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A Beleza da Linguagem de Verde

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A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, indo o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!
Em alguns poemas, a capacidade plástica da linguagem de Verde mistura-se à crítica 
social, como em "Num bairro moderno": o olhar do eu-lírico começa sua deambulação por 
esse ambiente citadino, pleno de cores e luz, e moderno, conforme o título, observando as 
diferenças de conforto entre os privilegiados da "casa apalaçada", onde "reluzem, num 
almoço, as porcelanas" - nas três primeiras estrofes - em oposição à situação de uma 
vendedora de frutas e verduras (regateira), maltratada por um criado que pouco lhe paga por 
seus produtos: "E muito descansado,/ Atira um cobre lívido, oxidado" (estrofe 6). De repente, 
a reflexão iniciada pela descrição da pobre moça "esguelhada, feia" volta-se para a beleza 
dos elementos do ambiente: "Subitamente - que visão de artista!" [...] "À luz do Sol, o intenso 
colorista" transformados em elementos humanos plenos de sugestões de cheiros: "Bóiam 
aromas, fumos de cozinha",de cores: "E os nabos - ossos nus, da cor do leite,/E os cachos de 
uvas - os rosários de olhos, e formas:  Há colos, ombros, bocas, um semblante/ Nas 
posições de certos frutos. 
CLIQUE PARA LER O POEMA “NUM BAIRRO MODERNO” 
Num Bairro Moderno
1. Dez horas da manhã; os transparentes 
Matizam uma casa apalaçada; 
Pelos jardins estancam-se as nascentes, 
E fere a vista, com brancuras quentes, 
A larga rua macadamizada. 
2. Rez-de-chaussée repousam sossegados, 
Abriram-se, nalguns, as persianas, 
E dum ou doutro, em quartos estucados, 
Ou entre a rama do papéis pintados, 
Reluzem, num almoço, as porcelanas. 
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