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PROFESSORA Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Libras ACESSE AQUI O SEU LIVRO NA VERSÃO DIGITAL! EXPEDIENTE Coordenador(a) de Conteúdo Marcia Maria Previato de Souza Projeto Gráfico e Capa André Morais, Arthur Cantareli e Matheus Silva Editoração Caroline Casarotto Andujar Design Educacional Patrícia Ramos Peteck Curadoria Fabiana Bruna Gozer Dias Revisão Textual Ariane Andrade Fabreti, Carla Cristina Farinha e Salen Nascimento Ilustração Andre Luis Azevedo da Silva, Bruno Cesar Pardinho Figueiredo e Eduardo Aparecido Alves Fotos Shutterstock NEAD - Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 Jd. Aclimação - Cep 87050-900 | Maringá - Paraná www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 Universidade Cesumar - UniCesumar. U58 Impresso por: Bibliotecária: Leila Regina do Nascimento - CRB- 9/1722. Núcleo de Educação a Distância. Ficha catalográfica elaborada de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a). : Libras / Ivanilda Almeida Meira Novais. - Indaial, SC Arqué, 2024. 304 p. : il. ISBN papel 978-85-459-2556-9 ISBN digital 978-85-459-2557-6 “Graduação - EaD”. 1. Língua 2. Brasileira 3. Sinais. 4. Ivanilda Almeida Meira Novais. I. Título. CDD - 419 FICHA CATALOGRÁFICA 02511458 Ivanilda Almeida Meira Novais A minha experiência com os estudos começa nos pri- meiros anos de escolarização. Quando fui apresentada à escola, pude perceber o quanto aquele ambiente era especial. Foi ainda criança e na escola que almejei me tornar uma professora, uma expectativa que se tornou realidade. Há 22 anos, sou professora da rede pública de ensino de Borrazópolis-PR. Com o decorrer dos anos, passei por diferentes ex- periências como docente. Lecionei para crianças peque- nas, na Educação Infantil, e fui professora alfabetiza- dora. Paralelamente ao trabalho desenvolvido na rede municipal de ensino de Borrazópolis, também trabalhei como intérprete de Libras em escolas estaduais do Pa- raná. A paixão pela Libras surgiu em 2005, quando tive contato com uma intérprete durante uma formação na cidade de Faxinal do Céu. Durante este evento, aprendi muitos sinais e percebi que poderia aprender, com faci- lidade, aquela língua especial que me encantou. Depois dessa experiência, procurei cursos de Libras e logo iniciei minhas pesquisas e estudos sobre o universo dessa língua. Foram cinco anos de estudos para apren- dê-la e desenvolvê-la com fluência. Fiz pós-graduação em Libras, estudos que me deram muitas oportunidades e contatos com a comunidade surda e, durante essa pós- -graduação pude aprofundar os conhecimentos acerca do universo da comunidade e cultura surdas. Atualmente, sou doutoranda pela Universidade Estadual de Maringá, onde pesquiso a formação da pessoa surda e os seus desdobramentos atrelados ao uso das TIC. Lattes: http://lattes.cnpq.br/2579309638413824 http://lattes.cnpq.br/2579309638413824 Imagine que você é um estrangeiro que deixou seu país e decidiu morar em um lu- gar completamente novo, na esperança de ter uma vida melhor, com muitos planos e sonhos que deseja alcançar. No entanto, assim que chega ao novo lugar, percebe que tudo é completamente diferente, especialmente a forma como as pessoas se comunicam, precisa aprender uma nova língua para se comunicar efetivamente. No início, sua comunicação é limitada e pouco funcional, mas você entende que faz parte do processo de adaptação. Esta situação pode ajudá-lo a compreender o desafio enfrentado pelas pessoas surdas, as quais vivem em uma sociedade predominantemente oralista, onde a maio- ria das pessoas se comunica oralmente. Coletar relatos e histórias de vida de pessoas surdas tem sido uma prática importante em minhas pesquisas, pois ajuda-me a definir estratégias e contribui para a valorização e o reconhecimento das diferenças. Ao imagi- nar-se como um estrangeiro em um novo lugar, você pode se aproximar da experiência das pessoas surdas em seu próprio país, cercadas por pessoas queridas e próximas, mas enfrentando barreiras de comunicação. Afinal, já parou para pensar em como a aprendizagem da Língua Brasileira de Sinais (Libras) promove a inclusão e a igualdade de oportunidades às pessoas surdas em uma sociedade predominantemente oralista? Quais são os principais desafios enfrentados pelos surdos na comunicação com pessoas ouvintes e como a Libras pode ajudar a superar essas barreiras? Qual é o papel da educação bilíngue (Libras e língua oral) na promoção da acessibilidade e no desenvolvimento linguístico e acadêmico das pessoas surdas? De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, atualmente, existem cer- ca de 1,5 bilhão de pessoas no mundo com algum grau de deficiência auditiva, o que evidencia a magnitude do problema. No Brasil, o IBGE divulgou, recentemente, que 5% da população é composta por pessoas surdas, o que corresponde a mais de 10 milhões de cidadãos. Dentre eles, 2,7 milhões possuem surdez profunda, implicando total falta de audição. LIBRAS Apesar de não ser possível compreender plenamente a experiência vivida por pessoas surdas em um mundo predominantemente ouvinte, é possível despertar a empatia em relação a essa realidade e agir de forma positiva. A conscientização e a mobilização social são fundamentais para promover ações que contribuam com a inclusão e a valorização das pessoas surdas. Um exemplo notável deste esforço foi a proposta de redação do Enem em 2017, cujo tema foi “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil”. Esta escolha surpreendeu alunos, professores e especialistas, pois colocou em destaque um assunto que, muitas vezes, era negligenciado. A partir desse momento, o debate sobre a im- portância da educação e dos direitos das pessoas surdas ganhou visibilidade nacional, extrapolando os limites da comunidade surda e das escolas. Sabemos que a comunicação dos surdos é única, usando uma linguagem própria relacionada à cultura e identidade deles. Mas será que aprender Libras é fácil ou difícil? Muitas pessoas confundem a Libras com gestos, mas isso não é verdade, ela é uma língua de sinais com sua própria estrutura gramatical, que é complexa. No Brasil, a Libras é reconhecida como uma língua oficial. Mas como isso aconteceu? Quais foram os passos para que a Libras fosse legitimada? E o que isso representa aos surdos, ter essa língua reconhecida, legalmente, como uma forma de comunicação? Estas questões são muito importantes, pois a Libras desempenha um papel social integrador. Ela une pessoas e permite que elas melhorem suas habilidades sociais, o que torna os relacionamentos mais dignos, respeitando a forma única de se comuni- car e se expressar dos surdos. Isso ajuda a quebrar preconceitos bem como promove uma sociedade mais inclusiva. Neste estudo, abordaremos questões relacionadas a educação, aspectos sociais, intelectuais, identidade, cultura e linguagem das pessoas surdas. Analisaremos as ideias pedagógicas e sociais que envolvem a diversidade dos surdos — sua cultura, sociedade e características pessoais — tanto no Brasil quanto no mundo. Ao longo da história, as pessoas surdas enfrentaram muitos desafios. Muitas vezes, foram julgadas, discriminadas e ignoradas, tendo a oportunidade de socializar e aprender negada. Infelizmente, muitos surdos foram impedidos de viver suas vidas plenamente. A jornada dos surdos é longa e cheia de avanços e retrocessos. Marcada por lutas e movimentos sociais, estas batalhas permitiram que os surdos tivessem o direito de conviver, se relacionar e se comunicar em sua língua natural — a língua de sinais — a Libras, no Brasil. A partir dessas lutas e movimentos crescentes, a sociedade começou a interessar-se em promover mudanças necessárias em todos os aspectos, fortalecendo discussões sobre diversidade, cultura, identidade e formas de comunicação do povo surdo. As experiências desse povo foram, por muito tempo, dolorosas. Você entenderáas principais mudanças que garantiram aos surdos o direito à edu- cação, o direito de frequentar a escola e o devido respeito pela sua forma de comuni- cação. Esses elementos são essenciais no processo de formação de qualquer indivíduo, portanto, os estudos, aqui, reconhecem que a qualidade de vida das pessoas surdas é de interesse social, pois impulsionam a aceitação e o reconhecimento de uma nova maneira de perceber e compreender as necessidades únicas dos surdos. É muito importante conhecer a Libras e tudo sobre a Língua Brasileira de Sinais, para quebrar paradigmas sociais. Sabemos que há muito preconceito em relação à Libras, principalmente por falta de conhecimento. Quanto mais oportunidades tivermos de discutir como a língua funciona e o que ela significa para as pessoas surdas, melhor poderemos nos comunicar de forma eficaz em situações que exigem o uso da Libras. A comunicação é essencial, tanto nas relações profissionais quanto nas interações sociais. Antigamente, as pessoas surdas não tinham muitas oportunidades de conviver socialmente, eram impedidas de exercer sua cidadania, de se relacionar com os outros e de usar sua forma de comunicação. Felizmente, hoje, as pessoas surdas têm mais oportunidades de interação social. Elas podem exercer seus direitos básicos, estão integradas ao mercado de trabalho, ao lazer, ao entretenimento e à educação. Espero que você goste muito de tudo que apresentaremos, porque o material que preparamos tem muitas informações, conceitos e curiosidades para você refletir sobre a importância da Libras a pessoas surdas, sociedade e ciência. Além de ser algo prático, o reconhecimento da Libras é resultado de lutas e movimentos que ajudam a difundir a língua na sociedade, promovendo a cidadania dos surdos brasileiros e valorizando a cultura e a identidade desse povo que se comunica e se faz entender. Querido estudante, te convido a começar esta jornada de conhecimento. Tenho certeza de que você se apaixonará pela Libras, assim como eu! IMERSÃO RECURSOS DE Ao longo do livro, você será convi- dado a refletir, questionar e trans- formar. Aproveite este momento. PENSANDO JUNTOS NOVAS DESCOBERTAS Enquanto estuda, você pode aces- sar conteúdos online que amplia- ram a discussão sobre os assuntos de maneira interativa usando a tec- nologia a seu favor. Sempre que encontrar esse ícone, esteja conectado à internet e inicie o aplicativo Unicesumar Experien- ce. Aproxime seu dispositivo móvel da página indicada e veja os recur- sos em Realidade Aumentada. Ex- plore as ferramentas do App para saber das possibilidades de intera- ção de cada objeto. REALIDADE AUMENTADA Uma dose extra de conhecimento é sempre bem-vinda. Posicionando seu leitor de QRCode sobre o códi- go, você terá acesso aos vídeos que complementam o assunto discutido. PÍLULA DE APRENDIZAGEM OLHAR CONCEITUAL Neste elemento, você encontrará di- versas informações que serão apre- sentadas na forma de infográficos, esquemas e fluxogramas os quais te ajudarão no entendimento do con- teúdo de forma rápida e clara Professores especialistas e convi- dados, ampliando as discussões sobre os temas. RODA DE CONVERSA EXPLORANDO IDEIAS Com este elemento, você terá a oportunidade de explorar termos e palavras-chave do assunto discu- tido, de forma mais objetiva. Quando identificar o ícone de QR-CODE, utilize o aplicativo Unicesumar Experience para ter acesso aos conteúdos on-line. O download do aplicativo está disponível nas plataformas: Google Play App Store https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/3881 APRENDIZAGEM CAMINHOS DE 1 2 3 4 5 ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO DO SURDO: UM PANORAMA MUNDIAL 11 ASPECTOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO DO SURDO 55 91 ABORDAGENS PEDAGÓGICAS DA EDUCAÇÃO DE PESSOAS SURDAS: UM OLHAR NAS PRÁTICAS EDUCATIVAS 137 ESTUDOS GERAIS DA GRAMÁTICA DA LIBRAS 217 GRAMÁTICA DA LIBRAS - ASPECTOS SINTÁTICOS DA LIBRAS 1Aspectos Históricos da Educação do Surdo: um Panorama Mundial Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Exploraremos a história da educação dos surdos em âmbito mun- dial e brasileiro. Abordaremos a evolução da Educação Especial e os fundamentos da Educação Inclusiva, com foco nas pessoas surdas ao longo dos anos. É essencial aprofundar-se nesses aspectos para compreender o processo educacional dos surdos, os conceitos de surdez, oralismo, comunicação total e bilinguismo, e como afetam a formação da identidade da pessoa surda. Ao voltar ao passado, você desmistificará equívocos e adquirirá novos conhecimentos, será leva- do a refletir e questionar acontecimentos relacionados à educação em diferentes épocas, compreendendo que o processo histórico envolve perdas, obstáculos, conquistas sociais e culturais. Vamos começar? Bons estudos! UNIDADE 1 12 Você é nosso convidado para conhecer a história da família de Pedro, Paulo, Paula e Laís, uma família que é composta pelo pai (Joaquim), a mãe (Joana) e os seus filhos. Os filhos são donos dos nomes que aparecem na primeira linha. É início de ano letivo, e a mãe, Joana, tem se preocupado muito com a vida escolar dos seus filhos e, como responsável por eles, ela frequentemente vai à escola para saber como os filhos têm se desenvolvido. Laís é a filha primogênita, é uma aluna dedicada e está no Ensino Médio. Pedro também é um filho e aluno esforçado, nasceu surdo e não ouve nada, é considerado pela classificação de níveis de audição surdo com perda auditiva profunda, portanto, Pedro não ouve absolutamente nenhum som. Não sei se podemos dizer que ele tem sorte, mas nasceu em uma época na qual a escola compreende que a perda auditiva não é um empecilho para seu bom desenvolvimento, pois, hoje, Pedro pode contar com a presença de um intérprete na sala de aula. Voltando para a mãe Joana, apontamos, anteriormente, que ela tem se preocu- pado muito nesse início de ano, pois é chegada a hora dos seus filhos gêmeos irem à escola. Joana já foi várias vezes conversar com a equipe gestora, para saber se os filhos poderão estudar na mesma classe. Então, para que você compreenda melhor, é pertinente saber que os gêmeos Paulo e Paula também são crianças surdas e, as- sim como o irmão Pedro, enquadram-se na mesma classificação de perda auditiva. Joana tem motivos para se preocupar com a vida escolar dos gêmeos, pois ela teve a informação que os filhos não terão nem intérprete, nem professor de apoio. A cidade onde a família mora é pequena, só tem uma escola do Ensino Fundamental I, então, não há a possibilidade de transferir os filhos para outra escola. Interessante que a “família” vive um tempo diferente, mais moderno. As con- dições na educação são outras em relação ao que já foi possível fazer em tempos remotos. Você pensa que a mãe tem razões para se preocupar? Como vivemos no século XXI, podemos presumir que não há mais empecilhos e obstáculos na educação? Viver na contemporaneidade não significa que estamos isentos de nos depararmos com obstáculos. Se você estivesse no lugar de Joana, qual histó- ria gostaria de contar daqui a alguns anos? Já pensou quais foram os caminhos percorridos pelo povo surdo que resultaram na educação a qual vemos hoje? De forma ampla, o sistema educacional é resultado de muitos movimen- tos, lutas, limitações e avanços. Assim se faz uma história e, com relação à educação dos surdos, não é diferente. Ela é marcada por trajetória de perdas, 13 de discriminações e privações no contexto social. Tais situações ocorreram, principalmente, pelo fato de os surdos usarem uma forma peculiar de comu- nicação: a língua de sinais. Aqui, no Brasil, a conhecemos como Libras, Língua de Sinais Brasileira. Todos nós fazemos parte de algum grupo na família, na escola, na religião, no trabalho, nas profissões, enfim, nos diferentes segmentos sociais, somos inseridos em grupos com os quais nos identificamos e por meio dos quais interagimos. Nestas relações, a comunicação é crucial, precisamoso tempo todo transmitir e receber informações, assim, seguimos a vida emaranhados às teias de represen- tações e fortalecimento de identidades. Todos nós, em algum momento, nos deparamos com muitos desafios para gerir todas as informações. Imagine você, como é para o povo surdo se relacio- nar e conviver nessa sociedade, cuja forma de se comunicar é diferente daquela utilizada pela maioria. Você percebeu que a comunicação dos surdos é diferente e acontece com a utilização das mãos. Neste caso, as mãos são para os surdos como a voz é para o ouvinte. Sabendo que eles aprendem, desenvolvem e comunicam-se usando a língua vi- sual, ou seja, utilizando a língua de sinais, você poderá apre- sentar, neste espaço, as principais curiosidades, ao assistir o vídeo. Para isso, acesse o QR Code ao lado e faça uma pequena viagem por meio do vídeo e observe quais são os recursos utilizados pelos surdos na sua comunicação. Com base no vídeo e na reportagem, pense quais sentimentos, ideais e interesses lhe chamaram atenção. Você acredita que a língua de sinais apresenta a possibilida- de efetiva de troca com o outro? Há diferenças de sinais de um país para o outro? Agora, reflita um pouco mais, e veja se há ou não pa- radoxos que predominam nas relações sociais das pessoas surdas e nas suas necessidades. Quais mudanças são ne- cessárias para que os surdos sejam, realmente, incluídos na sociedade? A partir desse contexto, apresentaremos, a se- guir, uma reportagem sobre o tema da redação explorado no Enem, em 2017. UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20393 https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20392 UNIDADE 1 14 Você consegue imaginar-se vivendo como um estrangeiro na sua terra natal? Já parou para pensar como desenvolveu a sua língua? Vivemos em uma sociedade predominantemente formada por pessoas ou- vintes, logo, nos comunicamos pela fala, ela é um mecanismo da nossa linguagem e determina a língua que dominamos. Para o surdo, é diferente, ele percebe o mundo de forma diferenciada dos ouvintes, suas experiências de aprendizagem e comunicação acontecem pela percepção visual, utilizando uma linguagem es- pecífica para isso, a língua de sinais, a qual, no caso do Brasil, é conhecida como Libras (Língua Brasileira de Sinais). DIÁRIO DE BORDO 15 Anote, no espaço anterior, as principais questões sobre o desenvolvimento da pessoa surda, e tente responder: como os surdos aprendem? Qual é a melhor forma de se comunicar com os surdos? Libras é língua ou uma linguagem? Será que consigo aprender Libras? Iniciaremos a nossa jornada em busca destas respostas. A história da educação do surdo: Um breve panorama mundial Passando por várias correntes teóricas na área das Ciências Sociais e por outras áreas das humanidades, nosso propósito, nesta unidade, está voltado, princi- palmente, a desenvolver conhecimentos sobre os contextos nos quais os surdos puderam romper as barreiras discriminatórias e conquistar seus espaços na conjuntura social, no que diz respeito à análise identitária e cultural. Para- fraseando Ennes e Marcon (2014), aqui, é interessante dar mais enfoque aos pesquisadores que, além de terem contribuído com posicionamentos críticos, assumem que os fenômenos relacionados às identidades contribuem na refle- xão sobre o seu caráter processual e dinâmico. Estas sinalizações nos revelam os aspectos universal e particular, apontando as características próprias e as gerais, pelos quais estão inseridos os contextos históricos e sociais produzidos ao longo das experiências de vida do povo surdo. A pessoa surda por muito tempo foi reconhecida como “pessoa muda”, isso se explica devido a forte corrente cultural das pessoas ouvintes, pois acreditava-se que, por sua condição de não ouvinte, a pessoa também não falava, logo, era muda. Geralmente, somos levados a pensar conforme imposições predefinidas, o que contribui para análises errôneas sobre as características dos indivíduos. Segundo Libâneo (2013, p. 20), as mudanças sociais “dão significado às coisas, às pessoas e, criam as ideias. [...] é socialmente que se formam opiniões, ideias e ideologias”. O autor contribui com a discussão ao apresentar subsídios no que tange à formação da civilização, sinalizando que o movimento do desenvolvimento da humani- dade é um elemento fundamental e, ao mesmo tempo, desafiador à escola, pois determina como a sociedade produz e organiza a educação. UNICESUMAR UNIDADE 1 16 A base estrutural da história é a experiência, o papel exercido pela história pode ser contatada por diferentes lentes e, apesar das inúmeras possibilidades, destacamos, neste livro, aquelas que deixam explícitas quais foram as princi- pais evidências que marcaram sobretudo as discussões sobre a forma como os surdos se desenvolvem. Nossa trajetória começará obedecendo uma ordem cronológica. Portanto, iniciaremos esta unidade apresentando algumas interpretações históricas oficiais de surdos registrados em muitos livros, artigos, teses e dissertações seguindo, exclusivamente, cinco épocas históricas: ■ 1. Pré-História. ■ 2. Idade Antiga ou Antiguidade. ■ 3. Idade Média. ■ 4. Idade Moderna. ■ 5. Idade Contemporânea. 17 Segundo Perlin e Strobel (2008, [s. p.]): “ É pelas raízes numa história que surgem revelações trazendo à luz as discussões educacionais das diferentes metodologias, pode-se observar que a raiz central das disputas sempre esteve ligada a res- peito da língua, ou seja, se os sujeitos surdos deveriam desenvol- ver a aprendizagem através da língua de sinais ou da língua oral? Na Antiguidade, pensar a educação e o desenvolvimento das pessoas surdas foi desafiador para a sociedade. Segundo Strobel (2008), na Antiguidade, as pes- soas surdas, assim como as outras pessoas com alguma deficiência, vivenciaram momentos de muito sofrimento, marcados por casos de extermínios e outras situações de segregações. Naquele período, as pessoas que nasciam surdas eram consideradas pessoas incompetentes, incapazes de aprender e de se relacionar umas com as outras. Acreditava-se que, por não se comunicarem da forma con- vencional, ou seja, oralizando, as pessoas surdas não eram capazes de interagir, raciocinar, de aprender e se desenvolver. Estas situações oriundas de conclusões e influências próprias da cultural oralista definiam que os surdos eram incapazes de serem ensinados, portanto, eles não deveriam ser educados e, consequente- mente, eram impedidos de frequentar escolas. As privações contra a vida dos surdos, nesse período, por vezes, eram garan- tidas por lei. Dessa forma, a comunidade ouvinte atestava, legalmente, a incapa- cidade dos surdos. Conforme afirma Strobel (2008, p. 47): “ Assim na antiguidade, os sujeitos surdos eram estereotipados como ‘anormais’, com algum tipo de atraso de inteligência, devido à au- sência de trabalho e pesquisas científicas desenvolvidas na área educacional. Para a sociedade, o ‘normal’ era que: é preciso falar e ouvir para ser aceito, então os sujeitos surdos eram excluídos da vida social e educacional; não havia escolas para os sujeitos surdos e existiam muitas leis que não acreditavam na capacidade de surdos. UNICESUMAR UNIDADE 1 18 O povo surdo existiu em todos os tempos e, apesar da forma isolada como viviam, mesmo que de maneira informal e primitiva, utilizavam a língua de sinais para se comunicar. A língua de sinais utilizada em tempos anteriores — Antiguidade, Idade Média e Idade Moderna — não se apresentava tal como na atualidade, portanto, assim como o surdo existiu, a língua de sinais também surgiu nesse cenário. “ Apresento, aqui, o relato da pesquisadora Strobel (2008, p. 28), no qual nos expõe sua percepção ao se descobrir como pessoa surda: Eu não percebia o que era ser surda até ter mais ou menos seis anos de idade, antes percebia que todos em casa conversavam comigo através de gestos, apontações e de articulações lentosdos lábios. No decorrer da vida diária, não tinha motivos para pensar sobre as diferenças porque minha mãe comunicava desta mesma forma com os meus dois irmãos, acho porque eles eram pequenos ainda. Até que de uma forma incidental, aconteceu em que eu estava observando a mãe conversar falan- do rapidamente com minha irmã e eu não a entendia, minha irmã respondia falando e eu entendi que ela era igual como meus pais, como aos meus vizinhos, como as outras pessoas na rua e comecei a compreender que eu era diferente do resto de família e eu. Strobel (2008) afirma que, ao longo da história da humanidade, ser surdo não foi fácil. A autora sinaliza que os surdos foram vítimas de muitas in- justiças, as crueldades levaram muitas pessoas surdas à morte. A sociedade daquela época não aceitava pessoas que apresentassem aspectos de disse- melhança, ou seja, o “diferente” e as “diferenças” por elas apresentadas. Ao lermos o seu depoimento, podemos constatar o quanto a família buscou alternativas para manter uma comunicação. Percebemos que as condições exercidas pela família apresentadas pela pesquisadora são favoráveis ao seu desenvolvimento. 19 Na Antiguidade, os surdos eram descartados como objetos sem valor pela socie- dade. Durante esse período e por quase toda a Idade Média, pensava-se que os surdos não fossem educáveis, eram considerados imbecis. No Egito, eram ado- rados como deuses, na Grécia e na China, por exemplo, eram entendidos como pessoas castigadas, assim, muitos surdos foram mortos e lançados de penhascos, enquanto na Europa, eram jogados na fogueira. Até aqui, percebemos que os registros da história das pessoas surdas é marcado por crueldades, de tempos em tempos, os ciclos desumanos prevaleciam, as formas de entendimentos eram escassas bem como as discussões sobre as abordagens específicas educacionais. Segundo Sacks (1998, p. 31), em 368 a.C., o filósofo grego Sócrates foi res- ponsável pelos registros mais antigos sobre os surdos e a língua de sinais, ao acreditar que “Se não tivéssemos voz nem língua, mas apesar disso desejássemos manifestar coisas uns com os outros, não deveríamos, como as pessoas que hoje são mudas, nos empenhar em indicar o significado pelas mãos, cabeça e outras partes do corpo?”. Este questionamento afirma a importância de pensarmos sobre as características individuais que determinam, na plenitude das diferenças, quais são as necessidades comunicativas nas relações. Essa forma de pensamento é que mais se aproxima daquilo que, hoje, conhecemos por língua de sinais. Sócrates percebeu a importância da utilização da comunicação não verbal como condição especial para manter a comunicação. Talvez seja esse um registro que envolve, além de comprometimento com a comunicação, uma relação estreita de empatia sobre as formas comunicativas diferenciadas entre as pessoas. Cabe salientar que, na Grécia Antiga, acreditava-se que a fala era condição lega- da à inteligência, portanto, estava intimamente relacionada com o desempenho da fala. Segundo Aristóteles, se alguém não falava, também não podia pensar. Dessa forma, os surdos, vivendo isoladamente, não podiam enriquecer suas línguas, em- bora já tivessem, nos gestos, uma fonte viável de comunicação. De certa forma, eles contentavam-se com a comunicação gestual, ou seja, o gesto fazia parte das suas formas de interação uns com os outros. Assim como Aristóteles, Santo Agosti- nho (354 d.C.– 430 d.C.) defendia a ideia de que os surdos podiam se comunicar utilizando gestos e, como resultado, não tendo uma linguagem elaborada e não se beneficiando da educação, às vezes, eram consideradas pessoas de mente simples. UNICESUMAR https://pt.wikipedia.org/wiki/Agostinho_de_Hipona https://pt.wikipedia.org/wiki/Agostinho_de_Hipona UNIDADE 1 20 Descrição da Imagem: a figura mostra uma fotogra- fia colorida de um busto em mármore de Aristóteles, o qual apresenta um homem barbudo na faixa etária de 50 anos, com cabelo curto e vestindo uma toga. Descrição da Imagem: a figura mostra uma pintura colorida retratando Santo Agostinho, um homem na faixa etária dos 60 anos, com barba grisalha longa e cabelos curtos com falhas, vestindo uma batina branca e um manto dourado enfei- tado com figuras religiosas. Figura 1 - Aristóteles Fonte: Wikimedia Commons (2006, on-line). Figura 2 - Santo Agostinho Fonte: Champaigne ([c1645 – 1650], on-line). 21 Percebemos que, por muito tempo, a humanidade não pensava na educação do surdo, portanto, eles foram privados de desenvolverem valores, ideias e concepções de mundo. A língua de sinais é uma modalidade comunicativa visual-espacial que representa por si as possibilidades que traduzem as expe- riências surdas, ou seja, as experiências visuais. Segundo a pesquisadora Karin Strobel (2008), a civilização grega e a socie- dade espartana cultuavam o corpo, enquanto a sociedade ateniense cultuava o intelecto. Esta diferenciação entre esses povos postulava como eram entendidos os surdos. Considerando que os espartanos preparavam os meninos, a partir dos sete anos, para a guerra e a defesa da polis, as crianças que nasciam com qualquer deficiência não se enquadravam às necessidades do povo, dessa forma, eram eliminadas porque não tinham condições de servir ao exército em Esparta e, também, não conseguiriam receber instruções em Atenas. Carneiro e Soares (2017) apontam serem poucos os registros encontrados so- bre a educação dos surdos durante a Antiguidade e, por quase toda a Idade Média, as intervenções estavam voltadas aos procedimentos de curas milagrosas, ou seja, à crença de que os resultados obtidos com relação a comunicação e formação dos surdos só ocorreriam devido às intervenções divinas. Além das limitações e empecilhos para escolarização, os surdos eram privados de alguns direitos, por exemplo, a herança dos familiares. Tal situação se fortalecia pela crença de que eles não tinham condições de gerenciar as fortunas. Foi no fim Idade Média que surgiram os primeiros filósofos e pesquisadores defendendo a perspectiva de uma educação mais eficaz para os surdos, rom- pendo com um período de hostilidade, desmistificando as ideias defendidas até esse período de que os surdos eram pessoas incapazes de aprender, de se desenvolver tanto sob a perspectiva pedagógica quanto sob a perspectiva lin- guística. Certamente, as famílias nobres com herdeiros surdos tinham interesse em compreendê-los e integrá-los na sociedade com a finalidade de não perder as riquezas familiares. Vale destacar que, na Antiguidade, aspectos relacionados com a saúde eram tinham foco na perspectiva mística, pois acreditava-se que a doença trazia respostas dos deuses, as quais seriam veiculadas por meio das manifestações de maldições e feitiçarias. Durante 20 séculos na Europa, os intelectuais e a sociedade em geral acreditavam que as pessoas surdas eram impossibilitadas de aprender bem como eram inferiores aos demais seres hu- manos e, portanto, incapazes de socializar. UNICESUMAR UNIDADE 1 22 No século XII, as perdas e regressões continuavam. Nessa época, as pessoas surdas ainda eram consideradas seres não pensantes, uma vez que, para muitos, a ideia de capacidade se enquadrava na concepção a qual ligava a habilidade de raciocínio à fala. Logo, o povo surdo era considerado incapaz de pensar, sendo comparado a animais irracionais. No século XV, as crianças e jovens surdos de famílias ricas eram educados por professores particulares, portanto, até o final desse período, não havia escolas com ensino especializado para surdos. No início do século XVI, começaram as primeiras tentativas de evolução concreta sobre as formas de educação e metodologias aplicadas às pessoas surdas, graças a práticas e procedimentos pedagógicos e a evidências mais estruturadas que, para explicar qualquer avanço no desenvolvimento da pessoa surda, fugiam das relações sobrenaturais. Depoimentos dos profissionais da educação deram legitimidadeàs práticas educativas iniciadas nesse período. Vale destacar que havia muitos segredos acerca de como ocorria a educação dos surdos, pois não era permitida a troca de experiências. Segundo Lacerda (1998, on-line): “ É no início do século XVI que se começa a admitir que os surdos podem aprender através de procedimentos pedagógicos sem que haja interferências sobrenaturais. Surgem relatos de diversos pedagogos que se dispuseram a trabalhar com surdos, apresentando diferentes resultados obtidos com essa prática pedagógica. O pro- pósito da educação dos surdos, então, era que estes pudessem de- senvolver seu pensamento, adquirir conhecimentos e se comunicar com o mundo ouvinte. Para tal, procurava-se ensiná-los a falar e a compreender a língua falada, mas a fala era considerada uma estra- tégia, em meio a outras, de se alcançar tais objetivos. Conforme Strobel (2008), houve várias iniciativas relevantes no processo da educa- ção de surdos, as quais devemos conhecer. A pesquisadora aponta haver registros de que por volta dos anos 700 d.C., a influência acerca de como os surdos poderiam se desenvolver ocorreu pelos ensinamentos de John Beverly, um bispo inglês. Ele foi a primeira pessoa a ensinar um surdo a se comunicar. Por esta razão, ele é lembrado como um dos pioneiros no processo de educação dos surdos. É pertinente acrescen- tar que o bispo Beverly é considerado pioneiro na educação de pessoas com deficiên- cia auditiva, mas o reconhecimento formal como primeiro professor para surdos foi dado a um monge beneditino chamado Pedro Ponce de León (1520–1584). 23 A partir de agora, teremos a oportunidade de conhecer alguns dos principais personagens da história que deixaram suas contribuições para a educação dos surdos, legado que nos dará a oportunidade de conhecer as abordagens nas quais esses personagens baseavam-se. Pedro Ponce de León dedicou-se à educação dos surdos de famílias nobres e ricas da corte espanhola. O monge Ponce ensinava a escrita, a datilologia e a oralização. Quadros (2006) relata que, apesar das contribuições realizadas por Ponce de León, por ocasião da fundação da primeira escola para surdos em um monastério de Valladolid, não há nada escrito sobre seu trabalho. Sabe-se que foi ele quem teria iniciado o ensino da escrita com os surdos, por meio dos nomes dos objetos e, con- sequentemente, passado ao ensino da fala, começando pelos elementos fonéticos. Nessa época, de acordo com Strobel (2008), na Itália, os monges faziam voto de silêncio, forçando a utilização da língua de sinais, a qual permitia a comuni- cação entre eles. Ponce de León estabeleceu a prática do voto de silêncio, o que o levou a desenvolver, com o passar do tempo, uma linguagem própria de comuni- cação, por meio de gestos. Segundo Santana (2015), o monge passou a dedicar-se ao ensino do sacramento e promovia sua comunicação com Deus, com isso, ele manteria próximos de si os pais do surdo nobre e suas contribuições financeiras. As marcações deixadas e as inferências de alguns personagens na história da educação dos surdos permeiam práticas pedagógicas quase que experimentais. Em 1450, no Período Renascentista, a surdez passou a ser analisada pela ótica médica. Segundo Strobel (2008), é importante conhecer a história do surdo a partir de três divisões temporais: UNICESUMAR UNIDADE 1 24 Na primeira fase, os povos surdos não tinham problemas com a educação. A maioria dos sujeitos surdos dominava a arte da escrita e há evidência de que antes do ano 1880 havia muitos escritores surdos, artistas surdos, professores surdos e outros sujei- tos surdos bem-sucedidos. Na segunda fase, depois do ano de 1880, ocorre uma fase de isolamento da comunidade sur- da como consequência do Con- gresso de Milão, o qual proíbe o acesso da língua de sinais na educação dos surdos. Nesta fase, as comunidades surdas resistem à imposição da língua oral. Descrição da Imagem: a figura mostra uma ilustração com três círculos em sequência, na horizontal. Da esquerda para direita, respectivamente, no interior do primeiro, do segundo e do terceiro círculo, estão os seguintes textos: 1. Na primeira fase, a maioria dos sujeitos surdos dominava a arte da escrita e há evi- dência de que, antes do Congresso de Milão, havia surdos ativos no campo do trabalho, como: escritores, artistas, professores, todos bem-sucedidos profissionalmente. 2. Na segunda fase, depois do ano de 1880, ocorre uma fase de isolamento da comunidade surda como consequência do Congresso de Milão, o qual proíbe o acesso da língua de sinais na educação dos surdos. Nesta fase, as comunidades surdas resistem à imposição da língua oral. 3. Na terceira fase, ocorreu o que Strobel (2008) descreve como o despertar cultural: a partir dos anos 1960, período em que se inicia uma nova fase para o renascimento na aceita- ção da língua de sinais e da cultura surda, após muitos anos de opressão ouvintista dos povos surdos. Figura 3 - Divisões temporais da história dos surdos / Fonte: adaptada de Strobel (2008). Na terceira fase, ocorreu o que Strobel (2008) descreve como o despertar cultural: a partir dos anos 1960, período em que se inicia uma nova fase para o re- nascimento na aceitação da lín- gua de sinais e da cultura surda, após muitos anos de opressão ouvintista dos povos surdos. 1 2 3 25 Apenas a partir do século XVIII, vemos avanço quanto a organizações que bus- cavam medidas e ações efetivas. Veremos que os experimentos estavam voltados a ações pedagógicas, Juan Pablo Bonet incentivava duas correntes pedagógicas: a oralizada e a gestual. Juan Pablo Bonet (1579–1623): padre espanhol que trabalhava com treina- mento da fala, datilologia e sinais, lançou o primeiro livro sobre a educação de surdos, em 1620. Strobel (2008) mostra que alguns estudiosos contestam frontal- mente a ideia de que Bonet teria descoberto como ensinar o surdo a falar e que esse feito poderia bem ser creditado a Ramires de Carrion, rival de Bonet e surdo congênito, o qual teria tido sucesso em um experimento e lançado, também, um livro, em 1629, contextualizando esse experimento. Apesar de Bonet valorizar a expressão e o treino oral nos primeiros anos de vida da pessoa, em suas práticas, ele empregava a comunicação gestual, ensi- nando a articulação das letras para apresentar as estruturas gramaticais. Bonet considerava importante, na comunicação dos surdos, o uso dos “gestos”, pois, na sua percepção, ajudava os não ouvintes na compreensão do significado das palavras. Bonet mesclava, na sua metodologia, um ensino pautado tanto pelo emprego dos gestos quanto pelo desenvolvimento da fala, assim, podemos afir- mar que seu método pode ser considerado a base para a Comunicação Total, metodologia de ensino que foi muito divulgada pelos professores. Conforme sinaliza Santana (2015, p. 12): “ O uso de gestos não é exclusivo dos surdos, pois pequenos ouvintes também os produzem e interpretam durante seu desenvolvimento. Pelo fato de a língua de sinais possuir um canal visuomanual, os sinais são confundidos, muitas vezes, com gestos. Contudo, uma sequência de gestos não implica uma língua. Percebam que as correntes pedagógicas migraram para dois mundos diferentes. A partir daqui, chegamos ao século VI, e as questões afetas aos procedimentos pedagógicos ainda não são bem claras ou definidas às pessoas surdas. Ora o uso dos gestos eram empregadas como estratégias de ensino, ora preconizavam as práticas na oralização. A seguir, conheceremos mais um personagem importante para a trajetória das pessoas surdas: Charles de l’Épée, um homem francês que transformou a vida de muitos surdos na França. UNICESUMAR UNIDADE 1 26 Charles Michael de l’Épée (1712–1789): as suas contribuições iniciaram-se quan- do ele conhece duas irmãs gêmeas surdas cuja comunicação ocorria por meio de gestos. Foi em Paris que o abade l’Épée intensificou seu trabalho, ao integrar-se pelas ruas da capital da França, com os surdospobres e andarilhos. Por meio dessa experiência, observou como os surdos se comunicavam e percebeu que os gestos cumpriam as mesmas funções das línguas faladas, permitindo a comuni- cação efetiva entre os surdos. Assim iniciou-se o processo de reconhecimento da língua de sinais e, além de aprender e valorizar a forma singular de comunicação sinalizada, l’Épée seguiu suas pesquisas, ampliando o conhecimento no sentido de compreender que a língua utilizada pelos surdos era eficaz e legítima. Este abade percebeu que os sinais permitiam a comunicação com os surdos e favorecia a aprendizagem, então, a partir destas constatações, ele idealizou o alfabeto manual francês em conformidade com os sinais usados pelos surdos. Na sequência, houve considerável avanço até que os surdos pudessem ler e escrever a língua francesa de forma convencional. É pertinente sinalizar que tal fato ocorreu com o auxílio do intérprete. Quadros (2006, p. 22) aponta o seguinte: “ No convívio com os surdos, o abade L’Epée percebe que os gestos cumpriam as mesmas funções das línguas faladas e, portanto, permi- tiam uma comunicação efetiva entre eles. E assim inicia-se o processo de reconhecimento da língua de sinais. Não apenas em discursos, mas em práticas metodológicas desenvolvidas por ele na primeira Escola Pública para Surdos em Paris. Além disso, para o abade, os sons arti- culados não eram o essencial na educação de surdos, mas sim a pos- 27 sibilidade que tinham de aprender a ler e a escrever através da língua de sinais, pois essa era a forma natural que possuíam para expressar suas ideias. A língua utilizada no processo educativo era a de sinais. Foi l’Épée o fundador da primeira escola de surdos que, mais tarde, por volta de 1791, tornou-se o Institute of DeafMutes — Instituto Nacional de Surdos-Mudos — de esfera pública. O método de ensino utilizado pelo abade baseava-se nas língua de sinais, metodologia a qual se apresentou eficaz no processo educacio- nal. As bases das pesquisas de l’Épée foram promissoras e espalharam-se pelo mundo, haja vista que escolas do mundo inteiro recebiam pessoas interessadas na educação do surdo, incluindo professores surdos. Por todas as suas contribuições na esfera da educação, l’Épée ficou conhecido como o Pai da Escola Pública e o Pai dos Surdos, pois defendeu o uso da língua de sinais em detrimento do oralismo bem como fez publicações acerca do ensino dos surdos e mudos por meio de sinais metódicos, os quais, segundo o professor, seriam a real forma de instruir os chamados, à época, surdos-mudos. O abade colocou as regras sintáticas e, também, o alfabeto manual inventado pelo Pablo Bonet, que, mais tarde, foi transformado em uma obra completa, junto com a teoria, pelo abade Roch-Ambroise Sicard. Quadros (2006, p. 23) sinaliza que, na época: “ A educação de surdos tinha os mesmos objetivos que a educação dos ouvintes, ou seja, o acesso à leitura. Para o abade, a comunicação em sala de aula se efetivava graças ao domínio que ambos, professo- res e alunos, tinham da língua de sinais. Portanto, não se justificava poucos alunos surdos nesse espaço, mas sim classes com a mesma arquitetura das escolas públicas para ouvintes. Sendo a língua de sinais a essência no processo pedagógico, os resultados alcançados não se restringiam ao pequeno círculo de alunos contemplados no trabalho do monge beneditino Pedro Ponce de Leon. Como pioneiro na formação e na educação gestualista, l’Épée foi o primeiro a estu- dar uma língua de sinais usada pelos surdos, com atenção direcionada às peculiari- dades linguísticas. Destacamos que o contato com o povo surdo proporcionou ao abade verificar, com mais atenção, como os surdos desenvolviam sua comunicação, considerando todo aparato viso-gestual, muito satisfatório e eficaz entre eles. Isso despertou em l’Épée o interesse em conhecer a linguagem gestual, então, o abade UNICESUMAR UNIDADE 1 28 desenvolveu um método educacional apoiado na linguagem de sinais da comuni- dade de surdos, acrescentando a esses sinais elementos que tornavam sua estrutura mais próxima à língua francesa, denominando este sistema “sinais metódicos”. Segundo Lacerda (1998, on-line), a primeira caracterização de uma língua de sinais usada entre pessoas surdas encontra-se nos escritos do abade l’Épée. É inte- ressante apontar que muitos dos estudos elaborados foram mantidos apenas com um pequeno grupo de pessoas e interessados, só mais tarde, suas técnicas foram divulgadas e apresentadas a um público maior, no ano de 1776, com a publicação de um livro. Este material foi elaborado de forma coletiva, pois nele eram expres- sas as experiências da comunidade envolvida. Tais práticas beneficiaram o povo surdo, proporcionando condições de aperfeiçoamento, justamente porque as trocas provocavam, sob os aspectos culturais, novas relações mais significativas. Na ocasião, l’Épée, como pesquisador, sentiu-se orgulhoso, pois se apresentava à sociedade como uma pessoa que rompia com os padrões estipuladas na época, afinal, suas ideias eram contrárias à educação estabelecida aos surdos. O abade classificou a participação dos surdos de forma positiva, porque puderam demons- trar suas opiniões e habilidades, expressando-se, com êxito, em francês, na língua escrita, ou seja, os surdos sinalizaram a língua de sinais francesa, demonstrando os sentimentos, os posicionamentos acerca da sua própria educação e forma de comunicação. Na ocasião, os agentes envolvidos puderam avaliar e discutir sobre os problemas existentes, marcando um novo rumo nos processos educativos. Para l’Épée, a linguagem de sinais é concebida como a língua natural dos surdos e como veículo adequado para desenvolver o pensamento e sua comuni- cação (LACERDA, 1998, on-line). Na literatura, há autores, como Perlin e Strobel (2008), que sinalizam o fato de a educação e a história do surdo não serem difíceis de analisar e compreender. As autoras acreditam que a história evolui, continua- mente, apesar de vários impactos marcantes. No entanto vivemos momentos históricos caracterizados por mudanças e isso contribui na evolução, o que nos permite compreender a forma como o povo surdo se comunica. As pesquisas realizadas pelos autores citados aqui são processos importantes para a epistemologia da linguística de língua de sinais ao redor do mundo. Foi a partir de tais pesquisas que se instituiu o alfabeto manual, o qual passou a ter muita importância à vida acadêmica do povo surdo, afinal, por meio do seu uso, ampliou-se o ensino e a aquisição da língua escrita, independentemente de qual fosse o idioma. Veja, a seguir, na Figura 4, como se caracteriza o alfabeto manual na língua de sinais. 