tratando de instituições ou fundações, para cuja criação ou custeio o tesouro público concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, bem como de pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas, as consequências patrimoniais da invalidez dos 19 atos lesivos por meio deAção Popular terão por limite a repercussão deles sobre a contribuição dos cofres públicos. Segundo o art. 2º da lei de AP, são nulos os atos lesivos ao patrimônio público que violarem um ou mais dos seguintes elementos do ato administrativo: Competência; Forma; Objeto; Motivo; Finalidade. Portanto, o ato que for praticado por sujeito incompetente, com vício de forma, com ilegalidade do objeto, com inexistência de motivos ou desvio de finalidade e atingir o patrimônio público, pode ser objeto de Ação Popular para que seja declarado nulo. Para a conceituação dos casos de nulidade, devemos observar as seguintes normas previstas no parágrafo único do art. 2º da Lei de AP: a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência. 20 Segundo o art. 3º da Lei de AP, além dessas ilegalidades acima citadas, referentes aos elementos do ato administrativo, outros vícios podem ser constatados e serão anuláveis por meio de Ação Popular. Também são nulos os seguintes atos ou contratos, praticados ou celebrados por quaisquer das pessoas ou entidades supra referidas: Art. 4º São também nulos os seguintes atos ou contratos, praticados ou celebrados por quaisquer das pessoas ou entidades referidas no art. 1º. I - A admissão ao serviço público remunerado, com desobediência, quanto às condições de habilitação, das normas legais, regulamentares ou constantes de instruções gerais; II - A operação bancária ou de crédito real, quando: a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares, estatutárias, regimentais ou internas; b) o valor real do bem dado em hipoteca ou penhor for inferior ao constante de escritura, contrato ou avaliação; III - A empreitada, a tarefa e a concessão do serviço público, quando: a) o respectivo contrato houver sido celebrado sem prévia concorrência pública ou administrativa, sem que essa condição seja estabelecida em lei, regulamento ou norma geral; b) no edital de concorrência forem incluídas cláusulas ou condições, que comprometam o seu caráter competitivo; c) a concorrência administrativa for processada em condições que impliquem na limitação das possibilidades normais de competição; IV - As modificações ou vantagens, inclusive prorrogações que forem admitidas, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos de empreitada, tarefa e concessão de serviço público, sem que estejam previstas em lei ou nos respectivos instrumentos; V - A compra e venda de bens móveis ou imóveis, nos casos em que não cabível concorrência pública ou administrativa, quando: a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares, ou constantes de instruções gerais; 21 b) o preço de compra dos bens for superior ao corrente no mercado, na época da operação; c) o preço de venda dos bens for inferior ao corrente no mercado, na época da operação; VI - A concessão de licença de exportação ou importação, qualquer que seja a sua modalidade, quando: a) houver sido praticada com violação das normas legais e regulamentares ou de instruções e ordens de serviço; b) resultar em exceção ou privilégio, em favor de exportador ou importador; VII - A operação de redesconto quando sob qualquer aspecto, inclusive o limite de valor, desobedecer a normas legais, regulamentares ou constantes de instruções gerais; VIII - O empréstimo concedido pelo Banco Central da República, quando: a) concedido com desobediência de quaisquer normas legais, regulamentares, regimentais ou constantes de instruções gerias; b) o valor dos bens dados em garantia, na época da operação, for inferior ao da avaliação; IX - A emissão, quando efetuada sem observância das normas constitucionais, legais e regulamentadoras que regem a espécie. Por oportuno, vale destacar que não é apenas o ato comissivo da Administração Pública que está sujeito à impugnação por meio de Ação Popular. A omissão do Poder Público que possa acarretar dano ambiental também pode ser objeto de uma Ação Popular. Além da comprovação da cidadania do autor, é preciso comprovar a lesividade do ato impugnado ao patrimônio público. Essa lesão poderá ser efetiva ou legalmente presumida, caso em que basta a demonstração da prática do ato para que ele seja considerado nulo de pleno direito. Na Ação Popular que visa defender o meio ambiente, a lesividade é presumida, dispensando-se a sua comprovação. No polo passivo de uma Ação Popular, assim como na Ação Civil Pública, pode figurar qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, que seja direta ou indiretamente responsável pelo ato danoso ao meio ambiente. 