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DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICA
GRAAL DA PROVA ORAL DO 30º CPR – 03/2023
Revisado e organizado por Alexandre Benardis
Sumário
1A. Constitucionalismo: trajetória histórica. Constitucionalismo liberal e social. Constitucionalismo britânico, francês e norte-americano.	5
1B. Poder Legislativo. Organização. Atribuições do Congresso Nacional. Competências do Senado e da Câmara. Legislativo e soberania popular. A crise da representação política.	13
1C. Ministério Público: História e princípios constitucionais. Organização. As funções constitucionais do Ministério Público.	21
2A. Constituição e Cosmopolitismo. O papel do direito comparado e das normas e jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição.	25
2B. Poder Executivo. Histórico. Presidencialismo e Parlamentarismo. Presidencialismo de coalizão. Presidente da República: estatuto. Competências. Poder normativo autônomo, delegado e regulamentar. Ministros de Estado.	27
2C. Hermenêutica e Teorias da argumentação jurídica.	31
3A. Divisão de poderes. Conceito e objetivos. História. Independência e harmonia entre poderes. Mecanismos de freio e contrapesos.	33
3B. Poder Judiciário: organização e competência. Normas constitucionais respeitantes à magistratura. O ativismo judicial e seus limites no Estado Democrático de Direito.	38
3C. Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens.	49
4A. Direitos sociais: enunciação, garantias e efetividade. Princípio da proibição do retrocesso. Mínimo existencial e reserva do possível.	54
4B. Normas constitucionais. Definição. Estrutura. Classificações. Princípios e regras. Preâmbulo. Efeitos das normas da Constituição brasileira de 1988.	60
4C. Lacunas e Integração do Direito: analogia, costumes e equidade.	62
5A. Poder Constituinte originário. Titularidade e características.	64
5B. Supremo Tribunal Federal: organização e competência. Jurisdição constitucional.	66
5C. Município: criação, competência, autonomia. Regiões metropolitanas.	68
6A. Poder constituinte derivado. Limitações à reforma constitucional. Cláusulas pétreas expressas e implícitas. As mutações constitucionais.	75
6B. Federalismo. Concepções e características. Classificações. Sistemas de repartição de competência. Direito comparado.	78
6C. Direitos fundamentais. Concepções. Características. Dimensões objetiva e subjetiva. Eficácia vertical e horizontal.	85
7A. Processo legislativo. Emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto legislativo e resolução. O processo de incorporação dos tratados internacionais. Devido processo legislativo.	89
7B. União Federal: competência e bens.	98
7C. Os Princípios gerais de direito.	102
8A. Poder constituinte estadual: autonomia e limitações.	103
8B. Política Agrária na Constituição. Desapropriação para Reforma Agrária.	104
8C. Defesa do Estado e das instituições democráticas. Estado de defesa. Estado de sítio. Papel constitucional das Forças Armadas.	107
9A. Comunicação social. A imprensa na Constituição. Liberdades públicas, acesso à informação e pluralismo.	110
9B. Norma jurídica e enunciado normativo. Características da norma jurídica.	116
9C. Segurança Pública na Constituição. O papel das instituições policiais.	118
10A. Interpretação constitucional. Métodos e princípios de hermenêutica constitucional.	123
10B. Nacionalidade brasileira. Condição jurídica do estrangeiro.	126
10C. Intervenção federal nos Estados e intervenção estadual nos Municípios.	129
11A. Liberalismo igualitário, comunitarismo, procedimentalismo e republicanismo. Suas projeções no domínio constitucional.	134
11B. Princípios constitucionais sobre a Administração Pública.	138
11C. Colisão entre normas constitucionais. Ponderação e juízo de adequação. Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade.	141
12A. Controle de constitucionalidade: evolução histórica do sistema brasileiro. Direito Comparado. Legitimidade democrática.	144
12B. Critérios clássicos de resolução de antinomias jurídicas.	148
12C. Princípios Constitucionais do Trabalho. Os Direitos Fundamentais do Trabalhador.	149
13A. Direito Constitucional Intertemporal. Teoria da recepção	151
13B. Regime constitucional da propriedade. Função socioambiental da propriedade. Desapropriação e requisição.	153
13C. Princípio da isonomia. Ações afirmativas. Igualdade e diferença. Teoria do impacto desproporcional. Direito à adaptação razoável.	156
14A. Democracia. Conceito. História. Fundamentos. Democracia representativa e participativa. Teorias deliberativa e agregativa da democracia. Instrumentos de democracia direta na Constituição de 1988.	159
14B. Previdência social e assistência social.	162
14C. A evolução do constitucionalismo brasileiro: constituições de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969. A ditadura militar e os atos institucionais. A assembleia constituinte de 1987/88.	166
15A. Controle jurisdicional e social das políticas públicas. Serviços de relevância pública. O papel do Ministério Público.	171
15B. Direitos Políticos. O papel da cidadania na concretização da Constituição	175
15C. Regime constitucional dos parlamentares. Imunidades e incompatibilidades.	177
16A. Direito fundamental à educação. A educação na Constituição Federal.	181
16B. Os princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.	188
16C. Controle Concreto de Constitucionalidade. O Recurso Extraordinário	191
17A. Proteção constitucional à família, à criança, ao adolescente e ao idoso.	195
17B. A metodologia jurídica no tempo. A Escola da Exegese. Jurisprudência dos conceitos, jurisprudência dos interesses e jurisprudência dos valores. O realismo jurídico. Neoformalismo. O pós-positivismo jurídico.	199
17C. Direitos sexuais e reprodutivos.	203
18A. Orçamento público: controle social, político e jurisdicional.	208
18B. Direitos das pessoas portadoras de deficiência. A Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo.	214
18C. Controle abstrato de constitucionalidade: Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, Ação Declaratória de Constitucionalidade e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.	221
19A. Liberdade de expressão, religiosa e de associação. O princípio da laicidade estatal. Os direitos civis na Constituição de 1988.	235
19B. Direitos das comunidades remanescentes dos quilombos e de comunidades tradicionais.	240
19C. Direito à Saúde. Sistema Único de Saúde na Constituição. Controle Social. O Direito de Acesso às Prestações Sanitárias.	243
20A. Finanças Públicas na Constituição. Normas Orçamentárias na Constituição.	252
20B. Índios na Constituição. Competência. Ocupação Tradicional. Procedimento para Reconhecimento e Demarcação dos Territórios Indígenas. Usufruto.	264
20C. Limites dos direitos fundamentais. Teorias interna e externa. Núcleo essencial e proporcionalidade. Os "limites dos limites".	277
21A. Conselho Nacional do Ministério Público. História, composição, competência e funcionamento.	280
21B. Interpretação jurídica. Métodos e critérios de interpretação.	284
21C. Ordem constitucional econômica. Princípios constitucionais da ordem econômica. Intervenção estatal direta e indireta na economia. Regime constitucional dos serviços públicos. Monopólios federais e seu regime constitucional.	287
22A. O papel das pré-compreensões no Direito. Interpretação, moralidade positiva e moralidade crítica.	291
22B. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Técnicas decisórias na jurisdição constitucional.	294
22C. Direito fundamental à moradia e à alimentação.	298
23A. Direitos fundamentais culturais. Multiculturalismo e interculturalidade. Direito à diferença e ao reconhecimento.	301
23B. Súmula vinculante. Legitimidade e críticas. Mecanismos de distinção.	304
23C. Direitos fundamentais processuais: acesso à justiça, devido processo legal, contraditório, ampla defesa, vedação de uso de provas ilícitas, juiz natural e duração razoável do processo.	307
24A. Neoconstitucionalismo. Constitucionalização do Direito e judicialização da política.311
24B. Estatuto constitucional dos agentes políticos. Limites constitucionais da investigação parlamentar. Crimes de responsabilidade. Controle social, político e jurisdicional do exercício do poder. O princípio republicano.	313
24C. As funções essenciais à Justiça: Advocacia privada e pública. Representação judicial e consultoria jurídica da União, dos Estados e do Distrito Federal. A Defensoria Pública.	320
25A. Pluralismo jurídico. As fontes normativas não estatais.	322
25B. Inconstitucionalidade por omissão. Ação Direta e Mandado de Injunção.	324
25C. Conselho Nacional de Justiça. História, composição, competência e funcionamento.	327
1A. Constitucionalismo: trajetória histórica. Constitucionalismo liberal e social. Constitucionalismo britânico, francês e norte-americano.
Jorge Neto
CONCEITO: De acordo com SARMENTO, o constitucionalismo “é o movimento político que propugna pelo estabelecimento de uma Constituição que limite e organize o exercício do poder político”. Na mesma linha, CANOTILHO sustenta que o constitucionalismo “é a teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitado indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social de uma comunidade”. Esse conceito de constitucionalismo transporta, na visão de CANOTILHO, um claro juízo de valor, pois é, no fundo, “uma teoria normativa da política, tal como a teoria da democracia ou a teoria do liberalismo”. Assim, conclui CANOTILHO que o constitucionalismo moderno representa “uma técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos”. 
CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS: i) limitação do poder estatal (sobretudo pela ideia de separação dos poderes); e ii) instituição de direitos e garantias fundamentais. Neste sentido, eis o art. 16 da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”. Para Charles Howard McIlwain, a característica mais autêntica do constitucionalismo é “a limitação do governo pelo direito”.
TRAJETÓRIA HISTÓRICA: Embora o surgimento das Constituições seja considerado um fenômeno relativamente recente, pois as primeiras manifestações formais têm origem no final do século XVIII com as “Revoluções Liberais”, não se pode afirmar que a ideia de um conjunto de normas que discipline a atuação do Estado seja exclusiva da modernidade. De fato, tal como afirmou Ferdinand Lassale, todo ente estatal possuiu ao longo de sua trajetória uma Constituição real e verdadeira, sendo que o privilégio atribuído aos períodos mais recentes é o do nascimento de Constituições escritas em folhas de papel.
A propósito, deve-se destacar que na antiguidade já existiam leis que organizavam, ainda que de maneira incipiente, o próprio poder. Tais leis foram evoluindo e formaram a base para o desenvolvimento do constitucionalismo.
Segundo BARROSO, o termo constitucionalismo data de pouco mais de 200 anos, sendo associado aos processos revolucionários norte-americano e francês, em oposição ao Absolutismo. Todavia, as ideias centrais do constitucionalismo remontam à antiguidade clássica, no ambiente da polis grega, por volta do século V a.C.
Para SARMENTO: “A ideia de Constituição, tal como a conhecemos hoje, é produto da Modernidade, sendo tributária do Iluminismo e das revoluções burguesas dos séculos XVII e XVIII, ocorridas na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França. Ela está profundamente associada ao constitucionalismo moderno, que preconiza a limitação jurídica do poder político, em favor dos direitos dos governados”.
SARMENTO divide, didaticamente, a evolução história do constitucionalismo da seguinte forma: 1) Constitucionalismo antigo e medieval; 2) Constitucionalismo Moderno; 3) Constitucionalismo pós-moderno. Por sua vez, o Constitucionalismo Moderno foi construído sob três versões (inglesa; francesa; norte-americana). Ademais, no Constitucionalismo Moderno, além do estudo das 3 versões, destacam-se 2 fases (fase do Estado liberal-burguês e fase do Estado Social). Na contextualização temporal, é preciso ter em mente que as três versões acima mencionadas (inglesa; francesa e norte-americana) instauraram-se no seio do Estado Liberal-burguês e desenvolveram-se com a transição para a fase do Estado Social, de modo que é possível distinguir duas fases: constitucionalismo moderno do Estado Liberal-burguês e constitucionalismo moderno do Estado Social. Por fim, um novo modelo de constitucionalismo tem despontado: o constitucionalismo pós-moderno. Vejamos cada um deles:
1) CONSTITUCIONALISMO ANTIGO OU MEDIEVAL: remonta ao período da antiguidade clássica até final do século XVIII, quando surgem as primeiras constituições escritas, com predominância do jusnaturalismo. As experiências mais importantes na antiguidade são: a) Hebreus: era Teocrático, influenciado pela religião, os dogmas religiosos atuavam como limites ao poder do soberano. b) Grécia: vivenciou a democracia direta, com o início da racionalização do poder. Havia um regime político que se preocupava com a limitação do poder das autoridades e com a contenção do arbítrio. Contudo, essa limitação visava antes à busca do bem comum do que a garantia de liberdades individuais. A liberdade, no pensamento grego, cingia-se ao direito de tomar parte nas deliberações públicas da cidade-Estado, não envolvendo qualquer pretensão a não interferência estatal na esfera pessoal. Não se cogitava na proteção de direitos individuais contra os governantes, pois se partia da premissa de que as pessoas deveriam servir à comunidade política, não lhe podendo antepor direitos de qualquer natureza. Tal concepção se fundava numa visão organicista da comunidade política: o cidadão não era considerado em sua dignidade individual, mas apenas como parte integrante do corpo social. O cidadão virtuoso era o que melhor se adequava aos padrões sociais, não o que se distinguia como indivíduo. A liberdade individual não era objeto da especial valoração inerente ao constitucionalismo moderno. c) Roma: Para Ihering, “Nenhum outro Estado foi capaz de conceber a ideia de liberdade de uma forma tão digna e justa quanto o direito romano”. Em Roma já despontava a valorização da esfera individual e da propriedade, concomitante à sofisticação do direito privado romano e ao reconhecimento de direitos civis ao cidadão de Roma (direito ao casamento, à celebração de negócios jurídicos, à elaboração de testamento e à postulação em juízo). Ademais, algumas instituições do período republicano romano já prenunciavam a concepção moderna de separação dos poderes, notadamente a sua repartição por instituições como o Consulado, o Senado e a Assembleia, representativas de estamentos diferentes da sociedade, de forma a propiciar o equilíbrio entre eles. Apesar disso, não se cogitava de um constitucionalismo em sentido moderno (como fórmula de limitação do poder político em favor da liberdade dos governados); d) Idade Média, iniciada com a queda do Império Romano, correspondeu a um período caracterizado pelo amplo pluralismo político. Não havia qualquer instituição que detivesse o monopólio do uso legítimo da força, da produção de normas ou da prestação jurisdicional. O poder político fragmentara-se por múltiplas instituições, como a Igreja, os reis, os senhores feudais, as cidades, as corporações de ofício e o Imperador.
É importante destacar que, durante a idade média, foram celebrados alguns pactos instituidores de direitos e limitadores do poder, que influenciaram decisivamente o posterior surgimento do constitucionalismo moderno. Os exemplos mais citados são: Magna Charta Libertatum (1215) e o Petition of Rights (1628). Além destes, também são citados: o Habeas Corpus Act (1679), o Bill of Rights (1689) e o Act of Settlement (1701).
2) CONSTITUCIONALISMO MODERNO:  surgiu no final do século XVIII, como forma de superação do Estado Absolutista, sustentando a limitação jurídica do poder do Estado em favor da liberdadeindividual. Características históricas foram essenciais para o surgimento do constitucionalismo moderno, como a ascensão da burguesia como classe hegemônica; o fim da unidade religiosa na Europa, com a Reforma Protestante; e a cristalização de concepções de mundo racionalistas e antropocêntricas, legadas pelo Iluminismo. Sob as vozes do Iluminismo, a sociedade deixa o caráter organicista e passa a centrar-se na figura do indivíduo, concebido como um ser racional, titular de direitos, cuja dignidade independia do lugar que ocupasse no corpo coletivo. Evolui-se para o reconhecimento de direitos universais, pertencentes a todos. A sociedade não mais era concebida como um organismo social, formado por órgãos que exerciam funções determinadas (clero, nobres, vassalos). Ela passa a ser concebida como um conjunto de indivíduos, uma sociedade “atomizada” formada por unidades iguais entre si. Em harmonia com essa visão, desenvolveram-se as teorias de contrato social, que passaram a justificar a existência do Estado em nome dos interesses dos indivíduos. John Locke sustentava a ideia de que, ao celebrar o contrato social, as pessoas alienam para o Estado apenas uma parcela da liberdade irrestrita de que desfrutavam no Estado da Natureza, preservando determinados direitos naturais, que todos os governantes devem ser obrigados a respeitar. Esse jusnaturalismo difere daquele que predominara na Antiguidade e na Idade Média por não se basear na vontade divina, nem em imposições extraídas da natureza, mas em princípios acessíveis à razão humana, e por conferir primazia aos direitos individuais. O constitucionalismo moderno assenta-se em 3 pilares: a contenção do poder dos governantes, por meio da separação de poderes; a garantia de direitos individuais, concebidos como direitos negativos oponíveis ao Estado; e a necessidade de legitimação do governo pelo consentimento dos governados, pela via da democracia representativa. O constitucionalismo moderno conheceu três versões mais influentes: a inglesa, a francesa e a norte-americana.
2.1. O modelo inglês de constitucionalismo: Como na Inglaterra não chegou a haver propriamente absolutismo, a história do constitucionalismo adquire um perfil próprio. Desde o final da Idade Média, o poder real encontrava-se limitado por determinados costumes e pactos estamentais, como a Magna Carta de 1215, mas o constitucionalismo inglês só tem início a partir da Revolução Gloriosa de 1668, quando foi deposta a dinastia Stuart e foi assentado o princípio da supremacia política do Parlamento inglês, em um regime pautado pelo respeito aos direitos individuais. No curso do século XVII, foram editados três documentos constitucionais de grande importância: a Petition of Rights, de 1628; o Habeas Corpus Act, de 1679; e o Bill of Rights, de 1689, que garantiam importantes liberdades para os súditos ingleses, impondo limites à Coroa e transferindo poder ao Parlamento. A ideia central do constitucionalismo inglês é a de respeito às tradições constitucionais, não havendo um texto constitucional único que as consolide e organize. Inexiste, portanto, uma Constituição escrita na Grã-Bretanha. Ademais, entende-se que as normas constitucionais não decorrem apenas dos referidos textos esparsos, mas também de convenções constitucionais e de princípios da common law, desenvolvidos pelos tribunais. 
A ideia do exercício do poder constituinte, por meio de ruptura com o passado, com a refundação do Estado e da ordem jurídica, é estranha ao modelo constitucional inglês, que se assenta no respeito às tradições imemoriais. Nesse sentido, o constitucionalismo britânico é historicista, já que baseia a Constituição e os direitos fundamentais nas tradições do povo inglês. Em outras palavras, a evolução do constitucionalismo inglês é gradual e histórica, não abrupta ou revolucionária. Desenvolveu-se na Inglaterra o princípio constitucional de soberania do Parlamento, segundo o qual o Poder Legislativo pode editar norma com qualquer conteúdo. Não há a possibilidade de invalidação das suas decisões por outro órgão. Contudo, há na Inglaterra contemporânea uma tendência à alteração deste modelo de soberania irrestrita do Parlamento, pelo menos em matéria de direitos fundamentais. A mais importante expressão desta inflexão foi a aprovação, em 1998, do Humans Rights Act, que possibilitou ao Judiciário britânico a declaração de incompatibilidade de leis editadas pelo Legislativo com os direitos previstos naquele estatuto. Tal declaração não acarreta a invalidação da lei, mas cria um relevante fato político, gerando forte pressão para a revogação da norma violadora de direitos humanos.
2.2. O modelo francês de constitucionalismo: Tem como marco inicial a Revolução Francesa, iniciada em 1789, sendo a constituição escrita consagrada em 1791. Sob a perspectiva da teoria constitucional, a vontade de ruptura com o passado se expressou na teoria do poder constituinte, elaborada originariamente pelo Abade Emanuel Joseph Sieyès, em sua célebre obra Qu’est-ce que le Tier État?. Por essa teoria, o poder constituinte exprimiria a soberania da Nação, estando completamente desvencilhado de quaisquer limites impostos pelas instituições e pelo ordenamento do passado. Ele fundaria nova ordem jurídica, criando novos órgãos e poderes — os poderes constituídos — que a ele estariam vinculados. OBS.: destaca-se que o fundamento utilizado foi a “soberania da Nação”, que difere da “soberania do povo”. Para Sieyés, a detentora do poder era a nação, e não o conjunto dos nacionais. Sendo a Nação a detentora do poder e sendo essa uma concepção etérea/ideal, a resposta para a aparente incoerência entre a “igualdade” defendida e a exclusão dos iguais pelo voto censitário e masculino era justificada pelo argumento de que só podem exercer direitos políticos, na perspectiva liberal, aqueles que compõem o melhor da Nação (homens mais instruídos, de melhor condição social, reuniriam as condições que lhes permitiriam expressar, por meio do seu voto, a vontade da Nação).
A Constituição deveria corresponder a uma “lei” escrita, não se confundindo com um repositório de tradições imemoriais, ao contrário da fórmula inglesa. Ela pode romper com o passado e dirigir o futuro da Nação, inspirando-se em valores universais centrados no indivíduo. O protagonista do processo constitucional no modelo constitucional francês é o Poder Legislativo, que teoricamente encarna a soberania e é visto como um garantidor mais confiável dos direitos do que o Poder Judiciário. Isto levou, na prática, a que a Constituição acabasse desempenhando o papel de proclamação política, que deveria inspirar a atuação legislativa, mas não de autêntica norma jurídica, que pudesse ser invocada pelos litigantes nos tribunais. Tal pensamento vem sendo superado. Foi aprovada em 2008 (regulamentada em 2010), na França, a chamada “Questão Prioritária de Constitucionalidade”, permitindo que as partes aleguem incidentalmente a inconstitucionalidade de lei, por ofensa a direitos e liberdades fundamentais garantidos pela Constituição francesa, no âmbito de processos judiciais e administrativos. A questão deve ser encaminhada à Corte de Cassação ou ao Conselho de Estado que, por sua vez, podem provocar o Conselho Constitucional.
2.3. O modelo constitucional norte-americano: O fato de a colonização dos Estados Unidos ter sido realizada em boa parte por imigrantes que escapavam da perseguição religiosa na Europa contribuiu decisivamente para que se enraizassem na cultura política norte-americana ideias como a necessidade de limitação do poder dos governantes e de proteção das minorias diante do arbítrio das maiorias. A Constituição dos Estados Unidos foi aprovada pela Convenção da Filadélfia, em 1787, e depois ratificada pelo povo dos estados norte-americanos, vigorando desde então. Inovou ao instituir o presidencialismo e o sistema de freios e contrapesos, associado à separação de poderes. A plasticidade das cláusulas constitucionais mais importantes abriu a possibilidade de atualização daquela Constituiçãopela via interpretativa, para adaptá-la às novas demandas e valores que emergiam. O modelo constitucional dos Estados Unidos representa a tentativa de conciliação entre dois vetores. De um lado, o vetor democrático, de autogoverno do povo, captado pelas palavras que abrem o preâmbulo da Carta americana (We, the People of the United States...). Do outro, o vetor liberal, preocupado com a contenção do poder das maiorias para defesa de direitos das minorias. Uma ideia essencial do constitucionalismo estadunidense, derivada da sua matriz liberal, é a concepção de que a Constituição é norma jurídica que, como tal, pode e deve ser invocada pelo Poder Judiciário na resolução de conflitos, mesmo quando isto implique em restrição ao poder das maiorias no Legislativo ou no Executivo. Desenvolveu-se no direito norte-americano a noção de que os juízes, ao decidirem conflitos, podem reconhecer a invalidade de leis que contrariem a Constituição, deixando de aplicá-las ao caso concreto. Esta posição, sustentada por Hamilton no Federalista nº 78, foi formulada na jurisprudência da Suprema Corte pelo Juiz John Marshall, no célebre julgamento do caso Marbury v. Madison, em 1803. Em suma, no modelo constitucional dos Estados Unidos, a supremacia da Constituição não é apenas uma proclamação política, como na tradição constitucional francesa, mas um princípio jurídico judicialmente tutelado. O modelo não é livre de críticas. O controle judicial de constitucionalidade das leis (judicial review) sofre até hoje contestações nos Estados Unidos, sendo frequentemente apontado como um instituto antidemocrático, por transferir aos juízes, que não são eleitos, o poder de derrubar decisões tomadas pelos representantes do povo, com base nas suas interpretações pessoais sobre cláusulas constitucionais muitas vezes vagas, que se sujeitam a diversas leituras. Contudo, a jurisdição constitucional não apenas criou profundas raízes no Direito Constitucional daquele país, como também acabou se disseminando por todo o mundo, sobretudo a partir da segunda metade do século XX.
Fases do Constitucionalismo Moderno:
2.1) Constitucionalismo liberal-burguês: baseou-se na ideia de que a proteção dos direitos fundamentais dependia, basicamente, da limitação dos poderes do Estado. Naquele modelo, os direitos fundamentais eram concebidos como direitos negativos, que impunham apenas abstenções aos poderes políticos. O Estado era visto como o principal adversário dos direitos, o que justificava a sua estrita limitação, em prol da liberdade individual. Tal limitação era perseguida também por meio da técnica da separação dos poderes, que visava a evitar o arbítrio e favorecer a moderação na ação estatal. Na Economia Política era defendido o Estado mínimo, que confiava na “mão invisível do mercado” para promover o bem comum. O Estado deveria limitar-se a velar pela segurança das pessoas e proteger a propriedade, não lhe competindo intervir nas relações travadas no âmbito social, nas quais se supunha que indivíduos formalmente iguais perseguiriam os seus interesses privados, celebrando negócios jurídicos. Ele combateu os privilégios estamentais do Antigo Regime e a concepção organicista de sociedade. Porém, ignorava a opressão que se manifestava no âmbito das relações sociais e econômicas, existindo uma nítida contradição entre o discurso e a prática do constitucionalismo liberal-burguês no que tange à igualdade. A ideia de liberdade alentada pelo constitucionalismo liberal-burguês era muito mais identificada à autonomia privada do indivíduo, compreendida como ação livre de interferências estatais, do que à autonomia pública do cidadão, associada à soberania popular e à democracia. Além disso, a liberdade era concebida em termos estritamente formais, como ausência de constrangimentos externos, impostos pelo Estado à ação dos indivíduos. Ademais, o foco centrava-se mais sobre as liberdades econômicas do que sobre as liberdades existenciais.
2.2) Constitucionalismo Social: No final do século XIX e início do século XX, a extrema exploração da classe trabalhadora tornou-se insustentável. Na Europa Ocidental, a industrialização acentuara dramaticamente o quadro de exploração humana, que o Estado absenteísta não tinha como equacionar. A pressão social dos trabalhadores e de outros grupos excluídos, aliada ao temor da burguesia diante dos riscos e ameaças de rupturas revolucionárias inspiradas no ideário da esquerda, levaram a uma progressiva mudança nos papéis do Estado, que ensejou a cristalização de um novo modelo de constitucionalismo. Fica evidente que a suavização do capitalismo foi uma clara posição estratégica para evitar uma revolução da classe operária. Sobre o contexto, Lênin afirmou que preferia o capitalismo selvagem ao estado do bem-estar social, pois este tirava a energia necessária para a eclosão de uma revolução. No plano das ideias, despontavam o pensamento marxismo, o socialismo utópico e a doutrina social da Igreja Católica. A progressiva extensão do direito de voto a parcelas da população até então excluídas do sufrágio também contribuiu para a mudança de cenário. A democratização política, ao romper a hegemonia absoluta da burguesia no Parlamento, abrira espaço também para a democratização social. De mero garantidor das regras que deveriam disciplinar as disputas travadas no mercado, o Estado foi se convertendo num ator significativamente mais importante dentro da arena econômica, exercendo diretamente muitas atividades de produção de bens e serviços, como a realização de grandes obras públicas. No plano teórico, a sua atuação passa a ser justificada também pela necessidade de promoção da igualdade material, por meio de políticas públicas redistributivas e do fornecimento de prestações materiais para as camadas mais pobres da sociedade, em áreas como saúde, educação e previdência social. A proteção da propriedade privada é flexibilizada, passando a estar condicionada ao cumprimento da sua função social. É relativizada a garantia da autonomia negocial, diante da necessidade de intervenção estatal em favor das partes mais débeis das relações sociais. Há uma mudança, ainda, na leitura dos direitos, sendo desenvolvida a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Emergem os direitos de segunda geração, prestacionais, para efetivação da igualdade material. Sobre o discurso da igualdade formal, Anatole Frances escreve: “A majestosa igualdade das leis, que proíbe tanto o rico como o pobre de dormir sob as pontes, de mendigar nas ruas e de roubar pão.” A mudança no perfil do Estado refletiu-se também na sua engenharia institucional: a separação de poderes foi flexibilizada. A separação dos poderes estática (sociedades mais homogêneas, estado Liberal e/ou de Direito, sacralização da lei e do princípio majoritário), vigente no constitucionalismo liberal-burguês dá espaço à separação de poderes dinâmica (sociedade heterogêneas e pluralistas, Estado Democrático de Direito com aspectos sociais incorporados e maior participação popular, crise de representatividade e maior papel do Poder Judiciário), que se atenta para além da liberdade, para a efetividade, possibilitando uma atuação mais forte dos poderes públicos na seara social e econômica. O arranjo federalista também muda: as complexas tarefas assumidas pelo Estado não são exequíveis por um federalismo formal. É necessário o desenvolvimento de um federalismo cooperativo, com a participação de todos os entes federados. É preciso, aqui, diferenciar o Estado Social do Constitucionalismo Social: A necessidade de construção de um Estado mais forte, para atender às crescentes demandas sociais, foi utilizada como pretexto para aniquilação dos direitos individuais e das franquias democráticas. Este fenômeno foi intenso nas décadas de 1930 e 1940, com a instauração de regimes totalitários (Alemanha e Itália), ou autoritários (Brasil, no Estado Novo). Nestas situações, pode-se falar em Estado Social, mas não em constitucionalismo social. O constitucionalismo social não renega os elementos positivosdo liberalismo (preocupação com os direitos individuais e com a limitação do poder), mas pugna por conciliá-los com a busca da justiça social e do bem-estar coletivo.
Houve 2 fórmulas diferentes de recepção do Estado Social no âmbito do constitucionalismo democrático: 1ª) Exemplificada pela evolução do Direito Constitucional norte-americano a partir dos anos 30, os valores de justiça social e de igualdade material não foram formalmente incorporados à Constituição. Essa, no entanto, deixou de ser interpretada como um bloqueio à introdução de políticas estatais de intervenção na economia e de proteção dos grupos sociais mais vulneráveis. 2ª) Ilustrada pelas constituições mexicana, de 1917, e a alemã, de Weimar, de 1919. Elas não se limitaram a tratar da estrutura do Estado e da definição de direitos negativos, pois se imiscuem na disciplina de temas como a economia, as relações de trabalho e a família; moradia, saúde e previdência social. A maior parte das constituições elaboradas a partir da segunda metade do século passado seguiu, com maior ou menor sucesso, dita fórmula.
É inegável que o constitucionalismo social enfrenta crise desde as décadas finais do século passado, relacionada aos retrocessos que ocorreram no Welfare State (Estado de Bem-estar). A globalização econômica reduziu a capacidade dos Estados de formular e implementar políticas públicas para atender aos seus problemas sociais e econômicos, sob a influência do pensamento neoliberal, que preconiza a redução do tamanho do Estado, a desregulação econômica e a restrição dos gastos sociais. A população envelheceu e cresceu, demandando maiores gastos com previdência social, saúde e educação. A partir da década de 80, começam a se tornar hegemônicas propostas de retorno ao modelo de Estado que praticamente não intervinha na esfera econômica. Sob o estímulo da globalização da economia, se inicia um processo de reforma do Estado que alcança escala mundial. Reduzem-se as barreiras alfandegárias e não alfandegárias ao comércio internacional e ao fluxo de capitais. Os Estados diminuem ou eliminam a proteção que reservavam à empresa nacional. “Desterritorializa-se” o processo produtivo. A nova dinâmica da produção global estimula os Estados a flexibilizarem suas relações de trabalho, com o intuito de atrair investimento produtivo e de alcançar maior competitividade no mercado global. Ameaçados pela inflação, que leva à necessidade de redução dos gastos públicos, os Estados privatizam suas empresas e extinguem monopólios públicos. A atuação direta do Estado na economia é significativamente reduzida.
No que toca aos direitos sociais, o fim do constitucionalismo social seria moralmente inaceitável em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, caracterizados por grande injustiça social e desigualdade material.
Sobre a transição do constitucionalismo liberal para o social, Carlos Ayres Britto sustenta, na ADI 4246, que: “Naquela assentada, ainda deixei explícito ser a Defensoria Pública uma instituição especificamente voltada para a implementação de políticas públicas de assistência jurídica, assim no campo administrativo como no judicial. Pelo que, sob este último prisma, se revela como instrumento de democratização do acesso às instâncias judiciárias, de modo a efetivar o valor constitucional da universalização da justiça (inciso XXXV do art. 5º da CF/88). Fazendo de tal acesso um direito que se desfruta às expensas do estado, de sorte a se postarem (as defensorias) como um luminoso ponto de interseção do constitucionalismo liberal com o social. Vale dizer, a Defensoria Pública faz com que um clássico direito individual de acesso à Justiça se mescle com um moderno direito social; isto é, os mais pobres a compensar a sua inferioridade econômica com a superioridade jurídica de um gratuito bater às portas do Poder Judiciário ou da própria Administração Pública. O que já se traduz na concreta possibilidade de gozo do fundamental direito de ser parte processual, ora no âmbito dos processos administrativos, ora nos processos de natureza judicial. [...] Numa frase, aparelhar as defensorias públicas é servir, sim, ao desígnio constitucional de universalizar e aperfeiçoar a própria jurisdição como atividade básica do Estado e função específica do Poder Judiciário.”
3. Constitucionalismo pós-moderno: Até meados do século XX, no modelo hegemônico na Europa continental e em outros países filiados ao sistema jurídico romano-germânico, a regulação da vida social gravitava em torno das leis editadas pelos parlamentos, com destaque para os códigos, sob a premissa de que o Legislativo, que encarnava a vontade da Nação, tinha legitimidade para criar o Direito, mas não o Poder Judiciário, ao qual cabia tão somente aplicar aos casos concretos as normas anteriormente ditadas pelos parlamentos. Até então, a imensa maioria dos países não contava com mecanismos de controle judicial de constitucionalidade das leis, que eram vistos como institutos antidemocráticos, por permitirem um “governo de juízes”. Mesmo em alguns países em que existia a jurisdição constitucional — como o Brasil, em que ela foi implantada em 1890 e incorporada à Constituição de 1891 — o controle de constitucionalidade não desempenhava um papel relevante na cena política ou no dia a dia dos tribunais. Tal quadro começou a se alterar ao final da II Guerra Mundial na Europa, mediante as gravíssimas violações de direitos humanos perpetradas pelo nazismo, que demonstraram a importância de criação de mecanismos de garantia de direitos que fossem subtraídos pelas maiorias de ocasião. Na Alemanha, a Lei Fundamental de 1949, instituiu diversos mecanismos de controle de constitucionalidade e criou um Tribunal Constitucional Federal, que se instalou em 1951 e passou a exercer um papel cada vez mais importante na vida alemã. Na Itália, a Constituição de 1947 instituiu uma Corte Constitucional, que começou a funcionar em 1956. Na própria França, berço de um modelo de constitucionalismo avesso à jurisdição constitucional, o cenário se modificou substancialmente sob a égide da atual Constituição de 1958, que instituiu um modelo de controle de constitucionalidade originalmente apenas preventivo, confiado ao Conselho Constitucional, e hoje envolve também o controle repressivo. Na década de 70, Portugal e Espanha se redemocratizaram, libertando-se de governos autoritários, e adotaram constituições de caráter mais normativo, garantidas por meio da jurisdição constitucional.
Nesse contexto, “Uma das características marcantes do constitucionalismo contemporâneo reside na judicialização da política, verdadeira consequência do modelo constitucional adotado em diversos países ocidentais, e que deflui diretamente do constitucionalismo democrático construído, principalmente, a partir da segunda metade do século XX: Na ponta oposta, a emergência do constitucionalismo democrático no segundo pós-guerra, reforçada pela redemocratização, nos anos 70, do mundo ibérico europeu e americano, trazendo consigo a universalização do judicial review e afirmação das leis fundamentais que impõem limites à regra da maioria, é percebida como uma ampliação do conceito de soberania, abrindo para os cidadãos novos lugares de representação de sua vontade, a exemplo do que ocorre quando provocam o Judiciário para exercer o controle das leis. (VIANNA, Luiz Werneck. BURGOS, Marcelo. Revolução processual do direito e democracia progressiva. – extraído do Manual prático de Direitos Humanos Internacionais).
O que se observa atualmente é uma tendência global à adoção do modelo de constitucionalismo em que as constituições são vistas como normas jurídicas autênticas, que podem ser invocadas perante o Poder Judiciário e ocasionar a invalidação de leis ou outros atos normativos. E, muitas destas novas constituições que contemplam a jurisdição constitucional são inspiradas pelo ideário do Estado Social. A conjugação do constitucionalismo social com o reconhecimento do caráter normativo e judicialmente sindicável dos preceitos constitucionais gerou efeitossignificativos do ponto de vista da importância da Constituição no sistema jurídico — ela assumiu uma centralidade outrora inexistente —, bem como da partilha de poder no âmbito do aparelho estatal, com grande fortalecimento do Poder Judiciário, e, sobretudo, das cortes constitucionais e supremas cortes, muitas vezes em detrimento das instâncias políticas majoritárias. Sobre o tema, ver item 24.a (Neoconstitucionalismo).
Para finalizar, além da história do constitucionalismo, é preciso pontuar para onde ele caminha. O constitucionalismo moderno foi erigido a partir de um pressuposto fático, que hoje já não se verifica plenamente o Estado nacional soberano, detentor do monopólio da produção de normas, da jurisdição e do uso legítimo da força no âmbito do seu território, que não reconhece qualquer poder superior ao seu. O Estado continua sendo o principal ator político no mundo contemporâneo. Porém, com a globalização, atualmente, o Estado nacional perdeu em parte a capacidade que tinha para controlar os fatores econômicos, políticos, sociais e culturais que atuam no interior das suas fronteiras, pois esses são cada vez mais influenciados por elementos externos, sobre os quais os poderes públicos não exercem quase nenhuma influência. No mundo contemporâneo, os Estados nacionais, sozinhos, não conseguem enfrentar alguns dos principais problemas com que se deparam em áreas como a economia, o meio ambiente e a criminalidade. Em paralelo, surgem novas entidades internacionais ou supranacionais, no plano global ou regional, que exercem um poder cada vez maior e tensionam a soberania estatal e a supremacia constitucional. Ao lado disso, desenvolve-se na sociedade global, desde o final da II Guerra Mundial, um “cosmopolitismo ético”, que cobra dos Estados mais respeito aos direitos humanos, não aceitando a invocação da soberania ou de particularismos culturais como escusa para as mais graves violações à dignidade humana.
Nesse cenário, surgem fontes normativas e instâncias de resolução de conflitos alheias ao Estado, que não se subordinam ao Direito estatal, inclusive ao emanado da Constituição. O constitucionalismo em rede ou multinível toma o lugar da tradicional pirâmide Kelseniana; a emergência do Direito Comunitário, sobretudo no contexto europeu; o fortalecimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos; e a difusão global de uma lex mercatoria, composta por práticas aceitas pelos agentes do comércio internacional, que se situam às margens dos ordenamentos estatais; o conflito entre o universalismo dos direitos fundamentais e o respeito às diferenças culturais, são exemplos de questões colocadas à frente do constitucionalismo. Para que o constitucionalismo estatal não se torne autista, Marcelo Neves sustenta o transconstitucionalismo para manutenção do diálogo constitucional entre diferentes esferas, permitindo que as respectivas imperfeições e incompletudes sejam percebidas e eventualmente corrigidas. Esses são alguns dos desafios a serem enfrentados pelo constitucionalismo pós-moderno.
Ponto extra: O problema da legitimidade intergeracional 
Problema tormentoso surge da questão da legitimidade intergeracional, ou seja, do fato de uma geração adotar decisões vinculativas para as outras que a sucederão, principalmente no que pertine às cláusulas pétreas, cuja superação, como é cediço, só é possível através de uma ruptura da ordem jurídica. No entanto, o constitucionalismo democrático, além de valorar positivamente o fato de a Constituição ser dotada de supremacia, procura atribuir a importância devida às deliberações populares e às decisões da maioria dos representantes do povo. Contudo, registre-se que cada geração tem o direito de viver de acordo com seus valores, de forma que, cabe ao poder constituinte difuso, ou seja, a mutação constitucional deve ser a ferramenta para interpretar de forma a combinar com a realidade vigente.
Questões de prova oral:
(27º CPR) Deborah Duprat - Queria que você, rapidamente, me falasse sobre as principais características do constitucionalismo britânico, norte-americano e francês.
(27º CPR) Deborah Duprat - O que aproxima e o que distingue, na atualidade, o constitucionalismo brasileiro contemporâneo do constitucionalismo norte-americano?
(28º CPR) Deborah Duprat - Você diria, então, que nossa Constituição - você me disse que as razões religiosas não podem entrar no debate público, mesmo elas tendo essa filtragem que as transformam em razões públicas – essa é uma posição marcadamente liberal. A questão religiosa é uma questão de foro íntimo, uma questão reservada ao espaço doméstico, ao espaço privado, não tem lugar no espaço público. Você acha que a Constituição de 88 é uma constituição marcadamente liberal?
(28º CPR) Deborah Duprat: Deixa eu te fazer uma pergunta, sempre problematizando. Para uma determinada comunidade amazônica, na sua cosmologia, todos os seres da natureza são humanos. Eles estão, temporariamente, encarnados em plantas, bichos, mas, a qualquer momento, eles podem se transformar em humanos. Então, a noção de família passa por esses seres também – as árvores, os peixes, enfim, tem uma família extensa que não abrange somente as pessoas que estão agora encarnadas, mas naquelas que podem vir a ser encarnadas... Você acha que uma pretensão desse tipo, de reconhecimento de uma família que não é apenas antropocêntrica, você acha que isso pode ser trazido para o debate público, ou essa é uma visão que se aproxima de uma visão religiosa?
1B. Poder Legislativo. Organização. Atribuições do Congresso Nacional. Competências do Senado e da Câmara. Legislativo e soberania popular. A crise da representação política.
Isabella de Souza
Estrutura do Poder Legislativo.
Poder legislativo federal: no âmbito federal, vigora o bicameralismo: a câmara dos deputados, composta por representantes do povo, e o senado federal, composta por representantes dos estados membros.
Poder legislativo estadual: é unicameral, sendo composto pela assembleia legislativa, composta por deputados estaduais. De acordo com o art. 27, caput, da CF/88, o número de deputados da assembleia legislativa corresponderá ao triplo da representação do estado na câmara dos deputados e, atingindo o número de 36, será acrescido de tantos quantos forem os deputados federais acima de doze. Por expressa determinação constitucional (art. 27, § 1º), as regras da CF/88 sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às forças armadas serão aplicadas aos parlamentares estaduais.
Não há necessidade de prévia autorização da Assembleia Legislativa para que o STJ receba denúncia ou queixa e instaure ação penal contra Governador de Estado, por crime comum. Se o STJ receber a denúncia ou queixa-crime contra o Governador. O afastamento do cargo não se dá de forma automática. O STJ poderá aplicar qualquer uma das medidas cautelares penais (ex: prisão preventiva, proibição de ausentar-se da comarca, fiança, monitoração eletrônica etc.).
Poder legislativo municipal: é unicameral, sendo constituído pela câmara dos vereadores, composta por vereadores municipais. De acordo com o art. 29 da CF/88, o número de vereadores do município será fixado proporcionalmente à população, nos limites previstos no mesmo artigo (mínimo de 09, nos municípios com até 15 mil habitantes, e máximo de 55, nos municípios com mais de 8 milhões de habitantes. Por expressa determinação constitucional (art. 29, VIII), os vereadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do município.
Poder legislativo distrital: é unicameral, constituído pela câmara legislativa (art. 32, caput, da CF/88), composta por deputados distritais. De acordo com o art. 32, §3º, da CF/88, aos deputados distritais e à câmara legislativa aplica-se o disposto no art. 27, ou seja, todas as regras estabelecidas para os estados valem para o distrito federal.
