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Tí tu lo d a pa rt e | P AR TE 1 política comercial nos países em desenvolvimento CAPÍTULO 11 Até agora, analisamos os instrumentos de política de comércio e seus objetivos sem especifi‑ car o contexto, isto é, sem dizer muito sobre o país que realiza essas políticas. Cada país tem sua própria história e questões, mas ao discutir política econômica uma diferença entre eles torna‑ ‑se óbvia: seus níveis de renda. Como a Tabela 11.1 sugere, as nações diferem extremamente em suas rendas per capita. De um lado do espectro estão as nações desenvolvidas, um clube cujos membros incluem Europa Ocidental, vários países em grande parte colonizados por europeus (incluindo os Estados Unidos) e o Japão. Esses países têm rendas per capita que, em alguns casos, chegam a US$ 40.000 por ano. A maior parte da população mundial, entretanto, vive em nações que são substancialmente mais pobres. A faixa de renda entre esses países em desenvolvi- mento1 é muito ampla. Alguns deles, como a Coreia do Sul, agora são considerados membros de um grupo de nações “recém ‑industrializadas” com o status de país desenvolvido, tanto em termos de estatísticas oficias quanto na forma com a qual eles pensam sobre si mesmos. Outros, como Bangladesh, permanecem desesperadamente pobres. No entanto, para praticamente todos os países em desenvolvimento, a tentativa de fechar a diferença na renda com nações mais desen‑ volvidas tem sido a preocupação central da política econômica. Por que alguns países são tão mais pobres do que outros? Por que alguns países que eram pobres há uma geração conseguiram ter um progresso drástico enquanto outros não conseguiram? Essas são perguntas profundamente controversas, e tentar respondê ‑las, ou até mesmo descre‑ ver longamente as respostas que os economistas propuseram ao longo dos anos, nos afastaria do escopo deste livro. O que podemos dizer, entretanto, é que a mudança das visões sobre o desenvol‑ vimento econômico teve um papel importante em determinar a política de comércio. Por cerca de 30 anos após a Segunda Guerra Mundial, as políticas de comércio em muitos paí‑ ses em desenvolvimento eram fortemente influenciadas pela crença de que a chave para o desen‑ volvimento econômico era a criação de um forte setor industrial e que a melhor forma de criá ‑lo era proteger os produtores nacionais da competição internacional. A primeira parte deste capí‑ tulo descreve a razão para essa estratégia de industrialização de substituição de importação, bem como as críticas a essa estratégia, que se tornou cada vez mais comum após 1970, e o surgimento 1. País em desenvolvimento é um termo utilizado pelas organizações internacionais que se tornou padrão, embora alguns países “em desenvolvimento” tenham passado por longos períodos de declínio dos padrões de vida. Um termo mais des‑ critivo, mas menos educado é países menos desenvolvidos (PMD). tabela 11.1 Produto interno bruto per capita, 2009 (ajustado para diferenças em níveis de preço) Estados Unidos US$ 49.428 Alemanha US$ 40.511 Japão US$ 37.449 Coreia do Sul US$ 32.954 México US$ 14.943 China US$ 10.371 Bangladesh US$ 1.929 Fonte: Conference Board Total Economy Database. M11_KRUGXXXX_C11.indd 214 1/29/15 6:15 PM 215Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento Industrialização de substituição de importação Da Segunda Guerra Mundial até a década de 1970, muitos países em desenvolvimento tentaram acelerar seu crescimento limitando as importações de mercado‑ rias manufaturadas, a fim de nutrir um setor manufa‑ tureiro que servisse ao mercado nacional. Essa estra‑ tégia tornou ‑se popular por uma série de razões, mas argumentos econômicos teóricos para a substituição de importação desempenharam um papel importante para seu crescimento. Provavelmente, o mais importante des‑ ses argumentos foi o argumento da indústria nascente, que mencionamos no Capítulo 7. O argumento da indústria nascente De acordo com o argumento da indústria nascente, os países em desenvolvimento têm uma vantagem com‑ parativa potencial na manufatura, mas novas indús‑ trias manufatureiras em países em desenvolvimento não podem competir inicialmente com indústrias bem estabelecidas em países desenvolvidos. Então, para permitir que a indústria tenha um ponto de apoio, os governos devem apoiar as novas indústrias temporaria‑ mente até que elas tenham ficado fortes para enfrentar a concorrência internacional. Portanto, faz sentido, de acordo com esse argumento, utilizar tarifas aduaneiras e quotas de importação como medidas temporárias para começar a industrialização. É um fato histórico que algumas das maiores economias de mercado do mundo tenham começado sua industrialização atrás de barreiras de comércio: os Estados Unidos tinham altas taxas de tarifa em manufaturas no século XIX, enquanto o Japão tinha controles extensos de importa‑ ção até a década de 1970. Problemas com o argumento da indústria nascente O argumento da indústria nascente parece altamente plau‑ sível e na realidade tem sido persuasivo para muitos governos. Ainda assim, os economistas apontaram mui‑ tas armadilhas no argumento, sugerindo que ele deva ser utilizado cautelosamente. Primeiro, não é sempre uma boa ideia tentar entrar hoje nas indústrias que terão vantagem comparativa no futuro. Suponha que um país que atualmente é abun‑ dante em mão de obra esteja em processo de acumulação de capital. Quando ele acumular capital suficiente, terá uma vantagem comparativa nas indústrias de capital intensivo. Entretanto, isso não significa que ele deveria tentar desenvolver essas indústrias imediatamente. Na década de 1980, por exemplo, a Coreia do Sul tornou‑ ‑se exportadora de automóveis. Provavelmente não teria sido uma boa para a Coreia do Sul tentar desenvolver sua indústria na década de 1960, quando o capital e o trabalho qualificado ainda eram bem escassos. Segundo, proteger a fabricação não faz nenhum bem, a não ser que a proteção em si ajude a tornar a indústria competitiva. Por exemplo, o Paquistão e a Índia protege‑ ram