22 Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo. § 1º Se não houver benefício direto do ato lesivo, ou se for ele indeterminado ou desconhecido, a ação será proposta somente contra as outras pessoas indicadas neste artigo. Para instruir a inicial da Ação Popular, o cidadão poderá requerer às entidades acima mencionadas certidões e informações que julgar necessárias, bastando para isso indicar a finalidade delas. Essas certidões e informações devem ser fornecidas dentro de 15 dias da entrega, sob recibo, do respectivo requerimento. Ademais, a lei exige que tais certidões e informações sejam utilizadas apenas para instruir a Ação Popular. Somente nos casos em que o interesse público, devidamente justificado, impuser sigilo, poderá ser negada ao cidadão requerente a certidão ou informação. Nesse caso, assim como na ACP, a Ação Popular poderá ser proposta desacompanhada dos documentos negados, cabendo ao juiz, após apreciar os motivos do indeferimento, e salvo em casos de segurança nacional, requisitá-las. Feita a requisição, o processo correrá em segredo de justiça, que cessará com o trânsito em julgado de sentença condenatória. A competência para conhecer, processar e julgar a Ação Popular é definida de acordo com a origem do ato impugnado. É competente o juiz que, de acordo com a organização judiciária de cada estado, o for para as causas que interessem à União, ao Distrito Federal, ao Estado, ao Município, as pessoas jurídicas criadas ou mantidas por eles, bem como os atos das sociedades de que eles sejam acionistas e os das pessoas ou entidades por eles subvencionadas ou em relação às quais tenham interesse patrimonial. Quando o pleito interessar simultaneamente à União e a qualquer outra pessoa ou entidade, será competente o juiz das causas da União, se houver; mas, quando interessar simultaneamente ao estado e ao município, será competente o juiz das causas do estado, se houver. 23 A propositura da AP prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações que forem posteriormente intentadas contra as mesmas partes e sob os mesmos fundamentos. Ao contrário da Ação Civil Pública que é completamente gratuita, na Ação Popular são devidas as custas processuais e o preparo, que deverão ser pagos pela parte vencida ao final do processo.Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado. A pessoas jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente. O Ministério Público acompanhará todos os atos da Ação Popular, cabendo-lhe apressar a produção da prova e promover a responsabilidade, civil ou criminal, dos que nela incidirem, sendo-lhe vedado, em qualquer hipótese, assumir a defesa do ato impugnado ou dos seus autores. Para tanto, ao despachar a inicial, o juiz ordenará, além da citação dos réus, a intimação do representante do Ministério Público. A desistência da Ação Popular acarretará a publicação de editais para que qualquer cidadão ou o Ministério Público, dentro do prazo de 90 dias da última publicação feita, promova o prosseguimento da ação, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito. A sentença incluirá sempre, na condenação dos réus, o pagamento, ao autor, das custas e demais despesas, judiciais e extrajudiciais, diretamente relacionadas com a ação e comprovadas, bem como o dos honorários de advogado. Ademais, a sentença de uma Ação Popular que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores de dano, quando incorrerem em culpa. 24 Se, ao apreciar o fundamento de direito do pedido, o magistrado julgar a lide manifestamente temerária, condenará o autor ao pagamento do décuplo das custas. É sempre permitida às pessoas ou entidades referidas no art. 1º da lei de AP, ainda que hajam contestado a ação, promover, em qualquer tempo, e no que as beneficiar a execução da sentença contra os demais réus. Caso decorridos 60 (sessenta) dias da publicação da sentença condenatória de segunda instância, sem que o autor ou terceiro promova a respectiva execução, o representante do Ministério Público a promoverá nos 30 (trinta) dias seguintes, sob pena de falta grave. A sentença em sede de Ação Popular terá eficácia erga omnes, exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova. Neste caso, qualquer cidadão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova. 25 11. Tutela Penal e Processual Penal do Meio Ambiente 11.1 Lei de Crimes Ambientais Como você já estudou, o legislador constituinte estabelece a tríplice responsabilização do poluidor ambiental. Isso quer dizer que um mesmo sujeito, pessoa física ou jurídica, pode responder civil, administrativa e penalmente pelo mesmo dano que causou ao meio ambiente. As responsabilidades civil e administrativa já foram abordadas em capítulo próprio, restando agora trabalhar a responsabilidade penal e a tutela processual penal do meio ambiente. A Lei 9.605/98, chamada de Lei de Crimes Ambientais, é a norma responsável por regulamentar a Constituição Federal no âmbito penal ambiental, tipificando a maior parte dos crimes contra o meio ambiente. Uma característica desse diploma é que, não raras vezes, o legislador da Lei de Crimes Ambientais se utiliza de normas penais em branco, que necessitam de complementação por outra norma jurídica para que possam ser aplicadas. As normas penais em branco podem ser complementadas por disposição prevista na mesma lei; disposição prevista em outra lei; ou disposição de um ato administrativo. 