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<p>SETTING PSICANALÍTICO</p><p>AULA 4</p><p>Prof. Marcelo de Oliveira</p><p>2</p><p>CONVERSA INICIAL</p><p>O setting, traduzido comumente como enquadramento, é definido pela</p><p>soma de todos os procedimentos que organizam, normatizam e possibilitam o</p><p>processo psicanalítico (Zimerman, 2007). Freud ([1912] 1913) afirma que a</p><p>situação analítica é efetivamente caracterizada não simplesmente pelos seus</p><p>dispositivos, mas principalmente pela posição simbólica assumida pelo analista.</p><p>A instituição pode ser conceituada como um grupo que passa a existir a partir de</p><p>um ato fundador, que lhe dá estabilidade como conjunto e continuidade no</p><p>tempo.</p><p>Vamos estudar as implicações da posição do analista enquanto função do</p><p>setting analítico relacionadas à instituição. A instituição é fundamentalmente uma</p><p>organização simbólica, a partir de um ato (mito) originário, tal como a estrutura</p><p>do sintoma. É partindo da instauração do setting (posição) psicanalítico que</p><p>serão propostas as intervenções nas instituições.</p><p>TEMA 1 – INSTITUIÇÕES E O SETTING PSICANALÍTICO</p><p>A instituição pode ser conceituada como um grupo que passa a existir a</p><p>partir de um ato fundador, que lhe dá estabilidade como conjunto e continuidade</p><p>no tempo.</p><p>O mal-estar que os sujeitos apresentam na instituição é exposto na</p><p>forma de discurso direcionado a um Outro. É por intermédio dele que</p><p>o sujeito constrói seus laços na sociedade. Por se tratar de um</p><p>discurso, segundo Birman (1994), pode-se constituir o método analítico</p><p>como um instrumento de trabalho para o psicanalista. Pelo discurso,</p><p>temos a possibilidade de exercer a práxis psicanalítica em intenção e</p><p>extensão, pois ele contém aquilo que escapa da ordem</p><p>representacional, apontando para algo que se repete; isto é, revelando</p><p>o seu singular, que foi deixado de lado, na formação do laço. (Neto;</p><p>Silva, 2022)</p><p>A instituição é fundamentalmente uma organização simbólica, a partir de</p><p>um ato (mito) originário, tal como a estrutura do sintoma. Esta relação é possível</p><p>entre ato originário e estrutura do sintoma devido ao fato de serem ambos</p><p>sustentados e organizados por uma narrativa.</p><p>Além do romance familiar (cabe aqui recordar a expressão de Lacan:</p><p>“o mito individual do neurótico”), e incluindo familiar antes de ser grupal,</p><p>o mito se desdobra em cada um. Parcialmente transmitido, em grande</p><p>parte construído/reconstruído pelo sujeito, que encontra no mito, a</p><p>3</p><p>priori, as representações da causalidade de suas vivências e de suas</p><p>obras, e as representações que dão de seus laços com uma</p><p>pluralidade de outros sujeitos. Esses laços e esses sujeitos, ele os</p><p>identifica assim na mesma fonte, no mesmo momento em que os</p><p>introjeta, quando “eles, aqueles, esse pessoal” se tornam “meu grupo”,</p><p>minha instituição, minha sociedade. (Nicolle; Kaës, 2011)</p><p>É partindo da instauração do setting (posição) psicanalítico que serão</p><p>propostas as intervenções nas instituições. A função do analista e suas</p><p>intervenções devem ser dimensionadas a partir da posição que ocupa em</p><p>relação à instituição.</p><p>Freud observa que tanto nos grupos formalizados (instituições) quanto</p><p>nos indivíduos a vida anímica é constituída por um mito de origem. Este mito é</p><p>um ato fundador na medida em que integra um contexto anterior ao início da</p><p>instituição, os motivos e os objetivos que propiciaram sua instauração.</p><p>A vida anímica da instituição (bem como a do sujeito) é a perpetuação do</p><p>ato fundador pelos fios discursivos que tecem o dia a dia das instituições, tanto</p><p>o discurso oficial quanto o discurso informal. O setting analítico se faz no espaço</p><p>da intersecção entre o discurso formal e informal das instituições.