Prévia do material em texto
EssOES
Alresen
Itokugo)
Man ente
em
cun cati MonquiLOGole
CEO EV. esta c
o especialista
aIS na area (
nes, represe.
A present
dos. além
'ama da é
comeijíks d Ous [olulsiltoatgIOCS
'ata.
anatomia da larin
ceito e a classific.
■ Memoihkinc ruam/a. doadkjposonooibna éfnoiaitakaga-cqpeseifin omvez
ora
CSCI
raxgptoGanvoyziTSzaSHL,
Lons lkrmasolb@omin
me
CIISIIK UDEI10
ixo
kydkalv./MrzdlsmaiG.fzvzjpndktsonpd@lae@dlPeacufeIfo*t@esSynaselinananar—IpSF,sShn
ClIli
150) 1B51414 oindlogb IPSE, moad 110)9)7 fomingnle@gíjo DDx Danoloncs Idlagemás
sGtgzaddhSrkadlólslBbenalkana@lflaakyolkygm@Woylustoemodk1l999, 1 '__s
VOX.
0 Livro do
Especialista
mamorepreo
0 Livro do
Especialistai
Volume I
Organizadora
Mara Behlau
Fonoaudióloga Especialista em Voz pelo CFFa
Diretora do Centro de Estudos da Voz (CEV), São Paulo
Coordenadora Didático-Científica e Professora do Curso de Especialização em
Voz do Centro de Estudos da Voz (CECEV), São Paulo
Curso de Especialização em Distúrbios da Comunicação Humana pela
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Mestra e Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina (UNIFESP-EPM)
Pós-Doutoramento na University of California San Francisco (UCSF), Califórnia - EUA
REVINTER
Voz: 0 Livro do Especialista - Volume 1
Copyright © 2001, reimpressões 2004 e 2008, by Livraria e Editora Revinter Ltda.
ISBN 85-7309-525-3
Todos os direitos reservados.
É expressamente proibida a reprodução
deste livro, no seu todo ou em parte,
por quaisquer meios, sem o consentimento
por escrito da Editora.
Revisão Técnico-Científica
Marina Padovani
Fonoaudióloga
Denise Knopp
Fonoaudióloga
Mara Behlau
E-mail: mbehlau@uol.com.br
A responsabilidade civil e criminal, perante terceiros e perante a Editora Revinter,
sobre a conteúdo total desta obra, incluindo as ilustrações e autorizações/créditos
correspondentes, é do(s) seu(s) autor(es).
Livraria e Editora REVINTER Ltda.
Rua do Matoso, 170-Tijuca
20270-135 - Rio de Janeiro - RJ
Tel.: (21) 2563-9700- Fax: (21) 2563-9701
livraria@revinter.com.br - www.revinter.com.br
Ao Reinaldo,
amor da minha vida,
um amor intocado,
por me dar o que eu nunca tive.
mailto:mbehlau@uol.com.br
mailto:livraria@revinter.com.br
http://www.revinter.com.br
Indubitavelmente, não existe alguém melhor e nem mais qualificado que a Dra. Mara Behlau
para escrever e editar em dois volumes a obra Voz: 0 Livro do Especialista. Em minha opinião, a
Dra. Mara Behlau criou e desenvolveu o melhor curso de especialização do Brasil na área de voz.
Sempre acompanhada por excelentes profissionais, médicos e fonoaudiólogos, formou um grupo
de atuação clínica, ensino e pesquisa invejáveis.
Apesar de este livro ter sido escrito especialmente para o Curso de Especialização em Voz do
Centro de Estudos da Voz - CECEV -, o conteúdo apresentado certamente será muito útil e enri-
quecedor para todos os profissionais da área, especialmente para os otorrinolaringologistas, fo
noaudiólogos e professores de técnica vocal, estudantes e profissionais experientes.
O Volume I foi organizado de forma a oferecer conceitos e informações básicas e essenciais
sobre o funcionamento vocal, a fim de capacitar o leitor para estudos mais avançados na área de
voz. Com o domínio destes conceitos e informações, o leitor estará preparado para compreender
o real significado de uma disfonia, realizando uma avaliação vocal completa, explorando as mais
diversas classificações e analisando as diferentes categorias etiológicas. Além disso, o leitor pode
rá analisar aspectos extremamente importantes da clínica vocal, como, por exemplo, o comporta
mento vocal e suas consequências. Já o Volume II trata das disfonias orgânicas, das vozes profis
sionais, da fonocirurgia e, de modo particular, aprofunda os mais variados aspectos da reabilitação
fonoaudiológica.
Cada capítulo é exaustivamente explorado, apresentando uma revisão bibliográfica densa e
considerações específicas sobre a atuação fonoaudiológica na clínica vocal. Um outro aspecto a
ser ressaltado é que, além da bibliografia absolutamente ampla e completa, este livro traz, tam
bém, resumos das publicações mais importantes e interessantes de cada assunto explorado. Este
perfil tão particular da Dra. Mara Behlau leva o leitor a compreender as complexas inter-relações
da voz humana, na visão de outros autores.
Esta obra é uma contribuição singular para a literatura acadêmica da área de voz e, com certe
za, fará parte da biblioteca dos profissionais que atuam na área, pois o seu conteúdo é completo,
complexo, bem elaborado e, principalmente, de fácil compreensão. É uma honra e um enorme
prazer, para mim, poder recomendar este livro. É uma pena que, infelizmente, ele não foi escrito
em inglês!
Janina Casper, Ph.D.
Professora Livre-Docente do Otolaryngology & Communication
Sciences Department, SUNNY Health Science Center, Upstate Medicai University,
em Syracuse, New York, dos Estados Unidos da América
A formação do especialista é uma necessidade inquestionável na Fonoaudiologia e reflete o
avanço desta ciência no Brasil. A formação profissional nos cursos de graduação, embora
considerada uma das melhores do mundo, não preenche todas as necessidades do fonoaudiólogo
que quer dedicar-se ao complexo estudo da laringe e da voz humana. As interfaces com a medici
na, psicologia, acústica, informática e artes exigem uma formação multidisciplinar e um amadure
cimento pessoal que somente o estudo e a vivência clínica podem oferecer.
O Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CECEV - vem formando
especialistas desde o início da década de 1990, procurando favorecer a formação de profissionais
competentes, atualizados e com mente crítica, qualidades que considero essenciais para a sobre
vivência da nossa profissão. Em seu percurso, o CECEV sofreu profundas modificações, culminan
do na elaboração de apostilas que pudessem refletir dois aspectos, em princípio controversos: a
necessidade de obtenção de conhecimento e a dificuldade de atualização do fonoaudiólogo brasi
leiro (considerando-se as questões particulares da nossa cultura e língua, assim como as especifi
cidades da formação profissional em nosso País).
Desenvolver esta obra a partir do que é ensinado no CECEV foi meu eixo diretor. Ao mesmo
tempo, possibilitar que os leitores tivessem acesso, de modo rápido e imediato, a outras publica
ções, inclusive com idéias discordantes das minhas, era uma questão de honra. Sendo assim, cada
capítulo foi desenvolvido apresentando um texto central e uma sessão complementar, denomina
da De Boca em Boca. Para essa sessão foram elaborados resumos de textos, artigos, capítulos de
livros, monografias e teses, os quais permitem ao leitor buscar dados do seu interesse, em outras
fontes, e desenvolver uma inquietação básica que conduz ao avanço do conhecimento. Resolvi
acrescentar, também, ao final de cada capítulo, uma sessão de leituras e sítios recomendados.
Várias obras são insubstituíveis e, por mais que se procure passar a informação que nelas se
encontra, a leitura do original é essencial. Quanto aos dados on-line, a enxurrada de páginas de
pouco valor ou qualidade duvidosa faz com que o usuário da internet desanime ou não encontre
sítios realmente úteis e atraentes. Assim sendo, os sítios recomendados são endereços extensiva
e cuidadosamente selecionados.
Evidentemente, esta não é uma obra de um autor, mas o resultado de um trabalho conjunto de
amor e dedicação, com longas e intermináveis reuniões, alternadas por sessões de discussão e es
tresse geral.
Acredito que meu maior mérito está na seleção dos professores do CEV e co-autores deste
livro. A eles o meu profundo reconhecimento e minha admiração eterna. Inicialmente, neste pri
meiro volume, agradeço a dedicação dos médicos Paulo Pontes e Osiris do Brasil. Paulo é parceiro
de longa data, professor e mestre querido, que, com sua capacidadee indignação, não poupou
esforços para a reestruturação da otorrinolaringologia e da fonoaudiologia na área de laringe e
voz. Osíris é um parceiro mais recente, que representa tudo o que um otorrinolaringologista
moderno e sem medo de trabalhar em equipe deveria ter: conhecimento e respeito para com os
colegas associados. Às queridas colegas e amigas, parceiras de lutas pessoais e na fonoaudiologia,
meu inesgotável carinho e apoio total: Renata Azevedo, Glaucya Madazio e Deborah Andrade.
Renata é especial em tudo o que faz, imprimindo sua marca de competência, absolutamente
pessoal, com humor e sagacidade. Glaucya é incansável, energética e madura, representando o melhor
da nova geração de fonoaudiólogos. Deborah é organizada, dedicada e extremamente capaz, reco
nhecendo com precisão o que há de bom em cada texto, em cada conceito, em cada afirmação.
Além dos professores do CEV outros colaboradores foram essenciais na elaboração deste livro: o
Dr. Hélio Kawakami, médico-cirurgião plástico, que realizou os desenhos anatômicos do capítulo 1
com carinho e habilidade particulares, e o fonoaudiólogo Porfirio Jaques dos Passos, que navegou por
incontáveis e frustrantes horas na busca dos sítios sugeridos para consulta do leitor. Aos dois o meu
agradecimento por seus esforços. Às revisoras técnico-científicas desta obra, muitas vezes mais críti
cas que os próprios autores do texto, as fonoaudiólogas Marina Padovani e Denise Knopp, agradeço
pela coragem e insistência em monitorarem o meu trabalho, tecendo críticas duras sobre aspectos
que eu tentava relevar ou não ver. A elas a minha satisfação em ver o quanto cresceram profissional
mente e o quanto, com certeza, serão destaques na Fonoaudiologia. Ao Prof. Dr. José Carlos Prates,
meu mestre de anatomia, pelos ensinamentos e esclarecimentos quanto à nômina anatômica. À
Profa. Dra. Eliane Maria Goldfeder, pela presteza em ter-me relembrado a embriologia humana e ter
corrigido aspectos essenciais que eu, vergonhosamente, havia esquecido. De um modo todo parti
cular, recebi o apoio e a inspiração do Dr. Pedro Bloch, o “querido pai”, cuja voz ilumina o meu cami
nho. Contei, também, com o maravilhoso entusiasmo da ativa equipe de bolsistas e do corpo discen
te do CEV, que durante esses dois últimos anos ajudaram com correções, sugestões e inserções e mui
to carinho para comigo; a todos, o meu profundo reconhecimento.
Do outro lado da mesa, este livro foi produzido pela afinada e inesquecível equipe da Revinter,
perfeitamente sintonizada com a equipe do CEV: ao querido Sergio Dortas, o meu agradecimento por
seu investimento na fonoaudiologia e pelo carinho e atenção para comigo; ao incansável Laércio
Dortas, por conseguir controlar tudo, de modo tão admirável; à Deusa Albuquerque, por tanta força e
capacidade de trabalho, por debaixo de uma aparente fragilidade; à Aliçe Barducci, por pilotar tão
agilmente as etapas do circuito científico São Paulo-Rio; e à doce Solange Andrade, por resolver
problemas sorrindo, achando sempre as melhores soluções.
Finalmente, há uma pessoa muito especial por detrás de todas as 'questões decisivas desta
obra: meu marido, Reinaldo Scalzaretto. A ele o meu agradecimento por ter insistido para que eu
produzisse este livro, ensinando-me estratégias de editoração, desenvolvendo o esqueleto desta
obra, subtraindo longas horas do seu trabalho como escritor para dedicar-se a este texto, traba
lhando comigo nos finais de semana e sendo o meu mais absoluto incentivador e também o mais
implacável crítico. Todo o meu amor, mesmo nos momentos em que eu detestei tudo o que você
me dizia (embora sempre com razão!). Saiba que, com certeza, nenhum geógrafo entende mais de
voz do que você, além do pequeno Thomas, sempre de plantão, que analisa vozes, acústica e audi
tivamente, com cara de grande entendedor! A você, meu filho, obrigada por torcer por mim, mes
mo quando isso significa estar longe de você.
Este é o livro que eu sempre quis escrever e, embora me tivesse, frustrado, por ele e com ele,
tantas vezes, nada supera o prazer de fazer o que se gosta. Um privilégio!
Mara Behlau
, Diretora do Centro de Estudos da Voz - CEV
Coordenadora do Curso de Especialização em Voz - CECEV
DEBORAH FEIJÓ
Fonoaudióloga Especialista em Voz pelo CFFa, com Curso de Especialização no
Centro de Estudos da Voz - CEV, São Paulo
Mestra em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo -
Escola Paulista de Medicina - UNIFESP-EPM
Professora do Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CECEV, São Pauloi
GLAUCYA MADAZIO
Fonoaudióloga Especialista em Voz pelo CFFa, com Curso de Especialização no
Centro de Estudos da Voz - CEV, São Paulo
Curso de Especialização em Distúrbios da Comunicação Humana pela
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina, UNIFESP-EPM
Mestra em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo -
Escola Paulista de Medicina - UNIFESP-EPM
Professora do Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CECEV,
OSÍRIS DO BRASIL
Médico-Otorrinolaringologista e Cirurgião de Cabeça e Pescoço
Mestre e Doutor em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço pela
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina - UNIFESP-EPM
Professor do Curso de Pós-Graduação em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do
Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo
Professor do Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CECEV, São Paulo
PAULO PONTES
Médico-Otorrinolaringologista e Cirurgião de Cabeça e Pescoço
Diretor do Instituto da Laringe - INLAR, São Paulo
Doutor em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço pela
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina - UNIFESP-EPM
Professor Titular e Livre-Docente do Departamento de Otorrinolaringologia e Distúrbios da
Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina -
UNIFESP-EPM
Professor do Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CECEV, São Paulo
RENATA AZEVEDO
Fonoaudióloga Especialista em Voz pelo CFFa
Curso de Especialização em Distúrbios da Comunicação Humana pela
Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina - UNIFESP-EPM
Mestra e Doutoranda em Distúrbios da Comunicação Humana pela
Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP
Professora do Curso de Especialização em Voz do Centro de Estudos da Voz - CEV, São Paulo
Da esquerda para a direita: Deborah Feijó, Osiris do Brasil, Mara
Behlau, Paulo Pontes, Renata Azevedo e Glaucya Madazio.
Capítulo 1 - Anatomia da Laringe e Fisiologia da Produção Vocal................................. 1
Mara Behlau, Renata Azevedo & Glaucya Madazio
OBJETIVOS, 1
DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO DA LARINGE, 2
ANATOMIA MACROSCÓPICA - OS COMPONENTES
DA LARINGE, 2
Cartilagens Laríngeas, 2
Músculos Laríngeos, 7
Ligamentos, Juntas e Membranas
Laríngeas, 12
ANATOMIA HISTOLÓGICA DA PREGA VOCAL, 14
Estrutura Anatômica da Prega Vocal, 15
Zona da Membrana Basal - ZMB, 17
ASPECTOS NEUROLÓGICOS BÁSICOS DA
PRODUÇÃO VOCAL, 19
Mecanismo Neurológico Central, 19
Aspectos do Mecanismo Neurológico
Periférico, 22
DRENAGEM ARTERIAL, VENOSA E LINFÁTICA, 25
FUNÇÕES DA LARINGE, 25
Função Respiratória, 25
Função Deglutitória, 25
Função Fonatória, 26
BASES RESPIRATÓRIAS DA VOZ, 28
Trato Respiratório, 28
- Tecidos de Conexão do Aparelho
1 Respiratório, 29
Musculatura Respiratória, 29
Fisiologia Respiratória, 31
TEORIAS DA PRODUÇÃO DA VOZ, 32
Teoria da Corda Vibrante, 34
Teoria da Palheta, 34
Teoria Mioelástica, 34
Teoria Neurocronáxica, 34
Teoria Aerodinâmica, 34
Teoria Mioelástica-Aerodinâmica, 34
Teoria Impulsionai, 35
Teoria Muco-Ondulatória, 35
Teoria Neuroscilatória, 35
Teoria Osciloimpedancional ou Teoria da
Resistência Negativa, 35
Teoria do Caos, 35
SÍNTESE, 37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 38
LEITURAS RECOMENDADAS, 39
SÍTIOS RECOMENDADOS, 40
DE BOCA EM BOCA, 42
Capítulo 2 - Conceito de Voz Normal eClassificação das Disfonias.............................. 53
Mara Behlau, Renata Azevedo & Paulo Pontes
OBJETIVOS, 53
DESENVOLVIMENTO DA LARINGE, 54
DESENVOLVIMENTO ONTOGENÉTICO DA VOZ, 57
Voz no Bebê, 58
Voz na Adolescência, 60
Voz na Idade Adulta, 61
Voz na Senescência, 62
CONCEITO DE VOZ NORMAL E DISFONIA, 64
CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS, 66
Classificação pelo Tempo do Sintoma, 66
Classificação pela Dicotomia Orgânica e
Funcional, 66
Classificação pelo Achado da Avaliação
Clínica, 67
Classificação pela Cinesiologia Laríngea, 67
Classificação Etiológica das Desordens
Vocais, 68
SÍNTESE, 74
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 75
LEITURAS RECOMENDADAS, 77
SÍTIOS RECOMENDADOS, 78
DE BOCA EM BOCA, 79
Capítulo 3 - Avaliação de Voz..........................
Mara Behlau, Glaucya Madazio, Deborah Feijó & Paulo Pontes
OBJETIVOS, 85
INTRODUÇÃO, 86
ANAMNESE, 86
Queixa e Duração, 86
História Pregressa da Disfonia, 89
Hábitos Inadequados, 90
Investigação Complementar, 90
Antecedentes Pessoais e Familiares, 91
Tratamentos Anteriores, 91
AVALIAÇÃO CLÍNICA DO COMPORTAMENTO
VOCAL, 91
Qualidade Vocal, 91
Sistema de Ressonância, 104
Aspectos Temporais da Emissão
Sustentada, 105
Registros Vocais, 107
Gama Tonal, 109
Articulação e Pronúncia, 110
Aspectos Rítmicos da Emissão, 110
Resistência Vocal, 111
Dinâmica Respiratória, 111
Estruturas Fonoarticulatórias, 116
Funções Reflexovegetativas, 117
Avaliação Corporal, 117
Habilidades Gerais de Comunicação, 118
.85
Psicodinâmica Vocal, 118
Qualidade de Vida no Paciente com
Disfonia, 120
AVALIAÇÃO OTORRINOLARINGOLÓGICA, 121
Avaliação Laringológica Básica, 121
Semiologia Laríngea Avançada, 125
AVALIAÇÃO ACÚSTICA DO SINAL SONORO, 130
Cuidados Especiais na Avaliação Acústica, 133
Semiologia Acústica Avançada
Eletroglotografia (EGG), 135
Parâmetros Acústicos e Implicações
Clínicas, 138
Identificação Acústica dos Sons da Fala, 156
Pontos Importantes na Avaliação Vocal
Acústica, 163 '
Treinamento dos Parâmetros Vocais Acústicos
Básicos, 164 - ;
CORRELAÇÃO AVA: AUDITIVA, VISUAL E
ACÚSTICA, 171 -
SÍNTESE, 172
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 172
LEITURAS RECOMENDADAS, 177
SÍTIOS RECOMENDADOS, 178
DE BOCA EM BOCA, 180
Capítulo 4 - Disfonias Funcionais..................
Mara Behlau, Renata Azevedo, Paulo Pontes & Osiris do Brasil
OBJETIVOS, 247
INTRODUÇÃO, 248
DISFONIAS FUNCIONAIS PRIMÁRIAS POR USO
INCORRETO DA VOZ, 248
Falta de Conhecimento Vocal, 248
Modelo Vocal Deficiente, 248
DISFONIAS FUNCIONAIS SECUNDÁRIAS POR
INADAPTAÇÕES VOCAIS, 250
Inadaptações Anatômicas, 250
Inadaptações Funcionais, 261
247
Conduta, 306
Prognóstico, 306
PÓLIPOS VOCAIS, 306
Definição, 306
Aspectos Histológicos, 307
Fatores Causais e Incidência, 307
Aspectos Psicológicos, 308
Características Vocais, 308
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 308
Notas Acústicas, 309
Conduta, 309
Prognóstico, 309
EDEMA DE REINKE, 309
Definição, 309
Aspectos Histológicos, 310
Fatores Causais e Incidência, 310
Aspectos Psicológicos, 311
Características Vocais, 311
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 311
Notas Acústicas, 311
Conduta, 311
Prognóstico, 312
ÚLCERA DE CONTATO, 312
Definição, 312
Aspectos Histológicos, 312
Fatores Causais e Incidência, 3/2
Aspectos Psicológicos, 314
Características Vocais, 314
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 314
Notas Acústicas, 3/4
Conduta, 314
Prognóstico, 315
GRANULOMAS, 3/5
Definição, 3/5
Aspectos Histológicos, 315
Fatores Causais e Incidência, 315
Aspectos Psicológicos, 316
Características Vocais, 316
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 316
Notas Acústicas, 317
Conduta, 317
Prognóstico, 318
LEUCOPLAS1A, 318
Definição, '318
Aspectos Histológicos, 318
Fatores Causais e Incidência, 3/9
Aspectos Psicológicos, 319
Características Vocais, 319
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 320
Notas Acústicas, 320
Conduta, 320
Prognóstico, 320
SÍNTESE, 322
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 323
LEITURAS RECOMENDADAS, 327
SÍTIOS RECOMENDADOS, 328
DE BOCA EM BOCA, 329
DISFONIAS FUNCIONAIS POR ALTERAÇÕES
PSICOGÊNICAS, 270
Formas Clínicas Definidas, 271
Desordens Vocais Volitivas, 277
Disfonias por Alterações da Muda Vocal, 278
SÍNTESE, 28/
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, 282
LEITURAS RECOMENDADAS, 285
SÍTIOS RECOMENDADOS, 286
DE BOCA EM BOCA, 287
índice Remissivo.................................................................................................................................................................. 343
Capítulo 5 - Disfonias Organofuncionais
Mara Behlau, Glaucya Madazio & Paulo Pontes
OBJETIVOS, 295
INTRODUÇÃO, 296
NÓDULOS VOCAIS EM ADULTOS, 298
Definição, 298
Aspectos Histológicos, 299
Fatores Causais e Incidência, 300
Aspectos Psicológicos, 300
Características Vocais, 300
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 301
Notas Acústicas, 302
Conduta, 302
Prognóstico, 304
NÓDULOS VOCAIS EM CRIANÇAS, 304
Definição, 304
Aspectos Histológicos, 304
Fatores Causais e Incidência, 304
Aspectos Psicológicos, 305
Características Vocais, 305
Características Laringológicas e
Fonoscópicas, 306
Notas Acústicas, 306
295
. ■
0 Livro do
Especialista
(Ayrugnon@ do Larngje @ Rgfetego d@
Produçãó Vocal
Mara Behlau, Renata Azevedo & Glaucya Madazio
OBJETIVOS
^\aparelho fonador não existe enquanto unidade anatômica, mas deve se comportar
W como unidade funcional. 0 foco do texto em questão é a anatomia macroscópica da
laringe, com sua musculatura extrínseca e intrínseca; os aspectos neurológicos; drenagens
arterial e venosa; as bases da fisiologia laríngea; e as bases da respiração para a produção
vocal. As diferentes teorias da produção da voz são também apresentadas. 0 conhecimento
I recente da estrutura mullilaminada da prega vocal e a descrição de seus componentes celu
lares oferecem uma nova compreensão das implicações da arquitetura histológica na clínica
vocal. 0 estudo da anatomia e fisiologia laríngeas permite compreender o processo da fona
ção normal e patológica, reconhecer o impacto de lesões específicas na produção vocal,
' interpretar os dados de avaliação do paciente, definir o planejamento terapêutico e reconhe-
l cer os limites da atuação fonoaudiológica.
2 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA
DESENVOLVIMENTO EMBRIONÁRIO DA
LARINGE
A laringe situa-se no pescoço, sendo conectada inferior-
mente à traqueia e superiormente abre-se na faringe. A
estrutura da laringe é extremamente complexa, o que é
espelhado em seu desenvolvimento embrionário. Existem
várias teorias sobre o desenvolvimento da laringe humana e
a literatura disponível é geralmente complexa e controversa.
O sistema de classificação de Carnegie divide o desen
volvimento embrionário em 23 estágios. O desenvolvimen
to principal da laringe concentra-se entre o 9s e o 23a está
gio, no período entre 20 e 51 dias de gestação (Henick & Sa-
taloff, 1997) (Fig. 1-1).
O primórdio das vias aéreas inferiores aparece no em
brião de 20 dias, no 9a estágio, sob a forma de evaginação
mediana da parede ventral do intestino anterior. Num em
brião de quatro semanas pode-se observar, pela primeira
vez, um orifício laríngeo primitivo, entre o IV e o VI arco
branquial. Na quinta e sexta semanas continua o crescimen
to da laringe, observando-se rudimentos das cartilagens ari-
tenóideas e da epiglote, com uma configuração laríngea em
forma de “T”; entre a 7a e a 10a, a estrutura tubular é fecha
da, mas na 10a semana ocorre a recanalização dos tecidos,
abrindo-se novamente o adito à laringe, com o desenvolvi
mento de dois recessos laterais, os ventrículos da laringe,
que serão delimitados por pregas que se constituirão nas
pregas vocais e vestibulares (Aronson, 1990). Ao redor da
10a e 11a semanas de vida embrionária, a configuração to
pográfica principal da laringe está formada, e as cartilagens,
em fase de endurecimento.
Assim, a laringe forma-se entre’al4a e a 10a semana do de
senvolvimento, e é nesse período' que podem ocorrer malfor
mações nesta estrutura.
As estruturas da laringe são derivadas do 11, Ill, IV,V e VI.
arcos branquiais (Tucker, 1993; Henick & Sataloff, 1997).
Cada arco branquial é composto pelos três folhetos embrio
nários: endoderma, mesoderma e ectoderma.
O epitélio da laringe, traquéia, brônquios e pulmões é
de origem endodérmica. Entretanto os elementos esqueléti
cos da cabeça e do pescoço, incluindo as cartilagens e os
músculos, os sistemas vascular e linfático e, ainda, os nervos
laríngeos, derivam do mesoderma. O osso hióide deriva em
parte do II arco branquial, conhecido como arco hióideo, e
que origina a parte superior do corpo do osso e seus cornos
menores; já o III arco branquial dá origem à parte inferior do
corpo do osso hióide e à porção posterior da língua (Zem-
lim, 2000). O IV dá origem à cartilagem tireóidea; o IV e V
arcos branquiais dão origem às cartilagens cricóidea e arite-
nóideas, além dos anéis traqueais. As dilatações aritenói-
deas diferenciam-se nas cartilagens aritenóideas e cornicu-
ladas, e as pregas que as unem à epiglote passam a ser as
pregas ariepiglóticas. As cartilagens cuneiformes desenvol-
vem-se como derivados da epiglote. A musculatura intrínse
ca da laringe e a musculatura faríngea derivam do IV e VI
arcos branquiais; o nervo laríngeo superior vem do IV arco e
o nervo laríngeo inferior desenvolve-se a partir do VI arco
(Aronson, 1990).
A musculatura da laringe deriva do mesoderma do IV e VI
arcos branquiais. Ao redor do 23a estágio de desenvolvimen
to (51 dias) a maior parte dos músculos da laringe é identifi
cável, o palato duro está se formando, o véu palatino está ain
da aberto e o vestíbulo laríngeo conecta-se com a infraglote,
quando se desenvolve então o ventrículo da laringe.
As principais características anatômicas da laringe es
tão desenvolvidas ao redor do terceiro mês de vida embrio
nária, entretanto esse desenvolvimento continua mesmo
após o nascimento.
Ao nascimento, a laringe apresenta uma posição elevada
no pescoço, ao redor da terceira e quarta vértebras cervicais
(C3 e C4), com a cartilagem tireóidea encaixada no osso hiói
de. As estruturas do esqueleto laríngeo começam, então, a se
separar, o que ocorre paralelamente à ossificação das cartila
gens, que são do tipo hialino, ocorrendo um processo poste
rior de endurecimento total ao redor dos 65 anos, à exceção
das cartilagens corniculadas e cuneiformes. O hióide começa
a ser ossificado aos dois anos de idade, as cartilagens tireói
dea e cricóidea são ossificadas no início da terceira década de
vida (ao redor de 23 a 25 anos), enquanto que as aritenóideas
são ossificadas no final da quarta década (ao redor dos 38
anos de idade). A epiglote, em forma de ômega, apresenta a
configuração dita infantil, com suas metades aproximadas e
quase fechadas, até a puberdade, quando a laringe desce e
atinge o nível da sexta e sétima vértebras cervicais (C6 e C7),
continuando esse descenso gradual e lento por toda a vida. A
cartilagem epiglote, as cartilagens cuneiformes e os ápices
das cartilagens aritenóideas são fibrocartilagens amareladas,
com pequena tendência à ossificação. As cartilagens cornicu
ladas são fibrocartilagens brancas que se ossificam ao redor
dos 70 anos de idade.
ANATOMIA MACROSCÓPICA —
OS COMPONENTES DA LARINGE
O esqueleto da laringe é formado por cartilagens, mús
culos, membranas e mucosa (Fig. 1-2). A laringe como um
todo divide-se em três espaços: supraglote,'glote e infraglo
te. A cavidade supraglótica é formada pelas estruturas que
estão acima da glote, incluindo o ventrículo laríngeo (cavi
dades pares localizadas lateralmente e logo acima das pre
gas vocais), e tendo como limite superior o ádito laríngeo. A
cavidade infraglótica inicia-se logo abaixo da glote, tendo
como limite inferior o primeiro anel traqueal. A rima glótica,
ou simplesmente glote, é o espaço entre as pregas vocais,
com altura de cerca de 1 cm no adulto.O som da voz é pro
duzido na glote, sendo imediatamente acrescido de resso- —
nância na própria supraglote.
Cartilagens Laríngeas
As cartilagens laríngeas são em número de nove, sendo
três ímpares, uma par principal e duas outras pares, consi
deradas acessórias. As cartilagens ímpares são a tireóidea, a
Cartilagem
epiglote Cartilagem
(Smm) Cartilagem (12mm)
epiglote
7 semanas 10 semanas
(16mm) (40mm)
Fig. 1-1. Estágios embriológicos do desenvolvimento da laringe.
4 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 5
Fig. 1-2. Desenho esquemático da laringe e da traquéia no pescoço.
cricóidea e a epiglote; a cartilagem par principal é a aritenói-
dea; e as duas cartilagens acessórias, também pares, são as
corniculadas e as cuneiformes (Fig. 1-3). Há ainda outras'
duas cartilagens pares, de menor importância, nem sempre
presentes e também consideradas acessórias, chamadas de
tritíceas e sesamóides.
De todas as cartilagens laríngeas, as mais importantes
são a tireóidea, a cricóidea e as aritenóideas. Tais cartila
gens são constituídas principalmente por fibras hialinas,
mas também há a participação de fibras colágenas-e elásti
cas. Todas as cartilagens possuem tanto fibras-colágenas
quanto elásticas distribuídas ao longo das estruturas, ha
vendo predomínio de fibras elásticas em região de grande
mobilidade laríngea em suas diferentes funções, com predo
mínio de fibras colágenas na região de maior sustentação da
cartilagem (Hirano, 1996).
-O esqueleto cartilagíneo laríngeo é sustentado principal-
mente pelo osso hióide, que também serve de apoio para os
músculos da língua. Esse osso, o único do corpo humano que
não se articula a nenhum outro, tem forma de uma ferradura
deitada, situado superiormente na laringe, com as hastes vol
tadas para o plano posterior, ou seja, a abertura da ferradura
tem direção posterior; sua inclusão no esqueleto anatômico
da laringe é bastante polêmica (Fig. 1-2). O osso hióide apre
senta um corpo central e dois pares de cornos, mediais e late
rais, que servem de pontos de inserção para os músculos e
ligamentos da laringe e de outros órgãos.
e Cartilagem tireóidea
A cartilagem tireóidea é uma cartilagem única, a maior
cartilagem da laringe, e possui o formato de um escudo,
Cartilagem cricóidea
Fig. 1-3. Desenho esquemático das cartilagens laríngeas em visão
posterior.
sendo composta de duas lâminas laterais, de forma qua
drangular, e dois pares de cornos posteriores. O limite supe
rior externo, na junção das duas lâminas laterais, chama-se
incisura tireóidea superior e, inferiormente, incisura tireói
dea inferior. Na superfície externa de cada uma das lâminas,
encontra-se uma depressão chamada linha oblíqua, local de
inserção de alguns músculos (tíreo-hióideo, esterno-hióideo
e o músculo constritor inferior da faringe). O ângulo de união
entre as lâminas direita e esquerda, chamado de proeminên
cia laríngea, varia de acordo com o sexo, sendo facilmente —
observado como uma proeminência anterior de pescoço de
alguns homens. Na população masculina, observa-se um
ângulo ao redor de 90° e na população feminina o ângulo é
mais aberto, com cerca de 120° Esta variação gera grande
impacto entre os sexos na fisiologia vocal, como por exem
plo na medida que define o tamanho das pregas vocais e
contribui na definição da frequência vocal emitida (Fig. 1-4). V
Corno superior
da cartilagem <
tireóidea
Cartilagem
corniculada
Corno inferior
da cartilagem
tireóidea
Lâmina da
cartilagem cricóidea
Cartilagem
aritenóidea
Arco da
cartilagem
cricóidea
Ligamento
vocal
> Primeiro anel
traqueal
Cartilagem
7 tireóidea
Cartilagem
cricóidea
Fig. 1-4. Desenho esquemático das cartilagens laríngeas em visão
lateral, indicando também a movimentação da cartilagem tireóidea
(pontilhado).
(estiramento)
Os cornos posteriores da cartilagem tireóidea são os
elementos de conexão dessa cartilagem com outras estrutu
ras, sendo que os cornos superiores conectam-se ao osso
hióide e os inferiores, à cartilagem cricóidea.
“Cartilagem cricóidea
A cartilagem cricóidea tambémé uma cartilagem única,
a segunda maior da laringe, com formato circular de anel
completo. Possui uma região anterior mais estreita, o arco,
e uma região posterior mais larga e mais elevada, a lâmina,
como se fosse um anel de dedo com a pedra virada para a
região posterior.
De modo similar à tireóidea, observa-se uma acentuada
variação entre os diâmetros ântero-posterior e lateral da
cartilagem cricóidea de acordo com o sexo, 'apresentando
um formato ovoide nos homens e circular nas mulheres?)
O possíverimpacto da variação anatômica da cartilagem
cricóidea na fonação é desconhecido e pouco estudado,
mas pode ter relação com a fenda glótica posterior constitu-—
cional, devido a uma posição mais lateralizada das cartila
gens aritenóideas, observada principalmente nas mulheres
(Hg. 1-4) J
A cartilagem cricóidea articula-se com a cartilagem ti
reóidea através dos cornos inferiores desta última, que se
conectam por pequenos feixes musculares, na face superior
da lâmina da cricóidea — superfície articular; recebe ainda a
conexão das cartilagens aritenóideas na região póstero-su
perior (sobre a pedra do anel), em uma região levemente
convexa, a faceta articular.
a Cartilagens aritenóideas
As cartilagens aritenóideas são um par de pequenas car
tilagens móveis, consideradas a unidade funcional da larin-
ge pela sua importância nas funções fonatória e respirató-
ria. Possuem forma geométrica piramidal, um-ápíce, três
faces verticais e uma horizontal. A variabilidade dessas car
tilagens entre os sexos é muito pequena,representando os
elementos cartilaginosos de configuração -mais estável da
laringe (Figs. 1-3 a 1-5). Na base de cada cartilagem aritenói
dea encontramos três ângulos: o mais anterior projeta-se
para dentro da laringe e é chamado de processo vocal, sen
do o ponto de fixação posterior da prega vocal; o ângulo
póstero-lateral projeta-se para fora da laringe e recebe o
nome de processo muscular, por ser o local de fixação de
vários músculos, tais como o cricoaritenóideo posterior
(CAP), abdutor da laringe, e o cricoaritenóideo lateral (CAL),
adutor da região anterior das pregas vocais; o ângulo póste
ro-mediano não recebe nenhum nome.
As aritenóideas possuem dois movimentos básicos, fei
tos na superfície articular convexa da cartilagem cricóidea
(Fig. 1-5). Na verdade, a base horizontal da cartilagem arite
nóidea apresenta forma côncava, o que facilita sua articula
ção com a cricóidea e sua complexa movimentação.
Tradicionalmente os livros didáticos apontam esses
dois movimentos básicos: rotação médio-lateral e desliza
mento ântero-posterior, agindo na aproximação e no afasta
mento das pregas vocais. Na verdade, tal descrição é sim
plista e inadequada, como esclarecem Letsonjr. & Tatchell
(1997). Pelo fato de a superfície articular da cricóidea ser
curva e convexa, com forma elíptica, mantendo uma relação
convexo-côncava com cada uma das aritenóideas, o movi-
mento cartilagíneo é bem mais complexo, semelhante ao
que se observa em um cavalinho ou cadeira de balanço. Em
outras palavras, ao se mover anteriormente, o processo vo
cal descende e o processo muscular se eleva; ao se mover
posteriormente, o processo muscular descende e o proces
so vocal se eleva. Esta associação de movimentação ântero-
posterior e vertical é o que dá a impressão do movimento de
cadeira de balanço. Cada unidade de deslocamento vertical
corresponde a duas unidades de deslocamento médio-la-
. teral, dando a impressão de que as aritenóideas apresentam
A um movimento real vertical) o que não é possível pela confi
guração da junta cricoaritenóidea. O movimento vertical
descrito, geralmente ignorado, é de muita importância na
função fonatória. Quando as aritenóideas movem-se anteri
ormente e inferiormente, as pregas vocais movem-se em
direção à linha mediana, ou seja, em adução. Quando as ari
tenóideas movem-se posteriormente e superiormente, tan
to as aritenóideas como as pregas vocais movem-se lateral
mente, em abdução. Desta forma, o movimento das cartila
gens aritenóideas ocorre em três direções: ântero-posterior,
vertical e médio-lateral.
* Cartilagem epiglote
A epiglote é uma cartilagem única em forma- de folha,
sendo mais fechada na infância, passando a uma configura-
6 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 •/ ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL
Deslizamento
ântero-posterior
Cartilagem epiglote
Fig. 1-6. Cartilagens laríngeas e musculatura intrínseca em visão
posterior.
Fig. 1-5. Movimentos das cartilagens aritenóideas sobre a cartila
gem cricóidea.
ção mais aberta na puberdade (Figs. 1-3 e 1-6). Fixa-se atra
vés de um ligamento na superfície mesial da cartilagem ti-
reóidea, na junção anterior de suas lâminas, o chamado pe-
cíolo da epiglote. Conecta-se também às cartilagens arite-
nóideas através das pregas ariepiglóticas, uma dobra exten
sa de tecido e músculo. Apresenta enorme variabilidade de
forma e curvatura. Sua função é dè proteger as vias aéreas
inferiores, através, de abaixamento e fechamento do ádito
laríngeo.A epiglote movimenta-se bastante durante a pro
dução dos sons da fala, acompanhando a direção do movi
mento da língua; contudo participa muito pouco na produ
ção vocal, embora seu deslocamento parcial sobre, a laringe
pareça contribuir para o volume e projeção, em certos esti
los e técnicas de canto. É formada principalmente por fibras
elásticas.
Cartilagens acessórias
As principais cartilagens acessórias são as corniculadas
e as cuneiformes. ambas de pequeno tamanho (Fig. 1-3).
Além dessas, ainda temos outras duas, pares, de importân
cia pouco definida, as cartilagens tritíceas e as sesamóides.
As cartilagens corniculadas, do tipo elástico-brancas,
antes chamadas de cartilagens de Santorini, apresentam for
ma de cone e localizam-se no ápice das cartilagens aritenói
deas, as quais se ligam através de uma junta sinovial às arite
nóideas, podendo aparecer totalmente fundidas. As cartila
gens corniculadas servem para prolongar as aritenóideas
para cima e para trás.
As cartilagens cuneiformes, antes chamadas de cartila
gens de Wrisberg, têm forma de haste e estão mergulhadas
nas pregas ariepiglóticas, com provável participação na
constrição supraglótica ântero-posterior (fechamento do
ádito da laringe pelo abaixamento da epiglote). Por vezes,
observamos essas cartilagens na superfície interna da mem
brana mucosa das pregas ariepiglóticas, como duas peque
nas elevações esbranquiçadas, localizadas em frente às car
tilagens aritenóideas.
Por sua vez, as cartilagens tritíceas estão situadas nos
ligamentos e membranas que conectam o corno superior da
cartilagem tireóidea e o corno maior do osso hióide. Final
mente, as cartilagens sesamóides, nem sempre presentes
no homem, situam-se nas bordas laterais das cartilagens ari
tenóideas e conectam-se com as cartilagens corniculadas
por ligamentos elásticos.
Músculos Laríngeos
A musculatura laríngea é dividida em dois grupamentos
regionais, os músculos intrínsecos e os músculos extrínse
cos. São denominados intrínsecos os músculos que têm ori
gem e inserção na laringe, ao passo que os músculos extrín
secos apresentam apenas uma das inserções na laringe e
outra fora dela, como no tórax, mandíbula ou no crânio.
A) Musculatura intrínseca
A musculatura intrínseca possui relação direta com a
função fonatória e é constituída por músculos esqueléticos
que se originam e se inserem na laringe.
Os músculos esqueléticos são compostos primariamen-
te por três tipos de fibras. Henick & Sataloff (1997) resumem
as características desses três tipos da seguinte forma: tipo I -
fibras altamente resistentes à fadiga, de diâmetro reduzido,
com contração lenta e metabolismo aeróbio (oxidativo),
apresentam baixos níveis de glicógeno e altos níveis de en
zimas oxidativas; tipo IIA - fibras de contração rápida, mas
também resistentes à fadiga, com metabolismo principal
mente oxidativo, porém com altos níveis de enzimas oxida
tivas e deglicógenos; tipo IIB - fibras de contração muito
rápida, mas também de rápida fadiga, são as de maior diâ
metro e utilizam primariamente um mecanismo aeróbio por
glicose, contendo elevados níveis de glicógeno, mas baixos
níveis de enzimas oxidativas. Os músculos da laringe têm ,
uma maior proporção de fibras IIA que os outros músculos ,
do corpo; o tireoaritenóideo e o cricoaritenóideo lateral são
altamente especializados em contração rápida.
Os músculos intrínsecos, com exceção do músculo arite-
nóideo, são todos pares. A musculatura intrínseca da laringe
aproxima (aduz), afasta (abduz) e é responsável pela tensão
das pregas vocais, nas funções laríngeas de respiração, esfínc-
ter de proteção e fonação. Os músculos intrínsecos da laringe
são: tireoaritenóideo (TA), cricoaritenóideo posterior (CAP),
cricoaritenóideo lateral (CAL), aritenóideo (A), cricotireóideo
(CT), ariepiglótico (AE) e tireoepiglótico (TE).
Músculo tireoaritenóideo — TA
O TA é um músculo par que compõe o corpo das pregas
vocais (Fig. 1-7), cada um deles com a forma de um grosso
feixe, originam-se no ângulo da cartilagem tireóidea e inser
ção principalmente no processo vocal, mas com extensões
em direção ao processo muscular. O TA aduz, abaixa, encur
ta e espessa a prega vocal, deixando à borda da mucosa arre
dondada. Possui dois feixes principais: um medial, interno,
chamado de vocalis, vocal ou tireovocal; e outro lateral,
V
Cartilagem
tireóidea
Fig. 1-7. Músculos intrínsecos da laringe em visão superior: TA-ti
reoaritenóideo; CAL-cricoaritenóideo lateral; CAP-cricoaritenói
deo posterior; A - aritenóideo.
externo, chamado de tireomuscular. Reconhece-se ainda
um terceiro feixe do músculo tireoaritenóideo, conhecido
como feixe superior, de poucas fibras e com inserção prová
vel nas pregas vestibulares.
O músculo vocal apresenta suas fibras a partir do ti
reomuscular até praticamente mergulhar no ligamento vo
cal. Este feixe interno do TA insere-se diretamente no pro
cesso vocal, apresenta fibras de contração rápida e tem par
ticipação ativa na produção da fonação, ou seja, o vocal
vibra 'de modo sincronizado com a vibração da mucosa,
embora não tão ampla e vigorosamente como esta; sua ação
é complexa e não está ainda bem definida. O vocal possui
também, em sua contração, uma ação de tensão diferencial
da prega vocal, envolvida no controle refinado da fonação, a
fim de manter a prega rígida, independentemente de seu
comprimento. Geralmente imagina-se que quanto mais lon
gas ficam as pregas vocais, mais esticadas e tensas estarão.
Porém, na verdade, quando os músculos ficam tensos eles
estão contraídos e encurtados.
O feixe externo do TA insere-se no processo muscular e
apresenta fibras de contração rápida, tem menor ação sobre
as características da fonação e parece estar mais envolvido
na adução das pregas vocais. Finalmente, o feixe superior é
caracterizado pela presença de algumas fibras do TA que se
dirigem para as pregas vestibulares e provavelmente estão
envolvidas nos casos de fonação vestibular, através do des
locamento das pregas vestibulares.
A ação principal do TA é encurtar e aduzir as pregas vo
cais, diminuindo a distância entre as cartilagens aritenói-
8 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 9
deas e tireóidea, tornando-se um feixe mais largo e reduzin
do a frequência da voz gerada.
Músculo cricoaritenóideo posterior — CAP
O CAP é um músculo par e constitui-se no único múscu
lo abdutor das pregas vocais, permitindo a respiração e sen
do, por isso, denominado músculo da vida. 0 CAP é um mús
culo em forma de leque, com origem na lâmina da cartila
gem cricóidea e inserção no processo muscular da cartila-
gem aritenóidea.
O CAP abduz, eleva, alonga e afila a prega vocal, manten
do todas as camadas da mucosa rígidas, porém a borda livre
arredondada. A contração desse músculo desloca o processo
muscular posteriormente, abduzindo as pregas vocais (Fig.
1-8).
O CAP é ativado na respiração, mas é um engano acredi
tar que sua ação é ausente no processo de produção de voz
e fala. Ao contrário, observa-se a ativação do CAP já no final
de uma emissão, a fim de abduzir rapidamente as pregas
vocais, permitindo a inspiração. Além disso, na produção
dos sons surdos durante a fala encadeada sua ação de dispa
ro rápido permite a suspensão da vibração da mucosa para a
produção correta desses sons.
Músculo cricoaritenóideo lateral — CAL
O CAL é um músculo par, representando os principais
adutores das pregas vocais. O CAL aduz, abaixa e alonga a
prega vocal, afilando sua borda livre, que fica mais angulada,
deixando todas as camadas da mucosa rígidas. O CAL auxi
lia, portanto, a coaptação glótica necessária para a fonação.
Também possui forma de leque, com origem na margem su
perior da cartilagem cricóidea e inserção no processo mus
cular da cartilagem aritenóidea (Fig. 1-9). A contração desse
da cartilagem
aritenóidea
Processo muscular
Fig. 1-9. Ação do músculo cricoaritenóideo lateral.
músculo desloca o-processo muscular anteriormente, adu
zindo as pregas vocais. |
O CAL é, portanto, ativado na fonação, sendo responsá
vel pelo fechamento da glote anterior. Para que uma adução
completa ocorra é necessária a ação do CAL e do músculo
aritenóideo, responsável pelo fechamento da glote posteri
or. Vale lembrar que a adução completa não é essencial para
que a fonação se produza.
Músculo aritenóideo — A
O músculo aritenóideo é um músculo único, também
com ação adutora. Possui dois feixes, um que corre em dire
ção horizontal - chamado de transverso; e outro, mais super
ficial, denominado oblíquo. Este músculo, como o nome indi
ca, situa-se entre as duas cartilagens aritenóideas, sendo tam
bém chamado de interaritenóideo ou ari-aritenóideo, embo-
Fig. 1-10. Ação do músculo aritenóideo, feixe oblíquo e feixe transverso em visão posterior.
ra a nômina anatômica indique unicamente o nome aritenói
deo. O feixe transverso percorre horizontalmente o caminho
de uma cartilagem aritenóidea a outra, inserindo-se nos pro
cessos musculares bilateralmente; sua ação aproxima as ba
ses dessas cartilagens. O feixe oblíquo estende-se da base de
uma cartilagem aritenóidea, no processo muscular, ao ápice
da outra cartilagem aritenóidea, bilateralmente; sua ação
aproxima as pontas das cartilagens (Fig. 1-10). O efeito global
da ação do músculo aritenóideo aproxima e aduz as cartila
gens aritenóideas, oferecendo compressão medial glótica pa
ra fechar a glote posterior.
Músculo cricotireóideo — CT
O CT é um músculo par, com ação adutora secundária
das pregas vocais (Fig. 1-11). O CT é o maior músculo intrín
seco da laringe, possuindo a forma de um leque, com ori-
Músculo
cricoaritenóideo
posterior - GAP Processo
Proeminência
tireóidea
Fig. 1-8. Músculo cricoaritenóideo posterior em visão posterior e visão superior. Fig. 1-11. Ação do músculo cricotireóideo em visão anteriorizada e visão lateral.
10 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 11
gem no arco da cartilagem cricóidea, na região anterior, e
inserção na borda inferior da cartilagem tireóidea. O CT
aduz na posição paramediana, abaixa, estira, alonga e afila a
prega vocal, enrijecendo todas as camadas e angulando a
borda livre da prega vocal. O CT é largamente responsável
pela tensão longitudinal da prega vocal, um fator importan
te no controle da frequência. O CT apresenta dois feixes: um
vertical, denominado parte reta, e outro mais horizontal,
denominado parte oblíqua, cuja ação parece ser diferente,
entre cantores treinados e não-treinados, no controle da
frequência do som.
O CT é, portanto, o músculo do controle de frequência
da voz, e sua contração produz elevação da frequência, ou
seja, sons mais agudos. A ativação do CT aproxima as cartila
gens cricóidea e tireóidea, através principalmente do deslo
camento da cartilagem tireóidea para baixo, mas também da
cricóideapara cima, em até 15°. Tal movimento, conhecido
como movimento de báscula, alonga secundariamente as
pregas vocais, do momento em que a diminuição do espaço
entre as cartilagens tireóidea e cricóidea aumenta a distância
entre a cartilagem tireóidea e as aritenóideas. O alongamen
to das pregas vocais diminui a massa em vibração, aumenta a
tensão e eleva a frequência fundamental. O CT também apre
senta, portanto, uma ação de tensor secundário.
Músculo ariepiglótico — AE
O AE é um músculo par, composto por fibras esparsas,
situando-se nas pregas ariepiglóticas. O AE é, na verdade, um
músculo contínuo ao feixe oblíquo do músculo aritenóideo,
inserindo-se abaixo da epiglote. A contração deste músculo
abaixa a epiglote, aproximando-a das aritenóideas, promo
vendo o fechamento do ádito da laringe (Fig. 1-12).