Poder legislativo dos territórios federais: de acordo com o art. 33, §3º, da CF/88, alei disporá sobre as eleições para a câmara territorial e sua competência deliberativa. Como não existem territórios federais, ainda não foi regulamentado tal dispositivo constitucional. Deve-se observar, contudo, que, quando criados, de acordo com o art. 45, §2º, da CF/88, cada território elegerá o número fixo de 4 deputados federais, para compor a câmara dos deputados do congresso nacional.
O TCU, por força do art. 71, VI, da CF/88, tem competência para fiscalizar o uso dos recursos federais repassados a outros entes federados, como no caso de verbas federais repassadas ao Distrito Federal. Diante da autonomia própria dos entes federados, a fiscalização, pelo TCU, dos recursos federais repassados ao Distrito Federal não impede que o TCDF também faça a fiscalização da aplicação desses mesmos recursos (interesse na regular prestação dos serviços de saúde) (Info 674). Observação: Nas ações de ressarcimento ao erário e improbidade administrativa ajuizadas em face de eventuais irregularidades praticadas na utilização ou prestação de contas de valores decorrentes de convênio federal, o simples fato de as verbas estarem sujeitas à prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União, por si só, NÃO justifica a competência da Justiça Federal (STJ, Info 724). Em sentido contrário, o Enunciado nº 16 da 5ª CCR: Em havendo transferência de recursos da União, inclusive fundo a fundo, a fiscalização federal atrai a atribuição do Ministério Público Federal.
Atribuições do congresso nacional.
Reservas legais: o art. 48 trata das atribuições conferidas ao congresso nacional para as quais se exige sanção presidencial (são reservas legais, ou seja, atribuições materializadas por lei).
Competências exclusivas: já o art. 49 trata das matérias de competência exclusiva do congresso nacional, sendo dispensada a manifestação do presidente da república através de sanção ou veto (são atribuições materializadas por decreto legislativo).
Câmara dos deputados.
Composição: a câmara dos deputados é composta por representantes do povo. Eleição: os deputados federais são eleitos pelo povo segundo o princípio proporcional, de acordo com o art. 45, §1º, da CF/88. Se os territórios federais vierem a ser criados, elegerão o número fixo de 04 deputados cada. Atualmente, o número total de deputados federais é fixado pela LC78/93 em 513. Mandato: 04 anos, sendo permitida a reeleição. Requisitos para a candidatura dos deputados: a) ser brasileiro nato ou naturalizado (art. 14, §3º, I, CF/88); a exigência de ser brasileiro nato é apenas para ocupar a presidência da câmara (art. 12, §3º, II, CF/88); b) ser maior de 21 anos (art. 14, §3º, VI, c, CF/88); c) estar em pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, §3º, II, CF/88); d) estar alistado eleitoralmente (art. 14, §3º, III, CF/88); e) domicílio eleitoral na circunscrição (art. 14, §3º, IV, CF/88); f) filiação partidária (art. 14, §3º, VI, CF/88). Competências privativas da câmara: as matérias de competência privativa da câmara dos deputados estão previstas no art. 51 da CF/88 e não dependem de sanção ou veto presidencial (são materializadas por meio de resoluções). Obs.: a câmara tem apenas a iniciativa de projeto de lei que vise à fixação da remuneração dos cargos, empregos e funções de seus serviços, devendo, necessariamente, depois de aprovada nas duas casas, a matéria ir à sanção do presidente da república (trata-se de mudança realizada pela EC19/98, que retirou da câmara a competência privativa para a fixação da referida remuneração, atribuindo-lhe tão somente a iniciativa da lei). OBS.: REDIMENSIONAMENTO DO NÚMERO DE DEPUTADOS POR RESOLUÇÃO DO TSE E INCONSTITUCIONALIDADE - Resolução do TSE invadiu a competência do Congresso Nacional. A Lei Complementar 78/1993 não fixou critérios de cálculo, nem delegou sua fixação ao TSE, que usou critérios próprios para determinar o quantitativo dessas representações, introduzindo inovações legislativas para as quais não tem competência. “Ao TSE não compete legislar, e sim promover a normatização da legislação eleitoral”.
Senado federal.
Composição: o senado é composto por representantes dos estados e do DF. Se criados, os territórios não terão representação no senado, na medida em que não têm autonomia federativa. Eleição: os senadores são eleitos pelo povo segundo o princípio majoritário, de acordo com o art. 46 da CF/88. Cada estado e o DF elegerão o número fixo de 3 senadores, sendo que cada senador é eleito com 02 suplentes. Mandato: é de 08 anos (duas legislaturas), permitindo-se a reeleição. A renovação dos senadores eleitos dar-se-á a cada 04 anos, na proporção de 1/3 e 2/3. Requisitos para a candidatura dos senadores: a) ser brasileiro nato ou naturalizado (art. 14, §3º, I, CF/88); a exigência de ser brasileiro nato é apenas para ocupar a presidência do senado (art. 12, §3º, III, CF/88); b) ser maior de 35 anos (art. 14, §3º, VI, a, CF/88); c) estar em pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, §3º, II, CF/88); d) estar alistado eleitoralmente (art. 14, §3º, III, CF/88); e) domicílio eleitoral na circunscrição (art. 14, §3º, IV, CF/88); f) filiação partidária (art. 14, §3º, VI, CF/88). Competências privativas do senado: as matérias de competência privativa do senado estão previstas no art. 52 da CF/88 e não dependerão de sanção presidencial (são materializadas através de resolução). Obs.: o senado tem apenas a iniciativa de projeto de lei que vise à fixação da remuneração dos cargos, empregos e funções de seus serviços, devendo, necessariamente, depois de aprovada nas duas casas, a matéria ir à sanção do presidente da república (trata-se de mudança realizada pela EC19/98, que retirou do senado a competência privativa para a fixação da referida remuneração, atribuindo-lhe tão somente a iniciativa da lei).
Ativismo Congressual: manifesta-se em casos nos quais o Congresso Nacional, via emenda constitucional ou por meio de leis ou resoluções, busca reverter situações consideradas de “autoritarismo judicial” ou de “comportamento antidialógico” do Judiciário. Note-se que o trânsito em julgado de decisão proferida pelo STF em processo objetivo garante a plena eficácia de sua decisão em relação ao ato normativo impugnado. Contudo, a atividade legislativa futura não estará vinculada ao que restou decidido. Ex: “Emenda da Vaquejada”.
STF: As decisões definitivas de mérito proferidas pelo STF no julgamento de ADI, ADC ou ADPF possuem eficácia contra todos (erga omnes) e efeito vinculante (§ 2º do art. 102 da CF/88). 
O Poder Legislativo, em sua função típica de legislar, não fica vinculado. No caso de reversão jurisprudencial (reação legislativa) proposta por meio de emenda constitucional, a invalidação somente ocorrerá nas restritas hipóteses de violação aos limites previstos no art. 60, e seus §§, da CF/88. A emenda somente poderá ser declarada inconstitucional se ofender uma cláusula pétrea ou o processo legislativo para edição de emendas. No caso de reversão jurisprudencial proposta por lei ordinária, a lei que frontalmente colidir com a jurisprudência do STF nasce com presunção relativa de inconstitucionalidade (leis in your face), de forma que caberá ao legislador o ônus de demonstrar, argumentativamente, que a correção do precedente se afigura legítima. Assim, para ser considerada válida, o Congresso Nacional deverá comprovar que as premissas fáticas e jurídicas sobre as quais se fundou a decisão do STF no passado não mais subsistem. O Poder Legislativo promoverá verdadeira hipótese de mutação constitucional pela via legislativa. STF. Plenário. ADI 5105/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 1º/10/2015 (Info 801).
Efeito backlash: consiste em uma reação conservadora de parcela da sociedade ou das forças políticas (em geral, do parlamento) diante de uma decisão liberal do Judiciário em um tema polêmico.
Legislativo e Soberania Popular: Para José Afonso da Silva (2010, p. 131), a democracia repousa sobre dois princípios fundamentais: (a) soberania popular (o povo é a única fonte de poder) e (b) participação, direta ou indireta,do povo no poder (para que este seja a efetiva expressão da vontade popular). A forma pela qual o povo participa no poder dá origem a três tipos de democracia: direta, indireta (ou representativa) e semidireta. O Brasil adota o tipo semidireto, ou seja, democracia representativa, com alguns institutos de participação direta. Portanto, o Poder Legislativo, por meio dos representantes legitimamente eleitos pelo povo, é o veículo primordial para o exercício da soberania popular.
A Crise da Representação Política: Nas democracias ocidentais, é possível identificar as assembleias parlamentares, periodicamente eleitas, como expressão concreta da Representação política. Esta é um fenômeno complexo, cujo núcleo consiste num processo de escolha dos governantes e de controle sobre sua ação através de eleições competitivas. É um conceito multidimensional que abarca o fenômeno da seleção de lideranças, de delegação de soberania popular, de controle, de participação indireta e de questionamento político. Atualmente, a democracia representativa encontra-se na penumbra, diante da quebra global da confiança, marcada pela corrupção, descrédito quanto à capacidade das instituições e dos agentes políticos de agir de modo funcionalmente adequado. A crise da representação política no Brasil se insere no interior de um quadro mais amplo e que reflete, de forma quase planetarizada, os mesmos problemas da (1) diminuição da participação eleitoral, (2) declínio da relação de identificação entre representantes e representados e (3) o aumento das taxas de alienação eleitoral conjugado com o crescimento do processo de exclusão social; para alguns autores ainda há as questões relativas à crise da democracia e o declínio da importância dos partidos políticos nas democracias contemporâneas. Concomitantemente, é verificada uma crescente crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade no âmbito do Legislativo, alimentando o Judiciário na direção do ativismo judicial, em nome da Constituição, com a prolação de decisões que suprem omissões e, por vezes, inovam na ordem jurídica, com caráter normativo geral. (BARROSO, Luís Roberto). 
A crise de identidade da democracia representativa: Associada, antes de tudo, pela falta de confiança GLOBAL no sistema representativo. Envolve também a crítica a atores centrais dessa democracia, como os partidos políticos. Crítica que tem por base o distanciamento dos representantes dos interesses precípuos da sociedade (problema do issue voting, bandeiras irreais de defesa e que oferecem pouca capacidade de análise das convicções do representante). As pesquisas de confiança demonstram que os partidos políticos estão sempre nas últimas posições, como instituições pouco confiáveis. No Brasil, sem dúvida, a maior crítica ainda é o altíssimo nível de corrupção. 
Déficit democrático das instituições representativas, SARMENTO afirma: “Em que pese a universalização do direito de voto alcançada ao longo do século XX, hoje uma série de fatores - que vão da influência do poder econômico nas eleições, até a apatia e distanciamento do cidadão em relação à res publica - tende a segregar os representantes dos representados, minando a crença de que os primeiros vocalizariam na esfera política a vontade dos segundos. O problema é universal, mas, no Brasil, há componentes que o agravam de forma exponencial, abalando profundamente a credibilidade das instituições de representação popular. [...]. Neste quadro preocupante, a objeção democrática contra o ativismo judicial se arrefece, sobretudo quando o Judiciário passa a agir em favor de causas “simpáticas” aos anseios populares, como a proteção dos direitos sociais.” 
Possíveis instrumentos de superação de crise democrática: Não apenas com a democracia representativa e as formas de diálogo oficiais, mas também com as instâncias semioficiais e informais, audiências públicas, utilização de amicus curiae, abertura a uma sociedade participativa, abertura de diálogos com a opinião pública, orçamento participativo, inclusão do “terceiro gênero” (associações, sindicatos, etc.), utilização de pesquisas. 
Instâncias contramajoritárias: As instâncias majoritárias são aquelas compostas por membros eleitos diretamente pelo voto majoritário do povo. As instituições majoritárias por excelência são o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Os atos e leis advindos do Poder Executivo e Poder Legislativo são, assim, atos que gozam de presunção de constitucionalidade e legitimidade democrática, pois os representantes do povo foram eleitos para realizarem esses atos e editarem essas leis. O Poder Judiciário, por sua vez, é composto de membros vitalícios, que não são eleitos, não têm seus mandatos periodicamente sujeitos à revisão e não precisam prestar contas continuamente à população. No entanto, o Poder Judiciário possui a competência de realizar o controle judicial de constitucionalidade das leis e, assim, invalidar atos e leis aprovados majoritariamente pelos representantes do povo. Daí decorre a dificuldade contramajoritária do Poder Judiciário. Vale dizer, a legitimidade do Poder Judiciário para decidir sobre a constitucionalidade de uma lei não é lógica, automática, pois os juízes carecem de legitimidade democrática – eles não são eleitos pelo voto popular e não estão sujeitos a revisões periódicas de seus mandatos. Quando se confere ao Poder Judiciário essa tarefa (controle judicial das leis), sua atuação é, assim, pressupostamente contramajoritária.
Relação entre jurisdição constitucional e democracia: Sinteticamente, é a relação entre a limitação do exercício do poder pela lei (constituição) e exercício do poder pela maioria, logo seria a relação conflituosa entre a vontade da maioria e os direitos fundamentais da minoria. 
Instância de “representação argumentativa”: Está dentro da proposta de solução para a conflituosidade entre a jurisdição constitucional e democracia, leia-se o caráter contramajoritário do poder judiciário, proposta por Alexy. Segundo o qual a dificuldade do caráter contramajoritário da Suprema Corte é suprida pela argumentação necessária para a fundamentação e justificação de suas decisões.
Vontade de Constituição: É um conceito do Konrad Hesse, respondendo ao Ferdinand Lassale, dizendo que a Constituição não é um mero conjunto das forças reais de poder, mas também é norma, e suas normas impõem uma verdadeira vontade de constituição.
“Acordos para discordar”: Ligado à ideia procedimentalista, que compreende a constituição como a norma que possibilita os meios de definição do “desacordo” sobre o conteúdo dos direitos fundamentais. Para os substancialistas, os direitos fundamentais estariam estabelecidos e definidos a priori, mas para os procedimentalistas seriam apenas procedimentos “acordos” para que posteriormente fosse viabilizada a discussão em sociedade para que se chegue a um conceito (ex. direito a vida e aborto).
Dizer o Direito - decisões mais recentes 
Deputados Estaduais gozam das mesmas imunidades formais previstas para os parlamentares federais no art. 53 da CF/88: Por força do § 1º do art. 27 da Constituição Federal, as imunidades materiais e formais conferidas aos membros do Congresso Nacional (deputados federais e senadores) estendem-se aos deputados estaduais. Assim, são constitucionais dispositivos da Constituição do Estado que estendem aos Deputados Estaduais as imunidades formais previstas no art. 53 da Constituição Federal para Deputados Federais e Senadores. STF. Plenário. ADI 5824/RJ e ADI 5.825/MT, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 16/12/2022 (Info 1081).
É permitida apenas uma reeleição ou recondução sucessiva ao mesmo cargo da Mesa Diretora, mantida a composição das mesas das Assembleias Legislativas eleitas antes da data de publicação da ata de julgamento da ADI 6524/DF (7.1.2021). Teses fixadas pelo STF: (i) a eleição dos membros das Mesas das Assembleias Legislativas estaduais deve observar o limite de uma única reeleição ou recondução, limite cuja observância independe de os mandatos consecutivos referirem-se à mesmalegislatura; (ii) a vedação à reeleição ou recondução aplica-se somente para o mesmo cargo da mesa diretora, não impedindo que membro da mesa anterior se mantenha no órgão de direção, desde que em cargo distinto; (iii) o limite de uma única reeleição ou recondução, acima veiculado, deve orientar a formação da Mesa da Assembleia Legislativa no período posterior à data de publicação da ata de julgamento da ADI 6.524, de modo que não serão consideradas, para fins de inelegibilidade, as composições eleitas antes de 7.1.2021, salvo se configurada a antecipação fraudulenta das eleições como burla ao entendimento do Supremo Tribunal Federal. STF. Plenário. ADI 6688/PR, ADI 6698/MS, ADI 6714/PR, ADI 7016/MS, ADI 6683/AP, ADI 6686/PE, ADI 6687/PI e ADI 6711/PI, Rel. Min. Nunes Marques, julgados em 7/12/2022 (Info 1079).
Os requerimentos de providências investigativas direcionados a Comissões Parlamentares de Inquérito devem ser fundamentados adequadamente. A Constituição Federal atribui às Comissões Parlamentares de Inquérito poderes de investigação próprios das autoridades judiciais. Por essa razão, é lícito a tais órgãos colegiados decretarem no curso de seus trabalhos medidas de apuração que impliquem restrições circunstanciais a direitos fundamentais de pessoas de interesse, como a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico. Esses poderes, contudo, devem ser exercidos de forma fundamentada e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, impondo à esfera jurídica dos indivíduos apenas aquelas limitações imprescindíveis às tarefas de investigação. Esse entendimento está consolidado no âmbito do STF, que assentou que o deferimento de providências investigatórias por Comissões Parlamentares de Inquérito precisa ser devidamente motivado, demonstrada em qualquer caso a proporcionalidade da medida implementada (MS 24.817, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello).
Os requerimentos de providências investigativas direcionados a Comissões Parlamentares de Inquérito devem ser fundamentados adequadamente, de modo a: (i) individualizar as condutas a serem apuradas; (ii) apresentar os indícios de autoria; (iii) explicitar a utilidade das medidas para a caracterização das infrações; (iv) delimitar os dados e informações buscados. STF. 1ª Turma. MS-AgR 38.130, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/08/2022.
Com o término dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito, restam prejudicadas as ações de mandado de segurança impetradas contra atos da CPI. STF. 1ª Turma. MS-AgR 38.130, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/08/2022.
Não estão protegidas pela imunidade parlamentar as manifestações injuriosas de Senador proferidas em redes sociais de forma dolosa e genérica, com intenção de destruir reputações, sem qualquer indicação de prova que pudesse corroborar as acusações. A liberdade de expressão não alcança a prática de discursos dolosos (actual malice), com intuito manifestamente difamatório, de juízos depreciativos de mero valor, de injúrias em razão da forma ou de críticas aviltantes. A garantia da imunidade parlamentar, que deve ser compreendida de forma extensiva para a garantia do adequado desempenho de mandatos parlamentares, não alcança os atos que sejam praticados sem claro nexo de vinculação recíproca do discurso com o desempenho das funções parlamentares (teoria funcional) ou nos casos em que for utilizada para a prática de flagrantes abusos, usos criminosos, fraudulentos ou ardilosos. STF. 2ª Turma. Pet 8242, 8259, 8262, 8263, 8267 e 8366 AgR/DF, Rel. Min. Celso de Mello, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgados em 3/5/2022 (Info 1053).
Norma estadual ou municipal não pode conferir a parlamentar, individualmente, o poder de requisitar informações ao Poder Executivo. O art. 49, X, da CF/88 é taxativo ao conferir exclusivamente às Casas do Poder Legislativo a competência para fiscalizar os atos do Poder Executivo. Não se admite que norma estadual crie outras modalidades de controle ou inovem a forma de exercício desse controle ultrapassando aquilo que foi previsto na Constituição Federal, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes (art. 2º). STF. Plenário. ADI 4700/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 13/12/2021 (Info 1041).
Constituições estaduais podem prever a reeleição de membros das mesas diretoras das assembleias legislativas para mandatos consecutivos, mas essa recondução é limitada a uma única vez. O art. 57, § 4º, da CF, não é norma de reprodução obrigatória por parte dos Estados-membros. É inconstitucional a reeleição em número ilimitado, para mandatos consecutivos, dos membros das Mesas Diretoras das Assembleias Legislativas Estaduais para os mesmos cargos que ocupam, sendo-lhes permitida uma única recondução. STF. Plenário. ADI 6720/AL, ADI 6721/RJ e ADI 6722/RO, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 24/9/2021 (Info 1031).
Teses fixadas pelo STF: i) a eleição dos membros das mesas das assembleias legislativas estaduais deve observar o limite de uma única reeleição ou recondução, limite cuja observância independe de os mandatos consecutivos referirem-se à mesma legislatura; ii) a vedação à reeleição ou recondução aplica-se somente para o mesmo cargo da mesa diretora, não impedindo que membro da mesa anterior se mantenha no órgão de direção, desde que em cargo distinto; e iii) o limite de uma única reeleição ou recondução, acima veiculado, deve orientar a formação das mesas das assembleias legislativas que foram eleitas após a publicação do acórdão da ADI 6.524, mantendo-se inalterados os atos anteriores. STF. Plenário. ADI 6684/ES, ADI 6707/ES, ADI 6709/TO e ADI 6710/SE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/9/2021 (Info 1030).
Assim como ocorre com os Parlamentares federais, é vedado o pagamento de valor a mais a Deputados Estaduais pelo fato de terem sido convocados para sessão extraordinária. STF. Plenário. ADPF 836/RR, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 2/8/2021 (Info 1024). 
Deputado Estadual pode receber ajuda de custo, não havendo afronta ao regime de subsídio. É constitucional norma estadual que estabeleça o pagamento a parlamentar — no início e no final de cada sessão legislativa — de ajuda de custo correspondente ao valor do próprio subsídio mensal. STF. Plenário. ADI 6468/SE, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 2/8/2021 (Info 1024).
Governador não pode ser obrigado a depor em CPI instaurada no Congresso Nacional. Em juízo de delibação, não é possível a convocação de governadores de estados-membros da Federação por Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada pelo Senado Federal. A convocação viola o princípio da separação dos Poderes e a autonomia federativa dos estados-membros. STF. Plenário. ADPF 848 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 25/6/2021 (Info 1023).
São inconstitucionais os dispositivos da Lei nº 10.001/2000 que impõem deveres aos membros do MP no que tange às conclusões da CPI. São formalmente inconstitucionais os dispositivos da Lei nº 10.001/2000, de iniciativa do Poder Legislativo, que tratam de atribuições do Ministério Público (art. 2º, caput e parágrafo único e art. 4º). A Constituição Federal reserva ao Presidente da República e ao Chefe do Ministério Público o poder de iniciativa para deflagrar o processo legislativo no que concerne a normas de organização e atribuições do Ministério Público. Além disso, os arts. 2º e 4º da Lei nº 10.001/2000 são materialmente inconstitucionais por ofenderem a independência e a autonomia funcional e administrativa do Ministério Público. Por outro lado, é constitucional o art. 3º da Lei nº 10.001/2000, que confere prioridade aos processos e procedimentos decorrentes de relatórios de Comissão Parlamentar de Inquérito. STF. Plenário. ADI 5351/DF, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 18/6/2021 (Info 1022). 
O subsídio dos deputados estaduais deve ser fixado por lei em sentido formal. A vinculação do valor do subsídio dos Deputados Estaduais ao quantum estipulado pela União aos deputados federais é incompatível com o princípio federativoe com a autonomia dos entes federados (art. 18, da CF/88). É vedada a vinculação ou a equiparação remuneratória em relação aos agentes políticos ou servidores públicos em geral. STF. Plenário. ADI 6437/MT, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).
É possível a prorrogação da competência criminal originária do Supremo Tribunal Federal, quando o parlamentar federal, sem solução de continuidade, encontrar-se investido, em novo mandato federal, mas em casa legislativa federal diversa. Admite-se a excepcional e exclusiva prorrogação da competência criminal originária do Supremo Tribunal Federal, quando o parlamentar, sem solução de continuidade, encontrar-se investido, em novo mandato federal, mas em casa legislativa diversa daquela que originalmente deu causa à fixação da competência originária, nos termos do art. 102, I, “b”, da Constituição Federal. STF. Plenário. Pet 9189, Rel. Min. ROSA WEBER, Relator(a) p/ Acórdão: Edson Fachin, julgado em 12/05/2021.
A instalação de uma CPI não se submete a um juízo discricionário seja do Presidente da casa legislativa, seja do plenário da própria casa legislativa. Depende unicamente do preenchimento dos requisitos previstos no art. 58, § 3º, da Constituição Federal, ou seja: a) o requerimento de um terço dos membros das casas legislativas; b) a indicação de fato determinado a ser apurado; e c) a definição de prazo certo para sua duração. STF. Plenário. MS 37760 MC-Ref/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 14/4/2021 (Info 1013).
A imunidade material parlamentar não deve ser utilizada para atentar frontalmente contra a própria manutenção do Estado Democrático de Direito. Os crimes que, em tese, foram praticados pelo Deputado (Caso Daniel) são inafiançáveis por duas razões: 1) porque foram praticados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV, da CF/88; art. 323, III, do CPP); e 2) porque, no caso concreto, estão presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva, de sorte que estamos diante de uma situação que não admite fiança, com base no art. 324, IV, do CPP. Encontra-se, portanto, configurada a possibilidade constitucional de prisão em flagrante de parlamentar pela prática de crime inafiançável, nos termos do § 2º do art. 53 da CF/88. STF. Plenário. Inq 4781 Ref, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 17/2/2021 (Info 1006).
1C. Ministério Público: História e princípios constitucionais. Organização. As funções constitucionais do Ministério Público.
André Batista e Silva
Atualizado por Valmir Neto (2023)
História. Há controvérsia sobre a origem do Ministério Público. Várias categorias de agentes com funções de determinar o cumprimento da lei são apontados como “precursores” do que hoje é o Ministério Público. Tais agentes existiriam desde a Idade Antiga (funcionários do Faraó do Egito, Tesmoteti, na Grécia; Praefectus urbi, em Roma). Mas foi na França, em 1302, que foi institucionalizado o MP, por meio da ordonnance do Rei Felipe, constituindo os procureurs du roi. Em 1690, os membros do Parquet passaram a ter vitaliciedade. Há autores que, com razão, consideram que o MP só passou a ter um perfil mais parecido com o atual a partir da Revolução Francesa.
No Brasil, não tendo sido mencionado na Constituição de 1824, o MP surgiu no Código de Processo Criminal de 1832, e seus membros eram livremente escolhidos e demitidos. Em 1890, o MP é considerado instituição necessária (Decreto n. 1.030). A CF 1891 limita-se a dizer que o Presidente da República designará, dentre os Ministros do STF, o PGR. A CF 1934 institucionalizou o MP como órgão de cooperação nas atividades governamentais, na União, no DF, nos Territórios e nos Estados. O PGR é escolhido livremente pelo Presidente da República, com aprovação do Senado, entre cidadãos que preencham os requisitos para ser Ministros do STF, e é demissível ad nutum. Seus membros são estáveis e escolhidos por concurso público. A CF 1937 só se refere ao MP a respeito da designação do PGR e do quinto constitucional. A CF 1946 volta a organizar o MP, e, agora, em título especial, fora da estrutura dos demais Poderes. Ao MPF compete também a representação judicial da União. Seus membros têm estabilidade, inamovibilidade e são escolhidos por concurso público. A CF 1967 recolocou o MP dentro da estrutura do Poder Judiciário, mantendo as demais regras. A CF 1969 voltou a posicionar o MP no Poder Executivo. A CRFB 1988 representa uma forte ascensão do MP, que passa a estar situado fora da estrutura dos demais Poderes.
A Constituição de 1988 promoveu uma revolução institucional para o Ministério Público, em especial na área cível: “de predominantemente interveniente em ações individuais para predominantemente agente nas causas de interesse coletivo. No MPF, a revisão foi ainda mais radical, se desincumbindo da função de representante judicial da União que o caracterizava nos primeiros 100 anos de existência para assumir as funções de ombudsman, ou seja, de controle da Administração Pública que antes representava, e de legitimado coletivo, na qual, muitas vezes, precisa demandar justamente contra entes federais. Giro de 180º (...) Com a Constituição Federal nasceu um novo Ministério Público Federal” (Gavronski).
Definição: de acordo com o art. 127, caput, da CF/88, o ministério público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Regulamentando a CF/88, foram editadas a Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – LONMP, dispondo sobre normas gerais para a organização do MP dos estados) e a Lei Complementar n. 75/1993 (Lei Orgânica do Ministério Público da União – LOMPU, dispondo sobre a organização, atribuição e estatuto do MPU).
Organização: o art. 128, I, tratou do MP da união (MPU), enquanto o art. 128, II, tratou do MP dos estados (MPE). Conforme se extrai da CRFB/88, há um ministério público que atua na justiça comum – tanto federal (MPF) quanto estadual (MPE) – e outros que atuam perante os ramos especializados da justiça federal – justiça do trabalho (MPT), justiça militar (MPM) e justiça eleitoral. 
O Ministério Público brasileiro abrange: 
- MPU: compreende o MPF, MPDFT, MPT e MPM; e
- MPE.
Ministério Público Militar. Cabe observar, porém, que apesar de no âmbito federal existir uma carreira própria do MP com atuação perante a justiça militar (MPM), no âmbito estadual, tanto no primeiro quanto no segundo grau, a atuação se dá por um membro do MPE, não havendo uma carreira própria e específica de ministério público militar estadual. Ressalte-se que o Ministério Público Militar não dispõe de legitimidade para atuar, em sede processual, perante o STF. Isso porque a representação institucional do Ministério Público da União, nas causas instauradas na Suprema Corte, cabe ao Procurador-Geral da República, que é, por definição constitucional (art. 128, § 1º), o Chefe do Ministério Público da União, que abrange também o Ministério Público Militar (STF. 2ª Turma. HC 155245 AgR-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 11/11/2019).
Ministério Público Eleitoral. Do mesmo modo, o MP eleitoral não tem estrutura própria e a sua formação é mista, sendo composto de membros do MPF e do MPE. Apesar disso, a função eleitoral desempenhada pelo Ministério Público tem natureza federal, de modo que, quando atuam como órgãos eleitorais, os promotores de justiça os fazem como MPF, estando sujeitos à legislação que rege o Ministério Público Federal. Assim, nos termos da LC75/93 (que rege o MPU), as funções eleitorais do MPF perante os juízes e juntas eleitorais serão exercidas pelo promotor eleitoral, que é membro de MPE; já as funções eleitorais nas causas de competência dos tribunais eleitorais serão exercidas pelo MPF.
Atenção: o PGR é o Procurador-Geral Eleitoral, que designará vice-PGEleitoral. Ademais, incumbe ao PGEleitoral designar o Procurador Regional Eleitoral (PRE) e seu substituto em cada Estado e no DF, dentre osProcuradores Regionais da República no Estado e no DF, ou, onde não houver, dentre os Procuradores da República vitalícios, para mandato de 2 anos, podendo ser reconduzido uma vez. O PRE pode ser destituído, antes do término do mandato, por iniciativa do Procurador-Geral Eleitoral, anuindo a maioria absoluta do Conselho Superior do MPF.
Obs.1.: Compete ao PRE designar os membros do Ministério Público estadual que atuarão junto à Justiça Eleitoral em 1º Grau. Norma declarada constitucional pelo STF (ADI 3.802).
Obs.2.: O “Ministério Público junto aos Tribunais de Contas” integra o próprio Tribunal de Contas.
Sobre o conflito de atribuição, vale destacar tabela do Dizer o Direito:
	QUEM DECIDE O CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO?
	SITUAÇÃO
	QUEM IRÁ DIRIMIR
	MPE do Estado 1 x MPE do Estado 1
	Procurador-Geral de Justiça do Estado 1
	MPF x MPF
	CCR, com recurso ao PGR
	MPU (ramo 1) x MPU (ramo 2)
	Procurador-Geral da República
	MPE x MPF
	CNMP
	MPE do Estado 1 x MPE do Estado 2
	CNMP
Princípios constitucionais: o art. 127, §1º, da CRFB/88, prevê como princípios institucionais do MP a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.
I) Unidade: sob a égide de um só chefe, o MP deve ser visto como uma instituição única, sendo a divisão existente meramente funcional;
II) Indivisibilidade: é possível que um membro do MP substitua outro, dentro da mesma função, sem que, com isso, exista qualquer implicação prática; quem exerce os atos, em essência, é a instituição, e não a pessoa do promotor ou procurador;
III) Independência funcional: trata-se de autonomia de convicção, na medida em que os membros do MP não se submetem a qualquer poder hierárquico no exercício de seu mister, podendo agir, no processo, da maneira que melhor entenderem; a hierarquia existente restringe- se às questões de caráter administrativo, materializada pelo chefe da instituição, mas nunca de caráter funcional.
Princípio do promotor natural: além de ser julgado por órgão independente e pré-constituído, o acusado também tem o direito e a garantia constitucional de somente ser processado por um órgão independente do estado, vedando-se, por consequência, a designação arbitrária, inclusive, de promotores ad hoc ou por encomenda. Depois de muito debate, o STF aceitou a tese do promotor natural no HC 67.759. O postulado do promotor natural repele, a partir da vedação de designações casuísticas efetuadas pela chefia da instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do MP, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e predeterminados, estabelecidos em lei.
Garantias do Ministério Público:
I - Garantias institucionais:
a) autonomia funcional – é inerente à instituição como um todo e abrange todos os órgãos do MP, estando prevista no art. 127, §2º, da CF/88, no sentido de que, ao cumprir seus deveres institucionais, o membro do MP não se submeterá a nenhum outro poder, órgão, autoridade pública, etc., devendo observar apenas a constituição, a lei e a própria consciência;
b) autonomia administrativa – prevista no art. 127, §2º, a autonomia administrativa consiste na capacidade de direção de si próprio, autogestão, autoadministração, um governo de si; assim, o MP poderá, observado o disposto no art. 169 da CF/88, propor ao poder legislativo a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de provas ou de provas e títulos, a política remuneratória e os planos de carreira; O art. 79 da LC 75/93, que confere ao Procurador Regional Eleitoral a incumbência de designar os membros do Ministério Público estadual que atuarão junto à Justiça Eleitoral, é constitucional, tanto sob o ponto de vista formal como material. O Procurador-Geral da República detém a prerrogativa, ao lado daquela atribuída ao Chefe do Poder Executivo, de iniciar os projetos de lei que versem sobre a organização e as atribuições do Ministério Público Eleitoral. A designação de membro do Ministério Público local (estadual) como Promotor Eleitoral por Procurador Regional Eleitoral, que é membro do Ministério Público Federal, não afronta a autonomia administrativa do Ministério Público do Estado. (STF. Plenário. ADI 3802/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 10/3/2016, Info 817).
c) autonomia financeira – prevista no art. 127, §3º, assegurou ao MP a capacidade de elaborar sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na LDO, podendo, autonomamente, administrar os recursos que lhe forem destinados; a EC 45/04 regulamentou o procedimento de encaminhamento da proposta orçamentária do MP e a solução em caso de inércia; e proibiu a realização de despesas ou a assunção de obrigações que extrapolem os limites fixados na LDO, exceto se previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais. “É indispensável a efetiva participação do Ministério Público no ciclo orçamentário, não podendo ser imposta limitação de despesas na folha complementar do Parquet sem a sua participação nessa estipulação” (Info 163/STF).
II - Garantias dos membros:
a) vitaliciedade – adquire-se a vitaliciedade após a transcorrência do período probatório, ou seja, 02 anos de efetivo exercício do cargo, tendo sido admitido na carreira, mediante aprovação em concurso de provas e títulos; a garantia da vitaliciedade assegura ao membro do MP a perda do cargo somente por sentença judicial transitada em julgado; Na hipótese de membro de Ministério Público praticar falta administrativa também prevista na lei penal como crime, o prazo prescricional da ação civil para a aplicação da pena administrativa de perda do cargo somente tem início com o trânsito em julgado da sentença condenatória na órbita penal. (STJ. 2ª Turma. REsp 1535222-MA, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 28/3/2017, Info 601).
b) inamovibilidade – o membro do MP não poderá ser removido ou promovido, unilateralmente, sem a sua autorização ou solicitação; excepcionalmente, contudo, por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do MP (no caso, o CNMP), por voto da maioria absoluta de seus membros, desde que lhe seja assegurada a ampla defesa, poderá vir a ser removido do cargo ou função;
c) irredutibilidade de subsídios – é assegurada ao membro do MP a garantia da irredutibilidade de subsídio (a garantia é contra a irredutibilidade nominal, e não contra a corrosão inflacionária). 
Impedimentos: de acordo com os arts. 128, §5º, II, §6º, e 129, IX, da CRFB, os membros do MP não poderão: a) receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais; b) exercer advocacia; c) exercer representação judicial e consultoria jurídica de entidades públicas; d) participar de sociedade comercial, na forma da lei; e) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; f) exercer atividade político-partidária, sem qualquer exceção, nos termos da restrição trazida pela EC 45/04 – a Res. TSE 22.095/2005 previu ser imediata e sem ressalvas a aplicação da EC 45/04, abrangendo aqueles que adentraram nos quadros do MP tanto antes quanto depois da referida EC; em igual sentido, o art. 13 da res. TSE 11.156/2006 estabeleceu que os magistrados, membros dos tribunais de contas e membros do MP devem filiar-se a partido político e afastar-se definitivamente de suas funções até 06 meses antes das eleições; em sentido contrário, porém, há julgado monocrático do TSE que entendeu pela não aplicação da regra da EC45/04, que veda o exercício de atividade político-partidária por membro do MP, por força do art. 29, §3º, do ADCT, àqueles que ingressaram na carreira antes da promulgação da CF/88; destaca-se, ainda, o entendimento adotado pelo STF no RE59.794, que assegurou a membro do MP que já exercia cargo eletivo o direito a concorrer à reeleição; g) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; h) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos 03 anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.
Funções institucionais: as funções institucionais do MP estão previstas no art. 129 da CRFB/88 em rol exemplificativo, uma vez que o inciso IX estabelece que compete, ainda, ao MP exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade.
A tarefa de custos constitutionis – legitimidade e limitações. Em um sentido amplíssimo, pode-se considerar que o MP funciona como fiscal da Constituição por meio de todas as suas atitudes, judiciais ou extrajudiciais, na medida em que todas caminham no sentido de proteção direta ou ao menos indireta das normas da Constituição Federal. Num sentido mais específico, fala-se em custos constitutionis como atividade do MP no âmbito do controle de constitucionalidade. E em sentido restritíssimo – em simetria à designação de custos legis como sendo apenas a tarefa de intervenção no processo, sem ter sido o autor da ação –, custos constitutionis é a tarefa de opinar nos processos de controle de constitucionalidade em que não seja parte. 
Ampla legitimidade do PGR no controle de constitucionalidade. O PGR detém legitimidade para ajuizar ADI, ADC e ADPF perante o STF, tendo como parâmetro a CRFB, sendo sua legitimidade “universal”, abrangendo qualquer matéria passível de ser objeto de tais ações, independentemente de pertinência temática. O PGR será previamente ouvido em todos os processos de competência do STF, inclusive nas ações diretas de controle de constitucionalidade e naquelas em que a questão constitucional chega ao STF pela via recursal, destacando-se o Recurso Extraordinário, devendo o PGR opinar livremente, atuando com independência para defender a Constituição. Além disso, o MP pode manifestar-se em qualquer incidente de inconstitucionalidade (observados os prazos e condições fixados no Regimento do Tribunal, CPC, art. 482, §1º), o que faz com igual independência. Ademais, cabe ao PGR suscitar o incidente de deslocamento competência perante o STJ (art. 109, §5º, da CRFB).
Nesse sentido, decidiu o STF que “os Estados-membros da Federação, no exercício da competência outorgada pela Constituição Federal (art. 25, caput, c/c art. 125, § 2º, CF), não podem afastar a legitimidade ativa do Chefe do Ministério Público Estadual para propositura de ação direta de inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça local” (STF. Plenário. ADI 5.693/CE, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 18/11/2021).
Obs.: PODER INVESTIGATÓRIO DO MP: O Supremo Tribunal Federal decidiu que o Ministério Público pode investigar. A decisão da Suprema Corte foi proferida no Recurso Extraordinário 593.727/MG (com repercussão geral) e resulta de uma adequada interpretação da Constituição e da lógica de qualquer sistema acusatório. Isso envolve a “teoria dos poderes implícitos”. O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado e qualquer pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas profissionais de que se acham investidos, em nosso país, os advogados (lei 8906/94, artigo 7º, incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre presente no Estado Democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula Vinculante 14), praticados pelos membros dessa instituição.
Precedentes recentes/importantes: 1) O STF julgou inconstitucional dispositivo de lei estadual que institui gratificação aos membros do MP pela prestação de serviço à Justiça Eleitoral a ser paga pelo Poder Judiciário, uma vez que tal previsão representa uma inadequada ingerência na autonomia financeira do Poder Judiciário. (STF. Plenário. ADI 2831/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 30/4/2021. Info 1015 do STF); 2) O STF considerou constitucional uma lei do RJ que permitia que o MP requisitasse ao delegado de polícia explicações, quando não fosse concluído IP dentro do prazo de 30 dias em que o réu estivesse solto; 3) Segundo o STJ, o acesso do MPF às informações inseridas em procedimentos disciplinares conduzidos pela OAB depende de prévia autorização judicial; e 4) STF: É constitucional a regra que prevê a prerrogativa membros do MP de se sentarem do lado direito de juízes durante os julgamentos e audiências.
2A. Constituição e Cosmopolitismo. O papel do direito comparado e das normas e jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição.
André Batista e Silva
Atualizado por Valmir Chaves de O. Neto (2023)
I. Cosmopolitismo
O cosmopolitismo pressupõe o pensamento de que a humanidade segue as leis do Universo (cosmos), isto é, considera os homens como formadores de uma única nação, não vendo diferenças entre elas, parte da ideia de uma sociedade cosmopolita de cidadãos do mundo (Kant). É ligado ao direito natural! A aceleração da globalização após o fim da Segunda Guerra Mundial, e, principalmente, o fim da bipolaridade que caracterizou o período da guerra fria, ampliou o espaço conceitual para se pensar o projeto cosmopolita. O cosmopolitismo é atrelado à ideia de que os Direitos Humanos são universais, e que a constituição não pode retroagir direitos humanos, tal como se vê no princípio da vedação do retrocesso, o que se vincula a um “’cosmopolitismo ético’, que cobra dos Estados mais respeito aos direitos humanos, não aceitando a invocação da soberania ou de particularismos culturais como escusa para as mais graves violações à dignidade humana.” (SARMENTO, 2012, p. 11)
O cosmopolitismo, na práxis, também está relacionado ao diálogo com o pensamento de autores estrangeiros e ao exame das constituições e da jurisprudência constitucional de outros países.
Conceitos relacionados: 1 - Constituições privadas (normas não estatais e nem públicas que disciplinariam subsistemas sociais. Criticado por Sarmento por extrapolar o limite semântico da palavra constituição); 2 - Lex mercatória (“ordem jurídico-econômica mundial no âmbito do comércio transnacional”); 3 - Constitucionalismo multinível ou Pluralismo constitucional (convivência, às vezes tensa, entre diversas esferas constitucionais sobre um mesmo território); 4 - Neofeudalismo jurídico (caracterizado pela pluralidade das fontes normativas e jurisdicionais); 5 - Transconstitucionalismo (‘pontes de transição’ e a promoção de ‘conversações constitucionais’ entre as diversas ordens jurídicas: estatais, internacionais, transnacionais, supranacionais e locais); 6 - Princípio do cosmopolitismo (impõe que se atribua o devido peso argumentativo ao Direito Internacional dos Direitos Humanos na interpretação da Constituição); e 7 - Cosmopolitismo colonizado (importação acrítica e sem mediação de teses e precedentes estrangeiros).
II. Cosmopolitismo x Comunitarismo nas Relações Internacionais 
Para os liberais, ou cosmopolitas, o indivíduo possui uma essência ou valor anterior à sociedade. Há uma precedência ontológica do indivíduo em relação ao meio social. Há compreensão do indivíduo como uma abstração, desgarrado do contexto histórico-social, dotado de uma significação própria, independentemente da sociedade em que vive. Ligado ao jusnaturalismo dos pensadores modernos, na qual o indivíduo é um Ser dotado de natureza universal. Ao contrário, os comunitaristas (MORRICE, 2000) apontam a precedência ontológica da sociedade em relação ao indivíduo. Para os comunitaristas, o homem é um ser social, dotado de características sociais como história, cultura,valores e princípios comuns, constituído em uma determinada relação espaço-temporal. Advém disso o relativismo cultural, a compreensão de diferenças e a exclusão de interferências outras que não as da respectiva sociedade.