26 Exemplo: Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida: (...) § 4º A pena é aumentada de metade, se o crime é praticado: I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; (...). O dispositivo citado expressa que a pena do crime será aumentada de metade se ele for praticado contra espécie ameaçada de extinção. Mas a Lei de Crimes Ambientais não nos diz quais são as espécies ameaçadas de extinção! Nesse caso, o intérprete deve recorrer às listas oficiais do IBAMA para saber quais são essas espécies. Outra característica da Lei de Crimes Ambientais é que ela tipifica condutas de perigo abstrato, ou seja, que independem da produção de um dano efetivo ao meio ambiente para que sejam puníveis (por exemplo, art. 52). Essa técnica legislativa é muito importante para 27 materializar o princípio da prevenção, que direciona a norma ambiental como um todo, e não só a penal, para os riscos decorrentes de determinadas condutas e não apenas para os danos propriamente efetivados. Como última característica relevante da Lei de Crimes Ambientais, temos a sua especialidade. Isso implica na sua prevalência sobre as regras gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal – Princípio da Especialidade. Entretanto, você precisa ter em mente que, caso a lei penal ambiental seja omissa em algum ponto, nós devemos aplicar as normas gerais de direito e processo penal de forma subsidiária. 11.2 Responsabilidade penal A Constituição Federal de 1988 institui um mandado expresso de criminalização das condutas lesivas ao meio ambiente em seu art. 225, §3º quando afirma que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. No art. 2º da Lei 9.605/98, a Lei de Crimes Ambientais, temos a previsão de que “quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade” E o mesmo dispositivo completa que “o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la” também devem ser punidos pelos crimes ambientais, na medida da sua culpabilidade. Desse artigo, tiramos a seguinte conclusão: é possível o concurso de pessoas nos crimes ambientais com fundamento na teoria monista (ou unitária) – todos os agentes respondem pelo mesmo crime, na medida se sua culpabilidade. Assim, apesar de todos os agentes responderem pelo mesmo crime, não necessariamente terão a mesma pena. 28 Vimos anteriormente que a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva. Entretanto, tanto a responsabilidade administrativa como a responsabilidade penal ambiental são subjetivas, pois é imprescindível que o dolo ou a culpa (elemento subjetivo) do agente seja comprovado para aplicar a sanção. A responsabilidade penal ambiental é subjetiva. Para responsabilizar criminalmente um agente, é preciso comprovar a conduta, o dolo ou culpa do agente em cometê-la, e o nexo causal entre ela e o dano causado (ou risco de dano). 11.2.1 Responsabilidade penal das pessoas jurídicas Apesar de todos os debates sobre a possibilidade ou não de responsabilização da pessoa jurídica por crime ambiental, no Brasil prevalece o entendimento de que isso é possível. Fundamentada na teoria da realidade, da personalidade real ou orgânica, a teoria que defende a possibilidade de uma pessoa jurídica responder por crime ambiental afirma que ela é um ente real, com capacidade e vontade própria, distinta das pessoas físicas que a compõem. Para essa teoria, as pessoas jurídicas são seres coletivos, dotados de vontade, que podem ser exercidas de diversas formas, portanto, não há que se falar em responsabilidade penal objetiva ao puni-las. Ademais, as pessoasjurídicas têm capacidade de culpabilidade e de sanção penal, pois a culpabilidade no conceito mais moderno é a responsabilidade social. Nesse contexto, a culpabilidade da pessoa jurídica está intrínseca à vontade do seu administrador. A sanção da pessoa jurídica não fere os princípios da personalidade e da individualização da pena, pois a responsabilidade penal recai sobre o autor do crime – a própria pessoa jurídica. Além disso, o argumento de que a pessoa jurídica não poderia sofrer restrição ao seu direito 29 de liberdade de locomoção não deve prosperar, pois a pena privativa de liberdade não é a única sanção penal prevista em nosso ordenamento jurídico. Por fim, está clara a previsão constitucional da responsabilização de pessoa jurídica por crimes ambientais, na forma do art. 225, §3º, regulamentado infraconstitucionalmente por meio do art. 3º da Lei de Crimes Ambientais, com a seguinte redação: Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato. Visto isso, é importante ressaltar que, para haver responsabilidade penal da pessoa jurídica a infração deve ser cometida no interesse ou benefício da entidade e por decisão do seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA INFRAÇÃO COMETIDA EM SEU INTERESSE OU BENEFÍCIO POR DECISÃO DO SEU: - REPRESENTANTE LEGAL; - REPRESENTANTE CONTRATUAL; ou - ÓRGÃO COLEGIADO 30 Até algum tempo atrás, o STJ entendia que só seria possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes ambientais se, simultaneamente, houvesse a imputação da pessoa natural que atua em seu nome ou benefício. Esse entendimento consagrava a teoria da dupla imputação, pela qual o Ministério Público só poderia formular uma denúncia contra pessoa jurídica se identificasse a pessoa física que participou do delito (REsp. 610.114/RN). Posteriormente, na decisão do RE 548181, publicada em 2013, o STF se manifestou no sentido de ser admissível a condenação de uma pessoa jurídica pela prática de um crime ambiental, ainda que as