</p><p>O analista desenvolverá seu campo e sua estratégia ali onde pode escutar</p><p>os ditos e interditos da instituição. As intervenções do analista tomarão como</p><p>direção a partir da posição simbólica assumida entre o que é claramente</p><p>expresso e o que se apresenta encoberto, com o objetivo de distensionar crises</p><p>derivadas entre o mito originário e as demandas atuais, possibilitando outros</p><p>contornos entre as linhas identificatórias da filiação e de diferentes modalidades</p><p>de reconhecimento.</p><p>Não se trata apenas de relacionar a mítica grupal à sua fonte</p><p>inconsciente, mas de situar a intervenção do analista na instituição com</p><p>relação a esse universal. Trata-se do seguinte: a análise dos processos</p><p>e conteúdo dos momentos mitopoiéticos deve permitir ao psicanalista</p><p>pensar sua intervenção como um terceiro na dinâmica elaborativa</p><p>grupal de uma instituição. A análise — o que não quer dizer a</p><p>interpretação comunicada — da mítica do grupo é um elemento</p><p>metodológico essencial da intervenção elaborativa e da análise das</p><p>transferências do grupo e no grupo. Escutar como analista o mito de</p><p>um coletivo significa, antes de tudo, levar em conta a diacronia desse</p><p>grupo e a dualidade mito/histórica que acompanha todo grupo. (Nicolle;</p><p>Kaës, 2011)</p><p>A compreensão é uma função diretamente relacionada ao sentido. O</p><p>sentido é produzido e produz vínculo social. Compartilhar sentidos (significados)</p><p>produz identificação e pertencimento. Na instituição, essa relação de</p><p>4</p><p>identificação e pertencimento pode ser fonte de embaraço e mal-estar entre</p><p>indivíduo e coletivo, sendo neste ponto fonte de expectativas e frustrações que</p><p>podem e devem ser objeto da intervenção do analista. Ao escutar, o analista</p><p>busca alcançar o que está para além do sentido coletivamente atribuído. Sem</p><p>desconsiderar o contexto, visa a intencionalidade do sujeito que nem sempre é</p><p>compartilhada ou produz sentido na instituição, e vice-versa.</p><p>A escuta do analista está direcionada para o que está dito nas</p><p>“entrelinhas”, no que está “interditado”, posto que aí se encontra o conteúdo do</p><p>recalque. Suspender, ou adiar a compreensão, é função de um tempo necessário</p><p>para que se produza, através da fala, a abertura para o sentido inconsciente.</p><p>Produzindo uma escuta neste “entre” para fazer ressoar os sentidos que</p><p>podem ser reelaborados pela instituição e que a pertencem e identificam e, ao</p><p>mesmo tempo, nos sujeitos que a constituem. Reordenando e reposicionando</p><p>laços sociais e vínculos entre os sujeitos e estes entre a instituição é uma</p><p>proposta cabível ao analista no setting psicanalítico nas instituições.</p><p>TEMA 2 – O SETTING FÍSICO E O USO DO DIVÃ</p><p>O divã, para o setting psicanalítico, está diretamente ligado à função da</p><p>transferência. Seu uso é uma estratégia conduzida pelo fundamento ético de</p><p>uma análise. Sendo a transferência uma atualização da realidade do</p><p>inconsciente do analisante, espera-se que por esta via sejam apresentadas</p><p>projeções, fantasias e todos os demais elementos que compõem o cenário da</p><p>relação do sujeito com o objeto causa de desejo.</p><p>O divã, essa peça do mobiliário, tornou-se há muito símbolo de uma</p><p>psicanálise, ou até mesmo d’A psicanálise. Como significante, ele</p><p>representa para o Outro social o psicanalista, qualificado de herdeiro</p><p>de Freud. […] Para a IPA, trata-se de uma norma padronizada da cura-</p><p>padrão, a outra norma sendo a imposição da duração de pelo menos</p><p>quarenta e cinco minutos por sessão, sem mencionar a</p><p>regulamentação da frequência das sessões por semana. Com Lacan,</p><p>varre-se a padronização — o setting analítico é rompido para que o</p><p>analista possa manejar a sessão de acordo com a única regra imposta</p><p>ao analisante: a associação livre. Contudo, Lacan conservou a</p><p>condição do divã bem como as entrevistas preliminares: duas</p><p>condições intimamente ligadas, uma vez que a indicação do divã</p><p>pontua o fim dessas entrevistas, marcando a entrada em análise. O</p><p>fato de indicar aos pacientes que devem deitar será um procedimento</p><p>meramente técnico? É o que pode parecer à primeira vista. No entanto,</p><p>com o retorno a Freud promulgado por Lacan, aprendemos que esse</p><p>retorno é orientado: trata-se de buscar o fundamento ético a todo e</p><p>5</p><p>qualquer procedimento técnico para remetê-lo à estrutura em causa.