29 Figura 4 - Alfabeto manual de língua de sinais Fonte: a autora. Descrição da Imagem: a figura mostra uma série de pequenas fotografias coloridas que apresentam mãos executando o alfabeto manual de Libras, fotografias essas expostas e divididas por círculos. Cada círculo apresenta uma letra, seguindo a ordem alfabética. As- sim, o primeiro círculo inicia-se com a letra A e finaliza com a letra Z, totalizando as 26 letras do alfabeto. UNICESUMAR UNIDADE 1 30 O alfabeto manual ou alfabeto digital de línguas de sinais representou muito para a comunidade surda, porque, até a atualidade, é um recurso cujo papel é legitimar a comunicação, o domínio da língua escrita como segunda língua do surdo. Sabemos que, nas tentativas iniciais de educar o surdo, as atenções estavam voltadas à fala e à língua escrita: “ Os alfabetos digitais eram amplamente utilizados. Eles eram inven- tados pelos próprios professores, porque se argumentava que se o surdo não podia ouvir a língua falada, então ele podia lê-la com os olhos. Falava-se da capacidade do surdo em correlacionar as pala- vras escritas com os conceitos diretamente, sem necessitar da fala. Muitos professores surdos iniciavam o ensinamento de seus alu- nos através da leitura-escrita e, partindo daí,instrumentalizam-se diferentes técnicas para desenvolver outras habilidades, tais como leitura labial e articulação das palavras (LACERDA, 1998, on-line). A função do alfabeto manual na Libras ou em outra língua de sinais é a de soletrar manualmente as palavras, sendo muito utilizada por falantes desta língua. A leitura labial é uma técnica que estava atrelada com a metodologia oralista, mas isso não significa que todos os surdos submetidos a esta metodologia conseguiam dominá-la. Thomas Opkins Gallaudet (1787–1851): movido pelo desejo de fundar uma escola para surdos nos Estados Unidos, foi à Europa, em 1816, com o intuito de obter informações e, na França, conheceu Laurent Clerc. Am- bos foram juntos aos Estados Unidos, Clerc ensinava a língua de sinais a Gallaudet e este ensinava o inglês a ele. Em 1817, os dois fun- daram a primeira escola para surdos nos Es- tados Unidos, cuja língua de instrução era a língua de sinais. Assim como na Europa, essa língua ganhou espaço, e a maioria dos pro- fessores de indivíduos surdos começaram a utilizá-la como ferramenta de comunicação e conhecimento nas escolas do país. 31 A identidade cultural reforça as potencialidades e a condição humana do surdo de maneira natural e consistente, conferindo a ele uma identificação política, reconhecendo seus direitos e as necessidades de se expressar e de ocupar seus espaços no meio social, o que consolida a cidadania dele na sociedade ouvinte. Não podemos ignorar que a história dos surdos é marcada por muitos problemas sociais que prejudicam o desenvolvimento e o processo educacional. É justo escla- recer que mencionamos o descaso com o processo escolar da pessoa surda desde o início da escolarização dela, situação a qual denuncia as práticas ancoradas nas repetidas experiências opressoras tanto nos espaços educacionais quanto nos es- paços sociais. Tudo isso demonstra os progressivos desinteresse e desvalorização com a subjetividade comunicativa das pessoas surdas. Em 1880, em Milão (Itália), foi realizado o II Congresso Internacional, no período de 6 a 11 de setembro e, historicamente, este evento é considerado até os dias atuais, um desmonte às conquistas em relação à educação do surdo para épo- Descrição da Imagem: a figura apresenta uma ilustração em preto e branco de Charles Michel de l’Épée ensinando a linguagem de sinais para um aluno. l’Épée é um homem com cabelos escuros na altura do ombro, usando um hábito preto e está sentado em uma cadeira com a mão direita posicionada na altura do peito, executando um sinal com ela. De frente para o homem, está uma criança, em pé, com cabelos escuros na altura do ombro, segurando um papel com o alfabeto na mão esquerda, executando com a mão direita o mesmo sinal do homem à sua frente. Figura 5 - Charles Michel de l’Épée ensinando por meio da linguagem de gestos Fonte: López (2018, on-line). UNICESUMAR UNIDADE 1 32 ca, pois as ideias discutidas deram sustentação à abordagem de ensino baseada na perspectiva oralista, provocando fortes mudanças nos rumos da educação de surdos. O Congresso de Milão reuniu 182 pessoas ouvintes, representando Bélgi- ca, França, Alemanha, Inglaterra, Itália, Suécia, Rússia, Estados Unidos e Canadá. NOVAS DESCOBERTAS Confira o artigo “As Atas Oficiais de Milão (1880) e a Necessária Rees- crita da História das Práticas de Educação de Surdos”, para saber mais sobre as influências e consequências do Congresso Internacional de Mi- lão. Neste artigo, os autores analisam as atas oficiais do evento, redigi- das por Fornari, e suas implicações nas práticas da educação de surdos. As pautas defendidas no evento tinham como prio- ridade as ideias debatidas por representantes ou- vintes. Cabe mencionar que, na ocasião, apesar da pouca presença de pessoas surdas e das discussões serem direcionadas quanto ao desenvolvimento de- las nas instituições de ensino, mesmo presentes, os surdos não tiveram o poder de decisão, portanto, não foram ouvidos. Os congressistas tinham como um dos propósitos unir pessoas que fortalecessem, de forma legal, as ideias discutidas. Aqui, percebe- mos a crescente necessidade de apoio generaliza- do, para que, posteriormente, fossem divulgados os resultados do Congresso, culminando em novas diretrizes que determinassem as novas práticas na educação dos surdos. A base central de discussão no congresso esta- va ligada ao ato de avaliar o ensino para os surdos com base em três abordagens pedagógicas: https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/23955 33 Descrição da Imagem: a figura mostra uma ilustração colorida com três caixas de texto, sendo a primeira: “Língua de Sinais: Se caberia continuar no processo educacional, com práticas que valorizassem o método e o uso da língua de sinais”; a segunda: “Metodologia Oralista: Aqui está a cereja do bolo do evento, pois desenvolveram todo o congresso para discutir a importância de ensinar aos surdos a oralização”; e a terceira: “Metodologia Mista (língua de sinais e oralismo): Situações que geraram polêmicas no processo educacional pelos opostos entre a língua de sinais e o oralismo”. Figura 6 - Abordagens pedagógicas do ensino para surdos / Fonte: a autora. Língua de Sinais: Se caberia continu- ar no processo educacional, com práticas que valor- izassem o método e o uso da língua de sinais. Metodologia Oralista: Aqui está a cereja do bolo do evento, pois de- senvolveram todo o congresso para discutir a importân- cia de ensinar aos surdos a oralização. Metodologia Mista (língua de sinais e oralismo): Situ- ações que geraram polêmicas no pro- cesso educacional pelos opostos entre a língua de sinais e o oralismo. Segundo Lacerda (1998, on-line): “ O método alemão vinha ganhando cada vez mais adeptos e estenden- do-se progressivamente para a maioria dos países europeus, acompa- nhando o destaque político da Alemanha no quadro internacional da época. As discussões do congresso foram feitas em debates acaloradís- simos. Apresentaram-se muitos surdos que falavam bem, para mostrar a eficiência do método oral. Com exceção da delegação americana (cinco membros) e de um professor britânico, todos os participan- tes, em sua maioria europeus e ouvintes, votaram por aclamação a aprovação do uso exclusivo e absoluto da metodologia oralista e a proscrição da linguagem de sinais. Acreditava-se que o uso de gestos e sinais desviasse o surdo da aprendizagem da língua oral, que era a mais importante do ponto de vista social. As resoluções do congresso (que era uma instância de prestígio e merecia ser seguida) foram de- terminantes no mundo todo, especialmente na Europa e na América Latina. As decisões tomadas no Congresso de Milão levaram a que a linguagem gestual fosse praticamente banida como forma de comu- nicação a ser utilizada por pessoas surdas no trabalho educacional. 1 2 3 UNICESUMAR UNIDADE 1 34 No âmbito escolar, a ideia de “incapacidade” deu aos congressistas a força que necessitavam, junto dos apoiadores, para divulgar e implementar práticas educacionais, apontando os novos rumos acerca das práticas educativas dos surdos. O Congresso de Milão, por meio das parcerias instituídas, teve repre- sentação marcante para a comunidade surda, resultando na eliminação de qualquer forma de comunicação realizada com a língua de sinais. Os efeitos do congresso romperam com as boas relações e vínculos estabelecidos no fortalecimento da educação da pessoa surda, ou seja, na convivência tolerada, na educação dos surdos, entre a linguagem falada e a gestual. Segundo Quadros (2006), no congresso, houve momentos de tensões, princi- palmente na hora da deliberação, porque os congressistas tomaram suas decisões sem consultar ou dar importância à minoria interessada (os surdos). Assim, por meio da agitação e do confronto de um grupo de ouvintes, ficou imposta a supe- rioridade da língua oral sobre a língua de sinais. De forma legal, ficou decretado que a primeira deveria constituiro único objetivo do ensino e que o método oral, na educação de surdos, deveria ser prioridade em relação à forma gestual, pois, as palavras eram, segundo os ouvintes, superiores. Conforme afirma a autora: “ Nesse Congresso, que no momento da deliberação não contava com a participação nem com a opinião da minoria interessada – os surdos -, um grupo de ouvintes impôs a superioridade da língua oral sobre a língua de sinais e decretou que a primeira deveria constituir o único objetivo do ensino. A discussão foi extrema- mente agitada e, por ampla maioria, o Congresso declarou que o método oral, na educação de surdos, deveria ser preferido em relação ao gestual, pois as palavras eram, para os ouvintes, indubi- tavelmente superiores aos gestos (QUADROS, 2006, p. 26). 35 Dessa forma, a partir do Congresso de Milão, no mundo todo, os representan- tes concordaram sob o ponto de vista político, com as abordagens pedagógicas ouvintistas, redefinindo as práticas educativas aos surdos. Tais práticas, agora reformuladas, foram difundidas e desenvolvidas por um século, sendo o objetivo eliminar quaisquer práticas que valorizassem o uso da língua dos sinais. A abor- dagem adotada pela maioria dos países presentes no congresso foi a reabilitação da fala e o treinamento auditivo. Por 100 anos, os surdos foram privados de um processo de educação que valorizasse as suas necessidades comunicativas e suas particularidades linguísticas. Segundo Carneiro e Soares (2017, p. 20): “ Para conseguirem seus objetivos, os oralistas apresentaram diversos surdos que falavam bem e, na assembleia de encerramento, realizada no dia 11 de setembro de 1880, com exceção dos cinco membros ame- ricanos e de um professor britânico, todos os participantes, em sua maioria europeus e ouvintes, votaram por aclamação a aprovação do uso exclusivo e absoluto da metodologia oralista, proibindo, a partir de então, a utilização da linguagem de sinais na educação de surdos. Durante o congresso, houve uma abertura singela de participação de pessoas surdas, os organizadores tinham como objetivo mostrar que a abordagem ora- lista era eficaz, mesmo com um número reduzido de estudantes surdos. Assim, é preciso reconhecer que os organizadores do congresso permitiram a alguns (poucos) surdos que conseguiam falar uma breve participação. Evidências históricas mostram que muitos surdos profundos (as pessoas as quais não têm qualquer resquícios de audição, ou seja, não ouvem absolutamente nada) apresentam perda auditiva superior a 90 decibéis. Conheça, por meio do Quadro 1, os níveis da perda de audição: UNICESUMAR UNIDADE 1 36 Categoria de perda da audição Conceitualização Perda auditiva leve 26 a 40 dB Não tem efeito significativo no desenvolvi- mento. Geralmente, não é necessário uso de aparelho auditivo. Perda auditiva moderada 41 a 55 dB Pode interferir no desenvolvimento da fala e da linguagem, mas não chega a impedir que o indivíduo fale. Perda auditiva severa 70 a 90 dB Interfere no desenvolvimento da fala e lingua- gem, mas, com o uso de aparelho auditivo, o indivíduo poderá receber informações, por meio da audição, para o desenvolvimento de fala e da linguagem. Perda auditiva profunda + 91 dB Sem intervenção, a fala e a linguagem dificil- mente ocorrerão. Quadro 1 - Grau de perdas auditivas / Fonte: a autora. A surdez é dividida em quatro graus: leve, moderada, severa e profunda. Os graus são definidos pelos decibéis que o sujeito, após passar por exame audiométrico, é capaz de perceber. Assim, considerando a gravidade da surdez desses indivíduos, concluiu-se que não se desenvolveram de forma satisfatória, pois, apesar de todos os esforços, naquela ocasião, as pessoas surdas demonstraram fala inadequada. Neste caso, os especialistas da educação concluíram que os surdos não consegui- ram alcançar desenvolvimento satisfatório, conforme o padrão desejado. Embora houvesse pessoas surdas no congresso, ainda que de forma singela, os professores surdos foram impedidos do direito ao voto, impulsionando a mudança desejada pela maioria, portanto, venceu a proposta de ensino baseada no oralismo. Devemos assinalar que, no congresso, existiu alta correlação entre a comunida- de ouvinte e os que apoiaram a decisão oportuna do método oralista. O resultado foi muito prejudicial ao desenvolvimento de muitos surdos, o que pôde ser confe- rido pelo fracasso escolar, situação a qual culminou em notas baixas, reprovação e abandono das atividades escolares. Segundo Lacerda (1998, on-line), as dificuldades enfrentadas pelos surdos não estavam ligadas apenas ao desenvolvimento da fala ou aos fracassos escolares, mas também ao processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita, afinal, estas práticas educativas ocorriam tardiamente, culmi- nando em sérios problemas com a alfabetização e o letramento. Nesta situação, os 37 surdos eram expostos, mas suas dificuldades permaneciam, mesmo após anos de escolarização baseadas na abordagem oralista. Ainda sobre as atrocidades que aconteceram com as pessoas surdas, lembra- mos que, no período da Segunda Guerra Mundial, a história mostrou que essas pessoas foram alvo do plano de extermínio da política nazista. Os surdos, junto com os judeus e os ciganos, as pessoas com deficiência física ou mental, chamadas de impróprias, deveriam ser eliminadas da comunidade alemã. Segundo Silva e Spelling (2018, p. 167-168): “ Quando homens e mulheres com surdez hereditária eram encontra- dos, era emitida uma carta endereçada a eles ou a seus pais, solicitando que comparecessem ao hospital mais próximo nas duas semanas se- guintes para se submeter a processo de esterilização. Se a ordem não fosse cumprida, eram caçados e levados de casa à força. Essas pessoas eram, então, mais propensas a serem maltratadas durante a cirurgia, porque eram vistas como difíceis e merecedoras de uma lição punitiva. [...] como judeus (6 milhões de mortos), ciganos (1,5 milhão), homos- sexuais (15 mil), pessoas com deficiências (250 mil), entre outros. [...]. Aqui, percebemos que as pessoas surdas eram consideradas pessoas com defi- ciência, portanto, pela suas condições consideradas limitantes, eram levadas à morte. Os surdos também sofreram as consequências das práticas nazistas. Os autores apontam que tais ordens geraram um total aproximado de 58 milhões de mortes, entre civis e militares. NOVAS DESCOBERTAS Título: O Milagre de Anne Sullivan Ano: 1962 Sinopse: a história acontece num cenário de família nobre que re- trata a tarefa de Anne Sullivan (Anne Bancroft), uma professora, de fazer com que Helen Keller (Patty Duke), uma garota cega, surda e muda, adapte-se e entenda, pelo menos, em parte, as coisas que a cercam. Para isso, Sullivan entra em confronto com os pais da menina, que sempre sentiram pena da filha e, devido aos excessos de cuidados e mimos, a priva- ram de conhecer e experimentar o mundo à sua volta. UNICESUMAR UNIDADE 1 38 Aspectos históricos da educação do surdo no Brasil Por influência da Família Real — a família de Dom Pedro II — a educação de surdos no Brasil começa a existir em 1855, com a chegada do educador francês Ernest Huet, a convite do próprio imperador. Assim, o professor Huet chega ao Brasil para exercer sua profissão, com o intuito de direcionar a educação com foco no ensino eficaz ao povo surdo. Destacamos que o principal interesse de D. Pedro II, ao implementar o instituto para o ensino de surdos no Brasil, deu-se pelo fato de a Princesa Isabel ser mãe de um filho surdo e casada com o Conde D’Eu, o qual era parcialmente surdo. Após a chegada de Huet, no ano de 1857, foi fundado o Imperial Instituto de Surdos Mudos, por meio da Lei nº 939, de 26 de setembro de 1857. A presença do professor Huet fomentou o movimento e a implantação do Instituto Nacional do Ensino de Surdos (INES), e ressaltamos que, na atua- lidade, o INES é uma referência educacional para os surdos. Não podemos deixar de esclarecerque o surgimento do Instituto teve repercussão devido à influência de Dom Pedro II. Com isso, o Brasil abriu um espaço onde o papel exercido pelo professor Huet intensificou-se e sua prática educativa teve forte influência da metodologia educacional implantada e difundida na França, pois o professor priorizava o ensino da língua de sinais, utilizando o nosso alfabeto manual, o qual é muito semelhante ao da França. Veja, na Figura 7, uma foto do professor Ernest Huet. Descrição da Imagem: a figura mostra uma fotografia em preto e branco de Ernest Huet. Ele é um homem na faixa etária dos 50 anos, tem bigode e cabelos escuros. Está sentado, veste camisa branca, uma gravata peque- na e escura, terno, colete e calça preta. Figura 7 - Professor Ernest Huet Fonte: Wikimedia Commons ([1867], on-line). 39 Ernest Huet, chamado também de Eduard Huet, tem imensa importância para a comunidade surda brasileira e para a história da Libras (Língua Brasileira de Sinais). Nascido em 1822, na cidade de Paris, pertencia a uma família da nobreza francesa, portanto, teve oportunidades de frequentar as melhores escolas. Na adolescência, aos 12 anos, foi acometido pelo sarampo, doença que o deixou surdo. Mesmo de- pois de apresentar surdez, Huet conseguiu aprender espanhol e começou a estudar no Instituto Nacional de Surdos de Paris. Após muitos anos de comprometimen- to com os estudos, conquistou a formação de professor e, depois disso, enquanto atuava na França, recebeu o cargo de diretor do Instituto de Surdos de Bourges. É importante destacar que Huet falava, com fluência, o português e alemão. NOVAS DESCOBERTAS Neste estudo, estamos vendo como aconteceu a implementação do Instituto de Educação para Surdos, aqui, no Brasil, quando o professor surdo Huet veio, na época do Império. Há um documento bem impor- tante sobre isso no repositório Huet Digital, é uma carta escrita à mão, em francês, em 1855, pelo professor. Ela tem valor histórico enorme e representa muito tanto à sociedade em geral quanto à comunidade surda. Além de ver este documento, você também pode visitar o site e ver outros materiais legais presentes no repositório virtual. Vejam que a história da educação das pessoas surdas influenciou estudos pelo mundo afora, resultando no desenvolvimento de pesquisas mais enriquecedoras com enfoque na língua de sinais. No Brasil, não foi diferente. A vinda de Huet ini- ciou investigações relacionadas à língua de sinais que começaram a compreender a pessoa surda como uma pessoa com diferença cultural e, consequentemente, admitiu-se que a língua de sinais era uma língua própria dos surdos. Segundo Lopes (2011, p. 8), as mudanças no cenário brasileiro ocorreram quando: “ A expressão ‘Estudos Surdos’ surgiu no Brasil a partir de uma ten- tativa de tradução dos chamados deaf studies, que eram realizados por pesquisadores de outros países, principalmente dos Estados Unidos. É difícil e aqui, pouco relevante, determinar a origem dos deaf studies; mas, com alguma segurança, pode-se afirmar que UNICESUMAR https://academiadelibras.com/libras/historia-da-libras/ https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20631 UNIDADE 1 40 o linguista William Stokoe foi um dos primeiros pesquisadores que, em torno de 1960, começaram a produzir nesse campo. Ele utilizava critérios linguísticos para afirmar outro status para a lín- gua de sinais. Em contraposição a Saussurre que acreditava que a língua de sinais se tratava de um sistema semiótico elaborado, Stokoe descreveu a Língua Americana de Sinais como uma lín- gua natural de um grupo cultural específico. Com tal afirmação, Stokoe tornava visível que a ‘estrutura cultural’ dos sujeitos surdos é constituída de outra forma, na medida em que a língua está es- tritamente vinculada à cultura. Vinte anos depois desses estudos iniciais, Stokoe (1980) publicou Sign and culture, insistindo na relação entre comunidade, cultura, língua e comunicação. No Brasil, a partir da década de 1990, diferentes estudos fomentaram discussões acerca da educação dos surdos. Historicamente, este marco, ao longo dos anos, vem promovendo reflexões em relação à educação de qualidade bem como o pa- pel do Estado nesse cenário, revelando a investigação, a pertinência social da luta e dos movimentos pelos direitos dos alunos surdos. Um dos principais desafios para as instituições educativas, na atualidade, é promover educação de qualidade, somando a tal desafio a educação de qualidade sob a perspectiva bilíngue. A percepção social acerca do surdo ainda considera a sua condição restrita, mesmo com os avanços ocorridos na concepção de inclusão, sobretudo na edu- cação, na década de 1990, com a Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB), em seu art. 3º, que trata dos princípios os quais regem o ensino: “[...] XIV - respeito à diversidade humana, linguística, cultural e identitária das pessoas surdas, surdo-cegas e com deficiência auditiva” (BRASIL, 1996, on-line). O respeito de componentes relacionados à identidade da pessoa surda, como sua língua e sua cultura, demonstra a intenção de realçar a condição de sujeito e de cidadão do surdo, com direito de participar plenamente do processo educa- tivo e das atividades sociais, atendendo a suas necessidades de forma que possa realizar seus anseios e seus objetivos. No passado, isso não acontecia, contudo é importante reconhecer que ainda há dificuldades para que, de fato, se concretize o devido respeito proposto pela referida lei, não somente no âmbito educacional, mas também no meio social, pelo fato de a sociedade, no tratamento dispensado 41 ao surdo, ser mediada pela perspectiva do ouvinte. Esta é ainda cultivada em algumas famílias, situação a qual denota o desconhecimento dos avanços legais relacionados à comunidade surda, conforme destaca a seguinte afirmação: “ Entretanto, vale lembrar que embora as conquistas dos surdos sejam legalmente reconhecidas, nem sempre são socialmente aceitas. A situa- ção do indivíduo surdo ainda é bastante peculiar, considerando que a maioria provém de famílias ouvintes que utilizam apenas a língua oral como forma de comunicação e de interação (LEANDRO, 2017, p. 15). A sociedade ouvinte nem sempre consegue superar os conceitos estabelecidos em relação à surdez, a qual é identificada por alguns como uma patologia, por desco- nhecimento do significado atribuído à cultura surda, mantendo, assim, uma postura que valoriza a oralização como principal recurso de comunicação. Nessa situação, mesmo com os avanços legais, a sociedade ouvinte coloca “[...] o surdo como pro- duto social da exclusão, sem corpo, sem vontade e sem futuro. Futuro inalcançável pelo excesso de barreiras colocadas pela sociedade ouvinte” (ROSA, 2009, p. 34). Percebemos que a problemática persistente em relação ao surdo na sociedade ou- vinte é a intenção de adequá-lo ao processo de oralização, para que ele possa seguir os modelos culturais em vigência. Esse processo considera a concepção de normalidade, ou seja, o padrão de conduta aceitável à existência da convivência harmoniosa, sendo que essa concepção relacionada ao “normal”, ao padrão imposto pela comunidade ou- vinte nas práticas educativas, não atende nem às particularidades das pessoas surdas, nem às demais pessoas que possuem alguma restrição sensorial, física ou intelectual. Por inúmeros fatores, foram feitas várias tentativas de “normalizar” os surdos, ensinando-os a oralizar e a fazer leitura labial, bem como foram feitas tentativas de criar aparelhos e tecnologias auditivas para auxiliar os surdos nesse processo. A partir de uma visão mais completa e específica, surgem, no campo educacio- nal, alguns parâmetros conceituais que compreendem as diferenças, mas é neste campo que muitas ações de discriminação de se fortalecem. Na busca de normalizar a vida dos surdos, uma nova concepção tomou conta do repertório de muitos professores, em defesa da escola ideal, porém, em mui- tosdos casos, negligenciou-se que, neste espaço, há alunos com necessidades UNICESUMAR UNIDADE 1 42 educativas especiais. Aqui, os ideais se perdem, pois o ensino passa a ser com- preendido como comum, apesar de alguns estudantes precisarem de ensino di- ferenciado. Tal cenário, certamente, se fortalece à medida que se busca enquadrar todos na mesma régua, a régua da normalidade. Tal concepção trouxe ao universo educacional profundas consequências as quais impulsionaram práticas comuns em várias escolas pelo mundo. Do ponto de vista do sistema educacional, a comunidade escolar não avalia os problemas que as escolas enfren- tam, como: a aprendiza- gem, o funcionamento da instituição, a flexibi- lidade de ensino. Assim, a escola mantém mode- los de intervenção com mais rigidez, pois, sa- bemos que, hoje, o tipo de ensino desenvolvi- do em uma instituição educacional pode ori- ginar ou intensificar as dificuldades. Assim, durante longos anos, a escola deixou de exer- cer sua principal função democrática, excluindo alunos com características deficitárias (as quais nem sempre estão relacionadas aos alunos, mas sim à escola). Este conjunto de ações demonstram, de certa forma, o despreparo das instituições escolares. Mesmo diante de um histórico de vida opressora e limitante, a passos lentos, os surdos tiveram importantes avanços no processo de inclusão social e educa- cional. É pertinente destacar que a concepção clínica da surdez não se sustenta mais, pelo fato de se caracterizar como uma restrição sensorial que ocasiona 43 dificuldades na recepção e percepção de sons, mas a qual não compromete a capacidade de aprendizagem e de socialização, tampouco a capacidade de pessoa produtora e consumidora de cultura. A percepção adequada da surdez corresponde a uma particularidade do su- jeito surdo, que não o impede de ter qualquer tipo de vivência, sobretudo pela sua capacidade de desenvolver habilidades para compensar o fato de não ouvir sons, sendo que as limitações são oriundas, na maioria das vezes, das perceptivas cultivadas pela sociedade ouvinte. Daí a importância da presente reflexão encon- trar subsídios os quais contribuam para desenvolver e conhecer, de certo modo, os caminhos e as abordagens que conceituam os aspectos históricos, culturais e legais da educação do surdo no mundo e no Brasil. Outro aspecto a ser destacado é a crescente valorização da cultura surda, um referencial que consegue mobilizar a comunidade surda e fortalecer as suas causas, na tentativa de constituir uma realidade compatível com o respeito, a dignidade e a cidadania junto à sociedade ouvinte, demarcando a combatividade dessa comunidade em constituir uma realidade mais inclusiva e que atenda aos seus anseios e direitos (BASTOS, 2013). A perspectiva cultural orienta as ações das pessoas surdas no meio social, no sentido de realçar que suas particularidades, sobretudo as linguísticas — esta, neste caso, precisa ser considerada um fator de inclusão — possibilitam uma relação com os ouvintes, enriquecendo ambos, surdos e ouvintes, pelo intercâmbio de experiên- cias. Apesar de o surdo estar inserido na sociedade ouvinte, ele não pode perder a sua identidade cultural ou se fragmentar em metade surdo e metade ouvinte. O surdo deve ser sempre surdo, não importando em que lugar ele esteja, e os ouvintes precisam aprender a se relacionar com ele, da mesma forma que os surdos precisam aprender a estabelecer um relacionamento com os ouvintes, a fim de existir verda- deira interação entre ambas as partes (SANTOS JÚNIOR, 2020). Concluímos este tópico conhecendo a importância dos pioneiros na iniciativa da educação dos surdos. Dentre os autores que tiveram representabilidade na educação dos surdos, destacamos: Pedro Ponce de Léon, Juan Pablo Bonet e John Beverly. Apesar das frequentes interferências dos pesquisadores, dos avanços e retrocessos, foi apenas após dois séculos que um religioso francês chamado Mi- chel de l’Épée criou um método de ensino às pessoas surdas na França, iniciando a prática do gestualismo. Esta prática de ensino é a que mais se aproxima da educação oferecida, na atualidade, aos estudantes surdos no Brasil e no mundo. UNICESUMAR UNIDADE 1 44 Percebemos até aqui que o estudo da história de surdos tornou-se uma fonte de prazer e novas descobertas. Após adentrarmos aos fatos apontados, conquistamos muitas descobertas e aprendemos sobre os principais acontecimentos registrados ao longo da história da humanidade. A história como fonte de estudos e pesquisa, dentre vários outros encargos, nos auxilia na compreensão de como a sociedade se organizava, trazendo informações de como as pessoas viveram no passado. Assim, entendemos este processo como fenômenos sociais dos vários territórios que provocam as transformações. No caso da história dos surdos, estudamos como as metodologias educa- cionais e práticas sociais foram percebidas pela sociedade, as principais ordens intrínsecas ao indivíduo surdo e quais foram as prioridades que determinavam a forma de organização pela sociedade, em tempos remotos. Além disso, perce- bemos que estudar o passado é importante, porque nos ajuda a compreender o contexto atual, assim, percorremos não só mesmas trilhas da história, mas, a partir das lentes escolhidas, vimos como os acontecimentos são fontes de conhecimento, aprimoramento e organização da vida em sociedade. Em conformidade com os fatos apresentados nesta unidade, daremos sequên- cia aos estudos, tendo como prioridade nos aprofundar no processo de desenvol- vimento da educação dos surdos, trazendo a você novas experiências, para extrair e reestruturar os conceitos e significações acerca da cultura e identidade surdas. NOVAS DESCOBERTAS Título: Surdez & Educação Autora: Maura Corcini Editora: Autêntica Sinopse: este livro faz parte da série Temas & Educação, voltada a educadores, pesquisadores e estudantes. Sobre a proposta deste livro, a autora diz: “Não nego a falta de audição do corpo surdo, porém desloco meu olhar para o que os próprios surdos dizem de si quando articulados e engaja- dos na luta por seus direitos de se verem e de quererem ser vistos como sujei- tos surdos, e não como sujeitos com surdez. […] Rompendo com as interpre- tações e os usos fundados em bases clínicas e em bases que a declaram uma anormalidade, a surdez, vista como presença de algo (e não a falta de algo), possibilita outras formas de significação e de representações de surdos”. 45 Cultura surda e identidade surda: conceitos e significações Para iniciarmos a discussão proposta neste subtítulo, é necessário esmiuçar o termo “identidade”, a fim de compreendermos como este conceito vem sendo discutido na teoria social e quais os processos que provocam mudanças na for- mação da identidade. A partir de múltiplas significações de pertencimento, é pertinente conhecer, de forma mais ampla, o que os autores têm discutido sobre “identidade”. Dessa forma, avançaremos para os campos sociológico, filosófico, e epistemológico bem como para os aspectos das questões contemporâneas. Culturalmente, somos reflexos e frutos das nossas experiências, a questão da identidade está relacionada com a construção do perfil. De acordo com Santos (2005, p. 124), “ o processo de identidade é um processo dinâmico de interação entre, por um lado, as características individuais, consciência e os construtos organizados do sujeito e, por outro, as estruturas físicas e sociais e os processos de influência que constituem o contexto social. Nesse sentido, a construção da identidade pessoal aparece, assim, definida como um lugar determinado, que integra as esferas psíquica e sociocultural, portan- to, a identidade é um conceito discutido pela teoria social. Nesta concepção, a identidade é resultado das relações sociais, culturais, é entendida como parte de um processo amplo de mudanças que recebe e organiza as diversas mensagens transmitidas pelos diversos contextose suas sobreposições, em suma, a identida- de estabelece-se e altera-se a partir das relações. Dito isso, correlacionando com o que expressam Silva, Medeiros e Schwengber (2022, p. 13): “[a] aquisição da linguagem e da comunicação para os sujeitos surdos durante seu processo de formação e escolarização é imprescindível para o exercício da afirmação de sua alteridade, é a condição que marca suas existências”. Portanto, a identidade se fortalece nestas relações com as experiências de linguagem. Segundo Hall (2006), para discutir a “identidade”, é relevante compreendê-la a partir de três concepções: a) sujeito do Iluminismo; b) sujeito sociológico; c) sujeito pós-moderno. UNICESUMAR UNIDADE 1 46 “ O sujeito do Iluminismo estava baseado numa concepção da pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, dotado das capacidades de razão, de consciência e de ação, cujo ‘centro’ consis- tia num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o sujeito nascia e com ele se desenvolvia, ainda que permanecendo essencial- mente o mesmo - contínuo ou ‘idêntico’ a ele - ao longo da existência do indivíduo. O centro essencial do eu era a identidade de uma pessoa. A noção de sujeito sociológico refletia a crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e auto-suficiente, mas era formado na re- lação com ‘outras pessoas importantes para ele’, que mediavam para o sujeito os valores, sentidos e símbolos - a cultura - dos mundos que ele/ela habitava. De acordo com essa visão, que se tornou a con- cepção sociológica clássica da questão, a identidade é formada na ‘interação’ entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda tem um núcleo ou essência interior que é o ‘eu real’, mas este é formado e modifica- do num diálogo contínuo com os mundos culturais ‘exteriores’ e as identidades que esses mundos oferecem. Esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma ‘celebração móvel’: formada e trans- formada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos ro- deiam [...] É definida historicamente, e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um ‘eu’ coeren- te. Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas (HALL, 2006, p.11-12). Ainda de acordo com Hall (2006), a identidade, na concepção sociológica, preen- che o espaço entre o “interior” e o “exterior”, entre o mundo pessoal e o mundo público. O autor enfatiza que os indivíduos projetam situações a partir das re- lações as quais permeiam o campo da subjetividade, o que o autor denomina “nós próprios”. Nesse sentido, estabelecemos identidades à medida que nos rela- cionamos socialmente, assim, instituem-se as identidades culturais e, ao mesmo 47 tempo, internalizamos seus significados e valores, tornando-os “parte de nós”. Dessa forma, podemos compreender o seguinte: nossas identidades são frutos das relações, dos lugares os quais ocupamos no mundo social e cultural. Hall (2006, p. 14) afirma que “as sociedades modernas são, portanto, por definição, sociedades de mudança constante, rápida e permanente”. Trazendo a reflexão para o contexto das pessoas surdas e compreendendo que as realidades são diferentes, apesar de convivermos nos mesmos lugares, nossa identidade, influências culturais e as formas como percebemos o mundo são diferentes. Aqui, discutiremos a “identidade surda”, partindo do pressuposto que o surdo é um indivíduo que carrega sua singularidade. Portanto, entender a cultura surda não é tarefa fácil. Para a compreendermos, é preciso considerar as particularidades que a envolve. Segundo Strobel (2008), a cultura surda é a maneira de o surdo entender o mundo. A cultura do povo surdo é visual e, para entendê-la, deve-se conceber a surdez como diferença. Conforme estudamos anteriormente, após o Congresso Internacional de Mi- lão, muitos países adotaram, rapidamente, nas escolas para surdos, a metodologia de ensino baseada na oralidade, esta situação marcou a proibição do uso das língua de sinais nas práticas de ensino. Tal condição trouxe um período difícil ao povo surdo, o que trouxe sérios problemas à educação desse povo e, inclusive, desencadeou uma crise na cultura surda, devido à predominância do oralismo. De acordo com a pesquisadora Strobel (2008, p. 20): “ A proibição da língua de sinais por mais de 100 anos sempre este- ve viva nas mentes dos povos surdos até hoje, no entanto, agora o desafio para o povo surdo é construir uma nova história cultural, com o reconhecimento e o respeito das diferenças, valorização de sua língua, a emancipação dos sujeitos surdos de todas as formas de opressão ouvintistas e seu livre desenvolvimento espontâneo de identidade cultural! Devemos levar em conta que os 100 anos sem a língua de sinais na educação dos estudantes surdos poderia, na menor das probabilidades, ressoar mal à comunidade surda. É pertinente discutir sobre a cultura surda, pois esta discussão diminui os equívocos e estereótipos impostos pela cultura ouvinte/oralista ao povo surdo. À medida que os valores, símbolos e atitudes da comunidade surda foram divulgados UNICESUMAR UNIDADE 1 48 entre os seus pares, a língua de sinais ganhou espaço no universo de relações dos surdos, ocorrendo uma evolução que garantiu as mudanças do ambiente cultural estabelecido pela sociedade, proporcionando uma identidade com características culturais e singularidades próprias da cultura comunicativa exercida pelos surdos. Certamente, a exclusão social, ao longo da história, foi um grande problema enfrentado pelo povo surdo, a falta de contato com as pessoas bem como as restri- tas oportunidades de escolarização e de socialização, prejudicaram a formação da cultura e identidade surdas. Excluídos os surdos dos convívios sociais, o processo cultural aconteceu de forma lenta. Como define Santana (2015, p. 3), “cultura é um conjunto complexo de regras, costumes, crenças e particularidades vivenciadas por um grupo de pessoas das mais variadas comunidades, que são passados entre as gerações, concatenando-se em um modelo comum de sociedade”. Convido você a conhecer de perto a história de vida do Taynan. Tivemos uma conversa muito interessante, porque Taynan é um amigo surdo que tem muitas experiências para compartilhar com você. Confira a história de vida de uma pessoa surda, você terá a oportunidade de saber quais foram as dificuldades enfrentadas por ele, que apresenta um breve relato sobre suas relações sociais e, também, educacionais. Assim como ocorre em diferentes culturas, a cultura surda constitui-se, principal- mente, em função da “língua de sinais”, a qual é representada por padrões de com- portamento e interações compartilhados pelas pessoas surdas. É por meio das trocas de experiências, valores, crenças, leituras, arte e formas de experimentar as coisas neste mundo, nos momentos formais ou informais, que se estabelecem as interações culturais (PERLIN, 2004). Não há dúvida de que a formação da identidade se caracteriza pelo sentimento de “pertencimento”, a determinado grupo. O pertencimento expressa-se por meio das referências grupais e, no caso do indivíduo surdo, o modo como a surdez é cons- truída socialmente nas relações interfere na concepção de identidade. Conforme aponta Santana (2015, p. 22), “a língua é um objeto vivo que não pertence a ninguém, ela é a construção de uma referência cultural”. Considerando o exposto, por meio dessas relações, a constituição do sujeito fortalece-se bem como é influenciada. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/14477 49 A cultura de um grupo está relacionada com aconstrução da identidade. Definir cultura pressupõe compreender o processo de construção identitário que, por sua vez, diz respeito ao direito de exercer a cidadania. Segundo Baggio (2017, p. 14), “a cultura surda se constrói e se define em um contexto de pluralismo que se distancia de maneira única e hegemônica no modo de conceber a cultura, estabelecendo na diversidade a sua base conceitual”. Para a autora, a cultura surda pode ser compreendida como patrimônio cultural, próprio das comunidades surdas, traduzida em uma experiência visual e interligada aos seguintes aspectos: Descrição da Imagem: a figura mostra uma ilustração colorida com quatro caixas de texto, sendo a primeira: “Linguísticas: Como a língua de sinais, ou a linguagem gestual caseira de surdos que não têm acesso à língua”. A segunda: “Éticas: O entendimento político da surdez como diferença, a luta pelo re- conhecimento oficial da língua de sinais, as identidades surdas como posicionamento e modo de ser no mundo, por exemplo”. A terceira: “Estéticas: A exemplo do teatro surdo, da literatura surda, da arte visual produzida pelos surdos etc.”. A quarta: “Materiais: O telefone de surdos (Telecommunications Devices for the Deaf – TDD), instrumentos luminosos, como as campainhas nas escolas de surdos, despertadores com vibração, entre outros”. Figura 8 - Aspectos da cultura surda / Fonte: adaptada de Baggio (2017). UNICESUMAR UNIDADE 1 50 A cultura surda estabelece-se pela forma como a comunidade se expressa, ao utilizar os recursos do universo da sua linguagem, dos seus valores e costumes e, consequentemente, fortalecendo as práticas do grupo social. É importante este processo para determinar a evolução mais ampla no que se refere ao desenvolvi- mento e fortalecimento significativo da comunidade surda. A comunidade surda é a representação física das formas de relação que se caracterizam nos encontros do povo surdo e ouvinte em eventos formais e infor- mais, nas igrejas e espaços destinados a difundir e aperfeiçoar a língua — Libras — no caso do Brasil. Durante tudo que vimos até agora, conseguimos perceber que a língua de sinais não era o principal meio de comunicação dos surdos, pelo menos não na educação. Esta língua começou a ganhar destaque, timidamente, com práticas educacionais, porque, na maioria das vezes, o foco era nas abordagens oralistas/ouvintes. Ao entender como tudo aconteceu no passado, conseguimos enxergar como chegamos até aqui e como a educação inclusiva tornou-se uma realidade. É como uma viagem no tempo que nos mostra os desafios enfrentados, as diferentes abordagens — o oralismo, a comunicação total e o bilinguismo — e como tudo isso afetou a identidade das pessoas surdas. Sabe qual é a melhor parte? Este conhecimento histórico tem uma aplicabili- dade gigante! Quando entendemos o passado, podemos refletir sobre o presente e, até mesmo, moldar o futuro da educação dos surdos, desmistificar equívocos, buscar novas formas de ensino, promover a inclusão de verdade, em suma, é por meio desse aprendizado que conseguimos criar um ambiente mais acolhedor e acessível para todos. Ao conhecer e entender os aspectos do passado, estaremos preparados para construir um futuro melhor à educação dos surdos. É uma opor- tunidade incrível de fazer a diferença e valorizar a diversidade. Agora que chegamos ao fim deste estudo, quero te propor uma questão para refletir sobre a Libras e a sua importância aos estudantes surdos. Avalie a seguinte afirmação: “é por meio da linguagem que o sujeito se constitui, esta constituição dá-se no individual, mas é produzida pelas práticas sociais no coletivo, nas ex- periências em sociedade, nas escolas, nos grupos familiares, ou seja, nas comu- nidades as quais pertencemos”. E aí, qual é o papel da escola, acerca da subjetividade da pessoa surda? 51 1. Durante muito tempo, os surdos foram considerados incapazes de serem ensinados, por isso, eles não frequentavam escolas. Foi apenas no início do século XVI que se começou a acreditar que eles podiam aprender, mediante a educação. Considerando a história da educação de surdos, avalie as afirmações, a seguir: I - Até o final do século XV, não havia escolas com ensino especializado para surdos. II - As pessoas surdas, durante muito tempo, eram excluídas da sociedade, sendo proibidas de casar, possuir ou herdar bens. III - Ainda no século XV, crianças e jovens surdos de famílias ricas eram educados por professores particulares. IV - No início do século XVI, começaram as primeiras tentativas de evolução concreta sobre as formas de educação e metodologias aplicadas às pessoas surdas. É correto o que se afirma em: a) I, II e III, apenas. b) I, II e IV, apenas. c) II, III e IV, apenas. d) I, III e IV, apenas. e) I, II, III e IV. 2. O termo “cultura” está tão relacionado ao cultivo da terra que falamos em agricultura, em “cultura da cana-de açúcar”, “cultura de milho”, “cultura de soja” etc. Considerando este uso para esta palavra, a pesquisadora surda Karim Strobel (2008) afirma que o “cultivo da linguagem” é fundamental à existência da cultura surda. Dentre as afir- mações a seguir, considere as que se referem à cultura surda: I - Cultura surda é a maneira de o surdo entender o mundo. II - A cultura do povo surdo é visual. III - É bem simples definir a cultura surda. IV - Para entender a cultura surda, é necessário conceber a surdez como diferença. É correto o que se afirma em: a) I, II e III, apenas. b) I, II e IV, apenas. c) I, III e IV, apenas. d) II, III e IV, apenas. e) e) I, II, III e IV. 52 3. Após o Congresso Internacional de Milão, muitos países adotaram, rapidamente, a metodologia de ensino para surdos baseada na oralidade. Considere as afirmativas, a seguir, sobre os resultados desse congresso para as pessoas surdas no mundo todo. I - Esta situação trouxe sérios problemas à educação dos surdos, inclusive trouxe crise à cultura surda, devido à predominância do oralismo. II - Os surdos foram ouvidos no congresso e isso mudou o cenário educacional, por meio da valorização da língua de sinais. III - Situação que marcou um período difícil para o povo surdo, pois baniu, oficial- mente, a língua de sinais. É correto o que se afirma em: a) I e II, apenas. b) II e III, apenas. c) I, apenas. d) I e III, apenas. e) I, II e III. 2Aspectos Legais da Educação do Surdo Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Caro estudante, convido você para aprender, nesta unidade de estu- do, percorrendo os principais aparatos legais que provocaram mu- danças no cenário educacional do surdo no Brasil. Com um olhar mais apurado, sob os aspectos legais, conheceremos os caminhos que levaram a comunidade surda conquistar em forma de lei muitos direitos educacionais, sociais, comunicativos e linguísticos. Vamos começar? Boa leitura! UNIDADE 2 56 Os direitos são benefícios que os cidadãos podem ter acesso, como forma de garantir que as pessoas possam exercer sua cidadania e autonomia. Pensando a partir desse contexto, que as pessoas são amparadas pela lei, você acredita que elas possam contribuir para a implementação de acessibilidade comunicativa e escolarização de qualidade para a comunidade surda? Já conhecemos graves problemas sociais e educacionais acerca das experiências do povo surdo. Sim, eu sei que esses fatos nos deixam perplexos. Muitos proble- mas sociais que ocorreram com as pessoas surdas são reflexos da desigualdade. Nesse campo, a sociedade ouvinte impôs que o povo surdo se adaptasse à cultura ouvintista, ignorando as peculiaridades das pessoas surdas. Embora saibamos que somos todos iguais perante a lei, isso não se aplica no campo educacional, quando é preciso pensar nos direitos subjetivos da pessoa com necessidades educativas especiais ou em atendimentos especializados. Os surdos não eram vistos a partir das suas singularidades e tampouco respeitados como pessoas capazes de aprender, conviver e relacionar-se em sociedade.São muitos os relatos que nos comprovam tais situações, o discurso sobre a desigualdade também faz parte desse processo. Agora, convido você para conhecer algumas histórias marcantes de pessoas surdas que fizeram muitas conquistas ao longo de suas vidas. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20647 https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20646 https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20645 57 Como foi sua pesquisa ao assistir os vídeos? Após esse desafio, reflita sobre o que acabou de conhecer. Você conseguiu fazer uma conexão com os estudos e estabelecer novos conhecimentos? Você acredita que já temos políticas públicas suficientes na atualidade para atender às demandas das pessoas surdas? Será que os surdos são respeitados pelas suas singularidades culturais e identitárias? Você conhece de perto a história de uma pessoa surda? Levando em consideração tudo que estudamos sobre a pessoa surda, apresento a você outras informações sociais, relatos de pessoas surdas que retratam suas expe- riências e as barreiras encontradas nos espaços sociais. Escolhi esses vídeos porque são distintos, porém apresentam conceitos e ideias com perspectivas diferenciadas do mundo dos surdos. Recomendo a leitura nos comentários dos vídeos, em que você encontrará outros depoimentos interessantes e carregados de sonhos. Não esqueça de anotar os principais pontos discutidos, essa é uma tarefa mui- to importante que garante ainda mais o seu aprendizado. Acredite, esse procedi- mento facilitará sua rotina de estudos! Avante! Prepare-se! Nossa caminhada está apenas começando. Vamos seguir com os estudos? Não esqueça, deixe registrado em seu diário de bordo suas impressões sobre este tema, retome os estudos nesta unidade e perceba o quanto já aprendeu! DIÁRIO DE BORDO UNICESUMAR UNIDADE 2 58 A história da educação dos surdos e a legislação caminham jun- tas, são processos indissociáveis, fortalecendo as ações nas ins- tituições de ensino, na medida em que promovem discussões, melhorias, análises, pesquisas, ideologias, métodos e organizam as práticas educativas determinando a solidificação das necessi- dades em determinadas épocas históricas. A história nos mostrou que o surdo já foi adorado no Egito pelos deuses e os faraós. Enquanto para os romanos os surdos não eram reconhecidos, não tinham o direito de conviver em sociedade. A história também nos revelou que na Idade Média prevaleciam ideias centradas nos aspectos religiosos, acreditavam-se neste período que os pais que tinham filhos surdos estariam pagando por pecados an- teriores, dessa forma, as crianças surdas eram consideradas e trata- das diferentes das crianças ouvintes. Sabemos que, por muito tempo, os surdos foram isolados do convívio com a sociedade. A história dos surdos nos chama atenção pelas diferentes pers- pectivas ao longo do desenvolvimento civilizatório. Apesar de todas as diferenças, podemos perceber que, mesmo em tempos distintos, há algo em comum entre eles, sendo pertinente destacar que existiu ao longo da história muitos movimentos de lutas em defesa da edu- cação das pessoas surdas. Sinalizamos que ora tais movimentos são mais acirrados, envolvendo diferentes personalidades e segmentos sociais, ora eles aconteceram de formas singelas e ignorando a pre- sença dos surdos, porém ambos abriram espaços para as discussões acerca do desenvolvimento pessoal e educacional do povo surdo. Na história da educação dos surdos, existe um marco importan- te que são relacionados a dois congressos realizados em Milão, tais congressos foram importantes por oportunizar discussões e delibe- rar normativas sobre a educação dos surdos. O primeiro Congresso foi realizado em 1872, evento que definiu que seria pertinente que os surdos se desenvolvessem quanto a sua comunicação e o pensa- mento humano por meio da língua oral, ou seja, os surdos seriam educados e treinados para desenvolver a oralidade. Acreditava-se que eles poderiam, consequentemente, falar, portanto, seriam ca- pazes de se desenvolverem intelectualmente. 