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Cartilha das Situações Inesperadas Situações inesperadas Nas próximas páginas quero te mostrar como solu- cionar algumas possíveis situações inesperadas. Vamos lá? Primeira situação: Advogado que tenta induzir as respostas da testemunha. Você tem que ficar muito atento para ver se na hora que o advogado da parte contrária começa a fazer as per- guntas para a testemunha, se ele não está perguntando de alguma forma que induza a resposta. E o que é induzir a resposta? Quando o advogado ao invés de formular a pergunta de forma objetiva, ele faz uma afirmação, e no final dessa afirmação ele faz a pergunta à testemunha. Deixa eu te dar um exemplo, que vai ajudar na sua compreensão. Imagina que uma testemunha está sendo ouvida em um processo de acidente de trânsito. A forma correta do advogado perguntar se ela presenciou o aci- dente de trânsito é: “Você estava presente no dia e na hora tal? Você presenciou o momento da batida?” Essa é a forma adequada, mas, alguns advogados, às vezes, já tentam induzir a resposta da testemunha de forma que favoreça a ele. Por exemplo: “No dia tal, na hora tal, você presenciou o acidente, né?”. E sempre termina com “né?”, na esperança de que a testemunha acabe “concordando”. Se você presenciar o advogado da outra parte fazendo isso, nesse exato momento você tem que pedir a palavra e alegar uma questão de ordem. Fale: “Exce- lência, o advogado não pode fazer perguntas de forma a induzir a resposta da testemunha. Gostaria que Vossa Excelência advertisse o patrono da parte contrária para que ele faça as perguntas de forma objetiva.” É lógico que, às vezes, a questão não é colocada dessa forma tão simplória, como acabei de mostrar. Mas se você não prestar atenção o advogado consegue induzir uma resposta fazendo pequenas afirmações. Isso é muito comum. Outra forma de tentar induzir é quando o advogado começa a ler alguns trechos do processo, como se a tes- temunha conhecesse a ação, na esperança de que ela confirme determinados trechos e determinadas ques- tões. Você, como advogado, tem sempre que exigir que a parte contrária faça perguntas de forma objetiva, nunca com afirmação na pergunta. Se isso acontecer, você já sabe que tem que alegar uma questão de ordem. Segunda situação: Cliente mentiu para seu advogado. Você sabe o que fazer se o seu cliente mentir para você? Imagina que o seu cliente é autor numa ação de repa- ração de danos por acidente de trânsito e tenha narrado a você que no momento dos fatos conduzia o veículo a 40 km/h. No entanto, ao prestar depoimento, em audi- ência, ele declara ao magistrado que estava entre 80 e 100 km/h. Você sabe o que deve fazer para se livrar dessa mentira, dessa contradição? O que fazer para que o juiz não pense que foi você quem mentiu? O que fazer para não manchar a sua imagem profissional pra sempre? Quando eu percebo uma contradição, eu busco escla- recer na hora! A maioria faz isso! O pior é que, na maioria das vezes, o cliente diz: “foi meu advogado que colocou isso aí, Dr…” Bom, eu recomendo que você, enquanto advogado, peça a palavra assim que detectar essa contradição e explique ao juiz que na inicial consta exatamente aquilo que seu cliente declarou a você. Para evitar esse tipo de problema, você tem que ter uma atitude preventiva: fazer a parte assinar a inicial ou a contestação. E levar a peça assinada no dia da audi- ência. No momento da mentira, você ressalta que colocou em sua peça os fatos como lhe foram contados, e que, inclusive, pegou a assinatura do cliente na peça. Dessa forma, conseguirá manter sua credibilidade perante o juízo. Além disso, eu recomendo que você sempre tenha a assinatura do seu cliente em suas petições. Imprima, dê a ele para assinar, digitalize e depois protocole ele- tronicamente. Isso vai garantir o entendimento de que ele leu e está ciente dos fatos escritos por você. Terceira situação: O Juiz determina que você impugne oralmente centenas de documentos em audiência, além da contestação que tem 50 laudas. Eu vou te ensinar agora como impugnar, ou melhor, como jamais ter que impugnar diversos documentos em audiência, ganhando prazo suficiente para fazer isso na tranquilidade do seu escritório. Imagine-se nesta cena: você está em uma audiência de instrução do Juizado Especial, representando a parte autora. No polo passivo está uma instituição financeira, defendida por uma grande banca de advocacia. Assim que a audiência começa, a parte requerida apresenta uma contestação com 50 páginas, cheia de questões preliminares e alegações de nulidade. Se isso não fosse o suficiente, a contestação está acompanhada de mais de 100 documentos e o patrono da parte reque- rida afirma que a documentação juntada prova que seu cliente não tem qualquer direito. Para a sua surpresa, o Juiz Leigo, que preside a audiência, vira-se pra você e diz: “Doutor, o senhor tem 15 minutos para impugnar a contestação e todos os documentos apresentados.” Como assim? Em 15 minutos não dá tempo sequer de ler a contestação de 50 páginas. E os mais de 100 documentos anexados? E se no meio deles, de fato, existir algum documento