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DIÁLOGOS NÃO ESCREVA NO LIVRO • O texto abaixo foi adaptado da introdução do livro Então você pensa que é humano? Uma bre- ve história da humanidade, escrito pelo historiador britânico Felipe Fernández-Armesto (1950-). Leia-o tendo em mente o que você viu sobre os critérios usados para distinguir o ser humano das demais espécies animais. Durante os últimos trinta ou quarenta anos, temos investido muitos pensamentos, emoções, ri quezas e sangue no que chamamos valores humanos, direitos humanos, a defesa da dignidade hu mana e da vida humana. Ao longo do mesmo período, silenciosa, mas devastadoramente, a ciência e a filosofia se combinaram para solapar o nosso conceito tradicional de humanidade. Consequente mente, a coerência de nosso entendimento do que significa ser humano está agora em discussão. [...] O desafio tem vindo de seis fontes principais. Primeiro, a primatologia tem acumulado exemplos de como nós, humanos, somos semelhantes a outros macacos. É difícil encontrar hoje em dia qual quer capacidade supostamente racional que os primatólogos não digam que está replicada em ou tros macacos: uso de linguagem, fabricação de ferramentas, imaginação simbólica, autoconsciên cia – imagine qualquer uma, sempre haverá macacos não humanos que a exercem. [...] Estamos no estágio mais desconcertante de uma discussão que tem feito furor por séculos sobre as diferenças entre humanos e outros primatas. [...] Terceiro, o debate a respeito das implicações morais da nossa autodefinição como humanos tem se tornado inseparável de uma questão da paleoantropologia: até que ponto remoto no passado evolutivo podemos distinguir os humanos de outros seres. Em todo caso, a paleoantropologia vem esvaziando os limites tradicionais do gênero Homo. Já não parece haver nada especialmente defini dor sobre os espécimes que classificamos como no mesmo gênero a que pertencemos, em relação àqueles que relegamos aos reinos dos australopitecos “semelhantes ao macaco”. Ora, quando olha mos para trás no registro fóssil, vemos características que outrora se imaginava serem definidora mente humanas – como bipedismo, cérebro grande, uso de ferramentas, dieta onívora – partilhadas entre várias espécies, incluindo algumas de fora da nossa linha de descendência. [...] Quinto, a pesquisa sobre inteligência artificial tem estimulado um repensar filosófico de conceitos outrora essenciais para a autodefinição humana, como a consciência, a razão, a imaginação e as pai xões morais. Assim como o trabalho primatológico e paleoantropológico nos convence de que essas qualidades evoluíram e poderiam novamente evoluir em outras espécies que não a nossa, a busca da inteligência artificial propõe a especulação de que outros seres, de nossa própria criação, poderiam ter todas as qualidades que nos tornam humanos [...]. Poderíamos partilhar nosso mundo com hu manos que têm criadores humanos, em vez de progenitores humanos. Talvez nunca aconteça, mas essa ideia pode nos estimular ou conduzir, pelo pânico, a repensar a natureza da humanidade antes que isso ocorra. FERNÁNDEZARMESTO, Felipe. Então você pensa que é humano? Uma breve história da humanidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 913. a) De acordo com Felipe Fernández-Armesto, o conceito de humanidade vem sendo questionado por seis diferentes fatores, que ele enumera em seu livro. Na reprodução do trecho acima, apenas três desses fatores foram selecionados. Identifique-os e liste-os no caderno. b) Volte ao texto didático e releia o item “O ser humano e suas características”. Qual é a característica humana definidora da nossa espécie? c) No seu entendimento, a definição de humano que você estudou neste capítulo pode passar por modificações em função dos fatores anunciados por Fernández-Armesto? Justifique. Veja respostas e orientações no Manual do Professor. 23 V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 23V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 23 9/14/20 6:10 PM9/14/20 6:10 PM Mitologias O termo mitologia tem muitos significados. Aqui, vamos utilizá-lo para se referir a narra- tivas pertencentes à tradição cultural de um povo que, de forma simbólica, expressa situa- ções sobre as origens, aventuras e façanhas de seres sobrenaturais (deuses, heróis, etc.). Essas narrativas foram fundamentais para atri- buir sentido à vida humana. Os mitos foram uma das primeiras interpreta- ções elaboradas sobre o mundo e a sociedade. Em tempos remotos, diante de forças desconhecidas e, às vezes, ameaçadoras, nossos ancestrais re- correram à divinização da natureza. Assim, relâm- pagos, tempestades, enchentes e os mais diver- sos fenômenos naturais foram vistos como forças e obras de deuses. As principais personagens míticas não são seres humanos, e sim deuses e heróis. Para in- tervir nos desígnios divinos, as pessoas busca- ram relacionar-se com os deuses, criando ritos e lugares sagrados. A seguir, leia um exemplo de mito grego. No início de tudo, o que primeiro existiu foi Abismo: os gregos dizem Kháos. O que é Caos? É um vazio escuro onde não se distingue nada. Es paço de queda, vertigem e confusão, sem fim, sem fundo. [...] Portanto, na origem há apenas esse Caos, abismo cego, noturno, ilimitado. Depois apareceu a Terra. Os gregos dizem Gaîa, Gaia. Foi no próprio seio do Caos que surgiu a Terra. [...] Na Terra tudo é desenhado, tudo é visível e sólido. É possível definir Gaia como o lugar onde os deuses, os homens e os bichos podem andar com segurança. Ela é o chão do mundo. [...] Gaia é a mãe universal. Florestas, montanhas, grutas subterrâneas, on das do mar, vasto céu, é sempre de Gaia, a MãeTerra, que eles nascem. [...] VERNANT, JeanPierre. O Universo, os deuses, os homens. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 1720. NÃO ESCREVA NO LIVRO Narciso, de Caravaggio (1571-1610), 1597-1599. Óleo sobre tela, 113,3 cm 3 94 cm. Por meio de efeitos de luz e sombra, o pintor confere uma atmosfera de introspecção ao personagem mítico. Segundo o texto do historiador e antropólogo francês Jean-Pierre Vernant (1914-2007): 1. O que podemos entender por Caos? Qual é o sentido atual atribuído a essa palavra? 2. O que podemos entender por Gaia, a Mãe-Terra? Comente. 3. Pesquise outros mitos de origem do mundo e da humanidade para apresentar aos colegas. Veja respostas e orientações no Manual do Professor. Interpretar R e p ro d u ç ã o /G a le ri a N a c io n a l d e A rt e A n ti g a , R o m a , It á lia . 24 V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 24V1_CIE_HUM_Claudio_g21Sa_Cap1_016a043.indd 24 9/14/20 6:10 PM9/14/20 6:10 PM