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UNINASSAU ARAPIRACA
CURSO DE PSICOLOGIA
1º PERÍODO – NOTURNO
PROFESSOR: CÍCERO JOSÉ BARBOSA DA FONSECA
DISCIPLINA: TEORIAS E SISTEMAS PSICOLÓGICOS
ACADÊMICAS: ALINE BEATRIZ SILVA NUNES SANTOS
ANA KARINA LÚCIO DE MAGALHÃES SILVA 
DEBORA RAIMUNDO MILENO
INTERPRETAÇÃO DO LIVRO “A FÁBRICA DE INTERIORES – A FORMAÇÃO PSI EM QUESTÃO” 
Na introdução dessa obra, o autor afirma que a realidade diária exposta nos noticiários é ocultada na formação do psicólogo, o que cria uma forte relação de contradição nas experiências profissionais deles, que inundados pelo capitalismo e seu ideal liberalista, passam a tratar as problemáticas de forma idealizada, por meio de uma visão romantizada da realidade. Nesse viés, ao fazer uma analogia com a figura do “homem-estojo” como aquele ser que gosta da zona de conforto e foge ao máximo dos conflitos, ele defende que o indivíduo só mudará sua visão quando deixar de observar o mundo com essa visão. A partir da mudança de mentalidade, surgirá a possibilidade de alienação e transformação
 Ao fazer a comparação do processo de formação do psicólogo com o funcionamento de uma fábrica, entende-se que, assim como a fábrica, ele deve produzir algo como resultado final. Dessa maneira, os estudantes devem começar a aflorar o lado crítico e tornarem-se seres pensantes e questionadores, ao pararem de aceitar a forma de pensar que já é imposta pela sociedade e tornarem-se abertos ao mundo, como os “atiradores de pedra” citados pelo autor.
No primeiro tópico, ele traz a história da Estátua e o Balanço. Uma estagiária inicia seu relato falando da supervisão de psicoterapia e comparando-a com uma aula de escultura, a qual ela era apenas uma mera espectadora, sem nenhuma chance de expor suas dúvidas e opiniões e sentindo-se excluída da construção do saber. Para o autor, ela era alguém que não tinha amarras, pois falava com propriedade, sem arrodeios e com tons de ironia e indignação. Logo, recusou-se a interpretar a subjetividade de suas imagens, para não reproduzir o paradigma da aula de escultura, no qual o indivíduo não tem a oportunidade de ser crítico e fica engessado em apenas observar o processo, aprender a técnica e reproduzí-la. Em meio a vários questionamentos e observações ao seu redor, o autor ainda não está satisfeito com a afirmação de que o estagiário é excluído da formação do saber, e procura de maneira insaciável compreender o motivo disso. Enquanto a mulher falava, ele se recordou de um filme que havia assistido, chamado “Museu de Cera”, no qual compara as estátuas a “mortos-vivos”, o que representa a característica do sujeito que vive no mundo moderno, aquele que segue a relação sujeito-objeto e passa a fugir dos conflitos, pois eles os desestabilizam.
“A crença que defende a justaposição da subjetividade ao trabalho intelectual é preterida na metodologia deste estudo. Um texto acadêmico sonhado à noite, misturado aos pesadelos ou prazeres, pode oferecer uma intrigante síntese com parceria e cumplicidade. O texto e o sonho ganham forma e cheiro. As justaposições são, na maioria das vezes, amorfas e insípidas, violentas e tediosas, e resultam sempre em ansiosos monólogos.” Nesse trecho, é evidenciada a ideia de que fazer o uso da subjetividade não é interessante, visto que ela deixa tudo insosso, sem a emoção acalorada do conflito, sem instigar o debate. Assim, ao fazer uso dessa visão, o indivíduo permanece fechado para o mundo.
 Mais adiante, ao citar um pensamento do geógrafo Milton Santos, que afirma que “Se a geografia deseja interpretar o espaço humano como o fato histórico que ele é, somente a história da sociedade mundial, aliada à da sociedade local, pode servir como fundamento à compreensão da realidade espacial e permitir sua transformação a serviço do homem. Pois a História não se escreve fora do espaço e não há sociedade a-espacial.”, o autor interpreta-o como uma nova pista, pois enxergar coisas abstratas como concretas impossibilitam a entrada da história. Esse modo de enxergar, denominado “cristalização”, tira o direito da ação humana de intervir, tornando-a apenas observadora, sem o papel de destaque e protagonismo. 
