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AMARANTE, P D C Saúde Mental, desinstitucionalização e novas estratégias de cuidado

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SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros 
 
AMARANTE, P. D. C. Saúde mental, desinstitucionalização e novas estratégias de cuidado. In: GIOVANELLA, L., ESCOREL, 
S., LOBATO, L. V. C., NORONHA, J. C., and CARVALHO, A. I., eds. Políticas e sistemas de saúde no Brasil [online]. 2nd ed. 
rev. and enl. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2012, pp. 635-655. ISBN: 978-85-7541-349-4. 
https://doi.org/10.7476/9788575413494.0023. 
 
All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International 
license. 
Todo o conteúdo deste trabalho, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribição 4.0. 
Todo el contenido de esta obra, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons 
Reconocimento 4.0. 
 
 
 
 
 
Parte IV – Sistema Único de Saúde: setores de atenção 
20. Saúde mental, desinstitucionalização e novas estratégias de cuidado 
 
 
Paulo Duarte de Carvalho Amarante 
 
https://doi.org/10.7476/9788575413494.0023
http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
635
20. Saúde Mental, deSinStitucionalização
e novaS eStratégiaS de cuidado
Paulo Duarte de Carvalho Amarante
Este capítulo analisa as políticas de saúde mental no Brasil desde seu início até o mo-
mento presente, marcado pela desinstitucionalização no âmbito da loucura e do sofrimento 
mental. Para tanto, desenvolve um resgate histórico das principais políticas e modelos as-
sistenciais, que vai da criação do primeiro hospício até os fundamentos dos projetos atuais 
orientados pelos princípios da reforma psiquiátrica como processo social complexo. Fina-
liza com um detalhamento das diferentes propostas das redes de serviços e dispositivos de 
atenção psicossocial e saúde mental e com uma análise de suas perspectivas e possibilidades.
A história da assistência às pessoas com problemas mentais no Brasil começa com a 
fundação do primeiro hospital psiquiátrico brasileiro, o hospício criado pelo imperador 
Pedro II na data de sua sagração e que leva o seu nome.
Decreto n. 82, de 18 de julho de 1841
“Desejando assinalar o fausto dia de minha sagração com a criação de um estabelecimento de 
pública beneficência, hei por bem fundar um hospital destinado privativamente para tratamento 
de alienados, com a denominação de Hospício de Pedro II, o qual ficará anexo ao Hospital da 
Santa Casa da Misericórdia desta Corte, debaixo de minha imperial proteção applicando desde 
já para princípio da sua fundação o produto das subscrições promovidas por uma comissão de 
praça do commercio, e pelo provedor da sobredita Santa Casa, além das quantias com que eu 
houver por bem contribuir. Cândido José de Araújo Vianna do meu conselho, ministro e secre-
tário de Estado dos Negócios do Império e que tenha assim entendido e faça executar com os 
despachos necessários. Palácio do Rio de Janeiro, 18 de julho de 1841, 20 da Independência e 
do Império. Com a rubrica de S.M. o Imperador. Cândido José de Araújo Vianna. D. Pedro II, 
Imperador do Brasil.”
Inaugurado mais de dez anos depois do decreto, em 8 de dezembro de 1852, o Hospício 
de Pedro II logo se tornou alvo de críticas, muito particularmente dos médicos. Ora porque 
estava vinculado à Irmandade da Santa Casa da Misericórdia, não sendo considerado, portan-
À memória de Franca Ongaro Basaglia, senadora e importante expressão política 
e intelectual da psiquiatria democrática italiana.
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil636
to, uma instituição efetivamente médica e sim de caridade, ora porque não fora construído 
nos parâmetros adequados às necessidades da terapêutica moderna da alienação mental.
O conceito de alienação mental foi utilizado por Philippe Pinel, médico francês considerado o pai 
da psiquiatria, em seu clássico Tratado Médico-Filosófico sobre a Alienação Mental ou Mania, a primeira 
grande obra fundadora da especialidade.
O conceito de alienação se refere à ideia de um distúrbio das paixões que ocasiona um distúrbio 
moral. Pinel foi também responsável pela consolidação da primeira proposta terapêutica para a 
loucura: o tratamento moral (Pinel, 2007).
Em nosso meio, há uma obra clássica de um dos maiores escritores da língua portuguesa: 
O Alienista, de Machado de Assis. O conto, publicado em forma de folhetim, elabora uma perspi-
caz e profunda crítica ao modelo da ciência psiquiátrica que, ainda hoje, se embaralha com seus 
conceitos e dilemas mais fundamentais.
Para estudar este período e se aprofundar no conhecimento dos primeiros passos da 
psiquiatria brasileira, o livro Danação da Norma: medicina social e constituição da psiquiatria no 
Brasil, de Roberto Machado e colaboradores (1978), é, sem dúvida, a melhor referência 
bibliográfica e nos fornece as informações mais detalhadas e fundamentadas em pesquisa 
histórica.
Para refletir
Leia O Alienista, de Machado de Assis, e a partir deste conto reflita sobre alguns conceitos e 
questões. O que é normalidade? O que é loucura? Qual a relação entre normalidade e cultura?
O certo é que o Hospício de Pedro II abriu caminho para o surgimento de muitas ou-
tras instituições similares no país. A partir de então, e por quase 150 anos, pode-se resumir 
a política nacional do setor como de mera implantação de hospitais psiquiátricos. Vejamos.
Em 1890, logo após a Proclamação da República, o Hospício de Pedro II foi desane-
xado da Santa Casa e sua direção passou às mãos dos médicos. Além da criação da Assis-
tência Médico-Legal aos Alienados, primeiro órgão nacional de normatização e gestão da 
assistência, foram instituídas as duas primeiras colônias de alienados, as colônias de São 
Bento e de Conde de Mesquita, ambas na ilha do Galeão, no Rio de Janeiro. Daí em diante, 
foram dezenas de colônias agrícolas que passaram a existir em quase todos os estados da 
federação, onde eram internadas milhares e milhares de pessoas com problemas mentais. 
Para se ter uma ideia, a Colônia de Juquery (SP) alcançou a cifra das 15 mil vagas, ao passo 
que a Colônia de Jacarepaguá (RJ) chegou a 8 mil.
A noção de colônia já é suficiente para exprimir a proposta de uma modalidade única 
de cultura: de colonização de um determinado tipo de pessoas, ligadas por uma origem 
étnica, profissional, religiosa ou de uma natureza especial, como seria o caso dos alienados. 
De qualquer forma, tal princípio expressa uma prática de segregação de sujeitos identificados 
como loucos. No início do século XX, falava-se até mesmo em cidades destinadas somente 
para os alienados: as cidades manicômios!
O aparecimento das colônias foi o que faltava para que o modelo asilar dominasse 
definitivamente a assistência psiquiátrica no país até as décadas de 1940 e 1950. Daque-
Colônias de alienados
Instituições psiquiátricas 
que se baseavam no prin-
cípio de que o trabalho 
seria uma forma eficaz 
de tratamento moral da 
alienação mental, uma 
vez que disciplinaria os 
indivíduos que, por con-
ta da natureza de suas 
enfermidades, tinham as 
mentes desregradas.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 637
le momento em diante, outro fator viria a propiciar um novo momento de crescimento 
expressivo da oferta de leitos psiquiátricos no país. Trata-se do processo de privatização 
da assistência médica da previdência social, maior responsável pela assistência médica à 
população brasileira.
