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TCC ATUALIZADO E CORRIGIDO (1)

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 UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CAMPUS ARAPIRACA
UNIDADE EDUCACIONAL PALMEIRA DOS ÍNDIOS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
 
INGRID VALÉRIA ANDRADE DE SÁ
ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19
Palmeira dos Índios – AL 
2023
INGRID VALÉRIA ANDRADE DE SÁ
ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19
Trabalho de Conclusão apresentado ao curso de Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas/Unidade Educacional Palmeira dos Índios, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Prof. ª Dra. Marli de Araújo Santos
Palmeira dos Índios – AL 
2023
Ficha catalográfica 
INGRID VALÉRIA ANDRADE DE SÁ
ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA AS MULHERES NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19
Trabalho de Conclusão apresentado ao curso de Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas/Unidade Educacional Palmeira dos Índios, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social e aprovado em 19 de dezembro de 2023.
 Profa. Dra. Marli de Araújo Santos
Universidade Federal de Alagoas - Campus Arapiraca
(Orientadora)
Profa. Dra. Sueli Maria do Nascimento
Universidade Federal de Alagoas – Campus Arapiraca
(Examinadora interna)
Profa. Ma. Maria Olivia da Silva Monteiro
 Faculdade Cesmac do Sertão
(Examinadora externa)
 
Dedico este trabalho a minha família, principalmente aos meus pais pelo incentivo, mesmo nos momentos difíceis da minha trajetória acadêmica. Gratidão a vocês. 
AGRADECIMENTO
Em primeiro lugar, agradeço a Deus, que possibilitou a realização dos meus objetivos durante todos os anos de estudos, ao conceder-me saúde e determinação para concluir este trabalho.
Agradeço aos meus pais e irmão, especialmente à minha mãe, uma heroína que me ofereceu apoio e incentivo nos momentos difíceis de desânimo e cansaço.
Expresso minha gratidão a todos os professores que me acompanharam ao longo do curso, pela dedicação exemplar na arte de ensinar, por terem me proporcionado aprendizado e pelo conhecimento adquirido no processo de formação profissional.
Sou grata à minha orientadora, Prof.ª. Dra. Marli, pela oportunidade, dedicação e apoio na elaboração deste trabalho.
Quero reconhecer também algumas pessoas com as quais convivi ao longo desses anos de curso, as quais me incentivaram e certamente tiveram impacto positivo em minha formação acadêmica.
“Não acredito que existam qualidades, valores, modos de vida especificamente femininos: seria admitir a existência de uma natureza feminina, quer dizer, aderir a um mito inventado pelos homens para prender as mulheres na sua condição de oprimidas. Não se trata para a mulher de se afirmar como mulher, mas de tornarem-se seres humanos na sua integridade”.
Simone de Beauvoir
RESUMO
Este trabalho aborda uma visão geral do período da pandemia de Covid-19 e como ela impactou os problemas sociais do país, destacando a violência doméstica contra as mulheres, que persiste ao longo dos anos como um problema de saúde pública em uma sociedade patriarcal/capitalista que evidencia a desigualdade social entre homens e mulheres. O objetivo deste trabalho é mostrar a atuação do serviço social no enfrentamento da violência doméstica contra as mulheres durante a pandemia de Covid-19, bem como os desafios enfrentados pelos profissionais diante de um Estado pouco efetivo no combate à pandemia e à violência. A metodologia apresentada utilizou a pesquisa bibliográfica e documental, que forneceu o arcabouço teórico do trabalho. O patriarcalismo sempre gerou desigualdades por ser um sistema de dominação masculina e subordinação feminina, e a violência doméstica é a materialização desse fenômeno. A atuação profissional dos assistentes sociais é de fundamental importância, pois eles se dedicam a compreender as relações sociais, buscando criar alternativas de trabalho na perspectiva da garantia de direitos e no enfrentamento da violência contra as mulheres. Mesmo em situações de crise, como a pandemia, a busca por alternativas de enfrentamento é contínua, considerando que a violência doméstica contra mulheres não é uma demanda nova para assistentes sociais e não pode se limitar ao contexto pandêmico. Dessa forma, deve haver a conscientização de que a violência contra as mulheres é estrutural e exige estratégias de intervenção tanto dos profissionais, como assistentes sociais, quanto do Estado, com políticas públicas que visem sanar essa realidade vivida por essas mulheres.
Palavras-chave: Violência doméstica; Pandemia; Serviço Social; Patriarcado; Desigualdade social. 
ABSTRACT 
This paper provides a comprehensive overview of the Covid-19 pandemic period and its impact on the social issues in the country, with a focus on the persistent domestic violence against women, recognized as a public health problem in a patriarchal/capitalist society that highlights gender inequality. The main objective is to highlight the role of social work in addressing domestic violence during the Covid-19 pandemic, emphasizing the challenges faced by professionals in a state with limited effectiveness in managing the health crisis and addressing violence. The methodology employed involved bibliographical and documentary research, providing the theoretical framework for the work. Patriarchy, as a system of male domination and female subordination, historically has generated inequalities, with domestic violence being a concrete manifestation of this phenomenon. The professional role of social workers is crucial, dedicated to understanding social relations and creating alternatives for safeguarding rights and confronting violence against women. Even in crisis situations, such as the pandemic, the search for coping strategies continues, considering that domestic violence against women is not a new issue for these professionals and should not be confined to the pandemic context. In conclusion, there is a need to raise awareness about the structural nature of violence against women and the requirement for strategic interventions from both professionals and the state through targeted public policies to address the reality faced by these women.
Keywords: Domestic violence; Pandemic; Social service; Patriarchy; Social inequality.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO	15
2 PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL: UMA VISÃO GERAL	21
2.1 Formas de enfrentamento à violência contra as mulheres na pandemia	28
2.2 A violência contra as mulheres em uma sociedade patriarcal e capitalista acirrada na pandemia	34
3 O CONTEXTO HISTÓRICO DO SERVIÇO SOCIAL, A SUA ATUAÇÃO NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DA PANDEMIA DE COVID-19	38
3.1 Como ações e retrocessos provocados pelo governo federal no enfrentamento da pandemia de Covid-19 afetaram a atuação profissional dos assistentes sociais	47
3.2 Dificuldades e desafios enfrentados pelos assistentes sociais no contexto pandêmico	50
4 VIOLÊNCIA DE GÊNERO, SERVIÇO SOCIAL E PANDEMIA	52
4.1 Aumento da violência contra as mulheres e atuação profissional para além da pandemia na sociedade patriarcal	59
5 CONCLUSÃO	71
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
	
1 INTRODUÇÃO
A violência contra as mulheres é histórica, e sua origem se expressa através de um sistema de dominação – subordinação que determina os papéis de cada sexo na sociedade de classes, a partir da subjetividade e comportamentos que devem ser obedecidos pelos homens, que, muitas vezes, são pais, maridos, irmãos, chefes ou conhecidos de forma geral. Nesse sistema desigual, as mulheres foram ensinadas a obedecer a seus maridos e a prezar pela família, se anulando, tudo em nome dela. Além disso, foram ensinadas a seguir o patriarcado, que é praticado de geração em geração, de maneiras diferentes, mas com a mesma finalidade: aprisionaras mulheres. Nessas sociedades, os homens também são ensinados a tratarem as mulheres como sua propriedade, a obedecerem às suas vontades, pois as consideram inferiores.
Contudo, surgi no Brasil em 2020, a pandemia de Covid-19, que inicialmente pouco se sabia sobre a mesma, suas implicações, impactos, contágio, questões que só foram possíveis de conhecer com o passar do tempo à medida que foi se confirmando como uma crise sanitária mundial preocupante causando impacto em todos os níveis da vida humana social, cultural, econômico e político. Nesse contexto, muitos meios de comunicação afirmaram que houve um aumento da violência doméstica contra mulheres, tendo em vista que alguns dados foram informados sobre o assunto nesse período, mostrando também que o motivo desse aumento estava relacionado com as medidas de prevenção da doença como o isolamento social, fez com que as mulheres permanecessem mais tempo no seu ambiente privado em convívio com seus companheiros. Além disso, mostrou-se que alguns serviços de atendimento as mulheres em situação de violência foram total ou parcialmente interrompidos, dificultando a rede de apoio e a procura por atendimento no âmbito da assistência social. Porém, a violência contra as mulheres é compreendida a partir do entendimento de estrutura da sociedade da qual fazemos parte, ou seja, esta que é patriarcal, racista, machista, capitalista, etc.
No entanto, nesse período de pandemia muitos profissionais, principalmente, da saúde, foram convocados a trabalhar na linha de frente, dentre eles os assistentes sociais, visto que são profissionais da saúde. Estes tiveram que atuar nas várias demandas que a pandemia apresentou e uma delas foi a violência doméstica contra as mulheres. Apesar da violência doméstica não ser uma demanda nova para esses profissionais, durante a pandemia e em meio a muitos desafios, eles tiveram que buscar novas alternativas para intervir e tentar garantir a proteção e a viabilização dos direitos destas mulheres.
A violência contra as mulheres é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como qualquer ato de agressão ou negligência à pessoa que produz ou pode produzir dano psicológico, sofrimento físico ou sexual, incluindo as ameaças, coerção ou privação arbitrária de liberdade, tanto em público como em privado. É o uso intencional de força ou poder em uma forma de ameaça ou efetivamente, contra si mesmo, outra pessoa, grupo ou comunidade, que ocasiona ou tem grande probabilidade de ocasionar lesão, morte, dano psíquico, alterações do desenvolvimento ou privações (BRASIL, 2011).