O autor faz uma analogia do tempo vampiresco como noturno, solitário e eterno, sem cicatrizes, um tempo sem história. Ele afirma que para eles o tempo é nada mais que um alimento, e que os elementos de agitação como a cidade e a chama, são sempre riscos para esses estranhos seres. Ele também critica a forma com que o didatismo histórico é tratado, ao citar que o progresso nacional resume-se em monumentos e estátuas, de forma a produzir uma temporalidade solitária, sem rugas e cicatrizes, a qual considera o tempo como um simples alimento, assim como os vampiros. 
Ao citar Wertheimer, ele critica o seu pensamento, ao afirmar que “Historiador e fato unem-se na neutralidade. A memória despolitiza-se e vai de encontro aos neurônios”. Tal fala demonstra uma ausência do pensamento crítico e do debate político, ferramentas importantíssimas no estudo das ciências humanas, e o fomento da subjetividade, pois tudo passa a ser relativizado. 
“Vimos que relativizar, por mais democrática que possa parecer esta estratégia, caracteriza-se pela conservação de um essencialismo idealista. Defendendo múltiplas verdades ou formas de história, o que é omitido é a vigilância e a conservação da Verdade ou da Ordem, que este pensamento procura manter invisível. Ilustrando estas colocações através de práticas, as observações ou pesquisas sobre variações ou deformações da natureza humana não cedem espaço para problematizarmos a constituição e a engrenagem desta abstrata natureza. Antropólogos, jesuítas e psicólogos conhecem profundamente essa tática.”. Nessa fala, ele defende que as estratégias de dominação que surgem a partir da relativização do pensamento não permitem que o indivíduo faça questionamentos, visto que ele é forçado a aceitar a doutrina da Verdade ou da Ordem, sem fazer qualquer tipo de indagação sobre a realidade em que vive, impossibilitado de pensar, desconfiar e negar o que já conhece.
Para endossar tal constatação, ele retorna ao período da colonização, no qual os indígenas foram coagidos a aceitar a imposição de uma doutrina catequizadora, sem a mínima chance de questionar a razão de todo aquele processo. “Os indígenas não pensavam pensamentos, e sim, reitificavam-nos através da erosão de suas materialidades culturais.” O autor traz a ideia de “matéria em erosão” com esse exemplo, que deixa claro que o indígena deixou de ser um indivíduo pensante e precisou abandonar sua crença, seus costumes e toda sua bagagem cultural e passar a viver de maneira totalmente diferente, de acordo com os modos de outra cultura, o que fez ele perder sua essência e identidade cultural. Ao retomar o exemplo da estagiária que nada sentiu ao olhar para o supervisor, afirma que é mais um exemplo de matéria em erosão, a qual não se alia à aventura e a transformações, ou seja, não permite que o ser exponha os seus pensamentos e dúvidas acerca do mundo. Desse modo, torna-se matéria inerte, a qual apenas engorda, mas não envelhece e nem se arrisca, pois não tem rugas e cicatrizes – marcas de história – portanto, não tem história. 
Ele continua e diz que “A estagiária não sentiu nada porque foi levada a engordar demais”, ou seja, acumulou de forma sistemática todo o conhecimento preexistente, não sendo desafiada a expandir sua visão de mundo, questionar os métodos, apresentar novas problemáticas e sem a presença do elemento “aventura”, que produz o conhecimento acompanhado de tensão e risco, à medida que diz não e não se alia a identificações. “A estagiária não sentiu nada olhando para o supervisor porque foi impedida de aventura. Acumulou camadas e ficou, aliás, quase ficou triste. Seu atrevimento conduziu-se a se aventurar. A cruz dos jesuítas talvez esteja na parede da sala de supervisão. Índios e estagiários, gordos e tristes, retratam um eficaz mecanismo de dominação”. Esse trecho exemplifica fielmente a mentalidade colonizadora que os indivíduos têm até os dias atuais,na qual o sujeito torna-se um objeto, pois apenas seguem o modo de vida já enraizado na sociedade, passam a viver na passividade, a aceitar tudo que lhes é imposto, não promovem debates, tampouco se envolvem em conflitos. São seres que adoram viver na zona de conforto, não sabem lidar com mudanças e estão fechados ao mundo. 