III. Peter Häberle e a “sociedade aberta” de intérpretes
Häberle sustenta a canonização da comparação constitucional como um quinto método de interpretação constitucional, além dos quatro desenvolvidos por Savigny (gramatical, lógico, histórico e sistemático). Para ele, a interpretação dos institutos se implementa mediante comparação nos vários ordenamentos jurídicos. Assim, o Estado constitucional cooperativo deve substituir o Estado constitucional nacional. Para isso, o recurso ao direito comparado e às normas e jurisprudência internacionais deve ser empregado como método de interpretação, de modo a promover a abertura da sociedade para fora. Eis o que requer a interpretação pluralista da Constituição, para moldar uma cidadania que combina a igualdade de oportunidades com respeito à diferença, superando a cidadania homogeneizante e negadora das diferenças: abertura para dentro, isto é, o reconhecimento da sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – todos os que vivem a norma, e não só os juízes constitucionais, acabam por interpretá-la ou pelo menos co-interpretá-la – abertura ao mundo (ou cooperação). Interpreta-se o texto constitucional como aberto, cooperante e integrante de uma rede de outros textos constitucionais e internacionais com o mesmo propósito (especialmente nos direitos fundamentais).
IV. O Direito comparado e a Constituição brasileira
A importância do direito comparado e das normas e jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição decorre da constatação de que, hoje, o direito constitucional não começa onde termina o direito internacional, e o contrário também é válido. Lembre-se, a propósito, o § 3º do art. 5º da CRFB. Como diz Häberle (2007, p. 61): “A ideologia do monopólio estatal das fontes jurídicas torna-se estranha ao Estado constitucional quando ele muda para o Estado constitucional cooperativo. Ele não mais exige monopólio na legislação e interpretação: ele se abre – de forma escalonada – a procedimentos internacionais ou de Direito Internacional de legislação, e a processos de interpretação.”
A CRFB abre-se ao mundo e ao Estado constitucional cooperativo em diversos dispositivos: (1) no art. 4º, inc. IX, que erige a "cooperação entre os povos para o progresso da humanidade" em princípio reitor das relações internacionais do País e, no parágrafo único, diz: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações"; (2) nos §§ 2º, 3º e 4º do art. 5º, segundo os quais: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes [...] dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte", "Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais"; "O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão".
V. Interconstitucionalismo
Diante desta tendência mundial de globalização do direito constitucional, Marcelo Neves alude à provável superação do constitucionalismo provinciano ou paroquial pelo TRANSCONSTITUCIONALISMO, mais adequado para as soluções dos problemas de direitos fundamentais e humanos. Neste sentido, Canotilho chega a sugerir a formulação da denominada TEORIA DA INTERCONSTITUCIONALIDADE, na busca de estudar as relações interconstitucionais, ou seja, a concorrência, a convergência, justaposição e conflito de várias constituições e de vários poderes constituintes no mesmo espaço político.
Existe uma tendência crescente e positiva de invocação do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Comparado na interpretação constitucional. Há uma troca de experiências, conceitos e ideias entre cortes nacionais e internacionais, com a possibilidade de aprendizado recíproco entre as instâncias envolvidas nesse diálogo – fertilização cruzada.
Há Estados cujas constituições expressamente recomendam a adoção de uma ótica cosmopolita na interpretação constitucional, a exemplo da África do Sul e de Portugal. Na Europa, as cortes nacionais têm de levar em consideração as normas ditadas pela União Europeia, a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, a Convenção Europeia de Direitos Humanos e a sua interpretação realizada pela Corte Europeia de DH. Até mesmo nos EUA, há precedentes de interpretação cosmopolita (casos Lawrence v. Texas, e Roper vs. Simmons).
2B. Poder Executivo. Histórico. Presidencialismo e Parlamentarismo. Presidencialismo de coalizão. Presidente da República: estatuto. Competências. Poder normativo autônomo, delegado e regulamentar. Ministros de Estado.
Valmir Neto
Histórico. A noção de Poder Executivo, na modernidade, remonta à “Teoria da Separação dos Poderes”, proposta por Montesquieu (1689-1755).
O presidencialismo remete ao sistema implantado em 1787 nos EUA, com a criação de um Executivo independente do Legislativo, e, ao mesmo tempo, sujeito ao sistema de pesos e contrapesos de Montesquieu. O parlamentarismo surgiu na Inglaterra, a partir dos séculos XII e XIII, como resposta aos privilégios monárquicos.
Origem do Presidencialismo: Convenção de Filadélfia nos EUA. Influência da monarquia limitada (ou constitucional), da revolução de 1688 (Grã-Bretanha), mas construído a partir do sistema Republicano.
Origem do Parlamentarismo: Construção lenta e histórica inglesa, especialmente no século XVIII. Também possui como marco a revolução de 1688 e a consequente separação de poderes. Em razão da quebra sucessória dos Stuarts (ramo católico), o trono inglês foi assumido pela casa de Hanôver (Jorge I e II), de origem germânica e sem identificação com a Inglaterra. Assim, a figura do primeiro-ministro ganhou destaque como o verdadeiro governante (o primeiro foi o Sr. Walpole). Surgiu a figura do impeachment (procedimento penal) e da responsabilidade política (seguir a linha política do parlamento, sob pena de renúncia forçada).
Sistema de governo é o modo como se dá a relação entre os Poderes dentro de um Estado; sobretudo entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Diferencia-se da forma de governo, que é definida como o modo em que se dá a relação entre governantes e governados. As principais espécies de sistema de governo são: presidencialismo e parlamentarismo. Quadro comparativo apresentado por Bernardo Gonçalves Fernandes:
	Presidencialismo
	Parlamentarismo
	Identidade entre chefia de estado e chefia de governo (são a mesma pessoa).
Chefe de estado exerce função simbólica de representar internacionalmente o país e de corporificar a sua unidade interna.
Chefe de governo executa as políticas públicas. Ou seja, é quem efetivamente governa e exerce a liderança da política nacional.
	Não há identidade entre chefia de estado e chefia de governo. O chefe de estado pode ser um rei (um monarca) ou um presidente, ao passo que o chefe de governo é o 1º ministro, que exerce o governo conjuntamente com o seu gabinete (conselho de Ministros).
	Estabilidade de governo. Há a figura dos mandatos fixos para o cargo de presidente.
	Estabilidade democrática, construída pelo povo nos processos democráticos. Pode até existir a figura do mandato mínimo e do mandato máximo, todavia ele não é fixo. Nesse sentido, tem por fundamento a existência dos institutos: 
I) possibilidade de queda do gabinete pelo parlamento (através da “moção de censura” ou “voto de desconfiança”); e 
II) possibilidade cotidiana de dissolução do parlamento pelo gabinete.
Poder Executivo. Poder Executivo é o órgão constitucional em que se concentram as funções de cunho executivo nos moldes explicitados no art. 2º da Constituiçãode 1988, que delimita os poderes da União, cuja função está atrelada ao exercício da atividade executiva na República Federativa do Brasil.
Segundo José Afonso da Silva, a expressão Poder Executivo tem significado variado. Nela se confundem o Poder e o governo. Ora ela exprime a função ou a atribuição de um Poder (CF, art. 2º), ora o órgão (cargo e ocupante, CF, art. 76).
Konrad Hesse: a expressão Poder Executivo transformou-se em um conceito negativo daquilo que não está compreendido nas atividades do Poder Legislativo e do Poder Judiciário. A ideia abrange funções de governo e administração.
Função típica: chefia de Estado e de governo. Atípica: legislar por medida provisória (art. 62 CF) e julgar no “contencioso administrativo” no caso da defesa de multa de trânsito, do IPEM, da SEMAB, do CADE, TIT etc. Crítica: A função jurisdicional é marcada pelo caráter definitivo da decisão, inexistente no contencioso administrativo. Basicamente, suas funções estão estabelecidas no art. 84 da Constituição. 
O Poder Executivo, nos termos do art. 76 da Constituição, é exercido pelo Presidente da República (PR) com o auxílio dos Ministros de Estado (cargos de livre nomeação e exoneração do Presidente da República).
As condições de elegibilidade estão no art. 14, § 5º. O PR é eleito mediante sufrágio universal. A reeleição é possível para um único período subsequente, a partir da EC n. 16/1997. A eleição é pelo critério majoritário absoluto, que, se não for alcançado no primeiro turno, exige a realização de novo escrutínio. A linha sucessória do Presidente da República será: Vice-Presidente, Presidente da Câmara, Presidente do Senado e Presidente do STF (arts. 78 e ss. da CF). 
Atenção: o STF entende que, na hipótese do substitutos eventuais do PR (Presidentes da CD, do SF e do STF) ostentarem a posição de réus criminais, ficarão impossibilitados de exercer, em caráter interino, a chefia do Poder Executivo da União.
Impedimento: são afastamentos temporários do presidente da República. Vacância: é um afastamento definitivo do presidente (morte, renúncia, perda do cargo etc.).
Na hipótese de a vacância do cargo operar-se nos dois primeiros anos do mandato, far-se-á uma eleição 90 dias depois de aberta a última vaga (eleição direta); ocorrendo nos últimos dois anos do período presidencial, haverá a eleição indireta promovida, em 30 dias, pelo Congresso Nacional. A perda do mandato ocorrerá nas seguintes hipóteses:
1. Cassação (decorrente de decisão do Senado nos processos por crime de responsabilidade, ou de decisão do STF em caso de crime comum);
2. Declaração de vacância do cargo pelo Congresso Nacional;
3. Extinção (renúncia, morte, suspensão dos direitos políticos);
4. Ausência do país, sem licença do Congresso, por mais de 15 dias.
Desde 1994, em sede de análise de Medida Cautelar na ADI n. 1057, o STF tem reiteradamente entendido que o artigo 81, §1º, da Constituição Federal (regramento da sucessão presidencial no caso de dupla vacância) não é uma norma de reprodução obrigatória pelos Estados e Municípios em suas respectivas Constituições/Leis Orgânicas. Segundo o Supremo, compete aos entes federados, como decorrência do princípio federativo, o exercício da autonomia política administrativa para estabelecerem as regras da sucessão na hipótese da dupla vacância na chefia do Poder Executivo.
Competência. José Afonso da Silva classifica as atribuições do Presidente da República em três funções básicas:
a) Chefia do Estado: art. 84, VII, VIII, XVIII, segunda parte, XV, XVI, primeira parte, XIX, XX, XXI e XXII. b) Chefia do Governo: art. 84, I, III, IV, V, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XVII, XVIII, primeira parte, XXIII, XXIV e XXVII. c) Chefia da Administração Federal: art. 84, II, VI, XVI, segunda parte, XXIV e XXV.
Atribuições delegáveis → Apenas três são delegáveis aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União: a) Inciso VI (decretos autônomos); b) Inciso XII (conceder indulto e comutar penas); c) Inciso XXV, primeira parte – prover (por lógica, abrange o desprover -exonerar) os cargos públicos na forma da lei.
Estatuto: imunidades e prerrogativas. Imunidade formal: só poderá ser processado por crime comum ou de responsabilidade após o juízo de admissibilidade da Câmara dos Deputados (CD). E, enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, não se sujeita à prisão. Prerrogativa de foro: só poderá ser processado e julgado pelo STF no caso de crimes comuns, e pelo Senado nos crimes de responsabilidade. Por fim, o § 4º do art. 86, da CRFB, estabelece a irresponsabilidade temporária pelas infrações que não se relacionam com o exercício de suas funções. NÃO possui imunidades materiais, apenas imunidades processuais. Imunidade processual temporária (por atos estranhos ao cargo, somente responde após o mandato (art. 86, §4, da CRFB) - consequências: a prescrição fica suspensa, após o mandato não haverá controle de admissibilidade pela CD).
Os crimes de responsabilidade serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento, atualmente disciplinados na Lei n. 1079/50.
CF/88, Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União; II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País; V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária; VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Súmula vinculante 46-STF - A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.
	Crime Comum
	Crime de Responsabilidade
	Natureza
	Infração Penal (crime)
	Infração Político-administrativa
	Penas Possíveis
	Reclusão, detenção, Perda de bens etc.
	Perda do mandato (impeachment) e inabilitação para o exercício da função
	Provocação
	PGR por meio de denúncia
	Qualquer cidadão
	Juízo prévio de admissibilidade
	Câmara dos Deputados (2/3)
	Câmara dos Deputados (2/3)
	Juízo definitivo de admissibilidade
	STF (decisão de recebimento da denúncia ou queixa)
	Não há
	Competência
	STF
	Senado Federal
	Afastamento das funções
	A partir da decisão de admissibilidade do STF
	A partir da instauração do processo pelo Senado
Poder Normativo Autônomo: a EC n. 32/2001 positivou a figura dos decretos autônomos, estabelecendo que compete ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre: a) a organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos (art. 84, inciso VI, da Constituição). A doutrina (veja-se Celso Antônio Bandeira de Mello) criticou duramente essa inovação, mas o STF a respaldou (ADI 2.564). 
Poder Regulamentar: previsto no art. 84, IV, da Constituição. O regulamento de execução explicita a lei sem inovar a ordem jurídica, sem criar direitos e obrigações, em face do princípio constitucional da legalidade. Segundo a doutrina, fixa as regras destinadas a colocar em execução os princípios institucionais delimitados e estabelecidos na lei. Poder delegado: a delegação legislativa ao Presidente da República tem seus limites e contornos previstos no art. 68 da Constituição. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a delegação pode ser retirada pelo Congresso Nacional a qualquer momento.
	Decreto Regulamentar (Art. 84, IV)
	Decreto Autônomo (Art. 84, VI)
	Natureza
	Secundário
	Primário
	Inova no ordenamento
	Não
	Sim
	Hierarquia
	Infralegal
	Legal
	Matéria
	Em tese, qualquer lei
	Taxativa (art. 84, VI CF)
	Criação
	CF/1988
	EC 32/2001
Presidencialismo de Coalizão. O termo foi formulado pelo cientista político Sérgio Abranches. A ideia se assenta em dois pilares principais:o papel do presidente e a existência de coalizões partidárias que sustentam o governo.
Ao colocar a fórmula em movimento, os partidos da coalizão participam do governo quase que de forma semiparlamentarista e, ao mesmo tempo, oferecem a maioria de que dispõem no Congresso para apoiar a agenda do presidente. O termo “coalizão” refere-se a acordos entre partidos (normalmente com vistas a ocupar cargos no governo) e alianças entre forças políticas (dificilmente em torno de ideias ou programas) para alcançar determinados objetivos.
Em sistemas multipartidários (mais de dois partidos relevantes e com assento no parlamento), dificilmente o partido do presidente possuirá ampla maioria no parlamento para aprovar seus projetos e implementar suas políticas. Em geral, a coalizão é feita para sustentar um governo, dando-lhe suporte político no Legislativo (em primeiro lugar) e influenciando na formulação das políticas (secundariamente). Assim, partidos, dependendo da conjuntura política, se juntam para formar um “consórcio” de apoio ao chefe de governo. Essa prática é muito comum no sistema parlamentarista, no qual uma coalizão interpartidária disputa as eleições para o Legislativo visando obter a maioria das cadeiras e com isso indicar (“eleger”) o primeiro-ministro.
Atenção para o conceito de spoil system (sistema de “espólio”), de origem norte-americana, que tem por característica a prática do partido ou grupo político vencedor das eleições obter todo o “espólio” de cargos e nomear, segundo seus critérios e conveniências políticas, os integrantes de sua equipe (ministros, secretários, assessores etc.).
Ministros de Estado: Auxiliares do Presidente na direção superior da Administração Federal.
Requisitos: nato ou naturalizado (salvo o Ministro de Estado da Defesa, nato, conforme o inciso VII do § 3 do art. 12 da CF); maior de 21 anos e estar no exercício dos direitos políticos.
Atribuições: exercer a orientação, coordenação e supervisão de sua área de competência; referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente (Michel Temer defende que os atos não referendados são nulos; já para o José Afonso da Silva, os atos não referendados são plenamente válidos, a única possível consequência é a demissão do Ministro); expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos (Instruções Normativas); apresentar relatório anual de gestão e praticar os atos delegados pelo Presidente. Após a EC n. 32/2001, o art. 88 da CRFB determina que lei disporá somente sobre a criação e extinção de Ministério, não mais exigindo lei em sentido estrito para a determinação de estruturação e atribuições.
Nos crimes de responsabilidade sem conexão com o PR e nos crimes comuns são julgados pelo STF, nos crimes de responsabilidade com conexão com o PR a competência é do Senado Federal.
2C. Hermenêutica e Teorias da argumentação jurídica.
Autor Oswaldo Costa
Guilherme Mitidiero
O que normalmente se entende hoje por teoria da argumentação jurídica tem sua origem numa série de obras dos anos 1950 (século XX), origem esta que estava conectada com o problema das relações entre o direito e a sociedade. As três concepções mais relevantes como precursoras das atuais teorias da argumentação jurídica são: a tópica de Viehweg; a nova retórica de Perelman e a lógica informal de Toulmin. Estas, embora diferindo entre si em diversos aspectos, têm em comum a rejeição do modelo da lógica dedutiva. No entanto, as três concepções deixam a desejar quanto ao seu desenvolvimento. Mas, seu papel fundamental consistiu em terem aberto um campo de investigação relativamente novo e terem servido como precursoras das atuais teorias da argumentação jurídica elaboradas por MacCormick e Robert Alexy, os quais representam o que se denomina de “teoria padrão da argumentação jurídica”.
Das atuais teorias da argumentação jurídica, as teorias desenvolvidas por MacCormick e Robert Alexy foram as que, nos últimos anos, geraram mais discussão e alcançaram maior difusão. Essas duas concepções desenvolvidas por MacCormick e Alexy constituem o que se poderia chamar de Teoria Padrão da Argumentação Jurídica, na qual a perspectiva de análise das argumentações jurídicas se situa num conceito de justificação dos argumentos. Haveria aqui uma justificação formal dos argumentos (argumentos formalmente corretos) e uma justificação material (que se refere a aceitabilidade do argumento).
A) MACCORMICK 
MacCormick trata de construir uma teoria que dê conta tanto dos aspectos dedutivos da argumentação jurídica quanto dos não-dedutivos, dos aspectos formais e dos materiais, que se situe a meio caminho entre uma teoria ultra-racionalista do Direito (existência de uma única resposta correta para o caso) e uma irracionalista (decisões jurídicas são produtos da vontade e não da razão). Para ele, não se trata unicamente de mostrar em que condições uma decisão jurídica pode ser considerada justa; ele pretende, além disso, que as decisões jurídicas, de fato, se justifiquem precisamente de acordo com esse modelo.
MacCormick parte da consideração de que, pelo menos em alguns casos, as justificações que os juízes articulam são de caráter estritamente dedutivo (raciocínio lógico dedutivo). Mas, a justificação dedutiva obedece a pressupostos e limites.
O primeiro pressuposto é que o juiz tem o dever de aplicar as regras do direito válido. O segundo pressuposto é que o juiz pode identificar quais são as regras válidas.
A teoria de MacCormick foi objeto de algumas críticas, dentre as quais podemos citar: 
1) crítica em relação ao caráter dedutivo do raciocínio jurídico quando se refere: a possibilidade de se chegar a conclusões contraditórias quando se parte de premissas diferentes; a existência de conceitos indeterminados; ao âmbito em que opera a dedução, pois o próprio MacCormick admite a ampla zona de imprecisão entre os casos claros e os difíceis; 
2) crítica ao caráter ideologicamente conservador, quando: concentra-se nas decisões dos Tribunais Superiores; sugere que decisões inovadoras (contra legem) nunca poderiam ser justificadas; afirma que é sempre possível fazer justiça de acordo com o direito (o que não parece tão óbvio).
B) ROBERT ALEXY 
A teoria da argumentação jurídica formulada por Alexy coincide substancialmente com a de MacCormick. Ambos percorrem o mesmo caminho, mas em sentidos opostos. MacCormick parte das argumentações ou justificações das decisões tal e como de fato elas ocorrem nas instâncias judiciais e, a partir daí, elabora uma teoria da argumentação jurídica que acaba por considerar como parte de uma teoria geral da argumentação prática.
Alexy, pelo contrário, parte de uma teoria da argumentação prática geral que ele projeta, depois, para o campo do Direito. O resultado a que ele chega consiste em considerar o discurso jurídico, a argumentação jurídica, como um caso especial do discurso prático geral. Isto é, do discurso moral. Essa abordagem diferente faz com que a concepção de Alexy esteja, de certo modo, mais distante da prática geral da argumentação jurídica do que a de MacCormick. Mas, em troca, trata-se de uma teoria mais articulada e sistemática.
Alexy distingue dois aspectos na justificação das decisões jurídicas: a justificação interna e a justificação externa. A justificação interna se refere à aplicação de normas ou estabelecimento de passos de desenvolvimento, de maneira que a aplicação da norma ao caso não seja discutível. A justificação externa se refere à justificação das premissas.
Alexy entende que uma teoria da argumentação jurídica teria de ser capaz de unir dois modelos diferentes do sistema jurídico: o sistema jurídico como sistema de procedimento e o sistema jurídico como sistema de normas (regras e princípios).
A característica da aplicação de regras é a subsunção; mas, a característica da aplicação dos princípios é a ponderação, pois podem ser cumpridos em diversos graus. Os princípios são mais do que simples tópicos, levam a formas de fundamentação das decisões jurídicas que não poderiam existir sem eles.
Os princípios, diferentementedas regras, são comandos que admitem relativização. Segundo Alexy, a fórmula da ponderação resumir-se-ia no seguinte: “Quanto mais intensa se revelar a intervenção em um dado direito fundamental, maiores hão de se revelar os fundamentos justificadores dessa intervenção”. Portanto, é nos fundamentos justificadores da violação a determinado direito (ou princípio), em favor de outro que venha com ele colidir, que encontramos o ponto nodal do postulado da proporcionalidade.
Alexy sob à égide da razão prática procurou desenvolver uma análise mais apurada sobre a incidência dos princípios na resolução dos conflitos.
Foi cobrado na objetiva do 30CPR o seguinte:
A dignidade humana não consiste em princípio absoluto na Teoria dos Direitos Fundamentais de Robert Alexy. Nessa perspectiva, a dignidade pode ser abordada como autonomia e como heteronomia conforme Luís Roberto Barroso. A dignidade como autonomia designa a liberdade individual para a realização de escolhas existenciais, é a regra no ordenamento brasileiro. Já a dignidade como heteronomia consiste em impor valores externos ao indivíduo, na medida em que escolhas individuais podem gerar impactos sobre o corpo social. Assim, a dignidade como heteronomia pode restringir a liberdade individual. É exceção no ordenamento brasileiro.
Teoria prescritiva da argumentação: Robert Alexy apresentou uma vasta teoria prescritiva da argumentação. Ele distingue entre regras de justificação interna de uma sentença e regras de justificação externa. Na justificação interna, trata-se de saber se a sentença é o resultado lógico das premissas mencionadas na fundamentação da sentença. Na justificação externa, devem ser formuladas as regras que devem garantir a correção das premissas (interpretação semântica, histórica e teleológica).
Teoria interpretativa da argumentação: As teorias interpretativas da argumentação tentam esclarecer o que é “sentido” e “função” na argumentação jurídica. O máximo que se exige do conteúdo de verdade da argumentação é que a fundamentação jurídica tenha a função de garantir a correção de uma decisão em especial, a expressão normativa da sentença. O mínimo que se exige da argumentação jurídica é que ela garanta simplesmente a aceitação da decisão. No primeiro caso, a teoria da argumentação jurídica tem de receber elementos da filosofia prática, especialmente da teoria do discurso, e estabelecer critérios acerca da correção da argumentação jurídica. No último caso, uma teoria da argumentação tem de elaborar os critérios que nos digam em que casos são aceitas as fundamentações de sentenças.
3A. Divisão de poderes. Conceito e objetivos. História. Independência e harmonia entre poderes. Mecanismos de freio e contrapesos.
Oswaldo Costa
Guilherme Mitidiero
I. Noções Gerais
O tema da divisão dos poderes está relacionado com a Teoria Geral do Estado e com o Direito Constitucional, já que cabe à Constituição estabelecer as normas estruturais de um Estado.
Dispõe o art. 2º da CF que “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Nesse contexto, a Constituição detalha, com especial menção ao Título IV, a organização dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sem prejuízo de outras regras constitucionais que tratam do tema ao longo do corpo normativo constitucional (v.g., art. 60, § 4º, III; cláusula pétrea).
É oportuno lembrar que a divisão dos poderes possui íntima relação com o constitucionalismo moderno e com os direitos fundamentais, pois o art. 16 da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 já dizia que “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”.
Importa ressaltar que a divisão de poderes não é rígida, pois há mecanismos de freios e contrapesos, podendo o Poder Judiciário interferir em políticas públicas, inclusive, obrigando o Poder Executivo a realizar aquelas que sejam determinadas constitucionalmente ou legalmente, como se pode observar do seguinte julgado:
Administração Pública pode ser obrigada, por decisão do Poder Judiciário, a manter estoque mínimo de determinado medicamento utilizado no combate a certa doença grave, de modo a evitar novas interrupções no tratamento.
Não há violação ao princípio da separação dos poderes no caso. Isso porque, com essa decisão, o Poder Judiciário não está determinando metas nem prioridades do Estado, nem tampouco interferindo na gestão de suas verbas. O que se está fazendo é controlar os atos e serviços da Administração Pública que, neste caso, se mostraram ilegais ou abusivos já que, mesmo o Poder Público se comprometendo a adquirir os medicamentos, há falta em seu estoque, ocasionando graves prejuízos aos pacientes. 
Assim, não tendo a Administração adquirido o medicamento em tempo hábil a dar continuidade ao tratamento dos pacientes, atuou de forma ilegítima, violando o direito à saúde daqueles pacientes, o que autoriza a ingerência do Poder Judiciário.
STJ. 1ª Turma. RE 429903/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 25/6/2014
Obs.: não há menção a “separação vertical” neste acórdão.
Além desse julgado, no Tema 220 do STF sobre a competência do Poder Judiciário para determinar ao Poder Executivo a realização de obras em estabelecimentos prisionais com o objetivo de assegurar a observância de direitos fundamentais dos presos foi firmada a seguinte tese: “É lícito ao Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da Constituição Federal, não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes”. RE 592581, RICARDO LEWANDOWSKI, aprovada em 13/08/2015. Não há menção a “separação vertical” neste acórdão.
Por fim, o STF verificou o princípio da separação do Poderes no § 2º do art 9º da LRF:
A ADPF 708 reconheceu o Acordo de Paris de 2015 como equiparado a tratados de direitos humanos no nosso ordenamento e que, portanto, tem de status “supralegal”. 
Segue a decisão na ADPF 708 (2022): 
“O Tribunal, por maioria, julgou procedente a ação para: 
(i) reconhecer a omissão da União, em razão da não alocação integral dos recursos do Fundo Clima referentes a 2019; 
(ii) determinar à União que se abstenha de se omitir em fazer funcionar o Fundo Clima ou em destinar seus recursos; e 
(iii) vedar o contingenciamento das receitas que integram o Fundo, fixando a seguinte tese de julgamento: 
‘O Poder Executivo tem o dever constitucional de fazer funcionar e alocar anualmente os recursos do Fundo Clima, para fins de mitigação das mudanças climáticas, estando vedado seu contingenciamento, em razão do dever constitucional de tutela ao meio ambiente (CF, art. 225), de direitos e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil (CF, art. 5º, par. 2º), bem como do princípio constitucional da separação dos poderes (CF, art. 2º c/c art. 9º, par. 2º, LRF)’.”
Não há menção a “separação vertical” neste acórdão.
II. Conceito 
Para ser real o respeito à Constituição e aos direitos individuais por parte do Estado, “(...) é necessário dividir o exercício do poder político entre órgãos distintos, que se controlam mutuamente. A cada um desses órgãos damos o nome de Poder: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário. A separação dos Poderes estatais é elemento lógico essencial do Estado de Direito”. (SUNDFELD, p. 42, 2003).
“O princípio da separação dos Poderes preceitua que os Poderes sejam independentes e harmônicos entre si, cabendo ao legislador a função típica de estabelecer dispositivos que fundamentem normas gerais e abstratas, ao administrador a função típica de definir planos governamentais dentro dos limites traçados pelo legislador e de executar os mandamentos legais e ao julgador a função típica de aplicar, quandoprovocado, as estruturas normativas, os significados e as consequências escolhidos pelo legislador.” (ÁVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros, 2019, pág. 75.) (negritei)
III. Objetivos 
Analisando a Constituição Portuguesa, afirma José Joaquim Gomes Canotilho que “(....) é legítimo afirmar-se que o modelo de separação constitucionalmente consagrado visa, em princípio, identificar o órgão de decisão ajustado, estabelecer um procedimento de decisão justo e exigir um fundamento materialmente legítimo para as tomadas de decisão” (p. 708, 1993).
IV. História 
A divisão funcional de poderes remonta a Aristóteles, em “Política”, que identificou três funções básicas exercidas pelo poder político: assembleia-geral, corpo de magistrados e corpo judiciário; hoje equivalentes às funções legislativa, administrativa e jurisdicional. Respectivamente, (a) inovar a ordem jurídica por meio de normas gerais, impessoais e abstratas; (b) atuar concreta e individualizadamente por meio das funções de governo e de administração, excetuada a função jurisdicional; e (c) resolver conflitos intersubjetivos imparcial e desinteressadamente, com potencial de definitividade.
A distinção de funções, que remonta à Antiguidade, prosseguiu durante a Idade Média e a modernidade. Aqui já com Grotius e Puffendorf, Bodin e Locke, antes de Montesquieu. No absolutismo, a especialização funcional não correspondia a independência de órgãos especializados. A par da experiência parlamentarista inglesa, que não correspondia exatamente à uma separação de poderes, foi a obra de Montesquieu, de 1746, que sistematizou a separação orgânica do poder como técnica de salvaguarda da liberdade “dos modernos” (concepção burguesa-liberal). Todo homem que detém o poder tende a dele abusar, e o abuso vai até onde se lhe deparam limites; e apenas o poder contém o poder. Então, a separação orgânica do poder consiste em atribuir cada uma das funções estatais básicas a um órgão (corpo funcional) distinto, separado e independente dos demais. Combina-se a especialização funcional com a independência orgânica. 
No liberalismo, a separação de funções entre os órgãos independentes deveria ser bastante rígida, mas mesmo Montesquieu já previa que o constante movimento dos órgãos os compele a atuar em concerto, harmônicos, e as faculdades de estatuir (p.ex., aprovar um projeto de lei) e de impedir (veto presidencial) são prenúncios dos mecanismos de freios e contrapesos desenvolvidos posteriormente. A rígida separação de poderes do liberalismo foi inicialmente inserida nas constituições das ex-colônias inglesas na América, que seguiam a Declaração de Direitos de Virginia, de 1776. Após, constituição dos EUA, art. 16 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão e constituições francesas seguintes, espalhando-se pelo “ocidente”.
Benjamin Constant teorizou um quarto poder neutro, de modo a fazer com os demais o que o Poder Judiciário faz com os indivíduos, que seria exercido pelo rei. A 1ª Constituição do Brasil criou o “poder moderador” do Imperador; porém, distorceu a teoria ao atribuí-lo também ao executivo (para Constant, o poder neutro não poderia jamais coincidir com um dos demais).
5. Independência e harmonia entre poderes. Mecanismos de freios e contrapesos
Hoje, existe uma tendência de se considerar que a teoria da separação dos poderes construiu um mito. Este mito consistiria em um modelo teórico redutível à teoria dos três poderes rigorosamente separados: o executivo (o rei e os seus ministros), o legislativo (1ª câmara e 2ª câmara, câmara baixa e câmara alta) e o judicial (corpo de magistrados). Cada poder recobriria uma função própria sem qualquer interferência dos outros. Foi demonstrado por ElSENMANN que esta teoria nunca existiu em Montesquieu, como já mencionado acima. A interdependência é, porém, uma interdependência dinâmica necessariamente atenta aos aspectos político-funcionais do sistema.
Consolida-se a ideia de balanceamento entre poderes, na medida em que há uma divisão de funções do poder, de forma não exclusiva (não-incomunicável), entre órgãos relativamente independentes entre si, que devem atuar em cooperação, harmonia e equilíbrio.
A independência dos poderes significa que:
a) a investidura e a permanência das pessoas num dos órgãos não dependem da confiança nem da vontade dos outros; 
b) no exercício das atribuições que lhe sejam próprias, não precisam os titulares consultar os outros nem necessitam de sua autorização; 
c) na organização dos respectivos serviços, cada um é livre, observadas apenas as disposições constitucionais e legais.
Por outro lado, a harmonia entre os poderes primeiramente se verifica pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. Ainda, nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferências, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados (SILVA, p. 110, 2005).
Nesse sentido, v.g., o Poder Judiciário deve respeitar os parâmetros técnicos definidos pelas agências reguladoras em seus contratos, ainda que ocasione um aumento acima da inflação, como bem destacado:
Afronta o princípio da separação dos Poderes a anulação judicial de cláusula de contrato de concessão firmado por Agência Reguladora e prestadora de serviço de telefonia que, em observância aos marcos regulatórios estabelecidos pelo Legislador, autoriza a incidência de reajuste de alguns itens tarifários em percentual superior ao do índice inflacionário fixado, quando este não é superado pela média ponderada de todos os itens.
STF. Plenário. RE 1059819/PE, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/2/2022 (Repercussão Geral – Tema 991)
Não há menção a “separação vertical” no acórdão.
A divisão de poderes fundamenta-se em dois elementos:
(a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função; assim, às assembleias (congresso, câmaras, parlamento) se atribui a função legislativa; ao executivo, a função executiva; ao judiciário, a função jurisdicional;
(b) independência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação.
Ainda nessa linha, o STF (tema 1120) firmou a tese: 
“Em respeito ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal, quando não caracterizado o desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo, é defeso ao Poder Judiciário exercer o controle jurisdicional em relação à interpretação do sentido e do alcance de normas meramente regimentais das Casas Legislativas, por se tratar de matéria interna corporis”. RE 1297884, DIAS TOFFOLI, aprovada em 14/06/2021. Igualmente não há menção a “separação vertical” no acórdão.
O entendimento do STF na aplicação do princípio da lei penal mais benéfica também prestigia o princípio da separação dos poderes, impedindo que juízes criem uma terceira lei não aprovada pelo Congresso Nacional, como ficou firmado Tema 169 que tratou da aplicação retroativa do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 sobre pena cominada com base na Lei nº 6.368/76, firmando as seguintes teses: 
I – É inadmissível a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 à pena relativa à condenação por crime cometido na vigência da Lei 6.368/1976; 
II – Não é possível a conjugação de partes mais benéficas das referidas normas, para criar-se uma terceira lei, sob pena de violação aos princípios da legalidade e da separação de Poderes; 
III – O juiz, contudo, deverá, no caso concreto, avaliar qual das mencionadas leis é mais favorável ao réu e aplicá-la em sua integralidade. RE600817, RICARDO LEWANDOWSKI, aprovada em 07/11/2013. Não há menção a “separação vertical” no acórdão.
Espécies de separação de Poderes 
 (Tópico adicionado em razão da questão discursiva do 30CPR; ainda sem enunciado e espelho divulgado em 15.3.23.)
 A doutrina distingue quatro formas de separação dos Poderes:
“A separação de Poderes não é um princípio que se possa mitigar ou desconsiderar sem maior consequência. É tão importante, que, além da chamada “Separação Horizontal de Poderes” (Executivo, Legislativo e Judiciário), fala-se hoje em diversas conformações desse princípio. Assim, existiria uma “Separação Temporal de Poderes”, para designar a necessidade de limitar-se temporalmente o exercício de poderes pelos agentes públicos; fala-se de uma “Separação Vertical de Poderes”, para explicitar a necessária divisão territorial de competências, sobretudo, no Estado federal; e fala-se também de uma “Separação Social de Poderes”, para designar a divisão de poderes entre os diversos agentes, mídia, associações, partidos e grupos sociais, todos podendo disputar com igualdade de chances o poder estatal.” Trecho do artigo “Tomemos a sério o princípio da separação de Poderes” de Néviton Guedes publicado no Conjur em 2013 (acessado em 13.3.23).
Portanto, temos separação:
 	Horizontal: é separação em Executivo, Legislativo e Judiciário;
 	Temporal: designa a necessidade de limitar temporalmente o exercício de poderes pelos agentes públicos; 
 	Vertical: trata-se da necessária divisão territorial de competências, sobretudo, no Estado federal; 
 	Social: designa a divisão de poderes entre os diversos agentes, mídia, associações, partidos e grupos sociais, todos podendo disputar com igualdade de chances o poder estatal.
A separação vertical de Poderes denota que o Poder Executivo deve estar distribuído em entidades regionais e locais, em órgãos democraticamente eleitos, de modo a não estar apenas concentrado no Governo central.
Em pesquisa no site do STF em 13.3.2023, encontrei apenas a decisão abaixo com menção a “separação vertical de poderes”:
“Cuida-se de mandado de segurança em que o Distrito Federal impugna Decisão do Tribunal de Contas da União em 10 de dezembro de 2002 (Decisão nº/2002-TCU-Plenário, tomada nos autos do Processo TC nº 015.645/2001-0). Referida decisão determinou a constituição de tomada de contas especiais no âmbito da Companhia Imobiliária de Brasília - TERRACAP, entidade pertencente à administração indireta do Distrito Federal. Registra-se a participação da União no capital da TERRACAP.
Alega-se interferência ilegítima na autonomia política do Distrito Federal e usurpação da competência da Câmara Legislativa e do Tribunal de Contas do Distrito Federal. Afirma-se que seria "manifesta (...) a ausência de competência do Tribunal de Contas da União para exercer sobre empresa pública distrital a fiscalização e controle de que trata o art. 71, incisos II e IV, da Constituição Federal".
Aponta-se como precedente aplicável ao caso a liminar concedida pela eminente Ministra Ellen Gracie nos autos do MS nº 23.866.
Passo a analisar o pedido de liminar.
Ressalvado melhor entendimento quando da análise do mérito, considero presentes os requisitos específicos para a concessão da liminar. O fundamento da impetração, centrado no princípio da separação vertical de poderes e na autonomia do Distrito Federal, é relevante e plausível. Também está presente o requisito do perigo da demora, uma vez que a execução da Decisão atacada poderá importar na ineficácia do eventual deferimento do presente mandado de segurança. Em contrapartida, a suspensão da Decisão atacada não inviabiliza a proteção dos interesses da União, haja vista a manutenção de suas prerrogativas como acionista da TERRACAP.
Defiro a liminar para suspender a Decisão nº/2002-TCU-Plenário, tomada em 10 de dezembro de 2002, nos autos do Processo TC-015.645/2001-0.
(MS 24423 MC / DF - DISTRITO FEDERAL, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Julgamento: 19/12/2002, Publicação DJ 03/02/2003) (Grifei). A liminar foi confirmada.
3B. Poder Judiciário: organização e competência. Normas constitucionais respeitantes à magistratura. O ativismo judicial e seus limites no Estado Democrático de Direito.
Aline Morais
Atualizado por Valmir Neto (2023)
FUNDAMENTOS JURÍDICOS: arts. 92 e ss., CRFB e LC 35/79.
Conceito: O Poder Judiciário exerce parcela do poder estatal para manter o equilíbrio e evitar arbitrariedades (sistema de freios e contrapesos). Tem caráter nacional, é uno e indivisível. Composto por juízes de direito, desembargadores, ministros, juízes leigos, juntas eleitorais e juízes de paz. Ingresso na carreira de juiz de direito exige aprovação em concurso de provas e títulos e comprovação de 3 anos de prática/atividade jurídica privativa de bacharel em Direito, após a colação de grau. (art. 93, I, CRFB e Res n. 75/2009 do CNJ).
FUNÇÃO TÍPICA: exercício da jurisdição com aplicação do direito ao caso concreto e solução de conflitos; 
FUNÇÕES ATÍPICAS: legislativa: elaborar seus regimentos internos (art. 96 I, CRFB) e administrativa: autogestão e auto-organização (art. 96, I, b, c e d, CRFB).
ÓRGÃOS: STF, CNJ (apenas funções administrativas), STJ, TST, TRFs e Juízes Federais, Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares, Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. 
Órgãos de convergência: STF, STJ, STM, TSE e TST (todas as matérias convergem para eles).
Órgãos de superposição: STJ (decisões se sobrepõem às justiças comuns) e STF (suas decisões se sobrepõem a todas as demais justiças).
Classificação: MATERIAL: comum (Estadual e Federal) e especializada (eleitoral, militar e trabalhista); NÚMERO DE JULGADORES: singular (juízes 1º grau) e colegiada (turmas e tribunais).
STF: Guardião CRFB. Órgão de cúpula do Poder Judiciário. Obs.: abordado no ponto 5.b.
CNJ: órgão de controle interno do Poder Judiciário, criado pela EC n. 45/04 (Reforma do Judiciário), sendo órgão de natureza exclusivamente administrativa (ADI 3.367). Obs.: será abordado no Ponto 25.c.
STJ: Guardião da Legislação Federal, criado pela CRFB para desafogar o STF, é responsável por uniformizar a interpretação da lei federal e garantir sua observância e aplicação. Possui competência originária (art. 105, I), recursal (105, II) e especial (105, III). Tem sede na Capital Federal, jurisdição em todo território nacional. Julga o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal, nos termos do artigo 109, §5º, CRFB. Composição. Mínimo 33 (trinta e três) Ministros (alterável por lei), brasileiros (natos ou naturalizados) com idade superior a 35 e inferior a 70 anos, com notável saber jurídico e reputação ilibada. Investidura: nomeados pelo Presidente da República, após sabatina e aprovação por maioria absoluta do Senado Federal. Composição dos Ministros: 1/3 de juízes dos Tribunais Regionais Federais; 1/3 de desembargadores dos Tribunais de Justiça; 1/3 de advogados e de membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, alternadamente. Procedimento: No caso dos juízes dos Tribunais Regionais Federais e dos desembargadores dos Tribunais de Justiça, o STJ elabora lista tríplice, enviando-a ao Presidente da República, que indicará um e o nomeará após aprovação do Senado Federal. No caso dos advogados e membros do MP, serão eles indicados na forma das regras para o quinto constitucional do art. 94 CRFB. Funcionam junto ao STJ - Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (regulamenta cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira) e Conselho de Justiça Federal (supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal com poderes correcionais e decisões).
Novas competências (EC 45/2004): homologação de sentenças estrangeiras e a concessão do exequatur, e a preservação da competência para o julgamento de recurso especial quando a decisão recorrida julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal (análise da legalidade).
TST: Tribunal Superiordo Trabalho, órgão superior da Justiça do Trabalho. Composição: 27 ministros brasileiros (natos ou naturalizados) com idade superior a 35 e inferior a 70 anos, com notável saber jurídico e reputação ilibada. Investidura: Nomeados pelo Presidente da República, após sabatina e aprovação por maioria absoluta do Senado Federal. Composição dos Ministros: 4/5 de juízes do TRT escolhidos pelo próprio tribunal e 1/5 de advogados e de membros do Ministério Público do Trabalho, com mais de 10 anos de efetivo exercício, alternadamente. Funcionam junto ao TST - Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (regulamenta cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira) e Conselho Superior da Justiça do Trabalho (supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal com poderes correcionais e decisões). Lei disporá sobre sua competência.
TRIBUNAIS E JUÍZES FEDERAIS (art. 108 e 109 da CRFB) – Órgãos que compõem a Justiça Federal, possuidores de competência originária e recursal: Juízes (1º grau) e TRFs (2º grau). Reinstituída em 1965, pelo AI-2, teve as competências ampliadas. Composição TRF: mínimo 7 juízes brasileiros (natos ou naturalizados), recrutados, se possível, na respectiva região, com idade superior a 35 e inferior a 70 anos, nomeados pelo Presidente da República. Composição: 4/5 de juízes federais com mais de 5 anos de exercício, por antiguidade e merecimento, alternadamente e 1/5 de advogados e de membros do Ministério Público Federal, com mais de 10 anos de efetivo exercício, alternadamente. Seções Judiciárias: Nos Estados e no Distrito Federal, sede na Capital e subseções no interior. Pode constituir Câmaras Regionais. – Cabe à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença da União, suas autarquias e empresas públicas (Sum 150 STJ). 