A violência contra as mulheres é permeada por vários aspectos físicos, econômicos, culturais, psicológicos e sexuais, e considerada como um problema de saúde pública com múltiplas causas e com diferentes manifestações constituindo-se assim, uma violação de direitos humanos. A violência doméstica contra mulheres assumiu formas e conteúdos diversos em diferentes sociedades e contextos históricos. É um fenômeno que transcende ao tempo e ao espaço geográfico. Acomete diferentes culturas e classes sociais, ainda que seu impacto possa ser sentido com maior vigor nos grupos considerados vulneráveis e em países periféricos ao desenvolvimento capitalista mundial. 
O debate sobre esse tema é de grande relevância e apesar da pandemia evidenciá-la, este é um problema que se propaga desde muito tempo e as taxas de criminalidade, acidentes e violências contra as mulheres em todos os níveis cresceram exponencialmente, em todo país, tornando-se assunto emergente para os estados e municípios, que muitas vezes não conseguem dar respostas eficazes a população, tanto no que diz respeito à prevenção quanto na coerção do crime e da violência. Apesar das conquistas e avanços sociais garantidos pelos movimentos feministas e por várias leis como a Lei n. 11.340/06 (Lei Maria da Penha), a violência doméstica e familiar continua sendo uma difícil realidade para muitas mulheres no Brasil.
Neste trabalho será realizada a discussão de quais foram os problemas e dificuldades enfrentados pelos/as assistentes sociais no enfrentamento da violência doméstica contra as mulheres em sua atuação profissional no contexto da pandemia de Covid-19. Assim como também tem como objetivo abordar o contexto da pandemia de Covid-19, a atuação profissional dos assistentes sociais no enfrentamento a violência doméstica contra as mulheres nesse período e como as ações do governo dificultou a eficiência do trabalho desses profissionais, diante de uma situação de crise sanitária que afetou toda a sociedade. Entretanto, em um contexto tão difícil, o Estado brasileiro se mostrou pouco eficiente, pois com suas ações pouco conseguiram proporcionar melhores resultados para o combate de atos violentos contra as mulheres, visto que temos uma lei como a Maria da Penha na qual a sua aplicação determina punição a quem comete violência doméstica e proteção à parte violentada. Faltou ao poder público agir com mais responsabilidade e possibilitar ações concretas na criação de projetos, que dê segurança às mulheres que são agredidas por seus companheiros, por meio das políticas públicas serão efetivas, na medida em que privilegiem ações na construção de redes de atenção, na qual se possa debater, deliberar e construir novas sociabilidades em defesa da vida e da emancipação humana. Para apresentar tais discussões a metodologia utilizada para a realização deste trabalho será a de pesquisa bibliográfica e documental, descritiva e explicativa onde foi buscado em livros e pesquisas realizadas no ambiente virtual, além de artigos científicos, os elementos necessários para a pesquisa. 
Contudo, inicialmente será apresentada neste trabalho uma visão geral da pandemia no Brasil, como foram realizadas as primeiras medidas de prevenção e os primeiros casos da doença, o posicionamento negacionista e quais medidas foram tomadas pelo governo Bolsonaro para o enfrentamento da pandemia, como também os impactos sociais e econômicos gerados por ela. Além disso, para trazer uma realidade mais próxima do contexto pandêmico, será apresentado um recorte do enfrentamento da pandemia no estado de Alagoas. 
Como a pandemia intensificou ainda mais problemas sociais no país, dentre eles o da violência doméstica contra as mulheres, na item 2.1 será apresentado como se deram as formas de enfrentamento analisando as medidas adotadas pelo governo federal e a eficiência e efetividade ou não desses mediadas, bem como analisar também a grande mobilidade por parte dos movimentos sociais e feministas e de empresas privadas, provando que mesmo diante de uma pandemia e de um governo limitado, houve tentativas de resistência, solidariedade e de luta pela causa das mulheres. 
No item 2.2 será apresentado que a sociedade patriarcal e capitalista na qual vivemos reafirma a naturalização da desigualdade de gênero e da exploração, e no contexto da pandemia esses sistemas evidenciaram ainda mais essa desigualdade. Na pandemia além das mulheres vivenciarem as violências desde muito tempo, houve também a preocupação com a doença. Nesta sociedade as mulheres são submetidas a vários tipos de violência, e o modo de produção capitalista reafirma e amplia a submissão imposta às mulheres. O trabalho proveniente desse modo de produção baseado na divisão sexual do trabalho, mostra que o trabalho feminino é desvalorizado enquanto o masculino não, cabendo assim, aos homens o trabalho produtivo, formal enquanto as mulheres são responsáveis pela reprodução social, trabalho considerado improdutivo, informal e o doméstico, sendo este último considerado uma atividade natural imposta as mulheres. Por mais que a condição das mulheres tenham evoluído em relação ao mercado de trabalho, ser mulher ainda significa estar sob domínio das forças de uma sociedade patriarcal que foram intensificadas pelo modo de produção capitalista. Obviamente a pandemia contribuiu tanto para sobrecarga da jornada de trabalho quanto para as violências vividas no espaço privado na vida de muitas mulheres. 
Na segundaseção serão apresentadas as mudanças da atuação profissional a partir de um contexto histórico em que os profissionais do Serviço Social em um primeiro momento vai atender as demandas do período da autocracia burguesa com a prática profissional tradicional, assistencialista, mas que no decorrer do tempo com as modificações da sociedade vão surgir novas demandas que vão passar a exigir um perfil profissional mais moderno e com isso o Serviço Social se insere no campo universitário e entra no período de Renovação do Serviço social para romper com a prática tradicional da profissão surgindo assim, um profissional mais crítico. Os profissionais mais críticos se mostram ainda mais comprometidos com os interesses da classe trabalhadora e se preocupam em intervir nas expressões da questão social mesmo considerando situações de emergência ou de crise como a pandemia.
Sendo assim, o contexto pandêmico vai apresentar várias demandas ao Serviço Social dentre elas a violência doméstica contra as mulheres. Contudo, como os assistentes sociais tem um direcionamento de formação e prática profissional críticos, irão atuar articulando as dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa que proporciona a capacidade de lidar com as demandas apresentadas na sociedade, mais precisamente na pandemia. Além disso, será mostrada a importância desses profissionais, sobretudo no campo da saúde atuando em equipes multidisciplinares em situações de crise como a pandemia, pois o código de ética da profissão vai afirmar isso. Ainda nesta seção, será enfatizado que a intervenção profissional não se restringe apenas as situações de crises, será mostrado também a importância da atuação profissional na gestão dessas situações para que se possa compreender melhor a realidade dos indivíduos e suas vulnerabilidades, no caso de violência entender melhor a realidade vivida pelas mulheres nessas situações.
No item 3.1 será apresentada as ações limitadas e retrocessos causados pelo governo os quais afetaram o enfrentamento da pandemia e a atuação profissional dos assistentes sociais. Desde o governo de Michel Temer o país já sofria com contrarreformas, principalmente, na política de saúde, com as privatizações e no governo de Jair Bolsonaro a situação continua com um agravante o contexto pandêmico. Na conjuntura neoliberal as políticas sociais foram os principais alvos de contrarreformas e com as privatizações os serviços públicos foram precarizados, visto que a classe trabalhadora é afetada por não possuírem recursos para pagar por serviços privados de saúde, restando a ela o atendimento precarizado de serviços públicos. No período da pandemia houve desmonte da seguridade social, das políticas de saúde e assistência, da previdência social, estes, consequências de várias emendas constitucionais aprovadas pelo governo federal. E é nesse cenário que o serviço social é convocado a trabalhar e na condição de trabalhador da saúde, para intervir nas diversas situações em que os direitos aos indivíduos são prejudicados e/ou inviabilizados, mostrando o descomprometimento do Estado para com a sociedade no período de crise. 
No item 3.2 será apresentado alguns desafios e dificuldades enfrentados pelos assistentes sociais no contexto da pandemia, como por exemplo a falta de Equipamento de Proteção Individual (EPI), necessário para o atendimento, além das atribuições equivocadas feitas ao trabalho dos profissionais. No entanto, as ações do Conselho Federal de Serviço Social – CFESS no sentido de defender e conscientizar sobre o real trabalho dos assistentes sociais no âmbito da saúde na pandemia foi de grande importância. Sendo necessário também discutir o principal objetivo da atuação profissional na política de saúde refletindo sobre as prioridades e estratégias de ação. 
Na terceira seção será apresentada como se dá a discussão de gênero em uma sociedade patriarcal, como se constrói o papel do feminino e do masculino e os principais fatores para que as mulheres permaneçam em uma relação abusiva, sem conseguir rompê-la. Além disso, compreender que a violência de gênero não é sinônimo de violência doméstica, que a primeira engloba a segunda e que ela é produzida e reproduzida nas relações de poder. E também contextualizar como no período da pandemia o serviço social tentou manter seu comprometimento com o enfrentamento da violência doméstica mesmo com os desafios postos ao seu trabalho os profissionais tentaram achar alternativas para atender estas e outras demandas diante do enfraquecimento das políticas sociais.