Músculo tireoepiglótico — TE
O TE é um músculo par, pequeno, que se estende da car
tilagem tireóidea à epiglote, responsável pelo retorno da
epiglote à posição original, depois da contração causada
pela ação do AE (Fig. 1-12).
É importante ressaltar que, apesar de termos descrito a
ação individual de cada um dos músculos intrínsecos da la
ringe, raramente ocorre uma ação isolada, mas, ocorre uma
combinação de ações múltiplas e interdependentes. O resu
mo da ação dos principais músculos intrínsecos está no
Quadro 1-1.
B) Musculatura extrínseca
A musculatura-extrínseca é composta por músculos in
seridos nas cartilagens laríngeas, porém provenientes de
estruturas não-laríngeas. Tais músculos não interferem de
modo direto na fonação,mas sua ação indireta é de extrema
importância, modificando a laringe, a ponto de constituí
rem um mecanismo secundário no controle da frequência
da voz. Além disso, a hipertonicidade desses músculos pode
ser um fator muito importante nos casos de disfonia por
tensão muscular, elevando a laringe no pescoço, aumentan
do a massa muscular e tornando a palpação dolorosa.
A função básica da musculatura extrínseca é manter a
laringe no pescoço, sendo crítica na manutenção da estabili
dade laríngea, a fim de que a musculatura intrínseca possa
Quadro 1-1. Principais músculos intrínsecos da laringe, sua açao no corpo e na cobertura da prega vocal e inervação
Músculos Intrínsecos Ação Principal Inervação
TA
Tireoaritenóideo Aduz, abaixa, encurta e espessa a prega vocal
corpo rígido e cobertura solta, margem livre arredondada
Tireovocal - interno, fonação e tensão
Tireomuscular- externo, adução da prega vocal
Nervo laríngeo inferior (X par)
Ramo anterior
CAP
Cricoaritenóideo Abduz, eleva, alonga e afila a prega vocal; Nervo laríngeo inferior (X
posterior camadas rígidas e margem livre arredondada par)
Ramo posterior
CAL
Cricoaritenóideo lateral Aduz, abaixa, alonga e afila a prega vocal;
camadas rígidas, margem livre angulada
Nervo laríngeo inferior (X par)
Ramo anterior
A
--==============================
Aritenóideo Aduz a glote posterior Nervo laríngeo inferior (X par)
Ramo posterior
CT
Cricotireóideo Aduz na posição paramediana, abaixa, alonga e afila a prega vocal, Nervo laríngeo superior
tensor longitudinal; camadas rígidas, margem livre angulada (X par) Ramo externo
Fig. 1-12. Ação do músculo ariepiglótico (AE) e do músculo tireoepiglótico (TE), em visão posterior e visão lateral.
trabalhar efetivamente. Através da elevação ou do abaixa
mento da laringe no pescoço altera-se o ângulo entre as car
tilagens e a tensão entre elas (Quadros 1-2 e 1-3). Os múscu
los extrínsecos dividem-se em dois grupos musculares: mús
culos supra-hióideos e infra-hióideos, de acordo com sua
inserção no osso hióide e sua função principal (Figs. 1-13 e
1-14).
Os músculos supra-hióideos (Fig. 1-13) elevam a laringe
no pescoço; são eles: estilo-hióideo, digástrico, milo-hiói-
deo, gênio-hióideo, genioglosso e hioglosso. 0 músculo es
tilo-hióideo origina-se na base do crânio, no processo esti
lo-hióideo do osso temporal, inserindo-se no corpo do osso
hióide. 0 digástrico apresenta dois ventres com origens
diferentes e uma mesma inserção: o ventre anterior tem sua
origem na face interna da mandíbula, próximo à linha medi
ana, e a posterior origina-se na face medial do processo
mastóideo do osso temporal; sua inserção faz-se no tendão
intermediário, logo acima do osso hióide, fazendo um loop,
e insere-se no corpo e corno menor do osso hióide. 0
milo-hióideo é um músculo em forma de folha, formando a
base da boca; origina-se na mandíbula e insere-se no osso
hióide. 0 genio-hióideo é um músculo par, origina-se na su-
Quadro 1-2. Principais músculos supra-hióideos da laringe, sua ação principal e inervação
Supra-Hióideos Ação Principal Inervação
Estilo-hióideo Eleva e retrai o osso hióideo VII par - nervo facial
Digástrico Eleva o hióideo e deprime a mandíbula V par - nervo trigêmeo, ventre anterior
VII par - nervo facial, ventre posterior
Milo-hióideo Eleva e projeta o hióideo e a língua V par - nervo trigêmeo
Gênio-hióideo Puxa a língua e o hióideo para a frente XII par —nervo hipoglo-so
12 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 13
Quadro 1-3. Principais músculos infra-hióideos da laringe, sua
________________ ação principal e inervação____________________
Infra-Hióidcos Ação Principal Inervação
Esterno-hióideo Abaixa o osso hióide XII par - nervo
hipoglosso
Esternotireóideo Abaixa a cartilagem
tireóidea
XII par - nervo
hipoglosso
Tíreo-hióideo Aproxima a cartilagem
tireóidea e o osso hióide
XII par - nervo
hipoglosso
Omo-hióideo Abaixa c retrai o osso
hióide
XII par - nervo
hipoglosso
perficie interna da mandíbula, próximo à linha mediana, e
insere-se na superfície anterior do osso hióide.
Por outro lado, os músculos infra-hióideos (Fig. 1-14) abai
xam a laringe; são eles: esterno-hióideo, esternotireóideo, tí-
reo-hióideo e omo-hióideo. O esterno-hióideo origina-se no
limite superior do tórax, na extremidade medial da clavícu
la, no manúbrio do osso esterno e no ligamento esternocla-
vicular, inserindo-se na superfície inferior do corpo do osso
hióide. O esternotireóideo situa-se próximo à linha mediana
do pescoço, junto com o esterno-hióideo, priginando-se
nas porções superior e posterior do esterno e na primeira
cartilagem costal, inserindo-se na linha oblíqua da cartila
gem tireóidea. O tíreo-hióideo parece ser uma continuação
do esternotireóideo, com origem na linha oblíqua da cartila
gem tireóidea e inserção no corpo e no corno maior do osso
hióide. O omo-hióideo apresenta dois ventres, origina-se na
margem superior da escápula e insere-se na margem inferi
or do corpo do osso hióide.
Ligamentos, Juntas e Membranas Laríngeas
A laringe possui ligamentos intrínsecos e extrínsecos,
além de membranas e tecidos com a função básica de inter
ligação. Os ligamentos intrínsecos conectam as cartilagens
laríngeas entre si; já os ligamentos extrínsecos conectam o
osso hióide com a cartilagem tireóidea e a epiglote, e a car
tilagem cricóidea com os anéis traqueais.
A) Ligamentos intrínsecos da laringe e juntas
articulares
Os ligamentos intrínsecos da laringe apresentam suas
duas inserções nesse órgão, auxiliando sua sustentação e
flexibilidade. As juntas çricotireóidea e cricoaritenóidea es
tão intimamente relacionadas à mecânica laríngea, favore
cendo as mudanças de frequência e a adução das pregas vo
cais. \
Ligamento cricotireóideo mediano e
membrana cricotireóidea
O ligamento cricotireóideo mediano encontra-se ante-
riormente na laringe, conectando a cartilagem tireóidea ao
arco da cartilagem cricóidea. Este ligamento estende-se
lateralmente através da membrana cricotireóidea.
Osso
esterno
fíg. 1-14. Músculos laríngeos extrínsecos infra-hióideos.
fíg. 1-13. Músculos laríngeos extrínsecos supra-hióideos.
Ligamento cricoaritenóideo posterior
O ligamento cricoaritenóideo posterior conecta a car
tilagem aritenóidea à cartilagem cricóidea, êm sua região pos
terior.
Ligamento tireoepiglótico
O ligamento tireoepiglóticoinsere o pecíolo da cartila
gem epiglótica no ângulo da cartilagem tireóidea, interna
mente e logo acima da comissura anterior das pregas vocais.
Junta cricotireóidea
Ajunta cricotireóidea é uma articulação verdadeira, do
tipo sinovial, com ligamentos capsulares, formada em cada
lado pela interligação dos cornos inferiores da cartilagem
tireóidea e pelas regiões laterais da cartilagem cricóidea. Tal
junta é extremamente complexa e apresenta seis pares de
pequenos músculos, o que permite que a cartilagem cricói
dea mova-se para cima, elevando o arco em direção à cartila
gem tireóidea, abaixando posteriormente a sua lâmina. Este
movimento aumenta a distância entre a cartilagem tireóidea
e as aritenóideas, alongando, desta forma, as pregas vocais.
Junta cricoaritenóidea
Ajunta cricoaritenóidea é também uma articulação ver
dadeira, do tipo sinovial, reforçada por ligamentos capsula
res, onde cada uma das cartilagens aritenóideas articula-se
na face superior da cartilagem cricóidea, permitindo uma
movimentação complexa, que é responsável pela adução
das pregas vocais. Essa junta é crucial na mecânica laríngea.
Pregas ariepiglóticas
As pregas ariepiglóticas são formadas por músculo arie-
piglótico (AE), tecido conectivo e mucosa, estendendo-se
das pontas das cartilagens aritenóideas até a epiglote, for
mando um vigoroso esfincter que permite o fechamento da
laringe durante a deglutição e nas situações de proteção das
vias aéreas inferiores. Durante a produção da voz, uma con
tração parcial dessas pregas pode ocorrer em certos estilos
de canto, como na emissão típica da Broadway e no repente
nordestino; ou também em certas línguas, como o portu
guês brasileiro e inglês australiano.
Membrana fíbroelástica
A membrana fíbroelástica é a maior membrana da larin
ge e compreende duas porções: a porção superior, chamada
membrana quadrangular, e a inferior, o cone elástico (Fig.
1-15).
A membrana quadrangular é uma membrana elástica
que recobre a região interna superior da laringe, conectan
do as laterais da epiglote às cartilagens aritenóideas; assim,
14 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 15
V
Ligamento vocal
Fig. 1-15. Esquema das membranas e ligamentos laríngeos, em sec
ção coronal.
a membrana quadrangular recobre a laringe interiormente,
envolvendo toda a extensão da supraglote, incluindo as pre
gas vestibulares e o ventrículo laríngeo.
0 cone elástico é uma membrana elástica que recobre
toda a parede interna da laringe, a partir do limite do mús
culo vocal até a cartilagem cricóidea; ou seja, o cone elástico
localiza-se praticamente logo abaixo da superfície das pre
gas vocais e atinge a cartilagem cricóidea. O cone elástico é
recoberto por mucosa que se move independentemente
dele, o que é essencial na região da borda livre para a produ
ção da fonação.
Pregas vestibulares
As pregas vestibulares, antes chamadas de falsas pregas
vocais ou bandas ventriculares, são duas dobras de tecido
localizadas acima das pregas vocais (Fig. 1-15). As pregas
vestibulares são formadas por um tecido espesso e mole,
com inúmeras glândulas em seu interior. São constituídas
pelos ligamentos vestibulares e recobertas por mucosa. Em
sua região inferior podem ser encontradas algumas fibras
do chamado feixe superior do músculo tireoaritenóideo, às
vezes referido como músculo ventricular. Em situações
habituais, as pregas vestibulares não participam do proces
so fonatório, ficando lateralizadas em relação às pregas
vocais; observa-se porém que, em frequências muito graves,
como as do registro basal, elas podem ser envolvidas passi
vamente, vibrando durante a produção do som ou abafando
sua ressonância. Uma constrição mediana dessas pregas
pode ser também observada durante a produção do sussur
ro em alguns indivíduos. Contudo a maior ativação dessas
estruturas ocorre nas situações em que é requerido o sela-
mento laríngeo, como na execução de atividades de esfor
ço, tais como a defecação e a ação de levantar ou empurrar
pesos.
Ventrículo laríngeo
O ventrículo laríngeo (Fig. 1-15), anteriormente deno
minado de ventrículo de Morgagni, situa-se entre as pregas
vestibulares e as pregas vocais, bilateralmente, sendo tam
bém uma membrana mucosa, possuindo comprimento se
melhante ao tamanho das pregas vocais. Conjuntamente
com as pregas vestibulares, possui importante suprimento
de glândulas, com função de lubrificar a laringe, especial
mente as pregas vocais. Além da função de lubrificação, a
presença do ventrículo laríngeo permite que as pregas vo
cais vibrem livremente. Uma função secundária é a resso
nância dos componentes graves do espectro.
Ligamento vocal
O ligamento vocal\é, na verdade, parte da mucosa que
recobre o músculo vocal, constituindo a camada interme
diária e profunda da lâmina própria, paralelo à borda livre da
prega vocal e aderido aos feixes musculares em suas regiões
mais profundas. Em outras palavras, o ligamento vocal é o
cone elástico junto à borda livre das pregas vocais (Fig.
1-15).
B) Ligamentos extrínsecos da laringe
Os ligamentos .extrínsecos da laringe apresentam uma
inserção neste órgão e outra fora dele.
Ligamento hioepiglótico
A cartilagem epiglote é também ligada ao osso hióide
através de sua superfície anterior pelo ligamento hioepigló
tico, que se conecta ao corpo do osso hióide.
Ligamentos e membrana tireo-hióidea
Existem dois ligamentos tireo-hióideos; o lateral e o
mediano. O lateral estende-se do final do corno maior do
hióide até a ponta do corno superior da cartilagem tireói-
dea, sendo que a membrana tireohióidea corre, em toda a
extensão, da margem inferior do osso hióide à margem
superior da cartilagem tireóidea. Junto à linha mediana ante
rior, tal membrana se espessa, formando o ligamento
tireo-hióideo mediano.
Ligamento cricovocal
Este ligamento conecta a cartilagem cricóidea ao primei
ro anel traqueal.
ANATOMIA HISTOLÓGICA DA PREGA VOCAL
Neste item vamos discutir a estrutura anatômica da prega
vocal, seguida pela apresentação da zona da membrana basal.
Estrutura Anatômica da Prega Vocal
Para a compreensão da estrutura anatômica da prega
vocal, vamos nos ater particularmente ao modelo anatômico
proposto por Minoru Hirano, no início dos anos 70 (Hirano,
1993 e 1996), conhecido como Modelo Corpo-Cobertura das
pregas vocais (Fig. 1-16 e Quadro 1-4).
As pregas vocais são duas dobras de músculo e mucosa.
que se estendem horizontalmente na laringe, fixando-se an
teriormente na face interna da cartilagem tireóidea, forman
do a comissura anterior, a região de convergência de ambas
as pregas vocais. Posteriormente, cada prega vocal conec
ta-se à cartilagem aritenóidea, cobrindo-a de mucosa. A re
gião anterior das pregas vocais, da comissura anterior ao
processo vocal das cartilagens aritenóideas, é chamada de
parte intermembranácea da prega vocal; a partir do processo
vocal até a região posterior da laringe denomina-se parte
intercartilagínea da prega vocal. A região entre as duas carti
lagens aritenóideas é denominada região interaritenóidea.
Para a função fonatória, o conceito mais importante é
que as pregas vocais são uma estrutura multilaminada, onde
cada camada apresenta propriedades mecânicas diferentes.
De modo geral, podemos dizer que a prega vocal é com
posta de mucosa e músculo. A mucosa divide-se em epitélio
e lâmina própria. O epitélio pode ser visto como um fino pa
pel plástico, resistente, cuja função é cobrir e manter a for
ma da prega vocal. O epitélio é formado por tecido escamo
so estratificado.
A lâmina própria, por sua vez, subdivide-se em três ca
madas: superficial, intermediária e profunda, com diferença
crescente em rigidez, respectivamente. A camada superfici
al da lâmina própria (CSLP), freqúentemente chamada de
espaço de Reinke, é uma camada solta, flexível e com pou
cos elementos, como se fosse uma leve gelatina. A CSLP é a
que vibra mais intensamente durante a fonação,deslocan-
do-se acentuadamente. A camada intermediária da lâmina
Quadro 1-4. Divisão das camadas da prega vocal
Mucosa
Epitélio Cobertura
Lâmina própria
Camada superficial
Camada intermediária Transição
Camada profunda
Músculo Músculo vocal Corpo
i
própria (CILP), logo abaixo da superficial, é mais densa, sen
do composta de fibras elásticas, semelhantes a elásticos
moles. Finalmente, a camada profunda da lâmina própria
(CPLP) é composta de fibras de colágeno, mais rígidas, com
paradas às linhas de algodão.
A CSLP separa-se nitidamente das outras duas, já a CILP
e a CPLP não possuem limites definidos entre si. Desta for
ma, dá-se o nome de ligamento vocal à junção das camadas
intermediária e profunda da lâmina própria, sendo que o
número de fibras elásticas diminui e as de colágeno aumen
tam, em direção ao corpo da prega vocal.
O corpo da prega vocal é composto basicamente pelo
músculo vocal e, do ponto de vista mecânico, quando se
contrai, funciona como um feixe de elásticos muito rígidos.
Também não se observa um limite nítido entre as fibras co-
lágenas da camada profunda da lâmina própria e as fibras
mais superficiais do músculo vocal, sendo que algumas fi
bras da camada profunda inserem-se no próprio músculo.
As fibras elásticas, as de colágeno e as fibras musculares
do vocal apresentam uma distribuição longitudinal, paralela
à borda livre da prega vocal. Do mesmo modo, os delicados
Músculo
vocal
Camada profunda da
lâmina própria
Camada superficial
da lâmina própria
Camada intermediária <
da lâmina própria
Epitélio
cooOEEEgd
Cone
elástico
Fig. 1-16. Desenho esquemático da arquitetura histológica da prega vocal do adulto, em secção coronal.
16 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 17
capilares sanguíneos da mucosa da borda livre também apre
sentam uma disposição longitudinal e paralela à das fibras.
Este arranjo de fibras e vasos sanguíneos é uma vantagem
adicional para a vibração glótica, por sua disposição seme
lhante. Além disso, a não-existência, ou a existência ocasio
nal, de glândulas na prega vocal não oferece resistência aos
movimentos vibratórios da mucosa.
Assim, as cinco camadas inicialmente descritas podem
ser agrupadas em três seções: cobertura (epitélio e CSLP),
transição (CILP e CPLP) e corpo (músculo vocal).
Durante a fonação, a cobertura desloca-se, de modo
muito intenso e fluido, em direção contrária à da gravidade,
imagem esta observada durante a estroboscopia laríngea,
enquanto o corpo oferece a.estabilidade e o tono muscular
de base. A camada de transição, por sua vez, serve de aco
plamento entre a camada superficial da lâmina própria e o
músculo vocal. A teoria de vibração corpo-cobertura indica
exatamente esta estabilidade do músculo e da camada pro-
Tunda da lâmina própria versus a flexibilidade das camadas
elásticas da lâmina própria e do epitélio. Observe a distribui
ção das camadas da prega vocal através dos esquemas ilus
trativos.
Por outro lado, a estrutura laminada da borda livre da
prega vocal varia ao longo de seu comprimento (Fig. 1-17).
Na região anterior da prega vocal, a camada intermediária
da lâmina própria torna-se mais espessa, formando um eno
velamento de fibras, uma massa oval denominada mácula
flava, composta de fibras elásticas, fibroblasto e estroma.
Anteriormente à mácula flava observa-se uma outra massa
de fibras de colágeno, que formam o tendão da comissura
anterior, tendão este com conexão múltipla, interligando-se
à cartilagem tireóidea, à mácula flava e à camada profunda
da lâmina própria. Também na região posterior da prega vo
cal observamos que a camada intermediária forma um outro
novelo de fibras, uma segunda massa oval chamada de má
cula flava posterior, conectada ao processo vocal da cartila
gem aritenóidea.
As máculas flavas provavelmente exercem função de
proteção de lesões mecânicas por exigências fonatórias ou
situações déTonotrauma, oferecendo estabilidade à porção
membranosa das pregas vocais.
Finalmente,*é importante ressaltar que a estrutura da
prega vocal do recém-nascido difere bastante da do adulto,
principalmente quanto à composição da lâmina própria da
mucosa (Fig. 1-18). O epitélio escamoso celular é pratica-
mente o mesmo; porém a lâmina própria na infância é mais
espessa e praticamente uniforme, não se observando o liga
mento vocal e havendo apenas uma formação rudimentar
Fig. 1-18. Desenhos esquemáticos da arquitetura histológica da prega vocal da criança, em secção horizontal e coronal.
> Cartilagem tireóidea
Epitélio
Mácula flava posterior
Músculo vocal
Cartilagem aritenóidea
Camada profunda
da lâmina própria
Camada superficial
da lâmina própria
Mácula flava
anterior
Camada intermediária
da lâmina própria
> Tendão da cartilagem
tireóidea
Fig. 1-17. Desenho esquemático da arquitetura histológica da prega vocal do adulto em secção horizontal.
das máculas flavas anteriores e posteriores. Um ligamento
vocal imaturo aparece entre 1 e 4 anos de idade, não haven
do, ainda, fibras de interligação entre este e o músculo
vocal. A diferenciação entre as camadas intermediária e pro
funda da lâmina própria começa entre os 6 e 12 anos de ida
de, sendo que somente após os 15 anos pode-se observar a
estrutura completa de três camadas da lâmina própria. Os
motivos que justificam um processo de maturação tão lento
e longo, mais demorado que a própria maturação dos ór
gãos sexuais para a reprodução, não são ainda claros.
Com o passar dos anos, praticamente não se observam
mudanças no epitélio, porém a camada superficial da lâmina
própria — o espaço de Reinke-tende a ficar mais edematosa e
espessa. Observa-se também atrofia das fibras elásticas da
camada intermediária, mais acentuada nas mulheres, deixan
do esta camada mais fina, o que pode deteriorar o contorno
da prega vocal, produzindo áreas atróficas na mucosa, seme
lhantes às imagens de sulco vocal do tipo estria. A camada
profunda, por sua vez, torna-se mais larga, pelas fibras de co
lágeno ficarem mais espessas e densas. Em alguns casos ocor
re aumento localizado das fibras de colágeno, que passam a
correr em diferentes direções, produzindo fibrose. As fibras
do músculo vocal também diminuem e atrofiam-se com o
passar da idade. Dá-se o nome de presbilaringe ao envelheci
mento laríngeo inerente à idade, o que gera o envelhecimen
to vocal, chamado de presbifonia.
Zona da Membrana Basal — ZMB
Investigações recentes sobre a composição histoquími-
ca das pregas vocais identificaram uma área de transição en
tre o epitélio e a camada superficial da lâmina própria. Essa
região, conhecida como zona da membrana basal (Fig.
1-19), foi observada através da microscopia eletrónica com
o uso de técnicas especiais de coloração. Desta forma, além
das cinco camadas descritas na anatomia microscópica da
prega vocal, no início dos anos 90, Gray (1991) apresentou a
descrição dessa região complexa, multilaminada, com uma
rica estrutura química, situada logo abaixo do epitélio.
Embora a ZMB seja uma área muito reduzida, a impor
tância de sua função é extrema e não totalmente conheci
da. Gray, Hirano & Sato (1993) revisaram os aspectos espe
cíficos dessa estrutura. A ZMB é composta por fibras mem-
branosas e proteínas. A ZMB apresenta uma lâmina lúcida e
uma lâmina densa. Na lâmina densa encontramos duas pro
teínas essenciais para dar resistência à ZMB, o colágeno ti
po IV e o antígeno KF-l. Para compreendermos a importân
cia dessas proteínas, vale lembrar que o KF-l é a proteína
que faz a ligação do epitélio na derme, antígeno da epider-
mólise bolhosa adquirida (EBA). Na EBA ocorre a formação
incompleta ou a ausência total da ZMB, portanto o epitélio
não fica aderido à LP, o que, em grau severo, leva à morte,
pois a pele não fica aderida ao corpo. A duplicação da ZMB
18 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 19
LP
A
B
Membrana basal
Lâmina lúcidaLâmina densa
ene
Camada superficial
da lâmina própria
Membrana .
plasmática '
Camada
intermediária
Camada
superficial
Músculo
tireoaritenóideo
Área da membrana
sub-basal
Camada
— profunda
Epiderme
Hebee
Fig. 1-19. Desenhos esquemáticos da zona da membrana basal. A. Desenho da relação da membrana basal com o epitélio e a lâmina pró
pria; B. Desenho do arranjo das células basais da epiderme à camada superficial da lâmina própria (baseado em Gray, 1991).
Célula basal-da epiderme
nos nódulos vocais e a não duplicação nos pólipos sugere
uma forte relação entre alterações dessa zona e o uso da
voz.
Outras proteínas são também responsáveis pela aderên
cia da epiderme à camada superficial da lâmina própria, co
mo a laminina e a glicoproteína sulfato de heparina.
Na lâmina própria também encontramos muitas proteí
nas, como uma rede de fibras de colágeno tipo 111, a elastina
e a fibronectina. O colágeno tipo III é o mais frequente na
lâmina própria e parece ser o responsável pelas fibras cola-
genosas. Tais fibras não se inserem diretamente na ZMB,
deixando uma conexão muito frágil entre a ZMB e a LP. Para
reforçar essa conexão existem as fibras de ancoragem, pro
teínas que seguram a ZMB à CSLP, fazendo um loop da lâmi
na densa à CSLP e de' volta novamente à lâmina densa, rece
bendo, nesses loops, as fibras de colágeno tipo III. As fibras
de ancoragem são compostas basicamente por colágeno do
tipo VIL Essa rede de arranjo protéico permite a movimenta
ção exuberante dessa camada, sem rupturas.
A fibronectina é uma glicoproteína que também apre
senta diversas funções adesivas, como a aderência célula a
célula e aderência das células à ZMB, sendo também impor
tante no processo de cicatrização dos tecidos. Após uma
lesão de tecido, a fibronectina é depositada sobre o colágeno
danificado, aumentando a migração de fibroblastos e o pro
cesso de reparação celular. Uma presença acentuada de fibro
nectina indica área sujeita a repetidas lesões e reparação, de
vido a fatores agressivos, como o fonotrauma.
O conhecimento sobre a arquitetura histológica da pre
ga vocal, acrescentado pelas pesquisas relacionadas à zona
da membrana basal, modificou muitos princípios e técnicas
cirúrgicas empregados em laringologia. Não se sabe ainda
qual o impacto dos exercícios vocais sobre as diferentes
camadas da lâmina própria e sobre a ZMB, mas com certeza
há alterações induzidas pelo treinamento vocal.
ASPECTOS NEUROLÓGICOS BÁSICOS DA
PRODUÇÃO VOCAL
O mecanismo neurofisiológico da laringe ainda não é
completamente compreendido, embora os estudos em neu-
rolaringologia tenham acrescentado informações valiosas e
numerosas na última década.
0 controle da função laríngea evoluiu filogeneticamen-
te de um simples reflexo para uma rede complexa e interde
pendente, em diversos níveis do sistema nervoso.
0 sistema nervoso pode ser dividido em central (SNC) e
periférico (SNP). O SNC inclui o cérebro e a medula, enquan
to o SNP inclui os receptores sensoriais e os nervos. Altera
ções vocais neurológicas podem ter origem central, como a
doença de Parkinson, ou periférica, como a paralisia do ner
vo laríngeo recorrente.
Mecanismo Neurológico Central
A aquisição de produção vocal voluntária exigiu o de
senvolvimento de uma série de vias que conectam a muscu
latura laríngea e as áreas cerebrais correspondentes. Tal ati
vidade complexa depende da interação dos diversos níveis
do sistema nervoso central e do periférico, além da ação
programada e coordenada dos receptores sensoriais.
A atividade motora dos músculos estriados é derivada
do chamado sistema motor. O sistema motor, formado por
vias, estruturas e nervos, está presente nos diversos níveis
do sistema nervoso central e periférico, e é responsável
também pela produção motora da voz.
. O controle volitivo da voz inicia-se no sistema nervoso
cehtral, mais especificamente no córtex cerebral (Fig. 1-20).
A região cortical é a porção do cérebro responsável pela
conceituação, planejamento e execução do ato da fala, in
cluindo a fonação. Os estudos pioneiros de Penfield &
Roberts (1959) identificaram três áreas principais da região
cortical diretamente responsáveis pela vocalização: giro
pré-central (área 4 de Broadmann) e pós-central, área ante
rior (ou de Broca, área 44 de Broadmann) e a área motora su
plementar, localizada na superfície medial do hemisfério
esquerdo ou dominante.
A inervação motora da laringe inicia-se no giro pré-
central. Os conjuntos de fibras nervosas do sistema nervoso
central são geralmente chamados tratos ou vias, e transmi
tem impulsos para outros neurônios; já no sistema nervoso
periférico esses grupos de fibras são chamados apenas de
nervos, e transmitem impulsos para os órgãos do corpo.
Daube, Reagan & Sandok (1986) reconhecem quatro di
visões principais do sistema motor denominadas, pelos au
tores, como: as vias finais comuns, as vias de ativação dire
ta, as vias de ativação indireta e os circuitos de controle.
As vias finais comuns, denominadas neurônio motor
inferior, correspondem ao mecanismo periférico pelo qual
a atividade motora é mediada, ou seja, é a finalização da
cadeia dos eventos neurais. Sua função básica é estimular a
contração e os movimentos do órgão em questão através
dos nervos cranianos e espinais. As vias finais comuns do
sistema motor para a voz são formadas pelos nervos larín-
geos. Alterações nessas vias produzem fraqueza muscular,
paralisia e consequente atrofia muscular.
As vias de ativação direta são também chamadas de vias
do sistema voluntário, sistema motor direto, tratos pirami
dais, vias piramidais ou neurônio motor superior, e constitu-
em-se nas vias motoras diretas do córtex, com função excita-
tória. Essas vias influenciam os movimentos conscientemen
te controlados, distintos e rápidos, e suas principais estrutu
ras são os tratos corticobulbar e corticoespinal. Sua princi
pal ação é sobre as vias finais comuns, ou seja, no neurônio
motor inferior; contudo, além dessas fibras, outras também
são dirigidas ao sistema de ativação indireta (extrapirami-
dal). O trato corticobulbar influencia as atividades dos ner
vos cranianos, enquanto o trato corticoespinal influencia a
atividade dos nervos espinais. Os componentes corticais do
sistema de ativação direta incluem o córtex motor primário
VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 2120
Medula espinhal
Osso hióide
Anel traqueal <
Cartilagem
cricóidea
Cortéx
cerebral
Cartilagem
tireóidea
Artéria
subclávia
Núcleo ambíguo
Cérebro
Medula oblonga
Nervo laríngeo superior
Arco da aorta
Célula
de origem
Nervo laríngeo
recorrente
Nervo laríngeo superior,
ramo externo
Nervo laríngeo superior,
ramo interno
> Decussação de
fibras eferentes
. Nervo vago
7 (Xpar)
Fig. 1-20. Representação esquemática da topografia neural para a produção da voz, do córtex à laringe.
(área 4 de Broadmann, ou giro pré-central, no lobo frontal),
o córtex pré-motor (área anterior ao córtex primário, no
lobo frontal) e a área motora suplementar (uma região parti
cular da área pré-motora); além disso, algumas fibras do
neurônio motor superior também se originam no lobo tem
poral, em uma área chamada de área motora secundária.
0 neurônio motor superior, originado em cada um dos
hemisférios, ou seja, com representação bilateral, inerva o
neurônio motor inferior, em ambos os lados do corpo.
Lesões nesse componente produzem perda ou redução de
movimentos voluntários, porém de modo não tão profundo
como as lesões no neurônio motor inferior.
As vias de ativação indireta são extremamente comple
xas e não são completamente descritas e compreendidas. O
sistema de ativação indireta também é conhecido por via ou
trato extrapiramidal, ou sistema motor indireto. O termo
indireto aqui se refere às inúmeras e múltiplas sinapses en
tre sua origem no córtex e a ativação das vias finais comuns.
O sistema extrapiramidal tem origemdifusa no córtex cere
bral, mas seu maior componente situa-se na área motora do
lobo frontal, incluindo a área suplementar, a área pré-mo-
tora, o giro pré-central e o giro pós-central. O giro pós-cen-
tral é a área do processamento dos vários tipos de inputs
sensoriais, como, por exemplo, a informação da contração e
movimentação dos músculos da laringe, através de uma via
direta entre o córtex e o sistema sensorial laríngeo. O circui
to extrapiramidal projeta-se para os gânglios da base e para
o tálamo, retornando ao córtex, tendo a função de modular
o funcionamento da via piramidal. A principal função da via
extrapiramidal é agir como mecanismo modelador das vias
motoras finais, mas também está associada indiretamente
aos movimentos voluntários, ao equilíbrio e à postura. As
sim, as vias do sistema de ativação indireta apresentam-se
intrinsecamente ligadas aos gânglios da base e aos circuitos
de controle cerebelar. As principais estruturas das vias de
ativação indireta são os tratos corticorrubral, corticorreticu-
lar, rubroespinal, reticuloespinal, vestibuloespinal e outros
tratos para os nervos cranianos. Lesões nesse sistema mani
festam-se de diversas formas, mas geralmente afetam o
tono muscular e os reflexos.
Os circuitos de controle são os circuitos de integração
e coordenação das informações sensoriais e das vias de ati
vação direta e indireta. Ao contrário das vias de ativação
direta e indireta, os circuitos de controle não têm contato
com o neurônio motor inferior. Há dois principais circuitos
de controle motor: os circuitos de controle dos gânglios da
base, intimamente relacionados com o sistema extrapirami
dal, e os circuitos de controle do cerebelo.
Os gânglios da base são os responsáveis pela programa
ção da postura do corpo e pelos componentes de suporte
das atividades motoras. Os gânglios da base incluem: o
núcleo caudado, o putâmen e o globo pálido. Os gânglios da
base têm conexões com a substância negra, o núcleo subta-
lâmico e o córtex cerebral. As funções dos gânglios da base
não são totalmente compreendidas, mas são importantes
no controle da postura e do tono muscular sobre o qual os
movimentos voluntários são superpostos, regulando a am
plitude, a velocidade e, provavelmente, o disparo dos movi
mentos. Em muitos textos, os gânglios da base aparecem
como parte do sistema extrapiramidal, pelo fato de estarem
fora das pirâmides da medula, mas Daube, Reagan & Sandok
(1986) ressaltam que essa razão é insuficiente, já que o cere
belo também se localiza fora da medula, e nem por isso é
categorizado como parte do sistema extrapiramidal. Por
tanto parece ser fácil aceitar a categorização dos gânglios
da base como um dos circuitos de controle motor e não
como um trato descendente da atividade motora. Os princi
pais efeitos das lesões nos gânglios da base podem aparecer
de dois modos: redução de mobilidade, ou hipocinesia
(como na doença de Parkinson); e movimentos involuntá
rios ou hipercinesia, como na distonia focal laríngea e
coréia, entre outros (Duffy, 1995).
Os circuitos de controle do cerebelo integram e coorde
nam a execução de movimentos finos e dirigidos, e são
constituídos pelo cerebelo e suas conexões com a formação
reticular, núcleo rubro, núcleos da ponte, núcleo olivar infe
rior, tálamo e córtex cerebral. O cerebelo está profunda-
mente relacionado ao controle do movimento, principal
mente no que diz respeito ao planejamento de padrões de
movimento, ou seja, à sintonia da coordenação dos movi
mentos rápidos, como no ritmo da fala. O cerebelo é ainda
capaz de introduzir modificações corretivas para melhorar a
coordenação dos movimentos dos músculos agonistas e
antagonistas, produzindo, no caso da fala, uma emissão
bem coordenada. Lesões no cerebelo provocam marcha atá-
xica, nistagmo, hipotonia, tremor de movimentos e incoor-
denação ipsilateral ao lado da lesão.
Assim, a partir do cérebro, a informação desce através
das vias motoras voluntárias e involuntárias; e quando de
terminados pontos nas áreas corticais são estimulados, em
qualquer um dos hemisférios, ocorre a vocalização. Desta
forma, percebe-se que a laringe possui representação dupla
no córtex cerebral.
Muitas estruturas do sistema límbico estão envolvidas
em comportamentos afetivos e são capazes de estimular a
vocalização específica que acompanha as emoções. 0 tála
mo, em particular, tem vias que se ligam ao córtex motor e à
área de Broca; além disso, faz diversas conexões com o cere
belo, mesencéfalo e outras estruturas do diencéfalo. 0 tála
mo está envolvido na manutenção da consciência, alerta e
atenção e também integra a emoção a um ato motor com
plexo. Sendo assim, possui a capacidade de permitir a inter
ferência da emoção na voz e na fala.
Uma outra estrutura relacionada à vocalização é a subs
tância cinzenta periaquedutal (SCPA). Essa é uma zona es
pessa de substância cinzenta, posicionada no mesencéfalo,
logo abaixo do tálamo, envolvendo o aqueduto cerebral de
Sylvius. A SCPA é conhecida por interferir na atividade de
alguns músculos da laringe, incluindo a vocalização. Botez
& Barbeau (1971) também relacionaram a SCPA em distúr
bios envolvendo o mutismo. Embora a atividade dessa área
seja muito importante, não se sabe precisamente como os
22 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 23
seus neurônios estão relacionados à vocalização, apesar de,
aparentemente, desempenhar um papel relevante na coor
denação entre a musculatura respiratória e a laríngea na
vocalização, ativando a musculatura adutora.
A informação originada no giro pré-central é transmiti
da para os núcleos motores do tronco e da medula. No tron
co cerebral, as estruturas relacionadas com o controle neu
ral da fonação incluem o núcleo ambíguo, o núcleo do trato
solitário e o núcleo parabraquial.
0 núcleo ambíguo é um agrupamento complexo de cor
pos celulares que contém fibras do IX, X e parte das fibras do
XI par craniano. Assim, uma pequena parte do núcleo ambí
guo fornece fibras motoras para o X par craniano, formando
o nervo laríngeo. A estimulação das fibras do nervo laríngeo
superior ativa respostas a partir dos centros respiratórios na
medula. Estes são importantes para interromper a respira
ção durante o reflexo da deglutição. A estimulação do nervo
laríngeo superior também causa um fechamento reflexo da
laringe e produção aumentada de muco. Desta forma, a
informação que chega aos núcleos é enviada para a coorde
nação da atividade da laringe, musculatura torácica, abdo
minal e para os articuladores da fala, entretanto não se tem
conhecimento sobre a exata conexão entre SCPA e o núcleo
ambíguo.
É importante ressaltar que, além das conexões das vias
piramidais e extrapiramidal, um refinamento adicional da
atividade motora é realizado pelo sistema nervoso autóno
mo, que é dividido em dois subsistemas: simpático e paras-
simpático. 0 sistema nervoso simpático prepara o organis
mo para suportar situações de estresse através do aumento
da pressão sanguínea, da dilatação das pupilas e do aumen
to do fluxo respiratório, entre outras reações. Já o parassim-
pático produz efeitos opostos aos do sistema simpático,
apresentando um relaxamento global, com diminuição da
pressão sanguínea e do fluxo respiratório, gerando assim
sensação de bem-estar. A relação desses dois sistemas com a
voz é indireta, influenciando principalmente a qualidade
vocal.
Aspectos do Mecanismo Neurológico Periférico
Há doze pares de nervos cranianos que recebem seus
nomes de acordo com sua função, estrutura que inerva ou
localização, sendo numerados de acordo com a localização
de sua conexão no tronco cerebral. Desta forma, o primeiro
par craniano, o olfatório, é o mais alto e anterior dos 12
pares, enquanto o XII, o hipoglosso, é o mais baixo, quase
na junção com a medula. Tais nervos são motores, sensitivos
ou mistos, sendo que a maior parte deles está envolvida no
controle da voze da fala.
Os nervos cranianos associados à produção da voz e da
fala são: V ou trigêmeo (misto), VII ou facial (misto), VIII ou
vestibulococlear (sensitivo), IX ou glossofaríngeo (misto), X
ou vago (misto), XI ou acessório (motor), e XII ou hipoglosso
(motor).
O V par, o trigêmeo, é um nervo misto, o maior de todos
os nervos cranianos, cuja porção sensitiva inerva as estrutu
ras superficiais e profundas da face, boca e mandíbula; seu
componente motor principal responde pela mastigação e
pelo palato mole, inervando também o músculo milo-hiói-
deo e o ventre anterior do digástrico. Sua lesão pode gerar
vários sintomas, como redução na sensibilidade homolateral
da face, dificuldade mastigatória, nevralgia do trigêmeo,
maior sensibilidade sonora (por paralisia do tensor do tímpa
no), entre outros.
O VII par, o facial, é um nervo misto, que supre princi
palmente a musculatura da expressão facial, levando tam
bém informação aferente global e específica. Uma caracte-
rística desse nervo é a comunicação com outros pares crani
anos, entre eles os pares V, VIII, IX e X, função ainda pouco
compreendida. Sua lesão pode gerar vários efeitos, entre
eles paralisia dos músculos faciais ipsilaterais, perda do
paladar, aumento do tamanho da fissura palpebral e incapa
cidade de fechar o olho, com perda do reflexo córneo-
palpebral, com redução de produção de lágrimas e saliva.
O VIII par, o vestibulococlear, é um nervo sensitivo, for
mado por duas partes distintas, conhecidas como nervo
coclear e nervo vestibular, com um importante papel sensiti
vo na monitorização da faia. Sua lesão pode resultar em
deficiência auditiva neurosensorial parcial ou total, zumbi
do, vertigem, desvios posturais e nistagmo.
O IX par, o glossofaríngeo, é um nervo misto, responsável
pelas sensações da região posterior da cavidade oral e da
faringe, e também pelo suprimento motor dé alguns múscu
los da faringe e do véu palatino. Sua lesão pode produzir
diversas reações, como perda de sensação e paladar na região
posterior da língua, perda unilateral de reflexo nauseoso e
desvio da úvula contralateral à lesão, associado à disfagia.
O X par, o vago, é um nervo misto que desempenha fun
ções sensitivas e motoras em todo o trato faringolaringoe-
sofágico, tendo estreita relação com o nervo glossofarín
geo, principalmente na formação do plexo faríngeo. Este é o
nervo mais importante na fonação e será descrito com deta
lhes posteriormente. Sua lesão pode incluir paralisia do véu,
com desvio da úvula contralateralmente, disfagia e disfonia,
entre outros.
O XI par, o acessório, é um nervo motor, que supre os
músculos trapézio e o esternocleidomastóideo. Algumas
fibras deste nervo continuam no tronco cerebral e são dis
tribuídas conjuntamente com o nervo recorrente. Sua lesão
resulta em paralisia do músculo esternocleidomastóideo,
dificultando a mobilidade do pescoço e produzindo fraque
za geral do pescoço, além de alterações vocais.
O XII par, o hipoglosso, é um nervo motor, responsável
pelo suprimento dos músculos extrínsecos e intrínsecos da lín
gua, distribuindo-se ainda para alguns músculos do pescoço,
como o esterno-hióideo, esternotireóideo, tireo-hióideo, esti-
loglosso, hipoglosso, genioglosso, gênio-hióideo, milo-hióideo
e o ventre anterior do omo-hióideo. Sua lesão resulta em para
lisia da língua e fasciculação muscular.
Especificamente, os músculos da laringe desempenham
funções coordenadas, precisas e diversas, algumas delas
cruciais para a sobrevivência. A inervação responsável pela
ação muscular da laringe garante um desempenho de alta
qualidade, com contrações rápidas e reduzido nível de fadi
ga. Para a compreensão do padrão de normalidade das fun
ções da laringe e interpretação correta dos dados neurológi
cos da avaliação de um paciente disfônico, é fundamental
que conheçamos as principais características do trajeto da
inervação laríngea.
O nervo laríngeo é um dos poucos ramos do nervo vago
(X par), que tem este nome devido aos longos e tortuosos
caminhos que percorre no corpo (Fig. 1-20), sendo respon
sável por todas as atividades motoras iaríngeas envolvidas
na fonação e na deglutição. Os corpos celulares do nervo va
go originam-se principalmente do núcleo ambíguo do tron
co, sendo que outras fibras vêm de níveis mais altos.
O nervo vago deixa o crânio através do forame jugular,
dividindo-se em muitas ramificações que suprem a inerva
ção de toda a cabeça (ramificação meníngea), do pescoço
(nervos laríngeos superiores e inferiores), do tórax (ramifi
cações brônquicas e esofágicas) e do abdome (nervos gástri
co, celíaco e hepático).
O nervo vago dirige-se verticalmente para baixo e medi
almente à artéria carótida, podendo sofrer lesão em qual
Plexo
faríngeo
Artéria
subclávia
Nervo laríngeo <
recorrente
Ramo interno do nervo <
laríngeo superior
Ramo externo do nervo
laríngeo superior
Nervo laríngeo superior<
> Gânglio inferior
Fig. 1-21. Desenho esquemático do caminho do nervo vago e suas ramificações na inervação laríngea.
Artéria
aorta
> Nervo laríngeo
recorrente
Ramo interno do nervo
laríngeo superior
Nervo laríngeo
superior
Ramo externo do nervo
laríngeo superior
> Nervo laríngeo
inferior
quer ponto de seu trajeto. Particularmente, quanto aos as
pectos vocais, as lesões originadas no trajeto entre o núcleo
ambíguo e a musculatura laríngea provocam diferentes ma
nifestações. De acordo com o nível da lesão, as consequên
cias vocais e seus tratamentos serão diversos.
Uma lesão alta, acima do forame jugular, produz parali
sia de todos os músculos da laringe e também do véu palati
no; desta forma, a prega vocal fica afastada da linha mediana
e há escape nasal. Assim sendo, sempre que uma paralisia
laríngea envolver qualidade vocal com hipernasalidade de-
ve-se pensar em lesão acima da saída do plexo faríngeo, e
não apenas numa alteração periférica. Tais lesões envolvem,
ainda, maior ou menor grau de refluxo nasal de líquidos.
1 Quando as lesões ocorrem após a saída do plexo farín
geo, podemos ter paralisia envolvendo o nervo laríngeo
superior, o nervo laríngeo inferior ou ambos. Uma lesão to
tal, que envolva os nervos laríngeos superiores e inferiores,
tem que ocorrer no nível ou acima do gânglio nodoso.
O nervo laríngeo divide-se em superior e inferior. O ner
vo laríngeo superior (Figs. 1-21 e 1-22) é o principal nervo
sensorial da laringe e é uma ramificação que ocorre no nível
do gânglio nodoso do vago (gânglios inferiores), abaixo do
forame jugular, subdividindo-se em dois ramos, um interno
e outro externo.
24 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 ✓ ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 25
0 ramo interno do nervo laríngeo superior (NLS) desce
e penetra na laringe através de uma abertura na membrana
tireo-hióidea; consiste em fibras sensoriais e secretomoto-
ras, suprindo a mucosa da epiglote, as pregas ariepiglóticas
e toda a cavidade da laringe até as pregas vocais. O ramo ex
terno do nervo laríngeo superior, exclusivamente motor,
desce ao longo da laringe, paralelamente à sua região exter
na, apoiado no músculo constritor inferior, terminando no
músculo cricotireóideo (CT), ao qual provê inervação moto
ra por seu ramo interno.
O nervo laríngeo inferior (Fig. 1-21) é uma outra ramifi
cação no nível do gânglio nodoso do vago (gânglio inferior),
abaixo do forame jugular. Os nervos laríngeos inferiores
descem paralelamente à laringe, entrando no tórax e retor
nando em direção à laringe, quando então se inserem nos
músculos peia região posterior desta. O trecho terminai
•ascendente dos nervos laríngeos inferiores denomina-se re-
; corrente. Os nervos recorrentes direito e esquerdo ascen-
■ dem à laringe entre a traquéia e o esófago e suprem os mús
culos intrínsecos da laringe, com exceção do CT, inervado
pelo ramo externo do nervo laríngeo superior. Todos os
músculos da laringe são inervados pelo nervo recorrente
ipsilateral, com exceção do músculo aritenóideo que recebeinervação bilateral. Os nervos recorrentes direito e esquer
do apresentam origem, extensão e trajetos diferentes.
O nervo laríngeo recorrente direito é mais curto que o
esquerdo, iniciando-se após a passagem do nervo laríngeo
inferior pela artéria subclávia, logo abaixo da clavícula. O
nervo recorrente esquerdo é mais longo e inicia seu trajeto
após o nervo laríngeo inferior passar pelo arco da aorta, no
tórax, subindo então ao lado da traquéia, até atingir a larin
ge. A entrada de ambos os recorrentes na laringe faz-se pela
região mais posteripr da membrana cricotireóidea, próximo
à junta cricotireóidea. Pelo seu maior percurso, o nervo
laríngeo recorrente esquerdo é mais vulnerável a lesões,
particularmente devido à pressão de aneurismas da aorta ou
tumores do mediastino.
Quadro 1-5. Principais nervos da laringe, seus trajetos e funções
Nervo Trajeto Função
Laríngeo superior Ramificação do gânglio nodoso do vago, abaixo do forâme
jugular
Principal nervo sensorial da laringe
Ramo inferno Penetra na laringe através de uma abertura na membrana ■
tireo-hióidea
Fibras sensoriais e secretomotoras; supre :
a mucosa da epiglote, das pregas
ariepiglóticas e da cavidade da laringe até :
as pregas vocais ;
Ramo externo Desce paralelamente à região externa da laringe, apoiado no
músculo constritor inferior, terminando no músculo CT
Exclusivamente motor e inerva o músculo
CT
Laríngeo inferior Outra ramificação do gânglio nodoso do vago; desce paralelo à
laringe, entra no tórax e retorna à laringe por sua região posterior
Músculos intrínsecos da laringe, menos o :
CT: inervação sensorial e secretória da
mucosa
Nervo direito Mais curto que o esquerdo; inicia após a passagem pela artéria
subclávia, logo abaixo da clavícula
Ramo anterior: CAL e IA. Ramo posterior:
CAPeA
Nervo esquerdo Mais longo; inicia após passar pelo arco da aorta, no tórax,
subindo ao lado da traquéia, até atingir a laringe
Ramo anterior: CAL e TA. Ramo posterior:
CAPeA
Nervo laríngeo
recorrente
Alça<
cervical 1
Ramo interno <
do nervo laríngeo
superior
Ramo externo _
do nervo laríngeo
superior
Músculo <
constritor inferior
“ da faringe
Nervo laríngeo <
superior
Fig. 1-22. Desenho esquemático do caminho do nervo laríngeo
superior, ramos interno e externo.
Após a entrada pela membrana cricotireóidea, ambos
os nervos laríngeos recorrentes dividem-se em dois ramos:
anterior e posterior. O ramo anterior supre o músculo crico-
aritenóideo lateral e o tireoaritenóideo, enquanto que o ra
mo posterior supre o cricoaritenóideo posterior e o arite
nóideo. A mucosa da subglote recebe inervação sensorial e
secretória dos nervos laríngeos recorrentes. Existe ainda,
em alguns indivíduos, uma comunicação neural entre o
ramo externo do nervo laríngeo superior e o nervo recor
rente, chamada de anastomose de Galeno.
-Pela diferença de comprimento entre os dois nervos re
correntes, tem sido sugerido que o recorrente esquerdo
apresenta fibras de mielina de maior diâmetro que o direito,
o que lhe confere maior velocidade de condução para que o
estímulo nervoso chegue ao mesmo tempo em ambas as
pregas vocais.
