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Crítica de Nietzsche a Wagner

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26| Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017.
A wagneriana
Fernando R. de Moraes Barros*
Resumo: Este artigo visa a condensar e expor a crítica de 
Nietzsche a Wagner a partir do tipo cultural identificado, pelo 
filósofo, como a wagneriana. Levando em conta o sentido 
paradoxal do discurso nietzschiano a respeito do feminino – a 
um só tempo libertador e masculinista – e passando em revista 
elementos fundantes da obra do célebre compositor, torna-
se então plausível apreciar a relação entre drama musical 
e misoginia. A ideia principal é a de mostrar que, a despeito 
de certos prejuízos esposados pelo filosofo alemão, ele não 
pode aceitar a lógica dualista que preside o sistema sexista de 
significações, revelando-se, em suas análises estético-musicais, 
um confiável e atento aliado no combate aos preconceitos morais.
Palavras-chave: Wagner - Nietzsche - drama musical - eterno-
feminino.
“Quem sabe? Talvez eu seja o primeiro psicólogo do eterno-
feminino” (EH/EH, Por que escrevo tão bons livros, 5, KSA 
6.305).
No entender de Nietzsche, a obra de Wagner representa um 
perigo à mulher. “Wagner é fatal para a mulher”, diz-nos ele. (WA/
CW, Pós-escrito, KSA 6.44). Explicitar essa suposta ameaça impli-
ca, como veremos, passar em revista elementos de um expressivo 
teatro musical, bem como estruturas motívicas em meio a um denso 
repertório de sons. Mas, sob a ótica nietzschiana, vale dizer, desde 
logo, o aludido risco não se deixa estimar apenas em matéria de 
música e de músicos. Inserindo a produção do celebre compositor 
num horizonte hermenêutico notadamente amplo, que suplanta as 
atividades específicas de um dramaturgista musical, o filósofo ale-
http://dx.doi.org/10.1590/2316-82422017v3801frmb
* Professor da Universidade Federal do Ceara, Brasil. Correio eletrônico: frbarros76@
gmail.com. 
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mão recusa-se a analisá-la unicamente à luz dos elementos fundan-
tes de suas técnicas compositivas. Tanto é assim que, ao ponderar 
sobre a adesão à arte wagneriana, faz questão de marcar seu lugar 
de fala: “Tratemos de medi-la a partir de seu efeito sobre a cultu-
ra” (WA/CW, Pós-escrito, KSA 6.42). Considerado a partir de um 
parâmetro antropológico-cultural, tal efeito parece atingir, inclusi-
ve, as raias do aldeiglobal. Em registro epistolar, o autor de O caso 
Wagner chega a se lamentar, nesse sentido, quanto ao alcance apa-
rentemente regional de seu libelo estético-musical: “Três quartos 
dos músicos todos acham-se total ou parcialmente convencidos; os 
teatros sobrevivem dessa arte [wagneriana], de São Petersburgo a 
Paris, de Bolonha a Montevidéu (...) Confesso que, em vista do ca-
ráter inteiramente internacional-europeu do problema, este escrito 
[O caso Wagner] deveria ter sido redigido em francês, e não em 
alemão.”1 Compreendendo seu pensamento como uma visão geral 
sobre “a ‘civilização’ alcançada” (Nachlass/FP, 1887, 12 9[177], 
KSA 12.440),2 Nietzsche procede como se Wagner condensasse, 
como triunfo artisticamente sublimado de tardios processos forma-
tivos, a potência ético-moral da modernidade mesma, albergando 
seu mais característico cabedal axiológico. A esse propósito, es-
creve: “Por meio de Wagner, a modernidade fala a sua linguagem 
mais intima (...) ter-se-á feito quase que um acerto de contas sobre 
o valor do moderno, se tivermos clareza acerca do bem e mal em 
Wagner” (WA/CW, Prólogo, KSA 6.12).
Selecionadas por instâncias assimétricas de apreciação e 
cultivo valorativos, as modernas perspectivas de avaliação resulta-
riam, para o pensador alemão, de valores já de si ambíguos, exibin-
do uma sintomatologia paradoxal, na qual justamente “os mesmos 
sintomas poderiam indicar declínio e forca” (Nachlass/FP 1887, 10 
[23], KSA 12.468). Interpretada, pois, como “ambiguidade de valo-
1 Carta a Jacob Burckhardt de 13/9/1888 (KGB III, 5.1108).
2 Cf. também: “Minha obra deve conter uma visão geral sobre o nosso século, sobre a intei-
ra modernidade” (Nachlass/FP, 1887, 9[177], KSA 12. 440).
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res” (Nachlass/FP, 1888, 17[2], KSA13.520), a modernidade passa 
a ser entrevista – em especial, no período de maturidade de seu 
filosofar - como um empreendimento massivo de modelagem instin-
tual, responsável, sob a ótica nietzschiana, por um exaurimento da 
economia pulsional e, no limite, pela “atrofia dos tipos” (Nachlass/
FP, 1887, 9 [168], KSA 12.435) que dele decorrem. À descrição 
desse estado decadencial de coisas somos levados, porém, não ape-
nas por aqueles textos em que Nietzsche se detém, com acuidade 
histórico-filológica, no diagnóstico genealógico do processo civili-
zatório como um todo.3 Tal panorama também pode ser avistado lá, 
onde a crítica à modernidade se articula em vista das formas artís-
ticas de organização dos impulsos, consideradas como expressões 
estéticas da matéria-prima pulsional e, no caso, próprias ao imagi-
nário dramático-musical criado por Wagner. Como, por exemplo, 
os brutos escandinavos dotados, a um só tempo, de “sensualidade 
desenfreada e dessensualizacao” (NW/NW, Uma música sem fu-
turo, KSA 6.424), ou, então, de modo pregnante, na forma de uma 
curiosa feminização musical, a qual, segundo o filósofo alemão, re-
sumiria o próprio espírito da música wagneriana – supondo que 
“tal música, como toda música, não saiba falar acerca de si mesma 
sem ser ambígua: pois a música é uma mulher....” (NW/NW, Uma 
música sem futuro, KSA 6.424).
E é precisamente aqui, sob a égide do feminino, que os pon-
tos nodais da crítica a Wagner tendem a convergir entre si, operan-
do qual um sismógrafo em relação ao alcance dos juízos condena-
tórios que a ele são dirigidos. Afinal de contas, se “sua ópera é a 
ópera da redenção” (WA/CW, §3, KSA 6.16) e se nela há alguém 
que “sempre quer ser redimido” (WA/CW, §3, KSA 6.16), são as 
personagens femininas, ora como objeto de suplício ora como ins-
trumento de sedução, que terminam por concentrar os principais 
ciclos culpabilizantes e, por conseguinte, a ânsia por remissão. 
3 Como, por exemplo, em Para a genealogia da moral e, em especial, em O anticristo.
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Porque as apresenta como passivo termo relacional entre protago-
nistas masculinos – noivas ofertadas como dote, por exemplo –, os 
dramas wagnerianos serviriam para mostrar, tal como lembra Su-
sanne Vill, de que modo “o amor e a devoção das figuras femininas 
são fracassados e destruídos no confronto com a ação e o poder dos 
homens.”4 O que também presta testemunho do fato de que, aqui, a 
mulher não se sentiria à altura de cuidar de si mesma, carecendo, 
para tanto, de um vetor salvífico dela independente. Quem, a não 
ser Wagner, indaga Nietzsche a esse respeito, nos ensinaria “que 
damas promíscuas preferem ser redimidas por mancebos puros? (O 
caso de Kundry) Ou que belas moças esperam preferencialmente 
ser redimidas por um cavaleiro que seja wagneriano? (O caso nos 
Mestres cantores)” (WA/CW 3, KSA 6.17).
Todavia, examinada a partir da dinâmica que, segundo o filó-
sofo alemão, regula e constitui a concreção somática fundamental 
dos seres humanos, a obra de arte wagneriana se deixaria articular 
com base numa instância valorativa mais visceral e recuada, adqui-
rindo um sentido ligado ao corpóreo e às funções reguladoras dos 
próprios ouvintes. Pressupondo que as qualidades estéticas de um 
dado construto artístico são supervenientes ou consolidadas pelos 
impulsos ou complexos daquele que o engendrou,5 Nietzsche trata 
de presumir uma relação condicional, efetivada por transferência 
sensitiva não figurativa, entre a intensidade auditiva do espectador 
e aquilo que se passa em seu corpo. No caso de Wagner, ao menos 
sob o enfoque nietzschiano, isso traria consigo algo já de si preocu-
pante: “Os estados fisiológicos alarmantesaos quais Wagner trans-
fere a seus ouvintes (respiração irregular, perturbação da circula-
ção sanguínea, irritabilidade extrema seguida de coma repentino) 
4 VILL, Susanne. “‘Das Weib der Zukunft’: Frauen und Frauenstimmen bei Wagner.” In: 
VILL, Susanne (Org.). “Das Weib der Zukunft”: Frauengestalten und Frauenstimmen 
bei Richard Wagner. Stuttgart/Weimar: Metzler, 2000, p.12.
