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COLEÇÃO COMPEND IUM Um livro vai para além de um objeto. É um encontro entre duas pessoas através da palavra escrita. É esse encontro entre autores e leitores que a Chiado Books procura todos os dias, trabalhando cada livro com a dedicação de uma obra única e derradeira, seguindo a máxima pessoana “põe quanto és no mínimo que fazes”. Queremos que este livro seja um desafio para si. O nosso desafio é merecer que este livro faça parte da sua vida. www.chiadobooks.com Portugal | Brasil | Angola | Cabo Verde Edifício Chiado – Rua de Cascais, 57, Alcântara – 1300-260 Lisboa, Portugal Conjunto Nacional, cj. 205 e 206, Avenida Paulista 2073, Edifício Horsa 1, CEP 01311-300 São Paulo, Brasil Espanha | América Latina Paseo de la Castellana, 95, planta 16 – 28046 Madrid Passeig de Gràcia, 12, 1.ª planta – 08007 Barcelona Brickell Avenue 1221, Suite 900 – Miami 33131 Florida United States of America U.K | U.S.A | Irlanda 180 Picaddilly, London – W1J 9HF Brickell Avenue 1221, Suite 900 – Miami 33131 Florida United States of America 630 Fifth Avenue – New York, NY 10111 – USA Itália Via Sistina 121 – 00187 Roma © 2019, Renato Lessa Pereira e Chiado Books E-mail: geral@chiadobooks.com Título: O Poder do AutoConhecimento Editor: Rita Costa Coordenadora Editorial: Filipa Cantanhede Composição gráfica: Andreia Monteiro Capa: Filipa Cantanhede Revisão: Inês Castelhano Impressão e acabamento: Chiado P r i n t 1.ª edição: Abril, 2019 ISBN: 978-989-52-5526-9 Depósito Legal n.º 453294/19 Renato Lessa Pereira O PODER DO AUTOCONHECIMENTO Portugal | Brasil | Angola | Cabo Verde Agradecimentos Em primeiro lugar, agradeço a Deus pela oportunidade da vida e possibilidade de contribuir de alguma forma compartilhando o resultado modesto que absorvi. Agradeço a minha esposa e filhos pelo amor com que me presenteiam todos os dias. Agradeço aos meus pais pela dedicação e vigilância constante, não esquecendo dos demais familiares e amigos que tanto torcem por mim. Minha gratidão também a todos os pensadores, escritores e filósofos que fazem parte da história humana e já de longa data nos alertam a respeito da importância do autoconhecimento para alcançarmos a plenitude do ser. 7 Autoconhecimento “Conhece-te a ti mesmo”. Esse aforismo grego está inscrito no pórtico do oráculo de Delfos e nos mostra que a importância do autoconhecimento não é destaque ou diferencial apenas dos dias de hoje. Basta uma pesquisa rápida e será possível encontrarmos centenas de resultados vinculados a essa máxima que tanto ouvimos nos dias de hoje. O que gerou o nascimento da ideia e nos levou ao desafio de ten- tarmos compor uma obra capaz de auxiliar os aventureiros que desejam finalmente encontrar sua essência foi uma jornada e processo pessoal de autodescobrimento. A tarefa do autoconhecimento não é fácil. Apesar de tanto ouvirmos por aí sobre a importância do processo, existe muito pouco de atividades práticas bem fundamentadas disponíveis. Assim, unindo esforços e muitos estudos nas áreas da psicanálise, da programação neurolinguística, da hipnologia, da neuropsicologia e das neurociências em geral, atrevemo-nos a ofertar uma proposta modesta que pode ajudar no caminho heroico da autodescoberta. Precisamos deixar claro que nossa proposta não tem a pretensão de esgotar um tema tão complexo e apaixonante. Mas, afinal, por que o Autoconhecimento é tão importante? Não sei se você já ouviu uma frase de Carl Gustav Jung, que foi um brilhante psiquiatra e um dos maiores pensadores e estudiosos da psique humana, em que ele disse que a psiconeurose é a doença de uma alma que ainda não encontrou seu significado existencial. Isso nos remete a outra pergunta: “Como encontrarmos um signifi- cado existencial se não sabemos o que somos de fato?” Você pode se esquivar nesse momento e pensar que se conhece bem, mas vamos tentar provar durante essa trajetória literária que existe muita coisa embaixo das cascas que criamos ao longo da nossa existência. 8 Renato Lessa PeReiRa Na verdade, podemos observar que não é de hoje que vivemos os papéis que a vida nos impõe e acreditamos que somos somente isso que temos coragem de apresentar aos olhos de outros expectadores. Nossa história está repleta de momentos e experiências que ficaram arquivadas em nosso mundo interior, parte consciente e a maior parte in- consciente. Lutamos arduamente na vida para controlar pensamentos, emoções e comportamentos que insistem em nos abordar sem que tenhamos a capa- cidade de entendê-los e dissolvê-los com honestidade, e perdemos a opor- tunidade de transformar toda essa energia psíquica acumulada em fonte de crescimento. O autoconhecimento é o primeiro passo para o autodesenvolvimen- to. Como saber o que realmente precisamos ajustar dentro de nós se não nos conhecemos de verdade? É como procurar um fio de cabelo no deserto. Damos muita impor- tância para o que os outros dizem sobre nós, como se fosse possível alguém saber mais do que existe em nosso universo particular do que nós mesmos. A proposta do Autoconhecimento é encontrar partes nossas que es- tão perdidas e que por razões adversas estão enterradas ou escondidas nos cantos escuros de nossas almas. Assim como a lagarta que se recolhe ao casulo para tornar-se bor- boleta, a missão do autoconhecimento é uma fatalidade se pretendemos encontrar a paz interior e gozar de uma vida plena. Boa parte de nós vive como a lagarta, sem dar-se conta dos voos que poderá alçar se permitir-se o casulo do autoconhecimento. Não podemos ser presunçosos e achar que apenas ler essa obra fina- lizará o processo de autoencontro, mas temos certeza que chegará bem per- to do que na realidade é, identificando seus bloqueios, crenças limitantes, traumas, complexos e qualidades, sem penalizar-se por isso. Também tivemos uma dose de ousadia indo um pouco mais além da simples oferta das ferramentas de autoanálise e incluímos algumas técnicas cientificamente fundamentadas para iniciar sua reforma intima. Isso mesmo! Não deixa de ser um processo de reforma a jornada de encontrarmos os espaços abandonados de nossas almas, arregaçarmos as mangas e partirmos para a limpeza e organização desses espaços, cor- rigindo os buracos e danos que as experiências que vivemos podem ter ocasionado. 9 O POder dO AutOCOnheCimentO Que fique claro que essa jornada proposta foi e ainda está sendo realizada por nós. Não nos acomodamos em utilizar apenas os materiais já estudados, mas também adicionamos estratégias utilizadas em nossos atendimentos profissionais. Acredite, as perguntas que serão feitas e os exercícios que disponi- bilizamos para ajudá-lo em seu processo de descoberta e transformação serão como seres vivos que se manterão em crescimento. Deixe-nos explicar melhor. Conforme for dando os passos em di- reção ao seu “eu real”, muitas lembranças e insights surgirão em sua mente e você poderá retornar às respostas que já deu para ampliá-las e alterá-las. Essa proposta que estamos lhe ofertando é para ser mantida sem- pre com você e será uma grande aliada para enfrentar seus medos e de- mônios mais escondidos. Se passar pela sua cabeça que essa aventura que estamos propondo tratará apenas de assuntos superficiais com receitas prontas, convidamos você a acreditar que falaremos de muitas coisas que são novidade, inclu- sive no meio científico. Desceremos juntos com uma lanterna potente aos porões de seu ser, encorajando-o a iluminar a sombra densa que possui em seu universo íntimo através do conhecimento lúcido e racional. Queremos aparelhar você com mecanismos saudáveis e dinâmicos para que possa romper com as exigências do mundo das fantasias e da aparência que esconde a força divina que existe em você. O Autoconhecimento é como se fosse um espectro contínuo e po- derá trazer a você uma satisfação incrível perante a vida e seus desafios. Não bastará olhar para tudo aquilo que vivemos, o que passamos e como isso nos impactou na forma comosomos ou estamos nesse momento. Estamos tratando de uma empreita profunda que o levará a outro nível de consciência sobre o que somos em um aspecto holístico, inte- gral. Um mundo novo será apresentado a você onde poderá finalmen- te definir estratégias para controlar e eliminar seus medos e angústias, dando o conhecimento para fazer escolhas que impactam inclusive sua estrutura genética. Não há sequer um único átomo em nossos corpos que não são re- sultado do que experimentamos em nossas vidas, e isso vale tanto para as questões materiais do corpo como para os conteúdos que estão incrus- tados em nossas mentes. 10 Renato Lessa PeReiRa Quanto mais nossa consciência se expande, mais nos libertamos de limites inúteis. Cremos fortemente que ao final dessa jornada que está prestes a come- çar, você terá condições de escolher e trabalhar por seu verdadeiro sentido e significado existencial, ingressando em um novo plano de autocura integral. Somos muito mais do que parecemos ser e enquanto não nos predis- pusermos ao processo de nos conhecermos efetivamente, seremos vítimas do que o mundo e sua voracidade nos impõem. Guardamos uma frase com muito carinho que nos diz que o bom tera- peuta precisa amar e funcionar como um espelho ao seu paciente. Essa mo- desta receita de autoconhecimento e princípio de reforma íntima foi pensada alicerçada nesses preceitos, isto é, a cada página desta obra tente imaginar a faceta de um espelho capaz de mostrar além do que os olhos comuns podem ver. Não sei se gosta ou já leu algo sobre a mitologia grega. A mitologia nos ensina muito e é fonte fecunda para estudos relacionados à psique hu- mana. Já ouviu falar da Esfinge que apresentava enigmas aos seus confron- tantes? A Esfinge apenas liberaria a passagem se o enigma fosse decifrado – Decifra-me ou te devoro! Não podemos perder a ocasião favorável de dizer que o homem se torna seu próprio enigma a ser decifrado para que possa finalizar sua trajetó- ria heroica libertando-se de tudo aquilo que o mantém preso. Encontrarmo-nos dentro de nós mesmos nos tornará seres mais dig- nos da força maravilhosa que rege a vida, encontrando o divino dentro e fora de nós, garantindo-nos uma felicidade real e perene construída sobre os alicerces rígidos e seguros das escolhas certas motivadas pelo amor incon- dicional. No desafio do Autoconhecimento precisamos cerrar os olhos e nos voltarmos para dentro, aprofundando cada vez mais o contato com nossa re- alidade íntima. Não haverá processo de autoconhecimento sem a constante autoavaliação consciente. Acreditamos que não é pouco em termos de evolução humana ter a consciência do bem e do mal que habita em nós e trabalhá-los constante- mente. E que fique claro que você não deve jamais transformar o agradável projeto de reforma íntima em tortura íntima. Na confecção desse mapa capaz de adentrar nossas entranhas psico- lógicas, nossa bússola teve como direção o processo claro de Conhecer-se – Aceitar-se – Transformar-se – Transmitir. 11 O POder dO AutOCOnheCimentO Quanto mais nos conhecermos, mais seremos tomados pelo senti- mento de pequenez, de ignorância perante tudo aquilo que desconhe- cemos, de limitação e da libertadora simplicidade que nos aproximará uns dos outros cada vez mais, e, sem dúvida, mais nos aproximará da essência divina que pulsa em tudo e em todos. Motive-se sempre lembrando que a paz decorrente da autocon- quista não pode ser abalada por absolutamente nada e que somente após o autoconhecimento é que se pode conhecer realmente o próximo que também é portador de tudo aquilo que temos dentro da gente. Imagine agora que está apenas a alguns passos de ter em suas mãos a chave que vai lhe libertar das correntes e algemas que estão mantendo você estagnado em sua caminhada espiritual e anestesiado diante dos desafios e conflitos existenciais. Quando o autoconhecimento assume o comando de nossas ações, pensamos antes de agir e o fazemos tudo com maior serenidade, mesmo diante de situações adversas e normalmente inquietantes. Ouvirmos o chamado da alma e iniciarmos a trajetória rumo ao autoconhecimento é o único e verdadeiro caminho para nos tornarmos sempre vencedores diante do sofrimento. Conquistarmos a autoconsciência nos enriquecerá com muita sa- bedoria e responsabilidade para fazermos agora o que podemos e de- vemos fazer, sem adiamentos e tampouco ansiedades, seguindo nosso próprio ritmo pessoal. Deixe as flores crescerem e as sementes brotarem dentro de você. Somente o outono revelará o que a primavera produziu. O convite da vida é para que nos transformemos no “novo ho- mem” em substituição ao “homem velho” do passado, em um processo de burilamento ou lapidação da pedra bruta que somos. Tarefa essa que só será possível se nos conhecermos profundamente. Dedique uma atenção especial ao conhecimento de si mesmo. Pro- metemos que ao final do processo você estará inteiro. Mesmo que não estiver totalmente curado de suas angústias, sua vida melhorará de qual- quer jeito! Esperamos tê-lo convencido da importância do autoconhecimento. Embarque nessa aventura, que certamente será a melhor escolha de sua existência. Suba a bordo e boa leitura. Índice Agradecimentos 5 Autoconhecimento 7 Prepare-se para a jornada 15 Quem sou eu? 21 O seu mundo psíquico 35 Algo maior pensa em você 45 A Sombra 49 Como identificamos a Sombra 55 Estágios de relacionamento com a Sombra 67 Somos todos complexos 75 Anima x Animus 103 As relações 107 Os mecanismos de defesa do ego 113 Os gigantes da alma 123 Crenças e valores 137 Emoções e sentimentos 143 A sua própria biografia 155 15 Prepare-se para a jornada Muito bem. Agora que já sabe como o autoconhecimento é impor- tante, devemos ser honestos e dizer que não é uma jornada das mais fáceis. Dizemos isso porque nessa aventura em direção ao seu universo interior será necessário que esteja munido de alguns recursos e informa- ções importantes para que não desista no meio do caminho. É muito comum ocorrer a desistência do processo assim que os primeiros contatos com nossas partes mais doloridas e escondidas come- çam a acontecer. Será necessária muita coragem para encontrar e acolher seus de- mônios internos. Falamos de acolhimento porque na verdade não se trata de uma batalha, mas de um processo de autodescobrimento e autoacei- tação. Como você já sabe, somente quando começamos a tomar conheci- mento de nossa sombra é que traremos luz à consciência, e isso nos trará o poder de controlar essas partes que são importantes em muitas facetas de nossas vidas, mas que insistem em nos tornar reféns de suas potências psíquicas quando não as aceitamos. Outro ponto importante que desejamos que você considere é que não somos gurus, ou melhor, que você precisa libertar-se de qualquer conceito que envolva a transferência de sua responsabilidade de auto- conhecimento para terceiros, ou tendências a encontrar pílulas mágicas capazes de iluminar sua alma em um passe de mágica. Seu ego resistirá, acredite. Ao sinal dos primeiros clarões de cons- ciência sobre experiências dolorosas ou de sinais da existência de partes não admitidas por você, a primeira reação será o desejo de abandonar a jornada. A experiência em atendimentos também nos mostrou que não é apenas no início que a desistência da jornada acontece. Quando começa- mos a experimentar uma certa liberdade e pequenos momentos de ple- 16 Renato Lessa PeReiRa nitude através da autoaceitação, por conta da energia liberada pelo enten- dimento e solvência dos conflitos que antes drenavam nossa vivacidade, ficamos tentados a abandonar o processo. Será necessário humildade e perseverança. A humildade para come- çar a entender que não somos aquilo que queremos que os outros pensem que somos, ou aquilo que nos esforçamos tanto para ser, ou aquilo que ten- ta nos convencer de que somos mais especiais ou melhores que os demais. A perseverança será necessária para que insista quando não encon- trar as respostas prontamente.Isso mesmo, nunca se contente com as pri- meiras respostas diante das perguntas que terá de responder nessa aventura libertadora. Você perceberá que surgirão lembranças com o passar dos dias que darão a você a oportunidade de revisitar os capítulos e questões anteriores, e essas memórias podem ser bem diferentes das que respondeu inicialmen- te. A jornada de autoconhecimento é uma empreita para uma vida intei- ra, e não apenas durante a leitura de uma obra como essa. Queremos ajudá- -lo a encurtar o trajeto, facilitá-lo ao máximo, mas não há garantias de que não existam ainda mais lacunas a serem preenchidas dentro de você. Portanto, não podíamos nos furtar da responsabilidade de sermos honestos e avisá-lo do que essa trajetória tem em suas entrelinhas. Esteja certo de que não se trata de uma leitura que deve ser rápida. Pelo contrário, sugerimos que dê o tempo necessário ao final de cada etapa que veremos durante nossa estratégia desbravadora. Entenda essa contribuição como uma ferramenta companheira que pode ser lida, relida e acompanhada por muito tempo em sua vida. Pela nossa modesta experiência, possivelmente a cada novo ciclo de sua vida, novas respostas e descobertas surgirão auxiliando você a libertar-se das amarras de uma vida conflitante e limitante. Sugerimos que não se fixe apenas nos espaços do próprio livro, ou nos formulários e fichas que eventualmente poderemos oferecer a cada etapa. Separe um bom caderno e sugerimos que o etiquete com a frase “Minha libertação”, e não seja controlado ou sovina com as folhas que precisar utilizar nessa meta de autoencontro. Foi uma preocupação nossa que ao início desta obra seria necessário que explicássemos alguns conceitos importantes sobre a psique humana, afinal conhecer como nossa mente funciona faz parte de nossa caminha- da de autoconhecimento. 17 O POder dO AutOCOnheCimentO Pedimos que não se furte da leitura cuidadosa das etapas que trouxe- rem conteúdo conceitual porque serão fundações sólidas e muito importan- tes para abreviar muitas angústias que podem surgir em sua experiência. Dedique o tempo que precisar para sentir-se satisfeito com cada eta- pa. Não se preocupe em terminar essa leitura rapidamente. Lembre-se que se trata de um processo, e a velocidade será ditada pela sua bravura em não fugir do que precisa ser encontrado e revivido dentro de você. Você não estará sozinho nessa história. Todos estaremos torcendo muito por você e também fazendo nossos próprios mapas de autoconhe- cimento. Permita-se viver tudo isso de forma intensa e transparente. As an- gústias e medos fazem parte de nossas vidas e têm um papel importante para nos alertar da vida que não estamos vivendo de verdade. Pouco a pouco será preciso superar o medo do desconhecido e do novo. As inibições e as excitações também precisarão ser superadas. Insistimos que evite buscar fora o que você precisa vasculhar dentro de seu ser. Ninguém será tão capaz quanto você mesmo para descortinar o que nossas armaduras tentam esconder. Sinceridade e honestidade serão seus aliados incansáveis em sua meta desbravadora. Muitas vezes só temos a energia necessária para mos- trar a nós mesmos o que paira em nossa instância mental, sem filtros e sem desculpismos. Não pode existir jornada de autoconhecimento sem autoavaliação consciente. Temos de sair da condição de vítimas ou de juízes da vida alheia para direcionar essa energia preciosa em nossa própria missão. Apesar de parecer contraditório, durante o processo você precisará desenvolver a capacidade de distanciamento de si mesmo, exercendo mui- ta reflexão e autoanálise. Saiba que o ser humano é o único ser vivo na face da Terra que tem condições de realizar a autocrítica. Não confunda autocrítica com o seu crítico interior destrutivo, esse precisa ser calado. Tratamos aqui de uma autocrítica amorosa e construti- va, e não um comportamento equivocado de vitimização e adubo da baixa autoestima. Ninguém poderá fazer por nós os passos em direção ao amadureci- mento tão necessário em nossa trajetória pela vida. Tomar conhecimento de si mesmo é um exercício de muito esforço e paciência. 18 Renato Lessa PeReiRa Será preciso aprender a exercer a nossa vontade e trabalhar cons- tantemente nossa teimosia em fugir de nós mesmos. Se queremos ser amados, teremos de nos aceitar. Portanto, para essa aventura heroica leve em sua mala o autoperdão, a autoaceitação e o autoamor, que são fundamentais para estar bem consigo mesmo. Não espere sucesso logo nas primeiras tentativas. Tenha impres- so em sua mente que o esforço para o autoencontro e mudança tem significado e valor independente do resultado da empreita. Seja ela de êxito ou fracasso temporário. Abra mão dos resultados, curta a viagem. Seja firme e não se esqueça de abusar também da autenticidade, da simplicidade, da alegria de viver e aprender que ficar vulnerável é uma das melhores, se não a mais potente, formas de tornar-se forte e cada vez mais próximo da plenitude. Não tardará e você terá estampado em sua consciência quem você é e o que na realidade busca. Juntando todos os pedaços você perceberá que se trata de um grande e profundo processo de autopsicoterapia. E quando a ansiedade bater forte, respire fundo e mantenha o foco. Caminhe sempre, mesmo que seja um pequeno passo, mas cami- nhe. A ansiedade por completar a jornada pode comprometer muito seu resultado. Siga devagar e sempre. Aguente firme a solidão que a jornada pode exigir para ser honesto consigo mesmo. Lembre-se da metáfora da lagarta que, an- tes de tornar-se borboleta, vive seu casulo, protegendo-se do mundo externo e transformando-se lentamente para alçar voos mais altos e belos. O recolhimento interior é muito importante para a valorização real do tempo que temos. Mas que fique claro que o recolhimento que men- cionamos não pressupõe o isolamento ou distanciamento da vida social, isso seria uma forma de alienação. A convivência será muito importante para ajudá-lo no encontro de sua sombra. Será necessário silêncio para ouvir-se e ouvir a Deus dentro de você mesmo. Jamais busque a perfeição, aceite-se imperfeito como todos somos. Mirar em imagens de perfeição fatalmente escravizará você ao mundo das idealizações inalcançáveis e da validação social, que não precisamos dizer que é o caminho totalmente contrário ao autoencontro. 19 O POder dO AutOCOnheCimentO Queremos nos encontrar essencialmente, e não nos fantasiarmos pegando apenas as partes internas que achamos que os outros desejam em nós. Para sermos fiéis nessa trajetória intransferível temos de estar in- satisfeitos pelo que achamos que somos, possuímos, ou como nos encon- tramos. Um desejo sincero de mudança, e, como já dissemos, persistên- cia nas tentativas, são mais do que necessários. Temos de nos ver pequenos, faltosos e incompletos. Buscarmos a ausência de certezas. A meta não é tornar-se perfeito, mas completar-se, aceitar o fardo de conviver com nossas tendências opostas. Todos, sem exceção, temos de fazer essa caminhada de autoen- contro e autoaceitação se queremos gozar de uma vida plena, saudável e independente. Tenha disposição para aceitar-se e vencer-se, assumir-se pode ser algo perturbador no início. Transformação requer tempo e constância. A aventura do autoconhecimento é cheia de dificuldades. É fun- damental que nos desapeguemos do orgulho, dos achismos e de nossa arrogância. Com tudo isso exposto, acreditamos que concluímos o que pensa- mos ser essencial que saiba antes de iniciar sua jornada. Nossa intenção jamais será desencorajá-lo, pelo contrário, mas não podemos nos furtar do compromisso de informar que seu mundo interior será abalado pro- fundamente. Tem a nossa promessa de que valerá muito a pena e os resultados não tardarão a aparecer ao mergulho em cada etapa. Aqui está, diante de seus olhos, o começo do restante de sua vida. O que você quer verdadeiramente? Você quer ser livre? 21 Quem sou eu? Estamos certosde que você terá uma resposta pronta na ponta da língua se fizermos essa pergunta a você. Correto? Mas, e se dissermos que você não é aquilo que acha que é? Seu nome, sua idade, sua profissão, onde mora e muitas outras definições que pode tentar encontrar para definir quem você é certa- mente não chegarão nem perto da grandiosidade e complexidade do seu ser. Somos o produto de tudo que vivemos e trazemos em nosso mun- do interior, sejam esses conteúdos conscientes ou inconscientes. Sigmund Freud, certa vez disse: “Não somos apenas o que pen- samos ser. Somos mais: somos também o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos; somos as palavras que trocamos, os enganos que cometemos, os impulsos a que cedemos ‘sem querer’.” O desafio de responder essa pergunta é extremamente abstrato e ao mesmo tempo prático, uma vez que você tem agora em suas mãos a chance de se visitar internamente e descobrir quem realmente é. A partir dessa etapa nós vamos começar a visitar suavemente algumas de suas vivências. É uma espécie de “aquecimento”, ou talvez possamos chamar de primeiro passo em seu processo de autoconheci- mento. Esqueça tudo o que você acha que é e o que os outros definem a respeito de quem você é. É hora de se permitir as incertezas e o desco- nhecido, aceitando a hipótese que você não é o que aparenta ou o que os outros desejam que você seja. Comece a se preparar para tirar as máscaras e as armaduras que usa em todos os ambientes e papéis que executa em sua vida. Pergun- te-se: “O que mereço da vida?”, “O que estou fazendo com a minha vida?”, “O que sei sobre mim?”. Conhecer-se te dará a habilidade de reconhecer o valor dos de- mais, uma vez que saberá o seu real valor. 22 Renato Lessa PeReiRa Perceba que nos dias de hoje podemos facilmente identificar muitas pessoas tomadas pela necessidade de postar tudo nas redes sociais, alimen- tando assim uma obrigação infantil de ser validado ou valorizado pelo ou- tros, fugindo de seus reais sentimentos e desejos mais intrínsecos, que são peças fundamentais na trajetória do autoencontro. A dica inicial que podemos fornecer é que não somos perfeitos e so- mos o conjunto de muitas partes que lutam para serem ouvidas e respeitadas. Costumamos dizer que se o ser humano fosse comparado com uma fruta, o cacho de uvas seria um bom exemplo, uma vez que cada uva representaria uma parte nossa. Temos tudo dentro de nós, temos ao mesmo tempo o santo e o de- mônio. O calmo e o nervoso, o sério e o brincalhão. Enfim, veremos mais sobre isso e os opostos que carregamos dentro de nós mais adiante, quando falarmos da Sombra. Não se julgue, a maioria de nós descobre que não é tão bom e evoluído como imaginava, e isso é libertador. Tenha misericórdia do homem abandonado que está dentro de você. A aceitação de si mesmo é o antídoto de nossas dores morais. A des- cida até às nossas profundezas sempre parece anteceder a subida para uma vida mais leve e plena. No final do processo já não estaremos mais preo- cupados com o que o mundo espera de nós, já não seremos iguais a mais ninguém e estaremos prontos para seguirmos nossos corações. Nossa aventura não propõe respostas prontas, mas oferecer ferramen- tas profundas de reflexão. Compartilhamos da opinião de que bons terapeutas devem funcionar como espelhos para que os pacientes possam se perceber. E foi assim que elaboramos todo o conjunto de informações e per- guntas que você começará a seguir. Queremos que cada etapa reflita com a maior nitidez possível os conteúdos de sua alma. Vamos juntos buscar sua real identidade até que finalmente experimente uma sensação coerente de ser você mesmo. Reconhecer e acolher as partes não admitidas por você será semelhan- te ao processo de deixar o joio crescer para então separá-lo do trigo. Tudo isso é seu e também é parte do “você” inteiro. Nesta etapa você começará a liberar sua energia para encontrar algu- mas das primeiras respostas que serão cada vez mais úteis em seu mergulho interior na odisseia de amar a pessoa que poderá ser, sem aguardar aplau- sos nem reconhecimento coletivos, muito pelo contrário. Você precisa estar consciente de que descobrir quem você é vai contra a regra coletiva que estamos vivendo nos dias atuais infelizmente. 23 O POder dO AutOCOnheCimentO Diferentes “EUs” habitam dentro de você. Antes de prosseguirmos, gostaríamos de utilizar uma frase conhecida do brilhante filósofo alemão Friedrich Nietzsche, que diz: “Eu sou vários! Há multidões em mim. Na mesa de minha alma sentam-se muitos, e eu sou todos eles. Há um velho, uma criança, um sábio, um tolo. Você nunca saberá com quem está sentado ou quanto tempo permanecerá com cada um de mim. Mas prometo que, se nos sentarmos à mesa, nesse ritual sagrado eu lhe entregarei ao menos um dos tantos que sou, e correrei os riscos de estarmos juntos no mesmo plano. Desde logo, evite ilusões: também tenho um lado mau, ruim, que tento manter preso e que quando se solta me envergonha. Não sou santo, nem exemplo, infelizmente. Entre tantos, um dia me descubro, um dia serei eu mesmo, definitivamente. Como já foi dito: ouse conquistar a ti mesmo.” Vamos começar a conquista? Linha do Tempo Essa é a primeira proposta que vamos apresentar a você. Nada melhor para começarmos a jornada de autoconhecimento do que fazermos um apanhado geral de tudo que vivemos até o presente momento. Sua linha do tempo (Modelo): Nascimennto__________________________________________HOJE Nesse exemplo acima suporíamos que seu nascimento ocorreu em 1959 e os demais anos apontariam para suas experiências significativas até ao ano atual. 24 Renato Lessa PeReiRa É claro que é só um modelo para ficar mais claro como executar esse primeiro desafio. O objetivo aqui é você ir pontuando ano a ano as experiências que considera significativas em sua trajetória até agora. Nessa linha você poderá colocar qualquer coisa que lhe vier em mente, mas foque-se naquilo que considera significativo. Exemplos do que costumamos colocar na linha do tempo são: mudanças de casa, mu- danças de escola, separação dos pais, viagens importantes, acidentes sig- nificativos, primeiro beijo, primeira relação sexual, entrada na faculda- de, cursos que considera impactantes em sua vida, casamento, início de trabalho em cada empresa, nascimento de irmãos, morte de parentes e amigos próximos, e por aí vai. O modelo de Linha do Tempo que apresentamos geralmente não costuma ser suficiente e aconselhamos que elabore a sua própria forma. Veja como se sente mais confortável e mais organizado. Pode fazer de 1 em 1 ano, 5 em 5 anos, 10 em 10, enfim, não limite-se ao nosso pequeno exemplo e tampouco restrinja-se a períodos com intervalos iguais. O que conta aqui é o que se recorda e tem importância em toda sua existência. Costumamos sugerir em atendimentos profissionais que seja feita uma planilha e que a deixe sempre acessível para ir incluindo as lem- branças que vierem a sua mente com o passar dos dias. Existem anos onde temos mais de um evento significativo, não limite-se, inclua o que lembrar. Caso deseje maiores exemplos de como uma linha do tempo é feita nos programas de autoconhecimento, realize buscas na internet e encontrará muitos tipos e modelos que podem servir de inspiração a você. Primeiras Perguntas Ok. Assim que sua primeira linha do tempo já estiver completa, realize a resposta das perguntas que elencamos a seguir. São perguntas com respostas simples, mas foram elaboradas tecnicamente e têm como objetivo ajudá-lo a voltar sua atenção ao que está dentro de você. Lembre-se que estamos aquecendo os motores. Verifique se suas respostas estão realmente atendendo suas próprias preferências e não estão viciadas pelos ambientes e pessoas com quem convive. 25 O POder dO AutOCOnheCimentO Como é o relacionamento com seu pai (ruim, regular, bom ou ótimo)? Como é o relacionamento com sua mãe (ruim, regular, bom ou ótimo)? Qual seu estilo de música predileto? Qual sua bebidapredileta? Qual sua comida predileta? Qual sua cor predileta? Qual é seu lugar predileto? Qual é o local onde se sente mais seguro? (Seja específico.) Prefere campo, praia, cidade etc.? Qual sua estação predileta do ano? Gosta de flores? Se sim, sabe o nome da flor predileta? Gosta de algum esporte? Qual? Pratica algum esporte? Qual? Pratica meditação? Gosta de ver-se em fotos ou filmagens? Evita ver-se em fotos ou filmagens? Costuma orar? Se sim, com qual frequência? Gosta do som de sua voz em gravações ou filmagens? O que te faz feliz? Você se considera uma pessoa realmente feliz? Nesse momento de sua vida, de 0 a 10, quão feliz você está? O que te deixa triste? O que te deixa desanimado? Na maior parte de seu tempo, considera-se otimista, pessimista ou meio termo? Qual seu estilo de filme predileto? O que costuma assistir na televisão, qual tipo de conteúdo? (Pelo menos 3 x na semana.) Gosta do que faz profissionalmente? (Se for o caso.) Sente que está em contato com seu propósito de vida? Tem facilidade em imaginar? Considera-se uma pessoa que vê muito, ouve muito ou sente muito? Tem o hábito da leitura? Participa de alguma atividade voluntária? Qual frequência? 