Um resumo didático dos nervos laríngeos, seus ramos e
suas funções é apresentado no Quadro 1-5.
Além das inervações motora e sensorial descritas, exis
te um sistema de reflexos laríngeos altamente complexo,
com a finalidade de preservar a coluna aérea. A laringe pos
sui receptores sensoriais ao toque, vibração, diferenças de
pressão e estímulos por líquidos, o que possibilita um fecha
mento esfincteriano poderoso para isolar a traquéia e os
pulmões da possibilidade de entrada de algum elemento es
tranho. Quando o estímulo atinge níveis elevados, pode-se
desencadear um reflexo ainda mais forte, chamado laringo-
espasmo. Há também um reflexo laríngeo respiratório, que
abre as pregas vocais de modo rítmico e em contração coor
denada com o diafragma.
A laringe apresenta ainda uma grande variedade de re
ceptores sensoriais capazes de detectar mudanças na muco
sa, nos movimentos das articulações e nos tamanhos dos
músculos. Tais receptores são utilizados em diversos refle
xos, como proteção das vias aéreas inferiores e no controle
da fonação. Não se conhece precisamente como ocorre a
conexão desses receptores com o SNC, embora saibamos
que sua origem situa-se nas fibras do neurônio motor (Gar
rett & Larson, 1991).
DRENAGEM ARTERIAL, VENOSA E LINFÁTICA
A laringe situa-se entre duas artérias carótidas comuns,
mas esses vasos não enviam ramos ao pescoço. Por essa
razão, a laringe depende do que ela pode receber superior
mente da artéria carótida externa e inferiormente da artéria
subclávia. As artérias da laringe são as tireóideas superiores
e inferiores e seus ramos laríngeos, também superiores e
inferiores.
As artérias laríngeas superiores e as artérias cricotireói-
deas são ramos das artérias tireóideas superiores. A artéria
laríngea superior penetra na membrana tireo-hióidea, acom
panhada pelo ramo interno do nervo laríngeo superior. As
artérias cricotireóideas formam uma arcada diante da larin
ge, próximo da borda superior da glândula tireóidea; origi
nam-se dos vasos tireóideos superiores sob os músculos
esternotireóideos e arqueiam-se transversalmente diante do
ligamento cricotireóideo, emitindo anastomoses múltiplas
para os triângulos cricotireóideos e um vaso minúsculo cons
tante de linha mediana que perfura o próprio ligamento.
As artérias laríngeas inferiores originam-se das artérias
tireóideas inferiores, advindas do tronco tireocervical. A arté
ria laríngea inferior penetra na laringe posteriormente, pela
junta cricotireóidea, ao lado do nervo laríngeo recorrente, ra-
mificando-se sobre o GAP e o CAL, formando ainda anasto
moses com as conexões arteriais entre a artéria laríngea su
perior e os vasos cricotireóideos no espaço paraglótico.
As veias que acompanham o suprimento arterial for
mam tributárias que drenam o sangue de volta para as veias
tireóideas superior e média e finalmente para o sistema ju
gular interno.
As artérias e veias entram e saem da laringe, superior e
inferiormente, através das mesmas vias que os nervos larín
geos. Entretanto elas também enviam ramos e recebem tri
butárias anteriormente através de uma área desprovida de
nervos, o triângulo cricotireóideo. Este triângulo localiza-se
lateral ao ligamento cricotireóideo, inferior à cartilagem ti
reóidea e medial ao músculo cricotireóideo.
t A laringe é muito rica quanto à drenagem linfática, à ex
ceção da borda livre das pregas vocais. A drenagem linfática
é realizada ao longo dos vasos sanguíneos, tanto na parte
superior como na inferior da laringe, em direção aos nódu
los cervicais.
* FUNÇÕES DA LARINGE
A laringe possui uma série extensa de funções, das
quais as mais importantes são a função respiratória, a de-
glutitória e a fonatória.
Função Respiratória
A laringe apresenta uma fantástica evolução filogenéti-
ca, de modo que a função mais antiga, a respiração, é a que
requer menos energia e a que ocupa a maior parte do tempo
desse órgão. A abertura da laringe garante a entrada e a saí
da livre do ar, sendo garantida pela ação potente do GAP.
Durante a inspiração a laringe é fracionada ligeiramen
te para baixo, passando a ser tracionada ligeiramente para
cima durante a expiração; a dimensão desse deslocamento é
proporcional à intensidade da respiração. A traquéia e o dia
fragma participam da descida da laringe, contribuindo, jun
tamente com o músculo cricoaritenóideo posterior, para o
afastamento das aritenóides e das pregas vocais. Além dis
so, os músculos infra-hióideos e esternotireóideos contri
buem para a descida da cartilagem tireóidea e, conseqúen-
temente, para a abertura da laringe.
Função Deglutitória
O fechamento máximo da laringe ocorre durante a fase
faríngea da deglutição. O selamento conseguido é essencial
para que não ocorra a entrada de alimentos na árvore respi
ratória. A sequência de eventos ocorreda seguinte maneira:
a laringe é elevada, anteriorizada e fechada, de baixo para
cima, pela aproximação tanto das estruturas glóticas como
das supraglóticas, envolvendo uma contração mediana fir
me das pregas vocais e pregas vestibulares. O esfincter ve-
lo-faríngeo também se fecha nesse momento. A base da lín
gua é então empurrada posteriormente. A cartilagem epi
glote é fletida sobre o ádito laríngeo, à medida que a laringe
se eleva, pela ação das pregas ariepiglóticas. Quando a epi
glote está completamente abaixada, ocorrem contrações
sucessivas dos músculos constritores inferiores da faringe.
26 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 27
A cartilagem cricóidea afasta-se da coluna cervical e o mús
culo cricofaríngeo relaxa-se.
O bolo alimentar passa para a região superior do esófa
go, com retorno da base da língua à posição inicial. A epiglo-
te retorna à sua posição normal e a laringe descende e rea
bre. A respiração é automaticamente interrompida durante
a deglutição, sendo toda esta sequência dependente da esti
mulação neural aferente, realizada através dos nervos glos-
sofaríngeos e nervos laríngeos inferiores.
Desta forma, durante a deglutição a luz laríngea vai se
fechando de baixo para cima. O músculo tireoepiglótico
protege a mucosa supraglótica sensível no ádito da laringe,
de modo que ela não é estimulada. As pregas vocais pare
cem funcionar como uma válvula obturadora, de modo mais
eficiente do que um esfíncter circular simples faria. A epiglo-
te é um acréscimo adicional, porém não é essencial para o
fechamento da laringe, como se vê nos pacientes que foram
submetidos à sua ablação.
A função de deglutição consome muita energia durante
curto espaço de tempo. Entre as funções da laringe, a de
deglutição é a que ocupa o menor tempo (Lopes & Campos,
1994).
Função Fonatória
A fonação é uma função neurofisiológica inata, mas a
voz vai se formando ao longo da vida, de acordo com as
características anatomofuncionais do indivíduo e os aspec
tos emocionais de sua história pessoal.
A laringe produz a fonação, enquanto que o trato vocal
produz a voz. Voz é fonação acrescida de ressonância. Assim
sendo, do ponto de vista físico, a voz é o som produzido pela
vibração das pregas vocais, modificado pelas cavidades situa
das abaixo e acima dela, ditas cavidades de ressonância. Estas
modificações podem ocorrer de diversas formas e em associa
ções, tais como reforço ou abafamento dos harmónicos, além
de acréscimos de ruídos gerados em pontos de estreitamento
ao longo do trato vocal, ou ainda interrupção momentânea do
fluxo de ar, formando alguns dos sons consonantais.
Para a produção da voz há a necessidade da interação de
órgãos de diferentes sistemas do corpo humano. Este con
junto anatômico tem recebido inadequadamente o nome de
aparelho fonador, uma expressão consagrada e de uso cor
rente, aparelho este que não existe enquanto unidade física,
mas que deve funcionar de modo harmónico.
Para a compreensão detalhada da fisiologia envolvida
na produção da voz, é importante que alguns dos principais
conceitos envolvidos nesse processo sejam discutidos:
mecanismo de vibração glótica, controle de frequência, con
trole de intensidade e controle de qualidade vocal.
A) Mecanismo de vibração glótica
A compreensão do mecanismo vibratório envolvido na
produção do som envolve o conhecimento anatômico e o uso
de alta tecnologia. A mucosa da prega vocal vibra em uma
velocidade muito acelerada que impede a observação dos
ciclos glóticos individuais a olho nu. A frequência da vibração
da mucosa ocorre em cerca de 100 Hz (ciclos por segundo) no
homem, enquanto que na mulher esta frequência é, em mé
dia, o dobro, ao redor de 200 Hz (ciclos por segundo).
Cada ciclo glótico é formado por quatro etapas: fase
aberta, fase de fechamento, fase fechada e fase de abertura
(Fig. 1-23). O ciclo glótico inicia-se quando a pressão subgló-
tica é maior do que a resistência glótica e dá início ao pro
cesso vibratório.
Fig. 1-23. Representação esquemática das quatro fases do ciclo gló
tico e da expansão da abertura (de trás para frente e de baixo para
cima) e do fechamento glótico (de frente para trás e de baixo para
cima), evidenciando a diferença vertical de fase.
Os ciclos glóticos sucessivos não são exatamente iguais,
podendo ser observadas perturbações mínimas tanto no
período como na amplitude desses ciclos, o que é conhe
cido, respectivamente, por jitter e shimmer. Além dessas
perturbações nos ciclos glóticos sucessivos, podem exis
tir diferenças na duração de cada fase do ciclo, sendo que
em casos de fase fechada curta observam-se fadiga vocal e
disfonia, e em casos de fase fechada mais longa, verifi
ca-se um padrão fonatório mais saudável, com melhor
absorção do impacto gerado durante a fonação.
O movimento ondulatório da prega vocal é um mecanis
mo vibratório complexo, como explicado por similaridade
na figura elaborada por Perkins (Fig. 1-24). O movimento
ondulatório envolve tanto as características da mucosa das
pregas vocais como o aspecto muscular, podendo apresen
tar variações individuais (Perkins & Kent, 1986).
Fig. 1-24. Representação esquemática do movimento complexo
das pregas vocais através da comparação com os efeitos da com-
pliância no encontro de duas bolas de borracha (baseado em Per
kins & Kent, 1987).
A camada superficial da lâmina própria (CSLP) ondula de
forma bastante exuberante, de três modos combinados:
horizontalmente, longitudinalmente e verticalmente. O mo
vimento no plano horizontal indica o deslocamento da mu
cosa por movimentos mediais e laterais; o movimento longi
tudinal é o deslocamento da mucosa por movimentos ante
riores e posteriores, sendo que as pregas vocais abrem-se
de trás para frente e fecham-se de frente para trás. Final
mente, o movimento vertical da mucosa ocorre por diferen
ça vertical de fáse (Fig. 1-23), em movimentos de baixo para
cima, sendo que as pregas vocais abrem-se e fecham-se nes
te mesmo sentido, ou seja, de baixo para cima. Clinicamen-
te observamos apenas os movimentos horizontais e os lon
gitudinais da mucosa, porém, com a introdução recente da
videoquimografia, essa tão importante análise vertical da
onda da mucosa passa a ser possível.
As forças vibratórias envolvidas no processo fonatório
determinam no ciclo glótico a sua velocidade, a ocorrência
das fases de abertura e fechamento, além de definir quando
e como cada uma destas etapas ocorre. A teoria mioelásti-
ca-aerodinâmica da fonação auxilia na compreensão deste
processo. A essência desta teoria é que a vibração glótica é
o resultado da interação e do equilíbrio entre as forças aero
dinâmicas — basicamente advindas do efeito Bernoulli, e
forças mioelásticas — principalmente da resistência glótica,
ou seja, da resistência dos músculos da laringe à passagem
do fluxo de ar.
Para compreender as forças aerodinâmicas, torna-se im
prescindível lembrarmos do efeito Bernoulli. Este princípio
afirma que à medida que ocorre um aumento da velocidade
de um gás ou de um líquido passado pelas paredes de um tu
bo flexível, ocorre uma redução da pressão ao longo das pare
des desse tubo, o que aproxima essas paredes entre si.
Alguns exemplos no dia-a-dia podem ser lembrados para a
melhor compreensão desse fenômeno. Por exemplo, ao to
marmos banho em box com cortina plástica, ao ligarmos rapi
damente o chuveiro, observa-se o movimento imediato da
cortina em direção ao nosso corpo, à medida que à água pas
sa, ou seja, a pressão negativa criada pela passagem do líqui
do em alta velocidade aproximou a parede flexível, no caso a
cortina, da parede do fundo do box. Ao tomarmos rapidamen
te um líquido com canudinho plástico, podemos também
observar o colabamento de suas paredes durante a sucção,
também em função da pressão negativa criada. Um carro
parado pode ser facilmente puxado em direção a um cami
nhão passando em alta velocidade, principalmentese estiver
mos dentro de um túnel. Papéis podem voar por uma janela
aberta, em um carro em alta velocidade. Finalmente, temos o
processo de decolagem dos aviões, quando a ação das turbi
nas cria uma diferença de pressão entre a parte superior e
inferior das asas, facilitando a decolagem da aeronave:
O mesmo princípio aplica-se na laringe. Imaginemos que
o aparelho fonador é um tubo no qual há passagem de ar em
alta velocidade, criando uma pressão negativa em suas pare
des, pressão esta que aproxima estruturas flexíveis entre si.
Na laringe, a estrutura mais flexível é a mucosa das pregas
vocais, sugadas pela passagem do ar expiratório, o que ocor
re assim que as pregas vocais são aproximadas pela açãò da
musculatura adutora. Dessa forma, a pressão negativa gerada
nas paredes da laringe suga a mucosa e faz com que elas se
toquem algumas vezes, antes mesmo das pregas vocais en-
costarem-se pela ação da musculatura adutora.
B) Controle de frequência
Existe uma variação muito grande na frequência funda
mental das vozes entre indivíduos de diferentes idades e
sexos, muitas vezes superiores a três oitavas. Quanto menor
o tamanho da prega vocal, mais aguda será a frequência fún-
28 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 29
damental do indivíduo. Assim sendo, à proporção que o
comprimento natural das pregas vocais aumenta, o som fica
mais grave. Desta forma, nos bebés recém-nascidos a fre-
qiiência fundamental é bastante aguda, ao redor de 400 Hz;
em mulheres adultas a frequência média situa-se ao redor
de 200 Hz; e em homens adultos, cerca de 100 Hz.
Quanto ao controle de frequência da voz — produção
de um som mais agudo ou mais grave-— podemos utilizar
uma série de recursos. A principal estratégia envolvida na
prôdução de um som mais agudo é alongar as pregas vocais,
mas também podemos fazer as pregas vocais vibrarem mais
rapidamente, reduzir a massa colocada em vibração ou ele
var a tensão do sistema; na verdade, usamos todos esses
fatores de forma interdependente, mas aparentemente a
massa colocada em vibração por unidade de comprimento
parece ser o fator preponderante.
> C) Controle de intensidade
A variação de intensidade que o ser humano pode pro
duzir é também muito ampla, podendo chegar a sons de
140 dBNA, nas vozes treinadas de grande ópera.
A intensidade de um som produzido pelas pregas vocais
depende diretamente da resistência que a glote oferece à
passagem do ar; em outras palavras, uma glote eficiente gera
um aumento da pressão subglótica, responsável pela variação
da intensidade. Para que haja aumento da pressão subglótica,
será importante uma boa coaptação glótica no ajuste pré-
fonatório. Coaptação glótica deficiente produz vozes fracas e
com variação limitada da extensão dinâmica. Em um exemplo
oposto, podemos pensar na emissão em forte intensidade,
como o grito, que exige um padrão eficiente de coaptação
glótica. Fatores como velocidade da emissão do ar e quanti
dade de ar emitido também interferem na intensidade a ser
emitida, e são diretamente relacionados à pressão subglóti
ca, ou seja, quanto maior for a pressão subglótica, maior se
rão a velocidade e a quantidade do ar emitido. Em um exem
plo prático, podemos perceber essas variações na emissão do
som “p", colocando as mãos sobre a boca e variando a inten
sidade da emissão (Perkins &, Kent 1986).
Portanto também utilizamos mecanismos diversos na
variação da intensidade, sendo o principal o aumento da
pressão de ar subglótica, controlando sua saída por um mai
or fechamento glótico.
D) Controle de qualidade vocal
Enquanto os mecanismos anteriores são envolvidos
diretamente na produção da fonação, as variações na quali
dade vocal dizem respeito à produção da voz como um
todo. Quando produzimos uma voz mais rouca, mais clara,
mais nasal, mais enérgica ou mais melosa, modificamos to
do o trato vocal, e não somente o mecanismo de produção
fonatória em nível laríngeo, ou seja, na produção das dife
rentes qualidades vocais envolvemos aspectos ressonantais,
modificando a curva espectral do som. Por exemplo, em
uma voz rouca ocorre ruído entre os harmónicos e em subs
tituição a esses; já em uma voz soprosa ocorre uma acentua
da queda espectral, ou seja, a série de harmónicos é peque
na e com acentuada queda de amplitude.
BASES RESPIRATÓRIAS DA VOZ
A função primária da respiração é efetuar trocas gaso
sas entre o meio ambiente e o organismo, ou seja, oferecer
oxigénio ao organismo e eliminar dióxido de carbono. Além
desta função vital, o sistema respiratório fornece fluxo e
pressão de ar necessários para a produção da voz e da fala.
De acordo com Palmer (1984), a respiração envolve três
aspectos,.a saber: a ventilação, que compreende a entrada
do ar atmosférico para dentro dos pulmões; a respiração ex
terna, ou seja, a troca de gases entre as paredes dos pul
mões e o sangue; e a respiração interna, a troca de gases en
tre o sangue e as células do organismo.
O sistema respiratório funciona como uma bomba, pro
duzindo fluxo e pressão de ar para excitar o mecanismo vi
bratório das pregas vocais. Sem ar não há som laríngeo. Tal
fato pode ser facilmente verificado se a boca e as narinas
forem simultaneamente, ocluídas, enquanto se procura so
norizar em nível glótico.)Por vezes percebe-se um som mui
to fraco, apenas nas primeiras frações de segundo, quando
há um mínimo fluxo aéreo transglótico; a partir desse mo
mento, não se é mais capaz de excitar o mecanismo vibrató
rio glótico.
Trato Respiratório
O trato respiratório começa nas narinas e vai até os al
véolos pulmonares; O espaço entre o nariz e os brônquios
constitui-se em um espaço respiratório morto, no sentido
em que a troca gasosa somente ocorre nos capilares sangiií-
neos dos alvéolos pulmonares.
O nariz influi significativamente no volume e na quali
dade da corrente respiratória. A mucosa nasal é úmida e cili-
ada, o que permite a captura de resíduos e o transporte do
ar para a faringe. Quando a inspiração é feita via nasal, o ar é
purificado, aquecido e umedecido pela mucosa nasal, prin
cipalmente após a passagem, em alta velocidade, pelos cor
netos nasais. Quando ocorre a penetração de corpos estra
nhos nas narinas, ocorre uma parada respiratória reflexa,
seguida de espirro, caracterizando a função nasal protetora.
A maior parte do trato respiratório é formada pelo sis
tema pulmonar, que engloba a traquéia, os brônquios e as
estruturas dos pulmões. O sistema pulmonar é revestido
por uma caixa muscular e óssea, também denominada caixa
torácica, intimamente associada ao abdome. Os tecidos de
conexão do trato respiratório englobam principalmente os
ossos e estruturas cartilaginosas do tórax, que o protegem
internamente e favorecem as transformações necessárias-
para a respiração. Embora os chamados tecidos de conexão
da caixa torácica e os ossos da própria caixa tenham impor
tância primária no tipo e qualidade da respiração realizada,
são considerados órgãos respiratórios somente as estrutu
ras que recebem diretamente o ar respirado, ou seja: a cavi
dade nasal, a faringe, a laringe, a traquéia, os brônquios e os
pulmões.
O trato respiratório é extenso e variável intra e intersu-
jeitos. O ar é puxado através das narinas, ou pela boca,
chegando à faringe, laringe e traquéia. A traquéia se divide
em dois brônquios e estes em bronquíolos, que penetram
nos pulmões.
A traquéia é um tubo retilíneo composta por anéis carti
laginosos e porções musculomembranáceas, situado abaixo
da cartilagem cricóidea. A traquéia divide-se em dois brôn
quios, direito e esquerdo, na altura da 5a vértebra torácica.
Do 16a ao 20a anel traqueal, a traquéia apresenta anéis
incompletos de cartilagem hialina, que se diferem em largu
ra e espessura. A região dorsal dos anéis traqueais, musculo-
membranácea, é contígua à parede do esófago.
Os brônquios dividem-se em bronquíolos, cada brônquio
serve um lobo pulmonar. Os bronquíolossubdividem-se em
alvéolos pulmonares, que apresentam relação .íntima com as
paredes dos capilares sanguíneos, local onde ocorrem as tro
cas gasosas.
Os pulmões são altamente elásticos, formados por uma
base, um ápice e duas superfícies. A base é larga e côncava
para acomodar o diafragma. O ápice é pequeno e com proje
ção arredondada e pode alcançar as proximidades da claví
cula. As superfícies pulmonares são chamadas de costais e
mediastinais. A superfície costal é convexa e geralmente de
monstra a posição das costelas flutuantes. A superfície me
diastinal é côncava e irregular, próxima ao coração e cobre a
maior parte da traquéia e dos brônquios, provavelmente
acomodando o pericárdio.
O pulmão direito possui três lobos e, o esquerdo, dois.
A diferença do número de lobos é devida à localização do
coração e das outras estruturas do mediastino. A pleura é
uma membrana aquosa que envolve os pulmões e lobos pul
monares.
Tecidos de Conexão do Aparelho Respiratório
Os tecidos de conexão do aparelho respiratório são for
mados principalmente por estruturas ósseas, a saber: as vér
tebras, a clavícula, as costelas, o osso esterno, a escápula,
além de cartilagens que também servem de suporte para o
sistema respiratório. As principais estruturas da caixa toráci
ca estão esquematizadas na Fig. 1-25, onde também está
indicada a movimentação vertical e transversal da caixa.
A coluna vertebral é uma estrutura óssea flexível com
posta por um grupo de vértebras. As sete primeiras vérte
bras são denominadas vértebras cervicais, sendo que a pri
meira vértebra cervical (Cl) recebe o nome de atlas e supor
ta o crânio, e a segunda vértebra cervical (C2) é chamada de
áxis. Além das vértebras cervicais, existem 12 vértebras
torácicas, que tomam parte integrante do sistema respirató
rio, 5 vértebras lombares, 5 vértebras sacrais e 4 ou 5 vérte
bras coccígeas.
A clavícula localiza-se acima da primeira costela e arti-
cula-se ventralmente com o manúbrio do esterno. Partindo
deste ponto, estende-se lateralmente e alcança a escápula.
Vários músculos que têm sua origem ou inserção no osso da
clavícula participam da respiração: o esternocleidomastói-
deo, o peitoral maior e outros músculos extrínsecos da
Fig. 1-25. Representação esquemática da caixa torácica, com indi
cação de sua movimentação vertical e transversal.
laringe. A escápula une-se à clavícula para formar a articula
ção do ombro.
As costelas são pares de ossos que formam a caixa torá
cica, protegendo os pulmões. Geralmente são em número
de 12, embora possa haver costelas extras. Existe um entre
laçamento muscular que conecta as costelas entre si e com
outras estruturas do corpo, como, por exemplo, com o osso
esterno e as vértebras. As costelas terminam nas cartilagens
costais, que atuam como apoio do mecanismo elástico, que
é responsável pela flexibilidade natural da caixa torácica.
O esterno é um osso ímpar, localizado na linha mediana
do tórax, e auxilia na fixação da terminação ventral das carti
lagens costais, protegendo o conteúdo da caixa torácica. O
osso esterno é composto por três regiões anatômicas: o
manúbrio (seu terminal superior), o corpo e o processo
xifóide (sua ponta inferior).
Musculatura Respiratória
A respiração é o resultado de uma ação propulsora. Os
músculos envolvidos neste processo são vários, dependen
do da demanda respiratória. Durante o repouso, poucos
músculos são requisitados, e a respiração é chamada silen
te, passiva ou de repouso. Quanto maior a necessidade de
obter oxigénio, ou quanto maior a quantidade de ar neces
sária para a atividade fonatória, maior o número de múscu
los em atividade. Quando a respiração é forçada, a ação
muscular aumenta o volume e diminui a pressão dentro do
tórax, promovendo a entrada de ar nos pulmões. Durante a
expiração, há uma compressão desta bomba propulsora e,
conseqiientemente, uma diminuição no volume e aumento
na pressão dos pulmões, suficiente para expulsar o ar.
Os músculos da respiração podem ser didaticamente
divididos em torácicos e abdominais.
Os músculos respiratórios torácicos são: o diafragma,
os intercostais internos, os intercostais externos, o escale
no, o torácico transverso, o quadrado lombar, o peitoral
maior e o peitoral menor. Os principais dados quanto à ori
gem, inserção, ação e inervação de cada um desses múscu
los respiratórios torácicos estão no Quadro 1-6.
30 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 ✓ ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 31
Quadro 1-6. Músculos torácicos da respiração (adaptado de Palmer, 1984)
Músculo Origem Inserção Ação Nervo
Diafragma Circunferência interna do
tórax; processo xifóide; 6a e
7a costelas; vértebra lombar
Tendões centrais Principal músculo da
respiração; eleva as costelas;
deprime o tendão central; maior
dimensão vertical .
Nervo frênico
(C3,4e5)
Intercostais
externos
Face ínfero-exterior de cada
costela
Face súpero-exterior de cada
costela
Eleva as costelas na inspiração N. intercostal
(T1 a 11)
Intercostais
internos
Face súpero-interna de cada
costela
Face ínfero-interna de cada
costela
Deprime as costelas na
expiração
N. intercostal
(T1 a 11)
Escaleno Conexão variada de C3 a
C7
Face superior das costelas Eleva e fixa as costelas Fibras dc CA a Ca
Torácico
Transverso
Face interna do osso esterno
e processo xifóide
Cartilagem costal e terminação
das costelas de 2 a 6
Deprime as costelas N. intercostal.
(T2 a T6)
Quadrado
lombar
Crista ilíaca; vértebra
lombar; ligamento
íleolombar
Borda inferior da costela;
músculos abdominais
Empurra a costela! 2 e fixa o
diafragma :
Fibras de T12,
L1 a L2
Peitoral maior Úmero Clavícula; esterno; carts,
costais de 2 a 6
Eleva as costelas Fibras de C5 e T1
Peitoral menor Escápula Costelas de 2 a 5
=====
Eleva as costelas Fibras de C7 a C8
Os músculos respiratórios abdominais são: o reto abdo
minal, o oblíquo externo, o oblíquo interno e o abdominal
transverso. Os principais dados quanto à origem, inserção,
ação e inervação de cada um desses músculos respiratórios
abdominais estão no Quadro 1-7.
O diafragma é o maior e mais importante músculo da
respiração, e sua ação determina o nível de profundidade
respiratória que o indivíduo realiza. O diafragma é formado
por dois tendões centrais, que suportam o coração e os pul
mões, conectando-se com a borda inferior da caixa torácica.
Em repouso, os tendões do diafragma formam dois semicír
culos nas bases dos pulmões, o que dá uma imagem de guar
da-chuva aberto. Na inspiração, durante sua contração, o
diafragma retifica-se, devido à origem inferior das fibras
musculares, eleva as costelas e aumenta a dimensão vertical
do tórax. Um espaço potencial é criado entre o diafragma e
os pulmões, que é então preenchido por tecido pulmonar.
Quadro 1-7. Músculos abdominais cia respiração (adaptado de Palmer, 1984)
Músculo Origem Inserção Ação Nervo
Reto Abdominal Crista e sínfise pubianas Processo xifóide; cart,
costais 5, 6 e 7
Sustenta e comprime as
vísceras
Nervos intercostais
inferiores (T7 a 12)
Oblíquo externo Bordas externas das costelas 5 a
12_ Crista ilíaca; linha alba
e ligamento inguinal
Sustenta e comprime as
vísceras; deprime o tórax
Nervos intercostais
inferiores (T8 a 12, L1)
Oblíquo interno Crista ilíaca; fáscia lombar;
ligamento inguinal
Linha alba; cart, das
cost. 8, 9 e 10;
aponeurose abdominal
Sustenta e comprime as
vísceras
Nervos intercostais
inferiores (T9 a 12, L1)
Abdominal
transverso
Ligamento inguinal; crista ilíaca;
costelas 6 a 12; fáscia lombar
Processo xifóide; linha
alba; crista ilíaca
Sustenta e comprime as
vísceras
Nervos intercostais
inferiores (T7 a 12, L1) ;
Com isto, há uma mudança de pressão aérea, que força a
entrada do ar para dentro dos pulmões. O diafragma é iner-
vado pelo nervo frênico, ramo do nervo cervical.
Os músculos intercostais externos situam-se superfici
almente ao longo das costelas, unindo uma à outra em dire
ção oblíqua. São consideradosimportantes para a respira
ção, elevando as costelas na inspiração. Os músculos inter
costais internos também apresentam fibras oblíquas, e são
considerados músculos da expiração, pois são responsáveis
pelo abaixamento da caixa torácica. Ambos os músculos
intercostais são inervados pelos nervos intercostais.
Conforme já foi mencionado, dependendo da demanda
e do tipo de respiração, quer seja mais ativa ou passiva, um
maior ou menor número de músculos é acionado. Os mús
culos considerados auxiliares na respiração são: o escaleno,
o torácico transverso, o quadrado lombar, o peitoral maior,
o peitoral menor e o abdominal.
Para controlar as atividades voluntárias e involuntárias
da respiração são necessárias fibras nervosas de natureza
sensitiva e motora.
Fisiologia Respiratória
Muitas mudanças ocorrem na anatomia e fisiologia res
piratória desde a infância até a idade adulta. A capacidade
vital, ou seja, o volume de ar inspirado após expiração máxi
ma, aumenta e alcança seu pico por volta dos 20 anos de
idade e volta a decrescer com a diminuição da movimenta
ção diafragmática, em idades mais avançadas. Há um au
mento do volume residual, considerado o volume de ar res
tante após expiração máxima, o que significa que uma
menor quantidade de ar é necessária para a troca gasosa
(Perkins & Kent, 1986).
Uma outra mudança significativa ocorre no número de
respirações por minuto. Enquanto um neonato respira 30 a
90 vezes por minuto, um padrão de 10 a 22 respirações por
minuto é estabelecido no final da infância, início da adoles
cência. A frequência respiratória é determinada pela capaci
dade pulmonar e pela eficiência das trocas respiratórias.
Irregularidades do padrão respiratório são muito comuns
em crianças. Tal fato deve ser levado em consideração quan
do da avaliação de crianças disfônicas, do momento em que
as irregularidades respiratórias observadas geralmente não
caracterizam a alteração vocal, mas, sim, fazem parte do
processo de desenvolvimento respiratório.
A última mudança fisiológica observada com o desen
volvimento ontogenético corresponde ao aumento do ta
manho das estruturas respiratórias, incluindo a laringe e a
traquéia, além dos pulmões.
O tórax pode ser expandido em três dimensões: verti
cal, transversal e ântero-posteriormente.
O ciclo respiratório apresenta duas fases, separadas
entre si por um pequeno intervalo: a inspiração e a expira
ção. Na respiração em repouso, o tempo da fase inspiratória
é, em média, três vezes maior que a fase expiratória (Behlau
& Pontes, 1995). A respiração para a fala é muito diferente
da respiração vital ou silente.
Durante a respiração silente, a utilização de uma peque
na quantidade de volume de ar permite que se estabeleça
um equilíbrio entre a tendência do tórax expandir e dos pul
mões de colabar. Na inspiração, a musculatura ativa expan
de o tórax diminuindo a pressão interna e o ar entra nos pul
mões; a inspiração silente reflete o volume de ar que pode
ser inalado com a contração do diafragma e dos intercostais
externos. O relaxamento dos músculos inspiratórios e a for
ça elástica de recuo da caixa torácica diminuem o volume de
ar dos pulmões, aumentando a pressão aérea e forçando o
ar para sair. Portanto a expiração silente é um processo pas
sivo, resultante da força elástica dos pulmões e do abdome.
Neste caso, a duração da inspiração e da expiração silente
não é muito diferente, já que a inspiração ocupa 40% do ci
clo e a expiração, 60%. O volume de ar movimentado é cha
mado volume tidal. .
Quando a quantidade de energia requer maior quanti
dade de ar, há um recrutamento de suporte muscular, tanto
para a inspiração quanto para a expiração. A inspiração for
çada é acompanhada dos músculos acessórios da inspira
ção, além do diafragma e intercostais externos. Na expira
ção forçada, os músculos expiratórios participam ativamen
te, suportando a movimentação passiva do processo expira-
tório e aumentando a pressão aérea. Evidentemente, quan
to mais profundamente a pessoa inspira, maior será o recru
tamento de músculos acessórios. Em casos de inspiração
forçada extrema, como no grito, aciona-se inclusive o ester-
nocleidomastóideo, músculo extrínseco da laringe que atua
como acessório da respiração. Observa-se que alguns paci-
entes disfônicos mantêm sempre a caixa torácica elevada,
com contração forçada do esternocleidomastóideo, o que
produz um alargamento do pescoço.
Quando o objetivo da respiração é a fala, é necessário
que se forme pressão aérea capaz de fazer vibrar a mucosa
das pregas vocais, ou que se expulse uma quantidade de ar
suficiente para a produção, por exemplo, de uma consoante
plosiva. A pressão de ar necessária para a fala pode ser
alcançada de duas maneiras: a primeira, quando se estabele
ce um ajuste entre a força expiratória e a ação propulsora; e
a segunda, através do ajuste da resistência aérea. A pressão
resultante que se inicia na traquéia, abaixo das pregas vo
cais, é usualmente chamada de pressão subglótica. A varia
ção na resistência aérea da força expiratória determina a
pressão subglótica. A fala ocorre durante a expiração pro
longada, que se deve ao relaxamento controlado dos mús
culos inspiratórios, os quais reprimem a ação elástica, prin
cipal responsável pelo retorno dos pulmões e caixa torácica
à posição de repouso, o que é chamado pressão de relaxa
mento ou de retorno. Segundo Aronson (1990), utilizamos
para a fala cerca de 20% do volume total dos pulmões, o que
corresponde de 1,2 a 1,5 litro de ar; já a respiração vital utili
za apenas de 10 a 15% desse volume, ou seja, meio litro de
ar. Outro aspecto importante apontado pelo autor é a dife
rença na velocidade respiratória nas duas situações referi
das. Na respiração vital realizamos de 16 a 18 ciclos por
minuto, com duração média de 2 a 3 segundos por ciclo. Já
na fala a velocidade respiratória é enormemente reduzida,
podendo-se chegar a uma média de oito ciclos por minuto,
com uma expiração que se estende por até 40 segundos. A
proporção entre a duração das fases inspiratória e expirató
ria é de aproximadamente um na respiração silente, en
quanto na fala essa proporção chega a um décimo, o que in
dica que a inspiração passa a ocupar apenas 10% da duração
total do ciclo respiratório. Desta forma, a fala requer maior
quantidade de ar, menor velocidade respiratória e uma fase
expiratória alongada.
De forma bastante simplificada, a inspiração é a fase
eminentemente ativa do ciclo respiratório. Nesse processo,
o diafragma, que tem sua posição natural em cúpula, retifi
ca-se. Concomitantemente, com auxílio da ação dos múscu
los intercostais internos, procede um aumento do volume
da caixa torácica. Toda essa fase é regulada de forma reflexa
32 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 33
do centro pneumotáxico bulbar, porém uma série de inter
ferências podem ocorrer na inspiração, como as provocadas
pelas emoções. Já a expiração é um processo passivo, resul
tante do relaxamento do diafragma e da elasticidade das
paredes musculares da caixa torácica, o que provoca a
expulsão do ar armazenado. Durante a fonação há também
a solicitação da contração dos músculos intercostais exter
nos e de toda árvore traqueobrônquica.
Para uma fonação normal, é essencial que as forças
aerodinâmicas estejam equilibradas com as forças mioelás-
ticas da laringe, de modo que o resultado não seja uma fona
ção demasiadamente soprosa ou excessivamente tensa.
Para a produção de voz e fala normais é essencial a coor
denação da respiração. Aspectos como momento de recarga
e quantidade de ar, profundidade da inspiração e controle
da expiração devem ser considerados. O controle do timing
respiratório é básico. Enquanto a respiração silenciosa é
automaticamente controlada pelos centros respiratórios do
tronco cerebral, durante a fala esse controle passa a ocorrer
em nível superior, cortical, dominado pelo planejamentoda
emissão (Smith & Deny, 1990).
O planejamento respiratório de uma emissão envolve
considerações sobre o tipo de enunciado, sua estrutura sin
tática, a qualidade vocal utilizada, a intensidade e a proje
ção requeridas.
Em geral, a respiração para a fala é programada de tal
forma que iniciamos a maioria de nossas emissões com 40 a
60% de nossa capacidade vital e terminamos nossas emis
sões entre 50 a 30% da capacidade vital (Hixon, Goldman &
Mead, 1973). Dentro desta faixa, o volume pulmonar varia
de acordo com uma série de fatores, tais como: a idade do
sujeito (Hoit & Hixon, 1987), sua conformação física (Hoit &
Hixon, 1986), a posição do corpo (Hoit, 1995), fatores mecâ
nicos (Hixon, Goldmand & Mead, 1973), a intensidade da
fala, sendo que uma emissão forte é precedida por um nível
de volume pulmonar mais elevado (Winkworth, Davis, Ellis
& Adams, 1994) e o estado de humor.(Winkworth, Davis,
Adams & Ellis, 1995). Além disso, a respiração para a fala
também envolve maiores volumes da caixa torácica e meno
res volumes abdominais, ao contrário do que acontece no
relaxamento (Hixon, Goldman & Mead, 1973; Hoit & Hixon,
1987; Russell & Stathopoulos, 1988; Mitchell, Hoit & Wat
son, 1996).
Apesar de se reconhecer que o tipo de enunciado tem
uma grande influência sobre a inspiração que o precede,
com maiores volumes sendo utilizados em maiores intensi
dades e para enunciados mais longos (Winkworth, Davis,
Ellis & Adams, 1994), estudos recentes demonstram que há
também outras influências, como a dos mecanismos utiliza
dos pelo indivíduo na respiração silenciosa (Deny, 2000).
A postura corporal define grande parte do comporta
mento respiratório; se o corpo encontra-se em desequilí
brio em relação à gravidade, as relações mecânicas e as for
ças elásticas inerentes ao sistema respiratório estarão con-
seqiientemente alteradas. Nas situações de gravidade próxi
ma a zero, como no espaço sideral, a postura corporal passa
a ser praticamente irrelevante para a respiração. Também
nos bebés a influência da postura corporal é bastante limita
da, neste caso devido à pequena massa abdominal (Hoit,
1995).
Crianças e adultos apresentam diferentes comporta
mentos respiratórios durante a produção de fala, principal
mente devido a aspectos maturacionais, apesar das similari
dades encontradas quando se considera apenas o nível con
fortável de emissão. Russel & Stathopoulos (1988) conside
ram que fatores neurológicos e mecânicos são determinan
tes no padrão de respiração para a fala encontrado em crian
ças. Os dados de pesquisa apontam que as crianças, produ
zem um maior número de inspirações por minuto e um
menor número de sílabas por segundo de emissão; nas cri
anças, o volume pulmonar utilizado para a fala está situado
em níveis mais baixos da capacidade vital nos adultos; em
alta intensidade,-os adultos utilizam uma maior porcenta
gem de sua capacidade vital que as crianças; os adultos tam
bém utilizam ar da capacidade funcional residual nas emis
sões fortes, o que não é observado nas crianças; na tarefa de
leitura em voz alta, as crianças usam maior porcentagem de
sua capacidade vital quando o texto é carregado de conso
antes plosivas, influência que não é observada na idade
adulta. Tais fatores sugerem que a respiração na criança é
influenciada primariamente por questões articulatórias,
enquanto que no adulto é a demanda de intensidade que
controla a respiração. As autoras .concluíram que crianças
apresentam uma unidade torácico-pulmonar mais compli-
ante, com maior uso do mecanismo laríngeo para controlar
o fluxo e a pressão de ar, e com reflexos respiratórios mais
ativos, associados a músculos respiratórios mais fracos que
os adultos.
Alterações respiratórias são sinal e sintoma direto de
alterações vocais neurológicas, sendo um importante com
ponente nas disartrias. Nas desordens psicogênicas também
são frequentes as queixas respiratórias, contudo, neste caso
o sintoma típico é de que “o ar não chega ao fundo dos pul
mões", como se algo estivesse bloqueando, no peito, a sua
passagem.
TEORIAS DA PRODUÇÃO DA VOZ
A evolução e o desenvolvimento do conceito da produ
ção da voz passaram por quatro principais fases culturais,
de acordo com Von Leden (1997). Na primeira, denominada
mística, os homens procuravam explicar os fenômenos
naturais através da magia, da religião ou pela ação do sobre
natural. Na segunda fase, denominada metafísica, o conhe
cimento existente era baseado na observação, embora fosse
puramente especulativo. Já na terceira fase, denominada
tradicional, toda informação era baseada em tradição ou
revelação, nas grandes autoridades políticas e religiosas da
época. A última fase, denominada realista, iniciou-se com o
Renascimento, quando a medicina passou a ser considerada
uma ciência, sendo esperado que os médicos fossem habili
dosos tanto em arte quanto em ciência.
Algumas informações do texto de Von Leden (1997) são
particularmente interessantes. E, desta forma, transcritas
aqui. Hipocrates (460-377 a.C.) citava o volume e a força do ar
como fundamentais na produção da voz na laringe; foi ele
quem percebeu que consoantes e vogais eram formadas de
modo diverso. Por sua vez, Aristóteles (384-322 a.C.) compa
rou a laringe a uma flauta e a traquéia ao corpo de um instru
mento. No século II, Galeno, um grego nascido em Pergamon,
formado em filosofia e ciências naturais, serviu ao imperador
romano Marco Aurélio e demonstrou interesse especial pela
laringe, descrevendo as principais cartilagens e músculos, ad
quirindo conhecimento prático a partir do atendimento aos
gladiadores feridos. Galeno escreveu mais de 300 livros e foi
considerado um intelectual da época. Dentre os médicos ára
bes, o autor cita Avicenna, o persa, (980-1037), como o mais
famoso deste período, tendo escrito mais de 100 livros, inclu
indo uma descrição da anatomia e fisiologia da laringe, além
de um capítulo sobre a produção da voz e seus distúrbios.
Durante o Renascimento, um dos maiores estudiosos de ana
tomia, Leonardo Da Vinci (1452-1519), contribuiu com impor
tantes informações sobre a anatomofisiologia e a patologia da
voz humana. A contribuição de Da Vinci foi visionária em mui
tas áreas do conhecimento humano, além de ter realizado
diversos experimentos, como o de apertar os pulmões de um
ganso e observar que se produziam sons de tons variados. Fal
lopio (1523-1563) foi considerado um dos principais anato
mistas de sua época, responsável por ter cunhado o termo cri-
cóide para identificar a segunda maior cartilagem laríngea.
Morgagni (1682-1771), professor de anatomia em Pádova, for
neceu valiosas contribuições, tais como a descrição das fibras
oblíquas do tireoaritenóideo, as cartilagens cuneiformes, as
glândulas da epiglote, os ligamentos faringo-epiglóticos, os
ventrículos, as pregas vestibulares, entre outros. Bem mais
Quadro 1-8. Principais teorias da produção vocal, com seu conceito central
Teoria de Produção da Voz Conceito Central
Teoria da Corda Vibrante Cordas musculares vibram pela passagem da corrente de ar
Teoria da Palheta O ar que escapa no afastamento temporário das pregas vocais produz o som
Teoria Mioelástica A tensão dos tecidos produz os ciclos vibratórios repetidos
: Teoria Neurocronáxica Os impulso.-, nervosos vibram as pregas vocais na mesma frequência do som-
Teoria Aerodinâmica O processo aerodinâmico produz o som laríngeo
Teoria Mioelástica-aerodinâmica A elasticidade dos músculos (? a pressão do ar produzem o som
Teoria Impulsionai A oscilação relaxada das pregas vocais produz o som
Teoria Muco-ondulatória A mucosa define a vibração das pregas vocais
Teoria Neuroscilatória A voz é um fenômeno direto da atividade assincrônica do músculo vocal
Teoria Osciloimpedancional ou Teoria da
Resistência Negativa
A laringe é um oscilador complexo com amoni/ac ao reduzida
Teoria do Caos A laringe é um sistema caótico, não-linear e altamente sensível
recentemente, no século XVIII,Ferrein (1741) concluiu que no
interior da laringe existiam formações comparáveis às cordas
do violino, denominando-as de cordas vocais, que vibravam
sob a ação da corrente de ar pulmonar, podendo-se produzir
sons mais graves ou mais agudos. No século XIX, Liskovius
(1814) demonstrou que o movimento vibratório da prega
vocal era realizado principalmente no eixo horizontal. Em
seguida, Múller(1837) concluiu que a supraglote modificava o
som produzido pelas pregas vocais, percebendo ainda que se
a tensão das pregas fosse mantida enquanto se aumentasse a
pressão do fluxo subglótico, haveria um aumento na frequên
cia resultante. Míiller definiu, a partir destes dados, a
chamada Teoria Mioelástica da fonação, em 1839, por vezes
attibuída a Edwald (1898), como afirma Le Huche & Allali
(1993). Em 1863, Helmholtz explicou que a fonação seria o
produto da pressão do ar que passa pela glote. Dois anos mais
tarde, em 1865, Garcia observou, através de um espelho, suas
próprias cordas vocais, pela primeira vez, em ação.
Apresentaremos, a seguir, um breve relato das mais divul
gadas teorias de produção da voz, resumidas no Quadro 1-8.
A discussão básica na época era sobre o que vibrava: as
pregas vocais ou o ar na laringe. Com o passar das décadas,
várias teorias foram sendo formuladas, complementadas ou
refutadas, procurando-se explicar a produção da voz dentro
de uma visão científica. Na realidade ainda não temos ne
nhuma que dê conta das diferentes possibilidades de produ
ção vocal. Embora a maior parte dos textos clínicos na área
de voz exponha a oposição entre as teorias mioelásti-
ca-aerodinâmica e neurocronáxica, há uma série de contri
buições outras que nos fazem refletir sobre os mecanismos
envolvidos na produção da voz humana, desde a histórica
teoria da corda vibrante até a recente proposta de aplicação
da teoria do caos à laringe.
34 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 35
Teoria da Corda Vibrante
De modo simplista, essa teoria explicava que a corrente
de ar, ao passar entre as pregas vocais, provocaria sua vibra
ção e a produção do som. As pregas vocais seriam denomi
nadas cordas ou cordões, sendo consideradas fibras de mús
culo, com capacidade de vibração em partes ou como um
todo. A teoria preconizava que a vibração total da prega
vocal produziria a frequência fundamental, enquanto que
sua vibração por partes produziria os harmónicos. Os estu
dos anatômicos refutaram totalmente essa teoria.
2
Teoria da Palheta
Nesta teoria a laringe era comparada a um instrumento
de palheta, com as pregas vocais aproximando-se tempora
riamente e separando-se a seguir, deixando o ar escapar em
lufadas, que produziriam o som. A frequência do som
dependeria do tamanho, forma, rigidez, abertura da glote e
também da força do ar expirado. Embora muitas das rela
ções apresentadas por essa teoria sejam verdadeiras, o con
ceito de palhetas que se aproximam e separam é inadequa
do, já que a aproximação das pregas vocais mantêm-se por
toda a emissão, variando-se a vibração da cobertura.
Teoria Mioelástica
A teoria mioelástica descreveu a vibração das pregas
vocais como um processo passivo, que dependia basica
mente da relação entre a pressão subglótica e a tensão das
pregas vocais, sendo que a redução da pressão e as modifi
cações na tensão produziriam os ciclos vibratórios repeti
dos. Desta forma, a frequência dos pulsos de ar determina
ria a frequência do som emitido. Apesar desta teoria ter tido
seus fundamentos apresentados no século XIX, várias modi
ficações foram inseridas ao longo do tempo, e alguns dos
conceitos envolvidos perduram até nossos dias. Uma crítica
a essa teoria é que o processo de produção vocal não é pas
sivo e estanque, como o preconizado. Além disso, por este
modelo não se consegue explicar a variação de intensidade
independente de uma variação de frequência. Apesar desses
aspectos, a teoria mioelástica nunca foi refutada totalmen
te, embora seja vista como insuficiente.
Teoria Neurocronáxica
A teoria neurocronáxica foi descrita por Raoul Husson,
que questionou radicalmente a visão tradicional da produ
ção da voz, a partir de vários estudos na década de 50.
HUSSON (1962) apresentou a laringe como um sistema de
ativação periódica, provocando reações científicas interna
cionais e uma enorme quantidade de pesquisas, principal-
mente de grupos opositores, ocasionando grande avanço
no conhecimento sobre as características de vibração das
pregas vocais.
Segundo o autor, a fonação seria um fenômeno neuro
muscular ativo, e os movimentos periódicos das pregas vocais
originados por estímulos do nervo laríngeo na mesma fre
quência do som emitido, controlados por um centro cerebral
que regularia a velocidade de vibração de cada uma das pre
gas vocais, ciclo a ciclo. Desta forma, os impulsos elétricos
provocariam contrações de mesma frequência nas pregas
vocais, que se abririam rapidamente deixando passar o ar;
portanto a frequência produzida seria correspondente à fre
quência das aberturas glóticas, determinadas pelos impulsos
do nervo recorrente. De acordo com essa teoria, não haveria
influência importante da pressão subglótica, e nem do fluxo
aéreo. Essa teoria apresenta dificuldades para explicar a pro
dução de sons mais agudos, já que o regime de vibração des
crito permitiria que se produzisse um som de no máximo 500
Hz. O •autor desenvolve, então, o conceito de regime de vibra
ção monofásico para as frequências graves, e bifásico, trifásico
ou até mesmo tetrafásico, para frequências de até 2.000 Hz,
sugerindo que as fibras do nervo laríngeo atuariam em dife
rentes grupos na produção desses sons.
As principais críticas à teoria neurocronáxica dizem res
peito exatamente ao fato de que, se a vibração da prega
vocal fosse numericamente correspondente ao impulso neu
ral, o sistema entraria em tetania. Além disso, a teoria neuro
cronáxica não consegue explicar a aprendizagem da voz eso
fágica, já que neste caso os nervos laríngeos não poderiam
mais conduzir os impulsos neurocronáxicos; não consegue
explicar a produção vocal nas paralisias uni e bilaterais; e
também não dá conta do fato de podermos produzir som em
uma laringe de cadáver, ou mesmo totalmente excisada, ape
nas pela passagem de uma corrente aérea. A neurocronaxia
foi, então, absolutamente refutada, embora se reconheça
que o autor tenha trazido a noção de controle neural para a
produção da voz. Se essa teoria fosse verdadeira, a maior
parte das disfonias seria de natureza neurológica, tendo-se
que rejeitar a participação da mucosa na produção das dife
rentes qualidades vocais. Ademais, a reabilitação vocal seria
baseada no controle mental.