E por fim, será apresentado dados do aumento da violência doméstica contra as mulheres a partir do contexto da pandemia e como esta questão está associada a sociedade patriarcal. Destacando como foram importantes para o enfrentamento da violência a criação de instituições, leis e documentos, estes criados ao longo dos anos, mas que apesar disso, dados mostraram que na pandemia houve um verdadeiro descaso em relação as políticas públicas para as mulheres, mostrando a omissão do Estado em atuar mais efetivamente na questão. No entanto, o Serviço Social sempre esteve comprometido com a violência doméstica que ultrapassa o contexto da pandemia, tanto do ponto de vista teórico quanto metodológico em seus diversos espaços sócio-ocupacionais buscando estratégias de intervenção. Isso pode ser reafirmado com as ações e mobilizações do Conselho Federal de Serviço Social - CFESS e Conselho Regional de Serviço Social - CRESS com o intuito de garantir a defesa dos direitos cobrando do governo uma melhor efetividade das políticas sociais para mulheres, além da preocupação relacionado ao exercício profissional e a autonomia dos assistentes sociais, principalmente na pandemia, onde muitas vezes suas atribuições e competências foram compreendidas de forma equivocada e também promover a qualidade dos serviços prestados à sociedade.
 
2 PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL: UMA VISÃO GERAL
Nesta primeira seção será apresentada uma visão geral do período da pandemia de Covid-19, quando se iniciou, quais as primeiras medidas realizadas para conter a propagação do vírus, quais foram as ações do governo e ao mesmo tempo o seu negacionismo em relação a doença. E para trazer uma realidade mais próxima desse período será apresentado um pouco do posicionamento do governo de Alagoas no enfrentamento dessa pandemia. 
A pandemia da Covid-19 apresentou-se como um dos maiores desafios de crise sanitária do mundo, ao mesmo tempo que intensificou vários problemas existentes no Brasil, desigualdade social, desemprego, violência, pobreza são alguns deles. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em dezembro de 2019, foi informada sobre vários casos de pneumonia na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China. Tratava-se de uma nova cepa (tipo) de coronavírus que não havia sido identificada antes em seres humanos. Em janeiro de 2020, uma semana depois, as autoridades chinesas confirmaram que haviam identificado um novo tipo de coronavírus. 
Segundo a OMS os coronavírus estavam por toda parte, e eram a segunda principal causa de resfriado comum e, até as últimas décadas, raramente causavam doenças mais graves em humanos do que o resfriado comum. O novo coronavírus é responsável por causar a Covid-19 (no início foi temporariamente nomeado 2019-nCoV e, em fevereiro de 2020, recebeu o nome de SARS-CoV-2). Em janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto do novo coronavírus constituiu uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), o mais alto nível de alerta da Organização, conforme previsto no Regulamento Sanitário Internacional. Em março de 2020, a Covid-19 foi caracterizada pela OMS como uma pandemia. 
Inicialmente, pouco se sabia sobre o novo coronavírus, sobre sua alta velocidade de contaminação e de provocar várias mortes, principalmente, em regiões mais vulneráveis, como também geraram dúvidas sobre quais seriam as melhores formas para o seu enfrentamento. No Brasil, os desafios foram ainda maiores, “num contexto de grande desigualdadesocial, com populações vivendo em condições precárias de habitação e saneamento, sem acesso sistemático à água e em situação de aglomeração” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p.1). 
No entanto, algumas medidas precisariam ser tomadas em todo mundo para começar a conter a transmissão do vírus. Uma das primeiras medidas foi monitorar/bloquear a entrada de passageiros/turistas de outros países com o fechamento de aeroportos. Na ocorrência de uma alta contaminação do novo coronavírus “o objetivo era ter uma atenção maior aos grupos de alto risco de contaminação aonde pudessem presentar quadros clínicos graves e ter atenção também em relação ao isolamento dos casos confirmados, essa medida seria denominada de “isolamento vertical” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p.1), ou seja, apenas as pessoas do grupo de risco ficariam em casa. 
No caso da Covid-19, o grupo de risco é formado por idosos e pessoas com doenças como diabetes, hipertensão (pressão alta), problemas cardíacos, obesidade e outras doenças que afetam os sistemas respiratório, imunológico ou neurológico. Neste caso, só os jovens poderiam circular normalmente. Durante muito tempo na pandemia da Covid-19, a OMS foi contra essa forma de isolamento, uma vez que os jovens poderiam contrair e transmitir a doença para os mais vulneráveis e o número de contaminados poderia aumentar rapidamente. Além disso, “começa com o cancelamento de grandes eventos, seguido paulatinamente por ações como a suspensão das atividades escolares, proibição de eventos menores, fechamento de teatros, cinemas e shoppings, recomendações para a redução da circulação de pessoas” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p. 2). Caso as medidas anteriores não conseguissem ser efetivas, seja porque sua implementação não pôde ser concretizada de forma adequada e imediata “[...] (ex.: insuficiência de testes necessários para identificar indivíduos infectantes logo no início da epidemia) ou porque a redução alcançada na transmissão foi insuficiente para impedir o colapso na atenção à saúde” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p. 2), seriam implantadas medidas mais radicais de distanciamento social de toda a população. Nesse momento o objetivo seria adiar ao máximo o número de casos, “por tempo suficiente até que a situação se estabilizasse no campo da assistência à saúde, procedimentos de testagem pudessem ser ampliados e, eventualmente, alguma nova ferramenta preventiva eficaz (ex.: vacina) estivesse disponível” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p. 2). Nesta fase ocorreria o que seria denominado de “isolamento horizontal”, o qual todos deveriam permanecer em casa, limitando ao máximo o contato entre as pessoas, evitando que a doença se espalhasse. Esta medida apontaria divergências por parte do governo brasileiro, pois, apesar de causar impactos graves na economia, seria essencial para evitar um aumento descontrolado dos casos da doença e o colapso no sistema de saúde, o que também causaria danos à economia.
Durante o lockdown (palavra em inglês “bloqueio” ou “confinamento”), somente os trabalhadores de áreas essenciais, como saúde, segurança, farmácias e supermercados poderiam continuar circulando. Esse processo seria importante para que houvesse a diminuição da epidemia e o número de casos se tornasse residual. Além disso, seria necessária “uma organização da sociedade para a reestruturação social e econômica do país. E, certamente, intervenção do Estado” (VERNECK, CARVALHO, 2020, p. 2). 
As formas de enfrentamento de Covid- 19 pelos governos se revelaram desde posições sérias, até posturas negacionistas, ultra neoliberais, que nitidamente menosprezaram o sofrimento das famílias acometidas pela doença. O governo federal brasileiro não reconheceu a imensidão do problema, renegou seus efeitos sobre a classe trabalhadora mais exposta à contaminação, estimulou parte da população com posturas individualistas e contra as medidas sanitárias e incentivou ao uso de medicamentos sem eficácia comprovada (cloroquina e hidroxicloquina[footnoteRef:1]). [1: A hidroxicloroquina e cloroquina são medicamentos de uso controlado que tem efeito imunomodulador —fornecem aumento da resposta imune contra determinados microrganismos—, e por isso é usada para tratar doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide. ] 
Em fevereiro de 2020 foi registrado o primeiro caso de Covid- 19 no país, um homem de 61 anos que havia dado entrada no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, com histórico de viagem para Itália, de acordo com o Sistema Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS, 2020).  No início do mês de março, foi confirmada a primeira morte pela doença, uma mulher negra, empregada doméstica de 57 anos, também em São Paulo (CNN BRASIL, 2020). Neste mesmo mês o Ministério da Saúde através do então ministro Luiz Henrique Mandetta, posicionou-se de acordo com as orientações da OMS ao adotar o isolamento social com o objetivo de evitar uma maior contaminação, embora em desacordo com o presidente Jair Bolsonaro, que defendeu o isolamento somente para o grupo de risco, do já citado “isolamento vertical”. 
As declarações e a conduta do presidente Jair Bolsonaro em relação à pandemia não foram bem vistas pelo mundo. Desde o início da crise sanitária, o presidente adotou discurso negacionista e postura não empática e também irresponsável em relação aos impactos da Covid-19 no país. Para Bolsonaro, o que havia era um alarmismo sobre a pandemia, o novo coronavírus era apenas uma “gripezinha” e toda a preocupação da população e as medidas para conter o vírus não passavam de "mimimi". Somam-se a isso a propaganda anti - vacina e a aposta em medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da doença, fez também críticas ao uso de máscaras, medida com eficácia comprovada, defendida por especialistas de todo o mundo e reforçada pela OMS. 
No Brasil, houve uma rejeição da postura pró-saúde com a tomada de providências ativas para desmontar as infraestruturas de saúde pública, justificando a redução de recursos pela suposta priorização da economia. O posicionamento político do Estado brasileiro em relação ao período da pandemia levou a uma má efetivação do direito à saúde diante da Covid-19, negligenciando os cuidados e o acesso a recursos de saúde com a indução da escassez de fornecedores, equipamentos e suprimentos, até mesmo de oxigênio. Além do mais, ocorreu ainda “a desaprovação dele as diversas medidas adotas por outros governos para o enfrentamento da Covid-19, como o isolamento social, fechamento do comércio e paralisação do transporte público”, (LOPES, LEAL, 2020, p. 264). Um outro fator complicador durante esse período na gestão do enfrentamento à pandemia foram as trocas de ministros da saúde, principalmente nos primeiros meses, foram três entre fevereiro e maio, e um dos motivos destaca-se a promoção por parte do presidente da cloroquina e hidroxicloroquina que não tinham comprovação cientifica. 