26 Renato Lessa PeReiRa De 0 a 10, qual seu nível de carência afetiva nesse momento? Sente-se sexualmente satisfeito? Possui alguma fobia? Qual? Tem alguma alergia? Ao quê? Sente alguma dor frequente? Qual? Sente culpa por algo específico? Sente culpa constantemente (situações diversas, sente-se culpado quando algo não dá certo)? Sente-se triste com frequência? Sente angústia com frequência? O dinheiro é um fator de stress em sua vida? Seja sincero, para você, o que é mais importante? O que você mais valoriza? Amor, sucesso, saúde, honestidade, beleza ou família? Possui algum TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo)? Tem algum trauma significativo? Qual? Qual seu maior medo (não fobia)? Tem facilidade em perdoar? Possui algum vício? Qual? Magoa-se com facilidade? Perde a paciência com facilidade? O que mais admira em alguém? O que mais critica em alguém? Aproximadamente, quanto tempo passa nas redes sociais diariamente? Em uma escala de 0 a 10, como está sua ansiedade nos últimos tempos? Checa seu celular com frequência inferior a 1 hora? Em sua opinião, qual seu maior defeito? Em sua opinião, qual sua maior qualidade? O que deseja melhorar em você? Você gosta de chamar a atenção ou é uma pessoa discreta? Sonha muito? Costuma lembrar-se dos sonhos? Em sua opinião, em uma escala de 0 a 10, qual é o tamanho dos seus problemas atuais? Costuma ter algum sonho recorrente? Em uma escala de 0 a 10, em quanto está sua autoestima? Em uma escala de 0 a 10, em quanto está seu nível de stress? Dorme bem? Quantas horas por noite? 27 O POder dO AutOCOnheCimentO Seu sono é direto ou acorda algumas vezes durante a noite? É criativo? O que costuma fazer para expressar sua criatividade? Pode considerar sua infância como feliz? Tem irmãos? Se sim, tem bom relacionamento com todos? Teve muitos relacionamentos afetivos (namoros etc.) até o momento? Teve muitos amigos na infância? Já sofreu bullying? Tem desejo de quebrar regras? Quais? O que te impede de quebrá-las? Se seu maior problema fosse resolvido, o que você perderia? (É isso mesmo, o que acredita que deixaria de ter se seu maior problema fosse resolvido.) O que você quer resolver em sua vida? (Algo que não dependa de ninguém.) Defina o que seria seu “EU” ideal (imagine o que seria sua melhor versão desejada, física e mental). Há alguma coisa que o impeça de ser o seu EU mais autêntico e vital? Se sim, qual é esse obstáculo? Do que você gosta em si mesmo? O que eu vejo e o que o mundo vê sobre mim A Janela de Johari A Janela de Johari é uma ferramenta muito prática e precisa. Foi criada por Joseph Luft e Harrington Ingham em 1955. Ela tem como objetivo nos auxiliar no processo de entendimento de nossa comunicação interpessoal e de nossos relacionamentos nos grupos de que fazemos parte. O desafio não é complicado, mas você precisará pedir auxílio de pessoas que lhe conhecem. Nossa sugestão é que solicite ajuda ao menos a dois parentes próximos, dois amigos muito próximos e dois colegas que não o conheçam há muito tempo. Quanto maior for o número de pessoas que oferecerem informações a seu respeito, melhor será seu aproveitamento. Peça que sejam sinceras e francas sem receio de magoá-lo. Lembre-se do que falamos na etapa anterior a respeito de sua preparação para a jornada. Aqui você conseguirá ver e descobrir características suas marcantes que muitas vezes não são de seu conhecimento. 28 Renato Lessa PeReiRa Perceba que na base da imagem está sua percepção (Você) e na lateral esquerda estão os outros para quem solicitou ajuda. Veja que tanto na base (Você) quanto na lateral (Outros) existem dois campos chamados “Conhecido” e “Desconhecido”. E para que isso serve afinal? Após seus parentes, amigos e colegas lhe responderem às perguntas que serão sugeridas mais abaixo, você preencherá esses quadros posicionando as características que tanto você quanto os outros detectam como características marcantes, ou seja, todos percebem essas características em você. No entanto, provavelmente verá características mencionadas pelos seus respondedores que são desconhecidas por você. Com essas você preencherá o quadro “Conhecido” dos outros e “Desconhecido” por você. Simples, certo? Aquelas características que você sabe que possui, mas que os respondedores não mencionaram nas respostas serão inseridas no quadro “Conhecido” por você e “Desconhecido” pelos outros. Perceba que ainda teremos um quadro que deveria conter o que você mesmo e os outros não sabem que são características suas. Esse quadrinho é onde mora boa parte do resultado do processo de Autoco- nhecimento que vivenciaremos ao longo dessa obra. 29 O POder dO AutOCOnheCimentO Para facilitar um pouco o seu processo, seguem abaixo algumas perguntas que você pode utilizar como exemplo para encaminhar às pessoas de seu convívio: – O que você acredita que são as minhas habilidades? – Como você me descreveria em três palavras? – E as características não tão positivas, quais são? – Em sua opinião, quais são as minhas competências? – Em sua opinião, quais são as minhas paixões? – Em sua opinião, quais são os meus medos? Ex.: medo de não ser relevante ao mundo. Cremos que já entendeu o conceito e a utilidade da Janela de Johari. É um atalho significativo para identificar o que você não tem medo de mostrar ao mundo, o que mostra somente para alguns grupos e o que por alguma razão não deseja mostrar a ninguém. Esteja atento e receptivo às críticas que te fizerem. Seja grato, pois terá acesso a um valioso feedback sobre como as pessoas o enxergam de verdade. Mas ainda não acabamos nosso aquecimento. A seguir vamos dar mais um passo em direção às suas camadas mais profundas. INVENTÁRIO DE MOMENTOS PESSOAIS SIGNIFICATIVOS Nessa parte, escolha até 10 experiências felizes e até 10 expe- riências infelizes vividas em toda sua jornada. Não seja muito crítico sobre a relevância dessas experiências, faça o que lembrar, mesmo que entenda que o fato não seja tão feliz ou tão infeliz. Seja o mais detalhis- ta possível com relação ao contexto das experiências, suas emoções e sensações. Utilize seu caderno e quantas folhas precisar. Você percebe- rá que só o fato de registrá-las será uma tarefa terapêutica e poderá já trazer conteúdos que você tem guardado em um canto escuro qualquer dentro de você. 30 Renato Lessa PeReiRa É possível que alguns desses momentos também estejam menciona- dos em sua linha do tempo, mas aqui o desafio é ser detalhista, transcrevendo fatos, pessoas e emoções envolvidas. Você tem traumas? Se tiver, agora é um bom momento para admiti-los e revivê-los sem medo. Histórias felizes Ex. 1) Quando recebi a notícia de que seria pai, foi um dia mágico. Estava chovendo e as coisas foram tumultuadas em meu trabalho, estava um tanto ansioso e nervoso por conta dos problemasprofissionais. Quando estava chegando até minha casa senti uma energia maravilhosa sem saber o porquê, afinal os fatos até àquele momento não eram animadores. Abro a porta de minha casa e vejo minha esposa chorando com um envelope em mãos. Sem dizer nada abri o mesmo e lá estava o resultado do exame de gravidez com a frase: “Parabéns, você vai ser papai”. Não me contive e as lágrimas rolaram pelo meu rosto… abracei fortemente minha esposa e ainda lembro do seu cheiro. Acabei esquecendo todo o resto, tudo ficou muito pequeno diante da notícia que iria estremecer meu mundo. Histórias infelizes Ex. 1) Era madrugada, por volta das 3 horas da manhã. Ainda morava na casa de meus pais, era o ano do meu casamento. Recordo que o telefone tocou e prontamente abri meus olhos assustado. Ouço meu pai atendendo o telefone e já percebo que a notícia não era boa. Meu tio, que sempre conviveu e esteve muito próximo a mim, havia sofrido um ataque cardíaco na estrada e tinha falecido. Lembro que ficamos todos em choque, sem saber na verdade como agir ou sentir. Foi um momento de sofrimento que se estendeu por todo o dia no aguardo do corpo que estava em outra cidade. O momento de seu sepultamento foi muito intenso para mim e chorei, chorei muito. Foi a primeira vez que a morte mostrou sua face para mim. Meu primo substituiu meu tio como padrinho ao lado de minha tia na data de meu casamento, que ocorreu poucos meses depois. 31 O POder dO AutOCOnheCimentO Mais algumas questões estratégicas Na obra Formando Seres Integrais, que também compõe a série AutoCura Integral, pudemos explicar com mais detalhes e profundidade a origem e a importância das pirâmides que nortearam a elaboração dessas questões. Não faremos uso de todo conteúdo que expusemos naquela oca- sião, mas sob a ótica do processo de autoconhecimento cremos que su- gerir respostas a perguntas que estejam relacionadas às pirâmides de necessidades, aprendizagem e neurológica, seja um passo importante para finalizarmos essa etapa de aquecimento. Vamos a elas: 1. Você está com suas necessidades fisiológicas totalmente satis- feitas? 2. O que falta para considerar suas necessidades mais básicas atendidas? 3. Consegue perceber se não está exigindo mais do que é na realidade necessário para sentir-se satisfeito? 4. Costuma sentir-se insatisfeito com as coisas que possui? 5. O que você precisa de fato para se sentir seguro? Acredita que tem segurança nesse momento? Por quê? 6. Quando atinge alguma meta que deveria trazer segurança ainda permanece inseguro? 7. Consegue ter autoestima mesmo quando não está em algum relacionamento afetivo? 8. Você deseja respeito ou admiração dos demais? Consegue distinguir admiração ou respeito? 9. Quantos amigos verdadeiros acredita que possui em sua história? 10. Qual é a importância que sua família tem em sua vida? 11. Na sua opinião, o que de fato você acredita que seja indispensável em sua vida? Por quê? 12. Que tipo de leitura é seu gênero predileto? 13. O que o motiva a aprender algo? Por quê? 14. Costuma ver vídeos educativos? 32 Renato Lessa PeReiRa 15. Tem o hábito de participar de cursos presenciais de aprimora- mento pessoal? 16. Tem facilidade em ensinar algo a alguém? 17. O que facilita ou dificulta uma iniciativa sua de transmitir algum conhecimento? 18. Sente facilidade em aprender? O que costuma aprender com mais facilidade? 19. Você se considera uma pessoa mais prática ou teórica? 20. Quando olha para seu passado, quais foram os seus melhores professores? Por quê? 21. Quanto das melhores características de seus professores você acredita estar associado aos seus comportamentos? 22. Quando criança, fingiu ter dificuldades em algo para receber atenção de seus pais? 23. Tenta evitar exposição diante de algo que ainda não aprendeu? 24. Sente-se inferior quando precisa iniciar algum curso específico? 25. Sente-se superior quando tem a oportunidade de ensinar algo? 26. Sente-se incapaz de aprender algo? Se sim, o que pode estar associado a essa crença que lhe impede de aprender? 27. Onde costuma se sentir mais desconfortável? O que você sente exatamente? Sabe dizer por quê? 28. Em que tipo de ambiente você desenvolve comportamentos indesejáveis? Quais são esses comportamentos indesejados? 29. Costuma generalizar seus defeitos e qualidades como se fosse parte de sua identidade? 30. Quais são as suas habilidades? Qual é o seu maior talento? 31. Quais são as suas incapacidades e limitações? 32. Quando se sente incapaz? Por quê? 33. No que você acredita? Sabe dizer por quê? 34. Sabe dizer quem é você realmente? 35. Caso faça parte de alguma religião, sente-se totalmente alinhado com suas bases ideológicas? 36. De 0 a 10, quanto você acha que é reflexo do que seus pais são? 37. O que é família para você? 38. Para você, o que são amizades verdadeiramente profundas e verdadeiras? 39. Qual é a sua missão? 33 O POder dO AutOCOnheCimentO 40. O que você tem feito de positivo para outras pessoas ultima- mente? 41. O que você gostaria de fazer de positivo para outras pessoas, mas ainda não consegue? Por quê? 42. Tem o desejo de fazer a diferença no mundo onde vivemos? 43. O que acha de trabalho voluntário? 44. O que impede de fazer mais pelos demais? Acreditamos que depois dessas primeiras atividades você já está pronto para entender um pouco mais de seu mundo psíquico e conhecer rapidamente como nossas mentes funcionam. 35 O seu mundo psíquico Não sabemos se já teve a oportunidade de ler nossa outra obra chamada Formando Seres Integrais. Caso não tenha lido, sugerimos fortemente que faça isso assim que possível. Nessa etapa nosso desejo é que você perceba como seu mundo psíquico funciona. Vamos tentar transmitir essas informações de forma simples e prometemos que não será dolorido esse contato mais próximo com alguns dos principais conceitos que estão relacionados à psique hu- mana. PSIQUE vem do grego e quer dizer “ALMA”. Não seria de es- pantar se disséssemos como isso pode ser vago e ao mesmo tempo tão abrangente. De uma forma estranha, temos a percepção de que algo muito maior além do que percebemos existe dentro de nós. É aquela afirmação que nos deixa confusos só de imaginarmos: “Algo pensa dentro de mim”. Entender um pouquinho do que já foi possível mapear pelos estudio- sos da filosofia e da psicologia é fundamental para prosseguirmos com a construção do conhecimento de que precisaremos para os próximos passos de sua jornada de autoconhecimento. Antes de seguirmos precisamos esclarecer que existem linhas de pensamento diferentes dentro da própria teoria psicanalítica, no caso, temos preferência por uma corrente de pensamento que mais nos con- venceu diante de nossas experiências, estudos e atendimentos realizados. Quero deixar claro que qualquer intenção de transformar o sistema psíquico humano em um esquema padronizado é no mínimo equivocada, isso porque estamos tratando de um tema extremamente complexo sob todos os prismas. O que as ciências dedicadas ao estudo da psique humana até hoje conseguiram perceber é que existe um modelo que se repete praticamen- te em todos nós, e por isso a psicologia acabou por se tornar uma ciência aplicada. 36 Renato Lessa PeReiRa Queremos apresentar um modelo que sugere divisões como se fos- sem partes que se relacionam dentro do mesmo ambiente e que já de- monstram ao menos um caminho, um ponto de partida, para seguirmos o estudo individualizado de cada um. Apesar de termos preferência por uma corrente de pensamento es- pecífica, acreditamos que precisamos estar sempre com nossas mentes abertas para as novas teorias e experimentos realizados que vão a cada momento nos dando pistas para chegarmos cada vez mais perto do mapa mental ideal. Além disso, existem técnicas que fazem sentido e trazem resulta- dos bastante assertivos em todas as correntes e teorias que estão se for- mando nos últimos tempos. Portanto, é preciso estarmos sempre atentos a todasas novidades que visam o nosso equilíbrio. Veja, não queremos assustar você, mas vamos apresentar um dia- grama elaborado pelo grande mestre e médico psiquiatra suíço, Carl Gustav Jung. Fique tranquilo, não entraremos em teses e teorias complexas, apenas tentaremos de forma resumida apresentar os conceitos das partes detectadas pelo Jung e seus sucessores. 37 O POder dO AutOCOnheCimentO Não se assuste, confie em nós porque vamos apresentar os con- ceitos de forma informal e sem debates improdutivos. A intenção aqui é ter apenas uma noção, um ponto de partida que possa ser útil em seu processo de autoconhecimento. Podemos dizer que se por curiosidade você pesquisar um pouco, encontrará ainda mais diagramas que trarão outras definições e subdivi- sões desse modelo que estamos apresentando. Perceba no diagrama que temos no topo o “Mundo exterior” e na parte mais baixa o “Mundo interior”. Entenda que deve visualizar o diagrama percebendo que as “par- tes” contidas no mesmo estarão mais próximas do que chamamos de “Mundo exterior”, ou seja, o mundo que está fora de nós, quanto mais próximas ao topo. O inverso também é verdadeiro, ou seja, quanto mais próxima a “parte” estiver da área inferior do diagrama, mais interior e profunda a mesma estará em nosso mundo psíquico. Mas não se apegue a isso, não é uma ciência exata e não será pos- sível tanta precisão. No diagrama também foram apresentados dois itens (consciente e inconsciente) muito importantes que trataremos em etapa seguinte e que na verdade não seriam “partes”, mas talvez territórios. Para facilitar, vamos seguir a ordem exposta no diagrama. PERSONA Palavra derivada do grego e tem como significado “máscara”. Os ato- res na Grécia antiga faziam uso das máscaras que identificavam seus personagens. A Persona é a máscara que utilizamos no convívio social. É uma ferra- menta do Ego para nos integrarmos à sociedade e nos comunicarmos de forma melhor. Você possivelmente poderá identificar algumas delas nas respostas que recebeu para completar sua Janela de Johari. Perceba que o ser transcende a aparência! Por exemplo, assim que você começa a descobrir o ser que há por trás de um rosto muito bonito ou muito feio, de acordo com seus conceitos e preconceitos, as aparências superficiais somem até simplesmente não importarem mais. 38 Renato Lessa PeReiRa Temos várias personas, por exemplo: a persona do pai, do profissio- nal, do filho, do amigo, do cidadão e por aí vai. Podemos facilmente ver esse reflexo necessário nos trajes médicos e suas cores, provavelmente não confiaríamos em um médico utilizan- do chinelos e bermuda em seu consultório. A Persona é sem dúvida necessária, utilizamos a mesma tanto para proteção de nosso mundo íntimo contra o mundo exterior como para nos adaptarmos a ele. Para exemplificar, você já percebeu que somos diferentes no am- biente de trabalho em comparação de como somos nas casas de nossos amigos? A gente acaba sempre tentando uma adaptação de acordo com o ambiente em que estamos. Poderíamos imaginar que a Persona é como uma ferramenta de defesa, ou melhor, de adaptação ao meio. E não é só isso, podemos ainda utilizar outras personas dentro de uma mesma persona. Confuso isso? Em sua casa, dentro da persona de pai (caso você seja pai), pode existir o pai brincalhão e o pai dis- ciplinador. Há a hora de brincar e a hora que os filhos precisam res- peitar sua autoridade paterna para ajuste de algum comportamento inadequado, percebe? Nossa linguagem verbal e corporal muda to- talmente de acordo com o papel de diversão e correção. Agora tente responder: “Quem sou eu além dos papéis que interpre- to e interpretei?” EGO O Ego seria o centro de nossa consciência. A ferramenta que nos permite ver, interpretar tudo a nossa volta que está relacionado ou não com nossas ações próprias. Em uma concepção filosófica seria o “Eu de cada um”. É o que geralmente respondemos quando nos perguntam: “Quem é você?”. Recorda-se do que falamos em etapa anterior sobre quem é você? Então, a resposta que você costuma dar está relacionada e é ofere- cida pelo seu Ego. Podemos também considerar ele como se fosse o gestor, o gerente de nossa realidade nas atividades do dia a dia. Entenda que o Ego é necessário porque é a parte que nos permite a vivência consciente. 39 O POder dO AutOCOnheCimentO Costumamos dizer que o problema do ser humano é o “Ego”, mas não é verdade, se você não possuísse o Ego estaria em estado to- talmente inconsciente e não viveria, ou perceberia a sua realidade. Mas o fato de o Ego ser essencial nada tem de relação com ser ego- cêntrico ou egoísta, que são derivações utilizadas para definição de comportamentos. Dizemos que uma pessoa é egocêntrica quando se vê como o centro de tudo e egoísta quando quer tudo para o seu “Eu”. O Ego está muito ligado à sobrevivência, proteção e às reações do ambiente. Para exemplificar melhor, é como se o Ego fosse um solda- do que precisa defender o quartel general, sempre atento aos perigos e necessidades, controlando quem entra e quem sai, ou o que entra e o que sai. O Ego é só uma faceta do outro “Eu maior”, o Self. SELF Seria o si-mesmo. Na verdade não é uma parte e sim o “TUDO” que somos, nossa essência. Para muitos seria a imagem de Deus dentro de nós, ou “princípio inteligente”. O verdadeiro senhor da casa, o núcleo da alma. O Self é o “eu maior”, o “eu superior”, mais elevado. Seria o ponto central da personalidade, o que rege e sustenta todos os demais sis- temas. Seria a sede ou a fonte das maiores virtudes humanas, como a compaixão, o perdão, compreensão, gratidão, tolerância, humildade e o altruísmo. Quando falamos em autoconhecimento, o que estamos perseguindo é justamente esse “tudo” e não somente o que permeia nosso Ego consciente. Entendeu? É necessária a busca constante do Self. A harmonia entre o Ego e Self seria a meta do processo de equilíbrio psíquico, por isso tamanha im- portância nesse processo que estamos fazendo juntos para descobrir quem você é verdadeiramente, ou ao menos, o mais próximo possível de quem é realmente. Acho que não teria uma analogia melhor para o Self que não fosse a essência pura e divina que existe dentro de cada um de nós. 40 Renato Lessa PeReiRa SOMBRA Tudo aquilo que não temos consciência que está dentro de nós. Assim como projetamos uma sombra física, também projetamos uma sombra psíquica. Essa sombra psíquica contemplaria tudo aquilo que esquece- mos, que guardamos, desconhecemos que já vivemos, e tudo que não queremos reconhecer que está dentro de nós. Não se engane, não imagine que só existem coisas ruins na sombra. É muito possível que muitas coisas boas também estejam lá. Nessa jorna- da que estamos empenhados não há como conhecer-se sem passar pelo “vale da sombra” que existe dentro de cada um de nós. Justamente aqui é que nosso maior esforço será aplicado a cada nova etapa onde cava- remos mais fundo seu mundo interior. Em uma comparação mais simplificada, o que temos consciência, ou seja, tudo aquilo que é percebido pelo Ego está à luz, e por isso é con- teúdo consciente. O que não é percebido ou admitido pela consciência estaria com ausência de luz, dessa forma na escuridão da psique. É como se fosse o quarto escuro onde guardamos as coisas velhas e antigas. Essa é certamente a parte mais importante de que falaremos, especial- mente porque nosso foco principal nessa obra é ajudá-lo a descobrir-se por completo. Portanto, terá capítulo exclusivo mais adiante. ANIMA – ANIMUS Anima é o conjunto de todas as características femininas da alma. Tais como: bondade, compreensão, empatia, gentileza, justiça, emoção, in- tuição, capacidade de amar, cuidar, ouvir, criatividade, beleza, espiritu- alidade etc. Animus é o conjunto de todas as características masculinas da alma. Tais como: coragem, persistência, força de vontade, razão, ação, pen- samento claro, raciocínio lógico, concentração, cumprimento de metas, discernimento, empreendedorismoetc. Não temos aqui a intenção de polemizar ou realizar debates sobre as questões fisiológicas e de sexualidade. Trata-se de um pacote de ca- racterísticas anímicas, ou seja, da própria alma. Sabemos que é muito comum encontrarmos mulheres com características psíquicas predomi- 41 O POder dO AutOCOnheCimentO nantes consideradas masculinas e vice-versa, sem que isso tenha qual- quer impacto imperativo na sexualidade do ser. Por ora, o que precisamos alinhar entre nós é que somos dotados de características consideradas masculinas e femininas. A definição de ani- ma e de animus na verdade é mais uma rotulagem que utilizamos para facilitar a busca de interpretação de nossa psique. A proposta é o desenvolvimento de todas elas, sejam masculinas ou femi- ninas, visando o equilíbrio do ser. Entender quais são as características predominantes e as que estão em atrofia é de grande valia para os ajus- tes na conduta de qualquer um de nós. Mais adiante também dedicare- mos um pouco mais de atenção na descoberta dessas características que fazem parte de você, sejam elas predominantes ou não. Esse tema será mais abordado em etapa futura exclusiva. Que fique claro aqui que existem outros temas importantes que estariam associados ao diagrama que apresentamos, mas omitimos para não causar alguma confusão mental, que poderia atrapalhar ao invés de ajudar. Para ilustrar melhor e ficar mais claro, levando em conta que nosso mundo atual praticamente gira em torno de smartphones, queremos fa- zer uma analogia interessante sobre Ego, Self, Persona, Sombra, Anima, Animus e o cérebro. O smartphone em si, ou seja, a parte física é como se fosse o nos- so cérebro. O sistema operacional seria o Self porque contém toda a programação aparente e não aparente para o funcionamento de todos os componentes que fazem parte do smartphone, independente do co- nhecimento do usuário o sistema operacional está gerindo o uso da ba- teria, verificando inconsistências e muitas vezes checando atualizações necessárias. O usuário do smartphone seria o Ego porque tem acesso e interage com o que está sendo apresentado na tela, as apps, que são ferramentas para atender as necessidades do usuário, seriam as Perso- nas. A sombra é como se fosse aqueles programas que já usamos antes, mas que se mantém em execução em background ocupando memória e capacidade de processamento (chega a travar o smartphone) sem que a gente esteja vendo eles, temos geralmente de usar algum atalho do sistema operacional para vê-los e fechá-los liberando memória e dei- 42 Renato Lessa PeReiRa xando o smartphone mais “leve”, ou melhor, mais rápido e eficiente. As empresas quando estudam lançar um novo smartphone, não pensam apenas na velocidade, na segurança ou na resistência física do apare- lho (ANIMUS), é fundamental também que o smartphone tenha beleza, leveza e elegância (ANIMA), atingindo assim um produto consistente e equilibrado. Não mencionamos no diagrama um importante tema que também faz jus a um capítulo próprio, os chamados “Complexos”. Foram omitidos aqui também os conceitos de Consciência e In- consciente que aparecem no diagrama, por também merecerem trata- mento em etapa exclusiva. Ok. Agora achamos que você já tem algum conhecimento sobre parte do funcionamento de sua psique, o que te faz preparado para dar os próximos passos. Em linhas gerais, o equilíbrio psíquico estaria na harmonia entre Ego e Self, aproveitando a analogia, entre o usuário e o sistema opera- cional. Para atingirmos essa harmonia precisamos estruturar constante- mente o Ego através do conhecimento do que está escondido em nos- sas Sombras no território inconsciente, aumentando assim o território da Consciência. Quanto mais o usuário conhece o sistema operacional, maior é o aproveitamento do mesmo sobre o smartphone. De forma igual, temos de conviver harmoniosamente no mundo utilizando Personas adequadas, com características importantes e neces- sárias em cada setor de nossas vidas, sem permitir jamais que confunda- mos as Personas com nosso verdadeiro “eu”. Não devemos confundir as apps com o sistema operacional. Muitas vezes quando percebemos que somos mais valorizados pe- los outros quando estamos usando uma determinada Persona, costuma- mos imaginar que somos de fato a Persona, o que pode nos levar a um processo de desequilíbrio e aumento da Sombra, o que nos deixaria cada vez mais longe da autoaceitação, da autorrealização e do autoencontro. É como imaginar que o smartphone fosse feito para uma única aplicação. Na prática é comum estarmos ocultos sob sucessivas camadas de disfarce. Você terá de abrir mão da Persona e revelar-se para si mesmo. A maior parte do tempo estamos preocupados em construir uma Persona que seja aceita e valorizada pelo mundo, nesse processo vamos deixando 43 O POder dO AutOCOnheCimentO de ser quem somos. Nessa aventura que estamos apresentando será ne- cessário viver o desencontro da Persona, perder-se em relação ao mundo em geral, para encontrar o essencial. Nosso verdadeiro “eu” deve ser o reflexo dos verdadeiros desejos do Self, entendendo suas próprias qualidades e defeitos, honesto com seus sentimentos e propósitos. Você é valioso demais para se desperdiçar em busca de ser quem não é. Será necessário entrar em acordo com tudo que foi vivido no pas- sado, tornar-se responsável por sua própria biografia. O Ego precisará aprender a dividir espaço entre a busca externa e interna. Um Ego desestruturado, além de aproximar-se cada vez mais das necessidades primitivas de poder e de posse, fica à mercê do mundo in- consciente, sendo alvo constante dos conflitos e complexos que o levam ao desequilíbrio psíquico. Por outro lado, um Ego estruturado capaz de reconhecer suas defi- ciências e potencialidades, voltado para o trabalho de autoconhecimento e aprimoramento contínuo, é o que almejamos para você. Não existe transformação sem a morte constante do Ego imaturo. Temos de forjar um Ego que seja capaz de tolerar a verdade e lidar com as frustrações. Quem abrir mão das satisfações imediatas do Ego, de viver uma vida egoica, faltamente encontrará o si mesmo. As ilusões do Ego sobrevive- rão somente até o momento que nos conhecermos verdadeiramente. No decorrer dessa caminhada, falaremos mais sobre essas partes que compõem nosso universo psíquico e a cada novo passo novas peças serão juntadas ao seu grande quebra-cabeças. 45 Algo maior pensa em você Agora começamos para valer! Já percebeu que ultimamente tem se falado muito sobre o mundo inconsciente? Os holofotes estão voltados para o mundo cerebral, e isso envol- ve não só os aspectos biológicos, mas também o maravilhoso funcio- namento de nossas mentes. Não temos dúvidas de que uma visão mais próxima a respeito do Consciente e do Inconsciente será muito relevante se pretendemos ajudá-lo em seu processo de autoconhecimento. CONSCIENTE É o território da Consciência. Consciência é toda percepção imediata do que se passa dentro ou fora de cada um de nós. É como se fosse o ato psíquico pelo qual enxergamos nossa presença no mundo. O território onde o administrador é principalmente o Ego de que já falamos anteriormente. Aqui podemos trabalhar conceitos importantes, pois é a área em que percebemos efetivamente nossos pensamentos, utilizamos a força intencional da vontade, consultamos e gerimos nosso sistema de cren- ças e valores, definimos foco e planejamento. Aproveitando a ocasião, podemos fazer algumas sugestões a respeito das integrações possíveis entre Psicanálise e Neurociência, áreas de nosso convívio profissional. Poderíamos dizer que o Cons- ciente é a área onde o Ego faz uso da maquinaria disponível, especial- mente no córtex cerebral, seja nos lobos frontais, parietais, temporais ou occipitais. 46 Renato Lessa PeReiRa Grosso modo, as áreas primárias do córtex cerebral percebem o mundo externo através do mais diversos canais que possuímos, como visual, auditivo e cinestésico, enquantoas áreas secundárias tratam da interpretação dessas informações percebidas. Estudos de diversas áreas como da Psiconeuroimunologia mostram também que o desequilíbrio psíquico afeta nossos corpos e seus sistemas funcionais, tal como o sistema nervoso e endócrino, por isso considera- mos relevante mencionar essas possíveis interações entre mente e cérebro. Já não é de hoje que a própria OMS (Organização Mundial da Saú- de) admite as doenças chamadas psicossomáticas. Acho que não precisamos dizer mais nada, isso justifica muito nos- sa tese de que o ser precisa ser analisado e trabalhado sempre de forma integral. E como fazer isso sem um real esforço de autoconhecimento? Somos e estamos de acordo com o histórico de nossas influências diretas e indiretas de nosso mundo psíquico e ambiental. Através do campo da consciência podemos perceber e até identi- ficar algo que não está bem em nossa dinâmica diária. Podemos prever, precaver e constatar algum desequilíbrio analisando o que flutua no terri- tório consciente. Veremos no decorrer dessa caminhada muitas outras informações que ratificarão a necessidade de analisarmos o ser sob os mais diversos panoramas. A consciência é o que diferencia na prática o “animal homem” dos animais irracionais. Como o próprio nome já diz, racional vem de razão, raciocínio, o que é área integrante do território consciente que é expansí- vel e não tem limites definidos. Aproveitando a analogia que fizemos anteriormente sobre o smar- tphone, o consciente seria tudo que o usuário (Ego) pode ver na tela. INCONSCIENTE Tudo aquilo que não percebemos de forma consciente é território inconsciente. Você sabia que, comprovadamente, tudo, absolutamente tudo que vimos, ouvimos, sentimos ou vivenciamos, ou seja, tudo que foi captado pelos nossos canais primários relacionados aos lobos cerebrais, está ar- quivado em nossa mente? 