Teoria Aerodinâmica
De acordo com esta teoria, a vibração das pregas vocais
seria produzida por um processo aerodinâmico, resultante
da pressão do ar expirado. A fúnçãò dos músculos laríngeos
seria apenas secundária, promovendo os ajustes necessá
rios para manter as pregas vocais em posição, com determi
nada tensão e configuração. Essa teoria não reconhece a
função muscular nem a importância da mucosa, não expli
cando as variações conjugadas e independentes de frequên
cia e intensidade. Se considerarmos essa teoria, a maior par
te das disfonias ocorreria por problemas respiratórios e a
reabilitação vocal deveria focalizar o controle do processo
aerodinâmico.
Teoria Mioelástica-Aerodinâmica
Van Den Berg (1954) estabeleceu uma teoria conjunta
mioelástica-aerodinâmica que parecia solucionar a proble
mática da modulação vocal pelo controle neural do estira
mento, espessura e rigidez das pregas vocais, associando
esses fatores à energia cinética fornecida pelo fluxo aéreo
subglótico. Essa teoria combina a interrelação de forças de
duas naturezas: a da elasticidade dos músculos laríngeos e
as forças físicas aerodinâmicas da respiração. A descrição
original sofreu algumas modificações e complementações
posteriores, como o fato deque a produção de frequências
graves e agudas é realizada pela contração dos músculos
tensores, enquanto a intensidade é produzida pela contra
ção dos músculos adutores, concomitantes às variações do
fluxo aéreo. Desta forma, a teoria mioelástica-aerodinâmica
desvincula a frequência da intensidade, conseguindo lidar
adequadamente com esses dois parâmetros. A compreen
são desta teoria está intimamente relacionada à descrição
do efeito de Bernoulli, cuja aplicação à laringe refere-se ao
fato de que o aumento da velocidade das partículas de ar,
quando passam pela laringe, reduz a pressão entre as pre
gas vocais, desencadeando esse efeito de sucção, que apro
xima as pregas vocais entre si, seguidas por um retrocesso
elástico, que promove nova adução glótica e o recomeço de
um novo ciclo vibratório. Essa teoria, bastante divulgada e
apresentada até hoje, não dá conta, porém, da diversidade
das produções vocais humanas, particularmente das emis
sões disfônicas e aperiódicas..
Teoria Impulsionai
Cornut & Lafon (1960) desenvolveram a teoria impulsio
nai, na qual as pregas vocais não estão em vibração, mas, sim,
em oscilação relaxada.Os autores explicam a fonação por três
elementos: força do fechamento glótico, pressão subglótica e
oscilação relaxada, pelo efeito Bernoulli. A laringe produziria
impulsos rítmicos, sem que fossem necessários impulsos
motores recorrenciais, como era advogado na teoria neuro
cronáxica. Embora interessante, o conceito de oscilação rela
xada é muito limitado e insuficiente em face dos mecanismos
conhecidos de controle neurológico.
Teoria Muco-Ondulatória
Perellò (1962) apresentou sua teoria muco-ondulatória,
reforçando a importância da mucosa que reveste as pregas
vocais no processo de vibração. Esta teoria representa, na
verdade, praticamente uma complementação da teoria mio
elástica-aerodinâmica, anteriormente proposta, acrescen
tando-se a importância do movimento muco-ondulatório
da mucosa. O autor baseia sua teoria em observações clíni
cas das diferentes qualidades vocais em relação às caracte
rísticas da mucosa das pregas vocais, utilizando a estrobos-
copia e cinematografia ultra-rápida. Analisa a vibração da
mucosa no edema, nas laringites, na síndrome pré-mens-
trual e nas alterações climáticas que ocasionam secura de
mucosa, entre outras situações, fazendo uma ponte clínico-
científica e criticando a teoria neurocronáxica por não con
siderar a importância da mucosa. De acordo com a teoria
muco-ondulatória, a intensidade do som emitido depende
de um maior ou menor grau de adução glótica; já a frequên
cia vocal é dependente da contração dos músculos cricoti-
reóideo e tireoaritenóideo, os quais modificam a forma e o
volume das pregas vocais. Por ser considerada uma comple
mentação da mioelástica-aerodinâmica, esta teoria é muito
aceita e empregada na descrição da produção vocal básica;
contudo essa proposta se mostra insuficiente para explicar
as variações vocais súbitas e imprevisíveis, assim como as
emissões extremamente desviadas.
Teoria Neuroscilatória
A teoria neuroscilatória foi descrita por Silvestre & Mac
Leod (1968), que afirmaram ser a vibração das pregas vocais
um fenômeno direto da atividade do músculo vocal. Para os
autores, a movimentação dos músculos das pregas vocais
seria assincrônica e o impulso nervoso propiciaria inúmeras
4 contrações das pregas vocais. As críticas feitas são seme
lhantes às da teoria neurocronáxica, embora os autores te
nham conseguido avanços no que diz respeito à quantidade
de energia necessária para produzir a voz, esta teoria não
consegue aprofundar a analogia utilizada pelos autores en
tre o músculo vocal e a vibração das asas dos insetos.
Teoria Osciloimpedancional ou Teoria da
Resistência Negativa
Descrita por Conrad (1980) e também por Dejonckere
(1987), consiste em uma teoria moderna alternativa à teoria
mioelástica-aerodinâmica, na tentativa de explicar a movi
mentação das pregas vocais. Essa teoria considera a laringe
um oscilador complexo, com múltiplos componentes, com
amortização reduzida de forma muito lenta. O fluxo de ar
passa em alta velocidade pela laringe, até que alcança uma
pressão negativa, o que propicia que o sistema entre em vi
bração. Essa teoria consegue explicar as vibrações da larin
ge na presença de lesões de massa, através da formação de
subosciladores assimétricos e sobrepostos; todavia não con
segue descrever adequadamente os diferentes tipos de
vozes e as produções aperiódicas.
Teoria do Caos
É pouco conhecida em nossa área, porém muito utiliza
da em outros fenômenos, como os meteorológicos. A cardi
ologia tem empregado suas bases no estudo das arritmias,
assim como a neurologia na análise dos eletroencefalogra
mas. A análise da produção vocal sob o conhecimento da
teoria do caos oferece um paradigma totalmente diverso na
análise da função fonatória.
Titze, Baken & Herzel (1993) defendem a teoria do caos
na produção da voz, acreditando que a laringe, particular-
mente as pregas vocais e o fluxo aéreo transglótico, repre
sentariam um sistema adequado à análise com base nessa
teoria. Um sistema, para ser considerado caótico, deve
apresentar as seguintes propriedades: ser um sistema
não-linear; determinístico; imprevisível; com baixa dimensi
onalidade, ou seja, apresentar poucas variáveis; sendo alta
mente sensível aos fatores de controle, o que significa que
uma mínima alteração em suas condições pode provocar
enormes mudanças conseqúenciais. A teoria do caos ofere
ceria um instrumento necessário para descrever as mais
36 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 37
variadas produções vocais, de uma emissão quase periódica
à total aperiodicidade vocal, o que incluiria bifurcações, am
plitudes irregulares e formas de onda instáveis. Evidências
do caos na laringe, além das situações extremas, como na
disfonia espasmódica, podem ser observadas auditivamen
te quando um indivíduo perde o controle vocal momentâ
neo da voz, pela presença de um simples muco nas pregas
vocais, ou ainda através da análise de espectrogramas, onde
as características de uma dinâmica não-linear podem ser
facilmente identificadas. Os autores acreditam que as cau
sas mais prováveis da irregularidade na vibração das pregas
vocais seriam a oscilação na contração muscular da laringe e
do sistema respiratório, a turbulência no fluxo do ar trans-
glótico, as assimetrias nas propriedades mecânicas e geo
métricas das pregas vocais, a não-linearidade nas proprieda
des dos tecidos da laringe e a movimentação do muco sobre
a mucosa das pregas vocais. Os autores afirmaram que as
propriedades mecânicas das pregas vocais e do fluxo aéreo
translaríngeo poderiam produzir sons oscilantes de alta
dimensão de caos. A proposta recente dessa teoria ainda
não permitiu que estudos suficientes fossem desenvolvidos
para se verificar a real possibilidade de sua aplicação.
Cada vez mais são descritos fatores extremamente com
plexos da mecânica laríngea, que devem ser testados à luz
de uma nova teoria. Na verdade, o fato de se considerar a
laringe um sistema de baixa dimensionalidade talvez seja
uma visão muito simplificada da produção vocal; além disso,
outros aspectos como a falta de identificação das não-
linearidades relevantes e as dificuldades de unificação entre
a análise e a síntese vocais ainda estão em aberto.
Desta forma, embora os avanços no conhecimento da
laringe tenham sido absolutamente surpreendentes, não
existe ainda hoje uma teoria abrangente que contemple a
variedade da produção vocal humana normal e alterada,
embora certas circunstâncias privilegiem um determinado
conceito, como as vozes das lesões de massa da teoria
muco-ondulatória e as vozes das distonias laríngeas da teo
ria do caos. i
SÍNTESE
1. As vias aéreas inferiores surgem no embrião ao redor de quatro semanas e as principais características larín
geas estão formadas no terceiro mês de vida intra-uterina.2. As principais cartilagens da laringe são a tireóidea, a.cricóidea e as aritenóideas.
3. A musculatura intrínseca da laringe atua diretamente na fonação, sendo formada por grupos musculares
com origem e inserção na própria laringe, composta principalmente pelos músculos TA, CAP, CAL, A e CT; já
a musculatura extrínseca da laringe possui inserção fora desta e interfere de modo indireto na fonação.
4. As membranas e ligamentos que conectam as cartilagens laríngeas permitem que elas se movam e realizem
ajustes refinados. .
5. A prega vocal é composta por cinco camadas que apresentam propriedades mecânicas diferentes entre si,
promovendo a possibilidade de uma expressão vocal muito rica.
6. A zona da membrana basal, recentemente descrita, é uma zona de transição entre o epitélio e a camada
superficial da lâmina própria, composta basicamente de proteínas, com função de preservar a aderência da
cobertura da prega vocal durante os movimentos exuberantes da fonação.
7. A teoria de vibração corpo-cobertura baseia-se na noção de um corpo estável (músculo vocal), sobre o qual
a mucosa desliza durante o movimento ondulatório.
8. Os dois principais nervos responsáveis pela inervação da laringe são ramos do nervo vagò (X par craniano):
o nervo laríngeo superior é um nervo misto, sensório e motor, que se divide em dois ramos - o ramo inter
no do nervo laríngeo superior oferece — sensibilidade à laringe, enquanto que o ramo externo do laríngeo
superior inerva o músculo cricotireóideo -já o nervo laríngeo recorrente (porção terminai do laríngeo infe
rior) é um nervo exclusivamente motor, com trajeto distinto entre os lados direito e esquerdo do corpo;
esses nervos oferecem suprimento nervoso a todos os músculos da laringe, com exceção do CT.
9. As principais funções da laringe são três: respiração, deglutição e fonação; o efeito Bernoulli é um dos prin
cipais responsáveis pela função fonatória, sugando a mucosa das pregas vocais entre si e produzindo o som
laríngeo básico.
10. A frequência de uma emissão depende do comprimento da prega vocal, de sua tensão e da massa colocada
em vibração; a intensidade depende principalmente da resistência glótica; finalmente, a qualidade vocal
depende das modificações realizadas em todo o trato vocal.
11. A respiração para a produção vocal é adaptada a partir da respiração vital, sendo ativa na inspiração e passi
va na expiração; o número de músculos envolvidos nesse processo depende da demanda da tarefa fonató-
ria.
12. Existem várias teorias para explicar a produção da voz, sendo a teoria mioelástica-aerodinâmica a mais aceita
mundialmente; contudo, recentemente, a descrição da laringe como um sistema caótico, regido pela teoria
do caos, parece oferecer explicações bastante interessantes e adequadas sobre as produções vocais alteradas
e aperiódicas, normais ou disfônicas.
38 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
RONSON A. Clinical Voices Disorders. 3rd ed. New York:
Thieme, 1990.
BEHLAU M, PONTES P. Avaliação e Tratamento das Disfonias.
São Paulo: Lovise, 1995.
BOTEZ Ml, BARBEAU A. Role of subcortical structures and
particularly of the thalamus in the mechanisms of speech and
language. Intern J Neurol 8:300-20, 1971.
COLTON R. Physiology of Phonation. In BENNINCER MS,
JACOBSON BH, JOHNSON AF (Eds.): Vocal Arts Medicine.
New York: Thieme, 1994.
2
CONRAD WA. A new model of the vocal cords based on a
collapsible tube analogy. Med Res Eng 13:7-10, 1980.
CORNUT G, LAFON JC. Vibrations neuromusculaires des cordes
vocals et théories de la phonation. J Franc Otorhinolaryng
9:317-24,1960.
DAUBE JR, REGAN TJ, SANDOK BA. Medical neurosciences.
Boston, Little & Brown, 1986.
DEJONCKERE PH. Physiologie phonatoire du larynx: Ie concept
; oscilloimpédantiel. Rev Laryngol(Bordeaux) 108:365-68,1987.
DENY M. Periodic variation in inspiratory volume characterizes
speech as well as quiet breathing. J Voice 14:34-46, 2000.
DUFFY JR. Motor Speech Disorders Substrates Differential
Diagnosis and Management. St. Louis: Mosby, 1995.
GARRETT JD, LARSON CR. Neurology of the laryngeal system.
In FORD C, BLESS DM: Phonosurgery Assessment and
Surgical Management of Voice Disorders. New York: Raven,
1991, pp 43-76.
GRAY S. Basement membrane zone injury in vocal nodules. In
GAUFFIN J, HAMMARBERG B (Eds.): Vocal Folds Physiology.
San Diego: Singular, 1991, pp 21-8.
GRAY S, HIRANO M, SATO K. Molecular and cellular structure
of vocal fold tissue. In TITZE IR: Vocal Fold Physiology. San
Diego: Singular, 1993, pp 1-35.
HAMMOND T, ZHOU R, HAMMOND-E, PAWLAK A, GRAY S.
The intermediate+ layer: a morphologic study of the elastin
and hyaluronic acid constituents of normal human vocal
folds. J Voice 11:59-66, 1997.
HENICK DH, SATALOFF RT. Laryngeal embryology and vocal
development. In SATALOFF RT (Ed.): Professional Voice —
the Science and Art of Clinical Care. 2nd ed. San Diego:
Singular, 1997, pp 93-110.
HIRANO M. Histological Color Atlas of the Human Larynx. San
Diego: Singular, 1993.
HIRANO M. Laryngeal histopathology. In COLTON R, CASPER J:
Understanding Voice Problems, A Physiological Perspective
for the Diagnosis and Treatment. 2nd ed. Baltimore: Williams
& Wilkins, 1996.
HIXON T, GOLDMAN M, MEAD J. Kinematics of the chest wall
during speech production, volume displacements of the rib
cage, abdomen, and lung. J Speech Hear Res 16:78-115,1973.
HOIT J, HIXON T. Aging and speech breathing. J Speech Hear
Res 30:351-66, 1987.
HOIT J, HIXON T. Body type and speech breathing. J Speech
Hear Res 29:313-24, 1986.
HOIT J. Influence of body position on breathing and its
implications for the evaluation and treatment of speech and
voice disorders. J Voice 9:341-7, 1995.
HUSSON R. Physiologie de la phonation. Paris: Masson, 1962.
KURITA S, NAGATA K, HIRANO M. A comparative study of the
layer structure of the vocal fold. In BLESS DM, ABBS JH
(Eds.): Vocal Fold Physiology — Contemporary Research and
Clinical Issues. San Diego: Singular, 1995.
LE HUCHE F, ALLALI A. La Voz. Anatomia y Fisiologia de los
Órganos de la Voz y del Habla. 2nd ed. Barcelona: Masson,
1993.
LETSON Jr. JA, TATCHELL R. Arytenoid movement. In SATALOFF
RT (Ed.): Professional Voice — The Science and Art of
Clinical Care. 2nd ed. San Diego: Singular, 1997, pp 131—45.
LOPES O, CAMPOS CA. Tratado de Otorrinolaringologia. São
Paulo: Roca, 1994.
MITCHELL HL, HOIT JD, WATSON PJ. Cognitive-linguistic
demands and speech breathing. J Speech Hear Res
39:93-104;1 -18, 1996.
PALMER JM. Anatomy for Speech and Hearing Disorders. 3rd ed.
Cambridge; Harper & Row, 1984.
PENFIELD W, ROBERTS L. Speech and Brain Mechanisms.
Princeton University, 1959.
PERELLÓ J. La théorie muco-ondulatoire de la phonation. Ann
Otolaryngol 79:722-25, 1962.
PERKINS W, KENT R. Functional Anatomy of Speech Language
and Hearing. 3rd ed.'Boston: College-Hill, 1986.
RUSSEL N, STATHOPOULOS E. Lung volume changes in
children and adults during speech production. J Speech Hear
Res 31:146-55, 1988.
SAXON K, SCHNEIDER CM. Muscular strength and endurance
development. In SAXON K, SCHNEIDER CM: Vocal Exercise
Physiology. San Diego: Singular, 1995.
SILVESTRE JL, MacLEOD P. Le muscle vocal humain est-il
asynchrone? J Physiol 5:373-89, 1968.
SMITH A, DENY M. High frequency oscillations as indicators of
neural control mechanisms in human respiration, mastication
and speech. J Neurophysiol 63:745-58; 1990;
TITZE I, BAKEN RJ, HERZEL H. Evidence of chaos in vocal fold
vibration. In TITZE IR (Ed.): Vocal Fold Physiology. San Diego:
Singular, 1993, pp 143-85.
TUCKER H. Gross and microscopic anatomy of the larynx. In
BENNINGER MS, JACOBSON BH, JOHNSON AF (Eds.):
Vocal Arts Medicine. New York: Thieme, 1994.
TUCKER H. Anatomy of the Larynx. In TUCKER H: The Larynx.
New York: Thieme, 1993.
VAN DEN BERG J. Sur les teories mioelastique et neurocronaxique
de la phonation. Rev Layngol 1954;75:492-512.
VON LEDEN H. Acultural history of the larynx and voice. In
SATALLOF RT (Ed.): Professional Voice The science and Art of
Clinical Care. 2nd ed. San Diego: Singular, 1997, pp 7-86.
WINKWORTH A, DAVIS P, ADAMS R, ELLIS E. Breathing pattern
during spontaneous speech. J Speech Hear Res 38:124-44,
1995.
WINKWORTH A, DAVIS P, ELLIS E, ADAMS R. Variability and
consistency in speech beating during reading: lung volumes,
speech intensity, and linguistic factors. J Speech Hear Res
37:535-56, 1994.
ZEMLIN WR. Embriologia do mecanismo da fala e da audição. In
ZEMLIN WR: Princípios de Anatomia e Fisiologia em _
Fonoaudiologia. 4a ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000, pp
530-66.
LEITURAS
RECOMENDADAS
PERKINS W, KENT R. Functional Anatomy of Speech Language
and Hearing. 2nd ed. Boston: College-Hill, 1986, pp 65-117.
Os Capítulos 4 e 5 descrevem, de modo didático, com uma linguagem
acessível e com inúmeros exemplos práticos, a anatomia e fisiologia da
laringe. Possui testes no final de cada capítulo para avaliar o aprendiza
do, assim como resumos abrangentes do que foi discutido em cada ca
pítulo.
TUCKER H. Anatomy of the Larynx. In The Larynx. New York:
Thieme, 1993, pp 1-18.
Este Capítulo apresenta um texto atual, ricamente ilustrado, contendo
informações claras e atualizadas sobre a anatomia da laringe, com inú
meras correlações fisiológicas.
HIRANO M. Laryngeal histopathology. In COLTON R, CASPER J:
Understanding Voice Problems. A Physiological Perspective for
the Diagnosis and Treatment. 2nd ed. Baltimore: Williams &
Wilkins, 1996, pp 58-77.
0 Capítulo mencionado aborda aspectos anatômicos da macro e mi-
croestrutura de laringe, apresentando quadros com resumos dos dife
rentes aspectos histológicos de alterações variadas que incluem: le
sões benignas, malignas e lesões neuromusculares de laringe.
HIRANO M. Histological Color Atlas of the Human larynx. San
Diego: Singular, 1993.
0 atlas histológico do professor Hirano apresenta a mais bonita e ex
plicativa coleção de cortes laríngeos de diferentes idades e sexo, um
material de várias décadas de análise da Kurume University.
ZEMLIN WR. Princípios de Anatomia e Fisiologia em
Fopoaudiologia. 4th ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.
0 livro do professor Zemlin, recentemente traduzido para o portu
guês, é o resultado de sua extensiva carreira como professor da Univer
sity of Illinois, representando a transcrição de apostilas empregadas em
sala de aula, adaptadas para as necessidades do fonoaudiólogo. É um
livro básico para a compreensão dos distúrbios da comunicação huma
na, abordando aspectos como respiração, fonação, articulação, audi
ção e sistema nervoso, além de embriologia e circulação. Ressaltamos
os Capítulos 3 - Fonação; 5 - Sistema nervoso e 7 - Embriologia do me
canismo da fala e da audição.
VON LEDEN H. A Cultural History of the Larynx and Voice. In
SATALLOF RT (Ed.): Professional Voice The Science and Art of
Clinical Care. 2nd. San Diego: Singular, 1997, pp 7-86.
Esse capítulo, escrito pelo Prof. Dr. Hans Von Leden, reúne de modo ab-
solutamente elegante, com inúmeras ilustrações clássicas, a história
do conhecimento em laringe e voz, identificando as contribuições in
dividuais, desde os tempos dos gregos e romanos até Manuel Garcia. A
leitura sugerida mostra como muito do nosso conhecimento tem suas
raízes em observações empíricas, analisando a evolução científica des
ta área até o século XIX.
40 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 41
SÍTIOS
RECOMENDADOS
"8 http://www.bartleby.com/107/236.html
" Atlas anatômico clássico
0 atlas desenvolvido por Henry Gray (1821-1865), Ana
tomy of the Human Body, na edição de 1918, pode ser acessa-
do virtualmente pela internet, com informações sobre a
anatomia humana. Inclui um capítulo sobre o sistema respi
ratório, com desenhos e texto sobre as estruturas muscula
res, cartilaginosas, glandulares e neurais, relacionadas à la
ringe e à produção vocal. O texto é completo e mais comple-
xo quando comparado a sítios similares, e as imagens em bi
co de pena podem não ser tão atraentes, porém, são clássi
cos para consulta, revisão e estudo.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
13 http://salud.bayer.eS//laringe-atlas/contenido.html
Atlas anatômico com imagens de cortes de laringes
excisadas
Este sítio é um Atlas anatômico da laringe, criado pelo
médico de Barcelona, Ferran Tolosa i Cobani, disponibiliza-
do pela Bayer Farmacêutica. 0 Atlas virtual apresenta fotos
de laringes dissecadas, com explicações sobre as estruturas
laríngeas e suas disposições. As fotos são de ótima qualida
de e o texto é preciso e resumido. Apresenta também uma
bibliografia básica sobre anatomia da laringe.
Idioma: Espanhol
Sítio visitado em 5/1/2001
DS http://www.upmc.edu/upmcvoice/anatomy.htm
Anatomia básica da laringe
0 sítio da University of Pittsburgh Voice Center apresenta
um texto básico com informações sobre anatomia e fisiolo
gia laríngea, funções da laringe, fluxo aéreo transglótico,
fonação e articulação, acompanhado de ilustrações simplifi
cadas. Oferece a possibilidade de acessar, na página inicial,
o atlas de fotos e vídeos da laringe (encontrados na barra de
rolagem logo abaixo do título da página). É ideal para ser
usado com pacientes, para fins educacionais.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
D8 http://www.voice-center.com/larynx.html
Anatomia básica da laringe
O sítio da The Voice Center at Eastern Virginia Medical Scho
ol, criado por Randall L. Plant, médico e diretor do centro,
traz um leque de informações básicas desde tópicos de ana
tomia até questões gerais de otorrinolaringologia, incluin
do um fórum de discussões. Apresenta desenhos em preto
& branco e coloridos, com explicações e fotos das diferen
tes possibilidades de avaliação laríngea e vocal, incluindo a
acústica. Há explicações sucintas acompanhando as ima
gens. Quanto-à anatomia e fisiologia laríngea, há esquemas
sobre a respiração e a fonação que incluem a estrutura
microscópica da prega vocal e a onda de mucosa.
Idioma: Inglês 4
Sítio visitado em 5/1/2001
D3 http://users.ren.com/jsherry/airwaymap.html
Imagens clínicas de laringe normal e com alterações
Sítio americano de imagens, criado pelo Dr.John Sherry
entre os anos de 1999 e 2000, com fotos em tamanho redu
zido, porém bem selecionadas e de boa qualidade, das es
truturas laríngeas normais e com alterações. As melhores
fotos são de lesões laríngeas no adulto, mas apresenta tam
bém um arquivo com imagens da laringe infantil, normal e
alterada, além de fotos de algumas anomalias faciais e dos
diferentes laringoscópios para semiologia laríngea. Não
inclui texto explicativo.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
•S http://www.bem.tme.edu/oto/studs/anat.html
Anatomia do ouvido, nariz e laringe, com infor
mações clínicas
O sítio é apresentado pelo The Bobby R. Alford Depart
ment of Otorhinolaryngology and Communicative Sciences do
Baylor College of Medicine e funciona como um tutorial bási
co, com informações que vão desde uma introdução à otor
rinolaringologia, passando por anatomia da orelha, nariz,
seios paranasais, cavidade oral, faringe e laringe, até as mais
diversas alterações, concluindo com tumores em cabeça e
pescoço. A linguagem é simples, as informações básicas,
com eficaz mecanismo de busca virtual relacionada à anato
mia e assuntos correlates. As imagens por vezes não são tão
claras e a simplificação excessiva pode dificultar a visualiza
ção das regiões e estruturas. Apresenta ainda uma lista de
livros e revistas recomendadas.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
“ST http://www.visembryo.com/baby/
Embriologia básica
Sítio didático excepcionalmente bem desenhado sobre
a embriologia humana, apresentando uma espiral do desen
volvimento embrionário humano desde o primeiro trimes
tre da gravidez até a 40a semana, com desenhos e informa
ções sobre o desenvolvimento de semana a semana. Possui
também um glossáriobásico em embriologia e uma página
com diversos links correlates. É patrocinado pelo National
Institute of Health - NIH.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
•S http://www.med.harvard.edu/AANLIB/home.html
Atlas do cérebro
Sítio com um Atlas de anatomia do cérebro, realizado
com imagens de ressonância magnética e PET scan pelos
professores Keith A. Johnson e Alex Becker da Harvard Medi
cal School. Inclui as 100 principais estruturas cerebrais, ima
gens para exercícios de nomeação, itens como o cérebro
normal e imagens de pacientes com desordens vasculares,
neoplásicas, degenerativas, infecciosas e inflamatórias, além
de pequenas excursões on-line por estruturas cerebrais. Há
um texto introdutório explicativo sobre neuroimagem, com
conceito e exemplos de avaliação por tomografia, ressonân-
cia magnética e SPEC/PET.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em: 5/1/2001
http://www.bartleby.com/107/236.html
http://salud.bayer.eS//laringe-atlas/contenido.html
http://www.upmc.edu/upmcvoice/anatomy.htm
http://www.voice-center.com/larynx.html
http://users.ren.com/jsherry/airwaymap.html
http://www.bem.tme.edu/oto/studs/anat.html
http://www.visembryo.com/baby/
http://www.med.harvard.edu/AANLIB/home.html
42 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 ✓ ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 43
DE BOCA
EM BOCA
Drenagem Linfática
- Laringe tem grande quantidade de vasos linfáticos,
com exceção das pregas vocais.
- Supraglótica: cruza de um lado para o outro livre
mente.
- Infraglótica: não cruza e é independente.
Inervação
- Nervo laríngeo superior (ramos interno e externo) =>
sensitivo e motor.
- Nervo laríngeo recorrente (ramos anterior e poste
rior) => ramo do nervo vago.
1 TUCKER H. Gross and microscopic anatomy of the larynx. In: BENNINGER MS, JACOBSON BH,
JOHNSON AF (eds.). Vocal arts medicine. New York: Thieme, 1994.
HIRANO M. Laryngeal hystopathology. In: COLTON R, CASPER J. Understanding voice problems. A
physiological perspective for the diagnosis and treatment. 2 nd Baltimore: Williams & Wilkins, 1996.
ANATOMIA DA LARINGE => seis cartilagens
mais o osso hióide
Osso Hióide
- Localização: 3a vértebra cervical.
: - Corpo.
- Cornos maiores e menores.
- Inserções: músculos constritores + infra-hióideos;
ligamentos estilo-hióideo.
Cartilagens
- ímpares: tireóidea, cricóidea e epiglote.
- Pares: aritenóideas, çorniculadas e cuneiformes.
Articulações, Membranas e Ligamentos da
Laringe
- Articulação cricotireóidea: sinovial.
- Articulação cricoaritenóidea: sinovial.
- Membrana tíreo-hióidea: origina-se da borda superior
da cartilagem tireóidea, passa por baixo do osso hióide
e insere-se na face superior do mesmo. Medialmente,
esta membrana é espessa e pode ser identificada como
ligamento tíreo-hióideo mediano e lateral. A cartila
gem tritícea, uma pequena cartilagem, é eventualmen
te observada na membrana tíreo-hióidea.
- Membrana cricovocal ou cone elástico => origina-se
da face interna da cricóidea, passando medialmente
e superiormente, inserindo-se no ligamento vocal
= > processo vocal das aritenóideas e face interna da
tireóidea.
- Membrana quadrangular => pouco definida: posteri-
ormente origina-se da prega ariepiglótica e insere-se
nas corniculadas; inferiormente une-se ao ligamento
vestibular e se estende ao redor do ventrículo à parte
superior das pregas vocais.
Cavidades e Membrana Mucosa
- Vestíbulo => da epiglote à margem inferior da prega
vestibular.
- Glote => espaço entre as pregas vocais.
- Subglote => da borda livre da prega vocal para baixo.
- Seio piriforme => recesso bilateral profundo; fecha
do anteriormente e aberto posteriormente; superfí
cie interna da porção superior da cartilagem tireói
dea e superfície lateral das pregas ariepiglóticas.
- A presença dei membranas, ligamentos e esqueleto
cartilagíneo dailaringe auxilia na formação de espa
ços e compartimentos variados. Espaços laríngeos:
pré-epiglótico, paraglótico e subglótico
Musculatura
A) Extrínseca - músculos estriados:
- Músculos infra-hióideos - abaixadores da laringe:
omo-hióideo, esternotireóideo, tíreo-hióideo, ester-
no-hióideo.
- Músculos supra-hióideos - elevadores da laringe:
gênio-hioídeo, milohóideo, estilofaríngeo, tíreo-hiói
deo, digástrico e estilo-hióideo.
B) Intrínseca:
- Músculo cricoaritenóideo posterior => abdutor +
antagonista.
- Músculo cricoaritenóideo lateral => adutor.
- Músculos aritenóideos: feixe transverso => adutor;
feixe oblíquo => ação também esfincteriana.
- Músculo tireoaritenóideo => adutor + tensor.
- Músculo cricotireóideo => tensor.
- Músculo ariepiglótico => esfincter.
- Músculo tireoepiglótico => esfincter.
Irrigação Arterial
- Suprimento arterial da laringe => ramos das artérias
tireóideas superior e inferior. _
Drenagem Venosa
- Veias laríngeas superiores e inferiores => seguem o
percurso das artérias:
=> veia jugular;
=> veia cava superior.
Histologicamente, a laringe é constituída de cartilagem,
músculo e membrana mucosa.
Cartilagens
- Quatro principais: cricóidea, tireóidea, aritenóidea e
epiglote.
- Duas acessórias: corniculada e cuneiforme.
- Cartilagem: hialina (fibras colágenas) e elástica (fibras
elásticas).
- Células => condrócitos + substância intracelular.
Músculos
- Cinco principais: cricotireóideo, tireoaritenóideo,
cricoaritenóideo lateral, aritenóideo, cricoaritenói
deo posterior, tireoepiglótico e ariepiglótico.
Mucosa
- É constituída, em geral, de quatro camadas: epitélio,
lâmina própria, lâmina muscular, tela submucosa. A
mucosa laríngea não apresenta a lâmina muscular. A
lâmina própria e a tela submucosa não podem ser di
ferenciadas.
1. Epitélio + lâmina própria: o epitélio é ciliado, pseudo-es-
tratificado, com exceção das pregas vocais; a estrutura
histológica da mucosa varia entre as estruturas da larin
ge.
2. Membrana basal: entre o epitélio e a camada superficial.
Composta de proteínas, susceptível a lesões que podem
comprometer a ligação entre o epitélio e a membrana
basal, causando nódulos e outras patologias.
3. Fibronectina: proteína presente na cicatrização de le
sões e encontrada na membrana basal.
Epiglote
- Epitélio ciliado pseudo-estratificado.
- Fibras elásticas.
Prega Vestibular
- Epitélio ciliado pseudo-estratificado.
- Muitas glândulas.
Parede Posterior da Glote
i - Epitélio ciliado pseudo-estratificado.
- Tecido frouxo e fino na superfície.
- Tecido denso e grosso, com glândulas nas camadas
mais profundas.
Subglote
- Epitélio ciliado pseudo-estratificado.
- Lâmina própria é frouxa e com glândulas.
PREGA VOCAL NO ADULTO
- Vibrador com várias camadas.
- Composta por mucosa e músculo.
- Mucosa: epitélio e lâmina própria (LP).
- Lâmina própria: camada superficial (CS): conhecida
como espaço de Reinke, solta e flexível, grande vibra
ção durante a fonação; se tensa, pode provocar gran
des desvios vocais.
- Ligamento vocal: camada intermediária (Cl) + camada
profunda (CP); Cl: constituída principalmente de
fibras elásticas; CP: constituída principalmente de
fibras colágenas.
- A definição entre a CS e a Cl é clara; entre a Cl e a CP
não é nítida.
- A margem entre CP e músculo não é nítida.
- Do ponto de vista mecânico, podemos ter a seguinte
classificação:
o cobertura: epitélio + camada superficial;
o transição: camadas intermediária e profunda;
o corpo: músculo.
- Vasos sanguíneos: vêm das regiões anterior e poste
rior das pregas vocais e correm paralelamente à bor
da livre das pregas vocais, muito pequenos e poucos
entram na mucosa propriamente dita.
- Glândulas: não há glândulas que ofereçam resistência
para a vibração.
VARIAÇÃO DA ESTRUTURA AO LONGO DA
PREGA VOCAL, DE ACORDO COM A IDADE
Observação das seguintes estruturas: tendão da comis
sura anterior, mácula flava anterior e posterior, epitélio, ca
madas superficial intermediária e profunda, músculo vocal.
44 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 ✓ ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 45
Recém-Nascidos
- Diferem muito do adulto.
- Epitélio na pregavocal é escamoso = adulto.
- Lâmina própria é espessa em relação ao comprimen
to, uniforme, solta e flexível.
- Desenvolvimento da prega vocal:
o 1 a 4 anos: ligamento vocal imaturo, não há dife
renciação entre fibras elásticas e colágenas;
o 6 a 12 anos: ligamento vocal mais espesso, com
, maior diferenciação das camadas;
o após os 15 anos: diferenciação nítida; término ao
final da adolescência.
Modificações com a Idade
- Existem muitas diferenças individuais.
- Observamos algumas tendências, como;
o epitélio: pouca modificação;
• o camada superficial: edematosa e mais espessa, di
minui a densidade das células;
© camada profunda: modificação maior em homens
que mulheres, fibras colágenas mais grossas;
° músculo: atrofia muscular.
HISTOPATOLOGIA DAS LESÕES BENIGNAS
DA MUCOSA
Hiperplasia e Displasia Epitelial
- O termo hiperplasia epitelial = espessamento do
epitélio.
- Quando a hiperplasia é associada a lesões atípicas, é
chamada de displasia.
- As displasias podem ser: leucoplasias, hiperquerato-
se, paquidermia e acantose.
- Carcinoma pode se desenvolver a partir dessas le
sões.
- Originam-se do epitélio para a camada superficial da
lâmina própria.
- Nunca invadem o ligamento vocal, a não ser quando
malignas.
- Podem ser uni ou bilaterais.
- Em geral são assimétricas e comprometem a coapta-
ção das pregas vocais.
- Podem interferir na vibração da prega vocal oposta.
Nódulos de Pregas Vocais
- Desenvolvem-se na borda livre das pregas vocais.
- Esbranquiçados e bilaterais. _
- Localizam-se na camada superficial.
- Constituem-se de tecido edematoso e fibras coláge
nas.
- Podem ser simétricos.
- Coaptação glótica incompleta.
- Aumento de massa e tensão.
Pólipo de Prega Vocal
- Desenvolvem-se na borda livre da prega vocal.
- Podem ser avermelhados ou esbranquiçados.
- Pequenos ou grandes.
- Sésseis ou pediculados.
- Uni ou bilaterais, em geral assimétricos.
- Histopatologicamente: sangramento, degeneração
hialina, trombose, proliferação de colágeno.
- Coaptação glótica incompleta.
Edema de Reinke
- Vários termos: degeneração polipóide, cordite poli-
poidal crónica, hipertrofia edematosa crónica.
- Histopatologicamente: edema na camada superficial.
- Em geral é bilateral.
- Assimétrico.
- Aumento de massa.
Cisto Epidermóide
- Localiza-se basicamente na camada superficial.
- Pode ter abertura para a glote.
- Pode estar inserido no ligamento vocal.
- Contém material caseoso e parece um “balão cheio
de fluido."
- Uni ou bilateral.
- Vibração assimétrica.
- Coaptação glótica incompleta.
- Aumento de massa e tensão.
Granuloma Não-Específico
- Três tipos: por intubação, de contato e por refluxo
gastresofágico.
- Uni ou bilateral.
- Encontrado no processo vocal, na parede lateral da
glote posterior.
- Histologicamente: proliferação de capilares, fibro-
blastos, colágeno, leucócitos.
- Coaptação glótica incompleta.
Sulco Vocal
- Reentrância ao longo da borda livre da porção mem-
branosa da prega vocal.
- Há abaulamento da prega vocal.
- Uni ou bilateral, maioria é bilateral.
- Levemente simétrico.
- Coaptação glótica incompleta.
- Histologicamente: localiza-se na camada superficial
da lâmina própria, epitélio espessado, fibras coláge
nas aumentadas, diminuição de capilares.
- Diminuição de massa e aumento da tensão. ~
Cicatriz de Prega Vocal
- Pode ocorrer em qualquer local da prega vocal.
- Resultado de trauma, cirurgia, queimadura ou infla
mação.
- Constituída por fibras colágenas densas.
HISTOPATOLOGIA DE LESÕES NEOPLASICAS
Carcinoma
- Maior parte é de carcinoma escamoso; origina-se do
epitélio e invade estruturas mais profundas (lâmina
própria e músculo).
- Unilateral, pode se estender contralateralmente.
- Aumento de massa e tensão.
- Compromete a vibração contralateral.
Papiloma
- Origina-se no epitélio e pode invadir a lâmina própria
e o músculo.
- Uni ou bilateral.
- Em geral assimétrico.
- Coaptação glótica incompleta.
- Aumento de massa e tensão.
- Histologicamente: proliferação de célula epitelial neo-
plásica em forma de papiloma.
3 COLTON R. Physiology of phonation. In: BENNINGER MS, JACOBSON BH, JOHNSON AF (eds.). Vocal
arts medicine. New York: Thieme, 1994.
- Grande interesse em voz nos últimos 20 anos.
- Muitos congressos — > expansão de pesquisa.
- Cobrança de cantores e professores de canto.
- Desenvolvimento significativo no conhecimento so
bre voz.
- Discussão sobre alguns conceitos acerca do funciona
mento básico da fonação: conceitos básicos, controle
de frequência e mecanismos fisiológicos para contro
le de intensidade e qualidade vocal.
INÍCIO DO SOM GLÓTICO
1. Modelo corpo-cobertura e sua implicação na fonação:
- Pregas vocais apresentam estrutura multilaminar:
corpo (músculo) e cobertura (mucosa).
- Mucosa: epitélio e lâmina própria: camada superfici
al, camada intermediária e camada profunda.
- Modelo corpo-cobertura => ajuda na compreensão
da fisiologia normal e da fisiopatologia.
- Exemplo de diferenças entre frequência: falsete ver
sus modal.
® frequências mais baixas: cobertura solta e mais
independente do corpo;
0 frequências mais altas: cobertura menos solta, mo
vimento corpo-cobertura, vibração mais simples
com menos harmónicos.
2. Efeito Bernoulli:
- Ajuste pré-fonatório => aproximação das pregas
vocais.
- Cria resistência à saída do fluxo aéreo.
- Tensão de pregas vocais também ajuda a criar resis
tência do fluxo aéreo.
= > A frequência é determinada pela massa e tensão
das pregas vocais.
HISTOPATOLOGIA DE LESÕES
NEUROMUSCULARES
Paralisia de Prega Vocal
- A mais frequente lesão neural.
- São de três tipos, do ponto de vista neuropatológico:
0 neuropraxia: a condução dos impulsos nervosos é
temporariamente bloqueada; não há atrofia mus
cular. Ex.: aplicação de anestésico;
® axonimesis: secção dos axônios dos neurônios;
causa denervação;
® neuromesis: secção de toda a fibra nervosa; causa
2 denervação muscular.
- Nas axonimeses e neuromesis, quando o músculo
não é reinervado, ocorre atrofia muscular.
- Em casos de paralisia associada à atrofia muscular há
diminuição de massa e tensão.
- Daniel Bernoulli — nascido em 1783, era matemático.
A fórmula por ele criada explica como a energia de um
fluido se distribui durante a passagem em um condu
tor. Esta fórmula serve para compreender como as
PREGAS VOCAIS iniciam e mantêm sua oscilação. Se
há aumento da velocidade, há aumento da energia
cinética e diminui a pressão ou energia potencial para
que a energia total se mantenha constante.
Equação de Bernoulli: PE + 1/2MV2 = k
PE = energia potencial ou pressão
1/2MV2 = energia cinética (movimento)
V = velocidade
k = constante
3. Modelo de Resistência Negativa:
- Modelo proposto por Conrad e por Conrad McQueen
para explicar o início e a manutenção de vibração das
pregas vocais. Este modelo depende da existência de
uma resistência laríngea. Os autores acreditam que
tal resistência, quando grande o suficiente, vai esta
belecer condições para uma vibração.
Aerodinamicamente, R (resistência) =
razão entre pressão e fluxo
Resistência = pressão/fluxo ou pressão =
resistência x fluxo
- Em um sistema dinâmico, a presença de uma diferen
ça de pressão vai ser de grande importância, pois vai
gerar uma diferença de resistência, o que é uma con
tribuição energética para o sistema:
0 normalmente, o que ocorre nos sistemas físicos é
que, quando temos uma associação de uma resis
46 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 47
tência a um fluxo grande, há um aumento da pres
são, que é associado a uma perda energética. Ex.:
água em mangueira;
o mas suponha que exista uma situação onde o
aumento do fluxo provoque uma pressão menor,
fazendo, portanto, que a resistência não aumente
e sim, diminua (R = P/FI), e, além disso, ocorra um
ganho de energia, e não perda de energia. E possí
vel que ocorra essa resistência negativa associada
à diferença de pressão criada no trato vocal;
o resistência negativa = > estápresente em várias
situações. Ex.: nas artérias e veias, nas tubulações
etc.
- Como é possível pensar nesta resistência no trato vocal
do ser humano?
Para se criar a resistência negativa é importante criar
uma resistência sobre as pregas vocais, que pode ser qual
quer estrutura do trato vocal (pregas vestibulares, parede
posterior da faringe, língua etc.), inclusive as próprias pre
gas vocais.
Sabe-se que as pregas vocais vibram em partes, e não
como um bloco único. O primeiro contato entre as pregas
vocais no início do ciclo glótico é da borda inferior de cada
prega vocal e, depois, há o contato da borda superior. O
ciclo glótico inicia-se de baixo para cima, com quatro fases:
fechada, em abertura, aberta e em fechamento.
Quando a parte inferior está iniciando a abertura, a par
te superior, que está totalmente ou parcialmente fechada,
gera uma resistência negativa em relação à parte inferior
que, segundo esta teoria, é necessária para a vibração.
- Como o modelo acima descrito pode explicar a vibração
das pregas vocais?
Teoricamente, há, ná laringe, todos os componentes
necessários do modelo:
o oscilador (pregas vocais);
« fluxo aéreo (ar expirado);
« resistência (oferecida pelas pregas vocais durante a
fonação).
As pregas vocais criam resistência à passagem do ar; a
pressão subglótica é maior que a pressão supraglótica (no
ajuste pré-fonatório), e quando as pregas vocais se abrem,
há mudança de pressão, com modificação da pressão sub
glótica e supraglótica. Portanto a diferença de pressões é
responsável pela vibração.
Ajuste pré-fonatório: aumento de pressão subglótica.
No início da fonação, a pressão supraglótica começa a
aumentar devagar. Com a continuidade do ciclo glótico e
aumento do fluxo aéreo, a pressão subglótica pode se man
ter inalterada em função da abertura das pregas vocais. No
entanto a pressão supraglótica continua aumentando cri
ando uma diferença de pressão que cada vez é menor e
conseqiientemente gerando diminuição de resistência.
Esta região de resistência negativa cria uma condição aero
dinâmica instável que resulta na vibração das pregas vocais.
4. Mecanismos de Variação de Frequência:
- A voz humana pode chegar a até sete oitavas. A varia
ção de frequência em indivíduos não-cantores é ge
ralmente de duas oitavas; no canto pode-se atingir
quatro oitavas.
Modelo Corda de Instrumento
No passado foi comum a comparação entre as pregas
vocais e os instrumentos de corda. Nos casos de instrumen
tos, três propriedades são relacionadas ao ajuste de fre-
qiiência:
1. Massa.
2. Comprimento.
3. Tensão.
Quanto maior for o comprimento e a massa, e menor a
tensão, mais grãye o som emitido. A prega vocal também
possui os três elementos acima. A tensão é alterada pela
musculatura envolvida.
Comprimento das Pregas Vocais e Variação da
Frequência do Som
No instrumento musical de corda, quanto maior for a
corda, menor será a frequência de vibração e vice-versa.
Vários estudos foram feitos sobre o comprimento da prega
vocal e emissão em diversos registros. Todos os indivíduos
aumentam o comprimento das pregas vocais, no registro
modal, quando emitem sons agudos, o que é uma relação
exatamente oposta da observada nos instrumentos. Já no
registro de falsete, o comprimento reduz à medida que a
frequência aumenta.
Espessura das Pregas Vocais, e Variação da
Frequência do Som
A relação entre comprimento e frequência nas pregas
vocais faz sentido se as considerarmos como em um elásti
co, no qual a frequência depende da massa e da tensão. Nas
pregas vocais, o aumento de comprimento gera diminuição
da massa/espessura => ocorre vibração em frequências
mais altas.
No falsete a massa se mantém constante. É como esticar
um elástico ao máximo. Neste ponto, o comprimento e a
espessura se mantêm os mesmos. No caso do elástico, se
forçar um pouco mais, arrebenta. Obviamente, no caso das
pregas vocais, esta possibilidade não ocorre.
Tensão das Pregas Vocais e Variação de
Frequência
A tensão pode variar muito e é responsável pela varia-
ção da frequência fundamental no registro de falsete. No
registro modal (sub-registro de peito), uma pequena quanti
dade de tensão gera um grande efeito muscular = > alonga
mento. No sub-registro de cabeça, uma quantidade modera
da de tensão gera um pequeno efeito de alongamento,
enquanto que, no falsete, o grande aumento de tensão gera
um alongamento muito pequeno.
Estudos sugerem que a variação de frequência produzi
da tanto no dia-a-dia como na emissão sustentada de indiví
duos cantores pode ser explicada por mudança de tensão
que ocorre nas pregas vocais. Esta leve diminuição na fre-
qiiência do som ao longo da sustentação é explicada pela
diminuição de tensão que ocorre após a aplicação inicial de
força a uma estrutura. Durante a fonação, muitas outras
interferências podem contribuir para alterar a frequência
fundamental produzida.
5. Mecanismo de Variação de Intensidade
A loudness de um som é determinada por vários fatores,
sendo um atributo perceptivo do som. O correlato físico é o
nível de pressão sonora (NPS). Aqui se considera apenas a
contribuição das pregas vocais à intensidade da voz.
Pressão do Ar e Nível de Pressão Sonora
Som é a variação de pressão do ar em um nível audível.
O nível de pressão sonora produzido pela laringe é direta
mente dependente da pressão do ar que leva as pregas vo
cais a vibrar; quanto maior a pressão do ar, maior é o nível
de pressão sonora. Dois mecanismos podem ser usados
para produzir um aumento da pressão do ar:
1. Aumentar o fluxo de ar.
2. Aumentar a pressão subglótica.
Resistência Glótica e Intensidade Vocal
As pregas vocais, ficando mais tempo fechadas, produ
zem aumento de resistência, o que, aparentemente, é o
parâmetro fisiológico mais importante no controle de inten
sidade. Para aumentar a resistência glótica é necessário
aumento da contração da musculatura laríngea, que tam
bém ajuda a aumentar a pressão subglótica. No início da
fonação, a pressão do ar no trato vocal é maior, produzindo
um aumento do nível de pressão sonora. No falsete há varia
ção deste mecanismo.
KURITA S, NAGATA K, HIRANO M. A comparative study of the layer structure of the vocal fold. In:
BLESS, DM, ABBS JH (eds.). Vocal fold physiology— contemporary research and clinical issues. San
Diego: Singular, 1995.
- As pregas vocais apresentam uma estrutura multila-
minar.
- As propriedades mecânicas são diferentes para cada
uma de suas camadas.
- Essa diferença provavelmente contribui de maneira
diferente para o padrão vibratório.
- As laringes animais são similares o suficiente às larin
ges humanas para que seja possível a comparação?
- Há vantagens em se usar laringe animal para estudo:
fácil obtenção e possibilidade de controlar o tempo
do estudo.
- Estudos demonstram variações anatômicas grossei
ras nas estruturas laríngeas entre os animais.
- Modal = 60 a llOdB.
- Falsete = 60 a 75/80 dB.
Três mecanismos fisiológicos estão envolvidos no con
trole de intensidade: fluxo aéreo, pressão subglótica e resis
tência glótica.
6 . Mecanismos de Variação da Qualidade Vocal
A qualidade vocal não é determinada somente pelas
pregas vocais; os aspectos ressonantais também são impor
tantes.
Espectro Acústico e Qualidade Vocal
- O principal correlato acústico da qualidade vocal é o
2 espectro acústico.
- Espectro => relação entre amplitude e frequência.
- Pode ser modificado de acordo com o desejo do fa
lante (cantor ou ator).
- Qualidades vocais diferentes geram espectros distintos.
- Dentro de uma mesma qualidade vocal há menor
diferença entre os espectros, embora o formato do
mesmo possa variar de acordo com a frequência fun
damental.
