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<p>REPENSANDO AS HABITAÇÕES DE INTERESSE SOCIAL</p><p>LUIZ CARLOS TOLEDO | VERONICA NATIVIDADE | PETAR VRCIBRADIC</p><p>REPENSANDO AS HABITAÇÕES DE INTERESSE SOCIAL</p><p>REPENSANDO AS HABITAÇÕES</p><p>DE INTERESSE SOCIAL</p><p>Luiz Carlos Toledo</p><p>Petar Vrcibradic</p><p>Verônica Natividade</p><p>Colaboradores:</p><p>Luciana Corrêa do Lago</p><p>Cunca Bocayuva</p><p>Luiz Cláudio Franco</p><p>Thaís Velasco</p><p>Vera Tângari</p><p>Vincenzo Cristallo</p><p>Sabrina Lucibello</p><p>Bernardo Soares</p><p>Fernanda Gianinni</p><p>Fernanda Petrus</p><p>Frances Sampaio</p><p>Maria Isabel Pedro</p><p>Marina di Blasi</p><p>Pedro Henrique Bitencourt</p><p>Júlio Ferreti</p><p>Flavia Secioso</p><p>Apoio:</p><p>Pela UFRJ/IPPUR - Instituto de Pesquisa e Planejamento</p><p>Urbano e Regional</p><p>Adauto Lúcio Cardoso</p><p>Luciana Corrêa do Lago</p><p>Maria Julieta Nunes</p><p>Pela UFRJ/PROARQ - Programa de Pós Graduação</p><p>em Arquitetura da UFRJ</p><p>Vera Tângari</p><p>CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico</p><p>O livro Repensando as Habitações de Interesse Social tem sua origem</p><p>na pesquisa desenvolvida pela Rede FINEP sobre Moradia e Tecnologia Social.</p><p>Copyright© Luiz Carlos Toledo, Petar Vrcibradic, Verônica Natividade, 2014</p><p>Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998.</p><p>Nenhuma parte deste livro, sem a autorização prévia por escrito da Editora, poderá ser reproduzida</p><p>ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados.</p><p>Editor João Baptista Pinto</p><p>Revisão Edson Monteiro</p><p>Editoração Rian Narcizo Mariano</p><p>Capa Foto - Júlio Ferreti</p><p>Letra Capital Editora</p><p>Telefax: (21) 2224-7071 / 2215-3781</p><p>letracapital@letracapital.com.br</p><p>CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE</p><p>SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ</p><p>T584r</p><p>Toledo, Luiz Carlos, 1943-</p><p>Repensando as habitações de interesse social / Luiz Carlos Toledo, Verônica Natividade,</p><p>Petar Vrcibradic. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital : FINEP ; Brasilia, DF : CNPq, 2014.</p><p>96 p. : il. ; 30 cm.</p><p>ISBN 9788577853151</p><p>1. Arquitetura. 2. Urbanismo. 3. Geografia urbana. I. Natividade, Verônica. II. Vrcibradic, Petar.</p><p>III. Financiadora de Estudos e Projetos. III. Conselho Nacional de Desenvolvimento</p><p>Científico e Tecnológico. IV. Título.</p><p>14-17260 CDD: 711.4</p><p>CDU: 711.4</p><p>PATROCÍNIO CULTURAL</p><p>A prática do exercício profissional da arquitetura</p><p>e urbanismo, como consequência de uma formação</p><p>generalista, ganha dimensão em diversas áreas de</p><p>atuação, tais como: projetos de edificações, paisag-</p><p>ismo, legislação urbana, meio ambiente. Luiz Car-</p><p>los Toledo é a síntese desta formação somada, em</p><p>particular, a uma notável percepção humanista e</p><p>social do papel do arquiteto e urbanista. Resultado</p><p>de sua larga experiência e vivência profissional, To-</p><p>ledo é uma referência na área, tendo influenciado a</p><p>formação de vários arquitetos e urbanistas de sua</p><p>época e das novas gerações.</p><p>Seu compromisso ético, social e político com a pro-</p><p>fissão resultou na elaboração de planos e estudos</p><p>arquitetônicos e urbanísticos que se destacam pelo</p><p>aspecto inovador tanto do ponto de vista da quali-</p><p>dade projetual, como na atenção às demandas de</p><p>uma população tradicionalmente excluída dos pro-</p><p>cessos decisórios. Um dos exemplos mais significa-</p><p>tivos é o Plano Diretor Sócio Espacial da Rocinha,</p><p>apresentado detalhadamente nesta publicação,</p><p>que o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio</p><p>de Janeiro tem a honra de apoiar através de seu edi-</p><p>tal de patrocínio cultural.</p><p>O trabalho é resultado de um envolvimento exem-</p><p>plar com a comunidade e o seu cotidiano, a partir</p><p>de uma interação com moradores e a realidade do</p><p>espaço, em um exemplo notável de integração pro-</p><p>fissional na busca por uma solução urbana e de ha-</p><p>bitação que possa conferir dignidade e qualidade</p><p>de vida para milhares de pessoas que ali residem. A</p><p>possibilidade real de transformação espacial, com a</p><p>plena incorporação à malha urbana formal, soma-</p><p>da a projetos criativos, demonstra como é possível</p><p>solucionar a questão das favelas cariocas, melhoran-</p><p>do as condições de habitabilidade e oferecendo in-</p><p>fraestrutura urbana e equipamentos socioculturais.</p><p>A partir da proposta de repensar as habitações de</p><p>interesse social, através de um profundo trabalho</p><p>de pesquisa, Toledo e os arquitetos Petar Vrcibra-</p><p>dic e Verônica Natividade levantaram as diversas</p><p>alternativas de projetos, levando-se sempre em</p><p>consideração os princípios fundamentais da boa</p><p>arquitetura: insolação, iluminação e ventilação.</p><p>Mesmo enfrentamento uma geografia desafiadora,</p><p>os arquitetos conseguiram desenvolver propostas</p><p>criativas e inovadoras, perfeitamente integradas à</p><p>paisagem natural da Rocinha.</p><p>São apresentados também estudos do processo</p><p>construtivo e suas possibilidades, incluindo os</p><p>chamados projetos complementares de estrutura</p><p>e instalações, devidamente compatibilizados com</p><p>o projeto de arquitetura. Há ainda soluções para o</p><p>mobiliário que previram a utilização específica de</p><p>marcenaria como alternativa viável sob o ponto</p><p>de vista funcional e econômico, contribuindo para</p><p>o desenvolvimento de uma economia solidária e</p><p>colaborativa.</p><p>Essa publicação representa uma referência funda-</p><p>mental para estudantes e profissionais interessados</p><p>em desenvolver projetos de habitação popular, sen-</p><p>do uma contribuição notável também para os gesto-</p><p>res públicos que tem pela frente o desafio de urbani-</p><p>zar e oferecer condições dignas de habitação para as</p><p>camadas mais pobres, especificamente aquelas que</p><p>vivem nas comunidades cariocas.</p><p>Sydnei Menezes,</p><p>Presidente do Conselho de Arquitetura</p><p>e Urbanismo do Rio de Janeiro</p><p>UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL</p><p>A atual política nacional de oferta de moradia de interesse</p><p>social passa por um estreito relacionamento com os programas de</p><p>aceleração do crescimento e geração de empregos na construção</p><p>civil. Em meio a essa realidade, percebe-se que a qualidade dos</p><p>projetos e das construções foi relegada a um plano secundário.</p><p>Por outro lado, é evidente que a aplicação de critérios restri-</p><p>tivos impostos pela Caixa Econômica Federal – repassadora dos</p><p>recursos para a construção – na avaliação dos projetos habitacio-</p><p>nais acabou se constituindo em um elemento indutor de soluções</p><p>arquitetônicas medíocres e de baixa qualidade.</p><p>Diante das críticas generalizadas, alguns setores do governo e</p><p>da sociedade passaram a se preocupar com a precária qualidade</p><p>da habitação popular e da sua inserção nas cidades. O desapon-</p><p>tamento atual não se restringe às reduzidas dimensões dos im-</p><p>óveis. As críticas se estendem, também, para o acabamento das</p><p>edificações. Por não resistirem à ação do tempo, os revestimentos</p><p>externos acentuam as marcas de um envelhecimento precoce e</p><p>obrigam os moradores a arcarem, periodicamente, com o ônus da</p><p>sua manutenção.</p><p>Diante da falta de recursos para honrar esse compromisso, o re-</p><p>sultado não poderia ser outro, senão o comprometimento da inte-</p><p>gridade física do edifício, das suas condições de habitabilidade e,</p><p>consequentemente, a perda da autoestima dos moradores.</p><p>Do ponto de vista urbanístico incorre-se em erro semelhante.</p><p>Nada justifica as ocupações de áreas inóspitas e afastadas do</p><p>núcleo urbano das cidades. Um programa governamental com a</p><p>envergadura do Minha Casa Minha Vida deveria servir como ex-</p><p>emplo para nortear a aplicação dos vultosos recursos financeiros</p><p>em benefício da população e das cidades. Nesse sentido, não se</p><p>pode aceitar a visão imediatista dos governos e das grandes em-</p><p>preiteiras da construção civil que determinam, de comum acordo,</p><p>os parâmetros das construções populares.</p><p>Todavia, no meio dessa complexa estrutura, ao que parece, des-</p><p>ponta uma luz no fim do túnel. Algumas universidades brasileiras</p><p>se dedicam a avaliar, comparativamente, a qualidade da produção</p><p>habitacional no Brasil e no exterior.</p><p>As pesquisas elaboradas recentemente por uma equipe de ar-</p><p>quitetos cariocas, vinculados ao IPPUR/UFRJ, já apresentam re-</p><p>sultados concretos. Esse trabalho, financiado pela Finep, vem</p><p>tramitando nacionalmente em rede, de forma a permitir um</p><p>maior intercâmbio e troca de ideias entre pesquisadores</p><p>industrializados, sejam eles estruturais, de fecha-</p><p>mento das fachadas, paredes internas, esquadrias,</p><p>banheiros e cozinhas pré-fabricados etc. A racio-</p><p>nalização do processo construtivo levou a equipe</p><p>a estudar painéis modulados fabricados com mate-</p><p>riais leves, em substituição às paredes de blocos e</p><p>às fachadas pré-fabricadas em concreto, difíceis de</p><p>transportar, cujo peso afeta diretamente o dimen-</p><p>sionamento da estrutura. Assim, deu-se preferência</p><p>a painéis fabricados em argamassa armada, placas</p><p>cimentícias, chapas metálicas, PVC e madeira cer-</p><p>tificada, fixados na estrutura com perfis metálicos</p><p>(steel-frame).</p><p>As paredes internas serão de dry-wall que, além de</p><p>mais leves, dão mais rapidez à obra; a estrutura com</p><p>pilares e vigas de aço e lajes do tipo steel–deck ou</p><p>com placas de argamassa armada. Os banheiros e</p><p>cozinhas, com paredes em dry-wall impermeabiliza-</p><p>das, pintadas ou revestidas de azulejos, serão entre-</p><p>gues prontos na obra, restando apenas instalá-los</p><p>em cada unidade.</p><p>Figura 33 – Unidades típicas</p><p>64</p><p>Figura 34 – Componentes arquitetônicos, escadas e painéis de fechamento</p><p>65</p><p>Figura 35 – Variação dos painéis de fechamento em um mesmo tipo</p><p>6 AS MONTADORAS DE HIS</p><p>69</p><p>Figura 36 – Variação dos painéis de fechamento em um mesmo tipo</p><p>Figura 37 – Comparação com o modelo automotivo</p><p>As Montadoras de HIS, inspiradas no processo de</p><p>modernização do modelo automotivo, além de ab-</p><p>sorver boa parte das atividades próprias dos cantei-</p><p>ros de obra tradicionais, desempenharão um impor-</p><p>tante papel no que se refere ao emponderamento</p><p>dos futuros moradores, que terão maior possibilida-</p><p>de de escolha da moradia, a partir de uma oferta de</p><p>unidades mais diversificadas, tanto no que se refere</p><p>ao programa arquitetônico, como em relação à área</p><p>do imóvel.</p><p>Além disso, as Montadoras serão transmissoras de</p><p>conhecimentos relativos à modernização dos pro-</p><p>cessos construtivos, à aplicação de novos materiais</p><p>e componentes industrializados.</p><p>Nelas devem ser reservados espaços para os forne-</p><p>cedores dos componentes industrializados durante</p><p>o período em que estes estiverem sendo aplicados</p><p>e para as atividades de transferência tecnológica e</p><p>capacitação de mão de obra.</p><p>O dimensionamento das Montadoras depende-</p><p>rá do volume das obras e da área de atuação, já</p><p>que uma mesma unidade poderá atender a várias</p><p>frentes de trabalho, sempre visando economias</p><p>de escala e diminuição dos custos de transporte.</p><p>6.1 Participação & Transferência</p><p>tecnológica (T.S.)</p><p>Cada montadora deverá cumprir um importante papel</p><p>na transferência de novas tecnologias à mão de obra</p><p>dos locais onde será implantada, abrindo um novo</p><p>ciclo de transmissão de conhecimentos, semelhante</p><p>ao que ocorreu no passado com os nordestinos que,</p><p>fugindo da seca, chegaram ao Rio na década de 50 e</p><p>que, nos canteiros de obra, se apropriaram das técni-</p><p>cas e materiais utilizados na construção civil, em subs-</p><p>tituição às construções em madeira, taipa e sopapo</p><p>próprias de sua cultura.</p><p>7 OS TIPOS PROJETADOS</p><p>73</p><p>Figura 38 – Localização dos tipos</p><p>74</p><p>Figura 39A – Tipologia projetada</p><p>75</p><p>Figura 39A – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>76</p><p>Figura 39A – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>77</p><p>Figura 39B – Tipologia projetada</p><p>78</p><p>Figura 39B – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>79</p><p>Figura 39B – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>80</p><p>Figura 39C – Tipologia projetada</p><p>81</p><p>Figura 39C – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>82</p><p>Figura 39C – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>83</p><p>Figura 39D – Tipologia projetada</p><p>84</p><p>Figura 39D – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>85</p><p>Figura 39D – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>86</p><p>Figura 39D – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>87</p><p>Figura 39D – Tipologia projetada (Cont.)</p><p>89</p><p>O convite para dialogar com a Rede Morar TS</p><p>(tecnologia social), rede que se desdobra da Rede</p><p>FINEP voltada para a moradia de interesse social e</p><p>em especial para o Programa Minha Casa Minha Vida,</p><p>permitiu-me conhecer o trabalho e a extraordinária</p><p>pessoa de Luiz Carlos Toledo. Aceitei de imediato o</p><p>convite para fazer alguns comentários sobre o texto</p><p>Repensando as Habitações de Interesse Social:</p><p>Moradia e Tecnologia Social, que é o resultado do</p><p>trabalho e da interação interdisciplinar a partir do</p><p>IPPUR-UFRJ com a equipe de pesquisadores em</p><p>arquitetura, a partir da obra e da inventividade</p><p>de Luiz Carlos Toledo, cuja inteligência, energia e</p><p>potência dialogal atravessa o conjunto do trabalho</p><p>de pesquisa.