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Como citar este material: VIVAS, Lidia; SARTORI, Margô Trindade. Direito societário: sociedade limitada. Rio de Janeiro: FGV, 2023. Todos os direitos reservados. Textos, vídeos, sons, imagens, gráficos e demais componentes deste material são protegidos por direitos autorais e outros direitos de propriedade intelectual, de forma que é proibida a reprodução no todo ou em parte, sem a devida autorização. INTRODUÇÃO Segundo dados do Departamento de Registro Empresarial e Integração (Drei), fornecidos pelo Mapa de empresas, o primeiro quadrimestre de 2023 nos apresenta 6.201.958 sociedades limitadas ativas contra 187.408 sociedades anônimas em atividade (Brasil, 2023, p. 9). A constatação é clara da predominância das sociedades limitadas empresárias no ambiente de negócios no nosso País. Nesse contexto, é de vital importância o estudo desse tipo societário, acompanhando a sua evolução na contemporaneidade. Profissionais que trabalham com advocacia, gestão, administração e contabilidade precisam ter preparo para os novos desafios negociais apresentados por essa modalidade societária e um novo ambiente de negócios. Nesse contexto, espera-se que tais executivos e executivas não somente se prendam ao texto legal, mas também desenvolvam uma visão sistêmica da “nova” Sociedade Limitada, bem como de todas as implicações que giram em torno dessa sociedade para o sucesso do negócio. É nesse diapasão que, no Módulo Sociedade Limitada Contemporânea, abordamos temas como governança, compliance e Environmental, Social and Governance (ESG), que são imprescindíveis, de modo que as sociedades se adequem às novas diretrizes do mercado, de forma a promoverem crescimento sustentável e perenidade. Esta apostila foi estruturada em quatro módulos, descritos a seguir: Módulo I – Base estrutural da Sociedade Limitada – Neste módulo, apresentaremos a base estrutural de uma Sociedade Limitada, buscando os seus alicerces na Teoria da Empresa, as distinções entre empresário e empresa, a constituição do seu estabelecimento empresarial, a sua personificação e a desconsideração da personalidade jurídica. Abordaremos o seu surgimento, a sua evolução, o seu enquadramento como Microempresa (ME) ou Empresa de Pequeno Porte (EPP), além da distinção entre sociedade de pessoas e de capitais, bem como sociedades empresárias e simples. Trataremos das suas principais características e conceitos, assim como da forma de limitação de responsabilidade, da possibilidade de constituição de forma unipessoal, da regência supletiva pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 – a Lei das Sociedades Anônimas (S/A) –, da importância do acordo de quotistas, além da comparação entre a Sociedade Limitada e os demais tipos descritos na Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, o Código Civil (CC). Por fim, refletiremos sobre a possibilidade de constituição de um conselho fiscal, bem como as suas vantagens e desvantagens; Módulo II – Constituição da Sociedade Limitada – Neste módulo, trataremos da constituição de uma Sociedade Limitada, apresentando o contrato social e as suas especificidades, o caráter personalíssimo dessa sociedade, a participação nos resultados dos seus sócios e o exercício do direito de retirada. Abordaremos a natureza jurídica do capital social, as suas formas de integralização, a quota social, como unidade representativa do capital social, bem como direito patrimonial e pessoal do sócio. Analisaremos também a condição do sócio remisso, a possiblidade de quotas preferenciais, assim como o controle da Sociedade Limitada, a sua administração e a responsabilidade dos seus administradores; Módulo III – Sociedade limitada e modalidades de deliberações de sócios – Neste módulo, refletiremos sobre as deliberações de sócios no contexto das sociedades limitadas e apresentaremos os formatos de deliberação, bem como a diferença entre reunião e assembleia de sócios. Detalharemos a legitimidade de convocação das deliberações e a periodicidade de cada modelo deliberativo. Analisaremos os quóruns de instalações e deliberações, bem como o impacto da Lei nº 14.451, de 21 de setembro de 2022, que trata da redução dos quóruns de algumas matérias submetidas às deliberações nas sociedades limitadas; Módulo IV – Sociedade limitada contemporânea: governança corporativa, compliance e ESG – Neste módulo, estudaremos a nova estrutura das sociedades limitadas diante da adoção de gestão pautada na governança corporativa, do implemento das boas práticas do compliance. Apresentaremos as ações corporativas vinculadas à agenda do ESG, ou seja Ambiental, Social e Governança (ASG). Aprofundaremos as pressões do mercado no sentido de conduzirem as sociedades a se ajustarem às novas diretrizes, ora moldando uma mudança organizacional por entender que lucro está diretamente ligado aos valores e aos propósitos das organizações, ora se adequando às métricas de desempenho esperadas por stakeholders, em especial, pela análise de consumidores e de investidores que priorizam, respectivamente, a aquisição de produtos e investimentos nas empresas com programa de compliance, com gestão transparente e estruturada em práticas de ESG. Bom estudo! SUMÁRIO MÓDULO I – BASE ESTRUTURAL DA SOCIEDADE LIMITADA .............................................................. 7 EVOLUÇÃO DA SOCIEDADE LIMITADA ............................................................................................ 7 Teoria da empresa: ato de empresa, empresa e empresário ............................................. 7 Estabelecimento empresarial ................................................................................................ 10 Desconsideração da personalidade jurídica ........................................................................ 13 Do surgimento da Sociedade Limitada aos dias de hoje ................................................... 17 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE LIMITADA ........................................................ 20 Limitação da responsabilidade dos sócios e especificidades da Sociedade Limitada ... 20 Regência supletiva pela Lei das S/A....................................................................................... 23 Acordo de quotistas na Sociedade Limitada ........................................................................ 23 Conselho fiscal na Sociedade Limitada ................................................................................. 23 SOCIEDADE LIMITADA E COMPARAÇÃO COM OS DEMAIS TIPOS DE SOCIEDADES ................ 24 Sociedade Simples ................................................................................................................... 24 Sociedade em Nome Coletivo ................................................................................................ 25 Sociedade em Comandita Simples ........................................................................................ 25 Sociedades não personificadas ............................................................................................. 26 MÓDULO II – CONSTITUIÇÃO DA SOCIEDADE LIMITADA ................................................................ 27 CONTRATO SOCIAL .......................................................................................................................... 27 Elementos gerais e específicos do contrato social .............................................................. 27 Participação nos resultados da sociedade ........................................................................... 28 Direito de retirada na Sociedade Limitada ........................................................................... 29 CAPITAL SOCIAL E QUOTAS ............................................................................................................ 30 Natureza jurídica do capital social .........................................................................................30 Natureza jurídica da quota social .......................................................................................... 31 Sócio remisso na Sociedade Limitada ................................................................................... 31 Quotas preferenciais na Sociedade Limitada ...................................................................... 35 PAPEL DO SÓCIO, ADMINISTRAÇÃO E RESPONSABILIDADE DOS ADMINISTRADORES ......... 37 Centro de imputação do controle da Sociedade Limitada ................................................. 37 Administração da Sociedade Limitada .................................................................................. 38 Responsabilidade dos administradores ............................................................................... 39 Administrador e desconsideração da personalidade jurídica ........................................... 41 MÓDULO III – SOCIEDADE LIMITADA E MODALIDADES DE DELIBERAÇÕES DE SÓCIOS .............. 43 DELIBERAÇÕES DE SÓCIOS NAS SOCIEDADES LIMITADAS ......................................................... 43 Conceito e características das deliberações de sócios ....................................................... 43 Matérias submetidas às deliberações de sócios e legitimidade de convocação ............ 44 Modalidades de deliberações de sócios: reunião e assembleia ....................................... 45 Deliberação no formato virtual .............................................................................................. 46 FORMALIDADE DE CONVOCAÇÃO: DISPENSA E PERIODICIDADE DAS DELIBERAÇÕES ......... 47 Formalidade de convocação .................................................................................................. 47 3.2.2 Dispensa da formalidade de convocação ................................................................... 47 Periodicidade das deliberações de sócios ............................................................................ 49 QUÓRUNS DE INSTALAÇÃO E DELIBERATIVO NAS DELIBERAÇÕES DE SÓCIOS ...................... 50 Conceito de quórum ................................................................................................................ 50 Quóruns de instalação e de deliberação .............................................................................. 50 Nova Lei nº 14.451/2022: redução de quórum .................................................................... 51 MÓDULO IV – SOCIEDADE LIMITADA CONTEMPORÂNEA: GOVERNANÇA CORPORATIVA, COMPLIANCE E ESG ............................................................................................................................... 53 SOCIEDADE LIMITADA E GOVERNANÇA CORPORATIVA ............................................................. 53 Conceito governança corporativa .......................................................................................... 53 Princípios da governança corporativa .................................................................................. 54 Triângulo básico da governança ............................................................................................ 56 Quadrilátero de múltiplos interesses ................................................................................... 57 IMPORTÂNCIA DO PROGRAMA DE COMPLIANCE NAS SOCIEDADES LIMITADAS ..................... 58 Práticas de compliance no Brasil ............................................................................................ 59 Compliance e ética .................................................................................................................... 60 Programa de compliance e programa de integridade ......................................................... 62 Compliance nas Sociedades Limitadas .................................................................................. 63 IMPACTOS DAS PRÁTICAS DE ESG NAS SOCIEDADES LIMITADAS ............................................. 66 Pressões do mercado e forças impulsionadoras do movimento ESG ............................. 67 Triple Bottom Line ..................................................................................................................... 69 Agenda 2030 ONU: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ...................................... 70 Mercado contemporâneo e tendências ESG ........................................................................ 72 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................... 74 PROFESSORAS-AUTORAS .................................................................................................................... 79 LIDIA VIVAS ........................................................................................................................................ 79 FORMAÇÃO ACADÊMICA ......................................................................................................... 79 EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS ............................................................................................... 79 MARGÔ TRINDADE SARTORI .......................................................................................................... 80 FORMAÇÃO ACADÊMICA ......................................................................................................... 80 EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS ............................................................................................... 80 Neste módulo, apresentaremos a base estrutural de uma Sociedade Limitada, buscando os seus alicerces na Teoria da Empresa, as distinções entre empresário e empresa, a constituição do seu estabelecimento empresarial, a sua personificação e a desconsideração da personalidade jurídica. Abordaremos o seu surgimento, a sua evolução, o seu enquadramento como ME ou EPP, além da distinção entre sociedade de pessoas e de capitais, bem como sociedades empresárias e simples. Trataremos das suas principais características e conceitos, assim como da forma de limitação de responsabilidade, da possibilidade de constituição de forma unipessoal, da regência supletiva pela Lei das S/A, da importância do acordo de quotistas, além da comparação entre a Sociedade Limitada e os demais tipos descritos no CC. Por fim, refletiremos sobre a possibilidade de constituição de um conselho fiscal, bem como as suas vantagens e desvantagens. Evolução da Sociedade Limitada Teoria da empresa: ato de empresa, empresa e empresário A Teoria da Empresa vem superar a Teoria dos Atos de Comércio prevista no Código Comercial de 1850. Com a unificação do Direito Civil e Comercial italiano em 1942, a deficiência que a Teoria dos Atos de Comércio trazia de não incorporar outras atividades econômicas importantes é deixada de lado, passando a existir um arcabouço jurídico que abrangia todas as formas de atividade econômica. A positivação da Teoria da Empresa no Direito brasileiro se dá com o CC, que introduziu o Direito de Empresa, na sua Parte Especial, no Livro II. MÓDULO I – BASE ESTRUTURAL DA SOCIEDADE LIMITADA 8 O Direito de Empresa abrange os conceitos e as normas relativas ao empresário, as suas atividades como empresa individual ou em sociedade empresarial, as diversas formas de sociedades personificadas ou não, simples ou empresárias, e as sociedades cooperativas, regidas pela Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, com exceção da Sociedade Anônima, que continua regida por lei especial, ou seja, a Lei das S/A. Conforme o art. 966 do CC, podemos entender que a empresa pode ser compreendida como entidade organizada profissionalmente para o desenvolvimento de atividades econômicas voltadas para a produção ou a circulação de bens ou serviços. Nesse sentido, temos: Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. Parágrafoúnico. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. A atividade própria de empresário compreende toda a atividade econômica organizada, salvo a prestação de serviços de natureza intelectual, científica literária ou artística (art. 966, parágrafo único, CC). Certo é que, com a existência do elemento de empresa nas atividades intelectuais, será considerado empresário. Segundo Fábio Ulhoa Coelho (2017), podemos entender o empresário como aquele que organiza os fatores de produção: capital, insumos, mão de obra e tecnologia. O empresário pode ser pessoa natural ou jurídica, mas, para tanto, devemos observar os seguintes requisitos para a atividade empresarial: profissionalismo, organização, habitualidade, produção e circulação de bens ou serviços. Para ser empresário, deverá possuir capacidade civil e não estar impedido legalmente: Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos. Capacidade civil: maiores de 18 anos, no gozo de seus direitos civis; maiores de 16 e menores de 18 anos, desde que emancipados e não legalmente impedidos. São impedidos legalmente: militares da ativa das três forças armadas e das polícias militares; funcionários públicos e funcionárias públicas civis da União, dos estados, dos territórios e dos municípios; 9 membros da magistratura; médicos e médicas, para o exercício simultâneo de medicina, farmácia, drogaria ou laboratório; pessoas estrangeiras não residentes no País; cônsules, salvo se não houver remuneração; corretores, corretoras, leiloeiros e leiloeiras; pessoas falidas, enquanto não reabilitadas. Apesar disso, poderão participar de sociedades como acionistas, sócios ou quotistas de sociedade empresária na condição de investidor, que terá direito de receber lucros e dividendos, além dos demais direitos essenciais de sócios. O empresário deve proceder ao registro da sua firma, antes do início das suas atividades empresariais, no Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais. O empresário individual não constitui uma pessoa jurídica, mas o seu nome deve ser registrado sob a forma de uma firma social. O nome do empresário individual pode ser registrado por completo ou abreviadamente, com acréscimo ou não de alguma designação pessoal ou de gênero de atividade (art. 1.156, CC). Não é o registro que caracteriza a condição de empresário, tendo, portanto, natureza declaratória, e não constitutiva. Aquele que exerce atividade empresária e não efetiva o seu registro é considerado empresário irregular. O empresário rural pode optar pelo tratamento empresarial, bastando que se inscreva na Junta Comercial, sendo equiparado ao empresário sujeito a registro. Vejamos o art. 971 do CC: Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro. Para o produtor rural, se inscrito como empresário, poderá pleitear a recuperação judicial, instituto típico de empresário ou sociedade empresária (Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005). A sua responsabilidade é sempre ilimitada, isto é, respondem pelas suas dívidas não só os bens destinados à atividade empresarial, mas também todos seus bens particulares (art. 391, CC). 10 Estabelecimento empresarial O estabelecimento empresarial não era previsto de forma específica anteriormente ao CC. Era mencionado pela antiga Lei de Falências (Decreto-lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945) e pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991), que a ele se referiam como fundo de comércio. Com o advento do CC, ele passa a ser tratado nos arts 1.142 a 1.149 do referido diploma legal. Nesse sentido, o estabelecimento empresarial é elemento primordial da empresarialidade, pois dele se valem o empresário ou a sociedade empresária para o desenvolvimento da sua atividade econômica. O art. 1.142 do CC define estabelecimento: Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. Dessa forma, o estabelecimento empresarial é muito mais abrangente do que somente o lugar onde a atividade econômica é desenvolvida. Trata-se de um “complexo de bens”. Pode ser definido como o conjunto de bens corpóreos e incorpóreos organizados pelo empresário para a exploração da atividade econômica (empresa). A sua natureza jurídica é de uma universalidade de bens – de fato – para o desenvolvimento da atividade econômica pelo empresário ou pela sociedade empresária. O CC define a universalidade de fato no seu art. 90, vejamos: Art. 90. Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias. O estabelecimento não é sujeito de direito – sujeito de direito é o empresário –, sendo objeto de direito, podendo vir a ser onerado, alienado, penhorado, arrestado ou sequestrado. A Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021 – a Lei de Ambiente de Negócios – passou a permitir o estabelecimento virtual. A Lei nº 14.382, de 27 de junho de 2022, também incluiu no art. 1.142 os §§ 1º, 2º e 3º: § 1º O estabelecimento não se confunde com o local onde se exerce a atividade empresarial, que poderá ser físico ou virtual. (Incluído pela Lei nº 14.382/2022) 11 § 2º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for virtual, o endereço informado para fins de registro poderá ser, conforme o caso, o endereço do empresário individual ou o de um dos sócios da sociedade empresária. (Incluído pela Lei nº 14.382/2022) § 3º Quando o local onde se exerce a atividade empresarial for físico, a fixação do horário de funcionamento competirá ao Município, observada a regra geral prevista no inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019. (Incluído pela Lei nº 14.382/2022) Como falamos, a composição do estabelecimento é formada por bens corpóreos e incorpóreos. Como bens corpóreos, podemos citar móveis, mercadorias, máquinas, matérias-primas entre outros. Os bens incorpóreos são formados por: ponto, nome do domínio, elementos da propriedade industrial, como patentes de invenção, modelo de utilidade, marcas, desenho industrial, título do estabelecimento, entre outros. Nas palavras de Marlon Tomazette (2022), os contratos não integram o estabelecimento, por não serem considerados bens. Os atributos do estabelecimento são o aviamento e a clientela. Entendemos por aviamento a capacidade do estabelecimento de produzir lucro. Nas palavras de Marcelo Féres (2012): o aviamento constitui um atributo do estabelecimento, e não da empresa, como pretende parte da doutrina. Inegavelmente, o aviamento é o sobrevalor que se confere ao estabelecimento bem organizado. Suponha-se que um empresário, que vende no varejo calçados de luxo, tenha dois estabelecimentos empresariais, um situado num bairro nobre e outro numa localidade humilde. No primeiro ponto, ele tem ótima clientela, as vendas são significativas. No segundo, o movimento não é suficiente para o pagamento dos custos operacionais. Com certeza, o aviamento não pode estar relacionado à empresa (atividade), pois ela é idêntica em ambas as situações. A capacidade de gerar lucro, assim, decorre diretamente da articulação dos elementos do estabelecimento, inclusive o espacial,o que torna patente que cada azienda tem seu aviamento. Já, quando falamos da clientela, devemos entender que não é um elemento do estabelecimento, não estando a ele incorporado. Trata-se de um conjunto de pessoas que adquirem de forma habitual os produtos e serviços oferecidos, não podendo o empresário ou a sociedade empresária dela se apropriar. Tomazette (2022) destaca: 12 Não obstante seja incorreto falar-se em direito à clientela, é certo que há uma proteção jurídica a ela, consistente nas ações contra a concorrência desleal. Todavia, tal proteção não torna a clientela objeto de direito do empresário, pois o que se protege na verdade são os elementos patrimoniais da empresa, aos quais está ligada a clientela, esta recebe uma proteção apenas indireta. A operação de compra e venda do estabelecimento é denominada de trespasse. No trespasse, há a transferência do estabelecimento do patrimônio do empresário alienante (trespassante) para o patrimônio do empresário adquirente (trespassário). Nesse caso, ocorre a alienação do complexo de bens, corpóreos e incorpóreos. Será devida pelo alienante informação correta a respeito do aviamento. Tais informações poderão ser obtidas por meio de uma due diligence, que levantará a situação econômica do estabelecimento antes da sua aquisição. O contrato de trespasse deve ser arquivado na Junta Comercial ao lado do registro do empresário e publicado na imprensa oficial. Vejamos o que diz o art. 1.144 do CC: Art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. Uma questão importante quanto ao trespasse fica por conta da necessidade da anuência ou não dos credores do empresário para a alienação do estabelecimento. A lei dispõe que a concordância dos credores do empresário só se faz necessária quando na venda o empresário não tiver saldo suficiente para honrar as obrigações com os seus credores. Dessa forma, se a empresa saudável for negociada com terceiros, o empresário/vendedor não precisará da concordância dos seus credores, pois estes não serão prejudicados com a alienação. Agora, se o empresário/alienante do empreendimento não tiver saldo para honrar as dívidas contraídas, caberá, antes de efetivar a transação de venda, a notificação dos seus credores para que estes possam manifestar-se nesse sentido. O silêncio em relação à notificação de venda significa aprovação dos credores no trespasse do estabelecimento empresarial. Isso significa que a manifestação de reprovação deve ser de forma expressa, escrita. Desta forma o art. 1.145 do CC dispõe: Art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação. 13 A violação dessa notificação fará com que os credores, diante da ausência de saldo para a satisfação da dívida, possam ingressar com o pedido de falência do empresário (art. 94, III, “c”, da Lei nº 11.101/2005). Quanto à responsabilidade do trespassante e do trespassário nessa operação, o art. 1.146 do CC determina: Art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento. Sendo assim, estabelece que a responsabilidade é solidária, tanto do alienante como do adquirente, em relação aos débitos anteriores na ocasião do trespasse por um ano, a contar da publicação do negócio ratificado na Junta Comercial para as dívidas que foram contraídas antes da venda e que já estejam vencidas, ou a contar da data do seu vencimento se a dívida foi assumida antes da venda, porém com a data de vencimento posterior à da venda. As leis trabalhistas e tributárias apresentam tratamento especial, portanto o prazo para que o empregado ou a empregada acione solidariamente as partes envolvidas na venda é de dois anos, ao passo que para o Fisco de cincos anos, respectivamente. Há de se observar que, no CC, também existe proteção quanto à concorrência desleal: Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à transferência. Desconsideração da personalidade jurídica Sabemos que a aquisição da personalidade jurídica das sociedades se dá conforme determina o art. 985 do CC. Vejamos: Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos (arts. 45 e 1.150). Sendo assim, as sociedades empresárias se vinculam ao Registro Público de empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais; e as sociedades simples, ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas, nos termos do art. 1.150 do CC, a saber: 14 Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. O principal atributo trazido às sociedades pela personificação é a autonomia patrimonial, obrigacional e processual. Nesse sentido, o patrimônio do sócio não se confunde com o patrimônio da sociedade. A Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica surge do leading case Salomon vs. Salomon & Co, e se tornou cada vez mais difundida, tendo sido introduzida na doutrina brasileira por meio de Rubens Requião, em 1969, com o texto “Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica: disregard doctrine”. Tem-se então o início dos seus estudos, acompanhados da construção jurisprudencial sobre o tema. Decorrente do direito anglo-saxão, tem a intenção de impedir que a personificação jurídica seja instrumento para assegurar a impunidade de atos sociais fraudulentos. O primeiro dispositivo a mencionar a referida teoria foi a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Com o aperfeiçoamento do instituto na Common Law e a consolidação da nossa jurisprudência, o CC positivou a teoria no seu art. 50. Tal instituto ao longo do tempo tem sido aperfeiçoado. O Código de Processo Civil (CPC) de 2015 trouxe contornos mais específicos à teoria, criando o incidente de desconsideração da personalidade jurídica para a sua aplicabilidade (art. 133 a 137, CPC). A Lei de Liberdade Econômica avançou nesse instituto descrevendo de forma mais clara os parâmetros de aplicação da teoria: desvio de finalidade e confusão patrimonial. Atualmente, o art. 50 do CC assim se apresenta: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) 15 § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fatoentre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019). A Teoria Clássica da Desconsideração da Personalidade Jurídica é dividida pela doutrina entre a Teoria Maior, disposta no CC; e a Teoria Menor, disposta no CDC. A Teoria Maior da Desconsideração da Personalidade Jurídica consiste na regra geral para a aplicação do instituto. A mera demonstração da insolvência não fundamenta a sua aplicação, há de se perquirir a existência do desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Não devemos esquecer que a autonomia patrimonial é o alicerce do direito societário, daí a necessária cautela na sua aplicação. Vejamos: 1. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica deve ser excepcional, sendo a regra a preservação da autonomia patrimonial, devendo ser deferida quando presentes os requisitos do art. 50 do Código Civil. 2. O ordenamento jurídico adotou a teoria maior da desconsideração 16 da personalidade jurídica a qual exige prova do desvio de finalidade da sociedade ou a confusão patrimonial entre o patrimônio dos sócios e o da sociedade empresária (Acórdão 1369154, 07090171820218070000; Relator: Roberto Freitas; Terceira Turma Cível; Data de julgamento: 31/8/2021. DJe, 17/9/2021). É importante destacar que a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica não extingue a pessoa jurídica, mas, sim, afasta de forma episódica a autonomia patrimonial para estender aos sócios e administradores os efeitos de determinadas obrigações. A Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica foi consagrada no art. 28 do CDC: Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. § 1º (Vetado). § 2º As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 3º As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4º As sociedades coligadas só responderão por culpa. § 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. Podemos verificar que, para a Teoria Menor, basta somente a comprovação da insolvência da pessoa jurídica, independentemente de desvio de finalidade e confusão patrimonial. 17 Responsabilidade civil e Direito do consumidor. Recurso especial. Shopping Center de Osasco-SP. Explosão. Consumidores. Danos materiais e morais. Ministério Público. Legitimidade ativa. Pessoa jurídica. Desconsideração. Teoria maior e teoria menor. Limite de responsabilização dos sócios. Código de Defesa do Consumidor. Requisitos. Obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. Art. 28, § 5º [... ] o risco empresarial normal às atividades econômicas não pode ser suportado pelo terceiro que contratou com a pessoa jurídica, mas pelos sócios e/ou administradores desta, ainda que estes demonstrem conduta administrativa proba, isto é, mesmo que não exista qualquer prova capaz de identificar conduta culposa ou dolosa por parte dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica (Recurso especial nº 279.273 – SP. Recorrente: B Sete Participações S/A e outros. Recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Relatora: ministra Nancy Andrighi. Brasília, 4 de dezembro de 2003. DJ em 29/03/2004). Cabe ressaltar que a Teoria Menor é aplicada em microssistemas legais protetivos, como defesa do consumidor, direito trabalhista e proteção ao meio ambiente. Do surgimento da Sociedade Limitada aos dias de hoje Nos primórdios do Direito Societário, os sócios das sociedades existentes possuíam o nível de responsabilidade ilimitado, isto é, todo o seu patrimônio se encontrava sujeito aos riscos da atividade econômica, o que retraía os investimentos. A sociedade com limitação de responsabilidade à época era a Sociedade Anônima, cuja existência pode ser comprovada já no Estado Moderno, com documentos históricos das Companhias das Índias, mas o perfil dessa sociedade é voltado para grandes empreendimentos, e o mercado clamava por um instrumento mais flexível e ágil. A Sociedade Limitada, como um tipo próprio de organização societária, e não como Sociedade Anônima simplificada, foi criada na Alemanha em 1892 – Gesellschaft mit beschränkter Haftung –, isto é, sociedades de responsabilidade limitada. Teve como objetivo possibilitar a limitação da responsabilidade a pequenos e médios empreendedores, dispensando tais pessoas das formalidades próprias das S/As e afastando a responsabilidade subsidiária dos sócios pelo inadimplemento das sociedades, limitando a responsabilidade ao capital investido. 18 Nas palavras de Manoel de Queiroz Pereira Calças (2003), vejamos: Os pequenos e médios empresários não tinham condições de submeter – se ao rigoroso sistema legal exigido para a limitação de suas responsabilidades pelas obrigações sociais, razão pela qual pleitearam e obtiveram do Parlamento alemão a instituição de uma sociedade de responsabilidade limitada com características próprias e desvinculadas do modelo legal das anônimas, podendo ser constituída de maneira simples, somente por dois sócios, os quais teriam responsabilidade apenas pela importância com que cada um contribuísse para a formação do capital social. O Brasil, por meio do Decreto nº 3.708, de 10 de janeiro de 1919, adotou a chamada Sociedade por Quotas de Responsabilidade Limitada. Com o advento do CC, o referido decreto foi revogado tacitamente. Ela agora é chamada somente de Sociedade Limitada e passou a ser tratada nos arts. 1.052 a 1.087 do CC. Como sabido, o CC positivou a Teoria da Empresa no nosso ordenamento jurídico, sendo assim, a Sociedade Limitada pode ser apresentar como simples e empresária, classificação que explicaremos mais adiante. Esse é o tipo societário mais presente na economia do nosso País e, pela sua flexibilidade, atende a micro, pequenos e grandes empreendimentos. A Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, regulamentou o segmento das MEs e EPPs em atendimento ao mandamento constitucional de que para tal segmento deverá existir tratamento favorecido, diferenciado e simplificado, conforme arts. 170, IX, e 179 da Constituição Federal, a saber: Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] IX - tratamento favorecidopara as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. [...] Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei. 19 Nesse contexto, foi estabelecido um regime tributário específico: o Simples Nacional. As sociedades poderão optar pelo Simples Nacional como regime de tributação ou será feito pelo Lucro Presumido ou Lucro Real. O principal requisito para o enquadramento diz respeito ao faturamento anual, mas não é o único, ocorrendo também restrições quanto às atividades. O enquadramento como MEs para empresas com um faturamento anual de até R$ 360 mil. Já para as EPPs, o faturamento deve estar entre R$ 360 mil e R$ 4,8 milhões. O tratamento simplificado também se apresenta no tocante às reuniões ou assembleias de sócios, que são dispensadas; e ao quórum de deliberação, que é mais flexível. A Sociedade Limitada poderá ser classificada como sociedade de pessoas ou de capitais. O que determina tal classificação é o nível de dependência aos fatores subjetivos dos sócios. Nessas sociedades, o foco é a figura dos sócios, e não o investimento. Tem destaque o elemento subjetivo da affectio societatis, contribuindo para que a presença de um estranho possa vir a ocasionar a dissolução parcial ou até mesmo a extinção da sociedade. Se a Sociedade Limitada for classificada como de capitais, esses fatores subjetivos dos sócios deixam de ter importância, passando a ser mais importante o investimento efetuado, e não quem o realizou. Nesse sentido, o foco será no investimento, ocorrendo total mobilidade na substituição dos sócios. As Sociedades Limitadas poderão ser simples ou empresárias. O que definirá a sua classificação é o objeto a que se destinam. Essa classificação quanto ao objeto está presente no art. 982 do CC, a saber: Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais. Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa. As sociedades cujo objeto tenham elemento empresarial serão consideradas empresárias, portanto passam a existir de forma personificada com o arquivamento dos seus atos constitutivos no registro próprio, no caso, as Juntas Comerciais. Já as classificadas como simples estão dentro do conceito de exclusão, isto é, são as demais, atividades intelectuais, de natureza científica, literária ou artística, sem a presença do elemento de empresa. Essas adquirem personalidade jurídica com o arquivamento dos seus atos constitutivos no Registro Civil de Pessoas Jurídicas. 20 Conceito e características da Sociedade Limitada Limitação da responsabilidade dos sócios e especificidades da Sociedade Limitada O seu conceito se encontra previsto no art. 1.052 do CC, que assim dispõe: Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. Enquanto o capital social não estiver integralizado, todos são solidários pela integralização. Após a integralização, não se fala mais em solidariedade. Não podemos considerar a regra da limitação da responsabilidade dos quotistas como absoluta, comportando algumas exceções: Os sócios que decidirem contrariamente à lei ou ao contrato social responderão, ilimitadamente, pelas obrigações sociais decorrentes, isentos os que formalizarem a sua discordância (art. 1.080, CC). Com a desconsideração da personalidade jurídica, no caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, o sócio poderá responder pessoalmente pela obrigação que assim assumir a sociedade (art. 50, CC). Nos débitos da dívida ativa, por força do art. 135 do Código Tributário Nacional (CTN), os administradores respondem com o seu patrimônio particular se houver inadimplência da sociedade. Os sócios respondem solidariamente pelas dívidas da pessoa jurídica perante o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) (art. 13, Lei nº 8.620, de 5 de janeiro de 1993). Podem participar do quadro societário da Sociedade Limitada pessoas naturais e pessoas jurídicas. Se pessoas naturais devem ter capacidade civil – 18 anos, em regra –, menores também podem participar da Sociedade Limitada, desde que atendam a determinadas condições expressas no art. 974, § 3º, do CC, a saber: Art. 974. [...] § 3º O Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais deverá registrar contratos ou alterações contratuais de sociedade que envolva sócio incapaz, desde que atendidos, de forma conjunta, os seguintes pressupostos: (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011) I - o sócio incapaz não pode exercer a administração da sociedade; (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 21 II - o capital social deve ser totalmente integralizado; (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011) III - o sócio relativamente incapaz deve ser assistido e o absolutamente incapaz deve ser representado por seus representantes legais. (Incluído pela Lei nº 12.399, de 2011). Com o advento da Lei nº 13.874/2019, a chamada Lei de Liberdade Econômica, a Sociedade Limitada passou a poder ser constituída com um ou mais sócios, vejamos: Art. 1.052. [...] § 1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 2º Se for unipessoal, aplicar-se-ão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019). Com a Lei nº 14.195/2021, conhecida como a Lei do Ambiente de Negócios, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Eireli) foi extinta, e as já existentes foram transformadas em sociedades limitadas unipessoais. Observamos também que a referida lei possibilita a emissão de Notas Comerciais pelas Sociedades Limitadas. A Sociedade Limitada possui nome empresarial designado por Firma Social ou Denominação Social, acrescido da expressão “Limitada” ou “Ltda.”