5 É nessa chave que ganha sentido, por exemplo, a indagação: “Em vista de todos os valores 
estéticos, lanço mão, agora, dessa distinção fundamental: pergunto, em todos os casos particu-
lares, ‘foi a escassez ou o excesso que aqui se tornou criativo?’” (FW/GC 370, KSA 3.621).
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contêm uma refutação de sua arte” (Nachlass/FP 1888, 16 [75], 
KSA 13.510). E a questão se torna tanto mais temerária, porquanto 
o pensador faz intervir, a partir de uma concepção disposicional 
do sujeito da fruição estética, uma espécie de desejo ou deman-
da infra-consciente por esgotamento, bem como uma necessidade 
perversa, da parte dos esgotados, daquilo que lhes seria fisiopsico-
logicamente nocivo. Nesse sentido, lê-se ainda: “Os esgotados são 
atraídos por aquilo que é prejudicial” (WA/CW 5, KSA 6.22).
Na falta de uma leitura mais atenta, poder-se-ia entrever, 
aqui, a presença de uma identificação simpática e congenial, ou, 
então, uma versão laicizada da empatia [Einfühlung] romântica, 
segundo a qual, por afinidade de berço ou semelhança inata de 
caráter, “almas aparentadas já se saúdam à distancia.”6 Mas, assim 
como nossos olhos não se limitariam a registrar, qual uma lente 
objetiva, aquilo que condiciona externamente o estímulo retínico, 
a membrana timpânica tampouco se contentaria em captar passiva-
mente os sons formados pela vibração do ar, senão que associaria 
os golpes que a fazem vibrar, transpondo e traduzindo, centrífuga e 
inventivamente, a grandeza intensiva que lhe estimula. Daí o nosso 
universo sonoro ser, antes de mais nada, uma esfera por nós sub-
sumida, limitada e modulada em seus desempenhos sensoriais, es-
tando antecipadamente fora de questão uma escuta “real”, ou, para 
lembrar um lapidar fragmento nietzschiano de juventude: “ouvimos 
o som apenas em nós – supor, a partir daí, que exista um mundo ex-
terior implica, já, outro passo” (Nachlass/FP 1872, 19[217], KSA 
7.487). Razão pela qual não se trata, na mencionada nocividade, do 
resultado de uma passividade atávica e constitutiva, mas, antes do 
mais, de uma receptividade ativa e, por isso mesmo, paradoxal em 
sua operosidade. Tributária da ação basilar da vontade de potência 
no ser humano, a sensorialidade não deixa de ser, mesmo em seu 
carácter epifenomênico, o instrumento de um anseio de domínio, 
6 SCHOPENHAUER, Arthur. Parerga und Paralipomena I. In: Saemtlcihe Werke. Frank-
furt am Main: Suhrkamp, Volume IV, 1986, p.173.
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que visa a “um plus de potência” (Nachlass/FP 1888, 14 [174], 
KSA 13.360). A diferença estaria no fato de que, aqui, tal plus é 
interpretado segundo seu valor negativo, de sorte que o sentimento 
de aumento e crescimento dar-se-ia às avessas, atraído por aquilo 
que lhe é desgastante. Donde a acusação: “Wagner aumenta o esgo-
tamento: por isso atrai os fracos e esgotados” (WA/CW 5, KSA 6.22).
Ora, se o critério de análise for essa espécie predatória de 
atração pela música de Wagner, a assim chamada wagneriana, 
em sua acintosa devoção ao compositor, tende a adquirir a primazia 
interpretativa, figurando, à luz de uma lógica notoriamente perver-
sa, como causa e efeito de sua própria condição. “A mulher se em-
pobrece em prol do mestre, torna-se tocante, fica nua a sua frente” 
(WA/CW, Pós-escrito, KSA 6.44), diz-nos Nietzsche; mas para logo 
em seguida nos lembrar que, a seu ver, isso se deve à incorporação 
de injunções impositivas exteriores, de modo que tal espectadora, 
apresentando-se como porta-voz daquilo que vê e escuta, conver-
ter-se-ia num mero significante dos interesses de outrem, o mesmo 
é dizer, de seu mestre: “em sua figura vence a causa dele” (WA/CW 
6, Pós-escrito, KSA 6.44). Sob esse aspecto, a mulher seria mais 
propriamente, não o receptor, mas o objeto mesmo em que se reflete 
o poder da música diante da qual, sob tal ângulo, ela se dobraria. 
Provendo uma escuta perfeitamente adaptada àquilo que musical-
mente se lhe oferece, ela representaria, por assim dizer, a confirma-
ção de um domínio encantatório que lhe governaria por completo. 
Cagliostro da modernidade, Wagner teria então encontrado, aqui, a 
formula “oculta” de seu sucesso e, por esse trilho, a aprovação ex-
plícita de um mundo musical oportunista e ambiciosamente sancio-
nado: “O seu êxito [de Wagner] – seu êxito junto aos nervos e, por 
conseguinte, junto às mulheres – converteu o mundo dos músicos 
arrivistas em seguidores de sua arte oculta” (WA/CW 5, KSA 6.23). 
Especialista em passes hipnóticos, o compositor faria ainda su-
por, como precondição de seu fazer artístico, uma receptividade 
especificamente feminina, própria de quem, segundo as palavras 
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de Nietzsche, “sujeita-se às forças elementares da música mais ou 
menos como a mulher sujeita-se à vontade de seu hipnotizador” 
(Nachlass/FP, 1887, 10 [155], KSA 12.543). Conduzindo suas pro-
tagonistas a uma superexcitação dos nervos – Wagner, lê-se, é “une 
nevrose” [uma neurose] (WA/CW 5, KSA 6.22) –, ele daria a conhe-
cer, por fim, uma faceta psicopatológica de suas heroínas, mediante 
a qual estas últimas serviriam de “fármaco para toda sorte de expe-
rimentos neurótico-hipnótico-eróticos dos psicólogos parisienses!” 
(Nachlass/FP 1888, 15 [6], KSA13.407). Neurose que, conforme a 
visão masculinista de mundo aqui subjacente, decorreria de uma 
incapacidade, por parte das heroínas, de reproduzir: “Alguém já 
notou como como nenhuma delas nunca gerou uma criança?” (Na-
chlass/FP 1888, 15 [6], KSA13.407).
 Concedida a parte à perspicácia da critica nietzschiana, que 
traz à baila a manipulação fundadora do êxito wagneriano junto ao 
publico feminino, é evidente que o pensador também faz ecoar, à 
curta distância, a voz da misoginia. Gesto que salta igualmente aos 
olhos de quem lê outros escritos seminais. Zaratustra, por exem-
plo, promove uma atitude androcêntrica e autorreferida do sujeito 
da volição ao conceber a felicidade feminina em termos de uma 
relação disjuntiva de poder: “A felicidade do homem significa: eu 
quero. A felicidade da mulher significa: ele quer“ (Za/ZA I, Das 
velhas e jovens mulheres, KSA 4.85). Presumindo a impossibili-
dade de autoengrandecimento e prosperidade da mulher, o autor 
d’O anicristo entrevê, na escravidão, sua derradeira e radical saída: 
“num sentido mais elevado, a escravidão constitui a ultima e única 
condição na qual é dado ao indivíduo de vontade fraca prosperar, 
em especial, a mulher.” (AC/AC 54, KSA. 6.237). Fiando-se numa 
concepção sexista do conhecimento, o autor de Além de bem e mal 
faz interceder uma postura anti-cognitivista, como se a situação 
feminina excluísse, por si só, quaisquer ambições intelectuais: 
“Quando uma mulher tem inclinações eruditas, então, em geral, há 
algo de errado com sua sexualidade“ (JGB/BM 144, KSA 5.98). E, 
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supondo que sexualidade e maternidade são inseparáveis uma da 
outra, Nietzsche termina por fortalecer a ideia de que a reprodução 
é uma marca teleologicamente distintiva das mulheres, como se es-
tas tivessem, por destinação, a função de procriar, residindo nisso 
a solução do seu “enigma”: “Na mulher, tudo é um enigma, e tudo 
na mulher possui uma única solução: chama-se gravidez. O homem 
é, para mulher, um meio: o fim é sempre a criança” (Za/ZA I, Das 
mulheres velhas e jovens, KSA 4.84). Ou, de forma aindamais de-
trativa: “‘Emancipação da mulher’ – trata-se do ódio instintivo da 
mulher malograda, quer dizer, incapaz de gerar filhos, contra a mu-
lher bem-lograda“ (EH/EH, Por que escrevo tão bons livros, 5, KSA 
6.306). A causalidade em questão, porém, não pressupõe inerência 
e tampouco participa eficientemente da produção de seus efeitos, 
pois, se a criança, como imagem da “roda que gira por si mesma” 
(Za/ZA I, Das três transmutações, KSA 4.31), pode vir a sensificar 
o “jogo do criar”(Za/ZA I, Das três transmutações, KSA 4.31), tal 
autonomia criativa decerto não é coextensiva à corporeidade ma-
terna, a qual, nesse registro, não assegura para si qualquer nexo 
contínuo entre querer e poder – aproximando-se, antes do mais, ao 
“tu deves” próprio ao espirito de peso, o qual, embalado aqui pela 
significação compulsória da gestação, deseja “que se lhe carregue 
bem” (Za/ZA I, Das três transmutações, KSA 4.30). Isso porque 
fazer filhos não é o mesmo que gerá-los, de sorte que, embora iman-
tada à sexualidade reprodutora, a mulher se vê, em tal patamar 
reflexivo, despojada do sémen frutificador e da força engendradora 
da qual supostamente dependeria para adquirir auto-valoração – 
capacidade que, emanando de outrem, não lhe pertenceria de fato 
e tampouco de direito. E Annemarie Pieper tem uma certa razão ao 
lembrar que, “medida à luz da força produtiva do homem, a geração 
de filhos não é, nem de longe, tão meritória quanto a auto-organi-
zação do homem, ligada ao corpo e entendida como grande razão”7. 