</p><p>Os encontros e interações promovidos pelo longo</p><p>percurso que legitima esse trabalho impactam a visão</p><p>estabelecida de cidade para os que dele participam,</p><p>gente das mais diversas origens e formações,</p><p>expressando o esforço de pluralidade, de polifonia</p><p>na sua forma mais avançada. A única que permite a</p><p>articulação para pensar o público e o comum a partir</p><p>da arquitetura, do urbanismo e das artes plásticas.</p><p>A qualidade do desenho reforça o entendimento</p><p>e permite acompanharmos os sentidos visuais e</p><p>estéticos presentes nos resultados. Não fora Toledo,</p><p>também, um pintor de cidades imaginárias de rara</p><p>beleza. A energia utópica que anima as páginas</p><p>desse repensar nos aproxima da noção de “metaxy”</p><p>em Simone Weil, que me parece retratar a idéia</p><p>de “entre”, de between, que serve para pensar</p><p>o intervalo, a passagem, a conexão, a ponte, a</p><p>intermediação, as transições entre “reinos”, planos e</p><p>relações. Os objetos e os conceitos ganham forma e</p><p>estrutura ao seu colocarem sobre uma planta onde</p><p>os sentidos se tornam trama, modificam a estrutura</p><p>pelos novos usos e possibilidades que abrem para as</p><p>práticas espaciais, para as políticas públicas e para o</p><p>agir no cotidiano onde os nós e estrangulamentos</p><p>começam a ser rompidos pela recombinação e pela</p><p>inovação em arquitetura, engenharia e planejamento</p><p>participativo.</p><p>As conclusões e propostas da Rede Morar TS per-</p><p>mitem pensarmos a recombinação e a democra-</p><p>tização das trajetórias e da produção tecnológi-</p><p>ca,como uma tarefa dos que lidam com Ciência,</p><p>Tecnologia e Sociedade. Os estudos de CTS e a</p><p>noção de tecnologia social avançam ao sabor da</p><p>virada na direção das disciplinas espaciais, em par-</p><p>ticular do novo urbanismo crítico. Na reflexão que</p><p>sugere novos caminhos de produção e relação com</p><p>a cidade dita informal o texto que acabamos de ler</p><p>situa o espaço entre a materialidade das técnicas,</p><p>que ganham a dimensão topológica necessária</p><p>para podermos repensar o desafio da crise urba-</p><p>na. O caminho da adequação social e técnica para</p><p>a moradia de interesse social é construído desde</p><p>a experiência fundacional realizada na Rocinha no</p><p>Rio de Janeiro entre 2005-2007. O ponto da vira-</p><p>da é reconhecer os direitos e o conhecimento dos</p><p>atores do território, criando e inovando a partir da</p><p>práxis e das narrativas relacionados ao território</p><p>construído, como base para um novo laboratório</p><p>de ideias capazes de fazer avançar um novo para-</p><p>digma para as políticas públicas de urbanização e</p><p>habitação. Plano Diretor Sócioespacial da Rocinha,</p><p>e do seu desdobramento na pesquisa do Morar-TS.</p><p>Vimos na leitura do texto uma dimensão de metaxy</p><p>com as bordas, nas dobras, nas misturas, nas pas-</p><p>sagens, nas pontes e escadas, enquanto elementos</p><p>para uma transição sociotécnica, assim como, atra-</p><p>vés das mediações entre os processos e os produtos</p><p>que o texto sugere. Nas suas dinâmicas construtivas,</p><p>antevemos na proposta de Toledo os canteiros au-</p><p>togestionários, os consórcios e parcerias mistas e os</p><p>modos de montagem com usos de novos materiais.</p><p>Todo esse esforço de projeção que se materializa</p><p>para a recriação de espaços para o habitat contem-</p><p>porâneo, a partir da cidade informal, para um diálogo</p><p>entre o público e o privado. Destacando as funções</p><p>mistas presentes na nova concepção de moradia, que</p><p>parte do olhar sobre o morar que escuta as práticas,</p><p>as narrativas e os desejos de produção do lugar. Ou</p><p>seja, definido pelos seus usos e pela demanda de seus</p><p>habitantes, com a abertura projetual do partido ar-</p><p>quitetônico urbanístico.</p><p>Assim se fazem os diagramas para animar um en-</p><p>contro entre demandas</p><p>e desejos, as cartografias</p><p>que imprimem as necessidades e as aspirações que</p><p>partem da coleta e reflexão com ênfase nas práticas</p><p>POSFÁCIO</p><p>Repensando, inovando e construindo o direito a moradia</p><p>Pedro Cláudio Cunca Bocayuva (NEPP-DH/UFRJ)</p><p>90</p><p>e decisões de conteúdo colaborativo. Tudo ligado</p><p>pelo tripé da problematização da segregação e das</p><p>densidades, dos aspectos ligados ao saneamento, à</p><p>mobilidade, à coleta de resíduos sólidos, cujas for-</p><p>mulações alternativas seguem um modo variado</p><p>de soluções que são o resultado das respostas que</p><p>construídas e avaliadas pelo encontro de conheci-</p><p>mentos entre moradores, técnicos e governo. Alter-</p><p>nativas que se fortalecem com o uso das respostas</p><p>mais avançadas e das soluções mais apropriadas,</p><p>sem rendição ao precário e ao exibicionismo.</p><p>A Rocinha, que vemos nas imagens e debates sobre</p><p>a cidade do Rio é objeto de disputa política e de in-</p><p>teresse econômico, em meio às muitas intervenções</p><p>e agendas para as favelas, dado que aparece como</p><p>o espaço para a definição do “tipo ideal” de política</p><p>de urbanização. O processo que foi desencadeado</p><p>ali serve de “projeto piloto” a partir do sentido la-</p><p>boratorial e de “ponte” ou de grande bairro-conec-</p><p>tor (geográfica e simbolicamente) que representa</p><p>o complexo Rocinha/Gávea/São Conrado. O desafio</p><p>estético, ético, político e geográfico, torna aquele</p><p>espaço o laboratório de intermediação para pensar-</p><p>mos as muitas dimensões das “pontes” e mediações,</p><p>das metaxys para as transformações potenciais das</p><p>megalópoles brasileiras. Para a mobilização produti-</p><p>va e o direito à cidade justa e sustentável, desde uma</p><p>plataforma afirmativa como a que nasceu com o pro-</p><p>cesso do Plano Diretor Sócioespacial da Rocinha, e</p><p>do seu desdobramento na pesquisa do Morar-TS.</p><p>A centralidade da periferia, a Rocinha como território</p><p>em transformação, se articula com a perspectiva</p><p>real e virtual para divulgarmos o planejamento</p><p>colaborativo e a nova cibernética social (o Atelier</p><p>no Território), onde se desenhou e desencadeou</p><p>a trajetória para integrar as abordagens de TS nas</p><p>políticas dos novos possíveis para os territórios</p><p>segregados social e espacialmente.</p><p>A construção do conhecimento pela via da imple-</p><p>mentação de tecnologias sociais se abre com a</p><p>arquitetura e o urbanismo das “Metaxys reais e vir-</p><p>tuais de Toledo”. As pontes que se abrem na era</p><p>da “cidade da informação”, na sua relação com a</p><p>“cidade informal popular” se dá pela via da imple-</p><p>mentação de uma estratégia de leitura, projeção, de-</p><p>senho e imaginação onde os traçados, as narrativas</p><p>e a experiência do espaço ganham a forma orgânica</p><p>que liga os saberes locais com disciplinas espaciais.</p><p>Os novos agenciamentos públicos, com base numa</p><p>abordagem de TS, podem converter-se em expressão</p><p>orgânica e em matéria de potencial de transformação</p><p>socioecológica, através de um novo urbanismo e de</p><p>uma arquitetura e engenharias adequadas ao quadro</p><p>de exigências sociais e tecnológicas para enfrentar-</p><p>mos as dificuldades pertinentes ao desafio da relação</p><p>entre moradia de interesse social e direito à cidade.</p><p>A proposta lançada pelo projeto Morar TS, permite</p><p>vislumbrar as várias traduções e experimentações de</p><p>adequação em matéria de estratégias construtivas.</p><p>O foco na centralidade do social serve de eixo</p><p>estratégico de inventividade e criatividade técnica</p><p>e científica, com base nas disciplinas espaciais,</p><p>especialmente na arquitetura e no planejamento</p><p>urbano. A mistura de linguagens técnicas e estéticas</p><p>com as ciências sociais permite recuperar a noção</p><p>filosófica de metaxy, tão importante para a grande</p><p>pensadora Simone Weil.</p><p>Os complexos e sistemas territoriais favelado-peri-</p><p>féricos são respostas históricas e políticas aos de-</p><p>safios do produzir soluções para a moradia popular</p><p>no espaço urbano das metrópoles; essa afirmação</p><p>encontra em Toledo sua tradução em matéria de es-</p><p>forço dialogal e de construção de novas tipologias e</p><p>modos de construção face ao desafio apresentado</p><p>pela demanda por moradia e um ambiente digno</p><p>para as classes populares.</p><p>Quando estamos diante de grandes obstáculos,</p><p>riscos e ameaças, quando se esgotam os recursos,</p><p>e os conhecimentos não dão conta dos desafios, o</p><p>impensável exige que a razão técnica e a verdade</p><p>científica busquem respostas nas reservas de</p><p>criatividade e na experiência coletiva. O trabalho</p><p>de Luiz Carlos Toledo expressa esse engajamento</p><p>na direção de um avanço significativo na busca de</p><p>respostas para o tema da urbanização de favelas e</p><p>para a construção de moradia de interesse social.</p><p>Nesse breve pósfacio destacamos a importância da</p><p>recombinação de elementos, da adequação social</p><p>e tecnológica e da criatividade, a partir do caráter</p><p>diferenciado de uma abordagem orientada pela</p><p>noção de tecnologia social. O trabalho da Rede</p><p>FINEP MCMV, na sua face de Morar TS voltada para</p><p>repensar as soluções construtivas dentro de um</p><p>novo paradigma de direito à cidade, se orienta pela</p><p>relação filosófica entre o real e o ideal na construção</p><p>de novos possíveis. A noção filosófica de metaxy</p><p>serve para pensarmos essas pontes, passagens e</p><p>conexões entre a potência virtual e o poder real</p><p>do conflito ou do problema que definem o desafio</p><p>e a escala da questão urbana brasileira. A opção é</p><p>ética, desde que a consideremos como um ramo</p><p>da filosofia que pensa o agir individual e coletivo na</p><p>prática orientada por escolhas baseadas em reflexão</p><p>e informada pela experiência. O ethos que envolve os</p><p>que se engajam nesse processo é determinado pela</p><p>constituição de referências para gerar mudança, para</p><p>informar a decisão, questionando os determinismos</p><p>econômicos e a sua face cruel de dominação pela</p><p>imposição dos modelos tecnológicos mais nefastos,</p><p>como temos visto no grande desperdício de</p><p>experiência e de recursos na realização de grandes</p><p>obras, sempre marcadas pelo seu inacabamento e</p><p>pela enorme torrente de problemas de toda a ordem.</p><p>O questionamento e a mudança da trajetória tecno-</p><p>lógica se colocam no centro da vida política quando</p><p>colocamos em questão o padrão hegemônico de</p><p>91</p><p>urbanização e sua incapacidade de lidar com a es-</p><p>cala do desafio apresentado pelo nosso padrão de</p><p>desenvolvimento urbano. Os modos de produção e</p><p>paradigmas de C&T dominantes impedem a supera-</p><p>ção de contextos e espaços de injustiça social, se-</p><p>gregação e violência.</p><p>Por isso o tema do direito à cidade ganhou a cena pú-</p><p>blica brasileira no momento em que as pseudo-agen-</p><p>das de modernização líquida e o empreendedorismo</p><p>do city marketing implodem, em meio aos processos</p><p>de manipulação, jogos e espetáculos de (in)seguran-</p><p>ça. Apesar do mal-estar que pesa no ar, tivemos a per-</p><p>cepção que marcou a sociedade brasileira desde junho</p><p>de 2013, muitos atores e mesmo o governo disseram</p><p>que escutariam as ruas, que algo precisa mudar em-</p><p>bora nem sempre saibam como fazer. Raramente o</p><p>caminho e as propostas ganham tanta substância em</p><p>termos de saída tecnológica e formas de organização</p><p>dos modelos de gestão e planejamento, na escala e</p><p>na complexidade do que o Morar TS buscou formular.</p><p>A megacidade brasileira e os sopros do século XXI</p><p>ainda podem ser propícios para uma nova política</p><p>urbana, alguma combinação entre as agendas de</p><p>desenvolvimento com distribuição de renda que</p><p>passaria pela cidade informal, pela periferia, pela</p><p>favela. Nas páginas que lemos podemos ver a ener-</p><p>gia e o vigor do novo paradigma nascente que se</p><p>relaciona com outros embriões e experimentos</p><p>que eclodem em diversas regiões do país, sempre</p><p>com a força dos movimentos e associações po-</p><p>pulares. Como vimos, o obstáculo tecnológico é</p><p>superável, a qualidade pode ser uma resposta mais</p><p>econômica, a criatividade e a inovação podem se</p><p>encontrar com o reformismo urbano e a redistri-</p><p>buição de renda, numa síntese virtuosa que combi-</p><p>naria o plano diretor dos territórios, a participação</p><p>popular com o uso de novas tecnologias orienta-</p><p>das por um novo urbanismo crítico. As políticas e</p><p>programas podem ser sustentados por uma arqui-</p><p>tetura que procura lidar com as diversas</p><p>escalas</p><p>da demanda por desenho e construção do habitat,</p><p>com saneamento ambiental, mobilidade urbana</p><p>e equipamentos orientados por uma dimensão</p><p>pública de criação de direitos.</p><p>A combinação de ação, técnica e poder precisam fa-</p><p>zer um esforço como o apresentado no texto que</p><p>lemos, o de recombinar as tecnologias para o desen-</p><p>volvimento urbano em novas bases de adequação</p><p>sociotécnica. Mas para dar esse passo foi preciso dar</p><p>um salto de qualidade, acompanhar a megaescala</p><p>do desafio sem perder a microescala, procurar com-</p><p>preender e lidar com o espaço horizontal construído</p><p>pela própria população, combinando o fazer com</p><p>outros usos das novas tecnologias. Criando, assim,</p><p>literalmente, pontes, corredores e passagens susten-</p><p>tados na construção modularizada flexível incluindo</p><p>a possibilidade do avanço da economia solidária pela</p><p>via da dos complexos cooperativos e da autogestão.</p><p>O empurrão nessa direção foi dado pela decisão insti-</p><p>tucional acertada da FINEP de tomar por referência e</p><p>selecionar, dentre outros projetos que disputaram o</p><p>edital que financiou esse estudo, aquele que foi fruto</p><p>da articulação do IPPUR/UFRJ com a equipe do Arqui-</p><p>teto Luis Carlos Toledo, tendo por base o emblemá-</p><p>tico experimento do Plano Diretor Sócioespacial da</p><p>Rocinha que procurava delinear e construir as bases</p><p>para o que viria a ser o PAC das favelas.