. Quando utilizada a Firma ou Razão Social será composta do nome dos sócios; se Denominação Social, haverá um elemento fantasia. Neste caso, a lei determina a inclusão do objeto social na composição do nome empresarial, por exemplo: Carlos Fontes & Cia. Ltda. ou Sol & Mar Confecções Ltda. Com a Lei nº 14.195/2021, ocorreu a alteração do art. 35 da Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994, com a seguinte inclusão: Art. 35-A. O empresário ou a pessoa jurídica poderá optar por utilizar o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) como nome empresarial, seguido da partícula identificadora do tipo societário ou jurídico, quando exigida por lei. O art. 1.158 do CC determina a obrigatoriedade do acréscimo da expressão “Ltda.” ao final do nome empresarial, por extenso ou abreviadamente, sob pena de ilimitação de responsabilidade dos administradores, que assim empregarem a firma ou a denominação da sociedade, e não todos os sócios ou administradores. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12399.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8934.htm#art35a.0 22 A Sociedade Limitada é uma sociedade cuja estrutura econômica é preponderante como de pessoas, isto é, o foco é na figura dos sócios. Pelo seu caráter híbrido, também é possível ser uma sociedade de capital, quer dizer, com foco no investimento. A Sociedade Limitada é sempre de natureza contratual e, é por meio do contrato que identificamos ser a Sociedade Limitada de pessoas ou de capitais, e essa característica é muito importante quanto ao tratamento de temas como cessão de quotas e falecimento de sócio, entre outros. Apesar disso, se do contrato social não for possível concluir a natureza da Sociedade Limitada, deve-se considerá-la de cunho personalístico, em virtude do art. 1.028 do CC. A Sociedade Limitada poderá ser simples ou empresária. Serão empresárias quando tenham por objeto o exercício de atividade própria de empresário; e simples, pelo conceito de exclusão, as demais, conforme art. 982 do CC, vejamos: Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais. Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa. Sabemos que as atividades empresariais estão vinculadas ao Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais; e as sociedades simples, ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme preceitua o art. 1.050 do CC: Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. Nesse sentido, as Sociedades Limitadas que sejam empresárias adquirirão a sua personalidade jurídica com o arquivamento dos seus atos constitutivos na Junta Comercial; e as Sociedades Limitadas Simples, no cartório do Registro Civil de Pessoas Jurídicas. Com a aquisição da personalidade jurídica, a Sociedade Limitada passa a ter uma existência distinta da figura dos seus sócios: ela possui autonomia patrimonial, que é o principal atributo da personificação das sociedades. Ao término de cada exercício social, deverá ser elaborado o balanço patrimonial e de resultado econômico, além do inventário; nos quatro meses subsequentes ao término do exercício social, deverá ser convocada assembleia ou reunião de sócios, conforme o caso, para a aprovação das contas do exercício social, como determina o art. 1.065 do CC. 23 Regência supletiva pela Lei das S/A Quando omisso o CC, a disciplina supletiva pode ser a da Sociedade Simples ou da Sociedade Anônima, dependendo da vontade dos sócios, vejamos: Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima. A Sociedade Simples, como sabemos, é a sociedade modelo, padrão para todos os tipos de sociedades contratuais previstas no CC. Nesse sentido, no silêncio do contrato social, naturalmente a regência supletiva será pelas regras da Sociedade Simples. Acordo de quotistas na Sociedade Limitada O acordo de quotistas é oriundo da Lei das S/A, no seu art. 118. Trata-se de um instrumento parassocial que regulamenta relações entre os sócios. A utilização de tal instrumento por quotistas de sociedades limitadas é bastante salutar, pois, ao regular os interesses entre sócios, tende a evitar a judicialização de conflitos. O acordo de quotistas só terá validade entre os sócios, e não em face de terceiros. Vários são os assuntos que podem ser objeto do acordo de quotistas: fórmula de apuração dos haveres e prazo de pagamento; sucessão em caso de morte de sócio; acordo de voto; venda e compra conjunta de quotas, entre outros. Independentemente da regência supletiva adotada pela sociedade, isto é, mesmo sob as regras supletivas da Sociedade Simples, poderá ocorrer a utilização do acordo de quotistas. Conselho fiscal na Sociedade Limitada Desde a entrada em vigor do CC/2022, é facultada na Sociedade Limitada a criação de um conselho fiscal, diferentemente da Sociedade Anônima, em que esse órgão social é de caráter obrigatório. Há de se analisar a efetiva necessidade da criação do conselho fiscal, em razão da estrutura e do porte da sociedade, tendo em vista a necessidade de remuneração de conselheiros ou conselheiras, o que encarece o custo dessa modalidade societária. O art. 1.066 do CC dispõe sobre o número de conselheiros e suplentes, sendo de no mínimo três membros e respectivos suplentes, além das condições de inelegibilidade para a referida função, a saber: Art. 1.066. Sem prejuízo dos poderes da assembleia dos sócios, pode o contrato instituir conselho fiscal composto de três ou mais membros e respectivos suplentes, sócios ou não, residentes no País, eleitos na assembleia anual prevista no art. 1.078. 24 § 1º Não podem fazer parte do conselho fiscal, além dos inelegíveis enumerados no § 1º do art. 1.011, os membros dos demais órgãos da sociedade ou de outra por ela controlada, os empregados de quaisquer delas ou dos respectivos administradores, o cônjuge ou parente destes até o terceiro grau. § 2º É assegurado aos sócios minoritários, que representarem pelo menos um quinto do capital social, o direito de eleger, separadamente, um dos membros do conselho fiscal e o respectivo suplente. A existência do conselho fiscal não retira o poder de fiscalização exercido pela assembleia ou pela reunião de sócios. Os conselheiros fiscais são considerados administradores e são regidos pelas regras previstas no art. 1.016 do CC. Sociedade Limitada e comparação com os demais tipos de sociedades Já falamos que a Sociedade Limitada é o tipo societário com maior presença na economia do nosso País. Isto ocorre pois na atualidade predominam os tipos societários cujo nível de responsabilidade dos sócios é limitado, diminuindo os riscos da atividade econômica. Na Sociedade Limitada também é possível termos administradores não sócios, implicando uma gestão mais profissional. A Sociedade Limitada possui uma flexibilidade muito grande decorrente da sua natureza contratual, privilegiando a autonomia das partes, mas a legislação civil manteve outros tipos societários em vigor: Sociedade Simples A Sociedade Simples está prevista nos arts. 997 a 1.038 do CC. Esse tipo societário foi introduzido no nosso ordenamento jurídico no CC com a positivação da Teoria da Empresa. Os sócios podem ser pessoas físicas e jurídicas. Possui dupla função: ser o tipo societário adequado para atividades não empresarias, ou seja, atividades intelectuais de natureza científica, literária ou artística; e ser o tipo societário padrão, modelo das sociedades contratuais. Constitui-se por contrato escrito privado ou público. Qualquer modificação no contrato social de matéria prevista no art. 997 do CC dependerá do consentimento de todos os sócios, o que traz um engessamento na gestão da sociedade. É sociedade personalíssima e de natureza contratual. A responsabilidade dos sócios é determinada no art. 1.023 do CC, vejamos: 25 Art. 1.023. Se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária. O art. 997 do CC, no seu inciso V, prevê a possibilidade de sócio de serviços na integralização do capital social. A Sociedade Simples mais se destaca na sua função de ser a sociedade modelo dos tipos societárioscontratuais. Sociedade em Nome Coletivo A Sociedade em Nome Coletivo remonta à Idade Média. Está prevista nos arts. 1.039 a 1.044 do CC. Trata-se de uma sociedade da qual somente pessoas físicas podem participar. A sua identificação no mundo empresarial se dá por meio de firma ou razão social. Os sócios são solidária e ilimitadamente responsáveis. Somente sócios podem participar da administração da sociedade. É uma sociedade de caráter personalíssimo e de natureza contratual. Pode ser classificada como simples ou empresária, conforme art. 983 do CC. Quando da falência da Sociedade em Nome Coletivo, os seus sócios também são declarados falidos, como determina a Lei nº 11.101/2005. Sociedade em Comandita Simples A Sociedade em Comandita Simples está prevista nos arts. 1.045 a 1.051 do CC. Nela, há duas categorias de sócios: i) os comanditados – pessoas físicas com responsabilidade solidária e ilimitada; e ii) os comanditários – sócios meramente investidores. A responsabilidade dos sócios comanditários é limitada ao valor do seu investimento, sendo, portanto, classificada como uma sociedade mista quanto ao nível de responsabilidade dos sócios. A administração da sociedade compete ao sócio comanditado, e os comanditários não participam dela. Se o fizerem, serão considerados como se comanditados fossem, passando a responder de forma solidária e ilimitada. Além disso, não poderão dar nome à firma ou à razão social. Podem ser constituídos como procuradores da sociedade com poderes especiais para realizar determinado negócio. Como sócios, têm direito de participar das deliberações e de fiscalizar as operações sociais. É uma sociedade personalíssima e de natureza contratual. Os sócios comanditados seguem as regras dos sócios em nome coletivo, logo, se declarada a falência da sociedade, serão declarados falidos também. Pode ser classificada como simples ou empresária, conforme art. 983 do CC. 26 Sociedades não personificadas É importante destacar a existência de sociedades não personificadas previstas no CC: Sociedade em Comum – é tratada nos arts. 986 a 990 do CC. É assim considerada enquanto não inscritos os seus atos constitutivos no registro competente, com exceção das sociedades por ações em organização. A sua principal consequência é que, em razão de não possuírem autonomia patrimonial, os seus sócios são solidários e ilimitadamente responsáveis; Sociedade em Conta de Participação – está prevista nos arts. 991 a 996 do CC. Assemelha-se mais a um contrato de investimento. Há duas categorias de sócios: i) o sócio ostensivo, que exerce a atividade econômica no seu próprio nome, respondendo ilimitadamente; e ii) o sócio participante, que não se obriga com terceiros, somente com o sócio ostensivo, nos termos do contrato celebrado. Tal sociedade nunca adquirirá personalidade jurídica, mesmo com o arquivamento dos seus atos constitutivos em quaisquer registros. Neste módulo, trataremos da constituição de uma Sociedade Limitada, o tipo societário em maior número na economia do País, apresentando o contrato social e as suas especificidades, o caráter personalíssimo dessa sociedade, a participação nos resultados dos seus sócios e o exercício do direito de retirada. Abordaremos a natureza jurídica do capital social, as suas formas de integralização, a quota social, como unidade representativa do capital social, bem como direito patrimonial e pessoal do sócio. Analisaremos também a condição do sócio remisso, a possiblidade de quotas preferenciais, assim como o controle da Sociedade Limitada, a sua administração e a responsabilidade dos seus administradores. Contrato social Elementos gerais e específicos do contrato social O contrato social de uma Sociedade Limitada é um contrato plurilateral que apresenta um paralelismo de intenções dos seus sócios e contém os requisitos essenciais e comuns, além dos específicos aos contratos de sociedade. Além disso, deverá conter cláusula expressa sobre a limitação da responsabilidade dos sócios e a integralização do capital social. Caso não ocorra, todos os sócios responderão ilimitadamente. Como a Sociedade Simples é o modelo das sociedades contratuais, ele deve mencionar o solicitado no art. 997 do CC, salvo as exceções específicas para esse tipo societário, por exemplo, a possibilidade de sócio de serviços que possui disposição expressa contrária no art. 1.055, § 2º, do CC. MÓDULO II – CONSTITUIÇÃO DA SOCIEDADE LIMITADA 28 Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato. Participação nos resultados da sociedade É da essência do contrato de sociedade a participação dos sócios nos resultados da sociedade, de forma positiva ou negativa. O CC conceitua o contrato de sociedade no seu art. 981, vejamos: Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. O art. 1.008 do CC determina a nulidade de cláusula que venha a estipular a exclusão de qualquer sócio dos lucros e das perdas (cláusula leonina). É possível a distribuição desigual dos lucros, conforme previsão do art. 1.007 do CC, vejamos: Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas. 29 Direito de retirada na Sociedade Limitada O sócio não é refém da sociedade. A Constituição Federal garante a liberdade de associação e desassociação, logo não é válida cláusula no contrato social que exclua do sócio o seu direito de retirada. O art. 1.077 do CC prevê as causas do direito de recesso: i) modificação do contrato; ii) fusão da sociedade; iii) incorporação de outra sociedade; e iv) incorporação da sociedade por outra. É necessário que ocorra a dissidência em relação a essas deliberações. A apuração dos seus haveres deverá ser efetuada nos moldes do art. 1.031 do CC (balanço de determinação). O sócio também poderá retirar-se da sociedade cujo contrato seja por prazo indeterminado, desde que notifique os sócios com antecedência mínima de 60 dias, nos termos do art. 1.029 do CC, vejamos: Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se e prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa. É importante destacar que, mesmo sem essa previsão na Lei das S/A, as Sociedades Limitadas com regência supletiva pela Lei das S/A podem valer-se desse dispositivo legal conforme demonstrado no acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a seguir: EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL. DIREITO SOCIETÁRIO. SOCIEDADE LIMITADA. APLICAÇÃO SUPLETIVADAS NORMAS RELATIVAS A SOCIEDADES ANÔNIMAS. ART. 1.053 DO CC. POSSIBILIDADE DE RETIRADA VOLUNTÁRIA IMOTIVADA. APLICAÇÃO DO ART. 1.029 DO CC. LIBERDADE DE NÃO PERMANECER ASSOCIADO GARANTIDA CONSTITUCIONALMENTE. ART. 5º, XX, DA CF. OMISSÃO RELATIVA À RETIRADA IMOTIVADA NA LEI N. 6.404/76. OMISSÃO INCOMPATÍVEL COM A NATUREZA DAS SOCIEDADES LIMITADAS. APLICAÇÃO DO ART. 1.089 DO CC. 1. Entendimento firmado por este Superior Tribunal no sentido de ser a regra do art. 1.029 do CC aplicável às sociedades limitadas, possibilitando a retirada imotivada do sócio e mostrando-se despiciendo, para tanto, o ajuizamento de ação de dissolução parcial. 2. Direito de retirada imotivada que, por decorrer da liberdade constitucional de não permanecer associado, garantida pelo inciso XX do art. 5º da CF, deve ser observado ainda que a sociedade limitada tenha regência supletiva da Lei n. 6.404/76 30 (Lei das Sociedades Anônimas). 3. A ausência de previsão na Lei n. 6.404/76 acerca da retirada imotivada não implica sua proibição nas sociedades limitadas regidas supletivamente pelas normas relativas às sociedades anônimas, especialmente quando o art. 1.089 do CC determina a aplicação supletiva do próprio Código Civil nas hipóteses de omissão daquele diploma. 4. Caso concreto em que, ainda que o contrato social tenha optado pela regência supletiva da Lei n. 6.404/76, há direito potestativo de retirada imotivada do sócio na sociedade limitada em questão. 5. Tendo sido devidamente exercido tal direito, conforme Documento: 2030014 – Inteiro Teor do Acórdão – Site certificado – DJe: 26/03/2021 Página 6 de 5 Superior Tribunal de Justiça reconhecido na origem, não mais se mostra possível a convocação de reunião com a finalidade de deliberar sobre exclusão do sócio que já se retirou. 6. RECURSO ESPECIAL PROVIDO (Recurso Especial nº 1.839.078-SP (2017/0251800-6). Relator: ministro Paulo de Tarso Sanseverino). Como demonstrado no acórdão, a Corte comprova a garantia constitucional prevista no art. 5º, XX, da Constituição Federal. Capital social e quotas Natureza jurídica do capital social O capital social de uma sociedade pode ser entendido como a contribuição dos sócios para o desenvolvimento da atividade econômica. O capital social em uma Sociedade Limitada poderá ser realizado em dinheiro, bens ou créditos. Não existe no direito brasileiro a estipulação de capital mínimo para a constituição de uma Sociedade Limitada, tampouco prazos mínimo e máximo para a sua integralização, pois isso depende da convenção entre os sócios. Não é permitida na Sociedade Limitada a integralização em serviços, por força de disposição expressa do art. 1.055, § 2º, do CC, vejamos: Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio. [...] § 2º É vedada contribuição que consista em prestação de serviços. 