As distorções consequentes deste modelo privatizante para a atenção em saúde men-
tal, radicalizadas no período da ditadura militar instalada com o golpe de 1964 (quando a 
corrupção corroeu as bases do Estado), podem ser mais bem conhecidas no clássico livro de 
Luiz da Rocha Cerqueira, Psiquiatria Social: problemas brasileirosde saúde mental (1984). Para 
Cerqueira, a privatização fez crescer substancialmente o número de leitos psiquiátricos no 
país, sendo a maioria privados (Tabela 1).
Tabela 1 – Número de leitos psiquiátricos públicos e privados. Brasil – 1941 e 1978
Ano 1941 1978
Leitos públicos 21.079 22.603
Leitos privados 03.034 55.670
ToTal 24.113 78.273
Fonte: Cerqueira, 1984.
Em torno de 97% de todos os recursos financeiros destinados à psiquiatria eram 
consumidos exclusivamente no pagamento dos custos das internações hospitalares. Com 
apenas 3% de recursos empenhados nas atividades assistenciais não hospitalares, não exis-
tiam hospitais-dia, centros de convivência ou serviços de atenção psicossocial; e mesmo os 
ambulatórios eram muito raros e precários (Cerqueira, 1984).
origenS da reforMa pSiquiátrica braSileira
O processo de reforma psiquiátrica no Brasil começou no final da década de 1970, no 
contexto da redemocratização nacional, ou seja, na luta contra a ditadura militar. O ano de 
1976, cenário de muitos eventos históricos dramáticos, tais como as bombas implantadas por 
militares nas sedes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Ordem dos Advogados 
do Brasil (OAB), ou os assassinatos de dissidentes políticos, servia também de palco para 
o surgimento de uma forte militância no campo da saúde. Em São Paulo, a partir de um 
pequeno grupo de médicos da área da saúde pública, nascia o Centro Brasileiro de Estudos 
de Saúde (Cebes), que viria a ser o ator mais importante na organização do pensamento 
crítico no setor.
No início de 1978, no âmago deste cenário de luta pela redemocratização, no Rio de 
Janeiro, três médicos recém-formados deflagraram uma série de denúncias de maus-tratos, 
violência e desrespeito à dignidade e aos direitos humanos, impetrados pelos hospitais 
psiquiátricos da própria Divisão Nacional de Saúde Mental (Dinsam), órgão do Ministério 
da Saúde. As vítimas eram não apenas os pacientes internados, mas também alguns presos 
políticos da ditadura.
A prioridade de contra-
tação de prestadores pri-
vados e outras caracterís-
ticas da assistência médica 
previdenciária durante 
a década de 1970 são 
analisadas no capítulo 11, 
sobre a história das polí-
ticas de saúde no Brasil.
O movimento sanitário é 
analisado no capítulo 11. 
Confira.
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil638
Para refletir
Você conhece algum hospital psiquiátrico? Existe algum em sua cidade ou nas proximidades? 
Conhece alguém que esteve internado em uma dessas instituições? A partir de sua experiência, 
analise as características de um hospital psiquiátrico e compare-as com as de um hospital geral.
O Ministério da Saúde respondeu prontamente, mas com a demissão dos profissionais 
que realizaram as denúncias. As demissões provocaram mais manifestações; estas ocasiona-
ram mais denúncias e mais demissões. Enfim, foram demitidos 260 profissionais dos quatro 
hospitais psiquiátricos do Ministério da Saúde, todos eles localizados no Rio de Janeiro.
Esse episódio ficou conhecido como a “crise da Dinsam” e teve repercussão em toda 
a imprensa do país por quase todo o ano de 1978. Culminou com a criação do primeiro 
movimento social organizado na área da saúde mental no país, o Movimento dos Trabalha-
dores em Saúde Mental (MTSM).
No MTSM, teve início um processo de reflexão crítica sobre a natureza e o estatuto 
epistemológico do saber psiquiátrico, da função social da psiquiatria como estratégia de 
repressão e ordem social e quanto ao caráter de instituição total dos hospitais psiquiátricos.
Para refletir
No livro Asylums, Erving Goffman elabora uma análise microssociológica de algumas instituições 
fechadas, que ele denominou de totais, fundadas no isolamento e na gestão completa e absoluta 
da vida dos internos. No Brasil, o livro foi publicado com o título Manicômios, Prisões e Conventos 
(Goffman, 1974).
Você já havia identificado algumas semelhanças entre tais instituições? Caracterize algumas dessas 
semelhanças.
Com a efervescência daquele cenário político, o MTSM expandiu-se rapidamente. Nos 
núcleos regionais do Cebes do Rio de Janeiro, de São Paulo, da Bahia e de Minas Gerais, 
foram constituídas Comissões de Saúde Mental, que exerceram papel central nos primeiros 
anos do processo de reforma psiquiátrica.
Ainda no ano de 1978, ocorreram dois eventos muito importantes que contaram com 
a participação do MTSM e que se tornaram marcos para o processo de reforma psiquiátrica 
no Brasil. O primeiro foi o I Simpósio Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições, pro-
movido pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições (Ibrapsi), realizado 
no Rio de Janeiro no período de 19 a 22 de outubro de 1978, do qual participaram alguns 
dos mais importantes autores e atores da reforma psiquiátrica em âmbito internacional, como 
Franco Basaglia, Felix Guattari, Robert Castel, Thomas Szasz e Erving Goffman, dentre outros 
de grande importância. O segundo foi o V Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado 
em Camboriú (SC), de 27 de outubro a 1o de novembro, que possibilitou ao MTSM uma 
excelente oportunidade para organizar o movimento em âmbito nacional. Ficou conhecido 
como o “Congresso da Abertura”, na medida em que o MTSM conseguiu transformar o 
evento em um debate político sobre o modelo assistencial psiquiátrico brasileiro.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 639
1978 – O início do processo de reforma psiquiátrica no Brasil
• A ‘crise’ da Divisão Nacional de Saúde Mental (Dinsam) 
• O Congresso do Ibrapsi – I Simpósio Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições – Franco 
Basaglia, Robert Castel, Felix Guattari, Thomas Szasz e Erving Goffman 
• O Congresso da Abertura – V Congresso Brasileiro de Psiquiatria – Camboriú/SC
Franco Basaglia aproveitou a vinda ao Brasil para realizar visitas a sindicatos e as-
sociações, proferir palestras em universidades e institutos e manter um contato bastante 
próximo com os ativistas do MTSM, tornando-se, a partir de então, referência fundamental 
na trajetória da experiência brasileira.
Logo no ano seguinte, ocorreram outros eventos muito importantes para o processo 
de reforma psiquiátrica: o I Congresso Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental, o 
I Simpósio de Políticas de Saúde da Câmara dos Deputados e o III Congresso Mineiro de 
Psiquiatria. O Congresso do MTSM aconteceu em janeiro de 1979, no Instituto Sedes Sapien-
tiæ em São Paulo. Neste, depreende-se que a luta pela transformação do sistema de atenção 
à saúde está vinculada à luta dos demais setores sociais em busca da democracia plena e de 
uma organização mais justa da sociedade, por meio do fortalecimento dos sindicatos e das 
demais associações representativas articuladas com os movimentos sociais.
Já no Simpósio de Saúde da Câmara, o MTSM traçou um importante diagnóstico crí-
tico sobre o modelo assistencial psiquiátrico e algumas das reflexões e propostas que viriam 
a marcar a atuação do movimento em toda a sua história. Neste mesmo simpósio, o Cebes 
apresentou a proposta do Sistema Único de Saúde (SUS), que seria base de inspiração da 
Constituição de 88 e, consequentemente, da Lei Orgânica da Saúde (lei n. 8.080, de 19/9/90).