pessoas físicas com ela relacionadas sejam absolvidas. Para o STF, a teoria da dupla imputação, até então adotada pelo STJ, afronta a CF/88 ao condicionar a imputabilidade da pessoa jurídica à da pessoa física, pois estaria subordinando a responsabilização jurídico-criminal do ente moral à efetiva condenação da pessoa física. Dessa forma, o STF passou a rechaçar a teoria da dupla imputação e admitir a denúncia do MP apenas contra a pessoa jurídica. Nesse contexto, vale ressaltar que a denúncia contra os dirigentes da pessoa jurídica deve contar com elementos hábeis a comprovar a relação entre o fato delituoso e as respectivas autorias, sob pena se ser considerada inepta. Portanto, deve ser comprovado o nexo causal entre as condutas dos dirigentes e as imputações a eles atribuídas. A condição de administrador da pessoa jurídica não é suficiente para autorizar a instauração de processo criminal por crimes praticados no âmbito da sociedade. 31 Por fim, destaca-se que é possível a desconsideração da personalidade jurídica sempre que ela for obstáculo para o ressarcimento de prejuízos causados à qualidade ambiental (art. 4º da Lei 9.605/98). 11.2.2 Responsabilidade penal das pessoas jurídicas de direito público A União, os estados, o Distrito Federal, os municípios, as autarquias e fundações públicas são consideradas pessoas jurídicas de direito público. Há doutrina que admite a responsabilidade penal por crimes ambientais desses entes, baseando-se no fato de não existir especificação de quais pessoas jurídicas (de direito público ou de direito privado) estão submetidas às regras do art. 225, §3º da CF/88 e 3º da Lei de Crimes Ambientais. Os que defendem essa teoria afirmam que, nesses casos, o magistrado deve escolher a pena cabível à pessoa jurídica de direito público dentre as possibilidades previstas no art. 21 da Lei de Crimes Ambientais. Ao contrário do que pode parecer, a condenação de um ente público não enfraqueceria a instituição, ao contrário, o apoiaria no cumprimento de suas finalidades, pois o seu erário teria uma destinação fixada pelo Poder Judiciário. Por outro lado, a doutrina que não admite a responsabilização criminal de pessoas jurídicas de direito público argumenta que é intrínseco a elas a perseguição da finalidade pública, sendo impossível que atuem em interesse ou benefício próprio (o que é necessário para que exista responsabilidade penal das pessoas jurídicas). Quando a pessoa jurídica de direito público não persegue a finalidade pública, há desvio de poder e, nessa situação, só a pessoa natural é responsabilizada penalmente. Além disso, para a doutrina contra a punição penal da pessoa jurídica de direito público, não teria sentido uma eventual sanção contra um ente público, seria redundante condenar, por exemplo, um município à pena de multa, pois ela acabaria transcendendo a pessoa jurídica condenada e quem arcaria com a condenação seriam os contribuintes. 32 11.3 Aplicação da Pena O art. 6º da Lei de Crimes Ambientais dispõe de critérios a serem observados pelo julgador na imposição e na gradação da pena base dos crimes nela previstos. São eles: A gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e para o meio ambiente; Os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; e A situação econômica do infrator, no caso de multa. Em primeiro lugar, ressaltamos que os antecedentes do infrator que devem ser analisados são aqueles pertinentes à toda legislação ambiental, não apenas à Lei de Crimes Ambientais. Portanto, é possível considerar uma infração administrativa ambiental como mau antecedente. Depois, é preciso esclarecer que esses critérios devem ser analisados pelo magistrado no momento de definir a pena base do condenado em conjunto com os critérios do art. 59 e 60 do CP. Definida a pena base, o juiz passa a analisar as circunstâncias atenuantes e agravantes da pena, previstas nos arts. 14 e 15 da Lei de Crimes Ambientais, respectivamente. 33 Em relação às agravantes, entende-se que o baixo grau de instrução do agente retira a sua potencial consciência de ilicitude, configurando erro de proibição. Quanto ao arrependimento do infrator, como não há disposição legal expressa em relação ao momento em que ele deve ser manifestado, entende-se possível a sua ocorrência antes ou depois da denúncia. 34 Em relação às agravantes dos crimes ambientais, destacamos que a reincidência prevista no inciso I do art. 15 da Lei de Crimes Ambientais é uma reincidência específica, ou seja, se o agente cometeu crime de outra natureza (que não seja contra o meio ambiente), a agravante não irá incidir. Sobre o tema, destacamos: A reincidência não precisa ser em crime tipificado na Lei de Crimes Ambientais, basta que seja da mesma natureza, independentemente da norma que o prevê; e Condenação prévia por contravenção penal ambiental não gera reincidência. Apesar que crime comum prévio não implicar na agravante de reincidência em crime ambiental, o crime ambiental prévio implicará na agravante da reincidência em condenação por crime comum posterior, conforme o art. 63 do CP. 35 Com o fim da segunda etapa da aplicação da pena, deve ser estabelecido o regime inicial de cumprimento de pena para a pessoa física. Como a Lei de Crimes Ambientais não dispõe deregra específica sobre o tema, nesse ponto aplicamos as disposições do CP: Na terceira etapa da aplicação da pena, verifica-se a possibilidade substituição da pena privativa de liberdade intermediária aplicada por penas restritivas de direitos ou sursis. 