31 Natureza jurídica da quota social A unidade representativa do capital é a quota social. As quotas representam um direito patrimonial e pessoal dos sócios. Patrimonial porque representa o direito de percepção dos lucros e a participação no acervo remanescente quando da extinção da sociedade. Pessoal porque dá ao sócio o direito de participar da administração da sociedade. Na Sociedade Limitada, não ocorre a exigência de avaliação de bens quando estes são disponibilizados ao capital. De forma a não burocratizar e encarecer esse tipo societário, esta foi a opção do art. 1.055, § 1º, do CC: Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio. § 1º Pela exata estimação de bens conferidos ao capital social respondem solidariamente todos os sócios, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade. Observa-se, então, que a legislação civil optou por consagrar a solidariedade entre os sócios em razão da exata estimação dos bens conferidos ao capital pelo prazo de cinco anos, o que, indiretamente, obriga maior diligência entre os sócios. Com a morte de um dos sócios, caso o contrato social seja omisso, o art. 1.028 do CC, em regra, determina a liquidação da quota, isto é, apuram-se os haveres, ocorrendo a dissolução parcial; ou, como a trata o CC, a resolução da sociedade em relação a um sócio, privilegiando assim o princípio da preservação da empresa: Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido. Sócio remisso na Sociedade Limitada O principal dever de um sócio de qualquer sociedade é honrar o seu compromisso de subscrição do capital social. Se não o fizer, será considerado como remisso. Poderá ser efetuada a cobrança de forma judicial – pelo processo de execução, no caso de o contrato social atender às características do título executivo extrajudicial – ou extrajudicial. Nas duas situações, deverá ocorrer a notificação ao sócio remisso com antecedência mínima de 30 dias, a fim de que possa ser cobrado o valor devido e o dano emergente da mora. O sócio remisso na Sociedade Limitada é tratado com algumas medidas, vejamos: 32 Art. 1.058. Não integralizada a quota de sócio remisso, os outros sócios podem, sem prejuízo do disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros, excluindo o primitivo titular e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas. O art. 1.004 do CC, por sua vez, trata da constituição da mora: Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. O professor Sergio Cavalieri Filho (2008) assim dispõe sobre as espécies de mora: A mora pode, ainda ser ex re, quando houver estipulação de termo certo para o cumprimento da obrigação, independente de notificação, ocorrendo pleno iure, em razão da regra dies interpellat pro homine (CC, art. 397) não havendo dia determinado para o cumprimento da obrigação, a mora será ex persona, caso em que a notificação ou citação do devedor será indispensável para a constituição em mora (CC, art. 397, parágrafo único; CPC, art. 219). A doutrina se posiciona no sentido de que a espécie de mora a ser considerada deve ser ex re. Vejamos o entendimento da professora Mônica Gusmão (2009): Comungamos desse entendimento. Passamos a sustentar que admitir a mora ex re quando a lei a determina ex persona, ou seja, a mora do sócio remisso somente se caracterizará após prévia notificação para pagamento do valor devido, no prazo de trinta dias, acarretaria grave violação de direito legalmente assegurado. Tendo o sócio, após a mora, o prazo de trinta dias para adimplir sua obrigação. O contrato social somente pode contrariar a lei quando estipular condições mais benéficas aos sócios. As condições mínimas legais não podem ser desrespeitadas em seu detrimento. A exclusão do sócio remisso vai ao encontro do princípio da preservação da empresa. A exclusão do sócio poderá ocorrer de forma judicial e extrajudicial. Se judicial, dependerá da maioria dos demais sócios, podendo, inclusive, o sócio majoritário ser excluído, conforme o art. 1.030 do CC, a seguir: 33 Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. Nesse sentido, a título exemplificativo, apresentamos decisão do STJ: EMENTA: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ARTS.489 E 1.022 DO CPC/2015. VIOLAÇÃO. AUSÊNCIA. DOCUMENTOS. JUNTADA TARDIA. POSSIBILIDADE.SÚMULANº 83/STJ. SOCIEDADE EMPRESARIAL EXCLUSÃO. SÓCIOS MAJORITÁRIOS. ART. 1.030 DO CC. INICIATIVA. SÓCIOS MINORITÁRIOS. FALTA GRAVE. AFASTAMENTO. DELIBERAÇÃO. CAPITAL SOCIAL. MAIORIA. DESCABIMENTO. DIREITO. EXERCÍCIO NOCIVO. ART. 187 DO CC. CONDUTA. ADMINISTRADORES. PODERES. EXTENSÃO. CONTRATO SOCIAL. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS Nos 5 E 7/STJ. ADMINISTRADOR. RENÚNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO. RAZÕES DISSOCIADAS. SÚMULA Nº 284/STF. DANOS MATERIAIS. DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. JAZIDA MINERAL. TITULARIDADE. DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. CÓDIGO DE MINAS. PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 282/STF. EXPLORAÇÃO LÍCITA. JAZIDAS. INICIATIVA PRIVADA. INDENIZAÇÃO. 1. Não há falar em deficiência na prestação jurisdicional quando o tribunal de origem indica adequadamente os motivos que lhe formaram o convencimento e decide de forma clara, precisa e completa as questões relevantes do processo. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a juntada tardia de documentos que não sejam os indispensáveis para a propositura da ação, desde que inexista má-fé ou intenção de surpreender o juízo, e que tenha sido respeitado o contraditório no caso concreto. 3. É possível a exclusão judicial de sócio majoritário de sociedade limitada por falta grave no cumprimento de suas obrigações, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios minoritários. Precedente. 4. A deliberação realizada pela maioria do capital social da empresa não tem o condão de afastar a falta grave, porquanto, embora a maioria detenha o direito legítimo de impor à sociedade suas deliberações, a lei reconhece que mesmo os titulares de direitos cometem ato ilícito ao exercê-los de forma nociva. 34 5. Na espécie, rever a conclusão do acórdão recorrido é providência que esbarra nas Súmulas nos 5 e 7/STJ. 6. Encontrando-se as razões recursais dissociadas dos fundamentos do acórdão recorrido, e não indicando com precisão o dispositivo de lei federal supostamente violado, ou ainda, deixando de especificar de que forma ele teria sido contrariado na origem, o apelo nobre fica inviabilizado em virtude da aplicação, por analogia, da Súmula nº 284/STF. 7. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial, a análise de ofensa a dispositivos constitucionais, cuja competência é do Supremo Tribunal Federal, consoante o disposto no artigo 102 da Constituição Federal. 8. A ausência de prequestionamento da matéria infraconstitucional obsta o exame do recurso especial (Súmula nº 282/STF). 9. A atribuição constitucional da titularidade das jazidas à União não impede que se reconheça o direito à indenização a empresas que exploram licitamente a atividade minerária. Precedente do Supremo Tribunal Federal. 10. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1640387-RJ. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial 2019/0375557-3. Relator: ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. DJe, 24/03/2023). Outra forma seria os sócios tomarem para si as quotas do sócio remisso ou transferi-las para terceiros, não havendo assim a redução do capital social. Se a opção for a transferência das quotas para terceiro, deverá ocorrer a aprovação de 75% dos demais sócios, conforme determina o art. 1.057 do CC. A sociedade poderá também, na existência de fundos disponíveis, adquirir as quotas do remisso, tornando-se sócia de si mesma. Por fim, os sócios podem decidir pela redução da participação do sócio remisso ao montante das quotas integralizadas por ele, ocorrendo diluição da sua participação societária. Se a exclusão for extrajudicial, estará amparada no art. 1.085 do CC: Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. 35 Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019) Nesse sentido, é necessário que seja garantido ao sócio a ser excluído o direito ao contraditório. Nessas situações, ocorrerá redução do capital social na proporção das quotas do remisso, e deverá ser devolvido a ele o valor das suas quotas, apurado por balanço de determinação conforme preceitua o art. 1.031 do CC: Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. § 1º O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. § 2º A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário. Quotas preferenciais na Sociedade Limitada A Instrução Normativa Drei nº 81, de 10 de junho de 2020, no Anexo IV, prevê a possibilidade de se estabelecerem quotas preferenciais na Sociedade Limitada, vejamos: 5.3.1. Quotas preferenciais São admitidas quotas de classes distintas, nas proporções e condições definidas no contrato social, que atribuam a seus titulares direitos econômicos e políticos diversos, podendo ser suprimido ou limitado o direito de voto pelo sócio titular da quota preferencial respectiva, observados os limites da Lei nº 6.404, de 1976, aplicada supletivamente. Havendo quotas preferenciais sem direito a voto, para efeito de cálculo dos quóruns de instalação e deliberação previstos no Código Civil consideram- se apenas as quotas com direito a voto. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13792.htm#art4 36 As preferências consistem em uma vantagem econômica ou política às quotas nas condições estabelecidas no contrato social. A admissão de quotas preferenciais é um importante instrumento de governança na Sociedade Limitada. A referida instrução normativa também prevê que a presença de institutos típicos da Sociedade Anônima no contrato social implica, para fins de registro, a adoção automática da regência supletiva pela Lei das S/A – art. 1.053, parágrafo único, do CC –, vejamos: 5.3. [...] Para fins de registro na Junta Comercial, a regência supletiva: I - poderá ser prevista de forma expressa; ou II - presumir-se-á pela adoção de qualquer instituto próprio das sociedades anônimas, desde que compatível com a natureza da sociedade limitada, tais como: a) quotas em tesouraria; b) quotas preferenciais; c) conselho de administração; e d) conselho fiscal. 5.3.1. Quotas preferenciais São admitidas quotas de classes distintas, nas proporções e condições definidas no contrato social, que atribuam a seus titulares direitos econômicos e políticos diversos, podendo ser suprimido ou limitado o direito de voto pelo sócio titular da quota preferencial respectiva, observados os limites da Lei nº 6.404, de 1976, aplicada supletivamente. Havendo quotas preferenciais sem direito a voto, para efeito de cálculo dos quóruns de instalação e deliberação previstos no Código Civil consideram- se apenas as quotas com direito a voto. Deverão ser observados os limites de quotas preferenciais sem voto, nos mesmos parâmetros do art. 15, § 2º, da Lei das S/A, não podendo ultrapassar 50% do total das quotas emitidas. Com a adoção de quotas preferenciais, aumenta a possibilidade de arranjos societários, bem como a presença de sóciomeramente investidor, entre outras possibilidades de fomento da atividade econômica. Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 6.104/2019, que propõe a inclusão do art. 1.053-A do CC, no contexto da Sociedade Limitada, possibilitando a criação de quotas preferenciais com ou sem restrição de voto. 37 Papel do sócio, administração e responsabilidade dos administradores Centro de imputação do controle da Sociedade Limitada Ao ingressar em uma sociedade subscrevendo o seu capital social por meio da aquisição de quotas, como já falado, o sócio adquire direitos patrimoniais e pessoais em face da sociedade, os quais lhe permitem participar da vida da sociedade. À luz do Decreto nº 3.708/1919, o controle da Sociedade Limitada era feito pelo sócio que detivesse a maioria do capital social. Com a vigência do CC, esse controle foi alterado. Passou-se a exigir 75% do capital social para a aquisição do controle, pois na redação original do art. 1.076, I, do CC, assim determinava o quórum necessário para a modificação do contrato social, o que alterou substancialmente o centro de imputação do controle da sociedade, o que foi bastante criticado pela doutrina à época. No intuito de minimizar as críticas à alteração promovida pelo CC, a Lei Complementar nº 123/2006, passou a estabelecer que, para o segmento das MEs e EPPs, o controle da sociedade seria realizado por maioria absoluta, isto é, metade mais um do capital social, criando na realidade um anacronismo: nas Sociedades Limitadas em geral, o controle seria realizado por quem detivesse 75% do capital social; nas MEs e EPPs, isso se daria por metade mais um do capital social. Com o advento da Lei nº 14.451/2022, essa situação se alterou novamente, ressalvando aquelas Sociedades Limitadas enquadradas com ME e EPP pela Lei Complementar nº 123/2006. Com a revogação do art. 1.076, I, que determinava o quórum de 75% do capital social para o controle da sociedade, iguala-se à Lei Complementar nº 123/2006 com a necessidade da maioria absoluta do capital social, vejamos: Art. 1.076. Ressalvado o disposto no art. 1.061, as deliberações dos sócios serão tomadas (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019) I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.451, de 2022) II - pelos votos correspondentes a mais da metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV, V, VI e VIII do caput do art. 1.071 deste Código; (Redação dada pela Lei nº 14.451, de 2022). O controle da sociedade se fundamenta em razão de uma estabilidade, mas essas constantes mudanças – muitas até salutares – criam insegurança jurídica, afetando sobremaneira o ambiente de negócios. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13792.htm#art3 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Lei/L14451.htm#art2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#art1071ii https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#art1071viii https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#art1071viii https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Lei/L14451.htm#art2 38 Administração da Sociedade Limitada A administração da Sociedade Limitada deverá ser exercida por pessoa natural, conforme determinação do art. 997, VI, do CC. Poderá ser nomeado por meio do contrato ou por ato separado – instrumento parassocial específico para o tema –, que traduz maior celeridade na gestão da Sociedade Limitada, pois, conforme dispõe o art. 1.019, parágrafo único, do CC, são revogáveis a qualquer tempo os poderes conferidos por ato separado, vejamos: Art. 1.019. São irrevogáveis os poderes do sócio investido na administração por cláusula expressa do contrato social, salvo justa causa, reconhecida judicialmente, a pedido de qualquer dos sócios. Parágrafo único. São revogáveis, a qualquer tempo, os poderes conferidos a sócio por ato separado, ou a quem não seja sócio. O administrador possui deveres em relação à sociedade. Além disso, deve-se observar que existem alguns impedimentos ao exercício da administração, entre eles: Art. 1.011. O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios. § 1º Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação. Outros impedimentos ao exercício da função de administrador estão previstos em leis especiais, como no caso do impedimento de: servidor público federal; falido não reabilitado; e membros da magistratura, por exemplo. A sociedade pratica atos por meio dos seus administradores de acordo com o art. 1.022 do CC: Art. 1.022. A sociedade adquire direitos, assume obrigações e procede judicialmente, por meio de administradores com poderes especiais, ou, não os havendo, por intermédio de qualquer administrador. 39 O administrador deverá, no exercício da sua função: ser diligente; ser leal; prestar informações; e prestar contas. Quando o contrato social nada dispuser, a administração caberá a cada um dos sócios. A administração da sociedade tem caráter personalíssimo, não podendo ocorrer delegação, contudo, pode constituir mandatário. Nesse sentido, o mandatário agirá em nome do administrador, e não no seu próprio nome, conforme o art. 1.018 do CC: Art. 1.018. Ao administrador é vedado fazer-se substituir no exercício de suas funções, sendo-lhe facultado, nos limites de seus poderes, constituir mandatários da sociedade, especificados no instrumento os atos e operações que poderão praticar. A Instrução Normativa Drei nº 81/2020, anteriormente citada, também prevê no seu Anexo IV, item 1.2.13.5, a possibilidade de constituição de um conselho de administração na Sociedade Limitada, vejamos: Conselho de Administração Fica facultada a criação de Conselho de Administração na Sociedade Empresária Limitada, aplicando-se, por analogia, as regras previstas na Lei 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976. Quando adotado o conselho de administração, o administrador poderá ser estrangeiro ou residente no exterior, devendo, contudo, apresentar procuração outorgando poderes específicos a residente no Brasil para receber citação judicial em seu nome (art. 146, § 2º, da Lei 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976). A existência de um conselho de administração vai ao encontro dos preceitos estipulados para uma boa governança. Responsabilidade dos administradores Por ato regular de gestão, o administrador não responde pessoalmente. Apesar disso, a responsabilidade dos administradores tem natureza subjetiva, isto é, depende de culpa, conforme o art. 1.016 do CC: 40 Art. 1.016. Os administradores respondem solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa no desempenho de suas funções. Quando um sócio se retira, é excluído ou falece, ainda assim deverá responsabilizar-se – ou os seus herdeiros, no caso de falecimento – pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a alteração, vejamos: Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação. Ratificando tal entendimento, temos: EMENTA: RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ- EXECUTIVIDADE. EXECUTADA. SOCIEDADE LIMITADA. RESPONSABILIDADE. EX-SÓCIO. CESSÃO.QUOTAS SOCIAIS. AVERBAÇÃO. REALIZADA. OBRIGAÇÕES COBRADAS. PERÍODO. POSTERIOR À CESSÃO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO EX-SÓCIO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nos 2 e 3/STJ). 2. A controvérsia a ser dirimida reside em verificar se o ex-sócio que se retirou de sociedade limitada, mediante cessão de suas quotas, é responsável por obrigação contraída pela empresa em período posterior à averbação da respectiva alteração contratual. 3. Na hipótese de cessão de quotas sociais, a responsabilidade do cedente pelo prazo de até 2 (dois) anos após a averbação da respectiva modificação contratual restringe-se às obrigações sociais contraídas no período em que ele ainda ostentava a qualidade de sócio, ou seja, antes da sua retirada da sociedade. Inteligência dos arts. 1.003, parágrafo único, 1.032 e 1.057, parágrafo único, do Código Civil de 2002. 4. Recurso especial conhecido e provido (REsp 1537521-RJ Recurso Especial 2015/0062165-9. Relator: ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. DJe, 12/02/2019). 41 A Lei de Ambiente de Negócios revogou o parágrafo único do art. 1.015 do CC, retirando do nosso ordenamento a Teoria Ultra Vires Societatis. Fato é que esta nunca deveria ter sido integrada ao CC, em especial, pelo abandono da sua utilização no seu país de origem. Isso confirma, portanto, a aplicação da Teoria da Aparência, segundo a qual a sociedade responderá pelos atos praticados pelo seu administrador em face de terceiros e, se necessário, buscará do seu administrador a reparação civil, privilegiando assim o direito do credor. Administrador e desconsideração da personalidade jurídica Se houver abuso da personalidade jurídica com o objetivo de burlar credores ou fraudar obrigações, será o caso da aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do CC: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019) § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) I - cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) II - transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) III - outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 42 § 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019) § 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019). Nesse contexto, podemos exemplificar: EMENTA: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. HERDEIRA. SÓCIO MINORITÁRIO. PODERES DE GERÊNCIA OU ADMINISTRAÇÃO. ATOS FRAUDULENTOS. CONTRIBUIÇÃO. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE. EXCLUSÃO. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nos 2 e 3/STJ). 2. Cuida-se, na origem, de ação de indenização por danos morais e materiais na fase de cumprimento de sentença. 3. A questão central a ser dirimida no presente recurso consiste em saber se a herdeira do sócio minoritário que não teve participação na prática dos atos de abuso ou fraude deve ser incluída no polo passivo da execução. 4. A desconsideração da personalidade jurídica, em regra, deve atingir somente os sócios administradores ou que comprovadamente contribuíram para a prática dos atos caracterizadores do abuso da personalidade jurídica. 5. No caso dos autos, deve ser afastada a responsabilidade da herdeira do sócio minoritário, sem poderes de administração, que não contribuiu para a prática dos atos fraudulentos. 