seus setores manufatureiros por décadas e, recente‑ mente, começaram a desenvolver exportações significa‑ tivas de mercadorias manufaturadas. Esses artigos que eles exportam, entretanto, são mercadorias leves, como as têxteis, e não os produtos manufaturados pesados que eles protegeram; uma boa conjetura é que eles teriam desenvolvido suas exportações manufatureiras mesmo se nunca tivessem protegido a indústria. Alguns econo‑ de uma nova prudência convencional no fim da década de 1980, que enfatizou as virtudes do livre comércio. A segunda parte do capítulo descreve a mudança notável na política de comércio dos países em desenvolvimento que aconteceu desde a década de 1980. Por fim, embora os economistas tenham debatido as razões para as grandes diferenças de renda entre as nações, desde o meio da década de 1960 um crescente grupo de nações asiáticas surpreendeu o mundo ao alcan‑ çar taxas espetaculares de crescimento econômico. A terceira parte deste capítulo é voltada para a interpretação do “milagre asiático” e suas implicações (muito controversas) para a política do comércio internacional. ObJetivOs de aprendizaGeM Após a leitura deste capítulo, você será capaz de: ■ Recapitular o caso para o protecionismo da forma como tem sido historicamente praticado em países em desen‑ volvimento e discutir a substituição de importação que leva à industrialização e o argumento da “indústria nascente”. ■ Resumir as ideias básicas por trás do “dualismo econômico” e sua relação com o comércio internacional. ■ Discutir a história econômica recente dos países asiáticos, como a China e a Índia, e detalhar a relação entre seu rápido crescimento econômico e sua participação no comércio internacional. M11_KRUGXXXX_C11.indd 215 1/29/15 6:15 PM 216 Economia internacional mistas avisaram sobre o argumento da “indústria pseu‑ donascente”, no qual uma indústria começa protegida, entãose torna competitiva por razões que não têm nada a ver com a proteção. Nesse caso, a proteção da indústria nascente acaba parecendo um sucesso, mas pode ter sido na verdade um custo líquido para a economia. De modo mais geral, o fato de que é dispendioso e demorado construir uma indústria não é argumento para intervenção do governo, a não ser que exista alguma falha de mercado interno. Se uma indústria é presumidamente capaz de ganhar retornos altos o suficiente para capital, mão de obra e outros fatores de produção que façam o desenvolvimento valer a pena, então por que os investido‑ res privados não a desenvolvem sem a ajuda do governo? Algumas vezes, argumenta ‑se que os investidores pri‑ vados levam em conta somente os retornos atuais em uma indústria e deixam de levar em contra a prospecção futura, mas esse argumento não é consistente com o com‑ portamento do mercado. Em países desenvolvidos, ao menos, os investidores frequentemente apoiam projetos cujos retornos são incertos e repousam no futuro. (Con‑ sidere, por exemplo, a indústria de biotecnologia norte‑ ‑americana, que atraiu centenas de milhões de dólares de capital anos antes de fazer uma única venda comercial.) Justificativas de falha de mercado para a proteção da indústria nascente Para justificar o argumento da indústria nascente é necessário ir além da visão plausí‑ vel, mas questionável, de que as indústrias sempre preci‑ sam ser protegidas quando são novas. Se a proteção da indústria nascente é justificável, isso depende do tipo de análise sobre o qual discutimos no Capítulo 10. Isto é, o argumento para proteção de uma indústria em seu cres‑ cimento inicial deve estar relacionado a algum conjunto particular de falhas no mercado que impede os merca‑ dos privados de desenvolverem a indústria tão rápido quanto eles poderiam fazer. Proponentes sofisticados do argumento da indústria nascente identificaram duas falhas de mercado como as razões de por que a proteção da indústria nascente pode ser uma boa ideia: mercados de capitais imperfeitos e o problema da apropriabilidade. A justificativa dos mercados de capitais imperfeitos para a proteção da indústria nascente é a seguinte: se um país em desenvolvimento não tem um conjunto de insti‑ tuições financeiras (como um mercado de ações eficiente e bancos) que permitiriam que as poupanças dos setores tradicionais (como a agricultura) fossem utilizadas para financiar investimentos em novos setores (como a manu‑ fatura), então o crescimento de novas indústrias ficaria restrito pela capacidade de as empresas nessas indús‑ trias ganharem lucros atuais. Portanto, baixos lucros iniciais serão um obstáculo para investir, mesmo se os retornos de longo prazo sobre o investimento forem altos. A primeira melhor política é criar um mercado de capital melhor, mas a proteção das novas indústrias, que aumentaria os lucros e, portanto, permitiria um crescimento mais rápido, pode ser justificada como uma segunda opção de melhor política. O argumento de apropriabilidade para a proteção da indústria nascente pode tomar várias formas, mas todas terão em comum a ideia de que as empresas em uma nova indústria geram benefícios pelos quais elas não são compensadas. Por exemplo, as empresas que entrarem primeiro na indústria podem ficar sujeitas aos custos de startup de adaptar a tecnologia às circunstâncias locais ou de abertura de novos mercados. Se as outras empresas são capazes de seguir seus caminhos sem se sujeitarem a esses custos de startup, os pioneiros serão impedidos de colher quaisquer retornos desses gastos. Dessa forma, as empresas pioneiras, além de produzirem produtos físi‑ cos, criam benefícios intangíveis (como conhecimento ou novos mercados), sobre os quais eles não podem estabelecer direitos de propriedade. Em alguns casos, os benefícios sociais advindos da criação de uma nova indústria ultrapassarão os custos, porém, por causa do problema da apropriabilidade, nenhum empresário pri‑ vado vai estar disposto a entrar na indústria. A primeira melhor resposta é compensar as empresas pelas suas contribuições intangíveis. No entanto, quando isso não é possível, existe um segundo melhor caso para