11.3.1 Penas restritivas de direitos De acordo com o art. 7º da Lei de Crimes Ambientais, as penas restritivas de direitos, autônomas, substituem as penas privativas de liberdade: Quando tratar-se de crime culposo; Quando, mesmo que em crime doloso, for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; e Quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime. A regra de substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos na Lei de Crimes Ambientais tem uma pequena diferença em relação à regra do Código Penal: na Lei 36 9.605/98, essa substituição ocorre nos crimes com penas aplicadas inferiores a 4 anos, ou seja, quando o condenado tiver a pena por crime ambiental instituída em 4 anos exatos, não terá direito à sua substituição por restritiva de direitos. Por outro lado, o CP, em seu art. 44, I, prevê que a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ocorre quando a condenação é igual ou inferior a 4 anos. Isso quer dizer que, ao contrário dos crimes ambientais, quando o condenado por crime comum tem a sua pena estabelecida em exatos 4 anos, terá direito à respectiva substituição. As penas restritivas de direitos, em regra, terão o mesmo tempo de duração da pena privativa de liberdade que substituiu no caso concreto. A exceção encontra-se na pena de interdição temporária de direitos, que tem a sua duração predeterminada no art. 10 da Lei de Crimes Ambientais. Art. 10. As penas de interdição temporária de direito são a proibição de o condenado contratar com o Poder Público, de receber incentivos fiscais ou quaisquer outros PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS Prestação pecuniária Recolhimento domiciliar Prestação de serviços à comunidade Interdição temporária de direitos Suspensão parcial ou total de atividades 37 benefícios, bem como de participar de licitações, pelo prazo de cinco anos, no caso de crimes dolosos, e de três anos, no de crimes culposos. Segundo a Lei de Crimes Ambientais, a prestação de serviços à comunidade consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a parques e jardins públicos e unidades de conservação, e, no caso de dano da coisa particular, pública ou tombada, na restauração desta, se possível. Já a interdição temporária de direito, entende-se como a proibição de o condenado contratar com o Poder Público, receber incentivos fiscais ou qualquer outro benefício. A pena de suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às prescrições legais. Enquanto isso, a pena de prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima ou à entidade pública ou privada com fim social, de importância, fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. Segundo o art. 12 da Lei de Crimes Ambientais, o valor a título de prestação pecuniária será deduzido do montante de eventual reparação civil a que for condenado o infrator. Por fim, a pena restritiva de direito de recolhimento domiciliar baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado, que deverá, sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer atividade autorizada, permanecendo recolhido nos dias e horários de folga em residência ou em qualquer local destinado a sua moradia habitual, conforme estabelecido na sentença condenatória. 11.3.2 Suspensão condicional da pena Na última fase de aplicação da pena, se não for possível a substituição da pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, o magistrado deve observar a possibilidade de cabimento da suspensão condicional da pena. Se cabível, a respectiva pena não será executada, caso em que o condenado deverá se submeter a determinadas condições legais e impostas pelo juiz no caso concreto. Essas últimas, no caso dos crimes ambientais, devem ser relacionadas com a proteção do meio ambiente. De acordo com o art. 16 da Lei de Crimes Ambientais, a suspensão condicional da pena pode ser aplicada nos casos de condenação a pena privativa de liberdade não superior a três anos. 38 O requisito temporal para a suspensão condicional da pena de crimes ambientais é mais brando do que o requisito temporal para a suspensão condicional da pena de crimes comuns, previsto no art. 77 do CP – que determina como requisito do instituto a pena privativa de liberdade não superior a 2 anos. Fora essa observação, nos crimes ambientais devemos seguir os demais requisitos da suspensão condicional da pena previstos na lei penal comum: O condenado não pode ser reincidente em crime doloso; e A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e circunstâncias, autorizem a concessão do benefício. 