47 O POder dO AutOCOnheCimentO Obviamente que todo esse conteúdo não poderia permear a cons- ciência, caso contrário seria exaustivo, para não dizer enlouquecedor, vi- vermos e termos de selecionar somente aquilo que importa efetivamente em nosso dia a dia. O fato é que, na verdade, muito pouco de tudo que captamos em nossa história de vida está disponível à consulta consciente, mas não são poucas as pesquisas que mostram que tudo está inserido em nosso banco de dados mental e não há como não especularmos e tentarmos descobrir esse rico material que detém chaves importantes para adentrarmos as portas da autodescoberta. Em outra especialização que pude realizar, em Hipnose Clínica, o mundo do inconsciente se apresentou mais contundentemente para mim. Dentre muitas experiências em atendimentos com o uso da hipno- se, pude constatar e assumir como verdade essa tese do banco de dados absoluto. Não foram poucos os episódios de clientes que estavam em transe hipnótico, onde experimentei o resgate de informações e lembranças que estavam totalmente inacessíveis ao Ego, mas estavam diretamente rela- cionadas ao momento emocional destes. Situações traumáticas, fatos, fotos, sons, cheiros, dentre outras lembranças cinestésicas estão arquivadas nos cantos mais profundos da mente. Por isso Jung brilhantemente definiu que a “Sombra” estava no território da inconsciência. Muitos experimentos foram e ainda são realizados para entender- mos mais essa força colossal que é o inconsciente. Para termos uma ideia mais clara, costuma-se dizer que o consciente é a gota e o inconsciente o oceano, outros mais conservadores, no entanto, dizem que a consciência é apenas a pontinha do iceberg enquanto o inconsciente é todo o resto do iceberg. Enfim, já deu para entender que o inconsciente é muito, mas mui- to maior que o território consciente. Desta maneira, não temos como desprezá-lo em nossa caminhada, tampouco subestimar a força que o inconsciente pode ter em nossas vidas. É importante que tenha essa relevância do inconsciente em sua mente para uma maior compreensão da necessidade de visitarmos esse território utilizando nossa vontade consciente. O Ego possivelmente tentará fugir do desafio por querer proteger- -se do que pode haver nesse grande porão esquecido por você. 48 Renato Lessa PeReiRa Para ficar mais clara a diferença entre consciente e inconsciente, veja esse pequeno quadro comparativo: Consciente Inconsciente Vida de relação, relacionar Cuida da integridade física e psicológica Raciocínio lógico (estratégias) Tem uma lógica própria Fatos bem organizados cronologicamente Atemporal, organiza os fatos por qualidade Compreende linguagem figurada É literal Precisa de descanso Não tem descanso Diferencia realidade da imaginação Não diferencia o real do imaginário Você pode estar se perguntando: “Tá legal, já entendi mais ou menos esse lance do consciente e inconsciente, mas o que isso vai ajudar em meu processo de autodescoberta?”. Para uma jornada consciente e estruturada de autoconhecimento é fundamental ter conhecimento de que “Algo Maior Pensa em Você”. Na analogia que fizemos com o smartphone, o inconsciente é tudo aquilo que não aparece ao usuário (Ego) através da tela, mas que é fundamental para o funcionamento do mesmo. Por agora, queremos que você lembre sempre: “O inconsciente não sabe o que é verdade ou não, quem sabe é o consciente. A linguagem do inconsciente é simbólica e exige bem mais que a linguagem normal que acessa o consciente.” Isso dito, pode ser que faça sentido ver fotos e ouvir músicas an- tigas, revisitar lugares da infância, analisar seus sonhos, enfim, é a sim- bologia que pode ajudá-lo na descoberta de algumas experiências que ficaram esquecidas em seu território inconsciente, e que por conta de sua intensidade psíquica podem causar transtornos emocionais e com- portamentais. Descobrir isso tudo poderá libertá-lo de muitas correntes invisíveis. 49 A Sombra Chegamos até à principal estrela de nossa obra. Apesar de pa- recer contraditório que a Sombra possa brilhar como uma estrela, não poderíamos deixar de aproveitar o trocadilho. É aqui, ou melhor, é nela que mora o maior desafio do autoco- nhecimento para onde estamos caminhando. Não se trata bem do brilho da Sombra, mas da iluminação dela. Também não é um combate com a Sombra. Ela precisa ser diluída através da integração em sua própria realidade pessoal. Essa diluição ocorrerá pela sua capacidade de assimilar o conteúdo sombrio e per- mitir que ele faça parte de sua vida. Tudo aquilo que você conseguir extrair e descobrir na escuridão da Sombra se tornará imediatamente luz. Uma Luz a serviço de sua consciência e que lhe presenteará com a possibilidade de controle, não sendo mais vítima desses conteúdos que pedem reconhecimento, mas que normalmente não ouvimos ou aceitamos. Para ilustrar um pouco mais o início desta etapa, vamos come- çar utilizando um trecho da obra Ao encontro da Sombra, de Robert Bly: “Passamos nossa vida até os 20 anos decidindo quais as partes de nós mesmos que poremos na sacola e passamos o resto da vida tentando retirá-las de lá. Algumas vezes parece impossível recuperá- -las como se a sacola estivesse lacrada.” Jung também costumava dizer isso em outras palavras. Nós passamos praticamente os primeiros 20 anos de nossa vida construin- do a sombra e o restante dela tentando nos livrar da mesma. Fica claro que é muito mais difícil nos livrarmos dela do que construí-la dentro de nós. Você provavelmente não teve essa informa- ção, ou melhor, seus pais não tinham essa informação, e por mais que lhe foi oferecido o melhor que podiam dar, boa parte de sua sombra estará relacionada às vivências familiares, desde sua concepção. 50 Renato Lessa PeReiRa O homem ou a mulher adulta precisa se tornar consciente e en- frentar seus piores medos da infância. Parte de nossa proposta para alcançar o equilíbrio psicológico é a autorrealização, o encontro do si mesmo, tornar-se completo, tornar-se consciente do que está inconsciente, alcançando a harmonia entre Ego eo Self, ou seja, entre o usuário e o sistema operacional que falamos um tempinho atrás na metáfora do smartphone. Por isso, se queremos alcançar o equilíbrio, uma vida mais livre e plena, precisamos destrinchar e entender essa parte sombria que tem espaço importante em nossas mentes. Em primeiro lugar, precisamos desmistificar a interpretação equí- voca que costumeiramente temos a respeito da Sombra. Temos por hábito utilizar e associar a palavra sombra a significa- dos ou analogias ruins. Quantos de nós não utilizamos frases desse tipo: “Esse local é sombrio, dá medo!” ou “Ele é apenas sombra do homem que deveria ser” ou ainda, “Aquele rapaz é só sombra do irmão”. Enfim, imaginamos que a sombra esteja apenas associada à falta de luz, o que poderia abrir um extenso campo filosófico em torno dela. O que é luz é bom, divino. O que é escuridão é ruim, então, sem dúvidas, associamos isso ao medo do desconhecido. Mas o conceito real da Sombra está muito longe destas primeiras associações preconceituosas. Como já dissemos, assim como projetamos uma sombra física, também projetamos uma sombra psíquica. Essa sombra psíquica con- templa tudo aquilo que esquecemos ou não queremos lembrar, tudo que desconhecemos que já vivemos, e tudo que não queremos reconhecer que está dentro de nós. O que temos consciência, ou seja, tudo aquilo que é percebido pelo Ego está à luz, e por isso é conteúdo consciente. O que não é percebido ou admitido pela consciência estaria com ausência de luz, dessa forma na escuridão da psique. O uso da palavra Sombra também faz todo sentido se tivermos conhecimento da tese dicotômica, ou seja, da dualidade que sempre está presente em nossas vidas. Dicotomia é a divisão de um elemento em duas partes, em geral contrárias, como a noite e o dia, o bem e o mal, o preto e o branco, o céu e o inferno etc. 51 O POder dO AutOCOnheCimentO Ficaria mais fácil de entendermos a “Sombra” se tivermos conhe- cimento dos opostos, dos contrários. Tantas e tantas referências poderíamos usar para mais exemplifica- ções, como: Yin e Yang, bonito e feio, forte e fraco, LUZ e ESCURIDÃO (ou SOMBRA), mas paramos por aqui para evitar a monotonia. Agora que já entendemos plenamente o que é a Sombra, temos condições para descobrirmos como ela se formou e como podemos co- meçar a tomar consciência de tudo isso que está guardado aguardando a possibilidade de ser iluminado. A formação da Sombra A construção de nossa sombra é algo que começa desde o início das nossas vidas. Vamos viajar no tempo e retornar ao período onde estávamos com dois ou três anos, onde nosso processo de educação estava começando. Certamente muito do que vivenciamos nessa fase e que não temos cons- ciência iniciou a formação de nossas sombras. Imagine que um menino de três anos, onde o Ego já começou a ter uma pequena estruturação e a criança já percebia a diferença entre ela e os demais, tenha recebido uma educação um tanto radical de que homem não chora ou não mostra afetividade. Tal criança, toda vez que demonstrou um comportamento amável, dócil demais ou expressou suas emoções através das lágrimas, foi dura- mente repreendida. Para sentir-se aceita, amada pelos pais, começou a evitar os com- portamentos mais dóceis e emotivos. Visualize como uma criança de três anos pensaria vivendo uma experiência como essa: “Papai não gosta que eu chore, diz que sou feio quando choro, diz que isso não é coisa de homem… Eu gosto do papai, eu quero que ele goste de mim também”. Bingo, tudo isso foi para a Sombra. Citemos outro exemplo, imaginemos uma pequena garota com seus seis ou sete anos que possui um comportamento irritado, que grita muito, fala muito alto, e sua mãe reage duramente aplicando castigos severos. 52 Renato Lessa PeReiRa Será natural que essa garota passe a reprimir sentimentos, retendo sua ira, sua raiva, especialmente porque esse comportamento gera a desa- provação de sua mãe. Tal garota passa a crescer optando pelo comporta- mento mais dócil, pacato, suave ao extremo. Essa garota tende a ser cada vez mais dócil e “boazinha”, uma vez que detectou o padrão que é e será mais aceita dessa forma, escondendo perigosamente dentro de si partes que também a integram. Bingo nova- mente, sombra ganhando peso. E assim nossas sombras iniciam sua formação, principalmente com os comportamentos que não são tão agradáveis no conceito de nossos pais, ou seja, geralmente as pessoas mais importantes para qualquer criança. Gostaria de aproveitar o exemplo dessa garotinha e falar rapidamen- te sobre uma perigosa tendência que tenho observado nos últimos tempos. Uma vez que somos mais aceitos pelo meio quando usamos nossas Personas (a “máscara” que falamos um tempinho atrás), somos tendencia- dos a acreditar que SOMOS a própria PERSONA, o que está muito longe da realidade. Pomos na Sombra o que rejeitamos em nós, o que rejeitam em nós e o que achamos que os outros rejeitam. A Sombra é como uma estrutura complementar, como uma subper- sonalidade que tem o desejo de fazer ou ser o que a Persona não permite. Temos visto nossas crianças e jovens escolherem e imitarem ídolos padronizados pela mídia, formatados pela ditadura da beleza e do consu- mismo. O próprio ídolo não é efetivamente o que aparenta ser, no entanto, seus admiradores acabam se esforçando para criar uma Persona moldada aos padrões da imagem apresentada pelo ídolo. Quanto mais acreditamos que somos a própria Persona, maior e mais densa se torna a nossa sombra. Maiores serão os conflitos e desafios que deverão ser superados para o encontro do equilíbrio. Estaríamos assim no caminho mais distante possível de nosso real ser, do si mesmo. A Sombra forma-se através dos choques entre coletivi- dade e individualidade. Agora achamos que podemos dizer-lhe uma coisa importante que estávamos esperando a ocasião ideal. Nossa psique busca o equilíbrio mesmo contra nossa vontade, quan- to mais longe estivermos do autoconhecimento e quanto maior for o con- teúdo em nossa sombra, mais experimentaremos severos desequilíbrios, como psicoses, angústias, ansiedades, neuroses e transtornos dos mais va- riados como tentativa de autoajuste. 53 O POder dO AutOCOnheCimentO Todo esse conteúdo abandonado vai sendo armazenado em nossa sombra e em algum momento será necessário retirá-lo de lá. Caso con- trário, não conseguiremos alcançar nossa autorrealização. Você pode dizer agora: “OK! Já entendi que essa tal Sombra é im- portante. Mas como é que vou conseguir conhecê-la?”. Bem, não vamos dizer que é fácil, mesmo porque é uma luta que tem exigido esforço contínuo de todos nós também. Mas acreditamos que poderemos dar uma contribuição valiosa no que tem sido produtivo para nós e para muitos outros que estão na batalha do autoconhecimento. Lembremos que na Sombra está tudo aquilo de que não tenho consciência, ou até conheço, mas não aceito, e que faz parte de mim. A meta é nossa integração total, descortinando o material inconsciente que construímos durante nossa existência. Identificarmos a Sombra é seguirmos o mais verdadeiro e antigo aforismo grego presente na entrada do oráculo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”. 55 Como identificamos a Sombra É preciso reconhecer aquilo que nos incomoda, não arrancá-lo de nós como se isso fosse possível através de um simples passe de mágica. Inicialmente queríamos propor a você, para ficar mais claro e fácil o processo de identificação, ao menos parcial da sombra, a divisão entre duas categorias. Uma será a categoria das coisas que não aceitamos ou não reconhecemos que faz parte de nós, e outra será a categoria das coi- sas que não lembramos nas faixas mais superficiais da consciência. Coisas que não aceitamos Nós vamos vivendo, crescendo, envelhecendo e não raro mante- mos os mesmos padrões de educação que tivemos em nossa formação, editados levemente pelas tendências da época que vivemos. Assim, nós acabamos por acreditar que aquilo que vemos nos ou- tros,tais como comportamentos inadequados, medos e defeitos em geral, não está dentro de nós também. Lembra-se do que falamos sobre dicotomia? Pois bem, a bendita dicotomia está dentro de todos nós. Só sabemos o que é o bem porque sabemos o que é o mal, o que é certo porque sabemos o que é errado, o que é o amor porque sabemos o que é ódio, o que é agradável porque sabemos o que é desagradável, e assim por diante. Como já dito por Jung, se entendermos que o mal habita na natu- reza humana independentemente da nossa vontade e que não pode ser evitado, o mal entra na cena psicológica como o lado oposto e inevitável do bem. Assim, caro amigo, temos de dar uma triste notícia a você, e antes que suspenda a leitura, pedimos que acompanhe as explicações. Estamos certos que vai ajudar muito. 56 Renato Lessa PeReiRa “Você é invejoso e preconceituoso!” Pronto, falamos. Nossa, que peso removemos de nossas costas. Está- vamos segurando isso já por algum tempo. Todos nós já sentimos inveja e já fomos preconceituosos, ou melhor, temos isso dentro de nós. Mas espere, saber que isso está dentro de nós não nos dá o direito de agirmos sob essas bases. Mais adiante veremos mais sobre a inveja como um gigante da alma. Isso mesmo, o desafio aqui é integrar tudo isso, sabermos que todos somos “imperfeitos”, se é que nós sabemos na realidade o que é ser perfeito. Muitos não estão tendo a oportunidade que você está, a sombra de cada um acaba por formar uma sombra coletiva que termina por impor a busca desenfreada pelo poder, alimentando a cobiça, a inveja e o ciúme, aumentando o vazio existencial. Com conhecimento de que somos portadores de todos os defeitos que vemos nos outros, deve mudar muito a forma como agimos e nos por- tamos exatamente à frente desses pares. Acreditem, sejamos corajosos em admitirmos tudo isso a nós mesmos e teremos a recompensa imediata de gozarmos da sublime empatia e tolerância. A capacidade crítica do Ego pode ser muito prejudicada pelo nosso histórico de vida como condições familiares, meio social e educação. No- vos momentos podem ser contaminados pelo velho já conhecido, a raiz do preconceito. Não estamos querendo forçá-lo a acreditar em nada, porém temos a obrigação de alertá-lo que você vai achar sua vida muito mais fácil se simplesmente aceitar você mesmo como é, ao invés de tentar encaixar-se em quaisquer ideias preconcebidas. O mesmo vale para sua aceitação aos demais. Então, mãos à obra e detecte dentro de você todas as mazelas que nosso Ego presunçoso e desestruturado impede que vejamos. Ache onde e quando sente ciúmes, inveja, raiva, ódio, revolta, quando e diante de que circunstâncias deseja o mal a outrem. Mais adiante teremos etapas que se- rão mais focadas a tudo isso que estamos citando aqui. Nesta etapa ainda estamos tentando aprofundar sua preparação para a jornada. Frisamos novamente que não recebemos licença para agirmos de for- ma odiosa por sabermos que também temos ódio dentro de nós, tampouco podemos fazer o mal por termos em determinado momento desejado o mal a alguém. 57 O POder dO AutOCOnheCimentO As pessoas que convivem conosco conseguem identificar nosso lado sombrio com muita clareza, recorde da Janela de Johari onde você já pôde ter pistas a respeito de sua Sombra. Sabemos que é um processo duro, e quase perdemos uma amizade assim. Usamos a sinceridade e dissemos a um amigo: “Você já parou para pensar que você pode estar com inveja dele?”. Imaginem alguém se desfigurando por completo, pois é, foi o que vimos à nossa frente. Mas pelo menos, apesar do constrangimento da- quele momento, identificamos algo mais, além da inveja, que estava na sombra dele. Obviamente só falamos também sobre esse outro “algo mais” posteriormente. Esquecemos que a linguagem é simbólica, uma forma de gerar- mos comunicação e transferência de informações. Inveja é uma palavra apenas, como todos os demais sentimentos ou defeitos inaceitáveis so- cialmente falando. A inveja, bem como o ciúme, está diretamente vinculado ao nosso cérebro instintivo, que teve sua formação, segundo a ciência, a cerca de 200 milhões de anos atrás. Nosso cérebro instintivo traz uma herança, por coincidência uma das maiores contribuições de Jung está relacionada a isso, o inconsciente Coletivo e os Arquétipos. Mas deixemos esses temas para outra ocasião. Afinal, aqui nossa estrela é a Sombra e não vamos tirar os olhos dela. Basta imaginarmos e analisarmos as pesquisas sobre nossos ances- trais mais distantes e perceberemos o padrão territorial e de posse preva- lecendo, bem como a necessidade do destaque no grupo para alcance do status de macho alfa. Por isso, caro amigo, quando sentimos aquela inveja do vizinho que comprou aquele carrão e está com tanquinho ao invés da barriga protuberante, é o nosso cérebro mais primitivo agindo. É uma parte de nós que reclama a dominância do clã. E quando sentimos ciúmes da nossa companheira ou companheiro, que está conversando de forma descontraída com alguém do sexo oposto, é novamente nosso cérebro mais primitivo apresentando-se, reclamando cuidados diante da possibilidade de nossos pares serem conquistados e tomados de nós. Mas cuidado! Isso não significa que tenhamos de agir como nossos ancestrais mais primitivos, afinal de contas estamos falando de nosso cérebro primitivo. 58 Renato Lessa PeReiRa Quando tomamos conhecimento e aceitamos todas as partes que estão dentro de nós, especialmente as que não queremos admitir, nossa força lógica e racional torna-se mais poderosa. Isso mesmo, não esqueça- mos que já temos ao nosso dispor o neocortex, a parte de nosso cérebro que pensa, analisa e raciocina. Apesar desta parte racional ser um pouco mais lenta que a primi- tiva ligada à sobrevivência, quanto maior for o conhecimento e ciência a respeito das partes recalcadas, maior será nosso controle sobre nosso sistema emocional. Esmiuçar, tomar atenção ao que nos incomoda nas outras pessoas e circunstâncias. Reviver e ressignificar o que nos machucou no passado. Coragem! Essa é a dica para identificarmos em nossa Sombra o que não aceitamos ou não admitimos que está dentro de nós. Coisas de que não lembramos Se identificar as coisas que não aceitamos é uma tarefa que exige coragem, identificarmos as coisas de que não lembramos exige paciência e perseverança. Como já falamos vivemos muitas coisas ao longo de nossas vidas, contudo, provavelmente por um sistema de defesa altamente sofisticado em nossa mente, muitas experiências importantes ficaram arquivadas em nosso banco de memórias inacessíveis ao Ego. Jung desenvolveu algumas técnicas para auxílio na interpretação do material inconsciente, dentre elas merecem destaque, em nossa mo- desta opinião, a técnica de análise dos sonhos, a imaginação ativa e ou- tras ferramentas analíticas para detecção de complexos. Complexos, aliás, que também merecem uma breve explicação. Complexos: os complexos são grupos de ideias inconscientes associadas a eventos ou experiências particulares emocionalmente coloridos. Jung os deduziu a partir de seus estudos iniciais de associação de palavras quando observou que determinadas palavras provocam reações inten- sas ou produzem menos reação do que o esperado. Os complexos são construídos em torno de estruturas psíquicas solidamente interligadas conhecidas como arquétipos. 59 O POder dO AutOCOnheCimentO Também veremos mais profundamente esse tema em etapa posterior. Hoje muitas outras técnicas foram criadas e aprimoradas, mas honesta- mente sempre acabamos detectando uma releitura das teorias de Jung. Apesar de não ser uma estratégia completa e definitiva, atrevemo-nos a sugerir algumas possibilidades na busca desse inventário de memórias ina- cessíveis. O primeiro passo é ter paciência e ser perseverante, como dito mais acima, identificar essa parte da sombra é como vasculhar um porão escuro com uma lanterna fraca. Vasculhar o inconsciente nesse nível também exige um trabalho deinterpretação detalhado e de possibilidades. Podemos sugerir que analise seus sonhos. Mas você pode nos dizer: “Eu não sonho”. Outra crença a ser desmistificada. Todos sonhamos. Segundo Jung, o Sonho é um sistema regulador compensatório inerente a nossa vontade. Muitos estudos utilizando equipamentos modernos de alta tecnologia mostraram que todos temos atividades relacionadas ao sonho. Durante nosso período de sono, tratando-se de uma métrica normal, temos entre três e quatro sonhos por noite. Para você que costuma lembrar de seus sonhos, antes mesmo de sair de sua cama, procure anotar com o máximo de detalhes possíveis o conteúdo de seu sonho. Uma dica importante e fundamental: nossos sonhos trazem mensagens utilizando a linguagem do inconsciente, que é simbólica. Dessa forma, as pessoas que você vê em seu sonho não são objetiva- mente elas mesmas e sim projeções simbólicas do que elas representam em seu mundo íntimo. Não daria para tratar sobre análise de sonhos aqui, mas se quiser tirar proveito dessa possibilidade de autoencontro, recomendamos a busca por um profissional psicanalista que trabalha com interpretação de so- nhos e também recomendamos a leitura de um livro chamado Inner Work – A chave do Reino Interior, de Robert A. Johnson. Aproveite o livro indicado também para fazer uso da outra sugestão criada por Jung para interpretação de nosso inconsciente, a Imaginação Ativa. Se você é um dos que não se lembram de seus sonhos, pode utilizar uma técnica que pode parecer estranha, mas de fato funciona. Vamos dividi- -la com você. Levando em conta que se fôssemos comparar hipoteticamente o tama- nho de nosso Ego e o tamanho de nosso inconsciente, poderíamos imaginar que o Ego seria a gota e o inconsciente o oceano, podemos dizer que somos muito maiores e melhores do que percebemos. 60 Renato Lessa PeReiRa Antes de dormir, peça de forma firme, e se possível em voz alta, ao seu inconsciente que permita que você se lembre de seus sonhos. Faça esse teste. Alguns testes foram realizados sobre esse tema, mas gostaríamos de mencionar que certa vez tomamos conhecimento de uma pesquisa que separou dois grupos de pessoas que diziam ter dificuldades em acordar antes do despertador tocar. A conclusão é que quase todas as pessoas que pediram ao inconsciente para acordar antes do despertador após alguns dias começaram a acordar antes do horário programado. Em outro estudo, a um grupo foi ensinada essa técnica de pedir ao inconsciente que permitisse a lembrança do sonho, enquanto ao outro nada foi ensinado. Para resumir, 100% das pessoas do grupo que teve a técnica ensinada recordou pelo menos parcialmente de sonhos no perío- do avaliado. Legal, já falamos de duas possibilidades, os sonhos e a imaginação ativa. Mas e as memórias? Como podemos resgatá-las? Nessa seara temos sugestões também. A primeira delas inclusive nós já passamos a você, a Linha do Tempo desde o seu nascimento. Para maior aproveitamento no que tange à Sombra, foque-se especialmente no período até 20 anos, pode ser um pouco mais ou um pouco menos. O destaque aqui é que consiga se lembrar e anotar ano a ano os fatos que consegue recordar. Não espere que consiga muito êxito logo da primeira vez, a dica é que faça um pouco por dia. Use também a técnica de requisição ao inconsciente citada mais acima quando falamos dos sonhos. Peça ao inconsciente que o ajude a se recordar de fatos desse período de sua vida. Certamente você perceberá que conforme começa a dispensar atenção a esse processo, muitas lem- branças subitamente retornarão à sua mente consciente. Agora, também gostaríamos de sugerir a hipnose. Em um primeiro momento estamos certos que muitos podem ter receio e certo preconcei- to quando o assunto é hipnose. Isso provavelmente ocorre porque sempre tivemos acesso à chamada hipnose de palco, de entretenimento, através dos meios de comunicação. Sugerimos que caso queira acelerar seu processo de autoconheci- mento, busque um profissional com domínio da técnica de hipnose que busca o estado alterado de consciência para auxílio na interpretação do conteúdo inconsciente, acesso às memórias inacessíveis, ressignificação e recontextualização de experiências. 61 O POder dO AutOCOnheCimentO Mas fique tranquilo. Mesmo se não quiser fazer uso de um psica- nalista ou hipnoterapeuta para acelerar o processo, durante toda nossa jornada você vai ter etapas que vão lhe ajudar pouco a pouco a descor- tinar esse conteúdo. Na verdade, identificar as memórias inacessíveis que estão pre- sentes na sombra não é tarefa das mais simples. Exigirá boa vontade e dedicação, que indubitavelmente serão recompensados por um Ego mais estruturado e uma vida psíquica equilibrada. Uma dica que achamos relevante para esse início de processo é vasculhar fotos antigas e conversar com pais, irmãos, avós e amigos de infância a respeito de experiências vividas em seu passado infantojuve- nil. Reler diários e revisitar locais do passado também costumam ativar essas memórias antigas. A atividade neural no resgate dessas memórias ocorre como em um efeito dominó. Basta iniciar a busca que vai ficando cada vez mais fácil desenterrar os retratos de sua história. Aprofundando a identificação de sua Sombra Muito bem. Agora podemos aprofundar um pouco mais e através de algumas sugestões você começará a tatear esse solo ainda desconhe- cido. Primeiro vamos fornecer seis formas de identificação da Sombra propostas pela psicanalista inglesa Molly Tuby (na obra Ao Encontro da Sombra: o potencial oculto do lado escuro da natureza humana. 8.ª ed. São Paulo: Cultrix, 2011, p. 17-18). São elas: • Nos nossos sentimentos exagerados em relação aos outros (“Eu simplesmente não acredito que ele tenha feito isso!”, “Não consigo entender como ela é capaz de usar uma roupa dessa!”); ○ Quais são os seus sentimentos exagerados em relação aos outros? Por que você acha que isso acontece? Você con- segue admitir que talvez tenha também o desejo de ter o mesmo comportamento mas não tem coragem? 62 Renato Lessa PeReiRa • No feedback negativo que recebemos daqueles que nos servem de espelhos (“Já é a terceira vez que você chega tarde sem me avisar.”) ○ Você tem ouvido esses feedbacks negativos de alguém? Quais são eles? Por que você acha que tem agido assim? O que te impede de ajustar esses comportamentos? • Nas interações em que continuamente exercemos o mesmo efeito perturbador sobre diversas pessoas diferentes (“Eu e o Sam acha- mos que você não está sendo honesto com a gente.”) ○ Tem recebido a mesma crítica de pessoas diferentes? Quais são essas críticas? Por que você acha que as pessoas estão perce- bendo isso? Você costuma criticar esse mesmo comportamento em outras pessoas? • Nos nossos atos impulsivos e não intencionais (“Puxa, desculpe, eu não quis dizer isso!”) ○ Quais são esses atos impulsivos e não intencionais que têm lhe feito de refém? Qual é a sensação que antecede imediatamente essa impulsividade? Como você reage diante da impulsividade dos outros? • Nas situações em que somos humilhados (“Estou tão envergonha- da com o jeito que ele me trata”) ○ Tem se sentido humilhado? Quando é que se sente humilhado? Sente-se humilhado apenas por alguém e diante das mesmas situações? Já humilhou ou teve vontade de humilhar alguém? • Na nossa raiva exagerada em relação aos erros alheios (“Ela sim- plesmente não consegue fazer seu trabalho em tempo!”, “Cara, mas ele perdeu totalmente o controle do peso!”) ○ Em que situações você sente muita raiva? Quais são os erros alheios que considera intoleráveis? Você já fez ou acha que é capaz de cometer os mesmos erros? 63 O POder dO AutOCOnheCimentO Para complementar, queremos fornecer a você as brilhantes suges- tões de Connie Zweig e Steve Wolf (na obra O jogo das sombras: ilumi- nando o lado escuro da alma, Rocco: Rio de Janeiro, 1997, p. 55-57) de como procurarmos a Sombra: • Em nossas vergonhas secretas ○ Do que você temvergonha? O que você não tem coragem de fazer abertamente, mas faria se não houvesse julgamentos? Sente inveja ou critica quando alguém faz o que você tem vergonha de fazer? • Em nossas projeções ○ Quais são os comportamentos dos outros que mais te inco- modam? Existe alguma crença pessoal que lhe impeça de aceitar esse mesmo comportamento em você? • Em nossos vícios ○ Quais são os seus vícios e comportamentos compulsivos que tentam amortecer sentimentos ou preencher algo que lhe falta interiormente? • Em nossos atos falhos ○ Costuma falar frases infelizes? Já disse frases ou afirmações impensadas? Que parte sua não aceita pode estar por trás disso? • No nosso humor ○ Costuma fazer piadas cruéis à custa dos sentimentos alheios? Costuma achar graça de comentários feitos fora do momen- to apropriado ou dos erros cometidos por outras pessoas? Se sim, por que você acha que isso acontece? 64 Renato Lessa PeReiRa • Nos nossos sintomas físicos ○ Em que situações você percebe que seu corpo não condiz com o que está tentando mostrar aos outros? Em que situa- ções sente taquicardia ou tremores? • Na crise da meia idade ○ Caso seja o seu caso, tem a sensação de que sua energia está acabando e sente vontade de fugir do mundo? Você já tem noção daquilo que foi negligenciado ou ignorado até esse momento de sua vida? • Nos nossos sonhos (aqui estão eles novamente) ○ Tem sonhos recorrentes? Costuma sonhar com as mesmas pessoas? Quais são os maiores medos que sente em seus sonhos? Tem muitos sonhos sexuais? • Nos nossos trabalhos criativos ○ O que costuma desenhar? Possui alguma atividade artística frequente? Que tipo de arte costuma projetar? Consegue perceber um padrão de cenas e exposição em seus desenhos ou material criativo? E antes de finalizar, uma contribuição própria que gostaríamos de adicionar especialmente nos dias de hoje: • As redes sociais Seria displicente de nossa parte não aproveitar essa fonte riquíssi- ma que o mundo moderno está nos proporcionando, especialmente em um trabalho que foca suas energias no autoconhecimento. As redes so- ciais e seus braços secundários refletem claramente o que se passa em tempo real em uma sociedade. Diríamos que é possível fazermos análi- ses bem assertivas sobre os parâmetros que conduzem uma cultura e/ou 65 O POder dO AutOCOnheCimentO sociedade através dos conteúdos que circulam nas redes sociais. Como nossa proposta é pessoal, nosso desejo é contribuir em sua jornada exaltando o rico material que pode aproveitar observando como é a sua própria interação com esses universos digitais. Você ficaria surpreso com a variedade e profundidade de informações que pode obter sobre você caso dedique um tempo no estudo desse material. É possível detectar pontos muito importantes sobre seu mundo interior não conhecido e/ou não aceito. Carências, personas, crenças e desejos são só uma amostra do que poderá encontrar. Um pouco mais adiante serão apre- sentados os Gigantes da Alma e os Mecanismos de Defesa do Ego – lembre- -se especialmente deste item quando lá estiver porque as redes sociais serão solo fértil para detectá-los. Com um olhar mais honesto e desejoso para identificar o conteúdo que traz em sua sombra, estamos confiantes que poderá descobrir muito so- bre você mesmo, ou melhor, sobre seu “eu” real. ○ Observe o que você curte! Costuma curtir e/ou compartilhar frases de desabafo no sentido de exaltar-se ou de atingir ou- tras pessoas? Consegue perceber o que pode realmente estar por trás disso? Que tipo de pessoas ou páginas você segue? Por que as segue? Sente a necessidade de uma superexposição publicando continuamente momentos de seu cotidiano? Por quê? A imagem que você tenta apresentar nas redes sociais reflete a pessoa que você costuma enxergar no espelho? Sente- -se forçado a curtir postagens por razões adversas, tais como reciprocidade ou educação, mesmo sem vontade? Consegue perceber se sente inveja de coisas publicadas por outras pesso- as? Mesmo assim curte? Curte ou compartilha conteúdos nas redes sociais que não se sente à vontade em assumir ou jamais mostraria em seus grupos de convívio? Como se sente durante e após sua navegação pelas redes sociais? Sente-se triste, irri- tado ou angustiado? Sabe dizer por quê? Na empreita de identificação da Sombra você precisa estar firme para não se deixar deprimir, abandonar tudo e se vender à sua própria inferio- ridade. Aproveite essa maravilhosa possibilidade para crescer para dentro, desenvolvendo virtudes como o amor e a humildade. 