encora‑ jar a entrada em uma nova indústria utilizando tarifas aduaneiras ou outras políticas de comércio. Tanto o argumento para os mercados de capitais imperfeitos quanto o caso da apropriabilidade para pro‑ teção da indústria nascente são claramente casos espe‑ ciais da justificativa de falha de mercado para interferência no livre comércio. A diferença é que nesse caso os argu‑ mentos aplicam ‑se especificamente a novas indústrias em vez de qualquer indústria. Entretanto, os problemas gerais com a abordagem da falha de mercado permanecem. Na prática, é difícil avaliar quais indústrias realmente justi‑ ficam o tratamento especial, e há risco de que a política destinada a promover o desenvolvimento acabe sendo capturada por interesses especiais. Existem muitas histó‑ rias de indústrias nascentes que nunca cresceram e conti‑ nuam dependentes da proteção. Promover a fabricação mediante proteção Embora existam dúvidas sobre o argumento da indústria nascente, muitos países em desenvolvimento têm visto esse argumento como uma razão convincente para fornecer apoio especial para o desenvolvimento de M11_KRUGXXXX_C11.indd 216 1/29/15 6:15 PM 217Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento indústrias manufatureiras. Em princípio, tal apoio pode ser fornecido em uma variedade de formas. Por exemplo, os países poderiam fornecer subsídios para a produção manufatureira em geral, ou focar seus esforços em sub‑ sídios para a exportação de algumas mercadorias manu‑ faturadas em que eles acreditem que possam desenvol‑ ver uma vantagem comparativa. Na maioria dos países em desenvolvimento, entretanto, a estratégia básica da industrialização tem sido desenvolver indústrias orien‑ tadas ao mercado nacional por meio da utilização de restrições de comércio, como as tarifas e quotas que encorajam a substituição das mercadorias importadas pelos produtos nacionais. A estratégia de encorajar a indústria nacional limitando as importações de merca‑ dorias manufaturadas é conhecida como a estratégia da industrialização de substituição de importação. Alguém pode se perguntar por que é necessário fazer uma escolha. Por que não encorajar tanto a substituição de importação quanto as exportações? Essa resposta remete à análise do equilíbrio geral das tarifas no Capí‑ tulo 6: uma tarifa aduaneira que reduz as importações também reduz necessariamente as exportações. Ao pro‑ teger as indústrias de substituição de importação, os países tiram recursos dos setores de exportação reais ou potenciais. Então a escolha de um país em buscar subs‑ tituição para importações também é a escolha de desen‑ corajar o crescimento da exportação. As razões pelas quais a substituição de importação em vez do crescimento da exportação tem sido escolhida como uma estratégia de industrialização é uma mistura de economia e política. Primeiro, até a década de 1970 muitos países em desenvolvimento eram céticos em rela‑ ção à possibilidade de exportar mercadorias manufatu‑ radas (apesar de tal ceticismo também ser colocado em questão no argumento da indústria nascente para a pro‑ teção da produção). Eles acreditavam que a industriali‑ zação era necessariamente baseada em uma substituição da indústria nacional por importações, em vez de um crescimento nas exportações de manufatura. Segundo, em muitos casos as políticas de industrialização de subs‑ tituição de importação encaixaram ‑se naturalmente com as tendências políticas existentes. Já observamos o caso das nações da América Latina que eram com‑ pelidas a desenvolver substitutos para as importações durante a década de 1930 por causa da Grande Depres‑ são e durante a primeira metade da década de 1940, por causa da interrupção do comércio na época da guerra (Capítulo 10). Nesses países,a substituição de importa‑ ção beneficiou diretamente grupos de interesse podero‑ sos e estabelecidos, enquanto a promoção da exportação não teve apoio natural. Também vale a pena apontar que alguns defensores da política de substituição de importação acreditavam que a economia mundial era guarnecida contra novos estreantes — que as vantagens de indústrias nacionais estabelecidas eram simplesmente grandes demais para serem superadas por economias recém ‑industrializadas. Oponentes extremados desse ponto de vista chamavam por uma política geral de desligamento dos países em desenvolvimento das nações desenvolvidas. Mas mesmo entre defensores mais moderados das estratégias de desenvolvimento protecionista, a visão de que o sistema econômico internacional trabalha sistematicamente contra os interesses dos países em desenvolvimento per‑ maneceu comum até a década de 1980. As décadas de 1950 e 1960 viram a maré alta da indus‑ trialização de substituição de importação. Os países em desenvolvimento geralmente começaram protegendo os estágios finais da indústria, como processamento de ali‑ mentos e montagem de automóveis. Nos maiores países em desenvolvimento, os produtos nacionais quase que completamente substituíram mercadorias de consumo importadas (embora a produção tenha sido frequente‑ mente feita pelas empresas multinacionais estrangeiras). Uma vez que as possibilidades para substituir as merca‑ dorias de consumo importadas esgotaram ‑se, esses países viraram ‑se para a proteção das mercadorias intermediá‑ rias, como partes dos automóveis, aço e petroquímicos. Na maioria das economias em desenvolvimento, a rota da substituição de importação chegou ao seu limite lógico: mercadorias manufaturadas sofisticadas, como computadores, ferramentas de precisão e assim por diante, continuaram a ser importadas. No entanto, os países maiores que perseguiam a industrialização de substituição de importação reduziram suas importações para níveis notavelmente baixos. O caso mais extremo foi o da Índia: no começo da década de 1970, as impor‑ tações de produtos diferentes de petróleo eram em torno de 3% do PIB. Como uma estratégia para encorajar o crescimento da manufatura, a industrialização de substituição de importação claramente funcionou. As economias da América Latina começaram a gerar uma