59 O segundo momento que marca a história da educação dos surdos aconteceu no ano de 1880, provocando uma grande transformação na história dos surdos, pois, nesse evento, conduzido por um grande grupo de ouvintes, foi decidido pelos países presentes que a abordagem pedagógica da educação seria baseada no oralismo. O oralismo tornou-se o método oficial de educação dos surdos, banindo definitivamente a língua gestual. O objetivo do congresso era definir o melhor método de aquisição da linguagem pelo surdo. Percebemos que os congressos definem sob os aspectos políticos quais os caminhos seriam trilhados na educa- ção dos surdos, demonstrando que eles teriam que se adequar à cultura oralista para serem considerados pessoas normais. Por muitos anos, a caminhada em torno da educação do surdo no Brasil foi influenciada pelos acontecimentos mundiais, vários foram os pareceres que definiam as metodologias para a educação dos surdos. O francês Eduard Huet teve representatividade no Brasil, no tocante à educação dos surdos, que chegou ao Brasil em 1855, a convite de Dom Pedro II, para lecionar exclusivamente aos surdos no Instituto de Surdos e Mudos, que hoje conhecemos como INES. UNICESUMAR UNIDADE 2 60 Com a criação do Instituto dos Surdos, surgem os primeiros aparatos legais que implicam em olhares nos aspectos da educação dos surdos. Os anos de 1930 e 1934, Armando Lacerda assume o Instituto Nacional e promulga – a Pedagogia Emen- dativa do surdo-mudo –, esse documento apresentava, no seu bojo, as diretrizes para a comunicação do surdo, tratando com exclusividade os aspectos linguísticos. No ano de 1950, assume a presidência do instituto a professora Ana Rímoli, que se preocupa com a formação de professores para surdos no Brasil – im- plantando o primeiro curso normal de formação de professores para surdos do Ensino Médio. Mais tarde, por volta de 1957, acontece um movimento chamado Campanha de educação de surdos brasileiros, marcado pela filosofia oralista, ou seja, que pretendia fazer o surdo falar. A campanha mostrou-se inadequada apesar de contribuir para o crescimento no atendimento aos surdos. Portanto, po- demos perceber que existia uma preocupação no tocante à educação dos surdos em nosso país por parte dos governantes e que era necessário que os educadores fossem especialistas em surdez para que trabalhassem com esses alunos. Afinal, o que representa para a sociedade em geral e, principalmente para aqueles que estão fora do padrão, os chamados grupos minoritários, os movimentos, os eventos e congressos internacionais e nacionais? PENSANDO JUNTOS De fato, a mobilização é um dos principais meios que promove debates sobre pro- blemas agravados pela permanência de práticas educativas que desconsideram as singularidades, as diferenças de uma criança que necessita de educação especiali- zada. Identificamos que a educação dos surdos foi marcada historicamente pelos processos educativos, em que a língua de sinais se tornou praticamente invisível durante o século XIX e XX, o que pode ser considerado um fator de atraso do desenvolvimento linguístico dessa comunidade. As antigas escolas especiais es- tavam voltadas ao tratamento e na correção dos sujeitos surdos, submetendo-os aos processos educativos predominantes, focados na cultura oralista. Segundo Vieira e Molina (2018, p. 3): 61 “ [...] O projeto desenvolvido na década de 1980 era o mesmo pro- posto pela diretora do período de 1951/1961, Ana Rímoli de Faria Dória, sob uma ótica oralista exclusivamente. Essa professora pro- duziu um material nessa abordagem com o título de Compêndios de educação da criança surda-muda, o qual perpassou décadas sendo material pedagógico utilizado no ensino desses estudantes. Embora o excerto apresente dados mais recentes, percebemos que foi longo o período com as práticas pedagógicas que obrigavam o surdo a falar. Só no final de 1989 e início de 1990, surge, umnovo tempo que marca um período de ques- tionamentos acerca da eficácia dos métodos orais. Em 3 de dezembro de 1957, foi criado o Decreto nº 42.728, esse documento abriu espaço para outras demandas sobre a educação dos surdos, ampliando um diálogo com as concepções educacionais do período, refutando a ideia de que as pessoas surdas deveriam se enquadrar na educação oferecida à sociedade ou- vintista. Devemos mencionar que o decreto, surge devido, um pedido de Clovis Salgado, ministro da Educação e Cultura na época. Assim, o então secretário, solicitou a criação de uma campanha, cujo objetivo era comemorar o Centenário do Instituto Nacional de Educação de Surdos dos surdos aqui no Brasil – pro- movendo o debate, a partir de uma nova perspectiva de ensino às pessoas surdas. A campanha teve como lema O surdo não é diferente de você, ajude a educá-lo. Dessa forma, o principal objetivo do decreto demonstrou uma preocupação com a formação docente, já que, nesse período, o país contava com aproxima- damente 60.000 pessoas surdas. Portanto, o decreto estabeleceu aos estados e municípios que os professores fossem especializados, garantindo uma educação voltada às necessidades das pessoas surdas. Devemos mencionar que os pro- fessores já estavam sendo formados nos cursos chamados de (Curso Normal para Professores). Esse projeto ocorreu com parceria com o governo federal, prevendo que as escolas fossem organizadas com classes destinadas ao ensino da criança surda junto às crianças ouvintes. Aqui, percebemos os primeiros passos para a implementação da educação inclusiva. Desse modo, poderemos alargar, progressivamente, a área de atuação federal até atender a todas as nossas necessidades, que se exprimem em cerca de 60.000 surdos em todo o Brasil (DÓRIA; SALGADO; BRASIL, 1958). UNICESUMAR UNIDADE 2 62 Na ocasião, o decreto despontava a importância do movimento para melhorias na educação do surdo em termos legais, surgindo, nesse cenário, uma campanha a favor da comunidade surda, conforme compreendemos pela organização do art. 1, que instituiu ao INES a Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro (C.E.S.B.) e, ainda, conferindo para a campanha o desdobramento de divulgar com veemência as questões referentes à educação e à assistência de pessoas com deficiência da audição, o termo nos parece arcaico, mas a lei apresenta dessa for- ma. Queremos que você compreenda que o termo não altera o objetivo da cam- panha. Houve uma preocupação como as medidas necessárias que garantissem a divulgação e popularização da campanha. Esse decreto foi idealizado em comemoração ao Centenário do Instituto Nacional de Educação dos Surdos. Com o lema O surdo não é diferente de você, a campanha tinha como objetivo divulgar as necessidades reais na educação dos surdos. Nasce aqui uma campanha política que teve ampla divulgação e fui apoiada pelo governo Juscelino Kubitschek. A campanha deu mais visibilidade à educação do surdo proporcionando o discurso acerca da formação dos profes- sores para atuarem com o povo surdo. Vejam que mais uma vez a qualidade do trabalho pedagógico direcionado aos surdos gerava preocupação em âmbito nacional. Segundo Rodrigues e Gontijo (2017), na década de 1950, não havia legislação específica no Brasil que orientasse a educação de crianças surdas, os autores afirmam que, após a promulgação Decreto nº 42.728, de 3 de dezembro de 1957, as crianças conseguiram acesso ao sistema de ensino. Percebemos que a história da educação do surdo é marcada pelos movimen- tos, por impasses educacionais e pelas discussões ideológicas que determinam as ações educativas nos diferentes contextos, predominando, por muito tempo, a busca de adequar as pessoas surdas em paradigmas educacionais que prevaleciam a cultura oralista. Mesmo com as mudanças do modelo patológico de deficiência (adaptar as pessoas com deficiência ao sistema educacional) para o modelo social NOVAS DESCOBERTAS Você poderá conhecer de perto o que previu o Decreto nº 42.728 de 3 de dezembro de 1957, acessando o link. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20644 63 (adaptar o sistema educacional às necessidades educacionais de qualquer aluno), ainda nos deparamos com algumas dificuldades que impedem, muitas vezes, o acesso dessas pessoas ao processo de inclusão educacional. No quadro a seguir, veremos três fases de abordagens pedagógicas que mar- cam a educação do surdo. Abordagem Práticas educativas/metodológicas Oralista É o processo pelo qual se pretende capacitar o surdo na compreensão e na produção de linguagem oral. Pretende-se que o surdo, mesmo não possuindo audição, seja treinado a falar, desenvolvendo a linguagem oral, como as pessoas ouvintes. Nesta abordagem, prevalecem os treinos da fala, em que os alunos são submetidos a um laboratório de foné- tica, sendo utilizadas técnicas de terapia de fala, para que ele supere seu déficit auditivo e assim superasse a surdez. Comunicação total Nesta abordagem, há uma mesclagem na qual são admitidas práticas educativas, ora com ênfase no desenvol- vimento da língua gestual, ora na utilização da língua oral, embora prevaleça para a transição na língua oral. Bilinguismo A abordagem bilíngue surge como uma metodologia de ensino em que se propõe tornar acessível ao surdo duas línguas – a língua de sinais (L1) e a Língua Portuguesa (L2) na modalidade escrita para as pessoas surdas. Quadro 1 - Abordagens na educação dos surdos / Fonte: adaptado de Strobel (2007). Vejam que as abordagens educacionais para surdos estavam ligadas no oralismo e na comunicação total. Vimos, anteriormente, que até o Congresso de Milão as principais correntes metodológicas da educação dos surdos eram baseadas no oralismo e o gestualismo. Por influência de estudiosos daquelas épocas, es- peravam-se que os surdos aprendessem a língua que falavam os ouvintes, essa situação determinou as abordagens educacionais por longos anos. Dessa forma, percebemos, até aqui, que a educação dos surdos era baseada exclusivamente na fala e no uso do alfabeto digital. Durante muito tempo, acreditou-se que a lin- guagem oral era a forma mais eficaz para o desenvolvimento e funcionamento das faculdades mentais dos seres humanos. UNICESUMAR UNIDADE 2 64 O oralismo Segundo Strobel (2007), os surdos eram submetidos a uma educação baseada no oralismo, inclusive pelos professores surdos, pois defendiam e iniciavam práticas educativas que favorecessem a leitura e a escrita nas habilidades da leitura labial e na articulação de palavras. Apesar de muitos surdos passarem pelo processo de ensino-aprendizagem baseados no oralismo, é pertinente destacar que os treinos com a fala eram exaustivos, eles deveriam treinar a leitura labial, a percepção das vibrações vocais até que conseguissem emitir, da forma mais correta possível, a fala. Tais práticas privilegiam a fala em detrimento de outros sistemas de significação. Segundo Santana (2007, p. 121), “a fala é considerada a língua legítima e a abordagem oralista dá aos pais exatamente aquilo que buscam: a fala”. Vale ressal- tar ainda que o peso que tem a fonoaudiologia para os pais, logo após a descoberta da surdez, ocupa um papel de saber, um saber científico que determina o que deve ou não ser feito para cada criança. Para Santana (2007), quando se fala em abordagem oralista, pode-se supor que essa abordagem tem como objetivos a aquisição da linguagem oral e a facilitação da integração social do surdo. Ensinar e aprender a falar não são tarefas fáceis e exigem muita dedicação da família e da escola, além de muito esforço por parte do surdo. 65 O processo educacional dos surdos, norteados pela filosofia oralista, não foi o suficiente, de forma a garantir aos surdos o aprendizado, bem como o pleno desenvolvimento das habilidades da leitura e da escrita, surgindo, assim, espaço para novas estratégias metodológicas, fazendo que surgisse a abordagem chama- da comunicação total. Comunicação totalNa tentativa de expandir novas possibilidades e recursos metodológicos, a abor- dagem da comunicação total surge como forma de facilitar no processo de en- sino-aprendizagem da educação do surdo, como alternativa de uma formação baseada na mesclagem da língua gestual e da língua oral, cujo objetivo era dar prioridade às atividades de práticas que são empregados no sentido de uma co- municação mais efetiva entre surdos e entre surdos e ouvintes, embora essa filo- sofia se preocupa com a aprendizagem da língua oral. UNICESUMAR UNIDADE 2 66 No Brasil, a comunicação total foi adotada no final da década de 1970, após se constatar que os surdos educados por meio da metodologia oralista não con- seguiriam se comunicar ou falar como os ouvintes de maneira satisfatória. A Comunicação Total (CT) foi adotada no Brasil, destacando-se, particularmente, nos estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Visto que as pessoas surdas permaneciam se comunicando por meio da língua de sinais, decidiu-se, então, que os surdos poderiam utilizar toda e qualquer forma de comunicação. Assim, surge a Comunicação Total, esse modelo combinava a língua de sinais, gestos, mímicas, leitura labial e o desenvolvimento da língua oral. Segundo Ciccone (1996, p. 6 e 8): “ A Comunicação Total é uma filosofia de trabalho voltada para o atendimento e a educação de pessoas surdas. Não é, tão so- mente, mais um método na área e seria realmente um equívoco considerá-la, inicialmente, como tal [...]. A Comunicação Total, entretanto, não é uma filosofia educacional que se preocupa com ideais paternalistas. O que ela postula, isto sim, é uma va- lorização de abordagens alternativas, que possam permitir ao surdo ser alguém com quem se possa trocar ideias, sentimentos, informações, desde sua mais tenra idade. Condições essas que permitam aos seus familiares (ouvintes, na grande maioria das vezes) e às escolas especializadas as possibilidades de, verdadei- ramente, liberarem as ofertas de chances reais para um seu de- senvolvimento harmônico. Condições, portanto, para que sejam franqueadas mais justas oportunidades, de modo que possa ele, por si mesmo, lutar em busca de espaços sociais a que, inques- tionavelmente, tem direito. Segundo Cavalcante e Torres (2020), a abordagem metodológica “Comunicação Total”, é considerada mista, por permitir a prática de duas abordagens de ensino, pautadas no ensino da língua de sinais e da língua oral. A principal dificuldade encontrada nesse processo estava centrada nas diferenças gramaticais dentro de cada língua. Os autores supracitados afirmam que a primeira abordagem diz respeito ao desenvolvimento da criança surda em (L1), o que significa que são explorados a Língua de Sinais ou Língua Materna e, em seguida, desenvolver a 67 Língua Portuguesa como segunda Língua ou Língua 2 (L2), no caso do Brasil, na modalidade escrita – como uma língua de instrução no ensino. A segunda língua propõe um ensino com dupla introdução das línguas, tanto oral quanto a de sinais, assim, no segundo caso, o ensino da língua materna dos surdos desrespeita toda a gramática pertencente ao seu sistema linguístico. Esses elementos corroboram para o fato de que a Comunicação Total é uma extensão do oralismo, na qual os gestos são aceitos no processo de ensino-apren- dizagem como ferramenta para estabelecimento de comunicação. Os surdos ainda não eram entendidos como usuários de uma língua própria. Tanto que percebemos o uso da palavra “gestos” ao invés de dizer língua de sinais. Bilinguismo Para adentrarmos na abordagem bilíngue da educação aos surdos, é importante destacar o que nos sinaliza Lacerda (2006, p. 7): “ Partindo do conhecimento sobre as línguas de sinais, ampla- mente utilizadas pelas comunidades surdas, surge a proposta de educação bilíngue que toma a língua de sinais como própria dos surdos, sendo esta, portanto, a que deve ser adquirida primeira- mente. É a partir desta língua que o sujeito surdo deverá entrar em contato com a língua majoritária de seu grupo social, que será, para ele, sua segunda língua. Assim, do mesmo modo que ocorre quando as crianças ouvintes aprendem a falar, a criança surda exposta à língua de sinais irá adquiri-la e poderá desenvol- ver-se, no que diz respeito aos aspectos cognitivos e linguísticos, de acordo com sua capacidade. A proposta de educação bilíngue, ou bilinguismo, como é comumente chamada, tem como objetivo educacional tornar presentes duas línguas no contexto escolar, no qual estão inseridos alunos surdos. Com a adoção do bilinguismo como abordagem educacional para os surdos brasi- leiros, mudanças aconteceram quanto à forma de chamar os surdos, hoje, não são mais utilizadas as expressões “surdo-mudo” ou “deficiente auditivo” para referenciar UNICESUMAR UNIDADE 2 68 esses sujeitos. É adequado a utilização do termo surdo, é assim que a comunidade surda prefere ser reconhecida. Os reflexos dessas mudanças geraram um movimen- to que foi protagonizado por ativistas surdos, por seus familiares e profissionais da educação, buscando edificar academicamente um campo epistemológico. A utilização da nomenclatura surdo-mudo se fortaleceu por muito tempo na história, inclusive a Bíblia Sagrada traz os termos (surdo-mudo) ao mencionar sobre as pessoas surdas em capítulos e versículos. Quando se pretende agir em uma perspectiva inclusiva, a utilização de termos adequados é imprescindível. As pessoas surdas querem ser reconhecidas como “surdas” e não “surdas-mudas”. De certa forma, isso não é uma imposição das pessoas surdas, não é uma condição, mas é plausível porque demonstra uma aceitação às diferenças e territórios que pertencem ao processo identitário. Faz parte da compreensão da identidade própria do povo surdo. Portanto, é importante que você saiba que a denominação escolhida para designar uma pessoa ou um grupo de pessoas revela a nossa concepção a res- peito desse público. É preciso repensar sobre a utilização de termos ultrapassados, porque isso pode colaborar para perpetuar preconceitos e estereótipos. As discussões levantadas sobre a melhor educação, ou a educação ideal às pessoas surdas, permeiam sobre duas temáticas – da educação especial e inclu- são escolar. Aliás, são assuntos debatidos há algumas décadas, entretanto, no que tange à educação de surdos, ampliou-se, no cenário acadêmico, os debates sobre a escola bilíngue ou educação bilíngue – como abordagens adequadas para ofertar às pessoas surdas. A questão da escola bilíngue gera muitos debates e questiona- mentos, impostas pela própria legislação, travando empasses na prática. Dessa forma, pense a partir dessas duas questões apontadas a seguir: a) A escola bilíngue é uma escola de inclusão que oferta um ensino espe- cializado? b) A escola bilíngue é uma escola de educação básica? Devemos considerar que a escola bilíngue tem necessidades específicas, nesse sen- tido, tanto as escolas especiais como as escolas regulares não podem suprir. Hoje, há um consenso sobre a educação bilíngue para os surdos, priorizando educação em escolas próprias, as formas de oferta deste tipo de educação têm levantado questões a respeito da implementação e realização na prática deste tipo de educação. 69 Existem três tipos de alternativa de oferta que tem se apresentado à sociedade brasileira: 1. A oferta da escola bilíngue dentro de escolas especiais. 2. A oferta de escola bilíngue nas escolas regulares com salas especializadas. 3. A escola especializada para surdos. Assim, a defesa da comunidade surda sobre a escola bilíngue aponta para um modelo chamado de Escola Especializada para Surdos. Segundo Albres (2008), a Federação Nacional de Educação de Surdos tem defendido a edu- cação de surdos em escolas específicas para surdos como o modelo de oferta de educação ideal. Percebemos os esforços, a organização dos estados e das Políticas Públicas, como forças motrizes de que as escolas se desenvolvam na perspectiva da educação bilíngue.UNICESUMAR UNIDADE 2 70 Princípios da educação inclusiva para os alunos surdos A educação inclusiva surgiu no Brasil na década de 1990, ganhando força a partir de movimentos mundiais. Foram muitas as discussões para que se chegasse ao que conhecemos na atualidade de educação inclusiva. Lacerda (2006) sinaliza que, apoiados pela Declaração de Salamanca, os avanços começaram a ser percebidos nas instituições brasileiras. Da conferência que aconteceu no ano de 1994, surge a Declaração, estabelecendo compromisso para a escola que deve assumir a educa- ção de cada estudante, contemplando a pedagogia da diversidade, ao reconhecer que os alunos deverão estar dentro da escola regular, independentemente de sua origem social, étnica ou linguística. Nesse último aspecto, dentre outros elementos, enquadra-se a inclusão da pessoa surda. Lacerda (2006, p. 9) afirma que: “ A inclusão escolar é vista como um processo dinâmico e gradual, que pode tomar formas diversas a depender das necessidades dos alunos, já que se pressupõe que essa integração/inclusão possibilite, por exem- plo, a construção de processos linguísticos adequados, de aprendizado de conteúdos acadêmicos e de uso social da leitura e da escrita, sendo o professor responsável por mediar e incentivar a construção do co- nhecimento através da interação com ele e com os colegas. A educação inclusiva para surdo é respaldada por documentos e legislações que orientam as escolas sobre as principais adaptações que devem ser realizadas, permitindo ajustes organizacional e quais formações os professores necessitam para aperfeiçoar seu conhecimento, a fim de que possam garantir o acesso e a permanência do aluno surdo nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Perce- bemos que cada vez mais os debates, os estudos e as pesquisas repercutem no chão da escola e apontam os caminhos que a educação percorria após esse marco. Assim, faz-se necessário, principalmente os profissionais da educação, ter o conhecimento acerca do que trazem os documentos oficiais e quais informações apresentam sobre a educação dos surdos na modalidade educação especial. Com a implementação da escola inclusiva, é preciso pensar na organização do espa- ço, no tempo e nos recursos humanos e materiais necessários para promover a 71 aprendizagem da criança surda, uma vez que esta necessite de recursos didáticos visuais. O Decreto nº 5.626/2005, em seu art. 2º “considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras”. Certamente, os professores são os principais responsáveis pela formação dos alu- nos, são os agentes que promovem a educação deles, nesse sentido, é importante estabelecer parcerias com as famílias para que possam conhecer os segmentos e o conjunto de medidas estruturadas pelas políticas, que são consolidadas nas práticas exploradas em sala de aula. Ações como essa só fortalecem as propostas pedagógi- cas. Os impactos para a educação de surdos das diferentes abordagens pedagógicas podem ser constatados no processo de escolarização desses estudantes. A Constituição Federal de 1988 é considerada uma das políticas públicas mais importantes para educação, pois, a partir dela, intensificaram-se os debates acerca da educação e dos direitos humanos. A CF/1988 prevê, nos art. 205 e 208, ações que garantem aos cidadãos direitos específicos à pessoa com deficiência, à raça, à cor, à idade, a gênero, entre outros. UNICESUMAR UNIDADE 2 72 “ Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da famí- lia, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. [...] e no Art. 208 - I - educação básica obrigatória e gratuita dos quatro aos 17 anos de idade, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva universalização do Ensino Médio gratuito; III - atendimento educa- cional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; (Redação dada pela Emenda Constitu- cional nº 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 59, de 2009). Podemos dizer, portanto, que entre as principais conquistas no Brasil, surgem, também, pela representação da Constituição Federal/1988. A educação avançou consideravelmente com a obrigatoriedade e o direito subjetivo à educação de qualidade nos espaços públicos. Assim, veremos adiante que as leis estão direta- mente ligadas às vitórias sociais, pois os amparos legais são imprescindíveis para a sociedade. Conheceremos três importantes leis dos últimos 13 anos, a Lei nº 10.436/2002, que reconhece a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como forma legal de comunicação; o Decreto nº 5.626/2005, que exige o cumprimento da educação bilíngue (Libras e Língua Portuguesa na modalidade escrita); e a Lei nº 12.319/2010, que regulamenta a profissão de Tradutor e Intérprete de Libras. NOVAS DESCOBERTAS Para aprofundar mais sobre a história e educação dos surdos, a li- teratura surda e seus aspectos políticos, materiais Bilíngues Portu- guês/Libras e Estudos de Línguas de Sinai e Práticas Culturais, acesse o portal da Editora Arara Azul e conheça todos os recursos disponibi- lizados. Você poderá obter gratuitamente a Série Pesquisa de Ronice Müller de Quadros. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20648 73 NOVAS DESCOBERTAS Título: Estudos Surdos I, II, III e IV Autora: Ronice Müller de Quadros (org.). Ano: 2006 Editora: Arara Azul Sinopse: a Série Pesquisas em Estudos Surdos é uma ideia que surgiu no sentido de tornar públicas as investigações que estão sendo rea- lizadas na perspectiva dos surdos. Essa Série inaugura uma coleção que trará pesquisas que estão sendo produzidas no campo dos estudos surdos. São pesquisadores surdos, bilíngues e intérpretes de língua de sinais desconstruindo e construindo saberes. O contexto em que se apresentam tais ensaios, pesquisas e relatos é de tensão e, ao mesmo tempo, de conquistas. A série concretiza a democratização da produção do conhecimento. UNICESUMAR UNIDADE 2 74 A IMPORTÂNCIA DA LIBRAS PARA O ALUNO NO CONTEXTO DA INCLUSÃO A educação especial e a inclusão escolar são assuntos que vêm sendo debatido há algumas décadas, porém os avanços dessas áreas sobre educação de surdos ainda não é uma realidade no cotidiano das escolas regulares. A educação formal da pessoa surda tem suas especificidades devido à existência de uma língua própria que é a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Devido a essas questões, a educação de surdos era feita, de maneira geral, em escolas especializadas, em que os estudantes conviviam majoritariamente com outros surdos, com desenvolvimento da língua de sinais. Tal fato, que muito contribui para o desenvolvimento da criança surda, tem outro lado, que acaba por revelar limitações. Ao segregar o surdo em escolas especializadas, o desenvolvimento da Língua Portuguesa escrita e a interação com a sociedade ouvinte ficava deficitário e, posteriormente, ao ingressar ao mercado de trabalho, tais competências poderiam fazer falta. A escola bilíngue se faz necessária neste contexto para sanar as necessidades mais profundas de uma educação formal em Língua Portuguesa. Para Gesser (2009, p. 54): “os surdos, têm características culturais que marcam seu jeito de ver, sentir e se relacionar com o mundo [...]”, é importante que a escola seja um local que valorize e perceba as peculiaridades da comunidade surda, para que toda pessoa surda tenha o direito ao acesso à educação de qualidade e uma integração digna à sociedade civil. “ A adoção de um novo método de ensino, voltado prioritariamen- te para a aquisição e compreensão da fala, passou a ser a solução para a educação de surdos. O sucesso de sua escolarizaçãoe, por decorrência de sua integração social, dependeria do domínio, por parte do professor, de determinados procedimentos técnicos [...] (SOARES, 1999, p. 80). Ao debatermos sobre a questão do aluno surdo na escola regular, compreende- mos que ainda são necessárias muitas mudanças, pois essa inclusão apresenta vários desafios que precisam ser superados. A respeito da inclusão do aluno surdo, o ponto crucial é a interação a ser estabelecida para que sejam assegurados a eles 75 a construção da aprendizagem e acesso ao currículo escolar. Tendo em vista a problemática da comunicação como fator primordial para a relação entre pro- fessores/alunos ouvintes e alunos surdos. É importante destacar que um grande avanço veio por meio da Lei Federal nº 10.436, de 24 de abril de 2002, em que a Língua Brasileira de Sinais foi reconhecida no Brasil como a língua oficial dos surdos. Como dispõe em seu Art.1º: “ Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais – Li- bras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguís- tico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. O reconhecimento da Libras representou um grande progresso, contudo, foi ape- nas em 2005 que de fato esta lei foi regulamentada pelo Decreto nº 5.626/2005 que, em seu art. 2º, traz que “considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras” (BRASIL, 2005, on-line). Destacamos que este decreto estabelece em primazia a adoção da metodo- logia bilíngue como prática que respeita as singularidades e necessidades comu- nicativas do povo surdo. Portanto, o decreto reforçou e detalhou a presença da Libras como componente curricular, estipulou as condições para a efetivação da educação bilíngue, com professor bilíngue, do instrutor surdo de Libras e tra- dutores, a importância dos intérpretes e criou o exame nacional de proficiência em Libras. Tal criação contribuiu para a formalização do exercício profissional de docentes e intérpretes Libras/Língua Portuguesa nos anos seguintes. Cien- tes da condição linguística diferenciada dos alunos surdos, além da inclusão da Libras como disciplina curricular nos cursos de Magistério, Educação Especial, Fonoaudiologia, Pedagogia e demais licenciaturas, essa regulamentação fortalece o direito dos surdos de ter acesso às informações em Libras e à educação bilíngue. UNICESUMAR UNIDADE 2 76 Importante que você entenda que o Decreto de 2005 tem o propósito de re- gularizar a Lei nº 10.436/2002, que consolidou a difusão e o uso da Libras nos sistemas educacionais federal, estadual, municipal e privado, possibilitando o desenvolvimento de políticas de inclusão de pessoas surdas. Os currículos dos diversos sistemas de ensino sofreram modificações no que tange, principalmente, à formação docente, cujos objetivos estão voltados na aprimoração dos conhe- cimentos acerca da Libras e para atender às novas leis, tornando-se obrigatória a inclusão da disciplina de Libras na formação inicial. “ Os sistemas educacionais federal, estadual, municipal e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Edu- cação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior de ensino, a Língua Brasileira de Sinais, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, conforme legislação vigente (BRASIL, 2002, on-line). O ano de 2022 foi um ano comemorativo para a comunidade surda, pois a Lei nº 10.436/2002 completou 20 anos, essa foi a lei que reconheceu a Língua Bra- sileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunicação e expressão no país. A comunidade celebra esta data, pois com a lei, muitos avanços aconteceram no universo escolar. Esse marco é importante, não só pelo reconhecimento da Libras, mas, sobretudo, pelas oportunidades que estariam por vir. Podemos perceber isso acerca do ensino de Libras, que mais tarde, no ano de 2005, tornou-se obrigatório nos cursos de formação de professores e Fonoaudiologia, sendo disciplina curri- cular optativa nos demais cursos de nível superior e na educação profissional, de acordo com o art. 3º, § 2º do Decreto nº 5.626/2005. Assim define: NOVAS DESCOBERTAS O Decreto nº 5.626/2005 exige o cumprimento da educação bilín- gue (Libras e Língua Portuguesa na modalidade escrita). Veja mais a respeito do decreto acessando o link a seguir e aprecie detalha- damente o documento. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20649 77 “ Art. 3º - A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obri- gatória nos cursos de formação de professores para o exercício do Magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiolo- gia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. § 2º A Libras constituir-se-á em disciplina cur- ricular optativa nos demais cursos de educação superior e na edu- cação profissional, a partir de um ano da publicação deste Decreto (BRASIL, 2005, on-line). É notório que, desde o ano 2002, o fomento na expansão dos debates e a im- plementação das políticas públicas resulta, de forma prática, na consolidação de projetos, sonhos e ideais que rompem com as ações excludentes nas escolas. Podemos, assim, dizer que, a partir desse período, vimos como foi necessário pensar sobre as adaptações na metodologia de ensino para atender às demandas educacionais de alunos surdos. Exigindo na esfera educacional mais discussões, mais preparação e compreendendo que a inclusão, passou a ser cada vez mais realidade nas escolas. Agora, os alunos surdos têm leis que os amparam, a diver- sidade, que até então era mantida fora das escolas comuns a todos, passou a ser ambiente para todos, sem distinção. Em algum momento você deve ter ouvido ou mesmo participado de discussão sobre “in- clusão”, certo? Agora, pense: para você, o que caracteriza uma escola como verdadei- ramente inclusiva? O que a inclusão representa para você? O que implica educação de qualidade para todos? PENSANDO JUNTOS Essas questões serão respondidas na medida em que você avançar seus estudos. Por enquanto, é importante compreender que a forma legítima para abarcar todas as diferenças será viável por meio das Políticas Públicas. Sabemos que os desafios atuais são muitos, cabendo às escolas comuns incluírem estudantes, crianças ou adolescentes com necessidades educativas especiais, mas como as escolas estão se preparando desde 2002? Devemos pensar em muitos detalhes que abarcam UNICESUMAR UNIDADE 2 78 esse cenário, na busca de transformar não as estruturas físicas e materiais nas escolas, mas, sobretudo, perceber que, nesse contexto, o projeto inovador abrange também questões afetas às propostas pedagógicas. Sant’Ana (2005) enfatiza que os cursos de formação docente têm se desta- cado com maior ênfase nos aspectos teóricos, deixando uma ruptura distante da prática pedagógica, não preparando os profissionais para lidar com a diver- sidade dos educandos. Nesse aspecto, percebemos sérios problemas na imple- mentação de Políticas Públicas na área inclusiva, pois a formação de educadores deve ser repensada ao sentido de atrelar teoria e prática docentes, para que o ensino-aprendizagem dos educando seja realmente inclusivo e eficiente para atender às necessidades e desafios da contemporaneidade. A proposta que trago com essa história em quadrinhos representa como pen- sar sobre a Libras, tarefa que implica reorganização das propostas pedagógicas, portanto, há que se ter mais cuidados com os planejamentos.Sabemos que, em relação ao surdo, as adaptações ou acessibilidades são necessárias, pois são estra- tégias que direcionam o indivíduo surdo às novas práticas educativas, portanto, tais práticas passam a ser mais significativas. Destacamos que as propostas educacionais direcionadas aos alunos surdos de- vem garantir o pleno desenvolvimento de suas capacidades. Isso tudo vem ao encon- tro da educação bilíngue, assunto que será abordado com profundidade mais à frente. Vale ressaltar que a Língua Brasileira de Sinais foi oficializada como a língua que o povo surdo utiliza para se comunicar, desse modo, ela passa a ser vista como a L1 – Primeira Língua dos surdos e a Língua Portuguesa como L2 – Segunda Língua, ou seja, enfocando que, no ensino para os surdos, há a primazia da Libras e logo depois é que vem o Português. É importante esclarecer que Libras é o meio legal de comunicação entre os surdos e seus pares. Há um equívoco em pensar que a Libras é oficialmente reconhecida como segunda língua do Brasil, porém, cabe mencionar que isso não procede, pois a Libras é reconhecida como um meio legal de comunicação e expressão no Brasil e não como 2ª língua oficial do Brasil. Conforme consta na Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, é pertinente mencionar que a referida lei foi uma conquista para os surdos após um longo período de lutas da comunidade surda. 79 Professora, quais as principais contribuições da Lei 10436? Opa, essa pergunta é interessante! Vou explicar resumidamente. A Lei nº 10436 de 24 de abril de 2002, é considerada pela comunidade surda, a Lei mais importante para a educação dos surdos. Professora, o que isso significa? É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais – Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais – Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil Vejamos o primeiro artigo: Certamente isso, possibilitará ao professor e demais profissionais conhecer e compreender as necessidades e singularidades dos alunos surdos. Porém o Decreto nº 5.626 reconhece a Libras, inclui a Libras como disciplina curricular, estabelece normas para a formação de professores e do intérprete de Libras e garante saúde, educação dos surdos e dos deficientes auditivos. Na verdade é mais um aparato legal. Sabemos que a Lei nº 10436 de 24 de abril de 2002, vem ao encontro das necessidades dos estudantes surdos. Professora, e o Decreto nº 5.626 de 22 de dezembro? É mais uma alternativa política para as pessoas surdas? Ela reconhece o status linguístico da Língua de Sinais e estabelece que o sistema educacional federal e os sistemas de ensino estaduais, municipais e do distrito federal devem garantira inclusão do ensino de Libras em seus currículos nos cursos de formação de educação especial, fonoaudiologia e magistério. Figura 1 - Libras como meio legal de comunicação / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 2 80 Estudamos muito até aqui sobre a relevância das políticas públicas como garantia de avanços na educação, as leis têm como diretriz atuar no combate a qualquer desigualdade e exclusão dos alunos e atender todas as demandas sociais. NOVAS DESCOBERTAS Título: Crisálida Ano: 2019 Sinopse: esta coletânea de histórias emocionantes retrata os desa- fios complexos presentes no dia a dia das pessoas que convivem com a surdez. A trama passa em quatro episódios que retratam a forma de vida, as experiências e as dificuldades de convivência em diferentes seg- mentos sociais, como escola, lares, repartições públicas, comércios, entre outros. São jovens que se comunicam uns com os outros, ouvintes e surdos por meio da Libras. No primeiro episódio, são explorados assuntos perti- nentes aos conceitos de cultura, identidade surda, o método do oralismo e o desconhecimento da sociedade com a língua de sinais. Lembre-se de que a Lei nº 10.436 de abril de 2002 dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e é regulamentada pelo Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, ou seja a Lei nº 10.436 deve ser cumprida, executada pelas partes com- petentes. Apreciem o organograma indicado: A Lei nº 10.436/2002 1. A Libras é reconhecida como meio legal de comunicação e expressão. 2. A Língua Brasileira de Sinais – Libras – é a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico é de natureza visual-motora. 3. A Libras possui estrutura gramatical própria. 4. O poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públi- cos, devem apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais – Libras. 5. A Língua Brasileira de Sinais – Libras não poderá substituir a modalidade escrita da Língua Portuguesa. 81 A dificuldade existente na escolarização dos sujeitos surdos está relacionada às questões da língua, pois a Língua Brasileira de Sinais – a Libras – tem como prin- cípio uma modalidade espaço-visual, permitindo que a comunicação aconteça a partir daquilo que se vê, já a Língua Portuguesa, sendo oral e auditiva, leva em consideração apenas o que se ouve. Portanto, a gramática da Libras é diferente da Língua Portuguesa. Para o surdo aprender a Língua Portuguesa na modalidade escrita, ocorre do mesmo modo que a do ouvinte ao aprender qualquer outra segunda língua, como no caso da língua inglesa. A Libras é, portanto, uma língua que, assim como outras, apresenta seus pró- prios aspectos gramaticais. Gesser (2009, p. 27) enfatiza que “linguisticamente, pode-se afirmar que a língua de sinais é língua porque apresenta características presentes em outras línguas naturais e, essencialmente, por que é humana”. En- tão, não podemos pensar erroneamente, como muitos, que não a consideram uma língua, mas simplesmente um amontoados de gestos e mímicas. É preciso mudarmos esse pensamento. Ainda, por meio do Decreto nº 5.626/2005, em seu art. 3º, foi estabelecido que: “ Art. 3º A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obri- gatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiolo- gia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (BRASIL, 2005, on-line). Contudo, ainda que os cursos de formação inicial tenham a Libras como dis- ciplina obrigatória, o que podemos perceber em diversas escolas é que apenas esse contato durante o curso não possibilita que os docentes que atuam nas ins- tituições de ensino regular tenham todos os conhecimentos necessários para se tornarem fluentes e poderem se comunicar livremente com os alunos surdos. Para aprender Libras, é preciso muito esforço e comprometimento. Muitos professores acabam se interessando pela língua, têm até o desejo de aprendê-la, mas como exige tempo para tal, acabam se desinteressando nessa aprendizagem. Evidentemente, existem muitos professores que, ao se verem na sala de aula com UNICESUMAR UNIDADE 2 82 um aluno surdo, buscam todas as formas para aprender a Libras, pois com seu comprometimento ético, sentem-se na obrigação de saber se comunicar com aquele aluno e possibilitar um processo de ensino-aprendizagem de forma efetiva, porém nem todos os professores agem dessa forma. O acesso à educação formal de qualidade para surdos ainda é um desafio para a comunidade surda e para toda a educação nacional, tendo em vista a falta de recursos materiais e humanos. O estudante surdo enfrenta o dilema de ter que escolher entre uma escola regular adaptada ao mundo ouvinte, que é quando a es- cola conta com a presença de um intérprete, profissional que auxilia no processo de ensino-aprendizagem, devido à mediação da comunicação entre o estudantesurdo, demais estudantes, professores e profissionais ouvintes, ou frequentar uma escola especializada somente para pessoas surdas, o que muitos pesquisadores apontam como sendo uma espécie de segregação social. 83 Na perspectiva da educação inclusiva, a aprendizagem constitui um processo equilibrado entre a elaboração coletiva e o formato da organização do processo ensino-aprendizagem. Nesse foco, ambos estão ligados às múltiplas formas de colaboração em diversos grupos, buscando formar, a partir desse esforço con- junto, novos parâmetros para um programa de educação formal. Assim, devemos observar o processo político educacional das políticas públicas, como campo legítimo que regulamenta estratégias no processo de transformação. A instrução do aluno surdo nas escolas de inclusão é predominantemente visual. É importante destacar que, buscando promover a igualdade com relação ao ensino-aprendizagem do indivíduo, respeitando o acesso à educação e inclusão de todos, no ano de 2021, houve um avanço na legislação a respeito da educação para surdos. A legislação altera o artigo terceiro da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sob a Lei nº 14.191, de 3 de agosto de 2021, incluindo um inciso referente ao reconhecimento da cultura surda que, posteriormente, fundamentou o Capítulo V – A do art. 60, tratando sobre a Educação bilíngue de surdos. A Lei nº 14.191, de 3 de agosto de 2021, dispõe sobre a modalidade de educa- ção bilíngue de surdos. Ela altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), assegurando a oferta da educação bilíngue aos estudantes surdos a partir educação infantil. A mudança na LDB insere o ensino bilíngue para as pessoas surdas nas escolas, a fim de torná-lo uma modalidade independente, estabelecen- do a Libras como primeira língua e a Língua Portuguesa escrita como segunda. Para tanto, o conceito de bilíngue implica em dominar todas as habilidades e modalidades referentes a uma língua. Para os surdos, o termo tem o sentido de ser fluente na língua de sinais e podem e devem dominar a modalidade escrita da Língua Portuguesa. Segundo Bakhtin (1997), de nada adianta dois falantes de uma mesma língua estar frente a frente se eles não conseguirem se entender, eles pre- cisam estar e serem conhecedores do mesmo objeto que permeia a comunicação. Como será então se os interlocutores tiverem como meio de comunicação duas línguas diferentes? Uma oral e outra viso-motora? Essa é a situação encontrada em grande parte do território brasileiro, já que, nesse caso, a Língua Portuguesa é a língua dominante, sendo a modalidade de interação entre surdos e ouvintes, visto que os primeiros coexistem em espaços comuns com o grupo minoritário. UNICESUMAR UNIDADE 2 84 As escolas regulares podem ofertar o atendimento especializado para surdos, tendo um profissional que possa atender às necessidades deste aluno ou pode-se haver um espaço onde o ensino bilíngue ocorra, sendo a Libras a língua principal e a Língua Portuguesa escrita como segunda língua. O surdo tem sua própria cultura e questões relacionadas à surdez, que precisam ser respeitadas: “ [...] é muito comum e natural ouvir discursos de oposição às cul- turas ouvintes pregando a homogeneidade cultural surda. Esse é, sem dúvida, um posicionamento essencialista que, por sua vez, tem em vista a afirmação, a valorização e o reconhecimento cultural [...] (GESSER, 2009, p. 53). Conheça a seguir as principais leis que regulamentam a educação do surdo no Brasil. Respeitando uma ordem cronológica, você terá um panorama das princi- pais leis que transformaram a educação das pessoas surdas no Brasil. Em 1989, foi criada a Resolução nº 734, que foi elaborada pelo Conselho Na- cional de Trânsito (Contran). Ela traz detalhes sobre todas as questões associadas ao direito dos surdos de obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e dirigir. Em 1991, ficou instituído pela força da Lei de nº 8.160, a caracterização do símbolo que permite a identificação das pessoas que apresentam surdez. Essa é reconhecida pela comunidade surda, como uma das primeiras a reconhecer a importância da Libras para as pessoas surdas em nosso país. Em 15 de maio de 1998, surgiu o Decreto de nº 2.592, esse decreto conferiu aprovação ao Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado no Regime Público. Já o Decreto de nº 3.298 de 1999 teve como principal objetivo definir uma tabela com o intuito de enquadrar as pessoas com deficiência, conforme determinadas categorias estabelecidas. NOVAS DESCOBERTAS Conheça a Lei nº 14.191/2021, acessando o link, a seguir. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20650 85 No ano de 2000, ficou registrado a Lei de nº 10.098/2000, diante desse apa- rato legal, essa lei é considerada pela comunidade surda como uma das mais relevantes, por se tratar de várias questões sobre acessibilidade. Chegamos no ano de 2002, que nos é apresentada a Lei de nº 10.436, que mu- daria definitivamente a vida das pessoas surdas. Conhecida como a Lei da Libras – reconhece como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais – Libras, além de outros recursos de expressão. No ano de 2004, foi oficializada, em 5 de março, a lei que criou o Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas com Defi- ciência. É desse ano também a Lei de nº 4.309, que fortalece o universo da educação, pois trata sobre o ingresso de surdos nas universidades públicas estaduais brasileiras. Lei de nº 4.304 de 2004, essa lei para os surdos e Libras foi oficializada no dia 7 de abril. Ela trata sobre o uso de recursos visuais, destinados às pessoas surdas, na veiculação de propaganda oficial. É importante apontar que essa é responsável pela ampliação e difusão do uso da comunicação em Libras nos canais televisivos. Decreto de nº 5.626 de 2005, surgiu com o intuito de regulamentar a Lei nº 10.436, que trata sobre a Libras. Foi no ano de 2008, que ficou instituído, por meio da resolução publicada em 26 de fevereiro, regulamentação do cumprimento ao conteúdo do art. 1º da Lei de nº 12.522, oficializada em 2 de janeiro de 2007. A Lei nº 11. 796 oficializou em todo território brasileiro o Dia Nacional dos Surdos. Assim, o dia 26 de setembro passou a compor mais uma data comemo- rativa para a comunidade surda. Quanto à Lei de nº 12.319 de 2010, ficou claro para todos que ela regulamenta a profissão de Tradutor e Intérprete da Língua Brasileira de Sinais. Chegamos mais próximos dos dias atuais, com a PL nº 4909/2020, promulga- da no ano de 2021. A presente lei altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, ao estabelecer as Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a modalidade de educação bilíngue de surdos. Ela dispõe sobre a educação bilíngue de surdos, modalidade de educação escolar oferecida em Libras, como primeira língua e, em Língua Portuguesa escrita, como segunda língua para educandos com deficiên- cias auditivas. Determina à União a prestação de apoio técnico e financeiro aos sistemas de ensino para o provimento da educação bilíngue. Contamos, ainda, com a Lei nº 14.191/2021, que traz, no seu bojo, a definição à educação bilíngue de UNICESUMAR UNIDADE 2 86 surdos, como aquela em que a Língua Brasileira de Sinais (Libras) é considerada primeira língua e a Língua Portuguesa escrita como segunda língua. Determi- nando que a oferta dessa modalidade de ensino deverá começar na educação infantil e se estender ao longo da vida acadêmica. Como Libras é uma língua natural e atende às especificações citadas por Skliar (2013), o Decreto nº 5.626/2005, no Capítulo IV, trata sobre a difusão da língua para acessibilidade das pessoas surdas para a educação. Enquanto o Inciso IV especifica que os órgãos gestores de educação deveriam garantir o atendimento às necessida- des educacionais específicas de alunos surdos, desde a educação infantil,nas salas de aula e em salas de recursos, em turno contrário ao da escolarização. Conforme Skliar (2013, p. 27), “entende-se por língua natural uma língua que foi criada e é uti- lizada por uma comunidade específica de usuários que se transmite de geração em geração e que muda tanto estrutural como funcionalmente com o passar do tempo”. Até aqui, acredito que você compreendeu que o bilinguismo representa um avanço na educação dos surdos, pois, segundo Santana (2010, p. 168), “o bilinguis- mo amplia a capacidade cognitiva e linguística do surdo, propiciando resultados melhores na aprendizagem”, quando comparados ao uso da modalidade oral para eles. Na proposta bilíngue, segundo Quadros (1997, p. 32-33), “todos os conteú- dos seriam trabalhados na língua nativa dos alunos surdos, Libras, e a Língua Portuguesa em momentos específicos das aulas com leitura e escrita da língua”. Portanto, para que aconteça a inclusão do aluno surdo no ensino regular, em primazia, requer uma escola e sociedade inclusiva, assegurando a igualdade de oportunidades. Que a comunidade seja cada vez mais consciente da diversida- de que existe no ambiente escolar, que tenhamos mais professores capacitados e compromissados, aptos para lidar com as diferenças exercendo suas práticas pedagógicas de modo a alcançar todos os alunos. Diante das discussões que traçamos até aqui, podemos afirmar que são inú- meras as razões que movimentam a pesquisa, a história e o processo educacional, servindo de aporte para novos conhecimentos e encaminhamentos nos âmbitos da educação especial e da educação inclusiva para os estudantes surdos. Podemos des- tacar que os movimentos sociais foram decisivos para promover mudanças no ce- nário educacional, no caso do povo surdo. Conhecemos que a educação dos surdos seguiu os caminhos influenciados pelos mecanismos internacionais estabelecendo relações com os contextos sociais vigentes em cada período. Tanto a história quanto as implementações políticas nos mostraram que os avanços, no tocante à “educação”, 87 aconteceram de forma lenta, porém elas cumpriram com a própria evolução da educação no seu aspecto mais amplo concretizando a democratização da produção do conhecimento, o respeito à diversidade e, sobretudo, narrando as experiências do povo surdo, sua cultura, identidade linguísticas e formas de perceber e aprender as coisas que compõem o mundo com seus pares. Portanto, elas estão cumprindo com suas dimensões – formal e institucional, responsáveis pela formação integral do cidadão nos seus aspectos sociais e cognitivos. Agora, você é nosso convidado especial para acompanhar o podcast que preparamos exclusivamente para você, a fim de que possa apreciar novas experiências e conhecer de perto a vida do Taynan, um homem surdo que tem o prazer de compartilhar conosco um pouco da sua vida pes- soal e acadêmica. Nosso convidado vai fazer você viajar em uma experiência nova e cheia de oportunidades. Vamos lá? Aproveite e faça suas anotações. A legislação estabelece os direitos dos surdos e orienta as políticas educacionais inclusivas. Isso significa que conhecer essas leis nos ajuda a garantir uma educa- ção de qualidade para todos. Imagine que, ao conhecer as leis, podemos exigir a presença de intérpretes de língua de sinais nas escolas, garantindo a comunicação plena dos surdos. Além disso, podemos lutar por uma educação bilíngue, cuja língua de sinais seja reconhecida e valorizada como língua natural dos surdos. Ao promover uma educação inclusiva e respeitar a identidade linguística dos surdos, estamos proporcionando igualdade de oportunidades, estimulando o desenvolvimento cognitivo e linguístico e preparando-os para uma participação plena na sociedade. É muito importante conhecer os aspectos legais e colocá-los em prática para garantir uma educação inclusiva e de qualidade para os surdos. As políticas públicas educacionais têm suas relevâncias quando são imple- mentadas e chegam no chão da escola, provocando mudanças e aperfeiçoamento e, a partir disso, temos como resultados novos conhecimentos, novas oportunida- des e, certamente, educação com equidade. Pense comigo: você acredita que com a força das leis é possível obter melhorias no campo educacional? As políticas impactam de que forma as ações pedagógicas? Vamos nos informar e compartilhar esse conhecimento para contribuir com a construção de uma sociedade mais igualitária e inclusiva! UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/14478 88 1. As leis educacionais são formas para que novas ações se cumpram na sociedade em geral. Os objetivos são voltados para garantir direitos e deveres aos cidadãos. Consi- derando nossos estudos sobre as políticas públicas no Brasil, avalie as alternativas a seguir e assinale a que corresponde a uma grande conquista da comunidade surda, possibilitada pela Lei Federal nº 10.436 de 2022, a implantação de escolas especiais para alunos surdos. a) A oficialização da Libras como Língua Brasileira de Sinais. b) A obrigatoriedade de todos os cidadãos aprenderem a Libras nas escolas. c) O direito de o surdo aprender primeiramente a Língua Portuguesa oficial do Brasil. d) A regulamentação dos aparelhos de ampliação sonora individual (AASI – prótese auditiva). e) Nenhuma das alternativas anteriores está correta. 2. Atualmente, com a adoção do bilinguismo como abordagem educacional para os sur- dos brasileiros, não são mais utilizadas as expressões surdo-mudo ou deficiente au- ditivo para referenciar esses sujeitos. Nesse contexto, analise as afirmações a seguir. I - Quando se pretende agir em uma perspectiva inclusiva, a utilização de termos adequados é imprescindível. II - A denominação escolhida para designar uma pessoa ou um grupo de pessoas revela a nossa concepção a respeito desse público. III - A utilização de termos ultrapassados pode colaborar para perpetuar preconcei- tos e estereótipos. IV - A expressão Linguagem de Sinais é inadequada para classificar a Libras. É correto o que se afirma em: a) I, II e III, apenas. b) I, III e IV, apenas. c) I, II e IV, apenas. d) II, III e IV, apenas. e) I, II, III e IV apenas. 89 3. A Comunicação Total (CT) foi adotada no Brasil no final da década de 1970, particu- larmente nos estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A Comunicação Total utiliza todos os recursos para facilitar a comunicação entre surdos e ouvintes e entre surdos. Considerando essa abordagem educacional, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas. ( ) A surdez é entendida pelos defensores da Comunicação Total como uma defi- ciência que precisa ser normalizada. ( ) A família, da mesma forma que no oralismo, desempenha papel fundamental na educação dos surdos segundo a CT. ( ) Além dos procedimentos adotados pelo oralismo, a CT utiliza a datilologia e a língua de sinais. ( ) Os resultados obtidos com essa abordagem não foram satisfatórios nem para a aquisição da língua oral nem para a escrita. Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta: a) V, V, F, F. b) V, F, V, F c) V, F, V, V. d) V, F, F, V. e) F, V, V, V. 3Abordagens Pedagógicas da Educação de Pessoas Surdas: um olhar nas práticas educativas Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Caro estudante! Seja bem-vindo a este estudo. Não conseguimos avan- çar nos nossos estudos, sem relacionar a trajetória da educação do surdo com a modalidade de educação especial, elas são indissociáveis. Para que entenda as influências intelectuais que definiram as aborda- gens pedagógicas que marcam a história, continue compreendendo o movimento e a reorganização no que tange às abordagens pedagógi- cas, em cada tempo e espaços educativos. Bons estudos! UNIDADE 3 92 Ao longo da história, as abordagens pedagógicas em relação à educação de pes- soas surdas têm passado por transformações significativas. Durante muito tempo, a segregação e a exclusão foram práticas predominantes, limitando as oportu-nidades de aprendizado e desenvolvimento dos surdos. No entanto, nas últimas décadas, tem ocorrido um movimento crescente em direção a uma abordagem mais inclusiva e igualitária: a Educação Bilíngue para surdos. Diante desse cenário, surgem diversas questões relevantes a serem explora- das. Qual era a lógica por trás da segregação? Quais foram as consequências da segregação na formação das pessoas surdas? Como a Educação Bilíngue, que valoriza a língua de sinais como primeira língua e busca a aquisição da língua majoritária, está transformando esse panorama? Quais são os benefícios cogni- tivos, linguísticos e sociais dessa abordagem? Além disso, é importante refletir sobre os desafios e obstáculos que ainda precisam ser superados para uma efetiva implementação da Educação Bilíngue. Como garantir a formação adequada de professores e a disponibilidade de recur- sos educacionais adequados? Como lidar com resistências e preconceitos ainda existentes em relação às línguas de sinais e à diversidade linguística? Um dos maiores desafios para a comunidade surda é consolidar a proposta de educação bilíngue para os surdos, o que torna possível o acesso a duas línguas no âmbito escolar e valoriza sua cultura e língua particulares. Você perceberá que a educação bilíngue conecta os surdos às suas experiências de vida e ao modo de viver, pensar e se comunicar, o que contribui para o seu aprendizado, principal- mente, ampliando suas capacidades intelectuais e sociais. Nesse contexto, a discussão sobre as abordagens pedagógicas na educação de surdos é fundamental para promover uma reflexão crítica sobre as práticas do passado, os avanços alcançados e os desafios futuros. Por meio do debate e do entendimento aprofundado dessas questões, podemos trabalhar em di- reção a uma educação mais inclusiva, que respeite a identidade linguística e promova o pleno desenvolvimento dos surdos como cidadãos autônomos e participantes ativos da sociedade. Você conhece alguma escola bilíngue na sua cidade? O que você sabe a respei- to da educação bilíngue? Você acredita que a educação bilíngue é mais adequada para o desenvolvimento do povo surdo? Pesquise na LDB, Lei nº 9.394/96, quais são os artigos que contemplam a educação bilíngue e a educação inclusiva. 93 As questões apontadas anteriormente nos remetem ao processo histórico da educação de pessoas surdas, no mundo e no Brasil. A partir dos fatos, compreen- demos que os movimentos sociais, no âmbito educacional, têm nos mostrado que tais movimentos são molas impulsoras que geram mudanças. De certa for- ma, buscou-se, por meio das leis, garantir o devido respeito ao povo surdo. Isso porque esse respeito está diretamente relacionado à identidade da pessoa surda, com sua língua e sua cultura. Isso demonstra a intenção de realçar a sua condição de sujeito e de cidadão, como aquele que tem o direito de participar plenamente do processo educativo e das atividades sociais, atendendo às suas necessidades e realizando seus anseios e seus objetivos. DIÁRIO DE BORDO UNICESUMAR UNIDADE 3 94 A Educação de surdos e as políticas públicas do Brasil - Inclusão em foco As novas relações sociais têm exigido da comunidade educacional novas formas para enfrentamento dos problemas sociais, visto que a escola não é um lugar iso- lado, ela não se constitui como um espaço inerte às tensões da sociedade. É nesse espaço em que devemos centrar todos os esforços, para superar os problemas existentes no cotidiano das escolas. Assim, a inclusão é um dos discursos que vem ocupando tempo e estudos e que se reflete, no funcionamento da escola. Tratar da inclusão, além de necessário, culmina em manter e difundir um debate coeso em defesa dos direitos dos estudantes. Segundo Freire (2011, p.70), a escola “se faz por meio de palavras, não pode ser rompida a relação pensamento-linguagem contexto ou realidade”. Quando a escola assume e exerce esse papel, aproximamo-nos no que chamamos de atitu- des politicamente corretas, pois tais discussões abordam a diversidade cultural e social de indivíduos e grupos. Nesse cenário, respeitar as diferenças se tornou mais do que um objetivo a ser alcançado, passou a ser estratégia nas políticas públicas educacionais brasileiras. Conhecer a legislação acerca da educação de surdos no Brasil é fundamental para que o professor possa orientar seus alunos e familiares, assim como conhecer as políticas públicas educacionais para o surdo brasileiro cumpre também essa função. Além dis- so, esse conhecimento é importante para que o professor possa reivindicar melhores condições de trabalho, conduzindo efetivamente os processos de inclusão e exercendo práticas educativas mais significativas. 95 O processo de inclusão educacional é marcado por encontros e desencontros, avanços e retrocessos. As relações que envolvem os processos educativos carecem de reformas educacionais, e as políticas públicas possibilitam melhorias acerca dessas questões, e tais questões reforçam reflexões sobre a melhor forma de tratar a educação e a deficiência. Assim, em respeito à diversidade, a sociedade levanta reflexões sobre quem são os estudantes que necessitam da Educação Especial. Como os estudantes inclusos aprendem? Quais metodologias devem ser aplica- das? E claro, adentramos em um dos maiores desafios: a formação adequada, ou formação continuada, dos professores que trabalham com os alunos inclusos, na modalidade da educação especial. São muitas as razões que fomentam reflexões na busca de harmonização en- tre educação e diversidade, embora saibamos que ainda nos deparamos com muitos conflitos e contrapontos. Porém há os avanços e as novas perspectivas para implementação da inclusão, mas o principal alvo é o direito à educação de qualidade em qualquer instituição de ensino. À medida que a população mundial foi aumentando, outras experiências e necessidades sociais foram se apresentando. A escola que conhecemos na atualidade é resultado de medidas de influências de práticas culturais que determinam como o lugar comum a todos — a escola — deve ser pensada, analisada, pesquisada e modificada para atender às demandas atuais. Escola é espaço científico-social que gera e gerencia vidas. A qualidade educacional é um dos indicadores mais desafiadores que se apresenta na atualidade, como afirmam Matos, Lima e Menezes (2020). Dessa forma, temos a escola como um espaço de educar e que pode assegurar novas oportunidade e valorização das pessoas com deficiência. As políticas da educação inclusiva vêm superando os entraves no ato de educar, porém preci- sam de maiores adequações estruturais nas escolas e de efetivação de práticas pedagógicas voltadas para educação inclusiva. A primeira política pública para a educação dos surdos em nosso país pode ser considerada a decisão imperial de 26 de setembro de 1857, quando o governo de D. Pedro II criou o Instituto Nacional de Surdos-Mudos do Rio de Janeiro, atual Instituto Nacional de Edu- cação do Surdo (INES), que adotava a língua de sinais, criada por Ernest Huet, professor surdo francês que chegou ao Brasil com o objetivo de iniciar a edu- cação dos surdos. Porém, depois da proibição da língua de sinais, determinada pelo Congresso de Milão (1880), o INES, em 1911, estabeleceu o oralismo como UNICESUMAR UNIDADE 3 96 método de educação dos surdos. Atualmente, a filosofia educacional adotada é o bilinguismo (GOLDFELD, 1997). Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, na qual, em diferentes artigos, são garantidos os direitos das pessoas com deficiência, foram propostas políticas para que a atuação dos diferentes órgãos governamentais pudesse estar em conformidade com os dispositivos constitucionais. Assim, rege o art. 208: “ Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: [...]. III - atendimento educacional especializado aos portadores de defi- ciência, preferencialmente na rede regular de ensino (BRASIL, 1988).A legislação brasileira referente à educação de surdos Por essas razões, cada vez mais, os segmentos educacionais têm desenvolvido os estudos na área da Educação abarcando suas ramificações. A educação especial se desponta com relevância no centro das discussões, buscando analisar o pa- pel social da escola, ampliando a difusão de ideias e práticas educacionais que atendam a todos, que seja acessível a todos que nela se encontram. Nesse campo, cresce a parceria com a família, não só como promoção do desenvolvimento 97 da pessoa com necessidades especiais, mas também como suporte social para todos os envolvidos. Todavia os mesmos estudos indicam para a importância da parceria família e escola. Nesse sentido, há ainda obstáculos que precisam ser ultrapassados, apontando dificuldade de se conseguir o envolvimento ideal dos familiares, tendo como um dos principais motivos a distância dos profissionais da Educação Especial em relação à família. Distanciamento esse, na maioria das vezes, inconsciente, ligado a outros fatores, como a história da família, o tipo de funcionamento familiar, a integração da família na comunidade etc. Aqui, cabe ressaltar os pontos que envolvem os aspectos socioculturais. O professor é o agente principal dessa parceria que precisa ser feita entre a escola e a rede de apoio, como o dirigente, a equipe pedagógica e a equipe técnica formada por psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos e terapeutas. Nesse sen- tido, de forma mais expressiva, o professor e demais profissionais assumem com a sociedade o papel expressivo de ser capaz de orientar os pais sobre a deficiência do filho e quais os programas de atendimento disponíveis e que são eficazes que complementam as ações educacionais, de saúde, psicologia ou assistência social. É de responsabilidade do professor a orientação sobre a atuação da família em toda a vida escolar do filho com necessidades especiais, daí a necessidade de o professor conhecer a legislação e as políticas públicas que contemplam os surdos para ajudar no que for necessário a família, para procurar as entidades competentes para aplicação das leis. Outro fator fundamental para os professores e demais profissionais que aten- dem os estudantes com deficiência, ou necessidades educativas especializadas, é conhecer a legislação que rege os direitos dos surdos. Esses profissionais são, na maioria das vezes, os únicos profissionais aos quais a família tem acesso. Os profissionais, por possuírem o conhecimento teórico-prático (de como agir, quais práticas educativas e como os alunos se desenvolvem), estão de posse da sereni- dade emocional que as famílias demoram a conseguir, quando se deparam com o imprevisto da chegada de uma criança com necessidades especiais. Só recentemente passamos a ter legislação destinada especificamente aos surdos. A maioria das legislações brasileiras, em relação às garantias de direitos à educação, à saúde, ao trabalho, à acessibilidade etc., não contempla diretamente os surdos, mas, sim, a totalidade das pessoas com deficiência, independentemente de suas particularidades, muitas vezes, gerando tensão entre os diferentes segmentos que constituem esse conjunto de pessoas. UNICESUMAR UNIDADE 3 98 Dentre as leis que contemplam os direitos dos surdos, começamos pela Cons- tituição Federal de 1988, considerado um marco em relação aos direitos humanos no Brasil, Lei nº 7.853/1989, Lei 9.394/1996 (LDB), Portaria nº 1.679/1999, Lei Fe- deral nº 10.098/2000, Lei Federal nº 10.436/2002, Decreto Federal nº 5.296/2004, Decreto Federal nº 5.626/2005, Decreto nº 6.949/2009, Decreto nº 7.611/2011, Lei nº 13.146/2015 e Lei nº 14.191/2021, a mais atual. Sabemos que as leis resultam dos movimentos criados na sociedade, prin- cipalmente pelos grupos da comunidade surda que carregam uma influência mundial, como é o caso do impacto do Congresso de Milão, que repercutiu, in- clusive, aqui no Brasil e durou 100 anos. Após esse longo período da supremacia do oralismo, as primeiras mudanças começam a ocorrer com a Declaração de Salamanca, em 1994, quando representantes de diferentes países discutiram na Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais. “ No caso do movimento social surdo, lembramos que uma série de fatos pode ser elencada a partir do retorno à democracia no país, na década de 1980, como a criação da Federação Nacional da Educação e Integração dos Surdos (FENEIS), em 1987, que propiciou a concentração desse movimento. A FENEIS foi basilar na demanda dos surdos, que passaram a reivindicar a legitimação da língua de sinais. Como em outros casos de grupos minorizados que são excluídos por diferenças linguísticas, o movimento surdo pautou os direitos linguísticos como sendo a base dos direitos civis (BAALBAKI, 2018, p. 258). Vale destacar que, com o regime autoritário já em declínio, nesse período, houve a ascensão do movimento político social de redemocratização da república. Surgindo no final da década de 1970, desponta na sociedade o anseio e a luta pelo direito à cidadania, que se fortalece mais tarde na década de 1980. Nesse campo político, em busca da cidadania, as lutas ganham espaços, em busca de igualdade social, transformando grupos minoritários em protagonistas na luta pelos direitos sociais. (BRITO, 2016). As primeiras movimentações políticas para a democratização da educação do surdo no Brasil tiveram início no século XIX (em 1824), quando foi promulgada a primeira Constituição Brasileira, defendendo, em seus artigos, a gratuidade da 99 instrução primária para todos. Essa mesma constituição não explica de quem seria a responsabilidade pelo sistema e processo educacional, tirando o Poder Público desse compromisso. A criação de instituições para deficientes, doentes mentais, leprosos e outros significa a materialização das formas mais modernas de cuidar da nova ordem social, pessoas que fogem dos critérios sociobiológicos devem ser segregadas para garantir boas relações entre eles. Na época, a ideologia emergente exaltava a ideia de que todos eram livres. Se todos são livres, então, todos são iguais. Para preservar a igualdade dos indivíduos, é necessário isolar aqueles que possam interferir ou dificultar a manifestação de uma vontade particular. NOVAS DESCOBERTAS Quer saber mais sobre os movimentos sociais dos surdos? Reco- mendo a leitura do artigo “O Indivíduo Surdo na Sociedade Ouvinte: Resistir é preciso”. Educação Bilíngue para Surdos No ano de 2021, a LDB, Lei nº 9.394/96, incluiu a educação bilíngue como moda- lidade, assim como é reconhecida a educação especial. Assim, está previsto com Lei nº 14.191, de 2021: “ Art. 60-A. Entende-se por educação bilíngue de surdos, para os efei- tos desta Lei, a modalidade de educação escolar oferecida em Língua Brasileira de Sinais (Libras), como primeira língua, e em português escrito, como segunda língua, em escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou em polos de educação bilín- gue de surdos, para educandos surdos, surdo-cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas, optantes pela modalidade de educação bilíngue de surdos (BRASIL, 2021, on-line). UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20655 UNIDADE 3 100 Você conhece a Lei nº 10.436/2002? “ Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasilei- ra de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gra- matical própria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (BRASIL, 2002, on-line). Veja que o art. 60 estabelece que a Libras é a primeira Língua e a Língua Portu- guesaé a segunda língua, porém na sua forma escrita. A Libras tem prioridade, haja visto que os surdos precisam dominar o português escrito. Dessa forma, a legislação preconiza para os estudantes surdos a frequência de escolas de referên- cia para a educação bilíngue, com prática educativa especializada que garanta tal modelo, visando o desenvolvimento linguístico, o acesso ao currículo nacional comum e a inclusão escolar e social. A Lei nº 14.191/2021 é clara, os estudantes surdos podem frequentar escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou polo de edu- cação bilingue de surdo. A educação bilíngue de surdos é opcional, o que significa que os estudantes poderão decidir se querem, ou não, estudar nessa modalidade. Inclusive, a mesma Lei sinaliza no parágrafo 1º: § 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio educacional especializado, como o atendimento educacional especializado bilíngue, para atender às especi- ficidades linguísticas dos estudantes surdos. Haverá Quando necessário Serviços de Apoio Especializado, como o atendi- mento educacio- nal especializado bilíngue Para atender às especificida- des linguísticas dos estudantes surdos. Quadro 1 - Educação Bilíngue / Fonte: adaptado de Brasil (2021). 101 § 2º A oferta de educação bilíngue de surdos terá início ao zero ano, na educação infantil, e se estenderá ao longo da vida. Assim, percebemos que o direito à educação bilíngue está concomitantemente re- lacionado com a língua de sinais por toda a vida e por toda esferas e níveis da edu- cação, na EJA, na educação profissional, na educação infantil e na educação básica. § 3º O disposto no caput deste artigo será efetivado sem prejuízo das prerroga- tivas de matrícula em escolas e classes regulares, de acordo com o que decidir o estudante ou, no que couber, seus pais ou responsáveis, e das garantias previstas na Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que incluem, para os surdos oralizados, o acesso a tecnologias assistivas. Oferta de educação bilíngue de surdos Início ao zero ano, na educação infantil Estenderá ao longo da vida Quadro 2 - Oferta da Educação Bilíngue / Fonte: adaptado de Brasil (2021). O disposto no caput deste artigo será efe- tivado sem prejuízo das prerrogativas de matrícula em escolas e classes regulares De acordo com o que decidir o estudante ou, no que couber, seus pais ou responsáveis, e das garantias previstas na Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) Que incluem, para os surdos oralizados, o acesso a tecnologias assistivas. Quadro 3 - Liberdade de Escolha / Fonte: adaptado de Brasil (2021). É relevante conhecer o que prevê o art. 60b. “ Art. 60-B. Além do disposto no art. 59 desta Lei, os sistemas de ensino assegurarão aos educandos surdos, surdo-cegos, com de- ficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas materiais didáticos e professores bilíngues com formação e especialização adequadas, em nível superior. UNICESUMAR UNIDADE 3 102 Parágrafo único. Nos processos de contratação e de avaliação periódi- ca dos professores a que se refere o caput deste artigo serão ouvidas as entidades representativas das pessoas surdas (BRASIL, 2021, on-line). Os sistemas de ensino assegu- rarão aos educandos surdos, surdo-cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas Materiais didáticos Professores bilíngues com formação e espe- cialização adequadas, em nível superior. Quadro 4 - Material Didático / Fonte: adaptada de Brasil (2021). Veja que a lei deixa claro que, para atuar na educação bilíngue de surdos, o pro- fessor deve ter formação em nível superior. Isso difere da lei de educação especial, Lei nº 9.394/1996, mais precisamente no art. 59, III, “professores com especiali- zação adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns” (BRASIL, 1996, on-line, grifo nosso). Uma educação bilíngue pressupõe muito mais que o domínio de duas línguas. De acordo com a perspectiva socioantropológica presente nos recentes estudos sobre a educação de surdos, a surdez é considerada uma diferença que deve ser respeitada, e não uma deficiência a ser corrigida e/ou reparada (POMPEU; MOURA, 2016). A surdez faz da criança uma pessoa que apresenta possibilidades diferentes e, dessa forma, não deve ser compreendida como um ser humano que possui algo que falta ou inexistência de audição, já que existem distintas formas de desenvolvimento e é por esse motivo que o planejamento educacional deve ser orientado, tendo como parâmetro as potencialidades do aluno, e não sua oralidade. O objetivo é romper com as barreiras enfrentadas com a comunicação. Isso tem sido apontado como um fator muito importante, para que os estudantes surdos sejam bem-sucedidos no pro- cesso educacional, por isso, eles precisam se comunicar e ter acesso à comunicação. “ Uma educação bilíngue parte do reconhecimento da coexistên- cia de duas línguas no entorno da criança, as quais se atribuem todo o valor como instrumento de comunicação e como valor 103 de pertencimento, portanto, considera-se obrigatório respei- tá-las como tais, independentemente do prestígio que lhes é atribuído pelo grupo dominante. E que se faça valer o direito da criança a utilizar em sua aprendizagem que lhe permita me- lhor desenvolvimento. Não restringindo o conceito de educação bilíngue ao simples fato de utilizar dois idiomas na atividade escolar (SANCHES, 1990, p. 146). “Para que as práticas educativas possibilitem a inserção sociocultural dos alunos, é necessário ter uma visão crítica do mundo. Ser capaz de entender que a história não acabou e ninguém deve fazer por nós a nossa história” (PADILHA; SILVA, 2020, p. 18). Dada essa colocação, reforça a necessidade de garantir a existência das escolas bilíngues. Isso porque, nesses espaços, a educação bilíngue de surdos envolve a criação de ambientes linguísticos para fortalecimento da aquisição de Libras como primeira língua (L1). A educação bilíngue para surdos constitui um território em que há harmonização entre Libras e língua portuguesa. “A educação bilíngue deve basear-se na utilização plena da língua de sinais, a fim de garantir o desenvolvimento intelectual linguístico do aluno surdo, oti- mizando o aproveitamento do ensino regular e facilitando a aprendizagem da língua falada nas suas formas oral e escrita” (SANCHES, 1990, p. 153). É nesse espaço em que os alunos surdos terão a possibilidade de encontrar um ambiente linguístico para aquisição da primeira língua, a Libras. A proposta bilíngue está em concordância com a Declaração de Salamanca, sempre presente em citações de teóricos, que dissertam sobre a inclusão, tratando de um dos primeiros do- cumentos internacionais sobre o assunto, que aponta a Libras como primeira língua dos surdos (L1) e subsequente a língua oficial do país como segunda língua (L2). Outro ponto relevante diz respeito ao Decreto nº 5.626/2005, sobre o bilinguismo e a viabilidade de escolas bilíngues para surdos e ouvintes. “ Art. 22: As instituições federais de ensino responsáveis pela edu- cação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de: I - escolas e classes de educação bilíngue abertas a alunos surdos e ouvintes com pro- fessores bilíngues, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental [...] (BRASIL, 2005, on-line). UNICESUMAR UNIDADE 3 104 Pouco ainda se encontra a respeito do tema, porém o bilinguismo aparece como o mais adequado no processo de aprendizagem da língua portuguesa para os surdos. Pompeu e Moura (2016, p. 93) esclarecem que, “nesse tipo de bilinguis- mo, o surdoutiliza a Libras em todas as situações, assim como a criança ouvinte utiliza a língua portuguesa na modalidade oral. Para os surdos, o português é ensinado de forma sistemática na modalidade escrita, desempenhando o papel de segunda língua”. O que a comunidade surda busca, além do direito de aprender, é se comunicar com qualquer pessoa e que seus direitos sejam respeitados, e não somente que aceitem a existência da Libras. A comunidade surda quer que as pessoas com- preendam o seu modo de pensar, para isso, é necessário conhecer a educação bilíngue e aceitar tudo o que faz parte dessa comunidade, a sua identidade, sua cultura e sua forma de visão de mundo. Aprendemos que o movimento inclusivo educacional teve origem durante a década de 1990, no final do século XX. Esse movimento foi influenciado pelos acordos inter- nacionais, como: a) Declaração Mundial de Educação para Todos, evento idealizado e realizado na Tailândia, em 1990. b) Declaração de Salamanca, evento idealizado pela Unesco e pelo Governo da Espanha, no ano 1994. A partir desses marcos, os movimentos internacio- nais impactaram as políticas noBrasil, motivando e provocando mudanças na esfera educacional. Assim, a implantação da Política Nacional de Educação Especial, realizada no ano de 1994, foi confirmada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) ao incluir artigos específicos para o atendimento educacional a pessoas com deficiência. A política inclusiva é uma realidade, mas ainda se tem muito que fazer para me- lhorá-la. Existe uma adequação da legislação aos novos propósitos, decretos e leis que estão sendo sancionados e assinados, mas não basta somente isso, incluir é, 105 antes de mais nada, entender e ser entendido. Vigotski (2000), a partir da dimensão social dos processos humanos, afirma que a linguagem possui, além da função comunicativa, a função de organização e formação do pensamento. Não é somente colocar um aluno surdo em uma escola regular com ouvintes, se não há pessoas preparadas para isso, é relevante ter consciência da importância de profissionais devidamente capacitados. A formação de docentes, regulamen- tada pela atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394/96, art. 59), diz que: “III - Prevê em seu disposto atuação de professores com especializa- ção em nível médio ou superior, para o atendimento educacional especializado, bem como professores de ensino regular capacitados para atuarem com alunos especiais na classe comum” (BRASIL, 1996, on-line). Nota-se, portanto, uma discordância da lei no tocante à sua aplicabilidade, uma vez que a lei permite a formação em nível médio para atuar com alunos especiais, desprezando, de certa forma, educadores que investem, com recurso próprio, em es- pecializações para melhor atender o alunado, o que caberia ao sistema de ensino pro- mover cursos de formação continuada mais específicos, norteando cada educador na área em que foi destinado a ministrar, e qualificar o corpo docente, assegurando-lhes aptidões e novos métodos para prática pedagógica de modo a atender às necessidades educacionais dos alunos surdos. A formação continuada do quadro de professores deve ser um comprometimento com a qualidade de ensino, que, nessa perspectiva, devem assegurar que sejam aptos e correspondam às expectativas de seus alunos. “ Se o objetivo é garantir educação para todos, independente de suas especificidades, deve-se asseverar oferta de uma formação que pos- sibilite aos professores analisar e contribuir para o aprimoramento dos processos regulares de escolarização no sentido de que possam dar conta das diversas diferenças existentes entre seus alunos (GLAT; NOGUEIRA, 2003, p. 60). Por meio de recursos de ensino eficaz, serão proporcionadas ao alunado com deficiência condições reais de adaptação social. Outro fator importante é tornar a Libras acessível a todos, pois, quando o acesso é fácil, a curiosidade pelo diferente, muitas vezes, gera conhecimento. UNICESUMAR UNIDADE 3 106 “ Entende-se assim que, embora o surdo esteja inserido em uma so- ciedade e em um núcleo familiar cuja maior parte utiliza a língua oral majoritária, ele também está ligado direta ou indiretamente a espaços e pessoas que se comunicam por uma língua de sinais. Reconhecer, portanto, a condição bilíngue do surdo implica aceitar que ele transita entre essas duas línguas e mais do que isso que ele se constitui e se forma a partir delas (PEIXOTO, 2006, p. 26). A partir da comunicação entre surdos e ouvintes, sem a necessidade de um in- térprete, aí sim, poderemos classificar como educação bilíngue, em que todos conseguem conversar entre si, existindo uma interação de ambas as partes, in- dependentemente da deficiência, a partir daí, o aluno surdo se sentiria incluído não somente na escola, mas também em uma sociedade. A proposta de educação bilíngue surge dessa necessidade de possibilitar o desenvolvimento adequado de uma linguagem que permita o aprofundamento da aprendizagem escolar do surdo e amplie sua participação social. De tal modo que sua língua, língua natural, seja respeitada, por meio de práticas educativas que visam a inclusão, espera-se que suas chances de desenvolvimento social, cultural e acadêmico se ampliem (LACERDA, 2000). 107 Segundo Maurício (2015), a principal luta da comunidade surda é justamente a educação bilíngue, sendo que, para que essa realidade se instale no ambiente escolar, é preciso preparar os professores para essa escola bilíngue, sendo esse, portanto, um caminho possível para que ocorra, de fato, educação dos surdos. Aprendemos que os ambientes bilíngues devem ser elaborados de forma que a língua de sinais seja a primeira língua, e a língua portuguesa, na modalidade escrita, a segunda, respeitando e valorizando a cultura e a identidade surdas. Skliar (2015) expõe que é pela interação cotidiana com a comunidade surda que as crianças surdas adquirem a língua de sinais como língua natural. Dessa forma, o autor sinaliza que “‘língua natural’, aqui, deve ser entendida como uma língua que foi criada e é utilizada por uma comunidade específica de usuários, que se transmite de geração em geração, e que muda tanto estrutural como funcional- mente com o passar do tempo” (SKLIAR, 2015, p. 27). A aquisição da língua de sinais deve ser considerada língua natural do surdo, a primeira língua, e a aprendizagem da língua portuguesa como a segunda língua. Deve-se ressaltar ainda que, sendo a língua materna do surdo a língua de sinais, seu desenvolvimento deve ocorrer o mais cedo possível. A perspectiva da proposta bilíngue de educação para surdos, depois de desenvolver a língua de sinais como primeira língua, presume que a criança surda deve iniciar o processo de aprendizagem escolar tendo a língua portu- guesa na modalidade escrita como segunda língua (L2). Em síntese, para que o surdo aprenda a língua portuguesa, deverá, antes, apropriar-se da língua de sinais, sua língua materna (FERNANDES, 2003). Além disso, deve contemplar conteúdos específicos voltados para assuntos relacionados à surdez, à sua cultura, à identidade e à sua história. Nesse caso, devemos ter foco no currículo, pois esse elemento normativo se caracteriza na prática educativa, portanto, é imprescindível que seja respaldado no conceito de processo pedagógico significativo, justo, participativo e engajado culturalmente valorizando a diversidade e as diferenças. O currículo precisa ser aberto para mu- danças e adaptações, quando necessárias, contemplando os elementos essenciais, como lugares, contextos e pessoas específicas. UNICESUMAR UNIDADE 3 108 A verdadeira efetivação de práticas educativas que contemplem a educação dos surdos, em premissa, exige da sociedade educacional o reconhecimento de sua cultura, a utilização de materiais e práticas bilíngues, os recursos tecnológicos como ferramentas pedagógicas e, assim, a ampliação das formas de prover acessoao conhecimento. Lembremos sempre que educação é uma atividade prática. Curiosidade! Você sabia que a população surda no Brasil, segundo o IBGE (2021), abrange cerca de 5% dos brasileiros? Com esse dado, entendemos quão importante seja o Governo trabalhar para garantir direitos à população nos di- versos segmentos sociais. A ESCOLA BILÍNGUE O aluno surdo que está matriculado no ensino regular tem como maior dificul- dade no aprendizado a falta de comunicação. Não basta a presença do intérprete em sala de aula ou o professor ser apenas o sinalizador, pois a escola é na sua totalidade. Assim, caberá a todos profissionais da educação, no mínimo, um Figura 1 - População de pessoas surdas no Brasil / Fonte: adaptada de IBGE (2021). POPULAÇÃO DE PESSOAS SURDAS NO BRASIL 2,7 milões não ouvem nada No país, cerca de 5% da população é surda e, parte dela usa a Libras como auxílio para comunicação. De acordo com dados do IBGE, esse número representa 10 mlhões de pessoas IBGE/2021IBGE/2021 O que representa 5% da população 10 MILHÕES DE PESSOAS 109 conhecimento básico da Libras e da cultura surda, a fim de garantir às pessoas surdas uma convivência mais igualitária. Ter contato direto e diário com as pessoas nesse universo, também, é uma forma de aprendizado. A escola não é somente lugar para se aprender métodos pedagógicos, mas para adquirir vivên- cia para a vida social fora dela também. Apoiar a existência de mais escolas bilíngues proporcionará aos surdos me- lhor qualificação; com isso, serão inseridos no mercado de trabalho facilmente, utilizando estratégias que contribuam para a transformação social necessária para o processo de inclusão, tornando acessível as possibilidades de também competirem por seus objetivos de vida. Góes (2000, p. 100), baseando-se em Vygotsky, afirma-nos que “[...] é preciso criar formas culturais singulares que permitam mobilizar as forças compensatórias e caminhos alternativos de desen- volvimento que implicam o uso de recursos especiais”, ter uma escola que esteja envolvida com a causa. “ Pensar não somente em um ensino bilíngue, mas em uma socieda- de, ver que ela não se forma somente pelo contato entre línguas e culturas, igualmente importante são as atitudes que as pessoas têm em relação às línguas e aos membros das comunidades minoritárias bem como às políticas linguísticas a serem adotadas pela comuni- dade num todo (MELLO, 1999, p. 42). É preciso desenvolver atividades educacionais que priorize a Libras, “o modelo bilíngue parte do reconhecimento de que os surdos estão em contato com duas línguas e que uma destas línguas é a língua de sinais” (SANCHEZ, 1991, p. 4), com modalidade escrita da língua portuguesa, respeitando a cultura surda, ou seja, é incluir sem descaracterizar, pois ensinar uma língua escrita para quem não tem a oralidade é um desafio tanto para quem ensina quanto para quem aprende. “ A história da educação de surdos nos mostra que a língua oral não dá conta de todas as necessidades da comunidade surda. No mo- mento que a língua de sinais passou a ser difundida os surdos tive- ram maiores condições de desenvolvimento intelectual, profissional e social (GOLDFELD, 1997, p. 34). UNICESUMAR UNIDADE 3 110 A maior dificuldade não está na surdez em si, mas na falta do conhecimento da língua portuguesa. Por isso, é necessário flexibilizar atividades e investir em ex- periências visuais e em adaptações do que eles didaticamente têm que aprender com as referências visuais. Quando se trata de criança surda nascida em família ouvinte, só terá contato com a Libras, muitas vezes, apenas na escola, “quando o bilinguismo afirma que as línguas de sinais dos surdos são línguas naturais, reivindica para a Língua de Sinais o mesmo status linguístico de todas as línguas naturais” (SANCHES, 1991, p. 6), o que atrasa um pouco seu aprendizado, pois seus familiares não conseguem transmitir todas as informações necessárias para compor o indivíduo. “ A pior realidade é que grande parte dos surdos brasileiros e seus familiares nem sequer conhecem a língua de sinais. Muitas crianças, adolescentes e até adultos surdos não participam da comunidade surda, não utilizam a língua de sinais e também não dominam a língua oral (GOLDFELD, 1997, p. 42). Ao final desse processo, espera-se que as escolas bilíngues correspondam às necessidades dos seus alunos, que elas consigam passar para eles todas as informações e conhecimentos necessários e que tenham um ambiente em que complementos visuais sejam explorados, como cartazes com ilustra- ções para a observação e compreensão, e listas com o nome em português, a imagem e o sinal organizados. Morais e Martins (2020) afirmam que “é pertinente introduzir a criança surda em um contexto de aprendizado de duas línguas em ambientes em que haja significação para ela, a fim de que ela possa constituir-se como sujeito linguístico, da mesma maneira como essa oportunidade é oferecida à criança ouvinte”. NOVAS DESCOBERTAS Convido você a conhecer uma história em Libras, classificada “litera- tura surda”, uma forma de manifestação cultural das comunidades surdas, para designar as narrativas que apresentam a língua de sinais e a questão da identidade e cultura surda. Acesse o link e conheça algumas histórias em contextos da cultura surda. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20654 111 Com todas essas estratégias, o aprendizado do aluno surdo torna-se evidente. “A aprendizagem é social e o desenvolvimento das funções psicológicas supe- riores dependem da interação da criança com o seu meio, das relações que ela mantém com o mundo exterior” (VYGOTSKY, 2001, p. 86). É importante ter como foco principal o aprendizado, a certeza de que o aluno surdo está compreendendo o que se pede e que consiga interpretar e diferenciar textos, como jornalísticos, poemas, biografias, relatos históricos etc., respeitando seu tempo de aprendizado. “O bilinguismo, no caso dos surdos, pressupõe o aces- so pleno à Libras, representando o elemento fundador de sua subjetividade na constituição de sentidos sobre o mundo e acesso ao conhecimento” (SANCHEZ, 2002, p. 29). A força que a escola bilíngue adquiriu nos tempos atuais fez com que nova possibilidade fosse proporcionada à comunidade surda, principalmente, porque a escola é vista como o apoio necessário para novas conquistas dos sur- dos. “A educação bilíngue para os surdos impõe aos educadores um novo olhar não apenas sobre a situação linguística em questão, mas, sobretudo, em relação às concepções axiológicas envolvidas nessa prática (MOURA, 2016, p. 34-35). A representação das igrejas para fortalecimento da comunidade surda As igrejas, no Brasil e no mundo, lutam para implementar esse processo de segregação e isolamento dos diferentes ou doentes. De fato, a igreja usa a existência dessas instituições para colocar em prática suas atividades beneficentes e assistenciais, ampliando, assim, sua influência na sociedade. Estendendo sua caridade e ajuda, tornou-se possível man- ter seu poder. Nesse sentido, o ato de ajudar se confunde com a necessidade de oprimir, o dever de caridade e a vontade de punir. Essa abordagem errada tem seu significado, a necessidade de isolamento. Símbolos desse isolamento são as leprosarias medievais, que estavam vazias durante o Renascimento e foram reativadas no século XVII. No Brasil, a educação especial teve seu pioneirismo na época dos Impérios: as duas primeiras instituições foram criadas no Rio de Janeiro. Foram criados o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, atual Instituto Benjamin Constant (IBC), em 1854, e o Instituto dos Surdos Mudos, em 1857, atualmente, denominado Instituto Nacional da Educação de Surdos. A Apae teve seu início nessa época, com a inauguração, em 1954, de sua primeira instituição. UNICESUMAR UNIDADE 3 112 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma fotografia, colorida, do prédio do Instituto Benjamin Cons- tant. A fachada se apresenta na cor amarela,prédio com dois andares, com colunas gregas na entrada. Figura 1 - Instituto Benjamin Constant (IBC) / Fonte: Wikimedia Commons (2009, on-line). Segundo Mazzotta (1996), essas instituições representaram um avanço no aten- dimento a pessoas com deficiência, embora ainda de maneira precária para a situação em que o país se encontrava. Em 1872, existia uma população de 15.848 cegos e 11.595 surdos, os primeiros, no entanto, eram atendidos em número de 35, e os segundos, em 17, nas instituições. Evidenciava-se, nessa época, maior atenção às pessoas cegas e surdas e pouca preocupação com os demais. No século XVIII, ficava claro algo que se repete em nossos dias: “não há mais lugar para a irres- ponsabilidade social e política diante da deficiência intelectual, mas, ao mesmo tempo, não há vantagens, para o poder político e para o comodismo da família, em assumir a tarefa ingrata e dispendiosa de educá-lo” (PESSOTTI, 1984, p. 24). O desenvolvimento da ciência levou à constatação de que deficiência não deve- ria significar incapacidade; então, surgiu o princípio da normalização, pressupondo que existe um “estado normal” na vida das pessoas. Ao mesmo tempo, surgiu o conceito de integração, em que as pessoas com deficiência devem ser tratadas de 113 forma semelhante às demais, em conjunto. Como resultado, com base na normali- zação e integração, surgiu um paradigma de serviço, cujo principal objetivo é ajudar as pessoas com deficiência a alcançar uma vida mais normal e proporcionar-lhes padrões e condições de vida diária próximas das normas e dos padrões sociais. Reconhece-se que uma pessoa diferente tem direito à convivência social, desde que possa ser modificada, ajustada e preparada para funcionar da maneira mais seme- lhante à dos demais membros da sociedade. Figueroa (2022, p. 22-23) entende que: “ [...] no intuito de proteger as pessoas ‘normais’ das ‘anormais’ que surgem nas primeiras instituições para atender a essa clientela. Ape- sar de ter sido um período segregativo, podemos considerar que foi um avanço, pelo pouco que tínhamos, para a Educação Especial, pois com isso tivemos benefícios científicos, em que pesquisadores e intelectuais se voltaram para o estudo do tema. Nesse período, o que nos marca é a criação das escolas para deficientes, que tinham o intuito de encontrar a cura ou um tratamento para estas pessoas. Com isso, temos o início dos métodos de avaliação e tratamento. Veja que a ideia da normalização passou a ser o foco dessas instituições, assim, surgiram as contribuições das áreas clínicas, que apareceram na educação com o intuito de ajudar a normalizar as pessoas com deficiência, como forma de in- tegrá-las à sociedade. Os currículos escolares eram subsidiados por conteúdos reabilitacionalistas e reservada ao professor a tarefa de auxiliar a área clínica em seus serviços, uma vez que não se entendia que o sujeito pudesse aprender, in- dependentemente de sua condição, mas que era necessário, primeiro, prepará-lo por meio de treinos e, depois, educá-lo. Quanto às pessoas com deficiência ou estudantes que necessitam de formas especializadas de aprendizagem, acredita-se que apenas a repetição infinita da prática pode superar as dificuldades e iniciar o aprendizado, o que dificulta seu estado de espírito individual. Isso acontece porque não é fácil para a família re- ceber o diagnóstico que seu filho tem deficiência ou necessidade de educação especializada, não há como minimizar os diferentes sentimentos que vêm à tona, então, negar o diagnóstico e a existência da deficiência é um ato natural. Um exemplo disso é a Lei de Fundação e Diretriz Nacional da Educação (LDBEN), UNICESUMAR UNIDADE 3 114 Lei nº 4.042/61 (BRASIL, 1961), que assegura a educação “especial”, preferencial- mente, na rede geral de ensino. Em sua nova formulação, em 1971, pela Lei nº 5.692/71 (BRASIL, 1971), não foram encontradas inovações processuais e conceituais em relação à inclusão, ao contrário, a ideia de incluir alunos com deficiência em classes e escolas especiais foi preservada, sob o mesmo ponto de vista social. Em 1973, foi inaugurado o Centro Internacional de Educação Especial no Brasil (CENESP), influenciado por um forte aspecto segregacionista. Em 1986, foi criada a Coordenação Nacional de Integração da Pessoa com Deficiência e, em 1990, a Secretaria Nacional de Educação Básica assumiu a responsabilidade pela implementação da Política de Educação Especial (MENDES, 2006). Em 1957, o Governo Federal criou campanhas voltadas às pessoas com deficiência, a primeira para a educação dos surdos brasileiros, a segunda, em 1958, para a educação e a reabilitação de deficientes visuais e, em 1960, para os deficientes mentais, com o objetivo de promover as medidas necessárias de educação e assistência (MAZZOTTA, 1996). Foi na década de 1960 que houve o maior aumento na criação de escolas especiais, chegando a 800 unidades em 1969. Em 1962, a Apae já contava com 16 instituições e criou a Federação Nacional das Apaes, que realizou seu primeiro congresso em 1963. Em 1967, a Sociedade Pestalozzi do Brasil contava, também, com 16 instituições localiza- das em todo o país (MENDES, 2006). Houve, assim, um aumento significativo de instituições privadas sem fins lucrativos que isentam o Estado de aceitar pessoas com deficiência na rede pública. No final da década de 1960, as pessoas deficientes eram impedidas de frequen- tar a escola. Em muitos casos, eram isoladas em seus núcleos familiares, não tinham relações sociais. Somente após dez anos, na década de 1970, no período de inte- gração, que as pessoas com deficiências passaram a frequentar as escolas regulares. Embora a escola especial e a escola comum tenham desenvolvido trajetórias paralelas e separadas, o caráter seletivo de ambas as instituições pode ser conside- rado um traço comum. A escola comum tradicional desempenha, essencialmente, a função de selecionar aqueles que eram capazes de responder adequadamente às necessidades criadas em cada contexto social, econômico e político. Por outro lado, acreditou-se que uma instituição especial ficou encarregada de segregar aqueles considerados menos capazes, que deveriam receber atendimento especializado. 115 A segregação como estratégia para a educação básica dessas pessoas seguiu as exigências do modelo clínico deficitário, que prevaleceu ao longo da mo- dernidade até a segunda metade do século XX. Esse modelo centrava-se em uma concepção inata e estática do ser humano, em que não havia expectativas educacionais para aqueles que apresentavam déficits, deficiências ou limitações de ordem biológica, física e sensorial. Desde a Idade Média, a deficiência tem sido considerada um elemento retardador da ordem social. Nesse século, o advento das técnicas psicométricas reforçou o caráter estático e classificatório dos indivíduos que apresentavam tais diferenças. Na década de 1970, os países desenvolvidos passaram a considerar que a ne- cessidade de habilitação e reabilitação não justificaria o adiamento do momento de integração por critério e intervalo indefinidos, pois o progresso da medici- na traz novos conhecimentos no campo da educação. O progresso tecnológico (aproximando as pessoas e a rápida disseminação da informação), a maturidade técnico-científica (aumentando a possibilidade de sobrevivência humana) e as considerações sobre a necessidade de unir as pessoas nos diferentes segmentos passaram a exigir um mundo democrático, para combater a prática da discrimi- nação com uma política pública baseada nos princípios dos valores humanos. Surgiu, então, um paradigma de sustentação, em que a sociedade se prepara para acolher todas as pessoas, independentemente de sua formação pessoal, cultural ou religiosa, buscando construir, coletivamente, um espaço social e permitir a livre expressão das pessoas com deficiência, passando por uma real transformação. A superação dos modelos de segregação parte de uma construção teórica que, aoinvés de enfatizar fatores inatos, deixa de considerar o déficit como estável ao longo do tempo e passa a tomá-lo de necessidades circunstanciais geradas nas di- versas relações sociais produzidas pelos sujeitos. Essa pedagogia histórico-crítica enfatiza os processos de aprendizagem antes do processo de desenvolvimento. As situações de aprendizagem também se tornam um critério para avaliar a deficiência. As crescentes demandas por inclusão escolar implicam em novos processos de formação de professores e mudanças na organização institucional. Os modelos de segregação estão sob controle, porque as causas do fracasso escolar são fundamen- talmente identificadas em fatores sociais, culturais e pedagógicos, o que contribui para a reavaliação dos limites entre normalidade e deficiência, permitindo, assim, que os limites da escola normal e especial sejam questionados no mesmo caminho. UNICESUMAR UNIDADE 3 116 No momento em que a própria escola especial passa a ser objeto de avaliação, sofre com a exigência de apresentar os resultados da integração social e laboral de seus alunos, suas funções e seus objetivos, além do próprio modelo de educação segregada, entram em crise. A crítica ao modelo de atenção especializado, complementado por pressões so- ciais e políticas, no entanto, resultou na formulação de princípios que se esten- deram a todas as regiões a partir da década de 1960. Realizada exclusivamente nas mesmas instituições, a escolarização de todos os alunos pretendia ser uma questão de cidadania, e não fruto de boas intenções ou atos samaritanos. Tem-se afirmado, portanto, que o déficit pode ter origem na estimulação ambiental e no próprio processo de aprendizagem, e não necessariamente na hereditariedade ou na composição genética dos indivíduos. Com a expansão desses princípios, os conceitos de adaptação social e dificuldades de aprendizagem foram incor- porados à educação de pessoas com esses problemas. Desde a década de 1970, a crise dos modelos de segregação foi rompida em todo o mundo, com o modelo de integração educacional se fortalecendo. No Brasil da época, a educação especial se institucionalizou em termos de planejamento e políticas públicas com a criação do Centro Nacional de Educação Especial, em 1973. No entanto a prática da integração social ganhou mais força apenas a partir da década de 1980. 117 Aranha (2005) sinaliza que, na década de 2000, por meio do projeto Esco- la Viva, o Brasil se posicionou compreendendo que novos princípios políticos deveriam ser implementados nas escolas brasileiras. Assim, determinavam po- liticamente que todo caso de atenção pública deveria identificar a situação das pessoas com deficiência, as medidas necessárias para garantir seu acesso imediato e a participação nos serviços e recursos disponíveis. Essas medidas se constituíram nas primeiras ações efetivas no país, do pon- to de vista político do paradigma do apoio, para garantir que uma pessoa com necessidades especiais tenha acesso a todos os recursos disponíveis à sociedade, independentemente do tipo de deficiência. Na educação, foi estabelecido que a matrícula e a permanência são garantidas independentemente do apoio que uma pessoa possa precisar. Esse conjunto de ações abriu caminho para um novo conceito de educação, em que a filosofia da normalização e integração tornou-se fonte de inspiração para grandes mudanças que afetaram não só a educação especial, mas também o sistema de ensino regular. A rejeição das pessoas com deficiência foi entendida como forma de de- fesa da sociedade e das forças políticas estabelecidas, pela rigidez do controle, utilizando-se da disciplina, da ordem, das normas positivas e da hierarquia. A ciência médica, historicamente, serviu para sancionar poderes socialmente estabelecidos e prescreveu prisão domiciliar daqueles que para muitos eram estereotipados como incapazes de aprender. Como afirmam Skliar e Lunardi (2000, p. 46), “O discurso da medicina, fazendo a mediação entre a soberania (a ordem do direito, as normas públicas) e a disciplina (enquadramento, sele- ção e separação normal – anormal) teve na deficiência intelectual a expressão do furor normalizador”. Na década de 1970, a inclusão da psicologia, da fisioterapia, da fonoaudiolo- gia e de outros serviços expressou o progresso e a aplicação social e humana das ciências, mas, ao mesmo tempo, deu à educação especial contornos fundamen- talmente clínicos, ultrapassando as fronteiras do campo da saúde e fez sua inde- terminação científica, passível de incertezas no campo profissional e da política. Não foi possível, porém, deixar de cuidar das crianças que apresentavam di- versas dificuldades, educacionais ou não. Ocorre que, historicamente, a educação especial prescreveu, com autoridade, seus serviços sem levar em conta a condição de sujeito histórico de seus alunos, que poderiam ser verdadeiros parceiros na definição dos objetivos e conteúdos que comporiam o programa educacional. UNICESUMAR UNIDADE 3 118 Por exemplo, além da oralização, aos surdos foram prescritas ações para res- taurar quaisquer resquícios de audição. Para os cegos, deu-se preferência ao tra- balho com produtos artesanais, e procedimentos e técnicas, para minimizar suas consequências motoras, foram reservados para a paralisia cerebral. Mesmo que essas necessidades fossem parcialmente reais, sua adoção sem- pre foi arbitrária e imposta unilateralmente. Além disso, algumas dessas ações poderiam ser feitas no campo da saúde (na busca pela cura, como é o caso do implante coclear), ao invés do desenvolvimento no campo da educação. Tal viés pode ser explicado, mas não é lógico e coerente, devido à qualidade duvidosa dos serviços públicos de saúde oferecidos à maioria de nossa população, que exige educação especial para começar a aceitar certos problemas básicos como se fossem responsáveis por eles. Outro elemento essencial que contribuiu para a falta de consolidação do caráter educativo da pedagogia especial foi a ênfase em procedimentos, técnicas e ativi- dades pedagógicas especiais para os alunos, consideradas necessários para o cum- primento de suas especificidades e peculiaridades internas, ou seja, secundárias ao papel do professor, como responsável por gerenciar o processo pedagógico e traba- lhar com conhecimentos clássicos já acumulados historicamente pela humanidade. Enquanto o velho capitalismo industrial buscava homogeneizar os trabalha- dores para aumentar a eficiência e a produtividade, a educação especial desempe- nhava o papel de isolar aqueles cujas perspectivas econômicas eram praticamente nulas. Quando há separação entre planejamento e ação, entre teoria e prática e entre conceito e trabalho materializado nas relações de produção no modo de produção capitalista, a educação especial confirma essa dicotomia ao focar na oferta de ser- viços de formação para o trabalho com forte caráter mecanicista e fragmentado. O desenvolvimento tardio do processo de industrialização no Brasil, aliado aos processos políticos de centralização, impulsionados pela dualidade de nacionalização e internacionalização da economia, característicos desde a década de 1930, determi- nou certas especificidades na construção da história da educação especial brasileira. A pessoa com deficiência foi vítima de concepções mecanicistas que não a colocavam na posição de sujeito humanizado em meio às circunstâncias sociais. Nesse sentido, a deficiência passou por uma avaliação ética, segundo determina- ções específicas e, historicamente, criadas em cada sociedade, e não foi a priori fruto de retórica, iluminismo ou idealismo presente na mente dos homens. 119 Um pressuposto que explica a natureza dinâmica das tecnologias inseridas na educação especial e da deficiência baseia-se em sua historicidade, ou seja, que a população à qual essa educação se aplica se expande e diversifica, e como as ideias de educação e cidadania são incorporadas à prática especial, novos conceitose novas terminologias são projetados para lidar com essa nova realidade. Ao expli- car as conexões entre o surgimento de instituições, para realizar a educação das pessoas, e os determinantes sociais, econômicos, políticos e culturais, documen- ta-se o processo contraditório de participação e exclusão social dessas pessoas. Destacamos que, segundo o INEP (2020), no Brasil, existem 64 escolas bilíngues de surdos, com 63.106 estudantes surdos, surdocegos e com deficiência auditiva. NOVAS DESCOBERTAS Nome: Despertar do Silêncio Autora: Shirley Vilhalva Ano: 2004 Sinopse: uma leitura que levanta questões importantes e que são, muitas vezes, negligenciadas por aqueles que convivem e trabalham com pessoas surdas. O Despertar do Silêncio, publicado em 2004, pela profes- sora mestre Shirley Vilhalva, trata-se de uma obra que expõe suas vivências como surda parcial, por meio de poesias, de sentimentos que falam de si mesmo, relatando suas emoções e limitações frente à sociedade ouvinte, acontecimentos esses que ficaram registrados em sua memória. A obra ex- plana experiências que contribuem, de forma significativa, para um novo olhar sobre a educação de surdos, visando a inclusão e interação desses com a comunidade ouvinte. NOVAS DESCOBERTAS Para saber mais sobre a relação de professor e intérprete, acesse o QR Code. UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20680 UNIDADE 3 120 Educação dos surdos e as Tecnologias de Acessibilidade As tecnologias atuais têm permitido um aumento da boa qualidade da comuni- cação entre surdos e ouvintes e surdos, sendo um excelente exemplo o telemóvel, que permite enviar mensagens de texto, entre outros. Cabau et al. (2016) com- preendem que as décadas de 1960 a 1970 representam um marco às primeiras tentativas de construção de teorias baseadas nas tecnologias de informação e comunicação, tornando-se viáveis por meio do rádio, da televisão e do próprio ensino por correspondência. Segundo Novais (2017, p. 29), “ A educação, através dos séculos, tem se adaptado às mudanças sociais que modificam e determinam as estruturas e os processos comunicativos e de aprendizagem. Nos últimos 20 anos, por exem- plo, as tecnologias digitais possibilitaram a realização de grandes progressos, os quais alteraram, inclusive radicalmente, nossa vida, interferindo desde o trabalho até o cotidiano. Essas alterações tam- bém ocorreram no setor educacional. Para Moran (2015), uma educação inovadora se apoia em um conjunto de propostas que norteiam o conhecimento inovador e integrador, proporcio- nando o desenvolvimento da autoestima e autoconhecimento a todos os 121 alunos, tornando-lhes mais criativos e desenvolvendo o cidadão com valores individuais e sociais. Ainda para o autor, as tecnologias digitais desafiam a educação, pois, para integrá-las, subentende-se que ocorra superação de bar- reiras, tanto na perspectiva do professor quanto na do aluno. Sendo assim, o professor deixa de ser o centro da educação, passando a valorizar como papel central o aluno. O autor enfatiza que as tecnologias móveis provocam mudanças nas salas de aula com novas possibilidades. Ciência e educação são conceitos que têm ampliado o discurso entre pro- fessores. Aprendemos que, em todos os setores e segmentos sociais, as pessoas têm exercido trabalhos utilizando as Tecnologia de Informação e Comunicação (TICs), o universo digital é uma realidade. Portanto, seus impactos são na cultura linguística e comunicativa, passamos da cultural oral para cultura de comunica- ção interativa, ou seja, a era digital. Essas mudanças são, certamente, decisórias e servem como instrumentos educacionais e de formação de conhecimento, já que a ciência e a escola produzem cultura. Conforme asseveram Pacheco e Fernandes (2021, p. 81), “não se trata apenas de reconhecer e adotar as novas mídias, como redes sociais e grandes bases de dados como instrumentos educacionais e de pro- dução de conhecimento. A transformação digital é inexoravelmente disruptiva não apenas tecnológica, mas cultural”. Novais (2017) destaca que essas transformações são permeadas por uma nova capacidade de criar relações comunicativas, interligadas pela conectividade e pelo uso dos recursos tecnológicos, que definem uma nova identidade cultural. Dessa forma, observa-se que essas modificações atingem todas as faixas etárias, ou seja, pode-se dizer que a conectividade e o uso dos recursos tecnológicos contemplam, a cada dia, todas as esferas sociais com pessoas de todas as idades. Portanto, a sociedade ganha forma com a tecnologia de acordo com as necessidades e os interesses atribuídos pelas pessoas que a utilizam. “ As tecnologias digitais têm transformado profundamente a socie- dade, promovendo um sentimento de interdependência, uma noção crescente de que todos são capazes de manipular as tecnologias e utilizá-las nos mais diferentes fins. Assim, nesta complexidade a educação percorre um caminho que determina os rumos do univer- so pedagógico e, de forma mais abrangente, os sistemas educativos e os currículos das escolas (NOVAIS, 2017, p. 180). UNICESUMAR UNIDADE 3 122 Nesse sentido, com o uso das TICs, a realidade da pessoa surda se transforma, à medida que se acrescentam as possibilidades de enviar e receber um e-mail, usando a linguagem escrita, e receber a resposta, podendo ter acesso rápido, co- municando-se, a distância, com um grupo de amigos de uma mesma cidade, de outras cidades, estados e até, mesmo, de outros países, participando efetivamente de diferentes grupos virtuais. O reconhecimento da força exercida pelas tecnolo- gias na sociedade e no universo educacional tem direcionado e estimulado muitas instituições a desenvolverem e inserirem como práticas pedagógicas aparelhos tecnológicos, aplicativos e jogos educacionais que mediam o processo de ensino dos alunos surdos. Os recursos tecnológicos permitem ao aluno investigar e testar as atividades, comunicar-se e se desenvolver em tempo real. O Brasil, nos últimos anos, atendendo às normatizações acerca das tecno- logias, vem se atualizando e investindo nos programas educacionais, como as- segura a BNCC, ao prever, na competência 5, a importância de compreender e utilizar as tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais, com destaque nas prá- ticas escolares, para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva. Segundo CIEB (2022, [s. p.]): “ No atual contexto político e econômico, o país possui recursos subs- tanciais para investir em tecnologia na educação. Contudo, para que essas políticas e recursos gerem impacto significativo na adoção qualificada da tecnologia na educação pública, é necessário criar uma visão compartilhada no ecossistema a que se quer chegar, com metas e indicadores claros de como medir a evolução desta adoção e uma articulação multissetorial para definição dos papéis dos di- ferentes atores para essa transformação. Isso significa que, para atender às necessidades e concretizar os aparatos tec- nológicos nas instituições brasileiras, é preciso investimento, planejamento e direcionamento adequado das políticas e investimentos públicos. Você conhe- ce a Política de Inovação Educação Conectada (PIEC)? É uma política, criada pela Lei Federal nº 14.180/2021, que tem como objetivo apoiar a universaliza- ção do acesso à Internet em alta velocidade e fomentar o uso pedagógico de 123 tecnologias digitais na educação básica. Com essas políticas públicas, outras ações são implementadas, assim, amplia-se o uso de tecnologias digitais na educação para melhorar a qualidade e o acesso à educação. Na atualidade, um dos recursos tecnológicos mais utilizados pelas pessoas no mundo todo é o ce- lular e, com esse aparelho, as pessoas se mantêm conectadas à Internet. Embora o celular sejaum recurso moderno, os surdos usam outros tipos de telefone. O antecessor do telefone celular foi o PAGER, ou BIP. Esse dispositivo não foi criado para os surdos, mas, por utilizar a escrita e permitir que os surdos acessem a mensagem visualmente, foi adotado por muitos membros da comunidade surda, despertando muitas esperanças. No entanto, além de caro, seu uso não era prático. Como apenas as operadoras de telefonia podiam enviar mensagens escritas, não havia possibilidade de troca efetiva de comunicações. Ouvintes ligavam para a central de comunicação do BIP, e telefonistas levavam recados e enviavam mensagens para aparelhos audi- tivos de surdos, que não tinham como responder. Infelizmente, esses apara- tos tecnológicos eram defeituosos para a comunicação dos surdos, embora servissem para receber mensagens. Veja, a seguir, o relato da experiência de mãe e filha utilizando esse recurso. “ Beatriz e Marília tinham um porque a mãe, Clélia, queria mandar recados quando saíam à noite. Às vezes a mãe queria saber se estava tudo bem, então mandava mensagens para o pager e elas ligavam para casa da cabine telefônica. Era impossível falar, mas só de re- ceber a ligação, a mãe sabia que estava tudo bem. Era um código acordado entre a família. Esse exemplo ilustra bem as dificuldades de comunicação que os surdos têm encontrado ao longo do tempo; por isso, acreditamos que é muito mais fácil ser surdo no atual momento repleto de ferramentas tecnológicas. Em 1998, surgiu o TDD (Dispositivos de Telecomunicações para Surdos), que foi anunciado como grande avanço na comunicação para surdos. No entanto essa tecnologia não foi amplamente utilizada por eles. Em primeiro lugar, porque era difícil adquiri-los, de modo que apenas associações, entida- des governamentais e algumas organizações não governamentais possuíam os equipamentos. Além disso, seu uso não era prático. Para que um surdo UNICESUMAR UNIDADE 3 124 pudesse utilizar os serviços de TDD, quando queria ligar para um ouvinte, ele digitava um número e uma mensagem, que era recebida pela operadora e transmitida, oralmente, ao ouvinte em uma chamada telefônica conjunta. O demorado processo de troca de mensagens e seu alto custo impossibilitaram o uso desse recurso em larga escala. A partir do TDD, outros recursos tecnológicos baseados no português escrito foram disponibilizados para a comunidade surda. Muitos nem preci- savam de nenhum tipo de adaptação e eram usados, de forma intercambiá- vel, por surdos e ouvintes. Um exemplo desses recursos é o Facebook. Esse aplicativo de rede social é o mais acessível do mundo. Com recursos indivi- duais, também, permite a criação de grupos de usuários que compartilham interesses comuns. Os smartphones estão bastante acessíveis hoje em dia, e os aplicativos de men- sagens instantâneas melhoraram, passaram a fazer parte do dia a dia das pessoas e facilitam ainda mais a vida social dos surdos, como ICQ, WhatsApp, Instagram, Facebook, ICOM, Central de Libras e Personalize, entre outros. A comunidade científica é, constantemente, presenteada com novos meios tecnológicos que auxiliam a comunicação de pessoas surdas. Um exemplo disso é a pulseira L’epée, apresentada por alunos do departamento de Enge- nharia Elétrica, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. O dispositivo consiste em um aparelho vibratório que, ao ser conectado a qualquer celular, pisca e vibra quando o smartphone recebe um alerta de mensagem, como alarme de carro ou campainha sem fio. NOVAS DESCOBERTAS Você sabia que existe uma babá eletrônica desenvolvida para pes- soas surdas? Acesse o QR Code para saber mais sobre essa invenção brasileira. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/21727 125 Semelhante ao Facebook, o Instagram é uma rede social online de compartilha- mento de fotos e vídeos acessível a smartphones e não permite a criação de grupos. Oferece duas opções: público ou fechado. Se for público, qualquer pessoa pode acessar o que é disponibilizado na página do usuário. Se estiver fechado, apenas as pessoas que você adicionou poderão ver suas postagens. Os surdos costumam postar fotos e vídeos muito curtos, com, no máximo, dois minutos. Embora seja possível postar vídeos em Libras, a maioria dos surdos postam apenas fotos. O Telegram é considerado um dos principais concorrentes do WhatsApp, por possuir recursos semelhantes, como enviar e receber conteúdo de texto, vídeo, áudio e imagem por meio de pacote de dados ou conexão Wi-Fi. A primeira vantagem desse aplicativo é o fato de não estar conectado à nenhuma grande empresa de Internet. Como o Telegram usa a rede móvel para enviar e receber mensagens, vale destacar que é uma plataforma gratuita. O Telegram, também, suporta GIF (Graphics Interchange Format). Possui facilidades de busca para encontrar imagens (animadas ou estáticas) diretamente no aplicativo e um sistema para citar outros usuários durante uma conversa, ideal para uso em grupo. Atualmente, um grupo de surdos brasileiros está utilizando o Telegram para pesquisas que visam padronizar os sinais em Libras para diferentes áreas do conhecimento, como a Matemática. Os recursos descritos anteriormente são utilizados por surdos alfabetizados, mas também temos surdos analfabetos, que não sabem ler e escrever mensagens, ou mesmo aqueles que têm conhecimento insuficiente de português, o que im- possibilita a comunicação com ouvintes que não estão acostumados a escrever para surdos. Além das ferramentas tecnológicas que possibilitam o uso de vídeos em geral, que possibilitam, portanto, a comunicação em língua de sinais, há algu- mas ferramentas tecnológicas adaptadas ou mesmo criadas para surdos que usam Libras ou SignWriting. Aquelas que permitem o uso de escalas são preferidas pelos surdos porque eles podem utilizar um poderoso recurso de comunicação muito valorizado pela comunidade surda, que são as expressões visuais, pois estão associadas às formas como as pessoas surdas aprendem e se expressam — a pedagogia de vida e de referência para o desenvolvimento delas é visual — situação a qual se opõe às pessoas ouvintes que, para se desenvolverem, utilizam, majoritariamente, a voz, a fala. UNICESUMAR UNIDADE 3 126 Os vídeos, por exemplo, podem se apresentar em formato de dramatizações, depoimentos, cenas, jogos, tempo para atividades. O aluno pode se apropriar dessa ferramenta, produzindo, por exemplo, a partir de uma pesquisa, seu vídeo, mostrando os apontamentos que julgar necessários e importantes de serem re- gistrados. Isso permite ao professor agir com questionamentos, problematizações, oportunizando novas discussões e desenvolvendo conhecimento; para isso, basta que o aluno ou o professor tenha em mãos um aparelho celular. Esse tipo de atividade se fortalece como recurso, pois potencializa no aluno o sentimento de agente transformador, ativo e integrador do processo de ensino-aprendizagem. Dessa forma, a Libras é conceituada pelas experiências visuais de surdos que se sentem à vontade utilizando ferramentas tecnológicas, podendo se expressar em sua língua. Por exemplo, as pessoas ouvintes podem ver outras pessoas ler e escrever, mas, ao falarem ao telefone, sentem-se bem quando ouvem as vozes dos seus parceiros, os surdos, para se sentirem próximos da pessoa com quem estão a comunicar, precisam vê-los e os observar, ou seja, observar suas expressões faciais. Para os ouvintes, seria equivalente a ouvir uma voz, percebendo variações nos humores dos parceiros por entonação. As novas tecnologias em Libras são importantes não apenas para o uso social dos surdos, pois o fácil acesso à informação pode estimular os surdos a buscarem o conhecimento científico e social. Vários recursos de tecnologia utilizando Libras estão disponíveis para surdos. A seguir, apresentamos os meios tecnológicos com escalas mais utilizadas pelos surdos. O que vemos no contexto social são ações que vão contribuindo, gradativamente, com a ampliação ea divulgação da Libras, embora com mais força nas plataformas digitais do que nos estabelecimentos públicos, como nas escolas. Por isso, a importância de os surdos poderem se comunicar e aprender, por meio de imagens, ou seja, por meio de vídeos, pois esses recursos, além de permitir que eles se expressem em sua linguagem natural, estabelecem um espaço construtivo que pre- serva seus fundamentos essenciais de comunicação, aprimorando o desenvolvimento cognitivo e afetivo, porque as aprendências para as pessoas surdas é atualmente en- tendida como aquela que valoriza as experiências visuais. 127 NOVAS DESCOBERTAS Você acredita que os recursos tecnológicos podem contribuir para a difusão e o fortalecimento da Libras entre o povo surdo e a sociedade em geral? Para saber mais, acesse o QR Code e descubra o que os surdos têm pensado nesse sentido. O estatuto da pessoa com deficiência, regulamentada pela Lei nº 13.146/2015 (BRASIL, 2015), prevê no art. 74, a garantida à pessoa com deficiência acesso a produtos, recursos, estratégias, práticas, processos, métodos e serviços de tecno- logia assistiva que maximizem sua autonomia, mobilidade pessoal e qualidade de vida. O art. 78 afirma que devem ser estimulados a pesquisa, o desenvolvimento, a inovação e a difusão de tecnologias voltadas para ampliar o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias da informação e comunicação e às tecnologias sociais. “ Art. 147-A. Ao candidato com deficiência auditiva é assegurada acessibilidade de comunicação, mediante emprego de tecnologias assistivas ou de ajudas técnicas em todas as etapas do processo de habilitação. § 1º O material didático audiovisual utilizado em aulas teóricas dos cursos que precedem os exames previstos no art. 147 desta Lei deve ser acessível, por meio de subtitulação com legenda oculta associada à tradução simultânea em Libras (BRASIL, 2015, on-line). TV com intérpretes, certamente, foi a primeira ferramenta tecnológica que permitiu aos surdos acessar informações em sua língua nativa, no caso, a Libras Brasil. Para isso, alguns canais de TV ou determinados programas apresentam uma tradução simultânea com um intérprete de Libras destacado no canto da tela, em um espaço chamado janela de interpretação, uma webcam e videochats. Não são ferramentas específicas para surdos, são funcionalidades de diversos aplicativos e redes sociais que permitem aos surdos acompanhar o diálogo sinalizado ao mesmo tempo. UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20653 UNIDADE 3 128 O software Skype, atualmente, é amplamente utilizado para conferências, palestras e, até mesmo, painéis de defesa de mestrado e doutorado em que os pa- lestrantes não podem estar presentes, permitindo a comunicação simultânea de vídeo e áudio. Para estabelecer contato, você deve ter uma conta de e-mail. Duas imagens aparecem na tela, uma pequena, que corresponde à primeira pessoa, que vê sua própria imagem, e uma maior, que mostra a imagem do parceiro, ou seja, aquele com quem você está se comunicando. O Skype, também, permite comu- nicação escrita, na ausência de câmeras. O programa é gratuito e acessível apenas para computadores e tablets. Muitos surdos usam essa forma de comunicação. As plataformas, como Zoom, Teams e Meet, entre outras, são muito usadas pe- los surdos para trabalhar, divertir-se e estudar. Essas plataformas mudaram a forma como as pessoas passam o dia. Elas são legais e ajudam na comunicação, especialmente, para os surdos, porque são Apps de videochamada. Com isso, as pessoas podem se conectar em tempo real, não importa onde estejam no mundo. 129 NOVAS DESCOBERTAS Para conhecer mais sobre o HandTalk, acesse o QR Code e explore o site dessa plataforma que traz acessibilidade por meio da Inteligência Artificial. A webcam do telefone móvel permite o uso de alguns aplicativos simples e eficazes, como o Imo Video Free. Vale destacar que esse download gratuito é um grande sucesso entre os usuários em geral, porque permite chamadas de voz e vídeo de alta qualidade, desde que você esteja conectado à Internet 3G, 4G, 5G ou Wi-Fi. Também, permite mensagens de texto, bate-papo em grupo e imagens para enriquecer a comunicação escrita. O aplicativo, também, permite criar gru- pos para conversar e compartilhar fotos e vídeos. No entanto a capacidade de se expressar em Libras, à medida que a imagem é transmitida simultaneamente, é o que torna o aplicativo preferido para surdos. É um celular para comunicação entre usuários de Libras. Dentre as ferramentas tecnológicas específicas para uso de surdos, destaca- mos o Viável Brasil. Viável é o nome comercial de uma central de intérpretes, que possui uma tecnologia adaptada para surdos, semelhante ao Skype. Essa ferramenta requer um dispositivo próprio que deve estar conectado à Internet. Além dos custos de equipamentos e Internet, há uma taxa de serviço para pagar os intérpretes que ficam na sede. É um telefone específico para clientes surdos. Existem dois tipos: um oferece tecnologia de videoconferência para dois ou três surdos conversarem, com uma webcam, e o outro fornece um intérprete de lín- gua de sinais. Para utilizar o sistema Viável, um surdo que queira ligar para um ouvinte, normalmente, pode digitar um número de telefone e o intérprete atua como intermediário, interpretando em voz para o ouvinte e sinalizando em vídeo para o surdo. Ele, também, tem um bate-papo em linguagem escrita. Outro recurso tecnológico disponível é o software de tradução simultânea de texto e voz do português para a Libras, disponível sob os nomes PRODEAF e HandTalk. Ambos são aplicativos muito inovadores. UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20675 UNIDADE 3 130 O novo software auxilia, significativamente, na comunicação entre ouvintes e surdos, pois a pessoa fala no celular e o programa é traduzido automaticamente para o aplicativo para surdos por meio de animação. Apesar do grande avanço, esses aplicativos, ainda, precisam ser aprimorados e enriquecidos, pois não permi- tem a tradução da Libras para o português falado ou escrito, mas permitem que surdos respondam por escrito. Então, representa, por um lado, um grande avanço, porque facilita a comunicação em que o surdo é o destinatário na tradução do que o ouvinte fala para o surdo, mas, por outro lado, ainda, precisa que o surdo tenha conhecimento escrito em português para ser o remetente da mensagem. O Prodeaf foi desenvolvido na Universidade Federal de Pernambuco, por alunos do curso de Informática. O grupo participante fundou a Proativa Soluções e Negó- cios, que conta com o apoio e a parceria da Wayra Brasil — Telefônica, Microsoft, Sebrae e CNPq. Hand Talk foi lançado em 2012, o aplicativo é semelhante ao Prodeaf. Nele, Hugo, um personagem 3D, torna a comunicação interativa e fácil de entender. Quando se trata de educação de surdos, as ferramentas tecnológicas facilitam a comunicação e o aprendizado. Um exemplo são os livros didáticos traduzidos para o Vah, que permitem que os surdos compreendam “rapidamente” textos em português usando a tradução do Vah no DVD que acompanha o livro. O pro- blema dessas traduções é que, para serem fiéis aos textos escritos, os tradutores acabam fazendo mais português sinalizado do que Libras. Em outros países, principalmente, em alguns países europeus, já existe um recurso tecnológico, por meio do qual, a fala oral é traduzida em língua de sinais em sala de aula por meio de um monitor de televisão com aplicativo semelhante ao Prodeaf. O professor sempre fala em um microfone específico e 131 o software traduz para a língua de sinais por meio da animação do intérprete. Esse sistema é mais eficiente que a interpretação tradicional, pois a tradução ocorre simultaneamente. No Brasil, o projeto TLIBRAS, ainda, está em desen- volvimento na tentativa de implementação de recursos semelhantes. Outro recurso educacional resultante das ferramentas tecnológicas são os di- cionáriosvirtuais em Libras, muito importantes para alunos surdos e para alunos ouvintes. Como a Libras é sustentada pelo movimento, os dicionários só são possíveis graças às tecnologias digitais. Esses dicionários poderiam ser usados por escolas bilín- gues para ensinar português escrito para crianças surdas, assim como os dicionários tradicionais são usados para construir o vocabulário de crianças ouvintes. Assim, da mesma forma que esses recursos favorecem o aprendizado da Libras para pessoas ou- vintes, os surdos, também, podem ver os sinais de Libras e aprender português escrito. Outro recurso que se utiliza das tecnologias é o software VLibras. É uma ferramenta gratuita (de código aberto e distribuição livre) que faz a tradução automática da língua portuguesa para a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Esse recurso, que pode ser instalado em qualquer site ou no computador e, também, em tablets e smartphones, tem a função de traduzir conteúdos digitais (texto, áudio e vídeo). Foi desenvolvido pela Universidade Federal da Paraíba. Cabe res- saltar que o VLibras é o resultado de uma parceria entre o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGISP), por meio da Secretaria de Governo Digital (SGD), o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), por meio da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNDPD), e a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), por meio do Laboratório de Apli- cações de Vídeo Digital (LAVID). UNICESUMAR UNIDADE 3 132 Um dos maiores desafios do professor que não domina a Libras é se deparar com um aluno surdo na sala de aula e preparar seus conteúdos, pois, apesar da presen- ça do intérprete de Libras, o aluno surdo continua sendo o aluno do professor. Afinal, o intérprete não é o professor responsável pelo componente curricular. Imagine que você se encontra nessa situação, sendo o professor de Língua Portuguesa e sabe pouco de Libras. Você precisa planejar uma aula de história em quadrinhos. O que você faria? Você acredita que seja importante conversar com o intérprete sobre sua próxima aula e compartilhar, detalhadamente, o que ensinará? Pensar com um olhar para a diversidade educacional tem exigido res- significação do papel do docente. Nesse momento você é convidado a conhecer, a partir da fala da professora Nubia Cabau, os benefícios de trabalhar com a música com os estudantes da educação especial e educação inclusiva. Será que o universo educacional se depara com desafios (barreiras e impedimentos) para im- plementação da inclusão? Será que a música é importante para a integração das crianças na vida escolar? Amplie, ainda mais, seus conhecimentos acessando esse podcast! NOVAS DESCOBERTAS Para conhecer mais sobre o VLibras acesse o QR Code e confira o vídeo de apresentação dessa ferramenta. https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/14479 https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/21729 133 1. Por que conhecer a educação de surdos no Brasil? Percebemos que, ao longo dos anos, cada vez mais, faz-se necessária a inclusão tanto na educação quanto no conví- vio social. Muitas pessoas prezam pela educação e lutamos pela educação inclusiva, que rege por uma metodologia de ensino que visa a igualdade dentro da escolari- zação, porém percebemos que a exclusão ainda assola a educação brasileira. Atual- mente, no Brasil, a abordagem pedagógica incentivada para a comunidade surda é o bilinguismo. Veja o que assegura o art. 28, IV, da Lei nº 13.146/2015: “ Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver, im- plementar, incentivar, acompanhar e avaliar: [...] IV - oferta de educação bilíngue, em Libras como primeira língua e na modalidade escrita da língua portuguesa como segunda língua, em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas. Sabemos que a Lei Federal nº 10.436/2002 foi uma conquista para os surdos, pois, após um longo período de lutas da comunidade surda, essa lei possibilitou: a) A implantação de escolas especiais para alunos surdos. b) A regulamentação dos aparelhos de ampliação sonora individual (AASI, prótese auditiva). c) A oficialização da Libras, reconhecida como meio legal de comunicação e expres- são e outros recursos de expressão a ela associados. d) A obrigatoriedade de todos os cidadãos aprenderem Libras nas escolas. e) O direito de o surdo aprender, primeiramente, a língua portuguesa oficial do Brasil. 2. Os movimentos sociais são imprescindíveis para formulação e implementação das leis na vida das pessoas surdas. É a partir das lutas sociais que reconhecimento e direitos são alcançados por aqueles que foram deixados de lado. Na educação, isso não é diferente e tão pouco ocorre de forma isolada, o mundo todo segue os debates em busca de avanços e direitos. Conforme encontramos nas palavras de Baalbaki (2018, p. 327), ao vislumbrar os movimentos de reconhecimento legal de línguas de sinais em outros países, é possível verificar um movimento na história em que “os efeitos da mundialização operam também uma desconstrução das fronteiras linguísticas dos Estados, outrora tão fortemente erigidas”. 134 Seguindo esse contexto, analise as afirmativas: I - A Libras não tem valor social, portanto, não tem o porquê de a comunidade surda reivindicar a legitimação como língua de sinais. II - As lutas são formas legítimas de provocar mudanças em forma de políticas pú- blicas. III - Os movimentos sociais promovem as discussões e fomentam as instâncias legais na elaboração de leis, provocando mudanças na vida social e educacional das pessoas surdas. É correto o que se afirma em: a) I, apenas. b) I e II apenas. c) I, II e III. d) I e III, apenas. e) II e III, apenas. 3. A perspectiva cultural orienta as ações das pessoas surdas no meio social, no sen- tido de realçar que suas particularidades, sobretudo, a linguística, devem ser consi- deradas um fator de inclusão e, além de possibilitar uma relação com os ouvintes, essas particularidades enriquecem a ambos, ouvintes e surdos, pelo intercâmbio de experiências. Em sua opinião, quais foram as principais contribuições das Políticas Públicas, no âmbito educacional, que fortaleceram novas práticas e empreendimen- tos de sucesso na educação de surdos? Discorra sobre. 