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Prévia do material em texto

LAURENCE BONJOUR
ANN BAKER
FILOSOFIA
TEXTOS FUNDAMENTAIS COMENTADOS
2ª EDIÇÃO
B715f BonJour, Laurence.
 Filosofia : textos fundamentais comentados / Laurence BonJour, Ann Baker ; consultoria e
revisão técnica desta edição: Maria Carolina dos Santos Rocha, Roberto Hofmeister Pich.
– 2. ed. – Porto Alegre : Artmed, 2010.
776 p. ; 28 cm.
 ISBN 978-85-363-2119-6
1. Filosofia. I. Baker, Ann. II. Título.
CDU 1
Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges CRB-10/1922
CONSELHO EDITORIAL DE FILOSOFIA
Maria Carolina dos Santos Rocha (Presidente). Professora e Doutora em Filosofia Contemporânea pela ESA/Paris e UFRGS/Brasil. 
Mestre em Sociologia pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS)/Paris.
Fernando José Rodrigues da Rocha. Doutor em Psicolinguística Cognitiva pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica, com pós-
-doutorados em Filosofia nas Universidades de Kassel, Alemanha, Carnegie Mellon, USA, Católica de Louvain, Bélgica e Marne-la-
Vallee, França, Professor Associado do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Lia Levy. Professora Adjunta do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutora em História 
da Filosofia pela Universidade de Paris IV-Sorbonne, França. Mestre em Filosofia pela UFRJ
Nestor Luiz João Beck. Diretor de Desenvolvimento da Fundação ULBRA. Doutor em Teologia pelo Concordia Seminary de Saint 
Louis, Missouri, USA, com pós-doutorado em Teologia Sistemática no Instituto de História Europeia em Mainz, Alemanha. Bacha-
rel em Direito. Licenciado em Filosofia.
Roberto Hofmeister Pich. Doutor em Filosofia pela Universidade de Bonn, Alemanha. Professor do Programa de Pós-Gradua ção em 
Filosofia da PUCRS.
Valerio Rohden. Doutor e livre-docente em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com pós-doutorado na Uni-
versidade de Münster, Alemanha. Professor titular de Filosofia na Universidade Luterana do Brasil.
EQUIPE DE TRADUÇÃO
André Nilo Klaudat. Doutorado em Filosofia, University College London. Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio Gran-
de do Sul.
Darlei Dall’Agnol. Doutorado em Filosofia, University of Bristol. Professor Associado I da Universidade Federal de Santa Catarina.
Marco Antonio Franciotti. Doutorado em Filosofia pela University of London. Professor Adjunto IV da Universidade Federal de 
Santa Catarina.
Maria Carolina dos Santos Rocha. Doutorado em Filosofia Contemporânea pela ESA/Paris e Universidade Federal do Rio Grande 
do Sul.
Milene Consenso Tonetto. Doutorado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Nelson Fernando Boeira. Doutorado em História, Yale University. Professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Roberto Hofmeister Pich. Doutorado em Filosofia, Bonn Universität. Professor na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande 
do Sul.
Filosofia: textos fundamentais comentados 727
O Absurdo5
A maior parte das pessoas sente, 
ocasionalmente, que a vida é absurda, e 
algumas sentem isso de forma viva e con-
tínua. 1 Todavia, as razões normalmente 
oferecidas em defesa dessa convicção são 
visivelmente inadequadas: elas não pode-
riam realmente explicar por que a vida 
é absurda. Por que, então, elas fornecem 
uma expressão natural para a percepção 
de que ela o é?
5 Extraído de Mortal Questions (Cambridge, Mass.: Cambridge University Press, 1979).
1
de acordo com nagel, a 
maioria das pessoas, ao 
menos algumas vezes, considera a 
vida absurda, em que isso significa 
algo como radicalmente fora de 
sincronia com as expectativas e 
aspirações humanas. Você (ou 
talvez alguém que você conheça 
bem) já teve alguma vez essa 
experiência? em caso afirmativo, 
qual foi o conteúdo dela? de que 
modo ou em qual sentido a vida 
lhe pareceu absurda? tente ex-
plicar essa ideia da maneira mais 
clara que você puder antes de ver 
o que nagel tem a dizer sobre isso.
pAre
728 laurence bonJour & Ann baker
i
Considere alguns exemplos. Fre-
quentemente, nota-se que nada do que 
fazemos agora terá importância em um 
milhão de anos. Porém, se isso for ver-
dade, então, pela mesma razão, nada do 
que será o caso em um milhão de anos 
tem importância agora. Em particular, 
não tem importância agora que, em um 
milhão de anos, nada do que fazemos 
agora terá importância. Além disso, mes-
mo se o que fizéssemos agora tivesse im-
portância em um milhão de anos, como 
isso poderia evitar que as nossas preo-
cupações presentes sejam absurdas? Se 
a sua importância agora não é suficiente 
para realizar isso, como seria útil se elas 
tivessem importância daqui a um milhão 
de anos?
Se o que fazemos agora tivesse im-
portância em um milhão de anos é algo 
que poderia fazer a diferença crucial so-
mente se o fato de ter importância em um 
milhão de anos dependesse do fato de 
ter importância, ponto final. Mas, então, 
negar que qualquer coisa que aconteça 
agora terá importância em um milhão de 
anos é incorrer em petição de princípio 
com respeito ao fato de ela ter importân-
cia, ponto final; afinal, naquele sentido 
não se pode saber que não terá importân-
cia em um milhão de anos se (por exem-
plo) alguém agora é feliz ou miserável 
sem saber que isso não tem importância, 
ponto final. 2
O que dizemos para comunicar a 
absurdidade de nossas vidas muitas ve-
zes tem a ver com espaço ou tempo: so-
mos minúsculos pontinhos na vastidão 
infinita do universo; a nossa vida é mero 
instante, mesmo em uma escala de tem-
po geológica, para não citar uma escala 
cósmica; todos nós estaremos mortos 
a qualquer minuto. Porém, é claro, ne-
nhum desses fatos evidentes podem ser 
aquilo que torna a vida absurda, se ela 
for absurda. Ora, suponhamos que vivês-
semos para sempre; não seria uma vida 
que é absurda se durar setenta anos ain-
da infinitamente mais absurda se duras-
se toda a eternidade? E se nossa vida é 
absurda por causa do nosso presente ta-
manho, por que seria ela menos absurdas 
em qualquer medida se preenchêssemos 
o universo (ou porque fôssemos maiores
ou porque o universo fosse menor)? A
reflexão sobre a nossa miudeza e finitu-
de parece estar intimamente conectada 
com a percepção de que a vida não tem 
sentido, mas não está claro qual é essa 
conexão. 3
Um outro argumento inadequado é 
o de que, pelo fato de que vamos morrer,
todas as cadeias de justificação devam
ser abandonadas em pleno ar: estuda-se
e trabalha-se para ganhar dinheiro para
pagar roupas, moradia, diversão, alimen-
tação, para se sustentar ano após ano, tal-
vez para sustentar a família e seguir uma
carreira – mas para que fim último? Isso
tudo é uma jornada elaborada que não
leva a lugar algum. (Também se exercerá
alguma influência na vida de outras pes-
soas, mas isso simplesmente reproduz o
problema, pois elas morrerão também.)
Há inúmeras respostas para esse 
argumento. Primeiro, a vida não consis-
te em uma sequência de atividades, cada 
uma das quais tendo como seu propósito 
algum membro subsequente da sequên-
cia. Cadeias de justificação chegam re-
petidamente a um fim ao longo da vida 
e, se o processo como um todo pode ser 
justificado, isso não tem relação com a 
finalidade desses pontos finais. Nenhu-
ma justificação posterior é necessária 
para tornar razoável tomar aspirina para 
uma dor de cabeça, ir à exibição da obra 
de um pintor que se admira ou impedir 
que uma criança ponha a mão sobre a 
chapa quente. Nenhum contexto mais 
amplo ou propósito adicional é neces-
sário para impedir que esses atos sejam 
sem propósito. 4
Mesmo que alguém desejasse for-
necer uma justificação adicional para 
buscar todas as coisas na vida que são 
comumente vistas como autojustifica-
doras, essa justificação também teria de 
terminar em algum lugar. Se nada pode 
justificar a não ser que seja justificado 
em termos de algo fora de si mesmo, que 
também é justificado, então o resultado 
é um regresso infinito e nenhuma cadeia 
de justificação pode estar completa. Além 
disso, se uma cadeia finita de razões não 
pode justificarcoisa alguma, o que pode-
ria ser realizado por uma cadeia infinita, 
em que cada elo deve ser justificado por 
referência a algo fora de si próprio? 5
Uma vez que as justificações devem 
chegar a um fim em algum lugar, nada é 
ganho ao negar que elas terminam onde 
elas parecem terminar, a saber, na vida 
– ou ao tentar subsumir as justificações
2
Que algo “tem importância, 
ponto final” significa que 
ele tem importância em si mesmo, 
fora de qualquer relação com 
outras coisas (que podem não ter 
existido) – ter importância, como 
posteriormente nagel coloca isso, 
sub specie aeternitatis (desde a 
eternidade). A maioria das coisas 
tem importância por causa de sua 
relação com outras coisas – por 
exemplo, o dinheiro tem impor-
tância por causa daquilo que 
ele pode oferecer, mas não “tem 
importância, ponto final”.