Espectro do Som Glótico e o Ciclo Vibratório
- É possível variar o espectro variando-se a qualidade
vocal.
- É necessário conhecer os detalhes do ciclo vibratório.
- O aumento do tempo da fase fechada produz um
aumento de intensidade.
O Trato Vocal como Determinante da
Qualidade Vocal- O trato vocal é determinante da qualidade vocal.
- O trato vocal interfere nas características globais de
uma emissão.
- Poucos estudos foram feitos comparando-se as ca
madas da mucosa.
- As diferenças podem ser intrigantes: podem ser úteis
para elucidação da função fonatória, podem oferecer
mais dados sobre a função fonatória e auxiliar na de
finição sobre quais animais seriam mais apropriados
para estudos experimentais sobre a fonação.
Material e Método
- Cinco laringes de dez espécies animais diferentes: ca
chorro, macaco, cavalo, porco, coelho, gato, porqui-
nho-da-índia, boi, rato e ovelha.
- Cortes histológicos das pregas vocais observados ao
microscópio.
48 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL 49
- Uma laringe humana do sexo masculino, de 27 anos,
foi usada como referência.
- A densidade de fibras elásticas na camada interme
diária (Cl) e a densidade de fibras colágenas na cama
da profunda (CP) desta laringe humana foram classifi
cadas como 6.
- Todas as outras laringes foram comparadas a este
valor - níveis 1 a 7. Exemplos:
o densidade das fibras elásticas e colágenas da ove
lha foi 7, a maior;
o densidade das fibras elásticas e colágenas do coe
lho foi 1, a menor.
Resultados
- Em todos os animais a borda livre das pregas vocais é
revestida por epitélio escamoso.
- Resumindo e relembrando a estrutura das PREGAS
VOCAIS em humanos:
o comprimento médio: 15 mm.
° mucosa (epitélio e lâmina própria): 1,1 mm de es
pessura lâmina própria (LP) => camadas: superfi
cial (CS), intermediária (Cl) e profunda (CP).
- Dos animais estudados, somente cinco possuem ven
trículo laríngeo: cachorro, cavalo, macaco, porco e
coelho.
Principais Características das Laringes dos
Animais Estudados
Animais que possuem ventrículo laríngeo
Cachorro
- Comprimento da porção membranosa: média de 15
mm.
- Espessura da mucosa: 3,0 mm.
- Lâmina própria (LP): limite não é nítido.
- Componentes fibrosos diminuem da CS para a CP.
Cavalo
- Comprimento da porção membranosa: média de 40
mm.
- Espessura da mucosa: 5,1 mm.
- LP: três camadas, com limites mais nítidos.
Macaco
- Comprimento da porção membranosa: média 7,0
mm.
- Espessura da mucosa: 1,1 mm.
- Diferença entre partes superior e inferior das pregas
vocais.
e parte superior: LP = a três camadas; Cl contém gor
dura.
0 parte inferior: LP = a três camadas; Cl contém gor-
dura e também componentes fibróticos.
- Limites nítidos.
Porco
- Comprimento da porção membranosa: média de 18
mm.
- Espessura da mucosa: 0,9 mm.
- LP: duas camadas; os limites não são nítidos.
- Não há cone elástico.
- Presença de muitas glândulas.
Coelho
- Comprimento da porção membranosa: média de 4,0
mm.
- Espessura da mucosa: 0,3 mm.
- LP: duas camadas com limites nítidos.
Animais qiie não possuem ventrículo
laríngeo
Gato
- Comprimento da porção membranosa: média de 4,0
mm. 1
- Espessura da mucosa: 1,4 mm.
- Tireoaritenóideo é dividido em duas partes:
0 prega vocal: prega vestibular e prega vocal propria
mente dita.
- LP parece bastante uniforme na estrutura.
Porco-da-índia
- Comprimento da porção membranosa: média de 3,0
mm.
- Espessura da mucosa: 0,3 mm.
- LP: três camadas.
Boi
- Comprimento da porção membranosa: média de 27
mm.
- Espessura da mucosa: 1,6 mm.
- LP: três camadas com limites nítidos.
© CS densa com fibras elásticas + colágenas;
® Cl é pobre em componentes.
Rato
- Comprimento da porção membranosa: média de 1,0
mm.
- Espessura da mucosa: 0, 2 mm.
- LP: três camadas.
° limite entre CS e Cl não é nítido;
0 entre Cl e CP é nítido.
Ovelha ~
- Comprimento da porção membranosa: média de 14
mm.
- Espessura da mucosa: 1,2 mm.
- LP: duas camadas.
© CS é abundante em fibras elásticas e colágenas;
0 limite nítido.
Discussão — Principais Observações
- Na laringe humana:
0 a densidade de fibras colágenas aumenta ao se
aproximar do músculo vocal;
0 a densidade de fibras elásticas é maior na Cl da LP e
diminui em direção ao epitélio e ao músculo vocal;
® a tensão das fibras colágenas é maior do que as
fibras elásticas;
- Curva de tensão similar é encontrada em: porcos,
coelhos, gatos e ratos.
- Em coelhos e ratos a LP é muito fina => torna-se
tensa como um todo.
HAMMOND T, ZHOU R, HAMMOND E, PAWLAK A, GRAY S. The intermediate layer: a morphologic
5 study of the elastin and hyaluronic acid constituents of normal human vocal folds. J. Voice,
7 7:59-66, 1997.
Trata-se de um .texto muito interessante sobre dois
componentes da lâmina própria da prega vocal e seu impac
to na fisiologia fonatória. Tais observações são importantes
porque a mecânica da prega vocal depende do tamanho e da
composição da lâmina própria. As alterações na lâmina pró
pria afetam a performance e a elasticidade da prega vocal,
produzindo vibrações não-sincrônicas.
Os componentes estudados foram a proteína elastina
e o ácido hialurônico, dois constituintes principais da lâ
mina própria. Analisaram-se 30 pregas vocais, obtidas em
necropsia de indivíduos falecidos por causas traumáticas,
mas sem lesão de laringe. As pregas vocais foram submeti
das à análise histológica e ultra-estrutural, com o auxílio
de técnicas histológicas de coloração altamente específi
cas.
O ácido hialurônico é um dos maiores GAG (glicosami-
noglicanos) dos sistemas biológicos. GAG são moléculas hi-
drofílicas, relativamente não-flexíveis, que dão a caracterís-
tica de preenchimento de espaço na formação do gel extra-
celular. São moléculas osmoticamente ativas, que têm o
papel de resistir às forças de compressão. Homens apresen
tam três vezes mais ácido hialurônico que mulheres, o que
provavelmente faz com que o sexo feminino seja mais sensí
vel aos efeitos do fonotrauma. Do mesmo modo que as mu
lheres, as crianças apresentam menor quantidade de ácido
hialurônico que os adultos. A elastina é um componente da
matriz celular com um importante papel na vibração das
pregas vocais. Pode ser encontrada nas formas de: oxitala-
no, elaunina e fibras elásticas maduras.
- Prega vocal do gato é curta.
- Porcos têm dimensões de pregas vocais similares às
dos humanos, inclusive quanto às propriedades
mecânicas. Não significa, necessariamente, que os
porcos sejam os melhores animais para estudo expe
rimental. Outros fatores como cartilagem e músculo
devem ser considerados.
- Muitos cães são usados para estudo, embora possuam
características histológicas de mucosa diferentes dos
humanos.
- Estudos posteriores são necessários para esclarecer a
evolução da função fonatória e suas propriedades
mecânicas.
Os resultados obtidos demonstraram grande variação da
elastina nas várias camadas da lâmina própria e quanto ao
sexo. A elastina é escassa na camada superficial e abundante
nas camadas intermediária e profunda, apresentando uma
composição menos elástica nas proximidades do músculo
vocal. Os resultados quanto ao sexo foram inconclusivos.
Em relação ao ácido hialurônico, concluiu-se que as lâmi
nas próprias do homem e da mulher são morfologicamente
distintas. A lâmina própria do homem é mais espessa que a
da mulher, o que a torna mais maleável. O ácido hialurônico
concentra-se mais predominantemente na porção mediana
da prega vocal, e em maior quantidade no sexo masculino.
A discussão do artigo aborda aspectos morfológicos e sua
associação com a fisiologia durante a vibração da mucosa e a
produção do som. Em relação à elastina, o artigo menciona a
importância de se definir sua localização, tipo e quantidade
nas diferentes camadas da mucosa, pois acredita-se em sua in
terferência direta no padrão vibratório das pregas vocais.
Quanto ao impacto histológico e fisiológico do ácido
hialurônico, os autores associam, entre outros fatores, a
diferença da espessura da mucosa da prega vocal entre
homens e mulheres à presença de maior ou menor quanti
dade de ácido hialurônico. A ocorrência de lesões como
nódulos na população feminina também encontra uma
possível explicação na diferençada quantidade desse áci
do, muito menor nas mulheres. Desta forma, os homens
teriam maior absorção do impacto durante a fonação, por
apresentarem uma lâmina própria mais rica em ácido hia
lurônico.
50 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 1 • ANATOMIA DA LARINGE E FISIOLOGIA DA PRODUÇÃO VOCAL - 51
6 SAXON K, SCHNEIDER CM. Muscular strength and endurance development. In:---------------- Vocal
exercise physiology. San Diego: Singular, 1995.
- O cálculo da força muscular ocorre quando se pressi
ona um grupo muscular contra uma resistência.
- A resistência muscular, por outro lado, é a habilidade
de um grupo muscular de desempenhar contrações
repetidas por um longo período de tempo.
- A falta de força muscular não é ameaça à vida =>
importante componente para se sentir saudável. Há
perda de qualidade de vida quando frente a proble
mas musculares como dor nas costas e perda de mas
sa muscular.
- Estudo indica atrofia de 0,13 a 0,36 kg ao ano.
- Com melhora de força muscular e da resistência, os
músculos obtêm melhor desempenho.
- Musculatura do canto e fala também pode se benefi
ciar com programas de treinamento. Para este pro
grama de treinamento é importante incorporar os se
guintes princípios: sobrecarga, especificidade, resis
tência progressiva e ordem de exercícios.
Princípios de Treinamento com Peso
- Princípio da sobrecarga (overload): aumento de força e
de tamanho musculares ocorre quando músculos tra
balham com cargas de peso maiores que as habituais.
- Programas de treinamento de peso devem incluir
exercício progressivo de resistência.
- Estudo com atletas usando pesos equivalentes a 13%
de seu peso corporal diariamente mostrou aumento
significativo'de força da perna, Quatro semanas de
pois de ter tirado o peso => perderam massa muscu
lar.
- 1 RM => uma repetição máxima = maior quantidade
de peso que um atleta pode levantar após aqueci
mento. O treinamento de peso do atleta costuma ser
baseado em uma porcentagem deste 1 RM = > repe
tições múltiplas em trabalho de condicionamento.
- Regiões de ganho de força: abdome + partes superior
e inferior de corpo.
- 30% de 1 R.M. aumentam força e resistência. Para ga
nhos mais importantes => 60 a 80% de 1 RM.
- Não há correlação de RM no treinamento vocal. Este
método pode, no entanto, ser útil para treinar gru
pos musculares específicos.
- Força máxima => peso máximo e poucas repetições.
- Resistência => pouco peso e muitas repetições.
- O princípio de sobrecarga aplica-se a cantores e paci
entes de voz.
- Musculatura envolvida no canto tem que sofrer so
brecarga para desenvolver força e resistência.
- Treinamento respiratório + vocal é de grande ajuda.
Princípio da Especificidade
- Musculatura usada no treinamento de canto => adap
ta-se à sobrecarga e ganha resistência e força.
- Tipos de treinamentos musculares diferentes geram
resultados variados em ganho de força, usando os
mesmos grupos musculares (barbell => 75%; isometric
[eg press -> 30%).
- É importante compreender musculatura envolvida no
canto e na fala para o treino de grupos antagonistas.
Programas de treinamento exercitam musculaturas
antagonistas. Com esta abordagem, a musculatura
pode ser treinada de modo simétrico (forma ou tono)
ou assimétrico (focando em atividades específicas).
Ex.: ao trabalhar com pacientes hipercinéticos
(STME, laringe fixa etc.), o terapeuta pode criar um
programa de trabalho que enfatize grupos muscula
res opostos => relaxa e diminui a hipertrofia.
- Componente importante no princípio da especifici
dade => treinar musculatura de acordo com a compo
sição de fibras musculares.
- Atividade repetitiva de baixa demanda -> envolve
fibras musculares do tipo I
- Atividade pouco repetitiva, com alta demanda =>
fibras do tipo II.
- Músculos do tipo I -> baixa capacidade de sobrecar
ga, mas não entra em fadiga muscular tão rapidamen
te como o tipo II.
Princípio da Resistência Progressiva
- Treinamento deve ser gradual => evitar lesões.
- Aumento de carga quando o paciente consegue com
pletar a série facilmente.
- Aumento da carga segue a porcentagem de 1 RM.
- Resistência progressiva é adquirida a partir de um
treinamento razoavelmente longo => 4 anos, por
exemplo, para o cantor.
- Partir de uma voz não-treinada e desenvolver seu po
tencial máximo exige excelente professor de canto:
treinar o repertório e selecionar o repertório.
Princípio de Ordem dos Exercícios -
- Os exercícios no programa de treinamento não de
vem envolver os mesmos grupos musculares seguida
mente = > alternar!
- No treinamento vocal (ou ensaio de canto), conside
rar: intensidade, duração e tessitura exigida pelo
repertório => benefício máximo e lesão mínima!
Tipos de Programas de Treinamento de Peso
- O grau de melhora de força e de resistência muscular
depende de: frequência, duração e intensidade do
programa de treinamento.
- Grande variação de desempenho de força e de resis
tência.
- Homens possuem maior força que as mulheres.
- Programas de treinamento devem ter objetivos espe
cíficos. Ex.: pacientes que tiveram AVC precisam de
treinamento para hipertrofia ou peso para muscula
tura atrofiada. Cantores, não! Eles precisam de flexi
bilidade e eficiência.
- Três categorias de métodos de exercícios para desen
volver força e resistência:
o isométricos (estáticos);
o isotônicos (dinâmico, concêntrico e excêntrico);
o isocinético.
Isométricos
- Envolvem resistência sem movimentos. Ex.: empur
rar uma parede de tijolos.
- Desenvolve tensão nos elementos contráteis muscu
lares, mas o músculo não contrai ou estira. Ex.: na
laringe: manobra de Valsalva.
- Melhor treinamento implica contração máxima segu
rando por 6 s, repetição diária por 5-10 vezes.
- Vantagens: não precisa de equipamento e é fácil de
fazer; desvantagem: ganho de força ocorre somente
no ângulo da articulação onde a força é aplicada.
Isotônicos
- Envolvem resistência com movimentos — Ex.: elevar
5 kg através de flexão e extensão de cotovelo.
- Criam tensão muscular por toda a extensão da articu
lação em movimento. Ocorrem: contração concêntri
ca (encurtamento do músculo) e contração excêntrica
(alongamento do músculo).
- A Universidade Americana de Medicina Esportiva
recomenda: usar os principais grupos musculares ao
menos duas vezes por semana com 8 a 12 repetições;
deve gerar fadiga muscular ao final de cada série e ser
feito ao menos três vezes por semana.
- Desafio para o fonoaudiólogo: desenvolver exercí
cios que isolem e trabalhem grupos musculares espe
cíficos.
Isocinéticos
- Envolvem resistência a uma velocidade constante.
- O músculo encurta contra uma resistência acomoda
da que é igual à força produzida pela musculatura
durante a movimentação. Ex.: máquina de força Cybex
ou um parceiro, que poderá aplicar resistência aco
modada enquanto flexiona os braços.
- Exercícios realizados com velocidade diminuída pro-
. duzem maiores ganhos de força.
1 - Exercícios vocais: uso de escalas, onde o cantor pro
duz sons mais e menos intensos, enquanto modifica a
frequência. Ocorre mudança na resistência quando um
cantor faz uma escala em um volume e então aumenta
este volume. Isto é exercitar com sobrecarga.
Programa Específico para Musculatura
Respiratória
- Expirar e inspirar = > responsabilidade da muscula
tura respiratória localizada na cavidade torácica, e
não nos pulmões.
- Pulmões não são músculos respiratórios => são pas
sivos!
- Principal músculo respiratório = > diafragma; contri
bui com 1/4 a 3/4 do ar que se inspira.
- Músculos adicionais: músculos intercostais externos
= > facilitam a inspiração e estão entre as costelas;
quando se contraem, as costelas se elevam e rodam.
- Musculatura expiratória —> músculos abdominais
+ músculos intercostais internos.
- Fadiga de musculatura respiratória limita seriamente
uma performance]
- Exercícios que visam a aumentar a resistência da
musculatura respiratória podem garantir melhor de
sempenho vocal.
- Estudo com ciclistas: 16 aulasde treinamento por
várias semanas; aumento de resistência respiratória
em 12% em comparação com o grupo-controle.
- A musculatura respiratória treinada contribui para
melhor desempenho vocal.
Goncelo d3 Voz Novjol G GlossfcÇõ©
dais Dssfonlas
Mara Behlau, Renata Azevedo & Paulo Pontes
OBJETIVOS
desenvolvimenlo da laringe c da voz ocorre de maneira intensa e contínua desde o nas
cimento do bebê. As trans formações sofridas pelo aparelho fonador ao longo dos anos
ficam claras à medida que o resulLado vocal produzido sofre modificações facilmente percep-
0
tíveis auditivamente. O foco inicial desse texto é o desenvolvimento ontogenético da voz, da
infância à terceira idade. Conhecer e identificar a produção vocal esperada nas várias etapas
da vida nos permite uma melhor compreensão da qualidade vocal esperada, embasando a a-
ção terapêutica.
A partir da análise do desenvolvimento da voz, o presente capítulo também explora os
conceitos de voz normal, neutra, adaptada, esperada, preferida, desviada, alterada e disfônica.
0 conceito de voz normal c altamente negociável e dependente da cultura na qual o indivíduo
está inserido. Alguns desvios vocais são aceitos socialmente, enquanto outros se constituem
verdadeiras alterações de voz, as chamadas disfonias. Do momento em que o vocábulo normal é
passível de tantas análises, prefere-se utilizar o termo voz adaptada. Por outro lado, disfonia é
conceituada como toda e qualquer dificuldade que impede a produção natural da voz.
Finalmente, pela pluridimensionalidade do fenômeno voz, há diferentes modelos de clas
sificação de disfonias, com uma ampla taxonomia que pode contemplar diversos aspectos de
análise vocal, de acordo com o interesse e o tipo de avaliação do paciente. Compreender a
filosofia subjacente às classificações vocais oferece um outro nível de conhecimento das dis
fonias.
2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 5554 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA
DESENVOLVIMENTO DA LARINGE
Embriologicamente, sabemos que a laringe surge na ter
ceira semana de vida intra-uterina, a partir de um prolonga
mento da faringe, como uma dobra do endoderma, e já no
terceiro mês intra-uterino apresenta as mesmas característi-
cas encontradas ao nascimento.
É importante ressaltar que, após o nascimento, além do
crescimento do trato vocal, ocorrerá uma série de modifica
ções nas configurações geométricas desse tubo, de modo
que a estrutura vocal do bebê não corresponde a uma minia
tura da estrutura do adulto, diferindo tanto na forma quan
to nas relações com as outras partes do corpo. As principais
diferenças anatômicas nas estruturas do aparelho vocal da
criança, do adulto e do idoso estão reunidas no Quadro 2-1.
Ao nascimento a laringe apresenta-se muito alta, o que
pode ser facilmente constatado em recém-nascidos durante
a deglutição, quando se observa a elevação da laringe no
pescoço. Há, inclusive, algumas evidências de que a epiglo-
te pode se deslocar até a nasofaringe, sob o véu palatino,
quando os bebés deglutem. Se abrirmos a boca de um bebê
e pressionarmos a língua para baixo, facilmente visualizare
mos o adito à laringe. Sua posição alta e praticamente encai
xada no osso hióide permite a manutenção de um sistema
de dois tubos que assegura a alternância da sucção prolon
gada e da respiração, com segurança fisiológica para o bebê.
Ao nascimento, a laringe inicia sua descida no pescoço e há
sinais fisiológicos de que esse descenso continua ocorrendo
ao longo de toda a vida. Como referência no recém-nascido,
a epiglote situa-se na altura da primeira vértebra cervical
(Cl), e o limite inferior da cartilagem cricóidea está em tor
no da terceira e quarta vértebras cervicais (C3 e C4). Ao
redor dos cinco anos de idade, a cartilagem cricóidea está
posicionada na aítura da sétima vértebra cervical (C7), onde
ficará até os 20 anos, descendo lenta e continuamente até a
senescência (Aronson, 1990). É interessante comentar que o
grande descenso na primeira infância se completa ao redor
dos cinco anos de idade, quando também é esperada a mo
dificação do padrão de deglutição infantil, com o crescimen
to da porção faríngea da língua e o reposicionamento da lín
gua na cavidade da boca. A consequência direta da descida
da laringe é que o tubo de ressonância fica mais longo, po
dendo amplificar melhor as frequências graves.
Quanto à forma, o esqueleto laríngeo na infância é de
configuração cónica, como um funil de diâmetro menor em
direção à traquéia, perdendo essa forma no adulto, onde se
observa um estreitamento na região glótica e uma infraglo-
te mais ampla. Com o crescimento, a luz laríngea é ampliada
gradualmente, passando de uma forma inicial em “T” à for
ma de um círculo, já nos primeiros anos de vida.
As cartilagens da laringe infantil são delicadas e possu
em ligamentos frouxos; os tecidos epiteliais são abundantes
e mais vascularizados, com tendência a edema e obstrução.
A cartilagem tireóidea é contígua ao osso hióide, numa
posição submentoniana, não sendo possível a palpação da
membrana tíreo-hióidea. Apresenta forma arredondada e
ângulo aproximado de 110° no sexo masculino e 120° no
sexo feminino, e somente na adolescência assumirá sua
configuração de escudo, havendo a definição da linha média
anterior e a redução do ângulo para 90° nos meninos e 110°
nas meninas. A cartilagem cricóidea, em forma circular, aos
poucos adquire uma forma oval nos homens, ficando,
porém, sempre mais circular nas mulheres.
As cartilagens aritenóideas na criança são comparativa
mente maiores que no adulto, com inserção bastante anteri-
orizada na prega vocal. A glote divide-se em duas metades
praticamente iguais: uma porção membranosa de aproxima-
damênte 3 mm ao nascimento e uma porção cartilagínea de
mesmo tamanho, formada pelas cartilagens aritenóideas.
Do momento em que as cartilagens aritenóideas consti
tuem a unidade funcional da laringe, provavelmente essa
disposição anatómica tem suas razões na manutenção da
integridade da respiração, já que os bebés apresentam teci
dos subepitetiais menos densos e mais abundantes, facil
mente susceptíveis a edemas.
A porção membranosa das pregas vocais quase dobra
no primeiro ano de vida, chegando à fase adulta com uma
variação de 11,5 a 16 mm, no homem, e de 8 a 11,5 mm, na
mulher. Já a porção cartilagínea tem um crescimento menor,
e apresenta uma variação de 5,5 a 7 mm, no homem, e de
4,5 a 5,5 mm, na mulher (Aronson, 1990). Como as cartila
gens aritenóideas não aumentam de modo significativo, as
modificações no comprimento das pregas vocais devem-se
ao desenvolvimento da porção membranosa, que no adulto -
será o dobro da porção cartilagínea. A cónseqiiência direta
desse crescimento é uma fonte de som com maiores possi
bilidades de produção vocal. Imagens da laringe infantil, do
adulto e do idoso encontram-se, respectivamente, nas Figs.
2-1 a 2-3.
Além da diferença no comprimento, as pregas vocais in
fantis também apresentam diferenças fisiológicas em relação
às do adulto, por não mostrarem um ligamento vocal maduro
(diferenciação das camadas intermediária e profunda da lâmi
na própria), conferindo à túnica mucosa uma característica
ainda mais gelatinosa e uma produção sonora semelhante à
do gato, que não apresenta ligamento vocal maduro (Kurita,
Nagata & Hirano, 1985), como vimos ho Capítulo 1.
Outro dado interessante refere-se à chamada propor
ção glótica - PG (Pontes, Behlau & Kyrillos, 1994; Pontes,
Behlau, Crespo, Pedroso, Kyrillos & Pontes, 1995). Esta pro
porção relaciona as dimensões ântero-posteriores da glote
cartilagínea e membranácea, ou seja, entre as regiões fona-
tória e respiratória da laringe (Figs. 2-4 e 2-5). Os valores da
PG em crianças são aproximadamente iguais, ao redor de 1,
levemente maiores para as meninas, o que explica a fre-
qiiente imagem de fenda triangular posterior encontrada
na infância. Nas mulheres adultas a PG também mantém um
valor ao redor de 1, enquanto noshomens esse valor situa-se
ao redor de 1,3, favorecendo, desta forma, o fechamento
glótico completo. Na terceira idade, a PG no sexo feminino
parece se modificar, aumentando seus valores em direção ao
sexo masculino, entretanto não apresenta diferenças estatis-
Quadro 2-1. Quadro comparativo das principais diferenças anatômicas em aspectos selecionados do trato vocal na infância
na idade adulta e na terceira idade
Aspectos Anatômicos Infância Idade Adulta Terceira Idade
Trato vocal Bom para respiração, deglutição e
proteção das vias aéreas; pobre
para a fonação
Bom para respiração, deglutição,
proteção das vias aéreas e fonação
Bom para respiração, pode
haver problemas de
deglutição, protero das
vias aéreas o fonação
Forma do trato vocal Mais curto e em funil Mais longo e em trapézio Tendência a alongar
Pertuito aéreo Curvo Retificado Inalterado
Tubo de ressonância Mais curto e estreito Mais longo e amplo Tendência a menos amplo
Epiglote Ereta e em ômega Deitada sobre a língua e alargada Mais deitada e apoiada na
língua
Laringe Alta no pescoço, cartilagem
cricóidea em C3
Mais baixa no pescoço, cari, cricóidea
emC7gegm
Descenso discreto
Estrutura da laringe Mais compacta, com cartilagens
muito próximas
Mais difusa, cartilagens separadas por
membranas e ligamentos
Inalterada
Luz laríngea Em forma de "T" Em círculo Inalterada
Cartilagens Frouxas Calcificadas e ossificadas Mais calcificadas e
ossificadas
Cartilagem tireóidea Contígua ao osso hióide Separaro por membrana tireo-hióided
evidento
Inalterada
Ângulo da cartilagem
tireóidea
110° nos meninos
120° nas meninas
90° nos homens
110° nas mulheres
Inalterados
Cartilagem cricóidea Forma circular Forma oval nos homens
e circular nas mulheres
Inalterada
Cartilagem aritenóidea Processo vocal
anteriorizado
Processo vocal
Posteriorizado
Inalterado
Pregas vocais Curtas e grossas l ongas e afiladas Atrofiadas, menor massa o
edema
Estrutura da mucosa Mucosa espessa, camadas pouco
diferenciadas, ligamento vocal
imaturo
Mucosa menos espessa, arquitetura
histológica definida, ligamento vocal
maduro, fibras com distribuição paralela
Mucosa mais espessa,
redução de fibras elásticas
e colágenas;
desorganização das fibras
colágenas da camada
profunda
Proporção entre glote
membranosa e glote
cartilagínea
1:1 / 2:1 2:1, leve aumento da
porção membranácea
Porção membranosa Meninos: 5,7 a 7 mm ' Homens: 11,5 a 16 mm Inalterados, aumento em
da prega vocal Meninas: 4,5 a 5,5 mm Mulheres: 8 a 11,5 mm algumas mulheres
Músculos Imaturos e indiferenciados Maduros e diferenciados Atrofia variável
Músculo vocal Fibras finas Fibras desenvolvidas Fibras atrofiadas
Mandíbula Retror edida <■ clevada Desenvolvida e em oclusão cêntrca Cápsula articular frouxa,
redução do deslizamento
da AIM e reabsorção dos
alvéolos dentais
Língua Volumosa, alargada, curta e
na cavidade da boca
Estreita e com longa
porção faríngea
Aumento de volume; tono
e mobilidade reduzidos
Palato duro e véu
palatino
Mais cefálicos e musculatura
somente tensora
Mais caudais e com
musculatura elevadora
Redução da mobilidade da ;
musculatura elevador.)
Fechamento velar Fechamento em nível
velo-adenoidiano
Fechamento velofaríngeo Fechamento velofaríngeo
com menor tensão
56 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 •/ CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS, 57
Fig. 2-1. Imagens de laringe infantil, obtidas por nasolaringoscopia. A. Durante a respiração B. Durante a fonação.
Fit;. 2-4. Imagem de laringe, mostrando a proporção glótica (PG),
no sexo feminino; observe a medida aproximadamente igual das
dimensões respiratória (R) e fonatória (F), o que produz uma PG
com valor 1.
Fig. 2-2. Imagens de laringe de adulto, obtidas por telelaringoscopia. A. Durante a respiração. B. Durante a fonação.
Fig. 2-3. Imagens de laringe de idoso, obtidas por telelaringoscopia. A. Durante a respiração. B. Durante a fonação.
Fig. 2-5. Imagem de laringe, mostrando a proporção glótica (PG),
no sexo masculino; observe a medida maior da dimensão fonatória
(F), em relação à dimensão respiratória (R), o que produz uma PG
com valor 1,3.
ticamente significativas. Tais dados parecem estar relacio
nados às questões de predisposição anatomofuncional
para o desenvolvimento de disfonias com nódulos vocais.
No que diz respeito à cavidade oral, seu tamanho é acen-
tuadamente menor no bebê do que no adulto. No bebê, a
mandíbula está retrocedida e elevada, e apresentará um
crescimento acentuado para baixo e para frente, juntamen
te com o desenvolvimento dos alvéolos dentais. Ao contrá
rio da mandíbula, a língua apresenta-se volumosa na cavida
de oral, sendo curta no sentido ântero-posterior e mais lar
ga lateralmente, o que auxilia no vedamento para a sucção.
A porção faríngea da língua ainda não se desenvolveu, o que
contribui para que a laringe encontre-se em posição alta,
como já comentado anteriormente. 0 palato duro e o véu
palatino são mais cefálicos, e o funcionamento velar é limi
tado, atuando essencialmente como tensor. No momento
emque praticamente toda a cavidade oral é preenchida pela
língua, as condições de ressonância são muito pobres. O
bebê tem uma forte preferência pela respiração nasal, e
quando há séria obstrução da via aérea superior, as dificul
dades encontradas para se estabelecer uma respiração bu
cal são muito mais severas que nos adultos. O pertuito aé
reo da nasofaringe aos pulmões é curvo na criança, ao con
trário do tubo praticamente reto que se observa no adulto.
Evidentemente, essa geometria do trato vocal do bebê
traz uma série de implicações fisiológicas, especialmente a
constatação de que o trato vocal infantil é um excelente
instrumento de respiração, deglutição e proteção de vias
aéreas inferiores, mas não um bom instrumento para a fona
ção, devido a sua dimensão vertical encurtada, reduzida ca
pacidade de ressonância e uma laringe com a possibilidade
apenas de movimentos verticais amplos e grosseiros.
DESENVOLVIMENTO ONTOGENÉTICO DA
VOZ
Quase nenhum espaço é oferecido à discussão do de
senvolvimento normal da voz nos livros especializados, ape
sar de a voz ser uma das características mais individualiza
das do ser humano, cujos desvios podem ser facilmente
identificados pelo ouvinte.
0 desenvolvimento da voz acompanha e representa o
desenvolvimento do indivíduo, tanto do ponto de vista físi
co como psicológico e social.
Não existem estudos longitudinais completos sobre os
períodos de evolução vocal, mas encontramos uma tentati
va de classificação feita por Schrager (1966), adaptada, que
apresenta seis fases de evolução de acordo com característi
cas vocais:
1. Neonatal: do nascimento aos 40 dias de idade, obser-
vam-se emissões com frequências elevadas, ataque vocal
brusco e forte intensidade, com modulações reduzidas;
a frequência ao nascimento está ao redor de 400 Hz
(Lá3), as emissões chegam a 784 Hz (Sol4) e o grito pode
chegar a 1.318 Hz (Mi5).
2. Primeira infância: do primeiro mês de vida até os seis
anos, observa-se uma redução na presença do ataque
vocal brusco e a modulação vocal é mais evidente, o que
58 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 59
coincide com a ação hormonal; aos 18 meses aparece a
modulação vocal entre 523 e 784 Hz (de DÓ4 a Sol4).
3. Segunda infância: dos seis anos ao início da puberdade,
as variações vocais chegam a uma oitava e meia de ex
tensão.
4. Puberdade: estabelecem-se as características vocais de
diferenciação sexual, mais notáveis no menino; ocorre a
muda vocal fisiológica ao redor dos 13-14 anos, com
redução da freqência fundamental e predomínio do
» registro de peito; a voz do menino nessa fase pode ser
rouca, diplofônica, áspera e soprosa; na menina, a fre-
qiiência fundamental não se modifica de modo acentua
do, porém, paulatinamente, ocorre um decréscimo em
seu valor, acompanhado por modificações nas caracte
rísticas espectrais do som.
5. Estabilização:do jovem ao adulto; nesta etapa a voz é
estável e apresenta características próprias de cada
sexo.
6. Senescência: período da menopausa e do envelhecimen
to; a senilidade vocal é mais precoce na mulher e pode
apresentar um impacto maior na voz cantada; ocorre
perda de potência e diminuição dos harmónicos em am
bos os sexos, com a diminuição da extensão vocal.
As principais diferenças dos parâmetros vocais na infân
cia, idade adulta e terceira idade encontram-se no Quadro
2-2. Convém ressaltar que os dados dos indivíduos idosos
representam tendências de alteração, e não a realidade
vocal de todos os indivíduos nessa faixa etária.
Quadro 2-2. Comparação dos principais parâmetros vocais na infância, na idade adulta e na terceira idade (Behlau, 1999)
1’arâmctros Vocais • Infância Idade Adulta Terceira Idade
Qualidade vocal Delgada Plena Tendência a instável e trémula
Fo média A ima do 250 11/ Mulheres: 20-1 I Iz Mulheres: 180 I Iz
I lomens: I 13 I Iz l lomens: 10 I iz
Pitch Agudo Adequado para o sexo Mulheres: tendência a grave
Homens: tendência a agudo
Extensão vocal Reduzida, com picos extremos ocasionais Ampla Perda nos extremos
Gama tonal Rica à exagerada, mais nos primeiros anos 3 a 5 semitons Tendência a reduzida
Identificação do sexo Indiferenciada na vogal sustentada Nitidamente diferenciada Pode ser comprometida
Intensidade Moderada para elevada Extensão ampla Tendência a reduzida
Loudness Tendência a elevada Adequada Tendência a reduzida
Estabilidade vocal llK onslante <1 ieduzida Adequada Reduzida
Ataque vocal Brusco fsocrônico lendência a soproso
Padrão respiratório Superior Médio Superficial
Coordenação
Pneumofonoarticulatória
Tendência à incoordenação por
imaturidade neurológica
Adequada lendência à incoordenação
por falia de suporte respiratório
Tempos máximos de Abaixo de 12 s Mulheres: acima de 15 s Mulheres: acima de 10 s
fonação Homens.: acima de 20 s Homens: acima de 15 s
Voz no Bebê
Um dos mais esperados eventos do nascimento é o
choro do bebê. Segundo Kant (1789), a única espécie que
emite som ao nascimento é a espécie humana, e a possibili
dade de chorar nesse momento indica um certo grau de
organização social para a defesa da mãe e da prole.
O choro, de acordo com Kant, representa a revolta da
criança ao nascimento. Fisiologicamente o fato é menos ro
mântico, e destina-se à desobstrução das vias aéreas, a fim
de pôr em ação um novo padrão respiratório. Esse sinal de
vida e de saúde demonstra a capacidade fisiológica da so-
brevivência. A laringe precisa comprovar imediatamente sua
eficiência nas funções respiratória e protetora, para não pôr
em risco a vida do bebê. Além disso, também desde o nasci
mento a laringe se manifesta como órgão das emoções,
comportando-se dé modo específico para expressar estados
emocionais de diferentes manifestações vocais.
Apesar do trato, vocal infantil não ser um instrumento
sonoro ideal, o choro ao nascimento é uma manifestação de
extrema importância) e estudos com bebés indicam uso di
ferencial da voz de acordo com diferentes situações e emo
ções (Wasz-Hkert, Lind Vuorenkoski, Partanem & Vallane,
1968). Uma avaliação acústica das vozes de 180 bebés e cri
anças, de até quatro anos, com diversas doenças ou anoma
lias, foi realizada por Hirschberg & Szende (1982). Os auto
res concluíram que o choro do bebê auxiliou a elucidar a
localização da alteração vocal, sendo uma análise com obje
tivo diagnóstico e um instrumento de avaliação do progres
so terapêutico, com inquestionável valor de'documentação.
Particularmente no diagnóstico de lesões cerebrais, o choro
infantil muitas vezes auxilia no diagnóstico topográfico da
desordem.
Desde os primeiros meses de vida as emissões do bebê
fluem diretamente do corpo para o ambiente e são suas pró
prias sensações manifestadas em sons. A voz é o veículo pri
mário de transporte do pequeno ser que, embora ainda não
se locomova, faz-se presente no ambiente por meio dela,
solicitando, implorando e deslocando-se, chegando à mãe,
por exemplo, numa outra sala. Ao contrário do que geral
mente se pensa, o bebê possui uma emissão sonora muito
rica. Mães atentas, perceptivas e não-ansiosas desenvolvem
a capacidade de interpretar corretamente as emissões de
seu bebê. Mães ansiosas tendem a interpretar o choro como
sinal de fome, restringindo a uma opção de significado toda
uma gama de emoções. A voz do bebê é geralmente caracte-
rizada por uma qualidade vocal descrita como delgada, re
sultado do trato vocal encurtado e da reduzida possibilida
de de ressonância. Provavelmente, o mais detalhado estudo
com choros de bebés é o de Wasz-Hõkert, Lind Vuorenkoski,
Partanem & Vallane (1968), que analisaram 419 choros de
351 bebés normais, do nascimento ao sétimo mês de vida,
indicando a possibilidade de o choro infantil discriminar
diferentes estados emocionais, tanto do ponto de vista da
percepção auditiva, como da análise do traçado espectro-
gráfico acústico. Os autores identificaram quatro sinais vo
cais característicos:
o Sinal do nascimento: com uma média de um segundo de
duração, o sinal de nascimento é geralmente um som sur
do, em torno de 440 Hz, tenso ou estridente, contendo
sons plosivos, pela expulsão do líquido amniótico (Gráfico
2-1).
o Sinal de dor: é o sinal vocal de mais longa duração do bebê,
agudo, em torno de 530 Hz, estridente e com queda de
frequência na sustentação; há ação esfincteriana de toda a
laringe, com forte fechamento das pregas vocais e vestibu
lares (Gráfico 2-2).
o Sinal de fome: aparece com pequenas unidades vocais,
com frequência fundamental variável, passando de grave a
agudo rapidamente, também apresentando sons plosivos
(Gráfico 2-3).
Gráfíco 2-1. Exemplo de espectrograma de emissão ao nascimento,
tensa, ruidosa e curta, ao redor de 457 Hz (GRAM 5.1).
Gráfico 2-2. Exemplo de espectrograma de emissão de dor, aos três
meses de idade, de longa duração, com ataques bruscos e modula-
çãb descente, variando de 393 a 263 Hz (GRAM 5.1).
Gráfico 2-3. Exemplo de espectrograma de emissão de fome, aos
três meses de idade, apresentando curta duração, com sons respira
tórios e plosivos, variando de 382 a 414 Hz (GRAM 5.1).
o Sinal de prazer: a principal característica vocal deste sinal é
a hipernasalidade, seguida pela grande variedade de tons,
com total sonoridade glótica, sendo o resultado apenas da
vibração das pregas vocais. O sinal de prazer nunca é sur
do, tenso ou estridente; há um relaxamento de todo o tra
to, inclusive do véu palatino, que se encontra fortemente
tenso nos outros sinais vocais (Gráfico 2-4).
Gráfico 2-4. Exemplo de espectrograma de emissão de prazer, aos
três meses de idade, com curta duração, suave e sem ruído, com
ataques isocrônicos e ampla variação de frequência, de 306 a 468
Hz (GRAM 5.1).
60 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 61
Essa possibilidade de uma resposta diferenciada de acor
do com a emoção desde o nascimento ilustra o fato de que
nossa dinâmica vocal é o reflexo de nossa psicodinâmica.
Nos primeiros meses de vida o bebê depende de suas
modulações vocais expressivas, às vezes em momentos cru
ciais. Com o passar dos meses, mas ainda no primeiro ano
de vida, a articulação dos sons vai se impor à fonação. O
ambiente determinará a aquisição de um código linguístico
específico, com regras morfossintáticas inerentes a esse
código, passando a voz para um segundo plano. Porém, ao
* longo de nossa vida, a voz sempre oferecerá um rico materi
al acerca de nosso estado interior e da intenção de nosso
discurso.
Embora a plasticidade vocal seja muito ampla e nossa
voz mude constantemente de acordo com inúmeros fatores,
cada indivíduo virá a apresentar uma qualidade vocal nucle
ar que fará parte de sua identidade e, assim, a partir dos
sinais vocais básicos, vamos agregando elementos informa
tivos em nossa voz, de acordo com nossa constituição e his
tória de vida.
Voz na AdolescênciaAté a puberdade a laringe é bastante semelhante no me
nino e na menina, e é difícil fazer a discriminação quanto ao
sexo do falante com base apenas em uma emissão sustenta
da (Gráficos 2-5 e 2-6). Evidentemente, a fala encadeada per
mite tal diferenciação, devido às diferenças já presentes no
trato vocal, sem contarmos os aspectos morfossintáticos e
semânticos relacionados ao sexo.
A muda vocal nos homens ocorre ao redor dos 13 aos!5
anos, enquanto nas mulheres é ao redor dos 12 aos!4 anos;
nos climas quentes esse evento pode ser antecipado em até
dois anos, pela vida sedentária e pelos hábitos alimentares;
e nos climas frios, próximos aos pólos, pode-se atrasar em
mais de um ano. Um estudo realizado na cidade de Bauru
(Ruiz, 1993), com 300 jovens do sexo masculino entre 12 e
18 anos de idade, indicou que as mudanças vocais mais evi-
Cráfico 2-5. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal sus
tentada de uma menina com 5 anos de idade, frequência ao redor
de 263 Hz (GRAM 5.1).
Gráfico 2-6. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal sus
tentada de um menino com 11 anos de idade, frequência ao redor
de 226 Hz (GRAM 5.1).
dentes ocorrem dós 13 aos 15 anos, sendo que a maior inci
dência de indivíduos na muda vocal está na faixa entre 13 e
14 anos (88% dos 50 adolescentes nessa faixa); além disso, a
ocorrência da mudai vocal mostrou-se diretamente relacio
nada ao aumento da estatura física. Já no sexo feminino, um
outro estudo indicou que as mudanças na frequência funda
mental não têm um ápice de idade definido e também não
se observam descontroles de frequência, como nos rapazes.
Embora haja um decréscimo no valor absoluto da freqiiên-
cia, quando comparamos meninas de 9 anos (fo média de
245 Hz) a meninas de 15 anos (fo média de 227 Hz), não se
observou uma progressão clara e gradativa ao longo desta
faixa etária (Defina, 2000). Provavelmente outros fatores,
como as dimensões do próprio trato vocal, além do valor da
frequência em si, interferem na transformação da qualidade
vocal feminina, de infantil para adulta.
Na adolescência ocorre um crescimento evidente da
laringe acompanhando o crescimento corporal, mais acen
tuado nos rapazes. As pregas vocais dos meninos podem
alongar-se em até 1 cm, enquanto nas meninas esse cresci
mento dificilmente passa de 4 mm. Funcionalmente, é ne
cessária uma adaptação às novas condições anatômicas, o
que se traduz num abaixamento médio da frequência funda
mental em uma oitava para os meninos e de 2 a 4 semitons
para as meninas; essa adaptação funcional leva um período
de alguns meses a um ano. A voz torna-se levemente rouca e
instável, com várias flutuações, mas tendendo aos sons gra
ves. Com o passar dos dias os sons agudos tornam-se menos
presentes e os graves mais estáveis.
Esse crescimento, associado à ação dos novos níveis
hormonais, transforma a laringe infantil em laringe adulta,
com um consequente impacto vocal, a chamada mutação
fisiológica ou, simplesmente, muda vocal — um fenômeno
fisiológico rotineiro para a maioria das pessoas (Gráfico
2-7).
A maior alteração observada na laringe diz respeito ao
aumento em seu diâmetro ântero-posterior.
A muda vocal é apenas um aspecto das alterações glo
bais que ocorrem no período da adolescência, mais particu-
Gráfico 2-7. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal com
quebra de frequência, durante a muda vocal em rapaz de 14 anos,
com frequência inicial de 231 Hz e após a quebra, atingindo um
valor sobrepassado, em 91 Hz (GRAM 5.1).
larmente dos 9 aos 15 anos de idade. É interessante notar
que a sequência de desenvolvimento dos caracteres sexuais
não se alterou durante os séculos e obedece à seguinte or
dem, no sexo masculino (Andrews & Summers, 1988):
o Desenvolvimento genital dos testículos.
o Aumento da estatura física, da laringe e pregas vocais.
o Crescimento dos pêlos púbicos e do pênis — em média
um ano após o desenvolvimento dos testículos.
o Crescimento dos pêlos nas axilas e face — em média dois
anos após os pêlos púbicos, indicando os estágios finais
da maturação.
Assim, os pêlos na face indicam o final desse processo e
direcionam, na avaliação de um adolescente, o momento
em que sua presença e distribuição normal ajudam a afastar
a hipótese de alterações hormonais. :
Particularmente quanto ao aparelho fonador, ocorre um
crescimento constante, mas não-homogêneo da laringe, das
cavidades de ressonância, da traquéia e dos pulmões. A
muda representa, portanto, um período de desequilíbrios,
onde o pescoço se alonga, a laringe desce, o tórax se alarga
e a capacidade vital aumenta, de modo não-harmônico. Po
dem ser observadas pregas vocais edemaciadas, com bordas
irregulares e alterações vasomotoras.
A musculatura intrínseca da laringe não apresenta toni
cidade constante e, para alguns jovens, o canto torna-se difí
cil e deve ser evitado. Apesar de todas essas mudanças, a
maioria dos adolescentes enfrenta esse período sem quei
xas.
Por esses aspectos anatomofuncionais, as disfonias da
muda são mais frequentes nos rapazes. Os fatores, etiológi-
cos das disfonias mutacionais, também chamadas puberfo-
nias, são inúmeros, porém há uma maior predominância de
aspectos funcionais e psicológicos; causas orgânicas devem
ser sempre consideradas, contudo são de ocorrência rara
(Behlau & Pontes, 1992).
Num estudo sobre a memória da muda, pesquisada atra
vés de um questionário aplicado a 400 homens adultos (Gil,
Lourenço, Miranda, Pereira, Rodrigues & Behlau, 1994), os
resultados indicam que os homens lembram da muda vocal,
cujas alterações mais comumente observadas foram voz ins
tável, desafinada e grossa. Além disso, os homens não de
monstraram ter tido sentimentos negativos relacionados a
esse período e também não perceberam reações negativas
do interlocutor.
Já nas meninas, como o crescimento da laringe e o alon
gamento das pregas vocais são mais discretos, as modifica
ções na frequência fundamental são menores e menos
abruptas. Assim sendo, problemas na muda vocal são muito
raros no sexo feminino, embora existam em grau discreto, o
que pode se expressar em uma voz infantilizada, na fase
adulta.
Voz na Idade Adulta
A voz adulta é aquela que se apresenta após o término
da muda vocal nos rapazes, ou seja, após os 18 anos de ida
de. A partir desse período, a voz é considerada estável (Grá
ficos 2-8 e 2-9). Os professores de técnica vocal profissional,
tanto para a fala como para o canto, aconselham que o trei
namento formal para o desenvolvimento de uma voz profis
sional seja iniciado a partir dos 18 anos.
A voz adulta apresenta-se bastante diferente de acordo
com o sexo do falante, identificação esta comprometida
apenas em algumas situações de distúrbios vocais extre
mos. Um desses exemplos é o edema de Reinke avançado,
onde o peso da massa do edema reduz a frequência funda
mental da voz a valores tão baixos que o falante, sendo mu-
Gráfico 2-8. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal sus
tentada de uma mulher adulta jovem, com 25 anos de idade, fre
quência ao redor de 206 Hz (GRAM 5.1).
62 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 63
Gráfico 2-9. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal sus
tentada de um homem adulto jovem, com 28 anos de idade, fre
quência ao redor de 132 Hz (GRAM 5.1).
lher, passa a ser identificado como homem, particularmente
: ao telefone. Por outro lado, quando o rapaz não passa pelo
período natural de desenvolvimento vocal na adolescência,
a persistência da voz aguda identifica o falante masculino
como mulher ou pré-adolescente.
Para falantes do português brasileiro, a frequência fun
damental média para homens adultos e mulheres adultas
(média de 18 a 45 anos de idade) é, respectivamente, 113 Hz
e 204 Hz, enquanto as crianças brasileiras (de 8 a 11 anos)
apresentam uma média de 235,8 Hz (Behlau, Tosi & Pon
tes,1985).
Assim, as mulheres de 18 a 29 anos apresentam uma fre-
qiiência fundamentalde 231 Hz, que cai a 191 Hz na faixa
etária de 80 a 89 anos, enquanto os homens vão de 116 Hz a
154 Hz, considerando-se as mesmas faixas etárias.
Não existem estudos longitudinais realizados com indi
víduos brasileiros, mas Priston, Gonçalves & Behlau (1992) e
Priston (1994) analisaram 140 indivíduos de ambos os
sexos, distribuídos em sete faixas etárias, dos 18 aos 89
anos de idade (Quadro 2-3). A frequência fundamental do
sexo masculino apresentou uma faixa de distribuição está
Quadro 2-3. Valores médios da frequência fundamental (Fo), em Hz, do tempo máximo de
fonação de "a" (TMF), em s;.da capacidade vital (CV), em ml; e do fluxo aéreo adaptado
(FAA), em ml/s, nas diferentes faixas etárias, em anos, para indivíduos brasileiros
(Priston, Gonçalves & Behlau, 1992 e Priston, 1994)
Faixa Flária _F TMF CV FAA
Masc. Fcm. Masc. Fcm. Masc. Fem. Masc. Fem.
18/-/29 116,1 231,6 19,6 17,3 4445 2805 197 165
30 /-/ 39 112,1 2 i 2,1 20,1 14,1 4415 3035 252. 245 _
40/-/49 111,1 209,3 21,3 18,0 4111 2800 207 182
50/-/59 116,1 191,9 2 1,7 18,4 3955 2710 227 162
60/-/69 131,5 192,2 15,3 15,2 3925 2490 86 140
70/-/79 143,6 192,5 1 3,6 15,0 2875 2130 1 133
80 /-/ 89 153,8 191,2 1 7,3 d 12,4 2945 1815 137 93
vel até os 60 anos de idade, quando se observa um aumento
no valor absoluto obtido; já nas mulheres constatou-se uma
diminuição nesse valor a partir dos 50 anos, na menopausa,
sendo às vezes considerada a muda vocal feminina. O tempo
máximo de fonação caiu para ambos os sexos, de forma
mais acentuada para as mulheres. A capacidade vital decres
ceu para ambos os sexos, porém os valores no sexo masculi
no ainda permaneceram maiores. O fluxo aéreo adaptado
apresentou uma distribuição irregular. As melhores medi
das vocais ocorreram entre os 18 e 19 anos de idade.