</p><p>O</p><p>divã tampouco deve escapar a isso. (Quinet, 2005)</p><p>O divã é um dispositivo para viabilizar a manutenção da transferência com</p><p>o analista e seu deslocamento imaginário, para assim recalibrar as demandas</p><p>que se atualizam na análise. Este é o reposicionamento e fundamento ético que</p><p>se busca em uma análise. Uma trajetória de “falar para o analista” para alcançar</p><p>uma posição de falar com (na presença) o analista.</p><p>Esta posição ética é, em outras palavras, um modo de estabelecer a fala</p><p>com uma deflação do aspecto imaginário do discurso. Ou seja, o aspecto</p><p>imaginário traz em primeiro plano uma série de juízos de valor: será que serei</p><p>aceito, admirado, rejeitado? Como devo fazer para chamar a atenção? Para ser</p><p>respeitado? Estes julgamentos, que estão diretamente associados ao aspecto</p><p>narcísico e egocentrado da personalidade, produzem uma tensão (ou ansiedade,</p><p>para usar um termo mais corriqueiro) devido à relação que aí está implicada.</p><p>Relação de dependência da aprovação e autorização do outro que é</p><p>colocado em um lugar de idealização, um lugar “superior”, originário de uma</p><p>fantasia social de concorrência e competitividade, estabelecendo lugares</p><p>imaginários, convencionados culturalmente, tais como: “quem pode mais chora</p><p>menos”; ou “manda quem pode e obedece quem tem juízo”.</p><p>A passagem para o divã, ao deslocar o olhar do analisante do outro</p><p>semelhante (pessoa do analista) para um olhar/escutar a si mesmo (lugar do</p><p>Outro o qual o analisante habita enquanto sujeito de linguagem), tem por</p><p>finalidade produzir este movimento de deslocamento, melhor dizendo,</p><p>descolamento do desejo da demanda.</p><p>A principal razão do divã na análise não é, portanto, nem de ordem</p><p>histórica nem pessoal: ela se deve à estrutura da transferência. Trata-</p><p>se de uma tática, cujo objetivo é dissolver a pregnância do imaginário</p><p>da transferência, para que o analista possa distingui-la no momento de</p><p>sua pura emergência nos dizeres do analisante. […] Em outros termos,</p><p>trata-se de esmaecer a transferência imaginária para favorecer a</p><p>emergência da transferência no significante — o que podemos</p><p>aproximar do algoritmo da transferência, onde só há significantes.</p><p>Privilegiar a fala se acompanha, portanto, da redução do visual, que</p><p>Lacan designa como o campo exemplar do engodo do desejo, na</p><p>medida em que ele é protegido pela imagem. O olho institui, na relação</p><p>do sujeito com o outro imaginário, o desconhecimento de que sob esse</p><p>desejável há um desejante. Cabe a essa função chamada por Lacan</p><p>de desejo do analista ir contra esse desconhecimento, e fazer com que,</p><p>sob esse objeto de desejo que detém o analista, surja para o analisante</p><p>6</p><p>a interrogação sobre sua própria posição em relação ao desejo do</p><p>Outro.</p><p>Com o dispositivo de fazer o analisante deitar no divã, apaga-se a</p><p>imagem do outro, que representa a persona do analista, e o ideal do</p><p>Outro tenderá a ocupar o seu lugar. (Quinet, 2005)</p><p>Esta trajetória marca e busca reafirmar a modificação no estatuto do</p><p>objeto causa do desejo, que passa de uma posição reificada para assumir a</p><p>dignidade do objeto a (“a Coisa”/das ding freudiana). Este movimento é correlato</p><p>à assunção de uma retificação subjetiva, de um lugar de alienação enquanto</p><p>objeto do desejo do outro para um modo (lugar) de sujeito desejante.</p><p>Em outras palavras, o deslocamento do olhar, na passagem para o divã,</p><p>é correlato ao isolamento e destacamento no olhar do objeto da pulsão. Agora</p><p>não estando mais face a face, o analista buscará destacar na fala do paciente o</p><p>objeto pulsional que se evidenciava no vínculo pelo olhar. Ou seja, o objeto</p><p>pulsional é o que produz a possibilidade da troca e, portanto, o vínculo</p><p>transferencial.