Contudo, durante o período de pandemia o índice de desemprego aumentou, a Agência Brasil (2021) publicou através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2021), que o número de desempregados tinha ultrapassado 14 milhões, muitas pessoas perderam seus empregos, e famílias em vulnerabilidade passaram a ficar sem renda para suprir o mínimo necessário para sua subsistência. 
No entanto, o governo federal criou um programa de renda mínima chamado Auxílio Emergencial[footnoteRef:2] para tentar atenuar a crise econômica decorrente dos efeitos causados pela pandemia, aonde foi direcionado para famílias inseridas no Cadastro Único ou que recebiam o Bolsa Família, microempreendedores individuais, trabalhadores informais com baixa renda e contribuintes individuais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), (ARAÚJO). Posteriormente, a Caixa Econômica Federal desenvolveu um aplicativo chamado Caixa Auxílio Emergencial [footnoteRef:3]para que os indivíduos acompanhassem o cadastro e aprovação das parcelas (ARAÚJO). Porém, a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar(Rede PENSSAN, 2021) realizou um inquérito sobre Insegurança Alimentar no contexto da pandemia da Covid- 19 e indicou que que até dezembro de 2021, 19 milhões de brasileiros passaram fome ou enfrentaram algum grau de insegurança alimentar. Quando o governo diminuiu o valor do auxílio emergencial a situação piorou, e com difíceis condições de arrumar um emprego, restou aos indivíduos se inseriram no trabalho informal, precário ou mal remunerado. [2: Inicialmente o Ministro da Economia, Paulo Guedes em articulação com o governo federal apresentaram a proposta de implementar o programa temporário no valor de R$ 200,00 reais, proposta esta que sofreu várias críticas por alguns setores e pela sociedade, pois indicavam que o valor era insuficiente para suprir as necessidades básicas da população, assim o congresso ampliou o valor através da aprovação do projeto de lei, onde foi publicado no dia 02 de abril de 2020 a Lei de n° 13. 982 que instituiu o valor de R$ 600,00 reais durante um período mínimo de três meses. No dia 02 de setembro de 2020 o governo anunciou a prorrogação do auxílio até o final deste mesmo ano através da Medida Provisória n° 1000, mas agora no valor de R$ 300,00 reais. O valor das quantias distribuídas em 2021 foi diminuído para R$ 150,00 por mês para famílias compostas por uma pessoa e R$ 250,00 para famílias formadas por mais de uma pessoa. Caso a família fosse chefiada por mulheres sem cônjuges ou parceiros, apresentando ao menos uma pessoa menor de idade, a parcela em questão foi de R$ 375,00. No entanto, ainda no primeiro semestre de 2021, foi aprovado mais um Projeto de Lei 1.409/21 para elevar novamente o valor do auxílio emergencial para R$ 600,00 reais. ] [3: Com este aplicativo muitas pessoas relataram problemas técnicos na utilização, e muitas só conseguiram meses depois, e algumas não conseguiram, pois boa parte da população não tinha sequer um celular. Além disso, pela falta de informações adequadas parte da população se dirigiu à Caixa Econômica para tirar dúvidas e sacar o dinheiro, o que gerou filas, aglomerações e novas contaminações pela Covid- 19.] 
No início do ano de 2020, na gestão do então ministro da saúde Eduardo Pazuello, as informações sobre a divulgação do número de casos e de óbitos decorrente da doença passaram a ficar restritos, pois o Ministério da Saúde passou a divulgar em um horário que a maioria dos canais de TV aberta não poderiam divulgar durante o dia, e os dados passaram a ser fornecidos incompletos pelo governo, com omissões de números confirmados da doença, tabelas de quantitativos e mortes por data de notificação. Dessa forma, foi estabelecida uma parceria entre os veículos de imprensa denominado Consórcio de Veículos de Imprensa (CVI), formado pelo O Estado de S. Paulo, G1, O Globo, Extra, Folha de São Paulo e UOL com o objetivo de informar dados da pandemia de COVID-19 no Brasil. Em janeiro de 2021, o Consórcio criou, antes do Governo Federal, uma campanha publicitária estimulando a vacinação contra a Covid-19, intitulada “Vacinação. Brasil imunizado somos uma só nação”. Isto mostrou a falta de compromisso por parte do governo com a sociedade num período em que o país vivia uma das maiores crises sanitárias. 
Em relação aos estados do país no enfrentamento a pandemia, Santana e Perez (2020) destacou que: 
A ausência de coordenação por parte do governo federal e as orientações controversas do Ministério da Saúde, bem como as atitudes do presidente Bolsonaro, limitou uma atuação mais coordenada no âmbito estadual entre prefeitos e governadores no enfrentamento à pandemia de Covid-19 (SANTANA, PEREZ, 2020).
 Mas, ao mesmo tempo, os governos estaduais tiveram espaço para protagonizar ações mais coordenadas no âmbito regional. Dessa forma, trago como exemplo um recorte do período da pandemia no estado de Alagoas para apresentar uma realidade mais próxima, o qual informou que o primeiro caso de contaminação no dia 8 de março, tratava-se de um alagoano residente na capital com histórico de viagem recente para a Itália (G1 ALAGOAS, 2020). Em 31 de março de 2020 o então governador Renan Filho anunciou a primeira morte no estado por Covid- 19, um homem acreano de 64 anos de idade onde ficou internado em uma Unidade de Atendimento (UPA), em Maceió (G1 ALAGOAS, 2020). De acordo com o Ministério da Saúde (2020) o estado contabilizava 16 casos confirmados da doença. 
Nos primeiros meses as medidas adotadas pelo governo de Alagoas foram importantes para o planejamento de ações e estratégias de combate ao novo coronavírus. O estado tomou medidas em tempo hábil, apresentou alinhamento operacional entre governos estadual e municipal e disposição cooperativa entre estados e municípios, e tem priorizado ações de aporte científico e orientações da OMS (SANTANA, NASCIMENTO, 2020). No entanto, essas medidas não foram suficientes para conter o alto índice de contaminação e de óbitos nos primeiros meses, isso por causa das baixas taxas de isolamento social, principalmente na capital Maceió, o acesso e disponibilidade tardio a testes de Covid-19 por todo o país, e uma rápida expansão da doença nos municípios do interior, onde a maioria apresentava baixas condições socioeconômicas, mudando assim, o cenário do estado alagoano. 
Segundo Santana e Nascimento (2020): 
A expansão da pandemia para o interior do estado tornou-se particularmente preocupante, primeiro, em função da rede de interdependência econômica e social que liga os municípios e, depois, pelas próprias limitações estruturais destes municípios. A grande maioria dos municípios interioranos do estado de Alagoas são diretamente dependentes da rede de atendimentos hospitalares disponível na capital, à exceção de Arapiraca, por exemplo, segunda maior cidade do estado, visivelmente melhor equipada de aparelhos e insumos para o enfrentamento da pandemia (SANTANA, NASCIMENTO, 2020). 
Contudo, essas limitações puderam impactar, diretamente, o sistema de saúde do estado, além do agravamento da situação pela baixa cooperação do governo federal, isso porque ao invés de buscar cooperação dos entes federados, o presidente intensificou ataques aos governadores e prefeitos por adotarem medidas de distanciamento social e de bloqueio físico- algo que fizeram conforme orientações científicas e protocolos internacionais (SANTANA, PEREZ, 2020). 
Porém, apesar dos altos índices de casos e óbitos no estado, a taxa de leitos ocupados chegou a 95% em junho, e depois ocorreu uma diminuição dessa ocupação, chegando em julho a 66% dos leitos ocupados no estado alagoano (SANTANA, NASCIMENTO, 2020). Além disso, o governo alagoano foi estimulado a iniciar um processo de implantação de medidas de isolamento controlado e flexibilização das condições de segurança. Segundo Santana e Nascimento (2020) em 22 de junho de 2020, o governo emitiu um decreto n. 70145/2020 que aprovou um Plano de Distanciamento Controlado e posteriormente um decreto, para complementar ao Plano, o decreto n. 70177/2020, em 26 de junho que apresentou uma matriz de risco. 
De acordo com o Plano de Distanciamento Controlado foi apresentada a sua definição em cinco fases: 
As fases foram determinadas nas cores vermelha (risco elevado), laranja (risco moderado alto), amarela (risco moderado), azul (risco moderado baixo), e verde (risco controlado). Esta classificação leva em consideração três eixos estratégicos para orientar a tomada de decisões sobre a flexibilização de atividades e serviços do estado: 1) Utilização da Capacidade Hospitalar Instalada; 2) Taxa de ocupação de leitos; e 3) Evolução Epidemiológica dos casos (SANTANA, NASCIMENTO, 2020).
Passados alguns meses desde a decretação da pandemia pela OMS, não se podia imaginar quanto tempo iria durar, mas com as medidas necessárias poderia ter um certo controle em relação a expansão. No entanto, todos os estados estavam sofrendo pressão política quanto a flexibilização das atividades econômicas, principalmente por parte do governo federal. Mas, estados e municípios deveriam estar cientes sobre a importânciada priorização da saúde da população nesse momento inicial de alto contágio.
Além disso, em janeiro de 2021, a Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (SESAU) por meio da Superintendência de Vigilância em Saúde (SUVISA) apresentou o Plano Estadual de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, como medida de enfrentamento à Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII), mediante ações de vacinação nos 102 municípios alagoanos. A SESAU ainda destacou a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) nas ações de vacinação no Brasil tornando-o um país de referência mundial em saúde. Desse modo, a vacinação ocorreu de forma rápida no estado de Alagoas. 