6. Recurso especial não provido (REsp 1861306-SP. Recurso Especial 2017/0131056-8. Relator: ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. DJe, 08/02/2021). Observamos que as alterações introduzidas no art. 50 do CC pela Lei de Liberdade Econômica introduziram contornos mais específicos à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13874.htm#art7 Neste módulo, refletiremos sobre as deliberações de sócios no contexto das sociedades limitadas e apresentaremos os formatos de deliberação, bem como a diferença entre reunião e assembleia de sócios. Detalharemos a legitimidade de convocação das deliberações e a periodicidade de cada modelo deliberativo. Analisaremos os quóruns de instalações e deliberações, bem como o impacto da Lei nº 14.451/2022, que trata da redução dos quóruns de algumas matérias submetidas às deliberações nas sociedades limitadas. Deliberações de sócios nas Sociedades Limitadas Na Sociedade Limitada, como em qualquer corporação com agregação de pessoas, o seu planejamento estratégico e decisório se estrutura por meio das deliberações dos sócios. Nesse sentido, as deliberações se traduzem pelas reflexões e discussões sobre determinadas pautas que pontuam as necessidades daquela sociedade, ora denominadas de ordinárias, para decisão de assuntos comuns estabelecidos no contrato social ou na lei, como aprovação das contas do administrador; ora, quando emergenciais, classificadas como extraordinárias, quando as matérias a serem discutidas estão ausentes de previsão contratual ou legal. Conceito e características das deliberações de sócios As deliberações dos sócios comportam o chamado órgão social da Sociedade Limitada, que, em conjunto com os órgãos da administração e de fiscalização, molda a arquitetura organizacional. Como órgão social, as deliberações são compostas de todos os sócios da sociedade, MÓDULO III – SOCIEDADE LIMITADA E MODALIDADES DE DELIBERAÇÕES DE SÓCIOS 44 independentemente de serem titulares de quotas ordináriasou de quotas preferenciais, porque o ato da discussão sobre determinada matéria, próprio das deliberações, não se confunde com o fato de as quotas conferirem aos seus titulares o direito ou não ao voto, características, respectivamente, das ações ordinárias e preferenciais. Apesar de as deliberações nas sociedades limitadas não apresentarem um cenário democrático, já que na gigantesca maioria das matérias societárias a força do voto está vinculada à maior parcela do capital social, é certo que elas reproduzem, como nos demais tipos societários, uma decisão soberana da sociedade, no sentido de que nenhuma dinâmica poderá ser realizada em contrário ao que for decidido em deliberação societária, sob pena de acarretar responsabilidade do agente infrator. Na mesma sequência, pela supremacia das deliberações societárias, elas devem atentar para os requisitos legais para que produzam validade e eficácia jurídicas em relação às discussões aprovadas. Os arts. 1.071 a 1.080-A do CC tratam das disposições sobre as deliberações de sócios nas sociedades limitadas e listam desde as matérias a serem pautadas nas deliberações, a forma de convocação, as modalidades no formato de reunião ou de assembleia, até a legitimidade para convocá-las, além da sua periodicidade e das hipóteses de dispensa das convocações, tópicos que serão tratados a seguir. Matérias submetidas às deliberações de sócios e legitimidade de convocação O art. 1.071 do CC disciplina as matérias societárias que se submetem à deliberação de sócios. Pela leitura do caput do dispositivo, verifica-se que o rol não é taxativo e que tanto a lei como o contrato social podem indicar outros assuntos que julgarem pertinentes para deliberação. Vejamos: Art. 1.071. Dependem da deliberação dos sócios, além de outras matérias indicadas na lei ou no contrato: I - a aprovação das contas da administração; II - a designação dos administradores, quando feita em ato separado; III - a destituição dos administradores; IV - o modo de sua remuneração, quando não estabelecido no contrato; V - a modificação do contrato social; VI - a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação; VII - a nomeação e destituição dos liquidantes e o julgamento das suas contas; VIII - o pedido de concordata. (grifo nosso) 45 Com efeito, o pedido de concordata, grifado no inciso VIII do artigo disposto acima, deve ser substituído pelo pedido de recuperação judicial, porque a Lei nº 11.101/2005, posterior ao CC/2002, revogou o instituto da concordata no Brasil e implementou a recuperação judicial para as empresas que estivem em crise econômico-financeira com viabilidade de reerguimento. Considerando que a deliberação de sócios, em especial sobre as matérias elencadas no art. 1.071 do CC, é um ato solene com registro em ata arquivada na Junta Comercial, a sua convocação deve atentar para os agentes legitimados para essa dinâmica. Nesse cenário, a regra de convocação das deliberações está disposta na parte final do art. 1.072 do CC, a qual disciplina que tais deliberações devem ser convocadas pelos administradores nos casos previstos em lei ou no contrato. Poderá também ser convocada pelos sócios ou pelo conselho fiscal, se houver, nas hipóteses previstas no art. 1.073 do CC. Nesse sentido, o referido artigo estabelece que será convocada por sócio, quando os administradores retardarem a convocação, por mais de 60 dias, nos casos previstos em lei ou no contrato; por titulares de mais de 1/5 do capital, quando não atendido, no prazo de oito dias, pedido de convocação fundamentado, com indicação das matérias a serem tratadas; e pelo conselho fiscal, se houver, caso a diretoria retarde por mais de 30 dias a sua convocação anual, ou sempre que ocorram motivos graves e urgentes (art. 1.069, V, CC). Modalidades de deliberações de sócios: reunião e assembleia De acordo com o art. 1.072 do CC, as deliberações dos sócios nos casos previstos em lei ou no contrato serão tomadas em dois formatos: em reunião ou em assembleia. A assembleia, em especial, até o advento do CC/2002, era um modelo próprio das sociedades por ações; hoje, também compõem um desenho deliberativo alternativo, com conjunto com as reuniões, para as deliberações das sociedades limitadas, sendo que, para as sociedades limitadas com o número de sócios superior a 10 membros, será obrigatória a deliberação no modelo de assembleia, conforme dispõe o § 1º do art. 1.072 do CC. A distinção entre a reunião e a assembleia, além da própria denominação, consiste no fato de as normas de funcionamento da assembleia serem estabelecidas pelo CC, devendo ser obrigatoriamente observadas, sendo vedado aos sócios estipularem no contrato social regras contrárias às legais. Um exemplo de formalidade é a convocação da assembleia dos sócios, que deve ser feita por meio da publicação do anúncio de convocação pelo menos por três vezes, em órgão oficial da União ou do estado, dependendo da localidade da sede social; e em jornal de grande circulação. Já para as deliberações no modelo de reunião há liberdade contratual para que os sócios possam dispor o que atender ao melhor interesse da sociedade, obedecendo a uma norma de funcionamento mais simples. Dessa forma, é possível definir no contrato social que a reunião dos sócios será convocada por e-mail ou por carta, por exemplo. No entanto, caso o contrato social seja omisso em relação aos procedimentos quanto ao funcionamento da reunião dos sócios, a essa modalidade deverá ser aplicado o procedimento da assembleia dos sócios (arts. 1.072, § 6º; e 1.079, CC). 46 Dessa forma, a princípio, quando a sociedade puder optar livremente entre as duas formas de deliberação, a mais escolhida é a reunião de sócios justamente pela liberdade e pela celeridade na realização. Também é possível a realização de reunião ou assembleia de sócios virtual ou semipresencial, desde que observada a Instrução Normativa Drei nº 81/2020. Deliberação no formato virtual Com a pandemia de Covid-19 e a necessidade de imediata modernização do sistema societário, foi editada a Medida Provisória nº 931, de 30 de março de 2020, posteriormente convertida na Lei nº 14.030, de 28 de julho de 2020, que consolidou a possibilidade de realização de assembleia virtual, semipresencial e participação por voto a distância, respeitados os direitos legalmente previstos de participação e de manifestação dos sócios e os demais requisitos regulamentares. São consideradas virtuais as reuniões ou assembleias das quais os sócios participam e votam apenas a distância, sem a realização da assembleia presencial. Por sua vez, são consideradas semipresenciais as reuniões das quais os sócios podem participar ou votar presencialmente ou a distância. Na mesma sequência, a Instrução Normativa Drei nº 81/2020 trouxe que todos os documentos e atos empresariais produzidos por meio eletrônico deverão ser assinados eletronicamente pelos seus signatários, com qualquer certificado digital emitido por entidade credenciada pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) ou, ainda, utilizar qualquer outro meio de comprovação da autoria e da integridade de documentos em forma eletrônica, nos termos do § 2º do art. 10 da Medida Provisória nº 2.200-2, de 24 de agosto de 2001. A Instrução Normativa nº 81/2020 e a Instrução Normativa nº 79, de 22 de novembro de 2022, ambas editadas pelo Drei, definiram os requisitos para a realização de assembleias virtuais e semipresenciais de sociedades limitadas e anônimas fechadas, as quais estabelecem o seguinte: i. registro de presença dos sócios, acionistas ou associados ou dos seus representantes; ii. registro dos votos e demais manifestações de vontade proferidas pelos participantes durante a reunião; iii. gravação integral do conclave, que ficará arquivada na sede da sociedade pelo prazo aplicável à ação que vise a anular o conclave; iv.possibilidade de visualização de documentos apresentados durante o conclave; v. segurança, confiabilidade e transparência do conclave; vi. observância das normas atinentes ao respectivo tipo societário, bem como às normas do contrato ou estatuto social da sociedade, conforme o caso, quanto à convocação, instalação e deliberação; vii. disponibilização de documentos e informações em meio digital seguro; 47 viii. detalhamento sobre como acionistas, sócios ou associados podem participar e votar a distância, podendo ser feito inclusive no anúncio de convocação de forma resumida, com indicação de endereço eletrônico na rede mundial de computadores em que as informações completas devem estar disponíveis de forma segura; ix. adoção de sistema e tecnologia acessíveis para que todos os acionistas, sócios ou associados participem e votem a distância na assembleia ou na reunião, semipresencial ou digital. A participação e a votação remota devem ocorrer por meio de boletim de voto a distância ou de um sistema próprio eletrônico disponibilizado pela sociedade. Nesses casos, o edital de convocação deverá sempre informar se a reunião será semipresencial ou digital, deverá listar os documentos que serão exigidos para que sócios ou os seus representantes legais sejam admitidos e deve detalhar os mecanismos que serão utilizados para viabilizá-las. Medidas como essas visam adequar a rotina societária à realidade cotidiana e viabilizar o exercício das atividades societárias em um regime híbrido e remoto de distanciamento social. Formalidade de convocação: dispensa e periodicidade das deliberações Formalidade de convocação As sociedades limitadas devem publicar anúncio de convocação para a reunião ou a assembleia de sócios, no mínimo três vezes, devendo mediar, entre a data da primeira inserção e a da realização da assembleia, o prazo mínimo de oito dias, para a primeira convocação, e de cinco dias, para as posteriores, nos termos do § 3º do art. 1.152 do CC. Isso significa que, no caso de insucesso da primeira convocação, a segunda convocação também exige a publicação por três vezes, porém reduz o prazo entre a data da primeira publicação e a da realização da assembleia para cinco dias. Dispensa da formalidade de convocação A formalidade de convocação por publicação se torna dispensável quando todos os sócios comparecerem à reunião ou à assembleia ou quando se declararem, por escrito, cientes do local, da data, da hora e da ordem do dia, conforme dispõe o § 2º do art. 1.072 do CC. Vejamos: Art. 1.072. [...] § 2º Dispensam-se as formalidades de convocação previstas no § 3º do art. 1.152, quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia. 48 As sociedades limitadas, em regra, são modelos societários voltados para pequenos e médios estabelecimentos e com poucos sócios, dada a sua forma menos rígida de constituição e de manutenção menos custosa em comparação com as sociedades anônimas e, esse entendimento também norteou a legislação ao dispensar as formalidades de convocação das deliberações de sócios previstas no § 3º do art. 1.152 do CC quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, da data, da hora e da ordem do dia. Isso ocorre porque, sendo as sociedades limitadas compostas, na maioria das vezes, de um número mínimo de sócios, a ciência das informações sobre a deliberação se torna mais fácil do que em relação às sociedades anônimas. Um registro importante é não confundir a dispensa das formalidades da convocação da deliberação, há pouco analisada e prevista no § 2º do art. 1.072 do CC, com a dispensa da própria deliberação disposta no § 3º do mesmo artigo acima citado, que assim dispõe: Art. 1.072. [...] § 3º A reunião ou a assembleia tornam-se dispensáveis quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto delas. A dispensa da reunião ou da assembleia está ligada ao fato de a estrutura das sociedades limitadas ser de menor complexidade, constituída, em regra, de poucos sócios e voltada para empreendimentos de pouca monta, em que a unanimidade dos sócios sobre uma matéria é uma realidade fácil de ser alcançada. A matéria assume importância porque a inobservância dos dispositivos legais acarreta a nulidade da deliberação, como o exemplo da decisão decorrente do agravo de instrumento proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), parcialmente descrito a seguir: Ação declaratória de nulidade de deliberação assemblear. Concessão de tutela provisória. Cabimento. Alteração do contrato social. Reunião realizada sem observância das formalidades legais exigidas para a convocação de sócios. Presença de sócios que, juntos, representam apenas 35% do capital social. Exigência contratual e legal de maioria absoluta do capital social para deliberação. Arts. 1071, II, e 1152, § 3º, do Código Civil. Ausência de razão, ao menos em princípio, para obstar a participação nas reuniões do curador dos interesses de sócio detentor de 25% das quotas do capital social e incapaz para os atos da vida civil, conforme permite o art. 974 do Código Civil. Decisão mantida. Agravo desprovido (AI 2081566-39.2020.8.26.0000; Ac. 14123668; Campinas; Primeira Câmara Reservada de Direito Empresarial; relator: desembargador Pereira Calças; julgamento em 5 de novembro de 2020; DJESP, 10 de novembro de 2020). 49 Periodicidade das deliberações de sócios Todos os anos, nos quatro meses seguintes após o término do exercício social, os sócios das sociedades limitadas devem realizar reuniões ou assembleias de sócios, nos termos do art. 1.078 do CC, para: i) deliberar sobre a tomada de contas dos administradores, o balanço patrimonial e o resultado econômico; ii) designar administradores, quando for o caso; e iii) tratar de qualquer outro assunto constante da ordem do dia. Pela periodicidade anual e pela matéria tratada em lei, essas reuniões ou assembleias são denominadas de Assembleias Gerais Ordinárias (AGOs). Esse conceito decorre da lei das sociedades por ações, mas também pode ser estendido para deliberações em modelo de reunião. Todas as demais pautas inseridas para deliberações de sócios que não estejam listadas no art. 1.070 do CC são classificadas como Assembleias Gerais Extraordinárias (AGEs), que, pelo próprio nome, também não estão vinculadas ao período de realizadas das AGOs. A figura 1, a seguir, demonstra a periodicidade e a legitimidade de convocação assemblear, também aplicadas ao formate de reunião. Figura 1 – Periodicidade e legitimidade de convocação das deliberações Fonte: elaboração própria Uma discussão se deu a respeito da deliberação sobre as matérias listadas no art. 1.078 do CC, próprias das AGOs, porém realizadas fora do prazo dos quatro meses subsequentes ao exercício social da sociedade: se tal episódio deslocaria a assembleia para uma deliberação extraordinária. Hoje, a questão se encontra pacificada com tese firmada pelos tribunais superiores no sentido de que as matérias têm prevalência sobre o prazo da sua realização e, por tal razão, ainda que fora do seu tempo, elas são mantidas como AGO, restando apenas ação de responsabilidade aos administradores pela omissão. 50 Para as sociedades que têm o seu exercício social coincidente com o ano civil, o prazo para a realização da AGO referente ao exercício do corrente se encerrará em 30 de abril do ano subsequente. A importância de tal registro é que a omissão de convocação por parte dos administradores, não obstante não acarretar a impossibilidade de os demais sócios realizarem a convocação deliberativa, resultará na responsabilidade dos administradores pela referida omissão. Como a legislação impôs um período para a realização da AGO, a referida norma coercitiva não atribui aos administradores um ato de livre oportunidade e conveniênciapara a convocação da referida deliberação. Nesse sentido, a omissão das AGOs nos quatro primeiros meses do ano seguinte ao término do exercício social acarreta responsabilidade dos administradores pelos danos causados à sociedade ou a terceiros, independentemente de outros agentes assumirem a legitimidade de convocação assemblear diante da inação dos administradores. Segundo Coelho (2017, p. 180), a assembleia ou reunião dos sócios sempre pode ser substituída por documento que explicite a deliberação adotada, desde que assinado pela totalidade dos sócios. Sempre que houver consenso entre os sócios relativamente às deliberações sociais que exigem a formalidade da lei, deverá ser menos custoso adotar o documento substitutivo. Quóruns de instalação e deliberativo nas deliberações de sócios Conceito de quórum O quórum societário é o número mínimo de participação social referente ao titular de quotas que deve manifestar-se a respeito de determinada matéria, para que ela seja aprovada. A regra nas sociedades limitadas, quando, por lei ou pelo contrato social, competir aos sócios decidir sobre os negócios da sociedade, é de que as deliberações são tomadas por maioria de votos, contados segundo o valor das quotas de cada um. Nesse caso, para a formação da maioria absoluta são necessários votos correspondentes a mais de metade do capital. Excepcionalmente, algumas matérias podem ter o quórum vinculado à maioria dos presentes na assembleia ou reunião, como ocorre nas deliberações para aprovação das contas da administração. Quóruns de instalação e de deliberação De acordo com o art. 1.074 do CC, a assembleia dos sócios se instala com a presença, em primeira convocação, de titulares de no mínimo 3/4 do capital social; e, em segunda, com qualquer número. O sócio pode ser representado na assembleia por outro sócio ou por advogado, mediante outorga de mandato com especificação dos atos autorizados, devendo o instrumento ser levado a registro, juntamente com a ata. Aplicam-se as mesmas regras para as deliberações no modelo de reunião. 