</p><p>Estando no divã, o analisante perde o olhar como vínculo com o analista</p><p>durante a sessão, mas não perde o objeto transferencial que agora será</p><p>destacado pela sua presença na fala. O tratamento psicanalítico tem como</p><p>metodologia destacar o objeto pulsional (objeto a) de suas formas imaginárias,</p><p>para resgatar sua natureza simbólica de articulação. O divã é mais um dispositivo</p><p>que o analista pode vir a utilizar para realizar esta operação. Porém, esta</p><p>operação não é dependente do divã em si, mas é uma operação que se realiza</p><p>nos deslocamentos que esta passagem para o divã pode proporcionar.</p><p>TEMA 3 – SETTING ON-LINE</p><p>No setting analítico on-line, são preservados os elementos que compõem</p><p>o setting presencial, com as seguintes diferenças:</p><p>• ausência do divã;</p><p>• inserção de plataforma digital como espaço da sessão.</p><p>A ausência do divã introduz o manejo transferencial pela intermediação</p><p>do dispositivo eletrônico, assim é preciso que, em primeiro lugar, o analista tenha</p><p>disponível para seu uso um equipamento que possibilite uma boa conexão com</p><p>o paciente (isento de ruídos, com estabilidade no sinal etc.).</p><p>7</p><p>Estabelecidas as condições materiais para o atendimento on-line,</p><p>evidencia-se que a presença e, portanto, a relação transferencial mediada pelo</p><p>dispositivo eletrônico, são também moduladas pelas intercorrências da</p><p>transmissão. Ou seja, uma estratégia possível, por exemplo, se o analista verifica</p><p>que o paciente está demasiadamente “preso” à imagem da tela durante a</p><p>sessão, é alternar sessões com a câmera ligada e outras com a câmera</p><p>desligada.</p><p>É importante lembrar o quanto o aspecto imagético é uma função em que</p><p>o significado é prevalente em relação ao significante. Em outras palavras, uma</p><p>imagem sempre significa algo, sempre diz algo, tal como a expressão popular</p><p>que afirma: “Uma imagem vale mais do que mil palavras”.</p><p>No método psicanalítico, que é um tratamento que se realiza pela fala, o</p><p>analista deve conduzir o setting on-line de modo a manter a prevalência da fala</p><p>sobre a incidência da imagem. Em termos técnicos, isso aponta para uma escuta</p><p>que privilegia o aspecto significante da fala, isto é, as relações de metáfora e</p><p>metonímia com que se articula o significante.</p><p>Destarte, pode-se afirmar que não é a distância física que promove</p><p>aproximação ou distanciamento na relação transferencial, mas a maneira como</p><p>o analista se utiliza do recurso on-line. O analista deve, a partir do distanciamento</p><p>físico, potencializar a ligação/relação pela escuta.</p><p>O universo da linguagem que abarca a compreensão e o entendimento é</p><p>também composto por interferências e interrupções. Estas podem ser</p><p>potencializadas no modo remoto de atendimento. Contudo, não são obstáculos</p><p>para que se realize o tratamento psicanalítico, posto que a linguagem, sendo</p><p>baseada no equívoco, o esforço de compreensão e apreensão é constante nesta</p><p>práxis.</p><p>Logo, o mal-entendido, que pode ser acentuado na modalidade on-line</p><p>pela mediação do aparelho eletrônico (devido a inconsistências em seu</p><p>funcionamento) sob o manejo transferencial é exercício de dissolução da ilusão</p><p>narcísica de compreensão, que é estabelecida e reforçada pela imagem. Na</p><p>medida em que o processo de significação fixa um sentido, a funcionalidade</p><p>criativa da palavra associada à intensidade afetiva que preside o inconsciente,</p><p>fica reduzida pelo aspecto conservador do processo de significação.</p><p>8</p><p>Na modalidade on-line pode haver uma “vantagem” quanto às</p><p>possibilidades de diluição da consistência imaginária da transferência, devido às</p><p>intercorrências da mediação eletrônica. Desde que a linha prevalente do manejo</p><p>transferencial seja o fio simbólico da linguagem e não o engessamento da</p><p>imagem.