Competência 1º grau: para as causas que tenham com partes a União, suas autarquias e empresas públicas federais. Em linhas gerais, compete-lhe julgar: (a) as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; (b) as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País; (c) as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional; (d) a execução de carta rogatória, após o exequatur, e de sentença estrangeira, após a homologação; as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção e à naturalização; (e) as causas relativas a direitos humanos deslocadas da Justiça estadual para a Justiça Federal (IDC); (f) os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (g) os crimes: 1) previstos em tratado ou convenção, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; 2) contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira; 3) cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar; 4) de ingresso ou permanência irregular de estrangeiros; (h) os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição, os mandados de segurança e os habeas datas contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais; (i) a disputa sobre direitos indígenas.
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS: julgar as causas cíveis de menor complexidade (até 60 salários-mínimos) e as infrações penais de menor potencial ofensivo. Trata-se de competência absoluta.
TRFs - recursos nas causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício de competência federal, na área de sua jurisdição e originariamente julgar: (a) o processo e julgamento de juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral; (b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região; (c) os mandados de segurança e os habeas data contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal; (d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal; (e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal; (f), autoridades estaduais e municipais, que gozam de prerrogativa de foro junto ao Tribunal de Justiça estadual. Configuram também competências não expressas dos TRFs o processo e julgamento das ações rescisórias movidas por ente federal contra acórdão de Tribunais de Justiça ou sentença de juiz de direito e os mandados de segurança impetrados por ente federal contra ato de juiz estadual.
Atenção: Sobre competência da Justiça Federal, verificar a distinção dos critérios:
	Competência penal da JF
	Competência cível da JF
	Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
(...)
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
	Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
	Em relação às matérias penais, o art. 109 estabelece critérios mais amplos na fixação da competência da Justiça Federal do que quanto às ações cíveis. Isso porque no âmbito criminal, para que a competência seja federal, basta que exista interesse da União, entidades autárquicas e empresas públicas.
Obs.: Súmulas 208 e 209 do STJ.
	Em matéria cível, a Justiça Federal só será competente se a União possuir interesse que lhe permita atuar como autora, ré, assistente ou oponente. Logo, se a União, entidade autárquica ou empresa pública não figurar como parte no processo cível, a competência não será da Justiça Federal.
Obs.: As súmulas 208 e 209/STJ, apesar de certa confusão jurisprudência, não devem ser aplicadas de forma absoluta para definição da competência cível.
*Tabela extraída do site Dizer o Direito, com o acréscimo das “Obs”.
JUSTIÇA DO TRABALHO (art. 111 a 116 da CRFB): Justiça especializada em razão da matéria, com competência taxativamente prevista na Constituição. Órgãos: 1) TST; 2) TRTs; 3) Juízes do Trabalho. As Varas do Trabalho são criadas por lei, podendo ser atribuída jurisdição aos Juízes de Direito nas comarcas não abrangidas por elas, mas o recurso será para o TRT respectivo. Competência da Justiça do Trabalho: processo e julgamento: de ações decorrentes de relação de trabalho entendida esta como toda aquela submetida ao regime jurídico celetista. Excluem-se causas que sejam instauradas entre o Estado e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo (interpretação conforme na ADI 3395, STF) e contratos de prestação de serviço regidos pelo CDC ou CC; EC 45/04: a) ações que versem sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores; MS, HC e HD na relação de trabalho; indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho; ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho; direito de greve; executar,de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, “a”, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir (EC 20/98); conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista. 
JUSTIÇA ELEITORAL (art. 118 a 121 da CRFB): Justiça especializada em razão da matéria, composta pelos seguintes órgãos: o Tribunal Superior Eleitoral; os Tribunais Regionais Eleitorais; os Juízes Eleitorais e as Juntas Eleitorais. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas eleitorais.
TSE – Composição: mínimo 7 membros: 3 STF, 2 STJ, 2 advogados escolhidos pelo Presidente da República, em lista sêxtupla formada pelo STF. Presidente e Vice são do STF e corregedor-geral do STJ. Suas decisões são irrecorríveis, exceto quando contrariarem a Constituição e as denegatórias de habeas-corpus ou mandado de segurança. TRE -. Um na Capital de cada Estado e no Distrito Federal. Composição 7 juízes: cinco eleitos por voto secreto: 2 desembargadores de TJ, 2 juízes estaduais, 1 Juiz de TRF; 2 advogados escolhidos pelo Presidente da República, em lista sêxtupla formada pelo TJ. O presidente e o vice são eleitos entre os desembargadores. A atuação é por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria. Recursos das decisões: a) contra disposição expressa da CRFB; b) divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais; c) inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais; d) anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais; ou e) denegarem HC MS HD MI. 
Obs.: O MP não participa da composição dos tribunais eleitorais.
JUSTIÇA MILITAR (arts 122 a 124) – Justiça Especializada em razão da matéria.
Órgãos: STM, Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei, que disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência. STM - Composição: 15 ministros – 3 oficiais-generais da Marinha, 4 oficiais-generais do Exército, 4 oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e 5 civis, escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros maiores de 35 anos, sendo 3 dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional e 2, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar. A Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei. Não possui segundo grau de jurisdição.
AMPLIAÇÃO DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR (LEI 13491/2017) – ADI 5901 – inconstitucionalidade por retirar competência do Júri para a JMU. Parecer da PGR é pela parcial procedência porque a jurisdição penal militar deve ter “competência restrita ao julgamento de crimes envolvendo violação à hierarquia, disciplina militar ou outros valores tipicamente castrenses. O direito ao devido processo legal e a um julgamento justo por juiz competente, independente e imparcial, previstos na Constituição brasileira (art.5º, LIV), no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 14) e na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8º), aliado ao princípio da proibição do retrocesso, exigem que seja mantida a competência atual do Tribunal do Júri para julgar militares (dos Estados membros ou das Forças Armadas) que cometerem crimes dolosos contra a vida de civis, mantendo-se a igualdade e o juiz natural para todos”. 
Cumpre ressaltar que a Lei 13.774 de 2018 reorganizou a Justiça Militar da União, promovendo alteração na Lei Orgânica da Justiça Militar da União (Lei 8.457 de 1992). O diploma modificador entrou em vigor na data de sua publicação, 21 de dezembro de 2018.
 As alterações consistem em criação de novo órgão da Justiça Militar da União, o Juiz-Corregedor Auxiliar, alteração da nomenclatura da auditoria de correição para Corregedoria da Justiça Militar, bem como alterações de competência. Em nome da brevidade não me aprofundo nas alterações, tendo em vista que tornaria o resumo excessivamente longo[footnoteRef:1]. [1: Link para aprofundar o tema:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/novidades_legislativas/detalhes/b53b3a3d6ab90ce0268229151c9bde11>.] 
JUSTIÇA ESTADUAL (artigos 125 e 126, CRFB): Justiça comum, de competência residual, ou seja, o que não for da Justiça Federal, do Trabalho, ou Eleitoral. Composta por juízes e desembargadores. No primeiro grau, organiza-se em Varas e Comarcas e em segundo no Tribunal de Justiça com suas turmas e órgão especial.
JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL (art. 125, § 3º a 5º, CRFB): Criada por lei estadual de iniciativa do TJ. Composição: 1º grau – juízes de direito e Conselhos de Justiça; 2º grau – TJ ou TJM quando o efetivo supera 20 mil. Competências: processar e julgar crimes e atos disciplinares, preservada a competência do júri quando a vítima for civil. 
JUIZADOS ESPECIAIS (art. 98, I, CRFB): Criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados em seus territórios para conciliação, julgamento e execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo. Formados por juízes togados e leigos, atuam mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.
JUSTIÇA DE PAZ REMUNERADA (art. 98, II, CRFB): composta por cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de 4 anos. Exercem competência não-jurisdicional, como celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação. A Justiça Estadual pode lhe atribuir outras. Em Minas Gerais é responsável pela arrecadação de bens vagos, por exemplo.
QUINTO CONSTITUCIONAL: A CRFB reserva 1/5 dos lugares dos TRFs, TJs, TST e TRTs aos membros do MP com mais de 10 anos de carreira e aos advogados, indicados em lista sêxtupla, com notório saber jurídico, reputação ilibada e mais de 10 anos de efetiva atividade profissional. São requisitos exaustivos, vedada a estipulação de outros por Constituições Estaduais (ver artigos 94, 111-A, I, e 115, I, todos da CRFB). O STF entende que se o número total não for divisível por cinco, arredonda-se para o número inteiro seguinte e admite a recusa pelo tribunal de nomes da lista que deverá ser refeita. No STJ, 1/3 da composição deve caber, em partes iguais, aos advogados e membros do MP (art. 104, parágrafo único, CRFB). 
ÓRGÃO ESPECIAL: pode ser criado nos Tribunais com mais de 25 julgadores para exercer atribuições administrativa e jurisdicionais delegadas da competência do pleno (art. 93, XI, CRFB). Não podem ser delegadas atribuições políticas, como eleições de dirigente, e legislativas, como elaboração de regimento interno (art. 96, I, “a”, CRFB). Essa composição poderá variar entre 11 e 25 membros, sendo metade das vagas providas por antiguidade e a outra por eleição do Tribunal pleno.
GARANTIAS DO PODER JUDICIÁRIO: Para assegurar a independência e o exercício imparcial das funções jurisdicionais, a CRFB enumerou uma série de garantias. Institucionais (da magistratura): autonomia orgânico-administrativa (art. 96) - auto-organização; e autonomia financeira e orçamentária (art. 99, §§ 1º a 5º) - autogestão, é o Poder Judiciário que decide como aplicar os recursos. 
Funcionais (do magistrado): art. 95: vitaliciedade: 1º grau – 2 anos, após esse período só perde o cargo por meio de sentença judicial transitada em julgado, Tribunais: após a posse (art. 22 da LOMAN); inamovibilidade: salvo por interesse público e com aprovação de maioria absoluta do tribunal. Garantida aos titulares e aos substitutos, segundo o CNJ; e irredutibilidade de subsídios: preservação do valor nominal, com respeito ao teto constitucional.
Os subsídios dos ministrosde Tribunais Superiores são limitados a 95% do subsídio do ministro do STF. Os subsídios dos demais magistrados serão fixados em lei e escalonados, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da estrutura judiciária nacional, não podendo a diferença entre uma e outra ser superior a 10% ou inferior a 5%, nem exceder a 95% do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores.
VEDAÇÕES: 1 - Impossibilidade do exercício, ainda que em disponibilidade, de outro cargo ou função, salvo uma de magistério, exigindo-se compatibilidade de horários (inclusive de natureza privada, Resolução n. 10/2005, CNJ); 2 - receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; 3 - exercício de atividade político-partidária (deve se aposentar ou pedir exoneração e se filiar a partido político até seis meses). A EC 45/04 acrescentou: 4 - impossibilidades de receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei (segundo a LOMAN – bolsas de mestrado e doutorado); 5 - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos 3 anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração (Quarentena).
 
ESTATUTO DA MAGISTRATURA. É a lei da carreira: LC 35/1979, a LOMAN. Editada ainda no regime militar, foi, em sua maioria, recepcionada pela CRFB. Estabeleceu várias regras para a magistratura. Também determinou a elaboração de uma nova lei nacional, de iniciativa do STF, que ainda não foi editada. Dirley da Cunha Júnior leciona que “O Estatuto da Magistratura consiste num conjunto de normas constitucionais e legais, destinadas à disciplina da carreira da magistratura, forma e requisitos de acesso, critérios de promoção, aposentadoria, subsídio, vantagens, direitos, deveres, responsabilidades, impedimentos e outros aspectos relacionados à atividade do magistrado” (CUNHA JÚNIOR/2011, p. 1073). 
ATIVISMO JUDICIAL. Conceitos. Para Luís Roberto BARROSO, a “ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. [...] (i) aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas”. 
Para Daniel SARMENTO, o conceito de ativismo é objeto de controvérsia, “atuação mais enérgica e proativa da Corte, que pode ser ou não legítima, dependendo do caso e de uma série de variáveis”. Ex: vedação ao nepotismo no Legislativo e no Executivo, aborto de feto anencefálico, reconhecimento da união homoafetiva, pesquisa com célula-tronco. De acordo com Barroso, o “oposto do ativismo é a autocontenção judicial, conduta pela qual o Judiciário procura reduzir sua interferência nas ações dos outros Poderes. Por essa linha, juízes e tribunais (i) evitam aplicar diretamente a Constituição a situações que não estejam no seu âmbito de incidência expressa, aguardando o pronunciamento do legislador ordinário; (ii) utilizam critérios rígidos e conservadores para a declaração de inconstitucionalidade de leis e atos normativos; e (iii) abstêm-se de interferir na definição das políticas públicas”. Ex: Caso Eduardo Cunha.
Contextualização. O ativismo judicial está diretamente ligado ao neoconstitucionalismo. Para Sarmento, as “mudanças, que se desenvolvem sob a égide da Constituição de 88, envolvem vários fenômenos diferentes (a) reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e valorização da sua importância no processo de aplicação do Direito; (b) rejeição ao formalismo e recurso mais frequente a métodos ou “estilos” mais abertos de raciocínio jurídico: ponderação, tópica, teorias da argumentação etc.; (c) constitucionalização do Direito, com a irradiação das normas e valores constitucionais, sobretudo os relacionados aos direitos fundamentais, para todos os ramos do ordenamento; (d) reaproximação entre o Direito e a Moral, com a penetração cada vez maior da Filosofia”. 
Críticas. A principal é a falta de legitimidade democrática dos magistrados – que não são eleitos pelo povo – para criar regras e aplicá-las aos casos concretos, vinculando outros poderes. Também se questionam limites e parâmetros de atuação que se desrespeitados podem levar a uma “ditadura do Judiciário” (termo controverso).
BERMAN indaga se diante da indeterminação das disposições constitucionais, deve o Judiciário atribuir o que ele pensar ser o correto.
SARMENTO também apresenta críticas ao ativismo, pois esse modelo “tem dado ensejo ao excessivo arbítrio judicial, através do que chamo de ‘carnavalização dos princípios constitucionais’”. Ele não nega o fenômeno da judicialização da política, reconhece o papel importante do Judiciário na defesa dos direitos fundamentais e proteção da democracia, mas defende a centralidade dos movimentos sociais e da sociedade civil na arena constitucional. Não se trata de apenas afirmar que tais atores podem participar da jurisdição constitucional – como amici curiae ou expositores em audiências públicas – mas de reconhecer que há muito Direito Constitucional fora dos tribunais. Nesta questão, o seu pensamento se aproxima de uma corrente que é conhecida nos Estados Unidos como constitucionalismo democrático – que não se confunde com o constitucionalismo popular, de autores como Mark Tushnet, Larry Kramer e Jeremy Waldron, refratários ao controle jurisdicional de constitucionalidade. Ademais, considera que a postura mais ativista do STF foi correta em alguns casos, e equivocada em outros. A decisão sobre a união homoafetiva, por exemplo, seria ativista, pois o STF se baseou em princípios constitucionais abstratos, de elevado teor moral, para resolver uma questão altamente controvertida na sociedade, não dando tanto peso aos elementos literal e histórico da interpretação constitucional. Já a decisão de Raposa Serra do Sol, na parte em que impôs condicionantes às futuras demarcações de terras indígenas, também foi ativista, mas ele entende que há ilegitimidade: o STF praticamente atuou como legislador e impôs graves restrições a direitos básicos de uma minoria étnica vulnerável, que estão em total desacordo com o texto constitucional e com a normativa internacional sobre direitos humanos. Ao julgar ED opostos contra tal decisão, o lado negativo das condicionantes foi em certa medida suavizado, já que o Supremo esclareceu que elas não são vinculantes para outros casos, mas não foi eliminado, uma vez que tais restrições aos direitos indígenas foram confirmadas, tendendo a pautar a atuação do Judiciário brasileiro em outros processos.
HABERMAS aponta outros aspectos que lhe faz rechaçar o ativismo judicial, dentre os quais se destaca os seguintes: a) interesse público na coerência interna do direito; b) relativo distanciamento do direito em relação à política; e c) direcionamento ao autoritarismo quando o judiciário é conduzido preliminarmente pelos valores constitucionais. Também chama atenção para a passividade do indivíduo e da sociedade que não luta por transformações. Fica passivo esperando que o Poder Judiciário resolva. O Poder Judiciário também poderia se posicionar de forma crítica analisando se outro poder ou órgão não seriam mais qualificados para resolver a questão posta em juízo.
Riscos: conflito de atribuições entre Judiciário e Legislativo, com possível perda do efeito da norma parlamentar e extinção da harmonia entre os poderes, necessidade de estabilidade jurídica, e necessidade de segurança jurídica, politização da Justiça. Riscos para a legitimidade democrática e dificuldade contra majoritária.
Judicialização da política. Para Luiz RobertoBARROSO, “a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade. O fenômeno tem causas múltiplas”, tais como a redemocratização, a constitucionalização abrangente, o sistema de controle de constitucionalidade. Ademais, a “judicialização e o ativismo judicial são primos”, mas não têm as mesmas origens. A judicialização “decorre do modelo de Constituição analítica e do sistema de controle de constitucionalidade abrangente adotados no Brasil, que permitem que discussões de largo alcance político e moral sejam trazidas sob a forma de ações judiciais. Vale dizer: a judicialização não decorre da vontade do Judiciário, mas sim do constituinte”, e o “ativismo judicial, por sua vez, expressa uma postura do intérprete, um modo proativo e expansivo de interpretar a Constituição, potencializando o sentido e alcance de suas normas, para ir além do legislador ordinário”.
SÚMULAS
SÚMULA VINCULANTE N. 22: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da EC N. 45/04”.
SÚMULA VINCULANTE N. 23: A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.
SÚMULA VINCULANTE 37: Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.
SÚMULA VINCULANTE 53: A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança a execução de ofício das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir e acordos por ela homologados.
STF 649 - É inconstitucional a criação, por Constituição Estadual, de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros poderes ou entidades.
STF 628 – Integrante de lista de candidatos a determinada vaga da composição de tribunal é parte legitima para impugnar a validade da nomeação de concorrente.
STF 339 - Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia.
STJ 428 - Compete ao tribunal regional federal decidir os conflitos de competência entre juizado especial federal e juízo federal da mesma seção judiciária.
JURISPRUDÊNCIA
1031/STF - É inconstitucional norma estadual que estabelece limites etários para ingresso na magistratura. Normas estaduais (sejam leis ou normas da Constituição Estadual), que disponham sobre o ingresso na carreira da magistratura violam o art. 93, caput, da CF/88, por usurpar iniciativa legislativa privativa do STF. STF. Plenário. ADI 6794/CE, ADI 6795/MS e ADI 6796/RO, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/9/2021 (Info 1031).
1069/STF - É inconstitucional, por disciplinar matéria concernente ao Estatuto da Magistratura, norma estadual que prevê a adoção do maior tempo de serviço público como critério de desempate para a promoção de magistrados. STF. Plenário. ADI 6772/AL, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/9/2022 (Info 1069).
838/STF - O ex-Deputado Federal Eduardo Cunha impetrou mandado de segurança no STF pedindo a suspensão do processo de cassação que tramitava contra ele na Câmara dos Deputados por quebra de decoro parlamentar. O pedido do impetrante foi negado. O STF só pode interferir em procedimentos legislativos (ex: processo de cassação) em uma das seguintes hipóteses: a) para assegurar o cumprimento da Constituição Federal; b) para proteger direitos fundamentais; ou c) para resguardar os pressupostos de funcionamento da democracia e das instituições republicanas. Exemplo típico na jurisprudência é a preservação dos direitos das minorias, onde o Supremo poderá intervir. No caso concreto, o STF entendeu que nenhuma dessas situações estava presente. Em se tratando de processos de cunho acentuadamente político, como é o caso da cassação de mandato parlamentar, o STF deve se pautar pela deferência (respeito) às decisões do Legislativo e pela autocontenção, somente intervindo em casos excepcionalíssimos. Dessa forma, neste caso, o STF optou pela técnica da autocontenção (judicial self-restraint), que é o oposto do chamado ativismo judicial. Na autocontenção, o Poder Judiciário deixa de atuar (interferir) em questões consideradas estritamente políticas. STF. Plenário. MS 34.327/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 8/9/16
851/STF - É inconstitucional norma do Tribunal de Justiça que permite a reeleição de desembargadores para cargos de direção após o intervalo de dois mandatos. está reservada a lei complementar de iniciativa do Supremo Tribunal Federal. Além disso, esta norma afronta o tratamento que foi dado à matéria pelo art. 102 da LOMAN (LC 35/79). STF. Plenário. ADI 5310/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 14/12/2016.
832/STF - Inexistência de inconstitucionalidade no corte do orçamento do Poder Judiciário durante a tramitação da Lei Orçamentária Anual. Salvo em situações graves e excepcionais, não cabe ao Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio da separação de Poderes, interferir na função do Poder Legislativo de definir receitas e despesas da Administração Pública, emendando projetos de leis orçamentárias, quando atendidas as condições previstas no art. 166, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal. STF. Plenário. ADI 5468/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 29 e 30/6/2016 
825/STF - Lei estadual que concede ressarcimento de despesas de saúde a magistrados não viola a CF/88 nem a LOMAN que não proíbe que as leis estaduais prevejam o pagamento de verbas de natureza indenizatória aos magistrados estaduais. STF. 1ª Turma. MS 27463/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/5/2016 
821/STF - Momento de comprovação dos três anos de atividade jurídica: inscrição definitiva no concurso público. STF. Plenário. RE 655265/DF, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 13/4/2016 (repercussão geral)
855/STF - O STF é incompetente para apreciar feito (art. 102, I, n) em que um único magistrado pretende o reconhecimento de direito à fruição de licença-prêmio por tempo de serviço, pois a questão interessa também a outros agentes políticos e servidores públicos. Afinal, o benefício pode estar previsto em estatuto jurídico do agente ou do servidor. (STF, AO 2126/PR, Segunda Turma).
866/STF - O Supremo Tribunal Federal entendeu que a justiça comum é competente para julgar causa relacionada ao direito de greve de servidor público, pouco importando se se trata de celetista ou estatutário. 
794/STF - Judiciário pode determinar a realização de obras emergenciais em estabelecimento prisional. STF. Plenário. RE 592581/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 13/8/2015 (repercussão geral).
721/STF - CONTROLE JURISDICIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS A CRFB\88 e a Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência asseguram o direito dos portadores de necessidades especiais ao acesso a prédios públicos STF. 1ª Turma. RE 440028\SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 29.10.2013, 
741/STF É inconstitucional norma da Constituição estadual que preveja que a iniciativa da Lei de organização judiciária é do Governador do Estado. É inconstitucional norma da Constituição estadual que institua a criação de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros Poderes ou entidades. STF. Plenário. ADI 197/SE, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/4/2014
752/STJ - Judiciário pode obrigar administração pública a manter quantidade mínima de medicamento em estoque O que se está fazendo é controlar os atos e serviços da Administração Pública que, neste caso, se mostraram ilegais ou abusivos STJ. 1ª Turma. RE 429903/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,julgado em 25/6/2014
592/STJ - O Poder Judiciário pode condenar universidade pública a adequar seus prédios às normas de acessibilidade a fim de permitir a sua utilização por pessoas com deficiência. Se um direito é qualificado pelo legislador como absoluta prioridade, deixa de integrar o universo de incidência da reserva do possível, já que a sua possibilidade é obrigatoriamente, fixada pela Constituição ou pela lei. STJ. 2ª Turma. REsp 1.607.472-PE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 15/9/2016 (Info 592).
543/STJ - Judiciário pode determinar reforma de cadeia ou construção de nova unidade prisional. Constatando-se inúmeras irregularidades em cadeia pública, a alegação de ausência de previsão orçamentária não impede que seja julgada procedente ação civil pública mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. STJ. 2ª Turma. REsp 1.389.952-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/6/2014
QUESTÕES OBJETIVAS
MPF\27º - Somente a vedação de nepotismo na esfera do Judiciário independe de lei formal, haja vista a autonomia administrativa desse Poder. Assertiva incorreta.
MPF\27º - De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a fixação de tetos remuneratórios diferenciados para membros da magistratura federal e estadual contraria o caráter nacional e unitário do Poder Judiciário, não se aplicando aos juízes estaduais o limite remuneratório de 90,25% (noventa vírgula vinte e cinco por cento) dos subsídios dos ministros do STF, previsto no art. 37, XI, da Constituição da República e em Resoluções do Conselho Nacional de Justiça. Assertiva correta
MPF\27º - A vitaliciedade é atributo exclusivo dos cargos das carreiras do Ministério Público e do Poder Judiciário, significando que a desinvestidura, após o transcurso do estágio probatório, depende de decisão judicial transitada em julgado. Assertiva incorreta.
QUESTÕES – BANCO OUSE
728- Viola o princípio do juiz natural o julgamento em Tribunal por turma formada majoritariamente por juízes convocados? R: O STJ, de início, entendia que sim, mas o entendimento foi superado. Para STF e STJ não há nulidade no julgamento de recurso por turmas formadas majoritariamente (nem sequer exclusivamente) por juízes convocados, DESDE QUE A CONVOCAÇÃO TENHA OBEDECIDO A LEGISLAÇÃO ESTADUAL OU FEDERAL, a depender do tribunal, se Federal ou Estadual. Neste sentido, veja-se o RE 597133, julgado em regime de repercussão geral: “(...) Não viola o postulado constitucional do juiz natural o julgamento de apelação por órgão composto majoritariamente por juízes convocados, autorizado no âmbito da Justiça Federal pela Lei 9.788/1999. II – Colegiado constituídos por magistrados togados, integrantes da Justiça Federal, e a quem a distribuição de processos é feita aleatoriamente. III – Julgamentos realizados com estrita observância do princípio da publicidade, bem como do direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. IV – Recurso extraordinário desprovido. ” O STJ atualmente também adota o mesmo posicionamento. Veja-se, a título de exemplo, os seguintes precedentes: HC 139724 / SP, REsp 1091710 / PR e HC 141790 / ES.
597-O que é a criação judicial do Direito? Há o velho brocardo "onde há Sociedade, há Direito". O Judiciário também pode, excepcionalmente, criar o Direito. Tal aspecto vem sendo ainda mais aprofundado com o Neoconstitucionalismo e o Ativismo Judicial, que vêm ampliando os poderes do Judiciário na conformação do Direito, pode-se citar as sentenças aditivas no controle concentrado de constitucionalidade que estabelecem verdadeiros regramentos da aplicação de determinados institutos, p. ex, as regras para demarcação de terras indígenas no caso Raposa Serra do Sol. O processo de criação do Direito pode ser legitimado pela participação de agentes sociais através, p. ex., do Amicus Curiae ou das audiências públicas!
529-O que é significa a expressão “Supremocracia”? Termo criado para fazer críticas às funções que vêm sendo desempenhadas pelo STF nos últimos tempos - argumentando que ele não apenas mais está exercendo uma função de "proteção de regras" constitucionais, como também vem exercendo, em muitos casos, o pale de órgão "criador dessas regras" - assim, estaria acumulando exercício de autoridade com exercício de poder. Alguns alegam que isso ocorreu na ADPF 132, a respeito da união estável homoafetiva. Em um artigo sobre o tema, Oscar Vilhena Vieira define: Em um primeiro sentido, o termo supremocracia refere-se à autoridade do Supremo recentemente adquirida pelo Supremo de governar jurisdicionalmente (rule) o Poder Judiciário no Brasil. Em um segundo sentido, o termo supremocracia refere-se à expansão da autoridade do Supremo em detrimento dos demais poderes. 
3C. Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens.
Adriano Augusto
Tácito Coaracy
I. Estado-membro
Natureza jurídica dos Estados-membros: os Estados-membros são ordenações jurídicas parciais, que atuam como núcleos autônomos de poder, com legislação, governo e jurisdição próprios, exercendo as competências que lhes são deferidas pela Constituição Federal. Os Estados-membros não possuem soberania – só o Estado Federal (República) é dotado de soberania –, mas mera autonomia. Entre Estados e União não há hierarquia, convivendo todos em um mesmo nível jurídico.
Formação dos Estados: a divisão político-administrativa interna do país poderá ser alterada com a constituição de novos Estados-membros, pois a estrutura territorial interna não é perpétua. A Constituição prevê essa possibilidade no art. 18, § 3º. Temos as seguintes hipóteses:
· Fusão: dois ou mais Estados se unem com outro nome, perdendo sua personalidade jurídica;
· Cisão: um Estado divide-se em vários novos Estados-membros, desaparecendo o Estado originário;
· Desmembramento: há a separação de uma ou mais partes do Estado-membro, sem que ocorra a perda da identidade do Estado-ente primitivo. Há duas possibilidades de desmembramento:
· Desmembramento anexação: a parte desmembrada anexa-se a outro Estado-membro.
· Desmembramento formação: a parte desmembrada constitui um novo Estado-membro.
A formação de Estados exige, além dos requisitos do art. 18, § 3º, CR, a observância dos requisitos previstos no art. 48, VI, CR: a) realização de plebiscito: trata-se de requisito de procedibilidade do processo legislativo da lei complementar; b) audiência das Assembleias Legislativas; c) aprovação pelo Congresso Nacional: exige-se quórum de maioria absoluta, exigido para a edição da lei complementar; d) lei complementar.
Observação: os Estados podem, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamento de Municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
II. Competência
A competência dos Estados-membros se divide em:
a) Competência material (administrativa): trata-se da competência não-legislativa atribuída aos Estados. Ela se divide em:
· Competência material comum: são as competências materiais atribuídas a todos os entes federativos, prevista no art. 23 da CR.
· Competência material residual: trata-se da competência material que não é vedada ao Estado-membro e que lhe sobra, após a enumeração das competências não-legislativas dos outros entes federativos (art. 25, § 1º, CR).
b) Competência legislativa: trata-se da competência para elaborar leis. Divide-se em:
· Expressa: prevista no art. 25 da CR, é essencial para o exercício da auto-organização por parte do Estado-membro.
· Residual (remanescente ou reservada): toda competência que não for vedada e não for atribuída exclusivamente aos outros entes federativos cabe residualmente aos Estados (art. 25, § 1º, CR).
· Delegada pela União: a União pode, por meio de lei complementar, delegar aos Estados a competência para legislar sobre questões específicas das matérias de sua competência privativa.
· Concorrente: o art. 24 da CR traz as matérias que podem ser legisladas concorrentementepela União (normas gerais) e pelos Estados (normas específicas).
· Suplementar: ocorre quando o Estado-membro suplementa a competência legislativa concorrente da União. Divide-se em:
· Competência suplementar complementar: neste caso, a União exerceu sua competência legislativa concorrente, editando norma geral sobre determinado assunto e o estado complementa tal legislação, editando norma específica sobre a questão.
· Competência suplementar supletiva: configura-se quando há inércia legislativa por parte da União, que não edita norma geral sobre determinado assunto. Nesse caso, o Estado exerce, temporariamente, competência plena sobre a matéria, legislando não só sobre questões específicas e de interesse regional, como também editando a própria norma geral. Na superveniência de lei federal, editando a União norma geral sobre o assunto legislado pelo Estado-membro, a norma editada pelo ente federal no exercício da competência suplementar supletiva será suspensa.
· Competência tributária expressa: ver art. 155 da CR.
Observação: segundo o STF, a competência legislativa do Estado-membro para dispor sobre educação e ensino (art. 24, IX, CR – competência concorrente) autoriza a fixação, por lei local, do número máximo de alunos em sala de aula, no afã de viabilizar o adequado aproveitamento dos estudantes. Por outro lado, nas representações feitas pela PFDC sobre a edição de normas estaduais disciplinando a Escola sem partido, um dos argumentos apontados para sua inconstitucionalidade é justamente a invasão de competência da União para editar normas gerais, o que viola o pacto federativo: tendo em vista que a União editou a Lei 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional), os Estados-membros e o Distrito Federal não podem suplementar a legislação nacional em sentido diverso do previsto na referida lei, que, em seu art. 3º, III, garante o “pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas”.
Observação: Pedro Lenza afirma que os serviços de gás canalizado serão explorados diretamente pelos Estados ou mediante concessão, na forma da lei, vedando-se a regulamentação da referida matéria por medida provisória.
COVID-19: A Lei nº 13.979/2020 previu, em seu art. 3º, um rol exemplificativo de oito medidas que podem ser adotadas pelo poder público para o combate ao coronavírus. O art. 3º, VI, “b”, e os §§ 6º e 7º, II, da Lei nº 13.979/2020 estabeleceram que os Estados e Municípios somente poderia adotar algumas medidas se houvesse autorização da União. O STF, ao apreciar ADI contra a Lei, decidiu:
a) suspender parcialmente, sem redução de texto, o disposto no art. 3º, VI, “b”, e §§ 6º e 7º, II, da Lei nº 13.979/2020, a fim de excluir estados e municípios da necessidade de autorização ou de observância ao ente federal; e
b) conferir interpretação conforme aos referidos dispositivos no sentido de que as medidas neles previstas devem ser precedidas de recomendação técnica e fundamentada, devendo ainda ser resguardada a locomoção dos produtos e serviços essenciais definidos por decreto da respectiva autoridade federativa, sempre respeitadas as definições no âmbito da competência constitucional de cada ente federativo.
Assim, os Estados/DF e Municípios podem, mesmo sem autorização da União, adotar medidas como isolamento, quarentena, exumação, necropsia, cremação e manejo de cadáver e restrição à locomoção interestadual e intermunicipal em rodovias, portos ou aeroportos. Vale ressaltar que Estados e Municípios não podem fechar fronteiras, pois sairiam de suas competências constitucionais. A adoção de medidas restritivas relativas à locomoção e ao transporte, por qualquer dos entes federativos, deve estar embasada em recomendação técnica fundamentada de órgãos da vigilância sanitária e tem de preservar o transporte de produtos e serviços essenciais, assim definidos nos decretos da autoridade federativa competente. STF. Plenário. ADI 6343 MC-Ref/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 6/5/2020 (Info 976).
III. Autonomia
A autonomia dos Estados federados se consubstancia na sua capacidade de auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadministração. Conforme já apontado, a autonomia, própria de todos os Entes-federados (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) não se confunde com soberania, que é própria do Estado Federal (República) e pode ser exercida tanto interna quanto externamente, embora tal exercício seja, como reconhecido pela doutrina moderna, limitado (ver Direito Internacional, ponto 2.b.).
a) Auto-organização: é a capacidade de o Estado federado estabelecer Constituição própria. A auto-organização deve observar os seguintes princípios:
· Princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII, da CR): a inobservância dos princípios sensíveis pode acarretar sanção política, como a intervenção federal.
· Princípios federais extensíveis: são normas centrais comuns à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. Tais princípios praticamente não existem na CR.
· Princípios constitucionais estabelecidos: são normas que, além de organizarem a própria federação, estabelecem preceitos centrais de observância obrigatória aos Estados-membros em sua auto-organização.
b) Autolegislação: é a capacidade de o Estado federado estatuir legislação peculiar, num âmbito territorial delimitado.
c) Autoadministração: é a capacidade de gerir negócios próprios, pela ação administrativa do governador, com base nas competências administrativas, legislativas e tributárias. Destaque-se, aqui, a competência tributária, pois a capacidade financeira do Estado é essencial para o exercício da autoadministração.
STF: Não é possível o envio da Força Nacional de Segurança para atuar no Estado-membro sem que tenha havido pedido ou concordância do Governador. Compete ao Ministro da Justiça determinar a ida da Força Nacional de Segurança Pública para atuar em determinado Estado-membro ou Distrito Federal. Segundo a redação do art. 4º do Decreto nº 5.289/2004 a determinação do emprego da Força Nacional pode ocorrer de duas formas: 1) mediante solicitação expressa do Governador formulada ao Ministro da Justiça; 2) mediante iniciativa do próprio Ministro da Justiça, mesmo sem solicitação do Governador. Se o próprio Governador solicita o auxílio, não há qualquer problema ou questionamento. No entanto, e se o Ministro da Justiça determina o envio da Força Nacional mesmo sem pedido do Governador? Essa atuação seria constitucionalmente válida?
NÃO. Isso viola o princípio da autonomia estadual. Foi o que decidiu o STF, em juízo de delibação, ao apreciar medida liminar em ação cível originária. Afirmou a Corte: “É plausível a alegação de que a norma inscrita no art. 4º do Decreto 5.289/2004, naquilo em que dispensa a anuência do governador de estado no emprego da Força Nacional de Segurança Pública, viole o princípio da autonomia estadual”. STF. Plenário. ACO 3427 Ref-MC/BA, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 24/9/2020 (Info 992).
d) Autogoverno: é a capacidade de o Estado-membro organizar o seu governo, mediante a eleição de representantes. Envolve a eleição do Poder Executivo estadual, o processo legislativo estadual, a organização das Justiças Estaduais etc.
Observação: o STF vem aplicando o princípio da simetria, que funcionaria como limite ao poder constituinte decorrente, de forma que detalhes no arranjo institucional previstos na Constituição da República deveriam ser reproduzidos no âmbito do Estado-membro. Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto criticam tal princípio, alegando que ele não se compatibiliza com o federalismo, que é um sistema que visa a promover o pluralismo nas formas de organização política. Segundo tais autores, essa orientação impede que os Estados-membros exerçam experiências institucionais inovadoras nos governos locais (laboratórios da democracia), inibindo uma das mais interessantes funções do federalismo, que é permitir a inovação dos arranjos institucionais e, assim, a própria evolução da organização estatal.
O pluralismo político,nesta mesma toada, reclama o abandono de qualquer leitura excessivamente inflacionada das competências normativas da União, o que reforça o princípio federativo brasileiro.
IV. Bens
Nos termos do artigo 26 da Constituição Federal, incluem-se entre os bens dos Estados-membros: a) as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; b) as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros; c) as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; d) as terras devolutas não compreendidas entre as da União.
Cumpre fazer rápidos comentários sobre as terras devolutas, dado que a PFDC apresentou representação à PGR em 2017 para oferecer argumentos para a elaboração de parecer na ADI nº 5.623: com a Constituição da República de 1891, as terras devolutas foram transferidas para os Estados, mantendo-se na propriedade da União aquelas situadas na faixa de fronteira, modelo em que se baseou a Constituição da República de 1988 (v. art. 20, II e § 2º, CR). Tendo em vista a mutabilidade legal acerca dos requisitos legais para a venda de tais bens, diversos Estados acabaram vendendo terras devolutas que se encontram na faixa de fronteira e que, consequentemente, eram de domínio da União. Para evitar que a União simplesmente retomasse o domínio de tais terras, tendo em vista que tal venda foi feita por meio de títulos de domínio nulos, foram editadas leis prevendo a possibilidade de o particular requerer a ratificação do registro do respectivo móvel perante o órgão competente, desde que houvesse cumprimento dos objetivos previstos no art. 188 e no Estatuto da Terra, qual seja, a promoção de reforma agrária, o cumprimento à função social da propriedade e a ocupação da terra para cultura efetiva e moradia habitual. Tendo em vista que vários registros imobiliários não foram submetidos à ratificação, sobreveio a Lei 13.178/15, objeto da supracitada ADI, que prevê praticamente a ratificação automática e ex officio dos registros imobiliários quando a área for inferior a quinze módulos fiscais, sem exigir, nos outros casos, o cumprimento dos pressupostos constitucionais acima apontados (art. 188 da CR). Por tudo isso, defende a PFDC que a norma questionada é inconstitucional.
Jurisprudência (julgados mais recentes e relevantes):
1. É compatível com a Constituição Federal a imposição de restrições à realização de cultos, missas e demais atividades religiosas presenciais de caráter coletivo como medida de contenção do avanço da pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADPF 811/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 8/4/2021 (Info 1012).
2. O art. 3º, caput, VII e § 7º, III, da Lei nº 13.979/2020 autoriza que os gestores locais de saúde (secretarias estaduais e municipais, p. ex.), mesmo sem autorização do Ministério da Saúde, façam a requisição de bens e serviços. O STF afirmou que esses dispositivos são constitucionais.
Não se exige autorização do Ministério da Saúde para que os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios decretem a requisição administrativa prevista no art. 3º, caput, VII e § 7º, III, da Lei nº 13.979/2020, no exercício de suas competências constitucionais. STF. Plenário. ADI 6362/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 2/9/2020 (Info 989).
3. A omissão injustificada da Administração em providenciar a disponibilização de banho quente nos estabelecimentos prisionais fere a dignidade de presos sob sua custódia.
A determinação de que o Estado forneça banho quente aos presos está relacionada com a dignidade da pessoa humana, naquilo que concerne à integridade física e mental a todos garantida.
O Estado tem a obrigação inafastável e imprescritível de tratar prisioneiros como pessoas, e não como animais. STJ. 2ª Turma. REsp 1537530-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 27/04/2017 (Info 666).
4. É inconstitucional — por violação à competência da União para explorar os serviços e instalações de energia elétrica e para legislar sobre energia (arts. 21, XVII, “b”; 22, IV; e 175, parágrafo único, CF/88) — lei estadual que obriga as empresas concessionárias de energia elétrica a expedirem notificação com aviso de recebimento para a realização de vistoria técnica no medidor de usuário residencial. STF. Plenário. ADI 3703/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 6/3/2023 (Info 1085).
5. É inconstitucional lei estadual que proíbe os órgãos ambientais e a polícia militar de destruírem e inutilizarem bens particulares apreendidos em operações de fiscalização ambiental. Essa lei viola a competência da União para legislar sobre normas gerais de proteção ao meio ambiente (art. 24, VI e VII, da CF/99) e a afronta a competência privativa da União para legislar sobre direito penal e processual penal (e 22, I, da CF/88). STF. Plenário. ADI 7203/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 01/03/2023 (Info 1084).
6. É inconstitucional lei estadual que confere ao Governador poderes para conceder isenção de tarifa de energia elétrica aos consumidores residenciais, industriais e comerciais atingidos por enchentes no estado.
Essa lei viola a competência da União para legislar sobre energia elétrica (art. 22, IV, da CF/88), para explorar, diretamente ou por delegação, os serviços e instalações de energia elétrica (art. 21, XI, “e”), e para dispor sobre política de concessão de serviços públicos (art. 175, parágrafo único, III).
Leis estaduais não podem interferir em contratos de concessão de serviços federais, alterando as condições que impactam na equação econômico-financeira contratual e afetando a organização do setor elétrico. STF. Plenário. ADI 7337 MC-Ref/MG, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 01/03/2023 (Info 1084).
7. É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV, CF/88) — lei estadual que veda a adoção da “linguagem neutra” na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas e privadas, assim como em editais de concursos públicos locais. Tese fixada pelo STF: Norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União. STF. Plenário. ADI 7019/RO, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 10/02/2023 (Info 1082).
8. É constitucional lei estadual que proíbe, no âmbito de seu território, a fabricação, a venda e a comercialização de armas de brinquedo que simulam armas de fogo reais. STF. Plenário. ADI 5126/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/12/2022 (Info 1081).
9. É constitucional — haja vista a competência suplementar dos estados federados para dispor sobre proteção do consumidor (art. 24, V e § 2º, da CF/88) — lei estadual que torna obrigatória a assinatura física de idosos em contratos de operação de crédito firmados por meio eletrônico ou telefônico com instituições financeiras. STF. Plenário. ADI 7027/PB, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 16/12/2022 (Info 1080).
10. É inconstitucional, por ofensa à competência privativa da União para legislar sobre direito civil e política de seguros (art. 22, I e VII, da CF/88), lei estadual que veda, no âmbito de seu território, operadoras de plano de saúde de limitarem consultas e sessões para o tratamento de pessoas com deficiência. STF. Plenário. ADI 7172/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/10/2022 (Info 1072).
11. É inconstitucional, por violar os arts. 21, XI, 22, IV, e 48, XII da CF/1988, norma estadual que proíbe concessionárias de serviços de telecomunicação de ofertarem e comercializarem serviço de valor adicionado (SVA). STF. Plenário. ADI 6199/PE, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 15/8/2022 (Info 1063).
12. É inconstitucional, por invadir a competência municipal para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I e V, da CF/88), lei estadual que concede, por período determinado, isenção das tarifas de água e esgotoe de energia elétrica aos consumidores residenciais, industriais e comerciais.