3
Há, contrariamente ao que 
nagel está sugerindo, uma 
maneira pela qual a “finitude e 
brevidade” da nossa vida genuina-
mente dão suporte à ideia de que 
ela é absurda – ou sem sentido?
(Como nagel deixará claro 
depois, dizer que a vida não 
tem sentido não é exatamente 
a mesma coisa que dizer que 
ela é absurda, embora as duas 
alegações estejam intimamente 
relacionadas.)
pAre
4
É bastante comum pensar 
que o ponto ou propósito 
de cada ação deve residir em 
algum fim ou meta adicional, de 
maneira que, se a cadeia de atos 
termina (na morte de uma pessoa 
ou na morte daqueles que eles 
afetam), então tudo o que alguém 
fez foi sem propósito. de fato, 
porém, nagel está alegando que 
muitas atos têm um propósito ou 
um sentido em si mesmos, sem 
que isso dependa de quaisquer 
fins adicionais.
5
suponha que, como muitas 
pessoas acreditam, fomos 
colocados neste planeta por um 
ser poderoso e que a nossa exis-
tência é justificada pela satisfação 
dos seus propósitos. então, o que, 
para além dele, justifica os seus 
propósitos (e isso é requerido 
caso seja verdadeiro que “nada 
pode justificar a menos que seja 
justificado em termos de algo fora 
de si mesmo”)?
Filosofia: textos fundamentais comentados 729
7 
de acordo com nagel, a ab-
surdidade resulta quando 
há uma discrepância entre as nos-
sas pretensões ou aspirações e a 
realidade. pense cuidadosamente 
em como essa descrição aplica-se 
às situações limitadas descritas 
aqui. Você consegue pensar em 
outros exemplos desse tipo?
pAre
6 
nagel está sugerindo que 
o argumento a favor da 
absurdidade da vida falha porque 
considera sem nenhuma justifica-
ção que o único tipo de razão que 
alguém poderia possivelmente 
ter para qualquer coisa (dado que 
uma cadeia infinita de razões é 
logicamente impossível) ainda 
não é bom o suficiente.
ordinárias de ação múltiplas, frequente-
mente triviais, a um único esquema que 
controla a vida. Podemos ficar mais fa-
cilmente satisfeitos do que isso. De fato, 
através de sua deturpação do processo 
de justificação, o argumento faz uma 
exigência vazia. Ele insiste que as razões 
disponíveis na vida são incompletas, mas 
sugere, a partir disso, que todas as razões 
que chegam a um fim são incompletas. 
Isso torna impossível fornecer quaisquer 
razões. 6
Os argumentos padrão a favor da 
absurdidade parecem, portanto, falhar 
como argumentos. Eu acredito, todavia, 
que eles tentam expressar algo que é di-
fícil de afirmar, mas fundamentalmente 
correto.
ii
Na vida comum, uma situação é ab-
surda quando ela inclui uma discrepân-
cia visível entre pretensão ou aspiração e 
rea lidade: alguém faz um discurso com-
plexo em apoio a uma proposta que já foi 
aprovada; um criminoso notório torna-se 
presidente de uma grande fundação fi-
lantrópica; você declara o seu amor por 
telefone para um anúncio gravado; en-
quanto você está sendo condecorado, as 
suas calças caem. 7
Quando uma pessoa encontra-se 
em uma situação absurda, ela geralmen-
te tentará mudá-la, modificando as suas 
aspirações, tentando trazer a realidade a 
um melhor acordo com elas ou afastando-
-se por completo da situação. Nem sem-
pre estamos dispostos a ou somos capa-
zes de nos desembaraçar de uma posição 
cuja absurdidade tornou-se clara para 
nós. Contudo, é normalmente possível 
imaginar alguma mudança que remove-
ria a absurdidade – independentemente 
se podemos ou não implementar isso. A 
percepção de que a vida como um todo 
é absurda chega quando percebemos, 
talvez obscuramente, uma pretensão ou 
aspiração mais importante que é insepa-
rável da continuação da vida humana e 
que torna a sua absurdidade inescapável, 
quase um escape da própria vida.
A vida de muitas pessoas é absur-
da, temporária ou permanentemente, por 
razões convencionais que têm a ver com 
suas ambições particulares, circunstân-
cias e relações pessoais. Se há um sen-
tido filosófico de absurdidade, contudo, 
ele deve surgir de uma percepção de algo 
universal – algum aspecto em que a pre-
tensão e a realidade inevitavelmente se 
chocam para todos nós. Essa condição é 
suprida, eu argumentarei, pela colisão 
entre a seriedade com que levamos a 
nossa vida e a possibilidade perpétua de 
considerar tudo aquilo sobre o que somos 
sérios como sendo arbitrário ou aberto à 
dúvida.
Não podemos viver a vida humana 
sem energia e atenção, nem sem fazer 
escolhas que mostrem que levamos al-
gumas coisas mais a sério do que outras. 
Entretanto, temos sempre disponível um 
ponto de vista exterior à forma particular 
da nossa vida, a partir do qual a serie-
dade parece gratuita. Esses dois pontos 
de vista inescapáveis colidem em nós, e 
isso é o que torna a vida absurda. É ab-
surdo porque ignoramos as dúvidas que 
sabemos que não podem ser resolvidas, 
continuando a viver com uma seriedade 
praticamente não diminuída, apesar de-
las. 8
Essa análise exige uma defesa em 
dois aspectos: primeiro, no que diz res-
peito à inevitabilidade da seriedade; se-
gundo, no que diz respeito à inescapabili-
dade da dúvida.
Nós nos levamos a sério tanto se 
levamos vidas sérias ou não quanto se 
estamos preocupados primeiramente 
com fama, prazer, virtude, luxo, triunfo, 
beleza, justiça, conhecimento, salvação 
ou a mera sobrevivência. Se levamos a 
sério as outras pessoas e nos dedicamos 
a elas, isso só multiplica o problema. A 
vida humana é repleta de esforço, planos, 
cálculos, sucessos e fracassos: buscamos a 
nossa vida com graus variáveis de pregui-
ça e energia.
Seria diferente se não pudéssemos 
dar um passo para trás e refletir sobre o 
processo, mas fôssemos levados de im-
pulso a impulso sem autoconsciência. 
Contudo, os seres humanos não agem 
somente pelo impulso. Eles são pruden-
tes, refletem, medem as consequências, 
perguntam se o que estão fazendo vale 
a pena. A sua vida não é apenas repleta 
de escolhas particulares que se juntam 
em atividades mais amplas com estru-
turas temporais: eles também decidem 
em termos mais amplos o que buscar e o 
que evitar, quais prioridades devem estar 
entre os seus vários objetivos e que tipo 
8 Reafirmação/Resumo
Que a vida como um todo 
seja absurda significa que 
ela envolveria essencialmente 
uma versão em larga escala desse 
mesmo tipo de discrepância entre 
pretensões e realidade. A principal 
alegação de nagel é que, embora 
não possamos deixar de levar a 
sério muitas coisas em nossa vida, 
há, ao mesmo tempo, sempre 
disponível um ponto de vista 
diferente, mais objetivo, a partir 
do qual essa seriedade parece 
desabalizada e até mesmo tola.
730 laurence bonJour & Ann baker
de pessoas eles querem ser ou se tornar. 