</p><p>TEMA 4 – INSTITUIÇÕES, SAÚDE MENTAL E SETTING PSICANALÍTICO</p><p>O movimento conhecido como Reforma Psiquiátrica, que desde seu início</p><p>tem como objetivo a desinstitucionalização da loucura e a abolição de práticas</p><p>de enclausuramento como tratamento para o sofrimento psíquico, tem um marco</p><p>histórico importante com o psiquiatra italiano Franco Basaglia em 1961, quando</p><p>assume a direção do Hospital Provincial Psiquiátrico de Gorizia, no extremo norte</p><p>da Itália.</p><p>As discussões em torno deste tema ainda</p><p>hoje ocorrem e não há um</p><p>consenso em torno do tema saúde mental, tratamento, movimento</p><p>antimanicomial e reforma psiquiátrica. Contudo, a necessidade de não silenciar</p><p>a loucura, como adverte Foucault, e a busca por tratamentos que não sejam</p><p>estigmatizantes, mas, ao contrário, promovam a inserção ampla e irrestrita da</p><p>loucura na sociedade é um eixo em torno do qual os debates vêm se</p><p>desenvolvendo.</p><p>O fundamento da escuta e os princípios da ação do analista são as</p><p>principais contribuições do setting psicanalítico para a reforma das instituições</p><p>de tratamento em saúde mental. De uma prática de institucionalização da loucura</p><p>que reduzia o paciente a um mero objeto do saber psiquiátrico busca-se, desde</p><p>os tempos de Freud até hoje, a transformação em práticas que acolham e</p><p>escutem “a fala do louco”.</p><p>A categoria comum que agrupa todos aqueles que residem nas casas</p><p>de internamento, é a incapacidade em que se encontram de tomar</p><p>parte na produção, na circulação ou no acúmulo das riquezas (seja por</p><p>sua culpa ou acidentalmente). A exclusão a que são condenados está</p><p>na razão direta desta incapacidade e indica o aparecimento no mundo</p><p>moderno de um corte que não existia antes. O internamento foi então</p><p>ligado às suas origens e no seu sentido primordial a esta</p><p>reestruturação do espaço social.</p><p>Este fenômeno foi duplamente importante para a constituição da</p><p>experiência contemporânea da loucura. Inicialmente, porque a loucura,</p><p>durante tanto tempo manifesta e loquaz, por tanto tempo presente no</p><p>horizonte, desaparece. Entra num tempo de silêncio do qual não sairá</p><p>9</p><p>durante um longo período; é despojada de sua linguagem; e se se pode</p><p>continuar a falar dela, ser-lhe-á impossível falar de si mesma.</p><p>Impossível, pelo menos até Freud que, pioneiro, reabriu a possibilidade</p><p>para a razão e a desrazão de comunicar no perigo de uma linguagem</p><p>comum, sempre prestes a romper-se e a desfazer-se no inacessível.</p><p>(Foucault, 1975)</p><p>Este processo é reconhecido como humanização das instituições de</p><p>tratamento em saúde mental e continua acontecendo até os dias de hoje. A</p><p>Psicoterapia Institucional praticada na Clinique de La Borde é um exemplo de</p><p>como o setting psicanalítico atravessa e abarca a instituição como um todo. Na</p><p>condução da instituição, a fala/saber do paciente é o eixo central de todas as</p><p>demais atividades.</p><p>A posição e a função do psicanalista, como agente do reconhecimento e</p><p>da leitura do inconsciente, possibilitam uma revisão das práticas e dos</p><p>fundamentos tanto da instituição em si quanto do campo instituído como saúde</p><p>mental. Buscando dar um “giro” no status quo que se estabeleceu em torno da</p><p>loucura, pode-se afirmar que o setting psicanalítico, nestas modalidades</p><p>institucionais de tratamento, é uma prática que visa ser sustentada não apenas</p><p>pelos psicanalistas, mas por todos aqueles que buscam, antes de tudo, acolher</p><p>a experiência subjetiva com todas as suas nuances.</p><p>As atividades-meio não são separáveis das atividades propriamente</p><p>terapêuticas, pois acredita-se que é a vida comunitária por si mesma</p><p>que deve, em primeiro lugar, promover a “cura” ou o tratamento do</p><p>sofrimento psíquico grave. Segundo uma definição de Jean Oury, a</p><p>principal característica das psicoses, e fonte de intenso sofrimento, são</p><p>o isolamento mental e a alienação do mundo. Esta, no entanto, não se</p><p>confunde com a alienação social, da qual nenhum de nós escapa, e</p><p>que é, igualmente, analisada na vida comunitária. Por essa razão</p><p>teórico-clínica, todas as atividades devem ser de responsabilidade de</p><p>todos, de modo a restaurar a comunicação e a troca interrompidas na</p><p>vivência psicótica. A noção de troca é fundamental na teorização</p><p>lacaniana de Oury. Trocam-se bens, afetos, palavras. (Passos, 2009)</p><p>É, portanto, a própria noção de sofrimento ou transtorno mental que é</p><p>redimensionada pelo setting psicanalítico aplicado nas instituições. De uma</p><p>dimensão patologizante para uma consideração da experiência fundamental do</p><p>sujeito, certamente marcada por uma grande carga de sofrimento, porém não</p><p>descolada da vida e da sua possibilidade de formação e transformação de saber.