Franco Basaglia retornou ao Brasil para o III Congresso Mineiro de Psiquiatria e 
visitou o Hospital Colônia de Barbacena, em Minas Gerais, desencadeando uma crise de 
denúncias sobre a assistência psiquiátrica no Brasil. A visita de Basaglia a Barbacena trouxe 
muitos resultados marcantes, mas dois deles merecem destaque: o curta-metragem Em Nome 
da Razão, obra de estreia do premiado cineasta Helvécio Ratton, e o também premiado livro 
Nos Porões da Loucura, de Hiram Firmino. 
Livros e filmes sobre os hospícios no Brasil
Algumas obras trazem relatos muito expressivos de pessoas que estiveram internadas em hospícios 
brasileiros e que nos ajudam a entendero que é a violência e a violação permanente aos direitos 
humanos e à dignidade das pessoas internadas em tais instituições.
Procure conhecer:
Nos Porões da Loucura, livro de crônicas de Hiran Firmino sobre o hospital psiquiátrico de Barbacena; Diário 
do Hospício e Cemitério dos Vivos, do escritor carioca Lima Barreto; O Hospício é Deus, da jornalista 
e cronista Maura Lopes Cançado; Os Últimos Dias de Paupéria, do poeta, jornalista e compositor 
tropicalista Torquato Neto. 
Canto dos Malditos, de Austregésilo Carrano, que deu origem ao filme Bicho de 7 Cabeças, dirigido 
por Laís Bodanski, e O Alienista, de Machado de Assis, adaptado para o cinema por Nelson Pereira 
dos Santos com o título de Azyllo Muito Louco, com a participação de Leila Diniz.
Assista também ao premiado documentário Estamira, de Marcos Prado, e a Em Nome da Razão, 
documentário de Helvécio Ratton sobre o hospital psiquiátrico de Barbacena.
Franco Basaglia (1922-
1980), psiquiatra ve-
neziano que liderou os 
processos de desinstitu-
cionalização em Gorizia 
e Trieste, no norte da 
Itália, criou o Movimento 
Psiquiatria Democrática 
e inspirou a elaboração 
da lei da reforma psi-
quiátrica italiana, a lei 
n. 180, que ficou conhe-
cida como a Lei Basaglia. 
Suas vindas ao Brasil, em 
1978 e 1979, foram de ex-
trema importância para 
os primeiros momentos 
do processo brasileiro. 
Aqui, Basaglia proferiu 
praticamente suas últi-
mas conferências, que 
foram publicadas em vá-
rios países com o título de 
“Conferências Brasileiras 
de Franco Basaglia”.
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil640
reforMa pSiquiátrica coMo proceSSo Social coMplexo: ruptura radical por uMa 
Sociedade SeM ManicôMioS
O período denominado Nova República, iniciado com a eleição indireta do primeiro 
presidente civil da República após o golpe militar de 1964, e caracterizado por uma frente 
política bastante ampla no sentido de garantir a governabilidade, foi palco da 8ª Conferência 
Nacional de Saúde (CNS), em março de 1986.
A “Oitava”, como ficou conhecida – analisada em detalhe no capítulo 11 –, contou com 
efetiva (e expressiva) participação da sociedade civil e se tornou o marco das novas políticas 
de saúde no país, muito particularmente para a construção do SUS. Como desdobramento 
da 8a CNS, foram propostas conferências sobre áreas temáticas específicas.
A I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM) realizou-se no período de 25 
a 28 de junho de 1987, no Rio de Janeiro, promovendo uma articulação dos vários parti-
cipantes do movimento nacional ligados ao campo da saúde mental. A conferência contou 
com cerca de 1.500 participantes e foi extremamente inovadora, tendo em vista alguns dos 
aspectos que listamos a seguir. Inicialmente, a exemplo da 8a CNS, foi o primeiro evento 
de caráter público e de âmbito nacional a reunir, em uma mesma arena, os vários atores 
sociais envolvidos no campo da saúde mental, de pacientes (que, a partir da Oitava, foram 
denominados usuários), familiares e membros dos mais variados movimentos sociais a téc-
nicos, dirigentes e políticos.
Temas oficiais da I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM)
• Economia, sociedade e Estado, impactos sobre a saúde e doença mental;
• Reforma Sanitária e reorganização da assistência à saúde mental;
• Cidadania e doença mental: direitos, deveres e legislação do doente mental.
Para refletir
Você já participou de alguma conferência de saúde? Tem ou teve informações sobre a existência 
de alguma delas? Procure se informar em seu município.
A partir da I CNSM, a questão de uma nova legislação passou a compor a agenda do 
movimento da reforma psiquiátrica, assim como teve lugar o debate mais profundo sobre a 
falência do modelo centrado na hospitalização e sobre a premência da criação dos serviços 
extra-hospitalares. Mas também representou um marco histórico ao possibilitar o encontro 
de antigos e novos participantes do MTSM, de todas as partes do país, oferecendo as con-
dições para a organização de um segundo congresso do movimento.
Como vimos, o I Congresso do MTSM havia sido organizado em 1979, apenas alguns 
meses após a criação do movimento. Mas a conjuntura do final da década de 1980, com o 
governo da Nova República, a 8a CNS e a I CNSM, disponibilizava um cenário pleno de novas 
possibilidades. Assim, a partir da I CNSM, passou a ser organizado o II Congresso Nacional 
dos Trabalhadores em Saúde Mental, realizado em Bauru (SP), de 3 a 6 de dezembro de 1987, 
Você pode consultar o 
capítulo 28 para conhecer 
a dinâmica de participa-
ção das conferências de 
saúde.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 641
e que introduziu, no Brasil, o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, além de instituir 
o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, comemorado desde então na data de 18 de maio.
“Por uma sociedade sem manicômios”
Foi no âmbito da Rede Internacional de Alternativas à Psiquiatria, movimento criado em Bruxelas 
em 1974 por Franco Basaglia, Robert Castel e Felix Guattari, entre outros, que surgiu este lema. 
Foi utilizado pela primeira vez no Encontro Internacional na Espanha, em 1986, mas chegou ao 
nosso meio particularmente a partir do III Encontro Latino-Americano da Rede, realizado em 
Buenos Aires no período de 17 a 21 de dezembro daquele ano.
O Congresso de Bauru, como ficou conhecido, demarcou duas rupturas fundamentais 
na trajetória do processo. Uma primeira diz respeito à sua composição – predominante-
mente de profissionais da área, com pouca participação de ‘pacientes’ e familiares – para 
uma composição mais plural, com o concurso mais efetivo dos atores sociais envolvidos e de 
outros ativistas de movimentos sociais, todos considerados ‘usuários’ de acordo com os novos 
princípios da participação e o controle social inspirados nos princípios ideológicos e políticos 
do SUS. Uma segunda ruptura é representada pela proposição de uma transformação de 
caráter mais social, mais amplo, voltado para a introdução de mudanças na sociedade, e não 
apenas de uma transformação do modelo técnico-assistencial psiquiátrico.