7 PIEPER, Annemarie. Aufstand des stillgelegten Geschlechts: Einführung in die femi-
nistische Ethik. Herder Freiburg, Basel, Wien, 1993, p. 111.
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Ao que tudo indica, em que pese sua luta sem descanso contra as 
concepções metafísicas e religiosas de sujeito, Nietzsche não teria 
conseguido superar completamente as imposições da heteronomia, 
justamente por “denegar à mulher”, prossegue a comentadora, “a 
possibilidade de encontrar uma identidade a partir de sua própria 
força”8.
Não há nada, porém, na explicação que Zaratustra dá ao si-
-mesmo [Selbst]9 – enquanto corpo que “criou para si o espírito 
com a mão de sua vontade” (Za/ZA I, Dos desprezadores do corpo, 
KSA 4.31) –, que permita afirmar que a pluralidade de afetos e 
impulsos que constitui tal espirito corpóreo tenha de ser necessa-
riamente “macho” – e muito menos “fêmea.” O corpo não poderia 
determinar o gênero e tampouco este poderia ser concebido como 
um atributo exclusivamente anatômico, porque o corpo não é, nesse 
registro, um ser-causa e muito menos um substrato neutro à espera 
de qualidades a serem por ele instanciadas. Qualquer definição 
estipulativa do corpóreo deve ser entendida, aqui, como ilusão, 
ou, melhor ainda, como uma ilusão metodológica: “O fenômeno do 
corpo é o mais rico, claro e palpável: posto de antemão para fins 
metodológicos, sem nada atingir acerca de sua significação última” 
(Nachlass/FP, 1887, 5[56], KSA 12.206). E o mesmo valeria, num 
sentido ainda mais funcional, para termos tais como “impulso” 
[Trieb]: “A palavra impulso, afinal, consiste tão-só numa comodi-
dade e é sempre empregada nos casos em que efeitos regulares 
sobre os organismos ainda são remetidos às suas leis químicas e 
mecânicas” (Nachlass/FP 1887, 23 [9], KSA 8.406). Mais regu-
lativos do que lexicais, tais vocábulos assumiriam – em contextos 
dados, em geral, por descrições imagéticas – a função de remeter a 
8 Id. ibid.
9 Em vista de um estudo atento e rigoroso sobre o conceito de si-mesmo [Selbst] contido e 
explicitado na seção “Dos desprezadores do corpo”, em Assim falava Zaratustra, cf. o rico 
ensaio de Scarlett Marton intitulado “Do dilaceramento do sujeito à plenitude dionisíaca” (In: 
Cadernos Nietzsche 25. São Paulo: discurso editorial, 2009, pp.53-82).
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análise de modo intercambiável a um horizonte, no qual a noção de 
espírito já não pode ser pensada a partir da ideia de uma entidade 
imaterial que se opusesse ao corpo, mas segundo um pensamento 
que se incumbe justamente de abolir as versões canônicas de alma: 
“conceitos tais como ‘alma mortal’, ‘alma enquanto multiplicidade 
do sujeito’ e ‘alma enquanto estrutura social dos impulsos e afetos’ 
desejam ter, doravante, direitos de cidadania na ciência” (JGB/BM 
12, KSA 5.27). E, precisamente porque a atividade exercida pelos 
impulsos não se deixa enfeixar por leis que permitissem calcular, 
de antemão, os resultados da batalha por eles travada – no interior 
da “estrutura social de muitas ‘almas’” (JGB/BM 19, KSA 5.33) – é 
que se deveria conceber a noção de gênero enquanto processo infi-
xável. Pretender desnudar um feminino eterno e essencial implica 
submeter o gênero à noção de unidade e, por esse viés, reiterar a 
primazia de um “eu” unívoco doador de sentido: “Emprestamos o 
conceito de unidade de nosso conceito de ‘eu’” (Nachlass/FP 1888, 
14 [79], KSA 13.258). É para evitar esse tipo de contradição per-
formativa que Nietzsche enfatiza, às vezes, o caráter polimorfo e di-
nâmico da sexualidade: “O grau e o tipo de sexualidade de um ser 
humano atingir o ápice de seu espirito” (JGB/BM, 75, KSA 5.87).
 Com efeito, as cores marcantes com as quais Nietzsche pinta 
o tipo cultural que designa a wagneriana – em relação ao qual ele 
nunca deixará de ter “o pé atrás”10 – continuarão a matizar boa 
parte de suas ponderações estético-musicais, seja para acentuar 
estrategicamente a critica a Wagner, seja para marcar sua posição 
insular frente à Europa de seu tempo. Mas seria temerário igualar 
sua detração açodadamente a uma gratuita virulência antifeminis-
ta, fruto de uma auto-compreensão cínica que se compraz com seus 
próprios excessos verbais. Pois, mesmo se querendo extemporâneo, 
o filósofo alemão não se aparta dos contextos feministas emergentes 
da sociedade civil burguesa da qual inevitavelmente faz parte. Co-
10 Carta a G. Brandes de 20/10/1888 (KGB III, 1134, 5.457).
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nhece-os, ao contrário, em complemento à chave vivencial de seu 
pensar, de perto e desde dentro. Tanto é assim que, na década de 
1880, durante seus gratificantes veraneios em Sils-Maria, foi visi-
tado algumas vezes por doutorandas “engajadas” da Universidade 
de Zurique, como, por exemplo, Resa von Schirnhofer e Helene 
Druskowitz, e, em especial, Meta von Salis – que, em1887, de-
fendera uma tese sobre a mãe de Henrique IV. A recém-doutora, 
no entanto, não o visitou sozinha. Com ela, viajava Hedwig Kym. 
Escritora livre e laica, ativa integrante da “Fraternité” – associação 
feminina suíça - e assídua colaboradora da revista A filantropa [Die 
Philanthropin], a jovem intelectual presenteou o pensador com um 
volume de seus Poemas [Gedichte] e com ele entabulou conver-
sas diárias. Numa correspondência à irmã, Nietzsche comenta, não 
sem uma certa maledicência, sobre a estada a três: “A senhorita 
von Salis demorou-se 6 semanas em Sils, para recuperar-se das 
agruras do doutoramento; acompanhava-lhe uma miúda e enferma 
amiga, a filha do Prof. Kym [Ludwig Andreas Kym ], e tive huma-
nidade suficiente para receber essas feminilidades, que, embora 
respeitáveis, são, no fundo, pouco edificantes.”11
Isso apenas para indicar que as apreciações contundentes, 
certamente eivadas de prejuízos, que o filósofo alemão faz a propó-
sito das mulheres não decorrem de simples leituras acumuladas e 
caricatas, mas de uma visão que traz consigo as marcas do porme-
nor vivo, e, no caso supramencionado, assaz exemplar, porquanto 
diz respeito a um modo de vida avesso à maneira heterossexista 
de agir e sentir. Parceiras intelectuais, Kym e von Salis conhece-
ram-se quando ainda eram alunas e, desde então, partilharam as 
mesmas referências teórico-especulativas. Companheiras de casa, 
passaram a morar juntasem 1887 e, a partir dai, dividiram o mes-
mo espaço. Camaradas de viagem, juntas empreenderam – como 
atestam os diários escritos por Meta von Salis entre janeiro 1883 e 
11 Carta a E. Förster-Nietzsche de 15/10/1887 (KGB III, 925, 5.166)
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11 de marco de 1929 –, longas incursões pela Itália, Irlanda e norte 
