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literatuia brasileira iii-114


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Amar-amaro, nome que o poeta deu a esta seção, que contém textos sobre o choque social, é o 
título do último poema que aparece na parte seguinte, sobre o amor (Uma, duas argolinhas). O 
intrigante é que Amar-amaro é um poema do livro Lição de coisas, de 1962, em que já não transparece 
na poesia de Drummond a preocupação social, abundante nos livros Sentimento do mundo, José e A 
rosa do povo. Em Lição de coisas, Drummond já apresenta uma poesia mais madura, cheia de 
inquietações humanas, mais universal, despojada de engajamentos sociais.
O nome desta parte, Amar-amaro, mistura de paixão com amargura, amor gauche, certamente 
remete aos seguintes versos do poema da quinta seção:
amig (o,a) me releve
este malestar
cantarino escarninho piedoso
este querer consolar sem muita convicção
o que é inconsolável de ofício
É interessante lembrar que em entrevista dada a Maria Julieta, Drummond declarou que considerava 
sua poesia social como fruto de sua fase poética mais produtiva; a decepção, entretanto, com a militância 
política fez com que ele refluísse (a partir de Novos poemas, 1948) para "uma poesia mais subjetiva, algo 
metafísica".
É, portanto, esse período fecundo que Drummond homenageia nesta parte da Antologia, advertindo, 
porém, que essa tentativa de consolo é inútil. Fique, de qualquer forma, registrado o apelo/denúncia do 
poeta.
Quase todos os poemas desta parte (com exceção de quatro) foram escritos entre 1939 e 1945, 
época da Segunda Grande Guerra. O tom, naturalmente, é de desgosto com a vida, é a temática da 
injustiça, da destruição, da inutilidade das coisas diante de um mundo caótico, um sistema de erros 
dominado por interesses capitalistas.
O poema de abertura encena uma tentativa frustrada de suicídio que leva o poeta, proprietário de um 
"Coração amoroso", a se identificar com a cidade que ama e com seus habitantes. A guerra e a destruição 
são lembrados em "Sentimento do mundo" e, de forma mais sutil, em "Lembrança do mundo antigo", que 
não tinha os perigos que o atual oferece. 
Em "Elegia 1938", o capitalismo, chamado pelo eu lírico de Grande Máquina, é o inimigo, contra o qual 
não se pode lutar. Resta conformar-se e "adiar para outro século a felicidade coletiva". O agente do grande 
mal depreende-se que sejam os Estados Unidos, o grande e poderoso arquiteto e executor do capitalismo 
selvagem:
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.
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