Para contrastar com a ideia da cruz, que representa a dominação e a figura do sujeito epistêmico, o autor traz a “peste”, como algo revolucionário, que permite pensar pensamentos, uma coisa transformadora. “Ela não se alia simbioticamente aos interlocutores; ela envolve, contamina e retira os espelhos de cena. [...] A peste é vida, talvez, por isso, a história da cronologia e das amnésias não se utilize dela. [...] A peste não tem território, ela vai e volta ininterruptamente, como um balanço ou uma onda, para desespero de alguns e esperança de outros”. Diante desse excerto, a peste pode ser enxergada pelo sujeito epistêmico como o caos que advém da angústia e do conflito, por isso ele se opõe a ela. 
Para sintetizar as ideias apresentadas no primeiro tópico, o autor traz a metáfora da mulher de cabelos vermelhos, sentada em um balanço, que segura às cordas dele com as mãos ensanguentadas. Essa mulher representa a peste, a busca pelo conflito, a quebra de paradigmas, a saída da zona de conforto. Ela incomoda, assim como o caos faz o ser ficar extremamente incomodado. A figura dessa mulher representa para alguns, um convite para abrir-se ao mundo, libertar-se da dominação, tornar-se indivíduo crítico, capaz de argumentar suas opiniões, ser hábil em lidar com todas as adversidades que o tiram do comodismo. O vai e vem do balanço representa o voo em busca do novo, do desafio. 
O autor menciona que a imagem da mulher sentada naquele balanço vinha à tona diversas vezes em sua mente e voltava diante do relato da estagiária, das informações dos geógrafos que denunciam o imobilismo dos espaços pela ausência de história, nas afirmações marxistas que destroem a crença no percebido e nos destinos da ideia. Isso ocorre porque esses fatos são exemplos de ações que representam a saída do estado de “matéria de erosão”, no qual os seres deixaram de lado o costumeiro ato de apenas absorver uma gama de informações e passaram a viver a “aventura”, a questionar de maneira incessante o que ocorria ao redor, deixaram de ser “matéria inerte”, correram o risco, mergulharam de cabeça, corpo e alma na objetividade. Tal pensamento é evidenciado no seguinte trecho “Revelou também que a história pode ser contada fora das bibliotecas ou das varandas, e que não engloba apenas grandes nomes, mas pessoas ou grupos que molham as cordas de sangue quando decidem voar”.
“A estagiária pensou ter virado estátua, mas não virou. Ela falou com raiva, atrevida e irônica, construindo imagens, sem a previsível rebeldia dos discursos acadêmicos. Não era ela a estátua, e sim aquilo que ela aprendia. Sem história, as técnicas e os humanismos transformaram-se em cimento. Ao perceber excluída da construção do saber, não se deteve em sua inclusão na arquitetura do imóvel. Ao perceber-se excluída, não teve oportunidade de “aprender” que estava sentada em um balanço”. O problema não era a estagiária, e sim o ambiente em que ela estava inserida, no qual ela não tinha lugar de fala, pois era restrito apenas a absorver o conhecimento transmitido pelo seu supervisor, conhecimento este que já havia sido passado para ele por outro supervisor, o que torna o processo muito mecanizado e subjetivo.
“As vozes psi são variadas: roucas, agudas, suaves. [...] Nas línguas e nos dentes por onde passam os ruídos psi, encontramos apenas a defesa do território clínico. As vozes são emitidas sem suor e sem aventura.” Segundo esse trecho, nas vozes psi não há a presença do pensamento crítico, tampouco a possibilidade de expressar opiniões. 