da África.12 Não é fortuito que, ao comentar a união, Berta Schlei-
cher afirme não se tratar “apenas de íntima amizade, senão que 
um vínculo vital comum, uma singular fusão espiritual”;13 motivos 
suficientes para conjecturar que, num nível bastante apurado, tal 
relação era homoafetivamente regulada. Dadas essas circunstân-
cias, e sob a ótica de uma linha de fuga crítica, poder-se-ia dizer 
que ambas assumiram a perspectiva de uma vivência para além da 
oposição entre homens e mulheres, recusando-se, pois, a adqui-
rir uma personalidade nos limites e em vista de tal polaridade.14 
A lógica que preside a heterossexualidade é irremediavelmente 
dualista, porque, na polaridade dos gêneros, uma extremidade só 
existe como âncora que dá estabilidade e lastro à outra, firmando a 
relação feminino/masculino em meio a uma multiplicidade da qual 
não pode participar. E nada mais contrário à filosofia nietzschiana, 
porém, do que o modo dicotômico de pensar, de sorte que, ao menos 
do ponto de vista formal, seus pressupostos e a crítica feminista 
ao sistema binário devem fazer alusão mútua. Tanto é assim que, 
quando sua obra se tornou mais conhecida, a partir de 1890, Niet-
zsche gozou de uma recepção consideravelmente positiva por parte 
de algumas feministas radicais – tais como, por exemplo, H. Stoe-
cker.15 Por isso, em nosso entender, a hostilidade desabrida do filó-
12 Cf. STUMP, Doris. Sie toeten uns, nicht unsere Ideen. Meta von Salis-Marschlins. 
1855-1929. Schweizer Schriftstellerin und Frauenrechtskaempferin. Thalwil : Pae-
da-Media-Genossenschaftsverl., 1986, p.75.
13 SCHLEICHER, Berta. Meta von Salis-Marschlins: Das Leben einer Kaempferin. Ro-
tapfel, Erlenbach-Zürich/Leipzig, 1932, p.53.
14 Seguimos, aqui, a interpretação de Monique Wittig a proposito da economia não falocêntrica 
de significação: “a lésbica é o único conceito que conheço que está para além das categorias 
de sexo (homem e mulher), porque o sujeito designado (lésbica) não é uma mulher, nem eco-
nômica, politica ou ideologicamente. Pois o que constitui uma mulher é uma relação social 
específica com o homem (...) uma relação que implica obrigação pessoal e física, bem como 
econômica” (“One is not born a woman”. In: Abelove, H.; Barale, M. A.; Halperin, D. (Orgs.). 
The lesbian and gay studies reader. Nova York/Londres, 1993, p108).
15 Cf. o verbete “Mulheres”, escrito por Carol Diethe In: Niemeyer, Christian (Org.). Ni-
38| Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017.
Barros, R. M. F.
sofo contra a emancipação feminina só se deixaria justificar como 
uma espécie de backlash,16 para lançar mão, aqui, de um léxico 
hodierno, isto é, um contra-ataque incontornavelmente reativo. No 
fundo, tratar-se-ia de uma reação apavorada à latente capacidade 
de revolta das mulheres face à tábua valorativa falocêntrica. Temor 
admitido, aliás, num plano psicológico, pelo próprio Zaratustra: 
“Que o homem tenha medo da mulher, quando ela odeia; pois, no 
fundo da alma, o homem é somente malvado, mas a mulher é má” 
(Za/ZA I, Das mulheres velhas e jovens, KSA 4.85).
De outra ordem é, no entanto, a misoginia que se deixa pres-
sentir em Wagner. Interpretando o estatuto e o papel da mulher 
à luz de sua própria concepção dramatúrgico-musical, o compo-
sitor acaba por apetrechar a ideia de feminino com artigos de fé 
mais arraigados. A começar pela visão de um “eterno-feminino”, 
de uma mulher infinitamente feminina. Com isso, faz reverberar, 
à sua maneira, as derradeiras palavras do coro místico no Fausto 
II, de Goethe: “Toda transitoriedade não passa de uma parábola; o 
que é insuficiente torna-se, aqui, um acontecimento; o indescritível 
é, aqui, efetivado; o eterno-feminino nos atrai para o alto.”17 Mas, 
tomando essa imagem como uma das figuras da ideia de salvação, 
Wagner faz irromper um feminino que se arvora em tomar-se como 
o espírito musical redentor, ou, para trazer à baila suas palavras 
em Beethoven: “E na frase ‘O eterno feminino nos atrai’ veríamos 
o espírito da música que, se elevando da profunda consciência do 
artista, paira agora sobre ele e o guia no caminho da redenção.”18 
etzsche-Lexikon. Darmstadt: WBG, 2009, p.101.
16 Como contra-ataque periódico e contumaz à emancipação feminina, a noção de backlash 
ganha relevo, sobretudo, no seguinte comentário de Susan Faludi: “Toda a vez que as mulhe-
res parecem ter algum sucesso na sua marcha rumo à igualdade, surge uma inevitável geada 
atrapalhando o florescimento do feminismo” (In: Backlash: o contra-ataque na guerra não 
declarada contra as mulheres. Rio de Janeiro, Rocco, 2001, p.65).
17 GOETHE, Johann Wolfgang v. Dramatische dichtungen I. In: Werke. Hamburger Aus-
gabe. Munique, DTV, 2000, Volume 3, p.364.
18 WAGNER, Richard. Beethoven. Tradução de Anna Hartmann Cavalcanti. Rio de Janeiro: 
 Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017. |39
A wagneriana
Impelindo o homem rumo a uma esfera inteligível na qual possa 
legitimar aquilo que conta valer, para ele, como inefável, o eter-
no-feminino passa a representar, antes de mais nada, uma espiri-
tualidade divinamente ideal e incondicionalmente sublimada, sem 
relação com forças instintivas anteriores à sua significação. A esse 
plano suprassensível de determinação seríamos levados, sob a óti-
ca wagneriana, por aquilo que faria da mulher uma fiel depositária 
da castidade e da pureza, quer dizer, pela fidelidade matrimonial. 
Como o próprio compositor dirá, em Sobre o feminino no humano, 
seu último e inacabado escrito teórico: “Fidelidade amorosa: casa-
mento; aqui reside o poder do ser humano sobre a natureza, e o qual 
é por nós chamado de divino.”19
À diferença dos homens, a mulher teria sido feita, segundo 
Wagner, para casar e amar com irrestrita fidelidade. Disso, porém, 
ela não sai incólume. Ao contrário, inclusive. Pois, portadora de 
amor benevolente, sua generosidade pretende-se captativa e su-
pra-egoísta, mas, achando-se submetida às tendências atrativas 
alheias, acaba vampirizada pela servidão amorosa – a qual se en-
carrega, por assim dizer, de colocá-la em seu “devido” lugar. Qual-
quer outra economia pulsional que não se coadune com o zelo e 
com a dedicação integrais estaria, aqui, previamente fora de ques-
tão. Tanto é assim que o autor d’Opera e drama dirá:
 A natureza da mulher é o amor: mas este último é aquele acolhedor, 
amor que se entrega sem reservas no acolhimento. A mulher adquire 
plena individualidade apenas no momento da devoção... Uma mulher que 
não ama com esse orgulho de devoção, na verdade não ama. Uma mulher, 
porém, que não ama é o fenômeno mais indigno e repulsivo do mundo.20 
Zahar, 2010, p. 99.
19 Id. “Über das Weibliche im Menschlichen”. In: Sämtliche Schriften und Dichtungen. 
Volksausgabe. Leipzig, 1911, p. 344.
20 Id. Oper und Drama. (Org.) Kropfinger, Klaus. Stuttgart, Reclam, 2000, pp.118-119.
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Barros, R. M. F.
Sob esse ângulo devocional e pietista, compreende-se por 
que o amor prescrito às heroínas wagnerianas tem de exalar um 
calor materno, ou, se possível, virginal, apto a drenar e abafar ar-
roubos desgarrados e desenfreios emocionais por demais espalha-
fatosos. As descargas afetivas devem corresponder, nesse sentido, à 
espontaneidade livre de afetações daquelas cantoras que, segundo 
Wagner, conseguem dar expressividade aos sons, mas sem impactar 
excessivamente o ouvido. Assim como os atores de Shakespeare, 
que atuam sobre um palco cercado de espectadores por todos os 
lados e falam abertamente sobreseus sentimentos, fora das co-
xias e sem maquiagem, as protagonistas aqui não tencionam, pelo 
estardalhaço, levar o público ao desvario, mas mantê-lo preso à 
cadeira por meio de uma “naturalidade mimético-dramatica”.21 
Ou, como dirá o autor de Sobre atores e cantores: deixando o es-
pectador “enfeitiçado, sem sussurrar, em silêncio, quase imóvel.”22 
A serviço de uma totalidade dramático-musical à qual o talento 
individual pertence de forma oblativa, servindo ao espetáculo em 
vez de se servir deste em prol de sua auto-promoção, a intérprete 
não se destaca do espetáculo mediante números fixos ou recitativos 
exclusivos. A esse propósito, Wagner assevera ainda: 
Hoje, quando procuro por cantores em vista de uma apresentação 
preferencialmente correta de meus trabalhos dramáticos, o que me 
angustia não é, pois, a frequente falta de “voz”, senão que a inteira 
corrupção desta última, pressuposta em todas as partes sob a forma de 
um estilo recitativo.23
 
É bem verdade que esse esforço depurativo deve-se, em 
grande medida, à tentativa empreendida por Wagner – mas ensaia-
21 Id. “Über Schauspieler und Saenger”. In: Späte Schriften zur Dramaturgie der Oper. 
Voss, Egon (Org.). Stuttgart, Reclam, 1996, p.83.