</p><p>A combinação da sociologia e o planejamento</p><p>urbanos críticos com a arquitetura engajada</p><p>serviram-se do alicerce de uma experiência de</p><p>grande escala, aquela que se realizou na Rocinha</p><p>no Rio de Janeiro, que é uma espécie de bairro</p><p>popular paradigmático, nossa “Pequena Nápoles”</p><p>dentro da cidade do Rio de Janeiro. A favela no</p><p>centro dos bairros ricos é um território-fábrica</p><p>produtivo e potente, a Rocinha é periferia que</p><p>fabrica a cidade, que produz uma nova potência de</p><p>policentralidade. O trabalho de Toledo parte dessa</p><p>base dialogal e crítica, de inteligência coletiva que</p><p>se constituiu através da redefinição e recombinação</p><p>de elementos para um novo modo de projetar,</p><p>de fazer arquitetônico e urbanístico, imprimindo</p><p>criatividade e autonomia cognitiva para repensar</p><p>soluções ao lado das associações e lideranças locais</p><p>comprometidos com os novos possíveis em matéria</p><p>de direito a moradia/bairro .</p><p>Sem os avanços técnicos e o conhecimento</p><p>construído de forma colaborativa na experiência do</p><p>Plano Direitor não poderíamos entender a ousadia</p><p>do arquiteto.</p><p>Sem os avanços técnicos e o conhecimento cons-</p><p>truído de forma colaborativa na experiência do</p><p>Plano Direitor não poderíamos entender a ousadia</p><p>do arquiteto. Não entenderíamos os avanços em</p><p>matéria de tipologias e de modos de construção</p><p>que nos sugere o trabalho que Luiz Carlos Toledo</p><p>nos apresenta. A força de suas soluções nasce da</p><p>sensibilidade e da interação colaborativa que valida</p><p>as abordagens geral e específicas do projeto arqui-</p><p>tetônico e urbanístico para questões de densidade,</p><p>mobilidade, saneamento, urbanidade, relacionando</p><p>modo de produção, novos materiais, redução de cus-</p><p>tos e flexibilidade técnica e construtiva para a varie-</p><p>dade e mix de usos, de dimensões, de estilos de vida,</p><p>de montagem e de modularização aberta e flexível,</p><p>sem conceder ao precário.</p><p>A plataforma de propostas de qualidade de vida no</p><p>território foi esboçada através da ferramenta do</p><p>escritório (Atelier) localizado e equipado na favela,</p><p>articulado na sua dinâmica territorial e com redes de</p><p>comunicação horizontal. A presença do Arquiteto e</p><p>de uma equipe de composição mista com pessoal de</p><p>92</p><p>fora e moradores qualificados da Rocinha, propiciava</p><p>a aproximação prática entre conceito e realidade</p><p>projetual. O escritório territorializado combinava</p><p>conhecimento da população (formando uma equipe</p><p>local), desenho arquitetônico, leitura do território,</p><p>construção de esferas públicas e uma ferramenta-</p><p>plataforma construída por pactuação, como uma</p><p>modalidade de tecnologia social projetada em suas</p><p>plantas, numa nova cartografia de possibilidades.</p><p>Estava formada parte da massa crítica que permitiu</p><p>que o desenho e a força pessoal do arquiteto</p><p>se expressassem como potência e vontade que</p><p>interage e desperta o desejo de conhecimento e a</p><p>capacidade de produzir novas espacialidades.</p><p>O Plano Diretor Sócioespacial é resultado e</p><p>instrumento que informa as propostas e as</p><p>mobilizações locais e a disfunção de uma visão de</p><p>produção e uso do território com base na articulação</p><p>entre conhecimento e direitos, ferramenta prática</p><p>para expressar o desenho e a distribuição de forma</p><p>e função nas novas relações com a estrutura e os</p><p>usos do lugar, abrindo a vida para novas práticas es-</p><p>paciais. O direito ao conhecimento e à informação</p><p>coexistem no modo de elaboração, mas o arquiteto</p><p>pode avançar nas brechas, nas faltas e nas falhas do</p><p>que não foi possível propor e criar por força das limi-</p><p>tações próprias ao contexto do projeto inicial e de</p><p>seus desdobramentos no que foi chamado o PAC 1</p><p>da favela. O potencial dessa elaboração e sua conti-</p><p>nuidade como instrumento público é questão que se</p><p>tornou objeto de debate público desde então. Mas,</p><p>era preciso um novo estímulo, um novo trabalho de</p><p>pesquisa, um exercício desse laboratório projetual</p><p>que passou a conviver e ampliar suas conexões e</p><p>diálogo com os diversos atores da cidade. As políti-</p><p>cas urbanas e em especial o Minha Casa Minha Vida</p><p>apresentava demandas e questões que precisam de</p><p>solução urgente, no que tange a criar um conceito</p><p>de habitar que responda a muitas das possibilidades</p><p>abertas pela invenção e a imaginação arquitetônica.</p><p>A nova possibilidade aberta pelo projeto FINEP propi-</p><p>ciou uma autonomia em matéria de pesquisa na linha</p><p>da proposta de recombinação de requisitos, propos-</p><p>tas e objetos técnicos. O pensamento e a prática da</p><p>arquitetura se reposicionam aproveitando a colabora-</p><p>ção de outros saberes na busca de soluções sem fal-</p><p>sos consensos, sem perda de consistência em matéria</p><p>de conhecimento projetual, sociológico e construtivo.</p><p>A formação de uma aliança entre atores locais, Uni-</p><p>versidade e gestores públicos é um cenário propício</p><p>como ponto de partida para a abordagem social e</p><p>crítica da tecnologia, para definição do problema a</p><p>ser enfrentado, para a projeção da estratégia de so-</p><p>luções, para a democratização e recodificação das</p><p>tecnologias em termos de adequação e complexida-</p><p>de, conforme a demanda singular dos moradores e</p><p>dos sem-teto, em suas interfaces com as potenciali-</p><p>dades do Programa Minha Casa Minha Vida.</p><p>O novo projeto em rede de conhecimento interdis-</p><p>ciplinar permitiu pensar a especificidade da tecnolo-</p><p>gia social na relação com a política pública para a ha-</p><p>bitação de interesse social. A experiência com o PAC</p><p>de favelas serviu de base para criar as condições de</p><p>apresentar um caminho inovador para o Programa</p><p>Minha Casa Minha Vida.</p><p>Como vimos, Luiz Carlos Toledo e a Rede Morar-</p><p>TS nos oferecem um padrão pós-schumpeteriano</p><p>que supera a visão de “destruição criativa” pela</p><p>de inovação inclusiva, que faz dialogar a cidade</p><p>informal popular com a intenção da produção</p><p>em larga escala de moradias para as classes</p><p>populares. O desenho e a sua materialidade</p><p>em termos de engenharia precisava se projetar</p><p>na absorção de novos processos e modelos</p><p>construtivos, que servissem para redefinir as</p><p>orientações de construtores e financiadores,</p><p>aproveitando as novas tecnologias de produto</p><p>e processo. O impulso de formação da Rede de</p><p>Conhecimento Finep de Tecnologia Social para o</p><p>Minha Casa Minha Vida/HIS acaba sendo um campo</p><p>fecundo para lançar as novas bases e escalas que</p><p>proporão mudanças nos modelos estabelecidos.</p><p>O texto apresenta a urgência de enfrentarmos a tran-</p><p>sição tecnológica procurando sugerir a necessidade</p><p>de aproximação entre moradores e trabalhadores</p><p>de novos materiais e processos, de novas combina-</p><p>ções para a relação com novos modelos de fabrica-</p><p>ção através da substituição do canteiro de obras pela</p><p>nova linha de montagem. Vemos com Toledo uma</p><p>combinação de neofordismo na linha de produção</p><p>com pós-fordismo</p><p>flexível nas escolhas, na tipologia,</p><p>nos usos e nas conexões em diálogo com a produção</p><p>de espaços de passagem, ativando mobilidade e con-</p><p>vívio com os padrões ligados à topografia, ao sanea-</p><p>mento ambiental, aos ecolimites, através da proposi-</p><p>ção de soluções conexas e fórmulas que combatem</p><p>as lógicas de remoção pela via da relocalização com</p><p>verticalização planejada.</p><p>Para cumprir esse desafio de transformação so-</p><p>cioespacial construindo e respondendo aos impul-</p><p>sos políticos, produtivos e culturais da justiça espa-</p><p>cial, a FINEP buscou construir redes de pesquisa e</p><p>experimentação de projetos e processos, como o</p><p>edital voltado para o Programa Minha Casa Minha</p><p>Vida e a Moradia de Interesse Social. O projeto de</p><p>pesquisa avançou na proposição da tipologia das</p><p>edificações e moradias combinando várias aborda-</p><p>gens científicas, tecnológicas e produtivas voltadas</p><p>para a política habitacional, no que refere ao concei-</p><p>to de interesse social.</p><p>A partir da noção de tecnologia social podemos</p><p>perceber a força de inovação que deriva da produção</p><p>93</p><p>da transição para um novo modelo cognitivo na</p><p>arquitetura e no urbanismo. O projeto se mostra</p><p>capaz de traduzir as necessidades e demandas</p><p>populares, elaboradas desde um recorte que parte</p><p>da sensibilidade para uma metodologia que traduz a</p><p>noção de tecnologia social enquanto conjunto que</p><p>articula uma noção de problemática, um acordo e a</p><p>articulação de atores capazes de definir e resolver os</p><p>problemas, e que se volta para uma dada produção</p><p>de respostas por meio de novos dispositivos, meios,</p><p>instrumentos e modos de organização tecnológica.</p><p>A FINEP promoveu a constituição de uma rede</p><p>de tecnologia para a moradia de interesse social</p><p>para o MCMV e a HIS. O resultado do trabalho</p><p>interdisciplinar e a proposição expressa nesse</p><p>texto-relatório mostram que esse investimento</p><p>tem um alcance estratégico, pois cria uma brecha</p><p>de esperança para outras vias, um futuro possível</p><p>nas estratégias de produção do espaço urbano em</p><p>uma nova direção, sob a liderança de um novo bloco</p><p>social e técnico capaz de privilegiar e fazer avançar</p><p>uma cidade policêntrica, com base na potência da</p><p>periferia. O relato-proposta que acabamos de ler é</p><p>como uma plataforma, um manifesto como se diz</p><p>em arquitetura e urbanismo.</p><p>O Manisfesto em que Toledo escreve as virtualidades</p><p>projetuais da inovação tecnológica capazes de fazer</p><p>avançar o paradigma tecnicocientífico dos modos</p><p>de construção, com a organização de formas de</p><p>interação social, produtiva, cultural e ambiental</p><p>na luta pela concretização das proposições que o</p><p>legislador inscreveu no Estatuto da Cidade, foram</p><p>reafirmadas em compromissos do Presidente Lula</p><p>e do Ministério das Cidades frente aos resultados</p><p>formulados no ciclo das Conferências das Cidades.</p><p>O que se espera é que essa passagem do Plano</p><p>Diretor Sócioespacial para os novos processos</p><p>e tipologia de moradias ganhe o espaço que lhe</p><p>corresponde. De modo a evitar a dialética negativa</p><p>da combinação entre violência urbana, segregação</p><p>social e destruição espacial. O que parece ser o</p><p>resultado dos modelos urbanos insustentáveis</p><p>que insistem em não ver a potência democrática</p><p>e produtiva que nasce das tecnologias sociais. A</p><p>proposta do Repensando as Habitações de Interesse</p><p>Social percebe e se alimenta da mobilização dos</p><p>sujeitos sociais e da inteligência coletiva da periferia,</p><p>o que lhe confere potência, inspiração e eticidade.</p><p>Verônica Natividade</p><p>Verônica Natividade é Arquiteta</p><p>e Urbanista formada pela FAU/</p><p>UFRJ (2002) e possui mestrado</p><p>em Projeto de Arquitetura pela</p><p>FAU/USP (2010). Orientou sua</p><p>formação complementar para</p><p>as áreas de arquitetura para-</p><p>métrica e fabricação digital na</p><p>Architectural Association em Londres (2010) e no</p><p>Instituto de Arquitetura Avançada da Catalunha, em</p><p>Barcelona (2012).</p><p>Possui experiência profissional em projetos de Arqui-</p><p>tetura e urbanismo. Seu trabalho tem sido publicado</p><p>em mostras nacionais e internacionais de arquitetura</p><p>e publicações especializadas. Desde 2010 é profes-</p><p>sora no Curso de Arquitetura da Puc-Rio.</p><p>Petar Vrcibradic</p><p>Formado em Arquitetura e</p><p>Urbanismo pela FAU/UFRJ</p><p>(2002) e Mestre com honras</p><p>em Advanced Architectural</p><p>Design pela Universidade de</p><p>Columbia (2005). Possui expe-</p><p>riência profissional em projetos</p><p>de arquitetura e urbanismo,</p><p>com foco em projetos de média e larga escalas. Foi</p><p>arquiteto colaborador do Morphosis Architects,</p><p>Gehry Partners e Chang-Jo Architects. Desde de 2012</p><p>é coordenador de projetos da Aecom Brasil.</p><p>Participou de equipes vencedoras de concursos</p><p>nacionais e internacionais. Com Chang-Jo Archi-</p><p>tects, foi premiado com o 1° Lugar Korean Consu-</p><p>late Competition – Gwangzhou, China (2010); 3°</p><p>Lugar Four Rivers Competition (2009) - Samnangjin,</p><p>Coréia do Sul, 1° Lugar LG City Masterplan Competi-</p><p>tion (2009) - Ilsan, Coréia do Sul. No Brasil, venceu</p><p>o Concurso Centro de Convenções da Cidade Nova</p><p>(2002), com Mayerhoffer & Toledo Arquitetos e</p><p>o Concurso Arquiteto do Amanhã (2001), ambos</p><p>organizados pelo IAB-RJ.</p><p>Luiz Carlos</p><p>de Menezes Toledo</p><p>Formado em Arquitetura</p><p>(1966) pela Faculdade de</p><p>Arquitetura da Universidade</p><p>Federal do Rio de Janeiro –</p><p>UFRJ, com especialização em</p><p>urbanismo (1970), Mestrado em</p><p>Arquitetura (PROARQ, 2002) e</p><p>Doutor em Arquitetura (PROARQ, 2008) pela mesma</p><p>faculdade. Professor da disciplina de Urbanismo na</p><p>Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual</p><p>do Rio de Janeiro – UERJ (1977/ 2012), professor da</p><p>disciplina de Planejamento de Arquitetura da Facul-</p><p>dade de Arquitetura da UFRJ (1981/1996) e professor</p><p>visitante do Curso de Especialização de Arquitetura</p><p>em Sistemas de Saúde da Faculdade de Arquitetura</p><p>da Universidade Federal da Bahia – UFBA. Diretor</p><p>da empresa M&T-Mayerhofer &Toledo Arquitetura.</p><p>Planejamento. Consultoria Ltda.</p><p>Venceu os concursos organizados pelo IAB-RJ Rio</p><p>Cidade 1- Méier (1993), Rio Cidade 2-Irajá (1997),</p><p>Projeto de Ambiente e Mobiliário Urbano Baixada</p><p>Viva (1997), Centro de Convenções da Área do Tele-</p><p>porto (2002) e o concurso de Idéias para Elaboração</p><p>do Plano Diretor de Urbanização da Rocinha (2006).</p><p>Em 2005 recebeu da Associação Brasileira para o</p><p>Desenvolvimento do Edifício Hospitalar (ABDEH)</p><p>o título de Personalidade do Ano na Área de Arqui-</p><p>tetura Hospitalar. Em 2008 recebeu do Instituto de</p><p>Arquitetos do Brasil-Departamento do Rio de Janeiro</p><p>(IAB-RJ) o título de Arquiteto do Ano.