Assim, Alagoas recebeu no início de 2021 a primeira remessa com 87.760 mil doses da CoronaVac, a vacinação aconteceu em 3 fases: 
1)Trabalhadores da saúde, indígenas e idosos com 60 anos ou mais que residem em albergues e asilos de Maceió e do interior; 2) idosos entre 60 e 74 e idosos com 75 anos ou mais e 3) pessoas com comorbidades (diabetes mellitus, hipertensão grave, doença Pulmonar obstrutiva Crônica (DPOC), doentes renais crônicos, cardiovasculares e cerebrovasculares, transplantados de órgãos sólidos, anemia falciforme, câncer e obesidade grave) (G1 ALAGOAS, 2021).
 Em Alagoas a primeira pessoa a tomar a vacina foi uma assistente social que trabalha no Hospital da Mulher, em Maceió (G1 ALAGOAS, 2021). De acordo com o Painel- Covid-19 em Alagoas da SESAU até 31 de dezembro de 2021, o estado de Alagoas registrou 241.978 casos e 6.494 óbitos da Covid-19. 
Pode-se dizer que o estado de Alagoas, buscou de alguma forma enfrentar a pandemia com medidas de enfrentamento, mesmo diante de todas as dificuldades, da falta de ações mais efetivas do governo federal e das mudanças que a pandemia causou na sociedade. Mas, a pandemia de Covid-19 no Brasil impactou não apenas a saúde humana, mas também outros importantes aspectos da vida social. Esse contexto colaborou em velhos fatores já existentes na sociedade como o desemprego, o acirramento da desigualdade de acesso a direitos, a perda da renda dos/as trabalhadores/as, um mercado de trabalho precarizado e caracterizado por forte instabilidade e pela informalidade, a violência contra as mulheres, bem como por um Estado pouco efetivo no enfrentamento dessa violência e da crise. 
 
2.1 Formas de enfrentamento à violência contra as mulheres na pandemia 
A pandemia da Covid- 19 colaborou ainda mais com questões sociais e econômicas em que o país vinha enfrentando antes dela, e uma dessas questões é o da violência doméstica contra mulheres. A violência contra as mulheres é estrutural e está presente na sociedade patriarcal que determina os papéis sociais que são atribuídos às mulheres a função da submissão ao homem. As mulheres são responsáveis pelo lar, pelo espaço privado, pelo trabalho doméstico, cuidado dos filhos, enquanto ao homem, o patriarcado designa o papel de provedor da família, responsável pela manutenção econômica, e pelo trabalho nos espaços públicos. De acordo com a Lei Maria da Penha, em seu art. 5º a violência doméstica e familiar contra as mulheres é qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (BRASIL, 2006).
A violência doméstica causa efeitos muito cruéis as mulheres, levando mesmo que de forma diferenciada, às violações de direitos, e até a morte, e durante pandemia houve um fortalecimento a exposição das mulheres nessas situações. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2020), “os casos de feminicídios cresceram 22,2% entre março e abril de 2020, em 12 estados do país” (FBSP, 2020, p. 2). O feminicídio constitui-se como todo homicídio praticado contra as mulheres por razões da condição do gênero feminino e em decorrência da violência doméstica e familiar, ou por menosprezo ou discriminação à condição de mulher. 
No entanto, o isolamento social prejudicou, em parte, a busca por ajuda, proteção e/ou apoio, uma vez que as atividades de algumas instituições foram total/parcialmente interrompidas enquanto outras mantiveram o atendimento no período da pandemia seguindo as medidas de proteção e isolamento. Pois, se por um lado, os serviços de proteção social, como por exemplo, “as unidades de assistência social que realizam diversas atividades educativas, recreativas ou de atendimento direto” (MESQUITA, SILVA, LEONCIO, 2021, p. 190), como os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), “os Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), além de espaços de acolhimento e escuta qualificada para as mulheres que buscam esses serviços, diálogo e proteção dos direitos sociais” (MESQUITA, SILVA, LEONCIO, 2021, p. 190), por um período tiveram seus atendimentos interrompidos temporariamente, por outro lado, hospitais, delegacias e Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMS), Defensorias Públicas, os Centros de Referência da Mulher e Casas Abrigo e de Passagem, etc., tiveram seus espaços de atendimento funcionando mantendo as medidas de proteção e isolamento social ou com atendimento remoto (FERREIRA, 2020). Além do mais, a ONU Mulheres lançou em julho de 2020 as “Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero Contra Meninas e Mulheres em Tempos da Covid-19”, contendo recomendações para os serviços e a rede de atendimento nesse período. 
Outros espaços coletivos de socialização também foram interrompidos parcial ou integralmente, “como as igrejas, creches e escolas, lugares nos quais as mulheres podem conversar, buscar orientações e encontrar apoio social, emocional e afetivo para se fortalecerem no rompimento com o ciclo de violência” (MESQUITA, SILVA, LEONCIO, 2021, p. 190). 
Porém, o governo federal de alguma forma buscou estratégias para tentar encontrar outras formas de proteção e atendimento para as mulheres que tivessem em situação de vulnerabilidade, de violência e/ou violação de direitos. 
Então, para o enfrentamento à violência doméstica contra mulheres, além das leis existentes já criadas pelo governo federal como exempolo: a Lei Maria da Penha, (Lei 11. 340/2006), a Lei Carolina Dieckmann (Lei Nº 12.737/2012), Lei do Minuto Seguinte (Lei Nº 12.845/2013) a Lei do Feminicídio (Lei N° 13.104/2015) e a Lei Joana Maranhão (Lei N° 12.650/2012) e dos canais de denúncias de violação dos direitos humanos e violência contra mulheres Disque 100 e Disque 180, em 2020, foram criadas campanhas do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (2020), que propôs o enfrentamento à violência doméstica durante o Covid-19 com medidas emergenciais como a criação do aplicativo “Direitos Humanos Brasil”, como forma de ampliação da rede de acolhimento e proteção dos direitos humanos para garantir em teoria a efetividade de políticas públicas no enfretamento a violência contra mulheres. 
Durante a pandemia a quantidade de denúncias de violência contra as mulheres recebidas na Central de Atendimento à Mulher, serviço do Governo Federal que auxilia e ajuda as mulheres em situação de violência através do número para denúncias 180, “entre março e abril teve um aumento de 27% nas ocorrências em relação a estes meses entre 2019-2020” (FBSP, 2020, p. 11). 
Uma outra medida para o enfrentamento da violência contra as mulheres foi criada pela junção do Conselho Nacional de Justiça (2020) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) que uniram forças para lançar em junho de 2020, a campanha Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica. O objetivo era incentivar denúncias por meio de um símbolo: ao desenhar um “X” na mão e mostrá-lo em farmácias, órgãos públicos e agências bancárias, a vítima poderia receber auxílio e acionar as autoridades. O Conselho e a Associação contaram ainda com o apoio do Tribunal​ de Justiça de Alagoas e do Conselho Regional de Farmácia de Alagoas, e o objetivo, segundo o (CRF/AL), era levar a campanha para cerca de 1.600 estabelecimentos no estado alagoano (TJ/AL, 2020).
Ainda no estado de Alagoas foram apresentadosalguns dados sobre a violência contra mulheres, que de acordo com o Mapa de Violência em Alagoas (2021), foram registrados 5.741 casos de violência doméstica em 2021, em 97 dos 102 municípios alagoanos. Foi verificado que as mulheres negras (somatório de pardas e pretas) são as principais vítimas de violência doméstica somando 4.231 casos com percentual de 74% dos casos registrados. Também em 2021 foram registrados 24 casos de feminicídio em Alagoas, sendo a capital, Maceió, o município com o maior número de mulheres assassinadas em razão do gênero. Nesse sentido, Maceió contabilizou seis casos e somou 25% deles. 
Contudo, apesar das medidas tomadas por parte do governo para o enfrentamento da violência contra as mulheres no período de pandemia, houve um aumento dessas violências, apesar de nesse período alguns serviços essenciais de atendimento foram total/parcialmente interrompidos, e a resposta do governo federal para o aumento da violência contra as mulheres na pandemia, foi o desfinanciamento da pauta, mostrando que os esforços no enfrentamento refletiram na falta de comprometimento na gestão do governo Bolsonaro com a vida das mulheres. Mas, essa bandeira da violência contra as mulheres foi assumida de forma ainda mais determinante pelos movimentos feministas para poder criar condições para o enfrentamento dessa violência nesse período de crise. 
Contudo, pode-se dizer que o contexto pandêmico, foi contraditoriamente “favorável” à violência contra mulheres, pois ao mesmo tempo que estas sofreram com a crise, a vulnerabilidade em seus lares, com intensificação da sobrecarga de trabalho entre outras coisas, foi possível observar iniciativas relevantes dos movimentos sociais, em específico os feministas, lutando tanto no sentido da resistência política como na luta pela saúde, manutenção da vida e pela própria violência sofrida pelas mulheres. Mesmo em tempos de pandemia com distanciamento social, os movimentos feministas buscaram formas de continuar articulando ações de luta e solidariedade, principalmente para mulheres. Pode-se destacar como exemplo a Marcha Mundial das Mulheres (MMM) que teve sua iniciativa no Brasil desde os anos 2000 com ações voltadas para mudar o mundo e a vida das mulheres em um só movimento. Mas, que durante a pandemia teve que se apoiar mutuamente na apropriação de ferramentas online, com a criação de sites, companhas de arrecadação financeira e fortalecimento de iniciativas para economia solidária, realizando reuniões e ações de mobilização no contexto online (MMM, 2020). Entre os atos e manifestações políticas, há desde lutas específicas das mulheres, como o combate à violência de gênero e as pautas históricas dos 8 de março, até a união em reivindicações concernentes à população brasileira, especialmente à classe trabalhadora, como a implementação e ampliação do auxílio emergencial, e vacina para todas as brasileiras e brasileiros (MMM, 2021). Além disso, fizeram a articulação para realizar ações de solidariedade, como a distribuição de cestas básicas a população mais pobre, estimulando ainda as iniciativas de capacitação e geração de renda para mulheres em situação de extrema vulnerabilidade social, prostituição e/ou violência doméstica. 