Daí pode-se extrair o significado e a dimensão do lema “Por uma sociedade sem ma-
nicômios”, inspirador da mudança da denominação do movimento que, em 1993, passaria 
a se chamar Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA). O MNLA, existente 
até os dias atuais, não é o único movimento na área, mas é certamente o mais importante 
e abrangente ator social no processo da reforma psiquiátrica brasileira. O livro Loucos pela 
Vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil (Amarante, 2010) oferece uma análise e 
uma reconstrução histórica de todo o processo da reforma, com destaque para os temas, 
as tendências, os conflitos, os atores e os cenários. Analisa ainda as principais experiências 
internacionais de reformas psiquiátricas (Inglaterra, França, Estados Unidos e Itália), que 
trouxeram subsídios para a experiência brasileira.
rede de atenção pSicoSSocial: aSpectoS da política conteMporânea no caMpo da 
Saúde Mental
Falávamos de 1987. Aquele ano foi palco ainda de um terceiro fato que o tornou his-
tórico no processo da reforma psiquiátrica brasileira: a criação na cidade de São Paulo do 
primeiro serviço de atenção psicossocial do país, o Centro de Atenção Psicossocial Professor 
Luiz da Rocha Cerqueira, da Secretaria Estadual de Saúde, que passou a ser conhecido 
simplesmente como Caps.
Trata-se do primeiro serviço que procurava constituir-se fora da lógica manicomial. 
Ensaiava ações de inserção comunitária e iniciava propostas de atenção intensiva a pacientes 
com quadros mais graves que, até então, eram atendidos predominantemente em hospitais 
e, muito raramente, em ambulatórios, pois, como vimos, a rede hospitalar absorvia a quase 
totalidade (97%) dos recursos financeiros destinados à assistência psiquiátrica. O Caps pas-
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil642
sou a realizar um dos mais importantes trabalhos assistenciais, tornando-se uma referência 
nas políticas de saúde mental e um campo de formação estratégica de profissionais para o 
processo da reforma psiquiátrica brasileira. 
Mas os efeitos positivos dos tempos da democratização não acabaram por aí. Em 
1988, foi promulgada a nova Constituição Federal com um capítulo dedicado à saúde, 
que passou a ser considerada “Direito de todos e dever do Estado”. Foi certamente uma 
vitória do movimento nacional de Reforma Sanitária – aí incluído o movimento da reforma 
psiquiátrica – que propôs uma emenda popular com os termos do SUS, cujas diretrizes 
haviam sido consolidadas nos debates da 8a CNS.
Com a diretriz da descentralização estabelecida no SUS, o poder municipal passou a 
ser o responsável pelo conjunto de instituições e políticas de saúde no âmbito do município. 
Foi assim que, em 3 de maio de 1989, ocorreu um dos mais importantes acontecimentos 
do processo de reforma psiquiátrica no Brasil: a intervenção realizada pela Prefeitura de 
Santos (SP) em um hospital psiquiátrico privado conveniado ao SUS, a Clínica Anchieta, 
onde ocorriam violências contra pacientes internados, assim como vários óbitos.
A partir dessa intervenção, duas opções do poder público municipal de Santos deram 
início a uma verdadeira revolução na questão do tratamento da loucura no país. A primeira 
opção foi a decisão de não reformar o hospital. Ou seja, de não seguir pelo caminho das 
reformas administrativas, como ocorria anteriormente, nas quais, após situações desta na-
tureza, procurava-se readequar a instituição aos parâmetros considerados terapêuticos ou 
aceitáveis. Ao contrário, partiu-se do princípio de que o hospital psiquiátrico, por sua natu-
reza e função social, era uma instituição de violência e segregação. Tais eventos de agressão 
à dignidade humana, longe de serem crises eventuais, eram bastante comuns e mesmo 
inerentes ao modelo institucional. Em segundo lugar, tendo como base a experiência de 
Trieste (Itália), iniciada por Franco Basaglia e continuada por Franco Rotelli, decidiu-se por 
atuar no sentido da desconstrução do manicômio, entendido não apenas como o hospital 
psiquiátrico em si, mas como todas as referências conceituais e ideológicas produzidas no 
âmbito do saber psiquiátrico em torno do conceito de doença mental.
Desconstrução do manicômio
A noção de desconstrução não diz respeito a uma ideia negativa, de destruição, mas sim de des-
montagem da lógica teórico-conceitual e institucional de determinados saberes e práticas, e implica 
a reconstrução de formas de lidar com o problema. Quando nos referimos à desconstrução do 
manicômio, falamos da desmontagem de toda a lógica institucional, política, jurídica, ideológica, 
social e cultural que se constituiu em torno de um determinado conceito que, no caso da psiquiatria 
e do manicômio – sua mais importante e expressiva instituição –, é o conceito de doença mental 
como sinônimo de perda de razão.
Dessa forma, simultaneamente ao trabalho de desmontagem das estruturas manicomiais 
e do próprio encerramento das atividades de internação na Clínica Anchieta, teve início 
a construção de uma rede de serviços, estratégias e dispositivos que – sempre fortemente 
inspirados na experiência triestina – passaram a ser denominados serviços substitutivos. 
Criaram-se cinco Núcleos de Atenção Psicossocial (abertos 24 horas), distribuídos por critérios 
de regionalização em toda a cidade; um serviço de emergência psiquiátrica no hospital geral; 
Você conhece parágrafos 
da Constituição Federal 
que se referem à saúde? 
Consulte o capítulo 11.
Sobre as bases concei-
tuais e históricas da ex-
periência italiana, ver 
especialmente Desinsti-
tucionalização, de Franco 
Rotelli, Diana Mauri e 
Ota de Leonardis (1990), 
Escritos Selecionados em 
Saúde Mental e Reforma 
Psiquiátrica, coletânea de 
textos de Franco Basaglia 
(2005), e Jardins de Abel: 
desconstrução do manicômio 
de Trieste, de Denise Dias 
Barros (1994).
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 643
um vigoroso e criativo projeto cultural, o Projeto TAM TAM, com rádio e TV comunitária; 
uma residência para ex-internos do hospital que, por alguma razão, não tivessem condições 
próprias de moradia; e uma cooperativa de trabalho, para geração de renda para os usuários.
A experiência santista se tornou a mais importante do processo de reforma psiquiá-
trica no Brasil, tendo uma enorme repercussão, e não apenas no circuito da saúde: toda 
a grande imprensa divulgou e debateu a experiência, dando, à questão psiquiátrica, uma 
dimensão pública até então nunca vista. Sobre essa experiência, Florianita Braga e Cláudio 
Maierovitch (2000) organizaram o livro Contra a Maré à Beira-Mar: a experiência do SUS em 
Santos, que retrata não apenas a política de saúde mental, mas toda a proposta de saúde do 
município de Santos (SP), uma das pioneiras e mais avançadas do SUS.
O forte impacto e a repercussão da experiência santista estão na base das condições de 
possibilidade do aparecimento, em outubro do mesmo ano de 1989, do projeto de lei (PL 
n. 3.657/89), de autoria do deputado Paulo Delgado, que propunha a extinção progressiva 
dos manicômios e sua substituição por outros serviços de saúde mental. Apesar da rápida 
aprovação na Câmara dos Deputados, um ano depois, o projeto ficou em tramitação por 
quase 12 anos e acabou sendo rejeitado no Senado. Contudo, deu origem ao surgimento 
de um substitutivo, aprovado como a lei n. 10.216/01, que, apesar de abandonar algumas 
das propostas mais importantes do projeto – tais como a extinção progressiva dos mani-
cômios –, possibilitou muitas inovações no campo do modelo assistencial e dos direitos 
humanos e da cidadania das pessoas em sofrimento mental.
Outra experiência importante que reforçou a ideia de rede substitutiva aconteceu no 
início dos anos 90 na cidade de São Paulo, com a criação de vários centros de convivência, 
hospitais-dia, programas de atenção psicossocial e inclusão, realizados em praças e jardins 
públicos, bastante originais e inventivos, além de cooperativas de trabalho para usuários e 
uma série de outras estratégias e serviços. Sobre esse trabalho realizado em São Paulo, existe 
um livro que é extremamente didático e esclarecedor. Trata-se de Tecendo a Rede: trajetórias da 
saúde mental em São Paulo 1989-1996, organizado por Maria Cláudia Tedeschi Vieira, Maria 
Cristina Gonçalves Vicentin e Maria Inês Assumpção Fernandes (1999).