O depoimento de outra estagiária chama atenção pelo seguinte trecho: “[...] Os médicos os serventes, as enfermeiras, os doentes, eles reclamavam, reclamavam e não tinham um espaço, e se tinham, não conseguiam falar. Essa é a sacanagem da instituição. Ela faz das pessoas mudos falantes. A gente fala, mas sente que não tem eco nenhum. Não tem escuta nenhuma e não tem resposta.” Assim, evidencia-se que as pessoas são silenciadas e intimidadas devido ao sistema, que oprime e emudece esses indivíduos, impossibilitando-os de expor suas opiniões e insatisfações. “Carentes e eternos, os vampiros também temem o fogo, gostam de partes de corpos, detestam o urbano e não gostam de cinema. A mulher voadora não os afasta com a cruz. Afugenta-os com a peste”. A partir desse fragmento, entende-se que o vampiro é como o sujeito epistêmico, que teme o caos, se intimida com a dominação e se faz refém dela e foge dos conflitos e da visão aberta de mundo.
No segundo tópico, o autor traz a problemática de outra estagiária, que ao ser entrevistada diz que estagia no Serviço de Psicologia Aplicada (SPA) e no setor de psicologia aplicada, mas esquece que esse setor faz parte do próprio SPA. A partir daí, ele começa a fazer a seguinte indagação: “Por que será que a estagiária esqueceu?”. Nesse ínterim, ele começa a descrever um prédio limpo e bem cuidado, que possui dois elevadores o social e o de serviço. Os moradores, os brancos, as visitas e os proprietários utilizam o social. Já os trabalhadores, os negros e os animais utilizam o de serviço. Ao trazer essa metáfora para o sentido real, observa-se a separação entre dois mundos. No elevador social, o mundo idealizado, sem problemas, com muito glamour, sem espaço para o sofrimento. No de serviço, o mundo real, cheio de problemas, a realidade nua e crua. Os usuários do elevador social vivem uma realidade fantasiada, enquanto fingem não ver as mazelas que ocorrem ao seu entorno. Acreditam na existência de uma sociedade democrática, enquanto moram em um prédio que segrega já nos elevadores os que ali entram. 
Após descrever o seu encontro inesperado e indesejado, com a vizinha loura perfumada da cabeça aos pés no elevador, ele experimenta um mix de sensações. Diante disso, afirma que o prédio de Santa Tereza é multifacetado: “[...] tem sensala, tem democracia, tem natureza e inconsciente.”
Cita o surgimento da razão pragmática, em meio a Revolução Industrial. Esse seria o fim das trevas anteriores vividas na terra, pois a produção acelerada de mercadorias e de saberes iluminaria toda escuridão. “O sonho do progresso comemora o fortalecimento do capitalismo”. A partir desse momento nascem as ciências humanas, dentre elas a Psicologia, que terá seu novo espaço: o laboratório. “A psicologia, agora autônoma e independente, entra no reino do perceptível.”
“Wilhelm, o primeiro psicólogo-médico, tinha nas sensações a base de sua nova ciência. Mas o cientista, apesar de sua formação protestante, não protestava. [...] A alma do cientista era de pedra.” O autor critica os biógrafos dele, ao dizer que eles produzem rostos excluídos de contemporaneidade e paixão por parte de quem os fotografa. “Legando ao cientista a construção de um saber, conferem à Psicologia o caráter idealizada e abstrato”. Diante disso, afirma que essa ciência é tratada por eles com muita subjetividade, como algo que não necessita de pensamento crítico, algo que não é concreto. Logo, pode-se inferir que o elevador utilizado pelos psicólogos-biógrafos é o social, no qual há privacidades, cumprimentos e lavandas. “Vimos que a história circula completamente perfumada e que seus usuários são liberais democratas, temerosos de mau cheiro, de contradições e da peste”, ou seja, acreditam em um mundo democrático que só existe no papel, temem os usuários do elevador de serviço e evitam o conflito, a mudança de pensamento.
“Através das informações dos autores citados, o século XIX assiste ao sonho do progresso capitalista gerador de inventos e promessas e, simultaneamente, ao inferno criado por pensadores denunciadores de contradições”. De um lado, o sistema doutrinador que os indivíduos do elevador social fazem parte. Do outro, a revoluçãoimposta pelas mentes que se recusam a aceitá-lo sem questionar.