22 Id., ibid., p. 44.
23 Id., ibid., p.98.
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A wagneriana
da, já, por Gluck24 – de reinserir os processos musicais no universo 
da dramaturgia como um todo, desonerando-os da função, ate en-
tão quase obrigatória, de estruturar o bel canto e, por conseguin-
te, ensejar o virtuosismo musical. E Wagner, a bem dizer, jamais 
separou completamente encenação de dramaturgia, vendo-se a si 
mesmo, numa acepção que lhe era particularmente cara, como um 
músico encenador – atribuição cuja inspiração lhe fora dada, so-
bretudo, não por uma tradição teatral de cunho iluminista-burguês, 
senão que pelo teatro popular, ou, mais propriamente, pelo teatro 
de fantoches [Kasperltheater] e marionetes [Puppentheater]. Afinal, 
o improvisador é, aqui, como ele próprio dirá, simultaneamente 
“escritor, diretor teatral e ator.”25 Admitida, porém, essa visão de 
conjunto mais ampla em que se insere o projeto de reincorporação 
da ópera ao teatro e, pelo mesmo movimento, da música à cena, 
parece-nos que a desvalorização da potência vocal em favor da ex-
pressividade dramática reflete, noutra esfera, uma despotenciali-
zação das correntes pulsionais da mulher, enfraquecimento toma-
do como um traço feminino essencial e artisticamente consumado 
por Wilhelmine Schroeder-Devrient, cantora cujo exemplo serviria 
para ilustrar, segundo Wagner, “todas as minhas concepções acerca 
da nobre essência mimética”.26
Estamos longe, aqui, da intensidade emocional alcançada 
24 Defensor do dramma per musica, i. e., da música a serviço da poesia dramática, Chris-
toph Willibald Ritter von Gluck (1714-1787) enfatizava a simplicidade dos enredos, evitando 
ao máximo a ornamentação do bel canto; seja por exigir um acompanhamento proporcional à 
dimensão dos recitativos, seja por diminuir a fragmentação dos episódios, o compositor alemão 
terminou por operar uma abreviação dos princípios compositivos operísticos – eliminando a 
ária da capo e integrando o bailado à ação dramática. As óperas que produziu em Paris, de 
1774 a 1779, causaram, não por acaso, uma verdadeira comoção, incitando respostas enérgicas 
por parte dos arautos da música barroca.
25 Id., ibid., p.72.
26 Id., ibid., p.116. Wagner a conheceu, pela primeira vez, em Leipzig, em 1834, interpre-
tando Romeo – na opera Os Capuletos e os Montecchio , de Vincenzo Bellini. Depois, 
em suas próprias peças, foi o primeiro Adriano, em Rienzi, a primeira Senta, em O holandês 
voador e a primeira Venus, em Tannhäuser.
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Barros, R. M. F.
mediante hipérboles técnicas a la Farinelli ou ao modo de outros 
castrati do século XVIII. Estamos afastados, aqui, com igual dis-
tância, do soprano lírico-spinto, cuja reverberação atinge o ápice de 
sua estridência nos momentos mais dramáticos do canto. Visando 
a atrelar os arcos melódicos à fluidez generativa da linguagem na-
tural, ainda não inoculada, por assim dizer, pelas artificialidades 
do ritmo harmônico, bem como pelos longos vibratos e portamen-
tos maneiristas, o desenvolvimento motívico a ser levado a cabo 
pela intérprete ideal deve ser, sob um parâmetro de densidade, tão 
homogêneo quanto o amor idealizado, sem muitas variações e ele-
mentos cortantes. Colocando a força do órgão vocal a serviço da in-
teligibilidade dramática do libreto, a cantatriz, nesse caso, tende a 
adotar um paradigma sentimental, preferindo interpretar a impac-
tar. Acerca da aludida cantora, Wilhelmine Schroeder-Devrient, o 
compositor de bom grado dirá: “Ela não tinha ‘voz’ alguma; mas 
sabia lidar tão belamente com sua respiração e, por meio dela, fazer 
emanar uma verdadeira alma feminina de modo tão maravilhoso, 
que, ao ouvi-la, ninguém pensava nem no canto nem na voz.”27
 Essa “alma feminina” a emanar de modo rarefeito por meio 
do canto, a ponto inclusive de abstrair do próprio suporte sensível 
do qual depende – da voz –, não se limitaria, porem, a exemplifi-
car a ideia de eterno-feminino. Isso porque Wagner trata ainda de 
frisar que, para além do espaço cênico e arrancada à sua linha de 
vista, Schroeder-Devrient colocava em prática, de modo rotinizado, 
noções glorificadoras do feminino por ele mesmo idealizado, dando 
a conhecer um subsolo pessoal compatível com modulações mascu-
linistas de valoração. Reputando-a intrinsecamente boa, o compo-
sitor ressalta, por exemplo, a aversão da cantora à ideia de represá-
lia, descrevendo-a como alguém incapaz de se “vingar das trapaças 
que lhe foram cometidas; podia reagir às injustiças no juízo, mas 
27 Id., ibid., p. 119.
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A wagneriana
nunca no agir.”28 E, em contraste com as bajuladas e vistosas divas, 
lançadoras de moda e excessivamente extravagantes, a cantora não 
se fazia notar mediante acessórios: “caso ela tivesse de agradecer a 
uma salva de palmas por ter aplicado um expediente falso de efeito; 
assim como lhe teria sido impossível agradar o mundo masculino 
por meio dos hilários modismos de nosso universo feminino, como, 
por exemplo, usando um chignon postiço e altamente arqueado.”29 
Não sendo eroticamente atraente apenas “por fora”, a sensualidade 
feminina faz-se, então, de maneira difusa, mais centrípeta, atrain-
do desde a alma. “Wagner”, escreve, não por acaso, Susan Sontag, 
“abre um novo capítulo nessa tradição operística de criar uma be-
leza que é eroticamente perturbadora e que penetra na alma.”30
Tudo somado, forma-se então a imagem da mulher amorosa e 
de ilibada retidão, com um sensualismo atuante, mas expurgado de 
“maus” impulsos; capaz de atrair potenciais cônjuges, mas sem se 
deixar estorvar pela tão temida marca da promiscuidade – a qual, 
sob uma ótica patrilinear, tornar-lhe-ia indigna dos cuidados de 
um marido, assim como dos afazeres do lar. O problema, porém, 
é que os homens aparentemente não estavam à sua altura, sendo 
esta, segundo Wagner, a fonte mesma de seu maior tormento: “Um 
sofrimento cardeal atravessou sua vida: não encontrou o homem 
que merecesse a felicidade por ela proporcionada.”31 E é o que 
basta, pois, para tornar ainda mais arraigadas as convenções que a 
ela se colaram, haja vista que, na falta da proteção masculina, sua 
função familiar é reconvertida numa espécie de finalidade em si, 
que agora pode ser buscada por um pretenso talento natural para 
cuidar da casa: “não havia nada que buscasse mais do que uma 
28 WAGNER, Richard. “Über Schauspieler und Saenger”. In: Spaete Schriften zur Drama-
turgie der Oper. Voss, Egon (Org.). Stuttgart, Reclam, 1996, p.128.
29 Id., ibid., p. 120.
30 SONTAG, Susan. “Os fluidos em Wagner”. Tradução de Marilene Felinto. In Novos Estu-
dos. SãoPaulo: CEBRAP, julho de 1988, n. 21, p. 164.
31 Id., ibid., p. 129.
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Barros, R. M. F.
vida doméstica mansamente feliz, a qual ela, por outro lado, como 
dona de casa e patroa, sabia levar mediante o mais perfeito talento, 
de forma familiar e segura, bem como de modo gracioso.”32
Seria de esperar que O holandês voador, cuja protagonis-
ta principal, Senta, foi primeiramente interpretada pela própria 
Schroeder-Devrient, explicitasse tais significações do feminino, já 
que a peça reúne, em boa medida, os elementos que tradicional-
mente dão forma e conteúdo aos valores fundantes do patriarcado. 