Alguns homens são confrontados com 
tais escolhas pelas grandes decisões que 
tomam de tempos em tempos; alguns 
meramente por refletir sobre o curso que 
suas vidas estão tomando como o produ-
to de incontáveis pequenas decisões. Eles 
decidem com quem se casar, qual profis-
são seguir, associar-se ou não ao Country 
Club ou à Resistência; ou podem simples-
mente pensar por que continuam sendo 
vendedores, acadêmicos ou motoristas de 
táxi e então param de pensar sobre isso 
depois de um certo período de reflexão 
inconclusiva.Embora possam ser motivados de 
ato a ato por aquelas necessidades ime-
diatas que a vida lhes apresenta, eles 
permitem que o processo continue ao 
aderirem ao sistema geral de hábitos e à 
forma de vida em que tais motivos têm 
lugar – ou talvez somente por agarrar-se 
à própria vida. Gastam quantidades enor-
mes de energia, risco e cálculos sobre os 
detalhes. Pense sobre como um indivíduo 
normal preocupa-se com a sua aparên-
cia, a sua saúde, a sua vida sexual, a sua 
honestidade emocional, a sua utilidade 
social, o seu autoconhecimento, a qua-
lidade dos seus laços com a família, os 
colegas e amigos, quão bem ele faz o seu 
trabalho, se ele entende o mundo e o que 
está acontecendo nele. Levar uma vida 
humana é uma ocupação de tempo inte-
gral, para a qual todos devotam décadas 
de preocupações intensas. 9
Esse fato é tão óbvio que é difícil 
considerá-lo extraordinário e importante. 
Cada um de nós vive a sua própria vida – 
vive consigo mesmo 24 horas por dia. O 
que mais se supõe que ele faça – viver a 
vida de mais alguém? Os humanos, toda-
via, têm a capacidade especial de dar um 
passo para trás e investigar a si próprios 
e a vida com a qual estão comprometi-
dos, com aquele espanto desprendido 
que provém de assistir ao esforço de uma 
formiga em subir um montinho de areia. 
Sem desenvolver a ilusão de que eles são 
capazes de escapar de suas posições al-
tamente específicas e idiossincráticas, 
podem ver isso sub specie aeternitatis – e 
a visão é ao mesmo tempo sóbria e cô-
mica.
O passo para trás crucial não é to-
mado ao pedir-se ainda outra justificação 
na cadeia e ao fracassar-se em alcançá- 
-la. As objeções a essa linha de ataque já 
foram estabelecidas; as justificações che-
garam a um fim. Mas isso é precisamente 
o que fornece uma dúvida universal com 
o seu objeto. Voltamos atrás para desco-
brir que o sistema inteiro de justificação e 
crítica, que controla nossas escolhas e dá 
suporte às nossas defesas da racionalida-
de, baseia-se em respostas e hábitos que 
nunca questionamos, que não deveríamos 
saber como defender sem circularidade e 
aos quais continuaremos a aderir mesmo 
depois de terem sido questionados. 10
As coisas que fazemos ou queremos 
sem razões e sem exigir razões – as coisas 
que definem o que é uma razão para nós 
e o que não é – são o ponto de partida do 
nosso ceticismo. Nós nos vemos do lado 
de fora, e todas as contingências e espe-
cificidades de nossos objetivos e buscas 
tornam-se claras. No entanto, quando 
tomamos essa posição e reconhecemos 
o que fazemos como arbitrário, isso não 
nos separa da vida, e ali está a nossa ab-
surdidade: não no fato de que tal visão 
externa pode ser tomada de nós, mas no 
fato de que nós mesmos podemos tomá- 
-la sem deixarmos de ser as pessoas cujas 
preocupações últimas são consideradas 
tão friamente. 11
iii
Pode-se tentar escapar dessa posi-
ção ao buscar preocupações últimas mais 
amplas, a partir das quais é impossível 
dar um passo para trás – a ideia é de 
que a absurdidade resulta porque o que 
levamos a sério é algo pequeno, insigni-
ficante e individual. Aqueles que procu-
ram preencher a sua vida com sentido 
geralmente anteveem um papel ou uma 
função em algo mais amplo do que eles 
mesmos. Portanto, procuram a realização 
no serviço à sociedade, ao Estado, à revo-
lução, ao progresso da história, ao avan-
ço da ciência ou da religião e da glória 
de Deus.
Contudo, um papel em um empreen-
dimento maior não pode atribuir significa-
do a menos que o empreendimento seja 
ele mesmo significativo. E o seu significa-
do deve voltar àquilo que podemos enten-
der, ou ele nem mesmo parecerá nos dar 
aquilo que estamos procurando. Se apren-
dêssemos que estávamos sendo criados 
para fornecer alimento a outras criaturas 
afeiçoadas à carne humana, que planejas-
9 
nagel está correto sobre 
isso? Você pode pensar 
em alguém que não busca dessa 
maneira ao menos algumas 
partes ou aspectos da sua vida, 
alguém para quem tem pouca ou 
nenhuma importância se as coisas 
acontecem de uma forma em vez 
de outra?
pAre
10 
todas as pessoas, de acordo 
com nagel, têm a capaci-
dade de “dar um passo para trás” e 
de ver a sua vida da “perspectiva 
da eternidade”, uma perspectiva 
que transcende os interesses e 
as preocupações da sua vida ou 
mesmo da vida humana em geral. 
A partir dessa perspectiva, assim 
ele alega, todas as nossas razões 
para todas as nossas ações estão 
abertas à dúvida.
11 
Assim, podemos pretensa-
mente tomar um ponto de 
vista a partir do qual seja possível 
reconhecer que todas as nossas 
ações e os nossos propósitos são 
arbitrários. e, todavia, continua-
mos a nos preocupar seriamente 
com eles – e é por isso, segundo 
nagel, que a nossa vida é absurda.
(realmente reconhecemos 
que as coisas com que nos 
preocupamos são arbitrárias – 
genuinamente arbitrárias – ou elas 
meramente parecem arbitrárias 
daquele ponto de vista? nagel 
não é claro sobre esse ponto 
bastante crítico.)
Filosofia: textos fundamentais comentados 731
12 
A alegação de nagel é a de 
que fazer uma contribuição 
para um projeto maior não pode 
por si só atribuir significado à sua 
vida – não importa se esse projeto 
maior tem ou não sentido ou 
significado.
* N. de R.T. Especiaria da culinária francesa pre-
parada com carne de galinha embebida em vi-
nho.
13 
está claro, como nagel ale-
ga, que o significado ou a 
justificação de qualquer propósito 
maior (ou da fonte daquele propó-
sito) sempre pode ser questionada 
da mesma maneira ao “dar um 
passo para trás” tal como ele 
indica? muitas pessoas pensaram 
que o significado de deus ou dos 
propósitos de deus não podem 
ser questionados dessa maneira, 
mas há alguma razão clara pela 
qual isso é assim? nagel tem 
qualquer razão clara a favor da sua 
alegação contrária?
pAre
sem nos transformar em costeletas antes 
que emagrecêssemos muito – mesmo que 
aprendêssemos que a raça humana havia 
sido desenvolvida por criadores de ani-
mais precisamente para esse propósito –, 
isso ainda não daria sentido à nossa vida, 
por duas razões. Primeiro, estaríamos no 
escuro em relação ao significado da vida 
daqueles outros seres; segundo, embora 
pudéssemos admitir que esse papel culi-
nário torne a nossa vida significativa para 
eles, não está claro como ele a tornaria 
significativa para nós. 12
Reconhecidamente, a forma normal 
de serviço a um ser superior é diferente 
disso. Supõe-se que se contemple e par-
tilhe da glória de Deus, por exemplo, 
de um modo em que os galináceos não 
compartilham da glória do coq au vin.* O 
mesmo é verdadeiro a respeito do serviço 
a um estado, um movimento ou uma re-
volução. As pessoas podem chegar a sen-
tir, quando elas são parte de algo maior, 
que isso é parte delas também. Elas se 
preocupam menos com o que é peculiar a 
si mesmas, mas se identificam o bastante 
com o empreendimento maior de encon-
trar o seu papel na realização daquilo.
Contudo, qualquer propósito maior 
desse tipo pode ser posto em dúvida, as-
sim como os objetivos de uma vida indi-
vidual podem ser e pelas mesmas razões. 