Ademais, o autor retoma sua fala sobre a figura da empregada gorda do quinto andar. Uma pessoa que carrega muitos traumas. Que experimenta das mais variadas formas o sofrimento. Ela tem sentimentos. Sente alegria, saudade, e fundamentalmente, dor. Porém, “as teorias das sensações da sensações que partem da perna negra são proibidas de entrarem no elevador social. Neste, as sensações defendem propriedades e privacidades”. Fica clara a separação do trabalho e do social, uma vez que essas exclusões fazem com que eles percam materialidade e ganhem essencialismos impeditivos de confrontos.
Os aliados as “pernas negras” defendem a construção de um novo prédio e uma nova arte, na qual o trabalho e o social estejam intimamente ligados. Marx propõe em suas ideias os caminhos para isso. “Legando ao trabalho e ao social o seu lugar na História, o humano torna-se condição, perdendo a opressiva determinação do destino ou do inevitável.”
O depoimento de outra estagiária é apresentado. Ela relata um ocorrido no hospital em que estagia, no qual um médico ao suturar a cabeça de uma criança, já estava no modo automático de agir, e sequer se deu conta de que a criança estava acordada, consciente e ouvindo tudo que ele falava, só percebeu isso quando ela apontou para a criança. “Dá pra fazer desse acontecimento uma metáfora. Apontando para a escuta da menina, eu fiz a palavra ganhar sentido. Mas a instituição esvazia totalmente qualquer sentido das palavras. Você encontra nas paredes do hospital cartazes de luta, você vê convocação de greve, e aquilo não tem nada a ver com a prática. Você ouve o discurso das pessoas que também não tem nada a ver com a prática. O que tem a ver é esvaziado. Ele, o médico, não percebeu que a garota estava perto dele. Quando ela balançou a cabeça, ele ficou surpreso. Isso ocorre devido aos mecanismos institucionais que impedem a realização do processo de trabalho singularmente humano. Assim, no hospital também há dois elevadores incomunicáveis. “A estagiária esqueceu que nas escolas e nos consultórios convive com o trabalho. O médico esqueceu que a menina da cabeça quebrada estava acordada participando com ele de um processo em que a saúde também é mercadoria.” A subjetividade faz as atividades ficarem tão monótonas que os indivíduos nem percebem que estão realizando-as. 
“Nas salas de aula de Psicologia, dúvidas e polêmicas são levantadas por estagiários e professores em relação ao papel e à identidade do psicólogo”, uma vez que o trabalho enquanto processo é excluído, colocando-se no lugar o foco sobre a profissão. Há uma exclusão da formação deste profissional com o mercado. Este é encarado nas salas de aula de forma distante e ausente. Assim, sujeito e objeto transformam-se em coisas opostas, sem a historicidade que denuncia o mundo idealizado, sem o caráter questionador.
“Não sabendo o que produzem, não sabendo que podem ser produzidos, procurando papéis aliviadores de contradições, médicos e estagiários são induzidos a esquecer.” Em suma, fica evidente que o sistema capitalista é o maior responsável pelo processo de desumanização do trabalho, no qual o trabalhador deixa de pensar o trabalho de forma racional, e começa a agir de forma totalmente mecanizada, focando apenas na execução.
No terceiro tópico, o autor começa a questionar os limites da escuta clínica, aquela onde você escuta para depois intervir. Por meio de variados exemplos, ele questiona se o indivíduo é respeitado, se há sensibilidade ao escutar o outro, seus problemas, suas dores. Afirma que assim como os artistas, os psicólogos devem utilizar a sensibilidade como o motor de suas práticas e identidades. “As sensibilidades psi são noturnas e brilham, mas a noite nem sempre é eterna.” 
Também é abordada a questão da relação psicólogo-paciente. É dito que as técnicas utilizadas pelos psicólogos são fábricas, as quais devem fabricar corpos com materialidade e lembrança. O profissional psi não pode ser um consumidor de matéria apodrecida pela ideia e pela inércia. 
Por fim, uma estagiária propõe um outro objeto psicológico. Um indivíduo fabricado tensamente e passível de operacionalizar a solidariedade da aventura e da rebeldia. Um objeto simpático à peste, ou seja, que esteja aberto a enxergar o mundo com objetividade, que tenha senso crítico, que saiba se posicionar, questionar, reivindicar. Ela o define como um indivíduo múltiplo, com suas várias versões, todas elas diferentes e ao mesmo tempo relacionadas. Para ela, cada um tem sua história, não é correto definir o indivíduo como algo genérico. 