parcela quase tão grande de sua produção de manufatura quanto as nações desenvolvidas. (A Índia gerou menos, mas somente porque sua população pobre continuou a gas‑ tar uma grande proporção de sua renda em alimentos.) Contudo, para esses países, o encorajamento da manu‑ fatura não era um objetivo em si mesmo; em vez disso, era um meio para o objetivo final de desenvolvimento econômico. M11_KRUGXXXX_C11.indd 217 1/29/15 6:15 PM 218 Economia internacional O MéxicO abandOna a industrializaçãO de substituiçãO de iMpOrtaçãO Em 1994, o México, junto com o Canadá e os Esta‑ dos Unidos, assinou o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA). Um acordo que, como explicaremos no Capítulo 12, tornou ‑se altamente controverso. Mas a transformação do México da indus‑ trialização de substituição de importação para o rela‑ tivo livre comércio começou, na verdade, quase uma década antes de o país entrar para o NAFTA. A transformação do México em direção ao livre comércio reverteu meio século de história. Como muitos países em desenvolvimento, o México virou protecio‑ nista durante a Grande Depressão da década de 1930. Após a Segunda Guerra Mundial, a política de industria‑ lização para servir a um mercado nacional protegido tornou ‑se explícita. Por todas as décadas de 1950 e 1960, barreiras de comércio foram bem levantadas, ao mesmo tempo em que a indústria mexicana tornava ‑se cada vez mais autossuficiente. Pela década de 1970, o México tinha restringido amplamente as importações de mercadorias manufaturadas para itens como maqui‑ nário sofisticado, que não poderiam ser produzidos nacionalmente, exceto a um custo proibitivo. A indústria mexicana produziu muito pouco para exportação. Os ganhos estrangeiros do país vieram amplamente de petróleo e turismo, com as únicas exportações significativas de manufatura vindo das maquiladoras, fábricas especiais localizadas próxi‑ mas à fronteira norte ‑americana, que eram isentas de algumas restrições de comércio. Por volta do fim da década de 1970, o México viven‑ ciava dificuldades econômicas, incluindo o aumento da inflação e a crescente dívida externa. Os problemas vieram à tona em 1982, quando o país encontrou ‑se incapaz de fazer pagamentos inteiros de sua dívida externa. Isso levou a uma prolongada crise econômica e a uma mudança radical na política. Entre 1985 e 1988, o México reduziu drasticamente suas tarifas aduaneiras e retirou a maior parte de suas quotas de importação, que anteriormente protegiam sua indústria. A nova meta da política era transfor‑ mar o país em um grande exportador de mercado‑ rias manufaturadas, intimamente integrado com a economia norte ‑americana. A chegada do NAFTA, em 1990, fez pouco para reduzir as barreiras de comér‑ cio, porque o México já tinha feito o trabalho duro da liberalização do comércio na década de 1980. O NAFTA, entretanto, reassegurou aos investidores que a mudança na política não seria revertida. Então como a mudança de política funcionou? As exportações, de fato, explodiram. Em 1980, as exportações mexicanas eram somente 10,7% do PIB, e muito disso era do petróleo. Em 2012, estavam em 34% do PIB, principalmente manufaturas. Atual‑ mente, a manufatura mexicana, em vez de ser voltada a servir o pequeno mercado nacional, é parte de um sistema manufatureiro norte ‑americano integrado. No entanto, os resultados para a economia mexi‑ cana em geral foram um pouco decepcionantes. A renda per capita aumentou ao longo dos últimos 25 anos, mas a taxa de crescimento foi realmente menor do que a alcançada quando o México perseguia a polí‑ tica de industrialização de substituição de importação. Isso significa que a liberalização do comércio foi um erro? Não necessariamente. A maioria (mas não todos) dos economistas que olham para o desempe‑ nho mexicano culpa o relativo baixo crescimento em fatores como a educação deficiente. Mas o fato é que o afastamento do México da substituição de impor‑ tação, embora altamente bem ‑sucedida em torná‑ ‑lo uma nação exportadora, não trouxe o quanto era esperado em termos de um progresso econômico mais amplo. A industrialização de substituição de importação promoveu o desenvolvimento econômico? Aqui surgem sérias dúvidas. Embora muitos economistas aprovas‑ sem medidas de substituição de importação na década de 1950 e no começo de 1960, desde a década de 1960 a industrialização de substituição de importação tem sido alvo de crescentes críticas duras. De fato, muito do foco dos analistas econômicos e dos políticos tomadores de decisão mudou de tentar encorajar a substituição de importação para tentar corrigir o dano feito por políti‑ cas ruins de substituição de importação. Resultados de favorecimento da fabricação: problemas da industrialização de substituição de importação A industrialização de substituição de importação começou a perder a proteção quando ficou claro que os países que a perseguiam não estavam alcançando os paí‑ ses desenvolvidos. Na verdade, alguns países em desen‑ volvimento ficaram mais para trás ainda, mesmo quando M11_KRUGXXXX_C11.indd 218 1/29/15 6:15 PM 219Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento desenvolveram uma base manufatureira nacional. A Índia era mais pobre em relação aos Estados Unidos em 1980 do que em 1950, o primeiro ano após alcançar sua independência. Por que a industrialização de substituição de impor‑ tação não funcionou da forma que deveria? A razão mais importante parece ser a de que o argumento da indústria nascente não é universalmente válido como muitas pessoas supunham. Um período de proteção não vai criar um setormanufatureiro competitivo se existem razões fundamentais pelas quais um país não tem uma vantagem comparativa em manufatura. A experiência mostrou que as razões para o fracasso no desenvolvimento frequentemente são mais profundas do que uma simples falta de experiência com a manu‑ fatura. Os países pobres não têm mão de obra qualifi‑ cada, empresários e competência administrativa, e têm problemas de organização social que tornam difícil para esses países manter suprimentos