</p><p>Os autores</p><p>das</p><p>universidades de outros estados. O objetivo principal desse</p><p>grupo de arquitetos consiste em planejar e utilizar nas hab-</p><p>itações de interesse social o maior número possível de com-</p><p>ponentes construtivos industrializados que se encontram à</p><p>disposição no mercado.</p><p>Não se trata de empregar as técnicas obsoletas de pré-fabricação</p><p>em grande escala. A proposta é criar uma espécie de “montadora</p><p>da habitação”, a exemplo do que ocorre nos processos de mon-</p><p>tagem de produtos industrializados. Cada edificação seria plane-</p><p>jada levando em consideração a existência desses elementos con-</p><p>strutivos – vigas, pilares, painéis divisórios, forros, elementos de</p><p>fachada, esquadrias, banheiros completos – e a sua adequação ao</p><p>projeto do empreendimento e ao contexto físico local. O projeto</p><p>pretende racionalizar o sistema construtivo, oferecer uma melhor</p><p>qualidade de acabamento e propor uma solução estética que val-</p><p>orize as edificações e o ambiente urbano no seu entorno.</p><p>Espera-se que iniciativas dessa natureza recebam a acolhida da</p><p>Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades em</p><p>benefício da requalificação dos empreendimentos habitacionais e</p><p>da sua integração ao processo de construção de cidades inclusivas</p><p>e sustentáveis.</p><p>Luiz Fernando Janot,</p><p>arquiteto e urbanista.</p><p>Artigo publicado no jornal O Globo, em 24/11/2012.</p><p>PREFÁCIO ................................................................ 11</p><p>APRESENTAÇÃO ...................................................... 13</p><p>1. INTRODUÇÃO ....................................................... 15</p><p>2. UMA SÍNTESE DO PLANO DIRETOR SÓCIO</p><p>ESPACIAL DA ROCINHA (2005 / 2007) ................... 23</p><p>2.1 A ocupação do solo na Rocinha</p><p>e a carência de espaços públicos ...................... 26</p><p>2.2 A falta de saneamento ................................. 26</p><p>2.3 A má qualidade arquitetônica</p><p>e construtiva das edificações ............................ 27</p><p>2.4 As precárias condições de mobilidade ....... 28</p><p>2.5 Aprendendo com o Plano ............................ 28</p><p>2.6 As principais propostas</p><p>do Plano Sócio Espacial da Rocinha .................. 29</p><p>3 A PESQUISA .......................................................... 35</p><p>3.1 O papel das HIS na organização</p><p>e produção de espaços públicos ....................... 38</p><p>3.2 Parâmetros e indicadores ............................ 38</p><p>3.2.1 Verticalização, densidade</p><p>e ocupação do solo ...................................... 38</p><p>3.2.2 Os módulos pesquisados .................... 39</p><p>3.2.3 Estudo morfológico ............................. 42</p><p>3.2.4 Análise das declividades da AI2 .......... 42</p><p>3.3 Critérios de intervenção .............................. 42</p><p>3.4. Estudo do processo de remoção</p><p>de unidades existentes e inserção de novas</p><p>tipologias e sua aplicação na criação de espaços</p><p>públicos e aumento da mobilidade................... 43</p><p>3.5 Cenários de implantação das HIS na AI2 ..... 43</p><p>3.5.1 Cenário adotado .................................. 43</p><p>4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS PROJETADOS ........ 55</p><p>4.1 Tipos que criam espaços públicos</p><p>e melhoram a mobilidade e acessibilidade ....... 58</p><p>4.2 Tipos evolutivos que permitem aumentar</p><p>a unidade residencial segundo diretrizes</p><p>projetuais e tecnológicas pré-definidas ............ 59</p><p>4.3 Tipos com grande variedade</p><p>de layouts numa mesma edificação .................. 59</p><p>5 VOCABULÁRIO ARQUITETÔNICO ....................... 61</p><p>6 AS MONTADORAS DE HIS ................................... 67</p><p>7 OS TIPOS ............................................................... 71</p><p>POSFÁCIO ................................................................ 89</p><p>ENCARTE – CDRom (parte impressa e anexos abaixo)</p><p>ANEXO 1 - Projeto Básico</p><p>PB 1 - Micro de intervenção com quatro pavimentos</p><p>PB 1.1 Arquitetura</p><p>PB 1.2 Estrutura</p><p>PB 1.3 Instalações</p><p>PB 1.4 Custo estimado</p><p>PB - 2 Micro Intervenção Expansível linear</p><p>PB 2.1 Arquitetura</p><p>PB 2.2 Estrutura</p><p>PB 2.3 Instalações</p><p>PB 2.4 Custo estimado</p><p>ANEXO 2 - Oficina Solidária</p><p>1. Introdução</p><p>2. Modelo Solidário</p><p>3. Oficina Solidária</p><p>4. Design Solidário</p><p>SUMÁRIO</p><p>11</p><p>PREFÁCIO</p><p>A intenção dessa apresentação é tornar mais visí-</p><p>veis os ideais que sustentam as propostas aqui de-</p><p>senvolvidas e que ajudam a enxergar a singularidade</p><p>desse trabalho. A singularidade de um trabalho cole-</p><p>tivo com uma alma única. A alma de um humanista,</p><p>também arquiteto e urbanista, que ao projetar um</p><p>espaço, seja uma viela, um edifício de apartamentos</p><p>ou um centro esportivo, já está embebido das neces-</p><p>sidades e desejos daquela gente que usará esse espa-</p><p>ço. Luiz Carlos Toledo é a alma desse trabalho, a força</p><p>vital de uma experiência criativa e realmente coletiva</p><p>que agregou arquitetos e estudantes em torno de</p><p>uma grande mesa, ao longo de dois anos.</p><p>Essa experiência foi viabilizada pela FINEP, ao mon-</p><p>tar e financiar uma rede nacional de pesquisa sobre</p><p>moradia e tecnologia social. Um dos desafios postos</p><p>à rede era pensar processos de intercâmbio entre os</p><p>saberes técnico e popular que resultassem em proje-</p><p>tos habitacionais capazes de redefinir os parâmetros</p><p>de bem estar urbano hegemônicos no país e que am-</p><p>pliassem o universo de possibilidades construtivas</p><p>para a população envolvida. Buscava-se assim atrelar</p><p>ideais da boa moradia às formas de produzi-la, privile-</p><p>giando as formas autogestionárias, ou em outras pa-</p><p>lavras, as formas de produzir sob o controle dos que</p><p>nela vão morar. Esse desafio foi o impulso que faltava</p><p>para que uma experiência radicalmente democrática</p><p>de planejamento urbano no bairro da Rocinha tivesse</p><p>continuidade e ganhasse visibilidade.</p><p>Como será visto nesse trabalho, o processo de ela-</p><p>boração do plano diretor da Rocinha sob a coor-</p><p>denação do Toledo, entre os anos de 2005 e 2007,</p><p>gerou uma relação de reciprocidade e confiança</p><p>entre os profissionais à frente dessa empreitada e</p><p>os moradores do lugar. E foi justamente a nature-</p><p>za dessa relação que garantiu a compreensão mais</p><p>profunda, por parte dos profissionais, das neces-</p><p>sidades e desejos dos moradores, tanto adultos</p><p>quanto crianças. Já nesse momento, começou a ser</p><p>gestada a ideia nuclear desse trabalho, a de se pen-</p><p>sar a habitação como instrumento da urbanização.</p><p>Rompeu-se assim com a concepção da habitação</p><p>apenas como espaço privado da família, incorporan-</p><p>do-se em seu interior a dimensão pública inerente à</p><p>cidade. Os projetos habitacionais para a Rocinha se-</p><p>riam, então, projetos de urbanização voltados para</p><p>a necessidade urgente de espaços livres e públicos,</p><p>que ao mesmo tempo garantiriam o direito de todos</p><p>permanecerem em seu bairro. Como de praxe, esse</p><p>e os demais princípios norteadores do plano diretor</p><p>não foram apropriados e utilizados nas políticas de</p><p>intervenção pública na Rocinha. Porém, permanece-</p><p>ram nos corações e mentes de todos que se envol-</p><p>veram na elaboração do plano.</p><p>Foi a partir do acúmulo de informações e percep-</p><p>ções sobre a vida cotidiana naquele bairro popular,</p><p>que a equipe de arquitetos responsável pelos proje-</p><p>tos aqui apresentados desenvolveu os parâmetros</p><p>habitacionais para novas construções na Rocinha.</p><p>Três desses parâmetros, aqui destacados, exempli-</p><p>ficam claramente o caminho, desde a imersão no</p><p>lugar até a criação dos projetos.</p><p>O primeiro parâmetro é o que define os espaços</p><p>construídos de uso público, em que as necessidades</p><p>de circulação, de encontro e de trocas devem ser</p><p>atendidas. Elevadores, escadas, corredores e pilotis</p><p>de edifícios ganham aí novas funções ao se tornarem</p><p>espaços públicos, se somando às praças e às ruas. Tal</p><p>parâmetro altera as concepções de espaço privado,</p><p>condominial e público vigentes nos programas</p><p>habitacionais, ampliando as atribuições do Estado na</p><p>difusão do bem comum.</p><p>O segundo parâmetro resulta da diversidade de ar-</p><p>ranjos domésticos associada às estratégias de sobre-</p><p>vivência das classes populares. Projetos habitacionais</p><p>flexíveis e diferenciados incorporam a dimensão do</p><p>tempo, abrem a possibilidade de adequação da mo-</p><p>radia às necessidades de quem lá vive e invertem a</p><p>lógica histórica</p><p>no Brasil de forçar as famílias a se</p><p>adequarem ao modelo oficial de habitação.</p><p>O terceiro parâmetro introduz o mundo do trabalho</p><p>na concepção de um bem, a casa, comumente pen-</p><p>sado como o lugar do descanso. A moradia como</p><p>espaço do ócio e do trabalho não é exclusividade</p><p>dos bairros populares, mas guarda forte presença</p><p>nestes. A flexibilidade aqui se refere aos possíveis</p><p>usos da habitação.</p><p>Tive o privilégio e o prazer de acompanhar a feitura</p><p>desse trabalho no escritório na Rua da Glória,</p><p>participando de dezenas de conversas com a</p><p>equipe, com lideranças comunitárias e profissionais</p><p>de diferentes áreas, convidados a sentar em volta</p><p>da mesa e reagir às ideias expostas, alimentando</p><p>com suas opiniões a força criativa da equipe.</p><p>Em síntese, as propostas e projetos reunidos</p><p>nesse livro estão enraizados num lugar, um lugar</p><p>com nome próprio, vida própria, porém intensa e</p><p>conflituosamente conectado à cidade que o contém.</p><p>E justamente por estarem enraizados em vidas</p><p>humanas e suas histórias, tais propostas e projetos</p><p>são universais. Sendo universais e históricos, a cada</p><p>ideia implantada vão sendo repensados, talvez</p><p>modificados e novamente implantados, seja em seu</p><p>lugar de origem, seja em qualquer lugar...</p><p>Luciana Corrêa do Lago</p><p>13</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>Este é um trabalho coletivo, como bem assinala</p><p>Luciana Correa do Lago no Prefácio deste livro,</p><p>desenvolvido por mim e pelos jovens arquitetos</p><p>Petar e Verônica, cujo talento, criatividade e</p><p>comprometimento despertaram-me a vontade de</p><p>enfrentar o desafio de revisitar o tema da habitação</p><p>de interesse social numa época em que os grandes</p><p>eventos, com seus megaprojetos, monopolizam a</p><p>atenção do público e de boa parte dos arquitetos.</p><p>O livro nasceu do estudo de novas alternativas</p><p>para o projeto e construção das habitações de</p><p>interesse social, parte integrante da pesquisa</p><p>desenvolvida pela Rede FINEP sobre Moradia e</p><p>Tecnologia Social. A Seleção Pública de Projetos</p><p>para Patrocínio, em boa hora lançada pelo</p><p>CAU/RJ, possibilitou esta edição.</p><p>Petar Vrcibradic vem desenvolvendo uma carreira</p><p>brilhante que se inicia com um período de um ano</p><p>no Escritório Morphosis, do Arquiteto Thom Mayne,</p><p>seguido pelo mestrado na Faculdade de Arquitetura</p><p>de Columbia em 2004/2005, que o credenciou para</p><p>trabalhar no escritório de Frank Gehry durante três</p><p>anos, até retornar ao Brasil.</p><p>Verônica Natividade fez o mestrado em arquitetu-</p><p>ra na USP em 2007/2010, leciona várias disciplinas</p><p>na PUC-Rio e tem participado de vários projetos de</p><p>urbanização de favelas, além de dominar diversos</p><p>programas de modelagem paramétrica, conheci-</p><p>mentos que se mostraram imprescindíveis no de-</p><p>senrolar do trabalho.</p><p>Com o desenvolvimento da pesquisa juntaram-se</p><p>à equipe os arquitetos Luiz Cláudio Franco e Thais</p><p>Velasco, assim como os estagiários de arquitetura</p><p>Bernardo Soares, Fernanda Gianinni, Fernanda</p><p>Petrus, Frances Sampaio, Maria Isabel Pedro e</p><p>Marina Di Blasi, cujo entusiasmo e dedicação</p><p>se refletiram, tanto na arquitetura dos tipos</p><p>habitacionais projetados como na qualidade das</p><p>imagens.</p><p>O acompanhamento da pesquisa pelas Professoras</p><p>Doutoras da UFRJ Luciana Lago e Vera Tângari,</p><p>suas críticas, observações e estímulo, em muito</p><p>contribuíram para o resultado da pesquisa e para a</p><p>decisão de escrever este livro.</p><p>Para a elaboração dos dois anexos colaboraram</p><p>vários escritórios com larga experiência em projetos</p><p>de arquitetura, estrutura e instalações prediais e</p><p>dois professores da Faculdade de Desenho Industrial</p><p>da Sapienza Università di Roma.</p><p>No Anexo 1 dois tipos projetados foram desenvol-</p><p>vidos em nível de projeto básico pelos escritórios</p><p>Mayerhofer & Toledo Ltda, CGE Engenharia Ltda e</p><p>CONSULT Projetos e Instalações Ltda, sob a coorde-</p><p>nação dos arquitetos Verônica Natividade e Rafael</p><p>Veríssimo.</p><p>O Anexo 2 contém projetos de mobiliário para</p><p>as unidades habitacionais e de uma marcenaria</p><p>baseada nos princípios de economia solidária e</p><p>colaborativa. Esse estudo resultou de convênio</p><p>entre a UFRJ e a Sapienza Università di Roma,</p><p>viabilizado pelo Programa Ciência Sem Fronteiras.</p><p>Nele participaram os professores Vincenzo Cristallo</p><p>e Sabrina Lucibello, os bolsistas do Programa</p><p>Ciência Sem Fronteiras Fernanda Petrus e Pedro</p><p>Henrique Bitencourt, além de uma grande equipe</p><p>multidisciplinar do Dipartimento di Pianificazione,</p><p>Design, tecnologia dell árchitettura.</p><p>Os autores agradecem à FINEP e ao CNPq a</p><p>prioridade dada ao tema da habitação de interesse</p><p>social, viabilizando a pesquisa que deu origem a</p><p>esta publicação e, especialmente, à Luciana Correa</p><p>do Lago e Cunca Bocayuva, os Prefácio e Posfácio</p><p>instigantes que iniciam e fecham nosso livro.</p><p>Luiz Carlos Toledo</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Figura 01 – Habitações projetadas como parte do Plano Diretor da Rocinha.