</p><p>10</p><p>TEMA 5 – LOUCURA E DESINSTITUCIONALIZAÇÃO</p><p>A Lei n. 10.216/2001 versa sobre a proteção e os direitos das pessoas</p><p>portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde</p><p>mental, passando do modelo hospitalocêntrico para um modelo descentralizado</p><p>e com fortalecimento no território. Deste modo, busca-se um tratamento em que</p><p>a pessoa acometida com intenso sofrimento psíquico não seja excluída do</p><p>convívio social, pois isso tende a agravar o processo de alienação decorrente</p><p>desse tipo de sofrimento.</p><p>Assim sendo, o tratamento tem como um dos objetivos fortalecer vínculos</p><p>e realizar um processo de reconhecimento e subjetivação dessa experiência</p><p>marcada por uma importante prevalência da angústia e de outros sintomas que</p><p>podem implicar em prejuízos consideráveis no modo do sujeito ser e estar no</p><p>mundo. A psicanálise contribuiu significativamente para esta mudança,</p><p>sobretudo com as reflexões críticas à relação transferencial. Revisando o modelo</p><p>transferencial que se baseava no saber/poder do psiquiatra/analista como único</p><p>na direção de tratamento, para um modelo que reorganiza o lugar do analista</p><p>como um lugar de reconhecimento e acolhimento do saber constituído da</p><p>posição subjetiva do analisante.</p><p>Neste sentido, situa-se a direção de tratamento a partir do saber</p><p>inconsciente do analisante, e isto é próprio do setting psicanalítico. Ou seja, do</p><p>pedido inicial de tratamento advindo do paciente para o analista, este ao acolher</p><p>a demanda a ele dirigida, através da escuta, busca apontar e colocar em marcha</p><p>o inconsciente do paciente.</p><p>Sabe-se da hegemonia da representação da coisa mental como reflexo</p><p>ou tradução da atividade do cérebro: o marketing que explora a</p><p>dimensão aparentemente milagrosa da ciência aí está para nos</p><p>convencer. A este propósito aliás, o império mundial da psiquiatria</p><p>biológica nos faz refletir sobre o curioso modo de operação do poder:</p><p>como pode um discurso aparentemente tão ingênuo, tão facilmente</p><p>vulgarizável, como nos mostram os prospectos dos laboratórios e as</p><p>cenas do Fantástico, encontrar registro de cientificidade? Como podem</p><p>tais bobagens, que nos fazem sorrir com desdém porque nos parecem</p><p>tão facilmente refutáveis, ter um alcance, uma tal penetração?</p><p>Como pode o cérebro se apresentar como mente ou espírito? Ora, não</p><p>é difícil para o espírito reinstalar-se nessa coisa mental tomada como</p><p>apresentação do cérebro; como lembra Lacan em seu seminário sobre</p><p>o ato analítico, “toda esta construção dita materialista ou organicista é</p><p>bastante bem-vinda pelas autoridades espirituais”. Com base em outra</p><p>materialidade, aquela do significante a psicanálise nos oferece uma</p><p>11</p><p>perspectiva inteiramente distinta, irredutível à recuperação idealista.</p><p>Novamente nas palavras de Lacan, agora em Televisão: “O homem</p><p>não pensa com sua alma […] ele pensa porque uma estrutura, a da</p><p>linguagem […] recorta seu corpo, e que nada tem a ver com a</p><p>anatomia”. (Lobosque, 1997)</p><p>O setting analítico é o espaço privilegiado em que o saber inconsciente do</p><p>analisante vem à luz como “palavra verdadeira”, isto é, como a verdade do sujeito</p><p>que, ao falar, se apresenta como desejante e, como tal, está determinado pelas</p><p>vicissitudes deste modo de existir, como ser desejante. O analista, no lugar de</p><p>suposto saber, ratifica a verdade dita pelo analisante, resgatando nele a função</p><p>sujeito como efeito (da verdade) do desejo.