É tão legítimo encontrar justificação úl-
tima ali quanto encontrá-la antes, entre 
os detalhes da vida individual. Todavia, 
isso não altera o fato de que as justifica-
ções chegam a um fim quando estamos 
satisfeitos em ter chegado ao fim delas 
– quando não julgamos necessário seguir 
procurando adiante. Se podemos dar um 
passo para trás dos propósitos da vida in-
dividual e duvidar do seu propósito, tam-
bém podemos dar um passo para trás do 
progresso da história humana, da ciência, 
do sucesso de uma sociedade ou do reino, 
do poder e da glória de Deus, questionan-
do todas essas coisas da mesma maneira. 
13 O que nos parece conferir sentido, jus-
tificação, significado, faz isso em virtude 
do fato de que não precisamos de mais 
razões depois de um certo ponto.
O que torna a dúvida inescapável 
em relação aos objetivos limitados da 
vida individual também a torna inesca-
pável em relaçãoa qualquer propósito 
maior que estimule a percepção de que 
a vida é significativa. Uma vez que a dú-
vida fundamental teve começo, ela não 
pode ser deixada de lado.
Camus afirma em O mito de Sísifo 
que o absurdo surge porque o mundo fa-
lha em satisfazer as nossas demandas por 
sentido. Isso sugere que o mundo poderia 
satisfazer aquelas demandas se ele fosse 
diferente. Porém, agora podemos ver 
que esse não é o caso. Parece não haver 
qualquer mundo concebível (que contém 
a nós) sobre o qual não poderiam surgir 
dúvidas irresolúveis. Consequentemente, 
a absurdidade da nossa situação deriva 
não de uma colisão entre as nossas ex-
pectativas e o mundo, mas de uma coli-
são dentro de nós mesmos. 14
iv
Pode-se objetar que o ponto de 
vista a partir do qual essas dúvidas su-
postamente são percebidas não existe – 
que, se tomamos o recomendado passo 
para trás, aterrissamos em ar rarefeito, 
sem qualquer base para julgar as respos-
tas naturais que supostamente estamos 
verificando. Se mantivermos os nossos 
padrões usuais a respeito do que é im-
portante, então as questões sobre o sig-
nificado do que estamos fazendo com a 
nossa vida serão respondidas no sentido 
usual. No entanto, se não os mantiver-
mos, então aquelas questões não podem 
significar nada para nós, dado que não 
há mais qualquer conteúdo para a ideia 
daquilo que tem importância e, portan-
to, nenhum conteúdo para a ideia de que 
nada tem importância. 15
Todavia, essa objeção deturpa a 
natureza do passo para trás. Não se su-
põe que ele nos dê um entendimento do 
que é realmente importante, de modo 
que vemos por contraste que a nos-
sa vida é sem significado. No decorrer 
dessas reflexões, nunca abandonamos 
o padrão normal que guia a nossa vida. 
Meramente as observamos em operação 
e reconhecemos que, se elas são ques-
tionadas, podemos inutilmente justificá- 
-las apenas por referência a elas mes-
mas. Aderimos a elas devido ao modo 
como somos constituídos; o que nos pa-
rece importante, sério ou valoroso não 
14 
Assim, a alegação de 
nagel não é somente que a 
procura por sentido ou significado 
inquestionáveis em nossas vidas 
pode falhar, dependendo exata-
mente de como é a realidade, mas 
sim que o fracasso é garantido. 
estamos condenados para sempre 
a tentar encontrar uma maneira 
pela qual a nossa vida possa ter 
sentido ao final, embora, ao mes-
mo tempo, vejamos claramente 
que isso não pode ser feito.
15 
essa é a objeção mais séria 
à concepção de nagel. ela 
alega que a suposta perspectiva 
a partir da qual podemos legiti-
mamente questionar os padrões 
de significado, pelos quais nor-
malmente avaliamos a nossa vida, 
em realidade não existe, porque 
não há nenhuma base alternativa 
para avaliar o significado à qual 
possamos apelar.
732 laurence bonJour & Ann baker
nos pareceria assim se fôssemos diferen-
temente constituídos. 16
Na vida comum, com certeza, não 
julgamos uma situação absurda a menos 
que tenhamos em mente alguns padrões 
de seriedade, significado ou harmonia 
com os quais o absurdo pode ser con-
trastado. Esse contraste não é implicado 
pelo julgamento filosófico da absurdi-
dade, e pode-se pensar que isso torna 
o conceito inadequado para a expres-
são de tais julgamentos. Isso, contudo, 
não é assim, pois o julgamento filosó-
fico depende de outro contraste que o 
torne uma extensão natural a partir de 
casos mais comuns. Ele se afasta destes 
somente ao contrastar as pretensões da 
vida com um contexto mais amplo, em 
que nenhum padrão pode ser descober-
to, a não ser com um contexto a partir 
do qual padrões alternativos, que se so-
brepõem, podem ser aplicados. 17
...
vi
Quando nos vemos de uma perspec-
tiva mais ampla do que aquela que po-
demos ocupar em carne e osso, nós nos 
tornamos espectadores de nossa própria 
vida. Não podemos fazer muito como 
meros espectadores de nossas próprias 
vidas, então continuamos a levá-las e a 
nos dedicar ao que somos ao mesmo tem-
po capazes de ver como não mais do que 
uma curiosidade, como o ritual de uma 
religião estranha.
Isso explica por que o sentido de 
absurdidade encontra a sua expressão 
natural naqueles argumentos ruins com 
os quais a discussão começou. A referên-
cia ao nosso tamanho pequeno e à curta 
duração da vida e ao fato de que toda 
a espécie humana eventualmente desa-
parecerá no final sem deixar um traço 
são metáforas para o passo para trás 
que nos permite considerar a nós mes-
mos a partir de fora e descobrir a forma 
particular de nossa vida como curiosa e 
ligeiramente surpreendente. Ao fingir 
uma visão turva como essa, ilustramos 
a capacidade de nos vermos sem pres-
suposições, como ocupantes arbitrários, 
idiossincráticos, altamente específicos 
do mundo, uma das incontáveis formas 
possíveis de vida. 18
Antes de voltar à questão relativa 
a se a absurdidade de nossa vida é algo 
a ser lamentado e se possível evitado, 
deixem-me considerar o que teria de ser 
abandonado no intuito de evitar isso.
Por que a vida de um camundon-
go não é absurda? A órbita da lua não 
é um absurdo também, mas isso não 
envolve quaisquer buscas ou objetivos. 
Um camundongo, contudo, tem de tra-
balhar para ficar vivo. Todavia, ele não 
é absurdo, porque não tem a capacidade 
de autoconsciência e autotranscendência 
que o capacitaria a ver que ele é apenas 
um camundongo. Se isso acontecesse, a 
vida dele se tornaria absurda, pois a au-
toconsciência não o faria deixar de ser 
um camundongo e não o capacitaria a 
elevar-se acima de suas preocupações de 
camundongo. Trazendo consigo a sua au-
toconsciência recém-descoberta, ele teria 
de voltar à sua vida escassa, ainda que 
frenética, cheio de dúvidas a que ele foi 
incapaz de responder, mas também cheio 
de propósitos que ele não foi capaz de 
abandonar. 19
Já que o passo transcendental é 
natural a nós, humanos, podemos evitar 
a absurdidade recusando tomar aque-
le passo e permanecendo inteiramente 
dentro de nossa vida sublunar? Bem, não 
podemos recusar conscientemente, pois 
para fazer isso teríamos de estar cientes 
do ponto de vista que estávamos recu-
sando adotar. A única maneira de evitar a 
autoconsciência relevante seria ou nunca 
atingi-la ou esquecê-la – nenhuma das 
duas pode ser alcançada pela vontade.
Por outro lado, é possível dedicar es-
forços a uma tentativa de destruir o outro 
componente do absurdo – abandonando 
a vida humana, individual, terrena, no 
intuito de identificar-se o mais completa-
mente possível com aquele ponto de vista 
universal segundo o qual a vida humana 
parece arbitrária e trivial. (Esse parece 
ser o ideal de certas religiões orientais.) 
Se alguém for bem-sucedido, terá então 
de arrastar a consciência superior através 
de uma vida mundana estrênua, e a ab-
surdidade será diminuída.