4Estudos Gerais da Gramática da Libras Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Olá, caro aluno! Seja bem-vindo a este estudo. Iniciaremos nosso percur- so, conhecendo dois conceitos da gramática da Libras, que é constituída por uma gramática própria, apresentando requisitos, como fonética, pragmática, fonologia, semântica, morfologia e sintaxe. Aqui, você vai aprender como são executados os sinais. Assim, partindo do tema mor- fologia da Libras, estudaremos como se constitui a estrutura da Libras. A Libras tem uma estrutura linguística própria, com verbos, advérbios, pronomes, quantificadores e intensificadores. Assim, é importante com- preender que as regras gramaticais da Libras se diferem das regras da língua portuguesa. Em seguida, passaremos para a análise da sintaxe da Libras. Você terá a oportunidade de aprender como é a organização dos sinais para constituição de uma frase. Nesta unidade, você poderá se arriscar na prática da Libras. Vamos começar? Bons estudos! UNIDADE 4 138 A Língua Brasileira de Sinais (Libras), assim como toda língua de sinais, é origi- nária das comunidades surdas. Neste estudo, temos o objetivo de expor a Libras no campo da linguística. Espero que você possa desmistificar as línguas de sinais como sendo uma comunicação simplista na execução de gestos ou meramente uma comunicação por mímica. A intenção, aqui, é demonstrar que a Libras, a partir da perspectiva linguística, é uma língua com características pertinentes às regras gramaticais, como as demais línguas orais. Portanto, a Libras é consti- tuída de gramática própria, apresentando requisitos gramaticais, como fonética, pragmática, fonologia, semântica, morfologia e sintaxe. A Libras é uma línguacompleta, que ocupa a área da linguística, com características visuoespaciais, e é uma língua natural para as pessoas surdas. Agora, pense e responda: Libras é uma língua? Para a comunidade surda e a sociedade em geral, é possível consolidar uma sociedade mais justa com a divulgação e reconhecimento da Libras? Quais são os maiores desafios com os quais os surdos se deparam na sociedade? Com a Libras, ou qualquer outra língua de sinais, é possível resgatar as perdas históricas vividas pela comunidade surda? Você sabia que a Libras se difere de outras línguas de sinais pelo mundo? Os sinais são próprios de cada país. Isso mesmo. Segundo Quadros (2008) e Strobel (2008), a língua de sinais não é uma língua universal, pois adquire características diferentes em cada país, e até mesmo entre a comunidade surda de um mesmo país. Há variações de sinais na Libras, da mesma forma que há variações na língua portuguesa, ou seja, as variações são fenômenos que acontecem quando um mesmo idioma sofre alterações. Você será desafiado! Pesquise na internet por vídeos que lhe forneçam co- nhecimentos sobre as resistências da Libras. Considere o processo desde o reconhecimento da Libras no território nacional brasileiro, em 2002, e a im- portância da luta da comunidade surda para que garantias de direitos sejam implementadas na sociedade em geral. Essa pesquisa lhe dará subsídios para compreender como as pessoas surdas têm enfrentado o processo de inclusão da Libras nos diferentes espaços sociais, públicos ou não. 139 Os avanços conquistados pelas pessoas surdas, com o reconhecimento da Libras, aceitação e respeito com a forma singular comunicativa, foram conceitos que, aos poucos, atraíram o interesse de pesquisadores, defensores e apoiadores das pessoas surdas. Essas pessoas reagiram positivamente e se posicionaram com as causas da comunidade surda, tendo como base as defasagens próprias da de- sigualdade, faltas de oportunidades e conhecimentos, enfrentadas nas relações sociais. Assim, em defesa dos direitos, a sociedade surda fomentou discussões, criou movimentos sociais e estudos, que resultaram em políticas públicas que promovem muitos avanços sociais, nos aspectos linguísticos, socioafetivos e psi- cológicos, em especial, na esfera educacional. Portanto, os surdos que convivem, na atualidade, em uma sociedade mais inclusiva, nos revelam a importância das mudanças sociais, apontando as expe- riências do direito de ir e vir, estabelecidas pelo poder da autonomia e confiança, fatores que confirmam a acessibilidade, fortalecendo as lutas e as buscas por melhorias. Com isso, compreendemos que o universo da comunidade surda tem muito a nos anunciar e ensinar, pois os direitos à acessibilidade comunicativa vêm, a tempo, promovendo importantes transformações em toda sociedade. Se antes a comunidade era movida pelas expectativas, hoje, sabemos o poder regido pelas diferentes leis na sociedade brasileira. A saber, temos a lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que reconhece a Libras como meio legal de comunicação e expressão, o decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, que regulamenta a lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, e dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e o artigo 18 da lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Essas leis são exemplos normativos que impactam a realidade social das pessoas surdas, pois se convergem em maior independência nas relações sociais. Há um outro aspecto relevante das políticas públicas que devemos considerar. Quais os impactos dessas leis nas vias públicas? As leis são canais para difundir a Libras? Certamente, os canais legais possibilitam à sociedade, em geral, conhecer e desenvolver a língua natural dos surdos, ampliando o número de pessoas conhecedoras da Libras. UNICESUMAR UNIDADE 4 140 DIÁRIO DE BORDO Uma curiosidade sobre as línguas de sinais: você sabia que existe um sistema de escrita para a língua de sinais? Se pensamos nas línguas de sinais como possuido- ras de gramática própria, é pertinente conhecer como surgiu a escrita da língua de sinais, também chamada de sistema SignWriting. A curiosidade que apresento a vocês é a partir da experiência de uma professora de dança. A professora Valerie Sutton contribuiu no cenário dinamarquês, no ano de 1974, ao registar movimen- tos de dança – DanceWriting – como uma criadora da escrita dos movimentos da dança. Essa forma de registro chamou atenção de estudiosos que estavam em busca de descobrir uma forma de tornar a língua gestual uma língua que tam- bém pudesse ser escrita. Sua prática de registro incentivou pesquisadores com o trabalho de adaptação do SignWriting – as escritas de línguas de sinais. 141 Costa e Quadros (2006, p. 3) afirmam que: “ Valerie Sutton, do Center for Sutton Movement Writing, é uma es- pecialista em sistema de escrita de movimentos. Os dois principais sistemas de representação de movimentos que ela desenvolveu são o DanceWriting (um sistema para representação de coreografias, aplicado ao ballet e à dança em geral) e o SignWriting (um sistema para representação de gestos, aplicado às línguas de sinais). Durante muito tempo, as línguas de sinais eram consideradas línguas ágrafas, isto é, eram línguas apenas faladas, sem a possibilidade de serem representadas graficamente. Depois da invenção de Sutton, em 1974, a escrita de sinais passou a receber muitas transformações e aperfeiçoamento. Então, para a realização de um trabalho com foco no desenvolvimento de conhecimentos da escrita de si- nais, no ano de 1977, aconteceu o primeiro workshop sobre SignWriting para a Sociedade de Linguística de New England, nos Estados Unidos, que contou com a presença de pessoas surdas. A escrita de sinais se instituiu como uma escrita que utiliza símbolos visuais para representar as configurações de mão, os movimentos, as expressões faciais e os movimentos do corpo das línguas de sinais. Sabemos que a língua portuguesa escrita é oficialmente a segunda língua dos surdos. Então, qual é o status do sistema SignWriting para a comunidade surda? Segundo Breda (2016, p. 288), “o sistema SignWriting, que é a língua escrita de sinais, pode auxiliar na divulgação da Libras e ser uma ponte entre esta e a língua portuguesa escrita”. A escrita da língua portuguesa, é funcional, enquanto a escrita da língua de sinais tem funções especificas podendo ser registrado os movimentos, a configuração de mão, ponto de articulação, ex- pressões corporais e faciais. A escrita de sinais surge no Brasil no ano de 1996. Foi nesse período que os textos escritos na língua de sinais brasileira começaram a despertar o interesse de surdos e profissionais, pois a escrita apresenta possibilidades de expressar os recursos gramaticais dessa língua, bem como suas modulações visuais-especiais incorporadas nos sinais e no discurso. Segundo Costa e Quadros (2006), existem três formas de escrever os sinais: UNICESUMAR UNIDADE 4 142 1. A escrita com o corpo inteiro – nesse caso, utiliza-se a figura completa do corpo, uma forma mais fácil de ser entendida pelos iniciantes. Vale destacar que essa forma é utilizada na Dinamarca pelas crianças surdas, intérpretes e familiares. 2. A escrita de sinais padrão – utiliza a figura com símbolos, tornando o sinal uma unidade visual. É a forma considerada padrão no uso da escrita da língua de sinais que vem sendo usada nos Estados Unidos e demais países, inclusive o Brasil. 3. A escrita simplificada ou escrita à mão – é uma forma simplificada da escrita padrão que exclui alguns símbolos de maneira a facilitar a redação escrita à mão. Diante da crescente evolução da escrita de sinais, surgem, no cenário tecno- lógico digital, programas que auxiliam na escrita dos sinais. Segundo Silva et al (2018), há, no Brasil, quatro sistemas de escrita de sinais: o sistema Sign- Writing (SW); a Escrita de Língua de Sinais (ELiS), proposta pela professora Mariângela Estelita Barros, em 1998, quando cursava o Mestradoem Linguís- tica na Universidade Federal de Goiás (UFG); o Sistema de Escrita da Libras (SEL), que se trata de um sistema eficiente, testado, em 2011, por um grupo experimental formado por cinco surdos e um ouvinte, que obteve excelen- tes resultados, cabendo salientar que a “Escrita SEL” é um sistema de escrita para línguas de sinais desenvolvido pela Prof.a Dr.a Adriana Stella Cardoso Lessa-de-Oliveira, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), cujo projeto de pesquisa foi financiado pelo Conselho Nacional de Desen- volvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb); e, por fim, a Escrita Visogramada das Língua de Sinais (VisoGrafia). Vimos nas unidades anteriores que as escolas bilíngues priorizam o ensino da Libras (L1), a língua natural dos surdos, e a escrita da língua portuguesa (L2), que possibilita aos estudantes a construção de conhecimento sobre a escrita. Quanto ao signwriting, é pertinente compreender que a escrita da língua de sinais, para os brasileiros, corresponde ao processo da escrita da Libras. 143 A gramática da língua de sinais – morfologia É preciso resgatarmos alguns conceitos básicos da língua portuguesa, pois esse exercício é um bom princípio para o aprofundamento nos conceitos que consti- tuem a gramática da Libras. Assim, antes de adentrarmos nos aspectos gramati- cais da Libras, faremos uma retomada acerca dos conceitos, com enfoque nos pro- cessos morfológicos, que são realizados de acordo com certas regras gramaticais. NOVAS DESCOBERTAS Você sabia que existem diversos países que utilizam o sistema SignWriting? Segundo Bózóli (2015), há mais de 40 países. Entre eles, destacamos: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Austrá- lia, Bélgica, Bolívia, Brasil, Canadá, Colômbia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Etiópia, Euro- pa, Filipinas, Finlândia, França, Grã-Bretanha, Grécia, Holanda, Irlanda, Ir- landa do Norte, Itália, Japão, Malásia, Malta, México, Nepal, Nicarágua, No- ruega, Nova Zelândia, Peru, Polônia, Portugal, República Tcheca, Suécia, Suíça, Tunísia, Taiwan, entre outros. Para saber mais, acesse o QR code. A Língua Portuguesa é possuidora de regras próprias, assim como as demais línguas, a constar as línguas de sinais. Segundo Rocha (2008), a morfologia é a parte da gramática que estuda a estrutura, a formação e a flexão das palavras. Sendo assim, o estudo da estrutura preocupa-se em compreender o reconhecimento e a descrição dos elementos constitutivos do vocábulo, que são chamados de morfemas: raiz, radical, tema, vogal temática, prefixo, sufixo e desinência. UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20705 UNIDADE 4 144 Raiz Ex.: Ônibus Do latim, omnibus, que significava “para todos”. É o morfema lexical, originário e irredutível das palavras, que traz o significado comum a uma família de palavras. É o morfema nuclear de uma palavra, denominada como o elemento básico que expressa sua base significativa. Radical Ex.: geo – terra: geologia- geografia mito – lenda - mitologia casa - casebre - casarão - casinha É o elemento lexical básico da palavra, ao qual podem ser agregados outros elementos mórficos, como a vogal temática. A partir do radical, identificamos a origem da família da palavra, ou seja, a palavra primitiva. Tema Tema = radical + vogal temática cantar = cant + a, mala = mal + a, rosa = ros + a É o radical acrescido da vogal temática. Nos verbos, quando tiramos o "r" do infinitivo, obtemos o tema. Vogal Temática A - E - O cas + a = casa É a vogal que acrescentamos ao radical para formar o tema. Encontramos vogal temática tanto em verbos quanto em nomes. Essas palavras não podem ser tônicas. Desinência Gato - Gata - D. Gênero Temores - D. Número São morfemas que indicam a flexão das palavras em gênero e número; existem tanto nos nomes quanto nos verbos. São elas: desinências de gênero e número, nos nomes; desinências de modo-tempo, pessoa-núme- ro, nos verbos. Prefixo Palavra Primitiva - Feliz In + feliz = Infeliz São palavras derivadas com afixos. Nesse caso, o afixo é fixado no início da palavra. Sufixo Palavra Primitiva - Feliz Feliz + mente = Felizmente São palavras derivadas com afixos. Nesse caso, o afixo é fixado depois da palavra. Quadro 1 - Elementos constitutivos do vocabulário na língua portuguesa – morfemas Fonte: a autora. 145 Apresentamos, no Quadro 1, os elementos do morfema que compreendem a menor unidade estrutural da palavra, ou seja, são elementos que constroem as palavras. Todas as palavras da Língua Portuguesa são construídas a partir dos morfemas. O sistema morfológico é entendido como o estudo da estrutura inter- na das palavras, isto é, como os elementos se combinam entre si para formar as palavras. Morfema é o que chamamos de unidade mínima, que é a unidade míni- ma significativa. A Morfologia (área da Linguística) estuda, ainda, as “[...] diversas formas que apresentam tais palavras quanto à categoria de número, gênero, tempo e pessoa” e a “[...] origem das palavras” (QUADROS, KARNOPP, 2004, p. 16-20). Há outra forma, na língua portuguesa, de formação das palavras, que chama- mos de fonema. Para que você entenda o que significa fonema, é preciso com- preender o que é Fonologia. A Fonologia é a área da Linguística que estuda os fonemas. Assim, o fonema é a menor unidade de som de uma palavra, que dis- tingue uma palavra da outra. Observe a palavra /bala/. Se trocarmos a letra /b/, pela letra /f/, considerando o som dessas duas letras, obteremos outra palavra / fala/. Portanto, a Fonologia da Linguística estuda o sistema sonoro de um idio- ma – que resulta nos fonemas, sons produzidos pelos falantes, que representam as unidades sonoras que formam as palavras de uma língua. Os seres humanos produzem sons que se articulam, juntam-se e formam as palavras. Agora que retomamos os conceitos básicos da estrutura da língua portuguesa e compreendendo a complexidade acerca da gramática das diferentes línguas, seguire- mos os estudos, abrindo discussões sobre como se estrutura a Libras em relação aos aspectos gramaticais, permitindo que a Libras amplie o seu léxico, ou seja, crie sinais. Segundo Xavier e Neves (2016, p. 130-131): “ [...] para designar novos conceitos, as línguas, em geral, não criam novas palavras a partir de formas completamente inéditas, formadas exclusivamente para elas, mas sim através do reaproveitamento de palavras já existentes em seu léxico. [...] Os processos que resultam na modificação da forma de alguns sinais da Libras se assemelham ao que se chama de flexão nas línguas orais, justamente por não re- sultarem na formação de uma nova palavra. Na verdade, geram-se através deles diferentes formas de um mesmo sinal por meio das quais se expressam certos significados gramaticais. Na Libras, observam-se entre esses casos aqueles em que a forma do sinal é modificada quan- do incorpora quantidade, negação, argumento e intensidade. UNICESUMAR UNIDADE 4 146 Os princípios do uso das estruturas linguísticas da Libras permitem aos surdos e usuários de línguas de sinais o uso dos componentes pragmáticos que são codifi- cados no léxico que compõe a estrutura da Libras. Quadros (2008) compreende que a gramática da língua portuguesa é entendida como o conjunto de regras necessárias na estruturação de textos (morfologia, sintaxe, coesão e coerência, acrescentando, nesse repertório, as relações com a estrutura sintática, da morfo- logia, da fonologia, da semântica e da pragmática), que são constituintes que o indivíduo deve seguir ao registrar suas ideias. Segundo Quadros e Karnopp (2004), a estrutura da Libras é compreendida pelos seguintes elementos: ■ Fonologia: refere-se ao quirológico, que nas línguas de sinais é constituído no corpo dos sinalizantes, por meio da face e das mãos, por ser de mo- dalidade visual, assim a informação é recebida pela visão e produzida pelas mãos. ■ Morfológico: sinalou item lexical. ■ Semântico: significado. ■ Sintático: refere-se a frases. ■ Pragmático: uso do significado/sentido. Para Quadros (2008), a gramática de Libras também possui as regras de estru- turação de textos, assim como a gramática da língua portuguesa, que estão rela- cionadas à morfologia, coesão, coerência e semântica. Segundo Britto et al. (1997, p. 23): “ A Libras é dotada de uma gramática constituída a partir de elementos constitutivos das palavras, ou itens lexicais, e de um léxico que se es- truturam a partir de mecanismos fonológicos, morfológicos, sintáticos e semânticos que apresentam, também, especificidades, mas seguem, também, princípios básicos gerais. É dotada, também, de componentes pragmáticos convencionais e codificados no léxico e nas estruturas da Libras e de princípios pragmáticos que permitem a geração de implí- citos sentidos metafóricos, ironias e outros significados não literais. 147 A linguística contrastiva é uma parte da linguística geral, que estuda as similari- dades (coisas parecidas) e diferenças estruturais entre a língua materna (de um grupo de alunos) e uma língua estrangeira. Essa comparação é feita nos níveis de articulação da linguagem, a saber: fonológico, semântico, morfológico e sintático. O sistema fonológico estuda os fonemas, que são a menor unidade distintiva da palavra – por exemplo, na palavra “fala”, a letra “f ” representa o fonema “fê” –, e se refere aos sons numa língua oral. O sistema semântico estuda o significado ou sentido das palavras e da sentença. A semântica, além de estudar as ironias e metáforas, [...] é a parte da linguística que estuda a natureza do significado individual das palavras e do agrupamento das palavras nas sentenças, que pode apresentar variações regionais e sociais nos diferentes dialetos de uma língua (QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 163). Desse modo, o campo de estudo da semântica abarca conceitos das teorias linguísticas. Tamba (2006), ao estudar a teoria semântica, nos apresenta uma vertente na perspectiva histórica e define quatro períodos. Libras é língua? Aprendemos que a Língua Brasileira de Sinais (Libras) é uma língua de modalidade es- paço-visual, por meio da qual é possível se comunicar através dos sinais, expressões faciais e corporais. A língua de sinais não pode ser confundida com a mímica ou simples gestos, ao contrário, a Libras é uma língua que possui elementos gramaticais, comprovados por muitos pesqui- sadores, como um idioma, um sistema linguístico legítimo e natural, utilizado pela comuni- dade surda brasileira, em que se compartilham mensagens, ideias, emoções e sentimentos. Libras é um idioma completo. No Brasil, a Libras ganha status legal com a lei nº 10.436, decretada em 2002. A Libras não é universal. No Brasil, são utilizados cinco parâmetros que constituem a Libras: a configuração da mão, referente à posição dos dedos; o ponto ou local de articulação, que trata do local no espaço, entre a cabeça e o abdômen, em que ocorre a configuração da mão; o movimento, ou seja, como as mãos se movimentam no espaço; a orientação/direcionalidade, que é para onde a mão está orientada; e, por fim, a expressão facial e/ou corporal, usados para complementar e intencionalizar a sinalização. EXPLORANDO IDEIAS UNICESUMAR UNIDADE 4 148 Período Evolucionista semântica, que �cou conhecida como a ciência das signi�cações, nominada por Michel Bréal, inspirado no Darwinismo, cujo objetivo era descobrir nas leis da evolução o sentido/signi�cado das coisas, como também dentro de uma observação empírica dos fatos de sentido. Período Estrutural nesse período, estudos indicam que ocorrem duas concepções da abordagem semântica lexical, sendo: abordagem histórica e abordagem sincrônica. A abordagem histórica decorre da semântica evolucionista, na qual predomina um período dominado por uma semântica lexical histórica. Enquanto a abordagem sincrônica indica a linguística estrutural europeia, que explora a relação LÍNGUA X FALA, de�nida por Ferdinand de Saussure. Com esse pesquisador, a linguística surge com status cientí�co. Período das Gramáticas Formais ocorrido entre os anos de 1963 e 1965, esse período foi marcado pelo estudo da semântica da gramática gerativa. Aqui, o campo da semântica foi transferido do léxico para as frases, tendo por principal centro de interesse as relações entre as estruturas sintáticas e semânticas das frases, incluindo alguns sistemas indexicais. Período das Ciências da Cognição surgiu com L. Talmy, a partir de 1978, que estudou a semântica a partir dos diferentes processos de conceitualização sobre a organização do léxico. Descrição da Imagem: ilustração colorida com quatro caixas de texto, sendo elas: 1. Período Evolucionista - semântica, que ficou conhecida como a ciência das significações, nominada por Michel Bréal, inspirado no Darwinismo, cujo objetivo era descobrir nas leis da evolução o sentido/significado das coisas, como também dentro de uma observação empírica dos fatos de sentido; 2. Período Estrutural - nesse período, estudos indicam que ocorrem duas concepções da abordagem semântica lexical, sendo: abordagem histórica e abordagem sincrônica. A abordagem histórica decorre da semântica evolucionista, na qual predomina um período dominado por uma semântica lexical histórica. Enquanto a abordagem sincrôni- ca indica a linguística estrutural europeia, que explora a relação LÍNGUA X FALA, definida por Ferdinand de Saussure. Com esse pesquisador, a linguística surge com status científico; 3. Período das Gramáticas Formais - ocorrido entre os anos de 1963 e 1965, esse período foi marcado pelo estudo da semântica da gramática gerativa. Aqui, o campo da semântica foi transferido do léxico para as frases, tendo por principal centro de interesse as relações entre as estruturas sintáticas e semânticas das frases, incluindo alguns sistemas indexicais; e 4. Período das Ciências da Cognição - surgiu com L. Talmy, a partir de 1978, que estudou a semântica a partir dos diferentes processos de conceitualização sobre a organização do léxico. Figura 1 - Períodos históricos da semântica / Fonte: adaptada de Tamba (2006). 149 Os estudos sobre a semântica buscam compreender a significação das palavras, a qual ocorre dentro de um dado contexto em uma dada situação. Após esse adendo mais específico das pesquisas sobre a semântica, seguiremos retomando os estudos dos componentes pertinentes à estruturação das palavras: o sistema morfológico e o sistema sintático. Os morfemas na Libras: Morfologia = Estudo das estruturas internas. Morfema = Unidade mínima de significado. EXPLORANDO IDEIAS Em português, a palavra se estrutura a partir de unidades mínimas sonoras, por- tanto, as unidades das palavras faladas são de natureza acústico-sonoras – pas- sagem livre ou obstruída dos sons, sonoridade, posição da articulação posterior, frontal, média na boca etc. Enquanto na Libras, as características das unidades dos sinais são espaciais – forma da mão ou do sólido, movimento linear e com retenção, e vetores orientacionais da mão. De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 20), sintaxe é: “[...] a parte linguística que estuda a estrutura interna das sentenças e a relação interna entre as suas partes”. Para as autoras, “[...] o conhecimento linguístico dos seres humanos caracteriza-se pela existência de uma gramática que apresenta um conjunto finito de princípios (regras), que possibilitam a compreensão e produção de um número infinito de com- binações em uma determinada língua” (QUADROS, KARNOPP, 2004, p. 21). Vamos lá? Continuaremos estudando as categorias gramaticais e os aspectos linguísticos. Portanto, é pertinente discutir que, assim como na língua portugue- sa, a Língua Brasileira de Sinais determina os sinais, de acordo com a sua classe gramatical, quanto aos aspectos fonéticos, fonológicos e morfológicos. A fonética da Libras é formada e constituída por parâmetros que são estu- dados pela área da fonéticae da fonologia da Libras. Benassi, Duarte e Padilha (2015) entendem que a área da fonética se encarrega dos estudos das unidades físico-articulatórias dos sinais isoladamente. Dessa forma, estabelece um con- junto de traços ou propriedades que possam descrever os parâmetros usados na linguagem humana sinalizada. UNICESUMAR UNIDADE 4 150 Segundo Quadros (2008), a fonologia das línguas de sinais estuda as configura- ções e os movimentos dos elementos en- volvidos na produção dos sinais, assim os parâmetros são elementos que com- põem um sistema linguístico específico, cabendo a ela estudar as diferenças de significação, relacionando, entre si, ele- mentos de diferenciação e condições de combinação próprias na formação de morfemas. Destacamos que morfema é a unidade mínima dotada de significado que integra o vocábulo, portanto, essas estruturas são partes constituintes do campo gramatical e lexical das palavras. O que conhecemos por “palavra” ou “lexical” nas línguas orais corresponde ao que chamamos de “sinal” nas línguas de sinais. Portanto, parâmetros formam os sinais que se combinam, assim constituem as unidades mínimas, os fonemas que for- mam os morfemas nas línguas de sinais. Sabemos que as palavras da Libras e do português se estruturam a partir de unidades mínimas sonoras e espaciais. Na Libras, esses sinais são muito pare- cidos e se modificam por alguns parâ- metros que veremos detalhadamente à frente. Vejamos, a seguir, o exemplo: Descrição da Imagem: há duas imagens de uma mulher morena clara, de cabelos castanho-escuros, olhos castanho-escuros e vestida de blusa preta. Ela sinaliza SÁBADO e APRENDER. Na primeira foto, a mão direita, em configuração da letra O, está localizada em frente a sua boca, ocupando o espaço neutro, sinalizando SÁBADO, e na segunda foto, a intérprete de Libras está com a mão direita, em configuração do O, em frente à testa, sinalizando APRENDER. Figura 2 – Unidades mínimas na Libras Fonte: a autora. Sábado Aprender 151 No exemplo anterior, os movimentos são os mesmos, porém o sinal é articulado em localizações diferentes. Descrição da Imagem: na foto, há uma mulher de cabelos longos, castanho-escuros. A intérprete sinaliza a palavra QUEIJO. Nesse caso, a intérprete está com a mão direita próxima do queixo, porém, ocupando o espaço neutro, com a mão em configuração do L. Sua expressão facial é neutra. Na segunda foto, a intérprete está com a mão em configuração da letra L, no espaço neutro abaixo da altura do queixo e sorrindo, sinalizando SORRIR. Figura 3 – Unidades míni- mas na Libras Fonte: a autora. Queijo Sorrir UNICESUMAR UNIDADE 4 152 Percebam que no exemplo das sinalizações de QUEIJO e SORRIR, a mudança é pequena, ocor- rendo apenas alterações quanto ao movimento. É importante que vocês percebam que o léxico da Libras, assim como o léxico de qualquer língua, é infinito, podendo gerar outras palavras. Devido à carência em pesquisas, no passado, acreditava-se que a Libras era uma língua pobre, justamente por- que as palavras (os sinais) eram poucas. Atualmente, as pesquisas têm nos apresentado cientificamente que a Libras é uma língua e que, como qualquer outra, passa por transformações, inclusive com o surgimento de novas palavras. Para sua melhor compreensão, agora, você co- nhecerá os cinco parâmetros – configuração de mão (CM); locação ou ponto de articulação (PA); movi- mentos (M); orientação e expressões faciais (EF) – que constituem os sinais, a saber: 1. Configurações de mãos (CM) – são com- postas por 79 formas de mãos, que determi- nam como serão executadas a datilologia, nesse caso, o alfabeto manual, e as formas das mãos adequadas na execução dos sinais, que podem ocorrer com ambas as mãos, tanto para o sinalizador como para o emissor. 153 Descrição da Imagem: a figura acima é composta por 79 imagens que se caracterizam por configurações de mãos. Destacamos que cada mão tem um formato específico, que representa, na prática, a execução adequada para cada sinal em Libras. As configurações correspondem, também, à forma correta da sina- lização para os números naturais. Figura 4 – Configurações de mãos / Fonte: Capelli et al. (2019, p. 8). UNICESUMAR UNIDADE 4 154 2. Locação – denominado como ponto de contato (PC), ou ponto de ar- ticulação (PA), corresponde ao lugar em que será executado no corpo. Segundo Quadros e Karnopp (2004, p. 57) “o espaço de enunciação é uma área que contém todos os pontos dentro do raio de alcance das mãos em que os sinais são articulados”. Cabeça Tronco Mão Espaço neutro Topo da cabeça Testa Rosto Parte superior do rosto Parte inferior do rosto Orelha Olhos Nariz Boca Bochechas Queixo Pescoço Ombro Busto Estômago Cintura Braço(s) Antebraço Cotovelo Pulso Palma Costas das mãos Lado do dedo indicador Lado do dedo mínimo Dedos Ponta dos dedos Dedo mínimo Dedo anular Dedo médio Dedo indicador Dedo polegar Região em que o sinal é articulado; uma área que con- tém pontos dentro do raio de alcance das mãos. Quadro 2 - Pontos de articulação / Fonte: adaptado de Quadros e Karnopp (2004, p. 58). A tabela apresenta os principais pontos utilizados na sinalização. O espaço ideal de enunciação é aquele em que os interlocutores estão face a face. O Quadro 2 apresenta locações divididas em quatro regiões: cabeça, tronco, mão e espaço neutro. Para Quadros e Karnopp (2004), subespaço refere-se ao ponto específico e/ou à locação específica. Portanto, os subespaços incluem as distinções deta- lhadas, tais como: nariz, boca, olhos, testa, e são subcategorizados por locações principais. As locações principais, por sua vez, incluem categorias abrangentes, como: cabeça, tronco, mão não dominante e espaço neutro. 155 -100 100 100 80 3. Movimentos (M) – compreende os movimentos de dedos, punhos, bra- ços e corpo, que acompanham a articulação de um sinal. Vejamos o qua- dro das categorias do movimento, segundo Brito (1990 apud QUADROS, 2004, p. 58): Descrição da Imagem: a figura é composta por uma mulher de cabelos longos e amarrados. A mulher é morena clara, tem olhos castanho-escuros e usa uma blusa preta. Ela é uma intérprete de Libras e sinaliza a palavra CASA. Figura 5 – Espaço gramatical / Fonte: a autora. Vejamos na imagem, a seguir, os limites permitidos para a execução dos sinais. No quadrante da imagem do sinalizador, é possível compreender onde podemos tocar, ou seja, quais são as partes do corpo no momento da sinalização. UNICESUMAR UNIDADE 4 156 Tipo Contorno ou forma geométrica: retilíneo, helicoidal, semicircular, sinuoso, angular, pontual. Interação: alternado, de aproximação, de separação, de inserção, cruzado. Contato: de ligação, de agarrar, de deslizar, de toque, de esfregar, de riscar, de escovar ou de pincelar. Torcedura de pulso: rotação com refreamento. Dobramento de pulso: para cima, para baixo. Interno das mãos: abertura e fechamento, curvamento e dobramento (simultâneo/gradativo). Direcionalidade Direcional - Unidirecional: para cima, para baixo, para a direita, para a esquerda, para dentro, para fora, para o centro, para a lateral inferior esquerda, para a lateral inferior direita, para lateral superior direita, para lateral superior esquerda, para específico ponto referencial. Maneira Qualidade Tensão e velocidade Contínuo De retenção De refreado Frequência Repetição Simples Repetido Quadro 3 - Categorias do movimento / Fonte: a autora. Percebam, na figura a seguir, que a sinalização de “brincar” apresenta vários dos parâmetros da Libras que estamos estudando. Vocês estão convidados a executar esse sinal, a partir da percepção visual. Experimentem sinalizar. Não se preocu- pem com a perfeição, apenas repitam os movimentos conforme são apresentados na foto. Vamos lá? É assim que se começa a conhecer a Libras. 157 Descrição da Imagem: na foto, há uma mulher de ca- belos longos e castanho-es- curos, seus olhos também são castanho-escuros e ela está usandouma camiseta preta. Ela é intérprete de Libras e sinaliza o sinal de BRINCAR. Suas mãos se encontram na sua frente, bem próximas do abdômen, porém não encostam a bar- riga. A configuração das mãos é idêntica – os dedos mínimos e polegares estão erguidos para frente, en- quanto os dedos indicador, médio e anular estão enco- lhidos, encostando na pal- ma da mão. Assim, o sinal BRINCAR é formado com a configuração em Y, e ambas as mãos em movimentos circulares, que são realiza- dos no espaço neutro. Figura 6 – Brincar Fonte: a autora. 4. Orientação (O) – corresponde à orientação de palma (OP), que equivale à movimentação das mãos, que pode ser para os lados, direita e esquerda, frente e atrás. 5. Expressões faciais (EF) – são imprescindíveis, pois são componentes dos sinais que se completam, dando ênfase à mensagem no discurso. As ex- pressões faciais são também conhecidas como expressões não manuais, as quais podem ocorrer com os movimentos faciais – utilizando olhos, boca, cabeça, levantamento da sobrancelha, sorriso –, que auxiliam ao expressar sentimentos – alegria, tristeza, raiva, afetividade, estresse, ânimo, cansaço, carinho, amor, medo, susto, insegurança, desconfortos, entre outros. São exemplos de sinais com expressões faciais marcantes/sem acompanhamento da sinalização: Brincar O movimento é circular. UNICESUMAR UNIDADE 4 158 São exemplos de sinalizações acom- panhadas de expressões marcantes: Discussão 159 Descrição da Imagem: a sequência de fotos mostra uma sequência de sinais em Libras, que são rea- lizados por uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros. Seus olhos são castanho-escuros e ela está usando uma camiseta preta. Ela é intérprete de Libras e sinaliza o sinal de DISCUSSÃO em Libras, na primeira foto da esquerda para a direita. Na segunda foto, a mesma mulher sinaliza a palavra QUAL, demonstrando uma expressão facial marcante, suas mãos se encontram a sua frente, bem próximo do abdômen, usando o espaço que chamamos de neutro. A configuração das mãos é idêntica – os dedos indicadores estão apontados para cima. Na terceira imagem, a intérprete sinaliza a palavra MAGRO, indi- cada pelo movimento da mão direita à frente do corpo, com a configuração de mão em I e com marcação da expressão facial com as bochechas para dentro. Figura 7 – Sinais com expressões faciais marcantes / Fonte: a autora. Qual? Magro (a) É na combinação dos parâmetros executados que damos sentidos a Libras. É assim que a Libras é formada. É claro que à medida que aumenta a fluência em Libras, outros aspectos gramaticais tornam-se essenciais e garantem aos usuários compreensão no contexto da comunicação, como o uso dos classificadores. As autoras Farias e Farias (2019, p. 104) destacam que na Libras, a sintaxe (as re- gras gramaticais) é diferenciada, permitindo gerar uma quantidade infinita de sinais e sentenças em relação a outras línguas. Elas explicam que “a maneira de expressar os sinais está relacionada a determinadas estruturas, tanto no nível da morfologia quanto no nível da sintaxe, e são obrigatórias nas línguas de sinais em circunstân- UNICESUMAR UNIDADE 4 160 cias específicas”. Na perspectiva das autoras, o nível da sintaxe, das marcações não manuais, ou seja, expressões faciais, é responsável por indicar tipos de frases na Li- bras, como: as sentenças afirmativas, as interrogativas, as negativas, as relativas e as condicionais. A partir das ideias defendidas pelas autoras, sugiro que você conheça o material elaborado por Capovil- la, intitulado Novo Deit-Libras, que é um dicionário enciclopédico ilustrado trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. O referido material apresenta aspectos ba- seados em estudos da linguística das línguas orais, da fonologia, da morfologia, da sintaxe e também em es- tudos da linguística das línguas de sinais, como a es- trutura interna do sinal, os aspectos relacionados aos parâmetros que constituem a sua estrutura lexical e os conhecimentos relacionados à sintaxe. Carneiro, Nogueira e Soares (2017) afirmam que umas das formas mais simples de criação de sinais ocorre por meio do empréstimo lexical. As autoras ressaltam que os empréstimos lexicais não são si- nais nativos da Libras, eles são inspirações de outras línguas. Vejamos alguns exemplos de empréstimos lexicais constituídos no uso do alfabeto manual, por meio da datilologia. Empréstimos lexicais de soletração: manual com- pleta ou de parte das palavras em língua portuguesa, como os sinais para O-B-A; JUN (JUNHO); JUL (JU- LHO); A-Z-U-L (AZUL); S-O-L (SOL). Empréstimos lexicais de inicialização: nesse caso, o sinal é executado com a utilização de uma CM que corresponde, no alfabeto manual, à primeira letra da palavra equivalente em língua portuguesa. Exemplos: fé, flor, família, professor, pedagogo, futuro e férias. 161 Fé Férias Movimentos circulares UNICESUMAR UNIDADE 4 162 A mão que está em cima, em configuração da letra F, movimenta-se em círculo no sentido horário da mão fechada. Descrição da Imagem: a figura corresponde a uma mulher de cabelos longos e amarrados, de cor casta- nho-escuro. Ela tem olhos castanho-escuros e veste uma blusa preta. É uma intérprete de Libras e sinaliza as palavras FÉRIAS, FÉ e FUTURO. Figura 8 – Sinalização em Libras com empréstimos lexicais / Fonte: a autora. Futuro 163 Carneiro, Nogueira e Soares (2017) ressaltam que há empréstimos de itens lexi- cais de outras línguas de sinais, que foram agregadas ao léxico da Libras, como o sinal para laranja, que utiliza a configuração de mão (CM) em “O”. “O”, aqui, refere-se à “Orange”, palavra inglesa, consequentemente, o empréstimo é oriun- do da Língua de Sinais Americana (ASL). Xavier e Neves (2016) e Mark (2021) concordam que há três processos de formações de sinais na Libras, a saber: a) derivação, em que ocorre a mudança de um dos cinco parâmetros da Libras; b) composição, quando há a justaposição de dois sinais; c) fusão, que é a junção de partes de duas palavras primitivas. Você percebeu que os empréstimos lexicais são práticas que resultam em formação de sinais em Libras. Embora compreendamos, conforme afirmam os autores supra- citados, que desse processo novos sinais possam surgir por meio da derivação, composição e incorporação. a) Na derivação, um novo sinal é obtido pelo enriquecimento do radical (raiz) com vários movimentos e contornos no espaço. Podem ocorrer mudanças no movimento para derivar verbos de substantivos e vice-versa. Assim, o movimento dos substantivos repete e encurta o movimento dos verbos. Dessa forma, surge um novo sinal para se utilizar o significado de um sinal já existente num contexto que requer uma classe gramatical diferente. Um tipo de processo bastante comum na Língua de Sinais Brasileira é aquele que deriva nomes de verbos (ou vice-versa). Exemplo: sentar/cadeira. b) O processo de composição é um fenômeno muito produtivo nas línguas de sinais que permite a criação de novas palavras, a partir de outras já existentes. Assim, o “processo de composição se utiliza de itens lexicais que são morfemas livres que se justapõem, ou se aglutinam, para formar um novo item lexical” (MINUSSI; TAKAHIRA, 2013, p. 219). Takahira (2012) explica, no entanto, que o processo de composição da Libras pode ser chamado de “processo de justaposição”, que é quando dois sinais são executados em sua totalidade, ou seja, os dois sinais são completamente sinalizados. UNICESUMAR UNIDADE 4 164 Casa + Estudar = Escola Casa + Carne = Açougue 165 Descrição da Imagem: a sequência das fotos mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mulher é uma intérprete e está sinalizando, em Libras, a palavra IGREJA. Na primeira foto, a intérprete sinaliza o sinal de CASA, assim, junta as duas mãos, deixando-as afastadas e encostando as pontas dos dedos, formando um triângulo, como um telhado de casa. Na segunda foto, a intérprete faz o sinal de CRUZ,formados pelo cruzamento dos dedos indicadores, um sobreposto ao outro. Ambos os sinais são executados no campo neutro, ou seja, em frente ao corpo da mulher para formar o sinal de igreja, nesse caso, utiliza-se a composição de dois sinais. Figura 9 – Exemplos de composição / Fonte: a autora. c) O conceito de estudo da incorporação está ligado ao numeral e à in- corporação de negação; incorporação de instrumento; incorporação de intensificador; incorporação nas construções classificadoras; incorpo- ração nominal em verbos de deslocamento; incorporação de modo em verbos de deslocamento e de tempo em advérbios, porém, os processos mais comuns são: incorporação de numeral, incorporação de negação e incorporação de instrumento (RABELLO, 2020, p. 69). Casa + Cruz = Igreja UNICESUMAR UNIDADE 4 166 A comunidade surda tem muitas oportunidades quando utiliza a comunicação através da Libras. Pensando nas realidades escolares atualmente e analisando o processo de inclusão, a Libras propicia uma melhor compreensão entre surdos e ouvintes, uma vez que já está previsto em lei a presença de intérpretes de Libras em diferentes instituições públicas, como escolas, universidades, congressos, seminários, programas de televisão, entre outros. Um dos grandes desafios no universo educacional é garantir que os surdos possam aprender, respeitando as singularidades linguísticas. Sabemos que a utilização da Libras facilita a comunicação entre os surdos, compartilhando suas experiências cul- turais, sociais e intelectuais. Portanto, é importante compreendermos que a comunidade surda tem características específicas. Só assim, implementaremos a educação inclusiva e, consequentemente, a inclusão social. Portanto, partindo desses pressupostos, compreen- demos que a pessoa surda, ao utilizar a língua de sinais, pode desenvolver integralmente todas as suas possibilidades cognitivas, afetivas e emocionais. EXPLORANDO IDEIAS Aspectos Sintáticos da Libras – Espaço Gramatical na Libras Na Língua Brasileira de Sinais, assim como nas demais línguas de sinais exis- tentes no mundo, a realização de sinais ocorre no que chamamos de espaço gramatical. É nesse espaço que as relações sintáticas acontecem. Anteriormente, conversamos sobre esse espaço quando estudamos o conceito de locação, tam- bém denominado como ponto de contato (PC) ou ponto de articulação (PA). Agora, seguindo nosso pensamento, veja que o “espaço gramatical” compreende o espaço de sinalização, o “locus determinante da sinalização”, ou seja, o espaço de enunciação é uma área que contém todos os pontos dentro do raio de alcance das mãos em que os sinais são articulados. 167 Destacamos que espaço gramatical, ou de sintaxe espacial, são as relações gramaticais em Libras que implicam nas especificadas pela manipulação de sinais no espaço. Dentro do espaço gramatical, os sinais podem ser movimentados para estabelecer diferenças entre o sujeito e o objeto. 01 04 03 02 Os referentes relativos ao sistema pronominal, presentes ou não, são localizados no espaço pelos sinalizadores. O movimento da mão entre dois referentes marcados no espaço indica, por exemplo, quem é o receptor e quem é o emissor da mensagem. Das três classes de verbos em Libras (simples, com concordância e espaciais) duas são estabelecidas em função da movimentação espacial. Das três classes de verbos em Libras (simples, com concordância e espaciais) duas são estabelecidas em função da movimentação espacial. Descrição da Imagem: ilustração colorida com quatro caixas de texto, contendo os dizeres: 1. Os referen- tes relativos ao sistema pronominal, presentes ou não, são localizados no espaço pelos sinalizadores; 2. O movimento da mão entre dois referentes marcados no espaço indica, por exemplo, quem é o receptor e quem é o emissor da mensagem; 3. Das três classes de verbos em Libras (simples, com concordância e espaciais), duas são estabelecidas em função da movimentação espacial.; e 4. Das três classes de verbos em Libras (simples, com concordância e espaciais), duas são estabelecidas em função da movimentação espacial. Figura 10 – Espaço gramatical / Fonte: adaptada de Aragão Neto (2012). UNICESUMAR UNIDADE 4 168 É nesse espaço que os sinais são executados, portanto, essa localização é essencial para a produção da Libras. Por isso, é importante que ele seja bem utilizado, pois a eficiência na sinalização demanda conhecimento sobre as possibilidades de concreti- zação da Libras. Vejamos, a seguir, a produção de alguns sinais localizados no espaço: Eu Ela VocêEle 169 Nós Descrição da Imagem: as sequências das fotos mostram uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mulher é uma intérprete e está sinalizando, em Libras, as palavras: EU, ELA, ELE, VOCÊ e NÓS. Na primeira foto, a intérprete sinaliza o sinal de EU, apontando e encostando o dedo indicador da mão direita no tórax. Na segunda foto, a intérprete sinaliza a palavra ELA, nesse caso, seu olhar se direciona para a esquerda, seguindo a direção da mão e apontando para o campo neutro. Em seguida, na terceira foto, a intérprete sinaliza a palavra ELE, nesse caso, a mão dominante é a direita e o seu olhar segue a posição de apontamento, também, para a direita. Na quarta foto, a interpretação é da palavra VOCÊ. Aqui, a intérprete aponta o indicador na frente do seu corpo e o olhar também segue a direção do dedo. Na última sequência, há duas fotos para formar a sinalização da palavra NÓS. Nas imagens, o sinal é executado com a mão direita. Com o dedo indicador apontado para cima, sentido da cabeça, a intérprete encosta o dedo no ombro, faz uma volta, num movimento até chegar do outro lado do ombro. Figura 11 – Sinais localizados no espaço / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 170 O valor semântico de cada sinal dependerá da sua localização no espaço. Observe, nas fotos anteriores, que o sinalizador, ao apontar para o elemento ou objeto sinalizado, esclarece nesse espaço o entendimento do discurso. Dessa forma, na língua de sinais, a informação a ser transmitida está vinculada ao local de marcação (dentro do espaço) da sinalização. Quanto ao uso de espaço nas línguas de sinais, Langevin e Ferreira Brito (1988, [s. p.]) asseveram: “ No que se refere ao nível fonológico, um mes- mo sinal pode ser realizado em diferentes locais, dentre eles, o espaço neutro, que corresponde à área localizada na frente do sinalizante. Dependendo do ponto utilizado no espaço para a realização de um sinal, pode haver a produção de sinais com diferentes referentes. A autora afir- ma que a realização de um sinal em um deter- minado ponto no espaço implica em mudanças de significados relacionadas com o referente, ou seja, está ligada a questões semânticas. Quan- do se quer ser específico quanto ao referente, é possível realizar um sinal em uma determinada localização. Além disso, se o mesmo sinal for reproduzido em diferentes pontos do espaço, entraremos no campo morfológico, pois po- deremos incorporar movimentos que indicam marcação de plural e flexão verbal. É importante destacar que durante a formação dos sinais, há restrições quirológicas requeridas para uma boa formação. Conforme apontam Silva, Costa e Teles (2019), os sinais po- dem ser produzidos com: 1. Condição de simetria, produzidos pelas duas mãos, em que ambas são ativas e simétricas. https://www.libras.ufsc.br/colecaoLetrasLibras/eixoFormacaoEspecifica/linguaBrasileiraDeSinaisIII/scos/cap14489/2.html 171 Descrição da Imagem: há duas imagens de uma mulher morena clara, de cabelos castanho-escuros, olhos castanho-escuros e vestida de blusa preta. Ela sinaliza com ambas as mãos e de forma simétrica, tanto no movimento quanto na configuração de mãos. Na primeira foto, ela está com as mãos na altura dos ombros – ocupando o espaço neutro. Com as palmas das mãos viradas para cima e dedos entreabertos, com ambas as mãos em configuração de mão da letra “F”, onde o os indicadoresestão posicionados bem próximos. Na segunda foto, a mesma mulher está com as mãos na altura dos ombros, porém suas mãos estão viradas e encos- tadas pelos dedos indicadores, representando o movimento do sinal circular, assim surge o sinal de “FAMÌLIA”. Figura 12 – Sinal simétrico / Fonte: a autora. Aceitar Família UNICESUMAR UNIDADE 4 172 2. Condição de dominância – com uma das mãos ou com as duas mãos – em que uma é ativa (realiza o sinal) e a outra é passiva (apoia o sinal), servindo como locação ou ponto de articulação. Descrição da Imagem: há duas imagens de uma mulher morena clara, de cabelos castanho-escuros, olhos castanho-escuros e vestida de blusa preta. Ela sinaliza com ambas as mãos. Na primeira foto, a mão direita está localizada no início do pulso em cima da mão esquerda, e na segunda foto, a intérprete de Libras está com a mão direita em cima da mão esquerda; aqui, encontra-se mais próxima das pontas dos dedos, indicando uma movimentação ocorrida. Em ambas as mãos, os dedos estão próximos, bem agrupados uns aos outros. Figura 13 – Sinalização com dominância / Fonte: a autora. Começar Qualquer referência usada em uma conversa em Libras precisa de uma locali- zação no espaço de sinalização, que pode ser determinada por diferentes meca- nismos espaciais. Dessa forma, destacamos que é importante que o sinalizador se aproprie desses elementos quando estiver interpretando ou conversando com um surdo. Ao se apropriar de tais elementos (marcação no espaço), os sinalizadores serão mais objetivos e farão uma sinalização limpa e natural. 