</p><p>Ora, a psicanálise nos ensina que o desejo não é uma vontade instalada</p><p>no interior do sujeito, como uma espécie de célula que se mantém acomodada</p><p>em suas entranhas. Mas, sim, o desejo é um entroncamento de diversos dizeres,</p><p>saberes e afetos que delineiam e marcam as dimensões intelectuais e</p><p>“espirituais” do sujeito. Neste sentido, a práxis psicanalítica institui como um</p><p>saber</p><p>a experiência de reconhecimento do desejo pelo sujeito e de como este é</p><p>articulado e articulável com seu entorno, ou o campo do Outro. Desde esta</p><p>perspectiva, o fator relacional do desejo é intrínseco a este. Dito de outro modo,</p><p>é a condição de desejo que faz com que o ser humano seja um sujeito relacional;</p><p>mais precisamente, o ser humano só se faz como tal na medida em que está em</p><p>relação com o outro.</p><p>Para a psicanálise, não existe um sujeito que pode nomear-se a si mesmo,</p><p>ou bastar-se em si mesmo, pois, como efeito da linguagem, o sujeito é</p><p>dependente do reconhecimento do outro e da efetivação do outro sobre si como</p><p>um objeto desejável. A este processo, a psicanálise vai compreender que há um</p><p>modo muito específico de alienação, que é justamente estar alienado enquanto</p><p>um objeto do desejo do outro.</p><p>É apenas neste sentido que a psicanálise reconhece a condição de</p><p>alienação do sujeito. Entretanto, isso não promove nenhuma justificativa ou</p><p>necessidade de instituir a prática de asilamento/internamento do sujeito para</p><p>tratá-lo a respeito destas questões. Por princípio teórico, é justamente na direção</p><p>contrária que aponta a psicanálise. Sendo o sujeito relacional, toda e qualquer</p><p>questão/sofrimento que advenha deste campo relacional (desejo) deve ser</p><p>tratado nesta mesma perspectiva, e é justamente por este motivo que a</p><p>12</p><p>psicanálise instituiu como fundamento do seu tratamento o aspecto</p><p>transferencial.</p><p>Sob este direcionamento, a psicanálise busca deslocar a loucura da</p><p>condição de “não ser” do sujeito que, como tal, “justificou” seu enclausuramento</p><p>e práticas de coerção e correção sob o falso sentido de tratamento. É</p><p>reconhecendo que a loucura é uma dimensão da existência humana que a</p><p>psicanálise busca preservar o tratamento em sua dimensão relacional e não</p><p>solipsista. Ou seja, não é na perspectiva de penalizar e isolar no indivíduo o</p><p>sofrimento mental, mas sim, constituir um campo relacional no qual o sujeito</p><p>possa se reconhecer e se fazer desejante de acordo com as suas possibilidades</p><p>subjetivas.</p><p>NA PRÁTICA</p><p>Em uma instituição de saúde mental, a equipe multiprofissional se reúne</p><p>para avaliar como estão os pacientes. Cada profissional, a partir de sua</p><p>perspectiva técnica, faz seu parecer a respeito dos pacientes assistidos. O</p><p>psicanalista, na avaliação que faz, sugere que os pacientes façam parte da</p><p>equipe, ou seja, que participem também dos processos decisórios e avaliativos</p><p>que a equipe realiza durante as reuniões.</p><p>Em um primeiro momento, a equipe fica dividida. Alguns profissionais</p><p>concordam, enquanto outros entendem que os pacientes não estão em</p><p>condições psíquicas de participar das decisões e avaliações. O psicanalista</p><p>argumenta que a participação dos pacientes é fundamental em dois pontos para</p><p>que o processo de tratamento seja efetivo, pois assim os coloca em uma posição</p><p>de corresponsabilidade e não de objeto das intervenções. E, se algum paciente</p><p>apresenta dificuldades no modo de como colocar-se enquanto sujeito</p><p>responsável por escolhas e juízos, é justamente na experiência destes</p><p>processos que o psicanalista e a equipe são convocados para amparar o sujeito</p><p>e auxiliar, enquanto tratamento, em suas dificuldades.