A Marcha Mundial das Mulheres é um movimento que tem realizado ações em vários estados do país mesmo antes da pandemia, e durante seu período tornou-se ainda mais evidente a necessidade de que a sustentabilidade da vida e a solidariedade sejam postas como centrais. 
A garantia das condições materiais de vida da população, tanto na esfera produtiva como reprodutiva, passa por construir ações concretas: tanto no âmbito coletivo e estrutural, colocando a economia a serviço da vida, quanto no âmbito individual, para que combater a miséria, a pobreza, a fome, o excesso de trabalho (dentro e fora de casa), a precariedade do sistema público e gratuito de saúde e o aumento da violência (MMM, 2020).
Além disso, no período da pandemia, algumas empresas privadas reforçaram campanhas sobre a violência contra as mulheres como exemplo, a Natura que lançou em novembro de 2021 a campanha “21 dias de ativismo: pelo fim da violência contra a mulher atentando para a urgência da mobilização coletiva para mudar essa realidade”. Como também a campanha pelo fim da violência contra as Mulheres, do Instituto Avon, #IsoladasSimSozinhasNão, criado em 2020 e reforçado na pandemia. A Avon que tem o Fórum Fale Sem Medo aonde são realizados eventos para discutir sobre as violências contra as mulheres e meninas, promove campanhas ao longo dos anos como a “Você não está sozinha”. Estas ações podem tentar ajudar a mudar o cenário de violência e desigualdade em que as mulheres estão inseridas. Sendo assim, o fato dessas empresas falarem sobre o tema, conscientizar e oferecer uma rede de apoio para acolher e fortalecer as mulheres são elementos importantes no enfrentamento à violência contra mulheres. Como da mesma forma, podem tentar viabilizar condições de trabalho que assegurem maior qualidade de vida e contribuam para reduzir a desigualdade de gênero.
 No contexto de pandemia, crise econômica, violência e intensificação da sobrecarga de trabalho das mulheres, iniciativas do setor público como do setor privado são relevantes, visto que a pandemia trata-se de um momento histórico, de aprofundamento de crises que tem colocado em evidência ainda mais as desigualdades e os problemas sociais que existem e persistem no Brasil. Em paralelo, também pudemos viver o autoritarismo embutido no governo Bolsonaro, que ameaçou, atacou e criminalizou as lutas sociais e populares necessárias como a luta das mulheres nos movimentos feministas por direitos, contra as violências e retrocessos. Nesse período o cenário de atuação política os movimentos sociais tiveram que se reinventar com novas metodologias e estratégias de fortalecimento da militância, como também, para apoiar acolher e fortalecer as redes de solidariedade e ações de autocuidado e cuidado coletivo, tendo que respeitar o distanciamento social e enfrentando ainda a ofensiva conservadora autoritária ultraliberal e os retrocessos dos direitos conquistados.
Entretanto, além da limitação por parte do governo em buscar ações mais efetivas de enfrentamento da Covid-19, no Estado brasileiro existem grupos racistas, misóginos, que fazem apologia à violência, que defendem a repressão militar, que vai atingir a população negra, pobre e periférica e que aderem a religião da direita cristã onde prega hierarquias de gênero, raça e sexo controle sobre os corpos e a sexualidade das mulheres e imposição de um modelo único de família patriarcal heteronormativa. 
No entanto, a crise econômica estava posta antes mesmo da pandemia e se aprofundou com a desorganização do Estado e supostas medidas para enfrentar a crise da pandemia em que foram transferidos recursos públicos para bancos privados. Todas essas situações afetam diretamente as mulheres, porque a reforma neoliberal tem na moralidade e na família tradicional patriarcal a tarefa de substituir o papel do Estado e das políticas de bem-estar social. O mercado privatizou serviços essenciais do Estado e responsabilizou os homens como, “provedores da família”, a arcar com os custos de serviços básicos como educação, saúde e de cuidado com os dependentes que entre eles, são as mulheres. Por isso, a moral cristã reforça a ideia do modelo de família hierárquica, heteropatriarcal. E as pessoas mais afetadas e que estão mais vulneráveis diante de um Estado com ações limitadas, são as mulheres e homens negros, mulheres, homens e crianças indígenas, minorias étnicas e população pobre, sem acesso a bens básicos. 
Quando se observa o discurso bolsonarista, além de ser antidemocrático, vemos discursos de ódio, de desprezo ao povo pobre, racista, sexista, de superioridade masculina e subordinação das mulheres a papeis de gênero tradicionais e a naturalização da violência. 
A pandemia gerou impactos em todos os níveis da nossa vida. É uma questão de saúde que atravessa todos os níveis da sociedade:social, cultural, político, jurídico, econômico, porque, na realidade, a pandemia de Covid-19 é um problema do capitalismo global, que escancara todos os danos causados por esse modo de produção de vida, e a violência contra as mulheres é um desses danos; um problema de saúde coletiva e pública que afeta diferentemente as feminilidades: das mulheres com deficiência, das comunidades rurais e periféricas, quilombolas e indígenas, das mulheres negras e não negras, das mulheres em situação de rua, encarceradas, das mulheres trans, travestis, das mulheres em territórios criminalizados (GOMES, CARVALHO, 2021, p. 5).
A violência contra as mulheres trata-se, na realidade, de um fenômeno próprio das sociedades patriarcais, as quais estabelecem uma relação de dominação-subordinação entre homens e mulheres. A desigualdade de gênero passa, assim, a ser um dos eixos estruturantes da sociedade, entrelaçando-se com a de raça e a de classe, que quando juntas complexificam-se e, e de forma separada apresentam especificidades. Só poderia haver, assim, uma libertação, emancipação e empoderamento das mulheres se houvesse a superação desta estrutura patriarcal, racista e capitalista.
2.2 A violência contra as mulheres em uma sociedade patriarcal e capitalista acirrada na pandemia 
O patriarcado na pandemia revelou sua face mais perversa, pois a aflição pela vida sentida pelas mulheres revela que, além do vírus, elas conviveram com as múltiplas expressões de violência radicadas na desigualdade de sexo/gênero. Situação essa que coloca em risco a vida de milhares de mulheres todos os dias. 
Se pensarmos quais são os fundamentos da última instancia da violência que é o feminicídio eles recaem nas relações desiguais entre sexo/gênero, onde o feminicídio se classifica como um crime hediondo onde sua motivação é o ódio ao gênero feminino. E a sua materialidade diz respeito ao conjunto de valores sociais, morais, econômicos, culturais, raciais e geracionais que atribuem a sociabilidade capitalista o lugar de menor valor, às mulheres, visto que a soberania e a supremacia são do sexo/gênero masculino, consolidando essas relações patriarcais, ou seja, um sistema social em que os homens exercem e mantêm poder e soberania em todas as esferas da vida social. 
Considerando o patriarcado anterior ao capitalismo, ele se uni intimamente ao modo de produção capitalista, visto que se funde a esse modo de produção e como tal, “ao se fundir com o patriarcado, acirra o antagonismo presente nesse sistema de dominação – exploração tomado muitas vezes isoladamente” (SILVA, ibidem, p. 28 apud p. DINIZ, 2021, p. 50). Portanto, [...] “a subordinação da mulher se manifesta no sistema patriarcado se acirra no capitalismo, mas tem um grau de profundidade no contexto do contrato homem/mulher por envolver questões afetivo-emocionais entre seres que supostamente deveriam ser iguais” (DINIZ, 2021, p. 51). A violência contra as mulheres pode ser inerente aos dois sistemas, pois ambos se complementam e tem características parecidas relacionadas à dominação – exploração. 
O acirramento da subordinação das mulheres se aprofunda segundo Diniz (2021, p. 51), “através do Estado Neoliberal que tem em sua lógica na intervenção mínima do Estado no social o que, em outras palavras, significa menos recursos para as políticas públicas, especialmente voltadas para o setor feminino”. 
Ainda conforme Diniz (2010, p. 53): 
Vivemos numa sociedade capitalista, atravessada pelo sistema patriarcado, divididas em classes antagônicas, que aprofunda e reproduz todo tipo de violência. São várias as formas e faces da violência reproduzidas: exploração e dominação de classe, gênero e raça, violência física, psicológica, sexual, moral praticadas no cotidiano, tanto por homens quanto por mulheres... (DINIZ, 2010, p. 53).
No caso da pandemia, o Covid-19 evidencia os limites do capital e da teoria neoliberal do Estado Mínimo, e ao mesmo publicita marcas das desigualdades entre sexos/gêneros, que antecedem sua origem, mas que comprova o quanto o “lugar da mulher” na sociedade constitui-se entre velho e novo, ou seja, ao mesmo tempo em que elas incorporam grande quantitativo da frente responsável pelo combate à pandemia, no que diz respeito aos cuidados relativos à saúde, uma parcela considerável dessa população em confinamento forçado, corre o risco de morte. Trata-se do paradoxo de um mundo em que embora sejam reconhecidamente úteis ao capital e sua reprodução, são também passíveis de execução por sua condição de gênero.