11.4 Princípio da insignificância nos crimes ambientais Segundo o princípio da insignificância, a lei penal deve ser aplicada apenas para punir condutas que sejam efetivamente capazes de lesar um bem jurídico tutelado pelo direito penal. Trata-se de uma forma de materializar a fragmentariedade do direito penal e a teoria de intervenção mínima. Apesar da discussão doutrinária a respeito da aplicação do princípio da insignificância no âmbito dos crimes ambientais, os Tribunais Superiores entendem pela sua aplicabilidade. Prevalece em nosso ordenamento jurídico que a ultima ratio da tutela penal deve ser utilizada apenas quando a agressão ao meio ambiente ecologicamente equilibrado por intolerável e quando as demais instâncias (civil e administrativa) não forem suficientes para coibir a conduta infracional. Modernamente, o legislador visa privilegiar as soluções consensuais de conflitos, inclusive no âmbito criminal. Exemplo disso é a transação penal, prevista na Lei 9.099/95, e admitida em determinas circunstâncias pela Lei de Crimes Ambientais. 11.5 Processo penal de crimes ambientais 11.5.1 Ação penal As infrações penais previstas na Lei 9.605/98 são de ação penal pública incondicionada. Isso quer dizer que, em regra, será o Ministério Público o titular da ação penal referente a crimes 39 ambientais. A exceção se configura nos casos de ação penal privada subsidiária da pública, em que a titularidade da ação passa para o ofendido diante da inércia do MP. Nesse contexto, é importante ressaltar que o titular da ação penal privada subsidiária da pública é apenas o ofendido, pessoa física. Não há possibilidade de, por exemplo, associação civil de proteção ambiental ingressar com ação penal, mesmo que seja legitimada para propor ação civil pública. 11.5.2 Transação penal Modernamente, o legislador visa privilegiar as soluções consensuais de conflitos, inclusive no âmbito criminal. Exemplo disso é a transação penal, prevista na Lei 9.099/95, e admitida em determinas circunstâncias pela Lei de Crimes Ambientais. De acordo com o art. 27 da Lei 9.605/98, nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa pode ser formulada pelo representante do Ministério Público quando houver a prévia composição do dano ambiental e não estejam presentes as situações que impedem a celebração da transação penal. Art. 76 da Lei 9.099/95 – Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitosou multas, a ser especificada na proposta. § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. § 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado: I - ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; II - ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida. § 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz. 40 § 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. § 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei. § 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível. 11.5.3 Suspensão condicional do processo Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, também é possível aplicar a suspensão condicional do processo. De acordo com o art. 28 da Lei de Crimes Ambientais, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do respectivo processo: Por dois a quatro anos; Se o acusado não esteja sendo processado; Se o acusado não tenha sido condenado por outro crime; Quando presentes os demais requisitos que autorizem a suspensão condicional da pena (pena privativa de liberdade não superior a três anos, o condenado não pode ser reincidente em crime doloso; e a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e circunstâncias, autorizem a concessão do benefício). A extinção de punibilidade do agente decorrente da suspensão condicional do processo dependerá de um laudo que contate a reparação do ano ambiental causado pela conduta do infrator, ressalvados os casos de impossibilidade de reparação do dano. Se o laudo demonstrar que a respectiva reparação não foi completa durante a suspensão condicional do processo, o prazo de suspensão será prorrogado nos termos do art. 28, II da Lei de Crimes Ambientais, assim como ficará suspenso o prazo prescricional da infração. Com o fim do prazo máximo de prorrogação da suspensão condicional do processo, a declaração de extinção de punibilidade do agente dependerá de um novo laudo que constate o empenho do acusado em tomar todas as providências necessárias para a reparação integral do dano que a sua conduta causou ao meio ambiente. 41 Art. 28. As disposições do art. 89 da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, aplicam- se aos crimes de menor potencial ofensivo definidos nesta Lei, com as seguintes modificações: I - a declaração de extinção de punibilidade, de que trata o § 5° do artigo referido no caput, dependerá de laudo de constatação de reparação do dano ambiental, ressalvada a impossibilidade prevista no inciso I do § 1° do mesmo artigo; II - na hipótese de o laudo de constatação comprovar não ter sido completa a reparação, o prazo de suspensão do processo será prorrogado, até o período máximo previsto no artigo referido no caput, acrescido de mais um ano, com suspensão do prazo da prescrição; III - no período de prorrogação, não se aplicarão as condições dos incisos II, III e IV do § 1° do artigo mencionado no caput; IV - findo o prazo de prorrogação, proceder-se-á à lavratura de novo laudo de constatação de reparação do dano ambiental, podendo, conforme seu resultado, ser novamente prorrogado o período de suspensão, até o máximo previsto no inciso II deste artigo, observado o disposto no inciso III; V - esgotado o prazo máximo de prorrogação, a declaração de extinção de punibilidade dependerá de laudo de constatação