Temos aqui, de forma lapidar, a presença da mulher como moeda 
de troca, sendo oferecida como um dote ao nubente que, em tro-
ca, cede algum tesouro ou bem material. Assim é que, ao pai de 
Senta, o capitão Daland, o holandês diz: “Ofereço-te toda minha 
riqueza, se me concederes teu lar como se fosse minha casa.”33 Ao 
que Daland responde: “Sim, estrangeiro, tenho uma linda filha (...) 
ela é meu orgulho, a coisa mais importante dentre as minhas pos-
ses [Güter] (...) Tu ofereces joias, perolas inestimáveis e os mais 
preciosos diamantes, mas eu uma mulher fiel [ein treues Weib].”34 
O escambo, aqui, porém, não serve apenas para auferir lucros ou 
aproximar riquezas, senão que também, e sobretudo, para respon-
der à necessidade de assegurar a identidade masculina por meio 
do casamento, único a garantir a patrilinearidade entre famílias 
ou grupos que, assim, passam a comungar de pais descendentes 
comuns. Aqui, pai e marido se confundem. É nesse sentido que o 
holandês diz ao potencial sogro: “Que ela [Senta] sempre guarde 
amor por seu pai, sendo-lhe fiel, pois, assim, há também de ser fiel 
a seu esposo.”35. Reciprocidade condicional confirmada igualmen-
te por Daland: “Sim, o que almejam todos os pais? Um genro rico, 
32 Id., ibid., p.129.
33 Id. Der fiegende Holländer/The Flying Dutchman. In: John, Nicholas (Org.). English 
National Opera guide 12. Nova York/Londres: John Calder/Riverrun, 1999, p. 54.
34 Id., ibid., p. 55.
35 Id., ibid., p. 55.
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A wagneriana
que seja seu.”36
Mas, há mais o que se lhe diga. Em O holandês voador, vigora 
um elemento particularmente revelador e sintomático da caracteri-
zação quimerizada da mulher. Trata-se, em rigor, de um dispositivo 
imagético, a saber, o retrato material do holandês – a figurar pálido 
como todo fantasma, vestindo um traje de marinheiro espanhol. Ao 
idolatrar a imagem do homem misterioso suspensa na parede, Sen-
ta deixa entrever que, mesmo antes de cumprir a destinação que 
lhe fora gregariamente reservada – parir e cuidar do lar –, ela se 
acha, já, como que naturalmente, perdida e encapsulada num mun-
do onírico, contemplativo e prenhe de ideias fixas, próprio de quem 
não é capaz de agir e determinar-se na esfera prática da vida. A 
propósito dessa auto-ilusão consentida, Jean Starobinski comenta: 
“O mérito de Wagner não é o da invenção da história (ela já tinha 
sido contada por Heine), mas o de sua transformação dramática e 
musical (...) O maravilhoso é que a imagem do holandês, um retrato 
na parede de sua moradia, tenha fascinado Senta de maneira pro-
funda, muito antes de seu pai, Daland, lhe falar do rico estrangeiro 
cujo barco acabara de acostar.”37 A prévia adoração do holandês 
serviria para indicar, entre outras coisas, que o futuro da moça se 
desdobrara fatalmente como a efetivação de um passado fantasia-
do, validando, por um lado, o sentimentalismo nostálgico embutido 
na ideia de feminino e corroborando, por outro, que a afirmação de 
sua existência depende inevitavelmente de fabulações dadas. Ora, 
não é preciso ser feminista, como bem lembra Sabine Zurmühl, 
para “diagnosticar essas relações de gênero (...) como relações de-
sarranjadas.”38 
36 Id., ibid., p. 56. 
37 STAROBINSKI, Jean. As encantatrizes: sedutoras na ópera. Tradução de 
Ana Valeria Lessa Rio de Janeiro Civilização Brasileira, 2010, p. 40.
38 ZURMÜHL, Sabine. “Visionen und Ideologien von Weiblichkeit in Wagners Frauengestal-
ten.” In: Vill, Susanne (Org.). “Das Weib der Zukunft”: Frauengestalten und Frauen-
stimmen bei Richard Wagner. Stuttgart/Weimar, Metzler, 2000, p. 57.
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Engana-se, porém, quem acredita que Senta, qual uma Pe-
nélope, permanece à espera do holandês, cuidando da casa e dos 
afazeres ligados à impendente recepção do noivo. Tampouco este, 
de sua parte, quer-se casado e atrelado ao cotidiano da vida náu-
tica, tomando sobre o dorso a vida tributável e previsível de Da-
land, seu provável sogro. O comentário de Nietzsche, segundo o 
qual o “Navio fantasma prega a sublime doutrina de que a mulher 
faz assentar até a pessoa mais irrequieta” (WA/CW, §3, 6.18) só se 
tornaria plausível se o matrimônio tivesse sido consumado. Mas, 
em verdade, ao abrir mão de Erik – este sim, o noivo “oficial” –, 
Senta toma uma direção que se encaminha noutro trilho: o da da-
nação. Resultante de uma blasfêmia, a maldição que recai sobre 
o navegador fantasmagórico requer, como preço de seu cancela-
mento, o amor incondicional de uma mulher “fiel até a morte” [bis 
in den Tod getreu].”39 Ao jurar tal fidelidade, no entanto, a jovem 
faz uma promessa que só pode cumprir-se mortalmente, haja vista 
que o capitão infeliz precisa da palavra por ela empenhada para 
poder, ele mesmo, morrer. Sua redenção não está na sala-de-estar 
da família, junto à lareira, mas no fundo do mar. Se, ao fim, Senta 
joga-se do penhasco e o navio do holandês, então redimido, vai a 
pique, é porque o universo em que viviam já era outro desde o iní-
cio, mais próximo de um “além-tumulo”. E é com acerto que Carl 
Dahlhaus escreve a esse respeito: “O holandês voador não pertence 
à tradição da tragédia, mas à tradição do drama de martírio, o qual 
prescreve o caminho do desejo imperturbável de um herói de se 
sacrificar.”40 Tradição dramática que, em nosso entender, poderia 
ser musicalmente exemplificada por meio de um dos arcos melódi-
cos que servem de motivo condutor aos apelos de Senta no segundo 
ato da peça – que assume função condutora em sua “balada”, mas 
39 WAGNER, Richard. Der fiegende Hollaender/The Flying Dutchman. In: (Org.) John, 
Nicholas. English National Opera guide 12. Nova York/Londres: John Calder/Riverrun, 
1999, p. 60.
40 DAHLHAUS, Carl. Richard Wagners Musikdramen. Stuttgart: Reclam, 1996, p.22.
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A wagneriana
também em outros momentos. Em ré menor, tal frase de “reminis-
cência” faz o ouvinte recordar do sentido fluido e aventureiro do 
desenvolvimento musical, próprio às historias de navio, mas tende 
ao caráter épico, inclinando-se ao imaginário fantástico das ações 
heroicas e sacrificiais: 
À exemplificação dramático-musical de um efetivo cabe-
dal valorativo masculinista seremos levados, em verdade, apenas 
pela peça composta por Wagner imediatamente após o termino d’O 
holandês voador, a saber: pelo drama musical em cinco atos de-
nominado A sarracena (WWV 66). Elaborada especialmente para 
Schroeder-Devrient, a composição, embora nunca encenada, con-
tém a marca distintiva daquilo que, sob a forma de uma proibição, 
pode vir a simbolizar o banimento nu e cru da mulher da esfera que 
designa o tecido social. A esse propósito, Wagner escreve: 
“Ela [Schroeder-Devrient] estudou a ‘Senta’ no meu Holandês voador (...) 
Isso me despertou então o desejo de compor algo diretamente para ela, 
sendo que, em vista disso, retomei o abandonado plano d’A sarracena 
(...) Um traço fundamental de minha heroína vinha à tona na frase: ‘a 
profetiza não pode voltar a se tornar mulher’.”41 Compreender o alcance 
de tal interdição implica, porém, deslindar alguns fios da trama urdida 
pelo compositor nesse seu “libreto histórico.”4241 WAGNER, Richard. Dokumente und Texte zu unvollendeten Buehnenwerken. In: 
(Org.) Vetter, Isolde; Voss, Egon. Sämtliche Werke. Mainz: Schott Musik International, 2005, 
p. 37.
42 Id., ibid., p. 35.
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Barros, R. M. F.
O ensejo para o texto é dado pela portentosa Historia dos 
Hohenstaufen e sua época  (1823–25), de Friedrich von Raumer. 
Hauridas das aventuras da dinastia Staufer na história do Sacro 
Império Romano-Germânico – em torno do qual giram, como que 
atraídos pelas conquistas de príncipes e reis medievais –, as per-
sonagens do drama herdam um conflito multicultural. Por um lado, 
elevando-se contra o vetusto fundo de um mundo teologicamente 
determinado, há a figura de Frederico II, fundador da Universidade 
de Nápoles e responsável pelo fim da ocupação árabe na Sicília, 
dando-se a conhecer mediante uma expectativa pacífica pela união 
entre sarracenos e cristãos – líder “cujos destinos”, salienta Wag-
ner, “despertaram minha mais elevada comiseração;”43 por outro 
lado, como contra-imagem parasitária e oportunista, insinua-se 
Manfred, seu filho, ao qual é legada a administração ítalo-siciliana 
durante a ausência de seu meio irmão, Konrad IV. Mas Wagner 
trata de apetrechar esse contexto, como ele mesmo dirá, com “um 
protagonista feminino de elevado significado romântico.”44 Assim, 
se o libreto debruça-se sobre a sina de Manfred, sua espinha dorsal 
é sustentada, em verdade, por Fátima, jovem sarracena dedicada 
a salvaguardar o legado conciliador de Frederico II e que, ao lon-
go do drama, conforme seu autor, “age continuamente como uma 
ávida profetiza.”45 Enquanto Manfred avança, então, de vitória em 
vitória, “a relação por mim inventada entre o vencedor – sempre 
tomado por uma impetuosa ânsia de amor – e a bela heroína per-
manece o trágico ponto central da ação.”46 É, pois, a partir dessa 
oscilação entre a mulher generosa a ser esposada e a profetiza pagã 
a ser denegada que o tema irá desdobrar-se.