Particularmente nas mulheres, a menopausa pode pro
duzir uma modificação vocal de discreta a acentuada, devi
do a uma combinação de fatores que incluem: redução dos
níveis de progesterona a zero, baixos níveis de estrógeno e
presença de andrógenos. A reposição, hormonal tem sido
considerada, uma estratégia essencial e importante, especi
almente quando há uso profissional da voz e também para
evitar o desenvolvimento de uma voz masculina ou presbi-
fônica (Abitbol, Abitbol & Abitbol, 1999).
Quanto aos valores de intensidade vocal, o estudo de
Vasconcelos (1994), com indivíduos do estado de São Paulo,
indicou valores ao redor de 64 dB como intensidade média,
sendo que os valores médios nas intensidades fraca e forte
ficaram, respectivamente, ao redor de 54 dB e 80 dB. Acredi
tamos que a situação de teste inibiu os participantes para
realizarem emissões em forte intensidade, pois os valores
médios nesta faixa mostraram-se muito reduzidos quando
comparados com a literatura.
Voz na Senescência
O envelhecimento é um conglomerado complexo de
eventos biológicos que mudam a estrutura e a função de
diversas partes do corpo. As alterações mais frequentes do
envelhecimento dizem respeito aos seguintes parâmetros:
acurácia, velocidade, resistência, estabilidade, força e coor
denação; são ainda evidentes alterações na capacidade res
piratória, nos batimentos cardíacos e na condução nervosa.
O envelhecimento diz respeito não somente aos aspec
tos relacionados à idade cronológica do indivíduo, mas tam
bém às questões biológicas.
Swine (1992) reforça que o processo de envelhecimento
é acompanhado de modificações naturais e fisiológicas no
organismo e, portanto, não é uma doença que requeira tra
tamento.
O estudo clássico de Welford (1951) demonstrou que a
redução na velocidade é a característica motora mais pre
sente do envelhecimento. O impacto do envelhecimento na
voz ocorre de modo paralelo ao de outras funções do corpo.
De modo geral, considera-se o período de máxima eficiên
cia vocal dos 25 aos 45 anos, sendo que a partir desta idade
uma série de alterações estruturais na laringe, com maior
ou menor impacto vocal, pode ser identificada. O início da
presbifonia, seu desenvolvimento e o grau de deterioração
vocal dependem de cada indivíduo, de sua saúde física e psi
cológica e de sua história de vida, além de fatores constitu
cionais, raciais, hereditários, sociais e ambientais. Deve-se
compreender a presbifonia como parte do processo de
envelhecimento normal do indivíduo, e não como uma
desordem vocal, embora muitas vezes seja difícil estabele
cer um limite sobre o que é processo normal vocal fisiológi
co da idade e o que é uma desordem vocal estabelecida.
Na presença de uma alteração vocal frente a um indiví
duo idoso, deve-se procurar estabelecer um esquema de
diagnóstico diferencial, e não simplesmente rotular o indi
víduo como presbifônico. Morrison & Rammage (1994)
sugerem que o diagnóstico de um indivíduo com sintomas
vocais, na terceira idade, deve considerar várias situações,
como alterações vocais fisiológicas devido à idade, uso
vocal compensatório inadequado, questões de ordem emo
cional, doenças neurológicas periféricas ou centrais e mis
celânea (doenças orgânicas, refluxo gastresofágico e altera
ções iatrogênicas).
Alterações na laringe, resultantes do processo normal
de envelhecimento, têm sido referidas por vários autores,
desde que Carnevalle-Ricce (1937) e Bach, Lederer & Dinolt
(1941) descreveram as mudanças que ocorrem com a idade,
na musculatura laríngea. Trabalhos mais sistemáticos e com
maior número de sujeitos foram realizados a partir dos anos
60, com descrições detalhadas das mudanças observadas
(Luchsinger & Arnold, 1965; Zemlin, 1968; Kaplan, 1971;
Segre, 1971; Ackerman & Pfau, 1974; Schow, Christensen,
Hutchinson & Nerbonne, 1978 e Hirano, Kurita & Nakashi
ma, 1983).
Resumidamente são encontrados dois tipos de altera
ções anatômicas:
1. Calcificação e ossificação gradual das cartilagens larín-
geas que, como consequência, ao redor dos 65 anos,
apresentam-se quase sem nenhuma mobilidade (Zem
lin, 1968).
2. Atrofia dos músculos laríngeos intrínsecos, o que resul
ta numa menor eficiência biomecânica de todo o siste
ma. Observam-se redução na excursão das cartilagens
aritenóideas, redução da espessura da prega vocal e
alterações na qualidade da contratura muscular (Morri
son, Rammage & Nichol, 1989).
A ossificação das cartilagens ocorre até os 65 anos
(Pressman & Keleman, 1955), porém permanecem pequenas
ilhas de tecido cartilaginoso na cartilagem tireóidea do
homem e na porção superior da laringe feminina; a cartila
gem cricóidea pode apresentar ossificação completa (Kaha
ne, 1983). As cartilagens aritenóideas geralmente mantêm
seu ápex cartilaginoso, porém, com o restante ossificado.
Não existem estudos que relacionam a ossificação das carti
lagens laríngeas à disfunção muscular observada, exceto no
que diz respeito à junta cricoaritenóidea (Kahn & Kahane,
1996).
• Geralmente os autores concordam em que as alterações
dá laringe ocorrem num paralelismo com as de outras par
tes do corpo, porém há diferenças individuais e relaciona
das ao sexo ainda não bem esclarecidas (Pantoja, 1968;
Kahane, 1981).
Quanto aos aspectos relacionados à fonação, as estru
turas participantes desse processo também sofrem redução
na elasticidade dos tecidos e na força muscular; conseqen-
temente, os resultados dessas alterações refletem-se nos
mais variados parâmetros vocais (Gráficos 2-10 e 2-11).
Gráfico 2-10. Exemplo de espectrograma de emissão de vogal sus
tentada de uma mulher idosa, com 66 anos de idade, frequência ao
redor de 183 Hz, mais grave que a mulher jovem, com instabilidade
no traçado (GRAM 5.1).
Gráfico 2-11. Exemplo de espectrograma de vogal sustentada de
um homem idoso, com 66 anos de idade, e frequência ao redor de
166 Hz, mais aguda que o homem jovem, com irregularidade nos
harmónicos e presença de ruído no traçado (GRAM 5.1).
64 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 65
Convém ressaltar que as alterações encontradas variam
amplamente entre os estudose, embora geralmente se con
sidere o período de máxima eficiência vocal de 25 a 45 anos
de idade, o início da presbifonia e o grau de deterioração
vocal dependem do falante e dos ajustes que ele desenvolve
para compensar a perda da eficiência vocal. Exemplos de
vozes treinadas que resistiram à presbifonia são vários: no
canto lírico, o tenor italiano Martinelli, que cantou o papel
de Calaf, em Turandot de Pucçini, aos 82 anos, e, no canto
popular, Alberta Hunter, que com 85 anos e apesar de uma
'limitação na locomoção, em apresentação no Brasil, mos
trou sua voz clara, límpida e firme.
Na busca de marcadores vocais da senilidade, encontra
mos uma série de alterações que geralmente tornam-se
mais evidentes após os 60 anos. Contudo os estudos cientí
ficos fracassaram na descrição de um marcador que fosse
único e exclusivo da senescência vocal. A voz típica do idoso
apresentada em filmes do cinema é apenas um estereótipo e
1 não representa, seguramente, a voz padrão dos indivíduos
dessa faixa etária.
Dos numerosos estudos realizados com idosos, selecio
namos alguns, de acordo com as modificações encontradas
nos parâmetros analisados:
- Redução na capacidade respiratória vital (Muisan,
Sorbini & Grassi, 1971; Ptacek, Sanders-Maloney &
Jackson, 1966).
- Aumento da frequência fundamental da voz para os
homens (Mysak & Hanley, 1958; Mysak, 1959; Hollien
& Shipp, 1972; Alarcos, Behlau e Tosi, 1983; Hang &
Yang, 1990; Carbonell, Tolosa &Juan, 1996).
- Redução na frequência fundamental da voz para as
mulheres (Saxman & Burk, 1967; Kelley, 1977; Alar
cos, Behlau & Tosi, 1983; Morrison & Rammage,
1994; Carbonell, Tolosa&Juan, 1996).
- Frequência fundamental inalterada para as mulheres
(Hang & Yang, 1990).
- Extensão de frequências reduzidas para ambos os
sexos (Behlau, Pontes, Tosi & Ganança, 1988; Carbo
nell, Tolosa & Juan, 1996).
- Extensão de frequências no registro modal reduzida,
com aumento da extensão no falsete, para os
homens (Hang & Yang, 1990).
- Aumento no jitter, ou seja, na variação em torno da
frequência fundamental (Alarcos, Behlau & Tosi,
1983).
- Aumento na variabilidade do pitch (Mysak & Hamley,
1958).
- Perfil de extensão vocal com valores médios (Carbo
nell, Tolosa & Juan, 1996).
- Redução no tempo máximo de fonação (Ptacek, San
ders, Maloney & Jackson, 1966).
- Aumento do grau de nasalidade na fala (Hutchinson,
Robinson & Nerbonne, 1978).
- Deterioração na qualidade vocal em maior grau para
os homens (Alarcos, Behlau & Tosi, 1983).
- Deterioração na qualidade vocal mais precoce na mu
lher, e mais acentuada na voz cantada que na falada
(Jackson-Menaldi, 1996).
- Instabilidade vocal, incluindo emissão trémula (Mor
rison & Rammage, 1994).
- Redução na intensidade das vogais, no número de
notas da tessitura vocal, na diadococinesia para síla
bas repetidas e na pressão intra-oral máxima (Ptacek,
Sanders, Maloney & Jackson, 1966).
- Aumento da duração das pausas articulatórias (Alar
cos, Behlau & Tosi, 1983).
- -Redução da velocidade da fala (Ryan, 1972).
- Deslocamento dos formantes das vogais (Carbonell,
Tolosa &Juan, 1996).
Características vocais pela idade não são específicas
desse período e, sõb diversos aspectos, são semelhantes às
observadas em algumas doenças e também nos quadros de
repouso vocal prolongado. O desuso muscular causa perda
de fibras musculares de forma similar à observada na idade
avançada (Sataloff, 1991). Assim sendo, se conseguimos rea
bilitar as funções fohatória e vocal após doenças e longos
períodos de desuso, e se as alterações observadas são se
melhantes às da senescência, devemos investir na reabilita
ção da comunicação oral de indivíduos idosos. Alguns traba
lhos nessa área são alentadores quanto aos resultados funci
onais obtidos.
CONCEITO DE VOZ NORMAL E DISFONIA
Não há consenso quanto aos conceitos de voz normal e
disfonia. Não existe uma definição aceitável de voz normal,
não há padrões nem limites definidos (Colton & Casper,
1996).
- Contudo o conceito de voz normal e voz alterada veio
se modificando ao longo do tempo, sendo amplamente in
fluenciado pelo meio a que se pertence e pela cultura em
que se vive.
É importante compreender que enquanto a audição é
uma função essencialmente sènsorioneural, a voz depende
fundamentalmente de uma complexa e interdependente ati
vidade de todos os músculos que servem à sua produção,
além da integridade dos tecidos do aparelho fonador. Em
bora a fonação seja uma função neurofisiológica inata, a voz
desenvolve-se num paralelismo com o desenvolvimento
orgânico do indivíduo, como vimos anteriormente nesse ca
pítulo. Por sua vez, a formação psicológica do indivíduo
também se expressa na voz, constituindo-se em uma das
extensões mais fortes da personalidade. Assim sendo, a voz
é uma manifestação com base psicológica, mas de sofistica
do processamento muscular.
Quando a harmonia muscular é mantida, obtemos um
som dito de boa qualidade para os ouvintes e produzido
sem dificuldade ou desconforto para o falante. Esses atribu
tos caracterizam a eufonia. Em oposição, quando atributos
mínimos de harmonia e conforto não são respeitados, esta
mos diante de uma disfonia. Tal afirmação, contudo, é mais
complexa do que se pode imaginar.
Voz e disfonia são conceitos negociáveis: voz normal é
um dos temas mais controvertidos em nossa área. A própria
palavra normal, que significa segundo a norma, quando apli
cada a qualquer conceito relacionado ao comportamento
humano, oferece uma resistência imediata do momento em
que normas comportamentais são altamente influenciáveis
por fatores culturais e interpretações ideológicas, ou seja,
são passíveis de receber juízos de valor. Questões como
gosto pessoal, modismo, fatores sexuais, raciais e culturais
podem ser envolvidos nessa análise. Uma grande variabili
dade intrafalante e interfalante, além de uma certa dose de
subjetividade, está, assim, envolvida nesse conceito.
Desta forma, podem ser, portanto, formulados apenas
padrões gerais de normalidade vocal, como exemplificado
por Johnson, Brown, Curtis, Edney & Keaster (1965): 1. a
qualidade vocal precisa ser agradável, o que implica a pre
sença de certa qualidade musical e a ausência de ruído ou
atonalidade; 2. a frequência deve ser adequada, ou seja,
apropriada ao sexo e à idade do falante; 3. a intensidade de
ve ser apropriada, ou seja, a voz não pode ser tão fraca que
não seja ouvida em condições de fala ordinárias, e não deve
ser tão forte a ponto de chamar atenção indesejada sobre
ela; 4. a flexibilidade deve ser adequada, o que se refere ao
uso de variações em frequência e intensidade que auxiliem
na ênfase, no significado e nas sutilezas que expressem os
sentimentos do indivíduo.
Aronson (1990) sugere três questões para julgar a nor
malidade de uma voz: 1. A voz é adequada para oferecer ao
ouvinte inteligibilidade da fala?; 2. Suas propriedades acús
ticas são esteticamente aceitáveis?; 3. A voz preenche as
demandas profissionais e sociais do falante? Fawcus (1992)
propõe uma questão adicional: Qual o grau de desconfor-
to/esforço feito pelo próprio falante? Aronson (1990) ainda
comenta que definir voz normal é mais difícil do que definir
qualquer outro componente da fala ou linguagem porque,
por sua natureza, a variedade vocal é ilimitada e os padrões
de adequação vocal são amplos.
Greene & Mathieson (1989) definem voz normal como
simplesmente uma voz comum, que não apresenta nada
especial em seu som. Os autores referem que, para ser acei
ta, uma voz precisa ser forte o suficiente para ser ouvida e
apropriada para o sexo e a idade do falante. Precisa ainda
ser razoavelmente agradável para o ouvinte, modulada e
clara, apropriada ao contexto e não muito intensa, não pos
suindo nenhum desvio pronunciado de ressonância.
Moore (1971) descreve a complexidade da tarefa de
definir voz normal, afirmando que obviamente não existe
um som específico que possa ser referido como voz normal;
ao invésdisso, existem vozes de crianças, vozes de meni
nos, vozes de meninas, vozes de homens, vozes de mulhe
res, vozes de idosos, e assim por diante. O critério que sepa
ra as vozes em normais e não-normais é determinado pelos
ouvintes, sendo que as desordens vocais são culturalmente
baseadas e socialmente determinadas.
Um outro ponto importante a ser lembrado é que um
indivíduo que possui voz normal consegue variá-la livre
mente de acordo com a situação e o contexto do discurso.
Assim, na verdade, temos várias vozes, utilizadas de acordo
com o interlocutor e com a situação de comunicação. Essa
possibilidade de variação vocal, sob demanda voluntária ou
não, consciente ou inconsciente, talvez seja um dos melho
res atestados de saúde vocal e de normalidade anato-
mofuncional do aparelho vocal.
Considerando-se o exposto, seria aconselhável substi
tuir o termo voz normal por voz adaptada, de certa forma
isento da complexa discussão sobre o que seria a normalida
de vocal. Outra sugestão seria a de utilizarmos o termo voz
neutra para contornar essa questão, porém a tendência a
considerarmos esse vocábulo com o significado de não dis
tintamente marcado, indefinido e indeterminado esbarra na
realidade de que as vozes são sempre marcadas pelos aspec
tos biológicos, psicológicos e questões socioeducacionais
do falante. Uma voz adaptada nem sempre é neutra (Behlau,
1999).
Reconhecemos, ainda, que o próprio termo voz adapta
da não é ideal, pois não exprime de modo adequado a bidi-
recionalidade que queremos oferecer com esse conceito. A
voz deve ser produzida pelo falante, de modo adaptado,
sem esforço adicional e com conforto, identificando corre
tamente o sexo e a faixa etária a que pertence; por outro
lado, a voz deve ser adaptada ao grupo social, profissional e
cultural do indivíduo, o que é definido pelos ouvintes, por
um consenso não necessariamente consciente. Assim, uma
voz deve ser considerada adaptada após se avaliarem a per-
cepção do ouvinte e a do falante.
• Desta forma, sugerimos a utilização do termo voz adap
tada em todas as situações nas quais a produção vocal é de
qualidade aceitável socialmente, não interfere na inteligibi
lidade da fala, permite o desenvolvimento profissional do
indivíduo, apresenta frequência, intensidade, modulação e
projeção apropriadas para o sexo e a idade do falante e
transmite a mensagem emocional do discurso.
Se, por outro lado, deslocarmos nossa atenção para a
voz infantil, a problemática do conceito de voz normal com
plica-se ainda mais, já que observamos habitualmente crian
ças sem problemas de voz que apresentam um grau discreto
de nasalidade, rouquidão e soprosidade. Estudos recentes
inclusive indicam que fenda glótica é comum em crianças de
ambos os sexos (Pontes, Behlau, Crespo, Pedroso, Kyrillos &
Pontes, 1995), rouquidão é habitualmente observada em
crianças aos 10 anos de idade (Sederholm, Mcallister, Sund
berg & Dalkvist, 1993; Sederholm, 1995; Sederholm, Mcal
lister, Dalkvist & Sundberg, 1995) e o ataque vocal brusco é
o padrão de início de emissão de vogal sustentada em mais
da metade das crianças sem problemas de voz (Behlau &
Martins, 1998). Tais fatos fazem-nos propor a utilização do
termo voz esperada, quando queremos nos referir à voz
adaptada na infância, pelas próprias características do cres
cimento e maturação da laringe.
Finalmente, quando nos referimos à voz profissional, o
termo voz adaptada parece ser insuficiente, podendo-se,
assim, usar o termo voz preferida, que contempla também
66 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 67
questões culturais e de modismo. Como exemplo podemos
citar que a voz preferida para ópera, nos dias de hoje, é de
qualidade clara e com vibrato moderado; já a voz preferida
para os operadores de telemarketing é de qualidade limpa,
sem rouquidão, com modulação variada, mas não excessiva,
e sem marcadores acentuados de regionalismo ou caracte-
rísticas emocionais.
Com certeza, mais importante que a terminologia em
pregada é a habilidade do clínico de integrar as informações
advindas das diferentes dimensões de análise e interpretar
o'fenomeno vocal apresentado, determinando sua base e
definindo, considerando-se os valores e demanda vocal do
paciente, a necessidade ou não de reabilitação vocal e o
comprometimento da qualidade de vida em função da disfo-
nia. Contudo a falta de uma definição exata de limites de
normalidade cria-nos limitações na objetividade clínica e na
pesquisa científica.
Alterações em parâmetros vocais podem fazer com que o
falante e/ou o ouvinte não considerem uma certa emissão co
mo adaptada. Embora os falantes realizem vários desvios vo
cais durante a comunicação, principalmente de acordo com a
situação e o contexto em questão, há alterações que não po
dem ser aceitas como marcadores sociais, culturais ou emoci
onais, constituindo-se no que é chamado de disfonia.
Conceituamos disfonia como um distúrbio da comuni
cação oral, no qual a voz não consegue cumprir seu papel
básico de transmissão da mensagem verbal e emocional de
um indivíduo. Uma disfonia representa toda e qualquer difi
culdade ou alteração na emissão vocal que impede a produ
ção natural da voz (Behlau & Pontes, 1995). Isto engloba não
somente as alterações vocais, mas também as alterações
cinestésicas que podem estar presentes sem um marcador
auditivo específico. Assim, uma disfonia pode se manifestar
através de uma série ilimitada de alterações, tais como: des
vios na qualidade vocal, esforço à emissão, fadiga vocal, per-
da de potência vocal, variações descontroladas da freqiiên-
cia fundamental, falta de volume e projeção, perda da efi
ciência vocal, baixa resistência vocal e sensações desagradá
veis à emissão.
O uso do termo disfonia implica avaliação do indivíduo
e constatação de que os desvios encontrados não represen
tam marcadores específicos de seu grupo. Assim sendo,
quando ouvimos uma voz que nos soa desviada e não sub
metemos o falante a uma avaliação, é melhor referirmo-nos
a ele como tendo uma voz desviada ou alterada. Conse-
qúentemente, o uso do termo voz disfônica deve se reservar
às situações em que o indivíduo foi submetido a uma avalia
ção completa, identificando-se a desordem vocal.
O conceito de disfonia acima apresentado parece-nos
ser suficiente quando nos atemos ao universo do uso colo
quial da voz, porém, ao passarmos para a categoria de vozes
profissionais, principalmente no canto clássico e no teatro,
a situação é mais complexa. Para as vozes profissionais, o
conceito de emissão adaptada baseado na ausência de des
vios perceptíveis e em uma produção confortável é, no míni
mo, insuficiente. É necessário que se pondere a questão das
diferentes exigências vocais, onde a palavra-chave passa a
ser a eficiência no mecanismo vocal. Assim, uma voz profis
sional adaptada, além dos pré-requisitos anteriores, deve se
apresentar eficiente, nas diferentes exigências vocais do
indivíduo.
CLASSIFICACÃO DAS DISFONIAS 3
Vários critérios podem ser utilizados na classificação
das disfonias, no momento em que a voz é muldimensional
e diversos aspectos podem ser contemplados. Quem classi
fica, interpreta (Garcia-Tapia & Cobeta, 1996), o que envolve
muito mais do que uma simples lista de distúrbios, parâme
tros ou alterações. Alguns sistemas de classificação apresen
tados na literatura incluem os seguintes critérios: classifica
ção baseada na duração do sintoma; classificação baseada
na dicotomia funcional e orgânica; classificação por avalia
ção clínica; classificação baseada no uso vocal hipofuncional
e hiperfuncional; e classificação etiológica das desordens
vocais.
Classificação pelo tempo do Sintoma
As disfonias podem ser classificadas em agudas e cróni
cas, de acordo com a duração do sintoma, estipulando-se o li
mite de 15 dias como o marco divisório entre essas duas cate
gorias. As disfonias por processos inflamatórios agudos, taiscomo laringites, gripes e resfriados, dificilmente ultrapas
sam esse período; caso isso ocorra, pode ter-se estabeleci
do um desequilíbrio funcional, ou um quadro discreto pode
ter-se evidenciado. Ambas as situações merecem uma avali
ação cuidadosa.
Classificação pela Dicotomia Orgânica e
Funcional
A classificação mais comumente utilizada é a que divide
as disfonias em duas grandes categorias, orgânicas e funcio
nais. Os fundamentos desta classificação foram emitidos
ainda no século passado, a partir da utilização do espelho
de Garcia para o diagnóstico em laringologia.
Perelló (1962) e Perelló & Miguel (1973) fazem uma revi
são histórica sobre o conceito de disfonia funcional, ressal
tando alguns pontos que resumimos a seguir:
- Foi exatamente o espelho de laringe que fez com que
Frankel, em 1877, criasse o termo mogifonia,' para
designar a rouquidão sem lesões visíveis, precursor
do termo disfonia funcional.
- O termo foi então substituído por fonoastenia, cria
do em 1906 por Flatau & Gutzmann, que se propagou
de modo popular na linguagem médica da época.
- Imnoffer, em 1913, acreditava que o termo fonoaste
nia deveria ser utilizado somente para os profissio
nais da voz e propôs o termo fadiga vocal, com o
apoio de vários colegas, mas o uso de fonoastenia
prevaleceu.
Com o passar do tempo, o termo fonoastenia foi se en
fraquecendo por indicar apenas um sintoma, e não uma
enfermidade, mas ainda hoje se encontra uma certa utiliza
ção para designar as disfonias funcionais que se expressam
através da fadiga vocal.
Em 1926, La Barraque afirmou que “todas as alterações
funcionais não-corrigidas e não-educadas levam finalmente
à fonoastenia". Assim, paulatinamente, criou-se o conceito
de que é possível ocorrer uma disfonia apenas como resulta
do de uma alteração funcional, ou seja, com o mau uso ou
uso abusivo da voz.
Autores de grande expressão se opuseram a esse con
ceito, como Tarneaud (1955), que afirmou que “o fisiológi
co depende do orgânico e não pode ser separado”. Já mes
mo o texto clássico de Van Riper & Irwin (1958) aponta que
ambos os fatores orgânicos e funcionais estão frequente-
mente presentes, sendo difícil ou impossível ponderar a
influência isolada de cada um deles. Contudo o termo dis
fonia funcional ficou consagrado e a definição mais corren
te de disfonia funcional é a que se apresenta sem alteração
das pregas vocais visíveis ao exame laringoscópico, em
oposição à disfonia orgânica (Perelló & Miguel, 1973). De
início, duas fortes críticas podem ser feitas a essa definição:
em primeiro lugar, trata-se de uma definição negativa; em
segundo, o diagnóstico depende da precisão e da especifi
cidade do método semiológico empregado.
Mais recentemente, Le Huche (1982 e 1984) propôs o
uso do termo disfonia disfuncional para designar alterações
do comportamento fonatório que correspondem a uma fa
lha de adaptação e coordenação dos diversos órgãos que
intervêm na produção da voz. Tal descrição ressalta o aspec
to de se saber utilizar a voz corretamente, além de permitir
todas as possibilidades de associação entre as questões or
gânicas e disfuncionais.
A dicotomia orgânica e funcional é clássica; porém
observa-se que aspectos funcionais e orgânicos estão geral
mente presentes de modo associado e fica difícil pesar as
influências individuais de um e de outro. Além disso, a inte
ração entre esses fatores é complexa e, ao longo do tempo,
muitas alterações funcionais podem produzir reações orgâ
nicas, como os nódulos de pregas vocais. Acreditamos que o
termo disfuncional seja bastante apropriado, parecendo
mais próximo da realidade clínica. Contudo escapam a essa
definição várias alterações que poderiam ser incluídas na
designação funcional.
Uma simples pesquisa na literatura clínica aponta que
funcional pode significar: fisiologia alterada, abuso e mau
uso vocal, técnica vocal inadequada, disfonia psicogênica,
disfonia na ausência de lesões observáveis, disfonia com
redução de movimentos das pregas vocais, disfonia por mo
delo vocal inadequado e disfonias idiopáticas, entre outras
desordens vocais. Assim, quando se emprega esse termo,
deve-se esclarecer o que se quer dizer com ele.
A tendência moderna é substituir funcional por compor-
tamental ou por comportamental-orgânico, na presença de
lesões teciduais. Já na literatura brasileira, Brandi (1990) de
signa uma categoria de disfonias como comportamentais.
Classificação pelo Achado da Avaliação Clínica
A classificação pelo achado da avaliação clínica, propos
ta por Fawcus (1992), categoriza as disfonias em três gran
des grupos: anormalidades estruturais, distúrbios do movi
mento e ausência de impedimentos orgânicos e funcionais.
1. Anormalidades estruturais: a laringe é vulnerável ao es
tresse físico, que produz reações teciduais (nódulos,
úlceras e laringites não-específicas). Tais alterações po-
dem ser a consequência direta do uso inadequado da
voz. Porém tais alterações podem ainda ocorrer por trau
matismos físicos, como granuloma por intubação, por
infecção ou por tumores benignos ou malignos.
2. Distúrbios do movimento: as estruturas parecem nor
mais, mas seus movimentos são afetados. É a chamada
síndrome disartrofônica, um distúrbio do SNC que afeta
tanto a articulação como a fonação. São disartrias asso
ciadas com lesões centrais: cerebelares, extrapiramidais,
do neurônio motor inferior e lesões corticais; ou a le
sões periféricas: paralisias uni ou bilaterais de nervo la-
ríngeo superior e/ou inferior.
3. Ausência de impedimentos orgânicos ou funcionais:
não se encontram alterações estruturais ou funcionais
na laringe, nos exames clínicos disponíveis, o que não
quer dizer que não haja problemas de difícil detecção.
Nesta categoria estão as chamadas disfonias funcionais,
psicogênicas ou histéricas. É a mais complexa das situa
ções e necessita de avaliação detalhada. Outras duas
áreas que pertencem a essa categoria são a disfonia do
deficiente auditivo e do transexualismo.
Classificação pela Cinesiologia Laríngea
A classificação baseada na cinesiologia laríngea envolve
o uso dos conceitos de hipofunção e hiperfunção vocais.
Tais termos são referidos genericamente por Greene (1980)
como hipercinesia (esforço vocal) e hipocinesia (insuficiên
cia muscular), ou como fonação hipervalvular e hipovalvular,
como prefere Brackett (1971).
O termo hipocinético geralmente indica movimentos
laríngeos ineficientes (Luchsinger & Arnold, 1965), enquan
to o termo hipercinético refere-se a movimentos laríngeos
excessivos. Apesar dos prefixos hiper e hipo indicarem extre
mos opostos de um contínuo, nem sempre, ou, melhor
dizendo, quase nunca tal separação é nítida, no que diz res
peito à produção vocal. É comum a associação de grupos
musculares hipotônicos a grupos hipertônicos, como, por
exemplo, nos casos de paralisia recorrencial de prega vocal,
onde encontramos uma hipotonia em nível glótico, associa
da à constrição mediana e/ou ântero-posterior do vestíbulo
laríngeo, o que indica uma hipertonia supraglótica.
68 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 69
Aronson (1990) comenta que, embora esse tipo de clas
sificação tenha seu mérito, se usada de modo exclusivo é
simplista, pois reduz a complexidade das alterações larín-
geas e dá ênfase excessiva ao grau de aproximação das bor
das livres das pregas vocais, ao invés de analisar as causas
múltiplas das alterações nessa aproximação.
Tal classificação pode ser de certa valia para definir os
procedimentos básicos da reabilitação vocal, porém é consi
derada simplista e reducionista.z
Classificação Etiológica das Desordens Vocais
A classificação etiológica das disfonias é proposta por
diversos autores, com inúmeras variações, e baseia-se na
identificação dos fatores causais das disfonias. Tal taxono-
mia direciona o clínico quanto à conduta terapêutica a ser
empregada. Nesse item vamos apresentar algumas classificações disponíveis na literatura e explorar a classificação
proposta por Behlau & Pontes (1995).
O sistema de classificação de Luchsinger &
Arnold (1965)
Os autores alemães, com uma grande habilidade de
organização, apresentam um dos mais completos sistemas
de classificação etiológica das disfonias, em um livro que
representou um marco em nossa área, nos anos 60, sendo
referido até hoje. Dividem as disfonias em onze categorias
e, embora algumas divisões possam ser questionadas, como
a separação entre disfonia paralítica e disártrica e a coloca
ção de nódulos e pólipos numa categoria denominada pelos
nomes das lesões, o sistema apresentado é bastante abran
gente. 4
1. Disfonia displásica: desordens vocais de origem consti
tucional.
2. Nódulos e pólipos: disfonia primária e laringite secun
dária.
3. Disfonia endócrina: desordens vocais de origem endó-
crina.
4. Disfonia paralítica: desordens vocais por paralisia de
prega vocal.
5. Disfonia disártrica: desordens vocais de origem cen
tral.
6. Disfonia miopática: desordens vocais de origem mus
cular.
7. Influência do sistema neurovegetativo na voz: mono-
cordite vasomotora e úlcera de contato.
8. Disfonia traumática: desordens vocais após lesão larín-
gea.
9. Disfonia alaríngea: voz sem laringe.
10. Disfonia habitual: desordem vocal de origem habitual.
11. Disfonia psicogênica: desordens vocais de origem emo
cional.
O sistema de classificação de Aronson (1980)
O fonoaudiólogo Arnold Aronson foi um dos pioneiros
no estudo e na descrição das disfonias neurológicas, resul
tado direto de sua atuação expressiva na Mayo Clinic de Ro
chester. Uma figura modelo na fonoaudiologia americana
sustenta a atuação fonoaudiológica como uma especialida
de da área da saúde, e não da educação, defendendo o título
de doutorado para os fonoaudiólogos que atuam clinica-
mente, e não somente para os pesquisadores universitários.
Aronson (1980) classifica as disfonias em três grupos princi
pais: desordens orgânicas, psicogênicas e de origem inde-
terminada.
1. Disfonias orgânicas: incluem desordens congénitas, in
flamações, tumores, desordens endócrinas, trauma la-
ríngeo e desordens neurológicas.
2. Desordens psicogênicas: incluem disfonias por estresse
emocional, ou seja, disfonias por tensão musculoesque-
lética; desordens vocais com lesão laríngea secundária,
tais como os nódulos e as úlceras de contato; quadros
de psiconeurose; reação de conversão, tais como mutis
mo, afonia e disfonia; disfonias por conflito psicossoci
al, como o falsete mutacional; disfonia associada a um
conflito de identificação sexual, voz e fala infantis no
adulto e repouso vocal iatrogênico.
3. Disfonias de origem indeterminada: como a disfonia
espasmódica.
Essa classificação tem recebido críticas por categorizar
as disfonias com lesão laríngea secundária, principalmente
os nódulos, como um dos tipos de desordens vocais psico
gênicas. Evidentemente, a própria atuação clínica do autor,
centrada nas disfonias neurológicas, explica sua interpreta
ção.
O sistema de classificação de Brandi (1990)
A fonoaudióloga brasileira Edmée Brandi, pioneira no
estudo da voz humana no Brasil, apresenta uma classificação
simples e abrangente, também baseada na etiologia da disfo
nia. A autora explica que sua classificàção oferece um instru
mento rápido e eficaz de diagnóstico fonoaudiológico, fun
damentado no diagnóstico otorrinolaringológico, na avalia
ção da conduta vocal e na anamnese do paciente. Apesar de
fazer uma análise de base etiológica, a autora reforça a im
portância de se considerar, em todos os casos, os fatores pre-
disponentes, desencadeantes e agravantes das disfonias, pa
ra evitar as dificuldades etiológicas, podendo-se, assim, esta
belecer uma relação entre os aspectos estruturais e compor-
tamentais (Brandi, 1996).
Desta forma, as disfonias são classificadas em dois gran
des grupos:
1. Disfonias comportamentais: decorrentes de três situa
ções, a saber: desvios do padrão vocal, conduta vocal
hiperfuncional, ou, ainda, conduta vocal hipofuncional.
2. Disfonias estruturais: decorrentes de três situações, a
saber: anomalias congénitas; doença ou lesão, primária
ou secundária; ou ainda por laringopatias, ou seja, alte
rações estruturais indiretamente causadas por fatores
orgânicos, tais como endócrinos e neurovegetativos.
O sistema de classificação de Greene &
Mathieson (1989)
As autoras, fonoaudiólogas inglesas, consideradas as
mais importantes representantes da área de voz daquele
país, também apresentam uma classificação etiológica das
disfonias, demonstrando a diversidade de condições que
podem produzir alterações vocais. Greene & Mathieson
(1989) dividem as disfonias em dois grandes grupos, a
saber: disfonias comportamentais e orgânicas.
1. Disfonias comportamentais:
A) Por tensão muscular excessiva sem alterações
teciduais na mucosa laríngea.
B) Por tensão muscular excessiva com alterações
teciduais na mucosa laríngea: nódulos vocais,
laringite crônica, edema, pólipo e úlcera de
contato.
C) Psicogênicas: estado de ansiedade, neurose,
sintomas de conversão, atraso na voz puberal
(puberfonia) e conflito transexual.
2. Disfonias orgânicas:
A) Anormalidades estruturais: diafragma laríngeo,
fissura laríngea, obstrução nasal e trauma.
B) Condições neurológicas: paralisia do nervo laríngeo
recorrente, paralisia pseudobulbar, ataxia cerebelar,
tremor, parkinsonismo, coréia, atetose, apraxia,
lesões múltiplas, tais como doença do neurônio
motor e esclerose múltipla.
C) Desordens endocrinológicas: tireotoxicose,
mixedema, atraso mutacional sexual masculino,
virilização feminina devido à terapia hormonal
adversa, terapia medicamentosa adversa.
D) Doenças laríngeas: tumores benignos e malignos,
hiperqueratose, papilomatose, cisto, laringite
aguda e crônica, artrite cricoaritenóidea,
granuloma e infecção por fungo.
O sistema de classificacão de Garcia-Tapia
& Cobeta (1996)
Os médicos professores espanhóis classificam as disfo
nias de acordo com possibilidades etiológicas, ressaltando
que esse sistema de análise de causa e efeito não inclui
todas as possibilidades. Dividem as disfonias em quatro
grandes grupos.
1. Disfonias de causa orgânica: congénitas e adquiridas:
traumáticas, inflamatórias, neoplásicas, endocrinológi
cas, neurológicas e pós-cirurgia laríngea.
2. Disfonias de causa funcional: habituais — hiperfuncio
nal, hipofuncional, transtornos mutacionais e disfonia
vestibular; psicogênica — neurose, síndrome de con
versão, conflito psicossexual, disfonia puberum e trans
tornos fictícios.
3. Disfonias por lesões associadas: nódulos, pólipos, ede
ma de Reinke e granuloma de contato.
4. Disfonias de causas psiquiátricas: esquizofrenia, desor
dens afetivas - transtorno bipolar e outras.
Os autores esclarecem que consideram disfonias de
causa psicogênica aquelas em que não se reconhecem sinto
mas nem uma história detectável de alterações psiquiátri
cas, reservando o termo disfonias psiquiátricas para um gru
po bem diferenciado de alterações.
2 O sistema de classificação de Pinho (1998)
A fonoaudióloga brasileira Sílvia Pinho considera três
formas etiológicas de classificação das disfonias.
1. Disfonias funcionais: caracterizam-se pela presença de
distúrbio vocal na ausência de alterações orgânicas sig
nificativas.
2. Disfonias orgânicas secundárias: são disfonias decor
rentes do uso indevido da voz, da mesma forma que a
primeira categoria, porém com alterações orgânicas
conseqiienciais.
3. Disfonias orgânicas primárias: são aquelas cujo apare
cimento independe do uso indevido da voz.
O sistema de classificacão de Behlau &
Pontes (1990 e 1995) ’
Behlau & Pontes (1990) esclarecem que a disfonia é ape
nas um sintoma presente em vários e diferentes distúrbios,
ora se apresentando como sintoma secundário, ora como
principal. Muitas vezes é o sintoma mais importante de uma
desordem ou doença, sendo por isso encarado como a pró
pria desordem ou doença,como ocorre nas disfonias funci
onais por modelo vocal deficiente; outras vezes trata-se de
um sintoma discreto inserido num quadro muito maior,
como na doença de Parkinson. Portanto, apesar da distor
ção científica de se propor uma classificação etiológica de
um sintoma, os autores propõem agrupar as disfonias em
três grandes categorias etiológicas: disfonias funcionais,
disfonias organofuncionais e disfonias orgânicas. A classifi
cação desses autores é baseada no envolvimento do com
portamento vocal na causa da disfonia, sendo o envolvimen
to máximo nos quadros funcionais e ausente nos quadros
orgânicos. Os quadros funcionais são desordens do compor
tamento vocal, e podem ter como mecanismo causal três
diferentes aspectos: uso incorreto da voz, inadaptações vo
cais e alterações psicogênicas. Os quadros organofuncionais
representam uma disfonia de base essencialmente funcional
com lesões secundárias; representam, na verdade, uma eta
pa posterior na evolução de uma disfonia funcional. Final
mente, as disfonias orgânicas são aquelas que independem
do uso da voz e podem ser causadas por uma série variada
de processos.
70 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 71
Behlau & Pontes (1995) ressaltam ainda que as três cate
gorias apresentadas não são estanques, havendo uma gran
de interrelação entre elas. Uma simples disfunção da fona
ção, que se configura como uma disfonia funcional, pode
causar o aparecimento de alterações orgânicas, que acabam
por agravar o quadro, transformando-se numa disfonia
organofuncional. Por outro lado, a partir de uma disfonia
orgânica, pode ocorrer readaptação e consequente modifi
cação na função, acrescentando-se importantes desvios
vocais nesse quadro orgânico primário, transformando-o
hum quadro organofuncional. Ainda em algumas situações,
corrigidas as alterações orgânicas primárias, a readaptação
pode persistir, agora adquirindo características de disfonia
funcional.
Recentemente, Pontes, Behlau & Brasil (2000) modifica
ram a classificação original de Behlau & Pontes (1990), reno-
meando as duas primeiras categorias das disfonias funcio
nais e modificando algumas subcategorias, sem comprome-
(ter o espírito subjacente a esse modelo, ou seja, o envolvi
mento ou não do comportamento vocal no disparo da alte
ração vocal. As disfonias funcionais foram então organiza
das em primárias e secundárias, na tentativa de definir me
lhor o processo de participação comportamental subjacen
te, além das disfonias funcionais por alterações psicogêni-
cas.
Disfonias Funcionais
As disfonias funcionais são desordens do comporta
mento vocal e podem ter como mecanismo causal três dife
rentes aspectos: disfonias funcionais primárias por uso
incorreto da voz, disfonias funcionais secundárias por ina
daptações vocais e disfonias funcionais por alterações psi-
cogênicas.
c As disfonias funcionais são, por excelência, o campo de
domínio do fonoaudiólogo, uma vez que a reabilitação do
paciente depende diretamente do trabalho vocal realizado.
As disfonias funcionais primárias por uso incorreto da
voz são quadros funcionais puros, favorecidos por dois fato
res principais: falta de conhecimento vocal e modelo vocal
deficiente.
O uso incorreto da voz pela falta de conhecimento
vocal é observado quando o indivíduo não possui noções
básicas sobre a voz e as possibilidades do aparelho fonador,
o que pode levá-lo inconscientemente a selecionar ajustes
motores impróprios a uma produção vocal saudável. Con
vém lembrar que noções tais como inspirar antes de falar,
articular corretamente e com boca bem aberta, não compe
tir com ruído de fundo e usar roupas confortáveis, principal-
mente na região de pescoço e tórax, são conhecimentos
muito simples de nossa parte, mas o paciente não é um es
pecialista em comunicação e necessita ser orientado. Por
outro lado, nascemos com a possibilidade fisiológica do uso
da voz, e é uma distorção histórica das técnicas de canto
pensarmos na existência de uma técnica estruturada para
voz falada habitual. Falar é um atributo natural de nossa es
pécie, e o uso incorreto geralmente traduz desvios simples
do processo básico de produção natural da voz. Os principais
desvios no uso correto da voz são: 1. em nível respiratório -
inspiração insuficiente ou início de emissão após expiração;
2. em nível glótico - compressão glótica excessiva ou insufi
ciente; 3. em nível ressonantal - uso excessivo de uma caixa
de ressonância, como a laringe ou a cavidade nasal, ou, ain
da, o uso insuficiente das caixas de ressonância como um
todo.
O uso incorreto da voz por modelo vocal deficiente
ocorre quando o paciente modifica os ajustes laríngeos e
supralaríngeos naturais de sua emissão, procurando aproxi
má-la de um modelo que gostaria de ter ou que acredita ser
melhor. Modelos bastante comuns são vozes profissionais
de artistas famosos, que passam a ser imitados por aspiran
tes ao estrelato ou mesmo fas. Esse processo de aproxima
ção e modelagem vocal nem sempre é consciente e pode,
até mesmo, compor parte de um distúrbio psicológico pro
fundo, com dificuldades de aceitação pessoal e cisão de per
sonalidade.
As disfonias por inadaptações vocais representam uma
categoria muito importante dentro das disfonias funcionais
e, por não representarem quadros funcionais puros, foram
recentemente designadas de disfonias funcionais secundá
rias (Pontes, Behlau & Brasil, 2000). As inadaptações vocais
são situações muito variadas, de difícil enquadramento den
tro de uma classificação de disfonias.
As inadaptações vocais são muito comuns e podem es
tar restritas a um único aspecto, tanto do ponto de vista ana
tômico como funcional, mas podem envolver várias regiões
ou estruturas. Dessa forma, podemos ter inadaptações
vocais por inadaptação respiratória, fónica, ressonantal ou
de integração de dois ou mais sistemas, como os desequilí
brios entre o tamanho da laringe e as caixas de ressonância
(Pontes & Behlau, 1993; Pontes, Behlau & Kyrillos, 1994;
Pontes, Behlau & Gonçalves, 1994). As alterações com locali
zação fora da laringe são geralmente de interesse e de im
pacto muito pequeno, e não foram privilegiadas na classifi
cação de Behlau & Pontes (1992, 1995) devido ao restrito
impacto vocal que elas geralmente produzem.
Assim sendo, classificamos as disfonias funcionais se
cundárias por inadaptações vocais em dois grupos: inadap
tações anatômicas e inadaptações funcionais.
E As inadaptações anatômicas, por sua vez, podem ser
classificadas em quatro grupos: as assimetrias laríngeas, a
fusão laríngea posterior incompleta, os desvios na propor
ção glótica e as alterações estruturais mínimas da cobertura
das pregas vocais.
Nas inadaptações laríngeas observamos discretas alte
rações que comprometem apenas a função de produção
vocal, embora a execução das outras funções primárias des
ses órgãos esteja perfeita, como a respiração, a deglutição,
a tosse e o mecanismo de esfíncter.
Uma laringe normal, simétrica e estável, tanto na fun
ção respiratória como na fonatória, é apenas uma referên
cia encontrada nos desenhos anatômicos e idealizada em
nossas imagens mentais (Casper, Brewer & Colton, 1987).
Assimetrias laríngeas são inadaptações anatômicas
bastante frequentes. Embora essa não seja a única assime
tria nas estruturas e regiões do trato vocal, reveste-se de
grande importância pela possibilidade de um impacto
acentuado na fonação. A experiência dos avaliadores e a
interpretação que eles fazem sobre a correlação entre os
achados visuais e auditivos de um indivíduo são funda
mentais para a validação do diagnóstico diferencial entre
variabilidade anatômica e inadaptação vocal. Tal decisão é
vital do ponto de vista de triagem vocal para certas ocupa
ções, como na seleção de professores. Cabe ressaltar que
a clínica diária demonstra que indivíduos com tratos vo
cais inadaptados geralmente apresentam menor resistên
cia vocale maior possibilidade de desenvolvimento poste
rior de uma disfonia. A consequência mais comum de uma
inadaptação vocal é a fadiga vocal, principalmente se o
indivíduo passar a solicitar sua voz de modo intensivo ou
profissionalmente.
É nessa visão de pequenos desvios anatômicos e de
pequenas alterações na configuração estrutural da laringe
que se baseia o conceito de alteração estrutural mínima da
cobertura das pregas vocais (AEMC), uma das situações de
alterações da adaptação anatômica.
Definimos AEMC como um grupo de alterações na larin
ge, englobando desde simples variações anatômicas até le
sões na cobertura das pregas vocais (Pontes & Behlau,
1993). O impacto clínico, quando existente, restringe-se
única e exclusivamente à função fonatória da laringe, sendo
a disfonia consequente diretamente relacionada à quantida
de de uso, ao comportamento vocal e ao grau da alteração
apresentado pelo indivíduo (Pontes, Behlau & Gonçalves,
1994). Fazem parte das alterações estruturais mínimas com
desvios na cobertura das pregas vocais tanto alterações in
diferenciadas, não definidas macroscopicamente, como um
grupo de lesões diferenciadas, freqúentemente observadas
na clínica diária, como o sulco vocal, o cisto epidermóide, a
ponte de mucosa, o microdiafragma laríngeo e a vasculodis-
genesia.
O estudo das AEMC é uma verdadeira interface entre as
disfonias funcionais, organofuncionais e orgânicas, onde é
possível constatar a complexidade das relações entre as
diversas funções da laringe.
É exatamente na categoria das alterações estruturais
mínimas que reside a fragilidade do sistema de classificação
de Behlau & Pontes (1992). As críticas feitas à inclusão dessa
família de disfonias dentro da categoria de funcionais
podem ser resumidas em três questionamentos básicos: 1.
Os desvios embriogenéticos encontrados não seriam mais
bem alocados na categoria de disfonia orgânica por malfor
mação congénita?; 2. Por outro lado, a presença de lesões
disparadas pelo uso vocal não excluiria a disfonia da catego
ria funcional, deslocando-a para a família das disfonias
organofuncionais?; 3.0 distúrbio vocal apresentado, muitas
vezes levando ò paciente a uma desvantagem vocal social,
não seria grande demais para se traduzir no verbete altera
ção estrutural mínima?
Quanto à primeira crítica, a anatomia ensina que mal
formação congénita representa um desvio suficiente para
limitar ou impedir a função básica do órgão. No caso da
laringe, uma malformação congénita deve colocar em risco
a função respiratória, considerando-se que a função fonató
ria é uma função superposta secundária. Desta forma, o dia
fragma laríngeo, por dificultar ou até mesmo impedir com
pletamente a respiração, não é uma inadaptação vocal, mas
sim uma malformação congénita; pelo mesmo raciocínio, os
desvios de simetria, as fendas glóticas e alterações estrutu
rais mínimas são inadaptações vocais, e não malformações
congénitas.
Quanto à segunda crítica, talvez realmente fosse mais
confortável colocarmos pelo menos parte das AEM, nas situ
ações em que as lesões de cobertura são evidentes, na cate
goria das disfonias organofuncionais. Muitas vezes, as AEM
de cobertura aparecem e tornam-se sintomáticas somente
após uma maior solicitação vocal, o que justificaria sua in
clusão nessa última categoria. Isso implicaria, porém, distri
buir as alterações estruturais mínimas em duas diferentes
categorias.
Já o terceiro questionamento pode ser analisado consi-
derando-se que, na verdade, não temos informações sobre a
incidência de AEM na população e avaliamos apenas os paci
entes sintomáticos, cujas alterações são suficientemente
fortes para levar o indivíduo a buscar um tratamento. Além
disso, também observamos pacientes com AEM, avaliados
por outras queixas, sem nenhuma sintomatologia vocal.
A segunda categoria das disfonias funcionais secundá
rias por inadaptações vocais refere-se às inadaptações fun
cionais, que podem decorrer de problemas de incoordena-
ção, seja pneumofônica ou fonodeglutitória; ou por altera
ções miodinâmicas, quer sejam respiratórias, ressonantais
ou laríngeas. As alterações miodinâmicas laríngeas são as
mais importantes inadaptações funcionais, onde podemos
analisar as alterações posturais da laringe, das pregas vocais
(fendas glóticas) e as alterações cinéticas do vestíbulo larín
geo (constrição mediana e ântero-posterior).
