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Desfigurados, verdadeiros, sob o reflexo das chamas. A D. Cláudia, não: incorruptível, pura, não lhe toca o fogo. Por hábito, lançou os olhos às colmeias, que lhe ficavam mesmo em frente, dez ou doze metros, se tanto, e viu uma abelha voar da Cidade Verde. Batizava as colmeias conforme a cor de que as pintara, Cidade Verde, Cidade Azul, Cidade Rosa. A abelha foi apanhada pela chuva: vergastadas, impulsos, fios do aguaceiro a enredá-la, golpes de vento a ferirem-lhe o voo. Deu com as asas em terra e uma bátega mais forte espezinhou-a. Arrastou-se no saibro, debateu-se ainda, mas a voragem acabou por levá-la com as folhas mortas. Em O Delfim, José Cardoso Pires (1925-1998) recria o romance policial, critica o machismo e outras formas de opressão e estabelece uma rede de relações intertextuais com obras de diversos autores. Tais características, mescladas num romance que não segue a ordem cronológica e a linearidade, vinculam o Neorrealismo ao chamado Pós-Modernismo. Fonte [3] Aqui está um trecho em que o narrador-personagem, entre suas digressões, revela o processo de criação, atitude bastante frequente entre os escritores da chamada Pós-Modernidade: VEJA O TECHO Acontece ainda que entre cachorro e amo não contam apenas os sentimentos. Há serviço, propriedade, demonstração de poder, como provam (entre as anotações do meu caderno): 44