</p><p>Como corresponsáveis, é que os pacientes assumem a posição de</p><p>sujeito, condição necessária para a produção de saber. E cabe à equipe e a toda</p><p>a instituição auxiliar no reconhecimento e acolhimento dos modos de se fazer</p><p>sujeito nestes processos. Após longa discussão, concordam em realizar</p><p>semanalmente uma reunião com equipe e pacientes, todos juntos para decidirem</p><p>13</p><p>sobre assuntos relativos ao funcionamento da instituição em seus processos de</p><p>tratamento.</p><p>As reuniões são estabelecidas como uma das principais atividades do</p><p>processo de tratamento, justamente pelo fato de reconhecer e acolher a</p><p>fala/saber dos pacientes. A instituição passa a horizontalizar seus processos</p><p>decisórios, permitindo a circulação da posição de sujeito entre equipe e</p><p>pacientes.</p><p>FINALIZANDO</p><p>A posição simbólica assumida pelo analista é o fundamento do setting</p><p>analítico. Como posição simbólica, entende-se a prevalência do aspecto</p><p>relacional que se coloca com o jogo da fala na sessão analítica, indicando assim</p><p>que o analista, por ocupar esta função e operar com sua escuta, ressalta a lógica</p><p>inconsciente em funcionamento na fala do paciente.</p><p>A instituição é criada a partir de um mito de origem, tal como o indivíduo</p><p>com sua história pessoal. A ação do analista é justificada e orientada pela</p><p>instauração da escuta no lugar entre o dito e o interdito nas instituições. É</p><p>partindo da instauração do setting (posição) psicanalítico que serão propostas</p><p>as intervenções nas instituições. A função do analista e suas intervenções devem</p><p>ser dimensionadas a partir da posição que ocupa em relação à instituição.</p><p>O divã, para o setting psicanalítico, está diretamente ligado à função da</p><p>transferência. Seu uso é uma estratégia conduzida pelo fundamento ético de</p><p>uma análise. O divã é um dispositivo para viabilizar a manutenção da</p><p>transferência com o analista e seu deslocamento imaginário, para assim,</p><p>recalibrar as demandas que se atualizam na análise. A passagem para o divã,</p><p>ao deslocar o olhar do analisante para um escutar a si mesmo, tem por finalidade</p><p>produzir este movimento de deslocamento, descolamento do desejo da</p><p>demanda.</p><p>No método psicanalítico, que é um tratamento que se realiza pela fala, o</p><p>analista deve conduzir o setting on-line de modo a manter a prevalência da fala</p><p>sobre a incidência da imagem. Em termos técnicos, isso aponta para uma escuta</p><p>que privilegia o aspecto significante da fala, isto é, as relações de metáfora e</p><p>metonímia com que se articula o significante.</p><p>14</p><p>O fundamento da escuta e os princípios da ação do analista são as</p><p>principais contribuições do setting psicanalítico para a reforma das instituições</p><p>de tratamento em saúde mental. A posição e a função do psicanalista, como</p><p>agente do reconhecimento e da leitura do inconsciente, possibilitam uma revisão</p><p>das práticas e dos fundamentos tanto da instituição em si quanto do campo</p><p>instituído como saúde mental.</p><p>A psicanálise nos ensina que o desejo não é uma vontade que está</p><p>instalada no interior do sujeito, mas sim, o desejo é um entroncamento de</p><p>diversos dizeres, saberes e afetos que delineiam e marcam as dimensões</p><p>intelectuais e “espirituais” do sujeito. É a condição de desejo que faz com que o</p><p>ser humano seja um sujeito relacional. O ser humano só se faz como tal na</p><p>medida em que está em relação com o outro.</p><p>15</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BARRETO, F. P. Reforma psiquiátrica e movimento lacaniano. Belo</p><p>Horizonte: Itatiaia, 1999.</p><p>FOUCAULT, M. Doença mental e psicologia. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,</p><p>1975.</p><p>LOBOSQUE, A. M. Princípios para uma clínica antimanicomial: e outros</p><p>escritos. São Paulo: Hucitec, 1997.</p><p>OLIVIER, N.; KAES, R. (Orgs.). A instituição como herança: mitos de</p><p>fundação, transmissões, transformações. Aparecida: Ideias e Letras, 2011.</p><p>PASSOS, I. C. F. Reforma psiquiátrica: as experiências francesa e italiana. Rio</p><p>de Janeiro: Fiocruz, 2009.</p><p>QUINET, A. As 4+1 condições da análise. 10. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,</p><p>2005.</p>

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