Contudo, na medida em que esse 
autodefinhamento é o resultado de esfor-
ço, de força de vontade, de ascetismo, e 
assim por diante, ele requer que alguém 
leve a si mesmo a sério como indivíduo 
– que queira despender considerável es-
forço para evitar ser criatural e absurdo. 
16 
A primeira resposta de 
nagel é que a suposta 
perspectiva não envolve uma 
base alternativa ou um padrão 
alternativo, mas em vez disso nos 
deixa ver que os nossos padrões 
dependem dos tipos de criaturas 
que somos e não se aplicaria se 
fôssemos criaturas de um tipo 
diferente.
(isso é de fato algo que 
vemos claramente – ou isso 
é meramente uma possibilidade 
que não pode ser excluída?)
17 
Aqui está o que parece 
ser uma resposta bastante 
diferente: de uma perspectiva 
mais ampla, não há padrões de 
significado a serem discernidos 
– alegadamente mostrando-se 
a partir daí a arbitrariedade dos 
padrões comuns de significado 
que empregamos em nossa pers-
pectiva mais limitada.
(por que deveríamos supor 
que a perspectiva mais am-
pla proporciona a concepção mais 
acurada, em vez de simplesmente 
tornar mais difícil ver algo que 
ainda poderia ser perfeitamente 
genuíno?)
18 
nagel retorna à sugestão, 
brevemente feitaantes, de 
que poderiam existir tipos muito 
diferentes de criaturas, as quais 
se preocupam com tipos muitos 
diferentes de coisas. mas por 
que o fato, se é que ele existe, de 
que poderia haver criaturas que 
se preocupam com tipos muito 
diferentes de coisas é relevante ao 
fato se eu deveria ou não levar a 
sério as coisas com as quais me 
preocupo?
19 
o camundongo teria agora 
dúvidas graves sobre aque-
les propósitos que ele não pode 
abandonar. Antes que ele tivesse 
aquelas dúvidas, a vida dele não 
era absurda, mas uma vez que 
tem as dúvidas a sua vida se torna 
absurda, dado que ele não pode 
evitar, apesar disso, buscar seria-
mente aqueles propósitos.
Filosofia: textos fundamentais comentados 733
Assim, alguém pode minar o objetivo da 
não mundanidade ao buscá-lo de um 
modo demasiadamente vigoroso. 20 Não 
obstante, se alguém simplesmente permi-
tir que a sua natureza animal e individual 
deixe-se conduzir pelo impulso e respon-
da a ele, sem fazer da busca pelas suas 
necessidades um objetivo central e cons-
ciente, então esse alguém poderia, a um 
custo dissociativo considerável, alcançar 
uma vida que fosse menos absurda do 
que a maioria. Não seria, é claro, uma 
vida dotada de sentido também; porém, 
ela não envolveria o compromisso com 
uma consciência transcendente na busca 
assídua de finalidades mundanas. E essa 
é a condição principal da absurdidade – a 
subsunção de uma consciência transcen-
dente não convencida a um empreendi-
mento imanente limitado como uma vida 
humana. 21
A saída final é o suicídio. No en-
tanto, antes de adotar qualquer solução 
precipitada, seria sábio considerar cui-
dadosamente se a absurdidade de nossa 
existência de fato se apresenta como um 
problema para o qual alguma solução 
deve ser encontrada – um modo de li-
dar com um desastre prima facie. Essa é 
certamente a atitude com a qual Camus 
tratou o assunto, e ela ganha suporte a 
partir do fato de que todos estamos, em 
uma escala menor, ansiosos para sair de 
situações absurdas.
Camus – não sob fundamentos uni-
formemente bons – rejeita o suicídio e 
outras soluções que considera escapistas. 
O que ele recomenda é a provocação* ou 
o desprezo. Ele parece acreditar que po-
demos salvar a nossa dignidade mostran-
do os punhos para o mundo, que é surdo
às nossas súplicas, e continuar a viver 
apesar disso. Isso não fará com que nossa 
vida torne-se não absurda, mas empres-
tará a ela uma certa nobreza.6
Isso me parece romântico e ligeira-
mente autopiedoso. A nossa absurdidade 
não autoriza nem tanta aflição nem tanta 
provocação. Sob o risco de cair em um 
romantismo por um caminho diferente, 
argumentarei que a absurdidade é uma 
das coisas mais humanas que temos: uma 
manifestação das nossas características 
mais avançadas e interessantes. (...) ela 
é possível somente porque possuímos 
um certo tipo de insight – a capacidade 
de nos transcendermos em relação a nós 
mesmos em pensamento.
Se uma percepção do absurdo é 
um modo de perceber a nossa verdadei-
ra situação (mesmo que a situação não 
seja absurda até que a percepção surja), 
então qual razão podemos ter para nos 
ressentirmos ou fugir dela? Da mesma 
forma que a capacidade para o ceticismo 
epistemológico, ela resulta da habilidade 
de entender as nossas limitações huma-
nas. Não precisa ser uma questão que 
gere agonia, a não ser que façamos com 
que seja assim. 22 Nem é preciso que isso 
evoque um desprezo desrespeitoso pelo 
destino que permita que nos sintamos 
corajosos ou orgulhosos. Essa dramatiza-
ção, mesmo que conduzida na vida pri-
vada, denuncia uma falha em apreciar a 
insignificância cósmica da situação. Se 
sub specie aeternitatis não há nenhuma 
razão para acreditar que qualquer coisa 
tem importância, então isso também não 
tem importância, e podemos abordar a 
nossa vida absurda com ironia em vez de 
heroísmo ou desespero.
20 
A outra maneira de eliminar 
a absurdidade da vida de 
alguém é parar de levar a vida 
tão a sério. Contudo, buscar esse 
curso tão vigorosamente se auto-
anularia, por ser, afinal de contas, 
um modo de levar a vida a sério.
21 
A nossa vida não é absurda 
meramente porque não tem 
sentido. o que leva à absurdidade 
é a dupla apreensão (a) de que 
a seriedade com que levamos a 
nossa vida não é justificada e (b) 
de que não podemos parar de 
levar a sério a nossa vida.
* N. de R.T. No original, defiance.
6 “Sísifo, proletário dos deuses, impotente e rebelde, conhece a dimensão total da sua condição mise-
rável: isso é o que ele pensa durante a sua descida. A lucidez que deveria constituir a sua tortura ao
mesmo tempo coroa a sua vitória. Não há nenhum destino que não possa ser superado pelo desprezo.”
(The Myth of Sisyphus, traduzido por Justin O’Brien [New York: Vintage, 1959], p. 90; publicado ori-
ginalmente: Gallimard, 1942.)
22 
epicteto aprovaria essa 
atitude de nagel.
Filosofia: textos fundamentais comentados 735
O tópico do interesse próprio* levan-
ta questões filosóficas amplas e insisten-
tes – mais obviamente a questão “Em que 
consiste o interesse próprio?”. O concei-
to, contudo, em oposição ao conteúdo do 
interesse próprio parece suficientemente 
claro. O interesse próprio é o interesse 
de alguém em seu próprio bem. Agir por 
interesse próprio é agir pelo motivo de 
promover o seu próprio bem. Se aquilo 
que alguém faz é realmente em seu inte-
resse próprio depende se isso realmente 
promove ou, ao menos, minimiza o de-
clínio do seu próprio bem. Embora possa 
ser difícil dizer se uma pessoa está moti-
vada pelo interesse próprio em um caso 
particular, e também seja difícil determi-
nar se um dado ato ou uma dada decisão 
realmente é em seu interesse próprio, o 
significado das alegações em questão não 
parece ser problemático. 1
Neste ensaio, a minha principal pre-
ocupação é mostrar algo a respeito do con-
teúdo do interesse próprio.8 Mais especifi-
camente, sustentarei a concepção de que a 
posse de sentido,** tal como elaborarei, é 
um elemento importante de uma vida boa. 
Segue-se, então, que é uma parte de um 
interesse próprio esclarecido que alguém 
queira assegurar sentido na sua vida ou, 
de qualquer modo, permitir e promover 
uma atividade significativa*** nela. Po-
rém, a aceitação dessa concepção substan-
cial de interesse próprio carrega consigo 
uma consequência curiosa: o conceito de 
interesse próprio, que anteriormente pare-
cia ser claro, começa a tornar-se obscuro. 