A violência contra as mulheres em espaços públicos e privados é uma realidade ainda pouco enfrentada e combatida pelo poder público. O confinamento forçado instigou diversas frentes feministas na denúncia da falta de equipamento público de atendimento e serviços para esse fim. O risco de possíveis casos de violência e morte em âmbito privado de mulheres colocou em situação de alerta as medidas de prevenção ao vírus.
Na pandemia algumas formas de acesso a serviços essenciais bem como de proteção foram dificultadas e com isso as mulheres se viram em uma situação de vulnerabilidade, visto que a presença do homem no espaço privado não significa cooperação e distribuição harmônica das tarefas do lar, mas sim o aumento do trabalho não remunerado e invisível das mulheres, reafirmando as relações patriarcais, de desvantagens para as mulheres. Contudo, “o capitalismo apropria-se da suposta desvantagem feminina, diante da construção social e histórica da condição de subordinada da mulher para tê-la como presa mais fácil da exploração” (DINIZ, 2010, p. 52).
Entretanto, o modo de produção capitalista construiu-se sobre a separação dos lugares, tempos da produção e da reprodução, em que aos homens coube o trabalho produtivo, assalariado, e às mulheres, o trabalho reprodutivo, aquele realizado no domínio doméstico e que abrange as tarefas relativas à reprodução da força de trabalho e este é muito importante para o capitalismo. Assim, o trabalho doméstico foi transformado em uma atividade natural em vez de ser reconhecido como trabalho, porque foi destinado a não ser remunerado e acaba sendo uma das bases da problematização das relações desiguais de gênero. 
Fazer essa associação entre as mulheres e o trabalho doméstico dificulta a inserção das mulheres no mercado formal de trabalho bem remunerados e quando não conseguem esse tipo de trabalho resta a elas atividades que não são consideradas produtivas ou não são vistas como tal, considerando-as como sujeitos improdutivos. Essa desvalorização do trabalho feminino pode flexibilizar as leis trabalhistas e acaba por gerar desproteção social para essas mulheres. 
No modelo de sociedade que vivemos, na qual a desigualdade social e a precarização do trabalho se fazem presentes, as mulheres que são as únicas responsáveis pelo lar, ficam submetidas a aceitar empregos precários para sustentar a família e tentar propiciar uma condição de vida boa para os filhos, tendo em vista que aceitar esse tipo de trabalho ainda é melhor do que não trabalhar. Dessa forma, as mulheres assumem uma dupla jornada de trabalho, pois além de ter que trabalhar fora de casa, assumem a responsabilidade pelas tarefas domésticas e cuidados com a família. 
Contudo, nos últimos anos a participação do trabalho feminino no mundo produtivo tem aumentado e na sociedade patriarcal a qual vivemos, em que as mulheres são subordinadas em todas as esferas sociais, o poder patriarcal se sente ameaçado quando as mulheres saem dos lugares que lhes são determinados. 
Mas, ainda assim o capitalismo exerce sobre as mulheres uma violência ao passo em que a exploração por elas sofridas no privado de suas casas muitas vezes é imperceptível a elas próprias. Ou seja, é o processo de socialização a que as mulheres estão submetidas e as fazem crer na naturalização das atividades domésticas e reprodutivas, e a violência se objetiva na divisão sexual do trabalho e de reprodução biológica e social. Segundo Velloso (2013, p. 19) “a divisão sexual do trabalho, expressa uma divisão social dotrabalho entre os gêneros masculino e feminino, decorrente do modo capitalista de produção, em que as mulheres ocupam posições secundarizadas ou mesmo marginalizadas”. 
Como resultante das relações sociais e históricas, a divisão sexual do trabalho está sujeita a transformações, contudo, mantém dois “princípios organizadores” que funcionam como “invariantes” nesta categoria: a “hierarquia” por agregar sempre maior valor ao trabalho masculino em detrimento do feminino; e a “separação” entre o que é trabalho do homem e da mulher (kergoat, 2010, 2012 apud CISNE, SANTOS, 2018, p. 62). Não se trata apenas de trabalhos diferentes segundo o sexo, mas hierarquicamente distintos e assimétricos, que se desdobram e se expressam nas desigualdades existentes, dentre outros aspectos, nas carreiras, nas qualificações e nos salários entre os sexos (CISNE, SANTOS, 2018, p. 62-63).
A divisão sexual do trabalho mostra como essa hierarquia constrói uma divisão de tarefas e responsabilidades baseada na diferença sexual. De acordo com Cisne e Santos (2018, p. 62) “a percepção dessa dimensão sexual nos possibilita da visibilidade às relações de desigualdade e exploração que permeiam os trabalhos considerados femininos, como o doméstico”. Contudo, é naturalizada a ideia de que cabe as mulheres a responsabilidade do cuidado e das obrigações domésticas, mesmo que trabalhem fora. O que apresenta algumas vezes, na melhor das hipóteses, é a ideia da “ajuda” em casa, mas não da divisão das tarefas entre casais. 
O trabalho doméstico, não é valorizado e no capitalismo só o trabalho externo é valorizado com salário. Esse é um ciclo que favorece a desigualdade. Nessas situações surgem dificuldades de romper relações conjugais violências, além disso, impõe as mulheres a um aprisionamento econômico a si e aos seus filhos. Porém, como as mulheres nas últimas décadas começaram a ocupar cada vez mais espaço no mercado de trabalho formal, remunerado, a crescente participação feminina no mercado de trabalho assalariado sofreu uma alteração no padrão de família, antes constituído por um provedor masculino, pois muitas mulheres se tornaram chefes de família, mesmo tendo que ser ainda a responsável pelos cuidados da casa e da família. No entanto, na pandemia muitas mulheres tiveram que trabalhar em casa estendendo assim a jornada de trabalho, visto que foi um desafio conciliar a vida profissional com a vida pessoal, pois no seu cotidiano ocorreu a sobrecarga de trabalho produtivo e reprodutivo dessas mulheres. 
Apesar do modo de produção capitalista reforçar a condição de desigualdade entre homens e mulheres bem como a inferioridade das mulheres em relação aos homens, essa condição não foi vivenciada historicamente de forma pacífica, houve resistência por parte das mulheres isoladamente ou de forma organizada, a exemplo dos movimentos de mulheres e dos movimentos feministas. Em conjunturas mais favoráveis, principalmente, as mulheres tiveram possibilidades maiores de lutar contra tal situação. 
Obviamente, a pandemia confirma o quão profunda é a crise para a vida das mulheres e para o processo de reprodução social, e essas questões fazem chegar ao ponto de reflexão no sentido de os movimentos feministas promoverem novas reinvindicações e maneiras de se mobilizar para uma transformação social, e com isso continuar lutando para se construir uma sociedade sem ser em torno da lógica da exploração, da hierarquia social e da desigualdade. Além disso, é necessário destacar o quanto os profissionais de saúde foram importantes nesse processo de crise, profissionais que estiveram na linha de frente para lidar com o Covid-19 e suas nuances e com a violência contra as mulheres, entre eles, estão os assistentes sociais que também são profissionais da saúde.
Dito isso, compreender ainda que minimamente as formas de manutenção da violência e opressão contra as mulheres e como isso se intensifica no cenário pandêmico, analisaremos como o Serviço Social se situa nesse contexto, embora até esse momento nossa analise não tenha se direcionado para a profissão ressaltamos que não é possível pensar o serviço social sem uma análise do contexto histórico, econômico e político, e nesse caso pandêmico considerando que a sua atuação não é possível fora dos contextos nos quais se gesta e insere.
3 O CONTEXTO HISTÓRICO DO SERVIÇO SOCIAL, A SUA ATUAÇÃO NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DA PANDEMIA DE COVID-19 
Nesta seção será apresentado o contexto histórico do Serviço Social a partir do momento de renovação Serviço Social e como este foi um importante processo para que pudesse ser desenvolvida uma prática profissional crítica, rompendo com o tradicionalismo, e destacando ainda essa prática no período da pandemia de Covid- 19. Será apresentada também a questão da violência de gênero numa sociedade patriarcal em que os papeis sociais são definidos a partir da questão de gênero, submetendo as mulheres a vários tipos de violência, sendo submissas aos homens, enquanto a estes é atribuído o poder. 
A história do Serviço Social percorre vários contextos e épocas, se construiu e se solidificou ao longo de diferentes períodos sociais, econômicos, políticos e ideológicos que fortaleceram a sua emergência, a sua evolução e a sua (re) definição. Pode- se analisar a história do Serviço Social em diferentes fases e períodos, mas destaco as fases: Serviço Social clássico/tradicional, Serviço Social no período de renovação e o Serviço Social em um período mais atual que foi o da pandemia.
No contexto da ditadura militar que ocorreu no Brasil de 1964 a 1985, entende-se que ocorreu a fase de Renovação do Serviço Social. Neste contexto, ele vai responder as novas demandas que se apresentavam nesse cenário. Neste primeiro momento, os profissionais se apresentavam como reprodutores das formas tradicionais do início da profissão, com uma prática paliativa, caritativa, assistencialista, reforçada pela autocracia burguesa.