Não cabe às leis estaduais a interferência em contratos de concessão de serviços federal e municipal, alterando condições que impactam na equação econômico-financeira. STF. Plenário. ADI 6912/MG, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 15/8/2022 (Info 1063).
4A. Direitos sociais: enunciação, garantias e efetividade. Princípio da proibição do retrocesso. Mínimo existencial e reserva do possível.
Isabella Pires
I. Direitos sociais: enunciação
Os direitos sociais consistem em um conjunto de faculdades e posições jurídicas pelas quais um indivíduo pode exigir prestações do Estado ou da sociedade ou até mesmo a abstenção de agir, tudo para assegurar condições materiais e socioculturais mínimas de sobrevivência. Integram o segundo grupo do conceito de Direitos Fundamentais, que, além de acréscimos ao catálogo anterior (direitos individuais), foram responsáveis por uma releitura completa e radical, inclusive produzindo alterações no significado destes (direitos individuais). Ou seja, os direitos sociais não só alargam a tábua de direitos fundamentais, mas também redefinem os próprios direitos individuais.
Seu nascimento é associado à crise da tradição do Estado Liberal e na consagração do paradigma do Estado Social de Direito. Segundo André de Carvalho Ramos, historicamente os direitos sociais se inserem entre aqueles de segunda dimensão (direitos de igualdade), frutos das revoluções socialistas em diversos países, tendo sido inseridos, no campo constitucional, de modo pioneiro na Constituição do México de 1917 e na Constituição de Weimar (Alemanha) de 1919. No Direito Internacional, o Tratado de Versailles (1919) é inovador ao constituir a Organização Internacional do Trabalho, existente até hoje e que tem como missão precípua a defesa dos direitos dos trabalhadores.
Em nosso histórico constitucional apenas a Constituição de 1891 não declarou nenhum direito social. A Constituição de 1934 inaugurou entre nós o constitucionalismo social, fortemente influenciada pelas primeiras constituições do Estado Social (sobretudo a Constituição de Weimar), que os direitos sociais e em geral as normas definidoras de fins e tarefas do Estado em matéria social foram inseridos na tradição constitucional brasileira.
A CF foi pródiga na declaração de direitos sociais, desde o compromisso com a justiça social, expresso no seu preâmbulo, até a inclusão de tais direitos no rol das 5 espécies de direitos e garantias fundamentais do Título II da CF (Capítulo I – Direitos e deveres individuais e coletivos; Capítulo II – Direitos sociais; Capítulo III – Direitos de nacionalidade; Capítulo IV – Direitos políticos e Capítulo V – Partidos políticos). Também tratou heterotopicamente de alguns direitos sociais específicos no Titulo VIII, que cuida da ordem social, destacando-se o trato da seguridade e da educação.
No estudo dos direitos sociais, importa considerar a classificação dos direitos fundamentais em direitos de prestação em sentido amplo, gênero do qual são espécies os direitos à organização e ao procedimento e os direitos de prestação em sentido estrito. Cuidam-se de um tipo de direito fundamental em que os pressupostos fático-materiais são particularmente relevantes para o exercício pleno desse respectivo direito. Por isso, os direitos de prestação em sentido amplo podem consistir na edição de atos normativos pelo Estado, na criação de procedimentos e garantias judiciais, na instituição de auxílios pecuniários, na realização de políticas públicas etc.
Há 3 posições sobre a fundamentalidade dos direito sociais: 
a) todos os direitos sociais são formal e materialmente fundamentais: por isso a sua mera enunciação na CF seria suficiente lhes atribuir um regime diferenciado de aplicabilidade imediata (art. 5º, § 1º) e de limite material para a reforma da constituição (art. 60, § 4º, IV); 
b) todos os direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, e, por isso, são normas programáticas que não geram direitos subjetivos e não limitam o constituinte derivado; 
c) direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, sendo materialmente fundamentais apenas no que tange ao seu núcleo essencial (mínimo existencial). 
II. Direitos sociais: garantias
Conforme clássica classificação de Barroso (BARROSO, 2006, p. 119), há 3 espécies de garantias para a efetivação dos direitos sociais:
a) sociais: relacionam-se com a participação do indivíduo no controle do processo político e no exercício do direito de petição (art. 5º, XXIV);
b) políticas: destaca-se principalmente o controle externo da administração pelo Congresso, com auxílio do Tribunal de Contas (art. 70 CF); e
c) jurídicas: são aqueles buscados principalmente pela via jurisdicional, destacando-se o mandado de segurança (art. 5º, LXIX e LXX); a ação popular (Art. 5º, LXXIII); o dissídio coletivo (art. 114, § 2º); o mandado de injunção (art. 5º, LXXI); o habeas data (art. 5º, LXXII); a ação civil pública (art. 129, inc. III) as ações diretas de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade (art. 102, I, a), a ADPF (art. 102, § 1º), a ação de declaratória de inconstitucionalidade de por omissão (art. 103, § 2º).
III. Direitos sociais: efetividade
O tratamento incial dado aos direitos sociais dispensava era o de normas de caráter programático a implicar, invariavelmente, escolhas alocativas, feitas a partir de critérios de justiça distributiva (o quanto disponibilizar e a quem atender), configurando​-se como típicas opções políticas, as quais pressupõem “escolhas trágicas” pautadas por critérios de justiça social (macrojustiça). Por tal razão, se defendia e até hoje uma parcela da doutrina defende, que o Poder Judiciário, vocacionado a concretizar a justiça do caso concreto (microjustiça), muitas vezes não teria condições de, ao examinar determinada pretensão à prestação de um direito social, analisar as consequências globais da destinação de recursos públicos em benefício da parte com invariável prejuízo para o todo.
A seu turno, os defensores da atuação do Poder Judiciário na concretização dos direitos sociais, em especial do direito à saúde ou à educação, argumentam que tais direitos são indispensáveis para a realização da dignidade da pessoa humana. Assim, ao menos o “mínimo existencial” de cada um dos direitos não poderia deixar de ser objeto de apreciação judicial. Entendimento acolhido pelo STF em diversos julgados:
STJ decidiu que o Judiciário pode determinar a reforma de cadeia pública ou a construção de nova unidade prisional. (...) É por isso que o princípio da reserva do possível não pode ser oposto a um outro princípio, conhecido como princípio do mínimo existencial. Somente depois de atingido esse mínimo existencial é que se poderá discutir, relativamente aos recursos remanescentes, em quais outros projetos se deve investir. Por esse motivo, não havendo comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário determine a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político. STJ. 2ª Turma. REsp 1389952-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/6/2014 (Info 543). Obs: veja também: STF. Plenário. RE 592581/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 13/8/2015 (repercussão geral) (Info 794).
Observa-se um fenômeno tratado por alguns autores como de “judicialização dos direitos”, que nada mais é do que a busca por respostas imediatas para fazer cessar uma situação de inaplicabilidade dos valores fundamentais do Estado. Quanto à judicialização de direitos sociais, para Sarmento, cabe inicializar uma fase de racionalização, a qual passa por dois pontos principais: 
(a) a superação de uma certa “euforia judicialista”, com o reconhecimento de que o Poder Judiciário, apesar da relevância da sua função, não é, nem tem como ser, por suas limitações institucionais, o grande protagonista no cenário de afirmação dos direitos sociais, que dependem muito mais das políticas públicas formuladase implementadas pelo Legislativo e Executivo e da mobilização da sociedade civil; e 
(b) o traçado de parâmetros ético-jurídicos para as intervenções judiciais nesta seara. Afinal, deve-se refletir sobre o potencial de universalização do que foi pedido sempre que estivessem em jogo pretensões sobre recursos escassos, considerando- se a reserva do possível e as limitações orçamentárias, com uma análise de “macrojustiça”, que envolve a legitimidade do atendimento de determinados pleitos num quadro de escassez de recursos. Ademais, não se devem ignorar as deficiências da capacidade institucional do Judiciário para tutelar os direitos sociais, motivo pelo qual se deve adotar um parâmetro adicional para o exercício da proteção judicial: quanto mais a questão discutida envolver aspectos técnicos de políticas públicas, mais cautelosa e reverente em relação às decisões dos demais poderes deve ser a atuação do Judiciário. Este parâmetro deve ser conjugado com outros, como a razoabilidade da universalização da pretensão do titular do direito, e a essencialidade da prestação social demandada no caso específico.
Em suma, delimitação de aplicação:
(a) fático: razoabilidade da universalização da prestação exigida, considerando os recursos existentes; 
(b) jurídico: dois aspectos: 
1. Admissão que os poderes públicos precisam fazer escolhas de prioridades. 
2. Que os direitos sociais fiquem absolutamente vinculados às escolhas exercidas. 
Assim, o autor é pela possibilidade excepcional da atuação do Judiciário para a concretização de direitos sociais (essenciais) previstos constitucionalmente, nos moldes e parâmetros acima.
Gilmar Mendes ressalta as considerações de Canotilho segundo a qual “paira sobre a dogmática e teoria jurídica dos direitos econômicos, sociais e culturais a carga metodológica da vaguidez, indeterminação e impressionismo que a teoria da ciência vem apelidando, em termos caricaturais, sob a designação de ‘fuzzismo’ ou ‘metodologia fuzzy’”. Em “toda a sua radicalidade – enfatiza Canotilho – a censura de fuzzysmo lançada aos juristas significa basicamente que eles não sabem do que estão a falar quando abordam os complexos problemas dos direitos econômicos, sociais e culturais”.
ADPF 45 (controle judicial das politicas publicas) e RE 410.715/SP – Análise do STF sob o mínimo existencial. Na decisão monocrática do Min. Celso de Mello, este entendeu inicialmente pela possibilidade de controle judicial das políticas públicas, como medida necessária para a garantia da efetividade dos direitos sociais, em razão da omissão dos demais Poderes Constituídos.
Inf. 780 do STF – RE 33615: “Os ideais da democracia e do constitucionalismo – não obstante caminhem lado a lado – vez por outra revelam uma tensão latente entre si. É que, de um lado, a democracia, apostando na autonomia coletiva dos cidadãos, preconiza a soberania popular, que tem na regra majoritária sua forma mais autêntica de expressão. De outro lado, o constitucionalismo propugna pela limitação do poder através de sua sujeição ao direito, o que impõe obstáculos às deliberações do povo. (...) O problema consiste em saber até que ponto é que a excessiva constitucionalização não se traduz em prejuízo do princípio democrático” (MOREIRA, Vital. “Constituição e Democracia”. In: MAUÉS, Antonio G. Moreira (Org.) Constituição e Democracia. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 272). Essa aparente contradição entre os valores albergados pelo Estado Democrático de Direito impõe um dever de cautela redobrado no exercício da jurisdição constitucional. Com efeito, é certo que os tribunais não podem asfixiar a autonomia pública dos cidadãos, substituindo as escolhas políticas de seus representantes por preferências pessoais de magistrados não eleitos pelo povo (...) a Constituição não pode ser vista como repositório de todas as decisões coletivas, senão apenas dos lineamentos básicos e objetivos fundamentais da República. Deve-se, portanto, rechaçar qualquer leitura maximalista das cláusulas constitucionais que acabe por amesquinhar o papel da política ordinária na vida social. (...) Na lição irretocável de Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto, “de um lado, deve-se reconhecer o importante papel do Judiciário na garantia da Constituição, especialmente dos direitos fundamentais e dos pressupostos da democracia. Mas, de outro, cumpre também valorizar o constitucionalismo que se expressa fora das cortes judiciais, em fóruns como os parlamentos e nas reivindicações da sociedade civil que vêm à tona no espaço público informal” (SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional. Teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, 240)”.
IV. Princípio da proibição do retrocesso
A discussão sobre a vedação de retrocesso está diretamente relacionada com os direitos sociais, mas não apenas com eles. Segundo André de Carvalho Ramos, consiste na vedação da eliminação da concretização já alcançada na proteção de algum direito, admitindo-se somente apriomaramentos e acréscimos. Em essência traz mais uma limitação à liberdade de conformação do legislador, de modo que o núcleo essencial dos direitos sociais, efetivados por medidas legislativas, não mais poderia ser violado, sem o oferecimento de medidas compensatórias. Decorre do Estado Democrático de Direito, da dignidade da pessoa humana, da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, da proteção da confiança e segurança jurídica e de cláusula pétrea prevista no art. 60, parágrafo 4º, IV da CF/88.
Não representa, contudo, uma vedação absoluta a qualquer medida de alteração da proteção de um direito específico. Segundo André de Carvalho Ramos, eventual diminuição na proteção normativa ou fática de um direito pode ser permitida desde que preencha três condições: i) que haja justificativa também de estatura jusfundamental; ii) que tal diminuição supere o crivo da proporcionalidade; iii) que seja preservado o núcleo essencial do direito envolvido.
Espécies de retrocesso (ACR): a) vedação do retrocesso social: o Min. Celso de Mello entende que a cláusula traduz verdadeira dimensão negativa pertinente aos direitos sociais de natureza prestacional, impedindo que os níveis de concretização dessas prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser reduzidos ou suprimidos, exceto nas hipóteses em que políticas compensatórias venham a ser implementadas pelas instâncias governamentais; b) vedação do retrocesso político: o STF entendeu que a proibição do retrocesso político-constitucional impede que direitos conquistados (como o da garantia de voto secreto pela urna eletrônica) retroceda para dar lugar a modelo superado (voto impresso) exatamente pela sua vulnerabilidade (ADI 4.543-MC, 2011), posição reiterada na ADI 5.889 de 2020; c) vedação do retrocesso civil: em 2017, o STF decidiu que o CC/02 não poderia desigualar a proteção sucessória conferida pelas Leis 8.971/94 e 9.279/96 aos companheiros; d) vedação do retrocesso institucional: alegado por ADPF proposta pela PGR em face de decreto presidencial que esvaziou significativamente o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura – MNPCT. Para a PGR, reduziu-se o âmbito de proteção normativa ao direito de não submissão à tortura ou tratamentos e penas cruéis e degradantes de pessoas sob custódia do Estado, tese acolhida pelo STF, que deu interpretação conforme ao dispositivo; e) vedação do retrocesso ecológico: o princípio da proibição de retrocesso ecológico ou socioambiental é fruto da tutela constitucional (art. 225 da CF/88) e internacional do meio ambiente (art. 11 do Protocolo de San Salvador e PIDESC, entre outros), que restringe a discricionariedade do legislador (Estado-legislador) na adoção de medidas contrárias à proteção ambiental, reconhecido pelo STF em caso de alteração da área de unidades de conservação por Medida Provisória (ADI 4.717, 2019).
V. Mínimo Existencial 
Mínimo existencial seria o conjunto de bens e utilidades indispensáveis a uma vida humana digna para que se possa usufruir dos direitos de liberdade(direitos individuais), antes se faz necessário a implementação e garantia de um piso mínimo de direitos.
SARMENTO: (a) dimensão negativa: opera num limite, impedindo a prática de atos pelo estado ou por particulares que subtraiam do individuo as condições materiais indispensáveis a uma vida digna; (b) dimensão positiva: conjunto essencial (mínimo) de direito prestacionais a serem implementados e concretizados que possibilitam ao individuo uma vida digna. De acordo com Daniel Sarmento, se de um lado estiver os direitos sociais e do outro o princípio democrático/separação dos poderes/direito de terceiros, quando o mínimo existencial estiver nessa ponderação ele exigirá do Estado um ônus argumentativo ainda maior para o caso de não cumprir o direito.
Na visão de Ingo Sarlet, o mínimo existencial não se submete a reserva do possível, tendo sido esta a posição adotada pelo Min. Celso de Melo no RE 482.611/SC. Também é a posição do STJ, vide julgado da construção dos presídios.
VI. Reserva do Possível 
Reserva do possível compreende a possibilidade material (financeira) para prestação dos direitos sociais por parte do Estado, uma vez que tais prestações positivas são dependentes de recursos presentes nos cofres públicos. No estudo da reserva do possível, fica claro que o uso do argumento de racionalidade econômica (escassez) desvia o curso e obscurece os argumentos jurídicos por que ainda se pautam numa concepção de liberdade (conveniência) do Administrador Público de aplicação dos recursos financeiros públicos. A ausência de um espaço capaz de institucionalizar procedimentos de formação da vontade coletiva – à luz de um princípio democrático – acaba por legitimar posturas paternalistas e autoritárias por parte do Judiciário brasileiro, que assume o papel taumaturgo de decisão – a semelhança de um Poder Moderador ou de um Poder Constituinte Permanente -, confundindo fiscalização com usurpação do espaço e espectro de decisões dos demais Poderes Constituídos (FERNANDES, p. 583 e ss).
Segundo Ingo Sarlet, a reserva do possível tem três dimensões: possibilidade fática (disponibilidade de recursos necessários para satisfazer uma prestação relacionadas aos direitos sociais), possibilidade jurídica (existência de autorização orçamentária para cobrir as despesas e análise das competências federativas) e razoabilidade da exigência e proporcionalidade da prestação.
STF: É lícito ao Poder Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana e assegurar aos detentos o respeito à sua integridade física e moral, nos termos do que preceitua o art. 5º, XLIX, da CF, não sendo oponível à decisão o argumento da reserva do possível nem o princípio da separação dos poderes (RE 592581/RS).
Mesmo com tais restrições, o Supremo Tribunal Federal revisitou a sua jurisprudência e estabeleceu que no TEMA 27 a TESE: “É inconstitucional o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo como requisito obrigatório para concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição”. RE 567985, MARCO AURÉLIO, aprovada em 18/04/2013. Permitiu, portanto, que juízes analisassem em concreto situações de miserabilidade, ainda que desatendidos o critério objetivo legal.
Prova oral: explicar o princípio do não retrocesso, surgimento, aplicabilidade nos direitos sociais e nas liberdades públicas. Para ACR:
Os direitos humanos caracterizam-se pela existência da proibição do retrocesso, também chamada de “efeito cliquet”, princípio do não retorno da concretização ou princípio da proibição da evolução reacionária, que consiste na vedação da eliminação da concretização já alcançada na proteção de algum direito, admitindo-se somente aprimoramentos e acréscimos.
Outra expressão utilizada pela doutrina é o entrenchment ou entrincheiramento, que consiste na preservação do mínimo já concretizado dos direitos fundamentais, impedindo o retrocesso, que poderia ser realizado pela supressão normativa ou ainda pelo amesquinhamento ou diminuição de suas prestações à coletividade.
Sua origem remonta à década de 1970, quando a Alemanha atravessou período de dificuldade econômica agravada pelo agigantamento do Estado Social, o que gerou forte discussão sobre a legitimidade de restringirem-se e/ou suprimirem-se benefícios sociais assegurados aos cidadãos. Cabe destacar que, conforme alerta Rothenburg, a vedação ao retrocesso não se limita aos direitos sociais, aplicando-se aos variados tipos de direitos fundamentais.
4B. Normas constitucionais. Definição. Estrutura. Classificações. Princípios e regras. Preâmbulo. Efeitos das normas da Constituição brasileira de 1988.
Oswaldo Costa
Tiago Ferreira Santos
Guilherme Mitidiero
I. Normas constitucionais. Definição. Estrutura
Normas materialmente constitucionais, segundo a doutrina majoritária, são as que regulam os seguintes temas: forma de governo, forma de Estado, separação de poderes, obtenção e exercício do poder e direitos fundamentais; normas formalmente constitucionais são aquelas que, sem regular os aspectos acima mencionados, são consideradas constitucionais pelo simples fato de terem sido consignadas no texto da Constituição pelo legislador, adquirindo assim status constitucional. Ex.: Art. 242, § 2º - “O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal”.
Características das normas constitucionais: a) hierarquia superior: a Constituição é parâmetro superior para a interpretação das leis, em razão da supremacia constitucional; b) conteúdo político: a norma constitucional define, estrutura e legitima o poder político; c) natureza da linguagem: a norma constitucional apresenta uma linguagem dotada de plasticidade, porosidade ou ductibilidade, de conteúdo relativamente indeterminado (ex: princípios da dignidade da pessoa humana e da moralidade administrativa). Canotilho usa o termo textura aberta da constituição.
II. Normas constitucionais. Classificações
Normas definidoras de direito e normas de organização: “(...) refletindo a clássica dicotomia Estado/indivíduo, as disposições constitucionais podem ser classificadas em normas de organização, de estrutura ou de competência, e normas definidoras de direitos, sendo as primeiras aquelas que dispõem sobre a ordenação dos poderes do Estado, sua estrutura, competência, articulação recíproca e o estatuto dos seus titulares; as outras, as que definem os direitos fundamentais dos jurisdicionados.” (MENDES, COELHO e BRANCO, 2008: 30).
Normas autoaplicáveis (autoexecutáveis, segundo MENDES, COELHO e BRANCO): “(...) consideram-se autoexecutáveis as disposições constitucionais bastantes em si, completas e suficientemente precisas na sua hipótese de incidência e na sua disposição, aquelas que ministram os meios pelos quais se possa exercer ou proteger o direito que conferem, ou cumprir o dever e desempenhar o encargo que elas impõe; normas não-aplicáveis, ao contrário, são as disposições constitucionais incompletas ou insuficientes, para cuja execução se faz indispensável a mediação do legislador, editando normas infraconstitucionais regulamentadoras.”
José Afonso da Silva: 
 	i) Eficácia Plena – São de aplicação direta e imediata e independem de uma lei que venha mediar os seus efeitos. As normas de eficácia plena também não admitem que uma lei posterior venha a restringir o seu alcance. 
 	ii) Eficácia Contida – Assim como a plena, é de aplicação direta e imediata não precisando de lei para mediar os seus efeitos, porém poderá ver o seu alcance limitado pela superveniência de uma lei infraconstitucional, por outras normas da própria constituição ou ainda por meio de preceitos ético-jurídicos como a moral e os bons costumes. 
 	iii) Eficácia Limitada – São de aplicação indireta ou mediata, pois há a necessidade da existência de uma leipara “mediar” a sua aplicação. Caso não haja regulamentação por meio de lei, não são capazes de gerar os efeitos finalísticos (apenas os efeitos jurídicos que toda norma constitucional possui). Podem ser: a) Normas de princípio programático (normas-fim) - Direcionam a atuação do Estado instituindo programas de governo; b) Normas de princípio institutivo - Ordenam ao legislador a organização ou instituição de órgãos, ou instituições.
Classificação quadripartida: classificação proposta por Maria Helena Diniz, diferencia-se da proposta de José Afonso por dividir em normas de eficácia plena (admitem emenda) e normas de eficácia absoluta (intangíveis, não podem ser emendadas), além de normas com eficácia relativa restringível (contidas) e normas com eficácia relativa complementável (limitada).
Classificação quinquipartida: reproduz integralmente a classificação quadripartida, acrescentando um novo tipo de norma: normas de aplicabilidade esgotada e eficácia exaurida.
Bandeira de Mello: 
Todas as disposições concernentes à Justiça Social, inclusive as programáticas, são comandos jurídicos, gerando inconstitucionalidade (até por omissão) quando o Estado age em descompasso. Embora com teores eficaciais distintos, todas são direitos subjetivos. Espécies: a) concessivas de poderes jurídicos, podendo ser exercitadas de imediato; b) atributivas de direito a fruir, mediante prestação alheia, que pode ser exigida judicialmente; 	c) que apontam finalidades, sem indicar a conduta do Poder Público, que permitem aos administrados se oporem judicialmente a atos conflitantes com o preceito.
III. Princípios, regras e postulados
Diversas teorias e concepções buscam estabelecer distinção entre princípios e regras. As mais comumente aceitas afirmam que as normas constitucionais se distinguem em princípios e regras e que “aquilo que caracteriza particularmente o princípio – e isto constitui sua diferença com a regra de direito (...) – é, de um lado, a falta de precisão e, de outro, a generalização e abstração lógica.” (STARI, apud MENDES, COELHO e BRANCO: 31). Some-se a isto o fato de que os princípios são aplicados segundo juízo de ponderação, ao passo que as regras segundo critério do “tudo ou nada”. Ao lado das normas (gênero que se divide em princípios e regras), há também os postulados, os quais, segundo ÁVILA (2003: 80), distingue-se dos princípios pois estes “estabelecem fins a serem buscados”. Para Ávila, os postulados não seriam normas, mas sim metanormas, “situam-se num segundo grau e estabelecem a estrutura de aplicação de outras normas, princípios e regras”, ou seja, os postulados “(...) não impõe a promoção de um fim, mas, em vez disso, estruturam a aplicação do dever de promover um fim”, além disso “(...) não prescrevem comportamentos, mas modos de raciocínio e de argumentação relativamente a normas que indiretamente prescrevem comportamentos.” (Idem). Para Ávila, são exemplos de postulados a ponderação, a concordância prática e a proibição de excesso, bem como a igualdade, razoabilidade e proporcionalidade.
	Autor
	Princípios
	Regras
	Dworkin
	Dimensão de peso.
Conflitos solucionados pela argumentação moral.
	Comandos disjuntivos - “Tudo ou nada”.
	Alexy
	Mandados de otimização.
Comandos prima facie.
	Mandamento de definição.
Conflito solucionado pela inserção de uma cláusula de exceção ou pela declaração de invalidez de uma delas.
	Ávila
	Estabelecem um “estado ideal de coisas a ser atingido”.
	Imediatamente prescritivas.
	
	Ávila propõe uma terceira espécie normativa, postulados normativos, metanormas que instituem critérios de aplicação para as demais.
IV. Preâmbulo
Preâmbulo: “Na expressão de Peter Häberle, os preâmbulos são ‘pontes do tempo’, exteriorizando as origens, os sentimentos, os desejos e esperanças que palmilharam o ato constituinte originário” (BULOS, 2008: 283). Portanto, o preâmbulo não possui força normativa, não servindo, portanto, como parâmetro para o exercício do controle de constitucionalidade. Esta tese foi sedimentada pelo STF na ADI 2.076, que definiu também a desnecessidade de reprodução obrigatória do preâmbulo nas Constituições Estaduais.
V. Efeitos das normas da Constituição brasileira de 1988 
O estudo da dinâmica constitucional diz respeito aos efeitos das normas constitucionais no tempo (passado – presente - futuro). Certo é que o surgimento de uma nova Constituição traz uma série de consequências para o ordenamento jurídico do Estado. Sem dúvida, a teoria da Constituição desenvolveu uma gama de institutos para lidar com essas consequências. Assim, diante dessas premissas, são seus possíveis efeitos em relação a normas pré-existentes:
(a)  Recepção: as normas que forem incompatíveis com a nova Constituição serão revogadas por ausência de recepção. A contrario sensu, a norma infraconstitucional que não contrariar a nova ordem será recepcionada, podendo, inclusive, adquirir uma nova “roupagem”. Pode ocorrer de forma expressa ou tácita.
(b)  Revogação: nos casos de normas infraconstitucionais produzidas antes da nova Constituição, incompatíveis com as novas regras, não se observará qualquer situação de inconstitucionalidade, mas apenas de revogação da lei anterior pela nova constituição, por falta de recepção.
(c)   Repristinação: Em um primeiro momento, normas infraconstitucionais elaboradas (e em vigor) sob a base de um ordenamento constitucional não foram recepcionadas por um novo ordenamento constitucional, ocorrendo a sua revogação. Posteriormente, em virtude de uma nova Constituição, essas normas voltariam a vigorar, ocorrendo a repristinação. Os requisitos para essa possibilidade são: (i) não contrariedade à nova Constituição; (ii) disposição expressa do poder constituinte, já que a repristinação não ocorre de forma automática (defesa da segurança jurídica).
Recepção material das normas constitucionais: consiste na possibilidade de normas de uma constituição anterior serem recepcionadas pelo novo ordenamento constitucional (pela nova constituição) “ainda” como normas constitucionais (com o status de normas constitucionais). Nesse caso, os requisitos seriam: (i) não contrariedade com as normas da nova constituição; (ii) disposição expressa do Poder Constituinte Originário; (iii) prazo determinado (prazo certo) de tal prática devido ao seu caráter precário, sobretudo em razão de que as normas da constituição anterior vão permanecer no novo ordenamento constitucional ainda como normas de cunho constitucional, o que, obviamente, só poderia se dar de forma temporária e excepcional. Como exemplo desse fenômeno, temos o art. 34 do ADCT da CF/88, segundo o qual o “sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda n.º 1, de 1969, e pelas posteriores”. 
Graus de retroatividade da norma constitucional: máximo, médio ou mínimo. O STF entende que as normas constitucionais, fruto da manifestação do poder constituinte originário, têm, por regra geral, retroatividade mínima, ou seja, aplicam-se a fatos que venham a ocorrer após a sua promulgação, referentes a negócios passados. Mendes afirma que a atribuição de retroatividade máxima e média somente é possível com a expressa previsão pelo Poder Constituinte Originário.
Obs. Este tema foi cobrado na discursiva do 30CPR, colar aqui o espelho quando disponível. 
4C. Lacunas e Integração do Direito: analogia, costumes e equidade.
Oswaldo Costa
Guilherme Mitidiero
I. Lacunas e Integração do Direito
A teoria jurídica tradicional afirma que o ordenamento jurídico é dotado de completude. Isto porque dele seria possível extrair a resposta para qualquer problema jurídico que viesse a surgir. Porém, mesmo de acordo com esta concepção, as leis, diferentemente do ordenamento, podem conter lacunas, quando não indicarem soluções para questões juridicamente relevantes. Diante de uma lacuna, o Poder Judiciário, que tem a obrigação institucional de resolver os conflitos de interesses submetidosà sua apreciação, não pode recusar-se a julgar, proferindo um non liquet.
A Constituição é uma norma fragmentária, que não trata de todos os temas, mas tão somente daqueles escolhidos pelo poder constituinte por sua singular importância ou por outras razões atinentes à conveniência de seu entrincheiramento. Mesmo nestes temas, a Constituição, no mais das vezes, não exaure a respectiva disciplina, mas apenas fixa as suas principais coordenadas normativas, deixando a complementação para o legislador.
A jurisprudência do STF reconhece a existência de lacunas constitucionais, a exemplo do caso em que foi discutida as exigências profissionais para a nomeação de advogados para o exercício da função de juiz de Tribunal Regional Eleitoral (RMS 24.334/PB).
As principais formas de integração de lacunas são a analogia, os costumes e a equidade. O art. 4º da LINDB não alude à equidade, mas menciona os princípios gerais de Direito, os quais são arrolados também pela doutrina mais convencional como meios de colmatação de lacunas.
II. Analogia
A analogia consiste em técnica para colmatação de lacunas por meio da qual se aplica à hipótese não regulada uma norma jurídica que trata de questão similar. A norma em questão não seria inicialmente aplicável ao caso, que não está compreendido na sua hipótese de incidência. Mas, diante da lacuna, ela incide para resolvê-lo. O principal fundamento da analogia é a igualdade, pois se parte da premissa de que hipóteses simulares devem receber o mesmo tratamento do ordenamento.
III. Costumes 
O costume também é uma fonte do Direito, que não se esgota nas normas jurídicas produzidas pelo Estado. O costume contribui para a abertura do sistema jurídico, intensificando a sua conexão com a realidade social subjacente. A doutrina, em geral, caracteriza o costume jurídico pela confluência de dois elementos[footnoteRef:2]: o elemento objetivo, que é a repetição habitual de um determinado comportamento; e o elemento subjetivo, que é a consciência social da obrigatoriedade desse comportamento. A doutrina aponta como exemplo de costume constitucional no Brasil a aprovação de algumas leis, de caráter mais consensual, por meio do chamado “voto de liderança”. [2: No âmbito do Direito Internacional, são a prática generalizada (elemento objetivo/volitivo, chamada inverterata consuetudo), acrescida da convicção de que essa prática é juridicamente obrigatória (elemento subjetivo/psicológico, chamado opinio juris).] 
É certo, porém, que a rigidez e a força normativa da Constituição não se compatibilizam com os costumes contra legem (que também pode ser chamado de contra constitutionem). Portanto, o costume, por mais enraizado que seja, jamais pode ser invocado como escusa para a violação da Constituição, nem enseja a revogação de preceitos constitucionais. Isto confere ao costume constitucional uma posição singular no sistema das fontes do Direito, já que ele se situa acima das normas infraconstitucionais, mas, mesmo quando superveniente, não tem o condão de alterar o texto da Constituição.
IV. Equidade 
A equidade é o instituto jurídico que autoriza o intérprete a adaptar o direito vigente a particularidades que não foram previstas pelo legislador, buscando retificar injustiças ou inadequações mais graves. Pode ser empregada para auxiliar na interpretação das normas legais e para corrigir a lei, quando a aplicação dessa se revelar profundamente injusta ou inadequada às singularidades do caso concreto. Neste último sentido, ela é associada à suavização dos comandos legais, de forma benéfica aos seus destinatários. Mas a equidade também pode ser utilizada para preencher as lacunas da lei, integrando o ordenamento. Esta distinção entre equidade secundum legem (de acordo com a lei, pois previsto por ela), contra legem e praeter legem (suprir lacuna, pois está além da lei), clara na teoria, não é tão nítida na prática, pois as lacunas a que a equidade é convocada a colmatar são quase sempre lacunas ocultas. Ou seja, são aquelas lacunas que não decorrem propriamente da ausência da norma legal disciplinando a hipótese, mas da percepção pelo intérprete de que a norma incidente deixou de contemplar um aspecto essencial do caso, cuja consideração pelo legislador teria conduzido a tratamento jurídico distinto. 
A equidade não está prevista expressamente no art. 4º da LINDB como meio de integração de lacunas. No ordenamento infraconstitucional brasileiro, a principal alusão à equidade se encontra no art. 140, parágrafo único, do NCPC, segundo o qual “o juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei”, e no art. 108 do CTN:
Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: I - a analogia; II - os princípios gerais de direito tributário; III - os princípios gerais de direito público; IV - a equidade. § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei. § 2º O emprego da equidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido.
Esta reticência do nosso legislador infraconstitucional em relação à equidade se explica diante do predomínio, até não muito tempo atrás, de uma concepção jurídica formalista. Contudo, ao longo do século passado, floresceram, em diferentes contextos históricos e com impostações político-filosóficas heterogêneas, várias correntes que valorizaram ao extremo a liberdade decisória do juiz na busca da solução mais justa ou adequada para cada caso, como a Escola do Direito Livre na França, o realismo jurídico norte-americano, a tópica jurídica alemã, e, no Brasil, algumas versões do movimento conhecido como “Direito Alternativo”. Tais correntes, contudo, incorreram em excessos, por não atribuírem a importância devida à exigência de previsibilidade e segurança jurídica, inerente ao Estado de Direito, e tampouco à necessidade de legitimação democrática do processo de criação do Direito.
Portanto, a equidade pode ser usada para suprir lacunas da Constituição ou temperar, em circunstâncias excepcionais, o rigor das suas regras (p.ex. ADI 1289 e MS 26.690).
5A. Poder Constituinte originário. Titularidade e características.
Jorge Neto
I. Conceito e Titularidade
Poder constituinte originário: É uma força, uma energia que se forja na consciência popular. Por muito tempo se conserva hibernado e só acorda por força dos acontecimentos. É uma força de natureza política, não jurídica, pois antecede ao próprio direito. Também chamado inicial, inaugural, genuíno ou de 1º grau, é aquele que instaura uma nova ordem jurídica, rompendo com a ordem jurídica precedente. Seu objetivo fundamental é, portanto, criar um novo Estado.
Titularidade: Povo (conjunto de indivíduos) ou nação (unidade orgânica permanente)? Povo!
II. Características
Origem: O conceito de poder constituinte originário é derivado dos estudos do abade de Sieyès (“O que é o terceiro estado?”). Sieyès enfatiza que a constituição é produto do poder constituinte originário, que gere e organiza os poderes do estado (poderes constituídos), sendo, até por isso, superior a eles. Sieyès se propunha a superar o modo de legitimação do poder que vigia, baseado na tradição, pelo poder político de uma decisão originária, não vinculada ao direito preexistente, mas à nação, como força que cria a ordem primeira da sociedade. Para ele, o povo é soberano para ordenar seu próprio destino e o da sua sociedade, expressando-se por meio da constituição.
Classificação: o poder constituinte originário pode ser dividido em histórico (seria o verdadeiro poder constituinte originário, estruturando, pela primeira vez, o estado) e revolucionário (seriam todos os posteriores ao histórico, rompendo por completo com a antiga ordem e instaurando um novo estado).
Características: é inicial, autônomo, ilimitado juridicamente, incondicionado, soberano na tomada de suas decisões, um poder de fato e político, permanente: 
a) inicial – está na origem do ordenamento; é o ponto de partida; assim, o poder constituinteoriginário não pertence à ordem jurídica, não está regido por ela; 
b) autônomo – a estrutura da nova constituição será determinada autonomamente, por quem exerce o poder constituinte originário; 
c) ilimitado juridicamente – não tem de observar os limites postos pela ordem anterior; o caráter ilimitado, porém, deve ser entendido em termos; diz respeito à liberdade do poder constituinte originário com relação a imposições da ordem jurídica que existia anteriormente, mas haverá limitações políticas inerentes ao exercício do poder constituinte (se o poder constituinte é a expressão da vontade política da nação, não pode ser entendido sem a referência a valores éticos, religiosos, culturais, que informam essa mesma nação e que motivam as suas ações; assim, um grupo que se arrogue a condição de representante do poder constituinte originário e redija uma constituição que hostilize esses valores dominantes não haverá de obter o acolhimento de suas regras pela população e não terá êxito no empreendimento revolucionário, não sendo reconhecido como poder constituinte originário, posição de Paulo Branco); além disso, pode-se falar em limitações intrínsecas do poder constituinte originário sob outro ângulo – não há espaço para decisões caprichosas ou totalitárias do poder constituinte originário, já que ele existe para ordenar juridicamente o poder o estado, devendo, assim, sempre instituir um estado com poderes limitados. Entretanto, a doutrina majoritária entende que o Brasil adotou a corrente positivista, em oposição à jusnaturalista, que prevê certas limitações ao PCO; 
d) incondicionado e soberano na tomada de decisões – não se submete a qualquer forma pré-fixada de manifestação; 
e) poder de fato e poder político – pode ser caracterizado como uma energia ou força social, tendo natureza pré-jurídica, sendo que, por essas características, a nova ordem jurídica começa com a sua manifestação, e não antes dela; 
f) permanente – o poder constituinte originário não se esgota com a edição da nova constituição, sobrevivendo a ela e fora dela como forma de expressão da liberdade humana, em verdadeira ideia de subsistência (Sarmento relativiza todas essas características. P. ex.: inicial? Normalmente não se manifesta em um cenário de completa ruptura. Incondicionado? Podem ser estabelecidas regras prévias sobre o seu funcionamento – sobre a elaboração da própria constituição).
Formas de expressão: o poder constituinte originário pode ser expressar através da outorga (imposição – quando não há um “verdadeiro momento constitucional”, segundo Sarmento) ou da promulgação (forma democrática) da nova constituição. Para que seja reconhecido como legítimo, o poder constituinte deve se manifestar democraticamente e instituir um regime político comprometido com o respeito aos direitos humanos (Sarmento). 
Teoria das normas constitucionais inconstitucionais: formulada por Otto Bachof, entende ser possível analisar a Constituição a partir de duas áreas: existem temas que a Constituição pode tratar de forma livre (espaço de livre manifestação volitiva) e temas que estão acima do direito positivado (valores suprapositivos), a serem respeitados pela Constituição e incorporados ao próprio texto constitucional. Portanto, se uma norma constitucional viola um valor suprapositivo, esta norma será inválida, se tratando de uma norma constitucional inconstitucional. Exposta ao STF na ADI 815, que questionava o art. 44 da CF/88 (proporcionalidade do sistema eleitoral no Poder Legislativo – número mínimo e máximo para cada Estado), não foi acolhida pelo STF.
5B. Supremo Tribunal Federal: organização e competência. Jurisdição constitucional.
André Batista e Silva
Atualizado por Valmir Neto (2023)
I. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). O STF é órgão de cúpula do poder judiciário brasileiro, exercendo primordialmente a função de guardião da constituição, com atribuição de julgar questões de jurisdição concentrada-abstrata de índole constitucional, a fim de que prevaleça a supremacia Constitucional em todo o Brasil. Entretanto, a corte não possui atribuições exclusivamente relacionadas a jurisdição constitucional, possuindo outras competências atribuídas pela CRFB, a teor do seu art. 102.
I.1. COMPOSIÇÃO E INVESTIDURA. Composto por 11 Ministros. Investidura: o Presidente da República escolhe e indica o nome para compor o STF, devendo ser aprovado pela maioria absoluta do Senado Federal. Aprovado, passa-se à nomeação, momento em que o Ministro é vitaliciado. 
Requisitos para ocupar o cargo de Ministro do STF: (a) Ser brasileiro nato (art. 12, § 3º, IV da CF); (b) Ter mais de 35 e menos de 70 anos de idade (art. 101 CF); (c) Ser Cidadão (art. 101, estando em pleno gozo dos direitos políticos); e (d) Ter notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101). 
I.2. ORGANIZAÇÃO. Segundo o seu Regimento interno, o STF é organizado através do plenário, das turmas e do presidente. Cada turma tem 5 ministros, sendo presidida pelo membro mais antigo de cada turma (mandato de 1 ano). 
O Presidente e o Vice são eleitos pelo próprio Tribunal. Daniel Sarmento destaca a existência, sob à égide da Carta de 1988, de salutar convenção constitucional no que diz respeito à referida eleição, vez que a própria constituição não possui qualquer disposição a respeito. A observância dessa convenção não é meramente facultativa, impondo consequências políticas no caso de descumprimento (não há controle jurídico como ocorre no caso de costume constitucional).
II. COMPETÊNCIA – ART. 102 CF. Art. 102. Compete ao STF, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; (Redação EC 3/1993) b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República; c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; (Redação EC 23/1999)  d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal; e) o litígio entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Território; f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta; g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro; h) (Revogado EC 45/2004)  i) o habeas corpus, quando o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única instância; (Redação EC 22/1999)  j) a revisão criminal e a ação rescisória de seus julgados; l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; m) a execução de sentença nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atribuições para a prática de atos processuais; n) a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados; o) os conflitos de competência entre o Superior Tribunal de Justiça e quaisquer tribunais, entre Tribunais Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal; p) o pedido de medida cautelar dasações diretas de inconstitucionalidade; q) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal; r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público; (Incluído pela EC 45/2004)  II - julgar, em recurso ordinário: a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; b) o crime político; III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição. d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. (Incluído pela EC 45/2004).
Em resumo, as competências do STF podem ser divididas, em: “a) originária (art. 102, I, “a” até “r”); b) recursal ordinária (art. 102, II) e c) recursal extraordinária (art. 102, III)”. Em relação as competências, destacam-se as modificações introduzidas pela EC nº 45/2004: 1) A transferência de competência do STF para o STJ no tocante à homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias (art. 102, I, “h”, revogada; 105, I, “i” e art. 9º da EC 45/2004); 2) A criação do requisito da repercussão geral das questões constitucionais para o conhecimento do recurso extraordinário.
Acrescente-se, seguindo a doutrina de Gilmar Mendes e Gonet Branco, o STF exerce competências implícitas, que são decorrentes da interpretação extensiva ou compreensiva do texto constitucional (Ex.: Mandado de segurança contra ato de CPI do Senado, da Câmara ou Mista).
III. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL. Pode ser definida, em síntese, como o poder, de um órgão jurisdicional, em realizar a análise, conformação e concretização das leis e atos normativos à Constituição, é uma “a garantia jurisdicional da Constituição” (KELSEN, 2007, p. 123).
Quando se examina a jurisdição constitucional, destaca-se, primordialmente, o controle de constitucionalidade. O controle pode ser dividido em: a) difuso-concreto, de origem norte-americana, com base no precedente Marbury v. Madison de 1803, no qual o judicial review compete a qualquer magistrado, diante de um caso concreto, com decisão de efeitos ex tunc (retroativos); b) concentrado-abstrato, a partir da formulação de Hans Kelsen, que concebeu uma Corte Constitucional especializada para exercer a função, com poder de invalidar a norma impugnada com efeitos apenas prospectivos (ex nunc); c) sistema misto: ocorre no Brasil, a partir da Emenda Constitucional 16/65, que incorporou o controle concentrado-abstrato ao já existente controle difuso vindo desde Ruy Barbosa, (Constituição/1891). 