Felizmente, ele também parece tornar-se 
menos importante. 2
teorias do interesse próprio
Em Reasons and Persons,9 Derek 
Parfit distingue três tipos de teorias sobre 
o interesse próprio – teorias hedonistas, 
teorias preferencialistas e aquilo que ele 
chama de “teorias de lista objetiva”. As 
teorias hedonistas asseguram que o bem 
de uma pessoa é uma questão da quali-
dade percebida de suas experiências. A 
teoria mais popular do interesse próprio, 
que identifica o interesse próprio com a 
felicidade e a felicidade com o prazer e a 
ausência de dor, é um exemplo primor-
dial de teoria hedonista. 3 Contudo, a 
percepção de que algumas pessoas não 
cuidam muito de sua própria felicidade 
– e, de modo importante, que elas nem 
mesmo consideram a sua própria feli-
cidade como o elemento exclusivo em 
seu próprio bem – tem levado alguns 
a propor uma teoria de preferências do 
interesse próprio, que identifica o bem 
de uma pessoa com aquilo que ela mais 
quer para si mesma. Assim, por exem-
plo, se uma pessoa se importa mais em 
ser famosa, mesmo que postumamente 
famosa, do que em ser feliz, então uma 
teoria de preferências poderia conceder 
à fama um peso proporcional na iden-
tificação do interesse próprio dela. Se 
uma pessoa se importa mais com o co-
nhecimento da verdade do que acreditar 
naquilo que é prazeroso ou confortável 
crer, então está no seu interesse próprio 
saber a verdade, por mais desconfortá-
vel que ela possa ser. 4
No entanto, as preferências de uma 
pessoa em relação a si mesma podem ser 
autodestrutivasou até mesmo bizarras, e 
pode ser que algumas coisas (incluindo 
o prazer) sejam boas para uma pessoa, 
não importa se ela as prefere ou não. 
Não é absurdo pensar que ser enganado 
é ruim para uma pessoa (e, assim, que 
não ser enganado é bom para uma pes-
soa), não importa se a pessoa em questão 
conscientemente valoriza isso ou não. A 
amizade e o amor também parecem ser 
Felicidade e Sentido: Dois Aspectos da Vida Boa7
7 Extraído de Social Philosophy & Policy, v. 14, n. 1 (inverno, 1997).
* N. de T. No original, self-interest.
8 A visão descrita e defendida aqui mostra a influência das posições de Aristóteles e John Stuart Mill 
– e a minha total simpatia por elas. Não posso especificar a minha dívida para com eles; isso está em 
todo o texto.
** N. de R.T. No original meaningfulness.
*** N. de R.T. No original, meaningful activity.
9 Derek Parfit, Reasons and Persons (Oxford: Oxford University Press, 1984).
1 
nem sempre é fácil dizer o 
que realmente motiva al-
guém e nem sempre é fácil saber 
o que é verdadeiramente bom 
para alguém; contudo, se o ato 
de alguém for de fato motivado 
pelo que pensa ser o seu próprio 
bem, então é um ato de interesse 
próprio.
2 
embora a preocupação 
última de Wolf (que 
surge principalmente no final 
do trabalho) seja com questões 
pertencentes ao interesse próprio, 
o cerne do trabalho defende uma 
concepção particular de vida boa 
(uma noção que desempenha um 
papel crucial no argumento dela 
sobre o interesse próprio).
3 
de acordo com uma teoria 
hedonista, alguém sempre 
poderia satisfazer seu interesse 
próprio ao se conectar à máquina 
de experiência de nozick.
4 
tal teoria não impõe 
limitações nas preferências 
de uma pessoa. o bem dela foi 
incrementado na medida em que 
suas preferências, sejam lá quais 
forem, são satisfeitas.
736 laurence bonJour & Ann baker
coisas cuja bondade explica as prefe-
rências das pessoas, em vez de resultar 
delas. A plausibilidade desses últimos 
pensamentos explica o apelo das teorias 
de lista objetiva, de acordo com as quais 
o bem de uma pessoa inclui ao menos 
alguns elementos que são independen-
tes ou anteriores às suas preferências e 
ao efeito delas sobre a qualidade perce-
bida de sua experiência. Segundo essa 
visão, há alguns itens, idealmente espe-
cificáveis em uma “lista objetiva”, cuja 
relevância para uma vida plenamente 
bem-sucedida não é condicionada pela 
escolha de um indivíduo. 5
A concepção que estarei anteci-
pando, a saber, que a posse de sentido é 
um elemento da vida boa, compromete 
alguém com uma versão deste último 
tipo de teoria, pois a minha alegação é 
de que a posse de sentido é um aspecto 
não derivativo da vida boa – a sua bon-
dade não resulta do fato de que ela nos 
faz felizes ou do fato de que ela satisfaz 
as preferências da pessoa cuja vida está 
em pauta. Assim, segue-se que qualquer 
teoria que tome o interesse próprio como 
sendo uma questão completamente sub-
jetiva, em um sentido que identifique o 
interesse próprio com a qualidade subje-
tiva das experiências de uma pessoa ou 
em um sentido que permita os padrões 
do interesse próprio serem estabeleci-
dos pelas preferências subjetivas, deve 
ser inadequada. Ao mesmo tempo, seria 
um erro pensar que o bem objetivo que 
consiste em uma pessoa viver uma vida 
dotada de sentido* é um bem completa-
mente independente das experiências ou 
preferências subjetivas, como se pudes-
se ser bom que uma pessoa vivesse uma 
vida dotada de sentido, não importa se 
isso a torna feliz ou satisfaz as suas prefe-
rências ou não. De fato, como veremos, a 
própria ideia de que as atividades podem 
tornar dotada de sentido uma vida é, sem 
a confirmação da pessoa, duvidosa.
o sentido da vida
O que é uma vida dotada de sen-
tido? O ponto central do meu trabalho 
consistirá em explicar isso, pois a minha 
esperança é que, assim que a ideia for ex-
primida, será prontamente aceito que ela 
é um elemento de uma vida plenamente 
bem-sucedida.
Uma vida dotada de sentido é, an-
tes de mais nada, uma vida que tem em si 
a base para uma resposta afirmativa para 
as necessidades ou os anseios que são ca-
racteristicamente descritos como neces-
sários para o sentido. Tenho em mente, 
por exemplo, o tipo de perguntas que as 
pessoas fazem em seu leito de morte ou 
simplesmente na contemplação de sua 
eventual morte, sobre se as suas vidas 
foram (ou são) dignas de viver, se tive-
ram algum propósito, bem como o tipo 
de questão que alguém faz quando está 
considerando o suicídio e perguntam-se 
se têm alguma razão para seguir adiante. 
Se elas não são familiares nas próprias 
experiências pessoais, elas podem ser en-
contradas nos romances russos e na filo-
sofia existencialista. Embora surjam, em 
sua maior parte, em momentos de crise 
e de emoção intensa, elas também têm 
seu lugar em momentos de calma refle-
xão, quando se consideram as escolhas 
importantes da vida. Além disso, estão 
prontamente disponíveis em nossa cultu-
ra paradigmas daquilo que se pode con-
siderar vidas dotadas de sentido e sem 
sentido. As vidas de grandes realizações 
morais ou intelectuais – Gandhi, Madre 
Teresa, Albert Einstein – vêm à mente 
como vidas que são inquestionavelmente 
significativas (se alguma o é); vidas de 
desperdício e isolamento – as “vidas de 
silencioso desespero” de Thoreau, tipica-
mente anônima para o restante de nós, e 
a figura mítica de Sísifo – representam a 
falta de sentido.* 6
Para quais características gerais da 
posse de sentido nos levam essas imagens 
e como elas fornecem uma resposta para 
os anseios antes mencionados? Grosso 
modo, direi que vidas dotadas de sentido 
são vidas de engajamento ativo em pro-
jetos valiosos. É claro que muito precisa 
ser dito na elaboração dessa afirmação. 
Deixem-me começar discutindo as duas 
expressões principais, “engajamento ati-
vo” e “projetos valiosos”.
Uma pessoa está ativamente enga-
jada em algo se ela está ligada, excitada, 
envolvida com aquilo. Mais obviamente, 
estamos ativamente engajados nas coisas 
5 
somente de acordo com 
esse terceiro tipo de teoria 
é que o interesse próprio envolve 
exigências que são objetivas no 
sentido de que não dependem do 
que faz um indivíduo particular 
feliz nem do que ele de fato pre-
fere. o que são exatamente essas 
exigências objetivas depende 
obviamente do que está na “lista 
objetiva”.