que pode induzir o juízo a erro e fazê-lo acreditar que o meu cliente não tem direito? Certamente essa seria a sua reação. Se isso lhe parece ilógico ou irrazoável, eu quero que saiba que essa cena se repete com muita frequência nas salas de audi- ências pelo Brasil afora. É o famoso contraditório de faz de conta. Todo mundo sabe que em 15 minutos não é pos- sível ler uma grande contestação e vários documentos. Em apenas 15 minutos não dá para exercer o direito ao contraditório com a mínima eficiência. Mas, mesmo assim, essa situação costuma acon- tecer com frequência e infelizmente os advogados com menos experiência acabam aceitando a situação por não saberem o que fazer ou como agir. Se a Constituição Federal garante o pleno exer- cício da ampla defesa do seu cliente, você precisa ter um prazo minimamente viável para examinar a contestação ofertada pela parte e todos os documentos que com ela foram juntados. O que vou te contar agora é como eu ensino os meus alunos a agirem quando se deparam com uma situação como essa. Você vai aprender a aplicar a técnica da argu- mentação lógica e matemática. Quando tem que decidir sobre algo que não está claro na legislação, o Magistrado ou mesmo o Juiz Leigo, no caso do Juizado Especial, ancora-se basicamente em duas coisas: no entendimento da doutrina e da jurispru- dência ou em um raciocínio lógico. Com relação à questão que estamos tratando, a lei não esclarece sobre o prazo para que o advogado possa impugnar contestação e documentos apresentados em audiência, especialmente no Juizado Especial. Da mesma forma, a doutrina e a jurisprudência são vacilantes quanto ao tema. Então o que você vai fazer é basear-se em um racio- cínio lógico. Você vai dizer ao presidente do ato: “Excelência, um leitor comum lê em média 150 palavras por minuto. Uma folha de papel do tamanho A4 costuma ter cerca de 300 palavras. Pois bem, levando em conta essa capacidade do leitor médio, eu preciso de ao menos 2 minutos para ler cada uma das páginas da contestação que foi apresen- tada, assim como 2 minutos para ler cada um dos docu- mentos ofertados. Como a contestação tem 50 páginas e foram ao menos 100 documentos apresentados, eu necessito de pelo menos 300 minutos para fazer a leitura de toda a documentação. Vossa Excelência não espera e tampouco vai exigir que eu faça a impugnação de uma contestação e de inúmeros documentos sem sequer fazer a leitura dos mesmos, né?” Essas informações você pode conferir agora mesmo com uma simples consulta na internet. Continue da seguinte forma: “‘Então eu concordo plenamente com o prazo de 15 minutos para impugnar a contestação e os documentos contanto que me seja oportunizado ler todas essas peças anteriormente. E como eu acabei de demonstrar, para essa leitura eu precisode 300 minutos, ou seja, de pelo menos 5 horas. Mas é claro que eu também não quero atrasar a pauta de audiências e também não quero que o colega, advo- gado da parte contrária, permaneça aqui durante as 5 horas que preciso para ler toda a documentação. Então se Vossa Excelência preferir e se o nobre colega con- cordar, eu posso apresentar a impugnação por escrito, no prazo máximo de 24 horas. Assim, não atrasamos a audiência e o meu cliente poderá exercer plenamente o direito constitucional ao contraditório.” Pode apostar que, após apresentar esse simples raciocínio lógico e matemático, o deferimento do seu pedido será inevitável. Você não precisará passar pelo sufoco de ter que ler com pressa e impugnar de forma açodada os documentos desconhecidos apresentados em audiência. O presidente do ato não vai querer atrasar toda a pauta de audiências para ficar esperando horas e horas você ler todas as peças e o advogado adversário tam- pouco vai querer ficar mais de 5 horas em uma audi- ência. Será muito mais fácil e cômodo deferir o prazo de 24 horas pugnado por você. Mas caso isso não aconteça, caso o presidente do ato, de forma truculenta e sem qualquer fundamento, insistir para que você se manifeste em apenas 15 minutos, você vai simplesmente registrar que isso é impossível de ser feito pelas razões lógicas e matemáticas que eu acabei de te explicar e vai exigir que isso fique constado em ata. No futuro, caso o seu cliente saia perdedor na demanda, você poderá alegar a nulidade de todo o pro- cesso em razão dessa ofensa ao direito e à ampla defesa. Veja como a falta de experiência poderia levá-lo a aceitar esse tipo de situação sem fazer qualquer argu- mentação ou registro, prejudicando sobremaneira o seu cliente. Quarta situação: A testemunha, no momento do depoimento, mostra um documento importante. Imagina que você advoga para o autor e que arrolou uma testemunha. Durante a audiência, em seu depoi- mento, ela fala: “Excelência, inclusive eu tenho aqui no meu celular uma mensagem do réu confessando tudo.” Isso pode ser apresentado na hora da audiência? O art. 403, parágrafo único, fala da possibilidade de o juiz obrigar o terceiro a entregar os documentos. Bom, durante a audiência só pode ser apresentado aquilo que já estiver previamente no processo. Se você, como advogado, presenciar a testemunha que mostra uma documentação