Em 2001, em decorrência da permanente reivindicação do movimento da reforma 
psiquiátrica, a Comissão Intersetorial de Saúde Mental encaminhou ao Ministério da Saúde 
a solicitação para a convocação da III Conferência Nacional de Saúde Mental, que aconteceu 
em Brasília, de 11 a 15 de dezembro daquele mesmo ano. Foi um evento extremamente sig-
nificativo, com cerca de três mil participantes, a maioria composta de delegados eleitos, e que 
demonstrou a força social e política do movimento da reforma psiquiátrica em todo o país.
A política nacional de saúde mental brasileira assumiu um caráter inovador em relação 
às experiências dos demais países, sendo atualmente reconhecida como tal pelas organizações 
internacionais de saúde, como a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e a Organiza-
ção Mundial da Saúde (OMS). Certamente, é muito difícil explicar plenamente os motivos 
dessa inovação, mas podemos assinalar alguns aspectos. Um deles se refere à indiscutível 
participação e ao controle social, propiciados pelo próprio modelo de constituição do SUS, 
com destaque para alguns atores sociais muito expressivos, como é o caso do MNLA, e com 
a efetiva utilização dos canais de democratização do sistema, como as conferências e os con-
selhos de saúde. Outro aspecto está relacionado à pluralidade de experiências assistenciais 
e culturais inovadoras,distribuídas por todo o território nacional, que passou a produzir e 
Usuário
Este termo passou a ser 
adotado pelo SUS para 
designar os beneficiários 
desse sistema, mas assu-
miu um valor muito parti-
cular no âmbito da saúde 
mental, por possibilitar o 
abandono da expressão 
‘paciente’, considerada 
negativa e pejorativa, 
para os sujeitos em sofri-
mento mental.
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil644
a reproduzir novas possibilidades no trato com a questão do sofrimento mental. E há, ainda, 
o modo como o Estado vem incorporando essas inovações em forma de normas técnicas que 
constituem políticas de transformação do modelo de saúde mental.
O Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH) foi uma das 
medidas que introduziram uma reversão significativa no modelo assistencial. Instituído pela 
portaria n. 251/GM, de 31 de janeiro de 2002, o PNASH foi um dispositivo fundamental 
na redução dos leitos psiquiátricos ao estabelecer diretrizes e normas para a assistência hos-
pitalar em psiquiatria, reclassificar os hospitais psiquiátricos e definir e estruturar a porta 
de entrada para as internações psiquiátricas na rede do SUS. Atualmente, no país todo, o 
número de leitos psiquiátricos é inferior a 50 mil. Nesse processo de redução dos leitos, 
merece destaque a atuação dos ministérios públicos estaduais que, a partir de ocorrências 
de óbitos e violências em hospitais psiquiátricos, têm impetrado medidas substanciais para 
a reversão do modelo.
Embora seja evidente, muitos autores ligados aos setores conservadores da psiquia-
tria (dentre os quais muito particularmente os da psiquiatria privada com seus 55 mil 
leitos de então) alarmavam a sociedade com a ideia de que os leitos estavam sendo fe-
chados e a população, agora desassistida, estava sendo abandonada nas ruas. Ao contrá-
rio, desde a experiência pioneira de Santos, onde foi construída a primeira moradia para 
egressos do hospital (denominada República Manequinho), debatia-se a necessidade de 
dispositivos residenciais para os internos desmanicomializados. Seja porque não têm 
famílias ou porque as famílias não têm condições de aceitá-los (ou não os querem mais 
em casa), seja até mesmo porque alguns usuários não querem conviver com seus familia-
res, os dispositivos residenciais, ou formas e estratégias de residencialidade, vêm sendo 
propostos no âmbito do processo da reforma psiquiátrica desde o final dos anos 70. 
No Relatório Final da II Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em dezembro 
de 1992, foi ressaltada a importância dos “lares abrigados”, expressão adotada na época. 
Assim, foram promulgadas a portaria n. 106/2000, que introduziu os “Serviços residen-
ciais terapêuticos” para egressos de longas internações, e a portaria n. 1.220/2000, que 
regulamentou a anterior no sistema de financiamento do SUS.
O Ministério da Saúde considera que foi necessário denominar esses dispositivos de 
“serviços” e de “terapêuticos”, para que pudessem ser financiados pelo SUS. Em todo caso, 
é importante observar que todo o cuidado é pouco na implantação e condução das residên-
cias, na medida em que efetivamente não devem ser serviços e muito menos terapêuticos. 
A soma desses dois elementos, serviços e terapêuticos, aponta para o risco de instituições 
totais, que assumem o caráter de instituições disciplinares que se propunham reeducado-
ras dos indivíduos nelas internados. É o caso dos reformatórios, das casas de correção, dos 
educandários normais e dos manicômios (berço do tratamento moral).
Observados os riscos e as possíveis dificuldades daí advindas, as residências de egressos 
de hospitais psiquiátricos vêm representando um ponto de grande avanço no processo de 
reforma psiquiátrica, um recurso ímpar no processo de desinstitucionalização. Em 2011, 
registram-se 596 residências, onde moram em torno de três mil pessoas. Apesar do impacto 
dessa política na desmanicomialização, fica claro que não deve ser o único recurso adotado. 
Muitas famílias aceitaram seus parentes com muita generosidade e alegria. Não é verdade 
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 645
que as famílias sempre os rejeitam. São filhos e filhas, pais e mães, maridos e esposas... 
O mito da recusa ao retorno à casa foi construído pela psiquiatria, com invejável colabora-
ção dos empresários, donos de hospitais, que lucram com as hospitalizações prolongadas 
ou permanentes. Além disso, foi instituído o programa De Volta para Casa, de incentivo 
à desmanicomialização e integração social dos egressos dos hospitais psiquiátricos. O pro-
grama instituiu o auxílio-reabilitação psicossocial para pacientes acometidos de transtornos 
mentais egressos de internações, possibilitando um benefício em dinheiro para usuários 
e suas famílias. O programa foi instituído pela lei n. 10.708, de 31 de julho de 2003, e em 
julho de 2011 contava com 3.832 participantes (Brasil, 2011).
Em relação aos serviços de atenção psicossocial, logo após o surgimento do Caps Luiz 
Cerqueira e dos Núcleos de Atenção e Promoção à Saúde (Naps) de Santos, muitos outros 
serviços passaram a ser criados, com destaque para os Centros de Referência em Saúde 
Mental (Cersam), implantados no estado de Minas Gerais.
Com as perspectivas abertas por esses serviços pioneiros, em 19 de novembro de 1991 
o Ministério da Saúde promulgou a portaria n. 189 e, em 29 de janeiro de 1992, a portaria 
n. 224, que estabeleceram e regulamentaram os novos procedimentos em assistência psi-
quiátrica e atenção psicossocial. Ou seja, além das consultas ambulatoriais e das internações 
psiquiátricas, passaram a ser possíveis os atendimentos em serviços de atenção psicossocial 
(denominados igualmente de Naps/Caps), em hospitais-dia, em oficinas terapêuticas, entre 
outros. Apesar do valor inegável dessas portarias, a concepção impressa nesses documentos 
termina por limitar a criatividade e a complexidade dos serviços de atenção psicossocial.