que comprove ter o acusado tomado as providências necessárias à reparação integral do dano. 11.5.4 Competência A Lei de Crimes Ambientais nada dispõe sobre a competência para conhecer e julgar os crimes ambientais. Portanto, diante de uma interpretação sistemática da Constituição Federal, concluímos que, em regra, a competência para o julgamento dos crimes ambientais é da Justiça Comum Estadual. A Justiça Comum Federal será competente para o julgamento dos crimes ambientais apenas nas hipóteses em que eles tenham como objeto bens, serviços ou interesses da União ou de suas autarquias ou empresas públicas, de acordo com o art. 109 da CF/88. Ademais, segundo os Tribunais Superiores, ainda temos como hipóteses que justificam a competência da Justiça Federal: 42 Crime ambiental de caráter transnacional que envolva animais silvestres, ameaçados de extinção e espécimes exóticas ou protegidas por Tratados e Convenções internacionais (RE 835558/SP); Pesca predatória no mar territorial, no entorno de unidade de conservação da natureza, ou em águas territoriais divisórias de Estados-membros da Federação (STJ. CC 115.282-RS, STJ. CC 34.689-SP e STJ. CC 37.404-SP); Crimes contra a fauna em parques nacionais, reservas ecológicas ou áreas sujeitas ao domínio eminente da Nação; e Conduta que ultrapassa os limites de um único estado ou as fronteiras do país. Como o inciso IV do art. 109 da CF/88 exclui do âmbito da competência da Justiça Federal as contravenções penais, em regra, as contravenções ambientais serão julgadas perante a Justiça Comum Estadual, mesmo que atingidos bens, serviços ou interesses da União, suas autarquias ou empresas públicas. A exceção à essa regra encontra-se no caso de contravenção ambiental cometida por pessoa com foro por prerrogativa de função previsto constitucionalmente, como os juízes federais, que devem ser julgados perante a Justiça Federal. 43 QUADRO SINÓTICO TUTELA PROCESSUAL COLETIVA DO MEIO AMBIENTE AÇÃO CIVIL PÚBLICA Fundamento legal: art. 129, III da CF/88 e Lei 7.347/85. Legitimados: Ministério Público; Defensoria Pública; União, estados, Distrito Federal e municípios; Autarquia, empresa pública, fundação e sociedade de economia mista; e Associação civil constituída há pelo menos 1 ano e com pertinência temática. INQUÉRITO CIVIL Instrumento pertencente ao Ministério Público para apurar os fatos que servirão de fundamento para eventual Ação Civil Pública. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA Título executivo extrajudicial celebrado entre órgão público legitimado para propor Ação Civil Pública e a pessoa física ou jurídica interessada em reparar dano ambiental, adequar suas condutas às exigências legais ou compensar os danos ambientais que não possam ser reparados. AÇÃO POPULAR Fundamento legal: art. 5º, LXXIII da CF/88 e Lei 4.717/65. Qualquer cidadão possui legitimidade ativa para propor Ação Popular. TUTELA PENAL E PROCESSUAL PENAL DO MEIO AMBIENTE RESPONSABILIDADE PENAL A responsabilidade penal é subjetiva, devendo ser comprovado o elemento subjetivo da conduta do agente. Teoria da realidade: a pessoa jurídica pode cometer crimes (adotada pelos Tribunais Superiores). PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS As penas restritivas de direitos substituem as penas privativas de liberdade: Quando tratar-se de crime culposo; Quando, mesmo que em crime doloso, for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos; e Quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime indicarem 44 que a substituiçãoseja suficiente para efeitos de reprovação e prevenção do crime. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA Pena privativa de liberdade não superior a três anos; Não reincidência em crime doloso; e A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e circunstâncias, autorizem a concessão do benefício. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA STF e STJ: é possível a aplicação do princípio da insignificância nos crimes ambientais. AÇÃO PENAL DOS CRIMES AMBIENTAIS Ação penal pública incondicionada. TRANSAÇÃO PENAL Proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa formulada pelo representante do Ministério Público quando houver a prévia composição do dano ambiental e não estejam presentes as situações que impedem a celebração da transação penal. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO Proposta pelo MP, ao propor a denúncia, com duração de dois a quatro anos; só é possível se o agente não estiver sendo processado ou for condenado por outro crime; e quando presentes os demais requisitos que autorizem a suspensão condicional da pena. A extinção de punibilidade dependerá de um laudo que contate a reparação do ano ambiental causado pela conduta do infrator, ressalvados os casos de impossibilidade de reparação do dano. COMPETÊNCIA Em regra, da Justiça Comum Estadual. Justiça Comum Federal: quando o crime ambiental atingir bem, serviço ou interesse da União, das suas autarquias ou empresas públicas. 