que não está presente no processo, de imediato você deverá pedir a palavra e pedir ao magistrado que essa documentação seja juntada ao processo, para que a outra parte tenha ciência e para que esse documento seja explorado no processo. Você irá explicar ao magistrado que não tinha conhecimento deste documento antes, bem como que ele estava em posse da testemunha. Ademais, que a testemunha nunca comentou com o seu cliente da existência do mesmo. Por fim, por se tratar de um documento, o mesmo deverá ser exibido no processo. Está vendo como a audiência pode lhe trazer sur- presas e que se você não souber como agir você irá travar na hora do ato? Com o avanço tecnológico e dos meios de comuni- cação essa situação relatada é plenamente possível, pois a testemunha pode, por meio das redes sociais, encon- trar alguma prova que beneficie o cliente sem nem ele mesmo saber. ATENÇÃO! Se você estiver advogando para a parte contrária, ou seja, para o réu do processo, você irá insurgir contra esta prova afirmando que este documento não pertence ao processo. Em nenhum momento requeira sua juntada, apenas alegue a ilegalidade da prova. Quinta situação: testemunha bêbada ou muito nervosa. Parece até brincadeira, mas a situação da teste- munha bêbada aconteceu comigo… mas, e se no seu caso, o juiz quiser dispensar a testemunha? Antes de tudo, você precisa saber que o advogado não é responsável pela conduta da testemunha. Mas você pode evitar que situações como esta aconteçam previa- mente com ela. Você deve exigir que a testemunha seja esclarecida para voltar em outra data previamente pre- parada. Agora, sobre a testemunha nervosa, é muito normal e você deve acalmá-la. Testemunha nervosa costuma se confundir com os fatos e pode até prejudicar a parte, portanto, é a sua função deixá-la tranquila. Mas, se você perceber que o nervosismo é nítido e que ela não vai conseguir se lembrar de coisas básicas sobre os fatos, você deve pedir a rede- signação. Sexta situação: Você descobre, na hora da audi- ência, que perdeu o prazo para arrolar testemu- nhas. E agora, o que fazer? No seu caso, o que fazer se você efetivamente perdeu o prazo? Preparar o bolso? Você pode se valer da ação probatória autônoma, prevista no art. 381 e seguintes do Código de Processo Civil. Eu vou te ensinar uma saída que pode te salvar. Você vai usar um coringa da legislação. Você vai se valer do disposto no art. 381, § 5º, do CPC e ajuizar uma Ação Probatória Autônoma. O procedimento serve apenas para a produção da prova. O Juiz não se pronuncia sobre ela. Não há defesa, mas apenas participação dos inte- ressados na colheita da prova. Você precisa agir muito rapidamente para produzir a prova antes de o processo principal encerrar, antes dele ser sentenciado. E depois que a prova é produzida, ela lhe é entregue. Então você vai fazer a juntada na ação pertinente como prova documental e vai explicar que se trata de um docu- mento novo, que não existia anteriormente. Mas observe que o processo principal não vai parar. Se já houver sentença, talvez só lhe reste a rescisória, se for o caso. No entanto, como no Brasil as sentenças costumam demorar, você tem muita chance de salvar o seu pro- cesso. Sétima Situação: A parte contrária e seu advo- gado não comparecem à audiência, mas enviaram testemunhas. Quando essa situação acontecer com você, você deve aplicar o art. 362, §2°, do CPC. O juiz poderá dispensar a produção das provas reque- ridas pela parte, cujo advogado ou defensor público não tenha comparecido à audiência, aplicando-se a mesma regra ao Ministério Público. Portanto, fique sempre atento, caso isso aconteça em uma audiência, você já sabe o que deve ser feito. Oitava Situação: A parte contrária pede para sair da sala de audiências e você desconfia que ela irá instruir as testemunhas que ainda não foram ouvidas. O primeiro alerta que eu te dou é: nunca vá sozinho para uma audiência. Caso você tenha ido acompanhado, você pode pedir para que ele vá atrás da parte para verificar se isso vai realmente acontecer. Mas, caso você tenha ido sozinho, peça ao juiz para ele advertir a parte quanto a isso. Nona Situação: O seu cliente foi intimado pes- soalmente para prestar depoimento pessoal, mas não compareceu em audiência. Quando a parte intimada não comparece no depoi- mento pessoal, ocorre a confissão dos fatos. Eu já vi muitos advogados serem responsabilizados por isso, então, você precisa se prevenir para que isso não aconteça. Você deve esclarecer ao seu cliente, de preferência por escrito, qual é a consequência do não compareci- mento no depoimento pessoal. Além da advertência por escrito, ligue para o seu cliente, na semana da audiência, mande uma mensagem na véspera e, no dia, não deixe ele esquecer do compromisso. Caso você tenha esclarecido, mas mesmo assim ele não compareceu, peça ao juiz para que não aplique a pena de imediato, justifique que deve haver um motivo grande e busque informações sobre a ausência do seu cliente IMEDIATAMENTE. Isso pode funcionar ou não. Caso não funcione e o juiz declare a confissão, você pode comprovar o impedi- mento e postular a produção de provas em outra data.