O drama tem um início festivo. No castelo de Manfred em 
43 Id., ibid., p. 37.
44 Id., ibid., p. 37.
45 Id., ibid., p. 38.
46 Id., ibid., p. 38.
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A wagneriana
Cápua, num salão enfeitado com luxuosidade oriental e que leva 
direto a um jardim, dançarinas sarracenas movimentam-se com 
exuberância. Fátima, com um véu, canta num desabrochar gradual: 
“Deixa-me responder algo Manfred! Hei de te mostrar o que dese-
jas.”47 Assim como os demais, o nobre se encanta com o exotismo e 
a beleza da despojada bailarina. Instigado com a intervenção, Man-
fred procura inteirar-se, mas fica ainda mais surpreso com que es-
cuta da cantora dançante: “É a primeira vez que meus pés tocam o 
solo do Ocidente (...) Fui enviada pelo teu pai. Frederico, o grande 
imperador!”48 Um começo que poderíamos chamar propriamente 
de revelador, já que contém, em germe, dois elementos que irão re-
gular outros desdobramentos da peça: a excentricidade sensual de 
Fátima e seu não pertencimento à cristandade estatutária ociden-
tal. Isso irá reafirmar a ideia de que, para os homens ali presentes, 
a sarracena desponta como algo misterioso, mas, em certa medida, 
incompatível com a força ético-política que os anima, evocando um 
paganismo e uma espontaneidade instintiva que os seduz, mas ao 
mesmo tempo os espanta. Daí o uso do véu – hijab (véu), em árabe, 
significa justamente aquilo que separa duas coisas49 –, o qual indi-
ca, de saída, a diferença sob a qual dormita, de modo latente, um 
binarismo compulsório e enviesado.
O que primeiro chama a atenção de todos é, em rigor, o fato de 
a sarracena ter sido enviada por alguém que há tempos falecera, o 
que a aproxima, mais e mais, da dimensão que habitualmente desig-
na o sobrenatural e, quando não, a feitiçaria. Reconhecimento que 
apenas vem à tona, com todos os seus prejuízos, no segundo ato da 
peca. Em fuga para a cidade de Luceria e depois de atravessarem, à 
noite e sob forte tempestade, sombrias e selvagens montanhas, Man-
fred e seu séquito decidem repousar. Irrompendo por entre as nu-
47 Id., ibid., p. 207
48 Id., ibid., p. 207
49 Cf. GHEERBRANT. Jean Chevalier Alain. Dicionário de símbolos. Rio de Janeiro: Jose 
Olympio, 2002, p. 950.
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Barros, R. M. F.
vens, a luz da lua então ilumina um penhasco à beira do qual Fátima, 
avistando o flutuante espírito de Frederico II, chama pelo filho deste 
último. Recém-acordado, Manfred ainda se acha num estado de se-
mi-consciência e balbucia: “Tu me chamas? Não és deste mundo (...) 
Ah! Feiticeira, fazes-me perder os sentidos!”50 Wagner parece assim 
recolher, em Fátima, alguma coisa daquilo que, anos mais tarde, em 
Parsifal, irá caracterizar Kundry – emblema da mulher selvática e 
desobediente: “Não podes me deter,”51 diz ela ao mago negro Klin-
gsor. Mas, aqui, no contexto d’A sarracena, sem a presença onipo-
tente do Santo Graal e na ausência de uma alma feminina cristã, o 
nó da trama reserva outro desfecho à protagonista. Não deixa de ser 
indicativo o fato de que, quanto mais Manfred se auto-engrandece 
como invasor e dominador de territórios, tanto mais se jacta em se 
tomar como conquistador e sedutor de mulheres. Assim é que, no 
terceiro ato, ao adentrar em Luceria, cuja população então comemo-
ra a chegada do Ramadan – o palco acha-se dividido por ruínas de 
uma igreja cristã e pela fachada de uma mesquita –, Manfred exorta: 
“Que todos saibam! A partir de hoje, o reino de Apulia volta a per-
tencer à sua casa real. Dele me aposso e hei de governá-lo com força 
e ordem.”52 Momento no qual, ao rever a jovem sarracena, o nobre 
também interpela, em tom imponente: “Ah! Estas viva? Não és um 
sonho! Sublime feiticeira! Podeis dar-me agora a sua mão?”53
A questão é que, com a iminente coroação de Manfred, Fá-
tima se dá por satisfeita e entende que sua missão – conservar as 
marcas deixadas por Frederico II e assegurar, com isso, a boa vi-
zinhança entre árabes e cristãos – chegou ao fim, de maneira que 
sua tentativa de escapar do rei recém-ungido e voltar ao Oriente 
50 WAGNER, Richard. Dokumente und Texte zu unvollendeten Buehnenwerken. In: (Org.) 
Vetter, Isolde; Voss, Egon. Sämtliche Werke. Mainz: Schott Musik International, 2005, p. 211.
51 Id. Parsifal. Budapest: Könemann Musik, 1993, p. 62.
52 Id. Dokumente und Texte zu unvollendeten Bühnenwerken. In: (Org.) Vetter, Isolde; 
Voss, Egon. Sämtliche Werke. Mainz: Schott Musik International, 2005, p. 215.
53 Id., ibid., p.215.
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A wagneriana
Médio não pode deixar de ser também, pelo mesmo movimento, um 
gesto de afirmação de si como mulher. “Já fui uma profetiza – agora 
quero ser sua mulher”,54 diz ela, logo no início do quinto ato, ao 
jovem árabe a quem fora prometida ainda na infância e que deveria 
acompanhá-la de volta à terra natal, a saber: Nurredin. Esperanço-
sos, ambos esperam finalmente se assentar, vivendo “embaixo das 
palmeiras, inalando o mais cheiroso perfume das flores.”55 E tudo 
se encaminharia para um final feliz não fosse a ingerência maledi-
cente de uma outra personagem, Burello – que, seguindo o fio de 
prumo shakespeariano que cruza e influencia a peça, faz aqui as 
vezes de Iago.56 No esforço de desestabilizar Nurredin, incutindo-
-lhe dúvidas acerca da fidelidade de sua noiva e, por conseguinte, 
o medo de se tornar alvo de chacota ou deboche, Burello canta em 
surdina: “Nurredin! Ninguem jamais foi tão enganado quanto tu.”57 
O sussurro do difamador é importante, porque, por meio da descon-
fiança que suscita e do veneno que destila, obtém-se uma conjun-
ção de grande efeito, a qual, seguindo um raciocínio heterossexista, 
possibilita o encerramento da trama a partir de três pontos cru-
ciantes: sentimento de posse, culpa e feminicídio. Descrita nesse 
enquadramento, que combina preterimentoe represália, a situação 
é bastante conhecida. Trata-se do velho caso da honra masculina 
ferida, cuja aflição em muito se assemelha à sensação de quem teve 
algum bem roubado ou expropriado. “Ah. Que seja terrível minha 
vingança!”,58 exclama Nurredin, como se exigisse a reposição de 
algo que lhe fora ardilosamente tirado – ardil que, ao que tudo 
indica, contou com a ajuda de um sonífero: “ela me deu de beber e 
54 Id., ibid., p.219.
55 Id., ibid., p.219.
56 Conhecido pela astúcia e dissimulação, Iago é uma personagem do drama Ote-
lo, o mouro de Veneza, de William Shakespeare. Velhaco e vingativo, leva a cabo, 
na trama, um plano para que Otelo acredite que sua esposa lhe foi infiel.
57 Id., ibid., p.219.
58 Id., ibid., p. 219.
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Barros, R. M. F.
eu afundei – anestesiado – inconsciente. (...) quando acordei, pela 
manhã, ela estava à minha frente, enfeitada e com trajes suntuosos 
(...) ah, infame feiticeira, tu me envenenastes!”59
O elemento diferencial, porém, está no modo como a culpa é 
aqui utilizada. Reedita-se, no plano das relações amorosas, a noção 
de dívida à base da relação contratual entre credor e devedor, de-
certo mais antiga e remota do que o ideal romântico de noivado – já 
que “é tão velha quanto a existência de ‘sujeitos de direito’” (GM/
GM II, 4, KSA 5.298) –, mas nem por isso inoperante em termos 
de sua efetividade ético-social. Sobre essa primitiva forma de com-
pensação, o autor de Para a genealogia da moral dirá:
 “A equivalência ocorre ao se colocar, no lugar da vantagem advinda 
diretamente do dano (em substituição, pois, a uma compensação em 
dinheiro, terra ou posse de alguma espécie), um tipo de sentimento de 
bem-estar, dado ao credor como recompensa e restituição – a sensação 
prazerosa de poder exercer despreocupadamente seu poder alguém 
impotente” (GM/GM, II, 4, KSA 5.298). 