</p><p>Projeto de arquitetura: Arq. José Carlos Franco, 2007.</p><p>17</p><p>A pesquisa da Rede FINEP sobre Moradia e</p><p>Tecnologia Social possibilitou à equipe da UFRJ</p><p>aprofundar uma série de reflexões sobre o potencial</p><p>das Habitações de Interesse Social (HIS) como</p><p>agentes de transformação do espaço urbano e como</p><p>indutoras de um esforço de renovação da forma</p><p>de projetar e construir que transfira os avanços</p><p>projetuais e tecnológicos à população.</p><p>Nesse sentido a equipe propõe uma alternativa</p><p>à maneira de projetar e construir, mediante um</p><p>vocabulário contemporâneo e substituição dos</p><p>métodos tradicionais de construir por um sistema de</p><p>montagem aberto à (1) participação dos que atuam</p><p>na construção das HIS − na industrialização dos seus</p><p>componentes e na produção dos materiais nelas</p><p>utilizados – e (2) à população a que se destinam.</p><p>Nossas primeiras ideias sobre o papel das HIS como</p><p>instrumento de reorganização espacial surgiram</p><p>durante a elaboração do Plano Diretor Socioespa-</p><p>cial da Rocinha (2005 a 2007), ao se perceber que as</p><p>HIS poderiam ter sua função ampliada de forma a</p><p>proporcionar, além de moradia, a reorganização do</p><p>espaço urbano, combatendo a excessiva ocupação</p><p>do solo, criando novos espaços públicos, melhoran-</p><p>do a mobilidade e as condições sanitárias da favela,</p><p>com um mínimo de desapropriações.</p><p>A participação da população nas fases de projeto</p><p>e construção das unidades habitacionais e a</p><p>transferência das técnicas construtivas utilizadas</p><p>foi uma das preocupações da equipe que elaborou</p><p>o Plano, que propôs nesse sentido, a implantação</p><p>de uma fábrica de componentes pré-fabricados de</p><p>argamassa armada na própria favela, a ser operada</p><p>por moradores da comunidade.</p><p>As HIS propostas no Plano, projetadas com estrutura</p><p>metálica e argamassa armada, tinham as circulações</p><p>verticais separadas dos blocos. No pavimento térreo,</p><p>em pilotis, uma galeria coberta, à guisa de calçada,</p><p>que facilitava o trânsito de pedestres. O projeto, in-</p><p>tegrado à topografia da Rocinha, previa pavimentos</p><p>acima e abaixo do nível das ruas de acesso.</p><p>Infelizmente, nem a fábrica nem as elegantes HIS</p><p>projetadas pelo arquiteto José Carlos Franco, inte-</p><p>grante da equipe do Plano Diretor, foram implanta-</p><p>das pelo Governo do Estado, sob a alegação de que</p><p>não se enquadravam nos parâmetros estabelecidos</p><p>pelo Ministério das Cidades para o MCMV.</p><p>A dificuldade de viabilizar essas propostas ocorria</p><p>em um momento no qual, mais do que nunca, se fazia</p><p>necessário pesquisar e criar tipologias de HIS tais,</p><p>que além de combater o déficit habitacional com</p><p>unidades que correspondessem às necessidades</p><p>da população, também contribuíssem para a</p><p>requalificação do espaço urbano.</p><p>No Rio de Janeiro, durante a existência do progra-</p><p>ma Favela Bairro, assim como no PAC das Favelas,</p><p>os investimentos em habitações foram sempre mar-</p><p>ginais em relação aos alocados em infraestrutura e</p><p>equipamentos urbanos.</p><p>Os dois programas concentraram suas ações na</p><p>implantação de redes de drenagem pluvial, de siste-</p><p>mas de abastecimento de água e eliminação de esgo-</p><p>tos, abertura e alargamento de vias, criação de áreas</p><p>de lazer, creches, equipamentos esportivos etc. As</p><p>unidades residenciais construídas eram destinadas</p><p>apenas aos moradores</p><p>removidos das áreas de ris-</p><p>co, de terrenos onde seriam construídos os equipa-</p><p>mentos públicos e para moradores cujas casas não</p><p>tinham condições mínimas de habitabilidade.</p><p>Esse tem sido até o momento o receituário empre-</p><p>Figura 01-A – Habitações projetadas como parte do Plano</p><p>Diretor da Rocinha.</p><p>Projeto de arquitetura: Arq. José Carlos Franco, 2007.</p><p>Figura 01-B – Habitações projetadas como parte do Plano Diretor da Rocinha.</p><p>Projeto de arquitetura: Arq. José Carlos Franco, 2007.</p><p>18</p><p>gado na urbanização de favelas. A proposta em</p><p>pauta se distingue por prever em suas ações, tanto a</p><p>melhoria das edificações existentes, como a implan-</p><p>tação de novas tipologias habitacionais, contribuindo</p><p>com o desadensamento das áreas excessivamente</p><p>ocupadas, criando espaços públicos, além de melho-</p><p>rar a acessibilidade e a mobilidade.</p><p>O sentimento de pertencimento próprio da maioria</p><p>dos moradores de comunidades em relação aos</p><p>poucos espaços públicos disponíveis explica-se</p><p>pelo fato de que os largos, praças e quadras de</p><p>esporte são, muitas vezes, fruto de árduas lutas da</p><p>população local.</p><p>O mesmo se aplica às habitações, em grande par-</p><p>te, construídas pelos próprios moradores. Desse</p><p>modo, a discussão da moradia tem um forte apelo à</p><p>mobilização, principalmente se a população partici-</p><p>pa da seleção dos projetos, discutindo suas caracte-</p><p>rísticas e propondo alternativas.</p><p>Com a criação da Rede FINEP, formada pelas universi-</p><p>dades UFGRS, UFAL, UFCG, UFMG, UFPEL, UFRJ, USP</p><p>e pela FIOCRUZ, o tema Tecnologia Social /HIS passou</p><p>a ser discutido pela academia a nível nacional.</p><p>Coube ao IPPUR/UFRJ contribuir para essa</p><p>discussão em dois planos: no teórico, participando</p><p>da construção de um marco conceitual do binômio</p><p>“Tecnologia Social / HIS” e, no prático, projetando</p><p>um conjunto de tipos de HIS caracterizados pela</p><p>sustentabilidade e capacidade de qualificar o</p><p>território onde serão implantadas e propondo uma</p><p>nova maneira de projetar e construir.</p><p>Os programas arquitetônicos dos tipos projetados</p><p>variam desde um pequeno estúdio (conjugado),</p><p>com aproximadamente 22m², a apartamentos de</p><p>quatro quartos de 85m², para atender aos diversos</p><p>tamanhos e composições familiares. Os 14 tipos fo-</p><p>ram projetados de modo a criar unidades habitacio-</p><p>nais flexíveis que permitem diversos arranjos em</p><p>uma mesma edificação e unidades evolutivas que</p><p>comportam, até mesmo, o aumento de área.</p><p>A Figura ao lado ilustra alguns dos diferentes</p><p>arranjos arquitetônicos possíveis em uma mesma</p><p>edificação, fixando a posição dos poços de descida</p><p>de instalações (shafts).</p><p>Em relação aos métodos construtivos, a proposta</p><p>se fundamenta na aplicação de um processo de</p><p>montagem baseado em sistemas estruturais e</p><p>componentes arquitetônicos industrializados os</p><p>quais, além de reduzir o tempo de construção,</p><p>evitar desperdícios de materiais e melhorar a</p><p>qualidade da obra, poderão inaugurar um novo ciclo</p><p>19</p><p>de transferência tecnológica aos agentes formais e</p><p>informais que participam da construção das HIS.</p><p>Quando avanços tecnológicos são incorporados aos</p><p>projetos das HIS, mudanças na forma de construí-</p><p>las, além de naturais, passam a ser necessárias,</p><p>rompendo-se, muitas vezes, com processos</p><p>tradicionais de construção.</p><p>O melhor exemplo dessa ruptura é a obra do</p><p>arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, da qual não</p><p>podem ser separados os processos construtivos</p><p>inovadores que utilizou para erguer, entre outros</p><p>projetos, os hospitais da rede SARAH. Se neste</p><p>caso foram utilizadas técnicas construtivas</p><p>relativamente sofisticadas, o mesmo não ocorreu</p><p>com a escola rural e as pontes que Lelé construiu na</p><p>pequena cidade de Abadiana (GO), onde, mantendo</p><p>os princípios de racionalização, modulação e pré-</p><p>fabricação, simplificou as técnicas de construção</p><p>e utilizou mão de obra local, obtendo custos de</p><p>construção inferiores ao dos métodos tradicionais.</p><p>Na pesquisa, o projeto e o modo de construir também</p><p>caminharam juntos e, com base na obra de Lelé, foi</p><p>idealizada a Montadora de HIS, inspirada na “Fabrica</p><p>de Escolas” por ele criada no Rio de Janeiro, duran-</p><p>te o Governo Brizola, com uma diferença: enquanto</p><p>Lelé utiliza um sistema fechado, onde controla e reali-</p><p>za magistralmente, além do projeto, a fabricação dos</p><p>componentes e sua montagem, na proposta o siste-</p><p>ma é aberto, baseado na utilização de componentes</p><p>existentes no mercado, ou que venham a ser fabrica-</p><p>dos para atender ao sistema proposto.</p><p>Nesse sentido, a adoção de projetos e sistemas</p><p>construtivos inovadores pelas construtoras que</p><p>participam do MCMV será fundamental para</p><p>estimular a industrialização de componentes e a</p><p>aplicação de novos materiais às HIS.</p><p>O sistema proposto pretende ser uma alternativa</p><p>inovadora às práticas tradicionais de construção, Figura 02 – Arranjos arquitetônicos</p><p>20</p><p>Figura 03 – Modelo automotivo de fábricas x montadoras</p><p>semelhante a que ocorreu com o modelo automotivo,</p><p>cujas fábricas deram lugar às “montadoras”, que</p><p>tem por finalidade principal juntar os milhares de</p><p>componentes produzidos por centenas de fábricas</p><p>de autopeças, motores, carrocerias, vidros, rodas,</p><p>pneus, eletroeletrônicos, estofados etc.</p><p>Na figura ao lado se faz uma comparação entre os</p><p>dois processos, mostrando o que aconteceria se os</p><p>métodos tradicionais de construir, com seus cantei-</p><p>ros de obras, dessem lugar à “montadora de HIS”.</p><p>A alternativa proposta vai além do conceito de</p><p>pré-fabricação, ao prever a utilização maciça de</p><p>componentes industrializados pelo mercado. Nesse</p><p>sentido, existe muito a ser feito, já que os compo-</p><p>nentes existentes, em geral, são direcionados aos</p><p>edifícios corporativos, shoppings e habitações das</p><p>classes de renda mais alta. Para estimular os fabri-</p><p>cantes a lançarem produtos para as HIS será funda-</p><p>mental admitir custos de construção maiores dos</p><p>que os aprovados pelos órgãos de financiamento,</p><p>incompatíveis com moradias de boa qualidade.</p><p>No momento de especificar, construtoras e órgãos</p><p>de financiamento devem levar em conta que, nem</p><p>sempre, a utilização de sistemas construtivos, ma-</p><p>teriais ou componentes arquitetônicos mais caros</p><p>implicam num maior custo da obra, desde que con-</p><p>tribuam para a redução do tempo de construção,</p><p>eliminação de desperdícios e redução dos custos de</p><p>outros componentes. É o caso da adoção de estrutu-</p><p>ras metálicas, em princípio mais caras, que se tornam</p><p>competitivas quando é considerada a rapidez, o rigor</p><p>dimensional e a estabilidade da edificação. Da mes-</p><p>ma forma, o uso de paredes de gesso cartonado e</p><p>painéis leves nas fachadas influem positivamente no</p><p>custo da estrutura, ao reduzir as dimensões de pilares</p><p>e vigas, além de proporcionar maior qualidade nos</p><p>acabamentos. Os “banheiros prontos”, atualmente</p><p>utilizados em hotéis e edifícios corporativos, pode-</p><p>rão ser adaptados para as HIS, com grande vantagem</p><p>em relação à rapidez da obra e melhor acabamento.</p><p>A montagem desses componentes, aliado à indus-</p><p>trialização da estrutura, seja ela metálica, em arga-</p><p>massa armada, ou em concreto, entregue na obra</p><p>dentro das dimensões definidas no projeto, comple-</p><p>ta o sistema de montagem proposto. A utilização de</p><p>estruturas metálicas em HIS construídas em favelas</p><p>não é novidade e tem se mostrado bastante eficaz,</p><p>na medida em que sua montagem é mais rápida, re-</p><p>duzem o movimento de terra necessário às funda-</p><p>ções e são mais fáceis de transportar. As HIS apre-</p><p>sentadas na figura a seguir foram projetadas pelo</p><p>escritório carioca ARQTRAÇO Projetos Ltda. para as</p><p>favelas Cantagalo e Pavão – Pavãozinho, no Rio de</p><p>Janeiro, e construídas pela OAS.</p><p>21</p><p>Figura 04 - HIS na Favela Pavão-Pavãozinho. Projeto ARQUITRAÇO Projetos Ltda.</p><p>22</p><p>Para contemplar todos esses objetivos, os tipos de</p><p>HIS desenvolvidos durante a pesquisa, além de aten-</p><p>der às necessidades de famílias de diversos tamanhos</p><p>e composições, constituem projetos modulares, de</p><p>forma a possibilitar a máxima utilização de compo-</p><p>nentes industrializados e peças estruturais pré-fabri-</p><p>cadas. Longe da proposta, entretanto,</p><p>a adoção de</p><p>um único repertório e programa arquitetônico, o que</p><p>reproduziria a mesmice dos conjuntos habitacionais,</p><p>limitando as unidades habitacionais a apartamen-</p><p>tos de sala e dois quartos (S2Q). A Figura 5, abaixo,</p><p>demonstra a diversidade dos tipos projetados quan-</p><p>to à sua morfologia.</p><p>Figura 05 – Utilizando-se o mesmo vocabulário arquitetônico e sistema construtivo alcançou-se grande diversidade de forma e escala nos tipos projetados, fugindo da mesmice dos</p><p>empreendimentos do MCMV.</p><p>O caráter prospectivo da pesquisa levou a equipe</p><p>da UFRJ a seguir duas orientações metodológicas.</p><p>A primeira, como visto anteriormente, consistiu na</p><p>decisão de adotar um cenário real para contextua-</p><p>lizar os tipos de HIS projetadas, inserindo-as numa</p><p>estrutura urbana existente, a Área de Intervenção</p><p>2 (AI2) na favela da Rocinha. Essa escolha revelou</p><p>um território extremamente complexo, tanto do</p><p>ponto de vista topográfico, como de sua estrutura</p><p>viária, constituída por uma via principal (a Estrada</p><p>da Gávea) e um emaranhado de becos e travessas</p><p>que impõem aos moradores condições de mobili-</p><p>dade precárias.</p><p>A segunda orientação foi a de não condicionar os</p><p>projetos dos tipos de HIS aos parâmetros estabele-</p><p>cidos pelo Ministério das Cidades e adotados pela</p><p>CEF para o PMCMV, nem atender integralmente à</p><p>legislação urbanística do Rio de Janeiro.</p><p>Agindo dessa forma, pretendeu-se que a pesquisa,</p><p>livre dessas amarras, pudesse, eventualmente,</p><p>contribuir para a revisão de alguns critérios</p><p>adotados pelo programa MCMV, assim como de</p><p>algumas exigências da Legislação em vigor.