confiáveis de quaisquer coisas, de peças de reposição à eletricidade. Esses pro‑ blemas podem não estar fora do alcance da política eco‑ nômica, mas não podem ser resolvidos pela política de comércio: uma quota de importação pode permitir que um setor manufatureiro ineficiente sobreviva, mas não pode tornar o setor mais eficiente diretamente. O argu‑ mento da indústria nascente é que, dada a proteção temporária de tarifas aduaneiras e quotas, as indús‑ trias manufatureiras das nações menos desenvolvidas aprenderão a ser eficientes. Na prática, isso não é sem‑ pre, ou mesmo geralmente, verdade. Com a substituição de importação falhando na entrega dos benefícios prometidos, a atenção virou ‑se para os custos das políticas utilizadas para promover a indústria. Sobre essa questão, evidências crescen‑ tes mostraram que as políticas protecionistas de mui‑ tos países menos desenvolvidos distorceram de forma ruim os incentivos. Parte do problema era que muitos países utilizavam métodos excessivamente complexos para promover suas indústrias nascentes. Isto é, eles utilizavam quotas de importação elaboradas e frequen‑ temente sobrepostas, controles de câmbio e regras de conteúdo nacional em vez de simples tarifas aduanei‑ ras. É muito difícil determinar quanta proteção uma regra administrativa pode de fato fornecer, e estudos mostram que o grau de proteção é geralmente alto e mais variável nas indústrias do que o governo preten‑ dia. Como a Tabela 11.2 mostra, algumas indústrias na América Latina e no sul da Ásia foram protegidas por regras que eram equivalentes a taxas de tarifa de 200% ou mais. Essas taxas altas de proteção efetiva permi‑ tiram que as indústrias existissem mesmo quando o custo de produção delas era três ou quatro vezes o preço das importações que elas substituíam. Mesmo os maiores entusiastas e defensores dos argumentos de falha de mercado para proteção achariam difícil defen‑ der taxas de proteção efetiva tão altas. Um custo adicional que recebeu atenção considerável é a tendência das restrições de importação para promo‑ ver a produção em uma escala pequena ineficiente. Os mercados nacionais até mesmo dos maiores países em desenvolvimento são somente uma pequena fração do tamanho do mercado dos Estados Unidos ou da União Europeia. Com frequência, o mercado nacional inteiro não é grande o suficiente para permitir uma fábrica de escala de produção eficiente. Ainda, quando esse pequeno mercado é protegido, digamos, por uma cota de importação, se somente uma empresa entrar nele, ela poderia ganhar os lucros de monopólio. A concorrên‑ cia por esses lucros normalmente leva várias empresas a entrar em um mercado que não tem espaço nem mesmo para uma delas, e a produção é feita em uma escala alta‑ mente ineficiente. A resposta para o problema de escala para países pequenos é, como observado no Capítulo 8, especializar ‑se na produção e exportação de uma varie‑ dade limitada de produtos e importar outras mercado‑ rias. A industrialização de substituição de importação elimina essa opção focando a produção industrial no mercado nacional. Aqueles que criticam a industrialização de substitui‑ ção de importação também argumentam que ela agra‑ vou outros problemas, como a desigualdade de renda e o desemprego. No fim da década de 1980 a industrialização de substituição de importação tinha sido aceita ampla‑ mente, não só pelos economistas, mas também pelas organizações internacionais, como o Banco Mundial, e até mesmo pelos políticos tomadores de decisão nos próprios países em desenvolvimento. A evidência estatística pareceu sugerir que os países em desenvol‑ vimento que seguiram políticas de comércio relativa‑ mente livres tinham, em média, crescido mais rápido tabela 11.2 Proteção industrial efetiva em alguns países em desenvolvimento México (1960) 26% Filipinas (1965) 61% Brasil (1966) 113% Chile (1961) 182% Paquistão (1963) 271% Fonte: Bela Balassa, The Structure of Protection in Developing Countries. Baltimore: Johns Hopkins Press, 1971, p. 82. M11_KRUGXXXX_C11.indd 219 1/29/15 6:15 PM 220 Economia internacional do que aqueles que seguiram políticas protecionistas (embora essa evidência estatística tenha sido desafiada por alguns economistas).2 Essa mudança intelectual radical levou a uma considerável alteração nas políti‑ cas atuais, de forma que muitos países em desenvolvi‑ mento retiraram as quotas de importação e diminuí‑ ram as taxas de tarifa aduaneira. Liberalização do comércio desde 1985 Com início no meio da década de 1980, diversos paí‑ ses em desenvolvimento passaram para taxas de tarifa menores, suprimiram quotas de importação, entre outras restrições no comércio. Essa mudança dos paí‑ ses em desenvolvimento em direção a um comércio mais livre é a grande história da política de comércio das últi‑ mas duas décadas e meia. Após 1985, muitos países em desenvolvimento redu‑ ziram tarifas aduaneiras, retiraram as quotas de importa‑ ção e, no geral, abriram suas economias para concorrên‑ cia da importação. A Figura 11.1 mostra as tendências nas taxas de tarifa aduaneira para uma média de todos os 2 Veja: Francisco Rodriguez; Dani Rodrik. “Trade Policy and Economic Growth: A Skeptic’s Guide to the Cross ‑National Evidence”. In: Ben Bernanke; Kenneth S. Rogoff (Eds.). NBER Macroeconomics Annual 2000. Cambridge, MA: MIT Press for NBER, 2001. países em desenvolvimento e para dois importantes entre eles, a Índia e o Brasil, que costumavam apoiar ‑se forte‑ mente na substituição de importação como estratégia de desenvolvimento. Como se pode ver, existe uma queda dramática nas taxas de tarifa nesses dois países. Mudan‑ ças similares na política comercial, porém menos drásti‑ cas, aconteceram em outros países em desenvolvimento. A liberalização em países em desenvolvimento teve dois efeitos claros. Um foi o aumento dramático no volume do comércio. A Figura 11.2 traça as exportações e importações de países em desenvolvimento, medidas como porcentagens do PIB, desde 1970. Como se pode ver, a parcela do comércio no PIB triplicou sobre esse período, com a maior