173 a) Direcionar o olhar para uma localização particular, junto à sinalização do substantivo, é uma maneira de fazer referência àquele substantivo em particular. b) A apontação explícita, envolvendo referentes presentes ou não presentes, é a forma mais simples de estabelecer referências. c) Todos os referentes estabelecidos no espaço ficam à disposição do discur- so para serem referidos novamente. Segundo Quadros (2008), a Libras utiliza mecanismos espaciais, recursos de re- petição, expressões faciais e outros itens lexicais necessários. As expressões não manuais são um conjunto de movimentos da face e do corpo que dão entonação ao discurso na língua de sinais. Pronomes UNICESUMAR UNIDADE 4 174 Quadro 4 – Categorias gramaticais I: pronomes, adjetivos e substantivos / Fonte: a autora. Adjetivos Substantivos 175 Sabemos que a Língua Portuguesa organiza as palavras em categorias gramaticais. Na Libras, o processo ocorre de forma semelhante em relação aos sinais, e eles são organizados em classes gramaticais, como pronomes, advérbios, substantivos, verbos, adjetivos, numerais e outros. Em Libras, os pronomes não possuem marca para gênero. Tanto para o femi- nino como para o masculino, o sinal é o mesmo e está relacionado às pessoas do discurso e não à coisa possuída, como acontece na língua portuguesa. No singular, são representados com a mesma configuração da mão, mudando apenas a sua orientação. Na Libras, são frequentemente usados os pronomes pessoais (eu, você, ele/ela, nós, vocês e eles), os pronomes demonstrativos (esse, essa) e os pronomes possessivos (meu, sua, dele). Os pronomes são divididos em: ■ Pessoais. Eu Ele(a) UNICESUMAR UNIDADE 4 176 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanhos escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mulher é uma intérprete e está sinalizando, em Libras, as palavras EU, ELE ou ELA, VOCÊ, NÓS, ELES ou ELAS. Na primeira foto, a intérprete sinaliza o sinal de EU, apontando e encostando o dedo indicador da mão direita no tórax. Na segunda foto, a intérprete sinaliza a palavra ELE ou ELA, nesse caso, seu olhar se direciona para a esquerda, seguindo a direção da mão e apontando para o campo neutro. Em seguida, na terceira foto, a intérprete sinaliza a palavra VOCÊ. Aqui, a intérprete aponta o indicador na frente do seu corpo e o olhar também segue a direção do dedo. Na próxima sequência, há duas fotos para formar a sinalização da palavra NÓS. Nessas fotos, o sinal é executado com a mão direita, com o dedo indicador apontado para cima, sentido da cabeça, encostando o dedo no ombro, faz uma volta, um movimento até chegar do outro lado do ombro. Na última sequência, a intérprete sinaliza a palavra ELES ou ELAS, com dois dedos indicando que são duas pessoas. Figura 14 – Exemplo de pronomes pessoais / Fonte: a autora. Nós Eles(as) Você 177 Meu Dele(a) Seu/Teu ■ Possessivos. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mulher é uma intérprete e está sinalizando, em Libras, as palavras MEU, DELE ou DELA e SEU ou TEU. Na primeira foto, a intérprete sinaliza o sinal de MEU, com a mão direita aberta e os dedos juntos, tocando em seu tórax. Na segunda foto, a intérprete aponta com o indicador e olha na mesma direção da esquerda, e a sua mão ocupa o espaço neutro. Na terceira foto, a intérprete sinaliza SEU ou TEU, com o indicador apontado no espaço neutro para indicar que algo pertence à pessoa apontada. Figura 15 – Exemplo de pronomes possessivos Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 178 Esse(a) Quem? Aquele(a) Qual? ■ Interrogativos. Descrição da Imagem: nas fotos acima, há uma mulher de cabelos castanhos bem longos e amarrados. Ela veste uma blusa preta e sinaliza, em Libras, dois pronomes demonstrativos ESSE ou ESSA e AQUELE ou AQUELA. Em ambas fotos, a intérprete aponta a mão direita, ora para lado direito, ora para o lado esquerdo, ocupando o espaço neutro como se estivesse mostrando algum objeto. Figura 16 – Exemplo de pronomes demonstrativos / Fonte: a autora. ■ Demonstrativos. 179 Ninguém Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a mulher sinaliza QUEM, usando a mão direita com os dedos indicador e polegar juntos no espaço neutro, e intensifica a função do sinal com expressão facial marcante. Na segunda foto, a intérprete sinaliza o sinal de QUAL, nesse caso, utilizando-se do espaço neutro e com as duas mãos posicionadas com os dedos indicadores apontados para cima, sendo que a mão direita se encontra um pouco abaixo em relação à mão esquerda, pois representa o movimento do sinal. Nas duas últimas fotos, a intérprete sinaliza com o dedo indicador dobrado debaixo do queijo, com movimento direcionado para frente, chegando ao espaço neutro, bem em frente ao queixo. Isso é possível ser percebido na última foto, que marca o movimento. Nessas fotos, a intérprete faz uso das expressões faciais para dar maior sentido à palavra sinalizada, por isso, sua face está mais marcada pelas sobrancelhas e boca, criando uma mensagem de dúvida. Figura 17 – Exemplo de pronomes indefinidos / Fonte: a autora. ■ Indefinidos. Os adjetivos em Libras não recebem marcação de número (singular ou plural), não recebem marcação de gênero (masculino ou feminino), os adjetivos são sinais que formam uma classe específica e, na Libras, estão sempre na forma neutra. Na sinalização, podemos utilizar os classificadores que servem para a descrição, que podem seguir com as expressões faciais (intensificação que é realizada por meio de sinais não manuais). Os classificadores e as expressões faciais são imprescin- díveis na sinalização, ao se atribuir uma qualidade a determinado objeto. UNICESUMAR UNIDADE 4 180 Segundo Godoi (2021, p. 447): “ Em relação à tipologia linguística, as línguas de sinais se enquadram na perspectiva das línguas analíticas caracterizadas por terem maior parte dos morfemas livres aos quais se consideram lexemas com significado próprio. Essa classificação das línguas naturais em tipo- logias se baseia na comparação estrutural entre línguas. Enquanto línguas analíticas, as línguas de sinais tendem a depender bastante do contexto e de considerações pragmáticaspara se interpretar a informação da oração, já que raramente sua estrutura aplica meca- nismos, como a concordância e a referencialidade entre diferentes partes da oração como nas línguas sintéticas. Segundo Godoi (2021, p. 447), “[...] nas línguas naturais, chama-se atributo o adjetivo ou expressão equivalente que se associa a um nome ou expressão nominal para indicar uma característica ou qualidade do ser ou objeto desig- nado por esse nome”. Para você entender, proponho que pense na frase: — Vi muitas bolinhas espalhadas pela sala. Para sinalizar essa frase, daremos mais sentido quando sinalizamos e utilizamos os classificadores junto à expressão facial. Nesse caso, a comunicação será mais intensa, porém com detalhes, para que o surdo possa compreender que na sala há várias bolinhas, se elas são pequenas ou grandes, se são coloridas. Isso representa um tipo de classificação porque é uma adjetivação descritiva. No exemplo que você acabou de conhecer, o adjetivo tem como função a de modificar o substantivo, atribuindo-lhe um estado, qualidade ou carac- terística. Isso também pode ocorrer quando nos referimos aos seres. Godoi (2021) explica que, nesse caso, a distinção feita entre o adjetivo e o substantivo não é semântica (de significado). Para a autora na Libras, os adjetivos aconte- cem em forma de locuções adjetivas e estão ligadas e dependentes do contexto, que expressam atributos ou classes dos seres, coisas e entidades, restringindo, porém, a referência das expressões integradas por elas. 181 Vejam que nas línguas de sinais, há pouca distinção entre substantivo e adjetivo. Isso, porque, em muitas situações, a realização do adjetivo acontece em forma de atributos e modo muito específico, considerando a tendência de as línguas de sinais, línguas mais analíticas, dependerem bastante do contexto e de considera- ções pragmáticas para interpretar a informação da oração. Na Libras, o adjetivo sempre surge ligado a um substantivo (GODOI, 2021). Vamos aprender alguns sinais de adjetivos em Libras? Não tenha vergonha e experimente! Tente! Quadro 5 – Construção de frases / Fonte: a autora. Em Português Em Libras Aquela menina alta caiu. Substantivo/adjetivo/verbo CAIU MENINA ALTA Verbo/substantivo/adjetivo O bolo grande sumiu. Substantivo/adjetivo/verbo SUMIU BOLO GRANDE Verbo/substantivo/adjetivo Exemplo de frases: Bonito(a) UNICESUMAR UNIDADE 4 182 Feio Longe Pequeno Grande Certo/Honesto Descrição da Imagem: na primeira sequência de três fotos, a intérprete sinaliza BONITO ou BONITA, assim, na primeira foto, ela encontra-se com a mão direita ao lado do rosto e com a palma da mão virada para a lateral da face; na segunda, sua mão está com os dedos bem abertos e está em frente a seu rosto; e na terceira imagem, ela está com a mão fechada em configuração da letra A, do lado esquerdo bem próximo ao queixo. Na segunda sequência de fotos, a mulher sinaliza, na primeira foto, a palavra FEIO, com a mão direita encostada no tórax em configuração em L; na segunda foto, a mulher sinaliza PEQUENO com suas mãos fechadas, os indicadores apontam para frente e as mãos, próximas uma da outra, tocam-se pela parte dos dedos fechados, ocupando o espaço neutro na frente do seu abdômen; e na última foto da sequência, a intérprete está sinalizando GRANDE, com suas mãos fechadas e na mesma configuração da foto anterior; as mãos se encontram afastadas, uma do lado direito e outra do lado esquerdo .Na última sequência de fotos, a intérprete sinaliza as palavras LONGE e CERTO. Assim, para sinalizar a palavra LONGE, ela utiliza as duas mãos e o espaço neutro, porém as mãos encontram-se em posições diferentes, sendo que a mão direta está acima da altura dos ombros, apenas com os dedos indicador e polegar unidos, formando a configuração de CERTO, e os demais dedos estão levantados. Enquanto a mão esquerda está mantendo a configuração da mão direta, e encontra-se na altura da cintura. Para completar a sinalização, há expressão facial marcante. Nas duas últimas fotos, ela sinaliza o sinal de CERTO, com os dedos indicador e polegar unidos, a mão direita está acima da altura dos ombros, apenas com os dedos indicador e polegar unidos na altura da cintura e os demais dedos apontados para frente do corpo da sinalizante. Figura 18 – Sinais de adjetivos em Libras / Fonte: a autora. 183 Errado Gordo(a) Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete está com as mãos ocupando o espaço neutro, sendo que a mão direita está em configuração de mão da letra P, e a mão esquerda está um pouco abaixo, totalmente aberta, com a palma da mão virada para cima. Esses posicionamentos das mãos indicam o início do sinal da palavra ERRADO, enquanto na segunda foto, a mão, em configuração de P, toca a mão esquerda, bem próximo do punho, finalizando o movimento do sinal. Figura 19 – Sinalização de errado / Fonte: a autora. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de duas fotos, a intérprete sinaliza a palavra GORDO ou GORDA. Com a mão direita em configuração de Y bem próximo do punho do braço esquerdo, que se encontra com as mãos fechadas, e com expressões faciais bem marcantes pelas bochechas infladas. Na segunda foto, com a mão em Y e próxima do cotovelo, a intérprete mantém a mesma expressão facial e finaliza o sinal. Figura 20 – Sinalização de gordo ou gorda / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 184 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete encontra-se com a mão direita em configuração de letra I um pouco abaixo do seu queixo, com uma expressão facial marcante. Suas boche- chas estão para dentro. Na sequência, a intérprete sinaliza a palavra NERVOSO ou NERVOSA. Com a mão direita em configuração de X, ela toca o outro braço de apoio, bem próximo do punho. Sua expressão facial é marcante, com sobrancelhas franzidas, marcando a face com um sentimento irado. Uma postura encolhida e uma expressão facial tensa podem sugerir insegurança ou nervosismo. Figura 21 – Sinalização de magro ou magra e de nervoso ou nervosa / Fonte: a autora. Magro(a) Nervoso(a) 185 Figura 22 – Sinalização de ruim / Fonte: a autora. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Para sinalizar a palavra RUIM, a intérprete está com a mão direita debaixo do queixo, com a palma da mão virada para baixo e parte da mão ocupada no espaço neutro. Na segunda foto, sua expressão facial é intensificada pelo olhar, indicando que algo não está bom ou é ruim, enquanto os dedos estão abertos, em posições diferentes, alguns se movimentam para cima e outros, para baixo. Ruim Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, ela está com a mão direita, ocupando o espaço neutro, um pouco abaixo do queixo e em configuração da letra S. Na segunda foto, a mão direita toca o queixo, indicando o movimento que acontece de baixo para cima para execução da palavra VELHO. Figura 23 – Sinalização de velho / Fonte: a autora. Velho UNICESUMAR UNIDADE 4 186 Figura 25 – Sinalização de sujo / Fonte: a autora. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de fotos, a intérprete encontra-se com a mão direi- ta, bem próxima do queixo, com configuração de mão da letra O. Na segunda foto, a mão encontra-se, no espaço neutro, totalmente aberta, finalizando o movimento do sinal para a palavra BOM ou BOA. Figura 24 – Sinalização de bom / Fonte: a autora. Bom Sujo Descriçãoda Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de duas fotos, a intérprete sinaliza a palavra SUJO, com apenas o dedo indicador levantado e demais dedos fechados. A mulher toca o indicador no lado direito do pescoço e sua mão encontra-se com os dedos virados para frente. Na segunda foto, é possível perceber que houve um movimento, pois a mão está virada, mantendo o dedo indicador no pescoço. 187 Rápido Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos cas- tanhos e cabelos amarrados. Na sequência de duas fotos, a intérprete encontra-se com a mão direita ocupando o espaço neutro, próximo da altura do ombro direito com a mão em configuração da letra C. Na segunda foto, a mão está mantendo a mesma configuração e encontra-se do lado esquerdo do corpo, perto do ombro. Figura 26 – Sinalização de rápido / Fonte: a autora. Claro Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de fotos, a intérprete sinaliza a palavra CLARO. Nesse caso, ela encontra-se com as duas mãos no espaço neutro, próximo do rosto, sendo que as mãos, em configuração da letra A, estão uma de cada lado da face. Na segunda foto, as mãos estão abertas com as palmas viradas para fora e dedos afastados uns dos outros. Figura 27 – Sinalização de claro / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 188 Quente Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de fotos, a intérprete encontra-se com a mão direita bem próxima do queixo, com configuração de mão da letra C, ocupando o espaço neutro. Na segunda foto, a mão encontra-se, no espaço neutro, em configuração em C, do lado oposto, finalizando o movimento do sinal para a palavra QUENTE. Nesse caso, sua expressão é intensificada com marcação no lábio. Figura 28 – Sinalização de quente / Fonte: a autora. Gente Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Nessa sequência de fotos, a intérprete encontra-se com a mão di- reita bem próxima do lado direito da testa, com configuração de mão do algarismo 5. Na segunda foto, ela encontra-se, no espaço neutro, permanecendo com a mesma configuração, com a mão mais afastada da testa, finalizando o movimento do sinal no espaço neutro. Figura 29 – Sinalização de gente / Fonte: a autora. 189 Fraco Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete encontra-se com a mão direita bem próxima do ombro, ocupando o espaço neutro, com os dedos juntos pelas pontas e virados para cima. Na segunda foto, a mão encontra-se no espaço neutro, obedecendo a mesma configuração, porém os dedos estão direcionados para baixo e ao lado esquerdo do corpo na altura do ombro. Figura 30 – Sinalização de fraco / Fonte: a autora. Estranho/Esquisito Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete encontra-se com a mão direita bem próxima do ombro e fechada. Na segunda foto, a mão encontra-se no espaço neutro, com apenas o indicador da mão levantado e a palma direcionada para seu rosto, finalizando o movimento do sinal para a palavra ESTRANHO. Figura 31 – Sinalização de estranho ou esquisito / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 190 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A intérprete sinaliza ÓTIMO, na primeira foto da sequência de duas imagens, com a mão em configuração de OK. A mão direita encontra-se no espaço neutro do lado direito, próximo do ombro. Na segunda foto, a mesma mão, mantendo a configuração, ocupa o espaço neutro do lado esquerdo, na altura do ombro e a expressão marcante demonstra contentamento. Figura 32 – Sinalização de ótimo / Fonte: a autora. Ótimo Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete encontra-se com a mão direita bem próxima do queixo, com o polegar levantado. Na segunda foto, a mão encontra-se, no espaço neutro, man- tendo a mesma configuração, porém o polegar está direcionado para baixo e a expressão facial, marcante pelas sobrancelhas e boca, finaliza o movimento do sinal para a palavra PÉSSIMO. Figura 33 – Sinalização de péssimo / Fonte: a autora. Péssimo 191 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-es- curos, olhos castanhos e cabelos amarrados. Há uma sequência de duas fotos. Na primeira delas, a intérprete encontra-se com a mão direita tocando o nariz com dedo indicador. Na segunda foto, a mão encontra-se, no espaço neutro, totalmente aberta, finalizando o movimento do sinal para a palavra METIDO ou METIDA, EXIBIDO ou EXIBIDA. Figura 34 – Sinalização de metido ou exibido / Fonte: a autora. Metido(a)/Exibido(a) Descrição da Imagem: a sequência de duas fotos apresenta uma mulher de cabelos longos e castanho-escu- ros. Na primeira foto, ela sinaliza a palavra FINGIDO ou FINGIDA, com a mão direita acima da mão esquerda, que é apoio para execução do sinal. Na segunda foto, ela sinaliza a palavra AMARGO, com expressão facial marcada pelos olhos e sobrancelhas franzidas, e com o dedo indicador, que toca o canto da boca. Figura 35 – Sinalização de fingido ou fingida e amargo / Fonte: a autora. Fingido(a) Amargo UNICESUMAR UNIDADE 4 192 Engraçado Descrição da Imagem: a sequência de fotos mostra uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros, que veste uma blusa preta. A intérprete sinaliza a palavra ENGRAÇADO. Nesse caso, ela está com a mão direita próxima ao lado direito do queijo, porém ocupando o espaço neutro, no qual os dedos indicador e polegar se encontram, fazendo um círculo. Na segunda foto, a intérprete está com a mão em configuração da letra L, no espaço neutro abaixo da altura do queixo e sorrindo. Figura 36 – Sinalização de engraçado / Fonte: a autora. Descrição da Imagem: a sequência de fotos mostra uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros, vestida com uma blusa preta. Com a mão direita em X, encostando na testa, ela sinaliza com uma expres- são facial marcante pelas sobrancelhas, que se encontram franzidas. Na segunda foto, a mão está do lado oposto da testa, finalizando o sinal de DIFÍCIL. Figura 37 – Sinalização de difícil / Fonte: a autora. Difícil 193 Descrição da Imagem: na sequência de fotos, há uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros, que veste uma blusa preta. Nessa sequência de duas fotos, a intérprete sinaliza CANSADO ou CANSADA. Na pri- meira foto, suas mãos estão com as palmas viradas para cima, sentido à cabeça, posicionadas nos dois lados do corpo, um pouco abaixo dos ombros. Na segunda foto, as mãos se encontram com a mesma configura- ção, um pouco mais abaixo, e a expressão facial, marcada pelos olhos e pela boca, demonstra cansaço físico. Figura 38 – Sinalização de cansado ou cansada / Fonte: a autora. Cansado(a) Descrição da Imagem: na sequência de duas fotos, há uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros. Na primeira foto, ela sinaliza a palavra ABATIDO ou ABATIDA, com a mão direita, que está tocando a face direita, bem próxima da bochecha e expressão facial, indicando cansaço e tristeza. Na segunda foto, para a sinalização de TÍMIDO ou TÍMIDA, a intérprete encontra-se com a mão direita em configuração do numeral cinco, encostada na bochecha, com expressão facial e corporal marcante, como se estivesse envergonhada, e seus ombros estão projetados para cima. Figura 39– Sinalização de abatido ou abatida e tímido ou tímida / Fonte: a autora. Abatido(a) Tímido(a) UNICESUMAR UNIDADE 4 194 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros e amar- rados, e olhos castanhos. Na primeira foto, a intérprete encontra-se com a postura ereta e uma expressão facial relaxada, indicando confiança e tranquilidade, tocando as palmas das mãos no seu tórax, um pouco abaixo dos om- bros. Na segunda foto, as mãos estão um pouco abaixo, porém encontram-se na mesma posição e tocam o corpo. Figura 40 – Sinalização de calmo ou calma / Fonte: a autora. Calmo(a) Descrição da Imagem: a foto apresenta uma mulher morena, de olhos castanho-escuros e blusa preta. A intérprete sinaliza BRAVO ou BRAVA. Na imagem, sua mão direita está aberta e as pontas dos dedos tocam seu tórax. Para esse sinal, sua expressão facial é marcante e está indicada pelas sobrancelhas franzidas. Figura 41 – Sinalização de bravo ou brava / Fonte: a autora. Bravo(a) 195 Chato(a) Descrição da Imagem: na sequência de fotos, uma mulher morena, de olhos castanho-escuros e blusa preta, sinaliza o adjetivo CHATO ou CHATA em Libras. Na primeira foto, sua mão direita está aberta e em cima da mão esquerda, e ambas mãos ocupam o espaço neutro. Na segunda foto, sua mão está totalmente aberta, porém com a palma da mão direita voltada para cima, ocupando o espaço neutro. Em ambas fotos, a expressão é intensa, indicando um certo incômodo. Figura 42 – Sinalização de chato ou chata / Fonte: a autora. Alegre/Contente Descrição da Imagem: há uma sequência de fotos representadas por uma mulher morena, de olhos casta- nho-escuros, que veste uma blusa preta. A intérprete sinaliza ALEGRE, na primeira sequência de duas fotos, com as mãos abertas tocando pelas palmas em seu tórax. Na segunda foto, as suas mãos estão totalmente abertas e encontram-se no espaço neutro. Ambas as mãos estão com as palmas viradas para cima, na mesma direção e simetria. Sua expressão é marcada pelo sorriso. Figura 43 – Sinalização de alegre ou contente / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 196 Legal Magro(a) Descrição da Imagem: há uma sequência de fotos representadas por uma mulher morena, de olhos casta- nho-escuros, que veste uma blusa preta. Sorrindo, a intérprete posiciona a mão direita em um espaço neutro, na altura da bochecha com dedos apontados para cima, com os dedos do indicador ao mínimo afastados e o polegar encostado na palma. Na segunda foto, a mão direita está fechada, virada para a sinalizante, na altura dos ombros, apenas com o dedo mínimo apontado para cima; seus lábios formam um bico e as bochechas estão comprimidas. Na terceira foto, com expressão facial marcante e configuração de mão com palma e dedos unidos, a intérprete posiciona a mão direita, que está ocupando o espaço neutro, na altura da bochecha com dedos apontados para cima em configuração da letra “B”. Na quarta foto, a mesma mão ocupa o espaço neutro, porém um pouco abaixo e do lado contrário, ou seja, está voltada com a palma para baixo, mantendo a posição e configuração de mão em “B”. Nas fotos, a sinalização é marcada pela expressão facial. Figura 44 – Adjetivos em Libras / Fonte: a autora. Mau/Má 197 Os substantivos na Libras Assim, compreendemos pelas palavras de Azeredo (2008) como os lexemas se empregam tipicamente para significar atributos ou propriedades dos seres e coi- sas nomeadas pelos substantivos. Quadros e Karnopp (2004, p. 98) sinalizam que os sinais da classe de substantivos derivaram dos sinais da classe de ver- bos. Assim, os autores sinalizam que essa diferença ocorre com a “mudança no tipo de movimento (M), isto é, enquanto nos substantivos o M, quando o sinal é produzido, é encurtado e repetido, nos verbos, ele é mais longo e não repetido”. No substantivo, incorporamos o grau de tamanho por meio das expressões não manuais e a marcação do plural acontece pela repetição do sinal. Para sinalizar o substantivo BORRACHA, usamos a mesma configuração de mão que para o verbo APAGAR. No caso, decorre uma mudança no movimento, ou seja, durante a articulação do sinal. Para sinalizar BORRACHA, a articulação do movimento ocorre de duas a três vezes. O movimento é retilíneo, repetin- do por duas ou três vezes. Enquanto na articulação (movimento do sinal) de APAGAR, intensifica-se o mesmo movimento (de vai e vem), porém, nesse caso, utilizamos de expressão facial. Vejamos o exemplo: Borracha ou apagar Descrição da Imagem: na foto, há uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros. Ela é intér- prete de Libras e sinaliza as pa- lavras BORRACHA e APAGAR, que têm a mesma forma de execução. Nesse caso, a intérprete está com a palma da mão esquerda virada para cima e com a mão direita se apoia sobre a mão, como se esti- vesse esfregando de um lado para outro, apagando algo em um ca- derno ou folha de papel. Figura 45 – Exemplo de sinalização de substantivo / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 198 Conheça alguns sinais de substantivos em Libra. Substantivos de contexto escolares: Escola Computador 199 Descrição da Imagem: nas sequências de fotos, há uma mulher morena, de olhos castanhos, cabelos longos, que está usando uma blusa preta. Na primeira linha, para ESCOLA, ela sinaliza casa, com as duas mãos no espaço neutro, com as duas mãos unidas pelas pontas dos dedos, formando um triângulo, como um telhado de casa, seguida pela doto que sinaliza a estudar, assim, as mãos se encontram uma sobreposta à outra, palma e dorso das mãos se encontram, ocupando o espaço neutro. Na segunda linha, a intérprete sinaliza COMPUTADOR, nesse caso, com as duas mãos posicionadas no espaço neutro e configuração de mão em cinco simetricamente, ou seja, obedecendo a mesma altura no espaço e a mesma configuração em ambas as mãos, com as palmas viradas para frente da sinalizante. Na terceira linha, a mulher sinaliza a palavra CADERNO, com as duas mãos situadas no espaço neutro. A intérprete se apresenta com a palma da mão esquerda virada para cima, enquanto a mão direita encosta a mão esquerda em configuração de L. Na quarta linha, a mulher sinaliza LÁPIS. Nesse caso, a mão direita está próxima da boca, fechada, apenas com os dedos indicador e polegar unidos. Na última foto, a intérprete sinaliza CANETA, com a mão direita em configuração de Y; utilizando-se do espaço neutro, a mão está com os dedos fechados e virada para o seu corpo. Figura 46 – Sinalização de substantivos usados no contexto escolar / Fonte: a autora. Caderno Lápis Caneta UNICESUMAR UNIDADE 4 200 Fichário Papel Descrição da Imagem: na sequência de fotos, há uma mulher morena, de olhos castanhos, cabelos longos, que está usando uma blusa preta. Trata-se de uma intérprete que sinaliza FICHÁRIO. Na primeira foto, as mãos ocupam o espaço neutro, o braço direito está posicionado em frente ao braço esquerdo, que está com a mão voltada para cima. Assim, a intérprete encosta o dorso da mão direita na palma da mão esquerda. Na segunda foto, a mão direita encontra-se abaixo entre o cotovelo e o punho do braço. Descrição da Imagem: na sequência de fotos, há uma mulher morena, de olhos castanhos e cabelos longos, que está usando uma blusa preta. Nas fotos, a intérprete sinaliza PAPEL. Na primeira imagem, suas mãos estão unidas uma à outra, sendo que a palma está virada para cima e a outra mão está afastada em configuração de L. Na foto sequencial, a intérprete encosta a mão direita em configuração de L, na palma da mão esquerda, utilizando o espaço neutro. Figura 47 – Sinalização de fichário / Fonte: a autora. Figura 48 – Sinalização de papel / Fonte: a autora. 201 Borracha/Apagar Lápis de cor Descrição da Imagem: na foto, há uma mulher de cabelos longos e castanho-escuros. Ela é intérprete de Libras e sinaliza a palavra BORRACHA e APAGAR, que possuem a mesma forma de execução. Nesse caso, a intérprete está com a palma da mão esquerda virada para cima e com a mão direitase apoia sobre a mão, como se estivesse esfregando de um lado para outro, apagando algo em um caderno ou folha de papel. Na foto sequencial, a intérprete sinaliza APONTADOR, portanto, ela está com as mãos no espaço neutro, com a mão es- querda fechada e a mão direita posicionada na frente da mão esquerda, apenas com dedo indicador levantado. Descrição da Imagem: na primeira foto, a mulher sinaliza LÁPIS. Nesse caso, a mão direita está próxima da boca, fechada, apenas com os dedos indicador e polegar unidos. Na segunda foto, a intérprete está com a mão direita aberta em frente a boca, porém não toca o rosto. Figura 49 – Sinalização de borracha ou apagar e apontador / Fonte: a autora. Figura 50 – Sinalização de lápis de cor / Fonte: a autora. Apontador UNICESUMAR UNIDADE 4 202 Dicionário Descrição da Imagem: na foto, a mulher sinaliza DICIONÁRIO. Nesse caso, a mão direita, em configuração da letra D, está em cima da mão esquerda que se encontra fechada e serve de apoio para a realização do sinal. Descrição da Imagem: uma sequência de fotos mostra uma mulher morena clara de cabelos longos, sina- lizando a palavra LIVRO. Na primeira foto, as palmas de suas mãos estão unidas uma à outra. Na sequência, a intérprete abre as mãos, porém as partes inferiores das mãos mantêm-se juntas e as partes superiores se abrem, criando o sinal de um livro aberto. Figura 51 – Sinalização de dicionário / Fonte: a autora. Figura 52 – Substantivo de contexto escolar / Fonte: a autora. Livro 203 Substantivos de contexto familiar: Descrição da Imagem: a foto mostra uma mulher de cabe- los castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarra- dos. As mãos encontram-se na altura da cintura, com de- dos indicadores apontados no espaço neutro. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, sua mão direita ocupa o espaço neutro, um pouco abaixo do queixo e em configuração da letra S. Na segunda foto, a mão direita toca o queixo, indicando o movimento, que acontece de baixo para cima, para execução das palavras VOVÓ ou VOVÔ. Figura 53 – Sinalização de primo ou prima / Fonte: a autora. Figura 54 – Sinalização de vovó ou vovô / Fonte: a autora. Primo(a) Vovó/Vovô UNICESUMAR UNIDADE 4 204 Descrição da Imagem: a foto acima mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos cas- tanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a mão direita, ocupando espaço neutro, um pouco abaixo do queixo e em configuração do número 2, toca o queixo, indicando o movimento, que acontece de baixo para cima para execução das palavras BISAVÓ ou BISAVÔ. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, as mãos da intérprete estão posicionadas uma sobre a outra, como se ela estivesse segurando um bebê no colo. Assim, a intérprete sinaliza a palavra BEBÊ. Na segunda foto, quanto à sinalização de NETO ou NETA, com a mão direita, ocupando o espaço neutro, um pouco abaixo do queixo e em configuração em N, a mão direita toca o queixo, indicando o movimento, que acontece de baixo para cima para execução das palavras NETO ou NETA. Figura 55 – Sinalização de bisavó ou bisavô Fonte: a autora. Figura 56 – Sinalização de bebê e neto ou neta / Fonte: a autora. Bisavó/Bisavô Bebê Neto(a) 205 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A intérprete encontra-se com as mãos posicionadas na altura da sua cintura, ocupando o espaço neutro. Na primeira foto, as mãos estão com as palmas viradas para cima e dedos unidos também seguem a mesma direção. Na segunda foto, as mãos estão mais fechadas, demons- trando o movimento realizado pelos dedos, que, nesse caso, estão voltados para a sinalizante. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. As mãos estão abertas e próximas. Tocando pelos dedos, as mãos ocupam o espaço neutro, sendo que as palmas estão viradas uma para a outra. Na segunda foto, mantendo a mesma configuração de mão, elas estão mais afastadas. Figura 57 – Sinalização de jovem / Fonte: a autora. Figura 58 – Sinalização de idoso ou idosa / Fonte: a autora. Jovem Idoso(a) UNICESUMAR UNIDADE 4 206 Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mão direita, em configuração de G, está localizada no lado direito, ocupando o espaço neutro, na altura do ombro. Na segunda foto, a intérprete mantém a mesma configuração de mão, porém a mão encontra-se do lado esquerdo, indicando o movimento para execução do sinal de GENRO. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mão direita, em configuração de N, está localizada no lado direito, ocupan- do o espaço neutro, na altura do ombro. Na segunda foto, a intérprete mantém a mesma configuração de mão, porém a mão encontra-se do lado esquerdo, indicando o movimento para execução do sinal de NORA. Figura 59 – Sinalização de genro / Fonte: a autora. Figura 60 – Sinalização de nora / Fonte: a autora. Genro Nora 207 Mãe Casado(a)/Esposo(a) Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A mão direita, em configuração de OK, está localizada no lado direito do rosto, tocando a bochecha. Na segunda foto, a intérprete está com a mão em configuração de S, próximo da boca, como se estivesse beijando o dorso da mão, indicando o movimento para execução do sinal de MÃE. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A intérprete sinaliza CASADO ou CASADA, na primeira foto, com as mãos em configuração em C, ocupando o espaço neutro, com as palmas viradas uma à outra, como se fossem bater as palmas, porém, afastadas. Na segunda foto, as mãos estão unidas uma à outra. Figura 61 – Sinalização de mãe / Fonte: a autora. Figura 62 – Sinalização de casado ou casada / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 208 Filho(a) Gêmeos Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A intérprete, na primeira foto, encontra-se com a mão direita voltada para o corpo e encostando, pelos dedos, o tórax. Na segunda foto, a mão está afastada do corpo e, com dedos fechados, mantém a mesma posição dos dedos. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete está com as mãos, em configuração em G, posicionadas na altura do tórax com as pontas dos dedos voltados para baixo. Na segunda foto, as mãos estão mais abaixo e com as pontas dos dedos apontadas para frente do corpo da sinalizante. Figura 63 – Sinalização de filho ou filha / Fonte: a autora. Figura 64 – Sinalização de gêmeos / Fonte: a autora. 209 Padrasto Madrasta Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete está com a mão direita em configuração de X, posicionado abaixo do nariz, tocando o espaço entre nariz e boca, executando o sinal de PAI. Na segunda foto, ela sinaliza o sinal do número 2, no espaço neutro em frente ao queixo, e, assim, ela sinaliza PADRASTO. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a mão direita, em configuração de OK, está loca- lizada no lado direito do rosto, tocando a bochecha. Na segunda foto, a intérpreteestá com a mão, em configuração de S, próxima da boca, como se estivesse beijando o dorso da mão, indicando o movimento para execução do sinal de MÃE. Na terceira foto, sinaliza o sinal do número 2, no espaço neutro em frente ao queixo. Assim, a intérprete sinaliza MADRASTA. Figura 65 – Sinalização de padrasto / Fonte: a autora. Figura 66 – Sinalização de madrasta / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 210 Noivo(a) Sobrinho(a) Descrição da Imagem: a foto, aci- ma, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na foto, a in- térprete sinaliza NOIVO ou NOIVA, com as mãos em frente ao corpo, no espaço neutro, e paralelas uma à ou- tra, mantendo os dedos usados para as alianças abaixados e os demais, erguidos, sendo que o dedo direito está abaixo do dedo esquerdo. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Na primeira foto, a intérprete está com os dedos e a mão direita tocando a testa, um pouco acima da sobrancelha, com o dorso da mão virada para fora. Na segunda foto, a mão mantém a mesma configuração, porém, encontra-se em cima da cabeça, indicando o mo- vimento realizado do sinal. Figura 67 – Sinalização de noivo ou noiva / Fonte: a autora. Figura 68 – Sinalização de sobrinho ou sobrinha / Fonte: a autora. 211 Tio(a) Pai Descrição da Imagem: a foto, aci- ma, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. A intérprete sinaliza TIO ou TIA. Assim, a mão direita, em configuração em C, en- costa na frente da testa, acima da sobrancelha. Descrição da Imagem: a sequência das fotos, acima, mostra uma mulher de cabelos castanho-escuros, olhos castanhos e cabelos amarrados. Ela sinaliza PAI, na primeira foto, com a mão direita, segurando o queixo. Na segunda foto, ela faz o sinal de BÊNÇÃO, que se apresenta com a mão direita em configuração de S, beijando o dorso da mão. Figura 69 – Sinalização de tio ou tia Fonte: a autora. Figura 70 – Substantivo de contexto familiar / Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 4 212 Você compreende a Libras como uma língua constituída de elementos gramaticais com- plexos? Ou você encontra subsídios científicos que comprovam que a Libras é uma língua e possui todas as características gramaticais como quaisquer outras línguas? Essas ques- tões vêm ao encontro das primeiras perguntas apresentadas no início desta unidade. Libras é uma língua complexa e abstrata, portanto, é um idioma completo! PENSANDO JUNTOS Caros alunos! Tenho um convite especial a vocês, acessem o podcast para complementar e criar uma conexão com o universo da Libras. Você terá a oportunidade de aprofundar seus estudos, conhecendo um pouco mais sobre o campo de atuação de um intérprete da Unicesumar. Eu posso garantir que será uma um experiência importante no seu processo de conhecimento. NOVAS DESCOBERTAS Título: A Família Bélier Ano: 2014 Paula (Louane Emera) é uma adolescente francesa que enfrenta to- das as questões comuns de sua idade: o primeiro amor, os proble- mas na escola e as brigas com os pais. Sua família, porém, tem algo diferente: seu pai (François Damiens), sua mãe (Karin Viard) e o irmão são surdos. É Paula quem administra a fazenda familiar, e que traduz a língua de sinais nas conversas com os vizinhos. Um dia, ela descobre ter o talento para o canto, podendo integrar uma prestigiosa escola em Paris. Mas como abandonar os pais e o irmão? https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/14480 213 Este estudo mostrou que, durante um longo período, a educação de surdos foi marcada por questões polêmicas que, especificamente, diziam respeito às filosofias de ensino adotadas para o desenvolvimento dos alunos surdos. Tor- nou-se necessário conhecer como foi o processo de conquista desses direitos e entender as demandas educacionais existentes nos dias de hoje. Como visto, com o advento da inclusão, o surdo passou a ser visto como ser integrante de uma comunidade escolar que, assim como qualquer outro aluno, tem suas es- pecificidades e demandas que precisam ser atendidas. Faz-se necessário esclarecer que a atuação do intérprete de Libras, nos di- ferentes níveis de ensino, assumirá diferentes estratégias e sua atuação, ainda, é muito pensada e discutida no ambiente educacional, na tentativa de atender as necessidades de cada aluno e de cada estrutura escolar. Considerando o aborda- do, anteriormente, sobre a educação em Libras e os processos pedagógicos que envolvem a surdez, percebe-se também no decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, a afirmação do bilinguismo como orientação pedagógica que determina uma série de procedimentos, estratégias e recursos a que o surdo tem direito. Sendo assim, a questão linguística dos surdos ficou em evidência somente com a promulgação da lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que reconheceu a Libras como meio de comunicação dos indivíduos com surdez, junto às demais leis que foram surgindo. O surdo, finalmente, teve sua língua reconhecida e o direito ao intérprete de Libras, mas ainda faltava conhecer quem era esse profissional que seria a ponte linguística entre os ouvintes e os surdos. No entanto, é necessário afir- mar que a parceria entre os diversos profissionais da escola é um fator que colabora para os acertos e para um bom resultado no desenvolvimento do surdo. As respostas não estão dadas, a educação de surdos não é algo pronto e acabado. Ela está em construção e esperamos que este estudo possa colaborar para outras reflexões que possam embasar práticas e empreendimentos de sucesso na educação de surdos. UNICESUMAR 214 1. Durante muito tempo, as línguas de sinais eram consideradas línguas ágrafas, isto é, eram línguas apenas faladas, sem a possibilidade de serem representadas graficamen- te de maneira direta. Atualmente, isso mudou, com a criação de um sistema de escrita de sinais, conhecido por SignWriting. Nesse contexto, avalie as afirmações a seguir: I - A ideia de representar graficamente as línguas de sinais teve origem num sistema para escrever passos de dança. II - A primeira língua de sinais a ser representada pelo SignWriting foi a chinesa. III - O SignWriting pode registrar qualquer língua de sinais do mundo sem passar pela tradução da língua falada. IV - Não existe, ainda, um aplicativo para essa escrita para ser utilizado em computadores. Está correto o que se afirma em: a) III e IV, apenas. b) I, III e IV, apenas. c) I, II e IV, apenas. d) I, II e III, apenas. e) I, II, III e IV. 2. Os parâmetros da Libras não possuem significado isoladamente, apenas quando se compõem é que passam a constituir sentido. Em relação à composição dos parâme- tros para a constituição de um sinal, analise as afirmações a seguir: I - A composição dos parâmetros não tem nenhuma importância na Libras. II - Existem restrições para a composição de parâmetros na produção de sinais. III - A condição de simetria restringe a composição de parâmetros para sinais arti- culados com uma das mãos. IV - A condição de dominância orienta a formação de sinais articulados com ambas as mãos. Está correto apenas o que se afirma em: a) I e III, apenas. b) I, II e III, apenas. c) III e IV, apenas. d) II e IV, apenas. e) II e III, apenas. 215 3. Falamos de espaço gramatical ou de sintaxe espacial, porque as relações gramaticais em Libras são especificadas pela manipulação de sinais no espaço. Nesse contexto, avalie as afirmações, a seguir, e assinale V para as verdadeiras e F para as falsas: I - Dentro do espaço gramatical, os sinais podem ser movimentados para estabe- lecer diferenças entre o sujeito e o objeto. II - Os referentes relativos ao sistema pronominal, presentes ou não, são localizados no espaço pelos sinalizadores. III - O movimento da mão entre dois referentes marcados no espaço indica, por exemplo, quem é o receptor e quem é o emissor da mensagem. IV - Das três classes de verbos emLibras (simples, com concordância e espaciais), duas são estabelecidas em função da movimentação espacial. As afirmações I, II, III e IV são, respectivamente: a) V, F, V, F. b) V, F, V, V. c) F, F, F, V. d) V, V, V, V. e) F, V, V, V. 5Gramática da Libras - Aspectos Sintáticos da Libras Me. Ivanilda de Almeida Meira Novais Caro acadêmico, fico feliz por termos chegado até aqui juntos. É ótimo saber que estamos progredindo em direção a novas descobertas, mas nossa jornada não termina aqui. Os conceitos abordados nesta unidade fornecerão a você conhecimentos teóricos e práticos sobre a sintaxe da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Esta é uma língua completa, e você aprenderá, por meio dos textos discutidos, como a gramática e a sintaxe dela funcionam, especialmente em relação ao uso do espaço. É importante destacar que por ser uma língua visual-espacial, a Libras estabelece relações gramaticais no espaço de diferentes maneiras. Neste estudo, abordaremos definições e conceitos relevantes que serão explicados de acordo com os seguintes temas: a ordem das sentenças em Libras, verbos em Libras, verbos com concordância e uso de espaço, tipos de movimentos em Libras, adjetivos e uso de classificadores (CLs) em Libras. Desejo a você bons estudos! UNIDADE 5 218 A falta de profissionais qualificados nas escolas é uma das maiores dificuldades encontradas pelo surdo, situação que vem gerando impedimento na implemen- tação do ensino bilíngue. Mesmo que a escola assuma o papel social de escola inclusiva, esta situação é um problema que assola as escolas por todo o Brasil. Pense hipoteticamente que uma criança da sua família ou círculo de ami- gos apresentasse, depois de determinado tempo, a surdez. Perceba que a suposta criança, ouvia, mas, agora, não ouve mais. Pense a respeito da problemática a qual proponho, a seguir: você acredita que, apesar de não ouvir, essa criança terá ou não prejuízos na comunicação e no desenvolvimento cognitivo? Considerando que você, agora, tem conhecimentos sobre o universo da educação das pessoas surdas, qual seria sua atitude ou recomendação quanto às metodologias educa- tivas adotadas para essa criança? Muitas vezes, a falta de diálogo e de informação sobre determinados as- suntos e conceitos provocam muitos entraves para o desenvolvimento das pessoas. Não saber sobre algum assunto não é o mais sério dos problemas, mas deixar de conhecer os caminhos que podem ajudar um aluno surdo, por exemplo, gera muitos infortúnios. Já parou para pensar o quanto isso é verdade e faz sentido em muitos núcleos familiares? Para ampliar suas ideias, sugiro a leitura do artigo intitulado “A comuni- cação entre crianças surdas, filhas de pais ouvintes” de Oliveira e Córdula (2017). Antes de começarmos nosso estudo, proponho que você faça uma visita ao Instagram da Anne Magalhães pelo @aannemagalhaes e conheça o trabalho desenvolvido por ela, o qual tem alcançado um grande público, por meio da releitura de músicas e textos de diferentes culturas para a Língua Brasileira de Sinais, utilizando as redes sociais como meio de propagação da cultura surda. Com mais de 1,58 mil inscritos no YouTube e 85 mil no Instagram, a performance de Anne Magalhães dá luz à importância de tornar a arte um espaço de troca, onde a cultura ouvinte torna-se acessível ao público surdo, mas ela também é transformada por esse público graças à peculiaridade da linguagem de sinais e, assim, torna-se uma porta de entrada para as pessoas ouvintes se interessarem pela cultura surda, como nos vídeos mais vistos do perfil, que incluem clássicos, como: Feeling Good de Nina Simone, Como Nossos Pais de Elis Regina e Roda Viva de Chico Buarque. https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/17/3/a-comunicao-entre-crianas-surdas-filhas-de-pais-ouvintes https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/17/3/a-comunicao-entre-crianas-surdas-filhas-de-pais-ouvintes https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20706 219 Faça uma visita ao perfil da Anne, mas, antes, delicie-se com esta interpretação da música Como Nossos Pais, depois, navegue neste universo da Libras. Acesse o QR Code. Agora que você apreciou o vídeo de Anne Magalhães, que tal refletir sobre ele e apontar as suas principais impressões quanto à performance da intérprete? Para isso, você analisará o vídeo a partir de alguns questionamentos que te ajudarão a compreender por que Anne interpreta de forma tão peculiar. Anote, no seu Diário de Bordo, se conseguiu perceber alguma diferença na for- ma como Anne interpreta. O que mais lhe chamou atenção ao vê-la interpretando? Será que ela faz muitos sinais ou utiliza-se de outros mecanismos para transmitir a mensagem da música? Você considera o seu trabalho como intérprete um traba- lho voltado às especificidades da arte? Qual dos vídeos te chamou mais atenção? DIÁRIO DE BORDO UNICESUMAR https://apigame.unicesumar.edu.br/qrcode/20707 UNIDADE 5 220 A ordem das sentenças na Libras Aprendemos nas unidades anteriores que a Libras possui uma estrutura gramatical própria diferente de outras línguas de sinais e, também, da Língua Portuguesa ou de qualquer outra língua falada. Existem princípios gerais que são co- muns a todas as línguas, inclusive nas línguas de sinais. Do ponto de vista estrutural da língua, as sentenças são construídas com elementos que evidenciam os princípios da linguagem comuns e considerados universais. Dessa forma, podemos afirmar que cada língua tem sua particularidade, portanto, a Libras possui uma estrutura completamente visual, sendo organizada neste espaço gramatical conhecido por “espaço neutro”. Para compreender como se dá a formação da sentença em Libras, é preciso compreender a ordem das palavras nas frases. Pesquisas de Stokoe Junior (2005) nos revelam que na Língua de Sinais Americana (ASL), a base fonológica apre- senta os parâmetros primários e secundários que eram com- preendidos na ASL, e isso foi um fator decisivo para a melhor compreensão dos aspectos e implicações da língua. O referido autor — William Stokoe Junior — é considerado o pai da linguística da língua de sinais, por meio de seus estudos, in- fluenciou pesquisadores de diferentes lugares do mundo. Ao propor discussões de ordem linguística e específicas para o surdo, o debate ampliou-se para estudos das línguas de sinais em diferentes níveis linguísticos, incluindo no nível da sintaxe. De acordo com Quadros e Karnopp (2004), Stokoe Ju- nior comprovou, com suas pesquisas, que a língua dos sinais atendia todos os critérios linguísticos de uma língua genuína, perpassando o léxico e a sintaxe, além de ter a capacidade de gerar muitas frases. Este linguista analisou os sinais em suas unidades constituintes e comprovou “que cada sinal apresen- tava pelo menos três partes independentes [...] a localização ou ponto de articulação, a configuração de mãos e o movi- mento” (QUADROS; KARNOPP, 2004, p. 30). 