Uma consequência dessa orientação se reflete na redução conceitual e na mobilidade 
e flexibilidade dos serviços, ao desconsiderar as diversidades das modalidades e naturezas 
das experiências nas quais as portarias se basearam. O Caps, que serviu de inspiração para a 
normatização, surgiu em um período anterior ao SUS, não vislumbrando, à época, exercer 
uma intervenção de base fundamentalmente territorial, nem se propondo a se tornar um 
serviço substitutivo ao modelo psiquiátrico tradicional. Já os Naps eram serviços que funcio-
navam em rede, interligados às demais políticas e estratégias públicas e sociais, e tinham uma 
proposta de intervenção intersetorial mais articulada às iniciativas da comunidade – enfim, 
se propunham como estratégia substitutiva.
Em 2002, foi promulgada a portaria n. 336, que estabeleceu uma nova regulamentação 
dos serviços de atenção psicossocial. Foi abandonada a sigla Naps e todos os serviços dessa 
natureza passaram a ser denominados Caps, sendo classificados a partir de então em três 
categorias de modalidades distintas, como é possível constatar no Quadro 1.
Em julho de 2011, o número total de Caps no país chegou a 1.650, dos quais 780 da 
modalidade Caps I; 420, Caps II; 55, Caps III; 262, Caps-ad; e 132, Caps-i. No sentido 
de monitorar o processo de reversão do modelo assistencial, é importante assinalar que o 
número de leitos em hospitais psiquiátricos continuou a diminuir: passou de 51.393, em 
2002, para 32.681, em julho de 2011 (Boletim Informativo da Raps, 2012).
O objetivo é que os Caps funcionem articulados em rede, não apenas entre si, isto é, 
em rede inter-Caps, mas, e fundamentalmente, em rede com outros serviços sanitários (de 
saúde mental e saúde em geral) e em rede com outros serviços e dispositivos não sanitários. 
Ou seja, que possam atuar articulados intersetorialmente com projetos oriundos da área da 
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil646
educação, da cultura, do transporte, entre tantos outros produzidos no âmbito dos vários 
setores das políticas públicas. E não apenas das políticas públicas, mas também das iniciativas 
que vêm da sociedade com seus vários recursos e possibilidades.
Quadro 1 – Tipos e modalidades de Centros de Atenção Psicossocial (Caps)
Tipos e 
modalidades 
de Caps
População do 
município
Horário de 
funcionamento
Dias de 
funcionamento na 
semana
Clientela
Caps I Entre 20.000 e 
70.000 hab. 8h às 18h Segunda a sexta Adultos
Caps II Entre 70.000 e 
200.000 hab.
8h às 18h 
Pode ter um terceiro 
período até 21h
Segunda a sexta Adultos
Caps II-i Acima de 
200.000 hab.
8h às 18h 
Pode ter um terceiro 
período até 21h
Segunda a sexta Crianças e 
adolescentes
Caps II-ad Acima de 
100.000 hab.
8h às 18h 
Pode ter um terceiro 
período até 21h
Segunda a sexta
Pessoas com uso 
abusivo de álcool 
e outras drogas
Caps III Acima de 
200.000 hab. 24 horas
Diariamente, 
inclusive nos feriados 
e fins de semana
Adultos
Para refletir
Você tem informação sobre a existência de algum Caps em sua cidade? Ou melhor, já conheceu 
algum? Procure identificar uma dessas experiências e vá visitá-la. Se você também conhece algum 
hospital psiquiátrico, aproveite para comparar as duas modalidades de assistência.
O Caps é uma modalidade de serviço criada para atender de forma intensiva as 
pessoas com um sofrimento psíquico considerado intenso e, em geral, persistente. Para 
que um serviço possa almejar uma atenção que seja substitutiva ao hospital psiquiátrico, é 
necessário oferecer possibilidades de acesso e de cuidado mais frequentes e permanentes. 
Um dos maiores problemas das políticas de saúde mental nas décadas anteriores estava 
no fato de que a alternativa assistencial aos hospitais eram os ambulatórios e os centros de 
saúde mental, serviços de baixa resolutividade. Inexistiam serviços de natureza psicossocial 
que, na experiência italiana, passaram a ser conhecidos como serviços fortes, devido a sua 
alta flexibilidade, mobilidade territorial, oferta diversificada de cuidados e de estratégias 
assistenciais (Figura 1).
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 647
Figura 1 – A rede de atenção à saúde mental na concepção do Ministério da Saúde 
Vizinhos
Família
Praças
Esportes
Associações 
e/ou 
cooperativas
Trabalho
Associações 
de bairro
Escola
Fonte: Brasil, 2005.
Rede de atenção à saúde mental
A concepção de rede de atenção à saúde mental do Ministério da Saúde reflete uma visão ainda 
muito restrita aos recursos e dispositivos sanitários, sem incorporar adequadamente a possi-
bilidade de ativação de recursos intersetoriais e comunitários, mas é um passo para um novo 
entendimento da noção de rede e de articulação de recursos sociais e políticos do território no 
campo da saúde mental.
Além das várias atividades realizadas no interior de um Caps (oficinas de arte e trabalho, 
atendimentos individuais e/ou em grupo aos usuários e aos seus familiares, dentre outras), 
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil648
o maior potencial de sua capacidade substitutiva está na sua ação no território, seja na pos-
sibilidade de ativar atores e recursos comunitários em função dos objetivos e estratégias de 
inclusão e integração social (atividades culturais, esportivas, de lazer, de trabalho), seja na 
transformação da cultura da comunidade em relação à loucura e aos sujeitos em sofrimento 
mental. Um bom exemplo de trabalho com famílias em um Caps pode ser encontrado em 
Família e Doença Mental: repensando a relação entre profissionais de saúde e familiares, de Jonas 
Melman (2001).
Características de um serviço de atenção psicossocial ‘forte’
• Atuar no sentido de substituir o modelo asilar.
• Disponibilizar oferta dinâmica e diversificada de recursos e estratégias trans e mul-
tidisciplinares.
• Funcionar 24 horas, inclusive sábados, domingos e feriados.
• Atuar com base no território.
• Intervir de forma intersetorial, isto é, ativando recursos de vários setores sociais.
Saúde Mental e EStratégia Saúde da FaMília
A proposta de atenção à saúde da família que vem sendo implantada no Brasil é, sem 
dúvida alguma, uma das mais importantes políticas públicas experimentadas no país. A 
Estratégia Saúde da Família (ESF), como é denominada de forma mais apropriada atual-
mente, em atuação articulada com a saúde mental no contexto da reforma psiquiátrica, 
representa uma das mais efetivas e inovadoras frentes do SUS. Tanto a ESF quanto a 
reforma psiquiátrica partem de um mesmo princípio, que é o da ruptura com o modelo 
biomédico, cujas características principais são a centralidade do hospital no modelo assis-
tencial, o especialismo exacerbado, a predominância da relação médico-doença e não a 
relação sujeito-sujeito, entre outras.
Por isso, é muito importante que, nas atividades de atenção psicossocial, tanto dos 
Caps quanto dos demais serviços (hospitais-dia, ambulatórios, unidades psiquiátricas em 
hospitais gerais etc.) e dispositivos (centros de convivência, oficinas, projetos de residencia-
lidade, projetos culturais, de geração de renda e de inserção social), esteja sempre presente 
a articulação com a equipe de saúde da família.
Os programas de saúde mental de muitos municípios organizam estratégias de apoio 
matricial às equipes de saúde da família, isto é, estratégias de apoio permanente e consis-
tente às equipes de saúde da família no lidar com os problemas de sofrimento psíquico na 
comunidade. Trata-se não apenas de realizar supervisões regulares, mas de organizar ou-
tras formas de cooperação, como prestar consultas em conjunto, fazer visitas domiciliares, 
organizar estudos de situações clínicas mais complexas etc.