parte do crescimento acontecendo após 1985. O outro efeito foi uma mudança na natureza do comércio. Antes da mudança na política de comércio, os países em desenvolvimento exportavam, principalmente, produtos agrícolas e de mineração. Mas como vimos na Figura 2.6, isso mudou após 1980: a parcela de mer‑ cadorias manufaturadas nas exportações de países em desenvolvimento subiu, chegando a dominar as exporta‑ ções das maiores economias em desenvolvimento. Porcento Índia Brasil Todos em desenvolvimento 0 20 40 60 80 100 120 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 FIGURa 11.1 Taxas de tarifa aduaneira em países em desenvolvimento Uma medida do distanciamento da industrialização de substituição de importação é a drástica queda nas taxas de tarifa aduaneira em países em desenvolvimento, que caíram de uma média de mais de 30% no começo da década de 1980 para cerca de 10% hoje. Os países que algum dia tiveram políticas de substituição de importação especialmente fortes, com a Índia e o Brasil, também viram declínios exagerados nas taxas de tarifa aduaneira. Fonte: Banco Mundial. M11_KRUGXXXX_C11.indd 220 1/29/15 6:15 PM 221Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento Mas a liberalização do comércio, com a substituiçãode importação, era planejada como um meio para um fim, em vez de um fim por si mesmo. Como vimos, a subs‑ tituição de importação caiu em desuso quando se tornou claro que não entregava aqui a promessa de rápido desen‑ volvimento econômico. Será que a mudança para um comércio mais aberto trouxe melhores resultados? A resposta é que o cenário é misturado. As taxas de crescimento no Brasil e em outros países latino‑ ‑americanos têm, na verdade, sido mais lentas, desde a liberalização do comércio no fim da década de 1980 do que eram durante a industrialização de substituição de importação. A Índia, por outro lado, tem vivenciado uma aceleração impressionante de crescimento — mas como veremos bem na próxima seção deste capítulo, existe uma intensa disputa sobre quanto dessa acelera‑ ção pode ser atribuído à liberalização do comércio. Além disso, existe uma crescente preocupação sobre o aumento da desigualdade em países em desenvolvimento. Na América Latina, pelo menos, o distanciamento da industrialização de substituição de importação parece ter sido associado ao declínio dos salários reais dos trabalha‑ dores, mesmo que os ganhos dos trabalhadores qualifica‑ dos tenham aumentado. FIGURa 11.2 O crescimento do comércio nos países em desenvolvimento Com o início da década de 1980, muitos países passaram a distanciar ‑se das políticas de substituição de importação. Um dos resultados foi o grande aumento tanto nas exportações e importações quanto na porcentagem do PIB. Fontes: <http://data.worldbank.org/indicator/NE.EXP.GNFS.ZS>, <http://data.worldbank.org/indicator/NE.IMP.GNFS.ZS>. Acesso em: 13 nov. 2014. Porcentagem do PIB Exportações Importações 197 0 197 2 197 4 197 6 197 8 198 0 198 2 198 4 198 6 198 8 199 0 199 2 199 4 199 6 199 8 200 0 200 2 200 4 200 6 200 8 2010 0 5 10 15 20 25 30 35 40 Entretanto, uma coisa é clara: a antiga visão de que a substituição de importação é o único caminho para o desenvolvimento provou estar errada, já que uma série de países em desenvolvimento alcançou crescimento extra‑ ordinário ao passo que se tornaram mais, e não menos, abertos ao comércio. Comércio e crescimento: decolagem na Ásia Como vimos, na década de 1970 existia uma desilu‑ são generalizada em relação à industrialização de subs‑ tituição de importação como estratégia de desenvolvi‑ mento. Mas o que poderia substituí ‑la? Uma possível resposta começou a surgir quando eco‑ nomistas e políticos tomadores de decisão perceberam algumas histórias de sucesso surpreendentes no mundo em desenvolvimento — casos de economias que viven‑ ciaram uma dramática aceleração em seu crescimento e começaram a convergir sobre os rendimentos das nações desenvolvidas. Em princípio, essas histórias de sucesso envolviam um grupo relativamente pequeno de econo‑ mias do leste asiático: Coreia do Sul, Taiwan, Hong M11_KRUGXXXX_C11.indd 221 1/29/15 6:15 PM 222 Economia internacional FIGURa 11.3 A decolagem asiática Com início na década de 1960, uma série de economias começou a convergir em níveis de renda de países desenvolvidos. Aqui mostramos o PIB per capita como uma porcentagem de seu nível nos Estados Unidos, utilizando uma escala proporcional para destacar as mudanças. A Coreia do Sul iniciou sua ascensão na década de 1960, a China no fim da década de 1970 e a Índia mais ou menos uma década depois. Fonte: Total Economy Database. Índia Coreia do Sul China PIB per capita como % do nível norte-americano 0 10 20 30 40 50 60 70 1950 1953 1956 1959 1962 1965 1968 1971 1974 1977 1980 1983 1986 1989 1992 1995 1998 2001 2004 2007 2010 2013 Kong e Singapura. No entanto, ao longo do tempo, esses sucessos começaram a se espalhar. Atualmente, a lista de países que já vivenciaram decolagens econômi‑ cas surpreendentes inclui os dois países mais populosos do mundo: China e Índia. A Figura 11.3 ilustra a decolagem asiática mostrando as experiências dos três países: a Coreia do Sul, o maior país do grupo original dos “tigres” asiáticos; a China; e a Índia. Em cada caso, mostramos o PIB per capita como uma porcentagem do nível norte ‑americano, um indica‑ dor que destaca a extensão do “alcance” econômico des‑ sas nações. Como se pode ver, a Coreia do Sul iniciou sua ascensão econômica na década de 1960, a China no fim da década de 1970 e a Índia por volta de 1990. O que fez com que essas economias decolassem? Cada um dos países mostrados na Figura 11.3 viven‑ ciou grandes mudanças em sua política econômica por volta da época de sua decolagem. Essa nova política envolvia regulamentação reduzida do governo em uma série de áreas, incluindo uma mudança em direção a um comércio mais livre. A mudança mais espetacular foi na China, onde Deng Xiaoping, que tinha tomado o poder em 1978, transformou uma economia plane‑ jada centralmente em uma economia de mercado na qual a motivação do