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R ep ro d uç ão p ro ib id a. A rt .1 84 d o C ód ig o P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 464 U n id a d e E • R e p ro d u çã o e d e se n vo lv im e n to Objetivos❱❱❱❱ Valorizar CCCCCCC conhecimentos sobre o desenvolvimento embrionário dos cordados, que permitem identificar padrões no mundo natural e refletir sobre as relações de parentesco entre os diferentes grupos de organismos. Reconhecer que o CCCCCCC desenvolvimento embrionário envolve multiplicação, crescimento e especialização — diferenciação — de células. Termos e conceitos❱❱❱❱ desenvolvimento • embrionário Aspectos gerais do desenvolvimento embrionário 1 Primeiras ideias sobre desenvolvimento Desenvolvimento embrionário é o período em que o zigoto, a primeira célula do indivíduo multicelular, transforma-se em um jovem organismo semelhante aos pais. O filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) foi um dos primeiros a se interessar pelo desenvolvimento embrionário. Observando as diferentes maneiras pelas quais os animais podiam nascer, ele os clas- sificou em: ovíparos, que se desenvolvem dentro de ovos (aves, répteis, anfíbios e a maioria dos invertebrados); vivíparos, cujo desenvolvimento ocorre dentro do organismo materno (a maioria dos mamíferos); ovoviví- paros, que se desenvolvem dentro de ovos retidos no interior do corpo materno (certos tipos de peixes e de répteis). Observando ovos de aves desde o início da incubação, Aristóteles concluiu que o pintinho surgia a partir de substâncias que se organizavam gradualmente para formar as diversas partes de seu corpo. Para ele, a matéria-prima contida no ovo representava o “princípio feminino”, que se desenvolvia quando encontrava o “princípio masculino”, representado pelo esperma. No caso dos seres humanos, Aristóteles acreditava que o fluxo menstrual, retido durante a gravidez, era o material formador do embrião; o esperma do pai atuaria sobre esse material, dando-lhe forma e animação. Foi somente em 1651 que o médico inglês William Harvey (1578-1657), famoso por seus estudos sobre a circulação do sangue, concluiu que todos os animais, inclusive os mamíferos, originam-se a partir de ovos. Em 1672, o cientista italiano Marcello Malpighi (1628-1694) publicou o primeiro estudo microscópico sobre o desenvolvimento do embrião de galinha. A partir de então, começou um grande debate entre os estudiosos do desenvolvimento: estariam os órgãos embrionários presentes, em miniatura, dentro do ovo ou do espermatozoide ou seriam eles formados, reincidentemente, a cada nova geração? A primeira hipótese foi denominada pré-formação, e a segunda, epigênese. Vejamos algumas reflexões sobre elas. Em primeiro lugar, se admitimos que todos os órgãos já estão prontos, em tamanho reduzido, dentro dos gametas, o desenvolvimento embrionário passa a ser apenas uma questão de crescimento e não há muito o que discutir a respeito. A hipótese da pré-formação, ou pré-formista, foi muito popular no século XVIII porque correspondia às ideias da época, adequando-se ao contexto científico, religioso e filosófico. Caso adotemos a hipótese epigenética, porém, temos de explicar como um ser vivo completo e organizado pode surgir a partir da massa de substâncias que constitui o ovo. Em segundo lugar, quando se admite a existência de um adulto em miniatura dentro do gameta, chega-se à conclusão de que uma geração já está definida de antemão dentro da outra, desde a primeira, o que é con- veniente para explicar por que as espécies mantêm suas características constantes ao longo das gerações. (Fig. 18.1) Figura 18.1 Espermatozoide desenhado em 1694 por defensores do pré-formismo, que acreditavam ser possível ver no interior dos gametas um novo ser humano em miniatura (homúnculo). Entre os adeptos dessa ideia havia os espermistas, segundo os quais o homúnculo estaria no espermatozoide, e os ovulistas, segundo os quais estaria no óvulo. Na ilustração, homúnculo no espermatozoide em posição fetal, com uma grande cabeça onde se vê a moleira, um espaço entre os ossos presente nos recém-nascidos. Moleira Homúnculo Seção 18.1 R ep ro d uç ão p ro ib id a. A rt .1 84 d o C ód ig o P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 465 C a p ít u lo 1 8 • N o çõ e s d e e m b ri o lo g ia a n im a l Epiderme Somitos (musculatura e vértebras) Intestino Ânus Membro anterior Lábio dorsal do blastóporo Brânquia Notocorda Orelha Olho Lente do olho Ventosa do girino Limite da cabeça BLÁSTULA Mesoderma lateral Embora alguns microscopistas afirmassem ter visto no interior dos gametas um pequeno ser humano (homúnculo) completamente formado, as ideias epigenéticas prevaleceram. A partir da metade do século XIX, com o estabelecimento da teoria celular e a demonstração irrefutável de que óvulos e espermatozoides eram células, não havia mais como defender a pré-formação. Os estudos citológicos que se seguiram levaram à descoberta da