45 QUESTÕES COMENTADAS Questão 1 (XXIX EXAME DE ORDEM – FGV - 2019) Em decorrência de grave dano ambiental em uma Unidade de Conservação, devido ao rompimento de barragem de contenção de sedimentos minerais, a Defensoria Pública estadual ingressa com Ação Civil Pública em face do causador do dano. Sobre a hipótese, assinale a afirmativa correta. A) A Ação Civil Pública não deve prosseguir, uma vez que a Defensoria Pública não é legitimada a propor a referida ação judicial. B) A Defensoria Pública pode pedir a recomposição do meio ambiente cumulativamente ao pedido de indenizar, sem que isso configure bis in idem. C) Tendo em vista que a conduta configura crime ambiental, a ação penal deve anteceder a Ação Civil Pública, vinculando o resultado desta. D) A Ação Civil Pública não deve prosseguir, uma vez que apenas o IBAMA possui competência para propor Ação Civil Pública quando o dano ambiental é causado em Unidade de Conservação. Comentário: *Lei nº 7.347/85: Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e dá outras providências. Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; 46 II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Questão 2 (MPE-SC - 2019 - MPE-SC - Promotor de Justiça - Vespertina) Em ação civil pública ambiental, não é possível cumulação de pedido de obrigação de fazer e de reparação pecuniária, em razão do que dispõe o art. 3º da Lei n. 7.347/1985. ( ) CERTO ( ) ERRADO Comentário: O art. 3º da Lei de Ação Civil Pública dispõe que o seu objeto poderá ser a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Nesse contexto, o STJ entende que esses pedidos podem ser cumulados ou não (Súmula 629). 47 Questão 3 (CESPE - 2019 - DPE-DF - Defensor Público) Acerca do direito coletivo, julgue o item a seguir. Conforme jurisprudência do STJ, é competência da justiça eleitoral julgar ação civil pública em que se busque cessar degradação ambiental causada por partido político em propaganda eleitoral consistente em pichações e pinturas em edificações urbanas. ( ) CERTO ( ) ERRADO Comentário: Na Ação Civil Pública em que se busca cessar degradação ambiental causada por partido político em propaganda eleitoral não se discute direitos políticos, inelegibilidade, sufrágio, partidos políticos ou infrações à norma eleitoral, que são matérias da competência da Justiça Eleitoral. Apesar de a obrigação de pagar, fazer ou não fazer que se requer com a ACP ser dirigida a partido político, a demanda não é inerente ao processo eleitoral. Questão 4 (CESPE - 2019 - TJ-SC - Juiz Substituto) Uma associação de proteção ao patrimônio ambiental de Santa Catarina, constituída havia seis meses, ajuizou ACP requerendo a paralisação das obras de construção de um resort sobre dois sambaquis do estado — depósitos de conchas dos povos pré-históricos que habitaram as regiões litorâneas do estado. A entidade, cumprindo sua finalidade institucional de proteger o meio ambiente, pleiteou na ACP a condenação do proprietário do resort pelos danos até então causados ao patrimônio arqueológico. De acordo com a legislação que rege os meios processuais para a defesa ambiental, a referida associação A) não detém legitimidade para propor a ACP, em razão do seu tempo de pré-constituição, mas poderia propor ação popular com o mesmo fim. 48 B) não detém legitimidade para propor a ACP, porque a defesa de patrimônio arqueológico extrapola as suas finalidades. C) detém legitimidade para propor a ACP, independentemente de ter sido constituída nos termos da lei civil, pois não se exige das associações o registro do seu estatuto em cartório. D) detém legitimidade para propor a ACP, pois o requisito de tempo de pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, se verificado manifesto interesse social pela dimensão do dano. E) não detém legitimidade para propor a ACP, a menos que atue em litisconsórcio com o Ministério Público. Comentário: Em regra, a associação civil possui legitimidade para propor ACP, independentemente de atuação de outro legitimado, desde que cumpra dois requisitos legais: esteja constituída há pelo menos 1 ano nos termos da lei civil e tenha finalidade compatível com a tutela que pleiteia (pertinência temática). No caso em questão, a associação civil possui a pertinência temática, pois tem como finalidade institucional a proteção do meio ambiente, que inclui o patrimônio arqueológico; entretanto, por ter sido constituída há apenas 6 meses, em regra, a associação não poderia propor a Ação Civil Pública (nem a Ação Popular, que é de legitimidade exclusiva do cidadão) Ocorre que a jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica ao admitir a flexibilização do requisito temporal de pré-constituição da associação quando for verificado pelo juiz um manifesto interesse social devido à dimensão do dano no caso concreto. Questão 5 49 (CESPE - 2019 - TJ-BA - Juiz de Direito Substituto) O MP de determinado estado da Federação propôs ação civil pública consistente em pedido liminar para obstar a construção de empreendimento às margens de um rio desse estado. No local escolhido, uma área de preservação permanente, a empresa empreendedora desmatou irregularmente 200 ha para instalar o empreendimento. A liminar incluiu, ainda, pedido para que a empresa fosse obrigada a iniciar imediatamente replantio na área desmatada. Nessa situação hipotética, a ação civil pública proposta deverá discutir A) apenas a responsabilidade civil da empresa. B) as responsabilidades civil e criminal da empresa. C) as responsabilidades