Aplicada ao par de amantes, tudo se passa como se o marido 
ou nubente tivesse a prerrogativa de causar sofrimento à mulher 
ou futura esposa como uma espécie de caução ou garantia contra-
tual, abonando, assim, mediante uma “reparação” física, o prejuízo 
moral – a dívida – causado por uma possível traição ou desonra. 
O deleite, pois, de humilhar empiricamente o outro, de violar pelo 
simples prazer de fazê-lo, compensaria, sob tal ótica, algum rompi-
mento do compromisso. O problema é que, no caso em questão, o 
abuso seria mais perverso, pois o credor – Nurredin, supostamente 
desonrado – empenhar-se-ia em transferir o direito à restituição 
agressiva ao próprio devedor, e, desde já, caberá à própria mulher 
punir-se, infligir a si mesma a punição e incorporar a culpa, ou, 
como dirá o genealogista, “tomando partido contra si mesma” (GM/
GM II, §16, KSA 5.323). Sob tal perspectiva, não só os maus-tratos 
59 Id., ibid., p. 220.
 Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017. |53
A wagneriana
seriam contratualmente previstos, como sentidos, pela mulher mal-
tratada, como merecidos. É precisamente essa inversão que gera a 
ambiência psicológica condizente com o violento arremate do dra-
ma. Após ser insultada verbalmente por Nurredin – “Deixa-me, 
sem-vergonha [Schändliche]! (...) Traidora!”60 –, Fátima é então por 
ele apunhalada no coração. A orquestra retoma, numa sonoridade 
bastante suave, mas densa e compacta, o refrão da balada condu-
tora do primeiro ato, dando ocasião para que a sarracena se dê a 
conhecer, por fim, como irmã de Manfred. Acusado de usurpação e 
destronado, este ultimo canta a última melodia da peça: “A partir 
de hoje, adeus sorte!”61 Trompetes vibram alto e a cortina cai.
Disso tudo decorre algo importante para compreender o peri-
go da arte wagneriana, ao menos tal como Nietzsche a concebe, em 
relação à mulher: trata-se de seu não-lugar, de sua diminuta con-
dição existencial, cuja estranheza se apresenta, não como antítese 
do masculino – pois, desse modo, ainda que negativamente, con-
tinuaria a se relacionar de maneira conflitante com o universo que 
lhe oprime –, mas como uma espécie de “nada”, aquilo que não 
significa por si só e que, portanto, não aponta autônoma e semafo-
ricamente para nenhum outro signo. Não é fortuito que Fátima seja 
chamada de feiticeira. Enquanto tal, não se revela apenas como o 
avesso da mulher ideal, senão que cumpre o papel de bode expia-
tório, servindo como alforje para depositar as forças não domesti-
cadas e proscritas da animalidade humana, energias inflamáveis 
a serem calcinadas. Ela não pode ser companheira do rei cristão, 
nem esposa do noivo sarraceno. Desterrada, não encontra guarida 
nem no Ocidente, nem no Oriente Médio. Nesse sentido, trata-se 
de uma figura banida, mas cujo banimento não depende de alguma 
atividade ilegal na corte de Manfred – Fátima não comete nenhum 
crime –, senão que da mera gratuidade de sua presença. Exceção 
60 WAGNER, Richard. Dokumente und Texte zu unvollendeten Buehnenwerken. In: Vetter, 
Isolde; Voss, Egon (Org.). Sämtliche Werke. Mainz: Schott Musik International, 2005, p. 221.
61 Id., ibid., p. 221.
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Barros, R. M. F.
entre as exceções – pois, como sarraceno, Nurredin não deixa de 
ser uma exceção em meio a descendentes suábios e normandos –, 
a profetiza incluída no mundo gregário em que vive, não mediante 
valores introduzidos excepcionalmente para tal fim, mas por sua 
subtração mesma às apreciações valorativas vigentes. Fátima não é 
simplesmente um peixe fora d’agua, por assim dizer. É a água que, 
evaporando ao seu redor, cede terreno à sua apartada existência. 
E, nesse sentido, feitas as devidas diferenças, vale ao mundo da 
sarracena aquilo que, segundo Giorgio Agamben, vale ao chamado 
estado de exceção: “aquilo que é exterior, mas incluído, aqui, não 
simplesmente por meio de uma proibição ou de um internamento, 
senão que suspendendo a validade mesma da ordem.”62 
Escrutinar o sentido e o alcance desse tipo de exclusão nas 
posteriores obras de Wagner, procurando entender, por exemplo, por 
que motivo a inocência redimiria preferencialmente “pecadores inte-
ressantes (O caso em Tannhäuser, WA/CW, 3, KSA 6.17)” , ou, então, 
por que razão mulheres casadas gostariam de ser “redimidas por um 
cavaleiro (Caso de Isolda)”,63 ou, ainda, no caso de Lohengrin, por 
que não se deveria jamais “saber, de fato, com quem se casou”,64 eis 
algo que caberia a uma pesquisa futura – de mais fôlego, por certo. O 
mais relevante, a nós nos parece, é indicar que, a despeito dos juízos 
condenatórios deferidos pelo filosofo alemão a propósito do femini-
no, seria precipitado, ou, quando não, temerário, irmaná-lo ao tipo 
misógino de discurso que cruza o imaginário wagneriano. Primeiro, 
porque isso equivaleria a chancelar a visão schopenhaueriana, aca-
lentada pelo compositor, de acordo com a qual a mulher amortizaria 
“a divida da vida não mediante o agir, mas por meio do sofrer.”65 Se-
62 AGAMBEN Giorgio. Homo sacer. Die souveräne Macht und das nackte Leben. Frank-
furt am Main: Suhrkamp, 2002, p.28.
63 Id., ibid.
64 Id., ibid.
65 SCHOPENHAUER, Arthur. Parerga und Paralipomena II. In: Saemtlcihe Werke. 
Frankfurt am Main: Suhrkamp, Volume V, 1986, p.720.
 Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017. |55
A wagneriana
gundo, porque implicaria aceitar uma feminilidade única e original, 
autêntica e primordial, retroagindo a uma instancia pré-civilizatória 
e anterior ao processo de adestramento de problemáticas energias 
vitais. Como vimos, o sentimento de culpa – bem como a expiação 
que ele requer para si – não é, para Nietzsche, uma facticidade su-
pra-histórica, um dado fora do tempo e do espaço a ser legitimado 
num mundo inteligível. Sustentada por rígidas relações contratuais 
e poderosos impulsos de dominação, o conceito de culpa veio a ser 
historicamente, acumulando uma síntese multifacetada de sentidos 
cujos elementos “mudam a sua validadee, por conseguinte, reorde-
nam-se” (GM/GM, II, 13, KSA 5.317). Para o filósofo alemão, enfim, 
se lhe fosse dado parafrasear o célebre e certeiro dístico de Simo-
ne de Beauvoir, ninguém nasce wagneriana: torna-se wagneriana.66 
Felizmente ou infelizmente, não sem uma dose de êxtase, é claro. 
Tal como atesta a jovem italiana que, depois de ouvir o Prelúdio de 
Lohengrin, disse “com aqueles olhos maravilhados e lindos que as 
wagnerianas conhecem muito bem: ‘come si dorme con questa musi-
ca!’” (Nachlass/FP 1887, 10 [155], KSA 12.543). 
Abstract: This article aims at abridging and exposing 
Nietzsche’s critique on Wagner in view of the culture type known 
as Wagnerian woman. By considering Nietzsche’s paradoxical 
approach to womanliness – simultaneously liberating and 
masculinist – and investigating the fundamental elements of the 
composer’s work of art, it becomes then possible to appraise the 
relationship between musical drama and misogyny. The main idea 
is to show that, despite Nietzsche’s preconceptions, he cannot 
acknowledge the dualistic logic followed by sexist meaning 
systems; in fact, through his musical and aesthetic analysis, he 
ends up revealing himself as an attentive and trustworthy ally in 
the combat against moral prejudice.
Keywords: Wagner – Nietzsche – musical drama - eternal 
feminine
66 Parafraseamos, aqui, a lapidar e pregnante afirmação da autora d’O segundo sexo: “Nin-
guém nasce mulher: torna-se mulher” (BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: a experiên-
cia vivida. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1967, p.9).
56| Cad. Nietzsche, Guarulhos/Porto Seguro, v.38, n.1, janeiro/abril, 2017.
Barros, R. M. F.
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Artigo recebido para publicação em 18/10/2016.
Artigo aceito para publicação em 10/12/2016.

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