51 O quórum de deliberação é o quórum de discussão da matéria colocada em pauta para que ela seja aprovada ou rejeitada pelos sócios. O exame desse quórum, respeitando a linha do tempo, está após a submissão do quórum de instalação, de modo que se este não for atingido, não há que se falar em primeira convocação no quórum de deliberação. O CC estabeleceu os quóruns de deliberação de algumas matérias, em especial as elencadas no art. 1.071 do CC, deixando que o contrato social pautasse outras matérias além das dispostas em lei e estabelecesse quórum diferenciado para aquelas previstas no diploma legal, desde que se obedeça ao mínimo estabelecido pela legislação civilista. No entanto, o grande embate firmado nas discussões sobre esse tema pela doutrina era o elevado quórum em algumas matérias, como o estabelecido para a designação de administradores não sócios, cujo quórum de deliberação era de unanimidade dos sócios enquanto o capital não estivesse integralizado ou, ainda, o quórum de 3/4 do capital social para a modificação do contrato social e a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade ou a cessação do estado de liquidação. É natural que, sob essa ótica de quóruns altos, é nítida a intenção da legislação de conferir um protagonismo ao sócio minoritário, visto que o diálogo para compor interesses entre ele e o majoritário é necessário para a aprovação da matéria. Ocorre que tal premissa sempre foi combatida por quem estuda o tema, por não facilitar e otimizar a tomada de decisões na Sociedade Limitada, necessária no mercado contemporâneo, afastando, nesse aspecto, a Sociedade Limitada da praticidade da Sociedade Anônima. Nova Lei nº 14.451/2022: redução de quórum A Lei nº 14.451/2022, contudo, modificou os quóruns de deliberação dos sócios da Sociedade Limitada, previstos nos seus arts. 1.061 e 1.076, simplificando o planejamento empresarial, em especial nas tomadas de decisão, pois não são mais necessários grandes percentuais de participação societária para a deliberação de assuntos relevantes para a sociedade. Nessa sequência, o artigo das autoras Cristina Justo e Gabriela Garbelotti intitulado “Sancionada lei reduzindo quóruns de deliberações de sócios em sociedades limitadas” traduz uma realidade trazida pela Lei nº 14.451/2022. Vejamos: A partir das mudanças estabelecidas pela Nova Lei, os contratos sociais vigentes podem ser divididos em duas categoriais: (i) aqueles que faziam referência expressa aos quóruns necessários para aprovação de certas deliberações, como, por exemplo, a necessidade de aprovação por 75% (setenta e cinco por cento) do capital social para modificação do contrato social; e (ii) aqueles que mencionavam, simplesmente, que as deliberações dos sócios seriam tomadas de acordo com o quórum legal, sem, no entanto, especificar qual seria esse quórum. 52 Dessa forma, fica nítido que os sócios de uma Sociedade Limitada podem definir quóruns superiores àqueles previstos na legislação, inclusive aos modificados pela nova Lei. Nessa hipótese, os termos pactuados prevalecem sobre a regra geral do CC. A figura 2, a seguir, resume as inovações da Lei nº 14.451/2022: Figura 2 – Quóruns da Sociedade Limitada: Lei nº 14.451/2022 matéria quórum antes da Lei nº 14.451/2022 quórum depois da Lei nº 14.451/2022 designação de administrador não sócio art. nº 1.061, CC Unanimidade (se o capital social não estiver integralizado) 2/3 do capital social (se o capital social não estiver integralizado) 2/3 do capital social (se o capital social estiver integralizado) mais da metade do capital social (se o capital social estiver integralizado) alteração do contrato social art. nº 1.071, V, CC 3/4 do capital social mais da metade do capital social incorporação, fusão e dissolução da sociedade ou cessação do estado de liquidação art. nº 1.071, VI, CC 3/4 do capital social mais da metade do capital social Fonte: Alves (2023) Uma questão interessante é a aplicação da Lei nº 14.451/2022 na linha do tempo poder gerar direito adquirido ou se constituir em ato jurídico perfeito para os contratos preexistentes à vigência da nova lei. Em outras palavras, para os contratos sociais que mencionavam a aplicação do “quórum legal” para as suas deliberações seriam atingidos pela nova lei ou manteriam o quórum estipulado antes da mudança trazida pela Lei nº 14.451/2022? Juristas como Sergio Campinho (2010, p. 265) e José Edwaldo Tavares Borba (2015, p. 141- 142) sustentam que as disposições contratuais devem adequar-se automaticamente a uma lei nova, de natureza imperativa, não havendo, pois, que se falar em direito adquirido ou ato jurídico perfeito. Nesse sentido, a nova lei será aplicada imediatamente a todas as sociedades limitadas. Neste módulo, estudaremos a nova estrutura das sociedades limitadas diante da adoção de gestão pautada na governança corporativa, do implemento das boas práticas do compliance. Apresentaremos as ações corporativas vinculadas à agenda do ESG, ou seja, Ambiental, Social e Governança (ASG). Aprofundaremos as pressões do mercado no sentido de conduzirem as sociedades a se ajustarem às novas diretrizes, ora moldando uma mudança organizacional por entender que lucro está diretamente ligado aos valores e aos propósitos das organizações, ora se adequando às métricas de desempenho esperadas por stakeholders, em especial, pela análise de consumidores e de investidores que priorizam, respectivamente, a aquisição de produtos e investimentos nas empresas com programa de compliance, com gestão transparente e estruturada em práticas de ESG. Ainda que as limitadas sejam modelos de sociedades voltados para pequenos e médios empreendimentos, o advento de um mundo tecnológico e virtual com grande rede de contatos entre as empresas impulsionou uma nova arquitetura nasgestões das sociedades limitadas estruturada em uma matriz de sustentabilidade. Sociedade Limitada e governança corporativa Conceito governança corporativa O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) define governança corporativa como um sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas por instituições que envolvem interesses de diversos participantes, como acionistas, sócios, conselhos de administração, diretoria das empresas, auditorias independentes, comitês, diretoria e do conselho fiscal (IBGC, 2015). MÓDULO IV – SOCIEDADE LIMITADA CONTEMPORÂNEA: GOVERNANÇA CORPORATIVA, COMPLIANCE E ESG 54 Nesse sentido, a governança corporativa se estrutura em um conjunto de práticas de gestão que envolve o relacionamento entre acionistas, conselho de administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal, com o objetivo de promover a transparência dos negócios, principalmente para acionistas. Um dos seus pilares é a garantia de tratamento igualitário a acionistas minoritários e majoritários. Na sua essência, a governança corporativa tem como principal objetivo recuperar e garantir a confiabilidade em uma determinada empresa para os seus acionistas, criando um conjunto eficiente de mecanismos, tanto de incentivos como de monitoramento, a fim de assegurar que o comportamento dos executivos esteja sempre alinhado com o interesse dos sócios. Não obstante a evolução desse modelo de gestão tenha o seu berço nos grandes empreendimentos, o cenário atual impõe que as pequenas e as médias empresas, perfil próprio das sociedades limitada, ajustem-se a essa matriz para fortalecer o seu desempenho perante os investidores, a sociedade e o poder público como um todo, porque a boa governança corporativa contribui para um desenvolvimento econômico sustentável, proporcionando melhorias no desempenho das empresas. Nesse cenário, a “boa governança” contribui para um desenvolvimento econômico sustentável, proporcionando melhorias no desempenho das empresas, além de maior acesso a fontes externas de capital e redução de fracassos empresariais, em regras, decorrentes de: abusos de poder – do sócio majoritário sobre minoritários, da diretoria sobre o acionista e dos administradores sobre terceiros; erros estratégicos – resultado de muito poder concentrado no executivo principal; fraudes – uso de informação privilegiada em benefício próprio, atuação em conflito de interesses. Princípios da governança corporativa No estudo da governança corporativa, quatro princípios são identificados com os mais relevantes, independentemente de se tratar de pequenos, médios ou grandes empreendimentos, visto que a base principiológica integra os valores da empresa, sem despesas imediatas para o seu implemento. São eles: Princípio da Transparência – consiste no desejo de disponibilizar para as partes interessadas as informações que sejam do seu interesse, e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. Não deve restringir-se ao desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores – inclusive, intangíveis – que norteiam a ação gerencial e que condizem à preservação e à otimização do valor da organização; Princípio da Equidade – caracteriza-se pelo tratamento justo e isonômico de todos os sócios e demais partes interessadas (stakeholders), levando em consideração os direitos, os deveres, as necessidades, os interesses e as expectativas; 55 Princípio da Prestação de Contas (accountability) – agentes de governança devem prestar contas da sua atuação de modo claro, conciso, compreensível e tempestivo, assumindo integralmente as consequências dos seus atos e das suas omissões, atuando com diligência e responsabilidade no âmbito dos seus papéis; Princípio da Responsabilidade Corporativa – agentes de governança devem zelar pela viabilidade econômico-financeira das organizações, reduzir as externalidades negativas dos seus negócios e das suas operações, bem como aumentar as positivas, levando em consideração, no seu modelo de negócios, os diversos capitais – financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental, reputacional, etc. – em curto, médio e longo prazo. No entanto, o compliance, nos últimos tempos, tem sido considerando um princípio norteador para a efetivação da governança corporativa, a partir do momento que tal programa se funda na transparência das ações e na utilização da ética empresarial, pois o programa de compliance está diretamente ligado à estrutura orgânica das corporações, em especial, aos órgãos vinculados à administração da empresa, concentrando em conselheiros e diretores o dever de adesão absoluta ao programa de compliance, consagrada pela expressão Tone from the Top ou Tone at the Top, que, em tradução rasa, significa “o exemplo vem de cima’”; dessa forma, o implemento de um compliance estará nas mãos do “número um” da organização: dono, Chief Executive Officer (CEO), presidente ou equivalente. O ambiente em que se define a estrutura de poder, os processos e as práticas de governança corporativa se subdividem em pelo menos quatro blocos interligados: 1. propriedade; 2. controle; 3. administração; 4. auditoria e fiscalização. É certo que, nos grandes empreendimentos, no modelo de Sociedade Anônima, o controle da sociedade é exercido pelos acionistas majoritários, o que não inclui os minoritários e acionistas preferenciais. A administração é exercida pelo conselho de administração e pela diretoria executiva. O ambiente de auditoria e fiscalização pode ser integrado por quatro órgãos: 1. conselho fiscal; 2. auditoria independente; 3. comitê de auditoria; 4. auditoria interna. Os proprietários se reúnem em assembleia geral, que é órgão soberano da sociedade. Cabem- lhe deliberações de alto impacto nos destinos da companhia. O poder exercido na companhia emana desse órgão superior. 56 O conselho de administração e, exclusivamente, os seus comitês e a auditoria independente atuam como órgãos guardiões dos interesses dos proprietários. A diretoria executiva interage com o conselho de administração no exercício dos poderes e das funções que lhes soa atribuídos, abrangendo as áreas funcionais e de negócios da companhia. A adaptação dessa estrutura para as sociedades limitadas se faz necessário, quer pelo custo dessa gestão como formação de conselho de administração, diretoria e conselho fiscal, quer pelo número mínimo de sócios, natural das sociedades limitadas. Por isso, a gestão transparente pode ser composta dos próprios sócios quotistas assessorados por uma boa consultoria ou ainda, delegar a gestão em governança à empresa que atuem especificamente para pequenas e médias empresas. É claro que a aplicação da gestão em governança não é um modelo rígido que não possa ser aplicado às pequenas empresas, pois o mais relevante é que a base de princípios da governança corporativa seja implementada na cultura organizacional das sociedades limitadas. Triângulo básico da governança A governança corporativa se expressa por um sistema de relações entre pelo menos três atores: i) a propriedade; ii) o conselho de administração; e iii) a diretoria executiva. A essas três âncoras se somam outras, quando se admite a ativa interação com outras partes interessadas no desempenho e nos impactos das corporações. É nítido que nas sociedades limitadas haverá, em regra, a junção desses atores na figura dos quotistas, visto não ser frequente as limitadas se estruturarem em conselho de administração e diretoria. No entanto, esses órgãos se adequam a um conselho consultivo fornecido por empresas que atuam no segmento de consultoria de pequenas empresas. Em caráter excepcional, identificam-se no mercado sociedades limitadas de grande porte, quanto a essas, não se tem problema na construção triangular da governança corporativa. No âmbito de atuação de cada um desses agentes, estabelecem-serelações internas, além das que ligam uns aos outros. No conjunto dos proprietários, as relações internas têm como foco o alinhamento de propósitos empresariais; no colegiado do conselho de administração, a interação construtiva; na diretoria executiva, o alinhamento entre presidente e gestores; e entre outras partes interessadas, a conciliação das suas demandas com o máximo retorno total dos proprietários. Desse modo, independentemente dos princípios e dos propósitos em que se alicerça e do modelo predominantemente praticado em cada empresa, a governança corporativa se expressa por um sistema de relações que formam um triângulo básico composto de três vetores: i) a propriedade; ii) o conselho de administração; e iii) a diretoria executiva. A figura 3, a seguir, demonstra a interligação triangular e as funções desempenhas de cada agente. 57 Figura 3 – Triângulo básico da governança Fonte: IBGC (2015) Quadrilátero de múltiplos interesses Nas três últimas décadas, a importância dos stakeholders que são as partes interessadas que influenciam na tomada de decisões das empresas, como investidores, consumidores, poder público, entre outras, passou a integrar o triângulo básico de governança corporativa, redesenhando a sua estrutura para a de um quadrilátero de múltiplos interesses, que inseriram “as partes interessadas” no modelo de gestão em governança corporativa ao lado do proprietário, do conselho de administração e da diretoria de modo a conciliar as suas demandas com a do máximo retorno dos proprietários. Podemos examinar isso na figura 4, a seguir: 58 Figura 4 – Quadrilátero de múltiplos interesses Fonte: IBGC (2015) De acordo com Andrade e Rossetti (2007, p. 147), o que define a extensão e os objetivos desse relacionamento é a assimilação, pelos proprietários, de responsabilidades corporativas, voltadas para objetivos emergentes como sociais, ambientais e com atores da cadeia de negócios, a montante e a jusante. Importância do programa de compliance nas Sociedades Limitadas Compliance é uma palavra que sobrevém do latim, complere, cujo significado está relacionado “à vontade de fazer o que foi pedido, ou se agir ou estar em concordância. No mesmo sentido, a expressão deriva da língua portuguesa do verbo ‘to comply’ que, em tradução rasa, consiste em ‘cumprir, executar, satisfazer, realizar o que lhe foi imposto’” (Cardoso, 2015, p. 37). 59 Práticas de compliance no Brasil As práticas de compliance no Brasil tiveram o seu merecido destaque com a operação Lava- Jato, que foi deflagrada na década de 2000 e abordou inicialmente as investigações do delito de lavagem de dinheiro e, posteriormente, estendeu-se para os desvios de verbas públicas de empresas como a Petrobras, investigação que provocou uma reorganização não apenas da estatal investigada como também das demais organizações, ativando os seus controles internos para que as suas ações fossem estruturadas na transparência, na ética e na conformidade com os instrumentos regulatórios, alinhando-se ao universo do mercado internacional. No entanto, o estudo do programa de compliance nos remete ao início do século XX, com a criação do Federal Reserve Bank (FED), o Banco Central dos Estados Unidos, cuja proposta inicial era propiciar uma atmosfera mais flexível, segura e estável no campo financeiro. No Brasil, em especial, essa prática também já preexistia aos escândalos anticorrupção, mas, não obstante as esparsas leis já aplicadas à época da Lava-Jato, o compliance era uma ação concentrada nos grandes aglomerados econômicos que, em regra, traziam a cultura do mercado estrangeiro. Hoje, o compliance se traduz em práticas adotadas pelas empresas, dentro de um sistema complexo e interligado por múltiplos elementos que inclui pessoas, processos, sistema eletrônicos, documentos, dinâmicas e diretrizes que o estruturam em uma rede de medidas de boas práticas, no qual o combate à corrupção não se esgota em si próprio, mas se insere entre outros componentes do programa de compliance. Nesse mesmo contexto, a ferramenta do compliance nas empresas, sejam de natureza particular, sejam de natureza pública, evoluiu para a análise de duas perspectivas de grande relevância e que se complementam no processo de implemento desse programa nas corporações. São eles: a alteração da cultura organizacional pautada na ética empresarial e as ações aplicadas nas empresas para que o programa de compliance seja efetivo. Com efeito, o programa de compliance das organizações carrega em si uma ferramenta multidisciplinar que se traduz na sua interação com direito do trabalho, direito criminal, direito reparatório, com gestão de risco e estratégia das empresas, mas é na ética que se identifica o seu embrião. Nesse momento, percebe-se com nitidez que o comportamento ético dos dirigentes e dos seus colaboradores traz o protagonismo de toda a estrutura organizacional do compliance. De fato, há muito o estudo da ética, como uma parte da filosofia, busca problematizar as questões do comportamento humano. Nesse sentido, “moral”, “direito” e “ética” sempre foram canais interligados nos seus conceitos por atuarem no que diz respeito às ações e à conduta das pessoas na sociedade e no mundo. Com a relevância dessa conexão, tanto a “moral” como o “direito” apresentam papéis importantes na sistemática da governança. Aquela, por ser um conjunto de costumes de determinados grupos ou nações; nesse sentido, os grandes aglomerados econômicos e os seus executivos respondem a uma variação de comportamento de acordo com a cultura de cada região. O direito, da mesma forma, por ser um conjunto de normas elaborado por uma sociedade 60 delimitada por uma área geográfica e impõe uma conduta sob pena de sanção, ajustando assim a logística de responsabilidade civil, administrativa e criminal da gestão fraudulenta. Apesar disso, é na ética que o programa de compliance mais se justifica na sua essência, pois nela se procura exteriorizar em um âmbito universal, regras e princípios básicos que atendam ao interesse comum, ou seja, o respeito à dignidade da pessoa do próximo, como a atenção à vida, à informação, à liberdade e à igualdade de tratamento, bem como a concorrência saudável. Compliance e ética O estudo do compliance no mercado contemporâneo nos remete à base filosófica de Immanuel Kant, filósofo alemão iluminista do século XVIII, que, no cenário da ética, desenvolveu o “imperativo categórico” que é o dever de toda pessoa agir conforme princípios dos quais considera que seriam benéficos caso fossem seguidos por todos os seres humanos. Eles são três: o primeiro é o da “Lei Universal”, pela expressão: “Aja como se a máxima de sua ação devesse tornar-se, por meio da sua vontade, uma lei universal”. Isso significa que o ser humano deve sempre fazer o certo, porque isso é um dever do homem; o segundo é o “Fim em si mesmo”, replicado na frase: “Aja de tal forma que use a humanidade, tanto na sua pessoa, como na pessoa de qualquer outro, sempre e ao mesmo tempo como fim e nunca simplesmente como meio”, neste imperativo, tem-se o respeito da dignidade da pessoa humana; e, em terceiro, é o “Legislador Universal (ou da Autonomia)” consagrado pela frase: “Aja de tal maneira que sua vontade possa encarar a si mesma, ao mesmo tempo, como um legislador universal através das suas máximas”, que determina que todas as nossas ações devem ter como objetivo atender à convivência humana de forma saudável. É bem verdade que a base filosófica de Kant empodera e aprofunda o pilar conceitual do compliance, afastando-a de mero modismo, mas também é verdade que a adoção do programa de compliance em conjunto com o código de ética ilustrado pelo respeito aos princípios da transparência das ações da alta direção e de todos os colaboradores diretos e indiretos salvaguarda a boa cultura organizacional, bem como atrai novos investidoresadeptos a tais mecanismos empresariais. No mesmo grau de importância, está o estudo das ações adotadas pela empresa para que o implemento do programa de compliance seja real, concreto e opere como uma mudança do mindset empresarial para a vivência de boas práticas que reflitam um ambiente associativo saudável e ao mesmo tempo que comporte a imagem positiva da empresa no mercado e perante investidores. Com isso, a efetivação do sistema de compliance remete a uma tríade que se apresenta pela análise dos verbos prevenir, detectar e responder. A prevenção está relacionada com estabelecimento de políticas e procedimentos internos, comunicação do programa, realização de treinamentos operacionais com toda a equipe e adesão da alta administração, bem como a construção de mecanismos internos para a identificação de riscos. A detecção se torna essencial, visto que, por mais efetiva que sejam as ações de prevenção, a realidade nos mostra que ela não é absoluta para evitar todos os riscos da empresa. 