Importante examinar as posições procedimentalistas e substancialistas no contexto da jurisdição constitucional. Os procedimentalistas defendem um papel mais modesto e contido para a jurisdição constitucional, sustentando uma postura de autocontenção, salvo quando envolver a defesa dos pressupostos de funcionamento da própria democracia (são defensores da posição John Hart Ely e Jürgen Habermas). Já os substancialistas advogam um papel mais ativo para a jurisdição constitucional, mesmo em casos que não envolvam os pressupostos da democracia.
O neoconstitucionalismo (que envolve uma reaproximação do direito e da moral) e a teoria da constituição dirigente se situam claramente no campo do substancialismo, por conceberem papéis bastantes ambiciosos para as constituições, que vão muito além da garantia dos pressupostos do funcionamento da democracia. A CRFB/1988 tem viés substantivo, consagrando de valores materiais, o que acentua a “dificuldade contramajoritária” quando da atuação do STF, podendo ocorrer reações sociais às decisões judiciais (o denominado efeito backlash e o diálogo institucional), a exemplo do dissenso havido em relação à “vaquejada” (ADI 4.983 vs. EC 96/17).
III.1. ÓRGÃOS DE CONVERGÊNCIA E SUPERPOSIÇÃO. O STF e os Tribunais Superiores (STJ, TST, TSE e STM) são órgãos de convergência, têm sede na Capital Federal e exercem jurisdição sobre todo o território nacional, nos termos do art. 92 § 2º da CRFB/1988. Denominam-se órgãos ou centros de convergência na medida em que, conforme ensina Dinamarco, “cada uma das Justiças Especiais da União (Trabalhista, Eleitoral e Militar), tem por cúpula seu próprio Tribunal Superior, que é o responsável pela última decisão nas causas de competência dessa Justiça, ressalvado o controle de constitucionalidade, que sempre cabe ao Supremo Tribunal Federal.
Quanto às causas processadas na Justiça Federal ou nas locais, em matéria infraconstitucional a convergência conduz ao Superior Tribunal de Justiça, que é um dos Tribunais Superiores da União embora não integre Justiça alguma; em matéria constitucional, convergem diretamente ao STF. Todos os Tribunais Superiores convergem unicamente ao STF, como órgão máximo da Justiça brasileira e responsável final pelo controle de constitucionalidade de leis, atos normativos e decisões judiciárias. 
O STJ e o STF são também denominados de órgãos de superposição, na medida que não pertencem a qualquer Justiça. Isso porque, embora não pertençam a qualquer Justiça, as suas decisões se sobrepõem às decisões proferidas pelos órgãos inferiores das Justiças comum e especial. As decisões do STJ se sobrepõem àquelas da Justiça Federal comum, da Estadual e daquela do Distrito Federal e Territórios, ao passo que as decisões do STF se sobrepõem a todas as Justiças e Tribunais. 
5C. Município: criação, competência, autonomia. Regiões metropolitanas.
Renan Lima
Tácito Coaracy
BREVE HISTÓRICO: De acordo com HELY LOPES MEIRELLES, o município, enquanto unidade político-administrativa, “surgiu com a República Romana, interessada em manter a dominação pacífica das cidades conquistadas pelas forças de seus exércitos. Os vencidos ficavam sujeitos, desde a derrota, às imposições do Senado, mas, em troca de sua sujeição e fiel obediência às leis romanas, a República lhes concedida certas prerrogativas que variavam desde simples direitos privados até o privilégio de eleger seus governantes e dirigir a própria cidade”.
No que se refere ao histórico dos municípios no Brasil, HELY LOPES leciona que, no período da Constituição Imperial de 1824, “as Municipalidades não passaram de uma divisão territorial, sem influência política e sem autonomia na gestão de seus interesses”, em razão da previsão em lei regulamentar que “as Câmaras eram corporações meramente administrativas”. Com o passar dos tempos os municípios foram adquirindo paulatinamente mais funções e mais autonomia. No entanto, somente com a Constituição de 1988 que o município foi consagrado como ente federativo autônomo, integrante da República Federativa do Brasil, com capacidades e competências próprias.
NATUREZA JURÍDICA: Pessoa jurídica de direito público interno. Trata-se de ente federado, dotado de autonomia política, conforme previsão expressa dos artigos 1º e 18 da CRFB/88.
CRIAÇÃO DE MUNICÍPIO: O art. 18, § 4º, da CF prevê os requisitos para criação, incorporação, fusão e o desmembramento de Municípios, quais sejam: i) edição de Lei Complementar Federal estabelecendo o período dentro do qual poderá ocorrer a criação, a incorporação, a fusão ou o desmembramento de município (obs: a EC 57/2008 convalidou os municípios cuja criação, incorporação, fusão ou desmembramento ocorreu até 31/12/2006 sem a observância deste requisito, desde que observadas as regras estabelecidas na legislação do respectivo Estado); ii) divulgação dos estudos de viabilidade, nos termos previstos em lei ordinária federal; iii) consulta prévia às populações dos municípios envolvidos;e iv) edição de lei ordinária estadual, criando o novo município, desde que dentro do período previsto na Lei Complementar Federal.
Precedentes sobre o tema:
1. STF: “Lei Estadual que cria o Município pode ser objeto de ADI. Ainda que não seja em si mesma uma norma jurídica, mas ato com forma de lei, que outorga status municipal a uma comunidade territorial, a criação de Município, pela generalidade dos efeitos que irradia, é um dado inovador, com força prospectiva, do complexo normativo em que se insere a nova entidade política: por isso, a validade da lei criadora, em face da Lei Fundamental, pode ser questionada por ação direta de inconstitucionalidade” (MC na ADI 2.381-RS, rel. Min. Sepulveda Pertence, j. 20/06/2001). 
2. STF: “Seja qual for a modalidade de desmembramento proposta, a validade da lei que o efetive estará subordinada, por força da Constituição, ao plebiscito, vale dizer, à consulta prévia das "populações diretamente interessadas" – conforme a dicção original do art. 18, § 4º – ou "às populações dos Municípios envolvidos" – segundo o teor vigente do dispositivo” (ADI 2.967, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 12-2-2004, P, DJ de 19-3-2004).
3. STF: “Uma vez cumprido o processo de desmembramento de área de certo Município, criando-se nova unidade federativa, descabe, mediante lei estadual, mera revogação do ato normativo que o formalizou. A fusão há de observar novo processo e, portanto, prévia consulta plebiscitária às populações dos entes políticos diretamente envolvidos, por força do art. 18, § 4º, da CF” (ADI 1.881, rel. min. Ricardo Lewandowski, j. 10-5-2007).
4. STF: “Lei que altera limites geográficos do município também tem que se submeter ao plebiscito” (ADI 1262).
5. A Lei Complementar Federal estabelecendo o período dentro do qual poderá ocorrer a criação, a incorporação, a fusão ou o desmembramento de município ainda não foi criada. A EC 57/2008 convalidou os Municípios que foram criados, fundidos, incorporados ou desmembrados mesmo sem a existência de lei complementar federal (requisito 1). Vimos, contudo, que o art. 18, § 4º, da CF/88 exige outros três requisitos. Diante disso, indaga-se: se um Município foi criado sem algum desses outros requisitos, ele também foi convalidado pela EC 57/2008? Ex: um Município foi criado, em 2005, sem plebiscito; a criação deste Município foi convalidada pela EC 57/2008? NÃO. A EC 57/2008 somente dispensou o requisito da Lei Complementar Federal. Os demais requisitos precisam estar presentes. Logo, se um Município foi criado, fundido, incorporado ou desmembrado sem plebiscito, esse ato é inconstitucional e não foi convalidado pela EC 57/2008.
A EC nº 57/08 não convalidou desmembramento municipal realizado sem consulta plebiscitária e, nesse contexto, não retirou o vício de ilegitimidade ativa existente nas execuções fiscais que haviam sido propostas por município ao qual fora acrescida, sem tal consulta, área de outro para a cobrança do IPTU quanto a imóveis nela localizados.
STF. Plenário. RE 614384/SE, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 29/4/2022 (Repercussão Geral – Tema 559) (Info 1052).
6. Pendente a legislação federal prevista na redação atual do art. 18, § 4º, da Constituição Federal, são inadmissíveis os regramentos estaduais que possibilitem o surgimento de novos municípios e que invadam a competência da União para disciplinar o tema.
É inconstitucional lei estadual que permita a criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios sem a edição prévia das leis federais previstas no art. 18, § 4º, da CF/88, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 15/96.
STF. Plenário. ADI 4711/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 3/9/2021 (Info 1028).
AUTONOMIA MUNICIPAL: Autonomia é a capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior. Não se confunde, portanto, com soberania.
Há entendimento minoritário (José Afonso da Silva) sustentando que o município seria ente meramente administrativo, e não federativo, pelos seguintes motivos: (i) a Federação não é de Municípios, mas sim de Estados; (ii) os Municípios não participam da formação da vontade federal, mas apenas os Estados, por meio de seus representantes no Senado Federal; (iii) a intervenção nos municípios fica a cargo do respectivo Estado e não da União; (iv) a criação, incorporação, fusão ou desmembramento de Municípios se dá por lei estadual; (v) os Municípios não mantém Poder Judiciário e dependem de órgãos jurisdicionais estaduais ou federais para aplicação do Direito com força definitiva. Trata-se, no entanto, de posicionamento minoritário, em oposição ao consagrado pelo STF.
Com efeito, o entendimento amplamente majoritário é de que os municípios são entidades que integram a federação e possuem autonomia, pois detém capacidade de auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadministração:
i) AUTO-ORGANIZAÇÃO (art. 29, caput, da CF): Os Municípios se organizam por Lei Orgânica, votada em dois turnos, com interstício mínimo de dez dias, aprovada por no mínimo dois terços dos membros da Câmara Municipal (obs: prevalece que a Lei Orgânica não configura manifestação do Poder Constituinte Derivado Decorrente);
ii) AUTOLEGISLAÇÃO (art. 30 da CF): Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
iii) AUTOGOVERNO (art. 29, incisos I, II, III e IV, da CF): Os Municípios são governados/dirigidos por representantes próprios (Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores), eleitos pelos cidadãos;
iv) AUTOADMINISTRAÇÃO (art. 30, incisos III a IX, da CF): Os Municípios possuem competências administrativas expressas e implícitas, além daquelas decorrentes da sua competência para legislar sobre assuntos de interesse local.
Além disso, os Municípios também podem instituir tributos (art. 156 da CF), o que demonstra que, além da autonomia política, normativa e administrativa, a CF ainda atribuiu autonomia financeira a tais entes. Diante desse quadro, MARCELO NOVELINO afirma que “não há no direito comparado grau de autonomia equivalente ao conferido pela Constituição de 1988 aos municípios brasileiros”. E conclui que: “No Brasil, os Municípios possuem âmbitos exclusivos de competências políticas (legislativas e de governo), razão pela qual não há como negar-lhes a condição de verdadeiros entes federativos”. Na mesma linha, HELY LOPES MEIRELLES leciona que: “Em face dessas atribuições, já não se pode sustentar – como sustentavam alguns publicistas – ser o Município entidade meramente administrativa. Diante de atribuições tão eminentemente políticas e de um largo poder de autogoverno, sua posição atual no seio da Federação é de entidade político-administrativa de terceiro grau”.
STF: “A CF conferiu ênfase à autonomia municipal ao mencionar os Municípios como integrantes do sistema federativo (art. 1º da CF/1988) e ao fixá-la junto com os Estados e o Distrito Federal (art. 18 da CF/1988). A essência da autonomia municipal contém primordialmente (i) autoadministração, que implica capacidade decisória quanto aos interesses locais, sem delegação ou aprovação hierárquica; e (ii) autogoverno, que determina a eleição do chefe do Poder Executivo e dos representantes no Legislativo. O interesse comum e a compulsoriedade da integração metropolitana não são incompatíveis com a autonomia municipal. O mencionado interesse comum não é comum apenas aos Municípios envolvidos, mas ao Estado e aos Municípios do agrupamento urbano” (ADI 1.842, rel. min. Gilmar Mendes, j. 6-3-2013, P, DJE de 16-9-2013).
STF: “O poder constituinte dos Estados-membros está limitado pelos princípios da Constituição da República, que lhes assegura autonomia com condicionantes, entre as quais se tem o respeito à organização autônoma dos Municípios, também assegurada constitucionalmente. O art. 30, I, da Constituição da República outorga aos Municípios a atribuição de legislar sobre assuntos de interesse local. A vocação sucessória dos cargos de prefeito e vice-prefeito põe-se no âmbito da autonomiapolítica local, em caso de dupla vacância. Ao disciplinar matéria, cuja competência é exclusiva dos Municípios, o art. 75, § 2º, da Constituição de Goiás fere a autonomia desses entes, mitigando-lhes a capacidade de auto-organização e de autogoverno e limitando a sua autonomia política assegurada pela Constituição brasileira” (ADI 3.549, rel. min. Cármen Lúcia, j. 17-9-2007, P, DJ de 31-10-2007).
STF: “Viola a autonomia dos Municípios (art. 29, IV, da CF/1988) lei estadual que fixa número de vereadores ou a forma como essa fixação deve ser feita” (ADI 692, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 2-8-2004, P, DJ de 1º-10-2004).
Vale ressaltar, ademais, que a autonomia municipal configura princípio constitucional sensível, nos termos do art. 34, inciso VII, alínea “c”, da CF. Assim, caso não seja observada a autonomia municipal pelo Estado, caberá intervenção federal.
COMPETÊNCIA: O Município dispõe de duas hipóteses de competência legislativa: i) o art. 30, inciso I, da CF, prevê que compete ao município legislar sobre assuntos de interesse local; ii) o art. 30, inciso, da CF estabelece que compete ao Município “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”.
Além disso, a competência administrativa (“material”) dos Municípios divide-se em: i) competência comum, cujas hipóteses estão previstas no art. 23 da CF; e ii) competência exclusiva, cujas hipóteses estão previstas no art. 30, incisos III a IX, da CF.
STF: Súmula Vinculante 49 – “Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área”.
STF: Súmula Vinculante 38 – “É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial”.
STF: Súmula 419 – “Os municípios têm competência para regular o horário do comércio local, desde que não infrinjam leis estaduais ou federais válidas”.
STF: Repercussão Geral – “O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI, c/c 30, I e II, da CRFB)” [RE 586.224, rel. min. Luiz Fux, j. 5-3-2015, P Tema 145].
STF: Repercussão Geral – “É inconstitucional norma municipal que impõe sanção mais gravosa que a prevista no CTB, por extrapolar a competência legislativa suplementar do Município expressa no art. 30, II, da CF”. Neste sentido: ARE 638.574/ MG, rel. min. Gilmar Mendes, DJE de 14-4-2011. Esta Corte possui ainda jurisprudência firmada no sentido de que compete privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte, impossibilitados os Estados-membros e Municípios a legislar sobre a matéria enquanto não autorizados por lei complementar [ARE 639.496 RG, voto do rel. min. Cezar Peluso, j. 16-6-2011, P, DJE de 31-8-2011, Tema 430].
STF: Repercussão Geral – “Definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições bancárias. Competência do Município para legislar. Assunto de interesse local. Ratificação da jurisprudência firmada por esta Suprema Corte” [RE 610.221 RG, rel. min. Ellen Gracie, j. 29-4-2010, P, DJE de 20-8-2010, Tema 272].
STF: “Os Municípios podem legislar sobre direito ambiental, desde que o façam fundamentadamente. (...) A Turma afirmou que os Municípios podem adotar legislação ambiental mais restritiva em relação aos Estados-membros e à União. No entanto, é necessário que a norma tenha a devida motivação” (ARE 748.206 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 14-3-2017, 2ª T, Informativo 857).
STF: O município tem competência para editar normas suplementares relativas à segurança dos estabelecimentos bancários, como a instalação de sistema de monitoração e gravação eletrônica de imagens nos terminais de autoatendimento, nos termos dos artigos 30, I e II, e 182 da CF (ARE 784.981 AgR, rel. min. Rosa Weber, j. 17-3-2015, 1ª T, DJE de 7-4-2015).
STF: “O Município pode editar legislação própria, com fundamento na autonomia constitucional que lhe é inerente (CF, art. 30, I), com o objetivo de determinar, às instituições financeiras, que instalem, em suas agências, em favor dos usuários dos serviços bancários (clientes ou não), equipamentos destinados a proporcionar-lhes segurança (tais como portas eletrônicas e câmaras filmadoras) ou a propiciar-lhes conforto, mediante oferecimento de instalações sanitárias, ou fornecimento de cadeiras de espera, ou, ainda, colocação de bebedouros” (AI 347.717 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 31-5-2005, 2ª T, DJ de 5-8-2005).
STF: “Os Municípios são competentes para legislar sobre questões que respeitem a edificações ou construções realizadas no seu território, assim como sobre assuntos relacionados à exigência de equipamentos de segurança, em imóveis destinados a atendimento ao público” (AI 491.420 AgR, rel. min. Cezar Peluso, j. 21-2-2006, 1ª T, DJ de 24-3-2006).
STF: “A imposição legal de um limite ao tempo de espera em fila dos usuários dos serviços prestados pelos cartórios não constitui matéria relativa à disciplina dos registros públicos, mas assunto de interesse local, cuja competência legislativa a Constituição atribui aos Municípios” (RE 397.094, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 29-8-2006, 1ª T, DJ de 27-10-2006).
STF: É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que os serviços públicos de saneamento e de abastecimento de água serão prestados por pessoas jurídicas de direito público ou por sociedade de economia mista sob controle acionário e administrativo, do Poder Público Estadual ou Municipal. Compete aos Municípios a titularidade dos serviços públicos de saneamento básico. Assim, a eles cabe escolher a forma da prestação desses serviços, se diretamente ou por delegação à iniciativa privada mediante prévia licitação. Isso é garantido pelo art. 30, I e V, da CF/88. Além disso, essa previsão da Constituição Estadual também viola o art. 175 da Constituição Federal, que atribui ao poder público a escolha da prestação de serviços públicos de forma direta ou sob regime de concessão ou permissão mediante prévia licitação. STF. Plenário. ADI 4454, Rel. Cármen Lúcia, julgado em 05/08/2020 (Info 988 – clipping).
STF: É inconstitucional — por tratar de matéria que diz respeito a norma de direito econômico e contrariar a disciplina conferida a benefício já previsto no art. 23 da Lei federal nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) — lei municipal que institui o acesso gratuito de idosos às salas de cinema da cidade, de segunda a sexta-feira. STF. 2ª Turma. ARE 1307028/SP, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Ministro Gilmar Mendes, julgado em 22/11/2022 (Info 1077).
STF: É constitucional – formal e materialmente – lei municipal que obriga à substituição de sacos e sacolas plásticos por sacos e sacolas biodegradáveis. Os municípios — no limite de seu interesse local e desde que em harmonia com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados — possuem competência para legislar sobre meio ambiente, e, caso sua regulamentação seja mais protetiva, pode ter prevalência sobre a legislação federal ou estadual. STF. Plenário. RE 732686/SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 19/10/2022 (Repercussão Geral – Tema 970) (Info 1073).
STF: É inconstitucional, por violação à competência legislativa privativa da União, lei municipal que versa sobre a instalação de estação rádio base (ERB) e dá ensejo à atividade fiscalizatória do município, quanto ao uso e a ocupação do solo urbano em seu território. Tese fixada pelo STF: “É inconstitucional a Lei nº 13.756/2004 do município de São Paulo, por configurar invasão à competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações e radiodifusão (CF/1988, art. 22, IV)”. STF. Plenário. ARE 1370232/SP, Rel. Min. Luiz Fux, j. 8/9/2022 (Repercussão Geral – Tema 1235) (Info 1067).
STF: É inconstitucional lei municipal que:
a) institui direitos e obrigações das rádios comunitárias;
b) autoriza seu funcionamento e exploração no âmbito de seu território; e
c) estabelece infrações, sanções e o pagamento de taxade funcionamento.
Essa lei apresenta vício de inconstitucionalidade formal porque trata de matéria de competência reservada à União. STF. Plenário. ADPF 335/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27/8/2021 (Info 1027).
STF: É inconstitucional lei municipal que estabeleça limitações à instalação de sistemas transmissores de telecomunicações por afronta à competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações, nos termos dos arts. 21, XI, e 22, IV, da Constituição Federal. STF. Plenário. ADPF 732/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).
STF: É formalmente inconstitucional lei municipal que autoriza o Poder Executivo Municipal a conceder a exploração do Serviço de Radiodifusão Comunitária no âmbito do território do Município. O art. 21, XII, “a”, da CF/88 estabelece que a competência para conceder autorização para tais serviços é da União. Além disso, o art. 22, IV da CF/88 confere à União a competência privativa para legislar sobre o tema “radiodifusão”. STF. Plenário. ADPF 235/TO, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 14/8/2019 (Info 947).
STF: A proibição ou restrição da atividade de transporte privado individual por motorista cadastrado em aplicativo é inconstitucional, por violação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. STF. Plenário. ADPF 449/DF, Rel. Min. Luiz Fux; RE 1054110/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 8 e 9/5/2019 (repercussão geral) (Info 939).
STF: São inconstitucionais as leis que obrigam supermercados ou similares à prestação de serviços de acondicionamento ou embalagem das compras, por violação ao princípio da livre iniciativa (art. 1º, IV e art. 170 da CF/88). STF. Plenário. ADI 907/RJ, Rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 1º/8/2017 (Info 871). STF. Plenário. RE 839950/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 24/10/2018 (repercussão geral) (Info 921).
INICIATIVA POPULAR DE LEIS EM ÂMBITO MUNICIPAL: Nos termos do art. 29, inciso XIII, da CF, a iniciativa popular de projetos de lei de interesse específico do Município, da cidade ou de bairros, depende da manifestação de, pelo menos, 5% (cinco por cento) do eleitorado.
REGIÕES METROPOLITANAS: As regiões metropolitanas são zonas com forte urbanização constituídas por um conjunto de cidades que, com o passar do tempo e a expansão de seus territórios, foram aproximando seus limites geográficos, num processo denominado de conurbação, que faz com que se forme uma imensa aglomeração na qual as cidades vão perdendo seus limites físicos entre si.
A Lei nº 13.089/2015 (Estatuto da Metrópole) prevê, em seu art. 2º, inciso VII, o seguinte conceito de região metropolitana: unidade regional instituída pelos Estados, mediante lei complementar, constituída por agrupamento de Municípios limítrofes para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. 
Até a promulgação da CF/1988, a competência para instituir regiões metropolitanas era exclusiva da União, mediante da edição de Lei Complementar Federal (LCF). Com fundamento nessa competência, a União editou a LC Federal n.º 14/1973, instituindo as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza. Todavia, a partir promulgação da Constituição de 1988, a instituição de regiões metropolitanas passou a depender de Lei Complementar Estadual (LCE), nos termos do art. 25, §3º, da CRFB/88 e, recentemente, do art. 3º do Estatuto da Metrópole.
As regiões metropolitanas não constituem novo ente federativo, sendo apenas um instrumento de integração para organização, planejamento e execução de funções e serviços de interesse comum.
A criação de uma região metropolitana, de aglomeração urbana ou de microrregião deve ser precedida de estudos técnicos e audiências públicas que envolvam todos os Municípios pertencentes à unidade territorial (art. 3º, §2º, do Estatuto da Metrópole). Além disso, a instituição de região metropolitana ou de aglomeração urbana que envolva Municípios pertencentes a mais de um Estado será formalizada mediante a aprovação de leis complementares pelas assembleias legislativas de cada um dos Estados envolvidos (art. 4º do Estatuto da Metrópole).
O Estado e os Municípios inclusos em região metropolitana ou em aglomeração urbana formalizada e delimitada na forma do art. 3º do Estatuto da Metrópole deverão promover a governança interfederativa, que consiste no compartilhamento de responsabilidades e ações entre entes da Federação em termos de organização, planejamento e execução de funções públicas de interesse comum.
Ademais, a CF/1988, a par das regiões metropolitanas, previu a possibilidade de criação de aglomerações urbanas e de microrregiões, acrescendo o requisito de os municípios serem limítrofes.
Deve-se atentar para outros conceitos previstos na Lei nº 13.089/2015, de modo a não confundi-los: i) Metrópole - espaço urbano com continuidade territorial que, em razão de sua população e relevância política e socioeconômica, tem influência nacional ou sobre uma região que configure, no mínimo, a área de influência de uma capital regional, conforme os critérios adotados pelo IBGE; e ii) área metropolitana: representação da expansão contínua da malha urbana da metrópole, conurbada pela integração dos sistemas viários, abrangendo, especialmente, áreas habitacionais, de serviços e industriais com a presença de deslocamentos pendulares no território.
OBS.: As regiões metropolitanas, criadas por LCE, não se confundem com as regiões administrativas previstas no art. 43 da CF/1988, criadas por LCF, a exemplo da SUDAM, SUDENE, SUDECO e SUFRAMA, cujo escopo é o fomento ao desenvolvimento dessas regiões e a redução das desigualdades regionais, compreendendo, cada uma, um mesmo complexo geográfico e social.
STF: ADI 2809/RS. A LCE não é de iniciativa exclusiva do Governador do Estado (art. 61, §1º, II “e” da CF/1988), sendo constitucional a LCE cuja iniciativa foi deflagrada pela Assembleia Legislativa.
STF: ADI 1841/RJ. Objeto: Art. 357, parágrafo único da CE/RJ: “a participação de qualquer município em uma região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião dependerá de prévia aprovação pela respectiva Câmara Municipal”. CONCLUSÃO DO STF: É inconstitucional a previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 (LCE e Municípios limítrofes) para a instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia aprovação pela Câmara Municipal interessada.
STF: ADI 796/ES. É inconstitucional a previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 para a instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia consulta plebiscitária às populações interessadas.
STF: É inconstitucional norma que prevê a concentração excessiva do poder decisório nas mãos de só um dos entes públicos integrantes de região metropolitana. Nesse mesmo contexto, é inadmissível que a gestão e a percepção dos frutos da empreitada metropolitana comum, incluídos os valores referentes a eventual concessão à iniciativa privada, aproveitem a apenas um dos entes federados. STF. Plenário. ADI 6573/AL, ADI 6911/AL e ADPF 863/AL, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 13/5/2022 (Info 1055).
STF: Não é possível exigir que Estados-membros e Municípios se vinculem a autorizações e decisões de órgãos federais para tomar atitudes de combate à pandemia. Os Estados/DF e Municípios podem, mesmo sem autorização da União, adotar medidas como isolamento, quarentena, exumação, necropsia, cremação e manejo de cadáver e restrição à locomoção interestadual e intermunicipal em rodovias, portos ou aeroportos. Vale ressaltar que Estados e Municípios não podem fechar fronteiras, pois sairiam de suas competências constitucionais. A adoção de medidas restritivas relativas à locomoção e ao transporte, por qualquer dos entes federativos, deve estar embasada em recomendação técnica fundamentada de órgãos da vigilância sanitária e tem de preservar o transporte de produtos e serviços essenciais, assim definidos nos decretos da autoridadefederativa competente. STF. Plenário. ADI 6343 MC-Ref/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 6/5/2020 (Info 976).
6A. Poder constituinte derivado. Limitações à reforma constitucional. Cláusulas pétreas expressas e implícitas. As mutações constitucionais.
Jorge Neto
Conceito: O Poder Constituinte Derivado ou Constituído logra existência a partir do poder Poder Constituinte Originário, seu instituidor, de onde retira a sua força motriz. Logo, se insere na Constituição, possui limitações expressas e tácitas, e define-se como um poder jurídico, que tem por finalidade a reforma da obra constitucional e também para que os Entes federativos elaborem suas próprias Constituições. 
Características:
a. Derivado: Emana da própria Constituição, ou seja, deriva do poder constituinte. 
b. Limitado: A Constituição lhe impõe severas limitações, que podem ser temporais, circunstanciais, materiais ou procedimentais, explícitas ou implícitas, restringindo seu exercício. 
c. Condicionado: Somente pode se manifestar-se de acordo com as formalidades traçadas pela Constituição. Tem um procedimento delimitado estabelecido no próprio poder constituinte.
Poder Constituinte Reformador:
Emenda à Constituição (Art. 60 da CF). O PCDR, diferente do PCO, não é juridicamente ilimitado. Desse modo, existem limites às emendas, os quais podem ser de vários tipos:
1. Limites procedimentais ou formais:
A) Iniciativa restrita (art. 60, I a III, da CF): só podem apresentar a PEC alguns legitimados específicos: (a) um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; (b) Presidente da República; e (c) mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
Sobre a possibilidade de uma PEC de iniciativa popular, existem dois posicionamentos:
a) desfavorável: de acordo com o texto constitucional, não há previsão para a iniciativa popular de PEC;
b) favorável: em termos teóricos, JOSÉ AFONSO DA SILVA defende que, se o povo é titular do poder (art. 1º, p.ú., da CF), é possível uma interpretação ampliativa para entender que a iniciativa popular não abrange só leis, mas também a PEC;
B) Quórum de aprovação (art. 60, § 2º, da CF): necessita-se de 3/5 dos votos;
C) Trâmite (art. 60, § 2º, da CF): dois turnos de votação em cada Casa;
D) Promulgação (art. 60, § 3º, da CF): uma vez aprovada a PEC, esta é promulgada pelas Mesas das Casas. Não é a Mesa do Congresso Nacional, e sim das duas Casas. Não há sanção presidencial;
E) Princípio da irrepetibilidade (art. 60, § 5º, da CF): matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou prejudicada não pode ser objeto de nova PEC na mesma sessão legislativa – 02 de fevereiro a 22 de dezembro (art. 57 da CF). Obs.: alguns autores classificam esse limite como temporal;
2. Limites temporais: não há em relação às emendas;
3. Limites circunstanciais (art. 60, § 1º, da CF): não pode haver emenda em (a) estado de defesa; (b) estado de sítio; e (c) intervenção federal.
4. Limites materiais ou cláusulas pétreas: podem ser:
I. Explícitos (art. 60, § 4º, da CF): não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (a) a forma federativa de Estado; (b) o voto direto, secreto, universal e periódico; (c) a separação dos Poderes; e (d) os direitos e garantias individuais.
A expressão “tendente a abolir” significa, por óbvio, que uma emenda à Constituição não pode abolir uma cláusula pétrea. Porém, uma emenda à Constituição pode restringir um instituto protegido como cláusula pétrea, desde que não seja violado o seu núcleo essencial.
Núcleo essencial, apesar de difícil definição, pode ser conceituado como o conjunto das características sem as quais um instituto deixaria de existir.
Como se nota do inc. IV do § 4º, os direitos e garantias individuais são cláusulas pétreas, não havendo menção aos direitos sociais. Dessa feita, há divergência sobre a imutabilidade dos direitos sociais:
1ª corrente: entende que as normas disciplinadoras de direitos sociais não são cláusulas pétreas, por dois motivos: (a) não estão previstos expressamente no rol de cláusulas pétreas e (b) por serem direitos a prestação, estão na dependência de condições variadas no tempo dos recursos disponíveis, não podendo ser afirmados como imodificáveis;
2ª corrente: defende que as normas estabelecedoras de direitos sociais também são cláusulas pétreas, uma vez que são instrumentos para a implementação da dignidade da pessoa humana e dos demais fundamentos da República. Desse modo, os direitos fundamentais sociais da essência da concepção de Estado acolhida pela CF, devendo ser considerados cláusulas pétreas.
Há parte da doutrina que entende que uma emenda constitucional NÃO pode ampliar o rol de cláusulas pétreas, uma vez que o Poder Reformador recebe a sua autoridade do constituinte originário. Logo, o Poder Reformador só pode ser limitado pelo constituinte originário, de maneira que o Poder Reformador de hoje não pode inserir novos limites ao Poder Reformador de amanhã.
Por outro lado, o Poder Reformador pode inserir novo instituto que é abrangido por uma das hipóteses de cláusula pétrea existente. Ex.: Poder Reformador inserir no texto constitucional novo direito individual.
Quanto à questão sobre esse novo direito individual, inserido por emenda à Constituição, ser protegido como cláusula pétrea, existem duas posições:
a) favorável: o novo direito vira cláusula pétrea, em razão de dois motivos:
1. Quando o constituinte originário colocou no rol de cláusulas pétreas os direitos e garantias individuais, ele não diferenciou se esses direitos seriam somente os originários, ou se também poderiam ser direitos inseridos por emenda;
2. Princípio da vedação do retrocesso (evolução reacionária ou efeito cliquet), segundo o qual, se direitos fundamentais alcançaram um determinado nível de conquistas, não se poderia abolir tais conquistas porque isso implicaria um retorno a uma situação pior;
b) desfavorável: o novo direito não vira cláusula pétrea, uma vez que isso seria a imposição de novos limites ao Poder Reformador os quais não foram previstos pelo constituinte originário;
II. Implícitos:
1. Titularidade do poder: a titularidade do poder pelo povo não pode ser alterada;
2. Vedação à dupla reforma ou dupla revisão: dupla reforma é a alteração de um limite ao Poder Reformador para permitir posterior modificação daquilo que outrora era vedado. Dessa forma, pode-se dizer que os limites explícitos ao poder de reforma – limites procedimentais, circunstanciais e materiais explícitos – são, eles próprios, limites implícitos ao Poder Reformador, porque eles próprios não podem ser abolidos;
3. República: a matéria é controvertida, mas existem dois argumentos favoráveis à tese de que a República é uma cláusula pétrea implícita: a) a República é fruto de uma escolha popular direta, logo, não poderiam os representantes do povo modificar a forma de governo. Contudo, é possível que o próprio povo decida pelo fim da República em um novo plebiscito; b) o art. 60, § 4º, II, da CF traz que é cláusula pétrea o voto periódico, e a periodicidade do exercício do poder é um elemento essencial da República, afinal, o monarca não exerce mandato eletivo.
Revisão Constitucional (Art. 3º do ADCT). Diferentemente da emenda à Constituição, a qual deve ser utilizada quando se pretende operar mudanças específicas, pontuais, a revisão constitucional se presta a alterações de caráter mais geral na Constituição. Os limites da revisão constitucional são diferentes dos das emendas à Constituição:
1. Limites procedimentais ou formais:
a) Quórum de aprovação: necessita-se de maioria absoluta;
b) Trâmite: sessão unicameral;
2. Limites temporais: só pode ser feita após 5 anos da promulgação da CF. Para o STF, somente cabe uma única revisão constitucional, sendo aquela realizada 5 anos após a promulgação da CF, estando sujeita às cláusulas pétreas.
Poder Constituinte Decorrente: Decorre também do Poder Constituinte Originárioe sintetiza na possibilidade de os entes federativos elaborarem suas próprias Constituições. 
II. As Mutações Constitucionais
Poder Constituinte Difuso é o poder para promover a mutação constitucional, isto é, um processo informal da alteração da Constituição. Na mutação constitucional há alteração do sentido do texto, mas não do texto. Ou seja, o texto escrito permanece hígido; o sentido dado ao texto não. Diferentemente do PCDR, o PCD não é exercido com exclusividade por um órgão. Essa mutação constitucional decorre das próprias transformações sociais e da própria evolução do direito. Também é chamada vicissitude constitucional tácita, mudança constitucional silenciosa ou transições constitucionais. A mutação constitucional pode se manifestar das seguintes formas:
1. Grupos de pressão: grupos sociais que pressionam o poder público e a sociedade para admitir determinado valor ou mudar determinada concepção;
2. Práticas consolidadas: conduta reiterada ao longo de um grande lapso de tempo;
3. Construção doutrinária: ex.: doutrina brasileira do habeas corpus (1891 a 1934), a qual sustentava que o habeas corpus poderia ser usado para a proteção de qualquer liberdade, e não somente à liberdade de locomoção. Com a criação do mandado de segurança, essa doutrina se tornou superada.
Existe a figura da mutação constitucional inconstitucional, a qual consiste em atribuir a uma norma constitucional uma nova interpretação que seja contrária aos valores consagrados pela Constituição. É chamada por Canotilho de mutação constitucional exogenética. Para evitar que a mutação constitucional seja inconstitucional, a mutação constitucional tem limites:
1. Próprio texto: não se pode atribuir ao texto um sentido que seja contrário às suas possibilidades semânticas;
2. Sistema de valores constitucionais: a interpretação não pode levar a um resultado contrário aos valores defendidos pela Constituição. Exemplos próprios de violações são as práticas políticas consolidadas e as omissões do poder público em efetivar a Constituição (o que gera uma interpretação de inefetividade da Constituição.
6B. Federalismo. Concepções e características. Classificações. Sistemas de repartição de competência. Direito comparado.
Atualizado por Igor Lima Goettenauer de Oliveira
Guilherme Mitidiero
I. Noções Gerais
No Brasil, a federação surge provisoriamente por meio do Decreto n. 1, de 15.11.1889, juntamente com a forma republicana de governo, tomando assento constitucional na Carta de 1891. As Constituições posteriores mantiveram a forma federativa de Estado. Entretanto, o federalismo nas Constituições de 1937, de 1967 e na Emenda n. 1/69 foi apenas nominal (“federalismo de fachada”).
No Federalismo clássico, ou dual, a repartição do poder é rigidamente dividida entre a União (Poder Central) e os Estados (Poder Regional). O federalismo brasileiro atual é tricotômico, pois engloba a União (Poder Central), os Estados (Poder Regional), o Distrito Federal (DF) e os Municípios (Poder local). Os territórios não são entidades federais, mas meras autarquias territoriais integrantes da União. Entretanto, Municípios não possuem constituições locais, mas leis orgânicas.
Segundo José Afonso da Silva, para que haja autonomia federativa, são necessários os seguintes elementos: 1. órgãos próprios de cada entidade (união, estados e municípios); e 2. posse de competências exclusivas de cada entidade.
União. A União, pessoa jurídica de direito público, possui uma visão interna, relativa aos demais estados federados, e uma visão externa, em face dos demais Estados estrangeiros. Internamente, age a União em pé de igualdade com os outros entes da Federação, sendo detentora de deveres e obrigações. No âmbito externo, ela representa todo o Estado Federado na figura da República Federativa do Brasil, como se fosse ele unitário, já que o direito internacional não reconhece a personalidade jurídica dos estados-membros e municípios, naquele âmbito. Neste sentido, vide art. 29 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. 
Estados federados. São coletividades regionais autônomas, sem soberania, porém com autonomia. Entre os Estados e a União não há hierarquia, convivendo todos num mesmo nível jurídico. A autonomia define-se como condição “de gerir os negócios próprios dentro dos limites fixados por poder superior”, caracterizando-se pela capacidade de autogoverno, auto-organização, autolegislação, autoadministração e autonomias tributária, financeira e orçamentária.
Municípios. A CF/88, inovadoramente, considerou os municípios como componentes da estrutura federativa, e o fez em dois momentos (arts. 1º e 18). Anteriormente eram componentes dos Estados, que decidiam a sua organização. Saliente-se que José Afonso da Silva defende que os municípios não passaram a ser entidades federativas. Apenas teriam ganhado autonomia político-constitucional (entre outros argumentos, porque não há intervenção federal nos municípios, tampouco Poder Judiciário próprio). Paulo Branco enumera quatro motivos para os municípios não integrarem o Estado Federal: a) não participam da vontade federal, visto que não têm representantes no Senado; b) não mantêm um Poder Judiciário, como ocorre com os estados –membros e União; c) a intervenção nos municípios situados em estado-membro está a cargo deste; d) a competência originária do STF para resolver conflitos entre entes federativos não abrange os casos em que os municípios estão em um dos polos da lide. Grande parte da doutrina, acompanhada da jurisprudência, no entanto, sustenta os municípios são entes federativos (federalismo de 3º grau). Possuem os municípios, autonomia política, administrativa e financeira, sendo detentores das capacidades acima delineadas para os Estados, guardadas as peculiaridades, mas não exercem o poder constituinte derivado decorrente.
Distrito Federal. Antes considerado uma autarquia territorial, foi erigido pela CF/88 à condição de pessoa política, integrante da federação. Sua autonomia está consagrada no art. 32 da CF, que lhe confere as capacidades de auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadministração, embora sofram limitações em questões essenciais. Ex.: compete à União “organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios” (art. 21, XIII). Obs.: desde 2012, não inclui mais a Defensoria Pública do Distrito Federal, mas só dos Territórios, pois a União nunca a criava. Além disso, também compete à União “organizar e manter a polícia civil, a polícia penal, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal” (art. 21, XIV); essa competência já foi reafirmada pelo STF na ADI 6611. A competência legislativa do DF compreende as que são atribuídas aos Estados e Municípios, o Poder Legislativo é exercido pela Câmara Legislativa (no regime anterior o era pelo Senado Federal), o Poder Executivo pelo Governador e o Poder Judiciário – assim como o Ministério Público – na verdade não é dele, mas da União. 
Territórios. São pessoas jurídicas de direito público interno com capacidade administrativa e de nível constitucional, ligadas à União e tendo nela a fonte de seu regime jurídico infraconstitucional. Não são pessoas políticas (não legislam), possuindo mera capacidade administrativa (natureza jurídica de meras autarquias ou descentralizações administrativo-territoriais). Não integram a federação. Compete ao Congresso Nacional disciplinar sua atividade e organização administrativa e judicial, e é o governador escolhido pelo Presidente da República. Conforme Novelino, “a criação de territórios, disciplinada pela LC n. 20/74 e recepcionada parcialmente pela CF/88, poderá ocorrer em duas hipóteses. A primeira pelo desmembramento de parte de Estado-membro já existente, no interesse da segurança nacional. A segunda quando a União nela executar plano de desenvolvimento econômico ou social, com recursos superiores, pelo menos, a um terço do orçamento de capital do Estado atingido pela medida. A criação de território federal a partir do desmembramentode um Estado necessita de aprovação da população interessada, mediante a realização de plebiscito (CF, art. 18, §3º). A CF/88 transformou os territórios existentes em Estados, à exceção de Fernando de Noronha, que foi reincorporado a Pernambuco (ADCT, artigos 14 e 15)”.
II. Concepções e características 
O Estado Federal expressa um modo de ser do Estado (daí se dizer que é uma forma de Estado) em que se divisa uma organização descentralizada, tanto administrativa quanto politicamente, erigida sobre uma repartição de competências entre o governo central e os locais, consagrada na CF, em que os Estados federados participam das deliberações da União, sem dispor do direito de secessão. No Estado Federal, de regra, há uma Suprema Corte, com jurisdição nacional (lembrete: STF e STJ, além de órgãos de convergência por terem competência nacional, são também órgãos de superposição por não pertenceram a qualquer Justiça) e é previsto um mecanismo de intervenção federal, como procedimento assecuratório da unidade física e da identidade jurídica da Federação.
A soberania é atributo do Estado Federal como um todo representado pela República Federativa do Brasil. Os Estados-membros dispõem de autonomia, que importa, necessariamente, a descentralização administrativa e política. Eles não apenas podem, por suas próprias autoridades, executar leis, como também lhes é reconhecido elaborá-las. Disso resulta na percepção de que no Estado Federal clássico há uma dúplice esfera de poder normativo – a da União e a do Estado-membro - sobre um mesmo território e sobre as pessoas que nele se encontram. No Brasil, temos uma tríplice esfera normativa, já que os municípios também podem legislar sobre assuntos de interesse local (ex.: competência dos municípios para legislar, fundamentadamente, sobre direito ambiental, conforme decidido pelo STF no ARE 748206 AgR/SC, DJ 14.03.17 – Info 857). A autonomia política dos Estados membros abrange também a capacidade de se dotar de uma Constituição própria (lembrete: Poder Constituinte Derivado Decorrente, o qual não detém o município), sujeita embora a certas diretrizes impostas pela CF.