67 Estágios de relacionamento com a Sombra Nesta parte cometemos um atrevimento, mas em nossa defesa não temos a presunção de esgotar as possibilidades desse tema tão impres- sionante. Honestamente, talvez isso não seja possível, mas achamos que existe uma divisão coerente que de forma resumida pode segmentar as fases de relacionamento com a sombra. Seria ótimo que o autodescobrimento independesse de nossa som- bra, mas infelizmente trazer nossa sombra à luz é fundamental. Quem de nós atreve-se a perguntar a si mesmo a respeito das ques- tões que normalmente não ousa pensar? Subitamente nos recorre um ou outro pensamento indesejado e rapidamente nos esquivamos, procrasti- nando o debate interno a respeito da origem desses pensamentos. Já vimos que a tarefa de descortinar esse poderoso arquétipo (A Sombra) é longe de ser fácil, especialmente porque a sombra atinge di- retamente o Ego. Trabalhar a sombra exige de nós um esforço que nem sempre estamos dispostos a fazer. Veja esse pensamento de Jung: “A sombra é problema moral que desafia a personalidade como um todo, pois ninguém é capaz de tomar consciência dela sem esforço mo- ral considerável. Tornar-se consciente da sombra implica reconhecer os aspectos obscuros da personalidade como existem na realidade.” O Ego é o veículo para o descobrimento e relacionamento com a Sombra. Estranhamente, se nos dispusermos a uma rotina meditativa, mesmo que neguemos, saberemos que precisamos fazer isso. Sendo a Sombra um conteúdo oposto ao que a Persona mostra ao mundo externo, para nos relacionarmos com ela, como já falamos ante- riormente, teremos a exigência inegociável de abrirmos mão da Persona. 68 Renato Lessa PeReiRa A imagem que temos de nós mesmos precisa ser desfeita. Sem o relacionamento com nossa Sombra, estamos distantes de saber a dimen- são e a potencialidade desse outro “Eu” que existe dentro de nós. O caminho é analisarmo-nos sem julgamento e sem culpa, com a disposição sincera de revelar a nós mesmos como somos verdadeiramen- te despojados de nossas armaduras egoicas. Após alguns estudos, vamos propor quatro estágios na jornada de relacionamento com a Sombra, ao ultrapassar cada uma das etapas que proporemos durante toda a obra, analise em qual fase acredita que está e quanto ainda falta até atingir o 4.º estágio em cada contexto de sua vida. 1.º estágio – Ela permanece inconsciente, fazendo escolhas por nós. Nesse estágio fazemos de conta que ela não existe. Assim, ela fará uma avalanche de escolhas para nós. Não raro, somos tomados por uma emoção que nos descontrola em algum momento ou contexto. Jung chamou isso de complexos. É uma forma da manifestação da sombra. Quando estamos nesse estágio, sofremos repetições de padrões in- desejáveis de relacionamentos afetivos, no trabalho, com amigos e assim por diante. Quanto maior for a tentativa da consciência em forçar anulação, maior será a reação da personalidade sombria. O desconhecido que trazemos dentro de nós nos leva ao fanatismo, ao extremismo. Para ilustrar vamos lançar mão de um exemplo. Uma mulher na altura de seus 25 anos já não suportava mais fazer novas amizades. Após uma análise de suas últimas relações amigáveis foi percebi- do um padrão de comportamento dessa mulher. Ela apegava-se demasiadamente à nova amizade, sugando literal- mente o tempo e energia de cada nova amiga, ligando a todo o mo- mento, contando suas experiênciasrotineiras e pedindo posições a respeito. Obviamente, as pessoas acabam se afastando, gerando nesta mu- lher uma sensação de traição e abandono. Nessa fase somos reféns da sombra, buscando e escolhendo parceiros afetivos que possuem um padrão de conduta que criticamos veementemente. Geralmente nos programas de autoconhecimento, esse primeiro estágio é predominante. 69 O POder dO AutOCOnheCimentO 2.º estágio – A projetamos nos outros e repudiamos neles o que é intolerável tão perto de nós. Frase de Freud: “Quanto mais João fala de Pedro, mas de João eu conheço.” É o estágio do conteúdo que não suportamos e vemos no outro. Vemos isso no mundo todo, na história das guerras, intolerância religiosa etc. Criticamos as pessoas, defeitos e os comportamentos que nos in- comodam. Esse incômodo ocorre principalmente porque não acei- tamos essas características dentro de nós. Faz-se sugestivo que perguntemos a nós mesmos: “Onde reside em nós o corrupto que nos gera sentimentos de fúria? Ou o crimi- noso alvo de nossa impiedade.” Eu vejo no outro o que me pertence, por mais incômodo que isso pareça. Em toda oportunidade onde fazemos suposições estamos na verdade falando de nós mesmos, esse conteúdo é nosso e não dos outros. Veremos futuramente a respeito dos mecanismos de defesa do Ego, um deles é a projeção. Tomando conhecimento dessa parte, não adiantará repudiá-la. É importante acolhê-la, aceitá-la sem culpa e julgamento. 3.º estágio – Nós nos identificamos com ela e a vivemos, não sendo capazes de uma autocrítica. Não é porque estamos assim que temos de permanecer assim. Mui- tas vezes percebemos que usamos expressões como: “Sou uma pessoa orgulhosa, eu sou assim mesmo”. Desta forma acabamos ficando com a Sombra, invertendo os opos- tos, ao invés de lidarmos com ela de forma racional. Justificamos a Sombra. Se alguém nos critica e até sabemos que estamos errados, justificamos e criamos desculpas das mais diver- sas para o comportamento. Isso é identificar-se com a sombra, tão prejudicial quanto identifi- car-se com a Persona. Quando nos rotulamos com características 70 Renato Lessa PeReiRa que estão na Sombra ficamos equivocadamente isentos da autocrí- tica, não nos melhorando, ou melhor, não trazendo a Sombra à luz. O fato de conhecermos nossa Sombra não está relacionado com a permissão de que ela se expresse através de nós. Ficamos cegos para detalhes no início que se tornam grandes demais adiante. 4.º estágio – Admitimos que aquilo que não nos deixa confortáveis é, apesar de tudo, nosso, então crescemos em nossa capacidade de trabalhar com as essas energias e assimilá-las de forma consciente. Esse é o estágio mais desejável sob nosso ponto de vista e onde pre- tendemos que você esteja ao final dessa aventura literária. O momento que conseguimos sintetizar os primeiros três estágios reconhecendo que passamos por eles. Obviamente ainda ficamos incomodados com nossos opostos que estavam escondidos, mas conseguimos canalizar energia para res- significarmos todas essas características. É no enfrentar da Sombra que venceremos as nossas tentações. É a fase do amadurecimento, o momento que já começamos a vis- lumbrar nosso autoconhecimento de forma mais consistente e liber- tador. Muito bem, como dissemos não podemos dizer que não caibam mais formas e etapas de nos relacionarmos com a Sombra além das descri- tas nos quatro estágios apresentados. Além disso, não se trata de um processo exato porque em alguns momentos acreditamos estar no 4.º estágio e não tarda para perceber que ainda transitamos pelos demais estágios em determinados contextos. O importante é detectarmos esses estágios em nossa vivência diária de forma honesta. Queremos juntar as partes Torcemos para que nesse momento você já tenha clareza sobre a importância e profundidade que acompanham esse tema junguiano. 71 O POder dO AutOCOnheCimentO É hora de ratificarmos que nossa proposta final é juntarmos as par- tes. Isso mesmo, nossa missão é integrarmos os seus opostos. Você terá de buscar contato e conversar com cada parte sua encontrada, revendo suas escolhas. Depois de sabermos o que é a sombra, de aprendermos a identificá- -la e de nos relacionarmos com ela nos diferentes estágios, a partir daqui, a cada nova etapa nossa meta será a união contínua de todas as suas partes. Esteja ciente de que o objetivo é juntarmos seus opostos criando uma terceira via, a via do equilíbrio. Tudo em excesso precisa ser avaliado e trabalhado. Nem bom demais, nem ruim demais, nem espaçoso demais, nem isolado demais. Percebemos que somos vítimas de nossa incapacidade de autoava- liação. Jung dizia que para conquistar a sombra precisamos de três qualida- des fundamentais: • Coragem, porque machuca ver que não somos o que aparentamos ser aos outros. • Persistência, porque é um caminho inconstante de ir e vir. Muitas vezes achamos que já estamos livres do indesejado e nos vemos novamente fazendo o que achávamos que tínhamos extirpado de nós. Isso exige persistência e perseverança para que não desistamos diante da frustração. • Humildade, porque sem humildade o Ego ganha todo o espaço, nos impedindo a autoconquista. Tudo isso você já sabia desde que falamos de sua preparação para esse desafio, mas não custava repetir. Em uma óptica mais madura, percebemos também que existe algo de muito positivo no oposto indesejável. É justamente por sua existência que podemos encontrar o almejado equilíbrio e ajustar nossos compor- tamentos. Enquanto as nossas inquietações mais profundas e origem de auto- destruição não forem tratadas, seremos reféns dos processos avassalado- res de baixa autoestima e desvalorização. 72 Renato Lessa PeReiRa As pessoas que somos de verdade estão em nossas sombras. E mais, não vamos nos esquecer de que é na sombra que reside o ser divino dentro de nós, o que Jung chamava de imago dei, o Self. Não se esqueça que precisamos acolher todas as nossas partes, todas precisam ser ouvidas. Não se trata apenas de revelarmos, mas de transformarmos tudo que existe em nós. Tomarmos posse das forças opostas e transmutá-las em uma nova possibilidade. Avalizando essa conclusão, veja o que Jung diz em Mysterium Coniunctionis: “Esse processo de entrarmos em acordo com o outro em nós é bem compensador, porque neste caminho nós conhecemos as- pectos de nossa natureza que não permitiríamos que ninguém nos apontasse e que nós nunca teríamos admitido.” Nestas linhas finais desta pequena contribuição a respeito da Sombra, deixamos uma profunda reflexão extraída do livro Aion, também de autoria de Jung: “Cristo tomou nossos pecados sobre si mesmo. Ele nos mos- trou o caminho. Precisamos agora carregar nossa própria cruz. Isso significa que precisamos beber da taça amarga de nossas imperfeições até à última gota. Precisamos aceitar e encarar nossas faltas, por menores que sejam quando compa- radas com as do nosso próximo. Não é suficiente reconhecer intelectualmente que temos fra- quezas. Para que a transformação psíquica ocorra, nossos próprios ossos precisam sentir remorso; nossas faltas se tor- nam então ‘problema moral que desafia toda a personalidade- -ego’.” E antes de seguirmos para as próximas etapas, por excesso de zelo achamos produtivo contar a você essa pequena história que fize- mos uso também na obra Formando Seres Integrais, veja: 73 O POder dO AutOCOnheCimentO É a história de um neto e de seu avô. Para resumir esse conto, tudo trata sobre uma relação muito amorosa e divertida que um neto tinha com seu avô. O avô era um homem muito divertido, afetuoso, sempre sorridente, brincalhão e feliz. Contudo, subitamente passou a ficar calado, impaciente e entristecido. Então, o neto não sabendo o porquê dessa mudança na forma de ser de seu avô, tomou coragem e foi perguntar ao avô: “Vô, por que tem estado tão quieto e triste nesses últimos tempos?” O avô ficou surpreso e um tanto desconfortável, respirou profundamente, começou a coçar seu próprio queixoe pôs-se em estado pensativo. Passaram-se alguns minutos e o velho senhor começou a gargalhar. Seu neto, sem entender muito bem o que esta- va acontecendo, manteve-se à frente de seu estimado avô, e então recebeu a seguinte resposta: “Sabe, meu neto, está acontecendo dentro de mim uma verdadeira batalha entre dois lobos. Um dos lobos é preguiçoso, agressivo, impaciente, invejo- so, ciumento, teimoso, raivoso, violento e egoísta, o outro é animado, afetuo- so, paciente, inspirado, seguro, perseverante, calmo, carinhoso e caridoso.” O neto, espantado, então perguntou: “Mas e então, vovô, qual dos lobos vai vencer?” Sorridente e já se levantando de sua cadeira, respondeu o avô: “Vai vencer aquele lobo que eu alimentar!” Quanto maior for o seu conhecimento a respeito das partes dentro de você, sejam elas consideradas boas ou más, maior será o seu controle sobre seu sistema emocional. Desta forma, seu futuro psicológico equilibrado será uma realidade. Vamos lembrar do exemplo bíblico do apóstolo Paulo que alcançou sua integridade ao tomar conhecimento que fazia o mal que não queria e não fazia o bem que queria fazer. Para diluir a Sombra você terá de treinar o autoperdão e o autoamor. Você precisa amar suas partes perversas e rejeitadas, descobrindo a quantidade de caridade que é capaz de oferecer diante de suas próprias fra- quezas. Sabemos que é preciso disciplina para resistir e superar os desejos e impulsos dos sentimentos ruins, ser forte o bastante para suportar a pressão de um impulso. Sentir o peso da frustração ou da dor de não atender um de- sejo é difícil e um tanto doloroso. Mas esse é o caminho para administrar a Sombra. 74 Renato Lessa PeReiRa Lembre-se que cada pergunta e tarefa que propomos nessa obra está sempre fundamentada e motivada a arrancar conteúdos de sua Som- bra, portanto não esquive-se de aproveitar cada uma delas. Medite acerca da diferença entre reprimir e controlar. O maior erro é a repressão da Sombra. A modificação ou a supres- são de comportamentos indesejados diversos sem análise e aceitação sin- cera não o tornará melhor. Teremos de viver o encontro com essa Sombra e controlá-la sem sermos esmagados por ela, pelo contrário, se formos capazes de confrontá-la poderemos escolher quando, onde e como per- mitiremos sua expressão em um cenário construtivo. Segundo Winckel, todo mal que reprimimos dentro de nós con- tinua tentando permanecer sempre mal com uma tendência de piorar. Descubra o mal que reside em você e torne-o seu maior aliado. 75 Somos todos complexos Entender nossa complexidade é um dos grandes desafios na jor- nada de autoconhecimento. Costumamos ouvir com frequência que a vida é complexa, mas será que entendemos de fato o que isso significa? Será que percebe- mos que o choque dos complexos que possuímos dentro de nós com os complexos dos demais é o que torna tudo tão abstrato e subjetivo nas relações humanas? “Essa mulher é complexada!” ou “Esse rapaz é doente, está cheio de complexos”. Frases como essas são muito comuns de ouvirmos, não é ver- dade? Mas, e se disséssemos a você que todos nós somos complexa- dos? Você ficaria ofendido? Antes que seja tentado pelo seu Ego a abandonar a leitura por- que se sentiu ofendido, precisamos explicar a você o que são os com- plexos, como eles interferem em nossas vidas e porque devemos estar muito atentos a eles nesta tarefa de autodescobrimento. Para tornar essa etapa mais leve e dinâmica, queremos que você agora imagine em sua mente diversos balões espalhados de forma aleatória e desorganizados. Pois bem, agora imagine que cada balão corresponde a persona- gens e experiências importantes em sua vida. Os complexos seriam esses balões, que conforme as experiên- cias se tornam mais cheios que os demais, e se o Ego não estiver de olho nesses balões pode ser invadido por uns ou outros complexos cada vez que alguma nova vivência precisar acessar o balão corres- pondente. Não seria possível dizer exatamente quantos são os balões que cada um de nós possui na mente, mas podemos assegurar que são muitos, mas muitos mesmo. 76 Renato Lessa PeReiRa Toda vivência e experiência que temos desde a vivência fetal já começa a encontrar seu próprio balão e assim vai se inflando a cada novo ato ou fato que experimentamos. Para dentro de cada balão vão emoções, sensações, memórias e daí por diante. Um complexo constitui-se basicamente a partir das relações in- terpessoais da história infantil. Os complexos não são estáticos e não param de crescer em de- terminada fase da vida, na verdade parece que os mesmos são flexí- veis e alteram-se conforme novas experiências são vividas. Fora isso, é importante que tenha conhecimento que muitas das experiências que vivemos podem inflar mais de um balão simultane- amente, o que torna determinados fatos mais intensos e significativos que outros. Isso explica porque algumas coisas parecem ter muita importância emocional para uns enquanto para outros nem tanto. Mesmo não sendo possível elencar todos os balões, ou melhor, complexos que possuímos dentro de nós, é possível elencarmos al- guns dos mais importantes que fazem parte do nosso mundo interior e que merecem maior explicação. Como esses complexos estão entre os principais, ou seja, im- pactam significativamente nossa forma de agir e sentir, fica fácil en- tender porque é tão necessária uma noção maior a respeito dos mes- mos nesse processo. OS COMPLEXOS CAPITAIS Complexo materno Cremos que não precisamos dizer que o complexo materno está diretamente ligado às mães. Tudo e todos os momentos que vivemos de forma direta ou indireta que estiverem relacionados com nossas mães estarão nesse balão. Quanto maior a influência materna nas ex- periências da criança, maior e mais ativo será o complexo materno na mesma. E não apenas as experiências que tivemos com as nossas mães vão para dentro desse balão, todas as ocorrências que presenciarmos onde a imagem da mãe é relevante irão também para esse balão. 77 O POder dO AutOCOnheCimentO Não para por aí, a menina quando se torna mãe acaba de certa forma inflando mais esse balão (Complexo Materno) com as novas expe- riências que terá sendo a genitora e protetora de um novo ser. Perceba que não temos como nos conhecer ou nos entender se não vasculharmos o que temos dentro destes balões. Muitas das respostas que necessitamos estarão dentro deles. Você precisa agora buscar em seu mundo interior tudo que pode estar relacionado a este complexo. Mas como fazer isso? Bom, para facilitar, queremos propor alguns desafios e perguntas que serão úteis nesse processo: 1. Quais são as maiores qualidades de sua mãe? 2. Quais são os maiores defeitos de sua mãe? 3. O que você mais admira em sua mãe? 4. Quais são as características de sua mãe que mais irritam você? 5. Elenque as experiências mais felizes que estejam diretamente vinculadas à sua mãe. 6. Elenque as experiências mais tristes e traumáticas que estejam diretamente vinculadas à sua mãe. 7. Qual é o seu maior ou maiores ressentimentos vinculados com sua mãe? 8. Qual é o seu maior ou maiores medos vinculados com sua mãe? 9. Tem irmão(s)? Acha que sua mãe tinha preferência por ele(s)? Ainda no convívio com seus irmãos, sentiu-se privilegiado ou rejeitado por sua mãe em algum momento? 10. Culpa sua mãe por algo? 11. Sente-se julgado ou monitorado por sua mãe? 12. Tem o desejo constante de atender às expectativas de sua mãe? 13. Sente necessidade de obter a atenção ou valorização de sua mãe? Por quê? 14. Caso você já tenha filho(s), sente ciúmes ou compara a forma como ela agia com você e como age com seu(s) filhos(s)? 15. No que você parece com sua mãe? 16. Quais são as maiores diferenças entre você e sua mãe? 17. Se você fosse sua mãe, o que você mudaria ou evitaria em seu processo de educação? 18. Sente gratidão pelo que sua mãe fez ou faz por você? 78 Renato Lessa PeReiRa 19. Sente vontade de conviver mais ou menos com sua mãe? 20. De 0 a 10,que nota você daria para sua mãe? 21. Você sabe como sua mãe foi criada? Conhece os maiores me- dos e traumas de sua mãe? 22. Consegue falar abertamente e de forma equilibrada com sua mãe sempre e em qualquer circunstância ou tema? Se não, em quais situações você não consegue ser franco e perde sua cal- ma interior? 23. Se sua mãe tivesse 24 horas de vida, o que você diria a ela? 24. Consegue perceber algum padrão na forma como sua mãe foi criada e como ela criou você? 25. Admira mais a mãe de outra pessoa que a sua própria mãe? Por quê? 26. Caso seja casado(a), tem ou teve bom relacionamento com sua sogra? 27. Conviveu ou convive com suas avós? Se sim, do que mais se lembra a respeito delas? O que admira ou não gosta nelas? 28. Gosta da forma como sua mãe se relaciona com seus avós? 29. Costuma ficar emocionado em filmes ou livros que tratam sobre relações entre mães e filhos? Essas emoções são mais fortes quando o tema é vinculado à morte, abandono, culpa, reconhecimento ou não valorização? 30. Sente que sua mãe admira você? 31. O que você faz para viver, sua profissão, quanto você acha que tem de influência de sua mãe? 32. Você se lembra de alguma situação onde sua mãe desejou que algo de ruim acontecesse a você sob o pretexto de aprendiza- do? 33. Se casado(a), gosta da forma como sua esposa(marido) se rela- ciona com sua sogra? E com a sua mãe? 34. Quando conhece alguém com características parecidas com sua mãe, como você costuma reagir? Você gosta? Sente-se bem? Sabe dizer por quê? 35. Percebe-se replicando algum hábito que era ou é realizado por sua mãe? 36. Caso tenha filho(s), quais são os comportamentos que você tem com ele(s) e que sua mãe tinha ou tem com você? Em que circunstâncias isso mais incomoda você? 79 O POder dO AutOCOnheCimentO 37. Onde sua mãe errou com você? Onde ela acertou? 38. E onde você errou com sua mãe? Onde você acertou? 39. O que você faz só para agradar sua mãe? 40. Consegue ser você mesmo na presença de sua mãe? Nessas perguntas e desafios, tenha em mente que estamos tratando da mãe que está dentro de você. Também é preciso que esteja aberto a entender que pode ser que seu complexo materno não esteja vinculado apenas à sua mãe, mas também a outra pessoa que exerceu ou exerce as funções consideradas maternas, esteja viva ou não. É comum algumas pessoas terem mais convivência com suas avós do que com suas genitoras, neste caso considere ambas em suas respos- tas. Caso uma ou outra questão não seja válida à sua história de vida, apenas desconsidere. Complexo paterno Se o complexo materno está ligado às mães, obviamente, o Com- plexo Paterno está ligado aos nossos pais e/ou figuras paternas de nossas vidas. A regra é a mesma, tudo e todos os momentos que vivemos de forma direta ou indireta que estiverem relacionados com nossos pais es- tarão nesse balão. Quanto maior a influência paterna nas experiências da criança, maior e mais ativo será o complexo paterno na mesma. No caso dos meninos, quando se tornam pais, esse balão também passa a ser inflado com as experiências de ser o genitor e/ou responsável pelo ser. É interessante a flexibilidade desses balões, as vivências que o pai passará a acompanhar ao lado de sua esposa, agora mãe, também irão de alguma forma compor o balão do Complexo Materno dentro de seu mundo mental, e vice-versa. Vamos vasculhar esse complexo dentro de você? Mantendo a mes- ma lógica proposta no complexo materno, seguem as questões: 1. Quais são as maiores qualidades de seu pai? 2. Quais são os maiores defeitos de seu pai? 3. O que você mais admira em seu pai? 80 Renato Lessa PeReiRa 4. Quais são as características de seu pai que mais irritam você? 5. Elenque as experiências mais felizes que estejam diretamente vinculadas ao seu pai. 6. Elenque as experiências mais tristes e traumáticas que estejam diretamente vinculadas ao seu pai. 7. Qual é o seu maior ou maiores ressentimentos vinculados com seu pai? 8. Qual é o seu maior ou maiores medos vinculados com seu pai? 9. Tem irmão(s)? Acha que seu pai tinha preferência por ele(s)? Ainda no convívio com seus irmãos, sentiu-se privilegiado ou rejeitado por seu pai em algum momento? 10. Caso tenha irmão(s), quais são as características que mais ad- mira e mais detesta nele(s)? Por quê? 11. Culpa seu pai por algo? 12. Sente-se julgado ou monitorado por seu pai? 13. Tem o desejo constante de atender às expectativas de seu pai? 14. Sente necessidade de obter a atenção ou valorização de seu pai? Por quê? 15. Caso você já tenha filho(s), sente ciúmes ou compara a forma como ele agia com você e como age com seu(s) filhos(s)? 16. No que você parece com seu pai? 17. O que você faz para viver, sua profissão, quanto você acha que tem de influência de seu pai? 18. Quais são as maiores diferenças entre você e seu pai? 19. Se você fosse seu pai, o que você mudaria ou evitaria em seu processo de educação? 20. Sente gratidão pelo que seu pai fez ou faz por você? 21. Sente vontade de conviver mais ou menos com seu pai? 22. De 0 a 10, que nota você daria para seu pai? 23. Você sabe como seu pai foi criado? Conhece os maiores medos e traumas de seu pai? 24. Consegue perceber algum padrão na forma como seu pai foi criado e como ele criou você? 25. Consegue falar abertamente e de forma equilibrada com seu pai sempre e em qualquer circunstância ou tema? Se não, em quais situações você não consegue ser franco e perde sua cal- ma interior? Sabe por quê? 26. Se seu pai tivesse 24 horas de vida, o que você diria a ele? 81 O POder dO AutOCOnheCimentO 27. Admira mais o pai de outra pessoa que o seu próprio pai? Por quê? 28. Caso seja casado(a), tem ou teve bom relacionamento com seu sogro? 29. Conviveu ou convive com seu(s) avô(s)? Se sim, do que mais se lembra a respeito deles? O que admira ou não gosta neles? 30. Gosta da forma como seu pai se relaciona com seus avós? 31. Costuma ficar emocionado em filmes ou livros que tratam sobre relações entre pais e filhos? Essas emoções são mais fortes quando o tema é vinculado à morte, abandono, culpa, reconhecimento ou não valorização? 32. Sente que seu pai admira você? 33. Você se lembra de alguma situação onde seu pai desejou que algo de ruim acontecesse a você sob o pretexto de aprendizado? 34. Se casado(a), gosta da forma como sua esposa(marido) se relacio- na com seu sogro? E com o seu pai? 35. Quando conhece alguém com características parecidas com seu pai, como você costuma reagir? Você gosta? Sente-se bem? Sabe dizer por quê? 36. Percebe-se replicando algum hábito que era ou é realizado por seu pai? 37. Caso tenha filho(s), quais são os comportamentos que você tem com ele(s) e que seu pai tinha ou tem com você? Em que circuns- tâncias isso mais incomoda você? 38. Onde seu pai errou com você? Onde ele acertou? 39. E onde você errou com seu pai? Onde você acertou? 40. O que você faz só para agradar seu pai? 41. Consegue ser você mesmo na presença de seu pai? Nessas perguntas e desafios, tenha em mente que estamos tratando do pai que está dentro de você. Também é preciso que esteja aberto a entender que pode ser que seu complexo paterno não esteja vinculado apenas ao seu pai, e também a outra pessoa que exerceu ou exerce as funções consideradas paternas, esteja viva ou não. Assim como mencionamos no complexo materno, é comum pessoas terem mais convivência com seus avós ou tios do que com seus genitores, neste caso considere ambos em suas respostas. Caso uma ou outra ques- tão não seja válida à sua história de vida, apenas desconsidere. 82 Renato Lessa PeReiRa Podemos destacar a importância que o complexo materno e pa- terno pode exercer em nossas vidas mencionando inclusive histórias e figuras religiosas, como é o caso do admirável Francisco de Assis, que não raramente sofria os efeitos do caráter rígido do pai, absolutamente materialista e apegado aos prazeres transitórios, e da grande ternura de sua mãe, que já era grande admiradora de Jesuse João Batista, sendo inclusive razão pelo nome Giovanni. Vez ou outra, Francisco via-se em conflito por conta das influências de seus pais em sua formação. Conhecer e trabalhar nossos complexos maternos e paternos nos dará as condições necessárias para rompermos com as algemas e supe- rarmos a dependência psicológica que faz com que nossas decisões, se- jam quais forem, precisem ser submetidas à aprovação familiar. Nossos pais e mães internos que moram em nossas mentes costumam ainda fazer escolhas por nós. A sombra do que os nossos pais não conseguiram rea- lizar nos atormenta. Através dessas perguntas e de outras que você mesmo poderá fa- zer, será possível realizar uma espécie de raio X psíquico onde possivel- mente encontrará as questões implícitas de sua família que internalizou. Além da questão genética, essas questões são a maior influência em nos- so mundo mental. O fato de encontrarmos coisas que não queríamos que tivessem acontecido no processo de criação realizado pelos nossos pais não nós dá qualquer direito de culpá-los (vide mais abaixo sobre complexo de vitimização) pelo resultado do que somos. Afinal, não podiam entregar mais do que aquilo que tinham. A libertação do mito familiar e abandonar a exigência de vivermos a vida não vivida de nossos pais são partes importantíssimas em nosso processo de autoconhecimento e integração de opostos. Complexo de superioridade Você já ouviu ou disse alguma vez a expressão: “Tá se achando…”? Sabe aqueles pensamentos que, às vezes, povoam nossas mentes e dizem que somos melhores que alguém? Ou que se comparou com alguém, se perguntando o que determinada pessoa tinha que você não? E não venha nos dizer que você nunca pensou isso porque senão teremos de falar ainda mais da Sombra. 83 O POder dO AutOCOnheCimentO Todas as experiências onde fomos comparados e saímos como desta- que em relação aos outros compõem esse balão. Seja aquela vez que você foi o primeiro escolhido para o time da esco- la, ou o único menino da turma que conseguiu namorar alguém naquele ano escolar, ou até quando você ouviu de sua mãe que você estava mais bonito ou era mais inteligente que seu irmão, enfim, todas as experiências dessa natureza inflaram o seu balão da Superioridade. Que a gente não confunda a autoconfiança e autoestima com o Com- plexo de Superioridade. Apesar de o Complexo de Superioridade ser impor- tante e estar presente no processo de construção de autoconfiança e autoes- tima, se esse balão estiver muito cheio você poderá ter grandes problemas. Muito bem. Mas e você? Vamos tentar encontrar o que pode estar nesse balão? 1. Quando foi a última vez que se sentiu melhor ou superior a al- guém? 2. Aceita bem uma derrota? 3. Se for o caso, quando alguém tenta ultrapassá-lo na estrada, você cede passagem tranquilamente, sente raiva, mas libera passagem, segura quem está pedindo passagem ou aumenta sua velocidade? 4. Se for o caso, sente-se ou sentir-se-ia especial por frequentar uma sala VIP? Pode imaginar outros cenários como a primeira classe de um voo ou camarote em algum evento. 5. Se tem ou tivesse um cartão de crédito desses especiais sem limi- te, como se sente ou sentiria ao apresentá-lo? Seja sincero, faz ou faria questão que vissem esse cartão? Pensa que deve ser tratado diferente em razão disso? 6. Quando vai até o banco, acredita que deve ser atendido antes por ser um cliente mais especial? Imagina quanto dinheiro o cliente à sua frente possui? 7. No que você costuma sentir-se superior aos outros? 8. Seus pais costumavam compará-lo a outras crianças tentando mostrar que você era melhor ou superior? 9. Já foi eleito o melhor aluno da sala ou da escola? 10. Já ganhou alguma eleição escolar? 11. Diante de alguma frustração infantil, seus pais costumavam citar outras crianças em condições financeiras ou estéticas piores para fazê-lo se sentir melhor? 84 Renato Lessa PeReiRa 12. Alguém costuma fazer com que você sinta a necessidade de competir e mostrar-se melhor ou superior? Se sim, sabe expli- car por quê? 13. O que passa na sua cabeça quando conhece a esposa ou mari- do de seus amigos e colegas? Imagina se em uma competição você seria melhor ou “o escolhido(a)”? 