Finalmente, as disfonias funcionais por alterações psi-
cogênicas são responsáveis por um contingente expressivo
de problemas de voz. É uma observação simples comprovar
mos a influência das emoções na voz, embora o processo
subjacente a essa interferência seja bastante complexo. Do
mesmo modo, é fácil compreendermos a participação dos
fatores emocionais na produção de uma disfonia, quando
lembramos que comunicar emoções é um dos eventos mais
importantes do ser humano, e a voz, seu principal portador.
A inclusão dessa família de disfonias dentro da categoria de
disfonia funcional é apoiada na noção de que manifestações
vocais psicogênicas decorrem do próprio uso da voz, ou de
conflitos gerados nos valores inerentes à voz. As alterações
vocais são simbólicas e relacionadas às dificuldades enfren
tadas pelo paciente; esse simbolismo é relacionado à comu
nicação.
O grupo das disfonias psicogênicas pode ser classifica
do em dois grandes subgrupos, a saber: disfonias psicogê-
72 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 •/ CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 73
nicas com formas clínicas definidas e disfonias da muda
vocal. Reconhecemos as seguintes formas clínicas definidas
de disfonias psicogênicas: afonia de conversão, uso diver
gente de registros, falsete de conversão, sonoridade inter
mitente, síndrome de tensão musculoesquelética, disfonia
vestibular, disfonia por fixação em registro basal, disfonia
espasmódica de adução psicogênica, disfonia espasmódica
de abdução psicogênica e disfonia por movimentos parado
xais das pregas vocais. Por sua vez, as disfonias da muda
vocal ou puberfonias podem ser classificadas em: mutação
prolongada, mutação incompleta, mutação excessiva ou
sobrepassada, mutação precoce, mutação retardada e false
te mutacional. Além desses dois grandes subgrupos, há uma
série de disfonias psicogênicas monossintomáticas, com
desvios de frequência, intensidade, ou de outros parâme
tros vocais.
Nenhuma classificação é confortável em todos os seus
aspectos e ressaltamos, mais uma vez, que quem classifica
interpreta um fato ou um fenômeno de acordo com sua
experiência e realidade, que nesse caso é a realidade clínica
do grupo ao qual pertencemos. Na verdade, há várias zonas
de sobreposição, como entre as AEM de cobertura e as dis
fonias organofuncionais, e entre as disfonias por uso incor
reto da voz e as disfonias psicogênicas.
Disfonias Organofuncionais
São disfonias de base funcional com lesões secundárias;
representam, na verdade, uma etapa posterior na evolução
de uma disfonia funcional. Assim sendo, na maioria dos ca?
sos, uma disfonia organofuncional é uma disfonia funcional
diagnosticada tardiamente, ou por atraso na busca da solu
ção do problema pelo próprio paciente ou pelo não-reco-
nhecimento da possibilidade de se desenvolver uma lesão
secundária.
O objetivo primário do tratamento fonoaudiológico é
promover a reabsorção da lesão, corrigindo o desvio funcio
nal, no momento em que se reconhece como causa primária
a alteração no comportamento vocal. Nesta categoria é es
sencial a integração ORL-FONO, pois, em determinados ca
sos, a troca de informações é básica para definir a conduta
cirúrgica.
Existe uma lista extensa de critérios que podem ser
considerados para auxiliar a definir essa conduta, sendo que
o primeiro é, sem dúvida, como está configurada a equipe
(no caso da existência de uma) de atendimento ao paciente.
Os relatos na literatura de reabsorção de nódulos ocor
rem sempre nos serviços com equipes multiprofissionais,
assim como os relatosde cirurgia ocorrem em centros médi
cos que não contam com recursos ou tradição na área de
reabilitação.
Evidentemente, além da questão primordial da configu
ração da equipe de trabalho, existem.outros fatores a serem
considerados, sendo que um dos mais importantes é o tipo
e o tamanho da lesão observada. Além desses fatores, deve
ser também considerada a localização da lesão ao longo da
borda livre e nas faces supra e infraglótica das pregas vocais,
sendo que as lesões em região anterior têm maior probabili
dade de evolução com fonoterapia que lesões na região pos
terior da laringe. Outros critérios bastante úteis e que auxi
liam a nortear a decisão terapêutica são: a presença de assi
metria laríngea, a uniformidade da prega vocal; o impacto
na prega vocal contralateral; os fatores causais; as deman
das vocais do paciente; alterações displásicas associadas; a
análise da agenda do paciente, que pode não permitir a
dedicação necessária à fonoterapia; e fatores de personali
dade, particularmente motivação, constância e dedicação
ao trabalho proposto.
Situações particulares podem ocorrer quando não é
possível realizar um diagnóstico preciso, ou seja, quando o
quadro é maldefinido, apesar de terem sido utilizados todos
os recursos de semiologia. Um exemplo dessa situação é o
caso de lesões nodúlares, onde há dúvida diagnóstica entre
nódulo ou cisto de pregas vocais.
São consideradas lesões organofuncionais as seguintes:
nódulos, pólipos, edemas de Reinke, alguns quadros de úl
ceras de contato, granulomas e leucoplasias das pregas vo
cais. Essas três últimas lesões podem ser exclusivamente
orgânicas, ou seja, produzidas por fatores alheios ao com
portamento vocal do indivíduo, como, por exemplo, o reflu
xo laringofaríngeo.
Disfonias Orgânicas
Essas disfonias independem do uso da voz e podem ser
causadas por uma série variada dé processos; onde reconhe
cemos duas categorias abrangentes: disfonias orgânicas
por alterações com origem nos órgãos da comunicação e
disfonias orgânicas por doenças com origem em outros ór
gãos e aparelhos.
As disfonias orgânicas por alterações com origem nos
órgãos da comunicação podem ser divididas em: congéni
tas, como as malformações laríngeas, tais como o diafragma
laríngeo e a laringomalácia; traumáticas, por arma branca
ou arma de fogo; inflamatórias, não-infecciosas e infeccio-
sas; neoplásicas, tumores benignos e malignos; por proble
mas auditivos, entre outras.
As disfonias orgânicas por alterações com origem em
outros órgãos e aparelhos do corpo podem ser divididas
em: endocrinológicas, tais como as disfonias por distúr
bios relacionados à hipófise, à glândula tireóidea e às glân
dulas sexuais; as disfonias por síndromes, como na síndro
me cri du chat; por desordens neurológicas, como na doen
ça de Parkinson e esclerose lateral amiotrófica; por doen
ças renais, por doenças auto-imunes, como o lúpus congé
nito; por refluxo gastresofágico, entre outras.
Embora tal categorização possa facilitar o raciocínio, a
família de disfonias orgânicas é tão ampla e, ao mesmo tem
po, com aspectos tão particulares, que preferimos subdi-
vidi-la de acordo com o principal comprometimento. Desta
forma, apresentaremos, no Capítulo específico do tema, as
disfonias orgânicas agrupadas em disfonias congénitas, en
docrinológicas, neurológicas, traumáticas, inflamatórias e
infecciosas, por refluxo gastresofágico e por neoplasia.
O atendimento fonoaudiológico no campo das disfo
nias orgânicas é menos definido e os resultados obtidos
parecem ser menos evidentes ou confiáveis, porém é cada
vez mais aceito o benefício que dele resulta, como o que se
tem observado no tratamento da disfonia por doença de
Parkinson (Ramig, Bonitati, Lemke & Horii, 1994). Estudos
de eficácia da reabilitação vocal têm sido uma preocução
também nas disfonias orgânicas (Ramig & Verdolini, 1998).
Por outro lado, em muitas disfonias de tratamento exclu
sivamente médico, quer seja realizado por medicamentos ou
por cirurgia, podem permanecer alterações nas estruturas do
trato vocal, ou mesmo nas funções musculares, que exijam
um processo de reabilitação fonoaudiológica.
Nesses casos, e considerando-se que a voz alterada pro
duzida não depende primariamente de fatores comporta-
mentais, há quatro objetivos básicos de atuação fonoaudio
lógica:
1. Maximizar o uso da voz do paciente na vigência da
alteração orgânica: nesta situação podemos citar como
exemplo os casos de papilomatose laríngea, onde a fo
noterapia pode promover uma melhoria na sonoridade
glótica, visando também um padrão global de comuni
cação com melhor inteligibilidade, através de um traba
lho de sobrearticulação dos sons da fala. Especificamen-
te na papilomatose, pode ser realizado um trabalho de
prevenção do desenvolvimento de gestos motores atí
picos, como fonação vicariante por voz de pregas vesti
bulares ou produção ariepiglótica.
2. Desenvolver compensações por uso das estruturas re
manescentes: as cirurgias que envolvem a remoção de
partes da laringe, tais como cordectomias ou laringec-
tomias parciais, podem vir acompanhadas ou não de
reconstrução do espaço criado, através de retalhos da
musculatura e/ou pele. Esses retalhos de reconstrução
servem como muro de apoio das estruturas remanes
centes, para que se crie uma condição mínima de fonte
sonora, e também na tentativa de manutenção de uma
válvula suficiente para selar a luz laríngea durante a
deglutição. Desta forma, as estruturas remanescentes
deverão se desenvolver para auxiliar na produção de
um som básico o menos turbulento possível, além de
evitar a aspiração de líquidos ou alimentos. O trabalho
fonoaudiológico nesses casos tem sido chamado de
fonoterapia agressiva, pois os exercícios ministrados
utilizam forças de oclusão de trato vocal, hipertonicida-
de de musculatura paralaríngea e auxílio da movimenta
ção dos membros superiores na tentativa de reduzir o
espaço laríngeo criado.
3. Desativar a tratopatia de adaptação: a tratopatia de
adaptação foi nomeada por Behlau & Pontes (1995) para
designar um distúrbio funcional adquirido a partir de
uma lesão orgânica primária na laringe ou em qualquer
das estruturas que compõem o trato vocal. Essa trato
patia representa uma alteração compensatória ou vica
riante desenvolvida na tentativa de sobrepujar as limita
ções vocais decorrentes da disfonia orgânica primária.
Assim, por exemplo, um paciente que desenvolve uma
úlcera de contato por refluxo gastresofágico, uma disfo
nia de causa exclusivamente orgânica, pode vir também
a desenvolver uma tratopatia de adaptação na tentativa
de reduzir a rouquidão e se livrar da sensação de ardor e
fisgada, característica da presença da úlcera do terço
posterior. A reabsorção da úlcera não garante a elimina
ção da tratopatia de adaptação, que pode fixar-se tanto
em nível proprioceptivo como auditivo.
4. Auxiliar o paciente a aceitar a nova voz: é importante
reconhecer o valor de auxiliar o paciente a aceitar a
nova voz. A dificuldade de um indivíduo identificar-se
com uma voz diferente da que anteriormente o repre
sentava em suas dimensões biológica, psicológica e
socioemocional pode ser grave a ponto de modificar
sua maneira de se comunicar ou até mesmo de restrin
gir seu contato social ou profissional.
74 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 75
SÍNTESE
1. O desenvolvimento da voz acompanha e representa o desenvolvimento do indivíduo, tanto do ponto de
vista físico como psicológico.
2. Inicialmente a laringe apresenta-se muito alta, o que pode ser facilmente observado nos recém-nascidos
durante a deglutição, quando a laringe se eleva ainda mais no pescoço; ao redor dos cinco anos de idade, a
cartilagem cricóidea já se posicionou na altura da sétima vértebra cervical (C7), onde ficará até os 20 anos,
descendo lentamente até a senescência.
3. A porção membranosa das pregas vocais quase dobra de tamanho no primeiro anode vida, chegando à fase
adulta com uma variação de 11,5 a 16 mm no homem, e de 8 a 11,5 mm na mulher; além da diferença no
comprimento, as pregas vocais infantis também diferem fisiologicamente das do adulto, por não apresenta
rem o ligamento vocal maduro.
4. O bebê possui uma emissão sonora rica, embora sem controle volitivo; observam-se diferentes emissões
para expressar fome, dor e prazer, o que ilustra o fato de que desde o nascimento a laringe se manifesta
como órgão das emoções, produzindo diferentes manifestações vocais associadas a estados emocionais
diversos.
5. A voz do bebê é geralmente caracterizada por uma qualidade vocal descrita como delgada, sem diferenças
quanto ao sexo.
6. Até a puberdade a laringe e a voz são muito semelhantes em ambos os sexos; a muda vocal é apenas um dos
aspectos das alterações globais que ocorrem no período da adolescência, mais particularmente dos 9 aos 15
anos de idade e mais evidente no sexo masculino.
7. A muda vocal nos homens ocorre ao redor de 13 a!5 anos, enquanto nas mulheres acontece ao redor de 12
a 14 anos.
8. A frequência fundamental média para homens adultos e mulheres adultas (média de 18 a 45 anos de idade)
é, respectivamente, de 113 Hz e 204 Hz, enquanto as crianças brasileiras (de 8 a 11 anos) apresentam uma
média de 235,8 Hz.
9. O envelhecimento é um conglomerado complexo de eventos biológicos que mudam a estrutura e a função
de diversas partes do corpo; o início da presbifonia, seu desenvolvimento e o grau de deterioração vocal
variam amplamente e individualmente.
10. O conceito de voz normal é amplamente discutível, sofrendo influências culturais, sociais e raciais; suge-
re-se substituir o termo por voz adaptada, que indica produção confortável para o falante e agradável ao
ouvinte.
11. Disfonia é um distúrbio da comunicação que impede a produção natural da voz do indivíduo; suas causas
são múltiplas e podem estar ou não relacionadas ao uso da voz. '
12. As disfonias podem ser classificadas de modo multidimensional, embora uma taxonomia que inclua fatores
etiológicos ajude o clínico a delinear seu plano de atuação.
13. Uma disfonia é dita funcional quando em sua base encontram-se problemas relacionados predominante-
mente ao uso da voz; uma disfonia é dita organofuncional quando as lesões observadas são de natureza
predominantemente comportamental; finalmente, uma disfonia é dita orgânica quando suas causas inde
pendem do uso da voz, porém, é importante ressaltar que há zonas de sobreposição entre essas categorias.
14. A atuação fonoaudiológica depende de aspectos relacionados à categoria etiológica da alteração vocal
observada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABITBOL J, ABITBOL P, ABITBOL B. Sex hormones and the
female voice. J Voice 13:424-46,1999.
ACKERMAN R, PFAU W. Gerontologische untersuchungen zer
stõrungsanfalligkeeit der sprechstimme bei berufssprecherm.
Folia phoniatr 26:95-9, 1974.
ALARCOS AL, BEHLAU M, TOSI O. Computer acoustical
analysis of senile voices. Folia Phoniatr 35:102, 1983.
ANDREWS ML, SUMMERS A. Voice Therapy for Adolescents.
Boston: College-Hill, 1988.
ARONSON AE. Clinical Voice Disorders. New York, Decker,
1980.
ARONSON AE. Clinical Voice Disorders. 3rd ed. New York:
Thieme, 1990.
BACH AC, LEDERER FL, DINOLT R. Senile changes in the
laringeal musculature. Arch Otolaryngol 34:47-56,1941.
BEHLAU M. Presbifonia: envelhecimento vocal inerente à idade.
In RUSSO IP: Intervenção Fonoaudiológica na Terceira Idade.
Rio de Janeiro: RevinteR, 1999, pp 25-50.
BEHLAU M, MARTINS AF. Occurrence of hard vocal attack in
children. In DEJONCKERE PH, PETERS HFM (Eds.):
Proceedings. 24th IALP Congress. IALP, Vol. I. Amsterdam,
IALP, 1998, pp 3-4.
BEHLAU M, PONTES P. Avaliação Global da Voz. São Paulo:
EPPM, 1990.
BEHLAU M, PONTES PA. Disfonias psicogênicas. In FERREIRA
LP: Um Pouco de Nós Sobre Voz. Barueri: Pró-Fono, 1992,
pp 61-86.
BEHLAU M, PONTES P. Avaliação e Tratamento das Disfonias.
São Paulo: Lovise, 1995.
BEHLAU M, TOSI O, PONTES PA. Determinação da frequência
fundamental e suas variações em altura (jitter) e intensidade
(shimmer), para falantes do português brasileiro. Acta AWHO
4:5-9, 1985.
BEHLAU M. Alteraciones de la voz. In GIL-CARCEDO Y GARCIA
LM, ALGARRA JM, MEDINA J, ALAMO P, SÚAREZ NIETO C,
PINEDIJ: Tratado de Otorrinolaringologia y Cirugía de
Cabeza y Cuello. Madrid: Proyetos Médicos, 1999. (No
prelo.)
BEHLAU M, PONTES P, TOSI O, GANANÇA M. Análise
perceptual acústica das vogais do português falado em São
Paulo. Acta AWHO 7:67-76, 1988.
BRACKETT IP. Parameters of voice quality. In TRAVIS LE (Ed.):
Handbook in Speech Pathology and Audiology. New York:
Appleton-Century-Crofts, 1971.
BRANDI E. Disfonias: Avaliar para Melhor Tratar. São Paulo:
Atheneu, 1996.
BRANDI E. Voz Falada: Estudo, Avaliação e Tratamento. Rio de
Janeiro: Atheneu, 1990.
CARBONELL J, TOLOSA F, JUAN E. Presbifonia. Estudio de los
parâmetros acústicos de normalidad. Acta Otorrinolaring Esp
47:295-9,1996.
ÇARNEVALLE-RICCE F. Osservazioni istopathologiche sulla
laringe nella senescenza. Arch Ital Otol Rinol Laringol
49:1-17, 1937.
CASPER J, COLTON R. Compreendendo os Problemas da Voz:
Uma Abordagem Fisiológica para o Tratamento dos
Distúrbios da Voz. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
CASPER J, BREWER DW, COLTON RH. Variations in normal
human laryngeal anatomy and physiology as viewed
fiberscopically. J Voice 1:180-5,1987.
COLTON R, CASPER J. Understanding voice problems. A
physiological perspective for diagnosis and treatment. 2ed.
Baltimore, Williams & Wilkins,. 1996
DEFINA AP. Ocorrência de muda vocal em adolescentes do
sexo feminino — São Paulo, 2000. Monografia.
Especialização. Centro de Estudos da Voz.
FAWCUS M. Voice Disorders and Their Management. 2nd ed.
San Diego: Singular, 1992.
FLATAU, GUTZMANN (1906) apud PERELLÓ J. Dysphonies
fonctionnelles. Folia Phoniatr 14:150-205, 1962.
FRANKEL (1877) apud PERELLÓ J. Dysphonies fonctionnelles.
Folia Phoniatr 14:150-205, 1962.
GARCIA-TAPIA R, COBETA I. Clasificación de las disfonias. In
GARCIA-TAPIA R, COBETA I: Diagnóstico y Tratamiento de
los Transtornos de la Voz. Madrid: Garsi, 1996.
GIL D, LOURENÇO L, MIRANDA AR, PEREIRA AJ, RODRIGUES
S, BEHLAU M. A Memória da Muda Vocal. Acta AWHO
13:74-80, 1994.
GREENE M. The Voice and Its Disorders. Tunbridge Wells:
Pittman, 1980.
GREENE M, MATHIESON R. The Voice and Its Disorders 5th ed.
London: Wurr, 1989.
HANG Z, YANG S. Analysis of voice of healthy aged persons
with narrow band spectrum analyzer. Auris Nasus Larynx
(Tokyo) 17:45-8, 1990.
HIRANO M, KURITAS, NAKASHIMAT. Growth, development
and aging of human vocal folds. In BLESS DM, ABBS JH
(Eds.): Vocal Fold Physiology. San Diego: College- Hill, 1983,
pp 22-43.
HIRSCHBERG J, SZENDE T. Pathological Cry Stridor and Cough
in infants. Budapest: Akadémia Kiadó, 1982.
HOLLIEN H, SHIPPT. Speaking fundamental frequency and
chronologic age in males. J Speech Hear Res 15:155-9,
1972.
HUTCHINSON JM, ROBINSON KL, NERBONNE MA. Patterns of
nasalance in a sample of normal gerontologic subjects. J
Commun Disord 11:469-81, 1978.
IMNOFFER (1913) apud PERELLÓ J. Dysphonies Fonctionnelles.
Folia Phoniatr 14:150-205, 1962.
JACKSON-MENALDI MCA. Aspectos generales de la voz. In
GARCIA-TAPIA R, COBETA I: Diagnóstico y Tratamiento de
los Transtornos de la Voz. Madrid: Garsi, 1996, pp 205-16.
JOHNSON W, BROWN SF, CURTIS JF, EDNEY CW, KEASTER J.
Speech Handicapped School Children. New York: Harper &
Row, 1965.
KAHANE JC. A survey of age-related changes in the connective
tissues of the human adult larynx. In BLESS DM, ABBS JH
(Eds.): Vocal Fold Physiology. San Diego: College-Hill, 1983.
KAHANE JC. Anatomic and physiologic changes in the aging of
the peripheral speech mechanism. In BEASLEY DS, DAVIS
GA (Eds.): Aging: Communication Process and Disorders.
New York: Grune & Stratton, 1981, pp 36-51.
KAHANE J. Lifespan changes in the larynx: an anatomical
perspective. In: BROWN WS, VINSON BP,CRARY MA. (eds).
Organic voice disorders. Assessment and treatment. San
Diego: Singular, 1996, p. 89-110
KAHN AR, KAHANE JC. India ink pinprick assessment of age
related changes in the cricoarytenoid joint articular surfaces. J
Speech Hear Res 29:536-43, 1996.
KAPLAN HM. Anatomy and Physiology of Speech. New York:
McGraw-Hill, 1971.
KELLEY, A. Fundamental frequency measurement of female
voices from twenty to ninety years of age. Greensboro,
University of North Carolina, 1977, pp 68. Manuscrito não
publicado.
KURITA S, NAGATA K, HIRANO M. A comparative study of the
layer structure of the vocal fold. In BLESS D, ABBS JH (Eds.):
76 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 77
Vocaí Fold Physiology — Contemporary Research and
Clinical Issues. San Diego: Singular, 1985.
LA BARRAQUE L. Technique Vocale. Paris: Vogt, 1926.
LE HUCHE F. Dysphonies dysfonctionnelles. Enciclopédie
Médico-Chirurgicale. Paris: Techniques, 1982, Vol. 5, 20752
A15, 5, pp 1-14.
LE HUCHE F. Sur Ie traitement rééducatif des dysphonies
"dysfonctionnelles". Bull d'Audiophonol 14:67-106, 1984.
LUCHSINGER R, ARNOLD GE. Voice-Speech-Language Clinical
Communicology: Its Physiology and Pathology. Belmont:
Wadsworth, 1965.
a MOORE GP. Voice disorders organically based. In TRAVIS LE:
Handbook of Speech Pathology and Audiology. New York:
Appleton-Century-Crofts, 1971.
MORRISON M, RAMMAGE L. Voice disorders in the elderly. The
Management of Voice Disorders. San Diego: Singular, 1994,
pp 141-9.
MORRISON M, RAMMAGE LA, NICHOL H. Evaluation and
management of voice disorders in the elderly. In GOLDSTEIN
JG, KASHIMA HK, KOOPMAN CV Jr. (Eds.): geriatric
Otorhinolaryngology. Philadelphia: BC Decker, 1989.
MUISAN G, SORBINI C, GRASSI V. Respiratory function in the
aged. Bull Physiopathol Resp 1:973-1009, 1971.
MYSAK ED. Pitch and duration characteristics of older males. J
Speech Res 2:46-52, 1959.
MYSAK ED, HANLEY TD. Aging process in speech: pitch and
duration characteristics. J Gerontol 13:309-13, 1958.
PANTOJA E. The laryngeal cartilages. Arch Otolaryng
87:41 6-522, 1968.
PERELLÓ J. Disphonies fonctionelles. Folia Phoniatr 14:150-205,
■1962.
PERELLÓ J, MIGUEL JS. Alteraciones de la Voz. Barcelona:
Cientifico-Medica, 1973.
PINHO S. Avaliação e tratamento da voz. In PINHO S (Org.):
Fundamentos em Fonoaudiologia Tratando os Distúrbios Da
Voz. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 1998, pp 2-48.
PONTES P, BEHLAU M. Dysphonias secondary to minor
structural changes of vocal fold cover and to sulcus vocalis:
efficacy of treatment. Pacific Voice Conference 6. San
Francisco, 1993. Digest. San Francisco, 1993, pp 18.
(Abstract.)
PONTES P, BEHLAU M, BRASIL O. Minor structural alterations of
the larynx: an attempt of classification. 6th International
Symposium of Phonosurgeons. Anais. Veneza, 2000.
(Abstract.)
PONTES P, BEHLAU M, GONÇALVES ML Reduction of
misdiagnoses in vocal fold cover alterations — minor
structural changes. Review of 87 treated cases. The 3rd
International Symposium On Phonosurgery. Kyoto, 1994.
(Proceedings.)
PONTES P, BEHLAU M, KYRILLOS L. Configuration et rapport
glottique: un essai pour comprendre la fente glottique
postérieure Rev Laryngol 15:261-66, 1994.
PONTES P, BEHLAU M, CRESPO A, PEDROSO J, KYRILLOS L,
PONTES A. Glottic proportion and vocal fold opening angle.
Annals I World Voice Congress. Oporto, 1995. (Abstract
0180.)
PRESSMAN JJ, KELEMAN G. Physiology of the larynx Physiol Res
35:506-54, 1955.
PRISTON J. Análise da frequência fundamental do tempo
máximo de fonação da capacidade vital e do fluxo aéreo
adaptado em adultos falantes do português brasileiro. São
Paulo, 1994. Monografia Especialização Centro de Estudos
da Voz.
PRISTON J, GONÇALVES Ml, BEHLAU MS. Análise da
frequência fundamental do tempo máximo de fonação e do
fluxo aéreo adaptado em falantes do português brasileiro. In
BEHLAU M (Ed.): Anais do II Congresso Internacional de
Fonoaudiologia e VII Encontro Nacional de Fonoaudiólogos.
Rio de Janeiro, 1992. (Resumo TL8.)
PTACEK PH, SANDERS EK, MALONEY WH, JACKSON CR.
Phonatory and related changes with advanced age. J Speech
Hear Res 9:353-60, 1966.
RAMIG L, VERDOLINI K. Treatment efficacy: voice disorders. J
Speech Lang Hear Res 41 :S101-16, 1998.
RAMIÕ LO, BONITATI CM, LEMKE JH, HORII Y. Voice treatment
for patients with Parkinson disease: development of an
approach and preliminary efficacy data. J Med Speech Lang
Pathol 2:191-209, 1994.
RUIZ DM. Ocorrência da muda vocal fisiológica e relação com a
estatura física. Bauru, 1993. Monografia Especialização
Universidade do Sagrado Coração.
RYAN WJ. Acoustic aspects of the aging voice. J Gerontol
27:265-8, 1972. :
SATALOFF RT. The effects of age the voice In SATALOFF RT (Ed.):
Professional Voice the Sciences of Art and Clinical Care. New
York: Raven Press, -1991, pp 141-52.
SAXMAN JH, BURK KW. Speaking fundamental frequency
characteristics of middle aged females. Folia Phoniatr
19:167-79, 1967.
SCHOW RL, CHRISTENSEN JM, HUTCHIMSON JM,
NERBONNE MA. Communication Disorders of the Aged.
Baltimore: University Park, 1978.
SCHRAGER O (1966) apudJACKSON-MENALDI MCA. Aspectos
generales de la voz. In GARCIA-TAPIA R, COBETA I:
Diagnóstico y Tratamiento de los Transtornos de la Voz.
Madrid: Garsi,'1996, pp 205-6.
SEDERHOLM E. Prevalence of hoarseness in ten-year old
children. ScandJ Log Phon 20:165-73, 1995.
SEDERHOLM E, McALLISTER A, DALKVIST J, SUNDBERG J.
Aetiologic factors associated with hoarseness in ten-year old
children. Folia Phoniatr Logop 47:262-78, 1995.
SEDERHOLM E, McALLISTER A, SUNDBERG), DALKVIST J.
Perceptual analysis of child hoarseness using continuous
scales. Scand J Log Phonol 18:73-82, 1993.
SEGRE R. Senescence of the voice. Eye Ear Nose Throat Month
50:223-7,1971.
SWINE CH. Caractéristiques de la personne âgée malade et
problème fréquents en pathologie gériatrique. Louvain Méd
111:209-14, 1992.
TARNEAUD J. Precis de Therapeutique Vocale. Paris: Maloine,
1955.
VAN RIPER C, IRWIN JV. Voice and Articulation. Englewood
Cliffs: Prentice-Hall, 1958.
VASCONCELLOS LR. Análise da intensidade em diferentes
tarefas fonatórias — São Paulo 1994. Monografia
Especialização Centro de Estudos da Voz.
WASZ-HÕKERT O, LIND VUORENKOSKI V, PARTANEM T,
VALLANE E. The Infant Cry: A Spectrographic and Auditory
Analysis. London: Heinemann 1968.
WELFORD AT. Skill and Age: An Experimental Approach.
London: Oxford University, 1951.
ZEMLIN WR. Speech and Hearing Science. New Jersey:
Englewood Cliffs, 1968.
LEITURAS
RECOMENDADAS
BEHLAU M. Presbifonia: envelhecimento vocal inerente à idade.
In RUSSO IP: Intervenção Fonoaudiológica na Terceira Idade.
Rio de Janeiro: RevinteR, 1999, pp 25-50.
0 texto em questão é um capítulo de um livro brasileiro dedicado à
ação fonoaudiológica com pacientes da terceira idade. O capítulo faz
uma análise crítica entre os limites de uma voz fisiologicamente enve
lhecida e uma disfonia na terceira idade, com mais de 80 referências bi
bliográficas. E recomendado para quem quer estudar mais sobre esse
aspecto ou pesquisar na área.
PERRELLÓ /. & MIGUEL J. Alteraciones de la Voz. Barcelona:
Científico-Médica, 1973.
O livro recomendado, embora seja dos anos 70, representa uma das
mais completas referências sobre os diferentes tipos de disfonia, em
espanhol. Os capítulos vão desde as disfonias por malformações larín-
geas até a disfonia por laringectomia total. 0 livro inclui ainda uma das
primeiras publicações sobre as influências de fármacos e tóxicos na
voz, organizado de modo claro e didático.
FAWCUS M. The causes and classification of voice disorders. In
FAWCUS M (Ed.): Voice Disorders and Their Management.
London: Croom Helm, 1992.
O texto da autora inglesa oferece um panorama geral sobre os distúr
bios da voz, apresentando a complexidade de uma classificação vocal,
incluindo e comentando diversos tipos de taxonomia das disfonias.
78 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 79
SÍTIOS
RECOMENDADOS
DE BOCA
EM BOCA
D8 http://www.ncvs.org/.
Aspectos físicos da voz humana
0 sítio do National Center for Voice and Speech - NCVS do
National Institute on Deafness and other Communication Disor
ders traz um tutorial completo com informações sobre a
produção vocal e o desenvolvimento da voz durante a vida,
excluindo os aspectos da anatomia da laringe. O sítio é man
tido pela equipe de investigação multidisciplinar do referi
do centro americano, que se propõe a estudar o poder e as
limitações da voz humana. Inclui também aspectos da voz
cantada e é constantemente atualizado, além de apresentar
novidades na área da voz humana. O sítio funciona como um
livro, com diversos capítulos que exploram a biomecânica
dos tecidos da laringe, a oscilação das pregas vocais, concei-
tuação dos diversos parâmetros vocais, as modificações vo
cais durante toda a vida e aspectos do canto. O texto é mui
tas vezes complexo, com fórmulas e gráficos, apresentan
do poucas ilustrações.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
18 http://www.voice-center.com/voice-mecha.html
Mecanismos da produção vocal
Sítio pertencente ao The Voice Center at Eastern Virginia
Medical School, já citado anteriormente, criado por Randall L.
Plant. Inclui explicações sobre o fluxo aéreo e a vibração das
pregas vocais, exames dinâmicos da laringe, downloads de
imagens, tópicos em ciência da voz, além de distúrbios vo
cais e laríngeos.
Idioma: Inglês
Sítio visitado em 5/1/2001
CASPER J, BREWER D, COLTON R. Variations in normal human laryngeal anatomy and physiology
as viewed fiberoptically. J. Voice, 1:180-5, 1987.
O objetivo deste trabalho foi observar e documentar
variações na configuração e movimento do trato vocal infe
rior e estruturas laríngeas selecionadas.
Foi aplicado um protocolo constando de tarefas fonató-
rias e não-fonatórias, em todos os indivíduos, filmando-se
os exames. Avaliadores reviram as imagens obtidas, com
atenção especial às seguintes estruturas: parede posterior
da faringe, epiglote, seios piriformes, pregas vestibulares,
pregas vocais e o chamado complexo aritenóideo. Foi ob
servada grande variabilidade anatômica e fisiológica entre
os indivíduos normais.
Os autores comentam que o termo laringe normal não
descreve uma condição simples com limites fixos, embora
os desenhos anatômicos apresentem imagens perfeitamen
te idealizadas e simétricas das estruturas. A variabilidade na
estrutura de uma laringe dita normal tem sido descrita na li
teratura e é importante considerar as variações fisiológicas
para compreender a etiologia dos problemas de voz.
Método
Participaram do presente estudo 20 falantes normais,
10 homens e 10 mulheres, com idades entre 21 e 33 anos,
sem treino vocal profissional para fala ou canto. Todos os
sujeitos responderam a um questionário quanto ao uso de
fumo e álcool, medicamentos, saúde e histórico da voz. Três
avaliadores experientes avaliaram a qualidade de voz de
cada um dos indivíduos como normal. A média da relação
s/z foi de 0,62 a 1,4.
O protocolo utilizado para as análises constou das
seguintes manobras: respiração; três inspirações profun
das; três repetições confortáveis das vogais “i” e “u”, com 3
a 5 s de duração; três repetições das vogais “i” e “u” em fre
quência aguda; três repetições do som do uivo do lobo -
“auuuuuuu”; assobios interrompidos; assobio da canção
“Parabéns a Você”; e duas repetições de cada frase de um
conjunto de cinco frases especialmente construídas, carre
gadas de vogais “i” e “u”, para facilitar a visualização da
laringe.
As imagens foram vistas por três avaliadores. Cada qual
descreveu, individualmente, o tamanho, a forma e vários
movimentos das estruturas da laringe. Foram avaliados: a
epiglote, o chamado complexo aritenóideo (região posteri
or da laringe, formada pelas cartilagens aritenóideas e a
mucosa da região entre elas), as pregas vocais, as pregas
vestibulares, a parede posterior da faringe, as pregas ariepi-
glóticas, os seios piriformes, a abertura das pregas vocais e
os movimentos da laringe. Quando ocorreram controvérsias
nas observações entre os avaliadores, as imagens foram vis
tas novamente e discutidas.
Resultados e Comentários
Foram observadas muitas variações e diferenças, como
por exemplo: diferenças no todo do complexo aritenóideo,
diferença no comprimento das porções visíveis das pregas
vocais, prega vestibular ocultando a prega vocal, aproxima
ção bilateral de pregas vestibulares, abdução assimétrica
das pregas vocais, assimetria das cartilagens aritenóideas.
Neste estudo foram identificadas pelo menos quatro con
figurações diferentes na emissão do assobio: (a) movimentos
vigorosos diferentes do que ocorre durante a fala; (b) a posi
ção de abertura das pregas vocais e glote; (c) a posição fecha
da das cartilagens aritenóideas com um mínimo de movimen
to dá prega vocal; e (d) pregas vocais fechadas em Y, ou fenda
glótica posterior, e o pecíolo da epiglote proeminente.
As variações na estrutura de uma laringe normal descri
tas neste artigo são uma pequena amostra da ampla varieda
de existente. A descrição sistemática do que é normal e o
que é anormal é muito difícil. Normal não é uma única enti
dade; ao contrário, apresenta variação de comportamento e
estrutura.
A variabilidade estrutural mais marcante notada nessa
amostra ocorreu na denominação do chamado complexo
aritenóideo. Foram observadas diferenças no tamanho, for
ma e simetria do complexo, especialmente no movimento
da parede da faringe e também no movimento das pregas
vestibulares. Assimetria no comprimento das pregas vocais
também foi frequente. Durante a fonação, movimentos assi-
http://www.ncvs.org/
http://www.voice-center.com/voice-mecha.html
80 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS D1SFONIAS 81
Tre
métricos podem ocultar uma porção de uma prega vocal
mais do que a outra. A constrição ântero-posterior, muito
comum em pacientes com disfonia, não foi observada na
amostra de população normal. Esta amostra limitada, entre
tanto, não permite inferir que tais comportamentos não
podem ser encontrados entre indivíduos normais.
Em resumo, a condição normal pode estender-se em
uma ampla variação de diferenças na estrutura e função.
Quando não se observam alterações evidentes nos tecidos da
laringe ou lesões de massa, a diferença entre normal e anor-
2 mal é realmente difícil e impossível de se fer feita utilizan-
do-se somente a avaliação por nasofibroscopia.
Observações
1. A The Voice Foundation comercializa uma fita de vídeo,
através da Singular Publishing, dos mesmos autores do
artigo acima, mostrando o protocolo empregado e al
2 BEHLAU MS. Presbifonia: envelhecimento vocal inerente à idade. In: RUSSO IP. Intervenção
fonoaudiológica na terceira idade. Rio de Janeiro: RevinteR, 1999, p. 25-50.
O texto apresenta uma extensiva revisão dos trabalhos
publicados sobre as alterações vocais na terceira idade, fisio
lógicas e patológicas, apresentando os principais dados
relacionados a esse processo.
Estima-se que a incidência da disfunção vocal na terceira
idade seja de 12%, mas não há dados exatos. Embora exista
uma crença popular generalizada de que idosos têm vozes
estereotipadas, como é demonstrado pelos atores que inter
pretam papéis de idosos, tal regra não se aplica na vida real,
principalmente nas pessoas que apresentam vozes bem pro
duzidas, naturalmente ou através de treinamento. Reações a
vozes de idosos são geralmente negativas e a idade dos ou
vintes influencia a percepção da faixa etária através da voz.
Características vocais pela idade não são exclusivas e,
em muitas maneiras, são semelhantes às observadas em
algumas doenças e nos repousos vocais prolongados.
Há uma série de alterações que geralmente tornam-se
mais evidentes após os 60 anos, como qualidade vocal rouca
3 HIRANO M, KURITA S, NAKASHIMA T. Growth, developmentand aging of human vocal folds. In:
BLESS DM, ABBS JH. Vocal fold physiology. San Diego: College-Hill, 1983. p. 23-43.
A função fonatória modifica-se continuamente desde o
nascimento até a senescência. As mudanças mais marcantes
ocorrem entre o nascimento e a puberdade, e novamente na
senescência. Essas mudanças diferem significativamente en
tre os sexos.
Foram estudadas 88 laringes de indivíduos japoneses, ma
croscopicamente normais e obtidas em autópsias, com idade
variando entre algumas horas após o nascimento e 69 anos.
Os autores dividiram a prega vocal em porção membra-
nosa e porção cartilagínea. A porção membranosa foi defi
nida como a porção anterior do topo do processo vocal da
guns exemplos de variabilidade anatomofuncional en
contrados nos indivíduos analisados. O título da fita é:
Casper J, Colton R, Brewer D. The diversity of normal
larynx.
2. As cinco frases carregadas das vogais “i” e “u”, para me
lhor visualização da glote, foram adaptadas ao portu
guês por Behlau, quando da tradução do livro dos fono-
audiólogos Janina Casper e Raymond Colton, para o
português (Casper, J. & Colton, R. — Compreendendo os
problemas da voz. Uma abordagem fisiológica para o trata
mento dos distúrbios da voz. Porto Alegre: Artes Médicas,
1996.). São elas:
a) Vi Bibi feliz.
b) Ele disse sim pra mim.
c) Zizi viu o jipe?
d) O louco pulou o muro.
e) Dudu acendeu o fogo?
e trémula, porém estudos científicos fracassaram na descri
ção de um marcador que fosse único e exclusivo da senes-
cência vocal. As principais alterações relatadas são:
1. Capacidade vital com redução acentuada.
2. Frequência fundamental: aumentada para os homens,
reduzida ou inalterada para as mulheres, índices de per-
turbação aumentados e presença de tremor senil.
3. Extensão de frequências e intensidades reduzidas para
ambos os sexos.
4. Qualidade vocal: deterioração da qualidade vocal em
maior grau para os homens, mais precoce para as mu
lheres e mais acentuada na voz cantada que na voz fala
da; instabilidade vocal, incluindo emissão trémula, e
aumento do grau de nasalidade.
5. Formantes das vogais.- menor uniformidade no traçado,
com deslocamento dos formantes e redução da fre-
qiiência média do primeiro formante.
cartilagem aritenóidea, enquanto a porção cartilagínea
como a porção posterior do topo do processo vocal.
O comprimento da porção membranosa começa a dife
rir entre os sexos no período da muda vocal. Os autores
observaram que, na criança, a porção membranosa é relati
vamente curta, enquanto no adulto ela é bem mais longa,
tanto em valores absolutos como em relação ao comprimen
to da porção cartilagínea. Tais observações foram conside
radas evidências morfológicas de uma superioridade poten
cial de controle vocal no adulto. Foram realizadas várias
medidas, apresentadas no Quadro 2-4.
Quadro 2-4. Valores absolutos de algumas medidas nas pregas vocais para recém-nascidos
(RN), mulheres adultas (MA) e homens adultos (HA): comprimento total (CT), em mm;
comprimento da porção membranosa (PM), em mm; comprimento da porção cartilagínea
(PC), em mm; valor da proporção entre a porção membranosa e a cartilagínea (PM/PC);
espessura da mucosa (E), em mm; proporção entre a espessura da mucosa e o
comprimento da porção membranácea (E/PM)
CT PM PC PM/PC _F_ E/PM
RN 2,5 3 1, -2 1,0 1,1 1,1- 1,8 0,75-0,95 0,35-0,62
MA 11-15 «/>-12 2-3 . 3.3- 4,5 0,75-1,1 5 0,07-0,12
HA i 7- 2 1 14,5 1» 2, -3,5 ■],7 6,2 0,90 -1,55 0,05 0,10
Desenvolvimento das Estruturas Internas da
Prega Vocal
No recém-nascido a mucosa é muito espessa relativa
mente ao comprimento, e não há a estrutura do ligamento
vocal. Numa criança de 4 anos, a mucosa é relativamente
mais fina que nos recém-nascidos, porém mais espessa que
nos adultos; observa-se apenas um ligamento vocal imatu
ro, sem diferenciação entre a camada de fibras elásticas e a
camada de fibras colágenas. Num menino de 12 anos, perce-
be-se uma discreta diferenciação entre as camadas, mas so
mente aos 16 anos as camadas estão estruturadas como na
prega vocal do adulto. Portanto o principal processo de
amadurecimento ocorre durante a adolescência, onde há
um aumento de tamanho das pregas vocais acompanhado
de mudanças em sua estrutura interna.
A densidade de fibroblastos é muito maior nas crianças
do que no adulto; à medida que o número de fibroblastos di
minui, as fibras na lâmina própria aumentam em número.
No recém-nascido a espessura da prega vocal é muito
grande em relação ao seu comprimento.
Envelhecimento da Prega Vocal
É necessário lembrar, primeiramente, que as mudanças
observadas apresentam enorme variação intersujeitos, ten-
do-se considerado uma laringe masculina de um indivíduo de
27 anos de idade como referência para as análises efetuadas.
Cobertura
Não foram observadas mudanças marcantes no epitélio. A
lâmina própria tende a ficar mais espessa e edematosa, porém
com menor densidade de fibroblastos, fibras colágenas e elás
ticas. Nas mulheres, essas alterações são mais discretas.
4GIL D, LOURENÇO L, MIRANDA AR, PEREIRA AJ
vocal. ActaAWHO, 13: 74-80, 1994.
A mudança da voz na puberdade é um dos marcos mais
importantes da passagem da infância para a vida adulta. Quan
do não ocorre adequadamente, a emissão vocal é limitante e
pode causar dificuldades em relação à identidade sexual.
Camada Intermediária
Nos homens, a camada intermediária afila-se com a ida
de, com menor densidade e atrofia das fibras elásticas. Os
contornos dessa camada ficam deteriorados. Nas mulheres,
as alterações não são tão marcadas.
Camada Profunda da Lâmina Própria
Nos homens, a camada profunda torna-se mais espessa
particularmente após os 50 anos. O tamanho e a densidade
das fibras colágenas aumentam. As fibras, que corriam em
um arranjo paralelo nos jovens, passam a correr em várias
direções, o que é chamado de fibrose. Nas mulheres, as mu
danças não são tão marcadas, observando-se um discreto
aumento na densidade das fibras de colágeno e somente
uma pequena tendência à fibrose.
Mudanças no Corpo
Sem dúvida o corpo da prega vocal, isto é, o músculo vo
cal, também muda com a idade, porém o trabalho em questão
apresenta apenas dados preliminares. No recém-nascido, as
fibras musculares são muito finas e não aparentam ser desen
volvidas. Num homem de 27 anos, observam-se fibras muscu
lares completamente desenvolvidas; e, com a idade, essas fi
bras tornam-se, de certo modo, atrofiadas.
Os autores mostram-se relutantes em generalizar suas
conclusões pelo pequeno número de laringes estudadas e
pela grande variabilidade que caracteriza a normalidade ana
tômica, mas concluem dizendo que os dados apontam para o
fato de que a prega vocal cresce não somente em tamanho,
mas também modifica-se quanto a sua estrutura interna.
RODRIGUES S, BEHLAU M. A memória da muda
A mutação vocal fisiológica é uma fase de desequilíbrios
físicos associados a um complexo processo paralelo de de
senvolvimento emocional, decorrente dos novos níveis hor
monais no corpo. A mutação vocal ocorre entre 13 e 15 anos
82 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 2 • CONCEITO DE VOZ NORMAL E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFONIAS 83
e é mais evidente nos homens, com o crescimento das pre
gas vocais em até lem e uma redução da frequência funda
mental em aproximadamente uma oitava.
Durante a muda vocal há um crescimento constante e
não-homogêneo das estruturas responsáveis pela produção
da voz. Nesse período, a voz pode ficar rouca e instável,
com flutuações.
O objetivo do presente estudo foi investigar a memória
que homens de diferentes faixas etárias apresentam sobre
esse período de passagem da voz infantil para a voz adulta.
Material e Método
Participaram do presente estudo 400 homens, brasilei
ros, idade entre 16 e 65 anos, sem distúrbios evidentes de
fonoarticulação e história negativa de distúrbios da comuni
cação. Foi aplicado um questionário de 12 perguntas refe
rentes à muda vocal: ocorrência e duração, tipos de altera
ções vocais,sentimentos e comportamentos associados,
: reações dos ouvintes, artifícios para mascarar as quebras vo-
: cais e atitudes tomadas frente ao problema. Foram também
colhidos dados sobre as características vocais atuais, tais
como: julgamento sobre correspondência da voz e idade,
voz e tipo físico, voz e personalidade, e voz e atividade exer
cida pelo entrevistado.
Comentários
A muda vocal fisiológica é um fenômeno rotineiro,
porém marcante na vida dos homens, sendo os problemas
5 KAHANE J. Lifespan changes in the larynx: an anatomical perspective. In: BROWN WS, VINSON BP,
CRARY MA. (eds). Organic voice disorders. Assessment and treatment. San Diego: Singular, 1996, p. 89-110.
O autor apresenta um texto com as principais altera
ções biológicas que influenciam o tamanho, a forma e as
propriedades fisiológicas da laringe, bem como as causas
das mudanças vocais que ocorrem durante a vida. São apre
sentados os principais dados sobre a laringe do bebê, da cri
ança, do adolescente e do adulto.
A Laringe do Bebê
- Não é miniatura da laringe adulta; há vários aspectos
diferenciais.
- Epiglote, em posição ereta, para proteger as vias aé
reas, desviando o conteúdo ingerido para o seio piri-
forme, enquanto permite que o ar passe da nasofa-
ringe para a laringe desobstruída.
- Posição da laringe: alta do pescoço, borda inferior da
cartilagem cricóidea entre C2 e C3 contida na cavida
de faríngea, bastante horizontalizada, com a priori
dade de preservar a função respiratória.
- Laringe em forma de funil no bebê e tubular no adul
to, em decorrência do crescimento da cartilagem cri
cóidea, que aumenta a área subglótica.
- Laringe mais compacta, com cartilagens constituin
do-se em seu maior componente.
de muda uma exceção do processo de desenvolvimento.
Períodos longos de muda vocal, com mais de um ano de
duração, ou a ausência total ou parcial da muda devem ser
adequadamente avaliados e tratados.
Conclusões
1. Os homens lembram da muda vocal fisiológica.
2. Não têm sentimentos negativos relacionados às altera
ções vocais deste período.
3. Não perceberam reações negativas por parte do interlo
cutor.
4. Alterações vocais mais frequentes: voz instável, desafi
nada e grossa.
5. Indivíduos não usam artifícios para mascarar a muda e
não procuram atendimento especializado neste período.
6. Entrevistados gostam de suas vozes atuais e acreditam
que corresponda ao sexo, idade, tipo físico e atividade
profissional. i
Observação i
O trabalho acima resumido ganhou o prémio RAYMUNDO
MANNO VIEIRA de melhor trabalho científico, apresentado no
VI Encontro Anual do Centro de Estudos Fonoaudiológicos —
CEFA da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de
Medicina, em Barra Bonita, em novembro de 1993.
- Diferenças estruturais quanto ao sexo não existem,
portanto as vozes são similares.
- Osso hióide mais arredondado e cartilagem tireóidea
mais larga e mais curta.
- Cartilagens laríngeas moles e flexíveis, altamente
vascularizadas.
- Cartilagens aritenóideas grandes, o que estabiliza as
pregas vocais posteriormente; processo vocal relati
vamente anteriorizado pela curta dimensão anterior
da laringe, frequência fundamental aguda.
- Lâmina própria com camadas não definidas, ligamen
to vocal imaturo e menor massa muscular.
- Músculos com peso de 9,6 a 14% dos mesmos na ida
de adulta; maior parte da massa muscular intrínseca
representada pelos adutores (CAL, TA, A), provavel
mente devido às necessidades de pressão intratoráci
ca e intra-abdominal para desenvolver força corporal,
postura ereta, deambulação e defecação.
- CT é uma grande massa muscular da laringe infantil,
atribuído à necessidade do tensor ter massa adequa
da para regular comprimento/tensão/massa nas voca
lizações reflexas e no jogo vocal.
- 50% dos músculos intrínsecos laríngeos são imaturos
e indiferenciados.
- Imaturidade no controle neurológico até os 3 anos
de idade.
A Laringe Infantil
- Descenso da laringe no pescoço; aos 5 anos a borda
inferior da cricóide localiza-se no meio de C5; fatores
relacionados a esse descenso: crescimento vertical
da faringe e da região cervical, mudança do ângulo da
base do crânio em relação à coluna vertebral e cresci
mento do terço posterior da língua na faringe.
- Maior distância entre a epiglote e o palato mole.
- Modificação da forma da passagem aérea orofarín-
gea, semelhante a um tubo.
- Trato vocal aos 9 anos é comparável ao do adulto,
embora menor.
- Crescimento laríngeo e faríngeo correlaciona-se com
o crescimento da estatura física.
- Cartilagens aumentam no tamanho e na rigidez.
- Dimensão posterior da laringe cresce em maior
extensão que as dimensões lateral e anterior; a cavi
dade laríngea torna-se mais ampla e profunda acima
das pregas vocais do que abaixo delas.