lucro tinha a rédea relativamente livre. Mas como explicado no estudo de caso “Boom indiano”, a seguir, as mudanças de política na Índia também foram dramáticas. Em cada caso, tais mudanças de política econômica foram seguidas por um amplo aumento na abertura econômica, como medido pela fatia de exportações em PIB (Figura 11.4). Então parece justo dizer que as his‑ tórias de sucesso na Ásia demonstram que os defensores da industrialização de substituição estavam errados: é possível alcançar desenvolvimento mediante um cresci‑ mento orientado para a exportação. O que é menos claro é até que ponto a liberalização do comércio explica tais casos de sucesso. Como aponta‑ mos, redução de taxas e suspensão de outras restrições à importação foram apenas parte das reformas econômi‑ cas que essas nações empreenderam, o que torna difícil estimar a importância da liberalização do comércio em si. Além disso, nações latino ‑americanas como México e Brasil, que também liberalizaram fortemente o comér‑ cio e se moveram para a exportação, não tiveram deco‑ lagem econômica comparável, o que sugere, ao menos, que outros fatores desempenharam um papel crucial no milagre asiático. M11_KRUGXXXX_C11.indd 222 1/29/15 6:15 PM 223Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento As exportações como porcentagem do PIB. 1960 1963 1966 1969 1972 1975 1978 1981 1984 1987 1990 1993 1996 1999 2002 2005 2008 2011 Índia Coreia do Sul China 0 10 20 30 40 50 60 FIGURa 11.4 O crescente comércio da Ásia Portanto, as implicações da decolagem da econo‑ mia asiática permanecem um tanto controversas. Uma coisa é clara, porém: a visão antiquada de que o mundo econômico é tendencioso em relação a novos entrantes Fonte: Banco Mundial. e que países pobres não podem se tornar ricos provou‑ ‑se errada de modo espetacular. Nunca antes na história humana tanta gente vivenciou um progresso tão rápido em seu padrão de vida. BOOM INDIaNO A Índia, com uma população de mais de 1,1 bilhão de pessoas, é o segundo país mais populoso do mundo. É também uma força crescente no comércio mundial, especialmente em novas formas de comér‑ cio, que envolvem informação em vez de mercado‑ rias físicas. A cidade indiana de Bangalore tornou ‑se famosa por seu crescente papel na indústria global de tecnologia da informação. Ainda há uma geração, a Índia era um jogador pequenino no comércio mundial. Em parte porque, em geral, a economia do país tinha desempenho fraco: até por volta de 1980, tinha uma taxa de crescimento econô‑ mico (algumas vezes ridicularizada como “taxa de cresci‑ mento hindu”) que era em torno de 1 ponto percentual mais alto do que o crescimento da população. Esse crescimento lento era amplamente atribuído ao efeito sufocante das restrições burocráticas. Os observadores falavam de uma “licença Raj”: pratica‑ mente qualquer tipo de iniciativa de negócios preci‑ sava de permissões governamentais difíceis de con‑ seguir, o que abafou investimentos e inovações; e a lenta economia indiana pouco participava do comérciomundial. Depois de o país ter alcançado sua indepen‑ dência em 1948, seus líderes adotaram uma forma particularmente extrema de industrialização de subs‑ tituição de importação como estratégia de desenvolvi‑ mento: a Índia não importava quase nada que pudesse produzir nacionalmente, mesmo se o produto nacional fosse bem mais caro e de qualidade inferior ao que poderia ser comprado no exterior. Por sua vez, os altos custos limitaram as exportações. Portanto a Índia era uma economia bem “fechada”. Na década de 1970, as importações e exportações eram em média apenas 5% do PIB, próximo aos menores níveis de qualquer grande nação. M11_KRUGXXXX_C11.indd 223 1/29/15 6:15 PM 224 Economia internacional Então tudo mudou. O crescimento indiano acele‑ rou dramaticamente: o PIB per capita, que aumentara a uma taxa anual de somente 1,3% de 1960 a 1980, cresceu próximo de 4% anualmente desde 1980. E a participação da Índia no comércio mundial subiu ao mesmo tempo em que as tarifas aduaneiras foram diminuídas e as quotas de importação retiradas. Resumindo, a Índia tornou ‑se uma economia de alto desempenho. A Índia ainda é um país muito pobre, mas está enriquecendo rapidamente e começou a rivalizar com a China como o foco da atenção mundial. A grande questão, claro, é por que a taxa de cres‑ cimento da Índia aumentou de forma tão dramática. A questão é objeto de debate acalorado entre os eco‑ nomistas. Alguns argumentaram que a liberalização do comércio, que permitiu à Índia participar da economia global, foi crucial.3 Outros apontam que o crescimento indiano começou a acelerar por volta de 1980, conside‑ rando que as grandes mudanças na política de comér‑ cio não ocorreram até o começo de 1990.4 O que quer que tenha causado a mudança, a transição indiana tem sido um desenvolvimento bem ‑vindo. Agora, mais de um bilhão de pessoas têm muito mais esperança de ter um padrão de vida decente. 3 Veja: Arvind Panagariya. “The Triumph of India’s Market Reforms: The Record of the 1980s and 1990s”. Policy Analysis, v. 554, Cato Institute, nov. 2005. 4 Veja: Dani Rodrik; Arvind Subramanian. “From ‘Hindu Growth’ to Productivity Surge: The Mystery of the Indian Growth Transi‑ tion”, IMF Staff Papers, v. 55, p. 193–228, fev. 2005. resuMO 1. A política de comércio em países menos desenvolvidos pode ser analisada utilizando ‑se as mesmas ferramentas analíti‑ cas empregadas para discutir os países desenvolvidos. Entre‑ tanto, as questões particulares características dos países em desenvolvimento são diferentes daquelas dos países desen‑ volvidos. Em particular, a política de comércio nesses países refere ‑se a dois objetivos: promover a industrialização e lidar com o desenvolvimento desigual da economia nacional. 2. A política de governo para promover a industrialização tem frequentemente sido justificada pelo argumento da indús‑ tria nascente, que diz que novas indústrias precisam de um período temporário de proteção contra a concorrência de indústrias já estabelecidas em outros países. Entretanto, o argumento da indústria nascente é válido somente se pu‑ der ser usado como um argumento de falha de mercado para intervenção. As duas justificativas comuns são a exis‑ tência de mercados de capitais imperfeitos e o problema da apropriabilidade de conhecimento gerado pelas empresas pioneiras. 