O federalismo é uma sociedade de Estados autônomos com aspectos unitários porque é, enquanto Estado Federal, uma unidade territorial, unidade de representação e unidade nacional. Outra característica do federalismo é a de que os Estados-membros tenham voz ativa na formação da vontade da União – vontade que se expressa sobretudo por meio das leis. Para esse fim, historicamente foi concebido o Senado Federal, com representação paritária, em homenagem ao princípio da igualdade jurídica dos Estados-membros. Esses Estados participam da formação da vontade federal, na mesma linha, quando são admitidos a apresentar emendas à CF. Na medida em que os Estados- membros não são soberanos, é comum impedir que se desliguem da União, no que o Estado federal se distingue da confederação, em que se preserva o direito a secessão. Como regra inexiste, portanto, no federalismo, o direito de secessão. Os conflitos que venham a existir entre os Estados-membros ou entre qualquer deles com a União, assumindo feição judiciária, são levados ao deslinde de uma corte nacional. Falhando a solução judiciária ou não sendo o conflito de ordem jurídica meramente, o Estado dispõe do instituto da intervenção federal, para se autopreservar da desagregação, bem como para proteger a autoridade da CF.
Nesse sentido da autonomia dos entes subnacionais, importa verificar alguns julgados do STF. Embora a Lei de Execução Fiscal preveja a impossibilidade de concurso de credores, instituía um concurso de preferência à União em detrimento dos demais entes federados, assim como dos Estados em detrimento dos Municípios. No âmbito da ADPF 357, decidiu-se o seguinte:
ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 187 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 29 DA LEI N. 6.830/1980. CONCURSO DE PREFERÊNCIA ENTRE OS ENTES FEDERADOS NA COBRANÇA JUDICIAL DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS E NÃO TRIBUTÁRIOS. INCOMPATIBILIDADE DAS NORMAS IMPUGNADAS COM A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. AFRONTA AO INC. III DO ART. 19 DA CONSTITUIÇÃO. ARGUIÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 
1. A arguição de descumprimento de preceito fundamental viabiliza a análise de constitucionalidade de normas legais pré-constitucionais insuscetíveis de conhecimento em ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes. 
2. A autonomia dos entes federados e a isonomia que deve prevalecer entre eles, respeitadas as competências estabelecidas pela Constituição, é fundamento da Federação. O federalismo de cooperação e de equilíbrio posto na Constituição da República de 1988 não legitima distinções entre os entes federados por norma infraconstitucional. 
3. A definição de hierarquia na cobrança judicial dos créditos da dívida pública da União aos Estados e Distrito Federal e esses aos Municípios descumpre o princípio federativo e contraria o inc. III do art. 19 da Constituição da República de 1988. 
4. Cancelamento da Súmula n. 563 deste Supremo Tribunal editada com base na Emenda Constitucional n. 1/69 à Carta de 1967. 5. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente para declarar não recepcionadas pela Constituição da República de 1988 as normas previstas no parágrafo único do art. 187 da Lei n. 5.172/1966 (Código Tributário Nacional) e no parágrafo único do art. 29 da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais).
(ADPF 357, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 24/06/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-200 DIVULG 06-10-2021 PUBLIC 07-10-2021)
Não há menção a “separação vertical de poderes” no acórdão.
Apesar do precedente acima citado, em decorrência de ele se limitar expressamente a questão da Execução Fiscal, permanecem inteiramente válidas as disposição da lei geral de desapropriação ao afirmar que os “bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão ser desapropriados pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização legislativa”, assim como “é vedada a desapropriação, pelos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios de ações, cotas e direitos representativos do capital de instituições e empresas cujo funcionamento dependa de autorização do Governo Federal e se subordine à sua fiscalização, salvo mediante prévia autorização, por decreto do Presidente da República”.
A Constitucionalidade de tais disposições já foi reafirmada algumas vezes pelo STF, situação em que relativizou o princípio da isonomia entre os diversos entes federados, afirmando expressamente que “deve prevalecer o ato da pessoa jurídica de mais alta categoria, segundo o interesse de que cuida: o interesse nacional, representado pela União, prevalece sobre o regional, interpretado pelo Estado, e este sobre o local, ligado ao Município”.
Outra situação em que o STF protegeu o princípio da autonomia dos entes federados foi ao impedir que Governadores do Estado fossem convocados para CPI no Congresso Nacional, pois entendeu que respondem apenas perante as Assembleias Legislativas. Veja:
Em juízo de delibação, não é possível a convocação de governadores de estados-membros da Federação por Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada pelo Senado Federal. A convocação viola o princípio da separação dos Poderes e a autonomia federativa dos estados-membros. STF. Plenário. ADPF 848 MC-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 25/6/2021. Não há menção expressa a “separação vertical de Poderes” acórdão.
III. Classificações e sistemas de repartições de competência. 
A distribuição (ou repartição) constitucional de poderes (ou de competências) é um dos pontos mais importantes no estudo do Estado Federal. Consoante José Afonso da Silva, o princípio geral que norteia a repartição de competência entre as entidades federativas é o da predominância de interesses, pelo qual cabe à União as matérias e questões de predominante interesse geral, nacional;aos Estados-membros cabem as matérias e assuntos de predominante interesse regional; e aos municípios concernem os assuntos de interesse local. Só que atualmente essa distinção não é fácil de ser feita. A regra principal da federação, consoante Celso Ribeiro Bastos, é a seguinte: nada será exercido por um poder mais amplo quando puder ser decidido pelo poder local, pois os cidadãos moram nos municípios, e não na União.
Quanto à formação do Estado Federal, o federalismo pode ser classificado em: federalismo por agregação: os Estados independentes ou soberanos renunciam a parcela de sua soberania para agregar-se entre si e formar um novo Estado, agora, federativo, passando a ser autônomos. Consagra a indissolubilidade do vínculo federativo (ex: EUA, Alemanha e Suíça); e federalismo por desagregação: a Federação surge a partir de um Estado unitário que resolve descentralizar-se (ex: Brasil, que surgiu a partir da Proclamação da República).
Dada a existência de ordens central e parcial, a repartição de competência (e de rendas) entre essas esferas, realizada pela CF, favorece a eficácia da ação estatal. O modo de repartição indica que tipo de federalismo é adotado. A concentração de competências no ente central aponta para um modelo centralizador (centrípeto); uma opção pela distribuição mais ampla de poderes em favor dos Estados-membros configura um modelo descentralizador (centrífugo). Havendo uma dosagem contrabalançada de competências, fala-se em federalismo de equilíbrio.
O federalismo pode ser, ainda, simétrico, em que se verifica homogeneidade de cultura e desenvolvimento, assim como de língua (ex: EUA); ou assimétrico, quando há diversidade de língua e cultura (ex: Canadá). No Brasil, há certo “erro de simetria”, pelo fato de o constituinte tratar de modo idêntico os Estados, como se verifica na representação no Parlamento (cada Estado elege o número fixo de 3 Senadores – art. 46, §§ 1º e 3º).
Outra classificação dos modelos de repartição cogita das modalidades de repartição horizontal e repartição vertical. Na primeira não se admite concorrência de competência entre os entes federados. Esse modelo apresenta três soluções possíveis para o desafio de distribuição de poderes entre as órbitas do Estado Federal. Uma delas efetua a enumeração exaustiva da competência de cada esfera da Federação; outra discrimina a competência da União deixando aos Estados-membros os poderes reservados (ou não enumerados); a última discrimina os poderes dos Estados-membros, deixando o que restar para a União. No Brasil, a União e os municípios possuem competências enumeradas, enquanto os Estados-membros possuem competências residuais. 
Na repartição vertical de competências, realiza-se a distribuição da mesma matéria entre a União, os Estados-membros e, eventualmente, os municípios. Essa técnica, no que tange às competências legislativas, deixa para a União os temas gerais, os princípios de certos institutos, permitindo aos Estados-membros afeiçoar a legislação às suas peculiaridades, além de autorizar os municípios a legislar sobre assuntos de interesse local. A técnica da legislação concorrente estabelece um verdadeiro condomínio legislativo e é adotada no art. 24 da CRFB. 
Quanto aos critérios de distribuição de competência, tem-se que o Brasil adota um sistema complexo, que busca realizar o equilíbrio federativo por meio de uma distribuição que se fundamenta na técnica de enumeração dos poderes da União (21 e 22), com poderes remanescentes para os Estados (25, §1º) e poderes definidos indicativamente para os Municípios (30), mas combina com essa reserva de campos específicos (nem sempre exclusivos, mas às vezes apenas privativos) possibilidades de delegação (22, parágrafo único), áreas comuns em que se preveem atuações paralelas da União, Estados, DF e Municípios (23), e setores concorrentes entre a União e Estados, em que a competência para estabelecer políticas, diretrizes e normas gerais cabe à União, enquanto se defere aos Estados e até aos Municípios a competência suplementar.
III. Direito comparado 
No direito comparado, as formulações constitucionais em torno da repartição de competências podem ser associadas a dois modelos básicos – o clássico, vindo da Constituição norte-americana de 1787, e o modelo moderno, que se seguiu à Primeira Guerra Mundial. O modelo clássico conferiu à União poderes enumerados e reservou aos Estados-membros os poderes não especificados. Para mitigar os rigores dessa fixação taxativa, nos EUA elaborou-se a doutrina dos “poderes implícitos” (implied powers). O modelo moderno responde às contingências da crescente complexidade da vida social, exigindo ação dirigente e unificada do Estado, em especial para enfrentar crises sociais e guerras. Isso favoreceu uma dilatação dos poderes da União com nova técnica de repartição de competências, em que se discriminam competências legislativas exclusivas do poder central e também competência comum ou concorrente, mista, a ser explorada tanto pela União como pelos Estados-membros.
Em resumo, o primeiro modelo de federalismo adotado no mundo foi o chamado federalismo clássico, também chamado de federalismo dual, adotava a técnica da repartição horizontal de competência, no caso, elenca-se exaustivamente a competência privativa da União, cabendo aos Estados os poderes remanescentes. Surgiu com a Constituição americana de 1787, também chamada de Constituição da Filadélfia. No Brasil, vigorou durante a Constituição de 1891, que adotava o modelo americano.
Posteriormente, diante da necessidade moderna de maior centralização de poderes na União para fazer frente à intervenção econômica e social e às guerras, surgiu o federalismo moderno, no qual se prestigia também a técnica de repartição vertical da competência, ou seja, haverá uma distribuição simultânea para União e Estados-membros da mesma competência comum ou concorrente, instituindo um condomínio legislativo.
Mesmo no âmbito do federalismo americano, há uma aproximação do modelo moderno a partir de decisões da Suprema Corte. Um dos exemplos foi o caso McCulloch v. Maryland, no qual ficou instituído que, além dos poderes expressamente previstos, foi reconhecido que haveria poderes implícitos do governo federal com respaldo na "necessary and proper clause", também conhecida como "Elastic Clause", uma disposição que confere ao Congresso Nacional os poderes para fazer as leis que sejam necessárias e adequadas para atingir os fins das normas que atribuem competência à União.
Dentro da perspectiva do federalismo moderno, surgiram o federalismo de integração, rechaçado por propor uma mera técnica de repartição vertical de competência, em que a União adota sempre o papel central e o federalismo cooperativo, que flexibiliza a rigidez do modelo dual (clássico), sendo as atribuições exercidas de modo comum ou concorrente pelos entes federativos, adotado no Brasil e na Alemanha.
Facção, veto players e cross-cutting cleavages. Grupo político que ganha o poder majoritariamente, por meio de promessas vazias, corrompendo os princípios constitucionais ao chegar ao poder. Para evitar esse fenômeno, o sistema de eleição de representantes que filtram a vontade popular é um dos instrumentos, distribuindo o poder entre vários “jogadores” com capacidade de veto (veto players). O resultado é denominado pelos teóricos da democracia de teoria das clivagens transversais (cross-cutting cleavages).
JURISPRUDÊNCIA
A competência legislativa concorrente está disposta no art. 24 da CF, entretanto, apenas prevê a competência da União, dos Estados e do DF, nada mencionando sobre os Municípios. De acordo com suas disposições, a União estabelece as normas gerais, cabendo aos Estados suplementá-las. Ocorre que no tema 145 do STF sobre competência do Município para legislar sobre meio ambiente e sobre a competência dos Tribunais de Justiça para exercer controle de constitucionalidade de norma municipal em face da CF foi estabelecido que o “município é competente para legislar sobre o meio ambiente com a União e Estado, no limitedo seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, inciso VI, c/c 30, incisos I e II, da CF)”. RE 586224, LUIZ FUX, aprovada em 05/03/2015 (não há menção expressa “separação vertical de poderes” no acórdão). Vejamos que de fato é prevista expressamente a competência para os Municípios no interesse local suplementar a lei federal e estadual, motivo pelo qual, ainda que por outro artigo da Constituição, em uma interpretação sistemática, há de se reconhecer que também foi adotada para eles a técnica de repartição de competência vertical.
Recentemente, o STF reafirmou esse entendimento, ao tratar sobre as leis e políticas públicas dos Estados-membros e dos Municípios diante da pandemia da Covid-19, como ementa que segue:
CONSTITUCIONAL. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19). RESPEITO AO FEDERALISMO. LEI FEDERAL 13.979/2020. MEDIDAS SANITÁRIAS DE CONTENÇÃO À DISSEMINAÇÃO DO VÍRUS. ISOLAMENTO SOCIAL. PROTEÇÃO À SAÚDE, SEGURANÇA SANITÁRIA E EPIDEMIOLÓGICA. COMPETÊNCIAS COMUNS E CONCORRENTES E RESPEITO AO PRINCÍPIO DA PREDOMINÂNCIA DO INTERESSE (ARTS. 23, II, 24, XII, E 25, § 1º, DA CF). COMPETÊNCIAS DOS ESTADOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DAS MEDIDAS PREVISTAS EM LEI FEDERAL. ARGUIÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. [...] 
2. A gravidade da emergência causada pela pandemia do coronavírus (COVID-19) exige das autoridades brasileiras, em todos os níveis de governo, a efetivação concreta da proteção à saúde pública, com a adoção de todas as medidas possíveis e tecnicamente sustentáveis para o apoio e manutenção das atividades do Sistema Único de Saúde, sempre com o absoluto respeito aos mecanismos constitucionais de equilíbrio institucional e manutenção da harmonia e independência entre os poderes, que devem ser cada vez mais valorizados, evitando-se o exacerbamento de quaisquer personalismos prejudiciais à condução das políticas públicas essenciais ao combate da pandemia de COVID-19. 
3. Em relação à saúde e assistência pública, a Constituição Federal consagra a existência de competência administrativa comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23, II e IX, da CF), bem como prevê competência concorrente entre União e Estados/Distrito Federal para legislar sobre proteção e defesa da saúde (art. 24, XII, da CF), permitindo aos Municípios suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, desde que haja interesse local (art. 30, II, da CF); e prescrevendo ainda a descentralização político-administrativa do Sistema de Saúde (art. 198, CF, e art. 7º da Lei 8.080/1990), com a consequente descentralização da execução de serviços, inclusive no que diz respeito às atividades de vigilância sanitária e epidemiológica (art. 6º, I, da Lei 8.080/1990). 
4. O Poder Executivo federal exerce o papel de ente central no planejamento e coordenação das ações governamentais em prol da saúde pública, mas nem por isso pode afastar, unilateralmente, as decisões dos governos estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas competências constitucionais, adotem medidas sanitárias previstas na Lei 13.979/2020 no âmbito de seus respectivos territórios, como a imposição de distanciamento ou isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, sem prejuízo do exame da validade formal e material de cada ato normativo específico estadual, distrital ou municipal editado nesse contexto pela autoridade jurisdicional competente. 
5. Arguição julgada parcialmente procedente. (ADPF 672 MC-Ref, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 13/10/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-260 DIVULG 28-10-2020 PUBLIC 29-10-2020)
Neste acórdão não há a expressão “separação vertical de poderes”. 
No âmbito da competência administrativa comum na área de saúde, há entendimento de que a solidariedade no âmbito do direito à saúde é a medida que se impõe, cabendo posteriormente ao Poder Judiciário redirecionar de qual ente cabe o pagamento pelas despesas. Nesse sentido, o STF apreciou o Tema 793, que versou sobre a responsabilidade solidária dos entes federados pelo dever de prestar assistência à saúde, no qual firmou a tese de que os “entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. RE 855178 ED, LUIZ FUX, aprovada em 23/05/2019.
Prova oral – 26º CPR: Em termos de direito comparado, nosso sistema se aproximaria mais de que sistema jurídico internacional? Direito norte-americano, alemão? Você já ouviu a expressão “federalismo dual”? O dual se coloca muito mais, na atualidade, em contraposição ao cooperativo. O dual significa uma distribuição rígida de competências... Em termos de federalismo cooperativo, o art. 24 da CF encerra uma modalidade exatamente de cooperação no âmbito legislativo. Você poderia me dizer como é que funciona esse sistema? E os municípios, tem essa competência? Você conhece o entendimento do Supremo a respeito da possibilidade ou não de os Estados legislarem, no âmbito dessa competência legislativa concorrente normas mais protetivas, de meio ambiente, saúde, do que as normas gerais editadas pela União?
Prova oral – 27º CPR: Falar sobre federalismo e pluralismo. 
6C. Direitos fundamentais. Concepções. Características. Dimensões objetiva e subjetiva. Eficácia vertical e horizontal.
Nilton Santos
Tácito Coaracy
1. Fundamentos dos Direitos Fundamentais: o Estado de Direito e a dignidade humana.
2. Direitos e garantias fundamentais: conceito, noções gerais e concepções
Direitos fundamentais são direitos ou posições jurídicas que investem os seres humanos, individual ou institucionalmente considerados, de um conjunto de prerrogativas, faculdades e instituições imprescindíveis a assegurar uma existência digna, livre, igual e fraterna a todas as pessoas. Compõem um núcleo intangível de direitos dos seres humanos submetidos a uma determinada ordem jurídica. São cláusulas pétreas e estão previstos no art. 5º da CF/88, sendo que, segundo o STF, estão espalhados em diversos artigos da Carta Magna.
Para os jusnaturalistas, os direitos do homem são imperativos do direito natural, anteriores e superiores à vontade do Estado. Já para os positivistas, os direitos do homem são faculdades outorgadas pela lei e reguladas por ela. Para os idealistas, os direitos humanos são ideias, princípios abstratos que a realidade vai acolhendo ao longo do tempo, ao passo que, para os realistas, seriam o resultado direto de lutas sociais e políticas.
É usual que se diga serem os direitos fundamentais universais. Porém, tal afirmação deve ser encarada com ressalvas, uma vez que alguns direitos fundamentais são voltados a destinatários específicos (veja-se, por exemplo, o direito à nacionalidade).
Digno de nota o fato de que a Corte Suprema tem um entendimento bastante ampliativo dos direitos fundamentais. Considera-se que tal espécie de direitos é aplicável até mesmo a estrangeiros fora do país, caso sejam atingidos pela Lei brasileira (Caso “Boris Berezowski”).
No concernente às pessoas jurídicas (inclusive as de Direito Público) e aos entes despersonalizados, os direitos fundamentais também se lhes aplicam, desde que haja compatibilidade.
As garantias fundamentais são também direitos, “direitos-garantia”, pois são destinados à proteção de outros direitos. Não existem por si mesmas, mas para amparar, tutelar e efetivar direitos.
Questões Prova Objetiva 29CPR: Questão 9 – a) A despeito de a Constituição de 1988 ter limitado ao “estrangeiro residente” a titularidade de direitos fundamentais, a doutrina é pacífica quanto à impossibilidadede privação de tais direitos pelo exclusivo critério da “não-residência”.
VERDADEIRO. Curso de Direitos Humanos, André de Carvalho Ramos, 2018. A CF/88, em linha com seu fundamento de proteção à dignidade da pessoa humana, garantiu expressamente, ao brasileiro e ao estrangeiro residente, a “inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (art. 5º, caput). De início, a CF/88 limitou ao “estrangeiro residente” a titularidade de direitos fundamentais. Ocorre que tal restrição ofende aos princípios basilares de um Estado Democrático de Direito (art. 1º), pois permitiria, ad terrorem, a privação do direito à vida ou integridade física do turista, por exemplo. Como visto, é pacífica na doutrina a extensão da titularidade de direitos fundamentais a todos os estrangeiros. Tal extensão justifica-se de diversos modos: (i) o Estado Democrático de Direito, previsto no art. 1º da CF/88, não admite a privação de direitos com base no critério da “não residência”, que não possui qualquer pertinência com o exercício de tais direitos básicos; (ii) tratar os estrangeiros não residentes como desprovidos de direitos ofende um dos fundamentos da República, que é promoção da dignidade humana (art. 1º, inciso III); (iii) o reconhecimento pela CF/88 dos direitos decorrentes dos tratados internacionais de direitos humanos (art. 5º, § 2º) já ratificados pelo Brasil permite deduzir que tais tratados, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos ou a Convenção Americana de Direitos Humanos, estendem a todos, estrangeiros residentes ou não, a titularidade dos direitos humanos.
3. Características dos direitos fundamentais
• Historicidade - Os direitos fundamentais são uma construção histórica.
• Universalidade – destinam-se a todos. Ressalva: alguns direitos fundamentais são voltados a destinatários específicos (veja-se, por exemplo, o direito à nacionalidade). OBS: Lembrar da polêmica universalistas vs. relativistas (dizem que universalizar é uma ocidentalização e imposição cultural, afinal, quem dirá o que é fundamental de maneira a ser aplicado universalmente? O que é fundamental varia conforme a cultura e as tradições). Boaventura de Souza Santos propõe o multiculturalismo, a partir de uma globalização contra-hegemônica, utilizando-se da hermenêutica diatópica (instrumento: diálogo intercultural – diálogos entre os topoi de cada cultura), a fim de ser chegar em um universalismo de chegada ou de confluência (concepção mestiça de direitos humanos). O universalismo de partida ou tradicional é criticado pelos relativistas por propor um modelo pré-fabricado de direitos humanos que gera canibalização cultural e imperialismo ocidental.
• Relatividade ou limitabilidade - Nenhum direito fundamental é absoluto. Primeiramente, porque podem entrar em conflito entre si – e, nesse caso, não se pode estabelecer a priori qual direito vai prevalecer no conflito, pois essa questão só pode ser analisada diante de um caso concreto. E, em segundo lugar, nenhum direito fundamental pode ser usado para a prática de ilícitos. Contudo, a restrição aos direitos fundamentais só é admitida quando compatível com os ditames constitucionais e quando respeitados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. OBS: No tocante à limitabilidade dos direitos fundamentais há duas teorias a explicá-la:
Teoria interna[footnoteRef:3]: para esta teoria, os direitos humanos são limitados implicitamente, independentemente da existência de outro direito. Seriam limites imanentes do próprio direito em análise. Exemplo: ingressar em um cinema e gritar “fogo”, sabendo que não há. A liberdade de expressão não pode servir para expor outras pessoas a riscos ou a ameaças de violação da sua integridade. Então, nesse caso há um limite imanente (âmbito de proteção da norma), porque a liberdade de expressão não abarca essa postura. [3: Vide assertiva verdadeira (adaptada) do concurso para Auditor de Controle Interno – Planejamento e Orçamento do SEAP-DF de 2014, banca FUNIVERSA: Para os defensores da teoria interna dos direitos fundamentais, toda limitação ao âmbito de proteção do direito fundamental importa automaticamente na sua violação, porque toda limitação de um direito é, ao mesmo tempo, interferência na parte integrante da determinação do seu conteúdo definitivo.
Vide também questão do 28ºCPR, assertiva verdadeira: Pela teoria interna, o conflito entre direitos fundamentais é meramente aparente, na medida em que é superado pela determinação do verdadeiro conteúdo dos direitos envolvidos.] 
Teoria externa: defende que os direitos humanos são limitáveis em duas etapas. Na primeira é preciso ler o direito prima facie (à primeira vista) para verificar se ao menos inicialmente determinada conduta se encaixa; em um segundo momento, é preciso verificar se há outro direito em conflito e, em caso positivo, fazer a ponderação. Exemplo: gritar “fogo” falsamente é liberdade de expressão, não tem restrição até aqui. Mas no próximo passo percebe-se que tal conduta expõe a perigo terceiros. 
• Imprescritibilidade – Dizer que os direitos fundamentais são imprescritíveis quer significar que não podem (em regra) ser perdidos pela passagem do tempo. Contudo, há exceções, alguns direitos fundamentais que são prescritíveis, como no caso da propriedade x usucapião.
• Inalienabilidade - Em regra, são intransferíveis e inegociáveis, pois são desprovidos de conteúdo econômico-financeiro e seus titulares não podem deles se despojar. Há exceções, haja vista a propriedade que pode, obviamente, ser alienada.
• Irrenunciabilidade ou indisponibilidade - Geralmente, são irrenunciáveis, pois não são disponíveis, mas seus titulares podem deixar de exercê-los. Não podem ser dispostos da forma como convier ao indivíduo, em regra. Doutrina contemporânea prega que somente pode-se alegar indisponibilidade quando não existir uma renúncia válida, ou seja, quando o indivíduo por um motivo qualquer (por exemplo, avançada idade) não puder exercer seu arbítrio sem imperativos externos.
• Indivisibilidade - Os direitos fundamentais são um conjunto, não podem ser analisados de maneira separada, isolada (o desrespeito a um deles é, na verdade, o desrespeito a todos).
• Proibição de retrocesso - impede a revogação de normas garantidoras de direitos fundamentais e a implementação de políticas públicas de enfraquecimento de direitos fundamentais (efeito cliquet).
• Concorrência - Podem ser exercidos cumulativamente por um mesmo titular.
• Aplicabilidade imediata – Art. 5º, § 1º, da CF: “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. O texto se refere aos direitos fundamentais em geral, não se restringindo apenas aos direitos individuais. Os direitos fundamentais não são meramente normas matrizes de outras normas, mas são também, e sobretudo, normas diretamente reguladoras de relações jurídicas. Assim, a própria CRFB autoriza que os operadores do direito, mesmo à falta de comando legislativo, venham a concretizar os direitos fundamentais pela via interpretativa. Há, contudo, normas constitucionais, relativas a direitos fundamentais, que, evidentemente, não são autoaplicáveis. Carecem da interposição do legislador para que produzam todos os seus efeitos. Em razão disso, a doutrina entrevê no art. 5º, § 1º, da Constituição Federal uma norma-princípio, estabelecendo uma ordem de otimização, uma determinação para que se confira a maior eficácia possível aos direitos fundamentais.
OBS1: A Teoria das Gerações/Dimensões de Direitos: doutrina concebida por Karel Vasak, jurista francês, para classificar os direitos fundamentais conforme os temas da Revolução Francesa (liberdade, igualdade e fraternidade). Muito embora haja divergência na doutrina, prefere-se o uso da expressão “dimensões” dos direitos fundamentais, ante a ideia de complementaridade entre elas e não substituição. Ademais, divergem os juristas, também, em relação a quantas seriam tais dimensões.
1ª dimensão, direitos voltados à tutela das liberdades públicas, demandamprestações negativas do Estado: direitos liberais, como vida, propriedade, liberdade.
2ª dimensão, direitos de igualdade (material), demandam prestações positivas do Estado para a realização da justiça social, do bem-estar social e das liberdades sociais: direitos sociais, como moradia, saúde, educação, alimentação, direitos trabalhistas.
3ª dimensão, direitos de fraternidade (proteção do homem em coletividade social): direitos de solidariedade, de titularidade da coletividade ou difusa, como paz, desenvolvimento. São também conhecidos como direitos metaindividuais (está além do indivíduo) ou supraindividuais (estão acima do indivíduo individualmente considerado).
4ª Dimensão (Paulo Bonavides), direitos de globalização e universalização: são direitos que embasam uma possível globalização política rumo a uma sociedade universal aberta ao futuro. Alguns deles são: direito à democracia direta, direito ao pluralismo, direito à informação e os direitos relacionados à biotecnologia.
5ª Dimensão (Paulo Bonavides), desloca a paz para a quinta geração, direito superior e garantidor da sobrevivência digna na terra.
OBS2: Em relação às características funcionais dos direitos fundamentais, anote-se a “teoria dos quatro status” de Jellinek:
1) status passivo (subjectionis): o indivíduo está subordinado aos poderes estatais – ordens e proibições;
2) status negativo (negativus ou libertatis): ao indivíduo é reconhecida uma esfera individual de liberdade imune à intervenção estatal;
3) status positivo (positivus ou civitatis): ao indivíduo é possível exigir do Estado determinadas prestações positivas;
4) status ativo (activus): possibilita ao indivíduo participar ativamente da formação da vontade política estatal.
4. Dimensões Objetiva e Subjetiva
Dimensão subjetiva: Diz respeito à característica de servirem os direitos fundamentais como fontes de direitos subjetivos a seus respectivos titulares. Sintetiza a faculdade que tem o seu titular - o indivíduo ou a coletividade a quem é atribuído - de fazer valer judicialmente os poderes, as liberdades, o direito à ação ou mesmo as ações negativas ou positivas que lhe foram outorgadas pela norma consagradora de direito fundamental em questão. Trata-se de exigir respeito, especialmente por parte do Estado, aos direitos individuais, donde se tem a percepção de tratar-se de dimensão negativa[footnoteRef:4]! [4: Status negativo, nas palavras de Jellinek.] 
Dimensão objetiva: os direitos fundamentais operam como elementos objetivos fundamentais que sintetizam os valores básicos da sociedade e os expandem para toda a ordem jurídica (eficácia irradiante), que os identifica como diretrizes ou vetores para a interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais. Assim, tais direitos não apenas estabelecem faculdades aos indivíduos (dimensão subjetiva), mas estabelecem também deveres, explícitos ou implícitos, de proteção pelo Estado. Tal dever de proteção exige uma conduta ativa do Estado no combate à chamada proteção deficiente (dimensão positiva). Assim, exige-se do Estado a necessária proteção contra ameaça dos atos estatais (verticalidade), como ainda de possível ameaça de lesão proveniente de terceiros, em especial de (e entre) atos de particulares (horizontalidade), considerando que poderes não estatais podem vulnerar bens jurídicos tutelados constitucionalmente.
OBS1: Há controvérsia no que se refere à vinculação da dimensão subjetiva com direitos negativos e dimensão objetiva com dimensão positiva, pois a dimensão subjetiva é entendida como a faculdade do titular do direito, ao passo que a dimensão objetiva é entendida como a norma.
OBS2: A decisão proferida em 1958 pela Corte Federal Constitucional da Alemanha no caso Lüth é citada como o marco histórico a partir do qual se desenvolveu a teoria da dimensão objetiva dos direitos fundamentais. Nesta decisão, ficou consignado que os direitos fundamentais também “constituem decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, com eficácia em todo o ordenamento jurídico e que fornecem diretrizes para os órgãos legislativos, judiciários e executivos”.
5. Eficácia vertical, horizontal e diagonal
• Eficácia vertical - A História aponta o Poder Público como o destinatário precípuo das obrigações decorrentes dos direitos fundamentais. A finalidade para a qual os direitos fundamentais foram inicialmente concebidos consistia, exatamente, em estabelecer um espaço de imunidade do indivíduo em face dos poderes estatais. Tal proteção, expressada nas relações entre os cidadãos (posição de inferioridade) e os poderes públicos (posição de superioridade), tem sido denominada de eficácia vertical dos direitos fundamentais.
• Eficácia horizontal - Com a evolução dos direitos fundamentais, fica óbvio que os particulares também precisam respeitá-los, o que leva à eficácia horizontal: o reconhecimento de que os direitos humanos também incidem nas relações entre particulares (também chamada de eficácia privada ou externa ou drittwirkung - Direito alemão). Contudo, quanto à aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas, há duas teorias:
1) eficácia indireta ou mediata: Há necessidade da intermediação do legislador para a efetiva aplicação dos direitos fundamentais. A Constituição não investe os particulares em direitos subjetivos privados, mas ela contém normas objetivas, cujos efeitos de irradiação levam à impregnação das leis civis por valores constitucionais. Com efeito, os direitos fundamentais são protegidos no campo privado não por normas constitucionais, mas por meio de mecanismos típicos do próprio Direito Privado.
2) eficácia direta ou imediata: Alguns direitos fundamentais podem ser aplicados às relações privadas sem que haja a necessidade de intermediação legislativa para a sua concretização, já que seriam oponíveis erga omnes. Resultaria na aplicação direta dos preceitos constitucionais. Essa foi a tese que prevaleceu no Brasil, na doutrina e, inclusive, no STF[footnoteRef:5] e no STJ. [5: RE 201.819, julgado em 11 -10 -2005, Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes (DJ de 27/10/2006); RE 161.243, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 19/12/1997; RE 158.215-4, Relator Ministro Marco Aurélio, DJ de 07/06/1996.] 
• Eficácia Diagonal - Surgida mais recentemente, fala-se atualmente em eficácia diagonal dos direitos fundamentais, que constituiria um tertium genus cunhado pelo jurista chileno Sergio Gamonal Contreras, pelo qual, ao lado das garantias constitucionais do cidadão frente ao Estado (eficácia vertical) e frente aos próprios particulares (eficácia horizontal), surge a necessidade de proteção nas relações entre particulares, notadamente caracterizadas pelo desequilíbrio ou desproporcionalidade (assimetria substancial). No ordenamento positivo, a eficácia diagonal se expressa nas relações em que estão pressupostas a vulnerabilidade, inerente a todo consumidor (art. 4º, I, CDC), e nas relações trabalhistas, com o intuito de atenuar a hipossuficiência pressupostamente havida pelo empregado na relação de trabalho que estabelece com o seu empregador.
7A. Processo legislativo. Emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto legislativo e resolução. O processo de incorporação dos tratados internacionais. Devido processo legislativo.
Isabella de Souza
A função de legislar é uma das funções típicas do Poder Legislativo, cujo objetivo é produzir os atos normativos primários, chamados assim porque têm seu fundamento de validade diretamente da Constituição. Os atos normativos primários (emendas à constituição, leis complementares, medidas provisórias, leis delegadas, decretos legislativos e resoluções) são elaborados a partir de uma sistemática própria, prevista na Constituição e nos Regimentos Internos de cada uma das Casas Legislativas, cuja sistemática recebe o nome de processo legislativo.
Laboratórios legislativos: O art. 24, XI da Constituição prevê que “compete concorrentemente à União, Estados, DF, legislar concorrentemente sobre procedimentos emmatéria processual”. A prerrogativa de legislar sobre a forma como a matéria processual será executada de acordo com a maneira que julgar ser mais adequada, de molde a atender suas peculiaridades (art. 24, § 3º, da CRFB) faz com que os Estados sejam transformados em laboratórios legislativos, possibilitando-se que novas e exitosas experiências sejam formuladas (PGR, ADI 2922).
O processo legislativo é o núcleo central do regime constitucional de um Estado democrático de direito que permite a construção do Direito, que é um elemento essencial de integração da sociedade pluralista em que vivemos. Consoante o Ministro Alexandre de Moraes, o processo legislativo pode ser compreendido em duplo sentido: a) jurídico, que é o conjunto de disposições que regula o procedimento a ser observado pelos órgãos responsáveis pela produção das espécies normativas primárias; b) sociológico, que são os fatores reais de poder que impulsionam a atividade legiferante. Contudo, há espécies normativas que, apesar de serem primárias, estão fora do escopo do processo legislativo, como os decretos autônomos e os regimentos dos tribunais, que são atos normativos primários, mas que não são objeto do processo legislativo, bem como existem ainda os atos normativos secundários, como os decretos regulamentares, que também não são objeto do processo legislativo. O desrespeito às regras do processo legislativo constitucional resulta em inconstitucionalidade formal (ou nomodinâmica) da norma e havendo vício de iniciativa, por exemplo, tem-se, nesse caso, uma inconstitucionalidade formal, cujo vício será insanável, que poderá levar à declaração de inconstitucionalidade da norma pelo STF, em razão do princípio da não convalidação das nulidades. Outro importante princípio do processo legislativo constitucional é o princípio da simetria, que impõe que as regras básicas do processo legislativo estabelecidas pela CF/88 são de observância obrigatória nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios.
Tese 23 da PGR: É possível o estabelecimento de prazo razoável para que o Congresso Nacional conclua a deliberação acerca de lei apropriada, com objetivo de cumprir seus deveres constitucionais, na hipótese de reconhecimento de omissão inconstitucional no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, cabendo a flexibilização do entendimento de que a decisão, nesse caso, limita-se à constatação da omissão inconstitucional, pois, conforme jurisprudência do STF, a Constituição Federal não pode submeter-se à vontade dos Poderes constituídos nem ao império dos fatos e das circunstâncias, sendo ela a garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades não serão jamais ofendidos (ADO 26).
O processo legislativo divide-se em duas espécies: a) comum, que se destina à elaboração das leis ordinárias; e b) especial, que é aquele utilizado para a elaboração de emendas à Constituição, leis complementares, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções e leis financeiras (lei de plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias, leis orçamentárias anuais e abertura de créditos adicionais).
Poderá haver o controle judicial preventivo de constitucionalidade do processo legislativo, quando a norma ainda não estiver em vigor, que poderá ser feito pelo Poder Legislativo (quando, por exemplo, as Comissões da Câmara e do Senado apreciam a constitucionalidade dos projetos de lei), pelo Poder Executivo (quando o Presidente veta um projeto de lei por considerá-lo inconstitucional) ou mesmo pelo Poder Judiciário. Esse controle preventivo, no âmbito do Judiciário, será viabilizado mediante a impetração de mandado de segurança por congressista no STF, já que se trata de um direito líquido e certo sendo violado, que é o de ter o devido processo legislativo respeitado. Registre-se que não se admite o controle judicial do processo legislativo mediante ação direta de inconstitucionalidade (controle abstrato), pois o ajuizamento desta pressupõe uma norma pronta e acabada, já publicada e inserida no ordenamento jurídico, já que controle é exercido por meio do mandado de segurança, que viabilizará o controle incidental pelo Poder Judiciário, cuja legitimidade é do congressista da Casa Legislativa em que estiver tramitando a proposta, sendo que o encerramento do processo legislativo (aprovação e entrada em vigor da norma) retira do congressista a legitimidade para continuar no feito, restando prejudicado o mandado de segurança.
O processo legislativo é o mecanismo por meio do qual são elaboradas as normas jurídicas do art. 59, CF/88, contudo, o procedimento legislativo é a sucessão de atos necessários para a elaboração das normas do art. 59, CF/88. Este procedimento legislativo pode ser classificado em comum (destinado à elaboração da lei ordinária) e especial (destinado às outras espécies normativas primárias). O Comum subdivide-se em: a) ordinário, que consiste no procedimento mais completo, em que não há prazos definidos para o encerramento das fases de discussão (deliberação) e votação, permitindo estudo mais aprofundado sobre as matérias objeto do projeto de lei; b) sumário, que possui as mesmas fases do procedimento legislativo ordinário, mas há imposição de prazo para o encerramento da fase de discussão (deliberação) e votação; c) procedimento legislativo abreviado: que é o procedimento que se aplica a projetos de lei que, na forma dos regimentos internos das Casas Legislativa, dispensam a discussão e votação em Plenário, podendo ser aprovados diretamente pelas Comissões, sem necessidade de irem a Plenário.
O procedimento legislativo ordinário apresenta três fases: a) fase introdutória, que compreende a iniciativa de lei, ou seja, a apresentação do projeto de lei ao Congresso Nacional, deflagrando o processo legislativo; b) a fase constitutiva, que abrange a deliberação e votação sobre o projeto de lei no âmbito das duas casas legislativas, em virtude do bicameralismo no Poder Legislativo federal, com a manifestação do Chefe do Executivo (sanção ou veto). Se for o caso, haverá, ainda, a apreciação do veto presidencial pelo Poder Legislativo. Por fim, c) a fase complementar, que compreende a promulgação (ato solene que atesta a existência da lei) e a publicação (ato de divulgação oficial da lei).
O Presidente da República tem a iniciativa privativa de projeto de lei que trata da organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União e de projeto de lei que versa sobre normas gerais de organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Ressalte-se que, por força do art. 128, § 5º, CF/88, a lei de organização do Ministério Público da União é da iniciativa concorrente do Presidente da República e do Procurador-Geral da República. Por simetria, as leis de organização dos Ministérios Públicos Estaduais são de iniciativa concorrente do Governador e do Procurador-Geral de Justiça.
Conforme já decidiu o STF, “a Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário”, diferentemente da iniciativa das leis orçamentárias, que é privativa e vinculante do Presidente da República, já que é obrigado a apresentar o projeto de lei, na forma e nos prazos previstos na Constituição. À exceção das hipóteses de iniciativa vinculada (leis orçamentárias), compete ao Chefe do Poder Executivo determinar a conveniência e a oportunidade de exercer a iniciativa privativa de lei, não podendo os outros Poderes obrigá-lo a exercer tal competência, sob pena de ofensa ao princípio da separação de poderes.
Dos procedimentos legislativos especiais (Emendas Constitucionais, leis complementares, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções).
Nas Emendas Constitucionais, que cuidam da reforma à Constituição, elas apresentam quatro tipos de limitações: a) temporais, que ocorrem quando o Poder Constituinte Originário estabelece um prazo durante o qual não pode haver modificações ao texto da Constituição,sendo imutável, algo que não aconteceu com CF/88; b) circunstanciais, que se verificam quando a Constituição estabelece que em certos momentos de instabilidade política do Estado seu texto não poderá ser modificado, tais como estado de sítio, estado de defesa e intervenção federal (CF, art. 60, § 1º), podendo apenas ser apresentadas, discutidas e votadas, sem possibilidade de promulgação; c) formais, i) quanto à iniciativa restrita (1/3, no mínimo, dos membros da câmara ou do senado; Presidente da República; mais da metade das assembleias legislativas, manifestando-se, cada uma, pela maioria relativa de seus membros); ii) votação e discussão em 2 turnos em cada casa legislativa e aprovação por 3/5 dos membros de cada uma delas; iii) promulgação pelas mesas da câmara e do senado, com o respectivo número de ordem, e iv) vedação à reapresentação, na mesma sessão legislativa, de proposta de emenda nela rejeitada ou tida por prejudicada (irrepetibilidade absoluta); d) materiais, quando a Constituição estabelece que determinadas matérias não poderão ser abolidas por meio de emendas, conhecidas como explícitas ou expressas, quando previstas expressamente do texto constitucional e, em oposição, implícitas ou tácitas, quando não estão expressas Constituição. Os dois tipos de limitações materiais estão presentes na CF/88. As expressas estão previstas no § 4º do art. 60, segundo o qual não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: 1) a forma federativa de Estado; 2) o voto direto, secreto, universal e periódico; 3) a separação dos Poderes e 4) os direitos e garantias individuais. Já as limitações implícitas ao poder de reforma são limites tácitos, não podendo ser modificados, tais como: a titularidade do Poder Constituinte Originário e Derivado e os procedimentos de reforma e revisão constitucional.
Emendas parlamentares em projetos de lei de iniciativa dos Tribunais de Contas. A iniciativa de projetos de lei que tratem sobre a organização e o funcionamento dos Tribunais de Contas é reservada privativamente ao próprio Tribunal. É possível que haja emendas parlamentares em projetos de lei de iniciativa do Tribunal de Contas, desde que respeitados dois requisitos:  a) guardem pertinência temática com a proposta original (tratem sobre o mesmo assunto); b) não acarretem aumento de despesas. STF. Plenário. ADI 5442 MC/DF e ADI 5453 MC/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 17/3/2016 (Info 818).
Princípio da parcelaridade. O veto presidencial pode ser parcial, mas não pode recair sobre palavras (é preciso que recaia sobre artigos, inciso, alínea ou parágrafo). Já o STF pode declarar inconstitucionalidade de palavras e expressões de textos normativos.
Análise dos vetos. Em que pese a previsão contida no artigo 66, §4º, da Constituição, o tema foi objeto de análise do STF, no julgamento de agravo regimental no MS 31.816, que versava sobre os royalties de petróleo. Na ocasião, o STF entendeu que o Congresso Nacional não está obrigado a analisar os vetos realizados pelo Presidente da República em ordem cronológica.