- Entre 1 e 12 anos há um aumento de 6,5 mm no com
primento das pregas vocais.
- Até os 4 anos a lâmina própria é muito pobre; aos 10
anos o ligamento vocal e a lâmina própria estão mais
desenvolvidos, embora imaturos.
- Decréscimo da frequência fundamental entre 7 e 11
anos, cerca de 30 Hz em meninas e 60 Hz em meni
nos, como resultado do aumento do comprimento,
massa muscular e tecidos conectivos das pregas vo
cais.
A Laringe do Adolescente
- Crescimento significativo entre a pré-puberdade e a
puberdade, maior nos meninos, sendo que a laringe
feminina requer menor crescimento por unidade de
tempo para alcançar a maturidade.
- A laringe transforma-se num órgão maduro através
de um crescimento acelerado em um curto período
de 3 meses a 1 ano.
- O tamanho e a forma adulta da laringe são estabeleci
dos para ambos os sexos.
- A laringe posiciona-se mais baixa no pescoço; no final
da puberdade a borda inferior da cartilagem cricói
dea encontra-se np limite inferior de C6; localizan
do-se entre C6 e C7 no jovem adulto.
- Cartilagens laríngeas são significativamente maiores
e mais pesadas nos meninos e a proeminência tireói
dea é claramente mais pronunciada.
- Crescimento das pregas vocais por ação dos hormô-
nios sexuais; pregas vocais masculinas crescem duas
vezes mais que as femininas.
- A maturação da lâmina própria continua durante
toda a adolescência.
- A mudança da voz na puberdade é uma resposta fisio
lógica, produto de vários fatores do desenvolvimen
to, tais como questões genéticas, fatores hormonais
relacionados à estatura corporal e propriedades bio-
mecânicas das diferentes camadas e estruturas das
pregas vocais.
A Laringe Adulta
4 - A idade cronológica é um marcador da evolução da
voz: mudança de F0, aumento da variabilidade de fre-
qiiência e intensidade.
- Indivíduos com mesma idade podem ter vozes bas
tante distintas por diferenças nas condições fisiológi
cas.
- As dimensões da laringe adulta são estabelecidas
durante a puberdade.
- A laringe adulta reposiciona-se em níveis baixos no
pescoço, T2 e T3, por alterações da elasticidade dos
ligamentos e diminuição na altura das vértebras.
- Cartilagens aumentam de peso por ossificação e cal
cificação, mas sem modificação de tamanho.
- As cartilagens elásticas (epiglote, processo vocal e
ápice das aritenóideas) não se ossificam, mas alcan
çam certa calcificação; o processo de enrijecimento
ocorre tanto em mulheres quanto em homens, po
rém inicia-se mais tarde no sexo feminino e não é tão
extenso.
- As modificações nas juntas articulares podem variar
em extensão e incluem: afilamento e irregularidades
nas superfícies, diminuição e desorganização das fi
bras colágenas; atrofia da membrana sinovial, menor
lubrificação e nutrição da superfície articular, o que
pode limitar o grau de fechamento glótico.
- Redução do epitélio, conexão mais frouxa com a lâ
mina própria e edema persistente na mucosa e sub-
mucosa.
- Redução na rede de reentrâncias na mucosa, o que
dificulta a retenção da secreção e provoca resseca-
mento do epitélio.
- Irregularidades no contorno da borda livre das pre
gas vocais.
- Atrofia das glândulas mucosas e lubrificaçãoreduzi
da.
- Atrofia das fibras elásticas na lâmina própria, densi
dade reduzida e desorganização.
- Alteração no ligamento vocal do homem após os 50
anos, não observada nas mulheres.
- Fo mais grave na mulher idosa como resultado dos
efeitos edematosos no tecido elástico.
VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA
- Fo mais aguda no homem idoso, após a sexta década
de vida, por enrijecimento das pregas vocais e perda
de massa.
- Redução do controle neuromuscular das pregas vocais,
o que pode resultar em qualidade vocal tensa e/ou tre
mor vocal.
- Degeneração neural e várias tentativas de regeneração
nos nervos laríngeos.
- Não há consenso quanto às alterações nos músculos
intrínsecos na senescência, atribuídas à redução do
suporte sanguíneo.
O desenvolvimento e o envelhecimento da laringe são
áreas férteis para pesquisa. Estas novas informações trarão
uma compreensão mais completa do funcionamento larín-
geo. Desta forma, clínicos e pesquisadores se beneficiarão
ampliando seus conhecimentos e melhorando a prática clí
nica.
Aal©ÇÔ 0® Voz
í
Mara Behlau, Glaucya Madazio, Deborah Feijó & Paulo Pontes
OBJETIVOS
O objetivo de uma avaliação de voz é descrever o perfil vocal básico de um indivíduo e,
ainda, verificar a influência do comportamento vocal na génese de uma disfonia. A
avaliação de um paciente disfônico é essencialmente multiprofissional e inclui, pelo menos,
uma avaliação fonoaudiológica e médica; nas vozes profissionais, a avaliação de um profes
sor de técnica vocal é também parte integrante desse processo. A avaliação fonoaudiológica
analisa todas as dimensões do comportamento vocal, tendo como base a avaliação percepti-
vo-auditiva. A avaliação perceptivo-auditiva, embora seja considerada subjetiva, pode ser
conscientemente desenvolvida, tornando-se, portanto, um recurso confiável e decisivo. A
análise acústica, recentemente introduzida na rotina clínica através de programas compu
tadorizados de baixo custo, oferece meios práticos e objetivos de quantificar o sinal sonoro,
analisando a função vocal e oferecendo uma linha de base para o acompanhamento do(s)
tratamento(s) ministrado(s). A avaliação otorrinolaringológica é parte essencial e prioritá
ria da avaliação de voz. A correlação entre os dados auditivos, visuais e acústicos é a base do
raciocínio clínico diagnóstico e terapêutico. Quando os resultados acústicos não são confiá
veis, a avaliação perceptivo-auditiva é soberana. A avaliação de voz deve ser um procedi
mento contínuo durante todo o tratamento ou o processo de aperfeiçoamento vocal.
86 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 3 ✓ AVALIAÇÃO DE VOZ 87
INTRODUÇÃO
A avaliação de voz compreende uma série de procedi
mentos com o objetivo de conhecer o comportamento vocal
de um indivíduo, identificando os prováveis fatores causais,
desencadeantes e mantenedores da disfonia, descrevendo
as características de perfil vocal do indivíduo, os hábitos
adequados e inadequados à saúde vocal, os ajustes do trato
vocal empregados na produção da voz e a relação entre cor-
po-voz-personalidade. Haskell (1995) ressalta os principais
objetivos da avaliação de voz, a saber: auxiliar no esclareci
mento da causa da desordem; oferecer uma descrição da
função vocal, determinando a severidade e o prognóstico
do distúrbio; e educar o paciente sobre a desordem vocal e
sua responsabilidade em seu desenvolvimento e em seu tra
tamento. A avaliação do paciente disfônico envolve necessa
riamente um diagnóstico médico e uma avaliação fonoaudi-
ológica.
0 que avaliar depende basicamente do objetivo da ava
liação e da hipótese diagnóstica, quando se trata de uma
disfonia. Desta forma, o interesse do indivíduo ao buscar
uma avaliação vocal, assim como as hipóteses ou suspeitas
diagnósticas, é, portanto, a base da escolha dos itens da
avaliação, definindo os testes a serem realizados.
Para uma triagem vocal fonoaudiológica mínima suge
re-se a exploração dos seguintes itens:
o Análise perceptivo-auditiva da qualidade vocal.
• Medidas fonatórias: tempo máximo de fonação de uma
vogal, tempo de números e relação s/z.
• Avaliação corporal básica: relação corpo e voz.
Para uma avaliação fonoaudiológica vocal clínica com
pleta, são considerados itens essenciais:
o Anamnese completa.
o Análise perceptivo-auditiva da qualidade vocal.
o Medidas fonatórias: tempo máximo de fonação de uma
vogal, tempo de números e relação s/z.
o Avaliação corporal básica: relação corpo e voz.
o Análise acústica da onda sonora.
o Avaliação in loco nas vozes ocupacionais e profissionais.
A avaliação fonoaudiológica contribui para definir a
importância do uso da voz na etiologia ou na manutenção
da disfonia; para oferecer dados para um processo de diag
nóstico diferencial; além de explorar as condições de agen
da, personalidade e motivação do paciente para propor uma
reabilitação vocal.
A avaliação do paciente direciona a conduta de tal for
ma, que pode ser considerada a primeira etapa do próprio
tratamento. Uma avaliação completa e precisa leva a um pla
no de reabilitação específico e direcionado aos sintomas do
paciente. Uma avaliação não-conclusiva exige uma reabilita
ção como prova diagnóstica, o que deve ser realizado por
um curto período de tempo, com duração de no máximo um
mês. Nos casos em que a avaliação é indefinida ou inconclu
siva, pode-se proceder a uma abordagem exploratória, com
nova avaliação após esse período experimental.
ANAMNESE
A avaliação da voz necessita, antes de tudo, como em
qualquer prontuário clínico, de identificação pessoal. Nela
ressaltamos a importância da profissão e da ocorrência de
outra atividade secundária em que se empregue a voz.
A anamnese de um paciente com queixa de disfonia
deve ser a mais específica possível para se definir o quadro
do paciente, mas, ao mesmo tempo, a mais abrangente pos
sível, a partir do momento em que diversas doenças sistémi
cas podem ter o seu primeiro sintoma na fonação, como,
por exemplo, no parkinsonismo.
Propostas de anamneses e protocolos de avaliação vo
cal têm sido atualizadas e apresentadas na literatura moder
na (Menaldi, 1992; Behlau & Pontes, 1995; Sataloff, 1997) e
podem servir como base para o desenvolvimento de proto
colos adaptados a serviços específicos. Alguns desses proto
colos, traduzidos e comentados criticamente pelos profes
sores e alunos do Curso de Especialização em Voz do Centro
de Estudos da Voz (CECEV), estão descritos no item De Boca
em Boca.
A avaliação apresentada nesta unidade é baseada no
protocolo proposto por Behlau & Pontes (1995), modifica
do, atualizado e ampliado. Maiores detalhes sobre os itens
originais, assim como o protocolo desses autores, estão na
publicação referida.
Queixa e Duração
A queixa é o motivo da consulta e representa o sintoma
da disfonia. Ela pode revelar o grau de conscientização do pa
ciente sobre sua alteração, além de expressar sua habilidade
em organizar verbalmente a informação sobre a dificuldade
atual e o tempo de sua evolução. Desta forma, é essencial que
seja abordada a duração da queixa para auxiliar no raciocínio
diagnóstico.
Segundo o Dicionário Aurélio, sintoma vem do grego
symptoma, e quer dizer coincidência, acidente; qualquer fenô
meno ou mudança provocados'no organismo por uma doen
ça, e que, descritos pelo paciente,, auxiliam, em grau maior
ou menor, a estabelecer um diagnóstico.
Os principais sintomas vocais podem ser agrupados em
sete categorias, de acordo com as características da queixa
do paciente, que pode apresentar sintomas de uma ou mais
categorias.
<• Sintomas de alterações na qualidade vocal: para o paciente
tudo é rouquidão ou afonia ("Eu fico bem afônico!"); deve
mos procurar identificar o que mudou na qualidade vocal
habitual do indivíduo. Tais sintomas estão frequentemen
te associados a lesões de massa nas pregas vocais. —
o Sintomas de fadiga e esforço vocais: para muitos pacientes a
alteração vocal não é tão importante, mas o esforço ou o
cansaço associado à produçãoda voz podem modificar
completamente o comportamento vocal; o paciente pode
referir cansaço progressivo, esforço para melhorar a pro
jeção, ou, ainda, piora da voz em determinados períodos.
Estes sintomas estão associados às fendas glóticas ou dis
fonia por tensão muscular.
o Sintomas de presença de ar na voz: o paciente pode referir
ar constante, ar no final das emissões ou ar nos agudos,
quando canta. Nestes casos, geralmente observam-se fen
das glóticas, do tipo triangulares, nos quadros de tensão
muscular, ou fusiformes, nas alterações estruturais míni
mas.
o Sintomas de perda de frequências da extensão vocal: tais sin
tomas de extensão vocal reduzida, tanto na região dos
agudos como na região dos graves, são bastante comuns
entre os profissionais da voz, e podem estar relacionados
a quadros inflamatórios agudos, à presença de edemas, ou
ainda, após uso excessivo de voz, apesar de técnica ade
quada.
o Sintomas dê descontrole na frequência da voz: os pacientes
podem apresentar desvios, tais como quebras, falta de
modulação, modulação excessiva, ou voz trémula. Tais
desvios são frequentemente encontrados em alterações
neurológicas, como na disfonia espasmódica e no tremor
vocal essencial, mas podem ainda indicar distúrbios vocais
emocionais ou problemas na mutação fisiológica da voz.
o Sintomas de descontrole na intensidade vocal: de modo simi
lar ao descontrole na frequência da voz, o paciente pode
apresentar desvios, quebras com perda total de sonoriza-
.çào, ou dificuldade em modular a intensidade vocal. Tais
sintomas geralmente indicam abuso ou fadiga vocal,
porém também são encontrados em distúrbios neurológi
cos, sendo que um descontrole acentuado e com intensi
dade média elevada pode ser observado em distúrbios ce-
rebelares.
o Sintomas de sensações desagradáveis à emissão: queixas
de dor à produção da voz, dor muscular em áreas da cintu
ra escapular ou da face após fala prolongada, sensação de
ardor, queimação ou corpo estranho na laringe podem ser
referidas pelo paciente, de modo isolado ou em combina
ção com quaisquer outras queixas. Tais sintomas geral
mente indicam tensão muscular ou lesões da região pos
terior, particularmente os granulomas por refluxo laringo-
faríngeo.
A seguir são apresentadas algumas queixas reais de
pacientes e comentários ilustrativos sobre os dados conti
dos na informação do paciente, correlacionando-os com
outros elementos da história da disfonia e da evolução do
tratamento.
Queixa ns 1
“Eu sinto que a minha voz está ficando fraca, de uns dois
anos para cá. Não consigo mais gritar com os alunos. No fim de
semana ela melhora, na segunda e na terça ela fica quase boa. Na
quarta-feira começa a piorar e quinta à tarde eu estou pratica-
mente sem voz. Tenho um cansaço enorme e já nem tenho mais
gosto para dar aulas. Vai acabando o gás!"
A paciente do sexo feminino é professora, com 37 anos
de idade, e apresenta uma queixa típica de comportamento
vocal inadequado, com fadiga vocal e perda de potência à
fonação. Nesse caso, encontramos, ao exame laringológico,
uma fenda triangular médio-posterior e início de nódulos
bilaterais de pregas vocais, localizados no ápice do triângu
lo da fenda. O início lento do quadro e os momentos de me
lhora e piora relacionados ao uso da voz são bastante típi
cos das disfonias organofuncionais. A resposta aos exercí
cios foi imediata e positiva, porém foi necessário um traba
lho intensivo de higiene vocal, com a mudança dos hábitos
negativos em sala de aula, onde encontramos muita resis
tência por parte da paciente, lentificando a evolução da rea
bilitação.
Queixa ns 2
1 “A voz é a mesma, não mudou, mas essa coceirinha... esse
anzol que fica me fisgando no fundo da garganta... Eu falo três
palavras e lá vem ele... não dá... fico tossindo... Eu tenho um pro
grama de rádio... Pareço telegrama falado!”
Esse paciente é um locutor e desenvolveu um granulo-
ma de prega vocal, após abuso vocal em cima de um quadro
de laringite aguda, quando animou uma grande festa, por
várias horas sem auxílio de sistema de amplificação sonora.
O paciente apresentava um histórico vocal negativo,
com excelente voz, sem problemas anteriores, apesar da
queixa ser típica nos casos de granuloma de comissura pos
terior. É interessante comentar que as lesões de terço poste
rior de pregas vocais não provocam grandes alterações na
qualidade vocal em si, mas, sim, nas sensações à fonação,
pela concentração de receptores de dor nesta região. 0 gra
nuloma involuiu lentamente, com medicação e fonoterapia,
onde procurou-se suavizar a fonação, eliminar os pigarros e
deslocar a fonação para a região mais anterior da laringe,
evitando-se os ataques bruscos, a voz muito grave e a forte
intensidade. Somente após cinco meses a laringe voltou a
mostrar uma imagem normal.
Fica o comentário de que episódios de abusos vocais
concomitante aos quadros agudos podem causar danos
sérios, mesmo em indivíduos treinados e com antecedentes
vocais negativos.
Queixa n3 3
"Eu gosto da minha voz rouca... Os outros também gostam.
Eu vim aqui por causa da dificuldade de respirar, essa chiadeira.,.
mas não quero operar. Só opero se for grave, imagina se a minha
voz muda!"
A paciente do sexo feminino, fumante, apresentava um
edema de Reinke moderado, o que contribuía para uma qua
lidade vocal de frequência grave, com uma voz disfônica que
era considerada por si mesma e pelos outros positiva, sen
sual, não querendo correr o “risco de perdê-la" com uma ci
rurgia, para eliminar o edema. Neste caso, não era a voz que
a incomodava, mas, sim, a dificuldade respiratória. Foi soli
citado à paciente que parasse de fumar, se submetesse a
uma hidratação intensiva e deu-se início à reabilitação vo
cal. Após três meses, uma nova avaliação laringológica mos
trou apenas uma pequena redução do edema, porém, nos
testes vocais e respiratórios, o desempenho da paciente era
88 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 3 • AVALIAÇÃO DE VOZ 89
muito melhor, sentindo sua voz mais solta e a respiração
menos ofegante. Nem sempre a melhora dos sintomas vocais
é proporcional à melhora laríngea, sendo importante consi
derar as duas dimensões para analisar a evolução de trata
mento. A opinião do paciente sobre sua voz deve ser sem
pre considerada.
Queixa ns 4
“Essa não é a minha voz... Depois da cirurgia (úlcera estoma-
2 cai) eu acordei com essa voz de desenho animado... Pareço o Bar
ney (dos Flintstones)... É terrível, eu quero a minha voz de volta
senão vou criar outra úlcera!"
O paciente, do sexo masculino, apresentava uma parali
sia unilateral de prega vocal, pós-intubação, devida à cirur
gia gástrica, com uma voz rouco-soprosa e bitonal, o que o
fez associar sua emissão com a do personagem do desenho
' animado. A disfonia orgânica, de início súbito, causava enor
me irritação ao paciente, que exigia sua voz de volta, não se
identificando com a voz produzida. A reabilitação vocal teve
início imediato, embora houvesse a possibilidade de uma
recuperação da movimentação da prega vocal paralisada, o
que, porém, não ocorreu. Inicialmente, procurou-se um
ajuste motor que produzisse uma voz menos disfônica, com
a redução do fluxo aéreo transglótico, enquanto se trabalha
va com exercícios de esforço e de mudança de postura de
cabeça para promover uma compensação glótica. No final
de quatro semanas, o paciente recebeu alta, com uma voz
socialmente adequada e suficiente para o desenvolvimento
de sua atividade profissional.
Queixa n3 5
“Com a voz eu estou acostumada, é rouca desde pequena,
igual à da minha mãe. A força pra falar é que incomoda, dói tudo,
aperta o pescoço e o peito, piora nos dias em que eu trabalho com
as mães. Eu queria tanto abrir a boca e falar fácil, mas agora
falar parece um sacrificio. Fico esgotada!"
A paciente, do sexo feminino, é dona-de-casa e no últi
mo ano envolveu-se numa atividade voluntária assistencial,
quando começou a usar mais intensamente a voz e desenvolver vários sintomas de desequilíbrio muscular relaciona
dos ao uso da voz. Na verdade, essa paciente apresenta uma
disfonia que se manifesta desde a infância, devido à presen
ça de um sulco vocal bilateral, uma alteração estrutural con
génita nas pregas vocais, e que é responsável pela voz rouca
desde pequena, sendo também o mesmo quadro de sua
mãe.
A alteração na qualidade vocal não incomoda a pacien
te, pois é assim que ela se conheceu e aprendeu a se identifi
car, mas a síndrome de hipertonicidade que está se desen
volvendo e que não a deixa falar fácil é sua principal dificul
dade. Para muitos pacientes, não é a alteração vocal em si,
mas o esforço à fonação a principal queixa.
O trabalho para uma melhor coaptação laríngea, a fim
de reduzir a fenda fusiforme decorrente do sulco vocal, foi
suficiente para diminuir o esforço paralaríngeo e os sinais e
sintomas de síndrome de hipertonicidade compensatória. A
voz continuou praticamente a mesma, mas sem esforço, e a
paciente ficou satisfeita com a evolução de seu tratamento.
Queixa n3 6
“A nota quebra, penso uma coisa e sai outra, acordo de ma
nhã — a voz pesada ■— e eu já sei... Vai ser um inferno. Levo uma
hora e meia para aquecer a voz e ela dura 15 minutos!"
A paciente é uma cantora lírica, sem disfonia aparente
na avaliação realizada, que nos últimos dois anos refere-se
muito insegura com sua voz, pois faz aulas com dois dife
rentes professores de técnica vocal, sendo que cada um
deles tem uma opinião diferente sobre a classificação vocal
da cantora. A laringe apresenta-se normal ao exame laringo-
lógico; por outro lado, a paciente mostrava-se extremamen
te aflita com a possibilidade de perder sua voz. Além disso,
expressava estar muito dividida entre as opiniões dos dois
professores. Evidentemente, é preciso auxiliá-la a decidir
por um único professor de canto e verificar quais suas verda
deiras dificuldades vocais num exame mais detalhado. Uma
quebra de nota pode não significar nada para uma professo
ra, mas pode comprometer seriamente o desempenho pro
fissional de uma cantora erudita.
Queixa n3 7
“Porfavor, não diga que a minha voz é ótima, obrigado, mas
não serve... Já ouvi isso antes, mas minha voz não está ótima, eu
não posso fazer o que eu fazia! Sou locutor, estou limitado, nin
guém percebe, mas eu tenho que fcar mascarando. Não me diz
que minha voz é normal!”
O paciente, um locutor de 45 anos, apresentava uma
disfonia que conseguia mascarar com técnica vocal e expe
riência profissional, porém sentia que estava limitado e que
ria resolver o problema. Sua queixa deixava claro o medo de
seu problema não ser valorizado. A avaliação vocal, nos tes
tes vocais de rotina, era essencialmente normal, porém o
paciente não apresentava o mesmo rendimento em tarefas
fonatórias selecionadas, tais como leitura em velocidade
elevada. A comparação de sua qualidade vocal atual com
uma fita de comerciais antigos, gravados pelo paciente,
também evidenciava mudanças em determinados parâme
tros vocais. O exame laringológico mostrava hiperemia, dis
creto edema e sinais de uma laringite crónica por abuso vo
cal. A evolução da terapia foi excelente e rápida, devido à
forte motivação e colaboração do paciente.
Queixa n3 8
“Eu não acho nada... Minha mãe é que acha, pergunta pra
ela por que é que eu estou aqui!"
O comentário transcrito foi feito por um adolescente de
15 anos, com um sério comprometimento vocal psicogêni-
co, um quadro de disfonia com uso divergente de registros,
em resposta à pergunta da avaliadora sobre os motivos que
o traziam ao consultório. O paciente não identificava o pro
blema vocal apresentado como importante e, na verdade,
veio à consulta por preocupação de sua mãe. O exame larin-
gológico apresentou estruturas laríngeas normais, com uso
de dois registros vocais alternados, de acordo com a emis
são. O paciente recusou-se a fazer a terapia, por não achar
necessário.
Queixa n3 9
“A minha voz começou a ficar estranha há dois meses, foi
ficando Jraca e eu comecei a falar enrolado, como se tivesse bebido
um pouco. Às vezes, o som sai pelo nariz. Se eu bebo água rápido
demais, eu engasgo."
A paciente tinha 56 anos quando percebeu os primeiros
sintomas de voz. É interessante notar que a alteração de voz
começou associada a uma alteração de fala, com imprecisão
articulatória, distúrbio de fluência e ressonância nasal. Para
completar o quadro, os engasgos à deglutição direcionam a
hipótese diagnóstica para um quadro de distúrbio da comu
nicação na área neurológica. Neste caso, a paciente foi diag
nosticada pelo neurologista como portadora de esclerose
lateral amiotrófica, uma doença progressiva degenerativa e
de prognóstico reservado. A terapia fonoaudiológica teve
como objetivo maximizar o uso da comunicação disponível
e auxiliar a paciente a lidar com os sintomas progressivos da
disfagia.
Queixa n3 10
“Eu estou rouco há seis meses e a voz vem piorando. Acho que
foi depois de uma gripe muito forte. No começo, se eu descansava
um pouco ela melhorava. Agora parece que está sempre ruim e
cada vez pior. Fumo e tenho muito pigarro. ”
O paciente é um executivo de 58 anos de idade, fuman
te de dois maços ao dia, consumidor diário de álcool e com
grande uso de voz em seu trabalho. Sua disfonia, auditiva
mente semelhante a uma rouquidão por edema de pregas
vocais, na verdade indicava presença de um tumor de larin
ge que, pelo diagnóstico precoce, pôde ser removido atra
vés de uma laringectomia parcial, o que ofereceu condições
de reabilitação vocal por via laríngea. É essencial que tenha
mos em mente o fato de que o câncer de laringe pode ter
como sua primeira manifestação uma rouquidão como qual
quer outra e, portanto, sinais de alteração vocal devem ser
sempre adequadamente avaliados, ainda mais em pacientes
do sexo masculino, fumante e na faixa etária de 45 a 65
anos. O exame otorrinolaringológico é imperativo e definirá
a conduta. Na fonoterapia, foram trabalhadas as estruturas
remanescentes para melhorar a função fonatória e as outras
funções da laringe, desenvolvendo-se mecanismos compen
satórios.
Após a definição da queixa, é importante que o clínico
comece a investigar os sinais relacionados, que represen
tam a manifestação da queixa, ou seja, a evidência objetiva
do estado, observável e mensurável. Na avaliação do sinto
ma da disfonia podemos identificar sinais perceptuais (qua
lidade vocal, pitch, loudness, sinais não-verbais e dinâmica
respiratória), sinais acústicos (análise da onda sonora e da
área de contato entre as pregas vocais) e fisiológicos (larin-
goscópicos, vibratórios e aerodinâmicos), que serão descri
tos ao longo deste Capítulo. Cooper (1973) oferece uma
classificação dos sinais vocais negativos em três grandes
categorias: sinais sensoriais, auditivos e visuais. Os sinais
sensoriais são aqueles sentidos pelo próprio falante. Os sin
tomas auditivos são aqueles percebidos pelo próprio indiví
duo ou terceiros, a partir da qualidade ouvida da voz. Os
sinais visuais são aqueles notados durante o exame de larin
ge. Telles (1997), em sua tese de mestrado, avaliou a inci
dência e a evolução de diferentes sintomas vocais, classifica
dos em três categorias: auditivos, em função do uso da voz e
sensoriais. A autora verificou a ocorrência desses sintomas
em três diferentes momentos — antes, durante e no final da
réabilitação vocal em grupo e concluiu que os sintomas au
ditivos, além de serem os de maior incidência, respondem
mais favoravelmente à reabilitação.
História Pregressa da Disfonia
A história do distúrbio de voz procura coletar uma série
de fatos, desde como ocorreu a instalação da alteração até a
impressão de outras pessoas sobre a voz do paciente.
A origem do encaminhamento pode oferecer informa
ções interessantes, revelando se a procura do atendimento
foi feita por necessidade pessoal, por sugestão de algum
amigo, por obediência à orientação de outro especialista ou
solicitaçãode um familiar. A instalação da alteração é geral-
mente lenta nos casos de uso inadequado, abrupta nos ca
sos de nítido envolvimento psicológico de conversão somá
tica de sintomas funcionais, e muito gradual nos quadros
neurológicos progressivos.
Nos quadros funcionais, a principal característica do iní
cio da alteração diz respeito à flutuação dos sintomas vocais,
com períodos alternados de melhora e piora da voz, geral
mente relacionados ao comportamento vocal. Assim, a voz
melhora após descanso e nos fins-de-semana, quando o uso é
mais restrito e sob menos estresse. A voz costuma também
piorar no final da tarde e passa a requerer maior esforço mus
cular para manter a fonação, o que a musculatura em fadiga
não consegue fazer; poderá ocorrer edema como reação ao
esforço e aos mecanismos compensatórios. Nessa situação,
na manhã seguinte, a voz poderá estar bastante comprometi
da, principalmente pela restrição do movimento da túnica
mucosa.
Alguns pacientes mencionam essa fase inicial de varia
ção na voz, mas no momento em que procuram um espècia-
lista, as alterações já estão fixadas e a voz apresenta-se sem
pre ruim, o que reflete um quadro mais antigo, com padrões
alterados mais rígidos, e indica um provável tempo de reabi
litação mais longo.
A influência das emoções na voz ocorre em todos os
falantes, mas torna-se, de certa forma, exacerbada no paci
ente disfônico, pois a alteração vocal ou expressa uma difi
culdade de interrelacionamento, ou acaba por gerar uma
comunicação insatisfatória.
90 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 3 • AVALIAÇÃO DE VOZ 91
Na maioria das vezes, o paciente não sabe descrever
exatamente em que a voz mudou. Ele é capaz de dizer que
sua voz não era “desse jeito”, mas dificilmente nos informa
com precisão como ela era antes, a não ser que se trate de
um cantor com treinamento vocal formal e que tenha desen
volvido uma percepção auditiva quanto à sua emissão.
Embora sejamos influenciados e influenciemos constan
temente os outros através da voz, em geral não temos cons
ciência desse processo e das reações que a voz provoca nos
outros, a não ser que tenhamos recebido comentários especí-
‘ficos a esse respeito.
A impressão do paciente sobre sua própria voz reflete
não somente o grau de consciência sobre a emissão, mas
também a auto-imagem e as fantasias sobre seus recursos
vocais. A referência da impressão dos outros sobre sua voz
pode expressar o grau de preocupação com a opinião alheia
e como as experiências negativas em relação à sua emissão
podem ter afetado a maneira de se comunicar.
; Ainda na história pregressa da disfonia é importante
solicitar ao paciente que avalie o impacto da alteração vocal
em sua vida particular, profissional e social.
Para tal avaliação, sugerimos que se utilize uma escala
de 0 a 10, onde zero significa nenhum impacto e 10 repre
senta impacto máximo, obrigando o paciente à mudança de
hábitos de fala, chegando a impedir a comunicação ou o
desenvolvimento de sua atividade profissional. De modo
surpreendente, por vezes a avaliação do clínico — que tem
como sistema básico de referência a qualidade vocal — não
é a mesma do paciente. Geralmente, uma voz auditivamente
pouco alterada, porém, com muito esforço à produção,
recebe uma avaliação de impacto maior do que uma voz
mais alterada, contudo sem esforço associado.
Hábitos Inadequados
A investigação dos hábitos inadequados deve se con
centrar em dois grupos de fatores: os de natureza externa,
tais como tabagismo, etilismo, uso de ar-condicionado, e os
do próprio comportamento vocal, ou seja, o fonotrauma
devido ao abuso ou mau uso vocal.
É mais comum que os pacientes com tendência a desen
volverem hábitos vocais inadequados utilizem de diferentes
práticas abusivas e não só uma. Assim, geralmente, quem
grita demais também fala demais, em frequência inadequa
da e com velocidade elevada. A somatória de diferentes atos
de abuso ou mau uso tem um peso grande na redução da
resistência vocal. O grau de resposta e de influência desses
fatores sobre a voz é bastante individual e deve ser pesqui
sado. Nem sempre o paciente consegue fazer uma conexão
direta entre hábito inadequado e alteração na voz no
momento da avaliação. Indicam-se as situações prováveis de
influência na voz e pede-se que o paciente observe sua voz e
traga posteriormente essa informação.
Investigação Complementar
Na investigação complementar procura-se levantar uma
série de alterações que podem ter influenciado o estabeleci
mento do quadro, e que podem estar contribuindo para a
manutenção ou para a recorrência das crises disfônicas. As
principais alterações dizem respeito aos distúrbios alérgi
cos, faríngicos, bucais, nasais, otológicos, pulmonares, digestivos,
hormonais e neurovegetativos.
o Distúrbios alérgicos: em nossa casuística, os distúrbios
alérgicos constituem a causa mais frequente do prolonga
mento de tempo de terapia, com maior influência nas cri
anças. É aconselhável investigar a ocorrência de rinite,
caracterizada por coriza e espirros frequentes; obstrução
nasal; resfriados constantes; secreção nasal aquosa inten
sa; intolerância excessiva ao frio, ao calor, às mudanças de
temperatura; reações a perfumes, cosméticos, flores e
produtos químicos; urticárias; eczemas; alergias alimenta
res e outros. Além do dado de alergia em si, é importante
perguntar-se a voz piora na ocorrência de alguma dessas
manifestações. Alguns pacientes referem o início de sua
disfonia em decorrência de abuso vocal em cima de um
quadro alérgico ou gripal.
o Distúrbios faríngeos: os distúrbios faríngeos, geralmente
expressos como dores de garganta, faringites e amigdali
tes, podem ser de Origem inflamatória ou infecciosa, mas
também decorrentes de um ajuste motor hipertônico com
sobrecarga da faringe, gerando irritação e sintomas asso
ciados nessa região.
o Distúrbios bucais: os distúrbios bucais, como aftas e esto-
matites frequentes, interferem na ressonância e na articu
lação dos sons da fala na cavidade bucal; além disso, pro
blemas oclusais-ortodônticos, cáries frequentes e falhas
dentárias obrigam a uma adaptação, sobretudo da muscu
latura lingual, o que refletirá no funcionamento da laringe.
o Distúrbios nasais: os distúrbios nasais como rinite, sinusite
e desvios de septo, além de alterarem a ressonância,
podem modificar o padrão vibratório da laringe, induzin
do a uma contração na produção do som.
o Distúrbios otológicos: os distúrbios otológicos, como oti
tes, zumbidos, tonturas e especificamente alterações da
tuba faringotimpânica, prejudicam a monitorização da
própria voz e provocam ajustes musculares inadequados.
o Distúrbios pulmonares: os distúrbios pulmonares, como
bronquite, asma e todas as formas de"dispnéia, modificam
a corrente aérea e desequilibram a relação básica entre as
forças aerodinâmicas e mioelásticas da laringe. As queixas
de origem psicológica, como a de que o ar não chega ao
fundo dos pulmões, são também relevantes.
o Distúrbios do aparelho digestivo: os distúrbios do aparelho
digestivo, como dificuldade e dor à deglutição, engasgo,
acidez, refluxo gastresofágico, gastrite, digestão lenta e
prisão de ventre, entre outros, prejudicam o processo de
fonação através de formas diversas, como ao impedir o
livre movimento do diafragma, aspiração de secreções e
alterações secretórias e vasomotoras por estímulo vagai.
Na última década, uma maior atenção tem sido dada ao
refluxo laringofaríngeo, posto que se acredita que sua pre
sença é altamente irritante aos tecidos da laringe, provo
cando lesões de região posterior, irregularidades de
mucosa, lesões de massa e até mesmo favorecendo a ins
talação do carcinoma de laringe.
o Distúrbios hormonais: os distúrbios hormonais têm grande
influência sobre a laringe, particularmente sobre a fre
quência fundamental, embora os mecanismos de atuação
hormonal na voz ainda não estejam suficientemente
esclarecidos. Convém investigar se o paciente apresentaalguma afecção endócrina, como alteração no crescimen
to, puberdade precoce ou tardia, e, nas mulheres, altera
ções relacionadas aos ciclos menstruais, pílulas anticon-
cepcionais e gravidez. Em média, 50% das mulheres obser
vam alterações da voz no período menstrual ou nos dias
imediatamente antecedentes, referindo fadiga vocal,
redução no volume da voz, maior esforço para falar, emis
são mais abafada e perda de agudos. Finalmente, dados de
alteração do apetite, da sede, do volume urinário e do pe
so devem ser levados em consideração.
o Distúrbios neurovegetativos: os distúrbios neurovegetati
vos, como mãos frias, sudorese intensa, alterações gas
trintestinais, tendências a crises de palidez ou de conges
tão facial, taquicardia, bradicardia e outros, podem indi
car labilidade emocional do paciente e interferência
excessiva das emoções na voz.
Antecedentes Pessoais e Familiares
O item referente aos antecedentes pessoais visa a obter
informações sobre cirurgias ou estados mórbidos ocorridos
anteriormente e ainda não investigados. É importante que
sejam explorados tanto os aspectos diretamente relaciona
dos à queixa do paciente como outras alterações, doenças
ou cirurgias que, apesar de parecerem remotamente associ
adas, podem ter funcionado como aspectos desencadean-
tes ou de favorecimento à instalação do problema.
A pesquisa dos antecedentes familiares é muito impor
tante, pois pode evidenciar quadros familiares de inadapta
ção fónica, alterações estruturais mínimas (como o sulco
vocal), ou malformações congénitas que fazem com que os
membros de uma mesma família tenham uma qualidade vo
cal semelhante. Certas dinâmicas emocionais familiares
também podem contribuir para um padrão de comunicação
inadequado e comum a vários membros, contribuindo no
estabelecimento e na manutenção de disfonias.
Quadros de outros distúrbios da comunicação na famí
lia também devem ser pesquisados.
Tratamentos Anteriores
Devem ainda ser investigados a existência e quais os re
sultados obtidos em tratamentos já efetuados para a disfo
nia, sejam eles medicamentosos, fonoaudiológicos, cirúrgi
cos ou psicológicos.
Especificamente quanto aos tratamentos fonoaudiológi
cos, algumas facetas da manifestação atual podem ser mais
bem esclarecidas pela linha de trabalho a que o paciente foi
submetido, pelo tempo de terapia, pela participação e moti
vação do paciente e, particularmente, pelos resultados obti
dos. Uma série de outros tratamentos pode ser mencionada
pelos pacientes, como acupuntura, massagem, hemoterapia,
biofeedback, terapias energéticas, herboterapia etc.
AVALIAÇÃO CLÍNICA DO COMPORTAMENTO
VOCAL
A avaliação do comportamento vocal tem como objeti
vo básico oferecer um diagnóstico da função vocal e identifi
car os candidatos à disfonia. Este procedimento envolve
três amplos aspectos:
1. A avaliação dos parâmetros vocais: tipo de voz, sistema
de ressonância, frequência, intensidade, medidas fona-
tórias e coordenação pneumofonoarticulatória, entre
, outros; considerando-se o tipo e a magnitude do desvio.
2. 4 A descrição dos ajustes de trato vocal e do corpo em
pregados na produção da voz: alinhamento vertebral,
posição do tórax e da cabeça, posição da laringe no pes
coço, participação do vestíbulo laríngeo na produção
da voz, grau de abertura de boca e zonas específicas de
hipertonia muscular.
3. A identificação dos comportamentos vocais negativos
em situações externas à da avaliação clínica, com a des
crição do perfil de comunicação do indivíduo, que inclui
a descrição de hábitos vocais; o emprego de diferentes
tipos de vozes e a identificação das habilidades gerais
de comunicação.
Faz parte também da avaliação do paciente o prognósti
co sobre a eficácia da terapia. Neste sentido, a exploração
do campo vocal dinâmico tem-se mostrado um dos recursos
mais úteis para prognosticar a evolução da reabilitação
vocal. Alterações na qualidade vocal obtidas durante a pró
pria sessão de avaliação, através do auxílio de uma série de
manobras induzidas pelo examinador, são sinais indicativos
de uma flexibilidade vocal positiva para a eficácia da reabili
tação. Tais mudanças podem ser obtidas por modificação de
diversos parâmetros vocais, por manipulação direta das
estruturas do trato vocal, ou ainda através de mudanças na
posição do corpo e da cabeça.
Na avaliação do comportamento vocal, várias estraté
gias alternativas podem ser utilizadas, o que foge ao objeti
vo da presente unidade, mas é explorado com detalhes em
outras publicações (Boone & Mcfarlane, 1988; Behlau & Pon
tes, 1995; Colton & Casper, 1996). Apesar disto, gostaría
mos de comentar alguns aspectos dos principais dados do
comportamento vocal, no sentido de compreender melhor
a função vocal avaliada. São eles: qualidade vocal, sistema
de ressonância, medidas fonatórias, coordenação pneumo
fonoarticulatória, avaliação corporal e psicodinâmica vocal.
Qualidade Vocal
Qualidade vocal é o termo atualmente empregado para
designar o conjunto de características que identificam uma
voz; era anteriormente referida como o timbre, mas o uso
deste vocábulo está se restringindo aos instrumentos musi
cais. A qualidade vocal é nossa avaliação perceptiva princi
pal e relaciona-se à impressão total criada por uma voz, e,
embora a qualidade vocal varie de acordo com o contexto
92 VOZ: O LIVRO DO ESPECIALISTA 3 • AVALIAÇÃO DE VOZ 93
de fala e as condições físicas e psicológicas do indivíduo, há
sempre um padrão básico de emissão que o identifica. Esse
padrão básico é, na verdade, o índice mais completo dos
atributos da emissão de um indivíduo, sendo capaz de nos
fornecer desde informações sobre suas características físi
cas a dados de sua formação educacional.
Na avaliação vocal, diversos níveis de leitura podem ser
empregados, sendo consideradas como as principais dimen
sões: a biológica, a psicológica e a socioeducacional (Behlau
& Ziemer, 1988).
As informações da dimensão biológica dizem respeito
às características anatômicas e fisiológicas do indivíduo,
como sexo, idade, saúde geral, estrutura física geral e espe
cífica dos órgãos que compõem o aparelho fonador. Fazem
parte da dimensão biológica não somente os dados de con
formação estrutural de cada um dos órgãos envolvidos, mas
também a sincronia do funcionamento dos componentes da
laringe entre si, entre a laringe e as caixas de ressonância e
entre o aparelho fonador e todo o corpo.
A dimensão psicológica fornece-nos informações sobre
as características básicas de personalidade de um indivíduo
e sobre seu estado emocional no momento da emissão.
Embora ainda existam controvérsias sobre a confiabilidade
da correlação entre os dados obtidos pela análise da dimen
são psicológica e uma determinada qualidade vocal ou op
ção de parâmetro vocal, é irrefutável o argumento de que
ocorrem variações vocais nos diferentes estados emocio
nais. A influência da emoção na voz é absolutamente trivial,
embora extremamente complexa. A maneira como um indi
víduo usa sua voz reflete sua psicodinâmica.
Quanto à dimensão socioeducacional, devemos lem
brar que os valores que se adquirem em uma determinada
cultura são amplamente transferidos aos membros da co
munidade, de maneira não-explícita, através de um proces
so de aceitação e consequente imitação e incorporação de
determinados parâmetros de atuação. Os parâmetros relaci
onados à qualidade vocal também obedecem a essa regra,
expressando-se através do sotaque, dos regionalismos, da
seleção de certos modelos vocais como bons/positivos e de
outros como ruins/negativos, e mesmo a seleção de qualida
des vocais inteiras que identificam grupos de indivíduos ou
profissões (como voz de locutor, de padre, de policial, de
professora etc.). A incorporação de padrões sociais e educa
cionais ocorre através de um processo de mimetismo cultu
ral, onde consciente ou inconscientemente o indivíduo
identifica-se ou tenta se identificar com um determinado
grupo, adotandoo padrão de emissão que o caracteriza.
Da complexidade das interferências envolvidas, depre
ende-se que a qualidade vocal normal é um conceito pouco
resistente a discussões científicas, pois, acima de tudo, é
dependente de fatores culturais, linguísticos e históricos,
fator que contribuiu para que os comités de padronização
de terminologia e definições tivessem suas tentativas fra
cassadas ao longo de várias décadas (Sonninen & Hurme,
1992).
Desta forma, quando avaliamos a qualidade vocal, referi
mo-nos ao processo de identificação do tipo de voz emprega
do por aquele indivíduo, e não à seleção de um termo para
designar a voz disfônica, o que significa que a avaliação da
qualidade vocal precede a conclusão da existência ou não de
uma disfonia. Tal conclusão é uma decisão multifatorial, que
vai além da nomeação do tipo de voz. Por exemplo, um indiví
duo que apresenta um tipo de voz fluido em sua conversação
habitual pode tanto ser portador de um discreto edema de
Reinke e, portanto, disfônico, como não apresentar nenhuma
alteração, e esta qualidade vocal representar apenas um tipo
de voz com um correlato psicológico que diz respeito às suas
opções individuais. Devemos ainda considerar que a decisão
final sobre a qualidade vocal baseia-se fortemente no julga
mento do ouvinte, que, em sendo um fonoaudiólogo ou mé
dico, deverá melhorar suas habilidades inatas de leitura de
parâmetros vocais fisiológicos e psicológicos, através de um
treinamento auditivo constante, metódico e profundo.
Além da qualidade vocal propriamente dita, devem tam
bém ser identificados possíveis sinais não-verbais presentes
na emissão do paciente, tais como pigarro constante; estri
dor e ruídos laríngeos; cliques no trato vocal; tremor à respi
ração, entre outros, que podem auxiliar no diagnóstico do
paciente, assim como representar impacto social muito
negativo, prejudicando a comunicação oral como um todo.
Tipos de voz
O padrão básico de emissão de um indivíduo define o
chamado tipo de voz e está relacionado com a seleção de
ajustes motores empregados, tanto em nível de pregas vo- r
cais e laringe, quanto em nível do sistema de ressonância, o
que diz respeito principalmente à dimensão biológica da
voz. Porém, além dos dados relativos às escolhas anatômi
cas e mecânicas, o tipo de voz carrega elementos das outras
duas dimensões, psicológica e socioeducacional. Como co
mentamos ao introduzir o conceito de qualidade vocal, tipo
de voz não é sinónimo de voz disfônica.
O tipo de voz nunca deve ser analisado isoladamente,
sem que se leve em consideração uma série de fatores relati
vos ao falante, os quais se resumem a dois grandes grupos:
intrínsecos — como fatores hereditários, constitucionais,
de saúde geral e de natureza psicológica; e extrínsecos —
dependentes principalmente do ambiente e do nível socioe-
conômico-cultural do falante, onde também estão incluídos
elementos de modismo. Desta maneira é possível entender
que, sob certos ângulos, a disfonia é um conceito negociá
vel e, por exemplo, uma voz considerada normal na Itália
pode ser avaliada como alterada na Inglaterra e, da mesma
forma, o canto tradicional japonês pode ser definido como
hipertenso para os padrões do canto ocidental.
A terminologia nessa área é bastante imprecisa e confu
sa, tanto pelas inúmeras classificações de cada estudioso,
como pelo fato de utilizarmos palavras referentes a sensa
ções de outros órgãos dos sentidos para descrever nossas
impressões vocais. Por exemplo, dizemos que uma voz é cla
ra, brilhante, escura ou opaca, e esses são atributos visuais;
dizemos que uma voz é áspera e rude, e esses, por sua vez,
são atributos táteis, e assim por diante.
Laver (1981) faz uma revisão histórica muito interessan
te sobre o conceito de qualidade vocal, afirmando que nos
sos antecessores eram muito mais sábios do que pensamos.
O autor comenta que, embora a classificação impressionísti-
ca sempre tenha existido, desde os gregos antigos, uma
classificação explícita, com base fonética, de diferentes qua
lidades e do chamado tom de voz começa no século XIX,
com o início do aparecimento dos primeiros esquemas
fonéticos para descrevê-la.
Na clínica diária, a classificação impressionística é ainda
predominante, sendo que alguns tipos de voz aparecem
com maior frequência. São eles (Behlau & Pontes, 1995): voz
rouca, áspera, soprosa, sussurrada, fluida, gutural, compri
mida, tensa-estrangulada, bitonal, diplofônica, polifônica,
monótona, trémula, pastosa, branca, crepitante, infantiliza-
da, feminilizada, virilizada, presbifônica, hipernasal, hipo-
nasal e com nasalidade mista.
o Voz rouca: a voz rouca é a mais comum manifestação de
alteração vocal. É uma qualidade vocal do tipo ruidosa, o
que contrasta com a suavidade e a sensação de harmonia
da voz normal e indica irregularidade de vibração das pre
gas vocais. Nesse tipo de voz, a frequência e a intensidade
estão freqiientemente diminuídas e existem ruídos que
independem dos movimentos ondulatórios normais da
túnica mucosa das pregas vocais. Nos casos em que a alte
ração vocal produz gratificações ao paciente, ou ainda
quando esta apresenta um tênue contato com suas sensa
ções interiores, a voz rouca pode se apresentar com forte
intensidade. A qualidade vocal rouca é, na verdade, uma
qualidade mista, que contém elementos de soprosidade e
aspereza e, em certos casos, ou em certos períodos de
evolução da disfonia, um deles pode predominar. Esse
tipo de voz geralmente está relacionado a lesões orgâni
cas e quadros organofuncionais, em particular represen
tando uma situação onde a vibração das pregas vocais é
alterada, como vasodilatação, edema ou presença de mas
sa de característica flácida, como nódulos edematosos ou
pólipos, podendo também aparecer em neoplasias. É a
voz típica das gripes.
o Voz áspera: na voz áspera o que mais chama a atenção é a
característica rude, desagradável e até mesmo irritante da
emissão. Nota-se esforço do indivíduo ao falar, e os ata
ques vocais são predominantemente bruscos. É a popular
mente conhecida “voz de taquara rachada”. É comum
ouvirmos dois focos de ressonância simultâneos: uma res
sonância laringofaríngica básica e intensa, e uma resso
nância nasal compensatória ao esforço laríngeo, que re
presenta uma tentativa de melhorar a projeção vocal. É a
voz típica das situações de rigidez de mucosa das pregas
vocais, como nas leucoplasias ou nas retrações cicatriciais
pós-cirúrgicas, ou ainda de alterações congénitas na ar
quitetura histológica das pregas vocais, com pouca muco
sa à vibração, como nas alterações estruturais mínimas,
particularmente no sulco vocal. Por essa situação de rigi
dez, a frequência fundamental é aguda, um dos sinais típi
cos dessa qualidade vocal. Além disso, encontra-se comu-
mente associado um acentuado esforço muscular na
região da cintura escapular, que reduz ainda mais as possi
bilidades de ressonância, sendo a voz pobre em harmóni
cos e rica em ruído. Há variações como áspera estridente e
áspera gutural. Em alguns textos, voz áspera é usada
como sinónimo de voz soprosa, mas na verdade são duas
entidades distintas.
o Voz soprosa: na qualidade vocal soprosa ouvimos a voz
acompanhada de ar não-sonorizado pelas pregas vocais;
assim, temos a presença audível de um ruído à fonação,
que é o fluxo contínuo de ar através da glote. A voz sopro
sa típica é de intensidade baixa e frequência grave; porém,
por um esforço de compensação para tentar reduzir o es
cape de ar, podemos encontrar essa qualidade vocal com
intensidade forte. O exame otorrinolaringológico mostra
uma coaptação deficiente das pregas vocais. Esta qualida
de vocal está relacionada às disfonias hipocinéticas, aos
quadros de fadiga vocal, a certas inadaptações fónicas ou
ainda a casos neurológicos de paralisia de prega vocal,
miasteniagravis ou parkinsonismo. Vozes soprosas podem
também aparecer como padrão de sensualidade, o que é
amplamente utilizado