3. Utilizando o argumento da indústria nascente como justi‑ ficativa, muitos países menos desenvolvidos perseguiram políticas de industrialização de substituição de importação nas quais as indústrias nacionais são criadas sob a proteção de tarifas aduaneiras e quotas de importação. Embora es‑ sas políticas tenham sido bem ‑sucedidas em promover a in‑ dústria, nem de longe elas trouxeram os ganhos esperados em crescimento econômico e padrão de vida. Agora, muitos economistas são críticos duros dos resultados da substitui‑ ção de importação, argumentando que ela incentiva a pro‑ dução de custo alto e ineficiente. 4. Com início em torno de 1985, muitos países em desenvol‑ vimento, não satisfeitos com os resultados das políticas de substituição de importação, reduziram altamente as taxas de proteção para a indústria. Como resultado, o comércio de países em desenvolvimento cresceu rapidamente, assim como a parcela de mercadorias manufaturadas em expor‑ tações. Os resultados dessa política mudam em termos de desenvolvimento econômico, contudo, na melhor hipótese eles têm sido mistos. 5. A visão de que o desenvolvimento econômico deve acon‑ tecer por meio de substituição de importação e pelo pes‑ simismo sobre o desenvolvimento econômico, que foi es‑ palhado ao passo que a industrialização de substituição de importação pareceu fracassar, foi confundida pelo rápido crescimento econômico de uma série de economias asiá‑ ticas. As economias asiáticas cresceram não por meio de substituição de importação, mas por meio de exportações. Os dois crescimentos são caracterizados por altos índices de comércio na renda nacional e por taxas de crescimento extremamente altas. As razões para o sucesso dessas eco‑ nomias são muito discutidas, havendo controvérsia sobre o papel desempenhado pela liberalização do comércio. terMOs ‑chave apropriabilidade, p. 216 industrialização de substituição de importação, p. 217 mercados de capitais imperfeitos, p. 216 países em desenvolvimento, p. 214 M11_KRUGXXXX_C11.indd 224 1/29/15 6:15 PM 225Capítulo 11 Política comercial nos países em desenvolvimento prObleMas 1. Quais países parecem ter sido mais beneficiados com o co‑ mércio internacional durante as últimas décadas? Quais po‑ líticas esses países parecem ter em comum? As experiên cias desses países dão apoio ao argumento da indústria nascen‑ te ou ajudam a argumentar contra?5 2. “A experiência do Japão faz o caso da indústria nascente para proteção melhor do que qualquer teoria. No começo da década de 1950, o Japão era uma nação pobre que sobre‑ vivia com a exportação de produtos têxteis e brinquedos. O governo japonês protegeu o que, de início, eram indústrias de aço e automóveis ineficientes e de custo alto, e essas indústrias passaram a dominar os mercados mundiais”. Dis‑ cuta de forma crítica. 3. Atualmente, um país importa automóveis a US$ 8.000 cada. Seu governo acredita que, com o tempo, os produtores na‑ cionais podem produzir automóveis por US$ 6.000, mas que isso causaria um período de mudança radical durante o qual os automóveis custariam US$ 10.000 para serem produzi‑ dos nacionalmente. a. Suponha que cada empresa que tente produzir os automó‑ veis deva passar sozinha pelo período de mudança radical de custos altos. Sob quais circunstâncias a existência desses custos altos iniciais justifica a proteção da indústria nascente? b. Agora suponha, pelo contrário, que uma vez que essa em‑ presa tenha suportado os custos de aprender a produzir automóveis de US$ 6.000 cada, outras empresas podem imitá ‑la e fazer o mesmo. Explique como isso pode impe‑ dir o desenvolvimento de uma indústria nacional e como a proteção da indústria nascente pode ajudar. 4. Tanto a Índia quanto o México perseguiram políticas de substituição de importação após a Segunda Guerra Mun‑ dial. Entretanto, a Índia foi muito mais longe, produzindo quase tudo para si, enquanto o México continuou a depen‑ der das importações de mercadorias capitais. Por que você acha que essa diferença pode ter surgido? 5. Quais são algumas das razões para o declínio na estratégia da industrialização de substituição de importação em favor da estratégia que promove o comércio aberto? 5 Essa questão destina ‑se a desafiar os estudantes e ampliar a teoria apresentada neste capítulo. leituras adiciOnais LEwIS, w. A. The Theory of Economic Development. Homewood, IL: Irwin, 1995. Um bom exemplo da visão otimista tirada das políticas de comér‑ cio para desenvolvimento econômico durante a maré alta de substitui‑ ção de importação nas décadas de 1950 e 1960. LITTLE, I. M. D.; SCITOvSky, T.; SCOTT,M. Industry and Trade in Some Developing Countries. Nova york: Oxford University Press, 1970. Um trabalho sobre o surgimento de uma visão pessimista da substituição de importação nas décadas de 1970 e 1980. NAUGHTON, B. The Chinese Economy: Transitions and Growth. Cambri‑ dge: MIT Press, 2007. Uma boa visão geral das mudanças radicais na política chinesa ao longo do tempo. RODRIk, D. One Economics, Many Recipes. Princeton: Princeton Univer‑ sity Press, 2007. visões sobre comércio e desenvolvimento a partir de um líder cético de ortodoxias predominantes. SRINIvASAN, T. N.; TENDULkAR, S. D. Reintegrating India with the World Economy. washington: Instituto de Economias Internacionais, 2003. Como a Índia afastou ‑se da substituição de importação e o que acon‑ teceu como resultado. M11_KRUGXXXX_C11.indd 225 1/29/15 6:15 PM Capítulo 11 - Política comercial nos países em desenvolvimento Industrialização de substituição de importação O argumento da indústria nascente Promover a fabricação mediante proteção Resultados de favorecimento da fabricação: problemas da industrialização de substituição de importação Liberalização do comércio desde 1985 Comércio e crescimento: decolagem na Ásia Resumo