Antonio Lancetti (2002) considera que a atenção à saúde mental no contexto da saúde 
da família pode significar a institucionalização radical proposta pela reforma psiquiátrica, 
na medida em que, ao cuidar das pessoas em casa, fortalece os recursos espontâneos e ori-
ginais das próprias famílias e evita que o sujeito em sofrimento seja introduzido na carreira 
de doente mental produzida pelos hospitais psiquiátricos e outros recursos e terapêuticas 
O modelo assistencial da 
Estratégia Saúde da Fa-
mília é discutido nos capí-
tulos 15 e 16. Consulte.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 649
da psiquiatria tradicional. Lancetti entende ainda que a saúde mental na saúde da família 
possibilita um processo que pode ser denominado de complexidade invertida. Explicando: 
na saúde, de uma maneira geral, a assistência é oferecida em graus crescentes de complexi-
dade, isto é, vai dos cuidados mais básicos (atenção básica) ou primários (atenção primária) 
até os níveis mais sofisticados (assistência médico-cirúrgica hospitalar hiperespecializada). 
Ao contrário, o nível hospitalar na psiquiatria é o que dispõe do tratamento mais elemen-
tar, o mais padronizado e menos individualizado: eletrochoques como medidas punitivas, 
celas-fortes, proibições, coquetéis de medicamentos que atuam no sistema nervoso central, 
intolerâncias, violências etc. É no âmbito do território que as ações são mais complexas, 
mais voltadas para os sujeitos e suas famílias, pois devem contribuir para que as mesmas 
modifiquem sua maneira de relacionar-se com o usuário, tomar decisões a esse respeito, 
orientar os vizinhos, participar das decisões da comunidade, mudar a cultura em relação 
aos problemas mentais.
Embora ainda não existam muitas publicações sobre a relação saúde mental e saúde da 
família, a coletânea SaúdeLoucura 7 (2002), organizada por Lancetti, e o livro Saúde Mental 
na Saúde da Família: subsídios para o trabalho assistencial, de Alice Bottaro de Oliveira, Marcos 
AntônioVieira e Socorro Andrade (2006) são referências que auxiliam suficientemente a 
compreensão dos principais aspectos envolvidos.
lei da reforMa pSiquiátrica e perSpectivaS de futuro...
Como vimos, com a repercussão política positiva da experiência santista iniciada em 
1989, em outubro daquele mesmo ano foi apresentado um projeto de lei de autoria do de-
putado Paulo Delgado, que propunha a extinção progressiva dos hospitais psiquiátricos e 
sua substituição por outras formas de assistência, na mesma linha dos recursos psicossociais 
e culturais implantados em Santos. Mas, com a resistência organizada dos proprietários de 
hospitais psiquiátricos, que mobilizaram inclusive familiares, desinformados e assustados, e 
setores mais conservadores da universidade, foi muito difícil a aprovação do projeto de lei 
tal como apresentado originalmente. Por fim, em 27 de março de 2001, a Lei da Reforma 
Psiquiátrica foi aprovada; não mais o projeto original (PL n. 3.657/89), mas um substitutivo 
que, sancionado em 6 de abril do mesmo ano, se tornou a lei n. 10.216/2001. Embora o 
texto aprovado tivesse excluído a proposta de extinção dos hospitais psiquiátricos da rede 
de recursos assistenciais em saúde mental, representou um significativo avanço e uma vitória 
inquestionável da luta do movimento antimanicomial brasileiro, ao revogar a legislação ar-
caica, em vigor desde 1934, e ao abrir a possibilidade e legitimar a nova política de reforma 
psiquiátrica. Além disso, durante os quase 12 anos de sua tramitação, acabou por inspirar oito 
leis estaduais de reforma psiquiátrica (RS, CE, PE, RN, MG, PR, DF e ES) e um incontável 
número de experiências locais e de associações de usuários e familiares.
A lei n. 10.216 trata fundamentalmente dos direitos e da proteção das pessoas com 
transtornos mentais, além de estimular o tratamento em regime comunitário e não hospi-
talar. Em seu artigo 2o, determina que, nos atendimentos em saúde mental, de qualquer 
natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente informados dos 
direitos enumerados no parágrafo único deste artigo – tais como ser tratados com humani-
dade e respeito; ser protegidos contra qualquer forma de abuso e exploração; ter garantia 
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil650
de sigilo nas informações prestadas; ter direito à presença médica, em qualquer tempo, 
para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; ter livre acesso aos 
meios de comunicação disponíveis; receber o maior número de informações a respeito de 
sua doença e de seu tratamento; ser tratados em ambiente terapêutico pelos meios menos 
invasivos possíveis; ser tratados, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde 
mental, entre outros.
Outro ponto importante da lei é a obrigatoriedade de o responsável técnico do es-
tabelecimento comunicar, ao Ministério Público Estadual (MPE), a internação psiquiátrica 
involuntária. Essa inovação passou a produzir efeitos muito interessantes ao envolver o MPE 
nas atividades e responsabilidades de proteção das pessoas em sofrimento mental.
Lei n. 10.216, de 6 de abril de 2001 (Lei da Reforma Psiquiátrica)
Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona 
o modelo assistencial em saúde mental.
o PresidenTe da rePública
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta 
Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação 
sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de 
gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou 
responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste 
artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I – ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;
II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, 
visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
III – ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV – ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V – ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não 
de sua hospitalização involuntária;
VI – ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII – receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;
VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência 
e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participa-
ção da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim 
entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de 
transtornos mentais.
Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos 
extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
 § 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, à reinserção social do paciente em 
seu meio.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 651
 § 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer assistência 
integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assis-
tência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros. 
 § 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em instituições 
com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos mencionados no § 2o 
e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no parágrafo único do art. 2o.
Art. 5o O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave 
dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será 
objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob responsa-
bilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder 
Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.
Art. 6o A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado 
que caracterize os seus motivos.
Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica: I – internação 
voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário; II – internação involuntária: aquela 
que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e III – internação compulsória: 
aquela determinada pela Justiça.
Art. 7o A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a consente, deve assinar, no 
momento da admissão, uma declaração de que optou por esse regime de tratamento.
Parágrafo único. O término da internação voluntária dar-se-á por solicitação escrita do paciente 
ou por determinação do médico assistente.
Art. 8o A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por médico devidamente 
registrado no Conselho Regional de Medicina – CRM do Estado onde se localize o estabelecimento.
 § 1o A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de 72 horas, ser comunicada 
ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha 
ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta.
 § 2o O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do familiar, ou 
responsável legal,ou quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento.
Art. 9o A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação vigente, pelo juiz 
competente, que levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salva-
guarda do paciente, dos demais internados e funcionários.
Art. 10o Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento serão comuni-
cados pela direção do estabelecimento de saúde mental aos familiares, ou ao representante legal 
do paciente, bem como à autoridade sanitária responsável, no prazo máximo de 24 horas da data 
da ocorrência.
Art. 11o Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser realizadas sem 
o consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a devida comunicação 
aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de Saúde.
Art. 12o O Conselho Nacional de Saúde, no âmbito de sua atuação, criará comissão nacional para 
acompanhar a implementação desta Lei.
Art. 13o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 6 de abril de 2001; 180o da Independência e 113o da República.
Fernando Henrique Cardoso, José Gregori, José Serra, Roberto Brant
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil652
conSideraçõeS finaiS
A reforma psiquiátrica brasileira vem sendo constituída com base na noção de pro-
cesso social complexo, que permite, entre outros aspectos, superar a ideia de uma simples 
reorganização do modelo assistencial, fato que ocorreu em outras experiências europeias e 
na norte-americana de reforma psiquiátrica. Assumir a noção de processo social complexo 
significa dizer que não existe o processo ou um só processo de reforma psiquiátrica, mas 
processos, na medida em que são ocorrências locais e históricas, com atores sociais e con-
junturas específicas, singulares e diferenciadas. Além disso, a ideia de processo leva a pensar 
em movimento, com permanente renovação de atores, conceitos e princípios.
Assim, um processo social complexo implica várias dimensões simultâneas e interde-
pendentes. A primeira dessas dimensões é epistemológica, que remete a repensar, descons-
truir e reconstruir vários conceitos fundamentais do modelo científico, isto é, do paradigma 
da psiquiatria. O principal conceito se refere ao objeto da ciência psiquiátrica: a alienação 
mental (que posteriormente passou a ser denominada de ‘doença mental’ e, atualmente, de 
‘transtorno mental’, mas, em última instância, todos com o mesmo significado: a perda da 
razão!). Outro conceito em processo de desconstrução é o de cura, como ideia de correção, 
ou de normatização proveniente do princípio da ‘normalidade’, como ideal teleológico, 
sinônimo ora de perfeição, ora de felicidade.
A dimensão técnico-assistencial, ou seja, a dimensão que trata da organização e dos 
princípios do cuidado, é absolutamente redefinida quando surge como consequência ou 
associada à transformação na dimensão anterior. Exemplificando, no paradigma psiquiá-
trico, na medida em que ‘alienação mental’ é sinônimo de erro ou periculosidade, entre 
outros significados negativos, o modelo assistencial é baseado, como vimos, na tutela, na 
vigilância, na disciplina, no controle e na regeneração dos indivíduos. Foi dessa forma que 
nasceu e floresceu o modelo asilar, manicomial, hospitalar da psiquiatria. Se na dimensão 
epistemológica esses significados forem desmontados conceitualmente, como reflexo na 
dimensão técnico-assistencial, a organização de serviços se tornará voltada para o cuidado, 
para o acolhimento, para a construção de espaços de escuta, de sociabilidade, de produção 
de subjetividade, de vida, e não de controle e vigilância, ou de punição e segregação. Esse é 
o princípio geral dos serviços de atenção psicossocial e das novas estratégias e dispositivos.
A terceira dimensão é a jurídico-política. Uma faceta dessa dimensão está calcada nos 
aspectos legais que tratam do tema da loucura. Tanto o código civil quanto o penal são abso-
lutamente arcaicos na matéria da reforma psiquiátrica. Referem-se ainda a “loucos de todo 
gênero”, à “irresponsabilidade civil” e a tantos outros aspectos discriminatórios, estigmati-
zantes e preconceituosos contra as pessoas em sofrimento mental. Mas a outra faceta – a da 
política – pode conter grandes avanços, pois trata da questão das práticas de cidadania. Ou 
seja, da possibilidade de construir espaços reais de produção de possibilidades de vida, tais 
como cooperativas de trabalho ou projetos de geração de renda para pessoas com desvan-
tagem social (e não apenas com diagnósticos de transtorno mental), de construir programas 
de participação e ingresso social, entre outras estratégias que viabilizem efetivamente a 
participação cidadã de pessoas nas várias possibilidades da vida coletiva.
Por fim, há a dimensão sociocultural; ou seria esta uma dimensão que resultaria de 
todas as demais? Pois, certamente, uma característica do processo brasileiro de reforma psi-
quiátrica é o forte investimento no campo sociocultural, com uma pluralidade de iniciativas 
As características do cui-
dado ao doente crônico 
são discutidas no capítu-
lo 32. Compare.
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 653
que contribuem para que a sociedade possa refletir sobre a questão da loucura e transformar 
sua relação com ela e com as pessoas com ela identificadas.
Na atualidade, concordam autores e organismos internacionais, o processo brasileiro 
de reforma psiquiátrica é um dos mais importantes e originais em todo o mundo. Em parte, 
isso ocorre em consequência do próprio SUS. O funcionamento regular do SUS possibilita 
que os militantes do processo de reforma psiquiátrica participem dos Conselhos Municipais 
e Estaduais e do Conselho Nacional de Saúde e interfiram efetivamente nas políticas públicas 
de saúde mental e atenção psicossocial.
Outro mecanismo de participação também muito importante são as Conferências de 
Saúde Mental. Mas a ausência de uma periodicidade regular – como vimos, foram realiza-
das apenas quatro (1987, 1992, 2001 e 2010) desde a 8a CNS – enfraquece essa estratégia 
democrática de controle e participação social. Por exemplo, após a 12a CNS, realizada em 
dezembro de 2003, esperava-se que fosse convocada a IV Conferência Nacional de Saúde 
Mental. Ao contrário, além de não ter sido convocada, foram realizados pelo SUS alguns 
congressos nacionais de serviços com algumas características preocupantes. Uma delas, o fato 
de serem congressos de técnicos, sem a participação paritária, prevista constitucionalmen-
te, de usuários e familiares como representantes da sociedade civil. Outra, o fato de serem 
congressos especializados, isto é, dedicados exclusivamente a um tipo de serviço, fazendo 
com que o aperfeiçoamento estivesse na dependência exclusiva de medidas científicas ou 
administrativas oriundas do campo técnico. Finalmente, pelo fato de serem encontros de 
serviços isolados, no momento em que toda a política de saúde estava voltada para a cons-
trução de redes, de intersetorialidade, de integralidade. A IV Conferência foi realizada 
apenas em 2010, no final do governo, quando já se tornava pouco provável a viabilização 
das propostas aprovadas.
Uma das forças mais expressivas do processo brasileiro de reforma psiquiátrica está 
no fato de ser baseado em um forte e permanente movimento social, no qual se destacam o 
Movimento Nacional de Luta Antimanicomial, que já realizou vários encontros nacionais, 
com centenas de participantes, e as associações de usuários e familiares (existem dezenas 
de associações dessa natureza) que já realizaram vários encontros municipais, estaduais e 
nacionais, todos com ampla participação. Mais recentemente, surgiram novos atores sociais 
que enriquecem ainda mais as políticas de saúde mental, como a Rede Nacional Internúcleos 
da Luta Antimanicomial(Renila) e a Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme). 
Esta última reúne não apenas profissionais das várias áreas inter/transdisciplinares que 
caracterizam o campo da saúde mental, mas também os diversos militantes sociais e políticos 
(usuários, familiares, militantes dos direitos humanos e outros). Além disso, ficaram muito 
mais delimitados os atores sociais contrários ao processo de reforma psiquiátrica, como a 
Associação Brasileira de Familiares de Doentes Mentais (AFDM), a Associação Brasileira 
de Hospitais (ABH) e alguns segmentos da categoria médico-psiquiátrica e acadêmica.
O principal objetivo da reforma psiquiátrica é a possibilidade de transformação das 
relações que a sociedade, os sujeitos e as instituições estabeleceram com a loucura, com o 
louco e com a doença mental, conduzindo tais relações no sentido da superação do estigma, 
da segregação e da desqualificação dos sujeitos ou, ainda, no sentido de estabelecer com a 
loucura uma relação de coexistência, de troca, de solidariedade, de positividade e de cui-
dados. É o que se deseja para a nossa realidade.
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 Políticas e sistema de saúde no Brasil654
leituraS recoMendadaS
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Saúde Mental, Desinstitucionalização e Novas Estratégias de Cuidado 655
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