6 
sísifo foi condenado pelos 
deuses a empurrar uma pe-
dra para cima de uma montanha, 
simplesmente para deixá-la rolar 
para baixo, e assim indefinida-
mente, pelo resto de sua vida.
* N. de R.T. No original, meaningful life. * N. de R.T. No original, meaninglessness.
Filosofia: textos fundamentais comentados 737
e com as pessoas pelas quais e por quem 
somos apaixonados. Os opostos de um 
compromisso ativo são o tédio e a aliena-
ção. Estar ativamente engajado em algo 
nem sempre é prazeroso no sentido co-
mum da palavra. As atividades nas quais 
as pessoas estão engajadas de forma ativa 
frequentemente envolvem tensão, peri-
go, esforço ou sofrimento (considere, por 
exemplo, escrever um livro, escalar uma 
montanha, treinar para uma maratona, 
cuidar de um amigo doente). Todavia, 
existe algo bom sobre o sentimento de 
engajamento: alguém se sente especial-
mente vivo (em geral, sem ficar pensan-
do acerca disso). 7
Que uma vida dotada de sentido 
deva envolver “projetos valiosos” será, eu 
espero, mais controverso, pois a expres-
são sugere um comprometimento com al-
gum tipo de valor objetivo. Isso não é aci-
dental, pois acredito que a ideia da posse 
de sentido e a preocupação de que as 
nossas vidas o tenham estão conceitual-
mente ligadas a tal comprometimento. 
De fato, essa é a conexão que quero de-
fender, porque não tenho nem uma teoria 
filosófica do que é o valor objetivo nem 
uma teoria substantiva sobre o que tem 
esse tipo de valor. O que está claro para 
mim é que pode não haver nenhum sig-
nificado para a ideia de posse de sentido 
sem uma distinção entre os modos mais 
ou menosvaliosos de alguém passar o 
tempo. O teste do que é valioso é, ao me-
nos parcialmente, independente do pra-
zer ou das preferências sem fundamento 
de um sujeito. 8
Primeiro, considere os anseios e as 
preocupações que as pessoas têm sobre 
o sentido, as suas ponderações sobre 
se suas vidas são dotadas de sentido, 
os seus juramentos de acrescentar mais 
sentido às suas vidas. O sentido dessas 
preocupações e resoluções não pode ser 
completamente capturado por uma ex-
plicação na qual o que uma pessoa faz 
com a sua própria vida é algo que não 
interessa, contanto que goste dela ou a 
prefira. Algumas vezes, as pessoas têm 
preocupações sobre o sentido, apesar de 
saberem que as suas vidas até o momento 
têm sido satisfatórias. Certamente, o seu 
prazer e o seu “engajamento ativo” com 
as atividades e os valores que elas agora 
veem como superficiais parecem apenas 
aumentar o sentimento da falta de senti-
do que as aflige. A sua percepção de que 
as suas vidas até agora têm sido sem sen-
tido não pode ser uma percepção de que 
as suas atividades não foram escolhidas 
ou divertidas. Quando elas procuram por 
fontes de sentido ou pelos caminhos para 
atribuir sentido às suas vidas, elas estão 
buscando projetos cujas justificações es-
tão em outro lugar.
Segundo, precisamos de uma ex-
plicação referente a por que certos tipos 
de atividades e envolvimentos parecem-
-nos contribuir para a posse de sentido, 
enquanto outros parecem intuitivamente 
inapropriados. Pense sobre o que dá sen-
tido à sua própria vida, à vida de seus 
amigos e à vida de seus conhecidos. Entre 
as coisas que tendem a surgir nessas lis-
tas, já mencionei as realizações morais e 
intelectuais, bem como as atividades em 
andamento que nos levam a elas. Para a 
maioria de nós, as relações com os ami-
gos e parentes são até mais importantes. 
As atividades estéticas (criativas e apre-
ciativas), o cultivo das virtudes pessoais e 
as práticas religiosas geralmente contam 
bastante. Por contraste, seria estranho, 
até mesmo bizarro, pensar em palavras 
cruzadas, em seriados ou em um tipo de 
jogo de computador, acerca do qual es-
tou tentando me livrar do vício, como 
algo que proporciona sentido às nossas 
vidas, embora não questione que eles 
nos proporcionem um tipo de satisfação 
e que são os objetos de escolha. Escolho 
algumas coisas, como chocolate e aulas 
de aeróbica, até mesmo por um conside-
rável custo (é irrelevante que essas esco-
lhas particulares possam ser relativas), 
de forma que devo considerá-las valiosas 
em algum sentido. Porém, elas não são 
o tipo de coisas que tornam a vida digna 
de viver.
Defendo que o “engajamento ativo 
em projetos valiosos” responde às neces-
sidades a que uma explicação do sentido 
da vida deve dirigir-se. Se uma pessoa 
está ou esteve assim engajada ativamen-
te, então ela tem uma resposta para a 
questão referente a se a sua vida é ou foi 
valiosa, se ela tem ou teve um propósito. 
Quando alguém procura por modos de 
atribuir sentido para a sua vida, está em 
busca (embora talvez não sob essa descri-
ção) de projetos valiosos pelos quais pos-
sa ficar entusiasmado. 9 Esse enfoque 
também explica por que pensamos em 
algumas atividades e projetos, e não em 
outros, como contribuindo para o sentido 
7 
Assim, não importa o quão 
objetivamente importante a 
vida de uma pessoa possa parecer 
(pense em vários exemplos aqui), 
essa vida não é dotada de sentido, 
de acordo com Wolf, se a pessoa 
está entediada ou apática em 
relação a ela.
8 
suponha, por exemplo, que 
você realmente goste de 
contar folhas de grama de dife-
rentes gramados. A afirmação de 
Wolf é que essa atividade deve ter 
algum valor independente (além 
do fato que você goste disso) para 
que ela tenha valor objetivo. (Ver 
a Questão para discussão 2.)
9 
note que você tem de ser 
capaz de ficar entusiasmado 
acerca do projeto. se não está 
entusiasmado, então você não se 
engajará ativamente, segundo a 
visão de Wolf.
738 laurence bonJour & Ann baker
da vida. Alguns projetos ou atos particu-
lares são valiosos, mas também muito en-
tediantes ou muito mecânicos para serem 
fontes de sentido. As pessoas não con-
ferem sentido para a vida reciclando ou 
assinando cheques para a Oxfam e para a 
ACLU.* Outros atos e atividades, embora 
altamente prazerosas e profundamente 
envolventes, como andar de montanha-
-russa ou encontrar uma estrela de cine-
ma, não parecem ter o tipo certo de valor 
para contribuir para o sentido da vida.
Bernard Williams certa vez distin-
guiu desejos categóricos de outros dese-
jos. Os desejos categóricos nos dão razão 
para viver – eles não são estabelecidos sob 
a suposição de que viveremos. Os tipos 
de coisas que dão sentido à vida tendem 
a ser objetos de desejo categórico. Nós os 
desejamos, ao menos eu assim sugeriria, 
porque os consideramos valiosos. Eles 
não são valiosos simplesmente porque os 
desejamos ou simplesmente porque tor-
nam as nossas vidas mais agradáveis. 10
Grosso modo, então, de acordo com 
a minha proposta, uma vida dotada de 
sentido deve satisfazer dois critérios 
adequadamente conectados. Primeiro, 
deve haver engajamento ativo e, segun-
do, esse engajamento deve ser em (ou 
com) projetos valiosos. Uma vida é sem 
sentido se falta a ela engajamento ativo 
com alguma coisa. Uma pessoa que está 
desanimada ou alienada da maior parte 
das coisas que está fazendo em sua vida 
é uma pessoa cuja vida pode ser conside-
rada sem sentido. Note que ela pode de 
fato estar desempenhando funções de va-
lor. Uma mãe e dona de casa, um doutor 
ou um motorista de ônibus podem estar 
fazendo, com competência, um trabalho 
socialmente valioso. No entanto, porque 
não está engajada em seu trabalho (ou, 
como estamos supondo, por nada mais 
em sua vida), essa pessoa não tem de-
sejos categóricos que lhe forneçam uma 
razão para viver. Ao mesmo tempo, al-
guém que está ativamente engajado pode 
também viver uma vida sem sentido se 
os objetos de seu envolvimento são com-
pletamente sem valor. É difícil dar exem-
plos desse tipo que sejam incontroversos 
sem ser bizarros. Porém, há exemplos 
tanto bizarros quanto controversos. Na 
categoria bizarra, podemos considerar 
os casos patológicos: alguém cuja pai-
xão exclusiva na vida é colecionar tiras 
de borracha, memorizar o dicionário ou 
fazer cópias à mão de Guerra e Paz. Os 
casos controversos incluirão o advogado 
de uma corporação que sacrifica a saúde 
e a vida privada pelo sucesso ao longo 
de sua escalada profissional, o devoto de 
um culto religioso, ou o criador de porcos 
que compra mais terra para plantar mais 
milho, para alimentar mais porcos, para 
comprar mais terra e plantar mais milho, 
para criar mais porcos.