</p><p>2 UMA SÍNTESE DO PLANO DIRETOR</p><p>SOCIOESPACIAL DA ROCINHA (2005 / 2007)</p><p>25</p><p>Figura 06 - A Rocinha vista de São Conrado</p><p>A Rocinha, maior favela da Zona Sul da Cidade</p><p>do Rio de Janeiro, localizada entre São Conrado e</p><p>Gávea, bairros habitados por populações de alta</p><p>renda, viveu entre os anos de 2004 e 2007 um</p><p>momento especial em sua histórica resistência às</p><p>tentativas de remoção: a elaboração do seu Plano</p><p>Diretor Sócioespacial.</p><p>Para os moradores, permanentemente ameaçados</p><p>pelas remoções, o plano representava uma aposta</p><p>no futuro, um sinal de que o Governo do Estado,</p><p>na ausência da Prefeitura, chamara a si a tarefa de</p><p>transformar a Rocinha num bairro de fato e não</p><p>apenas de direito.</p><p>Recuperar aspectos desse trabalho e o muito que se</p><p>aprendeu com ele, revela que várias ideias e princípios</p><p>desenvolvidos durante a pesquisa nasceram dessa</p><p>experiência, que contou com intensa participação</p><p>da população e que proporcionou um permanente</p><p>aprendizado, durante os dois anos de convívio com</p><p>os moradores nas associações de bairro, escolas e</p><p>igrejas e no escritório técnico da equipe situado no</p><p>interior da favela.</p><p>O caráter emblemático da Rocinha, os profundos</p><p>contrastes em relação aos bairros vizinhos, a</p><p>relevância de fatos que antecederam ao inicio do</p><p>plano e a forma singular com que foi elaborado,</p><p>além das próprias características topográficas do</p><p>sitio onde se localiza, auxiliaram na decisão de sua</p><p>escolha como cenário da pesquisa.</p><p>O processo que deu origem ao plano diretor teve a</p><p>particularidade de ter sido conduzido pela sociedade</p><p>organizada sem a participação de nenhum nível de</p><p>governo. A intenção de elaborá-lo foi manifestada,</p><p>pela primeira vez, durante o Fórum Técnico de</p><p>Urbanização da Rocinha do qual participaram as</p><p>três associações de moradores da Rocinha (UPMMR,</p><p>AMABB E LABORIAUX), a Associação de Moradores</p><p>da Comunidade Parque da Cidade, a AMASCO</p><p>– Associação de Moradores de São Conrado, a</p><p>AMALGA – Associação de Moradores da Gávea, a</p><p>Câmara Comunitária da Barra, a AMALEBLON, a</p><p>PUC-RJ, a EARJ-Escola Americana do Rio de Janeiro,</p><p>o IAB-RJ, a FIRJAN e a OAB-RJ.</p><p>O Fórum foi criado em maio de 2004, logo após o</p><p>surto de violência na Páscoa daquele ano que atin-</p><p>giu diretamente a Rocinha, o Vidigal e o bairro de</p><p>São Conrado. Seus participantes, embora defenden-</p><p>do interesses nem sempre comuns e por vezes anta-</p><p>gônicos, conseguiram chegar a um consenso: todos</p><p>acreditavam no futuro da Rocinha, desde que este</p><p>incorporasse tanto a infraestrutura quanto os servi-</p><p>ços da cidade formal, respeitando as especificidades</p><p>da Rocinha e a criatividade de sua população.</p><p>Para atender as reivindicações do Fórum a Secretaria</p><p>Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Ur-</p><p>bano (SEMADUR) decidiu contratar um plano diretor</p><p>para a comunidade através de um Concurso Nacional</p><p>de Ideias para Urbanização do Complexo da Rocinha,</p><p>26</p><p>Figura 07- Favela da Rocinha - edificações no Largo</p><p>do Boiadeiro</p><p>organizado pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil-RJ</p><p>(IAB-RJ). Lançado no final de outubro de 2005 e</p><p>contando com um representante da Rocinha, foi</p><p>formada a nossa equipe, com cerca de trinta téc-</p><p>nicos e moradores, a qual se sagrou vencedora no</p><p>concurso, com uma proposta cuja linha mestra era</p><p>a participação.</p><p>A metodologia utilizada enfatizava o diálogo</p><p>permanente com a população, incorporando ao</p><p>conhecimento técnico os saberes da comunidade</p><p>que, aplicada desde a fase de concurso, conferiu</p><p>grande consistência às propostas formuladas e,</p><p>provavelmente, constituiu o principal motivo para</p><p>a vitória.</p><p>Destaque-se que o êxito na aplicação dessa</p><p>metodologia não pode ser creditado somente</p><p>ao empenho da equipe e sim dividido com os</p><p>moradores, cujo interesse pelo trabalho facilitou</p><p>sua divulgação e, sobretudo, a discussão de todas</p><p>as suas etapas, destacando-se nesse esforço as</p><p>três associações de moradores locais e a AMASCO.</p><p>O diagnóstico urbanístico do Plano apontou que a</p><p>excessiva ocupação do solo, a falta de saneamento,</p><p>a má qualidade das edificações e as precárias</p><p>condições de mobilidade existentes eram as</p><p>questões prioritárias a serem enfrentadas, já que</p><p>outros problemas importantes, como a falta de</p><p>equipamentos e serviços públicos de qualidade eram</p><p>supridos, de alguma maneira, pelos bairros mais</p><p>próximos.</p><p>2.1 A ocupação do solo na Rocinha e a carência</p><p>de espaços públicos</p><p>O uso intensivo do solo, decorrente de um</p><p>processo acelerado de ocupação sem nenhum tipo</p><p>de planejamento e controle, deu-se inicialmente</p><p>pela subdivisão dos lotes e pela progressiva</p><p>invasão do espaço reservado ao sistema viário</p><p>de dois parcelamentos irregulares (Loteamento</p><p>Castro Guidon e Cristo Redentor), responsáveis</p><p>por boa parte da estrutura viária hoje existente,</p><p>reduzindo-a a um emaranhado de becos e travessas</p><p>cuja largura, muitas vezes, não chega a um metro.</p><p>Num segundo momento, o crescimento da favela</p><p>deu-se pela expansão de seus limites que passaram</p><p>a ameaçar a integridade da Floresta da Tijuca e a</p><p>ocupar áreas de risco nas encostas e talvegues.</p><p>Sem condições de continuar essa expansão</p><p>horizontal, devido às barreiras naturais existentes,</p><p>iniciou-se um processo acelerado de verticalização</p><p>com a construção de dezenas de edificações</p><p>multifamiliares de quatro a onze pavimentos, em</p><p>geral mal projetadas e construídas e à revelia da</p><p>legislação.</p><p>Em termos urbanísticos a multiplicação dessas</p><p>edificações aumentou ainda mais a densidade po-</p><p>pulacional da Rocinha, produzindo sérios agravos</p><p>à saúde da população reduzindo a ventilação e a</p><p>insolação dos becos e das construções menores.</p><p>A proximidade excessiva das edificações produ-</p><p>ziu situações inimagináveis na cidade dita formal</p><p>como, por exemplo, edificações tão próximas que</p><p>permitem aos moradores um aperto de mão de</p><p>suas janelas.</p><p>Outro grave problema, decorrente do crescimen-</p><p>to sem qualquer planejamento ou orientação, foi a</p><p>ocupação dos espaços públicos necessários a equi-</p><p>pamentos urbanos como escolas, creches, postos</p><p>de saúde ou os destinados à prática do lazer, ou ao</p><p>simples encontro da população.</p><p>2.2 A falta de saneamento</p><p>As condições de saneamento existentes na Rocinha</p><p>podem ser consideradas precárias, tanto no que</p><p>concerne ao abastecimento de água, eliminação de</p><p>esgotos sanitários e águas pluviais, como no que se</p><p>refere ao recolhimento do lixo.</p><p>As redes de esgoto sanitário, além de subdimensio-</p><p>nadas e em péssimos estado de conservação</p><p>não</p><p>atendem a toda a favela e nem mesmo recebem os</p><p>esgotos de boa parte das residências, lançados dire-</p><p>tamente em valas a céu aberto ou nos talvegues, em</p><p>geral entupidos por toneladas de lixo.</p><p>O impacto das condições de saneamento na saúde</p><p>e na qualidade de vida da população é enorme,</p><p>obrigada a conviver com o mau cheiro das valas, com</p><p>a proliferação de roedores e insetos transmissores</p><p>de todo o tipo de doenças. O problema é tão grave</p><p>que transcende à própria Rocinha, comprometendo</p><p>a balneabilidade da Praia de São Conrado.</p><p>27</p><p>Figura 08 – Lixo acumulado nas calçadas</p><p>Figuras 09A e 09B – Rede de distribuição de água e esgoto a céu aberto</p><p>2.3 A má qualidade arquitetônica</p><p>e construtiva das edificações</p><p>Primeiramente cabe uma reflexão quanto à sustenta-</p><p>bilidade das habitações da Rocinha e das favelas em</p><p>geral. Enquanto não passavam de barracos de madei-</p><p>ra e telhados de zinco, aproveitando sobras de obras,</p><p>poderia se considerar que a reciclagem desses mate-</p><p>riais era prática, além de sustentável, compatível com</p><p>os conhecimentos adquiridos pelos moradores que</p><p>trabalhavam na construção civil.</p><p>A simplicidade dessas edificações era perfeitamente</p><p>adequada aos costumes de uma população,</p><p>recém-vinda da zona rural, onde a autoconstrução</p><p>era o único acesso à habitação. Na cidade, esse</p><p>contingente, não só estreitou os laços de vizinhança,</p><p>indispensáveis a sua sobrevivência, mas também</p><p>aprimorou seus conhecimentos trabalhando na</p><p>construção civil, reunindo-se em mutirões para</p><p>erguer suas casas, melhorar os acessos, construir</p><p>espaços públicos e implantar redes de infraestrutura.</p><p>Na medida em que os barracos de madeira deram</p><p>lugar a edificações de alvenaria com muitos pavi-</p><p>mentos, a situação passou a exigir maiores cuida-</p><p>dos estruturais, instalações elétricas e hidráulicas</p><p>complexas, exigidas pelos eletrodomésticos que as</p><p>classes populares passaram a ter acesso. Os conhe-</p><p>cimentos adquiridos na construção civil já não eram</p><p>suficientes para erguer habitações de boa qualidade</p><p>arquitetônica e construtiva.</p><p>A transformação dos barracos de madeira nos “es-</p><p>pigões” que proliferam na Rocinha não foi acompa-</p><p>nhada, como era de se esperar, por boas práticas da</p><p>arquitetura e engenharia. Mesmo nas construções de</p><p>poucos pavimentos são comuns erros de projeto que</p><p>infernizam a vida dos moradores, como escadas com</p><p>degraus irregulares e plantas mal resolvidas, que obri-</p><p>gam a passagem pela cozinha para ir ao banheiro, ou</p><p>ainda circulações extensas que “roubam” espaço dos</p><p>28</p><p>Figuras 10A e 10B – Edificações com problemas construtivos</p><p>cômodos de alta permanência e janelas subdimensio-</p><p>nadas, que ignoram o tamanho dos cômodos que ilu-</p><p>minam e ventilam, produzindo habitações escuras e</p><p>abafadas. A falta de observância às normas de escape</p><p>é outro problema que afeta a segurança da maioria</p><p>das edificações, agravado ainda mais pelo processo</p><p>de verticalização.</p><p>A má qualidade construtiva das edificações se expres-</p><p>sa, não só na ausência de revestimentos nas paredes</p><p>e na impermeabilização adequada das lajes de cober-</p><p>tura, provocando toda sorte de infiltrações, como na</p><p>fata dos projetos de engenharia, comprometendo a</p><p>estabilidade das edificações, ou ao contrário, cons-</p><p>truindo pilares e vigas superdimensionados que en-</p><p>carecem desnecessariamente a construção.</p><p>2.4 As precárias condições de mobilidade</p><p>A avaliação da mobilidade na Rocinha não se limitou</p><p>aos meios de transporte atualmente disponíveis</p><p>para compreender as estratégias dos moradores</p><p>para deslocar-se dentro e fora da comunidade.</p><p>As conclusões dessa avaliação levaram a equipe</p><p>a propor intervenções menos impactantes e</p><p>menos onerosas que algo proposto para outras</p><p>comunidades, como os teleféricos e elevadores</p><p>midiáticos.</p><p>Quem vai à Rocinha se espanta com a movimentação</p><p>dos moradores, os quais disputam com caminhões,</p><p>ônibus, vans, automóveis e motocicletas as pistas</p><p>de rolamento da Estrada da Gávea, da Via Ápia, da</p><p>Rua do Valão e dos trechos carroçáveis da Rua Um e</p><p>da Rua Dois, entre outras.</p><p>Além das poucas calçadas existentes, sempre</p><p>cobertas por montanhas de lixo e obstruídas por</p><p>barreiras de toda a ordem, obrigando os pedestres</p><p>a disputar com os veículos as pistas de rolamento,</p><p>são muito importantes na Rocinha as estratégias</p><p>de circulação dos moradores, já que os ônibus, vans</p><p>e moto-taxis não deixam os passageiros na porta</p><p>de casa, pela impossibilidade de trafegar pelos</p><p>estreitos becos da comunidade.</p><p>Assim, somente a pé, pode-se acessar à maioria das</p><p>edificações, vencendo obstáculos de toda a ordem,</p><p>como as escadarias mal projetadas, impraticáveis</p><p>para os portadores de necessidades especiais.</p><p>Durante meses a equipe estudou esses percursos</p><p>para entender as estratégias de circulação dos</p><p>moradores, seja para ir à escola e às compras, visitar</p><p>os amigos e dirigir-se para o trabalho.</p><p>Só assim tornou-se possível elaborar uma série de</p><p>propostas relativamente simples para melhorar</p><p>as condições de mobilidade na Rocinha, e mais do</p><p>que isso, passar a compreender que os grandes</p><p>problemas urbanísticos da favela (ocupação do solo,</p><p>saneamento, moradias precárias e mobilidade) se</p><p>interrelacionavam, exigindo soluções integradas.</p><p>2.5 Aprendendo com o Plano</p><p>Avaliando os resultados do trabalho, a primeira</p><p>conclusão foi a de que a equipe dificilmente teria</p><p>alcançado o sucesso sem a participação dos mo-</p><p>radores, e que a decisão de desenvolver parte dos</p><p>estudos na própria favela, montando um pequeno</p><p>escritório local, foi fundamental, tanto pela imersão</p><p>dos técnicos no campo de estudo, quanto pelo con-</p><p>tato diário com os moradores.</p><p>Ficou evidenciado que os problemas da excessiva</p><p>ocupação do solo, da falta de saneamento, da má</p><p>qualidade projetual e construtiva das edificações e</p><p>das péssimas condições de mobilidade não poderiam</p><p>ser solucionados, nem mesmo compreendidos, se</p><p>fossem tratados isoladamente, levando o planejador</p><p>a adotar soluções integradas.</p><p>Proposições com baixo nível de integração pode-</p><p>riam, até mesmo, criar problemas maiores: tentar</p><p>29</p><p>melhorar a mobilidade alargando os becos, sem</p><p>considerar a excessiva ocupação do solo na Roci-</p><p>nha e as estratégias de circulação dos moradores,</p><p>exigiria remoções desnecessárias e a construção de</p><p>viadutos e muros de arrimo, com um enorme custo</p><p>social, urbanístico e econômico.