61 Nesse sentido, detectar está relacionado a analisar e rever processos, auditoria interna, comunicação permanente com o setor jurídico para que as decisões estejam embasadas em um conteúdo legal, implementando, assim, um sistema de gestão abrangente capaz de detectar desvio e remediá-lo em curto prazo. Se, no entanto, as desconformidades se apresentarem, a resposta a esses desvios deve ocorrer com a investigação e a avaliação da conduta profissional. Além disso, a aplicação das consequências, que devem ser claras, objetivas e pré-estabelecidas no código de conduta, por uma equipe imparcial e sem conflito de interesse. Daí a importância da existência do canal de denúncias que não venha a expor os denunciantes, evitando assim maiores impactos de ordem financeira ou reputacional. Há pouco tempo, o programa de compliance passava por uma decisão discricionária da empresa em implementá-lo ou não. Atualmente, o diálogo empresarial mudou, especificamente, em dois pontos ângulos, que se seguem. O primeiro deles é a própria dinâmica do mercado, que reflete a preferência de negociação com empresas que tenham inserido o programa de compliance na sua estrutura, tanto pela transparência das ocorrências como também pelo perfil ético dessas empresas. Não ter um programa de compliance é ter a retração das negociações corporativas, com destaque, para o circuito internacional, que preza substancialmente pelo sistema de boas práticas estruturadas pelo compliance. Em segundo lugar, porém não em menor importância, a imposição legal para que a empresa tenha o seu programa de compliance se desejar estabelecer contratos com a Administração Pública. As unidades federativas estão se mobilizando. Nesse sentido, temos como exemplo o governo do Distrito Federal, pela publicação do Decreto Distrital nº 40.388, de 14 de janeiro de 2020, que regulamentou a Lei Distrital nº 6.112, de 2 de fevereiro de 2018, atualizada pela também Lei Distrital nº 6.308, de 13 de junho de 2019, cujo objetivo é implementar uma cultura de ética empresarial e prevenir a corrupção na Administração Pública do Distrito Federal. Esses atos normativos evidenciam uma tendência legislativa de incentivo à adoção do compliance. Junto dos estados do Rio de Janeiro, por meio da Lei Estadual/RJ nº 7.753, de 17 de outubro de 2017; e do Espírito Santo, por meio da Lei Estadual/ES nº 4.370, de 27 de dezembro de 2018, as empresas que estabelecerem os contratos com a Administração Pública em valores acima de R$ 5 milhões devem adotar o compliance. É nesse cenário que o programa de compliance se torna efetivo no sentido de reduzir ou, no seu máximo, de evitar os riscos decorrentes de condutas ilícitas de pessoas ou da própria organização – seja no formato de Sociedade Anônima, seja no de Sociedade Limitada) ou de atos incoerentes aos valores da empresa, alcançando assim as metas empresariais e melhorando os procedimentos internos e garantindo unidade e comprometimento de todos por meio de uma gestão mais transparente e ética e, acima de tudo, benéfica à sociedade como um todo. 62 Programa de compliance e programa de integridade As sociedades limitadas podem ter conjuntamente o programa de compliance e outro programa de integridade, porque, apesar de ambos relatarem a conduta de adequação ao comportamento legal, eles apresentam conceituações e características distintas. O programa de compliance significa encarar de forma concreta os problemas complexos e resolvê-los de maneira eficiente. Significa ter responsabilidades sobre os impactos diretos e indiretos gerados pelo negócio. Significa harmonizar aspectos sociais, ambientais e econômicos. Significa fazer o certo para gerar resultados sustentáveis e com qualidade. A ISO 19.600 – Sistema de Gestão de Compliance – é uma norma internacional que busca implementar na gestão os preceitos aqui abordados focando identificar os objetivos dos negócios e, em seguida, as obrigações legais e as expectativas do público de interesse com relação aos objetivos. A literatura e o debate sobre a integralidade surgem na esteira, o Decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015, que regularizou a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, esta, conhecida como Lei Anticorrupção, e definiu no seu art. 41 o conceito do compliance para empresas que tenham atividade em licitação. Vejamos: compliance consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Pela conceituação acima, nota-se que a menção do vocábulo “integralidade” está diretamente relacionada com a prevenção da corrupção, com a busca de ambientes justos, eficientes, morais, éticos e transparentes. Dessa forma, definir “programa” como sendo todo o escopo organizacional para operacionalizar determinado conceito, requisito ou função. Nesse sentido, integridade é a operacionalização da ética, da integridade e da transparência dentro de uma organização. É também chamado de programa anticorrupção. Existem inúmeros modelos e manuais de implementação do programa de compliance e de integridade com três, cinco, sete, nove pilares ou requisitos. A doutrina mais tradicional, firmada no Federal Sentencing Guidelines e no Guia de Integridade para Empresas Privadas, publicado pela Controladoria-Geral da União (CGU) publicou na sua página da internet (cgu.gov.br) um manual com diretrizes para a implantação de programas de integridade em cinco pilares, por oportuno, listados abaixo, mas que serão aprofundados no tópico seguinte. São eles: comprometimento da alta administração (tone from the top); 63 instância responsável pelo programa de integridade; avaliação de perfil e de riscos; estruturação das regras e instrumentos; estratégias de monitoramento contínuo. Considerando um estudo mais abrangente, somam-se mais pilares com base no entendimento global a esse respeito da efetivação do programa de compliance. Dessa forma, somam-se à lista anterior os seguintes pilares: controles internos; treinamentos e comunicação; canais de denúncia; investigações internas; due dilligence. Dessa forma, um programa de compliance abarca diversas diretrizes relacionadas com as obrigações do negócio sendo uma delas – normalmente – o compliance. Em outras palavras, um compliance está contido dentro de um programa de compliance. Há de se observar que existem organizações que possuem programas de compliance, sem a aplicação de diretrizes de integridade. Outras organizações implementam somente diretrizes de integridade, o que impossibilita a afirmação de que a empresa está em compliance, haja vista a inexistência daestruturação de um programa relacionado a esse requisito. Compliance nas Sociedades Limitadas Da mesma forma que a governança corporativa teve a sua origem na história dos grandes aglomerados econômicos, o compliance, principalmente por conta dos grandes escândalos de corrupção também se firmou em um cenário de empresas de grande porte. O programa de compliance já se instala no universo das pequenas e médias empresas, em especial nos modelos societários na forma de sociedades limitadas. Como a evolução é gradativa, em primeira visão, o pequeno empresário entende que a despesa e a burocracia do programa compliance são desvantagens para se instalar o programa. O artigo intitulado “Benefícios e efetividade dos sistemas de gestão de compliance” de autoria de André Luiz Pontin pontua o “Programa empresa na íntegra”, criado pela CGU e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), para incentivar o compliance por meio de uma cartilha lançada em 2017 e denominada de “Integridade para pequenos negócios”. Essa cartilha, em que pese não ter força de norma legal, sistematiza o entendimento da CGU sobre o assunto, que no estudo do autor pode ser resumida da seguinte forma: 64 1º) Cada empresa deve criar um programa de integridade adaptado às suas condições, necessidades e riscos, e que tenha orçamento factível para sua implementação e manutenção. 2º) Todo processo de implementação de um programa de integridade deve iniciar necessariamente com um bom mapeamento de riscos. A análise correta e permanente dos riscos a que a empresa está submetida é fundamental para as PMEs pois, entre outros fatores, permite a alocação adequada e eficaz dos normalmente reduzidos recursos (financeiros, pessoas, estrutura) disponíveis para o programa. 3º) Os parâmetros de integridade exigidos para os pequenos negócios são: 1. Comprometimento da direção da empresa; 2. Adoção e implementação de padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos; 3. Treinamentos e divulgação do programa de integridade; 4. Registros contábeis confiáveis; 5. Controles internos que assegurem a elaboração e a confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiras; 6. Procedimentos para prevenção de fraudes e irregularidades em licitações, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público; 7. Medidas disciplinares; 8. Procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades e correção de danos. 4º) Nada impede que os demais parâmetros de avaliação previstos no Regulamento sejam considerados pela MPE durante a criação de seu programa de integridade. Ademais, o efeito cascata se mostra cada vez mais real, pois, da mesma forma que as grandes empresas nacionais ajustaram os seus programas de integridade para fortalecer a linha concorrencial de parceiros internacionais, essas empresas, dentro das suas cadeias de produção, têm solicitado que os seus partícipes de negócios possuam programas de compliance implantados internamente, como pré-requisito de contratação. Representantes, distribuidores e fornecedores de produtos e serviços são requisitados nesse sentido, ou então sequer conseguem concorrer e apresentar os seus preços, sendo automaticamente excluídos de processos de cotação. Essa logística de monitoramento dos parceiros se denomina due diligence. Esse quadro se torna mais latente no âmbito da licitação e da concorrência, em que a existência ou não de um programa de compliance das empresas concorrentes é, por vezes, o grande diferencial para a escolha no certame. A avaliação do ambiente interno da empresa com programa de compliance também merece atenção. A melhoria do ambiente interno e a confiança de clientes, fornecedores e demais partes interessadas são apenas algumas. A empresa também será mais atrativa para o recebimento de investimentos externos, pois, com a estrutura implantada e documentada, a operação regular do programa de compliance será facilmente comprovada, quando solicitado em processos de due diligence. 65 Nesse sentido, ainda que ter um programa de compliance não seja uma obrigatoriedade da lei, o mercado já demostrou para grandes, médias e pequenas empresas que ele é um pré-requisito para as transações negociais, tanto no âmbito do poder público como nas relações privadas e, por si só, um elemento de grande vantagem competitiva. No campo prático, percebe-se que a instalação do compliance deve seguir o mesmo caminho do implemento da governança corporativa nas sociedades limitadas, na sua maioria estruturadas em pequenas e médias empresas, qual seja: a adaptação do compliance ao ambiente estrutural e economicamente enxuto das pequenas e médias empresas. Assim como se porta a governança corporativa ao se valer das boas práticas de governança corporativa impondo mudanças na maneira de gerenciar, propondo reflexões quanto à cultura organizacional, aprimorando a tecnologia de informação, tendo apoio de auditorias internas e independentes, da mesma forma, a implantação de um programa de compliance deve ater-se aos controles já estabelecidos que podem ser aproveitados. Aplicar essas diretrizes para as sociedades limitadas requer ações adequadas ao porte das pequenas e médias empresas para tornar viável e eficaz o programa de compliance, sem a necessidade de criação de uma área específica. Para as sociedades limitadas estruturadas em pequenas empresas, pode-se implementar o compliance com as seguintes condutas: mapeamento dos riscos – identificação de processos e eventuais falhas, algumas delas muito comuns, como a inadimplência de fornecedores ou crises financeiras, e assim propor medidas para prevenir os riscos; criação e implementação de um código de conduta – instrumento documentado que reúne os valores e o posicionamento da empresa no que diz respeito ao cumprimento de leis, normas internas e outras regulamentações que regem o comportamento de todas as pessoas que mantêm algum tipo de relação com a empresa; treinamento dos colaboradores da empresa – é importante que todos saibam quando e como agir diante de situações que vão contra o que está de descrito no compliance da empresa. Todos os membros se tornam responsáveis, desde a efetivação, por cumprir as regras e denunciar casos de omissão ou infração, para isso a empresa deve oferecer um canal de comunicação silencioso e seguro; utilização do sistema de informação – a tecnologia possibilita que o programa de compliance nas pequenas e médias empresas seja ainda mais efetivo quando oferece suporte para controle e gestão de informações, por isso os dados devem ser protegidos; além disso, plataformas, softwares e equipamentos também devem estar de acordo com a conduta de operação da empresa; análise prévia nas contratações – a checagem de antecedentes, ou background check, consiste na busca de informações que auxiliam na tomada de decisões. 66 O que se vê é que são ações de fácil implemento. Além disso, o quanto antes devem entrar na lista de prioridades de empresas de qualquer porte, pois tais dinâmicas são irreversíveis diante de uma sociedade que clama cada vez mais por relacionamentos éticos. Nesse sentido, a preocupação com a conformidade, com o cumprimento das leis e com a sustentabilidade das empresas já não é mais opção. Impactos das práticas de ESG nas Sociedades Limitadas Entender o que é ESG, a sua origem e a sua importância se tornou indispensável no mercado de trabalho atual e, no mesmo grau de importância, é um diferencial para profissionais que dominam o tema, alvo de debates e discussões diante da opinião pública, da sociedade e de consumidores, bem como nos reports para proprietários. Nesse sentido, questões ligadas a meio ambiente, sociedade e governança vão orientar as pautas sobre o futuro e já estão relacionadas ao desempenho dos negócios. Nesse ambiente, desenvolver uma agenda ESG em prol do planeta e da sociedadeé algo que hoje tem adquirido um valor ainda mais especial. Afinal, é uma questão de sobrevivência no mercado: as empresas que investem ativamente em prol da humanidade e de soluções sustentáveis ao planeta não só são mais notáveis como também contribuem com um papel social importante e cobrado por consumidores cada vez mais conscientes tanto dos hábitos de consumo sustentável como do seu poder na cadeia consumerista. No mesmo grau de importância, o farol corporativo se estrutura no respeito à pessoa como ser humano, e questões como diversidade e inclusão integram a pauta empresarial além das paredes do RH, reverenciando mais as habilidades e a competência do indivíduo. Esses intentos são operacionalizados por meio de uma gestão transparente com ações que fortalecem a organização e alinham os interesses de stakeholders em conformidade com os órgãos de fiscalização e regulamentação. Os investimentos relacionados ao formato ESG são cada vez mais expressivos, e uma prova dessa assertiva, a título de exemplo, é o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), criado pela Bolsa de Valores Brasileira (B3), que anunciou a 17ª carteira (ISE B3 ano 2022) na qual reúne 46 ações, de 46 companhias, pertencentes a 27 setores. Juntas, as companhias somam R$ 1,74 trilhão, o que corresponde ao significativo percentual de 38,26% do total do valor de mercado das companhias com ações negociadas na B3. Somam-se a tantos outros parâmetros estatísticos, a força do próprio mercado no sentido de impulsionar o movimento ESG, a exemplo da carta de Larry Fink, do CEO da BlackRock, um dos maiores fundos de investimento no mundo, aos demais CEOs, apresentando compromissos mais rigorosos em favor do ESG. Nesse mesmo sentido, o Fórum Econômico de Davos com a trilha voltada para a importância da sustentabilidade, com ênfase nas discussões do encontro para a relevância do propósito antes do lucro, desenhando assim um novo capitalismo de uma nova era. 67 Pressões do mercado e forças impulsionadoras do movimento ESG ESG é a abreviação em inglês de Environmental, Social and Governance, o que se refere à adoção de critérios ambientais, sociais e de governança. O termo tem feito cada vez mais parte da agenda estratégica de companhias de diferentes setores como base para a tomada de decisões financeiras e de investimentos. Não obstante a sigla ESG ser de apreciação recente no cenário atual, as suas origens e os seus embasamentos remontam, desde os anos de 1950, à discussão sobre sustentabilidade no ambiente corporativo, com destaque para empresas atuantes no mercado de valores mobiliários. As conferências da Organização das Nações Unidas (ONU), realizadas em 1972, em Estocolmo, na Suécia, e em 1982, em Nairóbi, no Quênia, marcaram os debates que levariam ao conceito de desenvolvimento sustentável, em 1987, com a publicação do Relatório Brundtland ou Nosso Futuro Comum, pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU e conduzida por Gro Harlem Brundtland, ex-primeira-ministra da Noruega, médica e líder internacional em desenvolvimento sustentável e saúde pública. Esse relatório faz parte de uma série de iniciativas relativas à Agenda 21, as quais “reafirmam uma visão crítica do modelo de desenvolvimento adotado pelos países industrializados e reproduzido pelas nações em desenvolvimento, e que ressaltam os riscos do uso excessivo dos recursos naturais sem considerar a capacidade de suporte dos ecossistemas”. O referido documento aponta para a incompatibilidade entre o desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo vigentes. Nele se consolidou a frase “satisfazer as necessidades das gerações presentes sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazer as suas próprias necessidades”. Na mesma sequência, o índice Dow Jones de sustentabilidade, criado em 1999, redesenhou o comportamento das empresas norte-americanas, pois ele é uma forma de investidores reconhecerem a importância de práticas de negócios sustentáveis, essenciais para gerar valor para acionistas de longo prazo, que desejam refletir as suas convicções de sustentabilidade nas suas carteiras de investimento. Esse movimento contribuiu para que outras bolsas no mundo adotassem o índice de sustentabilidade. No ano de 2004, no entanto, ganhou notoriedade a sigla ESG grifada em uma publicação pioneira do Banco Mundial, em parceria com o Pacto Global da ONU e instituições financeiras de nove países, denominada Who cares wins que, em tradução livre, significa “Ganha quem se importa”. O material é resultado de uma provocação do então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, a 50 CEOs de grandes instituições financeiras do mundo no intuito de ter devolutiva de crédito sobre como elas iriam integrar os fatores ESG ao mercado de capitais, anunciando que a tríade environmental, social e governance impunha um novo desenho para os índices norteadores da lucratividade das empresas. 