221 A partir desses estudos, surgiram, no mundo e no Bra- sil, pesquisadores que consideram existir, na sintaxe da Libras, vários desdobramentos possíveis sobre o funcionamento, em linhas gerais, daquilo que se cons- titui em campo científico (QUADROS; PIZZIO, 2011; ROYER; QUADROS, 2019). Estes autores citados dis- cutem acerca da tipologia linguística e explicam que pesquisas em relação à sintaxe de Libras, as proprie- dades linguísticas, devem ser estudadas com a análise da organização dos sinais no espaço em diversificadas sentenças externalizadas. A ordem das sentenças na Libras ocorre de forma diferente da Língua Portuguesa. Nas palavras de Royer e Quadros (2019), há um recurso muito interessante para a identificação do sujeito em português: é a presença de concordância número-pessoal entre sujeito e verbo. As autoras explicam que as sentenças da Língua Portuguesa são estruturadas, na maioria das vezes, com a ordem Su- jeito-Predicado, isto é, Sujeito-Verbo-Objeto (SVO). Sabemos que, na Língua Portuguesa,essa ordem é de muita relevância para a sintaxe, pois, em determi- nadas sentenças, é ela que nos dirá qual é o sujeito e o objeto da sentença. Observe a frase: “O pai beijou seu filho”. O sintagma nominal o (pai) é sujeito e vem antes do verbo (beijar), seguido pelo sintagma o (filho), que é objeto do verbo. Em Libras, como em português, a estrutura SVO é a mais frequente na língua. Para compreendermos a sintaxe da língua de sinais, é importante diferenciar que esse sistema é constituído no espaço visual e não oral auditivo, como na Língua Portuguesa. Assim, a língua de sinais não é subordina- da à língua oral majoritária do país, no nosso caso, a Língua Portuguesa. Consequentemente, coisas que são ditas de maneira oral não são ditas obedecendo a mes- ma construção em sinais e vice-versa. Devemos nos UNICESUMAR UNIDADE 5 222 lembrar que a Libras não é uma representação gestual da Língua Portuguesa. Na Libras, os discursos são constituídos a partir de uma organização no espaço, ou seja, é neste espaço comunicativo que se estabelecem as relações gramaticais. Desse modo, existem di- ferentes configurações que dão significatividade às estruturas gramaticais e essas acontecem na frente do sinalizante, no qual predomina o uso das mãos e da face. Entretanto, na formação das frases, desenvolve-se um conceito básico relacio- nado com uma estrutura, e a ordem dos sinais in- terfere, diretamente, na estrutura de como a frase será sinalizada em Libras. Não devemos esquecer, tampouco negli- genciar, as diferenças entre a língua de sinais — Libras —e a Língua Portuguesa. Muitos pes- quisadores têm nos apresentado inúmeros es- tudos que comprovam a legitimidade da Libras como uma língua completa. Comprovar que Libras é língua já não é mais uma necessidade, agora, urge, nesse espaço científico, que a Libras seja pensada e difundida em toda a sociedade (comunidades surda ou não, profissionais da educação e de outros segmentos, como na área clínica e terapêutica, comerciantes em todos os segmentos sociais) até podermos (sociedade) compreender as diferenças e aprender a usar a Libras da forma mais fidedigna possível. Por isso, é importante compreender que, para sinalizar e se comunicar com clareza, é preciso conhecer a gramática das estruturas das senten- ças, pois o conhecimento dos sinais não garante uma comunicação eficaz. Quadros e Karnopp (2004, p. 67) dizem: 223 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher morena de olhos castanhos e cabelos longos, usando uma blusa preta. Na primeira imagem, a mulher sinaliza a palavra “Você”, com a mão direita apontando para o espaço neutro, indicando que se refere a alguém. Na segunda foto, a intérprete sinaliza a palavra “Casa”, com as mãos unidas pelos dedos e as bases afastadas e posicionadas na frente do corpo, ocupando o espaço neutro. Na terceira imagem, a mulher sinaliza a palavra “Ficar”, com as pontas dos polegares encostadas e os demais dedos ocupando o espaço neutro, na altura do tórax. Figura 1 - Sentença na ordem sujeito/objeto/verbo / Fonte: a autora. Libras: Você casa ficar. Português: Você ficará em casa. “ Ordem das palavras é um conceito básico relacionado com a estru- tura da frase de uma língua. O fato de que as línguas podem variar suas ordenações das palavras apresenta um papel significante nas análises linguísticas. Por exemplo, Greenberg (1966) observou que de seis combinações possíveis de sujeito (S), objeto (O) e verbo (V), algumas delas são mais comuns do que outras. Para essas autoras, nas línguas de sinais, a gramática permite diversas combi- nações estruturais SOV, entre o sujeito, o objeto e o verbo, determinando as ordens mais usuais, portanto, cabendo, nesse espaço, variações possíveis. As au- toras explicam que existem diferentes possibilidades de ordenação dos sinais em uma frase, mas, mesmo com esta flexibilidade, parece existir uma ordem básica — SVO — sigla que se refere a sujeito/verbo/objeto. Embora as autoras apresentem a ordem SVO como sendo uma ordem básica, elas mencionam que há frases na Libras capazes de seguir outras formas, organizadas a par- tir dessas combinações SOB, ou seja, sujeito/objeto/verbo. Veja na imagem, a seguir: UNICESUMAR UNIDADE 5 224 As relações gramaticais são estabelecidas, visualmente, dentro desse espaço. Para sinalizar uma sentença, ou seja, uma frase, utilizamos os espaços e construímos uma sentença em Libras. Perceba o exemplo, a seguir: Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher morena de olhos castanhos e cabelos longos, usando uma blusa preta. Na primeira imagem, a mulher sinaliza a palavra “Gato”, com as duas mãos em configuração de numeral três próximas do rosto, em cima das bochechas. Na segunda imagem, a mulher está apontando ao espaço neutro, o local faz a referência ao gato, marcando o lugar que esse animal ficará no discurso. Nas terceira imagem, a mulher executa o sinal de rato, neste caso, ela apresenta-se com a mão direita fechada que toca, com as pontas dos dedos indicador e polegar, a bochecha direita. Na quarta imagem, a mulher aponta o lado esquerdo no espaço neutro, onde o rato está, e a sua mão esquerda encontra-se aberta, representando a boca do gato voltada na direção do rato. Finalmente, na quinta e última imagem, a mão esquerda da mulher segura a mão direita, com referência à mordida no rato. Figura 2 - Sentença com uso de classificador / Fonte: a autora. O gato comeu o rato. 225 Nesta frase, foi preciso estabelecer um ponto essencial no discurso, ou seja, um lado específico para um referente, neste caso, representado pelo gato, enquanto estabeleceu, do outro lado, o segundo referente da frase — o rato — deliberando uma relação de intensa composição gramatical, criada pela sinalização de um ponto para o outro ponto. Então, no discurso, esclarecemos que o gato pegou o rato pela utilização do espaço gramatical, formando uma sentença em Libras. Nesta sentença, usamos, na organização da Libras, os pontos determinados no espaço, cuja função é ordenar as relações gramaticais de forma estruturada, na seguinte ordem: sujeito/objeto/verbo (SOV). Perceba que existe uma estrutura a qual respeita a seguinte ordem: o gato como sujeito da sentença, o rato como objeto e o verbo (comeu). Neste caso, a sinalização é executada no espaço que foi incorporado em um movimento. Segundo Quadros e Karnopp (2004): a) todas as sentenças SVO são grama- ticais sem informações adicionais; b) OSV e SOV são ordens derivadas somente mediante alguma marca especial (presença de traços), tais como as marcações não manuais; c) as demais combinações verbo/sujeito/objeto (VSO), objeto/ verbo/sujeito (OVS) e verbo/objeto/sujeito (VOS) não são derivadas na Libras, mesmo com a presença de alguma marca especial. Vejamos os exemplos de Quadros e Karnopp (2004): a) Construção com SVO – Estrutura básica de uma frase (sujeito, verbo e objeto). EU COMER BOLO. S V O b) Construção da ordem (S) V (O) possibilita omitir tanto o sujeito quanto o objeto. No exemplo do verbo “dar”, nesta construção frasal, houve a omissão do sujeito (S) e do objeto (O). Ex.: (S) dar (O) V. DAR V UNICESUMAR UNIDADE 5 226 c) Construção com SOB. Neste exemplo temos a construção em SOV, ou seja, sujeito (S), ob- jeto (O) e verbo (V): EU COMER BOLO. S O V Destacamos que das sentenças apresentadas, a que segue a ordem básica da Língua Brasileira de Sinais é SVO. Enquanto as de ordens OSV, SOB e VOS são ordens derivadas de SVO. Assim, estabelecemos associações entre o local, a referência e a concordância verbal, situação que ocor- re na língua portuguesa. Portanto, essa equivalência (as associações) apresentam algumas relações entre forma e significado, entre o referente e o referenciado. Quadros e Pizzio (2011, p. 7) afirmam que: “ As línguas de sinais podem variar quantoà forma de preencher a falta de concordância: podem restringi-la ao uso da ordem SVO na ausência da concordância, podem passar a dispor de um auxiliar. Mesmo assim, a direcionalidade prediz em todas as línguas de sinais o licenciamento de argumentos nulos. Esse padrão é similar ao padrão encontrado nas línguas faladas. Na língua de sinais brasileira, um elemento negativo pode intervir entre o sujeito e o ver- bo com concordância, mas não entre um sujeito e o verbo pleno. 227 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando unidades mínimas em Libras. Trata-se de uma intérprete sinalizando as palavras “Curioso” e “ Interesse”. Na primeira imagem, ela encontra-se com a mão em configuração de “C”, localizada próximo ao olho direito, sinalizando “Curioso”. Na segunda imagem, a intérprete mantém o mesmo ponto de articulação, porém sua configuração é parecida com “C”, embora sejam utilizados apenas os dedos polegar e indicador. Na terceira imagem, a mão ocupa o espaço gramatical sendo direcionada para frente. Figura 3 - Unidades mínimas / Fonte: a autora. Você, provavelmente, está se perguntando, nesse momento: o que isso significa? Já conhecemos as diferentes configurações de mãos que fazem parte da estrutura gra- matical da Libras. As configurações de mão são responsáveis pela execução da Libras, elas envolvem um conjunto de ações que determinam, com apenas uma mudança da configuração, a execução de um sinal diferente. Tal situação pode ser percebida quando sinalizamos “interesse” e “curioso”, o ponto de articulação é o mesmo para ambas as “palavras”, havendo pouca diferenciação na configuração de mão, ou seja, elas são muito parecidas uma com a outra, conforme o exemplo. Veja a sinalização: Curioso Interesse O desenvolvimento das palavras anteriores, em Libras, permite a hipótese de ocorrência da mesma situação, na Língua Portuguesa, quando há pequenas di- ferenciações sonoras — como nas palavras “faca” e “fala” — caracterizada pela mudança de uma letra para outra, no tocante às unidades sonoras F e V, a troca de uma letra muda a palavra. Na Libras, isso se processa com a configuração de UNICESUMAR UNIDADE 5 228 mão, criando as unidades mínimas na língua de sinais, também correspondente aos pares mínimos: sinais muitos parecidos que se modificam por alguns dos parâmetros da língua de sinais. Confira os exemplos: a) São chamados de pares mínimos porque são parecidos, porém a mudança acontece no ponto de articulação, mantendo os demais parâmetros na mesma configuração de mão e no mesmo movimento. Aprender Sábado Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de foto- grafias coloridas que mostram uma mulher interpretando palavras em Libras. Na primeira imagem, ela está executando a configuração de mãos para o sinal “Aprender”, abrindo e fechando a mão direita na região da testa, com a palma virada para a esquerda. Na segunda imagem, ela está executando a configuração de mãos para o sinal “Sábado”, abrindo e fechando a mão direita na frente da boca, com a palma da mão virada para a esquerda. Figura 4 - Sinais “Aprender” e “Sábado” Fonte: a autora. 229 Ontem Anteontem Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mos- tram uma mulher interpretando palavras em Libras. Na primeira imagem, ela está executando a configuração de mãos para o sinal “Ontem”, com a mão di- reita em sinal de “L” localizada e apoiada na lateral do rosto na linha dos olhos, fazendo a movi- mentação de rotação de frente para trás. Na segunda imagem, ela está executando o sinal “An- teontem”, com a mesma confi- guração de mãos e movimento, só que agora com os dedos po- legar, indicador e médio. Figura 5 - Sinais “Ontem” e “An- teontem” Fonte: a autora. b) Os dois sinais acontecem no mesmo ponto de articulação, mantém o mesmo movimento e muda a articulação da mão. UNICESUMAR UNIDADE 5 230 Neste caso, o ponto de articulação é o mesmo, a configuração de mão é idêntica, muda-se apenas o movimento. Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mos- tram uma mulher interpretando palavras em Libras. Na primeira imagem, ela está executando a configuração de mãos para o sinal “Vida/Viver”, com a mão di- reita localizada à frente do peito do lado esquerdo, as pontas dos dedos unidas voltada para cima, realizando o movimento de cima para baixo, duas vezes. Na segun- da imagem, ela está executando o sinal “Pecado”, com a mesma configuração de mão, só que agora apontando para o peito e realizando duas batidas. Figura 6 - Sinais “Vida/Viver” e “Pecado” / Fonte: a autora. Vida/Viver Pecado 231 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mos- tram uma mulher interpretando palavras em Libras. Na primeira imagem, ela está executando a configuração de mãos para o si- nal “Amarelo”, com o indicador da mão direita passando uma vez pela lateral direita do nariz. Na segunda imagem, ela está executando o sinal “Perigoso”, com a mesma configuração de mão, mas com o indicador e a passada na lateral do nariz em um movimento de sobe e desce. Figura 7 - Sinais “Amarelo” e “Peri- goso” / Fonte: a autora. c) Os próximos sinais mantêm a mesma configuração de mão, o mesmo ponto de articulação e diferem quanto ao movimento. Amarelo Perigoso UNICESUMAR UNIDADE 5 232 Verbos na Libras Na Libras, a flexão de verbos ocorre por mecanismos discursivos, contextuais e espaciais. É pertinente destacar que, nos verbos em línguas de sinais, não há as categorias morfológicas/sufixos específicos de tempo e modo na conju- gação dos verbos, mas há a incorporação de outros tipos de flexão, como: de parâmetros de movimento, de direção e de expressões faciais. É importante destacar que, na Libras, os verbos estão separados em três grupos: simples, espaciais e com concordância. 1. Verbos simples O primeiro é o grupo dos verbos simples e, para execução deste tipo, utilizamos as partes do corpo e do rosto. Eles não precisam de concordância, por serem verbos simples, são formados por um único sinal. Podemos citar, como exemplo dentro desse primeiro grupo, sentenças com o verbo “pensar”. Pensar 233 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher sinalizando a palavra “Pensar”. Na primeira imagem, ela está com o dedo indicador da mão direita tocando a cabeça, do lado direito. Na segunda imagem, a intérprete sinaliza “Você”, apontando o dedo indicador na frente do corpo, utilizando-se do espaço gramatical, seguida pela sinalização de “Pensar”. Na terceira imagem, a intérprete sinaliza “Eu”, apontando o dedo indicador para si, seguida da interpretação de “Pensar”, onde ela se apresenta com a mão direita na cabeça, Figura 8 - Verbo “Pensar” / Fonte: a autora. Eu pensar Você pensar UNICESUMAR UNIDADE 5 234 Conversar Quer/Querer Nas sentenças “Eu penso” ou “Você pensa”, o local da sinalização mantém a mes- ma disposição quando nos referimos ao “Eu” no discurso ou quando o discurso é direcionado ao outro. Desse modo, o sinal acontece na cabeça do sinalizador e não na cabeça do receptor da mensagem. Assim, não há mudança da localização do sinal, por se tratar de outra pessoa. O mesmo ocorre com os verbos “Gostar/ Conversar/Falar/Querer/Conquistar”. Veja os exemplos, a seguir: 235 Você conversar quer? Exemplos em sentenças: a) Em português: Você quer conversar? Descrição da Imagem: nas imagens, há uma sequência de fotografias coloridas onde é interpretada uma sentença em Libras. Na primeira imagem, a intérprete sinaliza a palavra “Você”, com a mão direita apontando para o espaço neutro, indicando que ela se refere a alguém. Na segunda imagem, a intérprete encontra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Conversar”. Sua mão direita está sobreo dorso da mão esquerda, na altura da barriga. Na terceira imagem, a intérprete en- contra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Querer/Quer”. Suas mãos estão posicionadas na frente do seu corpo, ocupando o espaço neutro. Ambas as mãos estão com os dedos abertos e com as palmas viradas para cima e encontram-se no espaço neutro de forma simétrica. Figura 10 - Exemplo de sentença em Libras/ Fonte: a autora. Descrição da Imagem: nas imagens, há uma sequência de fotografias coloridas onde são interpretados verbos simples em Libras. Na primeira imagem, a intérprete encontra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Conversar”. Sua mão direita está sobre o dorso da mão esquerda, na altura da sua barriga. Na segunda ima- gem, a intérprete encontra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Quer/Querer”. Suas mãos estão posicionadas na frente do seu corpo, ocupando o espaço neutro. Ambas as mãos estão com os dedos aber- tos e com as palmas viradas para cima, encontrando-se no espaço neutro de forma simétrica. Na terceira imagem, a intérprete sinaliza “Falar”, a sua mão direita em configuração de “P”, está posicionada abaixo do queixo. Figura 9 - Verbos simples “Conversar”, “Quer/Querer” e “Falar” em Libras / Fonte: a autora. Falar UNICESUMAR UNIDADE 5 236 Conversar quer comigo? Descrição da Imagem: nas imagens, há uma sequência de fotografias coloridas onde é interpretada uma sentença em Libras. Na primeira imagem, a intérprete encontra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Conversar”. Sua mão direita está sobre o dorso da mão esquerda, na altura da barriga. Na segunda imagem, a intérprete encontra-se com as duas mãos ocupando o espaço neutro, sinalizando a palavra “Querer/Quer”. Suas mãos estão posicionadas na frente do seu corpo, ocupando o espaço neutro. Ambas as mãos estão com os dedos abertos e as palmas viradas para cima e encontram-se no espaço neutro de forma simétrica. Na terceira imagem, a intérprete faz o sinal de “Comigo” ou “Eu”, apontando para si ao encostar o dedo indicador da mão direita no tórax. Figura 11 - Exemplo de sentença em Libras / Fonte: a autora. Em português: Quer conversar comigo? Aprendemos que os verbos simples são verbos sem concordância e, geralmente, são ancorados em alguma parte do corpo, ou seja, obedecem um critério linguístico ao serem realizados no corpo. Como não apresentam concordância, ao executá-los, é necessário utilizarmos outras estratégias para estabelecer as relações gramaticais. De acordo com Quadros e Karnopp (2004, p. 34), verbos simples em língua de sinais não se alteram nem pela direção de movimento, nem pela orientação da mão. “ Os verbos simples na Libras, ou na língua de sinais, são aqueles que não apresentam a modificação no movimento, portanto eles permanecem iguais. Assim, o verbo continua o mesmo em relação ao sujeito, no que se refere ao pronome pessoal da primeira pessoa (eu), com o objeto no pronome pessoal da segunda pessoa (você) e quando ocorre com a troca de pronomes pessoais. Percebem que para sinalizar CONHECER e FAZER, os sinais não se alteram, ocor- rendo apenas as mudanças nos pronomes. 237 Os verbos simples têm as mesmas propriedades significativas que representam uma ação. Em relação aos sinais de verbos em Libras, se eles não se modificam, trata-se de um verbo simples. As imagens, a seguir, são exemplos, em Libras, do uso dos verbos em frases. Descrição da Imagem: nas imagens, há uma sequên- cia de fotografias coloridas onde é interpretada uma sentença em Libras. A intérprete sinaliza, na primeira figura, a palavra “Você”, com a mão direita apontando o indicador para frente. Na segunda imagem, a mulher sinaliza a palavra “Casa”. Na terceira imagem, ela sinaliza uma cruz, onde os dedos indicadores cruzam-se uns aos outros, isso acontece na frente do seu corpo, utilizando o espaço neutro, complementando o sinal de “Casa + “Cruz”, surgindo o sinal de “Igreja”. Na quarta imagem, a intérprete executa o sinal de “Conhecer” e encontra-se com a mão direita aberta debaixo do queixo. Figura 12 - Frase em Libras / Fonte: a autora. igrejaVocê conhecer Sentença na Língua Portuguesa Você conhece a igreja? Eu conheço a igreja. Sentença na Libras Conhecer igreja você? Conhecer igreja eu. Agora é com você! Coloque suas mãos em movimento e veja a mágica surgir! Você é convidado a praticar alguns verbos. Estude-os e sinalize à vontade! UNICESUMAR UNIDADE 5 238 Descrição da Imagem: nas imagens, há uma se- quência de fotografias co- loridas onde é interpretada uma sentença em Libras. Na primeira imagem, a intérprete sinaliza a pala- vra “Amar”, aqui, sua mão direita está próxima do co- ração, encostada no peito, com configuração em “C”, enquanto na imagem se- guinte, a mulher está com a mão na mesma posição, porém os dedos estão fechados em configura- ção de “S”. Na segunda sequência de imagens, a mesma mulher sinaliza as palavras “Mandar/Orde- nar”, aqui, sua mão direita está parcialmente fechada, apenas com o indicador levantado, a mão encon- tra-se posicionada na ca- beça encostando o dedo indicador na testa e, na imagem que complementa o sinal, a mesma mão está posicionada na frente do corpo, utilizando do espa- ço neutro apontado para frente. Por fim, a sequên- cia sinaliza as palavras “Es- tudar” e “Culpar”. A palavra “Estudar” é sinalizada com as duas mãos posiciona- das no espaço neutro, am- bas abertas com a palmas viradas para cima, uma tocando na outra. Quanto à palavra “Culpar”, a mão direita é posicionada em cima da cabeça, as pon- tas dos dedos se mantêm encostados nesta parte do corpo, e a palma da mão fica um pouco erguida. Figura 13 - Exemplos de verbos / Fonte: a autora. Amar Estudar Culpar Mandar/Ordenar 239 Pular 2. Verbos espaciais Os verbos espaciais são verbos que têm afixos locativos. Esses verbos caracterizam-se pelo movimento, a posição acontece no espaço e admite afixos locativos, os quais identificam locais no espaço neutro da sinalização. Os verbos locativos também possuem a direciona- lidade, assim como os verbos com concordância nú- mero-pessoal, por exemplo, o verbo “Colocar” sobre algo, ao ser sinalizado, demonstra que a pessoa pegará um copo (objeto) na mesa, demonstrando a ação para colocar o copo. Todos estes elementos na sinalização fluem para a construção de movimentos e são incor- porados os classificadores, com o objetivo de determi- nar o lugar e a direção cujos pontos iniciais e finais da trajetória estão alinhados com as localizações. Confira alguns exemplos. Mãos em movimento! Agora, você poderá praticar a Libras conhecendo os sinais de verbos. Aproveite seu tempo e coloque suas mãos em funcionamento. UNICESUMAR UNIDADE 5 240 Ir/Vou Pagar Perguntar Descrição da Imagem: nas imagens, há uma sequência de fotografias coloridas onde é interpretada uma sentença em Libras. Na primeira ima- gem, a mulher interpreta o sinal de “Pular”, suas mãos estão abertas, a mão es- querda serve de apoio a para a direita, a qual se encontra com dois dedos esticados em cima da mão esquerda. Na sequência, há a sinalização da palavra “Pular”, porém, aqui, os dedos da mão direita estão encolhidos e um pouco para cima. Na segunda ima- gem, a intérprete executa o verbo “Ir/Vou”, ela está com a mão fechada, apenas com o dedo indicador apontado a si mesma e, na sequência, com a mesma configuração de mão, ela aponta o dedo in- dicador para frente, utilizan- do-se do espaço neutro. Na terceira imagem, a mulher interpreta a palavra “Pagar”, aqui, a sua mão esquerda está aberta, enquanto a mão direita, toda fechada, encon- tra-se logo acima. Para com- pletar o sinal, na sequência, a mulher mantém a mesma posição da mão esquerda, porém a mão direita está em cima, encostada na mão es- querda. Na quarta imagem, a intérprete sinaliza a palavra“Perguntar”, aqui, ela está com a mão esquerda aberta, a palma da mão virada para o lado direito, enquanto a mão direita tem os dedos fe- chados, apenas mantendo o indicador levantado próximo da palma da mão esquerda. Figura 14 - Exemplos de verbos espaciais / Fonte: a autora. 241 3. Verbos com concordância Você aprendeu que os verbos simples não apresentam modificações quanto à forma de sinalizar. Entretanto o mesmo não ocorre com os verbos com concor- dância, nesta categoria, há modificações que possuem três tipos distintos. Verbo com concordância número-pessoal: com concordância Verbo com concordância de gênero: verbos classificadores Verbo com concordância de locação: verbos espaciais Quadro 1 - Tipos de verbos com concordância / Fonte: a autora. Segundo Wanderley (2017), os três tipos de verbos com concordância apresen- tados anteriormente têm características de concordância quando um dos pa- râmetros é alterado, tais alterações são marcadas quando há diferenciações na direção de movimento ou na orientação da mão que conhecemos, também, como configuração da mão. Diferentemente dos verbos simples, em que os movimentos ou um dos parâmetros não se alteram. Aprendemos na unidade anterior que expressões não manuais são, normal- mente, expressões faciais que executam algum movimento do corpo e podem apresentar a função linguística gramatical. Segundo Pimenta e Quadros (2008), as funções gramaticais das expressões faciais investigadas na língua de sinais brasileira acompanham a concordância verbal, inclusive com a incorporação de negação. Neste caso, há no discurso as expressões não manuais, as quais consistem em movimentos da face, da cabeça e do tronco presentes na execução de muitas formas de expressões nas línguas de sinais e, também, nas línguas faladas. Assim, há normas quanto expressões não manuais que são organizadas, principalmente, em alguns tipos de sentenças. Para perceber a tipologia da frase, isto é, se a sentença é afirmativa, exclamati- va, interrogativa ou negativa, como mencionado por Quadros e Karnopp (2004), o receptor precisa estar atento às expressões faciais e corporais que, geralmente, estão associadas a outros sinais manuais. UNICESUMAR UNIDADE 5 242 Expressões não manuais Cabeça Movimentos de cabeça - Balanceamento para frente e para trás; - Balanceamento para os lados; inclinação para frente; - Inclinação para o lado; - Inclinação para trás. Rosto Parte Superior - Sobrancelhas franzidas; - Olhos arregalados; - Lance de olhos; - Sobrancelhas levantadas. - Bochechas in�adas; - Bochechas contraídas; - Lábios contraídos e projetados e sobrancelhas franzidas; - Correr de língua contra a parte inferior interna da bochecha; - Apenas bochecha direita in�ada; - Contração do lábio superior; - Franzir de nariz. Rosto e Cabeça - Cabeça projetada para frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas; - Cabeça projetada para trás e olhos arregalados. Tronco - Para frente; - Para trás; - Balanceamento alternado dos ombros; - Balanceamento simultâneo dos ombros; - Balanceamento de um único ombro. Parte Inferior Descrição da Imagem: a figura apresenta, na estrutura de um mapa conceitual, os elementos que compõem as expressões não manuais, divididos por 13 quadros. No primeiro, está escrito “Expressões não manuais”, as quais se dividem em dois quadros, intitulados “Cabeça” e “Tronco”. O quadro da Cabeça subdivide-se em movimentos da cabeça e do rosto, este último subdivide-se em parte superior, parte inferior, rosto e cabeça. Neste último caso, são apresentadas as expressões que correspondem a esses requisitos: “Cabeça, projetada para frente”, “Olhos levemente cerrados”, “Sobrancelhas franzidas”, “Cabeça projetada para trás” e “Olhos arregalados”. Figura 15 - Expressões não manuais / Fonte: Souza (2020, p. 37). As expressões constituem componentes lexicais que marcam referência prono- minal, partícula negativa, advérbio ou grau ou aspecto (QUADROS; KARNOPP, 2004). Assim, pode-se afirmar que as expressões faciais interferem no discurso sinalizado, cumprindo um papel estrategicamente eficaz na interpretação em Libras. Na língua de sinais, uma oração do tipo negativa/interrogativa é realiza- da com as sobrancelhas franzidas e um aceno de negação exercido pela cabeça, conforme o exemplo na sentença interrogativa, a seguir: 243 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando sentenças em Libra. Na primeira imagem, a mulher sinaliza a palavra “Namorado(a)”, na segunda imagem, ela sinaliza a pergunta “Quem?”. Figura 16 - Sentença em Libras / Fonte: a autora. Observe que há maior modificação da parte superior da face, embora mudanças aconteçam na face inferior, assim, as partes superior e inferior da face estão rela- cionadas a diferentes domínios, acentuando os movimentos da parte superior do rosto (sobrancelha, olhar, posição e movimentos de cabeça). As marcações faciais ocorrem com mais frequência em orações e sentenças. De acordo com a literatura de Souza e Fronza (2018), as expressões não ma- nuais podem ser de dois tipos: as afetivas e as gramaticais. As afetivas estão rela- cionadas aos sentimentos, acompanham sinais como raiva, alegria, tristeza, dor, medo, entre outros. Enquanto as gramaticais dividem-se em, pelo menos, duas classes distintas: classe de expressões faciais com funções sintáticas (condicionais e relativas), com uso de expressões específicas, e a classe que marca sentenças adverbiais, essas expressões, quando ocorrem, modificam sinais verbais. Pimenta e Quadros (2008) apresentam que, no nível da sintaxe, as marca- ções não manuais são responsáveis por indicar tipos de construções, como: sentenças negativas, interrogativas, afirmativas, condicionais, relativas, cons- truções com tópico e com foco. Para as autoras, os verbos “manuais” são os que envolvem uma configuração de mão, de modo geral, situação que se evi- dencia pela ação “pegar”, ou seja, estar segurando um objeto na mão. Sob essa perspectiva, Quadros e Karnopp (2004, p. 205) afirmam que esses verbos, Quem é o(a) seu(sua) namorado(a)? UNICESUMAR UNIDADE 5 244 Em português Escrevo de caneta no meu caderno. Em Libras Caderno meu escrever caneta. geralmente, finalizam a frase: “Primeiro situa-se sobre o que se está falando e, em seguida, define-se que tipo de verbo manual será usado, como nas cons- truções tópico-comentário”. Perceba no exemplo: Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando sentenças com verbos em Libra. Na primeira imagem, a mulher sinaliza a palavra “Caderno”, com as duas mãos situadas no espaço neutro. A intérprete apresenta-se com a palma da mão esquerda virada para cima, enquanto a mão direita, em configuração de “L”, encosta na mão esquerda. Na segunda imagem, a mu- lher sinaliza a palavra “Meu”, neste caso, a mão direita aberta toca o seu corpo, próximo ao coração. Na terceira imagem, utilizando-se do espaço neutro, a intérprete executa o sinal de “Escrever”. Aqui, ela está com a mão esquerda na frente do seu corpo, com a palma da mão virada para cima e a mão direita está em cima, como se escrevesse algo. Na quarta e última imagem, a intérprete sinaliza o sinal de “Caneta”, com a mão direita em configuração de “Y”, utilizando-se do espaço neutro, a mão está com os dedos fechados e virada para o corpo. Figura 17 - Sentença com verbo / Fonte: a autora. 245 Aqui, escrever é um verbo manual, a presença do verbo “escrever” está vinculado com a “ação”, mencionada anteriormente, pois o sinal de “escrever” tem o movimen- to idêntico ao ato “escrever”, e a configuração da mão apresenta similitude entre o objeto e movimento, ou seja, o sinais indicam que há, realmente, uma caneta na mão. 1º. Sentenças negativas: são aquelas em que a sentença está sendo negada. Normalmente, possuem um elemento negativo explícito (não, nada, nunca). Na línguade sinais, podem estar incorporadas aos sinais ou ex- pressas apenas por meio da marcação não manual, conforme os exemplos nas frases em Libras e na Língua Portuguesa, a seguir: Não encontrei o livro. Nunca encontrei esse menino. Livro encontrar não. Nunca menino encontrar. 2º. Sentenças interrogativas: são aquelas formuladas com a intenção de obter alguma informação desconhecida. São perguntas que podem requerer informações relativas aos argumentos por meio de expressões interrogativas (o que, como, onde, quem, por que, para que, quando, quanto etc.). Também há interrogativas formuladas simplesmente para obter confirmação ou negação que pressupõe uma resposta (sim ou não). Expressões interrogativas: Você quer água? Água querer? 3º. Sentenças afirmativas: são sentenças as quais expressam ideias ou ações afirmativas. Conforme os exemplos: Eu vou à escola. Escola ir não. Se chover vou ao cinema. Se chover cinema ir. 4º. Sentenças condicionais: são sentenças que estabelecem uma condição para realizar outra coisa. Conforme exemplo: UNICESUMAR UNIDADE 5 246 O menino que brigou e foi para casa. Menino brigar casa ir. Cores, eu gosto do vermelho. Cor gostar vermelho. 5º. Sentenças relativas: são aquelas em que há uma inserção dentro da sentença para explicar, para acrescentar informações, encaixar outra questão relativa ao que está sendo dito. Nessas sentenças, normalmente, utiliza-se que na Língua Portuguesa; enquanto na língua de sinais, há quebra na expressão facial para anunciar a sentença relativa, a qual é produzida com a elevação das sobrancelhas. 6º. Construções com tópico: são uma forma diferente de organizar o discur- so. O tópico retoma o assunto sobre o qual se desenvolverá o discurso. Por exemplo: 7º. Construções com foco: são aquelas que introduzem no discurso uma informação nova que pode estabelecer contraste, informar algo adicional ou enfatizar alguma coisa. Ana comeu todo o peixe. Ana peixe comer. Perceba no exemplo nas sentenças: Sentença na Língua Portuguesa Sentença na Libras Eu dou o livro ao Paulo. Ela dá o livro a Paulo. Você me dá o livro. Eu não vou à igreja. Você não gosta de sorvete. Eu dar livro Paulo. Ela me dar livro. Livro você me dar. Eu ir não igreja. Você gostar não sorvete. 247 Ao sinalizar o verbo dar, altera-se o movimento do verbo em direção ao obje- to e ao sujeito na sentença. É interessante que você perceba, também, a função do olhar neste processo de concordância verbal. O olhar é fundamental, assim como qualquer outro verbo com concordância da língua de sinais, pois, como critério próprio, além do olhar, decorre uma movimentação, no exemplo, essa movimentação desenrola-se em direção ao objeto. Assim, aqui, há também, além da expressão de concordância, uma expressão não manual do verbo, porque o verbo movimenta, articula funções. Com a marcação do olhar, por exemplo, o sinalizador pode se direcionar tanto ao sujeito quanto ao objeto. No exemplo da frase “Eu pego o livro”, perceba que o sinalizador acompanha (direciona) com o olhar a movimentação das mãos. Nesse momento, realiza-se o que chamamos de marcação do tópico na Libras. Veja outro exemplo: Descrição da Imagem: a figu- ra apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mos- tram uma intérprete de Libras sinalizando uma sequência de sinais que compõem a senten- ça “Eu pego o livro”. Na primei- ra imagem, ela sinaliza “Eu”, apontando o indicador para si mesma. Na segunda imagem, ela sinaliza “Pegar”, aqui, a in- térprete está com a mão direita fechada bem perto do seu cor- po, utilizando o espaço neutro gramatical. Na terceira imagem, ela sinaliza “Livro”, neste caso, suas mãos estão unidas, palma com palma. Na quarta imagem, a intérprete abre as mãos, po- rém as partes inferiores delas se mantêm juntas e as parte superiores se abrem, criando o sinal de um livro aberto. Figura 18 - Sinal em Libras do verbo “Pegar” / Fonte: a autora. Eu pegar livro. UNICESUMAR UNIDADE 5 248 Quanto ao verbo de concordância número-pessoal, a primeira característica des- se verbo acontece em um dos cinco parâmetros da Libras (ponto de articulação, movimento, localização, expressões faciais e orientação). Neste caso, a orientação é responsável em marcar as pessoas do discurso, isso porque o sinalizador precisa compreender a mensagem que deve passar no discurso. Em consonância à orientação, surge a marcação referente das pessoas no discurso. Lembremos que na língua de sinais é exatamente um desses parâmetros que altera a concordância entre os elementos da frase. Ressalta-se o seguinte: a orientação é o sentido para onde será levado o movimento, com a possibilidade de sair do sinalizador ou ser dirigido ao sinalizador. Há uma segunda característi- ca desse verbo, que diz respeito ao ponto inicial. Aqui, esse movimento concorda com o sujeito e o final com o objeto. Quadros e Quer (2010, p. 33) afirmam: “ A direção do movimento não inicia na posição gramatical asso- ciada ao sujeito e não termina na posição gramatical associada ao objeto, mas ocorre exatamente ao contrário. Todavia, a face da mão continua direcionada para o objeto preservando a relação gramatical. Meir propõe, assim, a existência de uma marcação dupla, ou seja, uma concordância temática marcada pela trajetó- ria (FONTE-ALVO) e uma concordância sintática marcada pela orientação da face voltada para o objeto. Vamos ao exemplo: Português: Eu te ajudo. Libras: Ajudar você. 249 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher sinalizando uma sequência que compõe duas sentenças. Na primeira sequência, a intérprete sinaliza os sinais de “Ajudar”, sua mão esquerda está na altura do seu tórax, virada com a palma para baixo, apoiando a mão direita que toca na lateral. Em seguida, ela repete o mesmo movimento, porém as mãos estão mais afastadas do seu corpo, demonstrando o movimento que acontece na execução do sinal, indo em direção ao outro, ou ao referente no discurso. Na segunda sequência, o mesmo sinal se repete, porém, agora, indica o movimento contrário. Vem do espaço neutro, mais afastado do corpo, em direção ao seu lado, bem próximo, demonstrando que a ajuda vem do referente. Figura 19 - Verbos com concordância / Fonte: a autora. Nos exemplos, a seguir — “Eu aviso/Você me avisa” — ocorre a mudança da dire- ção do movimento, o que determina a relação gramatical dentro do próprio sinal. Português: Você me ajuda. Eu avisar. Libras: Ajudar-me. UNICESUMAR UNIDADE 5 250 Você me avisar. Eu te dar. 251 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher sinalizando verbos com concordância em Libra. Na primeira imagem, a intérprete sinaliza a o verbo “Avisar”, sua mão encontra-se próxima do rosto, ocupando o espaço neutro, sem encostar a mão no rosto, com a configuração em “Y”. Na segunda imagem, mantém a mesma mulher, porém, aqui, o sinal é modificado, pois, neste caso, está sinalizando a palavra “Avisar-me”. Na sequência, a mulher realiza os sinais de “Dar”, com as duas mãos, aproximadamente, na altura do seu tórax. Ela direciona as mãos como estivesse entregando a alguém, mantendo as mãos mais afastadas do seu corpo e demonstrando o movimento que acontece na execução do sinal, indo em direção ao outro ou ao referente no discurso. Na sequência, o mesmo sinal se repete, porém, agora, indica o movimento contrário. Figura 20 - Verbos com concordância / Fonte: a autora. Você me dar. UNICESUMAR UNIDADE 5 252 Tipos de movimentos em Libras Os movimentos na execução dos sinais são importantes para desempenhá-los de forma correta, pois se caracterizam como componentes articulatórios do sinal. Aprendemos que os cinco parâmetros, além de constituírem a estrutura da Libras, constituem-se, também, a partir dos tipos de movimentos dos sinais que determinam os processos envolvidos na sinalização. Destacamos,aqui, os seis movimentos que marcam a forma correta de execução dos sinais. Descrição da Imagem: a figura apresenta a ilustração de um quadro que mostra seis tipos de mo- vimentos na Libras, sendo eles: o Retilíneo, representado por uma seta com linha reta; o Angular, representado por uma seta com linha quebrada; o Sinuoso, por uma seta com linha sinuosa; o Circular, por uma seta em círculo; o Semicircular, por uma reta com linha curva, e o Helicoidal, por uma seta com linha em espiral. Figura 21 - Tipos de movimentos na Libras / Fonte: a autora. RETILÍNEO ANGULAR SINUOSO CIRCULAR SEMICIRCULAR HELICOIDAL Com as mãos, o emissor pode sinalizar no espaço neutro ou no corpo, trans- mitindo as mensagens e apropriando-se dos movimentos com contornos ou linhas. Nas línguas de sinais, a(s) mão(s) do enunciador representa(m) o objeto, enquanto o espaço onde o movimento se realiza (o espaço da enunciação) é a área em torno do corpo do enunciador. As palavras selecionadas, a seguir, são classificadas pelos movimentos M, os quais caracterizam a estrutura do sinal. Assim, temos para os movimentos, os seguintes exemplos: 253 Acreditar Comunicação Descrição da Imagem: a figura apresenta, em uma sequência de duas fotografias coloridas, duas palavras em Libras. Estes dois sinais apresentados são exemplos de sinais com movimentos retilíneos. Sendo assim, na primeira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Comunicação”, por meio da configuração das mãos em “C”. As mãos dela estão posicionadas na frente do corpo, na altura do tórax, uma na frente da outra. Na segunda e terceira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Acreditar”. Na primeira imagem, a intérprete está com a palma das mãos abertas, a mão direita localizada na altura do rosto, tocando a testa, enquanto a mão esquerda está localizada na frente do tórax, com a palma virada para cima. Na segunda imagem, a mão direita desce e fica apoiada em cima da esquerda. Figura 22 - Movimento retilíneo / Fonte: a autora. Retilíneo: UNICESUMAR UNIDADE 5 254 Helicoidal: Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma interpre- tando duas palavras em Libras. Estes dois sinais apresentados são exemplos de sinais com movimentos helicoi- dal. Na primeira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Importante”, com configuração das mãos em “I”. Sua mão direita está posicionada ao lado do corpo, ocupando o espaço neutro, um pouco acima da cintura. Enquanto na segunda imagem, a mulher mantém a mesma configuração de mão, porém na altura da cabeça. Figura 23 - Movimento helicoidal / Fonte: a autora. Importante Alto 255 Computador Brincar Circular: Descrição da Imagem: a figura apresenta uma se- quência de fotografias co- loridas que mostram uma mulher interpretando duas palavras em Libras. Estes dois sinais apresentados são exemplos de sinais com movimentos circula- res. Na primeira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Computa- dor”, com configuração das mãos em “cinco”, ou seja, dedos indicadores e anela- res levemente encolhidos, e os demais, abaixados. Ela mantém as duas mãos nes- sa configuração em frente ao seu corpo, na altura do tórax. Na segunda imagem, suas mãos estão com a con- figuração em “Y”, posicio- nadas em frente ao corpo, ocupando o espaço neutro, um pouco acima da cintu- ra. As mãos estão paralelas umas das outras, indicando o sinal de “Brincar”. Figura 24 - Movimento circular Fonte: a autora. UNICESUMAR UNIDADE 5 256 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando duas palavras em Libras. Estes dois sinais apresentados são exemplos de sinais com movimentos semicirculares. Na primeira sequência, a intérprete apresenta o sinal de “Professor”, com configuração das mãos em “P”. Sua mão direita está posicionada em frente ao corpo, ocupando o espaço neutro, um pouco acima da cintura. Na primeira imagem, a qual mostra a mão “P”, o sinal é realizado do lado esquerdo, enquanto na segunda imagem, a intérprete mantém a mesma configuração de mão, porém o sinal está do lado direito. Na segunda sequência, o sinal é de “Pedagogo”. Neste caso, a mão esquerda serve de apoio, com a mão dobrada em frente ao corpo, a intérprete faz, com a mão direita, o movimento semicircular em cima do braço, vindo da esquerda para a direita, tocando uma vez em cada extremidade. Figura 25 - Movimento semicircular / Fonte: a autora. Professor Pedagogo Semicircular: 257 Peixe Feliz Navio Brasil Sinuoso: Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando duas palavras em Libras. Aqui há uma sequência de três sinais que são exemplos de sinais com movimentos angular. Na primeira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Feliz”, com configuração das mãos em “F”. A intérprete apresenta-se com as duas mãos paralelas em frente ao corpo, ocupando o espaço neutro. Na segunda imagem, com a mão direita em configuração de “B”, o sinal é realizado em frente ao corpo, na altura da cabeça, descendo até a altura do tórax. Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando duas palavras em Libras. Estes dois sinais apresentados são exemplos de sinais com movimento sinuoso. Na primeira imagem, a intérprete apresenta o sinal da palavra “Peixe” com a mão aberta, virada de lado, em que o seu dedo polegar fica para cima e a palma mão virada para o lado esquerdo do seu corpo, indicando o movimento para frente do corpo. Na segunda imagem, a intérprete está com as duas mão juntas, semiabertas, as partes de baixo estão juntas e as partes de cima, dos dedos polegares, estão abertas, marcando o sinal da palavra “Navio”. Figura 27 - Movimento angular / Fonte: a autora. Figura 26 - Movimento sinuoso / Fonte: a autora. Angular: UNICESUMAR UNIDADE 5 258 Conheça exemplos de verbos com alguns dos movimentos apresentados anteriormente: Beber Esperar Lembrar Aproveitar Chorar Gostar 259 Descrição da Imagem: a figura apresenta uma sequência de fotografias coloridas que mostram uma mulher interpretando verbos em Libras. Na primeira imagem, a mulher interpreta o sinal de “Beber”, a sua mão está fechada com apenas o dedo polegar levantado e sendo direcionada para a boca, porém sem encostar nela, a cabeça da intérprete fica um pouco inclinada para trás, situação que indica o ato de beber algo. Na sequência, é mostrada a sinalização do verbo “Aproveitar”, a mulher faz a configuração de mão em “I” com todos os dedos fechados, apenas fazendo o gesto de segurar algo com o polegar, deixando o dedo mínimo levantado em frente ao corpo. Na sequência, a intérprete executa o verbo “Esperar”, ela está com as duas mãos fechadas, com configuração em “S”, a mão esquerda apoia a mão direita que se encontra um pouco atrás da mão esquerda, ambas estão encostadas pelos punhos. Na sequência seguinte, a mulher interpreta o verbo “Chorar”, aqui, suas mãos estão fechadas, porém os dedos indicadores levantados tocam o seu rosto, logo abaixo dos olhos, e sua expressão facial é como de alguém que chora. Em sequência, a intérprete sinaliza o verbo “Gostar”, aqui, ela está com a mão direita do lado direito da cabeça, com a mão em confi- guração em “V” e seu olhar está direcionado ao sinal. Na imagem que sinaliza o ato de “Escrever”, a intérprete está com a mão esquerda na frente do corpo, com a palma da mão virada para cima e a mão direita sobre ela, como se escrevesse algo. Na última imagem, a mulher interpreta o verbo “Gritar”, neste caso, com a mão direita em configuração de “cinco”, ou seja, mão fechada e apenas os dedos indicador e anelar levemente dobrados. Mantendo essa configuração, a mão encontra-se em frente da boca, um pouco distanciada, e a expressão da mulher é marcante, com boca aberta. Figura 28