14. Seus pais ou amigos costumam, ou costumavam, chamá-lo pelo aumentativo de seu nome ou apelido? Por exemplo: Pe- drão, Chicão, Luizão etc… 15. Se alguém o chama pelo diminutivo de seu nome (Pedrinho, Chiquinho, Luizinho etc.), como você se sente? Em que situa- ções e diante de quem você sentiria carinho ou diminuição no caso de chamá-lo pelo diminutivo de seu nome? 16. Considera-se uma pessoa competitiva? 17. Você consegue diferenciar claramente a autoconfiança da pre- potência ou arrogância? 18. No que você não se acha bom? No que você se acha melhor que os demais? 19. Elenque as qualidades e defeitos que considera existir nas prin- cipais pessoas de seus grupos de convívio. Costuma enxergar mais qualidades ou mais defeitos? 20. Já disse ou costuma dizer: “Sabe com quem você está falan- do?” 21. Costuma sentir-se a “última bolacha do pacote” nos ambientes onde convive? 22. Às vezes percebe-se criticando mentalmente outras pessoas para sentir-se melhor diante de frustrações? 23. Exige ou já exigiu que o chamassem de doutor(a) ou senhor(a)? 24. Qual é a sua reação diante de assuntos que desconhece? Finge conhecer, foge do assunto ou crítica sem mesmo ter uma opi- nião formada e fundamentada? 25. Procura desconfiar ou afastar-se de pessoas que parecem ser melhores a você em determinados setores? 26. Acha-se merecedor de regalias ou tratamento melhor que ou- tras pessoas em determinados setores de sua vida? 27. Ganhou muitas competições na infância e adolescência? 28. Ouviu muitos elogios ou que era especial na sua infância e adolescência? 85 O POder dO AutOCOnheCimentO 29. Tem preconceitos diante de pessoas mais simples e humildes? 30. Tem preconceitos raciais ou de preferência sexual? Quais são os preconceitos que possui? 31. Costuma ostentar bens na tentativa de suprir o sentimento de superioridade? 32. Acha-se uma pessoa muito boa se comparada aos demais? Vivemos atualmente uma época onde a maioria julga e já julgou muitas pessoas durante a vida servindo a uma necessidade de alimentar o complexo de superioridade. Julgou e julga os atos e as motivações dos outros, como se soubesse realmente quais são. Julgou e ainda julga a cor da pele, a linguagem corporal e até o cheiro das pessoas. Infelizmente julgou e está julgando até o valor da vida das pessoas segundo conceitos ilusórios de beleza. Gostaríamos de citar um pensamento filosófico que diz que um homem só deve olhar para outro de cima para baixo quando for para estender sua mão e ajudar a levantar um irmão caído. Complexo de inferioridade É basicamente o inverso do Complexo de Superioridade. Aqui vão algumas frases comuns que inflam o balão da inferiori- dade: “Você não serve para nada”, “Você faz tudo errado”, “Você é feio”, “Você é uma toupeira”, “Você é muito atrapalhado”, e por aí vai. Neste balão estarão todas as experiências e suas respectivas ten- sões emocionais onde você foi destacado como inferior e onde foi com- parado de forma negativa com outros. Estariam aqui as experiências onde você foi o último do time a ser escolhido, o único da turma a nunca ter namorado alguém, onde foi repulsado por alguém, e até quando seus pais deram preferência clara para outro filho. É um balão traiçoeiro dentro de nós, especialmente porque basica- mente “parece” não ter proveito algum em nosso padrão psíquico. Esse balão muito inflado pode trazer problemas sérios de baixa autoestima e insegurança desproporcional. 86 Renato Lessa PeReiRa Não dissemos “parece” sem motivo. O complexo de inferioridade é necessário também porque em condições normais nos dá a projeção da humildade, da aceitação e da tolerância dos defeitos que pertencem aos demais. Gostaríamos de fazer um comentário breve sobre a psicogênese do ciúme. Nãonecessariamente o ciúme estará ligado sempre ao complexo de inferioridade. Assim como demais problemáticas, como raiva, neces- sidade de valorização, ressentimento, ansiedade, depressão, entre outras, a origem pode ser diversa e multifatorial. Tente responder essas perguntas e desafios da forma mais sincera possível. Permita-se descortinar os conteúdos que estão em seu balão de inferioridade. 1. Quando foi a última vez que se sentiu pior ou inferior a al- guém? 2. Aceita bem uma derrota? 3. Sente-se intimidado na presença de alguém? 4. Sente-se intimidado quando alguma pessoa possui uma deter- minada qualidade ou característica que você considera impor- tante? 5. Se for o caso, quando alguém tenta ultrapassá-lo na estrada, você cede passagem tranquilamente, sente medo, sente angús- tia ou se imagina inferior? 6. Sente-se envergonhado pela forma como fala ou se veste? 7. Costuma dar muita atenção aos seus próprios defeitos? 8. Sente-se inseguro diante de qualquer necessidade de exposi- ção? 9. Caso tenha de realizar uma apresentação, como se sente? Per- cebe alguma necessidade de fugir da mesma? Faria qualquer coisa para evitar tal exposição? 10. Sente vergonha de seu nome? 11. Quando alguém corta alguma fila onde você esteja, como cos- tuma reagir? Você consegue manifestar-se e obrigar a pessoa a respeitar a ordem ou apenas critica calado? 12. Sente-se intimidado diante de pessoas muito bonitas? 13. No que você costuma sentir-se inferior aos outros? 14. Seus pais costumavam compará-lo a outras crianças tentando mostrar que você era pior ou inferior? 87 O POder dO AutOCOnheCimentO 15. Já foi destaque negativo em sua experiência escolar? 16. Já perdeu de forma vergonhosa alguma competição? 17. Diante de alguma frustração infantil, seus pais costumavam citar outras crianças em condições financeiras ou estéticas melhores, fazendo se sentir pior? 18. Alguém costuma fazer com que você sinta a necessidade de fugir por medo de comparação? Se sim, sabe explicar o que sente exatamente? 19. O que passa na sua cabeça quando você apresenta sua esposa ou marido aos seus amigos e colegas? Imagina se poderia ser trocado em uma competição? 20. Sente muito ciúmes de pessoas ricas e/ou bonitas? Sente-se muito ameaçado? 21. Seus pais ou amigos costumam, ou costumavam, chamá-lo pelo diminutivo de seu nome ou apelido? Por exemplo: Pe- drinho, Chiquinho, Luizinho etc… 22. Se alguém o chama pelo diminutivo de seu nome (Pedrinho, Chiquinho, Luizinho etc.), sente-se menor ou entende como forma carinhosa? 23. Considera-se uma pessoa que foge de competições por não achar-se bom o bastante? 24. Você consegue diferenciar claramente a humildade da falta de autoconfiança e da baixa autoestima? 25. No que você se acha bom? No que você se acha pior que os demais? 26. Nas perguntas para tentarmos nos aprofundar no que existe em seu balão de complexo de superioridade, nós pedimos que elencasse as qualidades e defeitos que considera existir nas principais pessoas de seus grupos de convívio. Costuma en- xergar mais qualidades nos outros ou mais defeitos em você? 27. Já disse ou costuma dizer: “Não sou bom em nada”? 28. Costuma sentir-se o “pior ou um dos piores” nos ambientes onde convive? 29. Às vezes percebe-se se criticando ou punindo-se mentalmen- te por não possuir alguma qualidade ou possuir algum defei- to? 30. Sente-se incomodado quando alguém elogia você? Ou sente- -se alegre e feliz de forma desproporcional? 88 Renato Lessa PeReiRa 31. Qual é a sua reação diante de assuntos que conhece? Conse- gue manifestar suas ideias e conhecimentos, ou sente-se enver- gonhado ou com medo e não se posiciona? 32. Sente necessidade constante de provar que merece respeito? Acha que a maioria das pessoas nem nota você? 33. Não se acha merecedor de reconhecimento ou de tratamento diferenciado em determinados ambientes? Consegue distin- guir modéstia de merecimento? 34. Perdeu muitas competições na infância e adolescência? 35. Ouviu muitas críticas ou que não era especial na sua infância e adolescência? 36. Acha que os outros têm preconceitos com você? 37. O que sente quando vê a felicidade (ao menos aparente) dos outros nas redes sociais? 38. Gosta de se ver em fotos e filmagens? Se não gosta, por quê? 39. Preocupa-se muito com a opinião dos outros ao seu respeito? 40. Costuma ostentar bens na tentativa de suprir o sentimento de inferioridade? 41. Sente-se bem diante de pessoas muito humildes e fragilizadas por não apresentarem uma possível competição? 42. Acha-se uma pessoa muito inferior se comparada aos demais? 43. Tem medo de ser reprovado pelos outros? A virtude da humildade não nos coloca nem em condição de supe- rioridade nem de inferioridade, mas na medida certa e justa. Complexo de poder Muitas pessoas quando estão em uma posição de comando acabam por tornarem-se autoritárias e com tendências ditatoriais. Essa necessidade de estar acima de todos, em posições de coman- do e liderando, está diretamente ligada ao complexo de poder. Que fique claro que todos nós temos esse complexo. São muitas as experiências que inflam esse balão, como, por exemplo, quando você foi escolhido para ser o líder da sala de aula onde estudava, quando você foi designado o capitão do time, ou o líder de um 89 O POder dO AutOCOnheCimentO grupo de estudo, ou o coordenador de alguma atividade, quando foi o juiz do jogo de futebol no campeonato de sua escola e até quando foi o escolhedor do time nas aulas de educação física. Sim, tem semelhanças com o complexo de superioridade em alguns aspectos, mas o foco nesse balão são as expe- riências que proporcionaram “controle” ou função hierárquica aos demais. Tudo isso vai formando nosso complexo de poder. Nada de errado nisso, o problema está quando a ânsia de poder toma conta de nós, ou seja, quando esse balão está muito inflado. Esse complexo é um dos motivos que leva a humanidade constante- mente a forjar ditadores e “donos do mundo”. A necessidade da posse e de poder é extremamente perigosa e requer atenção diferenciada. Jung costumava dizer que o poder é a sombra do amor, e vice-versa. Onde um está aparente, o outro está na sombra. Portanto, detectarmos o que pode estar neste balão do poder em seu mundo psíquico sem dúvida integra- rá um conteúdo muito significativo em sua jornada, facilitando o equilíbrio em suas relações de amor e de liderança. 1. Costuma ficar muito nervoso quando se sente contrariado? 2. Exerceu muitas posições de comando em sua vida? 3. Na infância e adolescência, teve funções de liderança e controle, especialmente no grupo escolar? 4. Costuma ser paciente com as limitações das pessoas que convi- vem com você? 5. Em uma reunião, acredita que a última palavra tem de ser a sua? 6. Como costuma dar ordens e reportar-se a quem está em posição hierárquica inferior a você? 7. Sabe obedecer a uma ordem sem questionar? 8. Respeita a hierarquia sem questionamentos internos? 9. Quando está em um grupo, sente a necessidade e/ou prazer em liderar? 10. Gosta de sentir-se em posição superior? 11. Costuma respeitar e acatar a opinião dos outros? 12. Já se apoderou de alguma ideia que não foi sua? 13. Gosta de mandar ou comandar? 14. O que acha da frase: “Manda quem pode, obedece quem tem ju- ízo”? 15. Considera-se muito estrategista? 90 Renato Lessa PeReiRa 16. É muito manipulador? 17. É pontual ou costuma deixar as pessoas esperando por sua che- gada? 18. Sente prazer em persuadir as pessoas? 19. Faz o que for preciso para conseguir o que deseja? 20. Já usou a expressão: “Doa em quem doer”? 21. Caso tenha filhos, tem postura autoritária com eles? 22. Considera-se machista ou feminista? 23. Sente-se ou já se sentiu o “dono do mundo”? 24. Consegue perceber se acha que o mundo “gira em seu redor”? 25. Considera-se egocêntrico? Já ouviu alguma crítica sobre isso? 26. Considera-se egoísta? Já ouviu alguma crítica sobre isso? 27. É muito mais preocupado com suas próprias necessidadesdo que com as necessidades dos que te cercam? 28. Já disse ou costuma dizer: “Eu mando, você obedece”? 29. Gosta de ser servido? Sente-se incomodado em servir alguém? 30. Costuma dar palpites e conselhos aos outros sem que tenham pedido a você? 31. O que acha da expressão: “O mundo é dos espertos”? 32. Você concorda com a “Lei do mais forte”? 33. Tem dificuldade em pedir ou aceitar ajuda dos outros? 34. Costuma insistir na crítica rígida sobre um determinado com- portamento, fazendo interpretações agressivas para se estabe- lecer predominante? Reconhecer o próprio valor auxilia no enfrentamento e controle dos complexos de Superioridade e de Poder. Queríamos aproveitar o ensejo para falarmos de uma síndrome que precisa ser observada especialmente em um momento que vivemos nes- te mundo onde as Personas idealizadas são tão valorizadas. Trata-se da síndrome da ajuda. A nossa sombra de poder aparece não raras vezes fantasiada de amor ao próximo. Além do complexo de poder, a síndrome da ajuda também se relaciona com outros complexos. Na tentativa de parecermos heróis, perfeitos e de atingirmos a expectativa de sermos pessoas ideais aos olhos dos outros, mostramos nosso complexo de inferioridade e/ou também o medo de abandono e reprovação. 91 O POder dO AutOCOnheCimentO Quando somos possuidores dessa síndrome, temos grande difi- culdade de pedir e aceitar ajuda de outras pessoas, além de termos difi- culdades de perceber soluções para os nossos problemas. Nessa síndrome de ajuda, o que ocorre na verdade em nosso mundo psíquico é a manutenção da dependência de quem está sendo ajudado e não uma ajuda eficaz de fato. Na fragilidade e fraqueza do ajudado, a autoestima de quem está ajudando é fortalecida. Equilibrar nosso complexo de poder nos gera autonomia. Sabemos que já falamos sobre a necessidade de ser honesto con- sigo mesmo, mas não custa lembrar. Nosso Ego tende a nos enganar nas respostas e nos força a respondermos de acordo com a imagem que gostaríamos de ter ou que atende às expectativas do meio. Precisamos fazer esse alerta, vale relembrar, caso você não consiga admitir algo, esse algo irá tornar sua sombra ainda mais densa ao invés de tornar-se luz e ser integrado. Tomar conhecimento sincero do que se passa em nossas mentes e corações vai trazer muitos benefícios. Ninguém verá suas respostas a não ser você. Desta forma, seja o mais verdadeiro e transparente com você mesmo. Acolha esse ser abandonado e repudiado até esse mo- mento. Complexo de abandono Esse é um balão bastante subjetivo. Como se os outros não fos- sem, não é? Aqui temos condições de entender melhor como existe correla- ção, ou melhor, inter-relacionamento entre complexos. Você alguma vez já teve algum sonho de que se perdeu no shop- ping ou no mercado quando era criança? Ou melhor, você já se perdeu em algum lugar e sentiu-se desamparado e desesperado? Esse é o balão onde experiências dessa natureza são inseridas. Momentos onde se perdeu, sentiu-se sozinho em determinado lo- cal, foi colocado em um local escuro como corrigenda pelos pais, ficou aguardando na escola seus pais virem buscá-lo muito além do horário quando todas as demais crianças já tinham ido embora, e até “levou um fora da(o) namorada(o)”, certamente inflaram esse seu balão de abandono. 92 Renato Lessa PeReiRa Experiências de abandono, como as que foram citadas, relaciona- das aos pais, acabam inter-relacionando-se com outros complexos como o materno e paterno, por exemplo, o que potencializa muito a tensão desse complexo. É muito comum serem poucas as experiências de abandono, mas as poucas que ocorreram estão recheadas de tensão emocional por es- tarem envolvidas com outros balões, e por isso acabam inflando mais rapidamente. Algumas das maiores problemáticas relacionadas ao complexo de abandono são: a insegurança, as fobias, o pessimismo, a desconfiança e a necessidade de valorização. Pessoas que possuem esse balão muito inflado precisam tomar grande cuidado e buscar conscientização dessas experiências, de forma a ressignificarem as mesmas para que não tenham suas vidas impactadas pela ansiedade e medos constantes. Vamos tentar encontrar sua criança abandonada? 1. Pessoas próximas a você morreram? 2. Já se perdeu de seus pais? 3. Teve muitas experiências em que ficou aguardando alguém que não apareceu? 4. Costuma sonhar que está sozinha e perdida? 5. Já perdeu o horário de um compromisso ou evento muito im- portante? Um voo por exemplo. 6. Como costuma reagir quando não sabe onde está? 7. Já foi alvo de rompimentos de relacionamentos? 8. Tem alguma experiência muito traumática ligada ao término de relacionamentos? 9. Já foi traído? 10. Como se sente quando precisa ir para um lugar que não sabe o caminho? 11. Como se sente em ambientes com grande aglomeração de pes- soas? 12. Se tem filhos, já os perdeu de vista em mercados, shoppings ou outro local coletivo? 13. Quando vê filmes onde uma criança é abandonada, tem algu- ma reação emotiva desproporcional? 14. O que acha da adoção de crianças? 93 O POder dO AutOCOnheCimentO 15. Seria capaz de amar e criar uma criança adotada? 16. Seria capaz de entregar um filho para adoção caso não tivesse um cenário futuro promissor? 17. Quando alguém que você se importa está demorando a chegar, costuma aguardar pacientemente ou pensa logo no pior? 18. Seus pais separaram-se quando você era criança ou adolescen- te? Lembra-se de como se sentiu quando soube (se for o caso)? 19. O que sentiria se seu pai ou sua mãe tivessem outro filho em outro casamento? 20. Você é muito ciumento(a)? Pensa que sua companheira(o) pode abandoná-lo(a) a qualquer momento? 21. Pensa muito na morte de seus entes queridos? 22. Já precisou ficar quando toda sua família realizou uma via- gem? 23. Costuma ligar ou enviar mensagens muitas vezes ao dia para as pessoas que ama? 24. Você tem medo do escuro? 25. Qual é o seu maior medo? Talvez para respondermos adequadamente a essas perguntas, pre- cisaremos reviver os traumas da infância e entrar em contato com a nossa criança interior, que muitas vezes se mostrará ainda muito ferida, machu- cada e outras tantas vezes abandonada. Complexo de heroísmo O heroísmo sempre esteve presente na história da humanidade. Nas pesquisas de Jung e de muitos outros pesquisadores sobre os povos primitivos e a mitologia, ele pôde identificar que a personificação dos deuses e heróis fez parte de todos os povos da Antiguidade. Nunca antes na história da humanidade tivemos tanto acesso a he- róis das mais diversas formas e características. Se nos perguntarem se nos últimos anos ficamos três meses segui- dos sem assistir um filme que envolvesse heróis e a salvação do mundo, nossa resposta seria negativa. As crianças adoram esse tipo de filme, e nós, para sermos honestos, acabamos gostando também. 94 Renato Lessa PeReiRa O fato de vivenciarmos e assistirmos com nossos filhos esse tipo de filme tem lá suas vantagens. Como apaixonados e curiosos por tudo que envolva o mundo mental e suas variações, os filmes recentes de heróis são um prato cheio para análises e divagações. Se pararmos para analisar friamente, desde muito pequenos, es- pecialmente as gerações dos anos 70 para frente, sempre estivemos envolvidos com a figura do herói. E não estamos falando apenas dos heróis de desenhos e qua- drinhos. As próprias religiões nos apresentam seus heróis, e é muito, mas muito, difícil não inflarmos nossos balões diante das conquistas desses heróis. Cada vez que vemos um filme de heróis, que vemos alguém salvar um animal, que vemos os bombeiros trabalhando, que defende- mos alguém, lá estará nosso balão do heroísmo sendo inflado. Não poderíamos deixar de falar sobre esse balão, precisaremos aprender um pouco dele para entendermos melhor as últimas gera- ções. O fato aqui é que a vivência e exposição contínua ao mundo he- roico vai inflar significativamente nosso balão de heroísmo, inserindo não apenas a tensãode salvar o mundo, mas também as característi- cas específicas de cada herói. Sabemos bem que hoje em dia a maioria dos heróis não são bem os maiores exemplos de conduta e equilíbrio possível. Não estamos mais falando de figuras messiânicas como Jesus, que é impossível encontrarmos algo repreensível. Falamos agora de heróis muito complicados e cheios de distúr- bios de comportamento. Por isso requer nossa atenção como estamos sendo impactados por esses heróis. Pessoas com o balão do herói muito inflado acabam por torna- rem-se reféns de um padrão de busca para serem messias ou deten- tores de missões únicas e especiais que podem salvar a humanidade. Quem não quer ser herói, não é verdade? Mas no mundo real as coisas não funcionam bem assim. Pessoas com esse balão muito infla- do podem tornar-se alvos fáceis da exploração afetiva e até material. Além do que, convenhamos, alguém que imagina ter uma su- permissão superespecial designada por uma força maior certamente será vítima da frustração e até de estados depressivos quando perce- ber que essa missão não existe efetivamente. 95 O POder dO AutOCOnheCimentO Mas longe de nós dizermos que esse complexo não serve para nada, muito pelo contrário. Cremos que se há um complexo capaz de mudar o mundo de verdade, é esse o tal. Se esse balão estiver inflado no ponto certo, quem tiver esse pri- vilégio pode ser alguém muito importante na coletividade. Geralmente são aquelas pessoas que lutam pela igualdade de direitos, por condições melhores para os mais necessitados, que protegem os mais vulneráveis e que tentam sempre compartilhar conhecimentos para o equilíbrio co- letivo. Saindo do plural e indo para o singular nesse momento, vou contar para você o meu caso. Acho que posso dar esse testemunho com a missão de explicar a você como o complexo de heroísmo pode impactar nossas vidas. Honestamente não sei o porquê, já fiz muitas reflexões, exercícios de autoconhecimento, exercícios de meditação, auto-hipnose avançada, en- tre muitas outras coisas, mas não consegui chegar a um fato específico que explique o porquê do meu complexo de heroísmo ser inflado. Sem- pre achei que precisava de alguma forma fazer algo especial, algo que fizesse a diferença por ter vivido. Ao longo do tempo fiz muitas coisas tentando atender essa necessidade íntima. Fiz sites em troca de doação de cestas básicas para entidades beneficentes, visitava asilos, servi sopa a moradores de rua, tentei sempre ajudar a medida do possível quem estivesse ao meu lado, mesmo financeiramente. Acho que queria salvar as pessoas. Como se a pessoa que eu mais precisasse salvar de fato não fosse eu. Comecei a perceber em alguns momentos que a fonte da minha motivação não era apenas o amor, mas também o reconhecimento. O estudo da mente me trouxe muitas vantagens, por conta disso percebi que o complexo de heroísmo que eu possuía estava sendo alimentado por um verdadeiro gigante da alma: a necessidade de valorização. É claro que muitos outros complexos estão relacionados à minha tentativa de jornada heroica, mas a necessidade de ser valorizado estava dividindo espaço com o amor que eu aplicava nessas tarefas. Tomar conhecimento de como esse balão estava inflado dentro de mim fez toda a diferença em minha vida. Comecei a desenvolver uma habilidade capaz de filtrar quando eu estava sendo motivado pelo amor e quando eu estava sendo motivado pela necessidade de ser o herói valorizado. Isso mudou minha vida em muitos setores e removeu de mim uma carga psíquica que não 96 Renato Lessa PeReiRa era minha responsabilidade. Hoje tento fazer as coisas por amor, com pro- pósito real, e não mais sendo refém de meu balão heroico. Ainda luto com isso, é claro. Não foi do dia para a noite que consegui esse equilíbrio nesse quesito. Levou tempo para aprender a separar a ajuda sincera, da explora- ção e da acomodação alheia. Ainda resisto às vezes aos pensamentos que me levam ao estereótipo do grande herói. Mas hoje raramente me submeto à necessidade de valorização potencializada pelo complexo de heroísmo. Hoje sei que a primeira alma que devo salvar é a minha, sem ser egoísta, mas para então estar apto e merecedor de salvar mais alguma outra alma. Enquanto isso, estou tentando fazer o melhor que posso, buscando e ad- quirindo algum conhecimento para compartilhar visando uma missão mais simples, sem a necessidade de uma máscara e um símbolo no peito. Vamos achar o herói que vive dentro de você? 1. Acha que precisa salvar as pessoas? 2. Acredita que tem uma missão especial? 3. Quais são seus heróis preferidos? 4. Quais as características que mais gosta nos heróis de sua prefe- rência? 5. Se você pudesse escolher um super poder, qual seria? 6. Preocupa-se demasiadamente com o bem-estar dos outros? 7. Sente-se culpado quando está feliz e os outros não? 8. Acha que quando descobre algo novo deve espalhar para o máxi- mo de pessoas possível? 9. Faz trabalho voluntariado? 10. Já teve ou tem o sonho de fundar uma ONG? 11. Percebe se às vezes acha que você deve resolver o problema que cabe à própria pessoa resolver? 12. Sente-se frustrado quando as pessoas não seguem os conselhos que pediram a você? 13. Percebe se não fica tentando aconselhar as pessoas a mudarem há- bitos e comportamentos que considera ruim para elas? Sim, tem relação também com o complexo de poder, mas aqui estamos ten- tando focar mais na necessidade de ajudar e salvar, não controlar a vida dos demais. 14. Costuma seguir adiante no que está fazendo, mesmo em uma si- tuação onde esteja com muita dor? 97 O POder dO AutOCOnheCimentO 15. Costuma tentar superar seus limites físicos diante de qualquer atividade? Temos que tentar deixar para trás as atitudes heroicas se queremos viver a vida que verdadeiramente desejamos, sem culpas e sem traumas. Complexo de vitimização E aqui chegamos ao último balão que achamos muito importante vi- sitar em sua jornada de autoconhecimento. Apesar de ser o último, não é menos importante, pelo contrário. Ao que nos parece estamos em uma fase onde temos visto muito isso em atendimentos e no convívio com outras pessoas. Mesmo estando em uma época onde a tecnologia deveria aproximar as pessoas facilitando a oferta de cuidados e atenção, podemos perceber um crescimento devastador no grau de carência entre as relações humanas. Os contatos são muito mais rápidos, frios e superficiais que outrora. Essa falta de proximidade, bem como outros fatores ligados ao vazio exis- tencial e a falta de habilidade em extrair prazeres e felicidade da vida, tem contribuído para que os balões da vitimização estejam cada vez mais infla- dos no mundo psíquico das pessoas. Ocorre que esse complexo não é muito diferente dos demais e impacta significativamente na qualidade de nossas relações e comportamentos, ge- rando uma percepção distorcida da realidade que possa ser percebida através de lentes pessimistas e desfocadas. Tudo e todos parecem conspirar contra o ser que possui esse balão inflado em sua mente. Para facilitar seu processo de busca e descoberta a respeito do quanto esse balão pode estar atrapalhando sua vida, gostaríamos de fazer uso de um trecho brilhante da obra Em Busca da Iluminação Interior (Ed. LEAL 2017, p. 120), onde o coautor Cláudio Sinoti lista a seguinte série de comporta- mentos vinculados a indivíduos que sofrem do complexo de vitimização: – Evitam assumir responsabilidades, porquanto se assim procedem, terão de reconhecer os próprios erros, e isso a vítima quer evitar a qualquer custo. 98 Renato Lessa PeReiRa 1. Você percebe se está evitando assumir responsabilidades em al- gum ou todos os setores de sua vida? 2. Você costuma reconhecer seus próprios erros? 3. Qual é a sua responsabilidade pelas coisas que não estão bem em sua vida? 4. Quais são os erros mais graves que cometeu ou que ainda vem cometendo? 5. O que você perderia se seus problemas fossem todos resolvi- dos? Isso mesmo, o que “perderia”. Será que por trásde algum comportamento vitimizador não existe a necessidade de chamar a atenção das outras pessoas na tentativa de suprir alguma ca- rência afetiva? Na psicologia costumamos chamar isso de “ga- nhos secundários”. – Tendem a buscar algum culpado para a situação em que se encontram e, de forma consciente ou inconsciente, terminam por atrair para o círculo próximo “algozes” nos quais coloquem a culpa por seus insucessos e sofrimentos. 6. Você costuma culpar os outros pelos seus problemas? 7. Diante de algum infortúnio costuma maldizer outras pessoas? 8. Quem são os culpados pelas suas derrotas ou infelicidades? 9. Já ouviu críticas de que sempre põe a culpa em alguém por seus dissabores? 10. Você costuma se queixar muito? 11. Já ouviu alguma crítica de que você está sempre reclamando? 12. Como você se sente diante de pessoas que só reclamam? – Analisam a própria história a partir de um olhar estreito, exaltando o sofrimento, abandono ou negligência de que acreditam terem sido vítimas. 13. Quando analisa sua vida, consegue ver as coisas utilizando um ponto de vista imparcial e dissociado? 14. Quando conta sua história de vida ou experiências específicas, costuma dar ênfase desproporcional para o sofrimento e experi- ências infelizes que viveu? 99 O POder dO AutOCOnheCimentO 15. Costuma mencionar que sofreu por conta do abandono ou ne- gligência das pessoas com quem convive ou conviveu? Exis- tem relações entre os complexos conforme já mencionamos, no caso dessa questão há vínculos com o complexo de aban- dono, complexo materno e paterno. Contudo, o objetivo aqui é detectar a exaltação a respeito do sofrimento que viveu. 16. Diante de algum risco costuma manifestar o pessimismo? 17. Recebia pouca atenção afetiva quando era criança e adoles- cente? 18. Quando ficava doente durante a infância, recebia muita aten- ção de seus pais? 19. Quando você adoece, costuma fazer questão que todos sai- bam? 20. Seu pai ou sua mãe tinham comportamentos vitimizadores? – O sofrimento a que são submetidos sempre parece mais intenso do que o dos outros e, em uma postura egotista, sempre apresentam um problema maior quando alguém tenta lhes contar alguma situação di- fícil, ou mesmo minimizam a dor do outro, na tentativa de exaltar a própria dor. 21. Qual é a sua postura quando alguém tenta desabafar com você? 22. Quando alguém tenta lhe contar que está com algum proble- ma, você tenta ouvir com compaixão ou logo conta um outro problema seu como se tentasse disputar qual é o maior? 23. Consegue perceber se você não está sempre aumentando a intensidade de seus problemas e sofrimento na tentativa de ganhar a compaixão alheia? 24. Consegue sentir empatia e compaixão diante da infelicidade alheia? 25. Costuma diminuir (achar que é menor) a dor e sofrimento dos demais? 26. Já ouviu alguma crítica de que sempre acha que o seu proble- ma é o maior? 27. Como você se sente diante de pessoas que possuem esse pa- drão de vitimização? 100 Renato Lessa PeReiRa – Não aceitam as sugestões ou soluções que lhes são dirigidas, porque isso significaria reconhecer neles a força da superação dos problemas ou a capacidade de lidar com eles. Assim procedendo, arrumam sempre alguma desculpa para não fazerem o que devem ou podem fazer. 28. Você procura aceitar e seguir os conselhos que recebe? 29. Consegue perceber se não prefere manter o sofrimento para ga- nhar atenção? 30. Costuma pedir conselhos já com a intenção de não os seguir? Temos de revisitar e acolher nossa criança maltratada que deseja ins- pirar compaixão. Lembre-se de que o conteúdo rejeitado da criança torna-se sombra. O complexo de vitimização é traiçoeiro e precisa de nosso reconheci- mento imediato, caso contrário até nosso projeto de autoconhecimento será comprometido. Esses comportamentos vinculados ao balão da vitimização fazem com que acreditemos que somos apenas o resultado do que os outros nos fizeram, fazendo com que nosso Ego nunca se coloque em posição de responsável pela nossa história e destino. Quem se vitimiza acredita na ilu- são de que está livre do compromisso de melhorar-se e de contribuir com a melhora do mundo, por isso esse complexo é tão tentador. Quando tudo o que conseguimos ver é somente a nossa própria dor, talvez seja aí que perdemos a visão de Deus. James Hillman, em O Código do Ser – Uma busca do caráter e da vo- cação pessoal, (Ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 1997, p. 13), adverte: “quanto mais minha vida for explicada pelo que já ocorreu em meus cromossomos, pelo que meus pais fizeram ou deixaram de fazer e pelos anos remotos da minha infância, tanto mais minha biografia será a história de uma vítima”. Desafio rápido Agora que você já abriu caminho para conhecer e reconhecer a sua complexidade, queremos propor um desafio rápido como treino de auto- percepção. 