Podemos resumir o meu propósito 
no seguinte lema: “O sentido surge quan-
do a atração subjetiva encontra a atrati-
vidade objetiva”. A ideia é de que, em um 
mundo em que algumas coisas são mais 
valiosas do que outras, o sentido surge 
quando um sujeito descobre ou desen-
volve uma afinidade por uma ou várias 
coisas tipicamente mais valiosas e tanto 
tem quanto faz uso da oportunidade de 
se engajar com ela ou com elas de um 
modo positivo.
Uma vantagem do lema é que ele 
evita, de algum modo, a referência enga-
nosa a “projetos”. Esse termo não é ideal 
em sua sugestão de tarefas bem-definidas 
e bem-orientadas por fins. Para ser mais 
exata, muitos projetos de fato atribuem 
sentido à vida – dominar um campo de 
estudo, construir uma casa, transformar 
um brejo em jardim, curar um câncer –, 
mas grande parte do que dá sentido à 
vida consiste em relações e envolvimen-
tos duradouros, com amigos, com a famí-
lia, com a comunidade científica, com a 
igreja, com o balé ou com o xadrez. Esses 
aspectos duradouros da vida dão origem 
e são de certo modo constituídos por pro-
jetos – você planeja uma festa surpresa 
para o seu esposo, treina um pequeno 
time de uma liga, faz um parecer para 
o artigo de um periódico –, mas o sen-
tido vem menos de projetos individuali-
zadosdo que de grandes envolvimentos 
dos quais eles fazem parte. O lema, além 
disso, é intencionalmente vago, pois se 
julgamentos pré-teóricos sobre o sentido 
até mesmo se aproximam da verdade, en-
tão não somente os objetos de valor, mas 
também os tipos de interação com eles, 
os quais são capazes de contribuir para o 
seu sentido, são imensamente variáveis. 
Alguém pode obter sentido ao criar, pro-
mover, proteger coisas (valiosas), ao aju-
10 
de acordo com a posição 
de Wolf, a ordem de depen-
dência aqui é muito importante. 
se você está atraído por algo 
porque julga que é valioso, então 
isso pode dar sentido à sua vida. 
porém, se você julga que isso é 
valioso meramente porque está 
atraído por ele e você não tem 
nenhuma razão além do seu 
próprio prazer de ser atraído por 
aquilo, então isso não é capaz de 
dar sentido à sua vida.
* N. de T. American Civil Liberties Union ou União 
Americana para as Liberdades Civis.
Filosofia: textos fundamentais comentados 739
dar as pessoas a quem ama e as pessoas 
necessitadas, ao alcançar níveis de talen-
to e excelência, ao superar obstáculos, ao 
alcançar entendimento e até mesmo ao 
desabafar ou apreciar ativamente o que 
está ali para ser apreciado. 11
É parte da nossa tarefa, se não da 
nossa tendência natural, como filósofos, 
sermos céticos – sobre a correção desses 
julgamentos pré-teóricos, sobre a nossa 
habilidade confiável para distinguir as 
atividades significativas das atividades 
não significativas e sobre a coerência 
dessa distinção. Não estou muito interes-
sada pelas duas primeiras preocupações. 
Admitindo que as distinções são coeren-
tes e que algumas atividades são mais va-
liosas do que outras, nossos julgamentos 
contemporâneos de quais atividades são 
valiosas, julgamentos esses que são cultu-
ralmente limitados, estão condenados a 
ser parcialmente errôneos. A história está 
repleta de gênios, artistas, inventores, 
exploradores desvalorizados, cujas ativi-
dades em seu tempo foram desprezadas 
e de modelos de comportamento e rea-
lizações que mais tarde parecem ter sido 
valorizados. Embora possamos melhorar 
nossos julgamentos, tanto particulares 
quanto gerais, através de um esforço não 
preconceituoso, concentrado e comum 
para examinar e articular as suas bases 
(um projeto que me sensibiliza por ser 
valoroso e intrinsecamente interessan-
te), a esperança ou expectativa de que tal 
exame produzirá um método seguro para 
distinguir as atividades valiosas das ati-
vidades sem valor parece excessivamen-
te otimista. Por que respeitamos mais as 
pessoas que se consagram ao xadrez do 
que as pessoas que se tornam ganhadoras 
no pinball? Por que admiramos mais as 
estrelas do basquete do que os campeões 
em pular corda? Por que é mais valioso 
escrever um livro sobre filosofia da lin-
guagem do que escrever um livro sobre 
a vida sexual (de alguma celebridade)? 
É proveitoso perguntar e responder a tais 
questões, à medida que podemos, para 
ampliar e corrigir os nossos horizontes e 
aumentar o nosso entendimento. Porém, 
não precisa ser um problema sério nos-
sa falta de habilidade para dar respostas 
completas e adequadas ou para ficarmos 
confiantes nos detalhes de nossas ava-
liações. No final das contas, o ponto de 
reconhecimento da distinção não é hie-
rarquizar vidas dotadas de sentido. Em 
geral, não há nenhuma necessidade de 
julgar indivíduos ou até mesmo ativida-
des em que as pessoas querem engajar- 
-se. A questão é, em um nível mais amplo,
entender os elementos de nosso próprio
bem ou dos outros e ter uma ideia me-
lhor do tipo de considerações que forne-
cem razões para viver nossa vida de uma
maneira em vez de outra. 12
O ponto que estou desenvolvendo é 
que a posse de sentido é uma parte não 
derivativa do bem de um indivíduo e que 
ela consiste em um engajamento ativo em 
projetos e atividades valiosas. Embora me 
pareça que esse ponto e grande parte de 
sua utilidade possa ser sustentado apesar 
das reconhecidas dificuldades de identifi-
car precisamente quais são esses projetos 
ou atividades, ele poderia ser completa-
mente destruído caso se descobrisse que 
não existem, de modo algum, coisas tais 
como projetos ou atividades valiosas – 
caso se descobrisse, em outras palavras, 
como Bentham pensou, que qualquer 
jogo infantil é tão bom quanto a poesia, 
não por causa de alguma excelência não 
descoberta até agora nos jogos infantis, 
mas porque a própria ideia de distinção 
dos valores é falha e incoerente. Se não 
há projetos valiosos (em contraste com 
outros projetos), então não há coisas 
como vidas mais ou menos significativas 
e, portanto, não pode ser parte do bem 
de uma pessoa viver uma vida mais dota-
da de sentido em vez de uma vida menos 
dotada de sentido. Se a ideia de que um 
projeto que vale a pena é uma fraude ou 
um engano, então a minha posição sobre 
o interesse próprio está inacabada.
11 
É tão fácil ver como as 
atividades que contribuem 
para os projetos ou objetivos 
bem-definidos contam para 
uma vida dotada de sentido que 
alguém pode até mesmo falhar 
em apreciar a importância de 
atividades mais comuns – aquelas 
que não contribuem com um 
projeto específico, mas que ainda 
são importantes para uma vida 
dotada de sentido por causa dos 
relacionamentos e envolvimentos 
que refletem.
12 
Aceitar a distinção entre 
atividades significativas e 
não significativas não pressupõe 
que, na prática, seja fácil distinguir 
as duas ou que não possam existir 
casos discutíveis. ela também não 
exige que você esteja preocupado 
em hierarquizar a vida de seus 
amigos e de sua família (e de você 
mesmo) a esse respeito.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para 
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual 
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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