No segundo capítulo, o autor traz desabafos dos estagiários a respeito da forma em como a formação do psicólogo e as supervisões de psicoterapia são conduzidas
No primeiro tópico, um entrevistado reclama do modo como seu supervisor ensina: “Ser bom terapeuta é ser igualzinho a ele. A gente não tem espaço para nenhum questionamento. A clínica parece estar isolada do mundo”. Eles também discordam da forma como é construída a formação deles. Classificam-na como alienante, pois ela não estimula o senso crítico. “Na própria formação dele já se começa a alienar, porque o psicólogo não tem um lado político, é como se a própria prática fosse acima de qualquer coisa...”. Outro entrevistado discorda do fato de o psicólogo enxergar tudo como verdade absoluta, na medida em que atribui essa característica ao processo de formação. A maioria defende a existência de uma psicologia mais abertas para outras visões de mundo, que olhe pelo lado histórico e social. 
No segundo tópico, entrevistados contestam a falta de autonomia para escolher o setor de estágio, pois durante o curso o aluno já é direcionado e persuadido a escolher determinada área, que é tida como ideal. Outros criticam a desvinculação da teoria e da prática, e defendem que elas deveriam andar lado a lado durante o curso. Também surgem indagações a respeito da importância que a instituição dá às práticas de psicoterapia, pois muitas só fornecem o estágio porque ele é obrigatório. Logo, não se importam com o paciente, tampouco com o estagiário.
Em outro depoimento, também é abordada a importância de não mascarar as dúvidas e questionamentos, mas sim procurar solucioná-las e entendê-las. A pessoa entrevistada defende que ser psicólogo é duvidar, investigar, ler, perguntar, sempre procurar mais conhecimento, nunca se acomodar por achar que é um excelente profissional. Além disso, outro entrevistado reitera a necessidade de falar sobre os possíveis ramos de atuação, sem falar somente da clínica. Ele acha interessante mostrar todas as opções e deixar o estudante livre para escolher a área que mais o agrada. Por fim, uma entrevistada afirma que a classe dos psicólogos precisa aproveitar o grande valor que a Psicologia possui e fazer um sindicado forte. 
No terceiro tópico, os relatos acerca da formação e atuação do psicólogo continuam. Um dos entrevistados aponta a diferença entre o atendimento na clínica e o atendimento na indústria, sob o seu ponto de vista. Outro reclama do fato de a Psicologia reduzir o papel do psicólogo somente à clínica. Também há a opinião de um estagiário que destaca a importância de deixar o egoísmo e o individualismo de lado e se unir durante as supervisões.
No terceiro e último capítulo, o autor faz uma interessante analogia para sintetizar todas as ideias defendidas por ele ao longo do livro. Ele remete o costume de comer baiacu, um peixe venenoso, aos corajosos que tomam a iniciativa de sair da caixa, tiram a venda dos olhos, enxergam o mundo de outra maneira. Para ele, os comedores de baiacu são aqueles que questionam a realidade em que vivem e não aceitam a visão de mundo idealizada. São aqueles estagiários que resolveram expor seus pensamentos, questionaram os métodos, não se intimidaram com a cruz. Aos sujeitos epistêmicos, ele os atribui o título de “sentinelas liberais”. Em seu pensamento, ele afirma que sentinelas liberais não comem a carne de baiacu, pois eles têm medo do veneno, ouseja, são aqueles que têm medo do novo, vivem dentro das caixas de veludo, que aceitam tudo sem questionar, acreditam em uma sociedade ideal, fogem do conflito e são amigos do comodismo.
CONCLUSÃO: O livro trata da necessidade de formar profissionais críticos, com o dom de pensar, questionar e debater. Para o autor, o psicólogo precisa ser agente transformador desde a sua formação. Ainda durante os estágios, ele deve possuir participação ativa, pois não pode ser tratado apenas como um simples observador. Sem dúvidas, é uma obra que possui grande contribuição para que os universitários e professores enxerguem a formação do psicólogo sob um novo olhar. 
REFERÊNCIAS: Baptista, Luis Antonio dos S. A fábrica de interiores: a formação psi em questão. Niterói: EdUFF, 2000
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