A prática dos assistentes sociais era de subalternidade, agiam como simples reprodutores das políticas sociais, e mantenedores da ordem e do controle da sociedade. Com a reorganização do Estado e as modificações da sociedade ocorridas durante o período da autocracia burguesa, tais mudanças refletiram no cenário do Serviço Social em dois âmbitos: da prática e da formação profissionais.
Na prática profissional há uma expansão do mercado de trabalho ao Serviço Social, as novas demandas exigiam um profissional com novas características. Ocorreu nesse período a implantação de uma modernização por parte do estado, e indústrias para a reprodução do capital, com a permanência de modelos econômicos utilizados anteriormente no país remodelados para inserção na dinâmica capitalista. O desenvolvimento do país, que ocorreu através das indústrias que atendiam o capital, que trouxe como consequência a pauperização relativa, pois evidenciou-se o êxodo rural, gerando um aumento populacional nas regiões urbanas causando miséria, desigualdade, violência e outras refrações da questão social. 
O mercado de trabalho para o assistente social seja em instituições estatais ou mesmo privadas demandava um padrão de exigências para o seu desempenho profissional. A racionalidade burocrático-administrativa em meio a modernização conservadora passou exigir, dos assistentes sociais uma postura moderna “[...] no sentido de compatibilidade do seu desempenho com as normas, fluxos, rotinas e finalidades dimanantes daquela racionalidade” (NETTO, 2005. p. 123).
Com a necessidade de um profissional moderno implicou- se assim, em modificações das agências de formação dos assistentes sociais, agora aptas a romper com a prática assistencialista, expandindo assim outras agências. Com isso, depois de um período, o sistema de ensino superior ampliou em todo país os cursos de Serviço Social, inserindo-os nas universidades, pois antes havia apenas escolas isoladas, com escassez de recursos, ligadas a valores morais. 
Mesmo o Brasil sendo um país laico, há que se observar a imposição de grupos religiososque se apresentam com um posicionamento moral conservador, sexista, misógino e patriarcal, inclusive pessoas com esse pensamento dentro da própria universidade, que se mostram contrários a essa diversidade. E nesse sentido se mostra necessária a potencialidade da universidade de cumprir o seu papel transformador e educativo e em articulação com os movimentos sociais podendo fortalecer a luta por essa educação transformadora que tenham condições de superar o sistema capitalista. Nesse contexto se mostra desafiador proporcionar uma formação crítica aos profissionais comprometida com o Projeto Ético-Político da profissão. 
No campo universitário, o Serviço Social passou a interagir com disciplinas das ciências sociais como psicologia, antropologia e sociologia, contando também com disciplinas do viés da ditadura militar. Esta formação passa a atender as exigências que se faziam do mercado nacional de trabalho constituído na esfera da ditadura militar. “A modernização conservadora revela-se inteiramente neste domínio: redefine-se a base da legitimidade profissional ao se redefinirem as exigências do mercado de trabalho e o quadro da formação para ele” (NETTO, 2005, p. 127). 
É nesse contexto que se desenvolve a renovação do Serviço Social no Brasil trazendo uma nova prática profissional rompendo com as práticas tradicionais do início da profissão. Segundo Netto (2005): 
Entendemos por renovação o conjunto de características novas, que no marco das constrições da autocracia burguesa, o Serviço Social articulou, à base do rearranjo de suas tradições (...), procurando investir-se como instituição de natureza profissional dotada de legitimação prática, através de respostas a demandas sociais e da sua sistematização, e de valorização teórica, mediante a remissão às teorias e disciplinas sociais (NETTO, p. 131).
A renovação do Serviço Social no Brasil se concretiza com a formação de uma pluralidade profissional, configurando perspectivas diversificadas que é [...] “radicado nos procedimentos diferentes que embasam a legitimação prática e a validação teórica, bem como nas matrizes teóricas a que elas se prendem” (NETTO, 2005, p. 131), observa-se que a posição do Serviço Social com a inserção das disciplinas das ciências sociais, os profissionais passaram a ter uma visão crítica dos seus fundamentos, o que implica o seu conhecimento específico, da sociedade e de sua própria atuação. 
Assim, três perspectivas são apresentadas por Netto (2005) neste processo de renovação do Serviço Social: perspectiva modernizadora, perspectiva de reatualização do conservadorismo e a intenção de ruptura. Esta última perspectiva recorre principalmente ao pensamento marxista, que era tida de forma progressiva na sociedade.
Netto (2005) vai destacar três momentos distintos que constituem a perspectiva da intenção de ruptura: o da sua emersão, o da sua consolidação acadêmica e do seu espraiamento sobre a categoria profissional. 
No momento de sua emersão ao projeto de ruptura o Serviço Social se aproximou da tradição marxista que se operou pelo viés da política. Caracterizou-se mais especificamente pelo “marxismo acadêmico”, que se desenvolveu no decorrer do tempo com a crise da ditadura militar. O Serviço Social se apropria das teorias marxistas, pois acreditavam em uma mudança social, e foi sobretudo pela resistência dos protagonistas (docentes, profissionais e estudantes) da Escola de Serviço Social de Minas Gerais, que mesmo sem condições institucionais, estabeleceram as bases para a retomada da crítica ao tradicionalismo. Mas, mesmo assim a leitura feita pelos assistentes sociais da época sobre o marxismo foi muito superficial o que causou uma concepção do assistente social como agente transformador da sociedade numa ideia de revolução.
Neste momento cabe ressaltar que existiu diferentes níveis de apropriação ao marxismo no Serviço Social. A primeira delas é a apropriação ideológica ao marxismo concretizado por ocasião do Movimento de Reconceituação, pela via da militância política da tradição marxista destacando alguns pensadores marxistas que adentraram em reflexões teóricas da profissão. “O processo de Reconceituação contestou o tradicionalismo profissional, enraizado de práticas de cunho empirista, fruto das influências positivistas. Entre avanços, impasses e equívocos, que constam em análises contemporâneas, a respeito deste marco histórico” (SILVA, p. 31). 
Pode-se destacar que a tradição marxista, em seus primeiros momentos, influenciou, no posicionamento político do Serviço Social, devido ao conteúdo ídeo-político do marxismo. [...] Aponta-se como consequência dessa apropriação ídeo-política do marxismo, as posturas fatalistas e messiânicas da profissão, provocando também um superdimensionamento da função social do Serviço Social na sociedade capitalista, compreendendo como “o agente da transformação” (SILVA, 2019, p. 31-32).
A segunda apropriação é a epistemológica que foi caracterizada como uma possível aplicação da teoria social de Marx na prática, fazendo existir uma unidade entre teoria e prática. Assim, “a apropriação epistemológica absorve da tradição marxista o empirismo, reduzindo o marxismo (SILVA, 2019, p. 32) “[...] ao epistemologismo de raiz estruturalista donde a reiteração de discussões sobre ‘idealismo’ e ‘materialismo’, ‘ciência’ e ‘ideologia’, ‘teoria’ e ‘prática’, ‘prática teórica’ etc.” (NETTO, 2011, p. 268 apud SILVA, 2019, p. 32).
E a terceira apropriação ontológica da vertente crítico- dialética que entre as décadas de 1980 e 1990, aqui ocorreram aproximações mais consequentes entre o Serviço Social e a Tradição Marxista, pois permitiu uma explanação de questões fundantes na efetivação da ruptura com o tradicionalismo. Ou seja, somente recuperando seus aspectos ontológico- sociais que a vertente critico-dialética apresenta-se em suas mais fecundas possibilidades, tornando-se capaz de realizar a ruptura teórica com a herança conservadora e intervir de forma qualitativamente superior na garantia do projeto ético- político profissional.
De acordo com SANTOS (2019): 
Essa apropriação ontológica do marxismo é perceptível em três documentos legais (Código de Ética de 1993, Lei de regulamentação da profissão de 1993 e Diretrizes Curriculares de 1996) que provam um “salto” teórico-metodológico e ético, frutos do acúmulo das décadas precedentes e amadurecimento propiciado pela conjuntura de década de 1990 (SANTOS, 2019, p. 35). 
Portanto, o processo de renovação do Serviço Social teve por objetivo a construção de um perfil profissional mais crítico, para uma melhor orientação e redimensionamento do exercício profissional do Serviço Social. E trazendo essa renovação para a atualidade, esse movimento foi um marco para o Serviço Social, pois foi através dele que se pensou em um modelo crítico de atuação diferente das práticas de atuação tradicional. Além disso, com esse movimento o Serviço Social ganha uma valorização diante da sociedade, visto que os assistentes sociais, em meio a tantas desigualdades e explorações, buscam lutar por uma justiça social atuando nos desafios que são postos acerca da sua prática profissional. 
O Serviço Social crítico mostra-se comprometido com os interesses da massa da população, preocupado com a qualificação acadêmica e com a interlocução com as ciências sociais e investindo fortemente na pesquisa. No que diz respeito ao exercício profissional, há profissionais comprometidos com esse Serviço Social mais crítico e preocupado em intervir nas refrações da questão social, mesmo que ainda possamos nos deparar na atualidade com algumas situações que nos remetem ao Serviço Social Tradicional assistencialista e paliativo.
Em um contexto pandêmico aonde causou uma crise sanitária em todo mundo, os assistentes sociais, sendo profissionais da saúde, tiveram que lidar com as demandas dos indivíduos e suas vulnerabilidades. Nesse âmbito, “na saúde o objetivo do Serviço Social seria de identificar os aspectos econômicos, políticos, culturais e sociais que perpassam

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