</p><p>Figura 11- Espigões da Rocinha</p><p>Figura 12 - Mobilidade na Rocinha</p><p>a um segundo plano o complexo e delicado tecido</p><p>viário da favela, assim como as atividades comerciais,</p><p>culturais e sociais que nele se desenvolvem.</p><p>As propostas do Plano Sócioespacial da Rocinha</p><p>revelam a preocupação da equipe em solucionar</p><p>os problemas locais a partir de medidas, sempre</p><p>discutidas com os moradores, que guardam entre si</p><p>um alto grau de integração.</p><p>Entender a complexidade de uma favela do</p><p>tamanho da Rocinha, com uma população de mais</p><p>de cem mil habitantes, não teria sido possível sem o</p><p>permanente diálogo com a população e sem que a</p><p>equipe, convivendo com o dia a dia da comunidade,</p><p>adquirisse uma nova maneira de olhar os problemas</p><p>e potencialidades existentes, olhar que identificou</p><p>os componentes da equipe como técnicos e pessoas.</p><p>2.6 As principais propostas do Plano</p><p>Sócioespacial da Rocinha</p><p>O Plano Sócioespacial da Rocinha foi concebido</p><p>para ser implantado ao longo de dez anos. Contá-</p><p>vamos, na época, que a Prefeitura, até então total-</p><p>mente afastada do processo conduzido pelo gover-</p><p>no estadual, assumisse o Plano, incorporando-o à</p><p>legislação municipal através de um Projeto de Es-</p><p>truturação Urbana, o PEU da Rocinha. Infelizmente</p><p>isso não se realizou até o momento, embora outro</p><p>fato, tão importante quanto, tenha ocorrido: a</p><p>transformação das propostas do Plano numa ban-</p><p>deira de luta dos moradores da Rocinha, na busca</p><p>pelos seus direitos.</p><p>A relação de propostas a seguir não esgota todas</p><p>as ações recomendadas no plano que abrange pro-</p><p>postas para as áreas da saúde, educação, desenvol-</p><p>vimento social, econômico e cultural, esporte, lazer</p><p>e meio ambiente. As</p><p>propostas abaixo foram sele-</p><p>cionadas por guardarem uma forte relação com as</p><p>Outro exemplo de solução com baixo nível de</p><p>integração é a recente prática de dotar as favelas de</p><p>sistemas de teleféricos para melhorar as condições</p><p>de mobilidade. Além dos altos custos de importação</p><p>desses equipamentos e das obras necessárias à sua</p><p>implantação, ao se adotar esse sistema relega-se</p><p>30</p><p>conclusões e produtos desta pesquisa. Algumas fo-</p><p>ram implantadas pelo PAC1, infelizmente sem obede-</p><p>cer às prioridades estabelecidas; outras deverão ser</p><p>implantadas pelo PAC2, cujos projetos estão sendo</p><p>detalhados nesse momento.</p><p>• Em relação à questão da excessiva ocupação</p><p>do solo, a principal proposta do plano foi usar</p><p>a verticalização como um fator de liberação</p><p>de espaços para uso público, revertendo os</p><p>danos que o atual processo especulativo de</p><p>verticalização tem criado.</p><p>Crescer em altura, aproveitando as características</p><p>topográficas da Rocinha, pode se transformar</p><p>num importante instrumento de liberação do</p><p>solo para atividades de recreação, implantação</p><p>de equipamentos urbanos, comércio etc, desde</p><p>que não seja acompanhado pelo aumento da taxa</p><p>de ocupação do solo.</p><p>• Quanto à falta de saneamento básico o plano</p><p>recomendou que a rede de esgotos existente</p><p>na Rocinha fosse completada e refeita, quando</p><p>necessário, de forma a atender a toda a população,</p><p>incluindo a ligação de todas as edificações à rede,</p><p>sem o que os esgotos continuarão a ser lançados</p><p>diretamente nas valas ou a escorrer pelos becos</p><p>da favela.</p><p>Em relação à rede de águas pluviais a principal</p><p>proposta do plano foi a liberação dos talvegues</p><p>das edificações construídas sobre eles, de forma a</p><p>possibilitar o recolhimento do lixo neles lançados,</p><p>transformando-os em caminhos que criarão</p><p>novas alternativas de mobilidade na favela,</p><p>Figura 13 - Palestras e conversas com os moradores no escritório local</p><p>incluindo a implantação de planos inclinados e</p><p>escadas drenantes.</p><p>Quanto ao abastecimento de água foi proposta a</p><p>complementação da rede e recuperação de sua</p><p>eficiência através do redimensionamento dos</p><p>sistemas de reservação e bombeamento.</p><p>A questão do lixo, considerada prioritária,</p><p>levou a equipe a elaborar um Plano Diretor de</p><p>Recolhimento e Reciclagem do Lixo. O plano,</p><p>amplamente discutido com a população e com a</p><p>equipe da COMLURB que recolhia o lixo na favela,</p><p>dimensionava o número e definia a localização</p><p>de compactadores e projetava instalações para</p><p>reciclagem de parte do lixo coletado, além de</p><p>dimensionar o número de garis comunitários a</p><p>serem empregados na coleta.</p><p>31</p><p>• Em relação à questão habitacional a principal</p><p>proposta do plano foi a implantação, na favela,</p><p>de uma fábrica de argamassa armada para a fa-</p><p>bricação das lajes e painéis de fechamento das</p><p>fachadas das HIS. Os pilares e vigas seriam metá-</p><p>licos buscando, além do rigor construtivo e a eli-</p><p>minação de desperdícios, a rapidez da montagem</p><p>e a diminuição do movimento de terra necessá-</p><p>rio às fundações. O pavimento térreo, em pilotis,</p><p>criaria espaços públicos de que a Rocinha tanto</p><p>necessita, além de “galerias” que funcionariam</p><p>como calçadas cobertas, sem a necessidade de</p><p>alargar em demasia o sistema viário. Circulações</p><p>verticais destacadas do corpo principal dessas</p><p>edificações poderiam ser usadas tanto pelos mo-</p><p>radores, para acessar seus apartamentos, como</p><p>Figura 14 - Centro esportivo e alargamento da Rua 4</p><p>pela população, criando trajetos alternativos que</p><p>melhorariam as atuais condições de mobilidade.</p><p>• A questão da mobilidade foi tratada através de</p><p>propostas que, na medida do possível, minimiza-</p><p>vam a necessidade de desapropriações e o custo</p><p>de implantação, abrangendo melhorias no tecido</p><p>viário existente, consolidando os trajetos mais</p><p>utilizados pela população, interligando outros e</p><p>requalificando a Estrada da Gávea em toda sua</p><p>extensão, incluindo a construção de um binário a</p><p>partir da Curva do S de forma a resolver o princi-</p><p>pal ponto de conflito da estrada.</p><p>Além dessas intervenções destaque-se o alar-</p><p>gamento da Rua 4 para desafogar a Estrada da</p><p>Gávea e urbanizar uma das áreas mais insalubres</p><p>da comunidade. A interligação da Rua 2 com a</p><p>Rua do valão, por meio de um plano inclinado, as-</p><p>sim como a implantação de um sistema compos-</p><p>to por cinco planos inclinados estrategicamente</p><p>localizados, o que possibilitará aos moradores o</p><p>deslocamento da Gávea até São Conrado, à pé,</p><p>vencendo assim os trechos mais difíceis.</p><p>Essas propostas primam pela simplicidade e pelo</p><p>baixo custo quando comparadas aos teleféricos</p><p>implantados em outras comunidades. Além dis-</p><p>so, potencializam estratégias de mobilidade já</p><p>utilizadas, tornando-as mais rápidas, mais confor-</p><p>táveis e seguras.</p><p>32</p><p>Figura 15 – Mapa geral da Rocinha com o resumo das propostas</p><p>33</p><p>Figura 16 - Propostas para a AI2</p><p>3 A PESQUISA</p><p>37</p><p>Figura 17 – Localização da AI2</p><p>Na divisão dos trabalhos de pesquisa entre as</p><p>equipes integrantes da Rede FINEP coube à da UFRJ,</p><p>desenvolver um marco teórico (Meta 2.1 - Definição</p><p>de um marco teórico-analítico aplicável à implantação</p><p>de TS em HIS) e um estudo tipológico (Meta 3.3 -</p><p>Tipologia e Tipos - estudo de tipos apropriados a</p><p>habitações evolutivas e inserção urbana de interesse</p><p>social). As atividades, conclusões e produtos aqui</p><p>apresentados referem-se aos itens 3.3.8 – Formulação</p><p>de anteprojetos de arquitetura dos tipos alternativos</p><p>e 3.3.9 - Definição e especificação de processos</p><p>construtivos adequados aos tipos propostos e aos</p><p>sistemas de TS da Meta 3.3, a cargo do núcleo de</p><p>pesquisa do IPPUR LabHab24TS.</p><p>As atividades do núcleo de pesquisa podem ser divi-</p><p>didas em quatro etapas, a saber:</p><p>• Conceituação, definição de parâmetros e aborda-</p><p>gens projetuais;</p><p>• Desenvolvimento de um vocabulário arquitetônico;</p><p>• Elaboração de estudos preliminares de arquitetu-</p><p>ra de quatorze tipos de HIS;</p><p>• Proposição de um sistema construtivo baseado</p><p>na montagem de componentes industrializados.</p><p>Embora a pesquisa tenha se desenvolvido no plano</p><p>teórico, os tipos foram testados em um cenário</p><p>real, com limitações topográficas e contextuais.</p><p>O cenário escolhido foi a favela da Rocinha, mais</p><p>precisamente, a Área de Intervenção 2 (AI2),</p><p>delimitada pelo Plano Diretor Sócioespacial.</p><p>A localização da AI2 numa encosta e a intensa</p><p>ocupação e verticalização da área formaram um</p><p>cenário ideal para testar os tipos projetados quanto</p><p>à capacidade de adaptação à topografia e de criar</p><p>os espaços públicos que a Rocinha necessita. Outro</p><p>fator que pesou na escolha deste cenário foi a</p><p>existência de um diagnóstico detalhado da área e</p><p>seu levantamento topográfico.</p><p>Fo</p><p>to</p><p>: J</p><p>úl</p><p>io</p><p>F</p><p>er</p><p>re</p><p>ti</p><p>38</p><p>Figura 18 – Blocos interligados por escadas e passarelas</p><p>3.1 O papel das HIS na organização e produção</p><p>de espaços públicos</p><p>A equipe adotou como premissa que as HIS podem</p><p>desempenhar um papel relevante na organização es-</p><p>pacial de áreas urbanas ocupadas sem planejamento</p><p>e à revelia das normas urbanísticas, como as favelas,</p><p>loteamentos irregulares, e em áreas degradadas das</p><p>periferias e no centro da cidade.</p><p>Trata-se de ampliar a funções das HIS que, além de</p><p>atender à função social de dar moradia de qualidade</p><p>à população, também passariam a requalificar o</p><p>espaço urbano, combatendo à ocupação excessiva</p><p>do solo, melhorando as condições de mobilidade e</p><p>criando novos espaços públicos.</p><p>Os tipos propostos procuram resolver questões</p><p>urbanísticas cruciais como a ocupação excessiva</p><p>do solo, a falta de espaços públicos, a inadequação</p><p>das construções à topografia e à drenagem</p><p>pluvial, as péssimas condições de acessibilidade e</p><p>mobilidade.</p><p>Para atender às especificidades de cada tipo de</p><p>família foram estudados programas arquitetônicos</p><p>que variam de pequenos conjugados, a unidades</p><p>habitacionais com até quatro quartos, assim</p><p>como programas que preveem o uso misto (uso</p><p>habitacional, comercial e prestação de serviços).</p><p>3.2 Parâmetros e indicadores</p><p>Abrir espaço no tecido complexo e denso de uma</p><p>favela para inserção de novas habitações e, ao</p><p>mesmo tempo, criar novos espaços públicos sem</p><p>ferir as pré-existências, não é tarefa fácil. Sem</p><p>uma abordagem inovadora e sem um esforço para</p><p>compreender, em toda a sua complexidade, o</p><p>processo de ocupação que deu origem ao tecido</p><p>urbano, pouco se pode fazer. Só uma imersão</p><p>no cenário da pesquisa e muita conversa com a</p><p>população possibilita abordagens projetuais que</p><p>dialoguem com os saberes e hábitos da população.</p><p>Neste sentido, a pesquisa contou com os dados</p><p>e com a vivência do arquiteto Luiz Carlos Toledo,</p><p>adquirida durante a elaboração do Plano Diretor</p><p>Sócioespacial da Rocinha (2005-2007).</p><p>3.2.1 Verticalização, densidade e ocupação do solo</p><p>As favelas mais densas são constituídas por uma</p><p>massa de edificações, geralmente de um a dois</p><p>pavimentos e por número menor de unidades com</p><p>três a quatro pavimentos, colados uns aos outros,</p><p>dotados de pequenos apartamentos onde, não</p><p>raro, residem mais de uma família.</p><p>Na Rocinha o processo de ocupação do solo e de</p><p>verticalização foi muito mais intenso, predominando</p><p>39</p><p>Figura 19 - Rua 4 antes e depois do alargamento</p><p>edificações de três a quatro pavimentos e a</p><p>presença de inúmeras edificações com seis, sete,</p><p>nove pavimentos e, até mesmo, um prédio com 11</p><p>andares.</p><p>As edificações, coladas umas às outras, são</p><p>acessadas por um emaranhado de becos e travessas</p><p>tão estreitas que não permitem a passagem de</p><p>viaturas, salvo as motos e bicicletas. Nessas vielas</p><p>onde o sol e o vento não conseguem penetrar, o</p><p>lixo se acumula e a umidade sobe pelas paredes dos</p><p>prédios, causando uma infinidade de doenças como</p><p>a tuberculose, verminoses e as alergias.</p><p>As edificações da AI2 formam uma sólida massa</p><p>construída, por vezes impenetrável, com índices de</p><p>permeabilidade baixos e prédios que crescem uns</p><p>sobre os outros, criando situações em que os becos</p><p>viram verdadeiros túneis. As edificações existentes</p><p>variam de um a sete pavimentos, predominando as</p><p>de três e quatro andares.</p><p>Para avaliar os problemas causados pela elevada</p><p>ocupação do solo na Rocinha, procedeu-se,</p><p>primeiramente, à comparação entre a taxa de</p><p>ocupação da AI2 e as de três áreas da cidade com</p><p>morfologias distintas: Barra da Tijuca, Copacabana</p><p>e Santa Teresa.</p><p>Para esse estudo, considerou-se como “área de</p><p>domínio público” o somatório das áreas de ruas,</p><p>passeios, praças e demais espaços livres de uso</p><p>público, e “área edificada” o somatório da projeção</p><p>das edificações.</p><p>A Figura 20, mostra como é intensa a ocupação</p><p>do solo na Rocinha, mesmo quando comparada</p><p>à de Copacabana, bairro que tem uma das mais</p><p>elevadas taxas de ocupação do solo da Cidade</p><p>do Rio de Janeiro. No bairro de Santa Teresa, cuja</p><p>porcentagem de domínio público é próxima à da</p><p>favela, a área edificada é muito inferior. Ou seja,</p><p>em Santa Teresa, as áreas livres localizam-se dentro</p><p>dos lotes, compensando, em parte, a ausência de</p><p>espaços públicos.</p><p>Se a densidade média da Rocinha de 392 habitantes</p><p>por hectare já é alta, o que dizer da densidade da AI2</p><p>que chega a 1.012 habitantes por hectare? De fato,</p><p>esta é uma das áreas mais densas da Rocinha, o que</p><p>se explica por sua localização privilegiada e por ter</p><p>sido uma das primeiras áreas da favela a ser ocupada.