68 Percebe-se que, nesse modelo contemporâneo, o propósito e os valores das corporações são protagonistas de uma nova era empresarial centrada nas causas de sustentabilidade, de respeito ao ser humano e de transparência das gestões negociais como pilares da sobrevivência da humanidade. Em 2020, uma carta escrita por Larry Fink, presidente e CEO da BlackRock, gestora de ativos em um patamar de mais de US$ 8 trilhões, e encaminhada a CEOs de empresas, anunciou uma realocação de capitais que resulta da precificação do risco climático no valor dos títulos, visto que, não obstante os efeitos da pandemia, a agenda ambiental avançou internacionalmente. Nesse cenário, Fink (2022) escreveu: a pandemia apresentou uma crise existencial de tal magnitude – um lembrete tão forte de nossa fragilidade – o que nos levou a confrontar a ameaça global das mudanças climáticas de maneira mais enfática e refletir como, a exemplo da pandemia, elas transformarão nossas vidas. Em 2022, em nova e tradicional carta anual a CEOs, Fink (2022) ponderou sobre o poder do capitalismo, sendo relevantes os trechos que se seguem: O capitalismo de stakeholders não se trata de política. Não é uma agenda social ou ideológica. Não é “justiça social”. É capitalismo, conduzido por relacionamentos mutuamente benéficos entre você e os funcionários, clientes, fornecedores e comunidades dos quais sua empresa depende para prosperar. Esse é o poder do capitalismo. [...] No mundo globalmente interconectado de hoje, uma empresa deve criar valor e ser valorizada por sua gama completa de stakeholders, a fim de oferecer valor de longo prazo para seus sócios. É por meio de um capitalismo de stakeholders eficaz que o capital é alocado de maneira eficiente, as empresas obtêm lucratividade duradoura, e o valor é criado e mantido em longo prazo. Não se engane, a busca justa pelo lucro ainda é o que anima os mercados; e a rentabilidade de longo prazo é a medida pela qual os mercados determinarão o sucesso da sua empresa no fim das contas. Atualmente, 2/3 dos fundos europeus já são ESG. Muitos países passaram a incorporar o ESG em compras públicas e nas relações com outros países, influenciando e fazendo exigências para que produtos e serviços entrem no seu mercado. Particularmente no Brasil, Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU, em parceria com Stilingue, plataforma de insights especializada em monitoramento de redes sociais baseado em inteligência artificial 100% brasileira, lançaram o estudo “A Evolução do ESG no Brasil”, o qual registra a ascensão do conceito ESG, com uma intensa mobilização do mercado, em parte, por conta da pandemia da Covid-19. Analisou-se da seguinte forma: 69 Uma das consequências da crise causada pelo novo coronavírus foi o despertar da consciência de parcelas maiores da sociedade para questões ligadas à sustentabilidade. As empresas brasileiras aceleraram suas práticas sustentáveis em um movimentosem volta. Quando algumas pessoas me questionam o que há de novo sobre o tema, costumo começar a conversa explicando que ESG não é uma evolução da sustentabilidade empresarial, mas, sim, a própria sustentabilidade empresarial. Uma pesquisa publicada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostra que a compreensão do mercado nacional sobre sustentabilidade é heterogênea. O estudo apresentou cinco perfis de comportamentos, em que: pessoas desconfiadas enxergam as práticas ESG como uma ameaça para o desenvolvimento dos seus negócios; pessoas distantes têm uma visão simplificada da sustentabilidade e a encaram como algo ligado às questões ambientais; pessoas iniciantes também acham que o tema é focado no meio ambiente, mas têm ações concretas; pessoas emergentes compreendem a relevância dos aspectos ESG e estão em fase de implementação de processos mais abrangentes; pessoas engajadas veem a sustentabilidade como parte da estratégia da instituição, embalando produtos e serviços com esses critérios e cobrando transparência nas relações da empresa com todo o conjunto de stakeholders. Triple Bottom Line Em 1997, a obra intitulada “Canibais com garfo e faca”, de John Elkington, destacou-se fortalecendo um modelo de gestão que consagra a importância de empresas terem uma atuação que assegure o tripé da sustentabilidade – triple bottom line – nos aspectos ambientais, sociais e econômicos dentro de uma concepção de capitalismo sustentável, redefinindo as economias e as grandes corporações para o futuro (Elkington, 2011, p. 127). Elkington (2011) define sustentabilidade há mais de uma década como a busca pelo equilíbrio entre o pilar econômico, social e ambiental, que pode ser comparado a um balanço com os resultados da empresa em dados quantitativos, nas três dimensões propostas pela sustentabilidade – econômica, social e ambiental –, sendo, nesse sentido, uma forma de gestão que avalia os impactos da organização sob uma visão mais sistêmica, levando em consideração a relação de interdependência com as partes interessadas, também denominadas de stakeholders. 70 Não obstante a interligação entre os temas, não há que se confundir sustentabilidade, ESG e desenvolvimento sustentável: são conceitos distintos, porém com atuação integrada na estratégia empresarial. A sustentabilidade é um termo amplo e vai além da questão ambiental porque se efetiva na gestão com o equilíbrio de três pilares: o econômico, o social e o ambiental. Essas três dimensões se relacionam, e o modo como elas interferem ou sofrem interferência uma das outras definirá o grau de viabilidade da economia, a sustentabilidade dos negócios, a gestão e a disponibilidade dos recursos naturais, o bem-estar da comunidade e a justiça social, entre outros princípios e fundamentos. O processo para que a expansão econômica ocorra, mantendo o equilíbrio das três dimensões, é o que se denomina de desenvolvimento sustentável. Tanto a sustentabilidade (como modelo de gestão) como o desenvolvimento sustentável (processo) têm em comum o fato de buscarem e difundirem formas de uso dos recursos naturais de um modo responsável, permitindo que as futuras gerações também possam utilizá-los para as suas necessidades econômicas e sociais. A sustentabilidade pode ser entendida como uma distribuição igualitária de bem-estar associado aos recursos naturais em duas dimensões. A primeira diz respeito aos esforços para permitir que gerações futuras tenham os mesmos recursos com qualidade semelhante à atual. Já a outra procura estabelecer que os custos da degradação ambiental sejam pagos por quem os gera, compensando ou evitando a perda de bem-estar de usuários não beneficiados por esse capital natural. O Triple Bottom Line se diferencia dos outros modelos de gestão, pois vai além das medidas tradicionais de lucros, incluindo as dimensões ambientais e sociais. No tripé da sustentabilidade, a questão é reconhecer os impactos negativos causados pela atividade da empresa e trabalhar para que esses impactos sejam majoritariamente positivos, sempre levando em consideração os aspectos econômicos, sociais e ambientais. Dessa forma, o tripé da sustentabilidade é baseado em três pilares: i) economia; ii) sociedade; e iii) meio ambiente. Tais pilares também são conhecidos como people, planet and profit, isto é, pessoas, planeta e lucro. Agenda 2030 ONU: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável A ONU e os seus parceiros no Brasil estão trabalhando para atingir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), os quais são interconectados e abordam os principais desafios de desenvolvimento enfrentados no Brasil e no mundo. Trata-se de um plano de ação para as pessoas, o planeta e a prosperidade, buscando o fortalecimento da paz universal com mais liberdade. Nesse sentido, reconhece-se que a erradicação da pobreza em todas as suas formas e dimensões, incluindo a pobreza extrema, é o maior desafio global e um requisito indispensável para o desenvolvimento sustentável: Objetivo 1 – acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; 71 Objetivo 2 – acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e a melhoria da nutrição, bem como promover a agricultura sustentável; Objetivo 3 – assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas as pessoas, em todas as idades; Objetivo 4 – assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas as pessoas; Objetivo 5 – alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas; Objetivo 6 – assegurar a disponibilidade e gestão sustentável de água e saneamento para todas as pessoas; Objetivo 7 – assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todas as pessoas; Objetivo 8 – promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas as pessoas; Objetivo 9 – construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação; Objetivo 10 – reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles; Objetivo 11 – tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; Objetivo 12 – assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis; Objetivo 13 – tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e os seus impactos; Objetivo 14 – conservar e usar de modo sustentável os oceanos, os mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável; Objetivo 15 – proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra, e deter a perda de biodiversidade; Objetivo 16 – promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todas as pessoas e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis; Objetivo 17 – fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável. É importante registrar que os ODSs compõem um compromisso de todas as pessoas na sociedade, desde cidadãos e cidadãs, passando por empresas de todos os portes no setor privado, empresas públicas e todas as espécies de organização com ou sem fim lucrativo, pois são objetivos que organizam um mundo sustentável para as futuras gerações. Antes de ser um clichê, as ações que levam à concretude desses objetivos comportam, hoje, no mercado contemporâneo, um ativo empresarial. 72 Mercado contemporâneo e tendências ESG O estudo do professor Márcio Roberto (2022, p. 56), doutor em Administração e Negócios, é claro em identificar a notória evolução do tema ESG ao redor domundo. Sem dúvida, o Brasil está na mesma esteira; em especial, pelo fato de investidores considerarem cada vez mais as decisões pautadas no ESG. Segundo o acadêmico, outro fator importante é o comportamento para tornar a gestão das empresas cada vez mais profissional no que tange aos aspectos ESG. Além disso, muitas pessoas que se especializaram no tema acreditam que estamos apenas no início dessa jornada e os números sobre os aspectos ambientais, sociais e de governança demonstram estatisticamente essa máxima por meio dos relatórios oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da B3 e da declaração formal por parte das empresas a respeito dos ODSs. São vários os fatores que justificam as organizações a se prepararem para atuar com os aspectos ESG. Entre os centrais, estão o comportamento dos investidores ao redor do mundo; o comportamento dos consumidores, em especial, das novas gerações; a preparação da empresa para venda, fusão, aquisição, internacionalização, abertura de capital; e as fortes tendências das regulamentações. No que diz respeito às fortes tendências sobre ESG, a pesquisadora Fiona Reynolds, CEO da Princípios para o Investimento Responsável, uma organização apoiada pela ONU, declarou no evento Expert ESG o quanto os aspectos ambientais, sociais e de governança impactarão os próximos anos. Fiona destaca alguns pontos fundamentais sobre as tendências: A demanda por ativos ESG tem crescido tanto por parte de clientes institucionais, quanto no varejo, onde tem sido especialmente importante para as gerações mais novas. Cerca de 85% dos millenials acreditam que investimentos sustentáveis são essenciais hoje. E segundo Fiona, US$ 53 trilhões devem ser transferidas dos pais baby boomers para a geração millenials nos próximos anos – será a maior transferência de riqueza da história. [...] Existe uma forte relação entre a adoção de práticas ESG e performance financeira por parte das empresas. Isso porque pensar em fatores ESG significa pensar holisticamente, ou seja, fazer decisões melhores. Por mitigar riscos ESG, as empresas capitalizam oportunidades e, no fim das contas, são levadas a uma performance maior. [...] 73 As maiores companhias do mundo, inclusive as de óleo e gás (consideradas grandes emissores de carbono), comprometem-se com a meta de zerar emissões até 2050. Outro exemplo são investidores que trabalham juntos para resolver problemas: o Climate Action 100+, uma iniciativa liderada por mais de 545 investidores que têm sob gestão US$ 52 trilhões. Todas essas são ações do que os investidores podem fazer juntos, como acionistas, para trazer mudanças de longo prazo. 74 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Elisa Dias. Mudança nas sociedades limitadas: entenda as novas regras para tomada de decisão pelos sócios. Goulart Colepicolo Advogados, [s.l.], 3 out. 2022. Disponível em: https://gclaw.com.br/mudanca-nas-sociedades-limitadas-entenda-as-novas-regras-para-tomada- de-decisao-pelos-socios. Acesso em: 10 jun. 2023. ANDRADE, Adriana; ROSSETTI, José Paschoal. 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Mediadora judicial pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj). Pós-Graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Estácio de Sá (Unesa). Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF). EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS Advogada. Consultora e instrutora do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Estado do Rio de Janeiro (Sebrae-RJ). Mediadora judicial junto ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ). Professora convidada nos cursos FGV Management. Professora conteudista do FGV Online. Professora-tutora do FGV Online. Sócia-proprietária da Tripartite Assessoria Empresarial Ltda. MARGÔ TRINDADE SARTORI FORMAÇÃO ACADÊMICA Doutora em Direito Empresarial pela Universidade Estácio de Sá (Unesa). Mestra em Direito, na área de Relações Econômicas, pela Universidade Gama Filho (UGF). Especialista em Direito Constitucional Europeu pela Universidade de Burgos, na Espanha. Pós-graduada em Direito pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj). Bacharel magna cum laude em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS Advogada. Membro do Conselho de Direito Empresarial da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Rio de Janeiro (OAB/RJ). Professora adjunta da UFRJ. Professora convidada da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV Ebape) e dos cursos de MBA da FGV. Sócia-proprietária da Trindade & Sartori Advogados. https://www.instagram.com/fgv.educacaoexecutiva/ https://www.linkedin.com/school/fgv-educacaoexecutiva/ Introdução Sumário MÓDULO I – BASE ESTRUTURAL DA SOCIEDADE LIMITADA Evolução da Sociedade Limitada Teoria da empresa: ato de empresa, empresa e empresário Estabelecimento empresarial Desconsideração da personalidade jurídica Do surgimento da Sociedade Limitada aos dias de hoje Conceito e características da Sociedade Limitada Limitação da responsabilidade dos sócios e especificidades da Sociedade Limitada Regência supletiva pela Lei das S/A Acordo de quotistas na Sociedade Limitada Conselho fiscal na Sociedade Limitada Sociedade Limitada e comparação com os demais tipos de sociedades Sociedade Simples Sociedade em Nome Coletivo Sociedade em Comandita Simples Sociedades não personificadas MÓDULO II – CONSTITUIÇÃO DA SOCIEDADE LIMITADA Contrato social Elementos gerais e específicos do contrato social Participação nos resultados da sociedade Direito de retirada na Sociedade Limitada Capital social e quotas Natureza jurídica do capital social Natureza jurídica da quota social Sócio remisso na Sociedade Limitada Quotas preferenciais na Sociedade Limitada Papel do sócio, administração e responsabilidade dos administradores Centro de imputação do controle da Sociedade Limitada Administração da Sociedade Limitada Responsabilidade dos administradores Administrador e desconsideração da personalidade jurídica MÓDULO III – SOCIEDADE LIMITADA E MODALIDADES DE DELIBERAÇÕES DE SÓCIOS Deliberações de sócios nas Sociedades Limitadas Conceito e características das deliberações de sócios Matérias submetidas às deliberações de sócios e legitimidade de convocação Modalidades de deliberações de sócios: reunião e assembleia Deliberação no formato virtual Formalidade de convocação: dispensa e periodicidade das deliberações Formalidade de convocação Dispensa da formalidade de convocação Periodicidade das deliberações de sócios Quóruns de instalação e deliberativo nas deliberações de sócios Conceito de quórum Quóruns de instalação e de deliberação Nova Lei nº 14.451/2022: redução de quórum MÓDULO IV – SOCIEDADE LIMITADA CONTEMPORÂNEA: GOVERNANÇA CORPORATIVA, COMPLIANCE E ESG Sociedade Limitada e governança corporativa Conceito governança corporativa Princípios da governança corporativa Triângulo básico da governança Quadrilátero de múltiplos interesses Importância do programa de compliance nas Sociedades Limitadas Práticas de compliance no Brasil Compliance e ética Programa de compliance e programa de integridade Compliance nas Sociedades Limitadas Impactos das práticas de ESG nas Sociedades Limitadas Pressões do mercado e forças impulsionadoras do movimento ESG Triple Bottom Line Agenda 2030 ONU: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável Mercado contemporâneo e tendências ESG REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PROFESSORAS-AUTORAS LIDIA VIVAS FORMAÇÃO ACADÊMICA EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS MARGÔ TRINDADE SARTORI FORMAÇÃO ACADÊMICA EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS