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WJUR0211_v3.0 Teoria geral dos direitos fundamentais Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Teoria da Reserva do Possível e Mínimo Existencial Bloco 1 Emerson Ademir Borges de Oliveira O estudo da restrição dos direitos fundamentais • STF: não há direitos fundamentais absolutos (ex.: MS 23452 (1999) e HC 93250 (2008)). • Virgílio Afonso da Silva (2021, p. 117): há, pelo menos, três direitos fundamentais absolutos: a. Proibição da tortura (BRASIL, 1988, art. 5º, III). b. Extradição de brasileiro nato (BRASIL, 1988, art. 5º, LI). c. Legalidade penal (BRASIL, 1988, art. 5º, XXXIX). • Pressuposto: a esmagadora maioria dos direitos fundamentais não são absolutos. O estudo da restrição dos direitos fundamentais • Restrição por expressa disposição constitucional. • Restrição por expressa indicação constitucional. • Restrição na realização eficacial do direito fundamental, sobretudo os de cunho programático e que dependam de intermediação legislativa ou executiva. • Restrição diante da colisão de direitos fundamentais. A Teoria da Reserva do Possível • Tribunal Constitucional Federal da Alemanha (1972). • Numerus clausus – vagas em curso de medicina de universidade pública. • Art. 12 (1) da Lei Fundamental (ALEMANHA, 1945): “Todos os alemães têm o direito de eleger livremente a sua profissão, o lugar de trabalho e o de aprendizagem. O exercício da profissão pode ser regulamentado por lei ou em virtude de lei”. • Rejeição do pedido: impossibilidade de atendimento coletivo do direito para todas as demandas – razoabilidade da pretensão. A Teoria da Reserva do Possível • Ingo Sarlet (2001, p. 264-265) – requisitos para sustentabilidade da alegação de reserva do possível: a. Impossibilidade fática – inexistência de recursos para atender a pretensão sob o viés coletivo. Deve-se imaginar uma class action, pleiteando o direito exigido individualmente. b. Impossibilidade jurídica – inexistência de autorização orçamentária e incompetência para realização da despesa. c. Ausência de razoabilidade da exigência e desproporcionalidade da prestação – ausência de legitimidade e de prioridade em face de outras políticas públicas. A Teoria do Mínimo Existencial • Tribunal Administrativo Federal da Alemanha (1953). • Conjunto de bens e utilidades indispensáveis para uma vida digna. • “Ajuda para a autoajuda” (SARLET, 2001, p. 298). • Duas posições: a. Núcleo impreciso, dependente das condições locais e temporais. b. Há um núcleo fixo, como defende Ana Paula de Barcellos: educação fundamental, saúde, assistência aos desamparados e acesso à Justiça (MASSON, 2017, p. 335). A Teoria do Mínimo Existencial • Mínimo existencial versus reserva do possível. • Possibilidades: a. O mínimo existencial não admite a alegação de reserva do possível (SARLET, 2001, p. 303). b. O mínimo existencial admite a alegação de reserva do possível, mas a carga argumentativa deve ser maior (SARMENTO, 2016, p. 1672). Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Restrições textuais de direitos fundamentais Bloco 2 Emerson Ademir Borges de Oliveira Âmbito de proteção do direito • Dois aspectos (MENDES; BRANCO, 2018, p. 194): a. Âmbito de proteção da norma – identificar os bens jurídicos protegidos e a amplitude da proteção. b. Verificar possíveis restrições no próprio texto constitucional e a autorização de reservas legais. • Art. 5º, II, CF (BRASIL, 1988) – cláusula geral de reserva legal: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Possibilidades restritivas • Reserva legal específica – “nos termos da lei”, “na forma da lei”, “fixada em lei” etc. Ex.: art. 5º, VII (BRASIL, 1988): “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”. • Duplo caráter da norma: direito + restrição. • Há situações em que a norma não restringirá, mas complementará o concretizará o direito. • Conceitos jurídicos indeterminados ou plurissêmicos. Ex.: função social (BRASIL, 1988, art. 5º, XXIII). Possibilidades restritivas • Limitação pelo próprio texto constitucional. • Exemplo 1: art. 5º, XI (BRASIL, 1988): “[...] a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. • Exemplo 2: art. 5º, XVI (BRASIL, 1988): “XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”. Teorias externa e interna das restrições • Externa: o direito e a restrição são dois institutos autônomos. A relação ocorre na situação concreta, não alterando a configuração do direito. É defendida quando se entende que os direitos são posições definitivas. • Interna: a restrição é inerente (imanente) ao próprio direito, fazendo parte dele. A relação é abstrata, pois a limitação está ínsita ao direito. É preferível quando se entende que os direitos possuem apenas posições prima facie. Reserva legal simples e reserva legal qualificada • Reserva legal ou restrição legal simples – o texto constitucional terceiriza a responsabilidade de conformação ou definição sem nenhuma exigência ao legislador ordinário (NOVELINO, 2011, p. 404). • Reserva legal ou restrição legal qualificada – o constituinte fixa “condições especiais”, fins ou meios a serem utilizados (LAZARI, 2018, p. 348) para a conformação legislativa. • Nenhuma reserva legal – dispositivo não faz qualquer menção à lei ou regulamentação (SILVA, 2021, p. 119). Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites O limite restritivo e a proteção do núcleo essencial Bloco 3 Emerson Ademir Borges de Oliveira Limites dos limites e direito comparado • Risco de esvaziamento do direito. • Teoria dos “limites dos limites” (Schranken-Schranken). • Proteção do núcleo essencial. • Art. 19 da Lei Fundamental de Bonn (ALEMANHA, 1949): 1) Na medida em que, segundo esta Lei Fundamental, um direito fundamental possa ser restringido por lei ou em virtude de lei, essa lei tem de ser genérica e não limitada a um caso particular. Além disso, a lei terá de citar o direito fundamental em questão, indicando o artigo correspondente. 2) Em nenhum caso, um direito fundamental poderá ser violado em sua essência (ALEMANHA, 1949). ( ( Identificação do núcleo essencial a. Teoria Absoluta – núcleo rígido em qualquer direito fundamental imune à atuação legislativa. Problema: definir em abstrato esse núcleo. b. Teoria Relativa – núcleo deve ser definido em cada caso, a depender das circunstâncias fáticas e jurídicas. Problema: extrema flexibilidade. c. Teoria Conciliadora – encontro do núcleo essencial pelo princípio da proporcionalidade: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Princípio da proporcionalidade • Adequação – medidas devem ser aptas para as finalidades pretendidas, ainda que não as atinja, mas ao menos fomente (SILVA, 2021, p. 121). • Necessidade – a restrição deve ser a menos onerosa para atingir a mesma finalidade (LAZARI, 2018, p. 349). • Proporcionalidade em sentido estrito – equilíbrio entre a intervenção e os objetivos perseguidos (MENDES; BRANCO, 2018, p. 227). Requisitos da lei restritiva • Formais: a. Reserva legal – atos normativos primários. b. Irretroatividade – efeitos para o futuro. • Materiais: a. Proporcionalidade – adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. b. Generalidade e abstração – não voltar-se para situação concreta ou pessoa. c. Salvaguarda do núcleo essencial – restrição não pode inviabilizar o direito.Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Colisão de direitos fundamentais Bloco 4 Emerson Ademir Borges de Oliveira Pressupostos e conceito • Direitos fundamentais enquanto princípios. • Princípios enquanto mandatos de otimização. • Satisfação em diferentes graus – pesos diferentes diante das situações concretas (ALEXY, 2002, p. 89). • “[...] dois ou mais direitos abstratamente válidos entram em conflito diante de um caso concreto, hipótese na qual as soluções serão divergentes de acordo com o direito aplicado” (NOVELINO, 2011, p. 407). • Lei de colisão versus ponderação. Lei de Colisão • Alexy (2002, p. 91): • Precedência condicionada, concreta ou relativa – Tribunal entende que determinado direito, sob certas condições, sempre terá precedência sobre outro. • Precedência incondicionada, abstrata ou absoluta – o direito sempre teria precedência, em quaisquer situações, sobre outros. Tribunal entende não ser possível sua aceitação (exceção: dignidade da pessoa humana). Lei de Colisão • Situação prática (ALEXY, 2002, p. 92): réu possui doença cardíaca grave e, se levado a interrogatório, pode ter infarto. • Direito à vida e à integridade física versus Aplicação do direito penal. • Sob certas circunstâncias (perigo concreto de danos à saúde), o primeiro possui precedência sobre o segundo. • O segundo, no embate com o primeiro sob certas circunstâncias, possui uma proibição jusfundamental. Lei de Colisão • A solução cria uma nova lei, não escrita, que conduzirá a um resultado preestabelecido. • (P1 P P2) C. • C R. • C – condições – que, presentes, conduzem ao resultado R como consequência jurídica. (ALEXY, 2002, p. 92 e 94). Ponderação • Inexistência de qualquer precedência. • Caso Lebach. • Direito de personalidade versus liberdade de informação. • Impossibilidade de uma precedência condicionada que admita a liberdade de informação sempre que se tratar de delitos (ALEXY, 2002, p. 96-97). • Todo conflito dependerá de solução e elementos casuísticos. Ponderação • Conjunto de condições S: • S1 – informação televisa repetida. • S2 – não corresponder a nenhum interesse atual informativo. • S3 – sobre delito grave. • S4 – que dificulta a ressocialização do autor. • S1 + S2 + S3 + S4 R (proibição jusfundamental). • O resultado R equivale ao conjunto de condições C2. • (P1 P P2) C2. Teoria em Prática Bloco 5 Emerson Ademir Borges de Oliveira Reflita sobre a seguinte situação Determinado cliente lhe procura. Ele alega ser bacharel em Direito e, por sucessivas vezes, não logrou êxito na aprovação do Exame de Ordem. Com base no art. 5º, XIII, CF (BRASIL, 1988), alega que a Constituição lhe garante o livre exercício de qualquer profissão e que, por isso, o Exame seria inconstitucional. Reflita e responda: art. 5º, XIII, CF (BRASIL, 1988) é norma restritiva de direitos fundamentais? Qual sua modalidade, reserva simples ou qualificada? No exercício da restrição, quais os critérios que devem ser observados pelo legislador? De acordo com a jurisprudência do STF, os critérios utilizados nesse caso em específico atendem aos requisitos limitadores? Norte para a resolução... • Art. 5º, XIII, CF (BRASIL, 1988): “XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. • Reserva legal simples. • Requisitos: 1) formais: a) reserva legal; b) irretroatividade; 2) materiais: a) proporcionalidade; b) generalidade e abstração; c) salvaguarda do núcleo essencial. • STF RE 603.583 (Rel. Min. Marco Aurélio, j. 25.10.2011, v.u.): constitucionalidade do Exame. Dica do(a) Professor(a) Bloco 6 Emerson Ademir Borges de Oliveira Teste de Pieroth e Schlink I – A conduta regulada pela lei está contemplada no âmbito de proteção de determinado direito fundamental? II – A disciplina contida na lei configura uma intervenção no âmbito de proteção do direito fundamental? III – Essa intervenção justifica-se do prisma constitucional? 1. Observam-se, na elaboração da lei, as normas básicas sobre a competência legislativa e sobre o processo legislativo? 2. a) nos direitos individuais submetidos à restrição legal qualificada: a lei satisfaz os requisitos especiais previstos na Constituição? b) nos direitos submetidos à restrição legal simples: a lei afeta outros direitos individuais ou valores constitucionais? c) nos direitos individuais não submetidos à restrição legal expressa: identifica-se conflito ou colisão de direitos fundamentais ou entre um direito fundamental e outro valor constitucional que possa legitimar o estabelecimento de restrição? (MENDES, 2012, p. 114) Teste de Pieroth e Schlink 3. A restrição atende ao princípio da ‘reserva do parlamento’? 4. A restrição atende ao princípio da proporcionalidade? 4.1. A restrição é adequada? 4.2. A restrição é necessária? Existiriam meios menos gravosos? 4.3. A restrição é proporcional em sentido estrito? 5. O núcleo essencial do direito fundamental foi preservado? 6. A lei é suficientemente genérica ou se figura aplicável apenas a determinado caso (lei casuística)? 7. A lei restritiva é suficientemente clara e determinada, permitindo que o eventual atingido identifique a situação jurídica e as consequências que dela decorrem? 8. A lei satisfaz outras normas de Direito Constitucional, inclusive aquelas relativas aos direitos fundamentais de terceiros? (MENDES, 2007, p. 107-108). Referências ALEMANHA. [Constituição (1949)]. Lei Fundamental da República Federal da Alemanha. 1949. Disponível em: https://www.btg- bestellservice.de/pdf/80208000.pdf. Acesso em: 19 maio 2021. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madri: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2002. BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, [1988]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 27 abr. 2021. Referências LAZARI, Rafael de. Manual de direito constitucional. 2. ed. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018. MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. 5. ed. Salvador: Juspodivm, 2017. MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. MENDES, Gilmar Ferreira. MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. Referências NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. SARMENTO, Daniel. O mínimo existencial. Revista de Direito da Cidade, [s. l.], v. 8, n. 4, p.1644-1689, 2016. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdc/article/ view/26034. Acesso em: 15 jul. 2021. SILVA, Virgílio Afonso da. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: EdUSP, 2021. Bons estudos! Teoria geral dos direitos fundamentais Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites O estudo da restrição dos direitos fundamentais O estudo da restrição dos direitos fundamentais A Teoria da Reserva do Possível A Teoria da Reserva do Possível A Teoria do Mínimo Existencial A Teoria do Mínimo Existencial Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Âmbito de proteção do direito Possibilidades restritivas Possibilidades restritivas Teorias externa e interna das restrições Reserva legal simples e reserva legal qualificada Teoria geral dos direitosfundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Limites dos limites e direito comparado Identificação do núcleo essencial Princípio da proporcionalidade Requisitos da lei restritiva Teoria geral dos direitos fundamentais IV: restrições, colisão e limites dos limites Pressupostos e conceito Lei de Colisão Lei de Colisão Lei de Colisão Ponderação Ponderação Teoria em Prática Reflita sobre a seguinte situação Norte para a resolução... Dica do(a) Professor(a) Teste de Pieroth e Schlink Teste de Pieroth e Schlink Referências Referências Referências Bons estudos!