divisão celular, o que consolidou a ideia de que, nos seres com reprodução sexuada, a vida de um organismo tem início com o zigoto e implica três processos básicos: multiplicação, crescimento e diferenciação celulares para formar os diversos tecidos e órgãos do adulto. Na tentativa de compreender o mais desafia- dor desses processos — a diferenciação celular —, muitos biólogos dedicaram suas habilidades de observação e de experimentação ao estudo do desenvolvimento embrionário. Cientistas pioneiros fizeram verdadeiras microcirurgias em embriões em desenvolvimento, partindo-os com laços de fios de cabelo ou transplantando partes de um local para outro, com embriões de mesma idade e de idades diferentes. Em 1929, o embriologista alemão Walther Vogt (1888-1941) desenvolveu um método interessante para mapear embriões de sapo. Ele aplicava pequenos discos de gelatina contendo corantes vitais (isto é, corantes que não matam as células) na superfície do embrião quando esse ainda era uma bolinha oca de cé- lulas chamada blástula. Depois que as células absorviam o corante, ele retirava os discos de gelatina e acompanhava o destino das células coradas. Esses e outros estudos mostraram que, no embrião em desenvolvimento, há uma intensa migração de células, cujos caminhos podem ser acompanhados com precisão, gerando verdadei- ros mapas embrionários. (Fig. 18.2) A partir da década de 1960, passou-se a usar substâncias radioativas e substâncias fluores- centes para marcar as células embrionárias, de modo a poder seguir seu desenvolvimento. Mais recentemente, os estudos embriológicos têm- -se beneficiado do grande desenvolvimento da Genética Molecular. Hoje, é possível produzir em- briões com genes propositalmente inativados, por meio de uma técnica conhecida como “nocaute genético”, e determinar o papel de cada gene na diferenciação das células e no desenvolvimento do embrião. Figura 18.2 A. Representação do experimento de Vogt, em que pequenos discos de gelatina embebidos em corantes foram aplicados sobre embriões de sapo no estágio de blástula. Note, pela numeração, o rearranjo das células coradas. B. Mapa embrionário de um anfíbio, mostrando as áreas da blástula que originam diferentes partes do corpo do animal. (Imagem sem escala, cores-fantasia.) (Baseado em Gilbert, S., 2000.) Conteúdo digital Moderna PLUS http://www.modernaplus.com.br Texto: Pioneiros da embriologia experimental Discos de gelatina contendo corantes I. BLÁSTULA (vista lateral) 11 1 2 9 10 3 4 5 8 7 6 3 10 5 4 11 Migração de células Futuro ânus embrionário III. GÁSTRULA AVANÇADA (vista dorsal) (corte longitudinal) IV. NÊURULA (vista dorsal externa) II. GÁSTRULA JOVEM (vista dorsal) Plano de corte Migração de células 5 67 11 10 8 9 1 2 3 4 11 5 6 7 1098 1 2 4 3 A B R ep ro d uç ão p ro ib id a. A rt .1 84 d o C ód igo P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 466 U n id a d e E • R e p ro d u çã o e d e se n vo lv im e n to Nêurula (vista dorsal externa) Futuro sistema nervoso (vista dorsal externa) Gástrula avançada (em corte) Blastóporo (futuro ânus) Gástrula jovem (em corte) FORMAÇÃO DE GÁSTRULA (GASTRULAÇÃO) (vista lateral externa) Músculos em formação GAMETOGÊNESE Blástula (em corte) Mórula (vista externa) Primeiras células embrionárias (blastômeros) Espermatozoide Óvulo FECUNDAÇÃO E FORMAÇÃO DO ZIGOTO SEGMENTAÇÃO E FORMAÇÃO DA BLÁSTULA Encéfalo em formação Olho FORMAÇÃO DE TECIDOS E ÓRGÃOS (HISTOGÊNESE E ORGANOGÊNESE) ESTÁGIO LARVAL (girinos) ADULTOS SEXUALMENTE MADUROS 2 Do zigoto ao organismo: visão geral do desenvolvimento O desenvolvimento embrionário tem início com a primeira divisão mitótica do zigoto e pode ser dividido em três etapas principais: segmentação, gastrulação e organogênese. A fase de segmen- tação (também chamada fase de clivagem) é o período que vai desde a primeira divisão do zigoto até a formação de um aglomerado de células com uma cavidade interna, a blástula. Durante a fase seguinte, a gastrulação, as células embrionárias continuam a se multiplicar e organizam-se formando a gástrula, estrutura caracterizada pela presença de um primeiro “esboço” do tubo digestório e pela diferenciação dos três folhetos germinativos — ectoderma, mesoderma e endo- derma. A organogênese é a fase em que, a partir dos três folhetos germinativos, diferenciam-se os diversos tecidos e órgãos que existirão no organismo adulto. (Fig. 18.3) Figura 18.3 Representação esquemática do ciclo de vida de um sapo, mostrando as diferentes fases do desenvolvimento. As áreas coloridas à direita mostram três etapas básicas do desenvolvimento embrionário. No caso dos anfíbios, ao desenvolvimento embrionário segue-se um estágio larval, durante o qual os girinos vivem na água e respiram por brânquias. Os adultos têm respiração aérea, por pulmões. (Imagem sem escala, cores-fantasia.) Conteúdo digital Moderna PLUS http://www.modernaplus.com.br Animação: Reprodução e desenvolvimento, veja aba Desenvolvimento embrionário