</p><p>A excessiva ocupação do solo nas favelas pode</p><p>ser combatida pela verticalização, desde que esse</p><p>processo seja planejado e contribua para a liberação</p><p>de áreas para uso de todos os moradores.</p><p>O conjunto de gráficos ao lado mostra o impacto</p><p>da verticalização na liberação de áreas públicas.</p><p>Neles considerou-se o número de habitantes da AI2</p><p>distribuídos, primeiramente, em edificações com 3,2</p><p>pavimentos (média encontrada na área). Elevando-</p><p>se o numero de pavimentos sucessivamente para</p><p>5, 7 e até 10 pavimentos, mantendo-se o número</p><p>de habitantes, os gráficos mostram o percentual de</p><p>solo liberado.</p><p>A Figura 22 demonstra o impacto da verticalização</p><p>na formação de áreas livres se a atual média de 3,15</p><p>pavimentos encontrada na Rocinha crescesse até 10</p><p>pavimentos sem aumento da população.</p><p>A figura 23 ilustra a variação da taxa de ocupação à</p><p>medida que o número de pavimentos das edificações</p><p>aumenta, tendo como cenário uma área da favela da</p><p>Rocinha. O primeiro desenho da série representa a si-</p><p>tuação atual da AI2, o número médio de pavimentos</p><p>das edificações (3,15 pavimentos) e a taxa de ocupa-</p><p>ção do solo (66,4%). Nas ilustrações seguintes perce-</p><p>be-se que à medida que o número de pavimentos au-</p><p>menta, a taxa de ocupação do solo diminui.</p><p>3.2.2 Os módulos pesquisados</p><p>A adoção de uma arquitetura modular conferiu</p><p>aos tipos estudados um alto grau de flexibilidade</p><p>programática e construtiva, permitindo plantas</p><p>variadas numa mesma edificação e facilitando a</p><p>incorporação de componentes industrializados às</p><p>HIS, sejam eles estruturais (pilares, vigas e lajes),</p><p>painéis de fachada, paredes, entre outros.</p><p>40</p><p>Figura 20 – Edificações da AI-2 segundo o nº de pavimentos</p><p>41</p><p>Figura 21 – Ocupação do solo – estudos comparativos da taxa de ocupação da AI2 com a ocupação das quadras na cidade formal</p><p>42</p><p>Figura 22 – Impacto da verticalização na ocupação do solo</p><p>na Rocinha</p><p>Figura 23 – Verticalização x densidade</p><p>Adotou-se em um primeiro momento o módulo de</p><p>6,0 x 6,0m para unidades habitacionais a partir de</p><p>um pequeno apartamento conjugado de 18m²,até</p><p>uma unidade de sala e três quartos com 54m², como</p><p>mostra a figura 25.</p><p>Com a evolução da pesquisa, o módulo de 6 x 6</p><p>foi descartado, por gerar espaços internos muito</p><p>pequenos, recomendando a adoção, na maior parte</p><p>dos projetos, de módulos estruturais de 7,5 x 7,5 e</p><p>7,5 x 4,5, com sub-módulos de 1,50m.</p><p>3.2.3 Estudo morfológico</p><p>Esse estudo teve por objetivo examinar o impacto</p><p>de diferentes arranjos morfológicos na área total</p><p>de edificação (ATE) e no número de moradores,</p><p>considerando-se edificações apartamentos de dois</p><p>quartos e o módulo de 6x6m.</p><p>3.2.4 Análise das declividades da AI2</p><p>A topografia da AI2 é muito movimentada, possuin-</p><p>do áreas planas e encostas com 45º de declividade. A</p><p>análise permitiu localizar as HIS e selecionar os tipos</p><p>mais adequados a cada situação. Serviu também para</p><p>avaliar a dificuldade de deslocamento dos moradores</p><p>e a importância de criar trajetos alternativos, aprovei-</p><p>tando as circulações verticais (escadas e elevadores) e</p><p>horizontais (corredores) das edificações.</p><p>3.3 Critérios de intervenção</p><p>Um dos desafios dos projetos de urbanização em</p><p>favelas é equilibrar intervenções de pequena escala,</p><p>que evitam cirurgias urbanas de custos sociais e</p><p>econômicos elevados, com intervenções de maior</p><p>porte para corrigir problemas estruturais.</p><p>43</p><p>No caso da Rocinha o combate à elevada ocupação</p><p>do solo é fundamental, priorizando-se à liberação dos</p><p>talvegues e áreas de risco, à criação de espaços públi-</p><p>cos, à urbanização dos becos, com a implantação da</p><p>infraestrutura de saneamento e garantindo a ilumina-</p><p>ção e ventilação naturais às edificações e, sempre que</p><p>possível, alargando e abrindo vias carroçáveis.</p><p>A construção de HIS pode assumir um papel es-</p><p>tratégico na consecução desse objetivo, desde</p><p>que projeto e implantação se desenvolvam em</p><p>perfeita integração com o projeto urbanístico e</p><p>de infraestrutura. Para situar melhor a questão</p><p>convém, primeiramente, caracterizar as macro e</p><p>as microintervenções.</p><p>As macrointervenções caracterizam-se por impac-</p><p>tarem a totalidade ou a maior parte da favela, impli-</p><p>cando em um grande número de desapropriações.</p><p>Fazem parte desse grupo a aberturas de novas ruas,</p><p>o alargamento de vias estruturais, a implantação de</p><p>teleféricos e sistemas de infraestrutura.</p><p>Em geral, os tipos de HIS com maior número de pavi-</p><p>mentos e de unidades habitacionais são os mais ade-</p><p>quados para complementar as macrointervenções,</p><p>de forma a aproveitar ao máximo os investimentos</p><p>elevados dessa escala de intervenção.</p><p>As microintervenções se caracterizam por atuarem</p><p>na requalificação de áreas menores, respeitando</p><p>as pré-existências e reduzindo a necessidade de</p><p>desapropriações.</p><p>Têm por objetivo melhorar o</p><p>acesso ao interior das quadras, garantir a ventilação</p><p>e a iluminação dos becos e edificações.</p><p>Os tipos de HIS adequados às microintervenções</p><p>não devem ultrapassar os quatro pavimentos, sem-</p><p>pre respeitando a morfologia das edificações exis-</p><p>tentes, como mostrado na figura a seguir.</p><p>3.4. Estudo do processo de remoção de unidades</p><p>existentes e inserção de novas tipologias</p><p>e sua aplicação na criação de espaços públicos</p><p>e aumento da mobilidade.</p><p>Cabe lembrar que lançar mão somente das macro</p><p>ou das microintervenções não é a melhor maneira</p><p>para abrigar as famílias que terão de ser removi-</p><p>das das áreas de risco ou em habitações condena-</p><p>das por sua precariedade. A combinação dessas</p><p>duas escalas de intervenção, em geral traz me-</p><p>lhores resultados dos pontos de vista qualitativo</p><p>e quantitativo, pois, ainda que as microinterven-</p><p>ções tenham um menor impacto no tecido urba-</p><p>no, as macrointervenções são essenciais para</p><p>garantir a oferta de um número de unidades capaz</p><p>de atender todas as famílias que tiveram suas</p><p>casas desapropriadas, evitando a necessidade de</p><p>remoções.</p><p>A inserção dos tipos projetados na área de estudo obe-</p><p>deceu a um conjunto de critérios urbanísticos, a saber:</p><p>a) Liberação dos talvegues hoje totalmente ocupa-</p><p>dos por edificações;</p><p>b) Desocupação das áreas de risco e de proteção</p><p>ambiental;</p><p>c) Estabelecimento de larguras mínimas para os be-</p><p>cos e travessas, sempre que possível, consolidando</p><p>os percursos originais;</p><p>d) Criação de espaços públicos e melhoria das condi-</p><p>ções de mobilidade.</p><p>3.5 Cenários de implantação das HIS na AI2</p><p>Para a AI2, foram desenvolvidos diversos cenários</p><p>com o objetivo de estudar a relação entre o número</p><p>de unidades removidas para implantar as novas HIS</p><p>e o número de unidades a serem criadas, tendo por</p><p>variável o número de pavimentos das edificações.</p><p>3.5.1 Cenário adotado</p><p>A escolha do cenário levou em conta, além dos crité-</p><p>rios urbanísticos anteriormente relacionados, a to-</p><p>pografia da AI2, variável que influiu diretamente na</p><p>seleção do tipo mais adequado a cada terreno.</p><p>44</p><p>Figura 24 – Arranjos morfológicos</p><p>45</p><p>Figura 25 – Layouts com módulos de 6x6 m</p><p>46</p><p>Figura 27 – Mapa de declividadesFigura 26 – Módulos utilizados nas HIS</p><p>Figura 28 – Etapas de uma de uma micro intervenção</p><p>47</p><p>Figura 29– Cenários de intervenção</p><p>48</p><p>49</p><p>50</p><p>51</p><p>52</p><p>53</p><p>54</p><p>Figura 30 – Localização dos tipos projetados</p><p>Unidades existentes 4627</p><p>Unidades relocadas 889</p><p>Unidades criadas 956</p><p>4 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS PROJETADOS</p><p>57</p><p>Figura 31 – Espaços públicos criados</p><p>Os quatorze tipos arquitetônicos desenvolvidos</p><p>durante a elaboração da pesquisa têm como um</p><p>dos seus objetivos criar uma tipologia que mostre</p><p>ser possível produzir HIS que atendam às necessi-</p><p>dades específicas das famílias que nelas irão morar,</p><p>com a qualidade projetual e construtiva desejável</p><p>para essas edificações. Pretendem ainda contribuir</p><p>para o permanente processo de aperfeiçoamento</p><p>do programa MCMV levado a efeito pelo Ministério</p><p>das Cidades.</p><p>No âmbito da pesquisa, os tipos projetados foram</p><p>implantados na Rocinha, uma favela caracterizada</p><p>por altas taxas de ocupação do solo, precárias</p><p>condições de mobilidade, edificações em áreas de</p><p>risco, habitações inadequadas do ponto de vista</p><p>funcional e construtivo, infraestrutura precária e</p><p>meio ambiente degradado.</p><p>Apesar desse recorte, todos os tipos estudados</p><p>podem ser implantados na chamada “cidade formal”,</p><p>ocupando vazios urbanos ou, em glebas maiores,</p><p>formando conjuntos habitacionais diversificados,</p><p>evitando a monotonia típica desses grupamentos.</p><p>Ao projetá-los, a equipe buscou dar a maior flexibili-</p><p>dade possível à unidade habitacional, permitindo ao</p><p>58</p><p>morador modificá-la e, até mesmo, ampliá-la, adap-</p><p>tando-a ao crescimento da família ou criando espa-</p><p>ços para o desenvolvimento de atividades econômi-</p><p>cas que complementem a renda familiar.</p><p>Outro objetivo perseguido pela equipe foi criar HIS</p><p>que contribuíssem para qualificar o espaço urbano,</p><p>melhorar a mobilidade/acessibilidade, criar espaços</p><p>de uso público e causar o menor impacto ambiental</p><p>possível durante a construção.</p><p>4.1 Tipos que criam espaços públicos e melhoram</p><p>a mobilidade e acessibilidade</p><p>Os moradores de favelas, principalmente das</p><p>excessivamente densas, sofrem com a falta de</p><p>espaços públicos e com a dificuldade de cami-</p><p>nhar por travessas e becos estreitos, tortuosos,</p><p>com pisos esburacados, escadarias irregula-</p><p>res e outras barreiras físicas. Esses problemas</p><p>são agravados pela falta de acessos adequa-</p><p>Figura 32 – Exemplo de variação</p><p>de metragem e layouts</p><p>dos às edificações, principalmente para os</p><p>idosos e portadores de necessidades especiais</p><p>(PNE).</p><p>Nessas favelas, a carência de praças, largos e</p><p>quadras onde os moradores possam se reunir para</p><p>conversar, tomar sol ou para praticar atividades</p><p>culturais, de lazer e esportivas, soma-se à falta de</p><p>insolação e ventilação das moradias, decorrente da</p><p>proximidade excessiva das edificações, não raro,</p><p>com vários pavimentos.</p><p>A visão da proposta é a de utilizar as HIS para</p><p>potencializar ações urbanísticas que tenham como</p><p>objetivo combater esses problemas, ajudando a</p><p>reverter o processo de adensamento, melhorando as</p><p>condições de mobilidade e acessibilidade e criando,</p><p>direta ou indiretamente, novos espaços públicos.</p><p>O Quadro a seguir mostra o impacto da implantação</p><p>de um conjunto de tipos no aumento da área pública</p><p>na AI2 da Favela da Rocinha.</p><p>59</p><p>4.2 Tipos evolutivos que permitem aumentar</p><p>a unidade residencial segundo diretrizes</p><p>projetuais e tecnológicas pré-definidas</p><p>Tais tipos foram projetados, de forma a permitir</p><p>o aumento da área da unidade para adequá-la ao</p><p>crescimento do número de moradores ou para criar</p><p>espaços para atividades produtivas como pequenas</p><p>oficinas, ateliers de costura, salão de cabeleireiro</p><p>etc. A expansão poderá se dar lateralmente,</p><p>ou verticalmente, no primeiro caso ocupando</p><p>um módulo vazio localizado ao lado da unidade</p><p>habitacional, no segundo caso formando um duplex.</p><p>As ampliações previstas estarão a cargo dos</p><p>moradores que as realizarão na medida de suas</p><p>necessidades. Para garantir que as expansões</p><p>sejam realizadas dentro de parâmetros previstos</p><p>no projeto, os proprietários das HIS evolutivas se</p><p>comprometerão em contrato, a fazer as ampliações</p><p>segundo as diretrizes projetuais pré-fixadas,</p><p>contando nesse caso com financiamento para</p><p>compra de materiais e, eventualmente, contratação</p><p>de mão de obra. A Montadora de HIS terá também</p><p>um papel importante, capacitando os próprios</p><p>moradores a fazer a ampliação.</p><p>4.3 Tipos com grande variedade de layouts</p><p>numa mesma edificação</p><p>Atualmente a área máxima das HIS do programa</p><p>MCMV de 42m² é insuficiente para atender às fa-</p><p>mílias maiores. Este problema agravou-se com</p><p>o aumento do poder de compra do salário míni-</p><p>mo, com as políticas de erradicação da pobreza</p><p>e, principalmente, com o acesso ao crédito que,</p><p>permitiu à população mais pobre, adquirir mó-</p><p>veis e eletrodomésticos que, definitivamente,</p><p>não cabem nas salas, quartos e cozinhas mínimas</p><p>das HIS.</p><p>No sentido inverso, famílias com um a dois mem-</p><p>bros podem morar com qualidade em pequenos</p><p>apartamentos conjugados ou de sala e quarto, que</p><p>não são contemplados pela política habitacional vol-</p><p>tada para a baixa renda.</p><p>Na tentativa de dar solução a esses dois problemas</p><p>a equipe projetou HIS que permitem ao futuro</p><p>morador escolher o apartamento mais adequado</p><p>à sua necessidade e capacidade de pagamento.</p><p>Para obter essa flexibilidade apenas as circulações</p><p>comuns e os poços (shafts) de descida das instalações</p><p>hidrossanitárias são fixos, permitindo que, numa</p><p>mesma edificação, possa existir uma grande variedade</p><p>de apartamentos e layouts, comportando unidades</p><p>habitacionais que podem variar de 22m² (apartamento</p><p>conjugado) a 85m² (apartamento de quatro quartos).</p><p>5 VOCABULÁRIO ARQUITETÔNICO</p><p>63</p><p>Projetos modulares facilitam a construção assim</p><p>como a utilização de componentes arquitetônicos</p>