101 O POder dO AutOCOnheCimentO Em uma escala de 0 a 10, avalie qual seria a interferência que cada um dos oito complexos teve em sua vida nos últimos tempos. Complexos Avaliação de 0 a 10 Materno Paterno De superioridade De inferioridade De abandono De heroísmo De poder De vitimização • 0 seria nenhuma interferência e 10 seria interferência total 103 Anima x Animus Nós já falamos sobre eles anteriormente, na etapa “O seu mundo psíquico”. Agora é hora de verificar quais das características e polaridades masculinas e femininas estão mais ou menos desenvolvidas em você. A dinâmica aqui é buscar o equilíbrio identificando o que requer sua atenção para ajuste das polaridades. Elaboramos um quadro resumido e bem fácil para sua autoavaliação. Pinte os quadros de acordo com sua percepção. Sendo 0 falta total do recurso, 5 intermediário e 10 o uso total do recurso. RECURSO 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Bondade Compreensão Empatia Gentileza Justiça Emoção Intuição Capacidade de amar (não apenas familiares) Cuidar Sensibilidade Ouvir Criatividade Beleza 104 Renato Lessa PeReiRa Espiritualidade Coragem Persistência Força de vontade Razão Ação Pensamento claro Raciocínio lógico Concentração Cumprimento de metas Discernimento Empreendedorismo Poderíamos citar mais outros recursos alinhados às polaridades masculinas ou femininas, contudo, acreditamos que essas já sejam sufi- cientes para um bom panorama dos recursos que estão predominantes ou pouco desenvolvidos. O objetivo é que você consiga perceber especialmente os pontos mais fracos e assim criar estratégias para desenvolvê-los. Não se escravize à ideia de que poderá estar com avaliação 10 em todos os recursos. Isso sinceramente é algo bem distante para cada um de nós e o fato de se autoavaliar nesses índices claramente estaria apontan- do a você algum complexo que precisa de controle. Na prática psicanalítica poderíamos dizer que todos os recursos que estão com baixa avaliação estão em sua Sombra. Reconhecer que os possui dentro de você e desenvolvê-los é uma tarefa muito salutar de trazer à luz todo seu conteúdo desconhecido. Tente ser mais ousado após ter realizado sua avaliação de polarida- des. Questione-se o que pode estar por trás desses recursos abandonados e predominantes dentro de você. Por que esses recursos pouco desenvolvidos não são trazidos para sua vida no dia a dia? Quais preconceitos podem estar enraizados em seu sistema de crenças que o impedem de fazer uso deles? 105 O POder dO AutOCOnheCimentO Que experiências na história de sua vida podem ter colaborado para que cada recurso tivesse essa intensidade em sua forma de ser? Como se sente diante de pessoas que possuem predominância dos recursos subdesenvolvidos em você? E quando existe similaridade? As pessoas com quem se relaciona afetivamente costumam possuir predominância ou subdesenvolvimento de que recursos? Você já seria capaz de identificar quais complexos podem estar relacionados com cada uma dessas polaridades? Lembre-se que todos possuem a potencialidade para todo e qual- quer recurso, os opostos estão dentro de nós e desenvolvê-losnos trará equilíbrio em todos os aspectos. Portanto esqueça a desculpa de que isso ou aquilo não é possível para você. O simples fato de identificar a intensidade dessas polaridades é capaz de mudar muito sua forma de enxergar as coisas e as pessoas à sua volta. 107 As relações “Diga-me com quem andas e te direi quem és…” Temos certeza que já ouviu o dito popular que associa nossa iden- tidade com o tipo de pessoas com as quais nos relacionamos. Concordamos apenas em parte com isso porque acreditamos existir muito mais complexidade em nossas relações. Temos diversos tipos de relacionamentos em nossas vidas, indo desde a família até pessoas que não conhecem mais do que apenas os nossos nomes. Alguns são escolhas, outros laços sanguíneos e temos até os acidentais. Mas o que de fato importa nesse momento é conseguirmos iden- tificar em nossas relações o que faz parte de nossa essência verdadeira. Precisamos buscar pistas em nossos relacionamentos que nos le- vem até respostas mais profundas das razões de estarmos relacionados com as pessoas que orbitam nossas vidas. Existem relações por amor, por interesse, por afinidade de objeti- vos, por afinidade de pensamentos, por similaridade de sentimentos, por sincronicidade de momentos de vida e daí por diante. Como já vimos anteriormente na obra Formando Seres Integrais, quando falamos da pirâmide das necessidades de Maslow, temos a neces- sidade de pertencer ao grupo. O ser humano é um ser gregário, ou seja, pre- cisa dos demais para existir. Isso pode explicar muitas de nossas relações que não são satisfatórias, mas nos garantem fazer parte do grupo. Aproveitamos o ensejo para mencionar as Personas novamente. Perceba que não é raro nos vermos vestidos das máscaras do que o grupo deseja que sejamos somente para não ficarmos sós. O fato é que um olhar mais aprofundado em torno de nossas re- lações e das sensações que temos diante das dinâmicas de convívio em cada uma delas pode nos apresentar um panorama riquíssimo sobre o que trazemos em nosso mundo interior. 108 Renato Lessa PeReiRa Quantas vezes vemos um ou outro casal em uma dinâmica infeliz que se mantém em um ciclo simbiótico entre os complexos que cada um possui? Podemos citar como exemplo os complexos de superioridade e inferioridade que levam a um padrão de distanciamento onde a necessidade de um parecer melhor se alimenta da certeza do outro de que não é bom o bastante. E não para por aí. Existe uma avalanche de situações que poderíamos elencar para ilustrar como a dinâmica de nossas relações pode desvendar muito do que temos escondido dentro de nós. Muito bem, respire fundo e comece a montar seu mapa pessoal de relações de forma a listar individualmente o que cada um de seus relaciona- mentos apresenta sobre você mesmo. 1. Liste as principais pessoas de seu convívio. Tente separar por se- tores de sua vida, por exemplo: familiares, amigos, colegas de trabalho etc. 2. Ainda de forma individualizada, elenque o que mais admira e o que menos gosta em cada um. 3. Seja honesto e responda se existe alguma mágoa a respeito de cada uma dessas relações. 4. Em cada uma dessas relações você sente que faz mais do que recebe? Por quê? 5. Quais dessas relações você acredita que são descartáveis? 6. Quais dessas relações você acredita que não lhe fazem bem? Sabe dizer por quê? Consegue identificar algum complexo significati- vo que possa estar gerando essa impressão? 7. Costuma perceber algum padrão de comportamento nas amizades que estreita? 8. Costuma perceber algum padrão na forma de agir de seus parcei- ros nas relações amorosas? 9. Para você o que é um amigo ideal? Você se considera um amigo ideal? 10. Consegue analisar se tem algum comportamento possessivo em alguma ou todas suas relações? 11. Você aceita seguir o que a outra pessoa pensa, mesmo não sendo o que você deseja? Por quê? 12. Sente medo de não ser aceito se não for do jeito que a outra pes- soa deseja que você seja? Se for o caso, o que pode estar por trás disso? 109 O POder dO AutOCOnheCimentO 13. Sente inveja de alguma pessoa que faça parte de suas relações? 14. Consegue ficar vulnerável em quais relações? Sente que as pessoas conseguem ficar vulneráveis perante você? 15. Tem medo da solidão? Por quê? 16. Diga o que você pensa a respeito da frase: “Antes só do que mal acompanhado”. 17. Quando se sente muito incomodado na presença de uma pes- soa que faz parte de seu rol de relacionamentos, procura se afastar? Já consegue saber o que essa pessoa tem que tam- bém pode estar dentro de você e não consegue admitir? Ou consegue saber quais são seus complexos associados a esse incômodo? 18. Quanto de seu tempo você dedica às relações que mais te dei- xam feliz? 19. Você tem alguma relação (de qualquer natureza) apenas por interesse? Como se sentiria se soubesse que alguém se relacio- na com você por interesse? 20. Tem a tendência de se relacionar com muitos superficialmente ou com poucos profundamente? 21. Considera alguma de suas relações abusiva? Se for o caso, por que não consegue interromper o abuso? 22. Muito bem, para finalizar esse pequeno grupo de perguntas a respeito de suas relações, queríamos propor a você um desafio avaliativo para cada uma das pessoas que elencou em seu rol de relações. De 1 a 5, onde 1 é quase nada e 5 é muito, pontue individualmente a intensidade de suas emoções vinculadas a cada pessoa. Para facilitar, utilize essas: amor, felicidade, paz, raiva, angústia, medo, tristeza, nojo, indiferença, inveja e ciúmes. Hoje vemos muitas frases de efeito em redes sociais sobre a ne- cessidade de afastamento de pessoas consideradas tóxicas. Partilhamos da filosofia de que relações que nos fazem mal devem ser evitadas, mas antes temos de tirar dessas relações o que pode contribuir para o nosso autoconhecimento. A qualidade de seus relacionamentos é totalmente dependente da qualidade do relacionamento que você mantém consigo mesmo. 110 Renato Lessa PeReiRa Não é raro em atendimentos terapêuticos detectarmos padrões e complexos que são da própria pessoa e geram incômodo diante de al- guém com determinadas características. Isso ocorre principalmente por- que eram desconhecidos e/ou não aceitos. Descortinar e integrar o que está dentro de nós traz equilíbrio e uma consequente facilidade em acei- tar as imperfeições dos demais. Antes de avaliarmos as pessoas como tóxicas temos de perguntar onde essa toxina mora dentro de nós, e quando é o caso optar pelo afas- tamento racional e consciente que não esteja vinculado à fuga do nosso combate interno. No caminho de concluirmos essa etapa, gostaríamos de falar bre- vemente sobre a “família”. É aqui onde as relações são mais desafiadoras e extremamente necessárias para a integração total do ser. Vemos que muitos dos valores básicos que contemplam a impor- tância das relações familiares estão sendo perdidos ou negligenciados pela velocidade imposta em nossas rotinas diárias, assim como pelo pró- prio materialismo e superficialidade, que vêm ganhando cada vez mais terreno nos últimos tempos. Precisamos entender que a família é peça fundamental quando de- sejamos equalizar nossa forma de interagir em nossas relações. O históri- co de nossa vivência familiar é uma das peças mais importantes, afinal é nossa origem e seja ela ideal ou não, é dali que temos de tirar o material necessário para grande parte de nosso processo de autoconhecimento. Família é o oposto de egoísmo. Se não há família somos tenden- ciados a sucumbir diante de um egocentrismo patológico que nos impede de viver plenamente a melhor parte das relações humanas. É onde inicia- mos, é nosso “treino” de afetividade. As regras, os limites, os valores e os sentimentos contemplados em nosso mapa familiar são colunas fundamentais de sustentação para nosso convívio social pacífico e respeitoso, onde temos a possibilidade de forjar padrões de tolerância e espírito de colaboração com os que se encontram em estadode desequilíbrio. Uma das coisas mais comuns com a qual também nos deparamos nos atendimentos profissionais é que quase a totalidade das pessoas traz consigo mágoas e problemas de relacionamento de caráter familiar. Seja qual for o motivo, parece que optamos com muita facilidade pelo afas- tamento das pessoas que nos incomodam no círculo familiar sem antes fazermos a nossa “lição de casa” de autoavaliação. 111 O POder dO AutOCOnheCimentO Por mais que nos deparemos com pessoas consideradas de difícil convivência, lembremos que o ódio não ouve o ódio. A única voz capaz de ser ouvida por alguém colerizado é a voz do amor e da mansuetude. Para sermos mais tolerantes em nossas relações familiares é imprescin- dível antes o combate interno aproveitando exatamente aquelas pessoas que mais nos incomodam, utilizando-as como espelho ou lupa na busca de nossas sombras. Toda relação entre duas pessoas é absolutamente única. Por conta disso é impossível amar duas pessoas exatamente da mesma maneira. Amamos cada ser de modo diferente por ele ser quem ele é e pelo reflexo fiel do que recebe de nós. Quanto mais vulneráveis somos capazes de ser perante o outro e mais nos conhecemos, maior é a quantidade de cores desse relacionamento. Nossas famílias são os verdadeiros laboratórios de que necessita- mos em nossa missão de alcançarmos a plenitude através da integração psíquica total. • Como você pode harmonizar sua família? • Qual é a sua parte de contribuição em seu grupo familiar? • Você culpa familiares pelo seu insucesso e sofrimentos? Nesta etapa de sua aventura de autoconhecimento, você já está conse- guindo assumir a responsabilidade de seus próprios infortúnios? Tente utilizar um olhar imparcial sobre cada integrante de sua fa- mília e tente encontrar sempre algo que seja útil em seu processo de construção interior. Pode inclusive pontuar que determinadas pessoas mostram como não devemos ser em nossas relações. Utilizando sua cria- tividade, tente chegar a uma ressignificação positiva para cada uma de suas relações familiares e pode estender a toda e qualquer relação que possua. Essa é uma técnica terapêutica poderosa. O ex-presidente americano Barack Obama disse em entrevistas que a ausência de seu pai o ensinou muito como ser um bom pai. Fran- cisco de Assis perdoou e agradeceu a existência de seu pai tomado pelo materialismo, que mostrou a ele um modelo insatisfatório de existência, abrindo o caminho da liberdade através do desapego material e da sim- plicidade. 112 Renato Lessa PeReiRa • Você já conseguiu tornar-se independente de seus pais? Já conseguiu libertar-se de culpas e ressentimentos que estejam vinculados a eles? • O que falta para libertar-se das algemas psicológicas que atrapalham sua convivência familiar e tornar a amizade o prin- cipal ingrediente dessas relações? 113 Os mecanismos de defesa do ego Muito bem. Estamos chegando agora em um ponto crucial em nossa jornada de autoconhecimento. Precisamos avisá-lo que nessa etapa será necessária muita coragem e sinceridade de sua parte para detectar quando e como esses mecanismos de defesa do Ego estão agindo em você impedindo sua relação sincera com os reais desejos de sua alma. Novamente utilizaremos alguns conteúdos adaptados de nossa obra anterior Formando Seres Integrais, contudo, sob um prisma mais profundo e objetivo. Tentaremos aqui realizar questionamentos focados a cada um destes principais mecanismos de defesa. Antes de prosseguirmos precisamos discorrer um pouco porque cha- mamos esses comportamentos de mecanismos de “defesa”. De maneira ge- ral, precisamos deixar claro que quando tratamos do Ego estamos falando do foco central de nossa vida consciente, ou seja, de nossa energia central voltada aos nossos hábitos e instintos de preservação. Em sua generalidade é através destes instintos de posse, proteção, do- minância e preservação é que tendemos a agir quando estamos vinculados intimamente com nosso Ego. Quanto mais primitivo e desestruturado nosso Ego, ou melhor, nossa consciência, mais vulneráveis estaremos a esses me- canismos que tem como intenção nossa defesa frente a tudo e a todos que nos ameaçam de alguma forma. Nosso propósito nesta etapa é conseguirmos juntos enxergar onde po- demos estar vulneráveis e agindo cegamente sem a clareza e honestidade da autocrítica e autoanálise. Os mecanismos de defesa que tentaremos nos aprofundar agora são: Compensação: para compensar algum defeito ou fragilidade, cos- tumamos desenvolver outras aptidões. Ex.: timidez compensada por intelectualidade ou desorganização compensada por desapego. 114 Renato Lessa PeReiRa Não é raro criticarmos usando essa aptidão desenvolvida. O Ego acredita que tal aptidão o isenta da necessidade de desenvolver o que não está bom em nós. 1. O que você tem evitado aceitar que precisa de melhoria em você? 2. Consegue detectar alguma fragilidade de aptidões em algum setor de sua vida? 3. Consegue perceber se não está se escondendo atrás de uma Persona dotada de alta capacidade em algo para esconder ou- tra vulnerabilidade? 4. Cada vez que se depara com algo que precisa melhorar em você costuma dedicar mais atenção a uma potencialidade sua tornando-se ainda melhor em algo que já é bom o bastante? 5. Você tem observado se não tem criticado pessoas pelo defeito que tem compensado? 6. Você já consegue responder se está compensando algum(ns) defeito(s) escondido(s) por outra(s) qualidade(s)? 7. Você tem a impressão de que tornar-se muito bom em algo o isenta da responsabilidade de tentar corrigir algum defeito ou comportamento inadequado? Queremos deixar claro que não há problema algum em possuirmos e assumirmos que temos algum defeito ou fragilidade, muito pelo contrário, tomarmos conhecimento disso e aceitarmos sem estratégias de compen- sação nos dará a motivação para superarmos ou simplesmente nos trará paz para não nos penalizarmos em detrimento do que ainda não temos desenvolvido. Deslocamento: quando sentimos raiva ou animosidade contra algo ou alguém, e as circunstâncias não permitem nos expressarmos, nos- so Ego costuma deslocar-se para reações com violência a objetos ou pessoas não envolvidas na problemática. Ex.: impulsão por alimen- tos ou quando “descontamos” em nossos filhos, pais ou companhei- ros nossas frustrações no trabalho. Nesse processo de “descontar- mos” acabamos por utilizar críticas destrutivas e destemperadas. 115 O POder dO AutOCOnheCimentO 1. Tem enfrentado alguma circunstância em sua vida que tem lhe trazido muita raiva contra alguém ou algo? 2. Consegue perceber se não tem agido sem paciência com as pessoas à sua volta? 3. Quando se sente frustrado ou com raiva costuma consumir mais alimentos? 4. Costuma chutar, socar ou atirar objetos quando está irritado e/ou algo não sai da forma como desejado? 5. Caso viva alguma circunstância onde se sente submisso, você consegue perceber se não age de forma autoritária com as pessoas à sua volta? 6. Caso você dirija, seu padrão de comportamento torna-se mais agressivo no trânsito? 7. Existe alguma atividade em sua vida para onde você esteja deslocando sua raiva de forma desproporcional como, por exemplo, nos esportes? É muito natural estarmos em situações que nos trazem descon- tentamento e ira em nosso dia a dia. O centro da questão aqui não é sen- tir ou não a ira, mas a canalização errada da mesma em pessoas, coisas e situações que não estejam vinculadas com a origem do desagrado. Podemos perfeitamente eleger atividades de output que nos ajudem a canalizar essa energia sem deslocá-la equivocamente. Os esportes, atividades de relaxamento, meditação, psicoterapia, entre outras, são ferramentas para nos ajudar nesse processo. Fique atento especialmente nos esportes, utilize essa energia para correr mais e aumentar seu desempenho, mas não confunda com exagerar na com- petitividade, que pode levar a choques físicos prejudiciais a todos. Projeção: necessidade de combaternos outros aquilo que é de- sagradável em nós mesmos. Aquilo que não admitimos ou des- conhecemos (Sombra) de negativo em nossa essência. Também ocorre com qualidades e potencialidades que gostaríamos de ter e vemos em outras pessoas. Ex.: existem pessoas que nos inco- modam muito quando estão por perto ou algumas caracterís- ticas de nossos filhos que nos irritam profundamente, nossas críticas geralmente mostram essa projeção defensiva. 116 Renato Lessa PeReiRa Poderíamos dizer que esse é um dos mais prejudiciais mecanismos de defesa que corrompe a humanidade e suas relações. Tomar co- nhecimento desse mecanismo faz toda a diferença em nossa forma de ver o mundo e as pessoas. 1. Tem alguma(s) pessoa(s) que lhe incomoda(m) muito quando estão perto de você? 2. Existe algum tipo de comportamento ou defeito específico que não suporta e sempre critica nos outros? 3. Você considera que não possui esse tipo de comportamento que lhe incomoda profundamente? E se você também tivesse isso dentro de você, como reagiria? 4. Quando vê alguém com comportamentos muito éticos, bondo- sos e fraternais sente-se desconfiado? Como se sente diante de pessoas que possuem muitas qualidades? 5. O que você mais admira nos demais? Acredita que também tem isso dentro de você? 6. Consegue admitir que pode estar projetando conteúdos seus não reconhecidos e não aceitos nessas pessoas que têm dificul- dades de integração? Aqui é muito importante não confundirmos com os temas relativos aos complexos de inferioridade e de superioridade. Queremos ajudá-lo a descobrir se não está projetando alguns dos conteúdos importantes de seu ser real. Não queremos dizer também que deve aceitar com naturalidade os piores comportamentos de algumas pessoas. O fato é que é preciso extrair dessas relações que parte é sua e não do outro. É obvio que lidar com pessoas consideradas tóxicas, maldosas e com comportamentos fal- sos jamais será prazeroso. Contudo, saber detectar em você onde podem estar também essas características positivas e negativas é fundamental para encontrar o en- dereço de sua alma e conseguir amar-se do jeito que é, sem maquiagem e sem adereços decorativos. Além disso, você perceberá que não se sentirá mais tão impactado diante dessas pessoas que lhe incomodam tanto. Investigue, analise e busque o corpo a corpo com esses pares que despertam esses incômodos 117 O POder dO AutOCOnheCimentO em você. Temos certeza que lhe ajudará muito em seu autodescobrimen- to e vai presenteá-lo com novas aptidões de equilíbrio, imparcialidade, compaixão e empatia. Introjeção: achamos que as qualidades das pessoas, ou dos filhos, nos pertencem. Ex.: criticamos filhos de outras pessoas como se as características dos nossos nos pertencessem. Às vezes, introjeta- mos características de pessoas que admiramos e heróis, pensando que somos a “Persona” que estamos usando, e temos a falsa im- pressão de que isso nos coloca em posição de juízes. Nesse meca- nismo de defesa, a “Persona” é o tema central. 1. Você costuma copiar comportamentos e atitudes de pessoas que admira? 2. Acredita tornar-se uma pessoa melhor quando age imitando seus “heróis”? 3. Acredita-se superior por pertencer a algum grupo de destaque? 4. Critica ou compara pessoas que não possuem características consideradas positivas que seus amigos, filhos, companheiros e/ou familiares possuem? 5. Consegue perceber se não tem julgado outras pessoas por ca- racterísticas que você também não possui? 6. Já consegue detectar se não tem confundido uma Persona que utiliza com o seu verdadeiro eu? Esse mecanismo de defesa tem particularidades no mínimo sinis- tras, porque cremos que é possível simplesmente possuirmos uma ou diversas qualidades através de uma inserção forçosa das mesmas. O fato é que virtudes e qualidades precisam ser desenvolvidas, trabalhadas e aprimoradas. Não é porque atuamos como detentores de um grupo de qualidades que as possuímos na prática. É preciso muito cuidado para não vincular-se com a Persona acre- ditando ser o que não é em essência, o que fatalmente nos levará a um distanciamento de nossas almas. Não tarda e as patologias surgem como grandes juízes e corretores dessa invenção criada pelos reféns desse mecanismo. Portanto, lembre- -se e analise se não tem introjetado conteúdos que não são seus e que lhe 118 Renato Lessa PeReiRa dão a enganosa sensação de tornar-se melhor ou um juiz dos demais que não fazem parte de seu clã e/ou também estão aparentemente desprovi- dos das características que introjetou. Racionalização: quando achamos motivos lógicos e aceitáveis para pensamentos e ações inaceitáveis. A razão e o intelecto nos afastam do eu profundo (Self). Podemos dizer que é um dos piores, senão o pior, dentre os mecanismos de defesa do Ego. É o meca- nismo das desculpas que usamos para não assumirmos nossa res- ponsabilidade pelos nossos erros. Criticamos muitas vezes usando essa racionalização. Ex.: o que os ditadores ou líderes radicais conseguem de aprovação quando apresentam motivos racionais e lógicos para explorar a “sombra” coletiva de um grupo ou povo. 1. Tem o hábito de encontrar desculpas para suas ações que não surtiram o resultado esperado? 2. Costuma penalizar pessoas através de um julgamento lógico punitivo quando executam algo que lhe desagradou? 3. Tende a buscar justificativas para comportamentos equivoca- dos? 4. Tem dificuldade em admitir seus erros perante os demais crian- do estratégias de convencimento próprio? 5. Utiliza mentiras corriqueiras como justificativas de suas im- perfeições? 6. Acredita que os fins justificam os meios? Se a vida machuca você é possível que busque as mentiras por- que são um dos lugares mais acessíveis para onde os sobreviventes se escondem. Elas trazem uma sensação efêmera de segurança, um local onde você acredita que só é necessário contar consigo mesmo. Contudo, trata-se de um lugar lodoso, fétido e muito escuro que vai a qualquer momento forçá-lo a buscar a luz e a oxigenação vital da verdade. Agora creio que um “nó” será dado em sua cabeça. Tenha calma que juntos e mantendo o foco conseguiremos desatá-lo. O ponto aqui é que se estiver sofrendo deste sorrateiro e potente mecanismo de defesa, ele acabará por criar desculpas para que suas respostas não sejam verda- deiras. Percebeu como é complicado? É preciso afastar-se um pouco e 119 O POder dO AutOCOnheCimentO buscando serenidade tentar analisar se não tem sido refém desse defensor traiçoeiro. Estamos falando basicamente do sistema que nos difere no reino animal, a razão. Assim, jamais subestime esse mecanismo de de- fesa porque ele sozinho é capaz de causar uma dinâmica consistente de autoengano e pode deixar você correndo em círculos. Uma estratégia bastante eficaz para ter um espectro mais trans- parente é o diálogo sincero com pessoas que fazem parte de seu grupo afetivo. Lembra-se da Janela de Johari que vimos em etapas anteriores? Pois então, talvez ali já estejam alguns sinais que podem presenteá-lo com o descobrimento ou facilitar o desmascaramento dessa ferramenta do Ego. É um desafio respeitável não ser vítima da racionalização, afinal somos seres racionais e isso por si só já nos coloca à mercê da construção de ideias que visam nos proteger a qualquer custo. Temos de estar atentos para não acreditarmos que erros graves po- dem ser justificados por ações externas ao nosso controle. Estamos assis- tindo nos dias de hoje um mundo repleto de impasses ideológicos, riscos diplomáticos e guerras localizadas justificadas por erros do passado ou pelo medo, uma ilusão óptica onde todos têm razão e ninguém tem razão, afinal existem lideranças que conseguem encontrar motivos lógicos para perpetuação do ódio e da vingança. Faça constantemente o exercício de questionar como você julgaria a situação se outra pessoa realizasse o mesmo comportamento que você. Repressão ou recalque: fazemos questão de esquecer coisas desa- gradáveis, escondemos aslembranças incômodas e emoções do- lorosas. Afastamos essas experiências desagradáveis da consciên- cia e as transformamos assim em um material reprimido na alma (psique). Esse mecanismo pode nos levar à crítica e a autocrítica destrutiva de forma inconsciente. Ex.: as pessoas querem esquecer o bullying que sofreram quando crianças e adolescentes ao invés de ressignificá-lo/recontextualizá-lo. 1. Costuma evitar a lembrança de coisas desagradáveis? 2. Consegue perceber se não criou um sistema de fuga para os assuntos que não lhe são agradáveis? 3. Tem facilidade para guardar rancor? 4. Já teve ou tem vontade de simplesmente apagar determinadas experiências de sua vida? 120 Renato Lessa PeReiRa 5. Tem dificuldades para desabafar? 6. O que você não consegue perdoar em sua história? 7. Sente vergonha de alguma fase de sua jornada até aqui? 8. Quais são as lembranças que luta para bloquear em sua mente? Poderíamos falar bastante sobre esse tema em específico, um dos alicerces das teses de Sigmund Freud. Não adianta esconder tudo aquilo que não foi bom em um cofre mental, esse conteúdo precisa ser revisto, trabalhado e ressignificado, caso contrário será um potencial portador de patologias e transtornos psicológicos. Nessa etapa, o que queremos dei- xar claro é como esse mecanismo de defesa pode estar presente em sua vida sem que tenha se dado conta. Via de regra o objeto do processo de recalque torna-se inconsciente com o passar do tempo. Uma vez que, como já falamos, o Ego é absolutamente relacio- nado à segurança e proteção, nada mais conveniente do que querermos fugir daquilo que nos incomoda, que nos faz sofrer. Se você quer a pro- messa de uma vida totalmente sem dor, isso não existe. Nada errado e é lícito querermos tirar um espinho da carne, mas tratando-se da mente humana, não funciona de forma tão prática. Exercitar o esquecimento de uma experiência negativa sem o trabalho necessário para significá-la é jogar a sujeira embaixo do tapete. Se dedicarmos nossa atenção ao sofrimento, sempre poderemos compreender alguma compensação no mesmo. Jamais devemos descon- siderar a maravilha de nossas lágrimas que podem ser águas curativas e uma inolvidável fonte de alegria. Não poucas vezes são as melhores palavras que o coração pode falar. Vai chegar a hora onde esse conteúdo reprimido virá à tona e co- brará sua análise. Muito comum nos traumas que acumulamos durante a vida, a repressão ou recalque é como um barril de pólvora. É extrema- mente importante que percebamos se não estamos sendo conduzidos por hábitos de conduta onde fingimos que algo de nossa biografia simples- mente não existiu. Que fique claro que em contrapartida não devemos inflar nosso complexo de vitimização remoendo ou revivendo as expe- riências ruins em uma maratona sem fim, uma coisa independe da outra. A proposta aqui é que, a cada vivência desagradável, você dê o tempo necessário para digerir a mesma, questionando o que de positivo ela trou- xe e qual o aprendizado pode extrair dela. 121 O POder dO AutOCOnheCimentO Regressão: retornamos a um nível infantil diante de problemas e conflitos. Ex.: pessoas que se infantilizam quando ficam doen- tes pensando que somente serão “cuidadas” se ficarem doentes, criticando os demais pela falta de atenção ou tudo ao seu redor, cedendo à sua necessidade de vitimização. 1. Costuma utilizar diminutivos ou apelidos infantilizados em seus relacionamentos afetivos? 2. Quando fica doente ou indisposto faz voz ou trejeitos de criança? 3. Tem o hábito de consumir alimentos que gostava quando era criança em momentos de tensão ou angústia? 4. Faz birras em seus relacionamentos? 5. Considera-se uma pessoa mimada? Imaginamos que à primeira vista pareça um tanto “piegas” ou até infantil falarmos sobre esse tema. Contudo, pedimos que acredite que os comportamentos ligados a esse tipo de defesa são muito mais comuns do que parecem. Precisamos olhar nas entrelinhas para desco- brirmos isso dentro de nós. Não se trata apenas de hábitos que se ex- teriorizam, mas também de pensamentos imaturos que dominam nossa consciência diante de qualquer contexto que afronte nossa segurança e conforto. Novamen22te podemos citar o complexo de vitimização inflado como um possível potencializador dessas defesas que buscam retomar às vistas a criança abandonada e indefesa não trabalhada e não acolhida dentro de nós. Também não é nosso desejo polemizar e imaginar que um deter- minado jeito carinhoso um tanto infantilizado de falar com nossos pa- res seja apenas um escudo protetor, mas vale sempre o alerta para iden- tificar se não estamos sendo passíveis desta regressão infantil quando algo não nos agrada ou demanda esforço para correção. Um antídoto potente para a superação dessa ferramenta defenso- ra é assumirmos a responsabilidade pelos nossos atos e tomar as rédeas de nossas vidas, fortalecendo nosso sistema de crenças através da per- severança e da resignação. 122 Renato Lessa PeReiRa Comedização: tentamos fazer piada ou satirizar situações e con- teúdos que nos incomodam na tentativa de suavizar o episódio, para evitar nos aprofundarmos no tema da discussão e/ou na ten- tativa de não deixar transparecer nosso real incômodo. 1. Costuma criar piadas no momento que um tema delicado para você é mencionado? 2. Em ocorrências que poderiam trazer alguma tensão costuma previamente utilizar personas extremamente sorridentes? Ou então, busca fazer uso de frases engraçadas? 3. Costuma tentar fazer imitações engraçadas de pessoas de que não gosta? Esse é um item que cremos ser difícil de encontrar material ade- quado em outras obras e teses porque vem de um processo de observa- ção e experimentação nas rotinas próprias de análises que realizamos. É muito importante não confundirmos a virtude de levarmos a vida com leveza, vermos graça onde ninguém mais vê e buscarmos lados positivos nas circunstâncias da vida, com a comedização que expomos como um mecanismo de defesa do ego. Para diferenciarmos é simples, basta que percebamos se estamos fugindo ou tentando minimizar o incômodo que sentimos diante de uma determinada experiência. Não temos a pretensão de limitar os mecanismos de defesa do Ego apenas nesses que expusemos, porém, sob nosso ponto de vista, cremos que sintetizam muito bem esse conjunto de manobras que geralmente realizamos e que nos afastam de nós mesmos. Nessa fase temos certeza de que já pode perceber como as etapas até aqui se entrelaçam. As perguntas são estratégicas e pensadas de for- ma que seja criada uma intersecção que encontre as senhas necessárias para explorar sua sombra. Muitas vezes pode parecer que se repetem, e na verdade tivemos essa intenção com pequenas e sutis alterações na busca de transpor as primeiras e automáticas respostas do Ego. Tomar conhecimento dos mecanismos pode fazer toda diferença na forma como nossas relações se desenvolvem e se tornam prazerosas e construtivas, além de remover um pouco mais das camadas que turvam nosso olhar na busca do diamante escondido. 