Emendas à CF - Início da tramitação. Uma PEC não precisa ter sua tramitação iniciada na Câmara dos Deputados.  “O início da tramitação da proposta de emenda no Senado Federal está em harmonia com o disposto no art. 60, I, da CF, que confere poder de iniciativa a ambas as Casas Legislativas.(ADI 2.031, rel. min. Ellen Gracie, j. 3-10-2002, P, DJ de 17-10-2003.)”. 
Emendas à Constituição Estadual. A Constituição Estadual pode autorizar que a iniciativa popular possa propor proposta de emenda à constituição estadual (PEC Estadual), com base no art. 1º, parágrafo único, no art. 14, II e III e no art. 49, VI da CF/88 (ADI 825)
Das leis complementares, nestas espécies normativas primárias há processo legislativo próprio, mais dificultoso do que o das leis ordinárias, porém mais fácil que o de reforma à Constituição, pois o constituinte entendeu que certas matérias, embora de extrema relevância, não deviam ser regulamentadas pela própria Constituição Federal, mas também não poderiam se sujeitar à possibilidade de constantes alterações pelo processo legislativo ordinário. As leis complementares se diferenciam das ordinárias em dois aspectos: o material, que consiste no fato de que os assuntos tratados por ela estão expressamente previstos na Constituição, o que não acontece com as leis ordinárias; o formal, que diz respeito ao processo legislativo, que exige quórum qualificado (maioria absoluta – art. 69, CF), diferentemente da lei ordinária, cuja aprovação é de maioria simples (art. 47). As demais fases do procedimento de elaboração da lei complementar seguem o processo ordinário.
Das medidas provisórias: Nestas espécies normativas, o Presidente da República (PR) poderá adotá-las, com força de lei, em caso de relevância e urgência, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. Os requisitos de relevância e urgência, necessários para a edição da medida provisória, são conceitos jurídicos indeterminados e, por isso, estão inseridos na esfera da discricionariedade administrativa, de competência do PR. Registre-se que o STF entende que é possível o controle jurisdicional dos requisitos de urgência e relevância, mas apenas em casos excepcionais, nos quais for evidente a ausência desses pressupostos (ADI 4029, Rel. Min. Luiz Fux, Julgado em 08.03.2012), sem que isso configure qualquer violação ao princípio da separação de poderes.
Registre-se que as medidas provisórias não podem tratar sobre qualquer matéria, tendo em visa a existência de limitações constitucionais à sua edição, tais como: I – relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º (abertura de créditos extraordinários); II – que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III – reservada a lei complementar; IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.
Uma vez editada pelo Presidente, a medida provisória deverá ser submetida, de imediato, ao Congresso Nacional, onde terá o prazo de 60 dias (prorrogáveis por mais 60) para ser apreciada, não correndo durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. Será apreciada por uma Comissão Mista, que emitirá parecer, para posterior apreciação pelo Plenário das Casas Legislativas, iniciada obrigatoriamente na Câmara dos Deputados. Caso seja integralmente convertida em lei, o Presidente do Senado a promulgará, não se falando em sanção ou veto. Caso rejeitada integralmente, o CN deverá disciplinar, por meio de decreto legislativo, as relações jurídicas dela decorrentes, no prazo de 60 dias. No caso de modificações do texto original, será transformada em projeto de lei de conversão, o qual será enviado para sanção ou veto pelo Presidente da República.
Medidas provisórias e trancamento da pauta. O trancamento da pauta por conta de MPs não votadas no prazo de 45 dias só alcança projetos de lei que versem sobre temas passíveis de serem tratados por MP. 
Medida Provisória e meio ambiente. É possível a edição de medidas provisórias tratando sobre matéria ambiental, mas sempre veiculando normas favoráveis ao meio ambiente. A proteção ao meio ambiente é um limite material implícito à edição de medida provisória, ainda que não conste expressamente do elenco das limitações previstas no art. 62, § 1o, CF/88. ADI 4717 - Alteração dos limites dos parques nacionais por medida provisória. MP´s não podem veicular norma que altere espaços territoriais especialmente protegidos.
A MP 927/2020 dispõe sobre a possibilidade de celebração de acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, duranteo período da pandemia do novo coronavírus (covid-19), bem como sobre diversas providências a serem tomadas nesse período de calamidade pública relativas aos contratos de trabalho.
A MP 966/2020, que dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19. 
Necessário interpretação conforme à Constituição e em caso de erro grosseiro, deve-se levar em consideração a observância, pelas autoridades: a) de standards, normas e critérios científicos e técnicos, tal como estabelecidos por organizações e entidades internacional e nacionalmente conhecidas; bem como b) dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção; e 2) conferir, ainda, interpretação conforme à Constituição ao art. 1º da MP 966/2020, para explicitar que, para os fins de tal dispositivo, a autoridade à qual compete a decisão deve exigir que a opinião técnica trate expressamente: (i) das normas e critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades reconhecidas nacional e internacionalmente; (ii) da observância dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção. Foram fixadas as seguintes teses: 1. Configura erro grosseiro o ato administrativo que ensejar violação ao direito à vida, à saúde, ao meio ambiente equilibrado ou impactos adversos à economia, por inobservância: i) de normas e critérios científicos e técnicos; ou ii) dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção. 2. A autoridade a quem compete decidir deve exigir que as opiniões técnicas em que baseará sua decisão tratem expressamente: i) das normas e critérios científicos e técnicos aplicáveis à matéria, tal como estabelecidos por organizações e entidades internacional e nacionalmente reconhecidas; e ii) da observância dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, sob pena de se tornarem corresponsáveis por eventuais violações a direitos. Vale ressaltar que a MP não trata de crime ou de ato ilícito. Assim, qualquer interpretação do texto impugnado que dê imunidade a agentes públicos quanto a ato ilícito ou de improbidade deve ser excluída. STF. Plenário. ADI 6421 MC/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20 e 21/5/2020 (Info 978).
Das Leis Delegadas: estas são as elaboradas pelo Presidente da República, no exercício da função atípica legislativa, por delegação do Congresso Nacional, após sua solicitação (do PR). É um ato discricionário do Congresso, podendo ser revogado a qualquer tempo. Na delegação típica, não há qualquer intervenção do Legislativo, enquanto na atípica, o Congresso apreciará antes de ser convertido em lei. A delegação não vincula o Presidente da República, que, mesmo diante dela, poderá não editar a lei delegada, como não retira do Legislativo o poder de regular a matéria. Elas não podem tratar de qualquer matéria, bem como o Congresso poderá sustar atos do Executivo que exorbitem dos limites da delegação legislativa, com efeitos não retroativos (ex nunc), chamado de “veto legislativo”.
Dos decretos legislativos e das resoluções: ambos são espécies normativas primárias, com hierarquia de lei ordinária, não sujeitos à sanção ou veto do Presidente da República. Os decretos legislativos são atos editados pelo Congresso Nacional para o tratamento de matérias de sua competência exclusiva (art. 49 da CF), dispensada a sanção presidencial. Segundo o Prof. José Afonso da Silva, os decretos legislativos são atos com efeitos externos ao Congresso Nacional. As resoluções são espécies normativas editadas pelo Congresso Nacional, pelo Senado Federal ou pela Câmara dos Deputados, sendo utilizadas para dispor sobre assuntos de sua competência que não estão sujeitos à reserva de lei (arts. 51 e 52 da CF), que apontam as competências privativas da Câmara e do Senado, respectivamente. A Constituição exige a edição de resoluções, também, em outros dispositivos constitucionais, dentre os quais: a) delegação legislativa para a edição de lei delegada (resolução do Congresso Nacional); b) definição das alíquotas máximas do imposto da competência dos Estados e do DF, sobre “causas mortis” e doações, de quaisquer bens ou direitos (resoluções do Senado). Ademais, promulgação da resolução se dá pelo Presidente da respectiva Casa legislativa.
Inconstitucionalidade formal e descumprimento do regimento interno. O controle judicial de atos “interna corporis” das Casas Legislativas só é cabível nos casos em que haja desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo (arts. 59 a 69 da CF/88). Tese fixada pelo STF: “Em respeito ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2o da Constituição Federal, quando não caracterizado o desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo, é defeso ao Poder Judiciário exercer o controle jurisdicional em relação à interpretação do sentido e do alcance de normas meramente regimentais das Casas Legislativas, por se tratar de matéria ‘interna corporis’.” STF. Plenário. RE 1297884/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 11/6/2021 (Repercussão Geral – Tema 1120).
Flexibilização da aquisição de armas de fogo por meio de decreto presidencial. Manifestação Aras: O Decreto 9.685/2019 foi expressamente revogado pelo Decreto 9.785/2019, sem reprodução do conteúdo da norma impugnada ou da situação reputada inconstitucional por ela disciplinada. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que a revogação do ato normativo impugnado após o ajuizamento da ação direta implica a prejudicialidade da sua análise em razão da perda superveniente do objeto. O Tribunal, por maioria, referendou a decisão que: (i) concedeu com efeitos ex nunc a medida cautelar , para suspender a eficácia do art. 12, §1º e §7º, IV, do Decreto 5.123/2004 (com alteração dada pelo Decreto 9.685/2019); do art. 9º, §1º, do Decreto nº 9.785/2019; e do art. 3º, § 1º, do Decreto nº 9.845/2019; e (ii) concedeu a cautelar para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 4º do Estatuto do Desarmamento; ao inciso I do art. 9º do Decreto nº 9.785/2019; e ao inciso I do art. 3º do Decreto nº 9.845/2019, fixando a orientação hermenêutica de que a posse de armas de fogo só pode ser autorizada às pessoas que demonstrem concretamente, por razões profissionais ou pessoais, possuírem efetiva necessidade. ADI 6119, 6139 e 6466.
NOTA TÉCNICA PFDC N.º 6/2021: A formulação de uma política pública consiste mais em estabelecer uma conexão entre as atribuições de órgãos já existentes, de modo a efetivar um direito social”, sendo que, segundo a interpretação mais adequada ao sistema constitucional brasileiro, “a alínea ‘e’ do inciso II do §1º do art. 61 da CF não veda ao Legislativo iniciar PL sobre políticas públicas”. O simples fato de um PL propor a formulação de políticas públicas, solicitando uma especial atenção dos serviços públicos e, de consequência, de seus agentes na abordagem da temática de acolhimento e orientação de migrantes e refugiados, como no caso do citado art. 6º, não invade a competência privativa do Chefe do Poder Executivo (João Trindade Cavalcante Filho).
ADPFs 714, 715 e 718 - Cabimento de ADPF contra veto presidencial - TRECHOS
Manifestação da PGR: Não se desconhece a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto ao não cabimento de ADPF contra veto (ADPF1-QO). Isso por impossibilidade de intervenção antecipada do Judiciário. Acontece que o caso sob análise é singular e não envolve nenhuma apreciação do Poder Judiciário quanto às razões (políticas ou jurídicas) do veto em si. Conforme narra a petição inicial, o chefe do Poder Executivo tinha até o dia 2.7.2020 (quinze dias úteis, conforme § 1º do art. 66 da Constituição) para decidir sobre o projeto. E assim o fez: no último dia, vetou parcialmente o projeto. No dia 6.7.2020, contudo, foi publicada no Diário Oficial da União “retificação”, com a aposição de dois novos vetos ao referido projeto de lei: ao § 5º do art. 3º-B e ao art. 3º-F da Lei 13.979/2020. Segundoo art. 66 da CF, o Presidente dispõe de 15 dias úteis para vetar o projeto de lei, total ou parcialmente. Decorrido o prazo, o silêncio importará sanção. A marcha do processo legislativo é sempre para frente, constituída de atos irretratáveis e que operam a preclusão das fases anteriores. Existindo veto a alguma norma do projeto, não poderá o chefe do Poder Executivo se arrepender tanto como não cabe ao Poder Legislativo reconsiderar deliberação de confirmação ou de rejeição do veto (ADI 1.254-MC). Neste caso, não tendo sido objeto de veto no prazo constitucional, tanto § 5º do art. 3º-B quanto o art. 3º-F foram sancionados, promulgados e integraram a Lei 14.019/2020. Não poderia, portanto, o Presidente da República, sob pena de violação dos princípios constitucionais da separação dos Poderes e da segurança jurídica, reabrir o processo legislativo e praticar ato (o do veto) já precluso. 
No mérito: No tocante aos pedidos de suspensão dos efeitos da retificação no DOU de 6 de julho de 2020, verifica-se que o que ocorreu foi um “exercício renovado” do poder de veto, em desconformidade com o art. 66 da CF, a ponto de representar violação ao preceito fundamental da separação de poderes. Os mais elevados valores materiais necessários para a convivência democrática não são localizáveis no éter; são, antes, produto de procedimentos: “a democracia como forma de racionalizar processos na ordem política cria publicidade no seio de seus próprios procedimentos. O procedimento formal se converte, portanto, em garantia de retidão e justiça material” (HÄBERLE, Peter. Pluralismo y Constitución: estudios de teoria constitucional de la sociedade abierta. 2ª ed. Madrid: Ed. Tecnos, 2013, p. 144). 
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, orientando-se pela lógica da preclusão entre as etapas do processo legislativo, também pontificou que “O poder de veto, quando usado pelo executor, não pode ser retratado”, para negar a possibilidade, ao então Governador de Pernambuco de proceder à sanção de Projeto de Lei que, dois dias antes, fora enviado à Assembleia Legislativa com mensagem de veto. O Relator, citando Pontes de Miranda, também destaca o não cabimento de nova publicação para o fim de se ampliar o quantitativo de dispositivos vetados, pois não se admitem correções às leis que não sejam de revisão, em relação à letra do projeto que foi à sanção. Concluiu-se, assim, que os novos vetos do Presidente da República à Lei 14.019/2020 descumpriram preceitos fundamentais relativos ao processo legislativo constitucional.
30 CPR, GI, Q. 09. III. Se uma lei é apenas formalmente complementar, mas materialmente ordinária, não há que se falar em superioridade hierárquica em relação a uma lei ordinária, o que somente ocorreria se se cuidasse a primeira de lei formal e materialmente complementar (FALSO) IV. - No processo de aprovação de lei complementar, são cumpridos e superados todos os requisitos indispensáveis à aprovação válida de lei ordinária, daí resultando sua superioridade hierárquica em relação à lei ordinária. (FALSO)
30 CPR, GI, Q. 10. II. Em respeito ao princípio da separação dos poderes, quando não caracterizado o desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo, é defeso ao Poder Judiciário exercer o controle jurisdicional em relação à interpretação do sentido e do alcance de normas meramente regimentais das Casas Legislativas, por se tratar de matéria “interna corporis” (CORRETO)
Processo de incorporação dos tratados internacionais. Segundo Portela, “o direito internacional não vincula apenas no âmbito internacional, regulando somente as relações entre Estados e organizações internacionais, mas também obriga no âmbito interno dos entes estatais. A execução das normas internacionais é facilitada a partir de sua incorporação ao Direito interno, também conhecida como “internalização”, que é o processo pelo qual os tratados passam a também fazer parte do ordenamento jurídico nacional dos entes estatais”. “A jurisprudência reconhece que o procedimento de internalização do tratado no Brasil é complexo, como evidencia a seguinte ementa: “o exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do CN, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe – enquanto Chefe de Estado que é da competência para promulgá-los mediante decreto” (ADI-MC 1480/DF, rel. Min. Celso de Mello, 18.05.01)”. 
Assim, “o primeiro passo após a assinatura do tratado é a preparação de uma Exposição de Motivos, dirigida ao PR pelo MRE (Ministro das Relações Exteriores), dando ciência da assinatura do ato internacional e pedindo o encaminhamento do acordo ao CN, para fins de providenciar sua eventual ratificação. No CN, o tratado será examinado na CD e, em seguida, no SF. A discussão da matéria envolverá as comissões competentes das duas Casas e votação no plenário de cada uma delas, em turno único, devendo sua aprovação seguir os termos do art. 47 da CF”. Ou, ainda, ser aprovado por 3/5, em dois turnos, se seguir o rito do art. 5⁰, §3⁰, da CF, nos tratados de direitos humanos. “Aprovado o acordo, o Presidente do Senado emitirá um Decreto Legislativo, que aqui consiste em mero instrumento de encaminhamento do tratado ao PR, a quem cabe decidir sobre a ratificação. Nesta hipótese (aprovação), o DL não tem o efeito de ordenar (ao PR) o cumprimento do tratado.
 Caso o CN não aprove o ato internacional, o PR fica impossibilitado de ratificá-lo, sob pena de violação ao livre exercício do Poder Legislativo (CF, art. 85, II). Por fim, quando o tratado entrar em vigor no âmbito internacional, o PR pode concluir o processo de incorporação por meio da promulgação, ato pelo qual ordena a publicação do acordo e sua execução em território nacional. A promulgação é feita por meio de Decreto, publicado no DOU”. Por último, “quanto à hierarquia, os tratados de direitos humanos internalizados antes da vigência da EC 45/04, sem o quórum qualificado do CN de 3/5, em dois turnos de votação, consoante entendimento do STF (RE 466.343), têm status supralegal, estando abaixo da égide Constitucional e acima da lei infraconstitucional.
 Os tratados de direitos humanos internalizados após a EC 45/04 e sob o rito qualificado do art. 5⁰, §3⁰, da CF, têm equivalência à norma constitucional em sentido formal e material”. Por sua vez, tratando-se de acordo internacional cuja matéria seja diversa do tema “direitos humanos”, sua hierarquia, após internalização ao ordenamento pátrio, terá status de lei ordinária. Já que “o Excelso Pretório tem adotado o sistema paritário ou monismo moderado, segundo o qual tratados e convenções internacionais têm status de lei ordinária.
Jurisprudência – frases.
· A prerrogativa do poder de veto presidencial somente pode ser exercida dentro do prazo expressamente previsto na Constituição, não se admitindo exercê-la após a sua expiração.
· A previsão regimental de um regime de urgência que reduza as formalidades processuais em casos específicos, reconhecidos pela maioria legislativa, não ofende o devido processo legislativo.
· Não há vício de iniciativa de lei na edição de norma de origem parlamentar que proíba a substituição de trabalhador privado em greve por servidor público.
· É inconstitucional norma de Constituição estadual que preveja quórum diverso de 3/5 dos membros do Poder Legislativo para aprovação de emendas constitucionais.
· É inconstitucional lei de origem parlamentar que institui regra de reserva de vagas de estacionamento aos órgãos públicos estaduais.
· O Poder Legislativo pode emendar projeto de lei de conversão de medida provisória quando a emenda estiver associada ao tema e àfinalidade original da medida provisória.
· É inconstitucional, formal e materialmente, norma estadual que permite a participação de trabalhadores inativos no sufrágio para a escolha de membros da diretoria de empresa pública.
· Durante a pandemia da Covid-19 ficou reconhecido que as medidas provisórias podem ser instruídas perante o plenário das Casas, ficando excepcionalmente autorizada a emissão de parecer por um deputado e um senador, em substituição à Comissão Mista.
· Não caracteriza afronta à vedação imposta pelo art. 62, § 1º, IV, da CF a edição de MP no mesmo dia em que o Presidente sanciona ou veta projeto de lei com conteúdo semelhante.
· É formalmente constitucional lei complementar — cujo processo legislativo teve origem parlamentar — que contenha regras de caráter nacional sobre a aposentadoria de policiais. É constitucional a adoção — mediante lei complementar — de requisitos e critérios diferenciados em favor dos policiais para a concessão de aposentadoria voluntária. STF. Plenário. ADI 5241/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/8/2021 (Info 1027).
· Não se pode declarar a inconstitucionalidade formal da lei sob o argumento de que houve mero descumprimento das regras do regimento interno, sendo indispensável o desrespeito às normas constitucionais que tratam sobre o processo legislativo.
· Não há inconstitucionalidade formal no fato de a lei ter sido aprovada pelo Congresso Nacional por meio de votação virtual em razão da pandemia da Covid-19.
· Não é possível republicar uma lei já sancionada, promulgada e publicada para incluir novos vetos, ainda que sob o argumento de que se trata de mera retificação da versão original.
· É inconstitucional norma de iniciativa parlamentar que preveja a criação de órgão público e organização administrativa.
· É possível o controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência para a edição de medidas provisórias, no entanto, esse exame é de domínio estrito, somente havendo a invalidação quando demonstrada a inexistência cabal desses requisitos.
· A Constituição estadual só pode exigir lei complementar para tratar das matérias que a Constituição Federal também exigiu lei complementar.
· A CF/88 prevê expressamente que é vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada.
· 
7B. União Federal: competência e bens.
Igor Lima
Tácito Coaracy
I. Introdução 
Segundo Novelino, “fruto de uma aliança entre Estados, a União é uma pessoa jurídica dotada de capacidade política existente apenas em Estados federais. Possui competência para atuar em nome próprio e em nome da federação. A União, pessoa jurídica de direito público interno, não se confunde com a República Federativa do Brasil, que é uma pessoa jurídica de direito público internacional formada pela união dos Estados, DF e Municípios. Por fim, a União, assim como os demais entes que compõem a federação brasileira, possui apenas autonomia, apesar de exercer as atribuições decorrentes da soberania do Estado brasileiro”.
II. Competência 
“A competência consiste na capacidade jurídica de agir atribuída aos entes estatais, seja para editar normas primárias capazes de inovar o ordenamento jurídico (competências legislativas), seja para executar atividades de conteúdo individual e concreto, previstas na lei, voltadas à satisfação do interesse público (competências administrativas)”. Vejamo-las:
a) Competência administrativa (competência não legislativa ou competência material): “A sistemática de repartição de competências administrativas seguiu fielmente o modelo dualista norte-americano, adotando como base o princípio da execução direta pela pessoa competente para legislar sobre o tema. Dentre as competências enumeradas, a União possui duas espécies de competências administrativas: 
i) comum (cumulativa ou paralela): exercida pela União, Estados, DF e Municípios (CF, art. 23); 
ii) exclusiva: exercitável somente pela União, abrange temas que envolvem o exercício soberano, ou que, por motivo de segurança ou eficiência devem ser objeto de atenção do governo central (CF, art. 21)”.
b) Competência legislativa: competência para elaboração de leis. Subdivide-se em: 
i) privativa: Prevista no art. 22 da CF, pode ser objeto de delegação. “Inspirada no modelo germânico, a Constituição permitiu que a União, por LC, autorize os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias de sua competência privativa”, conforme parágrafo único de citado artigo; 
ii) concorrente: prevista no art. 24, CRFB. Estabelece um “condomínio legislativo” enrte a União e os Estados-membros, cabendo àquela legislar sobre normas gerais e a esses legislarem sobre normas específicas, suplementando as normas gerais. Em caso de inércia da União e ausência de normas gerais, os Estados-membros poderão exercer competência plena, legislando sobre normas gerais e específicas. Se a União elaborar as normas gerais, as normas estaduais que forem contrárias às normas gerais ficarão suspensas; 
iii) competência tributária expressa: art. 153, CRFB; 
iv) competência tributária residual: art. 154, I, CRFB; 
v) competência tributária extraordinária: art. 154, II, CRFB. 
III. Bens da União 
Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei;
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;
IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, II;
IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;
V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;
VI - o mar territorial;
VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;
VIII - os potenciais de energia hidráulica;
IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;
X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos;
XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.
§ 1º É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.
§ 1º É assegurada, nos termos da lei, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração. 
§ 2º A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei. (a faixa de fronteira não é bem público).
Aduz Novelino que, “os bens públicos pertencentes à União podem ser agrupados em três categorias: 
i) bens de uso comum – permitem o livre acesso e a utilização de todos; 
ii) bens de uso especial – destinam- se à utilização da AP e ao funcionamento do governo federal;
iii) bens dominicais – são aquelespassíveis de alienação, já que não afetos a nenhum interesse público. Tais bens estão relacionados no art. 20 da CF, tais como, os recursos naturais da plataforma continental e da ZEE; o mar territorial; as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos; as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”. Quanto às terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas, decidiu o STF que a destruição de acessões nelas feitas pode configurar crime de dano qualificado (art. 163, par. único, III, CP) (STF. 2ª Turma. Inq 3670/RR).
IV. Jurisprudência e Súmulas de relevo
-> Lei estadual que disponha sobre bloqueadores de sinal de celular em presídio invade a competência da União para legislar sobre telecomunicações. STF. Plenário. ADI 3835/MS;
-> É INCONSTITUCIONAL lei estadual que prevê prazos máximos para que as empresas de planos de saúde autorizem exames médicos aos usuários. Isso porque se trata de lei que dispõe sobre direito civil, direito comercial e política de seguros, matérias que são de competência da União (art. 22, I e VII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 4701/PE;
-> É INCONSTITUCIONAL norma da Constituição Estadual que disponha as atribuições para a defesa dos direitos e interesses das populações indígenas. Isso porque somente a União pode legislar sobre a matéria, conforme determina o art. 22, XIV, da CF/88. STF. 1ª Turma. ADI 1499/PA;
-> É INCONSTITUCIONAL lei estadual que exija Certidão negativa de Violação aos Direitos do Consumidor dos interessados em participar de licitações e em celebrar contratos com órgãos e entidades estaduais. Esta lei é inconstitucional porque compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratos (art. 22, XXVII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 3.735/MS;
-> A lei estadual que trata sobre revalidação de títulos obtidos em instituições de ensino superior dos países membros do MERCOSUL afronta o pacto federativo (art. 60, §4º, I, da CF/88) na medida em que usurpa a competência da União para dispor sobre diretrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV). STF. Plenário. ADI 5341 MC;
-> A União não tem legitimidade passiva em ação de indenização por danos decorrentes de erro médico ocorrido em hospital da rede privada durante atendimento custeado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). De acordo com a Lei 8.080/90, a responsabilidade pela fiscalização dos hospitais credenciados ao SUS é do Município, a quem compete responder em tais casos. STJ. 1ª Seção. EREsp 1.388.822-RN;
-> A EC 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da Constituição Federal, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas costeiras sede de Municípios. STF. Plenário. RE 636199/ES.
-> A competência privativa da União para a edição de normas gerais sobre inatividades e pensões das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares (artigo 22, XXI, da Constituição, na redação da Emenda Constitucional 103/2019) não exclui a competência legislativa dos Estados para a fixação das alíquotas da contribuição previdenciária incidente sobre os proventos de seus próprios militares inativos e pensionistas, tendo a Lei Federal 13.954/2019, no ponto, incorrido em inconstitucionalidade. STF. Plenário. RE 1.338.750/SC, Rel. Luiz Fux, julgado em 21/10/2021 (Repercussão Geral – Tema 1.177).
-> A União deve prestar suporte técnico e apoio financeiro para a expansão da rede de UTI’s nos estados durante o período de emergência sanitária. STF. Plenário. ACO 3473/DF, ACO 3474/SP, ACO 3475/DF, ACO 3478/PI e ACO 3483/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgados em 10/11/2021 (Info 1037).
-> É formalmente inconstitucional norma federal que concede anistia a policiais e bombeiros militares estaduais por infrações disciplinares decorrentes da participação em movimentos reivindicatórios por melhorias de vencimentos e de condições de trabalho. A União possui competência para legislar concedendo anistia para crimes. A anistia de infrações disciplinares cometidas por servidores estaduais deve ser concedida pelos próprios entes estaduais tendo em vista a autonomia que caracteriza a Federação brasileira. Quanto aos bombeiros e policiais militares, a competência estadual é realçada nos arts. 42 e 144, § 6º, da CF/88. STF. Plenário. ADI 4869/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 27/5/2022 (Info 1056).
-> É inconstitucional lei federal, de iniciativa parlamentar, que veda medida privativa e restritiva de liberdade a policiais e bombeiros militares dos estados, dos territórios e do Distrito Federal. STF. Plenário. ADI 6595/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/5/2022 (Info 1055).
-> É inconstitucional a lei estadual que proíbe utilização de pontos na renovação da CNH. Fere a competência legislativa reservada à União para editar normas sobre trânsito (art. 22, XI, da CR) lei estadual que discipline contagem de pontos em Carteira Nacional de Habilitação (CNH), para fins de suspensão ou cassação do direito de dirigir. STF. Plenário. ADI 5.482/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 24/08/2020 (Info 991).
-> É inconstitucional lei estadual que discipline a instalação de antenas transmissoras de telefonia celular. É inconstitucional Lei estadual que, a pretexto de proteger a saúde da população, estabelece limites de radiação para a instalação de antenas transmissoras de telefonia celular. Essa lei adentra na esfera de competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações. STF. Plenário. ADI 2902, Rel. Edson Fachin, julgado em 04/05/2020 (Info 981 – clipping).
-> Além da União, os Estados/DF e Municípios também podem adotar medidas de combate ao coronavírus considerando que a proteção da saúde é de competência concorrente; o Presidente pode definir as atividades essenciais, mas preservando a autonomia dos entes. STF. Plenário. ADI 6341 MC-Ref/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgado em 15/4/2020 (Info 973).
-> É CONSTITUCIONAL lei estadual que obriga as prestadoras do serviço de Internet móvel e de banda larga a apresentar, na fatura mensal, gráficos informando a velocidade diária média de envio e de recebimento de dados entregues no mês. STF. Plenário. ADI 5572, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 23/08/2019.
-> É inconstitucional lei estadual que crie hipóteses de isenção de pagamento de direitos autorais fora do rol trazido pela Lei federal nº 9.610/98. É inconstitucional lei estadual que isenta entidades filantrópicas de recolher as taxas de retribuição autoral arrecadadas pelo ECAD. STF. Plenário. ADI 5800/AM, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 8/5/2019 (Info 939).
-> Os Municípios, ao editarem as leis locais regulamentando o transporte de passageiros mediante aplicativo, deverão observar as regras impostas pela Lei federal nº 13.640/2018. STF. Plenário. ADPF 449/DF, Rel. Min. Luiz Fux; RE 1054110/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 8 e 9/5/2019 (repercussão geral) (Info 939).
-> Lei estadual que fixa piso salarial profissional violando os requisitos da LC federal 103/2000 é considerada inconstitucional por ofensa ao art. 22, I e parágrafo único da CF/88. A competência para editar lei fixando o piso salarial das categorias profissionais (art. 7º, V, da CF/88) é privativa da União por se tratar de direito do trabalho (art. 22, I). STF. Plenário. ADI 5344 MC/PI, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 11/10/2018 (Info 919).
-> Viola a CF/88 lei municipal que proíbe o transporte de animais vivos no Município. STF. Plenário. ADPF 514 e ADPF 516 MC-REF/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 11/10/2018 (Info 919).
-> É INCONSTITUCIONAL lei estadual que proíba a comercialização, no referido Estado-membro, de produtos importados que não tenham sido submetidos à análise de resíduos químicos de agrotóxicos. Isso porque essa lei trata sobre comércio exterior, matéria cuja competência é privativa da União, nos termos do art. 22, VIII, da CF/88. STF. Plenário. ADI 3813/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 12/2/2015 (Info 774).
SV 2: É inconstitucional a lei ou ato normativo estadualou distrital que disponha sobre sistema de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias. 
SV 38: É competente o município para fixar horário de funcionamento de estabelecimento comercial;
SV 39: Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar do Distrito Federal;
SV 46: A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.
SV 49: ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.
7C. Os Princípios gerais de direito.
Igor Lima Goettenauer de Oliveira
Atualizado por Valmir Chaves de O. Neto (2023)
I. Introdução
Nas palavras de Chaves e Rosenvald, “toda vez que o intérprete não localizar no sistema jurídico norma aplicável ao caso concreto, verifica-se uma lacuna que necessita de preenchimento, colmatação. É que tem guarida entre nós a vedação ao non liquet. A própria lei (LINDB, art.4⁰), partindo da real possibilidade de omissão normativa, indica os meios pelos quais serão supridas as lacunas”. Note-se que, “a integração das normas serve para colmatar as lacunas do sistema, mas não tem caráter normativo (obrigatório), não vinculando outras decisões em casos análogos”. 
 
II. Princípios gerais de direito 
Os princípios gerais de direito, classificados como princípios monovalentes segundo Miguel Reale em seu livro Lições preliminares de Direito, “são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico em sua aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas”. Ou, nas palavras de Francisco Amaral, “são as formulações gerais do ordenamento jurídico, alinhavando pensamentos diretores de uma regulamentação jurídica, que como diretrizes gerais e básicas, fundamentam e dão unidade a um sistema ou a uma instituição”.
Chaves e Rosenvald afirmam ainda que, “apesar de seu caráter abstrato, indeterminado, é de se notar que os princípios realizam importante função positiva, influindo na formulação de determinadas decisões, além da induvidosa função negativa, impedindo decisões contrárias a seus postulados fundamentais”.
“Dos velhos princípios gerais do Direito Romano (suun cuique tribuere, honeste vivere e neminem laedere, isto é, dar a cada um o que é seu, viver honestamente e não lesar ninguém) extrai-se um substrato mínimo do que o ordenamento reputa fundamental em termos axiológicos, independentemente de expressa previsão legal. São os chamados princípios informativos que inspiram todo o sistema jurídico sem prender-se ao texto normativo”.
Conforme trecho de decisão do STF (RExtr nº 160.381- SP, Rel. Min. Marco Aurélio), citada no livro de Alexandre de Moraes (2017, p. 479), “Os princípios gerais de direito existem por força própria, independentemente de figurarem em texto legislativo. E o fato de passarem a figurar em texto constitucional ou legal não lhes retira o caráter de princípio.”
Ressalte-se que Daniel Sarmento possui uma posição diferente da doutrina convencional, pois não entende os princípios gerais do direito como meios de colmatação de lacunas, mas que “os princípios jurídicos – inclusive aqueles implícitos, de caráter mais abstrato, geralmente identificados como “princípios gerais de Direito” – são autênticas normas jurídicas. Portanto, quando eles incidem, não há lacuna.” (SARMENTO, 2012, p. 438).
Por fim, retornando à visão convencional e majoritária, “a previsão para a aplicação dos princípios gerais de direito, na omissão da lei, vem encartada em diversos ordenamentos jurídicos, como no Direito português (CC, art. 1⁰), no Direito espanhol (CC, art. 1⁰) e no Direito argentino (CC, art. 16)”.
8A. Poder constituinte estadual: autonomia e limitações.
Jorge Neto
O Poder Constituinte Derivado Decorrente é aquele que, decorrendo do originário, não se destina a rever a sua obra, mas a institucionalizar as organizações políticas regionais (Estados membros), divide-se em: 
1. Poder Constituinte Decorrente Institucionalizador: é o poder de criação da Constituição Estadual. A rigor, trata-se de um poder derivado, subordinado e condicionado, devendo obedecer às normas fixadas (limites) na CF/88, quais sejam:
1.1. Princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII, da CF/88): forma republicana; sistema representativo; regime democrático; direitos da pessoa humana; autonomia municipal; prestação de contas da administração pública, direta e indireta; e aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. Seu descumprimento autoriza a intervenção federal;
1.2. Princípios federais extensíveis: são normas centrais comuns à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, de observância obrigatória e que percorrem toda a Constituição. Ex.: arts. 1º, 4º e 5º, da CF/88;
1.3. Princípios constitucionais estabelecidos: são normas espalhadas pelo texto constitucional responsáveis por organizar a Federação. Ex.: normas de competência e normas de reprodução obrigatória.
1.4. Princípio da simetria: Parte da doutrina critica a excessiva aplicação do princípio da simetria pela jurisprudência do STF. Nesse sentido, o Min. Peluso pontuou que a aplicação dessa regra de simetria deve se pautar por uma justificação idônea, sob pena de descaracterizar a própria estrutura federativa que lhe é inerente (ADI-MC 4.298/TO). É entendimento consolidado do STF de que o Estado-membro não pode criar procedimento mais rigoroso do que o previsto na Constituição Federal para a emenda de suas Constituições (27º CPR).
2. Poder Constituinte Decorrente Reformador: é o poder de reforma da Constituição Estadual. Aplica-se, mutatis mutandis, o mesmo que foi dito sobre o Poder Constituinte Derivado Reformador (ponto 6.a).
A doutrina majoritária entende que, nos Municípios, não há PCDD, pois eles possuem Lei Orgânica, a qual não possui natureza constitucional. Existe corrente minoritária que defende que a Lei Orgânica tem natureza constitucional, havendo a seguinte divisão do Poder Constituinte:
1. Poder Constituinte de 1º Grau: Constituição Federal;
2. Poder Constituinte de 2º Grau: Constituição Estadual, o qual deve observância à CF;
3. Poder Constituinte de 3º Grau: Lei Orgânica, a qual deve observância à CF e à CE.
Em relação ao Distrito Federal, este também se organiza mediante Lei Orgânica. Todavia, trata-se de Lei Orgânica peculiar, uma vez que abrange tanto matéria de Constituição Estadual como de Lei Orgânica municipal. No ponto referente a matérias de Constituição Estadual, a Lei Orgânica do Distrito Federal tem natureza constitucional.
8B. Política Agrária na Constituição. Desapropriação para Reforma Agrária.
Priscila Ianzer Jardim Lucas[footnoteRef:6] [6: Legislação: CF, arts. 184-191; Lei nº 4.504/64. Bibliografia: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/temas-de-atuacao/reforma-agraria/questao-fundiaria/atuacao-do-mpf/representacao-ao-pgr-adi-lei-13465-2017.
] 
Alexandre Benardis
Política agrária e agrícola na Constituição: A política agrária engloba a política agrícola. Nesta, há maior predominância de interesses econômicos. Aquela possui uma perspectiva mais social, tratando de questões trabalhistas e previdenciárias no campo. Segundo o art. 1º, § 2º, da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra) “entende-se por política agrícola o conjunto de providências de amparo à propriedade da terra, que se destinem a orientar, no interesse da economia rural, as atividades agropecuárias, seja no sentido de garantir-lhes o pleno emprego, seja no de harmonizá-las com o processo de industrialização do país”. A CF/88 alargou o conceito de política agrícola, aduzindo que, no planejamento agrícola, incluem-se as atividades agroindustriais, agropecuárias, pesqueiras e florestais (art. 187, § 1º). A CF optou pela expressão agrícola, evidenciando o eixo econômicoda relação do homem no campo. A doutrina critica esta denominação, tendo em vista que o direito que regula estas relações possui fortes contornos sociais. A reforma agrária é o principal instrumento da política agrícola, pois atua sob um eixo econômico, bem como sob um eixo social. A reforma agrária é “o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição de terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade” (art. 1º, § 1º, do Estatuto da Terra).
Instrumentos da Política Agrária: Além da reforma agrária, que configura o principal instrumento da política agrícola, compõe instrumentos da política agrária: os instrumentos creditícios e fiscais; os preços compatíveis com os custos de produção e a garantia de comercialização; o incentivo à pesquisa e à tecnologia; a assistência técnica e extensão rural; o seguro agrícola; o cooperativismo; a eletrificação rural e irrigação; a habitação para o trabalhador rural. Cumpre salientar que esses instrumentos constitucionais previstos no art. 187 não são taxativos, apenas garantem a implementação mínima do projeto constitucional de política agrícola. 
Princípios da Política Agrária:
Princípio da função social da propriedade: a função social é o centro gravitacional do estudo da propriedade no direito moderno. A CF trata da função social em seu art. 186 e para estar caracterizada deve preencher todos os requisitos constantes naquele dispositivo: I) aproveitamento racional e adequado da terra: para ser atingido, devem ser atendidos níveis fixados pelo órgão responsável quanto à eficiência na exploração e o grau de utilização da terra. (obs: não são consideradas áreas aproveitáveis no cálculo do grau de utilização da terra as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação ambiental); II) adequada utilização dos recursos naturais e da preservação do meio ambiente: tem por finalidade o respeito à vocação natural da terra, através da manutenção do seu potencial produtivo; III) observância às normas relativas às relações de trabalho: possuem abrangência elástica, pois permitem a inclusão de relações de emprego e de contratos agrários (parceria e arrendamento): IV) bem estar dos proprietários (ou possuidores) e dos trabalhadores: está ligado à dignidade da pessoa humana. É cumprido pelo atendimento das necessidades básicas dos que trabalham na terra, pela observância das normas de segurança do trabalho e por não provocar conflitos e tensões sociais no imóvel. Assim, a função social na CF tem uma perspectiva econômica, social e ecológica. Eros Grau destaca que o princípio da função social da propriedade “passa a integrar o conceito jurídico-positivo da propriedade”. No mesmo sentido, Kildare Gonçalves Carvalho, para quem “a propriedade, sem deixar de ser privada, se socializou, com isso significando que deve oferecer à coletividade uma maior utilidade, dentro da concepção de que o social orienta o individual.” A ressignificação do instituto altera, por sua vez, a relação proprietário/propriedade. É ainda de Eros Grau a seguinte lição: “O que mais releva enfatizar, entretanto, é o fato de que o princípio da função social da propriedade impõe ao proprietário o dever de exercê-lo em benefício de outrem e não, apenas, de não o exercer em prejuízo de outrem. Isso significa que a função social da propriedade atua como fonte da imposição de comportamentos positivos – prestação de fazer, portanto, e não meramente, de não fazer - ao detentor do poder que deflui da propriedade.” Seguindo também essa compreensão, e mais forte na perspectiva ambiental, Álvaro Luiz Valery Mirra destaca que “a função social e ambiental não constitui um simples limite ao exercício de direito de propriedade, como aquela restrição tradicional, por meio da qual se permite ao proprietário, no exercício de seu direito, fazer tudo que não prejudique a coletividade e o meio ambiente. Diversamente, a função social e ambiental vai mais longe e autoriza até que se imponham aos proprietários comportamentos positivos, no exercício de seu direito, para que a sua propriedade concretamente se adeque à preservação do meio ambiente”.
Princípio da justiça social: é a justiça distributiva. A política agrária visa à alteração da estrutura fundiária vigente.
Princípio da prevalência do interesse coletivo sobre o individual: A política agrária é composta por normas cogentes de forte interferência no domínio privado.
Princípio da reformulação da estrutura fundiária: É base da política agrícola, permitindo ao Estado uma série de programas para alteração do homem no campo. Há órgãos específicos para cuidar desta reformulação. Ex: INCRA e Ministério da Reforma Agrária.
Princípio do progresso econômico e social: visa ao aumento da produtividade da propriedade rural, garantindo uma melhoria das condições de vida do proprietário/possuidor e um aumento na produção primária do país.
Regularização fundiária rural: A Constituição de 1988 é explícita quanto à necessidade da alteração da estrutura fundiária do país, marcada por acentuada concentração da terra. De acordo com o texto constitucional, a reforma agrária deve ser feita mediante a desapropriação de imóveis rurais que descumpram a função social da propriedade (art. 184) ou pela destinação de terras públicas ou devolutas (art. 188). O investimento constitucional na reforma agrária tem um claro propósito: a estreita ligação entre reforma agrária/moradia/dignidade/justiça social e igualdade. De resto, a Constituição brasileira também relaciona diretamente política agrícola e direito à moradia em seu art. 187, VIII. Um dos principais obstáculos à realização desse direito é o fato de se considerar a moradia, a terra e a propriedade como produtos comercializáveis, e não direitos humanos. A exemplo do que ocorre com os demais direitos fundamentais, há, na reforma agrária, uma dimensão subjetiva e outra objetiva. No primeiro caso, ela concretiza o direito à moradia e, em consequência, densifica o princípio da dignidade da pessoa humana. No segundo, ela realiza os objetivos que a Constituição coloca para o Estado brasileiro, de construir uma sociedade livre, justa e solidária, de erradicar a pobreza e a marginalização e de reduzir as desigualdades sociais. Por essa razão, o art. 188 da CF estabelece que “a destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária”. Tal dispositivo busca assegurar que: (i) a destinação de terras públicas e devolutas não se faça em prejuízo da população do campo que aguarda a implementação do direito à moradia; (ii) haja democratização do acesso à terra, desconcentrando a estrutura fundiária brasileira; e (iii) a produção agrícola se diversifique, como garantia de alimentação adequada a todos os brasileiros e brasileiras.
Desapropriação para reforma agrária: Nos moldes do definido no art. 184 da CF, compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação. A desapropriação, judicial ou extrajudicialmente, é executada pelo INCRA, autarquia federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Determina o art. 184, § 5º, da CF que são isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. Segundo o STF, a isenção deve ser entendida como imunidade e tem por fim não onerar o procedimento expropriatório ou dificultar a realização da reforma agrária. Ademais,

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