123 Os gigantes da alma É, meu caro amigo leitor, o nome é forte e assusta um pouco, não é verdade? O fato é que nós trazemos em nosso mundo psíquico um estrondoso acervo de energias e padrões que não pedimos para ter, ou melhor, faz parte da nossa essência como ser e nos cabe a tarefa de conhecê-lo e aprender a administrá-lo durante nossas jornadas. Por que os chamamos de gigantes? Você vai entender rapidamente durante a leitura desta etapa e tenho certeza que acabará concordando co- migo. Esses “gigantes da alma” podem ser avassaladores em nossa exis- tência se não optarmos pela trajetória de entendê-los e descortiná-los do mundo de ignorância que possuímos acerca de nós mesmos. Vou começar por um dos que acredito ser o mais traiçoeiro e pode tirar de nós a beleza de nossas mais belas ações. Vamos lá? Necessidade de valorização Responda com sinceridade, quem não gosta de ser valorizado? Recordo-me de minhas experiênciasinfantis onde são incontáveis as quantidades de momentos onde ouvi e presenciei cenas familiares total- mente temperadas por esse terrível gigante. Fecho os olhos e vem à minha mente e ouvidos: “Vocês só vão dar valor no dia que eu morrer?”. Essa é apenas uma das frases que contem- plam minha história juvenil e tenho quase certeza que você também deve ter algumas dessas frases colecionadas em suas experiências mais precoces. Certo dia peguei-me dizendo a mesma coisa aos meus filhos, uma frase diferente, mas que trazia em sua característica subliminar a mesma necessidade de cobrar uma valorização pelo que eu “acho”que deveria representar para eles. 124 Renato Lessa PeReiRa Na obra Formando Seres Integrais pude explicar com mais deta- lhes os padrões que herdamos e cegamente transferimos incansavelmen- te aos nossos filhos e aos nossos pares de convivência. Não cessariam os exemplos onde posso simplesmente cansá-lo com tamanha a quantidade que detectei em minha própria jornada de autoconhecimento. O mais importante é detectarmos quando é que estamos servindo a esse gigante. Quando e o que estamos fazendo para sermos valorizados em nosso dia a dia? Qual é o grau de carência que trazemos nesse momento e que tem conduzido nossas ações? Perceba que a carência está diretamente ligada e serve de poderoso adubo à necessidade de valorização. Na verdade, quando nosso Ego ain- da se encontra imaturo, e não me refiro à idade, busca constantemente o destaque e a aceitação de nossos companheiros de existência. É preciso força e audácia para doutrinar esse poderoso gigante que consome grande parte dos ídolos do mundo de hoje. Perceba dentro de você se não tem sido vítima e utilizado habil- mente comportamentos para que seja valorizado. Você sente necessidade de chamar a atenção alheia? Você cobra a valorização dos outros pelos seus atos? Tenha cuidado também para não passar despercebido se esse gi- gante não está sendo a estrela principal de seu complexo de vitimização. Nesse momento você já tem condições de detectar essa simbiose psíqui- ca que se retroalimenta continuamente, sugando suas energias e transfor- mando você em um verdadeiro zumbi servil que se move sedento pela consideração e valorização alheia. Desperte o quanto antes, a única pessoa que na realidade precisa valorizá-lo é você mesmo. Não se iluda de que encontrará fora o acon- chego e admiração que só pode brotar de dentro. Se eu não me conheço ou reconheço, acabo buscando tal reconhe- cimento fora, no outro, vivendo para o externo tornando-me totalmente refém de minhas Personas, o que, como já vimos, poderá levar à total dissociação do que realmente sou e punindo com conflitos e transtornos psicológicos dos mais diversos. A necessidade de valorização nos faz buscar e viver o que não somos, afastando-nos do processo de individuação e integralidade, sim- plesmente para agradar os outros. 125 O POder dO AutOCOnheCimentO Responda para si mesmo: “O que existe por trás das minhas me- lhores intenções?” Não queremos dizer que sua postura deva ser egoísta ou viver sua vida de forma egocêntrica. Fatalmente em suas melhores intenções existirá uma considerável fatia que serve a esse gigante, mas certamente não é a única potência executora que lhe move diante das tarefas que buscam o bem coletivo. Mesmo encontrando a necessidade de valorização por trás de suas “boas ações”, não deixe de fazê-las, apenas perceba sua existência e não se mutile emocionalmente para ser valorizado pelos demais. É nesse ponto que creio que o autoamor e a autoaceitação fará sua parte e ajudará você passo a passo a educar esse gigante para torná-lo um aliado e não mais um algoz. A inveja Como é dolorido descobrir que somos invejosos por natureza. Como prometemos anteriormente na etapa que falamos sobre a Sombra, agora é a hora de encararmos esse gigante de frente. Possivelmente você sentirá dificuldade em admitir isso e esse con- teúdo quase sempre está na sombra de todos nós. Costumamos negar a inveja. Sim, bem-vindo ao mundo onde a inveja é reconhecida e acolhida. Não importa o que você aprendeu ou ouviu até aqui. Tampouco se lhe dis- seram que isso é muito feio e você não pode sentir. Para ilustrar um pouco melhor esse item polêmico, quero rapida- mente levar ao seu conhecimento algumas pesquisas científicas na área da neurociência onde se pôde detectar que quando vemos pessoas que co- nhecemos postando em suas redes sociais momentos de felicidade, ou de aparente felicidade, a área de nosso cérebro que primeiro é acionada é a ligada à dor. Isso mesmo. Evidentemente que não quer dizer que não amemos verdadeiramente e que não fiquemos também felizes quando temos ciên- cia que nossos afetos estão felizes. O fato é que essa formação arquetípica e instintiva que possuímos tende a nos comparar imediatamente ao que vemos, e assim somos presas fáceis da insatisfação, especialmente quando estamos em um momento atribulado, difícil, e, podemos dizer, infeliz. 126 Renato Lessa PeReiRa Você não é pior por detectar e perceber a inveja dentro de seu mundo emocional. Há muito a ser discutido e esmiuçado nesse gigan- te que avaliza sua existência. Não apenas nosso instinto de competição relacionado ao nosso cérebro primitivo (veja também capítulo que trata sobre isso na obra Formando Seres Integrais), não apenas nosso medo de rejeição relacionado à nossa necessidade humana de pertencimento e não apenas nosso orgulho e vaidade são temas exclusivos no debate da inveja. A tal inveja, ou melhor, por definição, o tal desejo do mal alheio em virtude de detectar algo que não sou ou não tenho e vejo no outro, flerta consideravelmente com a necessidade de valorização que você já conhece. É preciso lutar com a necessidade de valorização e focar no au- torreconhecimento, na autovalorização, para termos êxito no controle e enfraquecimento da inveja. A inveja é proporcional ao grau de desvalori- zação que cada um de nós possui. Essa energia que nomeamos de inveja, na verdade, pode tornar-se uma forte aliada quando conseguimos canalizar sua energia para a admi- ração e espelhamento de condutas e virtudes que gostaríamos de possuir. Quando temos consciência podemos transformá-la na faceta da cobiça. Calma, entendo que é outra palavra que dá arrepios por conta de tudo que já ouvimos por toda nossa vida. Afinal, a cobiça é um pecado, certo? Mas e se você mudar o ponto de vista e vincular essa tal cobiça com ambição? Você consegue perceber a diferença? Ambicionar tam- bém é arquetípico no ser humano e é o estopim para alcançar o que de- sejamos, além de ser uma peça fundamental em qualquer processo de autotransformação. Aprendendo a identificar esses sentimentos você poderá partir para a tríade: “Decisão, estratégia e trabalho”. Isso possivelmente fará de você um conquistador preparado para conviver e aprender com os alvos de sua admiração, ao invés de sofrer. Lembre-se que você possui tudo isso dentro de você. Como vimos na etapa da sombra, só detectamos tais virtudes nos demais porque já as possuímos em gérmen ou estão apenas adormecidas dentro de nós. Além disso, por trás da inveja relacionada ao sucesso financeiro e de posse de bens materiais, está o medo de sobrevivência e/ou a ne- cessidade de destaque que serve ao orgulho e vaidade corrosiva. Perce- 127 O POder dO AutOCOnheCimentO ba que esse processo de conquista não acaba nunca porque quando conseguir o que desejava, como, por exemplo, aquele carro igual ao do seu vizinho ou chefe, logo já mudará seu foco para outro bem “invejado”. É uma luta inglória na busca de um preenchimento que jamais será alcançado. O cerne da questão é mais profundo e geralmente está relacionado com fatores que transcendem muito a superficialidade apa- rente do ter para ser. Tratando-se da inveja, o nosso valor está sempre onde nós não estamos, consegue perceber? Deslocamos nosso valor para o que não temos ou acreditamos não ter, acabamos tendenciados aoegocentris- mo. Passamos a acreditar que nosso valor é ter. Quando estamos sufocados por esse gigante nos distanciamos de nosso potencial criativo e não vemos caminhos para superar nosso ego- ísmo para compartilhar o que somos com o mundo. Cuidado também, não é raro em consultórios nos depararmos com pessoas que dizem que se sentem muito invejadas. Por trás desse padrão de comportamento está o orgulho. Se me acho invejado é por- que sou orgulhoso. Muito mais atentos precisamos estar aos filhos da inveja. Isso mesmo, dentre eles podemos apresentar a fofoca, a calúnia e muitos outros. O próprio complexo de poder flerta também com esse gigante, uma vez que o desejo de diminuir ou destruir o outro serve a essa ne- cessidade de definir a vida alheia para nosso conforto egoísta. Pare, pense e reflita. De quem você sente inveja? Do que você sente inveja? Por que acha que sente essa inveja? Quando é que conscientemente ou até mesmo inconscientemente deseja o mal de alguém que machuca seu orgulho? Quando é que realmente sente admiração? Já fez alguma fofoca ou calúnia sobre alguém? Por que acha que fez isso? Qual é sua postura diante de alguém que tem ou é aquilo que você deseja? O que você quer ter? Para que você quer ter? Por que você quer ter? O que você quer ser? Para que você quer ser? Por que você quer ser? 128 Renato Lessa PeReiRa Vamos lá, tenha coragem. Não passe simplesmente por essas etapas e perguntas. O universo mostra uma misericórdia que de certa forma não permite que tenhamos o que não devemos possuir ainda. Po- demos assumir a postura e fazer a escolha de desejar ser o que vemos de bom nos demais, evoluindo sempre com humildade e esperança. A culpa e a lamentação Sob o prisma psicanalítico, podemos dizer que algo que fizemos de ruim passa despercebido às vezes pelo Ego, mas se calcifica na consciên- cia maior, no inconsciente. A culpa é como se fosse um desacordo entre nosso Ego e o nosso eu maior, o Self. A culpa é poderosa e se enraíza em nosso psiquismo drenando uma grande parte de nossa potência vitalizadora. Quem de nós não carrega consigo culpas por erros e desacertos do passado? Há quem diga que não sofre desse mal. Pela experiência podemos dizer que algo de muito errado está ligado a esse tipo de autodiagnóstico, como até mesmo indícios de psicopatia. Esse gigante está diretamente ligado aos choques entre nossas ações e escolhas contra o sistema de crenças e valores que formamos em nosso processo de desenvolvimento humano. Certamente ações que trazem grande culpa para uns não serão nem um pouco significativas a outros. Na obra de James Hollis, Os Pantanais da Alma, James chega a concluir que a culpa seja inclusive existencial. É como se sentíssemos culpa até mesmo por existir, ou melhor, não sabemos sequer o motivo. Podemos usar um pouco a imaginação e considerar que enquanto não vivemos de acordo com as regras e leis que regem o universo em que estamos inseridos, sentiremos fortemente essa cobrança exaustiva. Podemos ir um pouco mais fundo e fazer uma visita ao nosso tem- po infantil onde fomos apresentados a esse gigante. Tanto quanto con- frontamos nossos pais e/ou quando rompemos com os valores familiares, a culpa vem à tona como um verdadeiro tornado emocional. Seria irresponsável aqui não destacar que esses valores familiares precisam ser questionados efetivamente e não necessariamente devem ser objeto de culpa, precisam ser ressignificados e recontextualizados. 129 O POder dO AutOCOnheCimentO Não são raros os casos que encontramos em consultórios onde detectamos pessoas que trazem significativa fonte de culpa por não escolherem a profis- são desejada pelos pais ou não atenderem às expectativas de seus genitores e/ ou educadores. A jornada do autoconhecimento é a estrada para a totalidade, para a integralidade e certamente levará ao afrontamento e rompimentos das regras que nos foram apresentadas e muitas vezes impostas. Somos em parte tam- bém produto do meio, mas não devemos viver de acordo com o que o meio deseja de nós. Quais são as culpas que você carrega dentro de si? Que valores ou crenças foram rompidos? A quais expectativas você não corresponde ou correspondeu? Quanto isso lhe traz de culpa? Sente-se culpado por ser quem é de verdade? A culpa está presente quando age de acordo com seu próprio desejo? O que pode estar por trás desse sentimento? Queremos ir um pouco adiante e detalhar rapidamente o ciclo da culpa. Diante de um desacerto ou ação que afronta nossos valores, sentimos a culpa propriamente dita, isso é um bom sinal, afinal só sente culpa quem está em pleno processo evolutivo moral. É a velha criatura digladiando com a nova. Se ficarmos presos apenas à lembrança do erro, estaremos fadados a reviver a angústia tenebrosa temperada pela autocobrança e autopenalização. Na prática, ficar nesse ponto, ou seja, cristalizar a culpa trazida pelo erro, não trará nada de positivo a você e certamente o levará a problemas maiores que podem e possivelmente afetarão até mesmo sua saúde. É infantilismo se paralisar. Parar na culpa pode ser “desculpismo”. Culpar-se não repara, só desperta. A etapa seguinte do ciclo reparador da culpa é o arrependimento. Al- guns podem chamar também de remorso, isso não vem ao caso na verdade e não muda necessariamente a proposta que tentamos apresentar a você. No ar- rependimento identificamos o erro. Essa identificação exigirá que superemos o orgulho que geralmente nos leva à formação de desculpas e justificativas para nossos equívocos. Não é que você não deve analisar tentando encontrar as razões que o levaram ao erro. A análise e questionamento são extremamente sadios e vão auxiliá-lo na jornada de autodescobrimento. Identificada a culpa, nasce o caminho obrigatório de se autoperdoar sem punição, nem qualquer justificativa doentia, apenas realizando uma es- colha de “digestão” psicológica da falta. 130 Renato Lessa PeReiRa Fechando o ciclo temos a reparação. É através desse último que conseguimos superar a culpa. Atingimos a reparação compensando os alvos de nossas faltas pelo transtorno e prejuízo causado pelo nosso equívoco, e quando não é possível, através da modificação de nossas ações e escolhas equivocadas a partir do momento que as descobri- mos. Quais comportamentos têm feito você sentir-se culpado? O que você acha que pode fazer para liberar-se de suas culpas? Em qual etapa do ciclo da culpa você está? O que falta para você começar o processo de reparação? Nunca se esqueça que os erros fazem parte da nossa jornada. Perdoe-se e liberte-se da culpa imediatamente, corrigindo e ressig- nificando as falhas do passado. A liberação da culpa é a aceitação da responsabilidade pelas consequências da própria escolha, por mais inconsciente que o episódio tenha sido. A culpa tem uma (apenas uma) boa função, que é a de despertar a consciência. Todas as vezes que você exerce o perdão, seja a si próprio ou aos demais, o universo muda. Cada vez que você estende a mão e toca um coração ou uma vida, o mundo se transforma. Aproveitamos essa mesma etapa para tratar em linhas gerais sobre a lamentação. Perceba que a lamentação é o que nos prende ao início do ciclo da culpa onde nos mantemos insistentemente lamen- tando o erro que cometemos. Não para por aí, a lamentação por si só é um outro gigante da alma que merece respeito por conta do impacto negativo que causa em nossas vidas e na vida das pessoas que dividem a meta conosco. Quando estamos no padrão de lamentação desconsideramos completamente uma das mágicas do bem-estar e felicidade, a grati- dão. Perceba que quem se lamenta raramente agradece. É outra “ener- gia” que suga nossas energias. A psique humana é extremamente complexa e não seria pouco dizer que trata-se de uma enorme colcha de retalhos onde gigantes e complexos interagem, gerando episódios conflitivos ou potencia- lizando uns aos outros. Não é raro vermos a lamentação andando de mãos dadas com a vitimização,tampouco é raro a lamentação estar em consórcio afetivo com outros complexos que já vimos. Lembre-se que os complexos são aglomerações de emoções ao redor de determinados temas. 131 O POder dO AutOCOnheCimentO A lamentação nos mostra a fragilidade e a infantilidade de nos- so Ego que apega-se à reclamação constante, ao invés de assumir a res- ponsabilidade pela mudança. Vemos isso constantemente na humanidade como um todo onde é fácil perceber que a maioria reclama sem fazer sua parte na correção dos problemas sociais. A lamentação irá aparecer também pelo não tratamento correto da culpa. Em linhas gerais, quem não trabalhou seu mundo afetivo cor- retamente, busca a vitimização, como já vimos anteriormente, e difi- cilmente não estará sequestrado pelo hábito da lamentação. As pessoas queixosas sempre tentam encontrar culpados por não quererem lidar com seus complexos. Do que você mais se lamenta? Que culpa você tem evitado assumir e tenta transferir a outros? Diante de algo que lhe desagrada, qual sua primeira reação? La- menta-se ou busca imediatamente a ressignificação? Consegue perceber se as lamentações não estão lhe impedindo de crescer em determinadas áreas de sua vida? Como se sente diante de pessoas que se lamentam constantemente? Acredita ser possível ter empatia e ajudar as pessoas que estão em processo contínuo de lamentação? A queixa é doença, é um espelho que reflete nossa insegurança e perturbação. Quanto mais nos queixamos, pior ficamos. Lamentar é escolher ser vítima para acalmar-se, transferindo a origem de nosso insu- cesso aos outros ou ao mundo sempre que for conveniente. Assim como vimos no complexo de vitimização, por trás das lamentações também pode existir uma grande carência. Quem prefere a lamentação ao esforço, pensando que as demais pessoas foram recompensadas sem possuírem mérito, faz a escolha de ser vítima de si mesma, evitando assumir o papel de principal ator de sua vida e triunfar sobre seus próprios limites. Responda a si mesmo: “Quando é que me queixo da vida?” e “De que responsabilidade estou querendo fugir?”. Lembre-se de que somos responsáveis pelas nossas escolhas e pre- cisamos sempre nos perdoar. A razão lúcida, ou melhor, a consciência ampliada faz a ponte entre o Ego e nosso eu superior. Não existem al- gozes, todos somos companheiros de jornada em uma grande obra exis- tencial. 132 Renato Lessa PeReiRa Raiva e ressentimento Comecemos pela raiva. Para falarmos com maior clareza sobre a raiva gostaria de fazer um testemunho pessoal sobre algumas situações que me causam raiva. É verdade que já causaram bem mais raiva no passado, mas acho relevante dividir com você algumas situações que geralmente despertam em mim esse gigante. Existem muitas ocasiões onde a raiva aparece em nosso dia a dia. Eu gostaria de citar em especial três situações. A primeira é quando algo ou al- guém me machuca fisicamente, seja de forma proposital ou não. Para mim a raiva aqui funciona como um sistema direto de autodefesa e que gera uma reação impulsiva capaz de gerar uma força contrária que pode retribuir a agressão. Costuma ocorrer de forma automática, quase um toma lá, dá cá. Felizmente após os últimos anos já consigo controlar quase todas as reações, mas confesso que, dependendo do dia, uma bela pisada na ponta do pé pode receber uma reação ostensiva verbal ou talvez um solavanco físico. A segunda é quando percebo alguém levando vantagem sobre os de- mais sem qualquer cerimônia, como alguém que “fura” a fila do banco ou que estaciona em fila dupla. Nossa, isso realmente é uma situação que mexe comigo e traz a raiva para minha administração racional. A terceira é quando percebo pessoas tentando boicotar meus projetos pessoais ou projetos de outros que, ao meu ver, seriam positivos para a cole- tividade. Percebo essa raiva em mim sempre que vejo, por exemplo, interes- ses políticos acima do bem-estar coletivo. Grupos e partidos que são contra qualquer ação que poderia levar ao bem-estar e melhora coletiva de um país porque amam mais seus próprios interesses de poder do que a possibilidade de um mundo melhor. Enfim, agradeço sua paciência por ter lido meu testemunho pessoal, mas saiba que não o fiz por acaso. A raiva é um fator de frequentes conflitos e que aparece subitamente, provocando grandes descargas de adrenalina em nossa corrente sanguínea, alterando o equilíbrio orgânico e principalmente o emocional. Trata-se de uma emoção primária que podemos dizer que tem vida au- tônoma. Temos de fazer um esforço verdadeiramente heroico para controlar e vencer a raiva. É preciso trazer para a consciência o conteúdo por trás dessa raiva, descobrir o que efetivamente está vinculado a ela e que potencia- liza nossas reações. 133 O POder dO AutOCOnheCimentO Aconselhamos a leitura da etapa que trata sobre o sequestro da amígdala em nossa obra Formando Seres Integrais. Lá você poderá ter maiores detalhes sobre o funcionamento dessa importante parte instin- tiva que reside em nossos cérebros. A raiva obscurece a razão e nosso discernimento e se não cuidar- mos dela podemos ser reféns do resultado impensado que produzimos em decorrência de seu ímpeto descontrolado. Ela precisa ser filtrada, treinada através do descobrimento das causas que trazem a mesma para nosso mundo cotidiano. O que te faz sentir raiva? Do que você tem mais raiva? Quando não consegue controlá-la? Já sentiu-se sequestrado pela raiva? Fez algo tomado pela raiva que jamais teria feito em estado normal? O desafio é não perdermos jamais nossa razão. Podemos e vamos sempre sentir a tal raiva, ela é também arquetípica e faz parte de nosso conjunto de ferramentas para sobrevivência. É outro pecado capital que aprendemos e possivelmente ouvimos repreensões acerca dela duran- te nossa educação. Temos de aceitá-la, temos de trabalhá-la buscando uma rotina de avaliação, reavaliação e ressignificação. É preciso, antes de tudo, assumir que sentimos raiva, faz parte de nosso processo evo- lutivo. Um alerta se faz necessário. A raiva instala-se com facilidade nas pessoas que perderam sua autoestima e possuem prazer na manutenção da imagem ou máscara que projetam, mas não pelo valor que dão a si mesmas. Então é mandatória a busca do autoamor, o resgate da auto- estima e o autoconhecimento para encontrarmos a paz interior que é o maior contrapeso à raiva. Outro ponto que achamos relevante mencionar é que quanto mais frustrações e decepções não ressignificadas, maior é a raiva acumulada dentro do ser. É preciso acolhimento da raiva para lidar com ela. Afinal é uma legítima reação da alma ao seu ferimento. Além disso, a raiva não é apenas uma parte de nosso sistema de defesa em nosso território psi- cológico como também é uma intimação vital que, quando percebida, pode conduzir à cura da alma. Perceba que nada que a sociedade define como negativo é na realidade ruim para nós, pois sob um novo olhar criativo pode nos con- duzir à cura e transformação interior. 134 Renato Lessa PeReiRa A boa notícia é que quando somos capazes de reconhecer a raiva, detectar sua origem, perceber seus efeitos acerca de nosso eu consciente, finalmente teremos em nossas mãos o necessário para nos libertar dos limites que construímos a nós mesmos até o presente momento. Você consegue usar sua raiva para superar seus limites? A raiva pode ser canalizada para auxiliá-lo na construção de novos desafios e projetos. É aquela energia que aduba nossa motivação e que nos desperta também para a colaboração na mudança para a melhora do mundo onde vivemos. Muitos a utilizam para alcançar melhores resulta- dos esportivos, outros para vencer medos e traumas do passado. E você? Onde está usando essa preciosa energia vital? Seguindo ainda pelo caminho das energias vitais, achamos impor- tante focarmos atenção agora em outro gigante da alma que caminha lado a lado com a raiva, o ressentimento. A raiva guardada e não trabalhada leva fatalmente ao ressentimen-to. Como o próprio nome já diz, sentir novamente. Assemelha-se a uma automutilação constante escolhendo sofrer ciclicamente os momen- tos que nos geraram sofrimento. Uma faceta muito perigosa em nosso mundo psicológico que nos levará a distúrbios contundentes e a doenças físicas. Muitos chamam de mágoa ou rancor, mas como já dissemos em assuntos anteriores, os nomes pouco interessam para nós. O que é nossa meta são as emoções e sentimentos que geralmente possuem percepções diferentes para cada um de nós. O sábio e ilustre escritor William Shakespeare certa vez disse que chorar sobre as desgraças passadas é a maneira mais segura de atrair ou- tras. Eu confesso que concordo com ele. Esse mesmo brilhante escritor disse que guardar ressentimento é como a experiência de tomar veneno esperando que o outro morra. Profundas reflexões que cabem ao tema que estamos apresentando para sua autoanálise. Quais são seus maiores ressentimentos? Quais são as experiências que provocam pesar e sofrimento quan- do você lembra delas? A filha dileta do ressentimento é a vingança. Um processo psíquico que corrói nossa essência tal como as traças fazem com as roupas guar- dadas. 135 O POder dO AutOCOnheCimentO É preciso lembrar que o problema somos nós e não os outros. Não é o que os outros fazem que me destroem e sim o que eu permito. Somos nós mesmos que permitimos que as ações externas nos impactem, e isso é uma escolha. Uma escolha idiota, convenhamos, mas que nosso ego ainda desestru- turado e infantil insiste em manter em nossas vidas. O complexo e o desejo de poder é muitas vezes o alimento de criar e manter o ressentimento. Não poucas vezes nos apegamos a esse ressentir. Queremos tudo do nosso jeito, o Ego inflado nos leva à raiva que não é aceita por esse mesmo Ego imaturo que não admite ser frustrado. O ressentimento também é fruto de falta de autoamor e uma projeção inconsciente da sombra psicológica dos conflitos que cada um de nós possui. A própria neurociência nos mostra que quando vivemos sem o perdão e nos mantemos nos padrões de raiva e ressentimento, uma grande descar- ga de adrenalina e hormônios, como o cortisol, é despejada constantemente em nossa corrente sanguínea, o que nos levará com o tempo a problemas e gravames físicos. Apegar-se à experiência de reviver o sofrimento é prati- camente suicídio, a memória não raras vezes pode ser uma companheira enganosa. Cabe a nós a tarefa de desmantelar o ressentimento primeiro, utili- zando a lógica do autoamor e do perdão, segundo, entendendo que também podemos ser a causa de ressentimentos a outrem. Em todos os casos, não é uma estratégia inteligente guardar esse verdadeiro lixo emocional dentro de nós. Libertemo-nos das algemas do ódio, da mágoa, do ressentimento e do rancor. Merecemos bem mais do que isso pode nos trazer. Lembre-se que os gigantes flertam uns com os outros e nos convi- dam através da autoanálise a usarmos estratégias similares para superá-los e encontrarmos paz interior através da autoaceitação e também da empatia para com os demais companheiros de tarefa. Quando nos queixamos demais alimentamos ressentimento. O que falta para você se libertar das mágoas que carrega dentro de si? A melhor forma de compensar os danos que você permitiu que cau- sassem a você é trabalhar essas experiências através da ressignificação cons- tante de que somos todos humanos e estamos em momentos de percepção diferentes. Não se trata de esquecer as experiências que lhe trouxeram feri- mentos, isso seria um problema de memória ou recalque sombrio, mas de avaliar os danos que o ressentimento e a raiva da vida ou dos outros traz a você. 136 Renato Lessa PeReiRa Não há algozes, há escolhas, erros e desacertos. Sempre é hora de reconstruir os alicerces que nos mantêm prontos para os embates da vida. Recorde que quando falamos sobre culpa pudemos perceber também que muitas vezes podemos ser o objeto do ressentimento alheio. Preparado para expulsar de você os algozes que criou? Os gigantes vão sucumbir com o despertar da consciência e o pas- so mais importante você já está dando, o maravilhoso e poderoso proces- so de autoconhecimento. Sempre se pergunte, investigue-se. Temos de nos aceitar e nos autoamar com todas nossas qualidades e defeitos suspendendo o chicote da autopunição, sempre fazendo uso do autoperdão e elegendo a jornada de reconhecimento e melhora contínua como a bússola de nossa existência. De tudo que já tive a oportunidade de ver na vida, o amor, que é o maior gigante da alma, em minha opinião, pode dizimar todos os outros gigantes nocivos. Esse gigante é tão importante que merece obra específica para sua contemplação. Para não perder a ocasião favorável e encerrar essa etapa já nos preparando para a próxima, novamente po- demos utilizar uma referência do nobre escritor William Shakespeare: “Quando fala o amor, a voz de todos os deuses deixa o céu embriagado de harmonia”. 137 Crenças e valores No que você acredita? O que realmente tem valor para você? Chegamos aqui talvez ao que seja o ponto máximo desta obra, onde muitas peças se encaixarão e você poderá ter um panorama muito mais preciso de quem você é de verdade. Muitos estudiosos, pesquisadores e pensadores já divagaram exaustivamente sobre esse tema valioso que nos contempla como seres racionais. Por trás de cada comportamento nosso é possível detectar uma ou mais crenças inseridas em nosso banco de dados existencial. Nós mesmos fizemos uma detalhada explicação a respeito do tema crenças e valores na obra Formando Seres Integrais, e que recomenda- mos fortemente que leia caso ainda não tenha feito. Agora é hora de vasculhar o conjunto de nossas crenças absorvidas por toda nossa experiência, desde nosso nascimento até o momento atu- al, estando presente tudo aquilo que vivemos e encontra-se forjado como uma chave mestra que norteia nossos planos, ações e comportamentos em geral. Não vamos nos aprofundar muito sobre a ciência intrínseca vincu- lada sobre o objeto dessa fase. Nossa meta aqui neste momento é tentar integrar algumas das partes que já vimos até agora, e para isso vamos propor um exercício. O exercício não é nada complicado de entender, contudo, pode ser de realizar caso não tenha se focado realmente nas respostas às pergun- tas que propusemos até aqui. Caso precise, não tenha pressa e retorne às etapas anteriores para dedicar atenção especial às perguntas. Sabemos o quanto é desafiador esse processo do autoconhecimen- to, mas garantimos que vai valer a pena cada segundo e esforço que investir nesta proposta. No exercício desta etapa queremos extrair de você os “porquês” de sua vida, basicamente alocados nos mais diversos papéis que executa. 138 Renato Lessa PeReiRa Para não transformar o exercício em uma tarefa muito exaustiva, alinha- remos o mesmo diretamente com os mecanismos de defesa do Ego e os gigantes da alma, e na sequência vamos tentar ajudá-lo a detectar suas crenças limitantes mais importantes. Basicamente, cada pergunta que fizermos estará logo a seguir questionando o “porquê”. Sempre que responde algo usando “porque” estará detectando a crença por trás de suas escolhas ou comportamentos. Faça quantas perguntas e obtenha quantas respostas conseguir. Muitas dessas respostas você já tem das etapas anteriores, agora é só descobrir a causa delas. Muito bem, mãos à obra. » Quando é que você utiliza a compensação (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você utiliza o deslocamento (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você faz ou fez uso da projeção (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você faz ou fez uso da introjeção (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você faz ou fez uso da racionalização (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você faz ou fez uso da repressão/recalque (mecanismo de defesa do Ego)? Por quê? » Quando é que você faz ou fez uso da regressão (mecanismode defesa do Ego)? Por quê? » Do que você sente inveja (gigante da alma)? Por quê? » Quando é que você quer se sentir valorizado (gigante da alma) pelo outros? Por quê? » Do que você se sente culpado (gigante da alma)? Por quê? » Do que você se lamenta (gigante da alma)? Por quê? » Quando é que você se vitimiza (gigante da alma)? Por quê? » O que te faz sentir raiva (gigante da alma)? Por quê? » Quais são os ressentimentos/mágoas (gigante da alma) que possui? Por quê? Você poderá ter várias respostas para cada pergunta, a meta é responder o porquê para cada uma delas. 139 O POder dO AutOCOnheCimentO Mas e os valores? Você sabe quais são os seus valores de verdade? Queremos propor uma dinâmica simples para que você consiga perceber quais são seus valores reais, aquilo que é seu manual de conduta moral. Vamos supor que seu “anjo da guarda” apareça para você nesse exato momento e diga que você tem apenas 24 horas de vida e que não pode contar isso para ninguém. Então perguntamos a você: “O que você faria? Com quem falaria? Gostaria de desculpar-se com alguém? Possui algum assunto importante inacabado? Do que vai sentir mais falta?”. Essa dinâmica pode ser estendida e ser ainda mais profunda, para isso basta utilizar sua criatividade. Analise essas perguntas, faça novas relacionadas aos seus comportamentos, disseque especialmente as suas respostas e detecte aquilo que sem dúvidas tem importância em sua vida. Agora queremos apimentar um pouco essa dinâmica proposta e sugerir as seguintes perguntas que auxiliarão você a identificar quais são seus valores de fato: � O que não pode faltar em uma pessoa? � O que mais admira em uma pessoa? � Se você pudesse colocar três virtudes em todas as pessoas do mundo, quais seriam elas? � Se você tivesse três desejos (qualquer coisa, só não vale pedir desejos ilimitados), quais seriam eles? Parecem perguntas despretensiosas, mas veja as respostas que deu e perceba que ali estarão os principais valores para você. Faça mais perguntas a si mesmo. Crie desafios de escolha que o coloque em dúvida real. Por exemplo, existe uma tarefa filosófica que podemos citar como tarefa: Imagine que está como motorista de um trem em alta velocidade e sem freios e tem a opção de escolher subitamente entre dois trajetos, em um existem dezenas de crianças e em outro estão as cinco pessoas que você mais ama. O que você faria? Vamos supor que você tenha escolhido o trajeto das dezenas de crianças, mas subitamente o tempo parou e você recebe uma visão que entre aquelas crianças existe uma que faria uma descoberta capaz de salvar o mundo, ainda manteria sua escolha? 140 Renato Lessa PeReiRa Sabemos que é uma dinâmica complicada que exige coragem e esfor- ço para continuar a desafiar-se a fazer escolhas extremas. Contudo, podemos garantir que é desses embates e questionamentos criativos que poderá extrair quais são efetivamente os seus valores e aproximá-lo cada vez mais de quem realmente é. Mais um exemplo: Suponha que a honestidade seja seu principal valor, contudo vamos imaginar que está completamente sem dinheiro passando por severas difi- culdades e um de seus filhos está doente precisando imediatamente de um medicamento ou até alimento. Você seria capaz de furtar (imaginando que todas as demais alternativas tenham sido esgotadas) para salvar seu filho? Interessante não? Se a resposta fosse salvar seu filho, o valor “família” estaria acima do valor “honestidade” e até da “liberdade”. Essas dinâmicas também são excelentes para que possamos desenvolver habilidades extre- mamente importantes como a empatia e compaixão. Eu gostaria uma vez mais de pedir sua licença e oferecer o resultado de valores que consegui depois de muitas dinâmicas, perguntas e exercícios como esses. Devo dizer que ainda continuo fazendo e não há garantias que esses valores não sejam alterados no futuro. Perceba que além dos principais valores colocarei ao lado também um porquê que explica a ordem desses valores. Valor Porque 1.º Deus Se Deus aparecesse para mim de forma inquestionável e pedisse que eu abandonasse tudo, eu o faria 2.º Família Prefiro ficar preso com minha família que livre sem eles 3.º Liberdade Ainda prezo minha liberdade acima da vontade de mudar o mundo 4.º Transcendência Tirando os três primeiros valores é o que mais dá sentido à minha vida, transcender e impactar positivamente o meio que me cerca 141 O POder dO AutOCOnheCimentO Obviamente existem mais valores que são muito importantes e fazem parte de mim, mas o que eu quis mostrar aqui é uma das formas simplistas de como você pode fazer seu tabuleiro de valores por prioridade. Quando você detecta um novo valor importante para você, seja qual for, faça exercícios que o force a escolher qual é o mais importante para você. Volto a lembrar, isso é flexível e pode mudar a cada fase de sua vida. Portanto, o objetivo é não se contentar com as primeiras respostas, insista sempre e desafie-se de acordo com as experiências que tiver adquirido em cada nova fase da vida. Como exemplo, certamente creio que quando meus filhos forem maiores e independentes, dado a projeção de idade que terei, o valor “trans- cendência” possivelmente ocupará a segunda posição, mas isso é só uma projeção que poderá ser completamente diferente. Agora queremos voltar um pouco para as crenças. Achamos muito re- levante destacar que é de extrema importância detectar quais são as crenças que limitam você a ser sua melhor versão possível. Isso mesmo, chamamos essas crenças de “Crenças Limitantes”. Não é porque você acredita em algo que isso é uma verdade. Para sermos práticos, responda rapidamente: Não consigo fazer isso porque… Exemplo: Não consigo praticar esportes porque me sinto culpado por deixar minha família sozinha. Ok? Veja que esse é um exemplo simples, mas rico porque foi temperado inclusive por um gigante da alma, a culpa, e também afronta- -se com o valor “família”. Através dos questionamentos sucessivos pode- mos chegar ao real bloqueio que nos mantém paralisados diante dos desejos que temos. Agora é sua vez, descubra quais são suas crenças limitantes. Voltamos a sugerir novamente a leitura da obra Formando Seres Integrais, em especial na etapa onde propomos uma excelente sugestão para superação das crenças limitantes. E para encerrar mais algumas perguntas simples e rápidas para auxiliá-lo a extrair mais algumas informações acerca de quem você realmente é: 142 Renato Lessa PeReiRa � O que você acha que vale a pena no que você faz? � Quais crenças fortalecedoras você tem a seu próprio respeito? � Quais crenças fortalecedoras você tem sobre os outros? � Que princípios você toma como base de suas ações? Poderíamos definir Crenças Fortalecedoras como um conjunto de ideias positivas que nos empoderam. Aquelas crenças que nos fazem pensar positivo e crer que somos capazes de conquistas extraordinárias quando reconhecemos e colocamos em prática o nosso potencial. Em um ensaio filosófico podemos dizer que evoluir é transformar e aprimorar continuamente nosso sistema de crenças e valores para que tornem-se cada vez mais alinhados com as leis universais. 143 Emoções e sentimentos Você já ouviu dizer que o corpo fala, certo? Se lhe dissemos que a etapa anterior onde tratamos das crenças e valores é talvez o ponto chave dessa obra, temos de dizer que não poderí- amos deixar para esta fase derradeira aquilo que verdadeiramente nos faz humanos. O conjunto de processos internos psíquicos que transbordam em nosso ser e que nos definem como uma única família, as emoções e sentimentos. Para tirarmos maior proveito dessa etapa vamos tentar dividir as atenções e definições entre emoções e sentimentos. É muito comum, quase uma unanimidade, a confusão que fazemos em identificar o que são emoções e o que são sentimentos. Portanto, nada melhor que iniciar- mos dando o nome correto aos bois. Com o desejo de não tornarmos a leitura cansativa e dedifícil in- terpretação, vamos sintetizar o que difere basicamente o que chamamos de emoção e sentimento. Emoções: funciona de forma automática sem consciência direta da ocorrência. Sentimentos: é o direcionamento da emoção pela razão, ou seja, são percepções conscientes das experiências que vivemos. É preciso deixar claro mais uma vez e mencionar que a alma hu- mana é deveras complexa e até mesmo o que chamamos de emoção é na verdade um conjunto de sensações que pode ser, e geralmente é, diferen- te para cada um de nós. Tudo está absolutamente relacionado em nosso mundo interior, sejam crenças, complexos, emoções ou sentimentos, seria muito difícil discorrer sobre qualquer um dos temas sem que houvesse uma simbiose e interação conceitual. Vamos iniciar voltando nossos olhos nesse momento para as emo- ções, afinal elas são as cores da alma. 144 Renato Lessa PeReiRa As emoções são partes integrantes de nossos sistemas e mecanismos biorreguladores. Já nascemos com elas. São extremamente necessários e estão totalmente vinculados à nossa sobrevivência. É como se fosse um software desenvolvido e aprimorado a cada etapa da evolução da espécie humana. Isso é tão verdade que podemos detectar as tais emoções em qual- quer parte do mundo, seja qualquer cultura que predomine por lá. Lembra- mos que tratamos sobre isso de forma bem interessante na obra Formando Seres Integrais, que também faz parte do projeto Autocura Integral. Não se furte da oportunidade de checar o capítulo onde falamos das expressões e microexpressões faciais, que foi orientado também levando em conta os trabalhos do brilhante Paul Ekman. A emoção é uma reação pontual, breve e intensa de nosso organismo diante de um fato inesperado. Podemos dizer que é um foco de reações penosas ou agradáveis. É um dinamismo automático que faz surgir um estado interior de excitamento, seja de prazer ou dor. Temos de ficar atentos e não permitir que as emoções sejam cana- lizadas para comportamentos destrutivos. É extremamente necessário que saibamos dosar e aprender a conviver com nossas emoções. Lembre-se que elas não são escolha, simplesmente ocorrem e o que diferencia uma pessoa com boa inteligência emocional de outra desequilibrada é não ser refém das mesmas. A sabedoria que todos almejamos está diretamente relacionada à boa administração de nossos impulsos emocionais. Não devemos servir aos impulsos, temos de identificá-los e perceber que eles são uma parte irrecusável de nós. São tantas emoções que poderíamos facilmente elaborar uma obra exclusiva sobre elas. Para não perdermos o alvo, podemos citar as prin- cipais emoções primárias: medo, ira, afeto, nojo, alegria e tristeza. Nesse conjunto estão quase a totalidade dos deflexos e reflexos de fuga, agressão ou fusão possessiva. Perceba que tivemos a pretensão de trazer para a lista uma das emo- ções que geralmente são deixadas de lado pela ciência, o afeto. Logo mais em sentimentos você poderá entender porque o amor é considerado um sentimento. Agora você pode perceber como tudo está associado e interligado em toda nossa obra. Praticamente já passamos por perguntas e explicações que estão vinculadas a cada uma dessas emoções primárias que citamos. 145 O POder dO AutOCOnheCimentO O centro de cada complexo é uma emoção. Os gigantes da alma estão todos embaralhados às emoções, demos inclusive atenção especial à raiva e ressentimento. A necessidade de valorização está diretamente ligada à busca pelo afeto. A inveja também pode estar ligada ao comple- xo de inferioridade e ao medo de não ser o destaque ou líder do clã, e por aí vai. » Mas você sabe quais são as emoções que dirigem suas reações? » Consegue identificar suas emoções no momento que as vivencia? » Sabe controlar e canalizar a energia psíquica e fisiológica que cada uma delas proporciona a você? » Do que você tem nojo? O que te faz subitamente alegre ou triste? Nesta altura queríamos aproveitar a possibilidade de expor um ponto de vista muito breve sobre a alegria e a felicidade. Para nós a ale- gria é uma emoção, pois é breve e é gerada por fatores externos, como o que sentimos ao ouvir uma música especial para nós, quando vemos um vídeo engraçado e daí por diante. Já a felicidade não tem na prática um antagônico direto, ou seja, infelicidade é na verdade a ausência de felici- dade. A felicidade sob nosso ponto de vista nada tem de relacionado com estados de euforia, que estão de mãos dadas com a alegria. Alcançar um estado de felicidade não é estar livre de problemas, mas ser possuidor de equilíbrio e paz interior diante de qualquer ocorrência da vida. » O que faz suas pernas tremerem de medo? » Você consegue superar as reações imediatistas da ira e da tristeza com facilidade? » Acredita ser capaz de compor um diário de emoções onde pode pontuar quais delas você sentiu em cada momento de seu dia? Consegue vincular essas emoções às pessoas com quem convive durante sua jornada diária? É importante citar que as emoções podem se tornar patológicas quando nos paralisam ou nos sequestram ao ponto de perdemos total- mente a consciência e causarmos mal aos demais. O medo não pode nos deter na clausura, se temos um projeto temos de segui-lo, mesmo quando o medo nos assombra. Coragem não é ausência de medo, é fazer mesmo com medo, tome nota. 146 Renato Lessa PeReiRa A raiva ou ira, como já vimos anteriormente, mas não custa lembrar, é uma emoção natural. Não precisamos mais usar da violência como estra- tégia de canalização dessa emoção, podemos direcioná-la e não negá-la. Não devemos ser punidos ou possuídos pelas emoções. Quais emoções possuem você? Quando isso acontece? Que emoções você castra e esconde de si mesmo? Quais delas você finge não possuir? Jamais castre ou esconda emoções de você mesmo. Não podemos recalcá-las. Optar por essa estratégia é como construir pouco a pouco uma verdadeira bomba dentro de nós pronta para explodir a qualquer momento. Não devemos viver no mundo lodoso das emoções danosas que nos ferem ferozmente. Se não estivermos atentos, vamos arquivando a raiva, a dor, a tristeza, entre outras, que se transformam em ressentimentos e mágoas, o que você já sabe que é um gigante da alma impetuoso que tem o poder de tomar grande parte de sua energia vital. O fato é que não devemos lutar contra as nossas emoções. Precisa- mos ser verdadeiros conosco. Tenhamos a consciência de que as emoções são ferramentas de aprimoramento. Nossos impulsos são veículos de nossas emoções. A semente pri- mordial de todo impulso é uma emoção explodindo para expressar-se em ação. Detectar seus impulsos traz a oportunidade ímpar de desenvolver o autocontrole e a piedade, evitando que fiquemos à mercê dos mesmos. É preciso que nos direcionemos para a autoconquista, visando a própria educação e quem sabe depois nos transformando em educadores. Uma vez que não podemos viver livres das emoções, é facultativa a escolha pelas que nos trazem bem-estar e prazer em detrimento das que nos perturbam. Alimente os prazeres da alma, evite os hábitos que nos levam às emoções ruins. Você tem cuidado dos conteúdos que são inseridos em seu mundo mental? Que tipo de filmes, vídeos, livros e notícias têm sido sua preferên- cia? Tem evitado o “lixo mental” que o leva ao desequilíbrio emocional? Muito bem, chegou a hora de falarmos um pouco sobre os senti- mentos. Andam lado a lado com as emoções e, como dissemos, causam grande confusão em sua identificação. Mas temos a certeza que a partir de agora você já saberá diferenciá-los em seu mundo interior e assim será capaz de criar suas próprias estratégias para lidar com todos eles. 147 O POder dO AutOCOnheCimentO Por mais incrível que possa parecer, o sentimento é uma função psí- quica racional. Exatamente, são derivadas de nossa vontade e ação cons- ciente. Lembre-se que nós podemos pensar sobre aquilo que sentimos e a recíproca é verdadeira, ou seja, podemos sentir de acordo com aquilo que pensamos.Os sentimentos são as experiências percebidas pela emoção de ma- neira sóbria e consciente. Como dissemos, a emoção é o efeito espontâneo do organismo diante de qualquer fato. A emoção é primária e produz o sentimento que pode ser prazeroso ou frustrante. Enquanto a emoção não passa pela razão, o sentimento é absoluta- mente ligado a ela. O sentimento é calmo, é filtrado, ou melhor, caminha pela consciência. Um bom exemplo que podemos dar, aproveitando a referência que fizemos mais cedo nesta etapa: o amor é um sentimento e poderia ser um bom exemplo de construção sequencial da paixão, que podemos categori- zar como emoção. O amor é um sentimento complexo, quiçá o mais complexo da alma humana e o mais poderoso também, que passa pelos pilares da admiração e do respeito. Podemos dizer que não será amor um sentimento que não estiver alicerçado anteriormente na admiração e no respeito pelo alvo. Simone de Beauvoir, a respeitada escritora e filósofa, é dona da se- guinte reflexão: “Quando se respeita alguém não queremos forçar a sua alma sem o seu consentimento.” Conforme nosso Ego vai se estruturando e amadurecendo, o que é um dos troféus da jornada de autoconhecimento, o sentimento vai se aprimorando e se tornando mais elevado. O que você tem feito para ampliar sua consciência? Quando nossa consciência está desperta e ampliada, mais elabora- dos serão nossos sentimentos. Albert Einstein sabiamente já disse que uma vez ampliada, a consciência jamais voltará ao seu tamanho original. Assim podemos usar como álibi esse incrível gênio produzido pela humanidade para atestar nossa reflexão de que grande parte do poder do autoconhecimento é usufruir dos sentimentos mais elevados e nobres ca- pazes de iluminar nossas almas ao ponto de trazer momentos de plenitude. Einstein também conseguiu produzir uma sublime reflexão na etapa final de sua vida em uma carta que enviou à sua filha. Ele disse que o amor é uma força universal para qual a ciência ainda não tinha encontrado uma explicação formal, e ainda não encontrou. 148 Renato Lessa PeReiRa Não queríamos perder essa ocasião para dizer que na atualidade a ciência já conseguiu comprovar que a saúde integral e o bem-estar interior mais poderoso são produzidos quando conseguimos viver em colaboração ao invés da competição, quando conseguimos transcender transpondo a barreira do egoísmo e servimos a um ou mais irmãos em humanidade. O que seria o amor fraternal senão essa consciência colaborativa aplicada onde admiramos nossos irmãos em humanidade pela sua complexidade única e os respeitamos como são? Hoje estamos pressionados por um sistema midiático direcio- nado à posse e à beleza. Nunca vimos tantas incidências de suicídios, depressão e ansiedade. É hora de virarmos o jogo e espalharmos a novidade de que o mundo se tornará evoluído quando todos tiverem desde cedo a oportunidade de aprender a importância de observar seu mundo interior, conhecendo, reconhecendo e acolhendo tudo que so- mos e estamos em cada pequena etapa de nossas vidas. Imagine se conseguíssemos propagar ao mundo a importância de formarmos nossas crianças com um poderoso sistema de crenças e valores totalmente ligados ao autoconhecimento e ao instinto colabo- rativo. Perdoe-nos a divagação, mas pensamos ser de grande importância essa referência sobre o mais sublime e poderoso sentimento. A razão sempre deve conduzir nossos sentimentos. » Você tem usado sua razão para produzir que tipo de sentimentos? » Quais são os pensamentos que mais povoam sua mente e quais sentimentos eles desencadeiam? » Já se sente preparado para alternar seu padrão de pensamentos para alcançar sentimentos elevados? » Quem é credor de seu amor, em sua opinião? Identifica o respeito e a admiração nas pessoas que diz que ama? » Com que frequência utiliza a gratidão em sua vida? » Quando e por quem sente ternura? Perceba que como o sentimento é uma produção racional, você pode escolher o que sente. Essa é uma das chaves mestras da felici- dade e do bem viver. É mais um presente que o autoconhecimento vai trazer a você, afinal você não pode transformar aquilo que não conhece. 149 O POder dO AutOCOnheCimentO Está se sentindo melancólico? Busque em seus arquivos mentais experiências onde sentiu alegria, produza felicidade dentro de você. Sai- ba que para nosso inconsciente não existe real ou irreal, por isso, mesmo que não se lembre de momentos prazerosos, imagine-os, invente-os, temos certeza que sentirá tudo aquilo que desejar se permitir-se usar a criativida- de e abandonar a necessidade de controle e o medo do julgamento alheio. Mas não deixe de valorizar também os sentimentos não tão praze- rosos. Estamos certos de que precisamos antes conhecer o inverno para compreender o verão, assim como é necessário vivenciar momentos de tristeza profunda para conseguir identificar e valorizar plenamente a felici- dade quando ela chegar. Precisamos deixar claro que a proposta dessa obra é convidá-lo ao mergulho interior sincero e empoderar-se diante do autoconhecimento e acolhimento de tudo que de fato é, mas não foge de nossas metas a compo- sição de obra futura onde queremos ofertar ferramentas que possam ajudá- -lo a perceber e canalizar cada uma de suas emoções. Por ora conhecer suas emoções e sentimentos já será incrível e sem dúvidas impactará sua vida de maneira extremamente positiva. A título de colaboração, gostaríamos de oferecer a você duas técni- cas para reconhecimento dos sentimentos, emoções, crenças e complexos que povoam seu mundo e direcionam suas ações. O primeiro e mais simples chama-se “Diário de emoções” e consiste em elencar uma emoção sentida, sua intensidade e o fato que desencadeou a mesma. Você também pode usar essa mesma técnica para os sentimentos, contudo, substitua fato por qual pensamento ou racionalização desenca- deou o sentimento. Diário de emoções 17/07/2017 Emoção Intensidade* Fato Raiva 6 Quando meu colega de trabalho pisou no meu pé Medo 9 Quando freei bruscamente meu veículo para não bater 150 Renato Lessa PeReiRa Nojo 7 Quando abri o lixo da cozinha e percebi um cheiro horrível Alegria 6 Quando recebi um vídeo engraçado no celular Tristeza 9 Quando fiquei sabendo do falecimento de um amigo de infância Ternura 9 Quando minha filha dormiu em meu colo • De 1 a 10, sendo 1 quase nenhuma intensidade e 10 intensidade extrema Uma dica preciosa é manter consigo um bloco de anotações ou utilizar seu celular, mesmo que for para gravar áudios quando sentir tais emoções. Você provavelmente vai se surpreender com a quantidade de emoções que vivencia e não se dá conta em seu dia a dia. Pesquisando um pouco mais a fundo essas emoções sua inteligência emocional, que é um item de grande valorização atualmente, será aprimorada exponencialmente. Também perceberá que as emoções se repetem por diversas vezes du- rante o dia e quando for necessário racionalizar a experiência gerando sensa- ções, esteja certo que estará diante de um sentimento, e por sua vez poderá alimentar seu diário de sentimentos. Tratando-se de seu diário de sentimen- tos, experimente questionar por que sentiu. Assim será capaz de identificar as crenças ou traumas significativos que podem estar intrínsecos a esses senti- mentos. Outro ponto que vale o destaque é investigar com mais cuidado e dis- posição as experiências que apresentaram maior intensidade, é quase certo que encontrará um complexo ou trauma vinculado ao fato vivido ou ao pen- samento originário. Quer turbinar um pouco mais essa técnica do diário de emoções e sen- timentos? Adicione uma coluna ao final com o título: “Reação”. Neste campo anote qual foi sua reação diante da emoção ou sentimento. Quanto menos reativo for se tornando mais fortalecida será sua inteligência emocional. 151 O POder dO AutOCOnheCimentO Outra dica poderosa é adicionar mais uma coluna ao lado da “reação” com o nome da pessoa ou pessoas envolvidas no momento ge- rador da emoção.Aí então poderá ter mais pistas e enxergar com clareza quais das suas relações demandam maior atenção de acordo com o tipo, a quantidade de momentos e a intensidade que geram em seu mundo emocional. Já a segunda técnica chama-se “Pizza de Motivação” e basicamente funciona como um gráfico analítico onde você mesmo define a proporção que cada item possui em uma determinada ação ou comportamento. A título de demonstração, gostaria de utilizar novamente um exemplo pessoal comparando momentos diferentes de minha vida. 2011 – Gráfico: O que realmente está por trás de minhas boas ações? Item Proporção em % Crenças e valores 15% Necessidade de valorização 10% Medo de não fazer o certo 5% Legado 5% Sensação de especialidade 5% Síndrome de ajuda 10% Complexo de heroísmo 35% Amor 15% 152 Renato Lessa PeReiRa 2018 – Gráfico: O que realmente está por trás de minhas boas ações? Item Proporção em % Crenças e valores 15% Necessidade de valorização 5% Medo de não fazer o certo 0% Legado 35% Sensação de especialidade 0% Síndrome de ajuda 5% Complexo de heroísmo 5% Amor 35% Agora perceba o comparativo entre 2.011 e 2.018 durante o pro- cesso e jornada de autoconhecimento. Gráfico Comparativo dos anos 2.011 e 2.018: “O que realmente está por trás de minhas boas ações?” 153 O POder dO AutOCOnheCimentO Consegue perceber a diferença? O ano de 2.011 mostra uma realidade que pude reconhecer diante dos enfrentamentos internos que estava vivendo até àquele momento. Conforme fui desbravando minha jornada de autoconhecimento, que devo dizer que ainda está em pleno processo de execução, as proporções do que me motiva- va a realizar as chamadas “boas ações” foram transformando-se. Isso só foi possível após eu ter tomado conhecimento do que estava escondido dentro de mim de verdade. É um processo, uma jornada. Essa técnica pode ser usada para qualquer comportamento que pos- sua. Você pode colocá-lo à prova sob qualquer circunstância, basta querer. Você pode utilizar essa técnica para descobrir o que está por trás de um com- portamento destrutivo ou apenas indesejado. Tomando conhecimento do mesmo é possível iniciar a transformação compondo estratégias pontuais. Você poderia, por exemplo, colocar à prova nesta técnica o porquê de usar uma determinada Persona em um grupo evitando ser você mesmo. Poderia encontrar respostas com itens muito significativos como medo de rejeição, necessidade de pertencimento, complexo de inferioridade, dentre outros. No caso que apresentei, perceba que os itens são variados. Podemos encontrar presentes o sistema de crenças e valores, o gigante da alma – ne- cessidade de valorização, o complexo de heroísmo, a transcendência – lega- do e até o sentimento mais nobre, o amor. 154 Renato Lessa PeReiRa Nossas ações nunca são motivadas por uma única força psíquica, até as situações de sobrevivência que poderiam justificar alguns de seus comportamentos certamente possuiriam uma parcela de outros compo- nentes, sejam complexos, emoções, sentimentos, mecanismos de defesa do ego, gigantes da alma, síndromes etc. É importante também destacar que pouco importa o grau de deta- lhamento que fará na composição de seu gráfico. Por exemplo, seria pos- sível ao invés de utilizar o item síndrome de ajuda utilizar o complexo de superioridade ou de poder. Portanto, não se apegue aos nomes e dê aten- ção ao item que conseguir identificar sem preocupar-se com extremo de- talhamento. Fatalmente os principais serão um, dois ou no máximo três itens muito significativos que precisará trabalhar em sua reforma íntima. Apesar de existirem vários itens não tão significativos por trás de um comportamento, é muito importante detectá-los, por menores que sejam. Isso lhe dará maior senso de humanidade e potencializará o de- senvolvimento de empatia. Lembramos que as proporções variam de acordo com a profun- didade do processo de autoconhecimento e o amadurecimento do Ego; assim, aconselhamos que refaça o gráfico e compare após alguns meses da leitura dessa obra. 155 A sua própria biografia Parabéns! Se você chegou até aqui não temos palavras suficientes para parabenizá-lo. Ficamos todos muito felizes e contentes por ter optado por essa jornada maravilhosa e fundamental do autoconhecimento. Agora é hora de respirar e relembrar tudo que viveu durante a lei- tura dessa obra tentando juntar e acolher todas as suas partes descobertas. Temos a certeza que sua vida nunca mais será a mesma e poderá finalmente alcançar momentos de paz e plenitude interior a cada nova descoberta. Nosso alerta nesse encerramento é que não exija perfeição de si mesmo. Nenhum de nós é perfeito. Aliás, perfeito vem do latim perfec- tum e traz em seu significado a projeção de completo, pronto. Cremos que jamais seremos completos, ou melhor, prontos. Al- guns filósofos inclusive entendem que o tal estado de “estar pronto por completo” ocorreria apenas com a morte quando já não haveria mais transformações. Essa tese já não possui muitos adeptos, uma vez que a cada nova geração percebe-se a presença da espiritualidade que transcende à vida do corpo nos definindo como almas que utilizam um corpo e não o contrário. A única coisa imutável na vida é o fato de que tudo se transforma sempre. Esqueça a necessidade de ser aceito pelo meio, de agradar as pla- teias. Lute contra o medo da solidão, que essencialmente não existe. Jamais ficaremos sós de verdade se estivermos conscientes da essência que somos. Acolha e ame cada pequeno pedaço seu, seja em que condições estiver. Não lastime-se por achar que outros são melhores que você. Acredite, todos vivem suas lutas internas e por trás de aparentes sorri- sos e máscaras existem grandes conflitos que cobrarão sua conta se não optarem pela autodescoberta e romperem com os padrões exigidos pelo meio. 156 Renato Lessa PeReiRa Para viver bem é preciso um pouco de loucura, talvez os únicos sadios sejam os que se permitem viver suas loucuras em busca do preenchimento do vazio que instala-se diante das existências sem objetivos e propósitos significativos. Assuma as rédeas de sua vida e seja o principal ator de suas experiên- cias. Estude, teste, escolha, arrisque e recomece sempre. Muitos especialistas do mundo psicológico definem que a receita do bem viver não é a busca da felicidade empacotada que o mundo extrema- mente materialista nos impõe através de suas armadilhas traiçoeiras, e sim a busca pelo significado. Encontrar o significado de nossas existências é o verdadeiro bálsamo de qualquer jornada evolutiva e seja qual for a estrada escolhida não teremos outro destino que não seja a autodescoberta em todos os níveis de nossa caminhada. Conhecer nossas próprias chagas e feridas nos transformará em seres mais tolerantes e despertos para os compromissos que a vida universal nos oferta. Contemple, agradeça e comemore cada nova vitoria sobre o Ego in- fantil e desestruturado, transformando-o pouco a pouco em um Ego maduro e servil aos desejos da alma que são capazes de trazer a plenitude tão alme- jada por todos nós. O que faz a sua alma pulsar? O que te faz vibrar dos dedos dos pés até à ponta de suas orelhas? Tenha em mente que a missão do autoconhecimento é diária e a cada dia é possível detectar novas facetas dentro de você capazes de fazê-lo apai- xonar-se pela vida e motivar-se para heroica reforma íntima. Sempre se per- gunte qual é a parte que lhe falta e onde mais você pode avançar. Sejam quais forem suas desculpas, seus desafios, suas desabilidades, levante seus olhos e encontre o seu porquê! Encontre a sua verdade! Não importa mais quais são os seus limites, lute para superá-los e divirta-se du- rante a aventura. Leve adiante essa boa nova e contamine as pessoas à sua volta divul- gando a necessidade do autoconhecimento para a autotransformação. Seja o exemplo espelhado mostrando o poder de sua vulnerabilidade diante da acei- tação de suas fraquezas e colocando suas virtudes a serviço do bem maior. A maiorcontribuição que o ser pode dar ao mundo é ser ele mesmo e trabalhar por sua própria melhora. Se você quer um mundo mais justo, seja justo. Se você quer um mundo mais pacífico, seja paz. Se você quer um mundo mais amoroso, seja amor. 157 O POder dO AutOCOnheCimentO Aquele que consegue a paz interior ao cerrar dos olhos no entarde- cer de sua vida atingiu sua meta maior e tornou-se certamente a melhor versão de si mesmo. É isso que desejamos a você! Impresso em Lisboa, Portugal, por: