Prévia do material em texto
<p>Polícia Civil do Estado de São Paulo</p><p>Noções de Criminologia</p><p>Conteúdo</p><p>Criminologia: Conceito, métodos, objetos e finalidade da Criminol ogia.</p><p>Criminologia Científica - Biologia, Sociologia e Ps icologia Criminal. Fatores condicionantes</p><p>História do pensamento criminológico.</p><p>Teorias sociológicas da criminalidade.</p><p>Vitimologia.</p><p>O Estado Democrático de Direito.</p><p>Prevenção da Infração Penal.</p><p>Conceito, métodos, objetos e finalidade da Criminol ogia.</p><p>A origem da palavra Criminologia , hibridismo greco-latino, tem a sua criação atribuída a Raffaele</p><p>Garofalo (Itália, 1851-1934), que com ela intitulou sua principal obra. Consta, porém, que tal vocábulo já</p><p>tinha sido empregado anteriormente na França, por Topinard (1830-1911).</p><p>Este vocábulo, a princípio reservado ao estudo do crime, ascendeu à ciência geral da criminalidade,</p><p>antes denominada Sociologia Criminal ou Antropologia Cri minal.</p><p>A criminologia é uma ciência social, filiada à Sociologia, e não uma ciência social independente,</p><p>desorientada. Em relação ao seu objeto – a criminalidade – a criminologia é ciência geral porque cuida</p><p>dela de um modo geral. Em relação a sua posição, a Criminologia é uma ciência particular, porque, no</p><p>seio da Sociologia e sob sua égide, trata, particularmente, da criminalidade.</p><p>A criminologia é a ciência que estuda:</p><p>1- As causas e as concausas da criminalidade e da periculosidade preparatória da criminalidade;</p><p>2- As manifestações e os efeitos da criminalidade e da periculosidade prepara tória da criminalidade e,</p><p>3- A política a opor, assistencialmente, à etiologia da criminalidade e da pericu losidade preparatória da</p><p>criminalidade, suas manifestações e seus efeitos.</p><p>Conceito de Criminologia: A Criminologia é um conjunto de conhecimentos que estudam o fenômeno e</p><p>as causas da criminalidade, a personalidade do delin quente e sua conduta delituosa e a maneira de</p><p>ressocializá-lo. É a definição de Su therland. Ciência que como todas as que abordam algum aspecto da</p><p>criminalidade deve tratar do delito, do delinquente e da pena. Segundo a Unesco, a criminologia se divide</p><p>em geral (sociológica) e clínica.</p><p>Na concepção de Newton Fernandes e Valter Fernandes, criminologia é o “tra tado do Crime”.</p><p>A interdisciplinaridade da criminologia é histórica, bastando, para demonstrar isso, dizer que seus</p><p>fundadores foram um médico (Cesare Lombroso), um jurista sociólogo (Enrico Ferri) e um magistrado</p><p>(Raffaele Garofalo).</p><p>Assim, além de outras, sempre continuam existindo as três correntes: a clínica , a sociológica e a</p><p>jurídica , que, ao nosso ver, antes de buscarem soluções isoladas, devem caminhar unidas e</p><p>Inter-relacionadas.</p><p>A criminologia radical busca esclarecer a relação crime/formação econômico-social, tendo como</p><p>conceitos fundamentais relações de produção e as questões de poder econômico e político. Já a</p><p>criminologia da reação social é definida como uma atividade intelectual que estuda os processos de</p><p>criação das normas penais e das normas sociais que estão relacionados com o comportamento</p><p>desviante.</p><p>O campo de interesse da criminologia organizacional compreende os fenôme nos de formação de leis,</p><p>o da infração às mesmas e os da reação às violações das leis. A criminologia clínica destina-se ao</p><p>estudo dos casos particulares com o fim de estabelecer diagnósticos e prognósticos de tratamento, numa</p><p>identificação entre a delinquência e a doença. Aliás, a própria denominação já nos dá ideia de relação</p><p>médico-paciente.</p><p>O objeto da moderna criminologia é o crime, suas circunstâncias, seu autor, sua vítima e o controle</p><p>social. Deverá ela orientar a política criminal na prevenção especial e direta dos crimes socialmente</p><p>relevantes, na intervenção relativa às suas manifes tações e aos seus efeitos graves para determinados</p><p>indivíduos e famílias. Deverá orientar também a Política social na prevenção geral e indireta das ações e</p><p>omissões que, embora não previstas como crimes, merecem a reprovação máxima.</p><p>Quando nasceu, a criminologia tratava de explicar a origem da delinquência utilizando o método das</p><p>ciências, o esquema causal e explicativo, ou seja, buscava a causa do efeito produzido.</p><p>Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fechar as</p><p>maternidades para o controle da natalidade.</p><p>Academicamente a criminologia começa com a publicação da obra de Cesare Lombroso chamada de</p><p>L´Uomo Delinquente, em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato.</p><p>Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em Rousseau, a criminologia deveria</p><p>procurar a causa do delito na sociedade, baseado em Lom broso, para erradicar o delito deveríamos</p><p>encontrar a eventual causa no próprio de linquente e não no meio. Um extremo que procura as causas de</p><p>toda a criminalidade na sociedade e o outro, organicista, investiga o arquétipo do criminoso nato (um</p><p>delinquente com determinados traços morfológicos). Isoladamente, tanto as tendên cias sociológicas</p><p>quanto às orgânicas fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força</p><p>os estudos de endocrinologia que associam a agressividade do delinquente à testosterona (hormônio</p><p>masculino), os estudos de ge nética ao tentar identificar no genoma humano um possível “gene da</p><p>criminalidade ”, juntamente com os transtornos da violência urbana, de guerra, da forme, etc.</p><p>De qualquer forma, a criminologia transita pelas teorias que buscam analisar o crime , a criminalidade , o</p><p>criminoso e a vítima . Passa pela sociologia , pela psico patologia , psicologia , religião, antropologia ,</p><p>política , enfim, a criminologia habita o universo da ação humana.</p><p>A CRIMINOLOGIA E O COMPORTAMENTO HUMANO</p><p>Um dos aspectos da Criminologia são os distúrbios da personalidade. Dentre os mais frequentes desses</p><p>distúrbios, podemos citar as neuroses, as psicoses, as personalidades psicopáticas e os transtornos da</p><p>sexualidade ou parafilias. Neuroses são estados mentais da pessoa humana, que a conduzem à</p><p>ansiedade, a distúrbios emocionais como: medo, raiva, rancor, sentimentos de culpa. Pode-se afirmar</p><p>que as neuroses são afecções muito difundidas, sem base anatômica conhecida e que, apesar de</p><p>intimamente ligadas à vida psíquica do paciente, não lhe alteram a personalidade como as psicoses, e</p><p>consequentemente se acompanham de consciência penosa e frequentemente excessiva do estado</p><p>mórbido (MARANHÃO, 2004, p. 356). Nessa perspectiva, de acordo com Newton e Valter Fernandes (2002, p.</p><p>213), podemos citar as neuroses obsessivas, caracterizadas pela constante de obsessões, fobias e tiques</p><p>obsessivos, cujas formas de projeção alinham-se à cleptomania, à piromania, ao impulso ao suicídio e ao</p><p>homicídio.</p><p>O termo psicose surgiu para enfatizar as afecções mentais mais graves. As psicoses são conjuntos de</p><p>doenças caracterizadas por distúrbios emocionais do indivíduo e sua relação com a realidade social, com</p><p>o convívio em sociedade. Citamos, dentre outras, a paranoica, a maníaco-depressiva e a carcerária.</p><p>Segundo Genival França (1998, p. 357), “as psicoses paranoicas são transtornos mentais marcados por</p><p>concepções delirantes permitindo manifestações de autofilia e egocentrismo, conservando-se claros</p><p>pensamento, vontade e ações”. Os paranoicos fantasiam, e nos seus delírios relacionam o seu</p><p>bem-estar ou a dor com as pessoas que lhes rodeiam, atribuindo a estas a causa de seu estado. Temos</p><p>por exemplo, a paranoia do ciúme, a de perseguição, a erótica. Seriam paranoicos os assassinos de</p><p>Abraham Lincon, Gandhi, John Lennon e o que atentou contra a vida do Papa João Paulo II (FERNANDES,</p><p>2002, p. 221).</p><p>A psicose maníaco-depressiva, hoje estudada como transtorno bipolar do comportamento, é marcada por</p><p>crises de excitação psicomotora e estado depressivo. A fase maníaca é caracterizada por hiperatividade</p><p>motora e psíquica, com agitação e exaltação da afetividade e do humor. O maníaco não permanece</p><p>quieto, é eufórico. A melancólica ou depressiva caracteriza-se pela inibição ou diminuição das funções</p><p>psíquicas e motoras. O indivíduo apresenta um quadro marcado</p><p>fatores objetivos, convergindo para os sentimentos da infância e seus privilégios, de um lado, e de outro,</p><p>a expectativa ansiosa do futuro, contribuem para o quadro complexíssimo que configura a crise da</p><p>adolescência. Nessa crise, de ação e de expressão, o jovem corre atrás de suas definições: a sexual e a</p><p>de identidade. As expressões fenomenológicas dessa etapa subordinam-se às defesas antidepressivas.</p><p>Nesse jogo defensivo, recorrem à mentira, à má-fé, às identificações projetivas maciças e, mais</p><p>gravemente, às crises de despersonalização. A atividade desses jovens psicopatas, que facilmente caem</p><p>no delito, tanto em casa como na escola, no trabalho, nos locais de diversão, tende a ser</p><p>predominantemente negativa, tanto do ponto de vista da produtividade quanto da ética. Procedem de</p><p>lares carentes de figuras parentais apropriadas para uma boa identificação. São pais de caráter muito</p><p>infantil, desejosos de transformar os filhos em seus protetores, nos diferentes níveis emocionais. O</p><p>resultado de tal relacionamento com os pais é desastroso. Sem modelos maduros, esses jovens são</p><p>capazes de desenvolver as qualidades que levam naturalmente ao equilíbrio adulto. Crescem, se é que</p><p>se pode chamar a isso crescer, na dependência de mecanismos de repressão maciça e de negação dos</p><p>instintos, o que os isola da realidade, incrementando-lhes o narcisismo e as fantasias de onipotência,</p><p>fonte de suas defesas antidepressivas. Como lhes faltam pais para uma relação interpessoal salutar,</p><p>tampouco podem adquirir confiança em si mesmos, o que constitui um pré-requisito indispensável para</p><p>desenvolver o espírito de independência e socialização. É que não puderam tornar próprios, assimilados,</p><p>os controles externos. E mais, para neutralizar a angústia que lhes provoca essa impotência, negam seu</p><p>valor como norma de vida. Tudo isso interfere negativamente na compreensão da realidade, que tentam</p><p>manejar magicamente. O fracasso dessa defesa tem uma das primeiras manifestações na ansiedade</p><p>que lhes provoca a escolha profissional, devido à incapacidade para renunciar. Escolher então assume o</p><p>significado, não de aquisição, mas de perda de algo. Muitas de suas ações agressivas tomam aspectos</p><p>de substitutivos de sintomas psíquicos. Haja vista a esfera de genitalidade. Como a conduta genital se</p><p>expressa em todas as atividades, o fracasso de identidade sexual no psicopata manifesta-se em todos os</p><p>campos da conduta humana.</p><p>A delinquência exprime o distúrbio da personalidade resultante do conflito crônico com os pais, com as</p><p>pessoas que são ou representam autoridades, com a sociedade em geral. O comportamento desses</p><p>indivíduos atesta o fracasso mais flagrante da luta defensiva contra os impulsos, contra as premências</p><p>reivindicantes.</p><p>A pesquisa das raízes do verdadeiro sentido desse distúrbio do existir levou os estudiosos do assunto a</p><p>considerá-lo multidisciplinar, epigenético. Portanto, será um enfoque errôneo pôr demasiada ênfase num</p><p>só fator dominante da personalidade delituosa. As séries complementares do desenvolvimento dos</p><p>indivíduos - instintos, família, costumes comunitários, sistema socioeconômico - todos amalgamados</p><p>determinam vicissitudes de caráter e de conduta dificilmente reversíveis. Temos aí, referidas de relance,</p><p>as ciências básicas do homem: a Biologia, a Psicologia, a Ecologia, a Antropologia, e a Sociologia.</p><p>Quando ocorre uma falha na interação dessas séries complementares, o que pode sobrevir é o</p><p>transtorno no engajamento pessoal, dificultando a colaboração coletiva a favor das transformações do</p><p>ambiente, que se faz através das influências renovadoras. E então o indivíduo - ante a angústia de</p><p>sentir-se ameaçado de marginalização, se a comunidade o abandona impiedosamente à sua imaturidade</p><p>psicológica, deixando-o entregue à indigência de seus recursos naturais de aprendizagem para a vida -</p><p>ou reagirá destrutivamente contra a sua organização comunitária ou se retrairá como unidade social e se</p><p>apagará no autismo. Noutras palavras: ou se extravia no crime, ou se desagrega na psicose.</p><p>CONDICIONANTES SOCIAIS</p><p>Condição Social versus Violência</p><p>Há quem considere a violência uma característica contemporânea, que emana da evolução do homem,</p><p>da globalização, da exclusão e dos diversos níveis sociais.</p><p>Ocorre que a violência, e por consequência a criminalidade, não se encontram restritas a esse ambiente.</p><p>Quem assim pensa só conhece da violência atual das megalópoles, e já se equivoca porquanto desde os</p><p>primórdios a violência acompanha a conduta humana, ou melhor, faz parte da natureza do homem</p><p>independente deste encontrar-se em ambiente urbano ou rural. Naquele sentido, quando falamos de</p><p>violência estaríamos deixando à margem aquela violência do campo onde as contendas são resolvidas</p><p>"na base do facão", porquanto, ademais, não se revestem na degradação lato sensu do homem.</p><p>Como anteriormente citado, alguns homens cometem crimes levados pela influência do meio em que</p><p>vivem. Nesse passo, "condição social" abarca uma gama de características, quais sejam:</p><p>a) condição econômica - renda insuficiente ou inexistente (oportunidade de trabalho);</p><p>b) formação de caráter - estrutura familiar na qual foi criado e na qual vive atualmente, (educação -</p><p>escola / creche);</p><p>c) condições dignas de moradia - habitação com infraestrutura adequada (ser humano);</p><p>d) outras;</p><p>Não podemos olvidar, como consequência da falta de tais "condições mínimas de sobrevivência" a</p><p>precária alimentação do corpo que influi, ademais, na má formação "física, psíquica e biológica" do</p><p>homem, tornando-o "apto", também, a delinquir; cuida-se do louco criminoso que da patologia que possui</p><p>- independente de sua fonte - acarreta o crime.</p><p>Nesta esteira, cumpre-nos examinar:</p><p>A Influência da Educação nos Instintos Criminosos.</p><p>"...a educação não representa senão uma das influencias que atuam nos primeiros anos da vida e que,</p><p>como a hereditariedade e a tradição, contribuem para a gênese do caráter. Mas, uma vez formado, este</p><p>subsiste, como a physionomia physica, perpetuamente aquilo que é. De resto, é ainda duvidoso que um</p><p>instinto moral definitivo possa criar-se pela educação na primeira infância".</p><p>Como se verifica da citação de GAROFALO, a educação não se reveste de critério determinante à</p><p>formação dos criminosos, mas deve ser considerado "um dos" fatores de influência em seu caráter. Vale</p><p>dizer que o fato de um indivíduo possuir uma educação "exemplar" não resta definido seu futuro em face</p><p>do cometimento futuro de crimes.</p><p>Vale sopesar que a educação que faz referência o tópico desde título não se restringe tão somente ao</p><p>sentido pedagógico; trata-se, ademais, de uma série de influências externas, "de cenas continuamente</p><p>vistas" pelas crianças e que são capazes de criar hábitos morais.</p><p>Fazendo um exercício hipotético de realidade, o que podemos esperar de duas crianças (um menino e</p><p>uma menina) que são criados em um lar aonde seu pai, depois de um longo e cansativo dia de</p><p>"vadiagem" chega em casa e prontamente passa a espancar sua esposa, a gritar com seus filhos,</p><p>chegando - não raras vezes a violentá-los.</p><p>- Não é difícil crer que aquele menino vai crescer com a figura de seus pais (ele violento e ela submissa)</p><p>na mente, como uma mancha negra indelével, tendo para si a certeza de que aquele é o papel da esposa</p><p>e do marido no casamento.</p><p>De outra feita, a posição daquela menina frente à sociedade conjugal que um dia possa vir a contrair fica</p><p>desde logo afetada; não se poderá responsabilizá-la pelo medo e submissão da figura masculina que a</p><p>acompanhará para sempre, ademais, caso venha ela a ser violentada pelo futuro marido, nada de novo</p><p>terá tal "bestialidade" posto que na sua concepção de família esta conduta é "legal"; não se cobrará dela</p><p>sequer denunciá-lo.</p><p>"a educação doméstica é uma continuação da herança; o que não é transmitido por geração, é-o, de um</p><p>modo também quase sempre inconsciente, pelos exemplos dos pais".</p><p>- Uma questão se impõe: Podemos afirmar que o marido que bate em sua esposa o faz porque sua mãe</p><p>apanhava de seu pai? - Não há exceção?</p><p>Torna-se</p><p>equivocado (fazendo referência novamente à citação de Garofalo) dizer que tais "cenas" são</p><p>determinantes no caráter criminoso de um homem.</p><p>Do sentido de educação podemos extrair algumas considerações, o que impõe desde logo algumas</p><p>indagações:</p><p>- Toda criança "mal educada" vai um dia cometer crime?</p><p>- Alguém com "boa educação" pode cometer um delito?</p><p>- A educação (ou a falta dela) é "o" caráter definidor da conduta delituosa de um indivíduo?</p><p>Dados da Secretaria de Segurança Pública refletem as características dos internos da FEBEM e nos dão</p><p>certa ideia dos fatores determinantes do crime; como se verá, a falsa ideia de que só o "pobre" comete</p><p>crime não se funda na realidade.</p><p>Os menores infratores apontam como fatores que os levaram ao crime: exclusão social, uso de drogas e</p><p>falta de estrutura familiar.</p><p>As palavras dos internos da FEBEM são o retrato da mentalidade social:</p><p>"nem todos que estão é um bicho como a imagem nossa lá fora".</p><p>"O que fez eu entrar pro crime (...) foi as necessidades que eu encontrei e que estava passando... uma</p><p>certa ambição também de ter as coisas (...) andar do jeito que todo mundo anda, com dinheiro. A</p><p>proposta que foi feita pra mim não foi a proposta de um trabalho, de ter um trampo. A primeira proposta</p><p>que teve pra mim foi pegar num revólver, foi vender uma droga".</p><p>"não ter emprego, falta de estudo e não ter oportunidade pra nós da periferia. Essa situação chegou a um</p><p>ponto que na vida do crime a gente ganhava alguma coisa".</p><p>"eu costumava roubar para usar drogas e usar drogas para roubar. Quando eu ia roubar eu gostava de</p><p>cheirar cocaína porque ela estimulava a violência, deixa você mais agressivo. Então, eu tinha mais</p><p>apetite".</p><p>"já tirei a vida de duas pessoas num assalta, mas, por mim não fez nem falta"</p><p>"o primeiro ato infracional que eu cometi na minha vida foi esse homicídio. O que eu senti num primeiro</p><p>momento foi a revolta. Eu até não queria mas a revolta foi trazendo tudo isso na minha cabeça e pelo</p><p>ódio e pelas mágoas eu ajuntei tudo e cometi esse crime".</p><p>Sendo assim, em relação à educação podemos assegurar que não se trata de critério único e</p><p>determinante na delinquência futura do homem; há se levar em consideração outros fatores que,</p><p>somados, PODEM criar uma personalidade criminosa.</p><p>A Influência Econômica nos Instintos Criminosos</p><p>"creem os socialistas que, removidas certas instituições e atingido o ideal que eles proclamam, cessaria a</p><p>maior parte dos delitos".</p><p>- Marginal é quem mora na favela!!!</p><p>Em tais locais, por exemplo, ademais do contato diário da violência com os moradores, suas próprias</p><p>condições refletem a falta absoluta de condições humanas de vida; as pessoas vivem ao lado de</p><p>esgotos, "moram em residências" sem o mínimo de estrutura, sem falar da precariedade de subsistência</p><p>frente sua condição social.</p><p>Tal realidade denota a falta de oportunidade de emprego e a ineficácia do seu ganho refletir em melhores</p><p>condições de SOBREVIVÊNCIA.</p><p>Muitos acreditam que o aumento da desigualdade social é o responsável pela violência que impera</p><p>hodiernamente. Ora, se assim o fosse, certo seria dizer que a violência se voltaria tão somente contra os</p><p>mais abastados; no entanto, o que se vê é a indiscriminada violência, ou seja, o "não abastado", ou mais,</p><p>"o miserável" possui chances iguais de ser violentado em seus mais diversos bens quanto aquele que</p><p>ostenta boa situação econômica.</p><p>O que ocorre - certamente - que a falta de condições econômicas refletem e geram outros maus; a</p><p>desigual repartição da riqueza condena uma parte da população à miséria, e com esta à falta de</p><p>educação, de moradia, de alimento, de condições mínimas de sobrevivência, de falta total de esperança</p><p>num futuro pouco melhor.</p><p>Tal assertiva reveste-se da realidade conquanto os "ricos" também cometem crimes; há aqueles que não</p><p>estão privados de excelente moradia, educação pedagógica e familiar exemplar, mas nem por isso</p><p>deixam, absolutamente, de estarem "aptos" à delinquência.</p><p>Os abastados trazem consigo diferentes fatores que os levam ao crime. Algumas vezes, "o pobre" rouba</p><p>visando o sustento de seus familiares, ou ainda, o faz em busca de melhores condições de vida. O "rico",</p><p>de outra feita, já dispõe de tudo que necessita porquanto se alimenta com dignidade, sua família detêm</p><p>certas "regalias", não possuindo, a priori "desculpa para roubar".</p><p>Possui, todavia, o que o homem tratou chamar de ganância.</p><p>- Utópica e hipoteticamente refletindo, não podia ele dispor de seus bens em excesso a favor daquele</p><p>que não os tem? - Assim não sendo, necessita ainda de mais, e, sobretudo, precisa delinquir para</p><p>alcançar este algo mais?</p><p>O que diverge da antagônica realidade do "pobre" e do "rico" é o crime (meio) dos quais se utilizam para</p><p>"saciar" seus desejos; O primeiro se vale do furto, do roubo, do sequestro; o segundo das falsificações e</p><p>das fraudes de toda espécie, visando essencialmente a obtenção de mais riqueza (monetária). De certo</p><p>que os crimes mais violentos estão ligados à camada mais baixa da sociedade, mas são, senão,</p><p>variantes de um mesmo delito natural.</p><p>A falta de freio moral é o mesmo!!!</p><p>Independente ou não da sua boa ou má educação lato sensu - como explicitado no tópico anterior - o</p><p>abastado comete o delito e não se frustra, igualmente, a novos crimes se necessário for.</p><p>Inserida assim a questão podemos asseverar que os fatores econômicos e educacionais não</p><p>determinam, individualmente, o caráter delinquente do homem.</p><p>Ficam, pois, algumas questões:</p><p>1. Os critérios estudados influenciam na violência e no crime?</p><p>2. O homem é fruto do meio ou o meio social é fruto do homem que nele vive?</p><p>3. Para aqueles que acreditam na influência ímpar de cada critério, como explicar sua eficácia (ou não)</p><p>frente os criminosos natos?</p><p>Devemos assim nos voltar para a base da formação que é a família e com igual razão ao Estado como</p><p>garantidor de condições mínimas de humanidade. A família por sua vez - berço de um futuro sólido - só</p><p>se fortifica se o Estado se coloca como sua base primária.</p><p>Homem violento e criminoso: Fruto do meio social em que vive?</p><p>Qualquer motivo é idôneo para impulsionar alguém a ter ou deixar de ter determinado comportamento,</p><p>ainda que considerado socialmente inadequado ou absurdo; na verdade, toda ação possui uma lógica</p><p>interna, orientada para a satisfação de uma necessidade primordial de sobrevivência, de segurança ou</p><p>de amadurecimento, tais como o amor, estima social, autoestima ou sensação de pertencer a um grupo,</p><p>qualquer que seja ele.</p><p>É óbvio que as dificuldades econômicas pelas quais passam nosso país, refletem na população em geral,</p><p>sobretudo nas camadas mais pobres, na grande parte miseráveis; contudo isso não importa</p><p>necessariamente em que se tornem criminosos.</p><p>Vários são os exemplos de que pobreza não implica em conduta criminosa, sendo o maior de todos, no</p><p>nosso ponto de vista, aquele em que o indivíduo se coloca como um animal de carga e passa a puxar um</p><p>carrinho no qual deposita papelão ou ferro velho, para sustentar a si e à sua família. Tais pessoas</p><p>preferem o caminho mais difícil, ou seja, passar fome a cometer delitos.</p><p>Os que o leva a não cometer crimes é difícil responder, mas sem dúvida, tal resposta se baseia,</p><p>necessariamente, na sua personalidade (sentimento, valores, tendências e volições).</p><p>Exatamente por serem vários os exemplos, entendemos não ser lícito ao criminoso escorar-se na</p><p>condição social para justificar seus atos violentos. Em sua maioria, aquele que comete crime por passar</p><p>fome, não usa da violência para cometê-los, opta no mais das vezes por cometer pequenos furtos</p><p>(chamado furto famélico).</p><p>Também é verdade que podemos encontrar atitudes violentas e crimes violentos em todas as classes</p><p>sociais, do contrário como explicar crimes como o cometido pelo jornalista Pimenta Neves, o do promotor</p><p>de justiça Igor Ferreira que matou a esposa grávida de oito meses, dentre tantos outros.</p><p>Contudo, não podemos nos apartar da realidade e negar que é no seio da população mais carente e</p><p>miserável que a violência e os crimes violentos encontram campo propício</p><p>para se desenvolver, ademais</p><p>dos motivos anteriormente expostos.</p><p>Nesse passo, os crimes violentos não se resumem em homicídios, no entanto esse é um bom parâmetro</p><p>para demonstrarmos nossa posição. Segundo dados fornecidos pela Secretaria de Segurança Pública,</p><p>no tocante ao ano de 1999, podemos observar a maior incidência de homicídios (100.000 habit.) no</p><p>município de São Paulo nas áreas dos Distritos Policiais em que se encontram as populações mais</p><p>carentes tais como Jardim Angela - 116,23; Cidade Ademar - 106,06; Iguatemi - 100,11; Parque São</p><p>Rafael - 96,16 e Grajaú - 95,62 ao passo que há uma menor incidência nas áreas dos Distritos Policiais</p><p>em que se encontram populações de classes média e alta, tais como Moema - 4,11; Jardim Paulista -</p><p>8,22; Vila Mariana - 11,55; Perdizes - 14,73 e Alto de Pinheiros - 16,49 (Apêndice, p. VI e VII).</p><p>Não podemos assim responder se o homem violento é produto do meio em que vive ou se ele forja tal</p><p>meio ao seu talante, ou seja, se o meio é produto do homem; no entanto, com certeza, podemos dizer</p><p>que a grande massa de miseráveis, principalmente aqueles que coabitam em favelas, convivem no seu</p><p>dia a dia com um alto grau de violência, comparável somente a Estados que se encontram em constante</p><p>guerra.</p><p>Diante das estatísticas e números não há argumentos.</p><p>Classificação dos Delinquentes</p><p>Classificação dos Criminosos:</p><p>Observando os ensinamentos do doutrinador Guido Arturo Palomba, ilustre Psiquiatra Forense, seguindo</p><p>os caminhos trilhados por Cândido Motta, podemos, basicamente, ter cinco tipos de criminosos:</p><p>1º- Os Impetuosos: Agem em curto-circuito, por amor à honra, sem premedi tação, fruto de uma</p><p>anestesia momentânea do senso crítico. Dentre os delitos que praticam relacionam-se</p><p>principalmente o crime passional e alguns tipos de assassinatos e de agressão física. Em geral é um</p><p>criminoso honesto, principal mente quando se trata de um delito passional dos amantes, dos maridos</p><p>e das mulheres traídas.</p><p>2º- Os Ocasionais: São os levados pelas condições pessoais e influências do meio. Os fatores têm</p><p>muito peso. Os delitos que mais praticam são o furto e o estelionato.</p><p>3º- Os Habituais: São aqueles cujos marginais são incapazes de readquirir uma existência honesta.</p><p>A emenda é a exceção. Cometem toda a sorte de delitos como assaltos, tráfico de drogas e</p><p>assassinatos em série. Esses últimos são co nhecidos como “assassinos de aluguel ou justiceiros”.</p><p>O criminoso habitual é o que tem como profissão o crime; sai de casa para “tra balhar” cuja atividade</p><p>é o delito.</p><p>4º- Fronteiriços: Não são propriamente doentes mentais e também não são nor mais. Apresentam</p><p>permanentes deformidades do sendo ético-moral distúrbio de afeto e da sensibilidade cujas</p><p>alterações psíquicas os levam ao delito.</p><p>Quando dão de ser violentos, são os que praticam os atos mais perversos e he diondos dentre todos</p><p>os outros tipos de criminosos.</p><p>A característica principal dos criminosos fronteiriços é a extrema frieza e insen sibilidade moral com</p><p>que tratam as vítimas.</p><p>5º- Loucos Criminosos: Os delitos que praticam podem ser divididos em dois grandes grupos:</p><p>I- aqueles que agem graças a um processo lento e reflexivo e</p><p>II- aqueles que agem por impulso momentâneo.</p><p>No primeiro caso, a ideia surge do nada, inesperadamente, é a obsessão doentia e invencível.</p><p>No segundo caso, a deliberação do crime é fruto de uma impulsão momentânea; é seguido de</p><p>imediata execução. O ato é em curto-circuito, reação primitiva, sem motivo algum que possa justificar</p><p>o tipo de atitude.</p><p>No campo da execução penal importante ressaltar sua natureza e objeto. Quan to a natureza, a</p><p>jurisprudência e a doutrina nos apontam as divergências reinantes, pois para alguns a execução criminal</p><p>tem incontestável caráter de processo judicial contraditório. É de natureza jurisdicional.</p><p>Para Ada Pellegrini Grinover a execução penal é uma atividade complexa, que se desenvolve nos planos</p><p>jurisdicional e administrativo. Segundo Paulo Lúcio No gueira a execução penal é de natureza mista,</p><p>complexa e eclética no sentido de que certas normas da execução pertencem ao direito processual</p><p>enquanto que outras que regulam a execução propriamente dita pertencem ao direito administrativo.</p><p>Para Júlio Fabbrini Mirabete a execução é de índole predominantemente admi nistrativa.</p><p>Quanto ao objeto, visa-se pela execução fazer cumprir o comando emergente da sentença penal</p><p>condenatória ou absolutória imprópria, assim considerada aquela que não acolhe a pretensão punitiva</p><p>mas reconhece a prática da infração penal e impõe ao réu medida de segurança.</p><p>De acordo com o Artigo 3º da Lei de Execução Penal – Ao condenado e ao in ternado serão assegurados</p><p>todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.</p><p>São várias as consequências da condenação e os direitos atingidos pela senten ça, como por exemplo:</p><p>1- Lançamento do nome do réu ao rol dos culpados, o que só é possível após o transito em julgado da</p><p>sentença penal condenatória;</p><p>2- Prisão do réu;</p><p>3-Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;</p><p>4- Perda de cargo, função pública e mandato eletivo;</p><p>5- Constitui obstáculo à naturalização do condenado;</p><p>Por outro lado, não são atingidos pela sentença penal condenatória os seguintes direitos:</p><p>1- Inviolabilidade do direito à vida, liberdade, igualdade, à segurança e à pro priedade;</p><p>2- Igualdade entre homens e mulheres em direitos e obrigações;</p><p>3- Integridade física e moral, não podendo ser submetido a tortura ou tratamento desumano ou</p><p>degradante;</p><p>4- Liberdade de manifestação do pensamento;</p><p>5- Individualização da pena;</p><p>História natural do delito</p><p>O delito se define por ele mesmo, sempre a partir de uma teoria, e a melhor teoria é aquela que se</p><p>aproxima da realidade histórico-social do objeto questionado. Teoria e prática se implicam de uma tal</p><p>forma no campo jurídico-penal que até não mais se concebe a menor tentativa de enfoque parcelado, à</p><p>guisa de análise. É o todo que carece de ser analisado, para que não se perca de vista aquele momento</p><p>crítico de intercomunicação recíproca de fatores e elementos, em perpétua dinamicidade unitária e</p><p>autotransformadora. Os fatos sociais, com sua enorme carga valorativa, participam do delito como o sol</p><p>participa do movimento dos planetas. A propósito, elimine-se o sol da vida dos planetas e se verá que</p><p>não serão apenas estes que sentirão os efeitos do repentino cataclisma gravitacional das esferas</p><p>celestes inseridas na Via Láctea.</p><p>O delito não existe sem o fato social que lhe regula ciberneticamente o rumo a ser alcançado, por via de</p><p>alterações de sentido geradoras de novas formas e matizes. Deve ser definido por seu conteúdo, nos</p><p>limites de sua própria efemeridade factual e contraditória, ao invés de ser aprisionado pelo método</p><p>esquizofrênico de certas filosofias ontológicas ou essencialistas.</p><p>O delito e suas circunstâncias, historicamente condicionadas, não se amoldam a figurinos estanques</p><p>desenhados por uma natureza intrínseca, como se nascessem de um mesmo e único ovo, idêntico a si</p><p>próprio. Os milhões de anos de vida sobre a terra atestam exatamente o contrário. Não se há de construir</p><p>o presente com dispensa dos materiais que lhe, servem de sustentáculo.</p><p>Sem a empiricidade dos fatos, potenciais ou consumados, não vale nenhuma teoria, se procura uma</p><p>verdade ontológica. Fora dos fatos qualquer teoria tem valor, pois se alimenta de si mesma, de seu</p><p>próprio enunciado unilateral. É dolo o que for como tal predeterminado. É culpa o que se encaixa no</p><p>conceito inventado de culpa.</p><p>Qualquer estudo sobre delitos ou transgressões sociais não pode prescindir do homem. Por sua</p><p>natureza, o delito induz a uma regulação da coletividade, e, por conseguinte, é uma ação, um fenômeno</p><p>social. Se o delito faz parte da natureza social do homem, então podemos aceitar o que disse Mariano</p><p>Funes em "Actualidad de la Venganza" (Buenos Aires, 1943:41):</p><p>"(...). El delito es un fenómeno de normalidad social, em cuanto producto de la humana convivencia; y de</p><p>anormalidad de la conducta, en cuanto la conducta criminal es inferior</p><p>em su expresión numérica y en su</p><p>frecuencia a los otros actos externos de las conductas normales"</p><p>O crime, por incrível que pareça, não é necessariamente nocivo para o sistema social, o que faz</p><p>Durkheim apontar a funcionalidade do crime. O referido filósofo promoveu a despatologização do crime e</p><p>assinalou o funcionalismo do crime e da pena. (...)</p><p>O crime é indispensável à evolução normal da moral e do direito. É fator de saúde pública. É fundamental</p><p>o legado de Durkheim para se entender o crime, o criminoso e o castigo nas sociedades</p><p>contemporâneas. Sua teoria sistêmica veio contrariar o determinismo positivo lombrosiano dominante à</p><p>sua época. E, profetiza: Não há sociedade sem crime."</p><p>Delito é a representação dos conflitos sociais mais agudos, por agredir sentimentos como a moral e ética</p><p>social.</p><p>Nada é bom indefinidamente e sem medida. Para a própria evolução da autoridade é imprescindível que</p><p>não seja excessiva, seja portanto, contestada. Muitas vezes, com efeito, o crime não é senão uma</p><p>antecipação da moral por vir um encaminhamento ao direito que será".</p><p>Se o delito, as transgressões e os crimes são fenômenos sociais, então são históricos. Portanto,</p><p>obedecem as estruturas dialéticas da sociedade em que eles se dão. Pode-se argumentar que alguns</p><p>crimes não são históricos, como o assassinato e o roubo; ocorrem em todas as sociedades,</p><p>independentes do sistema sócio-produtivo. Mesmo assim, nem todos os assassinatos e roubos são</p><p>considerados como transgressões; o colonialismo é um exemplo – hoje atende sob a alcunha de</p><p>"globalização". O conceito de crime não é imutável, absoluto, sendo mesmo relativo e por isso é que tem</p><p>sido discutido e não inaceitáveis as definições absolutas de crime.</p><p>Sociologicamente, crime é a infração de um costume ou de uma lei, contra a qual reage a sociedade,</p><p>aplicando uma pena ao infrator" e "antropologicamente, crime é qualquer afronta a uma crença</p><p>dominante como, por exemplo, crime com o desrespeito ao totem" ou crença religiosa ou política.</p><p>Premissa do Crime</p><p>Ora, a premissa do crime é o fato social. Não é a tipicidade, nem a injuricidade, nem a culpabilidade. O</p><p>crime já existia, na face da terra, antes que essas expressões fossem inventadas. Povos cultos e</p><p>civilizados, mesmo nos dias de hoje, conseguem fabricar seus delitos sem que seus mais eminentes</p><p>dogmatas sequer conheçam o significado nuclear dessas mágicas palavras do moderno direito penal.</p><p>Nem mesmo nós, no Brasil, eméritos copistas, nos últimos decênios, das elucubrações fantasiosas de</p><p>divertidos penalistas alemães (com qual deles estaremos, nos próximos anos?), chegamos a nos</p><p>entender no assunto, o que não é de causar espanto. As palavras, afinal, significam o que se espera que</p><p>elas signifiquem, seja para quem fala, seja para quem escuta.</p><p>Ninguém escapa à tentação (para evitar-se o termo incompetência) de acrescentar seu condimento</p><p>preferido, na retransmissão da receita. Um condimento que se pretende coincidente com a norma</p><p>legislada ou com os princípios avançados de justiça e equidade.</p><p>A premissa do crime é o fato social porque é este que sintetiza a tipicidade, a antijuridicidade e a</p><p>culpabilidade, sem que a recíproca se mostre verdadeira. É o fato social que controla e catalisa a</p><p>punibilidade, marca registrada do crime ou delito. Fato social, ou seja: atitude, comportamento ou</p><p>realidade intrinsecamente cativos ou persuasivos na vida de relação dos indivíduos.</p><p>Como fenômeno jurídico (ou antijurídico, pouco importa), depende o crime, para subsistir, da resistência</p><p>que lhe opõe a ordem social estabelecida. Matar índios é crime entre os índios, mormente se pertencem</p><p>à mesma tribo.</p><p>Matar índios é serviço à comunidade no período de implantação e expansão de colônias europeias no</p><p>Novo Mundo. Haveria sequestro, entre nós, na confinação forçada de dissidente político em hospital</p><p>psiquiátrico?</p><p>Verdades tão banais se relegam, todavia, a segundo plano nos compêndios de direito penal, ou se</p><p>reputam reservadas à pesquisa histórico-sociológica. Descobre-se que ao penalista cabe penetrar na</p><p>estrutura ou essência jurídica do crime, auxiliado, ou não, pelo legislador.</p><p>É assim que figuras como o estado de necessidade, legítima defesa, exercício de direito e cumprimento</p><p>do dever ganham ares de autonomia ontológica perante os fatos do homem, os mesmos fatos que lhes</p><p>fornecem, nada obstante, a mais concreta e tangível juridicidade ocasional. No arranha-céu dos</p><p>dogmatas até o vazio das paredes se transforma em estrutura.</p><p>E como ele é invisível, resiste com altivez camaleonesca às mais disparatadas transformações da</p><p>sociedade e do indivíduo, desde tempos imemoriais.</p><p>O Direito Penal trabalha com três conceitos de delito: material, formal e analítico.</p><p>O conceito material está vinculado ao ato que possui danosidade social ou que provoque lesão a um</p><p>bem jurídico.</p><p>O conceito formal está ligado ao fato de existir uma lei penal que descreva determinado ato como</p><p>infração criminal</p><p>Já o conceito analítico expõe os elementos estruturais e aspectos essenciais do conceito de crime.</p><p>Perguntando a um penalista sobre o conceito analítico de delito, ele irá responder (pelo menos a grande</p><p>maioria) que o crime é um ato típico, ilícito e culpável. Outros responderão que o crime é um fato típico e</p><p>ilícito. E agora, também, retornando ao conceito de que o crime é um fato típico, ilícito, culpável e punível,</p><p>haverá respostas apontando esses quatros elementos essenciais.</p><p>Esses conceitos são fundamentais para que a hermenêutica possa ser utilizada. Assim, é possível ao</p><p>intérprete da norma aplicar a norma abstrata ao caso concreto com a segurança que tais situações</p><p>exigem.</p><p>Na verdade, os conceitos formal e material não traduzem com precisão que seja crime. Se há uma lei</p><p>penal editada pelo Estado, proibindo determinada conduta, e o agente a viola, se ausente qualquer</p><p>cláusula de exclusão da ilicitude ou dirimente da culpabilidade, haverá crime. Já o conceito material</p><p>sobreleva a importância do princípio da intervenção mínima quando aduz que somente haverá crime</p><p>quando a conduta do agente atenta contra os bens mais importantes. Contudo, mesmo sendo importante</p><p>e necessário o bem para a manutenção e subsistência da sociedade, se não houver uma lei penal</p><p>protegendo-o, por mais relevante que seja, não haverá crime se o agente vier a atacá-lo, em face do</p><p>princípio da legalidade.</p><p>Mas esses conceitos são rasos. Eles não traduzem a profundidade do fenômeno criminal. Isso fica visível</p><p>na diferença que existe na aplicação da lei penal pela Justiça Criminal togada e pelo Tribunal do Júri. O</p><p>crime é muitas vezes visto de forma distanciada, sem emoção, comparando-se com jurisprudências e</p><p>mais jurisprudências; no Tribunal do Júri é tudo insólito, a emoção nos julgamentos está presente, os</p><p>jurados em seu íntimo se colocam no banco dos réus e se perguntam se teriam feito a mesma coisa.</p><p>Antes de acusação e defesa discursarem sobre legítima defesa e inexigibilidade de conduta diversa, o</p><p>jurado já fez, pelo menos por algumas vezes, a operação mental de ter se colocado no lugar do réu, com</p><p>as condições pessoais do mesmo e na hora dos fatos. Antes da descrição abstrata do crime (utilizado</p><p>pelo Direito Penal), o jurado quer perscrutar os fatores que levaram à ocorrência daquele homicídio. O</p><p>Tribunal do Júri é pura Criminologia!. Ali estão presentes delito, delinquente, vítima e o controle social.</p><p>A Criminologia moderna não mais se assenta no dogma de que convivemos em uma sociedade</p><p>consensual. Pelo contrário, vivemos em uma sociedade conflitiva. Não basta afirmar que crime é o</p><p>conceito legal. Isso não explica tudo e não ajuda em quase nada na percepção da origem do crime. O</p><p>crime é muito complexo, ele pode ter origens das mais diversas como o excessivo desnível social de uma</p><p>localidade, defeitos hormonais no corpo de uma pessoa, problemas de ordem psíquica como traumas,</p><p>fobias e transtornos de toda ordem emocional etc.</p><p>A Criminologia moderna busca se antecipar aos fatos que precedem o conceito jurídico-penal de delito. O</p><p>Direito Penal</p><p>só age após a execução (ex.: tentativa) ou na consumação do crime. A Criminologia quer</p><p>mais. Ela quer entender a dinâmica do crime e intervir nesse processo com o intuito de dissuadir o</p><p>agente de praticar o crime, o que pode ocorrer das mais variadas formas. Mas para que isso seja feito, a</p><p>Criminologia teve que desenvolver outros conceitos para o delito. Conceitos estes mais próximos e</p><p>íntimos da realidade que o fenômeno criminal apresenta.</p><p>Diversos conceitos foram surgindo no desenvolvimento da Criminologia. Já foram tratados aqui os três</p><p>conceitos utilizados pelo Direito Penal, os quais são obrigatórios pontos de partida da Criminologia, mas</p><p>não esgotam o problema.</p><p>Molina (MOLlNA, Gomes, 2002, p. 66) leciona que Garofalo chegou a criar a figura do delito natural, ou seja,</p><p>para ele, delito seria: "uma lesão daquela parte do sentido moral, que consiste nos sentimentos altruístas</p><p>fundamentais (piedade e probidade) segundo o padrão médio em que se encontram as raças humanas</p><p>superiores, cuja medida é necessária para a adaptação do indivíduo à sociedade", outros autores, no</p><p>entanto, realçam a nocividade social da conduta ou a periculosidade do seu autor.</p><p>A sociologia criminal já utiliza outro parâmetro, bastante em voga na atualidade: o de conduta desviada</p><p>ou desvio. Esse critério utiliza como paradigma as expectativas da sociedade. As condutas desviadas</p><p>são aquelas que infringem o padrão de comportamento esperado pela população num determinado</p><p>momento. É um conceito que não se confunde com o de crime, mas que o abrange.</p><p>Anthony Giddens ensina que podemos definir o desvio como o que não está em conformidade com</p><p>determinado conjunto de normas aceitas por um número significativo de pessoas de uma comunidade ou</p><p>sociedade. Como já foi enfatizado, nenhuma sociedade pode ser dividida de um modo linear entre os que</p><p>se desviam das normas e aqueles que estão em conformidade com elas. A maior parte das pessoas</p><p>transgride, em certas ocasiões, regras de comportamento geralmente aceitas. Quase toda a gente, por</p><p>exemplo, já cometeu em determinada altura atos menores de furto, como levar alguma coisa de uma loja</p><p>sem pagar ou apropriar-se de pequenos objetos do emprego - como papel de correspondência - e</p><p>dar-lhes uso privado. A dada altura de nossas vidas, podemos ter excedido o limite de velocidade, feito</p><p>chamadas telefônicas de brincadeira (trote), ou fumado marijuana (maconha).</p><p>Desvio e crime não são sinônimos, embora muitas vezes se sobreponham. O âmbito do conceito de</p><p>desvio é mais vasto do que o conceito de crime, que se refere apenas à conduta inconformista que viola</p><p>uma lei. Muitas formas de comportamento desviante não são sancionadas pela lei. Sendo assim, os</p><p>estudos sobre desvio podem examinar fenômenos tão diversos como os naturalistas (nudistas), a cultura</p><p>"rave" ou os viajantes "new age". O conceito de desvio pode aplicar-se tanto ao comportamento do</p><p>indivíduo, como às atividades dos grupos.</p><p>O conceito de desvio tem íntima relação com a política de controle da criminalidade conhecida como</p><p>tolerância zero. O controle da criminalidade naquele modelo começa na repressão de condutas</p><p>desviadas.</p><p>O delinquente</p><p>O delito foi o objeto principal de estudo da Escola Clássica criminal. Foi com o surgimento da Escola</p><p>Positiva que houve um giro de estudo, abandonando-se a centralização na figura do crime e passando o</p><p>núcleo das pesquisas para a pessoa do delinquente.</p><p>A Escola Positiva surgiu no contexto de um acelerado desenvolvimento das ciências sociais</p><p>(Antropologia, Psiquiatria, Psicologia, Sociologia, Estatística etc.). Esse fato determinou de forma</p><p>significativa uma nova orientação nos estudos criminológicos. Ao abstrato individualismo da Escola</p><p>Clássica, a Escola Positiva opôs a necessidade de defender mais enfaticamente o corpo social contra a</p><p>ação do delinquente, priorizando os interesses sociais em relação aos indivíduos.</p><p>Na atualidade, os modelos biológicos de explicação da criminalidade perderam quase que totalmente a</p><p>sua força.</p><p>Todavia, não foram totalmente eliminados, dentro de suas limitações também podem contribuir para a</p><p>compreensão do fenômeno criminal.</p><p>Na moderna Criminologia, o estudo do homem delinquente passou a um segundo plano, como</p><p>consequência do giro sociológico experimentado por ela e da necessária superação dos enfoques</p><p>individualistas em atenção aos objetivos político- criminais. O centro de interesse das investigações -</p><p>ainda que não tenha abandonado a pessoa do infrator - deslocou-se prioritariamente para a conduta</p><p>delitiva, para a vítima e para o controle social. Em todo caso, o delinquente é examinado, "em suas</p><p>interdependências sociais" como unidade biopsicossocial e não de uma perspectiva biopsicopatológica</p><p>como sucedera com tantas obras clássicas orientadas pelo espírito individualista e correcionalista da</p><p>Criminologia tradicional.</p><p>No entanto, também não há dúvida de que a Psicologia Criminal, com toda sua técnica de investigação,</p><p>possa contribuir sensivelmente para a Criminologia com seus estudos, individuais ou coletivos, do</p><p>delinquente.</p><p>A Psicologia Criminal destina-se a estudar a personalidade do criminoso. A personalidade refere-se,</p><p>usualmente, aos processos estáveis e relativamente coesos de comportamento, pensamento, reação e</p><p>experiência, que são característicos de uma determinada pessoa. Por intermédio dessas características</p><p>poderemos compreender e até prever grande parte do comportamento do indivíduo. O estudo da</p><p>personalidade das pessoas em conflito com a lei (e aqui podemos incluir as crianças e adolescentes)</p><p>pode contribuir efetivamente para se entender o fenômeno criminal.</p><p>Uma das maiores contribuições criminológicas que a Psicologia pode dar nesse sentido é ajudar na</p><p>criação de programas que auxiliem a redução da reincidência criminal, campo que ainda não foi</p><p>explorado totalmente.</p><p>As escolas penais</p><p>Todas as legislações sustentam o poder e autoridade do Estado para orientar, controlar e punir os seres</p><p>humanos, com a finalidade de regular a vida social harmoniosamente. Por conseguinte, a historicidade da</p><p>sociedade humana tem sua imagem nas regulamentações jurídicas. Desta forma tendem a se adequar</p><p>aos projetos político-sociais de cada sociedade, nação ou Estado.</p><p>Longe da uniformidade, o pensamento jurídico-penal orienta-se por filosofias jurídicas chamadas de</p><p>Escolas Penais. Mesmo a aceitação da denominação de Escola Penal não é hegemônica. "Não obstante,</p><p>a denominação se impôs e foi incorporada ao estudo do direito criminal" (Heitor Júnior; Op. cit. :37).</p><p>Assim, Mestieri conceitua Escola Penal como: "(...) o elenco de soluções típicas do problema penal</p><p>abrangendo-o em todos os seus aspectos principais, quais sejam: o delinquente, a responsabilidade</p><p>penal, o crime e a pena" (apud; Heitor Júnior; op. cit. :37).</p><p>Dos movimentos que se propuseram encaminhar soluções características aos problemas penais,</p><p>tentando explicar o crime, a pena, o homem delinquente, sua responsabilidade, temos as Escolas:</p><p>Clássica, Positiva, Intermediária (Eclética) e Nova Defesa Social. Renato Marcão (2002), nos dá um bom</p><p>resumo das principais Escolas:</p><p>Escola Clássica: Também chamada idealista, filosófico-jurídica, crítico-forense etc., que é</p><p>livre-arbitrista, invidualista e liberal, considerando o crime fenômeno jurídico e a pena, meio retributivo.</p><p>Os clássicos são contratualistas e racionalistas; foram, via de regra, jusnaturalistas, aceitando, o</p><p>predomínio de normas absolutas e eternas sobre as leis positivas.</p><p>Para a Escola Clássica, a pena é um mal imposto ao indivíduo que merece um castigo em vista de uma</p><p>falta considerada crime, que voluntária ou conscientemente, cometeu.</p><p>Escola Positiva: É determinista e defensivista, encarando o crime como fenômeno social e a pena</p><p>como meio de defesa da sociedade e de recuperação do indivíduo. Chama-se positiva, não porque aceite</p><p>o sistema filosófico mais ou menos "comteano", porém, pelo método.</p><p>Para a Escola Positiva, o crime é um fenômeno natural e social, e a pena meio de defesa social.</p><p>Enquanto os</p><p>clássicos aceitam a responsabilidade moral, para os positivistas todo homem é responsável,</p><p>porque vive e enquanto vive em sociedade (responsabilidade legal ou social).</p><p>Escola Intermediária: Em meio aos extremos bem definidos das Escolas Clássica e Positiva,</p><p>surgiram ao longo dos tempos posições conciliatórias. Embora acolhendo o princípio da responsabilidade</p><p>moral, não aceitam que a responsabilidade moral fundamente-se no livre arbítrio, substituindo-o pelo</p><p>"determinismo psicológico". Desta forma, a sociedade não tem o direito de punir, mas somente o de</p><p>defender-se nos limites do justo.</p><p>Escola da Nova Defesa Social: Depois da II Guerra Mundial, reagindo ao sistema unicamente</p><p>retributivo, surge a Escola do Neodefensivismo Social. Segundo seus postulados não visa punir a culpa</p><p>do agente criminoso, apenas proteger a sociedade das ações delituosas. Essa concepção rechaça a</p><p>ideia de um direito penal repressivo, que deve ser substituído por sistemas preventivos e por</p><p>intervenções educativas e reeducativas, postulando não uma pena para cada delito, mas uma medida</p><p>para cada pessoa.</p><p>Damásio E. de Jesus ensina que na Defesa Social, a pena tem três finalidades:</p><p>1) "Não é exclusivamente de natureza retributiva, visando também a tutelar os membros da sociedade";</p><p>2) "É imposta para a ressocialização do criminoso";</p><p>3) "A máquina judiciária criminal deve ter em mira o homem, no sentido de que a execução da pena</p><p>tenha um conteúdo humano".</p><p>Finalidade das penas</p><p>A partir da publicidade do Direito Penal, no qual o Estado detém o monopólio da aplicação das sanções,</p><p>e também, da não uniformidade do pensamento jurídico penal, a aplicação das medidas disciplinadoras</p><p>adquire o caráter filosófico-utilitário da Escola Penal que tanto o legislador quanto o sentenciador estão</p><p>concertados. Entretanto, dificilmente o legislador e o sentenciador estão em harmonia entre si no tocante</p><p>à finalidade da pena. Tentarei mostrar mais adiante esta terrível contradição no Estatuto da Criança e do</p><p>Adolescente, e como o Serviço Social vira "marisco" nesta "briga do rochedo com o mar".</p><p>No momento vamos ver os "instrumentais" jurídico-filosóficos do direito de punir. Assim, temos as teorias</p><p>Retributiva, Relativa e as Mistas ou Sincréticas.</p><p>A Teoria Retributiva: Parte do princípio autoritário de que a pena é sempre merecida pelo infrator. A</p><p>sanção penal é essencialmente retributiva porque opera causando um mal ao transgressor. Destina-se à</p><p>reposição do status quo ante através da reposição, indenização ou da restituição.</p><p>Na lição de Cezar Roberto Bitencourt, "A pena tem como fim fazer Justiça, nada mais. A culpa do autor</p><p>deve ser compensada com a imposição de um mal, que é a pena, e o fundamento da sanção estatal está</p><p>no questionável livre arbítrio, entendido como a capacidade de decisão do homem para distinguir entre o</p><p>justo e o injusto".</p><p>Destarte, na teoria retributiva a "pena encontra seu fundamento somente em sua referência ao delito;</p><p>segundo sua gravidade determina-se sua quantia como que se satisfazem as exigências do ordenamento</p><p>jurídico e a Justiça. Assim como a boa ação merece reconhecimento, a má ação requer reprovação e</p><p>compensação".</p><p>As Teorias Relativas: Baseiam a pena por seus efeitos preventivos. Distinguem dois tipos de</p><p>prevenção: a geral, e a especial.</p><p>A geral é a intimidação, ameaça com sanções os prováveis infratores. Dispõe-se a intimidar todos os</p><p>membros da comunidade jurídica pela ameaça da pena.</p><p>A especial atua diretamente sobre o autor da violação penal, para que não volte a delinquir, tentando</p><p>corrigir os que são possíveis de ressocialização e isolar os irrecuperáveis. Dirige-se exclusivamente ao</p><p>delinquente, para que este não volte a delinquir.</p><p>As Teorias Mistas ou Sincréticas: Mesclam as retributivas e as relativas, afirmando de que a pena é</p><p>retribuição, sem olvidar dos fins preventivos (buscam reunir em um conceito único os fins da pena). A</p><p>doutrina unificadora defende que a retribuição e a prevenção, geral e especial, são distintos aspectos de</p><p>um mesmo fenômeno, que é a pena.</p><p>Em resumo, as teorias mistas ou sincréticas acolhem a retribuição e o princípio da culpabilidade como</p><p>critérios limitadores da intervenção da pena.</p><p>Estado Democrático de Direito: noção e significado.</p><p>Estado Democrático de Direito significa que nenhum indivíduo, presidente ou cidadão comum, está acima</p><p>da lei. Os governos democráticos exercem a autoridade por meio da lei e estão eles próprios sujeitos aos</p><p>constrangimentos impostos pela lei.</p><p>As leis devem expressar a vontade do povo, não os caprichos de reis, ditadores, militares, líderes</p><p>religiosos ou partidos políticos autonomeados.</p><p>Os cidadãos nas democracias estão dispostos a obedecer às leis da sua sociedade, então, porque estas</p><p>são as suas próprias regras e regulamentos. A justiça é melhor alcançada quando as leis são criadas</p><p>pelas próprias pessoas que devem obedecê-las.</p><p>No Estado Democrático de Direito, um sistema de tribunais fortes e independentes deve ter o poder e a</p><p>autoridade, os recursos e o prestígio para responsabilizar membros do governo e altos funcionários</p><p>perante as leis e os regulamentos da nação.</p><p>Por esta razão, os juízes devem ter uma formação sólida, ser profissionais, independentes e imparciais.</p><p>Para cumprirem o papel necessário no sistema legal e no político, os juízes devem estar empenhados</p><p>nos princípios da democracia.</p><p>As leis da democracia podem ter muitas origens: constituições escritas; estatutos e regulamentos;</p><p>ensinamentos religiosos e étnicos e tradições e práticas culturais. Independentemente da origem, a lei</p><p>deve preservar certas cláusulas para proteger os direitos e liberdades dos cidadãos:</p><p>• No âmbito do requisito de proteção igual pela lei, a lei não pode ser aplicável unicamente a um</p><p>indivíduo ou grupo.</p><p>• Os cidadãos devem estar protegidos da prisão arbitrária, da busca sem razão em suas casas ou</p><p>da apreensão de seus bens pessoais.</p><p>• Os cidadãos acusados de crime têm direito a um julgamento rápido e público, bem como à</p><p>oportunidade de confrontar e questionar seus acusadores. Se forem condenados, não podem ser sujeitos</p><p>a castigo cruel ou excepcional.</p><p>• Os cidadãos não podem ser forçados a testemunhar contra si mesmos. Este princípio protege os</p><p>cidadãos da coerção, do abuso ou da tortura e reduz enormemente a tentação da polícia de empregar</p><p>tais medidas.</p><p>Estado Democrático de Direito brasileiro : fundamentos e objetivos.</p><p>A Carta Magna da República Federativa do Brasil de 05/10/1988 é denominada “Constituição Cidadã”.</p><p>Nela se afirma que o Brasil é um Estado democrático tendo, como regime de governo, o</p><p>Presidencialismo.</p><p>A intenção do legislador constituinte (mens legislatoris), ao cunhar a expressão “Estado Democrático de</p><p>Direito”, no primeiro artigo de nossa Carta política, foi evidenciar "que se pretende um país governado e</p><p>administrado por poderes legitimados, submissos à lei e obedientes aos princípios democráticos</p><p>fundamentais". Essa denominação do princípio da legalidade em sentido genérico é um dos objetivos</p><p>fundamentais de nossa Constituição.</p><p>Os Princípios do Estado Democrático de Direito bras ileiro.</p><p>Limitar-nos-emos a indicar esses princípios, sem entrar em pormenores. São os seguintes:</p><p>a) princípio da constitucionalidade , que exprime, em primeiro lugar, que o Estado Democrático de</p><p>Direito se funda na legitimidade de uma Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de</p><p>supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as garantias de atuação livre da</p><p>jurisdição constitucional;</p><p>b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de constituir uma democracia</p><p>representativa e participativa, pluralista, e que seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos</p><p>fundamentais (art.1o);</p><p>c) sistema de direitos fundamentais individuais, coletivos, sociais e culturais (Títs. II, VII e VIII);</p><p>d) princípio da justiça social , referido no art.170, caput, no art. 193, como princípio da ordem</p><p>econômica e da ordem social; como dissemos, a Constituição não prometeu</p><p>a transição para o</p><p>socialismo mediante a realização da democracia econômica, social e cultural e o aprofundamento da</p><p>democracia participativa, como o faz a Constituição portuguesa, mas abre-se ela, também, para a</p><p>realização da democracia social e cultural, embora não avance significativamente rumo à democracia</p><p>econômica;</p><p>e) princípio da igualdade (art. 5o, caput, e inciso I);</p><p>f) princípio da divisão de poderes (art. 2o) e da independência do juiz (art. 95);</p><p>g) princípio da legalidade (art. 5o, II);</p><p>h) princípio da segurança jurídica (art. 5o, XXXV a LXXII).</p><p>Analisando os princípios, regras e valores ora destacados na Carta Constitucional brasileira de 1988</p><p>temos que o poder está estruturado na independência e harmonia entre si, do Legislativo, do Executivo e</p><p>do Judiciário.</p><p>A separação dos poderes é uma garantia extraordinária que foi alçada à dimensão constitucional, fruto do</p><p>desejo e intenção constituinte de estabelecer funções diferenciadas, conjugando princípios por vezes</p><p>aparentemente contrapostos, com escopo de salvaguardar o exercício dos direitos individuais e coletivos.</p><p>A separação dos poderes tornou-se um princípio essencial de legitimação do Estado brasileiro.</p><p>No Brasil, a separação dos poderes é o fundamento do Estado Constitucional Democrático de Direito, no</p><p>qual cada um dos integrantes dos três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) deve observar sua</p><p>função frente a um propósito social.</p><p>Apesar dessa classificação, não é fácil de se alcançar o nível de entendimento pelo povo brasileiro do</p><p>processo de legitimação de poder. Têm-se todos os dispositivos necessários (mecanismos de</p><p>participação popular) para realizá-la, como o direito ao sufrágio, conforme disposto no art. 14 da</p><p>Constituição Federal. Mas a vontade popular nem sempre é acatada pelos representantes eleitos. Há,</p><p>pois, uma lacuna na classificação de Estado Democrático de Direito.</p><p>Podemos dizer que a intenção do legislador, ao elaborar a Constituição Federal, foi a de procurar</p><p>estender os direitos a todos os cidadãos brasileiros sem nenhuma distinção. Mas a verdade é que, na</p><p>prática, a nossa Carta Magna é casuística, porque não há uma ação política participativa do povo</p><p>brasileiro na formação da sociedade, não se sabendo se o que está sendo decidido atende realmente a</p><p>vontade popular.</p><p>Então como verificar se a todos os brasileiros está sendo dispensado o mesmo tratamento? Como saber</p><p>se o bem comum atinge a todos os níveis sociais indistintamente?</p><p>O povo exerce o seu direito ao voto como uma obrigação, sem imaginar os seus poderes de legitimador</p><p>e participante ativo do poder público. Seus princípios, que estão garantidos na Constituição, são quiçá</p><p>conhecidos por poucos.</p><p>Segundo Dalmo Dallari, "O Estado Democrático é aquele em que o próprio povo governa, sendo evidente</p><p>colocar o problema de estabelecimento dos meios para que o povo externe a sua vontade, através da</p><p>representatividade", ou seja, a eleição de um representante para realizar os ideais pretendidos pelos</p><p>cidadãos.</p><p>Assim, no artigo 14, incisos I a III, de nossa Constituição Federal, verificamos a presença dos</p><p>mecanismos de participação popular nas decisões políticas: pela democracia semidireta, o sufrágio</p><p>universal, plebiscito, referendo e iniciativa popular - eleição dos seus representantes na Assembleia</p><p>Nacional Constituinte – ou pela democracia representativa – mandato político.</p><p>Não sendo o poder social exercido a favor do povo por desconhecimento dos instrumentos de</p><p>participação popular garantidos em lei, haverá sérias consequências sociais tais como fome, miséria etc.</p><p>Como sanar essas carências sociais, se o povo não consegue externar as suas necessidades?</p><p>O povo brasileiro, em relação à formação política, aprendeu que o voto é uma obrigação do cidadão,</p><p>quando deveria ser uma afirmação de sua vontade, para atingir o bem comum.</p><p>O sufrágio é o direito concedido aos cidadãos para a escolha dos seus representantes e está assegurado</p><p>pelo artigo 1º, parágrafo único de nossa Constituição. Suas características estão descritas no art. 14,</p><p>incisos I a III: o voto direto e secreto, com igual valor para todos.</p><p>Esses representantes têm seu mandato por determinado tempo, sendo garantido a todos os cidadãos o</p><p>direito de participar, conforme as condições de elegibilidade estabelecidas no art. 14, § 3º da Constituição</p><p>Federal. Sem esse direito político, não estaria configurado o processo democrático que prevê, entre os</p><p>seus princípios, a igualdade de todos, de acordo com o disposto no art. 5º, caput, da CF.</p><p>Faz-se necessária a diferenciação entre sufrágio, voto e eleição. O sufrágio é o direito da escolha, como</p><p>já dito anteriormente; o voto é o ato que assegura o sufrágio; a eleição é o processo dessa escolha.</p><p>A evolução do processo democrático brasileiro foi influenciada por vários fatores históricos da nossa</p><p>República, desde a sua proclamação em 15 de novembro de 1889.</p><p>No início do período republicano, o voto só poderia ser exercido por homens, com idade superior a 21</p><p>anos que tivessem certo nível de renda.</p><p>Em 1964, com o golpe militar, esse direito foi negado à população, cabendo a um pequeno grupo</p><p>formado por representantes da Assembleia Nacional Constituinte, exercê-lo pelo povo. Tinham como</p><p>justificativa a necessidade de preservar a segurança nacional, já que os representantes escolhidos pelo</p><p>povo fizeram o desgaste econômico, político e social do país. Cumpre ressaltar que, nesse período, o</p><p>voto ainda não era estendido a todas as classes sociais.</p><p>Até chegarmos à Constituição de 1988, foram necessárias várias manifestações populares para firmar-se</p><p>o direito de escolha dos representantes no parlamento brasileiro, sem distinção de cor, raça, cultura etc.</p><p>Em nossa Carta Magna estão estabelecidas as formas de participação do povo na tomada de decisões</p><p>no governo, concedendo-lhes, além do exercício do voto, o direito de apresentar projeto de lei à Câmara</p><p>dos Deputados, conforme art. 61, § 2º, configurando, assim, a iniciativa popular, art. 14, inciso III.</p><p>O ideal para a garantia do processo democrático seria a conscientização política do povo,</p><p>familiarizando-o com os dispositivos estabelecidos em lei, afirmando que o seu poder social é peça</p><p>fundamental para a estruturação de melhorias das condições de qualidade de vida.</p><p>A Democracia participativa brasileira</p><p>Um exemplo concreto da democracia participativa brasileira está no art. 2º, caput, do Ato das</p><p>Disposições Transitórias de nossa Constituição de 1988, em que se previu "a realização de plebiscito</p><p>para definir a forma e o sistema de governo, com data para o dia 07.09.93, que foi objeto de antecipação</p><p>pela Emenda Constitucional nº 2, de 25.8.92, tendo-se realizado em 21.04.93".</p><p>No art. 49, inciso XV, está escrito que compete somente ao Congresso Nacional a convocação para</p><p>plebiscitos. A Constituição prevê expressamente a exigência de plebiscito para criação de novos Estados</p><p>(art. 18, § 3º) e de novos Municípios (art. 18, § 4º).</p><p>No preâmbulo da Constituição Federal, estão confirmadas as intenções dos legisladores em estabelecer</p><p>um Estado Democrático de Direito, com a finalidade de garantir e estender as condições de igualdade a</p><p>todo povo brasileiro, indistintamente.</p><p>Por isso, a participação do povo no processo democrático é importante, pois objetiva a diminuição das</p><p>diferenças sociais e a garantia dos direitos fundamentais a todos.</p><p>Finalidade Social</p><p>Quando se afirma que há uma finalidade a atingir, essa afirmação pressupõe um ato de escolha, um</p><p>objeto conscientemente estabelecido.</p><p>Assim, a sociedade pretende a prática do exercício de suas vontades, porque determinar o fim social não</p><p>é apenas traçá-lo num pedaço de papel. Vai além de qualquer definição escrita, cabendo ao cidadão o</p><p>poder de iniciativa política, capaz de firmar todos os seus anseios.</p><p>Mas, para se efetivar a vontade do povo, surgem, neste momento, os instrumentos legais do processo de</p><p>legitimação do poder. No Brasil, a representação democrática é semidireta, ou seja, o povo elege o seu</p><p>representante no governo. O art.</p><p>14 da Constituição dispõe sobre esses mecanismos, com a finalidade</p><p>de fazer prevalecer a vontade popular.</p><p>Cabe salientar que poucas pessoas exercitam conscientemente esse direito como identificar a</p><p>autenticidade do processo eleitoral, a sua importância e sua finalidade. Isso implica, realmente, que o ato</p><p>de escolha do cidadão pode não resultar na escolha de um representante que atenda a seus ideais.</p><p>A definição de Estado Democrático de Direito está correlacionada à expressão de “governo do povo”.</p><p>Para que o processo democrático e o sistema eleitoral sejam eficazes na estruturação desse Estado, a</p><p>participação popular é fundamental para a constituição de seus princípios.</p><p>A democracia só existe se houver garantias da participação de todos, sem distinção, assim com está</p><p>definido em nosso art. 5º em seu caput. Confirmar a decisão da maioria é a garantia do processo</p><p>democrático e, se esta for cumprida, as propostas políticas apresentadas pelos representantes poderão</p><p>ser convertidas em melhorias nas áreas política, social e econômica do país.</p><p>A verdade é que se tem a ideia de que votar é uma obrigação, tendo como contrapartida a perda de</p><p>algum direito, por exemplo, ou vota-se ou perde-se o salário do mês, no caso de o empregado não</p><p>apresentar o comprovante de votação ao setor de recursos humanos de sua empresa.</p><p>O voto não significa que os representantes eleitos legislarão de forma a estabelecer as diretrizes e</p><p>decisões que sejam justas e estendidas a todos, conforme está estabelecido em nossa Constituição</p><p>Federal.</p><p>Conclusão</p><p>O Estado Moderno necessário é aquele em que a democracia prevaleça, os projetos sejam efetuados, os</p><p>direitos sejam respeitados e, principalmente, haja uma articulação entre o governo e o povo.</p><p>Dessa forma, os representantes eleitos pelo povo poderão atingir o objetivo democrático, que é a</p><p>garantia do bem comum, sentindo-se o povo responsável em fazer parte desse processo de mudança no</p><p>país.</p><p>Pode parecer utópico, mas se a maior parte dos objetivos estabelecidos em nossa Carta Magna fossem</p><p>cumpridos, principalmente o direito à educação, teríamos cidadãos mais participativos no governo.</p><p>Se a população tivesse conhecimento sobre política, haveria análise aprofundada das questões que mais</p><p>afetam a sociedade e, com o trabalho conjunto de povo e governo, seria mais fácil e justa a tomada de</p><p>decisões, podendo avaliar-se os seus reflexos, a sua funcionalidade prática e seu controle para as</p><p>devidas correções.</p><p>Defesa do Estado e das Instituições Democráticas:</p><p>Segurança Pública; Organização da Segurança Pública .</p><p>DO ESTADO DE DEFESA</p><p>Ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional (órgãos meramente consultivos), o</p><p>Presidente da República pode decretar o estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer,</p><p>em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente</p><p>instabilidade institucional ou atingidas por calamidades da natureza de grandes proporções.</p><p>Do decreto presidencial, que não depende de prévia autorização do Congresso Nacional, deve constar o</p><p>tempo de duração da medida (não superior a 30 dias, prorrogável uma vez por igual período), a área que</p><p>a medida atinge e, nos limites da lei, quais das medidas restritivas previstas nos inc. I e II do § 1.º do art.</p><p>136 da Constituição Federal serão adotadas.</p><p>Em 24 horas, o decreto deve ser encaminhado com a respectiva justificativa ao Congresso Nacional (não</p><p>há, portanto, prévio pedido de autorização), que no prazo de 10 dias deverá aprová-lo (art. 49, inc. IV, da</p><p>Constituição Federal) ou rejeitá-lo (art. 136, § 4.º), sempre por maioria absoluta (voto da maioria dos</p><p>membros). Rejeitado o decreto, cessa de imediato o estado de defesa.</p><p>Se estiver em recesso, o Congresso será convocado para se reunir em cinco dias, permanecendo em</p><p>funcionamento durante todo o período do estado de defesa.</p><p>Qualquer prisão por crime contra o Estado deverá ser imediatamente comunicada pelo executor da</p><p>medida ao juiz competente (controle jurisdicional concomitante), que a relaxará se for ilegal. A</p><p>comunicação da prisão, que, salvo hipótese de autorização do Poder Judiciário, não poderá exceder a 10</p><p>dias, será acompanhada de declaração, feita pela autoridade competente, do estado físico e mental do</p><p>detido no momento de sua autuação. É facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à</p><p>autoridade policial, e qualquer pessoa pode impetrar habeas corpus .</p><p>A previsão deixa claro que nas hipóteses de estado de defesa é constitucional a prisão, ainda que não</p><p>em flagrante, efetuada sem ordem judicial. É uma exceção ao disposto nos incs. LIV e LXI do art. 5.º da</p><p>Constituição Federal, já que nesse período convive-se dentro de um critério de legalidade extraordinária</p><p>estabelecido pela própria Constituição.</p><p>É vedada a incomunicabilidade do preso.</p><p>Segundo o texto Constitucional</p><p>TÍTULO V</p><p>Da Defesa do Estado e Das Instituições Democráticas</p><p>CAPÍTULO I</p><p>DO ESTADO DE DEFESA E DO ESTADO DE SÍTIO</p><p>Seção I</p><p>DO ESTADO DE DEFESA</p><p>Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa</p><p>Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e</p><p>determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional</p><p>ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.</p><p>§ 1º - O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as</p><p>áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem,</p><p>dentre as seguintes:</p><p>I - restrições aos direitos de:</p><p>a) reunião, ainda que exercida no seio das associações;</p><p>b) sigilo de correspondência;</p><p>c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;</p><p>II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública,</p><p>respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.</p><p>§ 2º - O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado</p><p>uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.</p><p>§ 3º - Na vigência do estado de defesa:</p><p>I - a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada</p><p>imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame</p><p>de corpo de delito à autoridade policial;</p><p>II - a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do</p><p>detido no momento de sua autuação;</p><p>III - a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando</p><p>autorizada pelo Poder Judiciário;</p><p>IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.</p><p>§ 4º - Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e</p><p>quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por</p><p>maioria absoluta.</p><p>§ 5º - Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de</p><p>cinco dias.</p><p>§ 6º - O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento,</p><p>devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.</p><p>§ 7º - Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa.</p><p>DO ESTADO DE SÍTIO</p><p>Ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional (órgãos meramente consultivos),</p><p>pode o Presidente da República solicitar (há um controle político prévio) ao Congresso Nacional</p><p>autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:</p><p>1)Comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia da</p><p>medida tomada durante o estado de defesa (prazo de 30 dias, prorrogável cada vez por igual período).</p><p>LUIZ ALBERTO DAVID ARAÚJO e VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR denominam essa hipótese de</p><p>estado de sítio repressivo.</p><p>2)Declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira (pode perdurar por todo o</p><p>tempo da guerra ou da agressão armada estrangeira). É o denominado estado de sítio defensivo.</p><p>O pedido de autorização ou de prorrogação do estado de sítio deve ser acompanhado da respectiva</p><p>exposição dos motivos, decidindo o Congresso por maioria absoluta.</p><p>O decreto de estado de sítio indicará a sua duração, as normas necessárias à sua execução e as</p><p>garantias e direitos constitucionais que ficarão suspensos. Depois de publicado o decreto, o Presidente</p><p>da República indicará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.</p><p>O estado de sítio decretado com base no inc. I do art. 137 da Constituição Federal só autoriza a</p><p>imposição das medidas específicas no art. 139 da própria Constituição Federal.</p><p>O estado de sítio decretado com base no inc. II do art. 137, em tese, admite a suspensão de qualquer</p><p>direito ou garantia constitucional, desde que prevista na autorização do Congresso Nacional.</p><p>Observações:</p><p>O estado de defesa e o estado de sítio estão sujeitos a um controle político concomitante – uma</p><p>comissão composta por cinco parlamentares (designados pela mesa do Congresso Nacional após ser</p><p>dada oportunidade de manifestação aos líderes partidários) acompanhará e fiscalizará a execução das</p><p>medidas, nos termos do art. 140 da Constituição Federal – e a um controle político posterior – na</p><p>apreciação do relatório que será encaminhado pelo Presidente da República ao Congresso Nacional logo</p><p>que cesse a medida, nos termos do art. 141 da Constituição Federal.</p><p>A qualquer tempo, o Congresso Nacional, que permanece em funcionamento enquanto perdurar a</p><p>medida de exceção, pode suspender o estado de defesa ou o estado de sítio (art. 49, inc. IV, da</p><p>Constituição Federal).</p><p>O controle jurisdicional concomitante se faz, sobretudo, por intermédio do habeas corpus e do mandado</p><p>de segurança, que serão analisados à luz das restrições autorizadas pela própria Constituição Federal (à</p><p>luz da legalidade extraordinária).</p><p>O controle jurisdicional posterior é o mesmo previsto para o estado de defesa e para o estado de sítio,</p><p>pois os executores e os agentes das medidas excepcionais poderão ser responsabilizados pelos ilícitos</p><p>(principalmente excessos) eventualmente cometidos.</p><p>Não cabe ao Poder Judiciário analisar a conveniência ou a oportunidade da medida, que é</p><p>essencialmente política.</p><p>Segundo o texto Constitucional</p><p>Seção II</p><p>DO ESTADO DE SÍTIO</p><p>Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa</p><p>Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:</p><p>I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de</p><p>medida tomada durante o estado de defesa;</p><p>II - declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira.</p><p>Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o estado de sítio ou</p><p>sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido, devendo o Congresso Nacional decidir</p><p>por maioria absoluta.</p><p>Art. 138. O decreto do estado de sítio indicará sua duração, as normas necessárias a sua execução e as</p><p>garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente da República</p><p>designará o executor das medidas específicas e as áreas abrangidas.</p><p>§ 1º - O estado de sítio, no caso do art. 137, I, não poderá ser decretado por mais de trinta dias, nem</p><p>prorrogado, de cada vez, por prazo superior; no do inciso II, poderá ser decretado por todo o tempo que</p><p>perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira.</p><p>§ 2º - Solicitada autorização para decretar o estado de sítio durante o recesso parlamentar, o Presidente</p><p>do Senado Federal, de imediato, convocará extraordinariamente o Congresso Nacional para se reunir</p><p>dentro de cinco dias, a fim de apreciar o ato.</p><p>§ 3º - O Congresso Nacional permanecerá em funcionamento até o término das medidas coercitivas.</p><p>Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser</p><p>tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:</p><p>I - obrigação de permanência em localidade determinada;</p><p>II - detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;</p><p>III - restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de</p><p>informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;</p><p>IV - suspensão da liberdade de reunião;</p><p>V - busca e apreensão em domicílio;</p><p>VI - intervenção nas empresas de serviços públicos;</p><p>VII - requisição de bens.</p><p>Parágrafo único. Não se inclui nas restrições do inciso III a difusão de pronunciamentos de parlamentares</p><p>efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa.</p><p>Seção III</p><p>DISPOSIÇÕES GERAIS</p><p>Art. 140. A Mesa do Congresso Nacional, ouvidos os líderes partidários, designará Comissão composta</p><p>de cinco de seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado</p><p>de defesa e ao estado de sítio.</p><p>Art. 141. Cessado o estado de defesa ou o estado de sítio, cessarão também seus efeitos, sem prejuízo</p><p>da responsabilidade pelos ilícitos cometidos por seus executores ou agentes.</p><p>Parágrafo único. Logo que cesse o estado de defesa ou o estado de sítio, as medidas aplicadas em sua</p><p>vigência serão relatadas pelo Presidente da República, em mensagem ao Congresso Nacional, com</p><p>especificação e justificação das providências adotadas, com relação nominal dos atingidos e indicação</p><p>das restrições aplicadas.</p><p>DAS FORÇAS ARMADAS</p><p>A Constituição estabelece que “as Forças Armadas são instituições nacionais permanentes e regulares</p><p>que se destinam à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer</p><p>destes, da lei e da ordem” (art. 142).</p><p>Constituem, assim, elemento fundamental da organização coercitiva a serviço do Direito e da paz social.</p><p>Esta nelas repousa pela afirmação da ordem na órbita interna e do prestígio estatal na sociedade das</p><p>nações. São, portanto, os garantes materiais da subsistência do Estado e da perfeita realização de seus</p><p>fins. Em função da consciência que tenham da sua missão está a tranquilidade interna pela estabilidade</p><p>das instituições. E em função de seu poderio que se afirmam, nos momentos críticos da vida</p><p>internacional, o prestígio do Estado e a sua própria soberania.</p><p>A Constituição vigente abre a elas um capítulo do Título V sobre a defesa do Estado e das instituições</p><p>democráticas com a destinação acima referida, de tal sorte que sua missão essencial é a da defesa da</p><p>Pátria e a garantia dos poderes constitucionais, o que vale dizer defesa, por um lado, contra agressões</p><p>estrangeiras em caso de guerra externa e, por outro lado, defesa das instituições democráticas, pois a</p><p>isso corresponde a garantia dos poderes constitucionais, que, nos termos da Constituição, emanam do</p><p>povo (art. 1°, parágrafo único). Só subsidiária e e ventualmente lhes incumbe a defesa da lei e da ordem,</p><p>porque essa defesa é de competência primária das forças de segurança pública, que compreendem a</p><p>polícia federal e as polícias civil e militar dos Estados e do Distrito Federal. Sua interferência na defesa da</p><p>lei e da ordem depende, além do mais, de convocação dos legítimos representantes de qualquer dos</p><p>poderes federais: Presidente da Mesa do Congresso Nacional, Presidente da República ou Presidente do</p><p>Supremo Tribunal Federal. Ministro não é poder constitucional. Juiz de Direito não é poder constitucional.</p><p>Juiz Federal não é poder constitucional. Deputado não é poder constitucional. Senador não é poder</p><p>constitucional. São simples membros dos poderes e não os representam. Portanto, a atuação das Forças</p><p>Armadas convocada por Juiz de Direito ou por Juiz Federal, ou mesmo por algum Ministro do Superior</p><p>Tribunal de Justiça ou até mesmo do Supremo Tribunal Federal é inconstitucional e arbitrária, porque</p><p>estas autoridades, por mais importantes que sejam, não representam qualquer dos poderes</p><p>constitucionais federais.</p><p>Instituições Nacionais Permanentes</p><p>As Forças Armadas são instituições nacionais, permanentes e regulares, organizadas com base na</p><p>hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do</p><p>Presidente da República (art. 142). Foi a</p><p>Constituição de 1891 que as declarou instituições nacionais permanentes (art. 14), o que já se</p><p>encontrava implícito na Constituição imperial de 1824, que se referia a forças militares permanentes de</p><p>mar e terra (art. 146).</p><p>Concebendo-as como instituições nacionais, reconhece-lhes, a Constituição, importância e relativa</p><p>autonomia jurídica decorrente de seu caráter institucional; declarando-as permanentes e regulares,</p><p>vincula-as à própria vida do Estado, atribuindo-lhes a perduração deste.</p><p>Essa posição constitucional das Forças Armadas importa afirmar que não poderão ser</p><p>dissolvidas, salvo por decisão de uma Assembleia Nacional Constituinte. E, sendo regulares,</p><p>significa que deverão contar com efetivos suficientes ao seu funcionamento normal, por via do</p><p>recrutamento constante, nos termos da lei.</p><p>Hierarquia e Disciplina</p><p>As Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema</p><p>do Presidente da República (art. 84, XII).</p><p>Hierarquia é o vínculo de subordinação escalonada e graduada de inferior a superior. Ao dizer-se que as</p><p>Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia sob a autoridade suprema do Presidente da</p><p>República, quer-se afirmar que elas, além da relação hierárquica interna a cada uma das armas,</p><p>subordinam-se em conjunto ao Chefe do Poder Executivo federal, que delas é o comandante supremo</p><p>(art. 84, XIII).</p><p>Disciplina é o poder que têm os superiores hierárquicos de impor condutas e dar ordens aos inferiores.</p><p>Correlativamente, significa o dever de obediência dos inferiores em relação aos superiores. Declarar - se</p><p>que as Forças Armadas são organizadas com base na disciplina vale dizer que são essencialmente</p><p>obedientes, dentro dos limites da lei, a seus superiores hierárquicos, como dizia o art. 14 da Constituição</p><p>de 1891.</p><p>Não se confundem, como se vê, hierarquia e disciplina, mas são termos correlatos, no sentido de que a</p><p>disciplina pressupõe relação hierárquica. Somente se é obrigado a obedecer, juridicamente falando, a</p><p>quem tem poder hierárquico. "Onde há hierarquia, com superposição de vontades, há, correlativamente,</p><p>uma relação de sujeição objetiva, que se traduz na disciplina, isto é, no rigoroso acatamento pelos</p><p>elementos dos graus inferiores da pirâmide hierárquica, às ordens, normativas ou individuais, emanadas</p><p>dos órgãos superiores. A disciplina é, assim, um corolário de toda organização hierárquica". Essa relação</p><p>fundamenta a aplicação de penalidades que ficam imunes ao habeas corpus, nos termos do art. 142, §</p><p>2°, que declara não caber aquele remédio constituci onal em relação a punições disciplinares militares.</p><p>Componentes das Forças Armadas</p><p>As Forças Armadas brasileiras são constituídas pela Marinha pelo Exército e pela Aeronáutica (art. 142).</p><p>No Império, eram compostas apenas das forcas de mar e de terra, formando a Armada e o Exército. O</p><p>aparecimento da aviação, neste século, e seu emprego como arma de guerra, para desgosto de Santos</p><p>Dumont, fez surgir nova organização militar: a Aeronáutica.</p><p>Cada uma das três forças goza de autonomia relativa, subordinadas ao Ministério da Defesa, como</p><p>ocorre nos EUA e em outros países. Todas são, porém, entrosadas hierárquica e disciplinarmente e</p><p>devem ser obedientes a um centro comum, que é o seu comando supremo exercido pelo Presidente da</p><p>República.</p><p>A Obrigação Militar</p><p>Todas as Constituições brasileiras trouxeram normas que definiam as obrigações dos brasileiros</p><p>referentemente à defesa da Pátria. A de 1891 estabeleceu que todo brasileiro era obrigado ao serviço</p><p>militar, em defesa da Pátria e da Constituição, na forma das leis federais. Isso não era ainda o serviço</p><p>militar obrigatório regular, mas nos momentos em que a defesa da Pátria ou da Constituição exigisse a</p><p>convocação de todos. Foi a partir de campanha do poeta Olavo Bilac em favor do serviço militar</p><p>obrigatório para todos que se revelassem aptos, dentro dos limites dos efetivos previstos em lei, por via</p><p>de recrutamento anual, que afinal fora instituída a obrigação de todos servirem numa das Armas que</p><p>compõem as Forças Armadas.</p><p>A Constituição vigente manteve o princípio da obrigatoriedade nos termos do seu art. 143. 0 princípio aí</p><p>estatuído é o de que o serviço militar é obrigatório para todos nos termos da lei. Mas a Constituição</p><p>reconhece a escusa de consciência no art. 5°, VIII, que desobriga o alistado ao serviço militar obrigatório,</p><p>desde que cumpra prestação alternativa. O §1.° do a rt. 143 incumbe às Forças Armadas, na forma da lei,</p><p>atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz, após alistados, alegarem imperativo de</p><p>consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença religiosa e de convicção filosófica ou</p><p>política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente militar. Outras isenções vêm no § 2.°</p><p>do mesmo artigo, ao declarar que as mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar</p><p>obrigatório em tempo de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.</p><p>Em geral, o serviço militar consiste na incorporação do indivíduo às fileiras das tropas, de tiro de guerra</p><p>ou cursos de preparação de oficiais da reserva, para receber adestramento e instruções militares, por</p><p>determinado tempo, desincorporando-se, vencido este, na qualidade de reservista ou oficial da reserva.</p><p>Os outros encargos são os de assistência religiosa, enfermagem etc.</p><p>Pode parecer estranho que a Constituição tenha que determinar a obrigatoriedade de serviços destinados</p><p>à defesa da Pátria a todos os brasileiros, dado que essa defesa já decorreria da própria situação de cada</p><p>um em função de sua exclusiva pertinência à comunidade nacional, o que, por si, implica a necessidade</p><p>ética de cada membro dessa comunidade lutar por sua sobrevivência contra qualquer inimigo.</p><p>Justifica-se, porém, a determinação constitucional, pois se trata de obrigação sumamente onerosa, não</p><p>só por afastar o indivíduo do seio da família e de suas atividades, como por exigir, às vezes, o tributo da</p><p>própria vida. A exigência constitucional tem ainda o sentido de que ninguém poderá deixar de prestar a</p><p>obrigação militar fundado em especial condição social ou religiosa, ainda que agora a escusa de</p><p>consciência em tempo de paz seja reconhecida nos termos vistos acima. Cuida-se de dever infungível,</p><p>como nota Seabra Fagundes, cuja lição nos vem orientando neste passo, e é de caráter estritamente</p><p>pessoal, não comportando, por isso, execução por substituição, como já se admitiu em outros países.</p><p>Aquele que, convocado para o serviço militar, não se apresenta, fica considerado insubmisso, e aquele</p><p>que estiver em serviço e abandoná-lo será tido como desertor, prevendo a lei penas rigorosas para esses</p><p>crimes militares. Se alguém invocar imperativo de consciência para não servir e recusar-se a cumprir</p><p>prestação alternativa, sujeitar-se-á à pena de perda dos direitos políticos (art. 15, IV).</p><p>Segundo o texto Constitucional</p><p>CAPÍTULO II</p><p>DAS FORÇAS ARMADAS</p><p>Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são</p><p>instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob</p><p>a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos</p><p>poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.</p><p>§ 1º - Lei complementar estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e</p><p>no emprego das Forças Armadas.</p><p>§ 2º - Não caberá "habeas-corpus" em relação a punições disciplinares militares.</p><p>§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que</p><p>vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>I - as patentes, com prerrogativas, direitos e deveres a elas inerentes, são conferidas pelo Presidente da</p><p>República e asseguradas em plenitude aos oficiais da ativa, da reserva ou reformados, sendo-lhes</p><p>privativos os títulos e postos militares e, juntamente com os demais membros, o uso dos</p><p>pela tristeza, pessimismo, sentimento de</p><p>culpa. As tentativas de suicídio são frequentes nesta fase melancólica (GENIVAL, 1998, p. 356).</p><p>A psicose carcerária é decorrente da privação da liberdade do indivíduo submetido a estabelecimentos</p><p>carcerários que não dispõem, em sua grande maioria, de condições adequadas de espaço, iluminação e</p><p>alimentação. A pessoa acometida deste mal manifesta a “síndrome crepuscular de Ganser”,</p><p>apresentando sintomas com as seguintes características: estranhas alterações da conduta motora e</p><p>verbal do indivíduo que, quando interrogado, encerra-se em impenetrável mutismo ou passa a exibir para</p><p>respostas (“respostas ao lado”), como se estivera acometido de um estado deficitário orgânico, não raro</p><p>acompanhado de sintomas depressivos ou catatônicos (FERNANDES, 2002, p. 225).</p><p>A personalidade psicopática é caracterizada por uma distorção do caráter do indivíduo. Os indivíduos</p><p>acometidos por tal personalidade geralmente apresentam o seguinte quadro característico: são</p><p>inteligentes, amorais, inconstantes, insinceros; faltam-lhes vergonha e remorso; são egocêntricos,</p><p>inclinados à condutas mórbidas. Citamos como tipos, dentre outros: os explosivos ou epileptóides, os</p><p>perversos ou amorais, os fanáticos e os mitomaníacos.</p><p>Os explosivos ou epileptóides são indivíduos que manifestam em seu comportamento a habitualidade de</p><p>um estado colérico, raivoso, agressivo, tanto verbalmente como fisicamente.</p><p>Os perversos ou amorais são maldosos, cruéis, destrutivos. Tais características revelam-se</p><p>precocemente em crianças, nas tendências à preguiça, inércia, indocilidade, impulsividade, indiferença,</p><p>propensos à criminalidade infanto-juvenil. Na fase adulta, o indivíduo possui grau elevado de inteligência,</p><p>podendo ser observadas mentiras, calúnias, delações, furtos, roubos. Encontram-se no rol dos amorais</p><p>os incendiários, os vândalos, os “vampiros” e os envenenadores (FERNANDES, 2002, p. 209).</p><p>Os fanáticos tendem a um ânimo constante de euforismo, extrema exaltação daquilo que desejam.</p><p>Lutam por seus ideais de forma impulsiva, sem limites, sem controle. São capazes de praticar qualquer</p><p>ato delinquente na busca incessante por seus objetivos.</p><p>Os mitomaníacos, por sua vez, são acometidos de um desequilíbrio da inteligência no tocante à</p><p>realidade. São propensos à mentira, à simulação, à fantasia. Conseguem distorcer, de forma quase</p><p>convincente, a realidade dos fatos, podendo chegar a extremos de delírios e devaneios.</p><p>O estudo da sexualidade anômala ou transtornos da sexualidade interessa à medicina legal, são</p><p>distúrbios caracterizados por degeneração psíquica ou por fatores orgânicos glandulares. Citamos como</p><p>exemplo o sadismo, o masoquismo, a pedofilia, o vampirismo e a necrofilia. O sadismo, também</p><p>chamado algolagnia ativa, é transtorno sexual em que o indivíduo inflige sofrimentos físicos à parceira</p><p>para obter o prazer sexual. O termo tem origem no nome do Marquês de Sade (1740), que acometido do</p><p>mal, o relatou em seus romances Justina e Julieta. O marquês sentia prazer em cortar as carnes de suas</p><p>parceiras e em tratar as chagas das prostitutas (GOMES, 2004, p. 471).</p><p>Já o masoquismo é algolagnia passiva, isto é, o indivíduo só consegue sentir prazer sexual ao sofrer, ao</p><p>ser humilhado. Jean Jacques Rousseau, filósofo francês que viveu nos idos anos de 1712 a 1778,</p><p>bastante conhecido por sua obra Do Contrato Social (onde trabalha a formação e desenvolvimento da</p><p>sociedade civil e do próprio Estado), em um de seus livros publicados após sua morte, Confissões, revela</p><p>ser acometido deste transtorno da sexualidade: “Ajoelhar- se aos pés de uma amante imperiosa,</p><p>obedecer às suas ordens, pedir perdão de faltas que cometera eram para mim gozos divinos “(GOMES,</p><p>2004, p. 471).</p><p>A pedofilia é parafilia caracterizada pela atração por parceiros sexuais crianças ou adolescentes. O</p><p>vampirismo é a aberração venérea na qual a gratificação é alcançada com o degenerado sugando</p><p>obsessivamente o sangue de seu parceiro sexual (CROCE; CROCE JÚNIOR, 2004, p. 681).</p><p>A necrofilia, por sua vez, trata-se de transtorno caracterizado por prática de relações sexuais com</p><p>cadáver. “Alguns necrófilos chegam a violar covas, retirar corpos em decomposição para satisfazerem</p><p>seu instinto” (GOMES, 2004, p. 474).</p><p>CONCLUSÕES</p><p>Muitos outros são os distúrbios e doenças mentais que acometem a pessoa humana e a levam à prática</p><p>de atos ilícitos contra seu semelhante, ademais, como Voltaire nos lembra em seu Tratado de Metafísica,</p><p>muito pouco sabemos sobre o ser humano e sua mente, objetos constantes do conhecimento filosófico,</p><p>jurídico e científico. Muitos mistérios ainda a desvendar. Como dizia Voltaire, poucas pessoas se</p><p>preocupam em ter uma noção do que seja o homem. A única ideia que os camponeses de uma parte da</p><p>Europa têm da nossa espécie é a de um animal de dois pés, de pele trigueira, articulando algumas</p><p>palavras, cultivando a terra, pagando, sem saber por que, tributos a um outro animal a que chama rei,</p><p>vendendo suas colheitas tão caro quanto puder, reunindo-se com outros em certos dias do ano para</p><p>entoar preces numa língua incompreensível. Um rei sempre encara toda a espécie humana como seres</p><p>feitos para obedecer-lhe e aos seus semelhantes (VOLTAIRE, 1978, p. 61).</p><p>Criminologia Científica - Biologia, Sociologia e Ps icologia Criminal.</p><p>Introdução</p><p>Parte das reflexões e das pesquisas sobre aquilo que hoje designamos de comportamentos desviantes,</p><p>delinquentes ou criminosos, consoante as perspectivas teóricas, tem-se traduzido numa única e simples</p><p>questão: por que motivo, ou motivos, alguns indivíduos parecem mais predispostos que outros ao</p><p>cometimento de delitos?</p><p>As respostas têm variado consoante as épocas históricas e o manancial de conhecimentos teóricos e</p><p>empíricos disponível. Num primeiro momento, os comportamentos delinquentes foram explicados através</p><p>do recurso a fatores externos aos homens mas, de alguma forma inexplicáveis, uma vez que foram</p><p>remetidos para as causas sobrenaturais subjacentes a todo o tipo de eventos e de comportamentos. Os</p><p>comportamentos delinquentes, e as suas causas e as suas relações, eram simplesmente atribuídos à</p><p>ação de deuses ou outros poderes sobrenaturais.</p><p>Num segundo momento, os comportamentos delinquentes passaram a ser explicados através do recurso</p><p>a fatores internos ou, melhor dizendo, a qualidades intrínsecas a alguns indivíduos, mesmo que</p><p>relativamente abstratas, como a maldade, a imoralidade, o egoísmo ou a desonestidade. Embora ainda</p><p>persistissem explicações de natureza externa, essencialmente sobrenaturais, a percepção de que alguns</p><p>seres humanos transportavam em si uma incapacidade para se conformar às exigências das sociedades</p><p>modernas, intrinsecamente justas e racionais, começou a tornar-se preponderante.</p><p>Num terceiro momento, já dominado por paradigmas científicos ou «positivos», os comportamentos</p><p>delinquentes passaram a ser explicados através do recurso a características biológicas, psicológicas ou</p><p>sociais específicas e passíveis de serem facilmente observadas e medidas.</p><p>Ao longo deste percurso, apenas um pressuposto se manteve inalterado. Quem se envolve em delitos é,</p><p>necessariamente, diferente, e só essa diferença, seja ela biológica, psicológica ou social, permite</p><p>explicar, e eventualmente prever e prevenir, os comportamentos delinquentes. Este pressuposto marcou</p><p>todas as reflexões teóricas que foram desenvolvidas até quase ao final do século XX.</p><p>No campo da biologia, por exemplo, a diferença foi remetida para atavismos que se manifestavam,</p><p>quer a um nível intelectual, quer a um nível físico. Até pelo menos ao final da segunda grande guerra</p><p>mundial, os atavismos foram concebidos como sendo hereditários, concepção que legitimou, entre outras</p><p>práticas «preventivas», o isolamento dos «criminosos» ou a sua esterilização forçada, por forma a que</p><p>não se pudessem reproduzir, e, no limite, a sua eliminação física.</p><p>No campo da psicologia , a diferença foi remetida, quase invariavelmente, para a questão da</p><p>personalidade e dos seus diferentes traços, o que sustentou toda</p><p>uniformes das</p><p>Forças Armadas; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>II - o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente será transferido</p><p>para a reserva, nos termos da lei; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>III - O militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil</p><p>temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e</p><p>somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contando-se-lhe</p><p>o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois</p><p>anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei; (Incluído pela Emenda</p><p>Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>IV - ao militar são proibidas a sindicalização e a greve; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>V - o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos; (Incluído pela Emenda</p><p>Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>VI - o oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível,</p><p>por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em</p><p>tempo de guerra; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>VII - o oficial condenado na justiça comum ou militar a pena privativa de liberdade superior a dois anos,</p><p>por sentença transitada em julgado, será submetido ao julgamento previsto no inciso anterior; (Incluído pela</p><p>Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>VIII - aplica-se aos militares o disposto no art. 7º, incisos VIII, XII, XVII, XVIII, XIX e XXV e no art. 37,</p><p>incisos XI, XIII, XIV e XV; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>IX - aplica-se aos militares e a seus pensionistas o disposto no art. 40, §§ 7º e 8º; (Redação dada pela</p><p>Emenda Constitucional nº 20, de 11998)(Revogado pela Emenda Constitucional nº 41, de 19.12.2003)</p><p>X - a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras</p><p>condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as</p><p>prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas</p><p>atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra. (Incluído</p><p>pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)</p><p>Art. 143. O serviço militar é obrigatório nos termos da lei.</p><p>§ 1º - às Forças Armadas compete, na forma da lei, atribuir serviço alternativo aos que, em tempo de paz,</p><p>após alistados, alegarem imperativo de consciência, entendendo-se como tal o decorrente de crença</p><p>religiosa e de convicção filosófica ou política, para se eximirem de atividades de caráter essencialmente</p><p>militar.</p><p>§ 2º - As mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar obrigatório em tempo de paz,</p><p>sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir.</p><p>Teorias sociológicas da criminalidade.</p><p>Teorias criminológicas, em geral, têm como objeto quatro elementos: a lei, o criminoso, o alvo e 0 lugar.</p><p>A forma como são classificadas diz respeito aos diversos níveis de explicação, que variam do individual</p><p>ao contextual. As teorias criminológicas que adotam o nível individual de análise partem do pressuposto</p><p>de que o crime - a explicação de suas causas e o controle de sua ocorrência na sociedade - se deve aos</p><p>fatores internos aos indivíduos que os motivam, ou melhor, os impulsionam a cometerem um ato</p><p>criminoso. Variáveis como idade, raça, posição social e educação seriam algumas das medidas</p><p>consideradas fundamentais para explicar a atitude criminosa de um indivíduo.</p><p>A maioria das teorias criminológicas mais importantes são explicações relativamente precisas que</p><p>aspiram a propor dedutivamente hipóteses claras e consistentes entre si e que possam ser submetidas a</p><p>propósitos de refutação e superá-los com êxito.</p><p>Com o surgimento das teorias sociológicas da criminalidade, houve uma bifurcação muito poderosa</p><p>dessas pesquisas em dois grupos principais. Essa divisão leva em consideração, principalmente, a forma</p><p>como os sociólogos encaram a composição da sociedade: consensual ou conflitual.</p><p>Teorias macrossociológicas</p><p>Para a perspectiva das teorias consensuais, a finalidade da sociedade é atingida quando há um perfeito</p><p>funcionamento de suas instituições, de forma que os indivíduos compartilhem os objetivos comuns a</p><p>todos os cidadãos, aceitando as regras vigentes e compartilhando as regras sociais dominantes. Para a</p><p>teoria do conflito, no entanto, a coesão e a ordem na sociedade são fundadas na força e na coerção, na</p><p>dominação por alguns e sujeição de outros; ignora-se a existência de acordos em torno de valores de</p><p>que depende o próprio estabelecimento da força.</p><p>Dentro desses dois grupos vamos encontrar, principalmente, as seguintes teorias: escola de Chicago,</p><p>teoria da associação diferencial, teoria da anomia, teoria da subcultura delinquente, labelling aproach</p><p>(interacionismo simbólico) e teoria critica.</p><p>São consideradas de consenso: escola de Chicago, associação diferencial, anomia e subcultura</p><p>delinquente.</p><p>São conflitivas labelling e a teoria critica.</p><p>Escola de Chicago</p><p>É considerada uma teoria de consenso.</p><p>Pode-se dizer que a criminologia americana, como tal, se iniciou nas décadas de 20 e 30, à sombra da</p><p>Universidade de Chicago, com a teoria ecológica e os múltiplos trabalhos empíricos que inspirou. Na</p><p>linha da obra pioneira de Robert Park e Ernest Burguess (de ambos os autores, Introduction to the</p><p>Science of Sociology, 1921, e The City - 1925) em sede de sociologia, a escola criminológica de Chicago</p><p>encarou o crime como fenômeno ligado a uma área natural. Historicamente coincidente com o período</p><p>das grandes migrações e da formação das grandes metrópoles, teve a escola de Chicago que se afrontar</p><p>com o problema característico do ghetto. As sucessivas ondas de imigrantes arrumavam-se segundo</p><p>critérios rigidamente étnicos, dando origem a comunidades tendencialmente estanques. Parecia, assim,</p><p>natural que se optasse por um modelo ecológico - ou seja, de equilíbrio entre a comunidade humana e o</p><p>ambiente natural - para o enquadramento dos fenômenos sociais.</p><p>Caracterizou-se pelo seu empirismo e sua finalidade pragmática, isto é, pelo emprego da observação</p><p>direta em todas as investigações (da observação dos fatos são induzidas as oportunas teses) e pela</p><p>finalidade pragmática a que se orientavam: um diagnóstico confiável sobre os urgentes problemas sociais</p><p>da realidade norte-americana de seu tempo. Seus representantes iniciais não eram sociólogos nem</p><p>juristas, senão jornalistas, predominando em todo o caso, como setor de procedência, o amplo espectro</p><p>das ciências do espírito.</p><p>A escola de Chicago pode ter seu trabalho melhor compreendido dividindo-o em duas fases: a Primeira</p><p>Escola vai de 1915 a 1940, enquanto a segunda escola vai de 1945 a 1960. O trabalho dessa escola</p><p>explorou a relação entre a organização do espaço urbano e a criminalidade.</p><p>A escola de Chicago se tornou bastante importante para o estudo da criminalidade urbana. As teorias</p><p>estabelecidas por seus sociólogos durante aquele período influenciaram valiosos estudos urbanos sobre</p><p>o crime, que foram posteriormente conduzidos nos Estados Unidos e na Inglaterra. Sua atuação foi</p><p>marcada pelo pragmatismo, e, dentre outras inovações que preconizou, destacam-se o método da</p><p>observação participante e o conceito de ecologia humana.</p><p>A sociologia não estava interessada em fatos, mas em como as pessoas reagiam a eles. Nesse</p><p>compasso, a experiência prática era considerada fundamental, visto que a melhor estratégia de pesquisa</p><p>era aquela em que o pesquisador participava diretamente do objeto de seu estudo. Este método inovador</p><p>e cuja introdução na pesquisa se deve a Escola de Chicago é o da observação participante. Nesse</p><p>método, o observador toma parte no fenômeno social que estuda, o que lhe permite examiná-lo da</p><p>maneira como realmente ocorre. Assim, o conhecimento</p><p>tem por base não a experiência alheia, mas a</p><p>própria experiência do pesquisador.</p><p>A primeira das teorias que eclodem com surgimento da escola de Chicago e a teoria ecológica. Para os</p><p>defensores dessa teoria, a cidade produz delinquência. Existiriam para esses autores até áreas bastante</p><p>definidas, onde a criminalidade se concentra e outras em que seria bastante reduzida.</p><p>A teoria ecológica explica esse efeito criminógeno da grande cidade, valendo-se dos conceitos de</p><p>desorganização e contagia inerentes aos modernos núcleos urbanos e, sobretudo, invocando o</p><p>debilitamento do controle social desses núcleos. A deterioração dos grupos primários (família etc.), a</p><p>modificação qualitativa das relações interpessoais que se tornam superficiais, a alta mobilidade e a</p><p>consequente perda de raízes no lugar de residência, a crise dos valores tradicionais e familiares, a</p><p>superpopulação, a tentadora proximidade às áreas comerciais e industriais onde se acumula riqueza e o</p><p>citado enfraquecimento do controle social criam um meio desorganizado e criminógeno.</p><p>Teoria das zonas concêntricas</p><p>Para a teoria das zonas concêntricas as cidades não crescem em seus limites, mas tendem a se</p><p>expandir a partir do seu centro e de formas concêntricas denominadas zonas.</p><p>A Zona II é a área imediatamente em torno da Zona I e representa a transição do distrito comercial para</p><p>as residências. Normalmente ocupada pelas pessoas mais pobres é a chamada zona em transição ou,</p><p>ainda, zona de transição. A Zona III contém residências de trabalhadores que conseguiram escapar das</p><p>péssimas condições de vida da Zona II, sendo composta geralmente pela segunda geração de</p><p>imigrantes. A Zona IV chamada de suburbia, é formada por bairros residenciais e é caracterizada por</p><p>casas e apartamentos de luxo. É onde residem as classes média e alta. A Zona V denominada exurbia,</p><p>fica além dos limites da cidade e contém áreas suburbanas e cidades-satélites. É habitada por pessoas</p><p>que trabalham no centro e despendem um tempo razoável no trajeto entre casa e trabalho. Esta área não</p><p>é caracterizada por residências proletárias. Ao contrário, normalmente é composta de casas de classe</p><p>média -alta e alta. O conceito de subúrbio das cidades norte-americanas é diverso do das cidades da</p><p>América Latina. Enquanto nas cidades latino-americanas o subúrbio é usualmente caracterizado por ser</p><p>uma área pobre, nos EUA, é onde residem pessoas de alto padrão socioeconômico.</p><p>Pesquisadores consideravam a Zona II como de particular interesse, eis que era a área que as</p><p>estatísticas indicavam com maior incidência de crime. Eles observaram que a expansão do bairro central</p><p>acarretava no deslocamento dos residentes da Zona II. Foi dessa época que surgiram os estudos de um</p><p>dos subprodutos da Zona II e que também é um dos temas centrais da Criminologia hoje: as gangues. As</p><p>gangues e a delinquência juvenil são problemas graves e que desafiam a intervenção que a sociedade (e</p><p>a própria Criminologia) prevê para esses casos.</p><p>Podemos considerar que o esquema de divisão da cidade em cinco zonas características é mero artifício</p><p>didático, posto que nenhum processo pode ser apontado estatisticamente. Cada uma dessas zonas</p><p>encontra -se em expansão, o que resulta na expansão da cidade como um todo. Nesse processo, porém,</p><p>uma área forçosamente invade a outra para fazer sua expansão. Assim, a zona comercial para crescer</p><p>tem de invadir a zona adjacente, impingindo-Ihe sempre um caráter transitório, posto que sempre</p><p>comportando elementos da Zona I (comércio e indústria) e da Zona II (residências). Esse aspecto da</p><p>expansão urbana pode ser denominado de sucessão, importante princípio ecológico.</p><p>Em resumo: com a escola de Chicago, a Criminologia abandonou o paradigma até então dominante do</p><p>positivismo criminológico, do delinquente nato de Lombroso, e girou para as influências que o ambiente,</p><p>e no presente caso, que as cidades podem ter no fenômeno criminal. Ganhou-se qualidade</p><p>metodológica. Com os estudos da escola de Chicago criou-se também o ambiente cultural para as</p><p>teorias que se sucederam e que são a feição da moderna Criminologia.</p><p>Foi a sociologia americana, em especial, com a escola de Chicago, que passou a utilizar os social</p><p>surveys (inquéritos sociais) na investigação da criminalidade. É um importante instrumento para o</p><p>conhecimento do índice real da criminalidade de uma cidade ou bairro.</p><p>Teoria da associação diferencial</p><p>É considerada uma teoria de consenso.</p><p>Foi iniciada por Edwin Sutherland, um dos sociólogos que mais influenciou a Criminologia moderna,</p><p>tendo se inspirado, em parte, nas ideias de Gabriel Tarde. Sutherland, que nasceu em 1883 e viveu até</p><p>1950, teve seu primeiro contato com a Criminologia no início do século XX, com a escola de Chicago,</p><p>sendo por ela influenciado.</p><p>No final dos anos 30, Sutherland cunha a expressão white collar crimes, que passa a identificar os autores</p><p>de crimes diferenciados, que apresentavam pontos acentuados de dessemelhança com os criminosos</p><p>chamados comuns. Dez anos mais tarde, em 1949, revê parcialmente sua teoria, chegando a uma</p><p>formulação mais próxima da que conhecemos hoje.</p><p>Segundo Edwin Sutherland, a associação diferencial é o processo de aprender alguns tipos de</p><p>comportamento desviante, que requer conhecimento especializado e habilidade, bem como a inclinação</p><p>de tirar proveito de oportunidades para usá-las de maneira desviante. Tudo isso é aprendido e promovido</p><p>principalmente em grupos tais como gangues urbanas ou grupos empresariais que fecham os olhos a</p><p>fraudes, sonegação fiscal ou usa de informações privilegiadas no mercado de capitais.</p><p>A teoria da associação diferencial parte da ideia segundo a qual o crime não pode ser definido</p><p>simplesmente como disfunção ou inadaptação das pessoas de classes menos favorecidas, não sendo</p><p>ele exclusividade destas. Em certo sentido, ainda que influenciado pelo pensamento da desorganização</p><p>social de William Thomas, Sutherland supera o conceito acima para falar de uma organização diferencial</p><p>e da aprendizagem dos valores criminais. A vantagem dessa teoria é que, ao contrario do positivismo,</p><p>que estava centrado no perfil biológico do criminoso, tal pensamento traduz uma grande discussão dentro</p><p>da perspectiva social. O homem aprende a conduta desviada e associa-se com referência nela.</p><p>Teoria da Associação Diferencial de Sutherland</p><p>Segundo Molina e Gomes, a teoria da associação diferencial de Sutherland é resumida com nove</p><p>proposições.</p><p>1) A conduta criminal se aprende, como se aprende também o comportamento virtuoso ou qualquer outra</p><p>atividade: os mecanismos são idênticos em todos os casos.</p><p>2) A conduta criminal se aprende em interação com outras pessoas, mediante um processo de</p><p>comunicação. Requer, pois, uma aprendizagem ativa por parte do indivíduo. Não basta viver em um meio</p><p>criminógeno, nem manifestar, é evidente, determinados traços da personalidade ou situações</p><p>frequentemente associadas ao delito. Não obstante, em referido processo participam ativamente,</p><p>também, os demais.</p><p>3) A parte decisiva do citado processo de aprendizagem ocorre no seio das relações mais íntimas do</p><p>indivíduo com seus familiares ou com pessoas do seu meio. A influência criminógena depende do grau</p><p>de intimidade do contato interpessoal.</p><p>4) A aprendizagem do comportamento criminal inclui também a das técnicas de cometimento do delito,</p><p>assim como a da orientação específica das correspondentes motivações, impulsos, atitudes e da própria</p><p>racionalização (justificação) da conduta delitiva.</p><p>5) A direção específica dos motivos e dos impulsos se aprende com as definições mais variadas dos</p><p>preceitos legais, favoráveis ou desfavoráveis a eles. A resposta aos mandamentos legais não é uniforme</p><p>dentro do corpo social, razão pela qual o indivíduo acha-se em permanente contato com outras pessoas</p><p>que têm diversos pontos de vista quanto à conveniência de acatá-los. Nas sociedades pluralistas, dito</p><p>conflito de valorações é inerente ao próprio sistema e constitui a base e o fundamento da teoria</p><p>sutherlaniana da associação</p><p>diferencial.</p><p>6) Uma pessoa se converte em delinquente quando as definições favoráveis à violação da lei superam as</p><p>desfavoráveis, isto é, quando por seus contatos diferenciais aprendeu mais modelos criminais que</p><p>modelos respeitosos ao Direito.</p><p>7) As associações e contatos diferenciais do indivíduo podem ser distintas conforme a frequência,</p><p>duração, prioridade e intensidade dos mesmos. Contatos duradouros e frequentes, é lógico, devem ter</p><p>maior influência pedagógica, mas que outros fugazes ou ocasionais, do mesmo modo que o impacto que</p><p>exerce qualquer modelo nos primeiros anos de vida do homem costuma ser mais significativo que o que</p><p>tem lugar em etapas posteriores; o modelo é tanto mais convincente para o indivíduo quanto maior seja o</p><p>prestígio que este atribui à pessoa ou grupos cujas definições e exemplos, aprende.</p><p>8) Precisamente porque o crime se aprende, isto é, não se imita, o processo de aprendizagem do</p><p>comportamento criminal mediante contato diferencial do indivíduo com modelos delitivos e não delitivos</p><p>implica a aprendizagem de todos os mecanismos inerentes a qualquer processo deste tipo.</p><p>9) Embora a conduta delitiva seja uma expressão de necessidades e de valores gerais, não pode ser</p><p>explicada como concretização deles, já que também a conduta adequada ao Direito corresponde a</p><p>idênticas necessidades e valores.</p><p>Teoria da anomia</p><p>É considerada uma teoria de consenso. A anomia é um dos temas mais estudados pela moderna</p><p>Criminologia.</p><p>A anomia e uma situação social onde falta coesão e ordem, especialmente no tocante a normas e</p><p>valores. Se as normas são definidas de forma ambígua, por exemplo, ou são implementadas de maneira</p><p>causal e arbitrária; se uma calamidade como a guerra subverte o padrão habitual da vida social e cria</p><p>uma situação em que se torna obscuro quais normas têm aplicação; ou se um sistema é organizado de</p><p>tal forma que promove o isolamento e a autonomia do individuo a ponto das pessoas se identificarem</p><p>muito mais com seus próprios interesses do que com os do grupo ou da comunidade como um todo - o</p><p>resultado poderá ser a anomia, ou falta de normas.</p><p>Como exemplo prático disso, podemos tomar a situação de dificuldade de controle da ordem pública que</p><p>a força de paz da ONU enfrenta no Haiti. O colapso do governo anterior gerou uma situação de anomia</p><p>nos país (ex.: saques, estupros e violações de direitos humanos, como torturas e aumento dos</p><p>homicídios). E uma situação de caos, onde os índices de criminalidade encontram terreno propício para</p><p>forte elevação. Não será fácil a tarefa de restabelecer a ordem pública no Haiti. O Iraque é outro exemplo</p><p>a ser citado.</p><p>No âmbito das teorias mais propriamente sociológicas, o princípio do bem e do mal foi posto em dúvida</p><p>pela teoria estrutural-f uncionalista da anomia e da criminalidade. Esta teoria, introduzida pelas obras</p><p>clássicas de Emile Durkheim e desenvolvida por Robert Merton, representa a virada em direção</p><p>sociológica efetuada pela Criminologia contemporânea. Constitui a primeira alternativa clássica a</p><p>concepção dos caracteres diferenciais biopsicológicos do delinquente e, por consequência, a variante</p><p>positivista do princípio do bem e do mal. Nesse sentido, a teoria funcionalista da anomia está na origem</p><p>de uma profunda revisão crítica da Criminologia de orientação biológica e caracterológica, na origem de</p><p>uma direção alternativa que caracteriza todas as teorias Criminológicas das quais se tratara mais adiante.</p><p>Da abordagem sociológica do suicídio nas obras de Durkheim, podemos destacar uma regra geral:</p><p>quando se criam na sociedade espaços anomicos, ou seja, quando um indivíduo ou um grupo perde as</p><p>referencias normativas que orientavam a sua vida, então enfraquece a solidariedade social, destruindo-se</p><p>o equilíbrio entre as necessidades e os meios para sua satisfação. O indivíduo sente-se livre de vínculos</p><p>sociais, tendo, muitas vezes, um comportamento antissocial ou inclusive autodestrutivo.</p><p>Segundo Figueiredo Dias, a teoria da anomia e uma versão criminológica das teorias funcionalistas em</p><p>sociologia, que tiveram em The Social System (1950), de T. Parsons, a sua expressão mais acabada. A</p><p>teoria da anomia foi, pela primeira vez, enunciada por Robert Merton, em 1938, num artigo publicado na</p><p>American Sociological Review, sob o titulo de Social Stroctre and Anomie. A teoria da anomia radica a</p><p>explicação do crime no defasamento entre a estrutura cultural e a estrutura social. A primeira impõe a</p><p>todos os cidadãos a persecução dos mesmos fins e prescreve para todos os mesmos meios legítimos. A</p><p>segunda reparte desigualmente as possibilidades de acesso a estes meios e induz, por isso, o recurso a</p><p>meios ilegítimos. Noutros termos, o crime é, segundo Merton, uma das formas individuais de adaptação</p><p>no quadro de uma sociedade agônica em torno de meios escassos. Na mesma linha se mantém, entre</p><p>outras, a obra de A. Cloward e L. Ohlin, Deliquency and Opportunity A Theory of Deliquent Gangs (1960),</p><p>com a particularidade de encarar o crime como solução coletiva e subcultural.</p><p>Robert King Merton foi quem deu melhor desenvol vimento ao conceito de anomia. E, embora tenha sido</p><p>enunciada pela primeira vez em 1938, você poderá constatar a seguir que a mesma pode auxiliar</p><p>também a compreensão do fenômeno criminal na atualidade.</p><p>Merton afirma que em todo contexto sociocultural desenvolvem-se metas culturais. Estas expressam os</p><p>valores que orientam a vida dos indivíduos em sociedade. Coloca-se então uma questão: como uma</p><p>pessoa pode atingir essas metas? Merton diz que, para tal efeito, cada sociedade estabelece meios.</p><p>Trata-se de recursos institucionalizados ou legítimos que são socialmente prescritos. Existem também</p><p>outros meios que permitem atingir estas mesmas metas, mas que são rejeitados pelo grupo social. A</p><p>utilização destes últimos é considerada como violação das regras sociais em vigor.</p><p>O insucesso em atingir as metas culturais devido à insuficiência dos meios institucionalizados pode</p><p>produzir o que Merton chama de anomia: manifestação de um comportamento no qual as regras do jogo</p><p>social são abandonadas ou contornadas. O indivíduo não respeita as regras do comportamento que</p><p>indicam os meios de ação socialmente aceitos. Surge então o desvio, ou seja, o comportamento</p><p>desviante.</p><p>Não sabemos exatamente quais fatores levam algumas pessoas a cometerem infrações criminais ou</p><p>não. Mas, em entrevistas individuais, algumas vezes encontramos casos de pessoas que simplesmente</p><p>praticam o delito porque entenderam que é o caminho mais rápido para alcançarem a riqueza e/ou o</p><p>prestígio. E aqui posso citar um caso relativamente comum no leste de Minas Gerais, de jovens que</p><p>passam a trabalhar na ilicitude do envio de pessoas para trabalhar ilegalmente em outros países,</p><p>algumas vezes falsificando passaportes, comprando vistos de entrada de passaportes originais,</p><p>emprestando dinheiro à juros extorsivos para as famílias iniciarem a viagem ao país de destino,</p><p>extorsões etc. Esses jovens preferiram abandonar a tentativa de progredir socialmente pelos meios</p><p>institucionalizados (ex.: trabalho) e optaram por chegar ao sucesso e prestígio com condutas criminais.</p><p>Para eles, o risco de serem processados e condenados vale a pena. Em tempo relativamente curto,</p><p>passam a comprar carros importados, frequentar colunas sociais, organizar festas de arromba etc. Não</p><p>são também incomuns os casos de pessoas que se envolvem em quadrilhas de extorsão mediante</p><p>sequestro e trafico de drogas com o mesmo objetivo. Muitas vezes elas não passam por dificuldades</p><p>financeiras, mas escolhem esse caminho - o do comportamento desviante - para atingir a meta cultural</p><p>da riqueza e do sucesso.</p><p>Então, basicamente no conceito de anomia de Merton, temos um conflito de dois pontos: metas culturais</p><p>(ex.: riqueza, sucesso, status profissional etc.) versus meios institucionalizados. Merton criou então um</p><p>esquema onde ele explica os meios de adaptação dos indivíduos, que chamou de modos de adaptação,</p><p>e que são cinco: conformidade, inovação, ritualismo, evasão e rebelião. O sinal positivo</p><p>sinaliza quando o</p><p>indivíduo aceita o meio institucionalizado ou meta cultural. O sinal negativo é quando não os aceita.</p><p>Vejamos então o esquema de Merton:</p><p>Modos de Adaptação Metas culturais Meios institucionalizados</p><p>Conformidade + +</p><p>Inovação + -</p><p>Ritualismo - +</p><p>Evasão - -</p><p>Rebelião + - + -</p><p>Classificação da Anomia de Robert Merton (modos de adaptação)</p><p>Conformidade: também chamado de comportamento modal. Aqui o indivíduo aceita os meios sociais</p><p>institucionais para alcançar as metas culturais. Ele adere totalmente ao comportamento aceito e</p><p>esperado pela sociedade e não apresenta comportamento desviante. Os demais comportamentos são</p><p>não modais ou desviantes e sinalizam a ocorrência de anomia.</p><p>Inovação: na inovação o indivíduo aceita as metas culturais, mas não os meio institucionalizados.</p><p>Quando o indivíduo verifica que não estão acessíveis a ele todos os meios institucionais, ele rompe com</p><p>o sistema e passa ao desvio para atingir as metas culturais.</p><p>Ritualismo: neste modelo o indivíduo vê com descaso o atendimento das metas socialmente</p><p>dominantes. Por um motivo ou outro, a pessoa acredita que nunca atingira as metas culturais, e mesmo</p><p>assim continua respeitando as regras sociais, mas agindo como uma espécie de ritual. É um conformista.</p><p>Neste modelo há uma focalização nos meios e não nos objetivos sociais.</p><p>Evasão: neste conjunto encontramos os párias, mendigos, bêbados e drogados crônicos, etc. Enquanto</p><p>para Merton o conformismo era o modo de adaptação mais comum, a evasão já é o modo mais raro.</p><p>Neste modelo o indivíduo vive num determinado ambiente social, mas não adere às suas normas sociais,</p><p>nem aos meios institucionais e nem a metas culturais. E um comportamento claramente anômico.</p><p>Rebelião: consiste na rejeição das metas e dos meios dominantes - julgados como insuficientes ou</p><p>inadequados - e na luta pela sua substituição. A conduta da rebelião busca assim a configuração de uma</p><p>nova ordem social. Por essa razão, Merton entende que essa conduta não pode ser considerada</p><p>especificamente como negativa, utilizando simultaneamente como símbolos os sinais positivos e</p><p>negativos. Exemplos claros da conduta de rebelião constituem os movimentos de revolução social.</p><p>Três elementos básicos emergem desta construção teórica: objetivos (ou fins) culturais, normas</p><p>institucionalizadas e oportunidades reais. Eles são independentes, mas podem, em variações</p><p>autônomas, provocar estados de defasagem recíproca. Em relação às defasagens dos elementos da</p><p>estrutura cultural, elas podem oscilar entre duas situações-limite, expressando as formas mais sérias de</p><p>desintegração cultural. De um lado, está a sociedade que atribui excessivo valor aos fins e relega a</p><p>segundo plano as normas, a procura do sucesso a qualquer preço. De outro, a sociedade que concede</p><p>prioridade aos meios e descuida dos objetivos, caindo na armadilha da conformidade absoluta e do</p><p>apego desmedido à tradição como valores dominantes.</p><p>Teoria da subcultura delinquente</p><p>É considerada uma teoria de consenso.</p><p>O criador dessa teoria foi o sociólogo norte-americano Albert K. Cohen e teve como marco o ano de</p><p>lançamento de seu livro Deliquent boys, em 1955.</p><p>A subcultura é uma cultura associada a sistemas sociais (incluindo subgrupos) e categorias de pessoas</p><p>(tais como grupos étnicos) que fazem parte de sistemas mais vastos, como organizações formais,</p><p>comunidades ou sociedades. Bairros étnicos urbanos - variando de indianos em Londres e muçulmanos</p><p>em Paris, a americanos em Hong Kong ou chineses em Nova York compartilham frequentemente de</p><p>linguagens, ideias e práticas culturais que diferem das seguidas pela comunidade geral, mas, ao mesmo</p><p>tempo, sofrem pressão para conformar-se, em certo grau, a cultura mais vasta na qual esta enraizada a</p><p>subcultura. O mesmo fato pode acontecer também em sistemas sociais menores, como grandes</p><p>empresas, departamentos do governo ou unidades militares, que se aglutinam muitas vezes em torno de</p><p>interesses especializados ou de laços criados por interações diárias e interdependência mútua.</p><p>As teorias subculturais sustentam três ideias fundamentais: o caráter pluralista e atomizado da ordem</p><p>social, a cobertura normativa da conduta desviada e a semelhança estrutural, em sua gênese, do</p><p>comportamento regular e irregular. A premissa dessas teorias subculturais é, antes de tudo, contrária à</p><p>imagem monolítica da ordem social que era oferecida pela Criminologia tradicional. A referida ordem</p><p>social, a teor deste novo modelo, é um mosaico de grupos, subgrupos, fragmentado, conflitivo; cada</p><p>grupo ou subgrupo possui seu próprio código de valores, que nem sempre coincidem com os valores</p><p>majoritários e oficiais, e todos cuidam de fazê-los valer diante dos restantes, ocupando o correspondente</p><p>espaço oficial.</p><p>Aqui podemos identificar os fundamentos dessa teoria (ou teorias, porquanto existem variantes) nos</p><p>casas das gangues de delinquência juvenil. Ao participar de uma gangue, o jovem passa a aceitar os</p><p>valores daquele grupo, fazendo-os valer para si, em muitos casos, mais que os valores sociais</p><p>dominantes.</p><p>Uma subcultura profissional muito estudada pela Criminologia na atualidade é a policial. Os policiais</p><p>trabalham com o perigo diariamente em sua profissão. Possuem laços de relacionamento muito fortes</p><p>com a corporação. O chamado espírito de corpo dos policiais é um reflexo claro do dever de lealdade que</p><p>os seus membros devem ter com a subcultura policial. O membro que desrespeita esse espírito de corpo</p><p>esta fadado a ser isolado do convívio dos demais policiais e familiares. Passa a ser evitado e visto com</p><p>reservas pelos colegas, mesmo quando faz legalmente uma denúncia de desvio de comportamento ilegal</p><p>de algum membro de sua unidade. Sem o estudo profundo da subcultura profissional policial é difícil criar</p><p>mecanismos mais eficientes para se controlar a criminalidade derivada da corrupção policial.</p><p>A conduta delitiva para as teorias subculturais diferentemente do que sustentavam as teses ecológicas -</p><p>não seria produto da desorganização ou da ausência de valores, senão reflexo e expressão de outros</p><p>sistemas de normas e valores distintos: os subculturais. Teria, portanto, um respaldo normativo. Assim,</p><p>tanto a conduta normal, regular e adequada ao Direito, como a irregular, desviada e delitiva seriam</p><p>definidas em relação aos respectivos sistemas sociais de normas e valores oficiais e subculturais, isto é,</p><p>contariam com uma estrutura e significação muito semelhante, visto que o autor, em última análise</p><p>(delinquente ou não delinquente), o que faz é refletir com sua conduta o grau de aceitação e</p><p>interiorização dos valores da cultura ou subcultura a qual pertence (não por decisão própria), valores que</p><p>se interiorizam - reforçam e transmitem - mediante idênticos mecanismo de aprendizagem e socialização,</p><p>tanto no caso de conduta normal ou regular como no de conduta irregular ou desviada.</p><p>Teoria do labelling aproach/ interacionismo simbólico, etiquetamento ou</p><p>rotulação.</p><p>É considerada um dos marcos das teorias de conflito.</p><p>A teoria do etiquetamento rompeu paradigmas. Ela deu um giro profundo na forma de se analisar o</p><p>crime. Deixou de centrar estudos no fenômeno delitivo em si e passou a focar suas atenções na reação</p><p>social proveniente da ocorrência de um determinado delito.</p><p>Os principais representantes dessa linha de pensamento são Erving Goffman e Howard Becker.</p><p>Seguindo Becker, os grupos sociais criam os desvios ao fazerem as regras cuja infração constitui o</p><p>desvio e ao aplicarem tais regras a certas pessoas em particular, qualificando-as como marginais. Os</p><p>processos de desvios, assim, podem ser considerados primários e secundários. O desvio primário</p><p>corresponde a primeira ação delitiva do sujeito, que pode ter como finalidade resolver alguma</p><p>necessidade, por exemplo, econômica, ou produz -se para acomodar sua conduta às expectativas de</p><p>determinado grupo subcultural. O desvio secundário se refere a repetição dos atos delitivos,</p><p>especialmente a partir da associação forçada do individuo com outros sujeitos</p><p>delinquentes.</p><p>A tese central dessa corrente pode ser definida, em termos muito gerais, pela afirmação de que cada um</p><p>de nós se torna aquilo que os outros veem em nós e, de acordo com essa mecânica, a prisão cumpre</p><p>uma função reprodutora: a pessoa rotulada como delinquente assume, finalmente, o papel que lhe é</p><p>consignado, comportando-se de acordo com o mesmo. Todo o aparato do sistema penal esta preparado</p><p>para essa rotulação e para o reforço desses papéis.</p><p>Como exemplo nítido dessa situação podemos citar o personagem Carlito Brigante, representado par AI</p><p>Pacino em 0 Pagamento Final ( Carlito’s Way ) filme dirigido por Brian de Palma, em 1993. Nesse filme,</p><p>Carlito é traficante de drogas e consegue sair da cadeia com uma brecha da lei. Ele tenta então dar um</p><p>novo rumo à sua vida, mas seus ex-colegas do crime, a polícia, sua família e o resto do sistema</p><p>rotularam Carlito como "criminoso". Uma linha invisível vai conduzindo a vida de Carlito, até o mesmo se</p><p>enquadrar novamente em seu rótulo.</p><p>Surgida nos Estados Unidos par volta dos anos 70, o labelling approach privilegia, na análise do</p><p>comportamento desviado, o funcionamento das instâncias de controle social (criminalização secundária),</p><p>ou seja, a reação social aos comportamentos assim etiquetados. Crime e reação social são, segundo</p><p>esse enfoque, manifestações de uma só realidade: a interação social. Não há como compreender o</p><p>crime senão em referência aos controles sociais.</p><p>De acordo com essa perspectiva interacionista, não se pode compreender o crime prescindindo da</p><p>própria reação social, do processo social de definição ou seleção de certas pessoas e condutas</p><p>etiquetadas como delitivas. Delito e reação social são expressões interdependentes, recíprocas e</p><p>inseparáveis. O desvio não é uma qualidade intrínseca da conduta, senão uma qualidade que lhe é</p><p>atribuída por meio de complexos processos de interação social, processos estes altamente seletivos e</p><p>discriminatórios.</p><p>Do ponto de vista metodológico, há que se realçar a importância da descoberta do defasamento</p><p>quantitativo e, sobretudo, qualitativo entre a delinquência potencial (ou secreta) e a delinquência real. Tal</p><p>fato permitiu ao labelling, por um lado, contestar os fundamentos epistemológicos da criminologia</p><p>tradicional e, por outro lado, retirar a ideia de delinquência de sua dimensão ontológica. O que os</p><p>delinquentes têm em comum, o que verdadeiramente os caracteriza, é apenas a resposta das audiências</p><p>de controle. Ou seja, não e o crime em si que vai ser o ponto central da visão criminológica, mas sim a</p><p>respectiva reação social que e deflagrada com a prática do ato pelo delinquente. Temos um giro nos</p><p>sistema que sai do crime para a reação social ao mesmo.</p><p>Deslocando o problema criminológico do plano de ação para o da reação social - dos bad actors para os</p><p>powerful reactors – o labelling erige as "audiências sociais em variáveis críticas do estudo da deviance”,</p><p>segundo a expressiva formulação de Erikson. Noutros termos, toda a investigação interacionista gravita</p><p>em torno da problematização da estigmatização, assumida como variável dependente (quais os critérios</p><p>em nome dos quais certas pessoas, e só elas, são estigmatizadas como delinquentes?), quer como</p><p>variável independente (quais as consequências desta estigmatização?). Nesse plano de ideias podemos</p><p>citar o caso de envolvimento de agentes de classes mais humildes com a contravenção penal de</p><p>embriaguez no Brasil.</p><p>Com as teorias da criminalidade e da reação penal baseadas sobre o labelling approach e com as teorias</p><p>conflituais, tem lugar no âmbito da sociologia criminal contemporânea a passagem da criminologia liberal</p><p>para a criminologia crítica. Uma passagem, como parece evidente, que ocorre lentamente e sem uma</p><p>verdadeira solução de continuidade. A recepção alemã do labelling approach em particular é um</p><p>momento importante dessa passagem. Essa direção de pesquisa parte da consideração de que não se</p><p>pode compreender a criminalidade se não se estuda a ação do sistema penal que a define e reage contra</p><p>ela, começando pelas normas abstratas até as instâncias oficiais (polícia, juízes, instituições</p><p>penitenciárias que as aplicam), e que, por isso, o status social do delinquente pressupõe,</p><p>necessariamente, o efeito da atividade das instâncias oficiais de controle social da delinquência,</p><p>enquanto não adquire esse status aquele que, apesar de ter realizado o mesmo comportamento punível,</p><p>não é alcançado, todavia, pela ação daquelas instâncias. Portanto, este não é considerado e tratado pela</p><p>sociedade como delinquente.</p><p>O discurso jurídico-penal ficou irremediavelmente desqualificado pela demonstração incontestável de sua</p><p>falácia, enquanto a criminologia etiológica, complemento teórico sustentador desse discurso, viu-se</p><p>irreversivelmente desmentida. A parir dessas contribuições teóricas, o sistema penal já não podia</p><p>permanecer fora dos limites da Criminologia, convertendo-se em seu objeto necessário ao revelar-se</p><p>como mecanismo reprodutor da realidade criminal. Por isso, afirmamos que as investigações</p><p>interacionistas e fenomenológicas constituem o golpe deslegitimador mais forte recebido pelo exercício</p><p>de poder do sistema penal, do qual o discurso jurídico-penal não mais poderá recuperar-se, a não ser</p><p>fechando-se hermeticamente a qualquer dado de realidade, por menor que seja, isto é, estruturando-se</p><p>como um delírio social.</p><p>Não interessam, enfim, à perspectiva interacionista as causas da desviação primária, mas só os</p><p>processos de criminalização secundária, vale dizer, os processos de funcionamento de reação e controle</p><p>sociais, que são, em última análise, os responsáveis pelo surgimento do desvio como tal. Ou seja, para o</p><p>interacionismo, o delito é apenas um rótulo social derivado do processo de etiquetamento.</p><p>Teoria crítica, radical ou "nova criminologia"</p><p>É considerada teoria de conflito.</p><p>Essa perspectiva criminológica - a mais recente – afirmou- se em plena década de 1970. Ela surgiu quase</p><p>ao mesmo tempo nos Estados Unidos e na Inglaterra, irradiando depois para a generalidade dos países</p><p>europeus - sobretudo Alemanha, Itália, Holanda, França e países Nórdicos -, para o Canadá etc.</p><p>O ramo americano da criminologia radical desenvolveu -se sobretudo a partir da escola criminológica de</p><p>Berkeley (com os Schwendinger e T. Platt). Criou a organização, a Union of Radical Criminologists, e a</p><p>sua revista própria, Crime and Social Justice. Na Inglaterra, a criminologia radical, organizada em torno</p><p>da National Deviance Conference, é encabeçaada por I. Taylor, P. Walton e J. Young, autores do mais</p><p>conhecido tratado de criminologia desse tipo, The New Criminology: For a Social Theory of Deviance</p><p>(1973) e organizadores da coletânea Critical Criminology (l975).</p><p>O Grupo de Berkeley surge como reação aos objetivos básicos da escola de Criminologia que se</p><p>consubstanciava na formação de técnicos e profissionais treinados para a luta contra o crime. Tratava-se</p><p>de um confronto entre os interesses básicos do Estado, em sua política de criação de novos profissionais</p><p>para o exercício do controle funcional da criminalidade, e os teóricos universitários que queriam a</p><p>redefinição do próprio objeto da Criminologia.</p><p>A National Deviance Conference nasce como uma reação ao pragmatismo da criminologia europeia, na</p><p>busca da visão interdisciplinar associada à sociologia, e com uma postura crítica ao positivismo e às</p><p>posições reformistas e correcionais da criminologia tradicional. O grupo inglês entende que a solução</p><p>para a redução da criminalidade passa pela extinção da exploração econômica e da opressão das</p><p>classes políticas. Em resumo: a criminologia radical se apresenta expressamente como uma criminologia</p><p>marxista.</p><p>As bases dessa linha de pensamento se materializaram na crítica às posturas tradicionais da criminologia</p><p>do consenso, incapazes de compreender a totalidade do fenômeno criminal. A premissa do pensamento</p><p>estava indubitavelmente ancorada no pensamento marxista, pois sustentava ser a delito um fenômeno</p><p>dependente do modo de produção capitalista.</p><p>Todavia, sabemos hoje que até na antiga União Soviética</p><p>havia crime durante o comunismo. A China comunista (mesmo com abertura) hoje enfrenta com mão de</p><p>ferro a criminalidade, utilizando a pena de morte com excessivo rigor para o controle da criminalidade do</p><p>país. Há notícia de 2004 que cerca de 10 mil pessoas são condenadas à morte e executadas anualmente</p><p>na China. Então, não há como acusar de forma simplista que o capitalismo é o principal gerador da</p><p>criminalidade. Tanto no comunismo mais denso e fechado da antiga URSS como no comunismo</p><p>mesclado com a abertura da China, há muita criminalidade também. Nesse contexto, e bastante provável</p><p>também que a máfia russa já operasse naquele país na época do comunismo, talvez não com a ousadia</p><p>de hoje.</p><p>De qualquer modo, é quando o enfoque macrossociológico se desloca do comportamento desviante para</p><p>os mecanismos de controle social dele, em especial para o processo de criminalização, que o momento</p><p>crítico atinge sua maturação na Criminologia, e ela tende a transformar-se de uma teoria da criminalidade</p><p>em uma teoria crítica e sociológica do sistema penal. De modo que, deixando de lado possíveis</p><p>diferenciações no seu interior, ela se ocupa hoje em dia, fundamentalmente, da análise dos sistemas</p><p>penais vigentes.</p><p>A atenção da nova criminologia - da criminologia crítica - se dirigiu principalmente para o processo de</p><p>criminalização, identificando nele um dos maiores nós teóricos e práticos das relações sociais de</p><p>desigualdades próprias da sociedade capitalista, e perseguindo, como um de seus objetivos principais,</p><p>estender ao campo do Direito Penal, de modo rigoroso, a critica do direito desigual.</p><p>Igualmente expressiva foi a ruptura metodológica e epistemológica com a criminologia tradicional. Ela</p><p>significa, desde logo, o abandono do paradigma etiológico-determinista (sobretudo no plano individual) e</p><p>a substituição de um modelo estático e descontínuo de abordagem do comportamento desviante por um</p><p>modelo dinâmico e contínuo. Traduz-se, por outro lado, na desvalorização das estatísticas oficiais como</p><p>instrumento de acesso à realidade do crime, e que por isso colocavam necessariamente aporias</p><p>insuperáveis dum ponto de vista gnosiológico.</p><p>A criminologia radical é, em grande parte, uma criminologia da criminologia, principalmente a discussão e</p><p>analise de dois temas: a definição do objeto e do papel da investigação criminológica.</p><p>Nesse sentido, uma das principais demandas da Criminologia radical, consequente da sua visão</p><p>marxista, é a da própria redescoberta do problema da definição criminológica do que é um delito.</p><p>A Criminologia radical recusa o estatuto profissional e político da criminologia tradicional, considerada</p><p>como um operador tecnocrático a serviço do funcionamento mais eficaz da ordem vigente. O criminólogo</p><p>radical se recusa a assumir esse papel de tecnocrata; desde logo porque considera o problema criminal</p><p>insolúvel numa sociedade capitalista; depois, e, sobretudo, porque a aceitação das tarefas tradicionais é</p><p>em absoluto incompatível com as metas da criminologia radical. Como poderiam os criminólogos</p><p>propor-se a auxiliar a defesa da sociedade contra o crime, se o seu propósito último é defender o Homem</p><p>contra esse tipo de sociedade?</p><p>O modelo explicativo da criminologia radical se reconduz aos princípios do marxismo. A criminologia</p><p>radical distingue entre crimes que são expressão de um sistema intrinsecamente criminoso (v.g., a</p><p>criminalidade de white-collar, o racismo, a corrupção, o belicismo) e crimes das classes mais</p><p>desprotegidas. Este, que constitui o verdadeiro problema criminal da sociedade capitalista, nem sempre é</p><p>encarado com simpatia pelos criminólogos radicais. Na medida em que se traduz num ato individual de</p><p>revolta, este crime revela uma falta de consciência de classe e representa um dispêndio gratuito de</p><p>energias que importa canalizar para a revolução.</p><p>A teoria crítica combateu diversos posicionamentos das outras teorias da criminalidade. Esse clima de</p><p>questionamento da criminologia da criminologia propiciou o florescimento, alguns anos depois, de três</p><p>tendências da Criminologia: o neo -realismo de esquerda, o direito penal mínimo e o abolicionismo</p><p>criminal. O abolicionismo criminal não encontra grande aceitação na América Latina, e, em especial, no</p><p>Brasil. Eventualmente encontramos defensores do Direito Penal Mínimo que recusam o rótulo de</p><p>abolicionistas, mas que agem como tais. O neo-realismo de esquerda (e o seu respectivo movimento de</p><p>law and order) e o direito penal mínimo são, talvez, duas das posições ideológicas de maior debate na</p><p>atual Criminologia.</p><p>Vitimologia</p><p>O QUE É VITIMOLOGIA</p><p>Vitimologia pode ser definida como o estudo científico da extensão, natureza e causas da vitimização</p><p>criminal, suas consequências para as pessoas envolvidas e as reações àquela pela sociedade, em</p><p>particular pela polícia e pelo sistema de justiça criminal, assim como pelos trabalhadores voluntários e</p><p>colaboradores profissionais.</p><p>A definição abrange tanto a vitimologia penal quanto a geral ou vitimologia orientada para a assistência.</p><p>O termo “vitimologia” foi utilizado por primeiro pelo psiquiatra americano Frederick Wertham, mas ganhou</p><p>notoriedade com o trabalho de Hans von Hentig “The Criminal an his Victim”, de 1948. Hentig propôs uma</p><p>abordagem dinâmica, interacionista, desafiando a concepção de vítima como ator passivo. Salientou que</p><p>poderia haver algumas características das vítimas que poderiam precipitar os fatos ou condutas</p><p>delituosas. Sobretudo, realçou a necessidade de analisar as relações existentes entre vítima e agressor.</p><p>A vitimologia é hoje um campo de estudo orientado para a ação ou formulação de políticas públicas.</p><p>A vitimologia não deve ser definida em termos de direito penal, mas de direitos humanos. Assim, a</p><p>vitimologia deveria ser o estudo das consequências dos abusos contra os direitos humanos, cometidos</p><p>por cidadãos ou agentes do governo.</p><p>As violações a direitos humanos são hoje consideradas questão central na vitimologia.</p><p>A expressão “vítimas” significa pessoas que, individual ou coletivamente, sofreram dano, incluindo lesão</p><p>física ou mental, sofrimento emocional, perda econômica ou restrição substancial dos seus direitos</p><p>fundamentais, através de atos ou omissões que consistem em violação a normas penais, incluindo</p><p>aquelas que proscrevem abuso de poder.</p><p>Na Declaração da ONU, de 1985, "victims" are defined in the broad sense as persons who, individually or</p><p>collectively, have suffered harm, including physical or mental injury, emotional suffering, economic loss or</p><p>substantial impairment of their fundamental rights, through acts or omissions that are violations of national</p><p>criminal laws or of internationally recognized norms relating to human rights.”</p><p>As vítimas de atos ilícitos, especialmente de delitos, passaram por fases que, no dizer de Garcia-Pablos</p><p>de Molina, correspondem a um protagonismo, neutralização, e redescobrimento.</p><p>O protagonismo correspondeu ao período da vingança privada, em que os danos produzidos sobre uma</p><p>pessoa ou seus bens eram reparados ou punidos pela própria pessoa.</p><p>As chamadas ciências criminais - Ciência do Direito Penal, Criminologia e Política Criminal,</p><p>“abandonaram” a vítima, quando sua atenção volta-se para o infrator.</p><p>A resposta ao delito assume critérios vingativos e punitivos, quase nunca reparatórios.</p><p>A ideia de neutralização da vítima entende que a resposta ao crime deve ser imparcial, desapaixonada,</p><p>despersonalizando a rivalidade. O problema daí decorrente é que a linguagem simbólica do direito e</p><p>formalismo transformaram vítimas concretas em abstrações.</p><p>Observe-se, ainda, que a punição serviria como prevenção geral. Pouca preocupação havia com a</p><p>reparação.</p><p>O redescobrimento da vítima é um fenômeno do pós 2ª Guerra Mundial. É uma resposta ética e social</p><p>ao fenômeno multitudinário da macrovitimização, que atingiu especialmente judeus, ciganos,</p><p>homossexuais, e outros grupos vulneráveis. Esse redescobrimento não persegue nem retorno à vingança</p><p>privada; nem quebra</p><p>das garantias para os delinquentes: a vítima quer justiça.</p><p>A vitimologia vem, efetivamente, conferir novo status à vítima, contribuindo para redefinir suas relações</p><p>com o delinquente; com o sistema jurídico; com autoridades, etc.</p><p>A propósito, o próprio conceito de vítima precisou ser revisto, posto que já não corresponde apenas ao</p><p>sujeito passivo (protagonista) do fato criminoso. Exemplo de modo amplo de compreender vítima é</p><p>trazido por Sue Moody, ao mencionar como o principal documento definidor de política pública para</p><p>vítimas de delitos, na Escócia, trata a questão: Vítima é qualquer pessoa que tenha sido sujeita a</p><p>qualquer tipo de crime, como também sua família ou aqueles que gozam de uma posição equivalente à</p><p>de família.</p><p>Ao lado do conceito mais amplo de vítima, surgiu também o de vitimização, que examina tanto a</p><p>propensão para ser vítima quanto os vários mecanismos de produção de danos diretos e indiretos sobre</p><p>a vítima.</p><p>Israel Charny entende que o processo de vitimização diz respeito a relações humanas, que podem ser</p><p>compreendidas como relações de poder. Fattah (1979) identificava no crime como que uma transação</p><p>em que agressor e vítima desempenhavam papéis.</p><p>Assim, a identificação de vulnerabilidade e de definibilidade da vítima são essenciais no processo.</p><p>A vulnerabilidade da vítima decorre de diversos fatores (de ordem física, psicológica, econômica e</p><p>outras), o que faz com que o risco de vitimização seja diferencial, para cada pessoa e delito. Nesse</p><p>sentido, o exame dos recursos sociais efetivos da vítima também devem ser levados em conta.</p><p>Kurt Vonnegut Jr., com uma certa ironia, afirma que “Os evangelhos ensinaram, de fato, o seguinte:”</p><p>Antes de matar alguém, certifique-se de que ele não é bem relacionado.”</p><p>Os judeus mataram Cristo. Mais de 2.000 anos depois, mais de um bilhão de pessoas diariamente</p><p>escutam, em todas as partes do mundo, a narrativa de sua morte. “Não sabíamos que era o Filho de</p><p>Deus”, poderão responder. Como, em Brasília, os garotos que brincaram de incendiários, e queimaram o</p><p>índio Galdino Pataxó disseram: “Não sabíamos que era um índio. Pensávamos que fosse só um</p><p>mendigo”.</p><p>Contribuições da vitimologia</p><p>Os estudos de vitimologia têm dado imensa contribuição para a compreensão do fenômeno da</p><p>criminalidade, contribuindo para melhor enfrentamento, a partir da introdução do enfoque sobre as</p><p>vítimas atingidas e os danos produzidos.</p><p>O primeiro aspecto observado por Garcia-Pablos diz respeito à compreensão da dinâmica criminal, e da</p><p>interação delinquente-vítima. Em que medida a vítima interfere para o desencadear da ação, ou sua</p><p>precipitação. Em que medida suas ações ou reações condicionam ou direcionam as ações dos</p><p>agressores. E em que delitos o papel da vítima é de menor importância.</p><p>Análise sobre a vítima também se faz relevante para a prevenção do delito. A introdução da chamada</p><p>“prevenção vitimaria”, que se contrapõe à prevenção criminal, realça a importância de se evitar que</p><p>delitos aconteçam, a partir da reorientação às vítimas, e aos próprios órgãos do estado, para que adotem</p><p>condutas e perspectivas distintas, que reduzam ou eliminem as situações de risco. A reflexão parte da</p><p>constatação de que o crime é um fenômeno seletivo, e que atinge os mais vulneráveis, no momento de</p><p>maior vulnerabilidade. Assim, a prevenção é dirigida aos grupos mais vulneráveis ou mais propensos à</p><p>vitimização. Além disso, essa prevenção vitimaria exige adoção de políticas públicas sociais, ensejando</p><p>intervenção não penal. Finalmente, co-responsabiliza todos. O que é muito próprio, já que vivemos em</p><p>uma sociedade de risco.</p><p>Outro aspecto absolutamente relevante é que a vítima é fonte de informações.</p><p>Com efeito, as pesquisas de vitimização fornecem imensos subsídios a respeito de como os delitos</p><p>ocorrem, em que circunstâncias de tempo e lugar, e por quais fatores desencadeantes. A partir da vítima,</p><p>que é conhecida, e acessível de pronto, é possível identificar relações existentes ou não com a pessoa</p><p>do agressor, e outros fatores relevantes.</p><p>O medo do delito e o medo coletivo de ser a próxima vítima são também objeto do estudo da vitimologia.</p><p>O medo, percepção e sentimento individual, mas com forte conteúdo de objetividade, ajuda a reconhecer</p><p>a presença do risco, e orientar a conduta para minimizá-lo ou mitigar seus efeitos. Mas também o medo</p><p>aprisiona, e termina sendo, ele mesmo, fator de vitimização. A sensação de insegurança coletiva, que</p><p>enseja a adoção de políticas criminais fortemente repressoras, plenas de abusos de direitos, e destruição</p><p>de prerrogativas dos cidadãos, encontra aí sua raiz.</p><p>Também o modo como a política criminal trata a vítima é tema de relevo. O modo tradicional tenta,</p><p>quando o faz, uma ressocialização do delinquente. Mas raramente se percebe que também a vítima</p><p>precisa se encontrar, e ser reintroduzida ao convívio social. Não sendo percebida, torna-se esquecida em</p><p>todas as fases das políticas criminais. A chave para sua inclusão está no respeito a seus direitos, para</p><p>evitar vitimização secundária. Esta termina acontecendo quando se tem a lesão e sua não reparação; o</p><p>crime e sua impunidade; a vitimização e a ausência de investigação, de processo e de condenação. Uma</p><p>tendência que tem sido observada é a introdução de programas de assistência à vítima, que incluem</p><p>assistência strictu sensu, reparação pelo infrator, programas de compensação, e programas especiais de</p><p>assistência, quando a vítima for declarante.</p><p>Talvez as maiores contribuições estejam sendo dadas a partir das reflexões sobre as relações existentes</p><p>entre a vítima e sistema legal, e a vítima e a justiça penal.</p><p>O sistema legal costuma realizar perseguição aos delitos noticiados . Estudos revelam que há</p><p>subnotificação. Ou seja, os delitos praticados são em número superior às ocorrências registradas. Por</p><p>que se subnotifica? Quem melhor pode responder é a vítima, e o sistema não pode ser indiferente às</p><p>suas percepções.</p><p>Ora, a alienação em relação ao sistema diz tanto quanto a afirmação de notificar. O certo é que a</p><p>vivência da vítima, e suas características e atitudes são elementos e fatores relevantes para o adequado</p><p>funcionamento do sistema penal.</p><p>A relação existente entre crimes conhecidos ou esclarecidos pela Polícia, ou processados, e o papel</p><p>desempenhado pela vítima. Identificam que os crimes conhecidos ordinariamente resultam de uma</p><p>proatividade da polícia, ou de uma reatividade. Na pro-atividade, a polícia seleciona suspeitos pelos</p><p>estereótipos. Isso pode implicar em procedimentos discriminatórios por parte da polícia, desde que há</p><p>grupos antecipadamente considerados como mais propensos à prática de delitos, e outros grupos imunes</p><p>à suspeita, ou investigação.</p><p>Na reatividade, a denúncia da vítima desempenha papel vital. Mas eles advertem: nem toda vítima faz</p><p>desencadear investigações. Só as capazes de se justificarem como tais . Ou seja, não é toda vítima</p><p>que consegue fazer com que a polícia inicie uma investigação. E é a polícia que define quem e o que</p><p>investigar.</p><p>As conclusões a que chegaram esses pesquisadores apontam no sentido de que a polícia não investiga</p><p>quando a vítima se opõe fortemente, nem quando o investigado é muito poderoso.</p><p>Por outro lado, o ministério público também constrói seu perfil de vítima ideal.</p><p>Esta deve ser aquela que pode ser uma boa testemunha.</p><p>Finalmente, os estudos de vitimologia ajudam a melhor compreender a interação existente entre a vítima</p><p>e justiça penal. O modelo clássico, com efeito, tem a vítima como objeto, ou pretexto, para a</p><p>investigação. Mas ordinariamente não leva em conta seus interesses legítimos. Isso fez com que fossem</p><p>identificados fatores que pudessem contribuir para mensurar a qualidade de uma justiça criminal. Entre</p><p>esses, são examinados como se concebe o fato delitivo e o papel dos protagonistas; como ou se se</p><p>satisfaz a expectativa dos protagonistas; qual o custo social; qual a atitude dos usuários da justiça.</p><p>O Conselho de Ministros da União Europeia publicou uma Decisão Referencial sobre a Presença das</p><p>Vítimas nos Procedimentos</p><p>Criminais. Como padrão mínimo é incluído o dever de informação sobre tipos</p><p>de apoio disponíveis para a vítima; onde e como comunicar a queixa; os procedimentos criminais e o</p><p>papel da vítima; acesso a proteção e aconselhamento; elegibilidade para compensação; resultado do</p><p>julgamento e da sentença.</p><p>Uma boa comunicação com a vítima é exigida em todas as fases do processo criminal.</p><p>TIPOLOGIA DAS VÍTIMAS</p><p>Classificações de Benjamín Mendelsohn (Tiplogias, Centro de Difusion de la Victímologia, 2002).</p><p>O vitimólogo israelita fundamenta sua classificação na correlação da culpabilidade entre a vítima e o</p><p>infrator. É o único que chega a relacionar a pena com a atitude vitimal. Sustenta que há uma relação</p><p>inversa entre a culpabilidade do agressor e a do ofendido, a maior culpabilidade de uma é menor que a</p><p>culpabilidade do outro.</p><p>1 – Vítima completamente inocente ou vítima ideal: é a vítima inconsciente que se colocaria em 0%</p><p>absoluto da escala de Mendelsohn. É a que nada fez ou nada provocou para desencadear a situação</p><p>criminal, pela qual se vê danificada. Ex. incêndio</p><p>2 – Vítima de culpabilidade menor ou vítima por ignorância: neste caso se dá um certo impulso</p><p>involuntário ao delito. O sujeito por certo grau de culpa ou por meio de um ato pouco reflexivo causa sua</p><p>própria vitimização. Ex. Mulher que provoca um aborto por meios impróprios pagando com sua vida, sua</p><p>ignorância.</p><p>3 – Vítima tão culpável como o infrator ou vítima voluntária: aquelas que cometem suicídio jogando com a</p><p>sorte. Ex. roleta russa, suicídio por adesão vítima que sofre de enfermidade incurável e que pede que a</p><p>matem, não podendo mais suportar a dor (eutanásia) a companheira (o) que pactua um suicídio; os</p><p>amantes desesperados; o esposo que mata a mulher doente e se suicida.</p><p>4 – Vítima mais culpável que o infrator.</p><p>Vítima provocadora: aquela que por sua própria conduta incita o infrator a cometer a infração. Tal</p><p>incitação cria e favorece a explosão prévia à descarga que significa o crime.</p><p>Vítima por imprudência: é a que determina o acidente por falta de cuidados. Ex. quem deixa o</p><p>automóvel mal fechado ou com as chaves no contato.</p><p>5 – Vítima mais culpável ou unicamente culpável.</p><p>Vítima infratora: cometendo uma infração o agressor cai vítima exclusivamente culpável ou ideal, se</p><p>trata do caso de legitima defesa, em que o acusado deve ser absolvido.</p><p>Vítima simuladora : o acusador que premedita e irresponsavelmente joga a culpa ao acusado,</p><p>recorrendo a qualquer manobra com a intenção de fazer justiça num erro.</p><p>Meldelsohn conclui que as vítimas podem ser classificadas em 3 grandes grupos para efeitos de</p><p>aplicação da pena ao infrator:</p><p>1 – Primeiro grupo: vítima inocente: não há provocação nem outra forma de participação no delito, mas</p><p>sim puramente vitimal.</p><p>2 – Segundo grupo: estas vítimas colaboraram na ação nociva e existe uma culpabilidade reciproca,</p><p>pela qual a pena deve ser menor para o agente do delito (vítima provocadora).</p><p>3 – Terceiro grupo: nestes casos são as vítimas as que cometem por si a ação nociva e o não culpado</p><p>deve ser excluído de toda pena.</p><p>VITIMOLOGIA, A CIÊNCIA PENAL E O ITER VICTIMAE - PR OCESSO DE VITIMIZAÇÃO.</p><p>Como aponta Edmundo de Oliveira, "Iter Victimae é o caminho, interno e externo, que segue um</p><p>indivíduo para se converter em vítima, o conjunto de etapas que se operam cronologicamente no</p><p>desenvolvimento de vitimização (Vitimologia e direito penal, p.103-4)".</p><p>Fases do Iter Victimae, segundo a esquematização elaborada pelo próprio Edmundo de Oliveira em sua</p><p>obra Vitimologia e o Direito Penal – O crime precipitado pela vítima, 2001, p. 101, in verbis:</p><p>Intuição (intuito) - A primeira fase do Iter Victimae é a intuição, quando se planta na mente da vítima a</p><p>ideia de ser prejudicado, hostilizada ou imolada por um ofensor.</p><p>Atos preparatórios (conatus remotus) - Depois de projetar mentalmente a expectativa de ser vítima,</p><p>passa o indivíduo à fase dos atos preparatórios (conatus remotus), momento em que desvela a</p><p>preocupação de tornar as medidas preliminares para defender-se ou ajustar o seu comportamento, de</p><p>modo consensual ou com resignação, às deliberações de dano ou perigo articulados pelo ofensor.</p><p>Início da execução (conatus proximus) - Posteriormente, vem a fase do início da execução (conatus</p><p>proximus), oportunidade em que a vítima começa a operacionalização de sua defesa, aproveitando a</p><p>chance que dispõe para exercitá-la, ou direcionar seu comportamento para cooperar, apoiar ou facilitar a</p><p>ação ou omissão aspirada pelo ofensor.</p><p>Execução (executio) - Em seguida, ocorre a autêntica execução distinguindo-se pela definitiva</p><p>resistência da vítima para então evitar, a todo custo, que seja atingida pelo resultado pretendido por seu</p><p>agressor, ou então se deixar por ele vitimizar.</p><p>Consumação (consummatio) ou tentativa (crime falho ou conatus proximus) - Finalmente, após a</p><p>execução, aparece a consumação mediante o advento do efeito perseguido pelo autor, com ou sem a</p><p>adesão da vítima. Contatando-se a repulsa da vítima durante a execução, aí pode se dar a tentativa de</p><p>crime, quando a prática do fato demonstrar que o autor não alcançou seu propósito (finis operandis) em</p><p>virtude de algum impedimento alheio à sua vontade. (Edmundo de Oliveira. Vitimologia e dreito penal. 2001, p. 105)</p><p>PERIGOSIDADE VITIMAL</p><p>No importante estudo sobre o comportamento da vítima, é relevante discorrermos brevemente sobre a</p><p>perigosidade vitimal, que é a etapa inicial da vitimização. Perigosidade vitimal é um estado psíquico e</p><p>comportamental em que a vítima se coloca estimulando a sua vitimização, ex., a mulher que usa roupas</p><p>provocantes, estimulando a libido do estuprador no crime de estupro (Lúcio Ronaldo Pereira Ribeiro. Vitimologia,</p><p>2000, p. 36.)</p><p>A compreensão do conceito de "Perigosidade Vitimal’’é de suma importância para o entendimento dos</p><p>próximos textos, pois estaremos discorrendo dentre outras, da vítima provocadora e de casos de</p><p>vitimização com o consentimento da vítima.</p><p>O ARTIGO 59, CAPUT DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO</p><p>No nosso ordenamento jurídico temos alguns dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que falam</p><p>sobre a vítima, como o Art. 59, 61, II, c, in fine; 65, III, c, do Código Penal e art. 245 da Constituição</p><p>Federal de 1988. Mas, o nosso estudo se concentra na principal mudança e preocupação concernente à</p><p>vítima no Brasil, que ocorreu no ano de 1984 com a reforma do Código Penal, o artigo 59, caput.</p><p>Tal mudança ocorreu com o advento da Lei 7.209, DE 11 DE JULHO DE 1984, da Nova Parte Geral do</p><p>Código Penal, assim passando a vigorar no Capítulo III – DA APLICAÇÃO DA PENA, o artigo 59, caput</p><p>com a seguinte redação:</p><p>Art. 59 . "O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do</p><p>agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima,</p><p>estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime".</p><p>A Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, justifica, assim, a preocupação com a</p><p>vítima: ‘’Fez-se referência expressa ao comportamento da vítima, erigido, muitas vezes, em fator</p><p>criminógeno, por constituir-se em provocação ou estímulo à conduta criminosa, como, em outras</p><p>modalidades, o pouco recato da vítima nos crimes contra os costumes’’</p><p>O ART. 59, CAPUT DO CP E A APLICAÇÃO DA PENA.</p><p>Diante do que discorre o artigo 59, caput, então passou a ser dever do magistrado na dosimetria da pena,</p><p>analisar o comportamento da vítima (antes e depois do delito)como circunstância judicial na</p><p>individualização da pena imposta ao acusado.</p><p>As circunstâncias judiciais são muito importantes, pois é através delas que o juiz fixa a (pena base),</p><p>obedecido o disposto no art. 59; considera-se em seguida as circunstâncias atenuantes e agravantes</p><p>(pena provisória); incorpora-se ao cálculo, e finalmente as causas de diminuição e aumento (pena</p><p>definitiva).</p><p>Nesse sentido, Celso Delmanto, explana: "O comportamento do ofendido deve ser apreciado de modo</p><p>amplo no contexto da censurabilidade do autor do crime,</p><p>não só diminuindo, mas também a aumentando,</p><p>eventualmente. Não deve ser igual a censura que recai sobre quem rouba as fulgurantes jóias que uma</p><p>senhora ostenta e a responsabilidade de quem subtrai donativos, por exemplo, do Exército da</p><p>Salvação’’(Código Penal Comentado, 2000, p. 104).</p><p>O CONSENTIMENTO DA VÍTIMA (OFENDIDO).</p><p>Um fato importantíssimo que deve ser investigado, é no tocante ao consentimento do ofendido (vítima).</p><p>Dependendo do comportamento do ofendido, a conduta do sujeito ativo pode resultar em atípica e</p><p>antijurídica. Uma situação importante de consentimento da vítima, e que deve ser analisada pelo</p><p>magistrado é que, nos delitos sexuais, não é raro a contribuição, consciente ou inconsciente da vítima</p><p>nesses tipos de delitos (atentado violento ao pudor e estupro).</p><p>José Eulálio Figueiredo de Almeida, comenta: "O consentimento ou aquiescência da ofendida, insista-se,</p><p>obtém nota de relevo nos crimes sexuais, desde que não tenha sido viciado, porque permite ao Juiz,</p><p>diante da confirmação de tal circunstância, declarar a atipicidade da conduta do acusado ou a sua</p><p>antijuridicidade. (...) Se, por outro lado, esse consentimento é evidente exclui-se não apenas a ilicitude,</p><p>mas a tipicidade da conduta, isto é, não há delito a punir - nullum crimen sine culpa" (José Eulálio Figueiredo</p><p>de Almeida. Sedução - Instituto lendário do código penal, 2002)</p><p>E A "VÍTIMA’’, DEVE SER PUNIDA?</p><p>Como já apontado anteriormente, seja através das tipologias, seja através dos casos estudados com</p><p>consentimento da vítima, pudemos constatar que existem vítimas provocadoras, que atraem para si uma</p><p>determinada situação ou desencadeiam algum processo para que se torne vítima de algo ou alguém, o</p><p>chamado processo de vitimização.</p><p>Oportuno que sejam transcritas algumas ementas, para assim, demonstrar como a jurisprudência vem se</p><p>pronunciando a respeito de um tem tão relevante.</p><p>EMENTA - Nº 17876 - ESTUPRO – Não caracterização – Nos crimes sexuais, a palavra da vítima, para</p><p>gozar da presunção de veracidade necessita ser verossímil, coerente e escudada no bom</p><p>comportamento anterior – No caso o comportamento da vítima deixa muita a desejar – Absolvição</p><p>decretada. (Relator: Celso Limongi – Apelação Criminal 100.223-3 – Candido Mota – 23.01.91)</p><p>EMENTA - Nº 28859 - ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR – Não caracterização – Ausência de violência</p><p>física – Atos praticados com consentimento da vítima – Versões apresentadas por esta, que se mostram</p><p>em contradições – Réu de porte físico menor que o da ofendida, e que não se apresentava armado –</p><p>Comportamentos dos quais não se extrai violência reação – Absolvição decretada – Recurso provido.</p><p>Para que se configure o delito do artigo 224 do CP a oposição ao ato libidinoso deve ser sincera e</p><p>positiva, manifestando-se por inequívoca resistência, não bastando recusa meramente verbal ou</p><p>oposição passiva e inerte, apenas simbólica. (Ap. Criminal n. 182.101-3 – São Paulo – 2º Câmara</p><p>Criminal Férias Julho/95 – Relator: Prado de Toledo – 12.07.95 – V.U.).</p><p>EMENTA – Nº 71022 - ESTUPRO – Presunção de violência – Vítima de mau comportamento menos de</p><p>14 anos – Relações sexuais mantidas anteriormente com outros homens – Circunstâncias que elide</p><p>presunção, de caráter relativo – Absolvição - Inteligência dos arts. 213 e 224, "a", do CP ( Ement.) RT</p><p>557/322.</p><p>No tocante aos crimes sexuais, a participação ou consentimento da vítima, é algo muito mais sério do</p><p>que imaginamos, pois mostramos anteriormente com algumas ementas que há casos de absolvição em</p><p>processos que envolvam conjunção carnal, sedução, atentado violento ao pudor, estupro, etc.</p><p>Direitos das vítimas</p><p>Basicamente os direitos das vítimas consistem em tratamento justo e respeito à sua dignidade e</p><p>privacidade; proteção contra agressor; informação sobre a tramitação processual, e garantia de presença</p><p>em corte; acesso ao acusador público; restituição das coisas indevidamente tomadas ou apreendidas;</p><p>informação sobre a condenação, a sentença, a prisão e a libertação do agressor.</p><p>A Declaração sobre os princípios fundamentais de justiça para as vítimas de delitos e do abuso de poder,</p><p>da ONU, deram a direção que foi seguida pela norma americana: garantia de ACESSO A JUSTIÇA E</p><p>TRATAMENTO JUSTO; tratamento com compaixão e respeito; Informação sobre seu papel e alcance;</p><p>assistência apropriada (legal, medica, psicológica); ressarcimento dos danos; informação sobre a</p><p>tramitação processual.</p><p>Direitos Humanos e Vitimologia</p><p>Direitos Humanos e vitimologia resultam de um novo olhar sobre as vítimas, como consequência dos</p><p>horrores da 2a Guerra e do nazi-fascismo. Não é obra do acaso o fato de o primeiro instrumento</p><p>vinculante, promulgado no âmbito da ONU, ter sido a Convenção contra o Genocídio, em 9 de dezembro</p><p>de 1948, um dia antes da promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos.</p><p>A vitimologia é uma espécie de “filha” da Criminologia, ou parte dela. Integra com esta última os pilares</p><p>das ciências criminais (ciência do direito penal, criminologia e política criminal). Analisa o sistema de</p><p>justiça e segurança. O seu objeto de estudo faz parte (estando contido) no âmbito de atuação dos direitos</p><p>humanos. O âmbito dos direitos humanos é mais amplo. Abrange os direitos civis e políticos (como vida,</p><p>liberdade, integridade física e mental, julgamento justo, propriedade, etc.), mas também acrescenta os</p><p>direitos econômicos, sociais e culturais, conhecidos como DESCs. Assim, vítimas de fome, despejos</p><p>forçados e coletivos, desemprego, discriminação, doenças, etc., são sujeitos de direitos no direito</p><p>internacional dos direitos humanos. O olhar solidário as enxerga, e as traz para protagonizarem as lutas</p><p>em defesa do reconhecimento e respeito de seus direitos.</p><p>Quanto ao modo de atuar, a interdisciplinaridade caracteriza tanto a criminologia e a vitimologia quanto</p><p>os estudos de direitos humanos.</p><p>No Brasil, o município de São Paulo editou, em 2001, Lei de Assistência às vítimas de Violência. A</p><p>norma, por sua importância seminal, segue transcrita na íntegra,</p><p>LEI Nº 13.198, 30 DE OUTUBRO DE 2001</p><p>Dispõe sobre a assistência às vítimas de violência e dá outras providências.</p><p>MARTA SUPLICY, Prefeita do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por</p><p>lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 10 de outubro de 2001, decretou e eu promulgo a</p><p>seguinte lei:</p><p>Art. 1º - O Município, por intermédio de seus órgãos da administração direta ou indireta, prestará</p><p>assistência às vítimas de violência.</p><p>Art. 2º - Para efeitos desta lei, é considerada vítima de violência a pessoa que tenha sofrido lesão de</p><p>natureza física ou psíquica em consequência de ações ou omissões tipificadas como crime na legislação</p><p>penal vigente.</p><p>Parágrafo único - Nos crimes de homicídio, são equiparadas às vítimas de violência, para efeito de</p><p>concessão dos benefícios previstos nesta lei:</p><p>I – o (a) cônjuge, companheiro ou companheira sobrevivente;</p><p>II - os filhos e filhas da vítima;</p><p>III - ascendentes e descendentes em linha reta ou colaterais, até o terceiro grau, desde que comprovem</p><p>relação de dependência econômica com a vítima.</p><p>Art. 3º - A assistência às vítimas de violência, prevista no artigo 1º desta lei, consistirá em:</p><p>I - garantia de assistência médica e psicológica integral, de forma exclusiva ou subsidiária, durante todo o</p><p>tempo necessário à reabilitação das vítimas;</p><p>II - atendimento prioritário pelos programas sociais e assistenciais oferecidos pelo Município;</p><p>III - orientação e assessoria técnica para a proposição e acompanhamento de ações visando o</p><p>ressarcimento dos danos causados pela violência.</p><p>Art. 4º - O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de 60 (sessenta) dias, contados da</p><p>data de sua publicação.</p><p>Art. 5º - As despesas com a execução desta lei correrão por conta de dotações orçamentárias próprias,</p><p>suplementadas, se necessário.</p><p>Art. 6º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.</p><p>PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 30 de outubro de 2001</p><p>DECRETO Nº 43.667, DE 26 DE AGOSTO DE 2003</p><p>Regulamenta a Lei nº 13.198, de 30 de outubro de 2001, que dispõe sobre a assistência às vítimas de</p><p>violência e dá outras providências.</p><p>MARTA SUPLICY, Prefeita do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por</p><p>lei,</p><p>D E C R E T A:</p><p>Art. 1º . A Lei nº 13.198, de 30 de outubro de 2001, que dispõe sobre a assistência às vítimas de</p><p>violência, fica regulamentada na conformidade das disposições deste decreto.</p><p>Art. 2º. Caberá às Secretarias Municipais, no âmbito das respectivas competências, articular ações</p><p>voltadas à prevenção, ao atendimento e à redução dos casos de violência, priorizando aqueles motivados</p><p>pelo gênero ou praticados contra crianças e adolescentes.</p><p>Parágrafo único. Os casos de violência cometidos contra crianças ou adolescentes serão comunicados</p><p>pelas Secretarias Municipais que deles tiverem conhecimento ao Conselho Tutelar do domicílio dos</p><p>respectivos pais ou responsáveis ou, na sua ausência, do lugar onde se encontre a vítima, nos termos do</p><p>disposto nos artigos 138 e 147 da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do</p><p>Adolescente).</p><p>Art. 3º. Fica instituído o Comitê Gestor, composto por representantes das Secretarias Municipais de</p><p>Assistência Social, da Saúde, de Segurança Urbana e de Educação, bem como das Coordenadorias</p><p>Especiais da Mulher e dos Assuntos da População Negra, visando ao desenvolvimento de ações e à</p><p>implantação e manutenção de um sistema de informações relativas ao atendimento às vítimas de</p><p>violência.</p><p>§ 1º. A coordenação do Comitê Gestor caberá à Secretaria Municipal de Assistência Social.</p><p>§ 2º. O Comitê Gestor contará com o apoio de uma Comissão Consultiva, constituída por representantes</p><p>de organizações não-governamentais e universidades, cuja composição e atribuições serão definidas por</p><p>portaria da Secretaria Municipal de Assistência Social.</p><p>Art. 4º. A Secretaria Municipal de Assistência Social será o órgão local de referência para o atendimento</p><p>de que trata este decreto, centralizando, por intermédio do Comitê Gestor, as informações referentes aos</p><p>casos atendidos de vítimas de violência, devendo tais dados apontar, obrigatoriamente, o número de</p><p>casos assistidos e o respectivo tipo de violência, relacionados por Subprefeitura e distrito de ocorrência,</p><p>na forma prevista em portaria.</p><p>§ 1º. Na disponibilização dos dados mencionados no "caput" deste artigo, deverá ser mantido sigilo</p><p>quanto à identidade das vítimas, a fim de garantir sua privacidade e segurança, podendo ser efetivada</p><p>mediante solicitação, por escrito, de indivíduos devidamente identificados, nos seguintes casos:</p><p>I - a pedido da vítima;</p><p>II - por requisição de autoridades policiais, judiciárias e do Ministério Público;</p><p>III - para pesquisas científicas, cujo Protocolo de Pesquisa esteja devidamente aprovado pelo Comitê de</p><p>Ética em Pesquisa - CEP que referenda a investigação, conforme disposto nas Diretrizes e Normas</p><p>Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, vigentes no território nacional, sob a</p><p>condição de que, em nenhuma hipótese, serão divulgados dados que possibilitem a identificação das</p><p>vítimas.</p><p>§ 2º. O Comitê Gestor emitirá relatórios trimestrais relativos às informações referidas no "caput" deste</p><p>artigo, omitindo todos os dados que permitam a identificação das pessoas atendidas.</p><p>Art. 5º. Compete à Secretaria Municipal de Assistência Social:</p><p>I - expandir os núcleos de atendimento regionalizados, preferencialmente nas Subprefeituras e sempre</p><p>em seu território de abrangência, compostos por profissionais das áreas de saúde e por assessoria</p><p>técnica gratuita, para o atendimento integral às vítimas de vidência do Município de São Paulo;</p><p>II - identificar, no âmbito de suas ações, os casos que apresentam características vitimárias, inserindo-os</p><p>prioritariamente nos serviços e programas existentes e encaminhando-os aos demais serviços de apoio a</p><p>cargo de outros órgãos;</p><p>III - garantir a capacitação profissional contínua e a supervisão técnica às equipes multiprofissionais de</p><p>atendimento às vítimas de violência.</p><p>§ 1º. Os núcleos de atendimento mencionados no inciso I do "caput" deste artigo prestarão serviços de</p><p>acolhimento, atendimento, triagem para adequação dos casos a serem atendidos aos serviços e</p><p>programas existentes no âmbito municipal, educação para os direitos humanos e assessoria técnica</p><p>gratuita, que possibilite a propositura e o acompanhamento de ações visando ao ressarcimento de danos</p><p>materiais e morais causados pela violência.</p><p>§ 2º. O Executivo Municipal poderá firmar convênios com universidades e organizações da sociedade</p><p>civil para a efetivação das medidas e finalidades previstas neste artigo.</p><p>Art. 6º. Compete à Secretaria Municipal da Saúde - SMS:</p><p>I - oferecer atendimento médico e psicológico integral, de forma exclusiva ou subsidiária, durante todo o</p><p>tempo necessário à reabilitação das vítimas;</p><p>II - encaminhar as vítimas de violência e seus familiares, se for o caso, às Secretarias competentes, para</p><p>a inserção em programas e serviços de assistência social existentes, nos quais poderão ter prioridade de</p><p>atendimento, sempre que possível;</p><p>III - encaminhar as vítimas de violência aos núcleos pertencentes à Secretaria Municipal de Assistência</p><p>Social ou à rede conveniada local de atendimento, para orientação e prestação dos serviços previstos no</p><p>§ 1º do artigo 5º deste decreto.</p><p>Parágrafo único. O encaminhamento das vítimas de violência pelos serviços de saúde pública da rede</p><p>municipal será feito pelo profissional de saúde que realizou o atendimento inicial ou pelo profissional de</p><p>assistência social lotado na unidade.</p><p>Art. 7º. A Secretaria Municipal de Segurança Urbana - SMSU utilizará as informações e dados</p><p>estatísticos relativos a vítimas de violência no Município de São Paulo, enviados pela Secretaria</p><p>Municipal de Assistência Social, na elaboração de políticas vinculadas a suas competências.</p><p>Art. 8º . As Subprefeituras e as Secretarias Municipais que prestam atendimento direto à população</p><p>capacitarão seus servidores, a fim de identificarem, dentre os usuários de seus serviços, aqueles</p><p>expostos a situações de violência, de modo a orientá-los a recorrerem ao atendimento adequado.</p><p>Art. 9º. Os programas e serviços de assistência às vítimas de violência serão instalados primeiramente</p><p>em áreas da Cidade de São Paulo com registro de maiores índices de violência.</p><p>Art. 10. As despesas com a execução deste decreto correrão por conta das dotações orçamentárias</p><p>próprias, suplementadas se necessário.</p><p>Art. 11. Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação.</p><p>PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 26 de agosto de 2003, 450º da fundação de São</p><p>Paulo.</p><p>Prevenção da Infração Penal</p><p>CRIMINOLOGIA PREVENCIONISTA</p><p>A base da sistemática prevencionista está no conceito de Criminologia Prevencionista.</p><p>Conceito de Criminologia Prevencionista</p><p>Criminologia Prevencionista é uma ciência humana e social que estuda:</p><p>• o homem criminoso e os fatores criminógenos ou causas que contribuem para a formação de</p><p>seu caráter perigoso e/ou antissocial;</p><p>2 - a criminalidade, como o conjunto de criminosos e seus crimes, numa determinada região e num</p><p>determinado tempo, suas geratrizes, sua nocividade ou periculosidade e suas oscilações em decorrência</p><p>de medidas que se implementem contra ela;</p><p>3 - solução. Esta só poderá ser alcançada à nível de segurança pública e paz social, pela prevenção do</p><p>crime, em duas fases:</p><p>1ª) Fase de Pré-delinquência - através de políticas governamentais, capazes de evitar ou eliminar os</p><p>fatores criminógenos ou causas do caráter criminoso do delinquente.</p><p>2ª) Fase de Pós-delinquência - através da prevenção da reincidência, por meios de mecanismos,</p><p>critérios, medidas e ações capazes de recuperar ou ressocializar os criminosos perigosos e/ou</p><p>antissociais e integrá-los à comunhão social como cidadãos decentes.</p><p>PRINCÍPIOS BÁSICOS DA CRIMINOLOGIA PREVENCIONISTA</p><p>1 – Existencialismo Absoluto da relação Causa-Efeit o</p><p>Nada existe sem causa geradora.</p><p>2 – Só pela Prevenção será possível neutralizar as Causas ou Fatores</p><p>uma série de estudos e de programas</p><p>de tratamento e de adaptação forçada da personalidade, imatura, impulsiva ou agressiva, do delinquente,</p><p>às características e às exigências da vida em sociedade.</p><p>A própria sociologia não escapou a este pressuposto. Os delinquentes foram quase sempre</p><p>conceptualizados como sendo diferentes, mesmo que essa diferença se situasse nas diferentes tensões</p><p>ou pressões sociais exercidas sobre alguns grupos sociais, e tal motivou todo um conjunto de programas</p><p>de redução dessas tensões ou pressões como principal estratégia de prevenção de comportamentos</p><p>delinquentes.</p><p>O grande marco a inaugurar verdadeiramente os estudos criminológicos encontra-se no surgimento do</p><p>Positivismo e, mais especificamente, da chamada “Antropologia Criminal”. Nessa ocasião opera-se</p><p>uma mudança singular no que diz respeito ao objeto das preocupações da ciência criminal. Enquanto a</p><p>Escola Clássica Liberal preocupava-se com o estudo dos postulados jurídico – penais, procurando</p><p>desenvolver uma formulação teórico – dogmática do Direito Penal, o advento da Antropologia Criminal</p><p>propicia uma alteração de perspectiva, voltando os olhos da pesquisa científico – criminal para o estudo</p><p>do fenômeno do crime e, especialmente, da figura do criminoso.</p><p>O Positivismo exerce grande influência na conformação dessa nova postura, pois que defende a</p><p>irradiação do método científico para todas as áreas do saber humano, até mesmo às da filosofia e da</p><p>religião. Nesse contexto, o Direito e especificamente o ramo jurídico – criminal, também passaram a</p><p>sofrer influências importantíssimas desse referencial teórico então dominante.</p><p>O Positivismo Jurídico aproxima o Direito, o quanto possível, ao método das ciências naturais,</p><p>objetivando limitá-lo àquilo que tenha de concreto, observável, passível de mensuração e descrição. Por</p><p>isso é que seu resultado acaba sendo a limitação do Direito às normas legais, evitando a consideração</p><p>de fatores axiológicos, metafísicos etc.</p><p>O afastamento rigoroso das questões que não fossem subsumíveis ao método de experimentação</p><p>científico, ensejou, no bojo das ciências criminais, o nascimento da busca de relações e regras</p><p>constantes que tivessem a capacidade de esclarecer o fenômeno da criminalidade.</p><p>A Criminologia exsurge dessa efervescência, desse entusiasmo pelo método científico, dando destaque</p><p>nunca dantes constatado ao estudo do homem criminoso e à pesquisa das causas da delinquência.</p><p>Em meio a esse clima, a criminalidade somente poderia ser estudada com sustentação em dados</p><p>empíricos ofertados pela demonstração experimental de leis naturais seguras e imutáveis.</p><p>O criminoso passa a ser objeto de estudo, uma fonte de pesquisas e experimentos com vistas à</p><p>descoberta científica das causas do fenômeno criminal.</p><p>A obstinada busca de causas explicativas do agir criminoso em oposição às condutas conforme a lei,</p><p>somente poderia resultar na negação do “livre arbítrio”, apontado até então pela Escola Clássica como</p><p>verdadeiro fundamento legitimador da responsabilidade criminal.</p><p>É claro que a noção de livre arbítrio não poderia servir a uma concepção positivista, pois que ensejava</p><p>um total descontrole e imprevisibilidade quanto às práticas criminosas. A postura positivista não se</p><p>coaduna com tal insegurança. Deseja apropriar-se de um conhecimento que propicie o domínio seguro</p><p>de leis constantes a regerem o mundo e, por que não, o comportamento humano, inclusive aquele</p><p>desviado.</p><p>A consequência imediata foi a consideração do criminoso como um “anormal”. A partir daí, bastaria dotar</p><p>o pesquisador de instrumentos hábeis a selecionar, de forma científica, os criminosos (anormais), em</p><p>meio à população humana aparentemente homogênea ou normal.</p><p>O primeiro grande passo dado por um pesquisador nesse sentido foi a doutrina preconizada por Cesare</p><p>Lombroso, destacando-se a publicação de sua conhecida obra “O homem Delinquente”, em 1876.</p><p>Lombroso entendia ser possível detectar no criminoso uma espécie diferente de “homo sapiens”, o qual</p><p>apresentaria determinados sinais, denominados “stigmata”, de natureza física e psíquica. Esses sinais</p><p>caracterizariam o chamado “criminoso nato” (forma da calota craniana e da face, dimensões do crânio,</p><p>maxilar inferior procidente, sobrancelhas fartas, molares muito salientes, orelhas grandes e deformadas,</p><p>corpo assimétrico, grande envergadura dos braços, mãos e pés, pouca sensibilidade à dor, crueldade,</p><p>leviandade, tendência à superstição, precocidade sexual etc.). Todos esses sinais indicariam um</p><p>“regresso atávico”, tendo em conta sua clara aproximação com as formas humanas primitivas. Ademais,</p><p>Lombroso intentou demonstrar uma ligação entre a epilepsia e aquilo que chamava de “insanidade</p><p>moral”.</p><p>Percebe-se claramente o conteúdo determinista das teorias lombrosianas, o qual conduziria a</p><p>importantes conclusões e consequências para a Política Criminal.</p><p>Ora, se o criminoso estava exposto à conduta desviada forçosamente, tendo em vista uma congênita</p><p>predisposição, seria injusto atribuir-lhe qualquer reprovação que fosse ligada ao desvalor de suas</p><p>escolhas quanto à sua conduta, isso pelo simples motivo de que não atuava por sua livre escolha, mas</p><p>sim dirigido por forças naturais irresistíveis a impeli-lo para os mais diversos atos criminosos. Assim</p><p>sendo, jamais poderia ser exposto a apenações morais e infamantes. Não obstante, sendo as práticas</p><p>criminosas componentes indissociáveis de sua personalidade, estaria a sociedade legitimada a</p><p>defender-se, impondo-lhe desde a prisão perpétua até a pena de morte.</p><p>A doutrina lombrosiana, no entanto, foi grandemente criticada e desmentida por estudos ulteriores que</p><p>comprovaram a inexistência de indícios seguros a demonstrarem qualquer diferença fisiológica, física ou</p><p>psíquica entre homens que perpetraram atos criminosos e indivíduos cumpridores da lei.</p><p>Não obstante, deve ser atribuído a Lombroso o mérito de ser o primeiro a impulsionar os estudos que</p><p>dariam origem à Criminologia. Ele iniciou, com a sua Antropologia Criminal, os estudos do homem</p><p>delinquente, razão pela qual tem sido considerado o verdadeiro “Pai da Criminologia”. A partir dele</p><p>começam os mais diversos campos de pesquisa de elementos endógenos capazes de ocasionarem o</p><p>comportamento criminoso.</p><p>Inúmeras investigações científicas nos mais variados campos das ciências naturais e biológicas lograram</p><p>conformar um conjunto de teorias elucidativas do fenômeno criminal. A esse conjunto costuma-se</p><p>denominar “Criminologia Clínica”.</p><p>Pode-se exemplificar essa corrente criminológica com alguns de seus ramos mais destacados: Biologia</p><p>Criminal, Criminologia Genética, Psiquiatria Criminal, Psicologia Criminal, Endocrinologia Criminal,</p><p>Estudos das Toxicomanias etc.</p><p>Todas essas linhas de pesquisa têm como traço comum a busca de uma explicação etiológica endógena</p><p>do crime e do homem criminoso. Procura-se apontar uma causa da conduta criminosa que estaria no</p><p>próprio homem, enquanto alguma forma de anormalidade física e/ou psíquica. Também todas essas</p><p>teorias apresentam um equívoco comum: pretendem explicar isoladamente o complexo fenômeno da</p><p>criminalidade.</p><p>Em contraposição à “Criminologia Clínica”, surge a denominada “Criminologia Sociológica”, tendo</p><p>como seu mais destacado representante Enrico Ferri. A “Criminologia Sociológica” propõe uma revisão</p><p>crítica da “Criminologia Clínica”, pondo a descoberto que a insistência desta nas causas endógenas da</p><p>criminalidade, olvidava as importantes influências ambientais ou exógenas para a gênese do crime. Aliás,</p><p>para os defensores da “Criminologia Sociológica”, as causas preponderantes da criminalidade seriam</p><p>mesmo ambientais ou exógenas, de forma que mais relevante do que perquirir as características do</p><p>homem criminoso, seria identificar o meio criminógeno em que ele se encontra.</p><p>No entanto, a “Criminologia Sociológica” em nada inova no que tange à postura de procurar uma etiologia</p><p>do delito. Os criminólogos ainda insistem em encontrar “causas” para o crime, somente alterando a</p><p>natureza destas, transplantando-as do criminoso para o</p><p>Criminógenos</p><p>Evitada ou eliminada a causa, não há como surtir efeito.</p><p>3 – A Solução para o problema criminal está em tran sformar o Mau Caráter para Bom Caráter</p><p>A vontade está sempre vinculada ao caráter. O caráter é que empresta à vontade a disposição para os</p><p>atos. A vontade não age por si só, mas de acordo com o caráter. Se o caráter é bom (moralmente</p><p>bem-formado), a vontade não vai agir para a consecução de fins maus; se o caráter é mau (moralmente</p><p>malformado), a vontade só pode agir para a consecução de fins maus.</p><p>REGRA - Se o crime decorre da má formação do caráter, basta que os pais e educadores, formem bem</p><p>e moralmente o caráter das crianças e dos adolescentes para que não se tenha, no futuro, criminosos</p><p>perigosos e antissociais e, se assim mesmo ocorrer o crime, basta depurar o caráter moralmente</p><p>malformado, através de um processo restaurador, resgatando-se a dignidade daquele que a perdeu,</p><p>oportunizando-se com isso, a sua volta à comunhão social.</p><p>A sociedade não pode conviver com indivíduos perigosos e antissociais.</p><p>EXCEÇÃO A ESTA REGRA - o mau caráter resulta tanto de fatores exógenos como endógenos. Se o</p><p>mau caráter resultou de fatores exógenos ou fatores sociais, a raiz do problema é apenas moral e o</p><p>criminoso é passível de recuperação por meios pedagógicos (laborpsicoterapia) e o índice da incidência,</p><p>neste caso, é de 90 a 95%, mas se resultou de fatores endógenos, o seu portador só pode ser</p><p>recuperado por meios médico-psiquiátricos, desde que isso seja possível ou viável (5 a 10%).</p><p>FATORES CRIMINÓGENOS COMO FONTES DE ABASTECIMENTO D O CRIME NA</p><p>SOCIEDADE</p><p>Conceitos Gerais sobre Causa-Efeito</p><p>Causa é tudo o que provoca uma consequência ou um resultado. Obviamente que efeito é a</p><p>consequência ou resultado da causa.</p><p>O criminologista brasileiro, ORLANDO SOARES, em seu livro “CRIMINOLOGIA”, 1976, falando de</p><p>“Fatores Criminógenos” e “Fenômenos Sociais”, declara: “considera-se fator aquilo que pelas suas</p><p>características ou condições, contribui ou concorre para um resultado, isto é, torna viável o efeito,</p><p>servindo-se de nexo, entre este e a causa, relacionando-os naturalmente”. Mas, assim como em</p><p>Matemática, um só fator não dá produto, o caráter criminoso não resulta de um só fator.</p><p>Nada ocorre ao acaso. Não há geração espontânea. Todos os fenômenos, tudo o que for capaz de</p><p>impressionar os sentidos humanos, produz-se devido a relação causa e efeito.</p><p>Como já vimos, os fatores criminógenos são divididos em fatores exógenos e endógenos. Os fatores</p><p>exógenos são os fatores sociais como os sócio-familiares, sócio-educacionais, socioeconômicos,</p><p>socioambientais (más companhias) e outros concorrentes como migração, favelização, adensamento</p><p>populacional, mídia, drogas, álcool, prostituição, corrupção, porte de armas, etc.</p><p>Nos fatores endógenos, se encontram várias modalidades de portadores de personalidade psicopáticas,</p><p>neuróticas e doenças mentais, manifestadas no ser humano e reveladas através de desvios da conduta</p><p>deformada – anômala ou anormal em relação aos padrões socialmente aceitáveis.</p><p>POLÍTICA CRIMINAL DE PREVENÇÃO DO DELITO</p><p>Prevenção do delito</p><p>A constante busca de um ideal, seja moral, religioso, político ou social, tem caracterizado sempre a</p><p>aventura humana. Essa permanente indagação deu origem a determinadas crenças, algumas das quais,</p><p>pelo seu caráter perene e pela distância as separa da realidade observável, têm-se transformado às</p><p>vezes em mitos de grande importância. Esses mitos dominam numerosos aspectos da vida social, sendo</p><p>especialmente abundantes no setor da justiça penal. Um deles é o da prevenção da delinquência.</p><p>Existe um consenso generalizado em considerar que a prevenção do delito constitui um objetivo</p><p>importante do sistema penal. Afirma-se com frequência que é melhor prevenir o crime do que reprimi-lo.</p><p>De forma mais concreta, quase todos os especialistas na matéria estimam que a prevenção do delito</p><p>representa, senão a principal função, pelo menos uma das funções mais importantes e tradicionais da</p><p>polícia.</p><p>Apesar de certos filósofos terem abordado esse tema há muito tempo e dado ainda que diversas</p><p>instituições jurídicas parecem ter respondido a idênticas inquietações, a preocupação com a prevenção</p><p>do delito é uma tendência atual. O direito clássico não poderia acolhê-la na medida em que o legislador,</p><p>para efeitos da sanção penal, pretendia da injúria feita contra a lei ou simplesmente a dor do dano</p><p>causado pela infração. A noção moderna de prevenção aparece timidamente com a escola clássica,</p><p>segundo a qual a pena exerce uma importante função de intimidação geral, mas tem a sua verdadeira</p><p>origem na escola positiva de finais do século XIX.</p><p>Entre as principais razões que colocaram em evidência a necessidade de novos enfoques em relação à</p><p>prevenção, devem ser mencionadas as seguintes:</p><p>1) o aumento da delinquência grave e o aparecimento de novas formas de criminalidade;</p><p>2) as repercussões do delito na sociedade (lesões, perdas econômicas, impacto emocional, efeitos</p><p>desfavoráveis sobre a qualidade de vida, etc.) e, em particular, em determinados grupos (pessoas idosas,</p><p>deficientes físicos, mulheres, crianças, etc.);</p><p>3) o sentimento de insegurança cada vez maior dos cidadãos e suas consequências (inibição,</p><p>desconfiança, angustia, solicitação de medidas repressivas, mudanças nas condutas normais,</p><p>organização de sistemas coletivos de proteção, utilização com fins políticos ou partidários do sentimento</p><p>de medo do crime, etc.);</p><p>4) os custos cada vez mais elevados do conjunto do sistema penal e, em particular, dos serviços</p><p>policiais, assim como os custos indiretos do delito (sistemas de segurança, seguros, etc.);</p><p>5) a baixa percentagem de solução do delito;</p><p>6) a pouca participação do público no funcionamento da justiça penal e a insatisfação generalizada da</p><p>população em relação ao conjunto do sistema penal;</p><p>7) a ausência de parâmetros para a articulação de uma política criminal moderna e progressista.</p><p>Com relação à prevenção, as principais carências sã o:</p><p>1) a imprecisão e inadequação do significado desse termo;</p><p>2) por um lado, a falta de informação e de conhecimentos nesse setor e, por outro lado, e,</p><p>paradoxalmente, a proliferação de programas;</p><p>3) a ausência de continuidade nas ações empreendidas;</p><p>4) a falta de coordenação entre os órgãos que se ocupam da prevenção e a carência de</p><p>responsabilidades precisas desses órgãos;</p><p>5) o pouco apoio profissional e material necessário para uma ação eficaz nesse setor;</p><p>6) a relativa ausência de participação da comunidade na prevenção do delito.</p><p>Finalmente, no que tange à prevenção policial, deve m ser assinaladas as seguintes lacunas:</p><p>1) a existência de diversas concepções sobre o que deve ser a sua ação preventiva;</p><p>2) uma certa confusão sobre os objetivos da polícia (prevenção, repressão, detecção do delito, etc.);</p><p>3) a existência de poucos policiais que receberam uma formação suficiente sobre as técnicas e os</p><p>métodos preventivos;</p><p>4) muitos programas mal concebidos ou mal aplicados;</p><p>5) são poucos os recursos humanos e materiais destinados à prevenção;</p><p>6) são também raras as avaliações sobre os programas desse tipo colocados em pratica pela polícia;</p><p>7) alguns deles não se prestam a uma fácil avaliação.</p><p>Conter o crescimento da violência através da elaboração de políticas de segurança pública que</p><p>respondam com menos repressão ao complexo conjunto de problemas sociais, é o grande desafio de</p><p>toda sociedade democrática.</p><p>Grandes períodos de estagnação econômica ratificam as tensões sociais, muitas vezes manifestadas</p><p>pelo aumento da criminalidade urbana violenta através de roubos, assaltos, sequestros, desenvolvimento</p><p>e/ou fortalecimento do crime organizado. Porém, ao menos em relação ao desemprego, o sentido de</p><p>causalidade do aumento da criminalidade permanece, ainda, um parâmetro amparado por truísmos sem</p><p>muita evidência empírica que auxilie em sua compreensão. Análises da relação direta entre taxas de</p><p>desemprego e de criminalidade ficam prejudicadas pelo fato de as suas consequências serem sentidas</p><p>apenas tardiamente, a partir</p><p>do momento em que começam a exaurir os recursos e as esperanças do</p><p>desempregado.</p><p>Na atualidade, as ciências voltadas para a temática criminal buscam compreender o crime como um</p><p>fenômeno global, consequência da atuação conjunta de seus componentes (ofensor, ofendido e</p><p>ambiente) sob a ação de fatores socioeconômicos, políticos e culturais. Compreender a dinâmica criminal</p><p>não significa detectar os espaços de crimes/criminosos e suas características para ações repressivas.</p><p>Significa, antes de tudo, entender os processos operacionais do crime para antecipar-se à sua</p><p>ocorrência, prevenindo-o.</p><p>Políticas de segurança só poderão ser formuladas com o apoio de movimentos sociais e de instituições</p><p>como a universidade pública, capazes de estabelecer diagnósticos complexos que fujam às respostas</p><p>simplificadoras que inevitavelmente apenas apontam para a intensificação da violência institucional. Ao</p><p>dar crédito à relação de causalidade entre pobreza e criminalidade, corre-se o risco de legitimar ações</p><p>repressivas dirigidas ao segmento financeiramente desfavorecido.</p><p>A integração entre a pesquisa teórica e a ação poderá significar o desenvolvimento de novos “modelos</p><p>de eficiência” policial com embasamento científico, fugindo-se dos “achismos” costumeiros. Acreditamos</p><p>que a elaboração de formas democráticas de intervenção social, capazes de romper com o círculo</p><p>vicioso da brutalidade, depende do desenvolvimento de novos conhecimentos científicos a serem</p><p>aplicados no combate e prevenção à violência.</p><p>Entre outras disciplinas, a Moderna Criminologia está se consolidando como um empreendimento</p><p>interdisciplinar, constituído a partir de informações empíricas confiáveis sobre as principais variáveis do</p><p>delito, as suas características específicas (tempo oportuno, espaço físico adequado, vítimas potenciais</p><p>etc.) e as formas como interagem, sugerindo estratégias de prevenção mais ousadas que vão além do</p><p>ofensor, atinjam as vítimas, o espaço, o desenho arquitetônico, e, no âmbito generalizado da violência,</p><p>contemplem as variáveis sociais como pobreza, desigualdade social e qualidade de vida nos seus</p><p>diversos âmbitos: saúde, educação e moradia entre outros.</p><p>É preciso considerar que a violência é muito mais ampla que a criminalidade. Como dizia Ghandi, a</p><p>pobreza é a pior forma de violência. Portanto, a sua prevenção deve se pautar por políticas que</p><p>intervenham positivamente nas suas causas últimas que são o esfacelamento das relações sociais e a</p><p>carência de atendimento às necessidades básicas e de outros serviços que valorizem a cidadania.</p><p>Sob essa ótica, também a prevenção criminal deve ser comunitária, inter e multi-institucional, inter e</p><p>multidisciplinar. Se a universidade consegue formular problemas, alternativas e soluções, em âmbito</p><p>teórico, os Órgãos de Segurança formulam ações, estruturações técnicas baseadas em “modelos de</p><p>efetividade e eficiência” que devem ser subsidiadas pela pesquisa científica.</p><p>Dessa interação, a sociedade é a maior beneficiária. Ações isoladas dos Órgãos de Segurança Pública</p><p>apenas deslocam a criminalidade sem, contudo, atingirem as suas causas.</p><p>É sabido que vários programas bem-sucedidos de controle da criminalidade vão além do Sistema de</p><p>Justiça Criminal e podem estar fora do controle das organizações formais. Programas de ação,</p><p>integrados entre o Estado e a sociedade são muito mais eficazes, indubitavelmente.</p><p>A Teoria da Dissuasão (Deterrence Theory), que credita apenas às organizações do Sistema de Justiça</p><p>Criminal a responsabilidade pelo controle da criminalidade está sendo reavaliada com sérias críticas.</p><p>Para GARCÍA-PABLOS DE MOLINA (1992: 262), mais e melhores policias, mais e melhores juízes, mais</p><p>e melhores prisões [...] significa mais infratores na prisão, mais condenados, porém, não</p><p>necessariamente, menos delitos. Uma substancial melhora da efetividade do sistema legal incrementa,</p><p>desde logo, o volume do crime registrado, se apuram mais crimes e reduz a distância entre os números</p><p>“oficiais” e os “reais” (cifra negra). Porém, não por isso se evita mais crime nem se produz ou gera menos</p><p>delitos em idêntica proporção: só se detecta mais crimes.</p><p>Enquanto a Polícia Militar é a instituição responsável pelo policiamento ostensivo, prevenindo e</p><p>reprimindo crimes, auxiliando, orientando e socorrendo os cidadãos; a Polícia Civil é responsável pela</p><p>prevenção indireta através da investigação para a solução dos crimes – ambas, portanto, em contato</p><p>direto com a população.</p><p>Nesse sentido, não mais se concebe uma polícia apartada dos inúmeros problemas sociais enfrentados</p><p>pelos membros de sua comunidade. A atuação da polícia preventiva deve pautar-se pelo conhecimento</p><p>do contexto social em que está atuando. Quanto maior o conhecimento, melhor a qualidade de</p><p>manutenção da ordem, pois o comportamento policial corresponderá à necessidade de melhoria de</p><p>qualidade de vida, no aspecto segurança, proporcionando a oportunidade de elevar o nível de cidadania.</p><p>O Desenvolvimento de uma nova concepção de ordem pública pelo caminho da reeducação da polícia e</p><p>da população, num processo de conscientização de seus papéis, é o primeiro passo. Além do</p><p>desempenho de suas funções tradicionais, os policiais devem instruir os cidadãos sobre regras básicas</p><p>de prevenção ao crime, participar de reuniões com os moradores (Associações de Bairros) para a</p><p>organização de estratégias coletivas e intermediar o contato dos cidadãos com outras agências</p><p>(governamentais ou não) na busca de soluções para a comunidade. Nesse sentido, também a</p><p>participação do poder executivo municipal é essencial através de suas diversas secretarias como</p><p>educação e cultura, habitação e planejamento urbano, saúde, bem-estar social.</p><p>Por outro lado, a população será reeducada para o exercício da cidadania nos dois sentidos: direitos e</p><p>deveres. Ato contínuo, ao estabelecer contato com os órgãos oficiais para reivindicar benefícios, a</p><p>comunidade conhecerá as potencialidades, competências e limitações da polícia, e se conscientizará da</p><p>sua responsabilidade no processo. Com essa aproximação, também as ações policiais se tornam mais</p><p>transparentes, reduzindo as arbitrariedades e violências.</p><p>Nunca é demais ratificar que a universidade é hoje o principal espaço de surgimento de ideias e projetos</p><p>que podem tornar melhor a vida da população em todos os aspectos, bastando sair de sua tradicional</p><p>política intramuros. E a prevenção criminal, apesar de ser prioritariamente uma questão de segurança</p><p>pública, pode e de deve ser inserida não apenas em suas preocupações teóricas mas contemplada por</p><p>ações de extensão à comunidade via participação nas políticas de ação social.</p><p>Políticas criminais para a prevenção de delitos:</p><p>• investimentos em pesquisas sistemáticas que coloquem suas conclusões à disposição dos segmentos</p><p>da sociedade, preocupados com a qualidade de vida humana e com a redução nos níveis de violência;</p><p>• prevenção primária através de programas político-sociais que se orientem para a valorização da</p><p>cidadania, dando atendimento às necessidades básicas como emprego, educação, saúde, habitação,</p><p>lazer etc.;</p><p>• reestruturação urbana dos espaços conflitivos, incidindo positivamente no habitat físico e ambiental,</p><p>com implicações na ativa prevenção do delito e dos riscos para o delinquente, porém, fomentando-se</p><p>atitudes positivas de solidariedade e responsabilidade pois a barreira física, apenas, leva a outros delitos</p><p>e ao desenvolvimento de técnicas ofensivas mais elaboradas;</p><p>• prevenção de reincidência dos condenados através da ressocialização. Apesar de ser um programa</p><p>de tratamento, indiretamente também é preventivo devido à enorme reincidência - há muito mais delitos</p><p>que delinquentes;</p><p>• substitutivos penais para os infratores eventuais de crimes sem gravidade, sem índole e habilidade</p><p>criminosas, mas que poderão desenvolvê-las em contato com os condenados das prisões. O substitutivo</p><p>penal também evita a estigmatização;</p><p>• ações públicas e comunitárias dirigidas ao jovem, grupo mais vulnerável à criminalidade</p><p>em geral</p><p>(como autor ou vítima), e com participação elevada nos índices de morte violenta, a chamada “morte</p><p>evitável”. Programas de orientação cognitiva (treinamento e aquisição de habilidades) podem ser</p><p>altamente positivos para o extravasamento da violência e das frustrações, canalizando-as para ações</p><p>positivas. Sabendo-se que a maior parte dos jovens delinquentes tem família, mesmo que</p><p>desestruturada, é dever dela (família), da escola, através das organizações civis e do poder público</p><p>promover ações educativas e reintegradoras do jovem à sociedade;</p><p>• desenvolvimento de pesquisas independentes através de surveys de vitimização, mais realistas que</p><p>as estatísticas oficiais. A grande distância entre a criminalidade “real” e a “registrada” denuncia, também,</p><p>as imunidades institucionais da classe média e alta, que faz os seus componentes serem menos</p><p>detectados e/ou detidos e processados, e, em menor grau ainda, condenados;</p><p>• campanhas de prevenção vitimária, articuladas pelos meios de comunicação, de mudança de</p><p>comportamento das pessoas integrantes dos chamados “grupos de risco”, potencialmente sujeitas a</p><p>vitimização - to be in the wrong place at the wrong time. Diversos estudos na área de Saúde Pública</p><p>consideram agressão e direção perigosa, características de pessoas similares com tendências suicidas</p><p>e/ou homicidas;</p><p>• programas de mudança de mentalidade da polícia e da sociedade em geral sobre a necessidade de</p><p>reportagem dos crimes para a redução da criminalidade oculta. O aparato de controle envolve as atitudes</p><p>da vítima e da polícia (ignorar ou registrar), que por sua vez está condicionado também ao grau de</p><p>confiança que esta inspira àquela;</p><p>• programas de sensibilização e solidariedade à vítima, especialmente dos crimes sexuais, que são</p><p>altamente subestimados por seu caráter estigmatizante;</p><p>• programas de redução de circulação de armas de fogo para uso particular. Diminuindo o número de</p><p>armas de fogo em circulação haveria redução na mortalidade, mesmo que não reduzisse a violência,</p><p>devido à alta letalidade dessas armas. Ademais, indiretamente estaria deixando de armar o bandido que</p><p>tem na vítima uma das formas de aquisição desse instrumento. Paralelamente, a vigilância nas fronteiras</p><p>também seria uma forma de desarmamento já que a origem da maior parte das armas em circulação é</p><p>externa ao país.</p><p>• reavaliação do conteúdo disciplinar das escolas de formação de policiais (civil e militar), dando maior</p><p>ênfase às humanidades. A atuação policial reveste-se, muitas vezes, de tanta arbitrariedade e violência,</p><p>que desvirtua a sua tarefa de proteção do cidadão e manutenção da ordem pública.</p><p>• Implantação definitiva da polícia comunitária, vista como uma nova filosofia de comportamento</p><p>integrado com a sociedade. A integração dos segmentos (polícia e comunidade) reduz a violência policial</p><p>e aumenta a conscientização da sociedade para a sua responsabilidade no processo criminal.</p><p>Políticas públicas de prevenção da violência e a pr evenção vitimaria.</p><p>Segundo a criminologia moderna, a violência não é somente um problema da polícia e os esforços no</p><p>seu combate não devem ser direcionados somente ao infrator. Falar sobre combate a criminalidade é</p><p>falar principalmente sobre prevenção. A melhor forma de se combater ou diminuir a criminalidade é</p><p>alcançando o crime em suas causas, suas raízes, não suas consequências.</p><p>Mas o que podemos entender como prevenção da criminalidade? Garcia-Pablos de Molina afirma que a</p><p>criminologia clássica direciona todos os seus esforços preventivos para o infrator pois entende a ameaça</p><p>da aplicação da pena como modo eficaz de neutralizá-lo. “Não existe, pois, outro possível destinatário</p><p>dos programas de prevenção criminal, tendo em vista o protagonismo absoluto que se outorga ao</p><p>delinquente” (Molina & Gomes, 1997: 74).</p><p>É como se o infrator fizesse um balanço entre os custos e benefícios caso cometa o crime, e de uma</p><p>maneira refletida, decide consumá-lo. É a Teoria da Escolha Racional, onde o indivíduo confronta, de um</p><p>lado, o volume da punição, e principalmente as probabilidades de detenção e aprisionamento, e de outro,</p><p>o custo da oportunidade de cometer crime, os potenciais ganhos resultantes da ação criminosa, traduzido</p><p>como salário alternativo no mercado de trabalho (Becker, 1968) e então decide sua participação em</p><p>atividades criminosas a partir desta avaliação entre ganhos e perdas.</p><p>Já a moderna criminologia aceita a possibilidade de diminuir a delinquência através de diversas outras</p><p>formas que não exclusivamente o delinquente, destacando as formas de prevenção primária, secundária</p><p>e terciária.</p><p>A prevenção primária ressalta a educação, a habitação, o trabalho, a inserção do homem no meio social,</p><p>a qualidade de vida, como elementos essenciais para a prevenção do crime, elementos estes que</p><p>operam sempre a longo e médio prazo e se dirigem a todos os cidadãos. São estratégias de política</p><p>econômica, social e cultural, cujo objetivo primário seria oferecer qualidade de vida ao cidadão, e último</p><p>seria dotar o cidadão de capacidade social para superar eventuais conflitos de forma produtiva.</p><p>A prevenção secundária atua mais tarde, nem quando nem onde o conflito criminal se produz ou é</p><p>gerado mas onde se manifesta ou se exterioriza. Opera a curto e médio prazo e se orienta seletivamente</p><p>a grupos concretos, ou seja, grupos ou subgrupos que ostentam maiores riscos de padecer ou</p><p>protagonizar o problema criminal. São exemplos a política legislativa penal e a ação policial, políticas de</p><p>ordenação urbana, controle dos meios de comunicação.</p><p>A prevenção terciária tem um destinatário perfeitamente identificável, o recluso, o condenado, e um</p><p>objetivo certo, qual seja o de evitar a reincidência através de sua ressocialização.</p><p>A seguir, trataremos dos principais programas de prevenção, em teoria, e as devidas correntes</p><p>criminológicas nas quais se inspiraram.</p><p>Principais programas de prevenção</p><p>Prevenção sobre áreas geográficas: é nos núcleos urbanos industrializados que se identifica a</p><p>concentração dos mais elevados índices de criminalidade, por serem áreas muito deterioradas, pobres</p><p>de infraestrutura, e com significativos níveis de desorganização social. É com base na Escola de Chicago</p><p>que se faz uma análise sobre a expansão das cidades e o fenômeno da industrialização, de onde</p><p>emergem novos fenômenos sociais, a partir das provocadas mudanças na ordem econômica,</p><p>demográfica e espacial. É desse turbilhão que surge um novo ambiente, marcado por grandes</p><p>desigualdades e propício ao surgimento de condutas desviadas, muitos deles tipificados pela legislação</p><p>como crime.</p><p>O crime é então um produto social do urbanismo. Essa teoria baseia-se na perspectiva de vida coletiva</p><p>como um processo adaptativo consistente de uma interação entre meio-ambiente, população e</p><p>organização (Freitas, 2002). O comportamento humano é visto como sendo moldado por vetores</p><p>socioambientais, portanto, o crime não é considerado um fenômeno individual, mas ambiental, no sentido</p><p>de que o ambiente compreende os aspectos físico, social e cultural da atividade humana.</p><p>Sugere-se então atitude de intervenção dos poderes públicos nestas áreas marginalizadas, com</p><p>programas de reordenação urbana, melhoria de infraestrutura, oferecimento de serviços públicos</p><p>básicos. A prevenção do delito também pode acontecer por meio da reestruturação física ou urbanização</p><p>dos bairros, procurando-se assim neutralizar o risco criminógeno ou vitimário de certos espaços, a partir,</p><p>por exemplo, de medidas de melhoramento das vias de acesso as residências ou local de trabalho,</p><p>melhorias na iluminação, no sistema de transporte público e da criação de pontos de observação ou</p><p>vigilância. Seriam espécies de barreiras ao crime, que dificultariam o acesso e incrementariam o risco</p><p>para o infrator potencial.</p><p>Todavia, devemos observar a possibilidade desta política de prevenção se tornar em política de conteúdo</p><p>ofensivo e discriminatório, com base no entendimento segundo o qual a criminalidade estaria</p><p>concentrada</p><p>nos locais de alta densidade demográfica, e menos favorecidos. Seriam então vítimas de</p><p>discriminação principalmente os cidadãos marginalizados, pois frequentemente residem nos ambientes</p><p>onde há grande concentração demográfica e falta de estrutura urbana. Desta forma, o público alvo</p><p>destes programas seriam com frequência os marginalizados, ou aqueles que pelo fato de estarem à</p><p>margem numa série de aspectos, habitam nos bairros menos favorecidos ou mais conflituosos.</p><p>Prevenção dirigida à reflexão axiológica: seria a revisão de atitudes, de valores e de pautas de</p><p>comportamento. Para evitar certos comportamentos no futuro, faz-se necessário substituir os valores</p><p>sociais que os sustentam no presente. A criminalidade dos jovens e crianças é um exemplo, pois o crime</p><p>é aprendido, segundo a teoria do Aprendizado Social (ou da Associação Diferencial).</p><p>De acordo com Sutherland (apud Kuhn, 2002, 41) os indivíduos determinam seus comportamentos a partir de</p><p>suas experiências pessoais com relação a situações de conflito, por meio de interações pessoais e com</p><p>base no processo de comunicação. Desta aprendizagem, determinam-se os comportamentos favoráveis</p><p>e desfavoráveis ao crime. Neste sentido, tanto os contatos pessoais, como o contato com métodos e</p><p>técnicas criminosas são formas de aprendizado que motivariam e legitimariam o comportamento</p><p>delituoso.</p><p>Sutherland então constrói nove hipóteses onde a primeira, a segunda e a quarta são consideradas as</p><p>mais relevantes. O comportamento criminal é apreendido (primeira hipótese). É dentro do processo de</p><p>comunicação com as outras pessoas (segunda hipótese) que a aprendizagem começa pela transmissão</p><p>e imitação de técnicas e de atitudes criminosas (quarta hipótese).</p><p>Esta teoria pode explicar claramente a delinquência juvenil dos bairros menos favorecidos das cidades</p><p>brasileiras. A sociedade adulta deveria passar mensagens de êxito ou triunfo pessoal, mas não a</p><p>qualquer preço. E ainda, não somente evitar comportamentos negativos, mas levar mensagens e</p><p>modelos positivos de conduta que outorguem um sentido a existência.</p><p>Todavia, são feitas críticas no que se refere a relação de causalidade desta teoria. São os contatos com</p><p>criminosos que levam o indivíduo a uma vida criminosa, ou o indivíduo criminoso procura laços com</p><p>grupos de criminosos?</p><p>Prevenção do delito de inspiração político social: boa parte da criminalidade de que uma sociedade</p><p>padece tem raízes em conflitos sociais, como situações carenciais, desigualdades, conflitos não</p><p>resolvidos. Isto fica bem claro a partir da teoria da Anomia, que deve ser entendida na perspectiva de</p><p>Durkheim (1897) e de Merton (1957).</p><p>Segundo Durkheim o crime é um fato social. O homem não vive num ambiente de eleição, mas sujeito a</p><p>uma ordem imposta, estabelecendo-se, assim, as condições para a produção do crime.</p><p>Introduzindo a teoria da anomia, Durkheim explica que o crime é uma manifestação de um</p><p>desregulamento social. O crime é fruto da estimulação de desejos, decorrentes da modernização.</p><p>Anomia significa uma falta, um espaço, um branco, que devido ao seu não preenchimento de forma lícita,</p><p>estimula no homem o instinto de preenchê-lo de qualquer maneira, ainda que de forma ilícita. A</p><p>modernização e a urbanização são fenômenos que provocam a anomia pois aumentam a quantidade e a</p><p>variedade de bens de consumo, mas ao mesmo tempo, provocam na sociedade uma insuficiência de</p><p>bens, pois nem sempre são disponíveis. Ainda mais, a satisfação do homem é evolutivamente refinada.</p><p>Desta forma, a anomia é a distância entre o crescimento de bens disponíveis e a evolução dos desejos</p><p>do homem.</p><p>Quanto mais a sociedade se moderniza, mais será anomica pois os desejos do homem serão sempre</p><p>maiores que os recursos disponíveis. Em período de crise econômica, por exemplo, onde produção e</p><p>recursos diminuem de maneira brutal, os desejos humanos continuam a crescer. Não há então uma</p><p>equivalência ou adaptação entre ambos.</p><p>Merton (1957) reformulou a teoria de Durkheim trazendo uma nova abordagem. Segundo ele a motivação</p><p>para a delinquência decorreria da impossibilidade de o indivíduo atingir as metas desejadas por ele, como</p><p>o sucesso econômico. Esse modelo de explicação funcionalista consiste em reportar o crime a uma</p><p>possível contradição entre estrutura social e estrutura cultural. A cultura, em determinado momento do</p><p>desenvolvimento de uma sociedade, propõe ao indivíduo determinadas metas, como, por exemplo, um</p><p>certo nível de bem-estar e de sucesso econômico, o carro X, a roupa Y. Proporciona também modelos de</p><p>comportamento institucionalizados que resguardam que aquelas metas deverão ser alcançadas através</p><p>de meios legítimos.</p><p>Todavia, pode existir desproporção entre os fins culturalmente reconhecidos como válidos e os meios</p><p>legítimos de que dispõe o indivíduo para alcançá-los. E esta desproporção está na origem dos</p><p>comportamentos desviantes. A Anomia é, portanto, “crise da estrutura cultural, que se verifica</p><p>especialmente quando ocorre uma forte discrepância entre normas e fins culturais, por um lado, e as</p><p>possibilidades socialmente estruturadas de agir em conformidade com àquelas, do outro lado” (Merton,</p><p>1957).</p><p>Em síntese, inspirado por Sutherland, Merton explica que existem sociedade extremamente pobres</p><p>(carência de bens disponíveis, anômicas) onde os índices de criminalidade são baixos, como na Índia.</p><p>Então não seria necessariamente a falta de bens de primeira necessidade o que é determinante, mas sim</p><p>a tensão resultante da estrutura social destes países onde encontramos desigualdade. A criminalidade é</p><p>resultado da distância entre o desejo de vencer na vida e os meios disponíveis para vencer na vida, como</p><p>educação, saúde, trabalho e dinheiro (apud Kuhn, 2002).</p><p>Observando o contexto social do nosso país, a tensão decorrente do modo de vida advindo dessa</p><p>estrutura nos faz concluir que temos que buscar suporte principalmente nesta teoria, para justificarmos o</p><p>aumento da criminalidade, e assim, portanto, tentar buscar soluções de caráter principalmente social que</p><p>possam amenizar o problema. Uma ambiciosa política social se converte então no melhor programa de</p><p>prevenção criminal, já que pode intervir nas causas, do qual o crime é um mero sintoma ou indicador.</p><p>Prevenção Vitimária: é a prevenção a partir da vítima, verificando o seu potencial vitimal. A partir da</p><p>consciência do papel ativo da vítima na dinâmica do delito, a prevenção vitimária sugere uma intervenção</p><p>nos grupos de vítimas potenciais que ostentam, por diversos motivos, tais como condição social, física,</p><p>idade, sexo ou origem, maiores riscos de sofrerem agressões. “O crime é um fenômeno altamente</p><p>seletivo, não casual, nem fortuito ou aleatório: busca o lugar oportuno, o momento adequado, e a vítima</p><p>certa também. A condição de vítima – ou risco de chegar a sê-lo – tampouco depende do azar ou da</p><p>fatalidade, senão de certas circunstâncias concretas, suscetíveis de verificação” (Molina & Gomes, 1997: 75).</p><p>É a teoria da ocasião ou do situational approach, segundo a qual o homem é influenciado por elementos</p><p>que estão ao seu redor para a prática do crime. Desta forma, segundo o estilo de vida da vítima (life style</p><p>model, de Hondenlang, Gottfredson e Garofalo, 1978), o risco de se sofrer uma vitimização pode também</p><p>ser maior, bastando que a vítima potencial encontre um autor motivado.</p><p>No aspecto prevencional, a teoria da ocasião de certa forma contribuiu para algumas inovações na</p><p>política criminal. A noção de hot spots trouxe para as discussões criminais a preocupação com locais</p><p>onde exista uma concentração de causas que possam levar ao crime, como bairros menos favorecidos e</p><p>marginalizados, ou locais frequentados pela noite, ainda que em bairros mais favorecidos, mas onde se</p><p>possa encontrar uma combinação de fatores que possam levar ao crime, tais como drogas, bebida e</p><p>dinheiro</p><p>Ainda segundo a mesma teoria da ocasião, o segundo aspecto a ser observado para a prevenção</p><p>vitimária seria a rotina de vida: routine activity approach (Chen & Felson, 1979). Não somente o lugar que</p><p>a</p><p>vítima frequenta é importante, mas também sua rotina de vida. O crime é cometido quando o autor</p><p>motivado encontra sua vítima potencial e desprotegida. Desta forma, há um equilíbrio entre as condições</p><p>objetivas que oportunizam o crime, e as condições objetivas produzidas pela própria vítima, a partir da</p><p>sua rotina.</p><p>Sondagens de vitimização foram feitas em alguns países da Europa, na intenção de mesurar a</p><p>criminalidade oculta e traçar o perfil das vítimas mais frequentes de crimes. Perguntou-se ao entrevistado</p><p>se já havia sido vítima de algum delito, qual delito, em que período, em que lugar, quais as características</p><p>do infrator, se o infrator era conhecido, qual foi o prejuízo advindo do crime, se o fato foi noticiado à</p><p>autoridade competente e se houve intervenção desta (Killias, 2001; Molina & Gomes, 1997).</p><p>O que foi identificado nestas pesquisas, além da total discordância entre os delitos registrados na polícia</p><p>e os índices de vitimização detectados pela pesquisa, principalmente nos delitos sexuais, foi que alguns</p><p>delitos podem ser evitados a partir do momento em que se conhece o público alvo das infrações e as</p><p>condições físicas em que estes se desenvolvem Com frequência, são mais vítimas de violência pessoas</p><p>que tem uma rotina mais agitada, e que declaram passar mais tempo fora do que dentro de casa, seja</p><p>trabalhando ou se divertindo. Inclui-se ai os índices de violação de domicílio, que aumenta também entre</p><p>as pessoas que viajam com mais frequência (Killias, 2001). É comum que a vítima conheça seu agressor,</p><p>principalmente quando falamos de mulheres vítimas de violência. Os jovens do sexo masculino e os que</p><p>têm nível superior de escolaridade são o público mais frequentemente alvo da criminalidade urbana (Kahn,</p><p>2002).</p><p>Isto demonstra a possibilidade de detectarmos os indicadores que convertem as pessoas em candidatos</p><p>à vitimização. Através de um estudo do comportamento, do perfil da vítima, e das possibilidades que</p><p>algumas têm de se tornarem vítimas, pelo meio em que vivem, ou por serem de classes mais</p><p>vulneráveis, tais como mulheres, crianças, idosos, estrangeiros, marginalizados, podemos elaborar</p><p>políticas criminais de segurança pública mais objetivas. Podemos verificar também os locais e momentos</p><p>mais prováveis de vitimização, trabalhando com estas pessoas de forma que evitem estes espaços e</p><p>comportamentos considerados mais perigosos, ou então que organizem sua vida de forma a evitar</p><p>sofrerem crimes, que assumam atitudes em defesa de seus próprios interesses, desde o momento em</p><p>que já conhecem o motivo que as torna mais vulneráveis.</p><p>O outro aspecto das políticas de prevenção vitimária que é importante ressaltar é a cultura do medo que</p><p>estas políticas podem desenvolver. O medo que cidadãos, ou vítimas em potencial, passam a</p><p>desenvolver em seu psíquico através do mecanismo natural de autodefesa.</p><p>ambiente criminógeno. Em suma, muda o “locus”</p><p>da pesquisa, mas não muda a natureza claramente etiológica desta.</p><p>Os estudos relativos à atuação do ambiente na criminalidade são variegados, podendo-se mencionar</p><p>alguns ramos a título meramente exemplificativo: Geografia Criminal e Meio Natural, Metereologia</p><p>Criminal, Higiene e Nutrição, Sistema Econômico, Mal vivência, Ambiente familiar, Profissão, Guerra,</p><p>Migração e Imigração, Prisão e contágio moral, Meios de Comunicação etc.</p><p>Ainda no matiz sociológico deve-se dar atenção especial às chamadas “Teorias</p><p>Estrutural-Funcionalistas”, as quais podem ser tratadas como item apartado, tendo em vista suas</p><p>peculiaridades.</p><p>As Teorias Estrutural-Funcionalistas afirmam que o crime é produzido pela própria estrutura social,</p><p>inclusive exercendo uma certa função no interior do sistema, de maneira que não deve ser visto como</p><p>uma anomalia ou moléstia social.</p><p>A base teórica principal é ofertada por Émile Durkheim que dá ênfase para a normalidade do crime em</p><p>toda e qualquer sociedade. Aduz o autor em referência que “o crime é normal porque uma sociedade</p><p>isenta dele é completamente impossível”. Mas, o autor vai além, chegando a reconhecer que o crime</p><p>não somente é normal, mas também “é necessário” para a coesão social, sendo uma sociedade sem</p><p>crimes indicadora, esta sim, de deterioração social. Durkheim indica o fenômeno criminal como</p><p>reafirmador da ordem social violada e, portanto, legitimador de sua existência. Toda vez que acontece</p><p>um crime, a reação desencadeada contra ele reafirma os liames sociais e ratifica a validade e a vigência</p><p>das normas legais.</p><p>Portanto, o desvio é funcional, somente tornando-se perigoso ao exceder certos limites toleráveis. Em</p><p>tais circunstâncias pode eclodir um estado de desorganização e anarquia, no qual todo o ordenamento</p><p>normativo perde sua efetividade. Não emergindo disso um novo ordenamento a substituir aquele que</p><p>ruiu, passa-se a uma situação de carência absoluta de normas ou regras, ficando a conduta humana à</p><p>margem de qualquer orientação. A isso Durkheim dá o nome de “anomia”, efetiva causadora de</p><p>desagregação e deterioração social.</p><p>O conceito de “anomia” e o reconhecimento da funcionalidade do crime no meio social produzem uma</p><p>revolução quanto às finalidades e fundamentos da pena, vez que estes já não devem mais ser buscados</p><p>na fantasiosa profilaxia de um suposto mal. Outra formulação teórica relevante de matiz</p><p>estrutural-funcionalista deve-se a Robert Merton. Ele se apropria do conceito de “anomia” para</p><p>demonstrar que o desvio não passa de um produto da própria estrutura social. Portanto, absolutamente</p><p>normal, considerando que esta própria estrutura é que vem a compelir o indivíduo à conduta desviante.</p><p>Merton expõe detalhadamente o mecanismo estrutural que conduz o indivíduo ao crime no seio social: a</p><p>sociedade apresenta-lhe metas, mas não lhe disponibiliza os meios necessários para o seu alcance legal.</p><p>O indivíduo perde suas referências, sentindo-se abandonado sem possibilidades “normais” de conseguir</p><p>seus objetivos. Sem os meios legais, mas pressionado para a conquista de certos objetivos sociais, o</p><p>indivíduo precisa preencher esse vácuo (anomia) de alguma maneira. E a única maneira disponível será</p><p>a perseguição dos fins colimados por meios ilegítimos, ilegais e desviantes, uma vez que os legítimos</p><p>não estão acessíveis.</p><p>De acordo com Merton: “a desproporção entre os fins culturalmente reconhecidos como válidos e os</p><p>meios legítimos à disposição do indivíduo para alcançá-los, está na origem dos comportamentos</p><p>desviantes”. E mais: “a cultura coloca, pois, aos membros dos estratos inferiores, exigências</p><p>inconciliáveis entre si. Por um lado, aqueles são solicitados a orientar a sua conduta para a perspectiva</p><p>de um alto bem – estar; por outro, as possibilidades de fazê-lo, com meios institucionais legítimos, lhes</p><p>são, em ampla medida, negados”.</p><p>Outro referencial importante é a denominada “Teoria da Associação Diferencial” , produzida por Edwin</p><p>H. Sutherland. Segundo essa construção teórica, a criminalidade, a exemplo de qualquer outro modelo</p><p>de comportamento humano, é aprendida conforme as convivências específicas às quais o sujeito se</p><p>expõe em seu ambiente social e profissional.</p><p>Essa linha de pensamento possibilitou a formulação da conhecida “Teoria das Subculturas Criminais” ,</p><p>para a qual o sujeito aprenderia o crime de acordo com sua convivência em certos ambientes, assumindo</p><p>as características de determinados grupos aos quais estaria preso por uma aproximação voluntária,</p><p>ocasional ou coercitiva.</p><p>Afirma Sutherland que o processo de “associação diferencial” propicia ao sujeito, de conformidade com</p><p>seu convívio, aprender e apreender as condutas desviantes respectivas. Dessa forma, tal teoria teria a</p><p>vantagem de poder explicar a criminalidade das classes baixas tanto quanto a das classes altas. Nesse</p><p>processo de convívio – aprendizado os infratores menos privilegiados praticariam usualmente os</p><p>mesmos crimes, vez que estariam conectados ao convívio de pessoas de seu nível social e só teriam</p><p>oportunidade de aprender essas determinadas espécies de condutas delitivas, não sendo-lhes</p><p>possibilitado o acesso a conhecimentos e condicionamentos que os tornassem aptos a outras condutas</p><p>mais sofisticadas. De outra banda, os mais abastados teriam acesso ao aprendizado de outras</p><p>modalidades criminosas ligadas naturalmente ao seu meio social. Em razão disso também dificilmente</p><p>incidiriam nas condutas afetas às classes mais baixas.</p><p>Há certo ponto de contato entre a teoria de Merton e a de Sutherland, pois que a modalidade de conduta</p><p>atribuída aos indivíduos das classes pobres e abastadas apresentaria uma distribuição em conformidade</p><p>com os meios dispostos aos sujeitos para desenvolverem seus impulsos criminosos. No entanto, a</p><p>formulação de Sutherland tem a pretensão de ser mais ampla, fornecendo uma fórmula geral apta a</p><p>explicar a criminalidade dos pobres e das classes altas. Para o autor sob comento, qualquer conduta</p><p>desviante seria “apreendida em associação direta ou indireta com os que já praticaram um</p><p>comportamento criminoso e aqueles que aprendem esse comportamento criminoso não têm contatos</p><p>frequentes ou estreitos com o comportamento conforme a lei”. Dessa forma, uma pessoa torna-se ou não</p><p>criminosa de acordo “com o grau relativo de frequência e intensidade de suas relações com os dois tipos</p><p>de comportamento” (legal e ilegal). Isso é o que se denomina propriamente de “associação diferencial”.</p><p>Essa maior abrangência da teoria preconizada por Sutherland a teria tornado mais completa do que</p><p>aquela defendida por Merton. Segundo a maioria dos críticos, as explicações de Merton seriam bastante</p><p>satisfatórias para a criminalidade dos pobres, mas não serviriam para esclarecer por que pessoas</p><p>dotadas de todos os meios institucionais e legais para a consecução de seus objetivos sociais, mesmo</p><p>assim, perpetrariam ações delituosas. Portanto, não é sem motivo que o termo “crime de colarinho</p><p>branco” ou “white collar crime” foi cunhado e empregado originalmente por Edwin H. Sutherland, em data</p><p>de 28.11.1939, durante uma conferência que se passou na sede da “American Sociological Society”, com</p><p>a finalidade de fazer referência a uma espécie de criminalidade praticada por pessoas de nível social</p><p>elevado, e em especial na sua atuação profissional.</p><p>Como derradeira representante da linha de pensamento estrutural – funcionalista pode-se mencionar a</p><p>chamada “Teoria das Técnicas de Neutralização ”, cujos principais expoentes foram Gresham M. Sykes</p><p>e David Matza. Trata-se de uma “correção da Teoria das Subculturas Criminais”, mediante a</p><p>complementação implementada pelo acréscimo dos estudos das “técnicas de neutralização”. Estas</p><p>seriam maneiras de promover a racionalização da conduta marginal, as quais seriam apreendidas e</p><p>usadas lado a lado com os modelos de comportamento e valores desviantes, de forma a neutralizar a</p><p>atuação eficaz dos valores e regras sociais, aos quais o delinquente, de uma forma ou de outra, adere.</p><p>Na verdade, mesmo</p><p>aquele indivíduo que vive mergulhado em uma subcultura criminal não perde</p><p>totalmente o contato com a cultura oficial e, de alguma forma, sobre a influência e presta reconhecimento</p><p>a algumas de suas regras. É desta constatação que partem Sykes e Matza para lograrem expor os</p><p>mecanismos usados pelas pessoas para justificarem perante si mesmas e os demais, suas condutas</p><p>desviantes, infringentes das normas oficiais impostas pela sociedade.</p><p>São descritas algumas espécies básicas de “técnicas de neutralização”:</p><p>a) Exclusão da própria responsabilidade – o infrator se enxerga como vítima das contingências,</p><p>surgindo muito mais como sujeito passivo quanto ao seu encaminhamento para o agir criminoso.</p><p>b) Negação da ilicitude – o criminoso interpreta suas atuações apenas como proibidas, mas não</p><p>criminosas, imorais ou destrutivas, procurando redefini-las com eufemismos.</p><p>c) Negação da vitimização – a vítima da ação delituosa é apontada como merecedora do mal ou do</p><p>prejuízo que lhe foi impingido.</p><p>d) Condenação dos que condenam – atribuem-se qualidades negativas às instâncias oficiais</p><p>responsáveis pela repressão criminal.</p><p>e) Apelo às instâncias superiores – sobrevalorização conferida a pequenos grupos marginais a que o</p><p>desviado pertence, aderindo às suas normas e valores alternativos, em prejuízo das regras sociais</p><p>normais.</p><p>Note-se que a mais destacável “técnica de neutralização” é a própria criação de uma subcultura. Esta é a</p><p>maior ensejadora de abrandamentos de consciência e defesas contra remorsos, na medida em que o</p><p>apoio e aprovação por parte de outras pessoas integrantes do grupo, ocasionam uma tranquilização e um</p><p>sentimento de integração que não se poderia obter no seio da sociedade calcada nas normas e valores</p><p>oficiais.</p><p>Inobstante os avanços obtidos com as “Teorias Estrutural – Funcionalistas”, uma alteração</p><p>verdadeiramente radical do modelo de pesquisa do fenômeno criminal somente adviria com o surgimento</p><p>da chamada “Criminologia Crítica”. É com ela que se leva a efeito o abandono da mais constante</p><p>premissa da Criminologia Tradicional, qual seja, aquela de ser o crime uma realidade ontologicamente</p><p>reificada. A partir das ideias trazidas à tona pela revisão criminológica crítica, o crime passa a ser visto</p><p>como uma realidade meramente normativa, moldada pelo Sistema Social responsável pela edição,</p><p>vigência e aplicação das leis penais.</p><p>Por reflexo disso o criminoso deixa de ser encarado como um “anormal” e o crime como manifestação</p><p>“patológica”.</p><p>A explicação para a criminalidade é agora procurada no desvelar da atuação do Sistema Penal que a</p><p>define e reage contra ela, iniciando pelas normas abstratamente previstas, até chegar à efetiva atuação</p><p>das agências oficiais de repressão e prevenção que aplicam as leis. Vislumbra-se que a indicação de</p><p>alguém como criminoso é dependente da ação ou omissão das agências estatais responsáveis pelo</p><p>controle social. Percebe-se que muitos indivíduos praticantes de atos desviantes não são tratados como</p><p>criminosos, até que sejam alcançados pela atuação das referidas agências, as quais são pautadas por</p><p>uma conduta e exercem um papel altamente seletivo. Ser ou não ser criminoso é algo que não está</p><p>ligado à presença ou não de alguma doença ou anormalidade, mas sim ao fato de haver ou não o</p><p>indivíduo sido retido pelas malhas das agências seletivas que agem baseadas em orientações</p><p>normativas e sociais.</p><p>Propõem as Teorias da Criminologia Radical o abandono do velho modelo etiológico, visando erigir uma</p><p>inovadora abordagem crítica do Sistema Penal, inclusive propiciando um sério questionamento de sua</p><p>legitimidade.</p><p>A Criminologia Crítica é caracterizada por certo matiz marxista, pois parte da ideia de que o Sistema</p><p>Punitivo é construído e funciona com apoio em uma ideologia da sociedade de classes. Dessa forma, seu</p><p>principal objetivo longe estaria da defesa social ou da preocupação com a criação ou manutenção de</p><p>condições para um convívio harmônico entre as pessoas. O verdadeiro fim oculto de todo Sistema Penal</p><p>seria a sustentação dos interesses das classes dominantes. Qualquer instrumento repressivo de controle</p><p>social revelaria a atuação opressiva de umas classes sobre as outras. Por isso seria o Direito Penal</p><p>elitista e seletivo, recaindo pesadamente sobre os pobres e raramente atuando contra os integrantes das</p><p>classes dominantes, os quais, aliás, seriam aqueles que redigem as leis e as aplicam. O Direito é visto</p><p>como absolutamente despido de qualquer finalidade de transformação social. Ao contrário, é encarado</p><p>como um instrumento de manutenção e reforço do “status quo” social, conservando e alimentando</p><p>desigualdades pelo exercício de um poder de dominação e força.</p><p>Impõe-se uma conscientização da gigantesca diferença de intensidade da atuação do Direito Penal sobre</p><p>setores desvalidos da sociedade, enquanto apresenta-se bastante leniente e omisso perante condutas</p><p>gravíssimas ligadas às classes dominantes.</p><p>É nesse contexto que emerge a “Teoria do Labeling Approach” ou “Teoria da Reação Social”. Enquanto o</p><p>pensamento criminológico até então vigente advogava a tese de que o atributo criminal de uma conduta</p><p>existia objetivamente, como um ente natural e até era preexistente às normas penais que o definiam num</p><p>mero exercício de reconhecimento, o qual, aliás, consistia em um certo acordo universal, um consenso</p><p>social; a “Teoria do Labeling Approach” virá para desmistificar todas essas equivocadas convicções.</p><p>O “Labeling Approach” ou “etiquetamento” indica que um fato só é tomado como criminoso após a</p><p>aquisição desse “status” através da criação de uma lei que seleciona certos comportamentos como</p><p>irregulares, de acordo com os interesses sociais. Em seguida, a atribuição a alguém da pecha de</p><p>criminoso depende novamente da atuação seletiva das agências estatais.</p><p>Passa a ser objeto de estudo da Criminologia a descoberta dos mecanismos sociais responsáveis pela</p><p>definição dos desvios e dos desviantes; os efeitos dessa definição e os atores que interagem nessas</p><p>complexas relações. Deixa-se de lado a ilusão do crime como entidade natural pré–jurídica e do</p><p>criminoso como portador de anomalias físicas ou psíquicas.</p><p>Essa nova linha de reflexões produz uma derrocada no mito do Sistema Penal como recuperador dos</p><p>desviados. Contrariamente, entende-se que a atuação rotuladora do Sistema Penal exerce forte pressão</p><p>para a permanência do indivíduo no papel social (marginal e marginalizado) que lhe é atribuído. O sujeito</p><p>estigmatizado ao invés de se recuperar, ganharia um reforço de sua identidade desviante. Na realidade, o</p><p>Sistema Penal assim concebido passa a ser entendido como um criador e reprodutor da violência e da</p><p>criminalidade.</p><p>Finalmente cabe expor sumariamente a relação entre a “Sociologia do Conflito” e a “Nova Criminologia”.</p><p>Como já visto, a Nova Criminologia põe em cheque a ideia de que as normas de convívio social derivam</p><p>de certo consenso em torno de valores e objetivos comuns.</p><p>Aí está o ponto de contato com a “Sociologia do Conflito”, que apregoa ser uma tal concepção uma mera</p><p>ficção erigida com a finalidade de legitimar a ordem social. Na realidade, essa ordem social seria produto</p><p>não de consenso, mas do conflito de interesses de grupos antagônicos, prevalecendo a vontade</p><p>daqueles que lograram exercer maior dominação.</p><p>Com o esboço desse quadro evolutivo da ciência criminológica, é possível determinar dois principais</p><p>momentos de mudanças conceituais e epistemológicas: o primeiro deles refere-se à transição do Direito</p><p>Penal Clássico para o nascimento da Criminologia, sob a égide do Positivismo, com as inaugurais</p><p>pesquisas lombrosianas de Antropologia Criminal. Somente aí é que o homem criminoso adquire</p><p>importância central nos estudos, que não mais se reduzem às dogmáticas jurídicas. O segundo momento</p><p>relevante foi o da mudança radical do referencial teórico da Criminologia, propiciado pela emergência da</p><p>chamada “Criminologia Crítica”. Nessa oportunidade abandona-se o modelo de pesquisa etiológico –</p><p>profilático, mediante um consistente questionamento de um longo “processo</p><p>de medicalização do crime”.</p><p>O fenômeno criminal passa a ser perquirido como criação da própria organização social e não mais como</p><p>um ente pré–existente, passível de compreensão e apreensão pela aplicação isolada do método das</p><p>ciências naturais.</p><p>A virada epistemológica propiciada pela “Criminologia Crítica” não desmerece o conjunto dos estudos</p><p>anteriores e nem representa um ponto final para a pesquisa criminológica. Tão somente faz perceber que</p><p>são possíveis explicações parciais para o fenômeno criminal, mas jamais tal questão pode ser</p><p>devidamente desvendada de forma simplista e reducionista. A criminalidade e a violência em geral são</p><p>problemas complexos que somente permitem uma visão ponderada através de um conjunto de saberes e</p><p>métodos de investigação, os quais, isolados, produzem noções fantasiosas e distorcidas. Não é por outro</p><p>motivo que atualmente se fala numa “Criminologia Integrada”.</p><p>Neste item procedeu-se a uma retomada dessa evolução dos estudos criminológicos já anteriormente</p><p>levada a efeito em outro trabalho com um objetivo bastante definido: pretendeu-se expor o mais clara e</p><p>pormenorizadamente possível como se chegou à ponderada e racional conclusão de que o “crime” em si</p><p>não existe na natureza, tratando-se do resultado de normas humanas convencionadas. O criminoso,</p><p>portanto, é somente todo aquele que infringe tais normas e não o portador de anomalias. As pesquisas</p><p>etiológico-profiláticas, que são o original impulso da Criminologia, são impregnadas de um determinismo</p><p>irreal porque baseadas em uma noção ilusória do crime como ente natural pré-jurídico, que o Direito</p><p>Penal somente faz reconhecer e declarar, quando, na verdade, o crime é uma criação do Direito,</p><p>podendo inclusive modificar-se ao longo do tempo e das mudanças sociais.</p><p>Ainda que certos eventos criminais possam ser validamente explicados por meio de uma abordagem</p><p>etiológica (o homicídio perpetrado por um esquizofrênico que acredita estar esfaqueando um monstro),</p><p>deve-se ter em mente que se trata de um critério válido somente de forma eventual e parcial. Além disso,</p><p>mesmo sua validade eventual em nada atinge a conclusão inarredável de que o crime é uma criação</p><p>normativa, um filho do Direito e das convenções e não um rebento da natureza. O retorno a uma noção</p><p>equivocada a este respeito, devido a qualquer espécie de descoberta científica e novas possibilidades de</p><p>intervenção, constitui um enorme retrocesso do pensamento criminológico com riscos de terríveis</p><p>consequências sociais e individuais.</p><p>CONDICIONANTES BIOLÓGICOS</p><p>É habitual a questão do crime envolver uma série de reflexões e comentários que ultrapassam em muito</p><p>o ato delituoso em si; são questões que resvalam na ética, na moral, na psicologia e na psiquiatria</p><p>simultaneamente. Sempre há alguém atribuindo ao criminoso traços e características psicopatológicas ou</p><p>sociológicas: porque Fulano cometeu esse crime? Estaria perturbado psiquicamente? Estaria encurralado</p><p>socialmente? Seria essa a única alternativa? Ou, ao contrário, seria ele simplesmente uma pessoa</p><p>maldosa? Portadora de um caráter delituoso, etc.</p><p>Atualmente, apesar da ciência não ter ainda algum consenso definitivo sobre a questão, sabe-se, no</p><p>mínimo, que qualquer abordagem isolada do ser humano corre enorme risco de errar. Assim sendo,</p><p>atualmente usamos o modelo bio-psico-social, na tentativa de compreender as pessoas e os fatores que</p><p>influenciam seus comportamentos (Agra, 1986). Dentre esses três modelos (biológico, psicológico e</p><p>social), sem dúvida a abordagem biológica da pessoa é um dos aspectos mais criticados e polêmicos.</p><p>A utilização do modelo biológico (personalidade) como justificativa do comportamento criminoso não é</p><p>recente na história da medicina e da sociologia. A ideia parece ter vindo de encontro à crença popular de</p><p>que "o criminoso já nasce assim", tendência pela qual se procura identificar traços de personalidade que</p><p>o caracterizam como psicopata, sociopata ou criminoso, enfim, traços que o tornam diferente dos outros</p><p>seres humanos (Mannheim, 1984).</p><p>Mas, modernamente considerando que qualquer tentativa de explicação biológica para o crime,</p><p>geralmente desencadeia um juízo prévio de que seria difícil alterar o que é determinado biologicamente,</p><p>foram sendo progressivamente realçadas as investigações sobre fatores psicológicos e/ou sociais.</p><p>Esta rejeição ao modelo biológico se mantém muito enfático ainda atualmente. É sempre importante</p><p>cultivar um bom senso suficiente para evitar que o politicamente correto interfira no cientificamente</p><p>constatado. As modernas pesquisas sobre alterações genéticas associadas ao comportamento violento</p><p>(Bader, 1994), ainda são capazes de estimular debates inflamados sobre a validade e o interesse das</p><p>abordagens biológicas.</p><p>Mesmo correndo o risco de suscitar críticas amargas sócio-psicológicas, cientificamente podemos</p><p>agrupar a causalidade criminosa em quatro grandes categorias de fatores: genéticos, bioquímicos,</p><p>neurológicos e psicofisiológicos.</p><p>Fatores genéticos</p><p>Os estudos incluídos nesta categoria utilizam como metodologia os estudos de gêmeos e de adoção. Nos</p><p>estudos em gêmeos (Cloninger & Gottesman, 1987; Mednick, Gabrielli e Hutchings, 1987; Mednick e</p><p>Kandel, 1988), foram encontrado o dobro da correlação para o comportamento criminoso entre estes, em</p><p>oposição à menor concordância em irmãos não gêmeos.</p><p>Comparando a concordância de comportamento entre gêmeos monozigóticos e dizigóticos, os</p><p>monozigóticos apresentam o dobro de correlações no comportamento criminoso , sugerindo a</p><p>existência de fatores genéticos atrelados ao crime.</p><p>Para resolver a argumentação contrária de que os gêmeos geralmente teriam experiências vivenciais</p><p>semelhantes, na mesma família, escola e sociedade e, por isso, tenderiam a ter o mesmo</p><p>comportamento, foram estimulados os estudos de adoção.</p><p>Esses estudos de adoção utilizaram pessoas que não conheceram seus pais biológicos, bem como</p><p>sujeitos que ignoravam serem adotivos, buscando separar melhor os efeitos ambientais dos efeitos</p><p>genéticos. Esses trabalhos (Mednick, Gabrielli e Hutchings, 1984) demonstraram que existe uma elevada</p><p>concordância entre comportamento criminoso dos pais biológicos com comportamento criminoso de seus</p><p>filhos adotados por outras famílias.</p><p>Parece também existir uma relação maior entre o comportamento criminoso da mãe biológica com o</p><p>comportamento criminoso de seu filho adotado (Baker e col., 1989), do que a mesma comparação entre</p><p>pai e filho. Alguns autores consideram esse fato sugestivo de uma transmissão genética associada ao</p><p>cromossomo X .</p><p>Apesar da evidência dos dados apontarem para a existência de importantes fatores genéticos associados</p><p>à criminalidade, o papel do ambiente parece também ter importante influência. Cadoret e col. (1990),</p><p>num estudo com crianças adotadas e filhas de pais biológicos com comportamentos criminosos,</p><p>verificaram que quando os pais adotivos pertenciam a meio socioeconomicamente desfavorecido, as</p><p>crianças apresentavam mais comportamentos criminosos do que aquelas cujos pais adotivos pertenciam</p><p>a classes de estatuto socioeconômico superior.</p><p>Diante disso, será sensato acharmos que, apesar de existir um fator genético capaz de aumentar a</p><p>suscetibilidade da criança para comportamentos criminosos, esta suscetibilidade estará sujeita às</p><p>condições ambientais.</p><p>Fatores bioquímicos</p><p>Os estudos neste grupo causal procuram dosar algumas substâncias possivelmente envolvidas com o</p><p>comportamento violento, como por exemplo, o colesterol, a glicose, hormônios e alguns</p><p>neurotransmissores .</p><p>Virkkunen, em 1987, procurou demonstrar a diminuição nos níveis séricos de colesterol em pessoas com</p><p>comportamento criminoso, da mesma forma como também se associava os baixos níveis de glicose.</p><p>Como o álcool é frequentemente relacionado com o comportamento violento, foi também estudada a sua</p><p>associação com glicose e colesterol. Fisiologicamente se demonstra que, de fato, o álcool diminui o</p><p>açúcar na corrente sanguínea por inibição da produção de glucose hepática. Deste modo, o álcool ao</p><p>fazer diminuir a quantidade de açúcar no sangue pode ser apontado como um fator facilitador do crime.</p><p>Quanto ao colesterol a situação é mais curiosa ainda. Virkkunen mostrou que a relação entre o</p><p>colesterol e o álcool pode ter até uma finalidade discriminante. Ele conseguiu isolar dois grupos de</p><p>pessoas envolvidas com o alcoolismo; um grupo representado por pessoas que ficam agressivas quando</p><p>bebem e outro, por pessoas que bebem mas não ficam agressivos. Os primeiros mostraram menor nível</p><p>de colesterol do que os segundos. e, estes, menor nível ainda do que os sujeitos não delinquentes,</p><p>verificando-se que a maior violência aparece associada a menor quantidade de colesterol.</p><p>No que diz respeito ao nível neuroendócrino, a hormônio mais relacionado à agressividade é a</p><p>testosterona . A pesquisa verifica os níveis desse hormônio tomando por base três comparações; entre</p><p>criminosos, entre criminosos e não criminosos (grupo controle) e entre não criminosos relacionando-se</p><p>com a agressividade e não agressividade.</p><p>Nas investigações entre pessoas não criminosas os resultados são muito variáveis e até contraditórios,</p><p>concluindo-se por vezes que não há correlações entre testosterona e potencial para agressividade</p><p>(Rubin, 1987). Entre criminosos e não criminosos (Olweus, 1987; Rubin, 1987; Schalling, 1987) os</p><p>resultados são mais consistentes, mas nem sempre são significativos. Alguns desses resultados</p><p>mostram criminosos apresentando maior nível de testosterona do que os não criminosos.</p><p>Sobre as influências neuroquímicas no comportamento agressivo, algumas das substâncias mais</p><p>estudadas (Rubin, 1987; Magnusson, 1988; Bader, 1994) são a serotonina , que existiria em menor</p><p>quantidade, o ácido fenilacético e a norepinefrina, que existiriam em maior quantidade nos criminosos.</p><p>Esses estudos procuram estabelecer uma correlação entre alterações bioquímicas capazes de</p><p>desencadear comportamentos criminosos, bem como as associações entre tais alterações, ingestão de</p><p>álcool e criminalidade.</p><p>Fatores neurológicos</p><p>Esses estudos (Buikhuisen, 1987; Hare & Connolly, 1987; Nachshon & Denno, 1987; Pincus, 1993)</p><p>associam desordens do comportamento com eventuais alterações cerebrais, essencialmente no</p><p>hemisfério esquerdo.</p><p>Os estudos parecem apontar na identificação das disfunções neuropsicológicas relacionadas ao</p><p>comportamento violento estar presente no lobo frontal e nos lobos temporais. O Lobo Frontal se</p><p>relaciona à regulação e inibição de comportamentos, a formação de planos e intenções, e a verificação</p><p>do comportamento complexo, suas alterações teriam como consequência dificuldades de atenção,</p><p>concentração e motivação, aumento da impulsividade e da desinibição, perda do autocontrole,</p><p>dificuldades em reconhecer a culpa, desinibição sexual, dificuldade de avaliação das consequências das</p><p>ações praticadas, aumento do comportamento agressivo e aumento da sensibilidade ao álcool (sintomas</p><p>positivamente correlacionados com o comportamento criminoso), bem como incapacidade de</p><p>aprendizagem com a experiência (sintoma correlacionado positivamente com a alta incidência de</p><p>recidivas entre alguns tipos de criminosos).</p><p>Os Lobos Temporais regulam a vida emocional, sentimentos, instintos, comandam as respostas</p><p>viscerais às alterações ambientais. Alterações nesses lobos resultam em inúmeras consequências</p><p>comportamentais, das quais se destacam a dificuldade de experimentar algumas emoções, tais como o</p><p>medo e outras emoções negativas e, consequentemente, uma incapacidade em desenvolver sentimentos</p><p>de medo das sanções, postura esta frequente em criminosos. Esses estudos procuram associar o crime</p><p>com alterações cerebrais específicas. (Cristina Queirós, A importância das abordagens biológicas no</p><p>estudo do crime)</p><p>Fatores psicofisiológicos</p><p>O enfoque psicofisiológico se baseia essencialmente na avaliação da função cerebral (fisiopatologia),</p><p>como, por exemplo, a Atividade Elétrica da Pele, o Eletroencefalograma e o Eletrocardiograma,</p><p>trabalhando sobretudo em contexto laboratorial. Falta, no momento, uma metanálise de outros tipos de</p><p>investigação da função cerebral, como por exemplo, os estudos com PET e SPECT .</p><p>Os estudos demonstraram que, tanto a ativação tônica (reação global do sujeito na ausência de</p><p>estimulação específica) quanto a ativação fásica (reação a estimulação específica), é menor nos</p><p>criminosos. Também, apresentam os criminosos, uma média menor do ritmo cardíaco, menor nível de</p><p>condutância da pele e maior tempo de resposta na atividade elétrica da pele, bem como registros</p><p>eletroencefalográficos com maior incidência de anormalidades (Fowles, 1980; Hemming, 1981;</p><p>Satterfield, 1987; Volavka, 1987; Hodgins & Grunau, 1988; Milstein, 1988; Venables, 1988; Buikhuisen,</p><p>Eurelings-Bontekoe & Host, 1989; Patrick, Cuthbert & Lang, 1994).</p><p>Alguns estudos trabalharam também com crianças e adolescentes (Magnusson, 1988), e demonstraram</p><p>que as crianças com comportamentos considerados desviantes apresentam maior ativação do sistema</p><p>nervoso . No entanto estudos longitudinais (Raine, Venables & Williams, 1990 e 1995) demonstraram que</p><p>adolescentes com comportamentos antissociais e que posteriormente vieram a cometer crimes</p><p>apresentavam significativamente menor ativação cardiovascular e eletrodérmica, do que os que não</p><p>cometeram crimes.</p><p>Conclusão</p><p>Através da apresentação das quatro categorias citadas é possível constatar que foram realizados</p><p>diferentes estudos. Apesar das metodologias utilizadas e dos resultados serem por vezes</p><p>questionados, a maior parte dos trabalhos podem ser considerados científicos e metodologicamente</p><p>corretos, demonstrando que de fato, podem existir fatores biológicos implicado s no crime , sejam</p><p>estes identificados como genes, hormônios, neurotransmissores, etc.</p><p>Constata-se também que, apesar de alguns estudos não referirem apenas as variáveis biológicas, mas</p><p>também as variáveis psicológicas e contextuais, a divulgação dos seus dados é efetuada segundo uma</p><p>lógica reducionista e determinista, tentando estabelecer uma causalidade linear entre fatores biológicos e</p><p>o crime e, contribuindo deste modo para a rejeição das abordagens biológicas no estudo do crime.</p><p>Funcionando de acordo com esta perspectiva linear, se um sujeito cometeu um crime porque as suas</p><p>características biológicas assim o determinam, e se estas são fáceis de identificar (ex.: medir a</p><p>quantidade de glicose, colesterol, EEG, etc.), porque não prevenir o crime em pessoas, digamos, "de</p><p>risco". Avançando um pouco mais, porque não efetuar terapias genéticas no embrião para os sujeitos</p><p>que apresentam a este nível alterações identificadas como características do criminoso?</p><p>Perante estas questões levanta-se uma outra, que é do arbítrio individual, anulando esta liberdade</p><p>através da certeza do comportamento ser desse jeito porque é determinado unicamente por fatores</p><p>biológicos. Essas questões são de primordial importância na Psiquiatria Forense porque dizem respeito</p><p>à imputabilidade, culpabilidade e responsabilidade. De qualquer forma, parece que a ideia da biologia ser</p><p>a única e/ou principal determinante do comportamento é universalmente rejeitada.</p><p>Assim sendo, tentar explicar o comportamento e as atitudes humanas, apenas a partir de fatores</p><p>biológicos não parece ser um bom método, pois qualquer comportamento, incluindo o comportamento</p><p>criminoso, é considerado como um conjunto de inúmeros processos em complexa interação. Em nosso</p><p>caso, essa interação se dá através do vocábulo tríplice; bio-psico-social.</p><p>Segundo Cristina Queirós, a perspectiva biológica utilizada pelos vários estudos descritos pode ser</p><p>considerada como uma "biologia das causas". A alternativa a esta perspectiva mecanicista seria a</p><p>"biologia dos processos", que começa a ser utilizada atualmente, através da abordagem</p><p>bio-psico-social , a qual tenta articular os fatores biológicos com os restantes níveis do comportamento</p><p>humano.</p><p>Na avaliação da biologia do crime, mesmo reconhecendo ser necessário perscrutar as bases biológicas</p><p>do crime, esta deverá considerar, obrigatoriamente,</p><p>a interação com outros fatores envolvidos</p><p>(Farrington, 1987; Raine & Dunkin, 1990; Farrington, 1991), não esquecendo que o todo o indivíduo é um</p><p>ser biológico em interação com o meio (Karli, 1990).</p><p>Em suma, pode-se concluir que as abordagens biológicas, apesar de serem geralmente vistas como</p><p>polêmicas e discricionárias, também são importantes no estudo e na compreensão do crime e do</p><p>criminoso , não devendo nem ser negadas nem supervalorizadas.</p><p>Interpretando os fatores biológicos como representantes da personalidade da pessoa, será possível</p><p>articular este aspecto constitucional com outros níveis da personalidade, bem como com os níveis do ato</p><p>transgressivo e com o significado deste.</p><p>CONDICIONANTES PSICOLÓGICOS</p><p>PERSONALIDADE</p><p>Segundo Porot, personalidade é a síntese de todos os elementos que concorrem para a conformação</p><p>mental de uma pessoa, de modo a conferir-lhe fisionomia própria. Em termos gerais podemos dizer que é</p><p>o hardware da pessoa.</p><p>Na constituição da personalidade interferem ou atuam múltiplas variáveis de ordem biopsíquica</p><p>(constituição biopsíquica) somadas às experiências vividas (integração). Como colocado por Odon</p><p>Ramos Maranhão, constituição é o conjunto da estrutura do organismo e do temperamento.</p><p>A estrutura da personalidade é integrada por:</p><p>• tipo morfológico: conformação básica;</p><p>• tipo temperamental: disposição emocional básica;</p><p>• caráter: conjunto de experiências vividas.</p><p>A personalidade apresenta particularidades, que são suas bases fundamentais (maranhão), a saber:</p><p>• unidade e identidade: que lhe permitem ser um todo coerente, organizado e resistente;</p><p>• vitalidade: caracterizando um conjunto animado e hierarquizado, com oscilações interiores (fatores</p><p>endógenos) e estímulos exteriores (fatores exógenos), que reage e responde;</p><p>• consciência: que mantém a informação sobre o si mesmo e o meio;</p><p>• relações com o meio ambiente: caracterizadas pela regulação entre o eu e o meio ambiente.</p><p>Personalidade Normal</p><p>É difícil estabelecer um critério de personalidade normal. Vários autores adotaram diversos critérios para</p><p>atingir tal fim. Exemplificamos duas classificações: a primeira, baseada no critério biopsicológico e, a</p><p>segunda, baseada em tipos somáticos.</p><p>O critério biopsicológico, descrito por Kretschmer, apresenta três tipos somáticos:</p><p>a) Leptossômico</p><p>Alto, magro, pouco musculoso, rosto afilado, encanece precocemente, é introvertido e oscila da</p><p>insensibilidade à hipersensibilidade (esquizotímico).</p><p>b) Pícnico</p><p>Baixo, gordo, com abdome volumoso, sem pescoço, com tendência à calvície, apresenta variações</p><p>frequentes de humor, da euforia à depressão (ciclotímico).</p><p>c) Atlético</p><p>De aspecto trapezoidal, ombros largos, relevos musculares evidentes, é explosivo e agressivo</p><p>(epileptóide).</p><p>Sheldon descreveu os tipos somáticos, com base embriológica, englobando três tipos básicos:</p><p>endomorfo, mesomorfo e ectomorfo.</p><p>Outras classificações de menor importância são baseadas em critérios filosóficos, sociológicos e</p><p>psicanalíticos.</p><p>O critério jurídico é definido pelos códigos:</p><p>• Penal – dirige-se a entender o caráter do fato e a determinar-se conforme esse entendimento.</p><p>• Civil, de acordo com maranhão – presume capacidade geral e faz restrições parciais e absolutas,</p><p>considerando as capacidades de discernimento, intenção, consciência e juízo.</p><p>Personalidades Patológicas</p><p>Ante o exposto, mais uma vez baseado nos trabalhos do Professor Odon Ramos Maranhão, podemos</p><p>considerar fazendo parte das personalidades patológicas as seguintes perturbações:</p><p>• do desenvolvimento e da continuidade, representadas pelos atrasos e infranormalidades – são as</p><p>oligofrenias;</p><p>• da senso-percepção, da ideação e do juízo crítico, representadas pelas psicoses (alienações) e pelas</p><p>demências (deterioração mental);</p><p>• da harmonia intrapsíquica, provocando sofrimentos conscientes de causa inconsciente,</p><p>representadas pelas neuroses;</p><p>• do caráter, de base constitucional, representadas pelas personalidades psicopáticas.</p><p>Oligofrenias</p><p>As oligofrenias, também denominadas atrasos ou debilidades mentais, são insuficiências congênitas,</p><p>caracterizadas pelo não-desenvolvimento da inteligência; diferem das demências, caracterizadas por</p><p>deterioração da inteligência normalmente desenvolvida.</p><p>São vários os critérios diagnósticos:</p><p>a) Psicométrico</p><p>Baseado em medidas do quociente de inteligência, é o critério mais conhecido, mas que por apresentar</p><p>muitas deficiências, é atualmente muito combatido. Divide os deficientes em três grupos:</p><p>• Idiotas: com Q.I. até 30, para alguns autores, e até 20 para outros.</p><p>• Imbecis: com Q.I. entre 30 e 60 segundo um critério e entre 20 e 40 em outro.</p><p>• Débeis: com Q.I. entre 60 e 90 segundo um critério e entre 40 e 65 em outro.</p><p>b) Escolar</p><p>Baseado no desenvolvimento e na cronologia, é o critério mais aceito e mais justo, dividindo as</p><p>deficiências em ligeiras (débeis), médias e profundas (idiotas). Permite ainda um tipo denominado</p><p>atrasados profundos, equivalentes aos idiotas do critério psicométrico.</p><p>Outros critérios diagnósticos são o social e o clínico; porém, são pouco utilizados. São inimputáveis.</p><p>Alienações</p><p>Alienações ou psicoses são alterações psíquicas que tornam o indivíduo impossibilitado de manter uma</p><p>vida normal e de participar da vida em sociedade (vida coletiva e social), resultando daí as designações</p><p>alienação ou alienados. São os “loucos de todo o gênero” do Código Civil e a “doença ou doente mental”</p><p>do Código Penal.</p><p>São exemplos a psicose maníaco-depressiva (atual distúrbio bipolar), as epilepsias, as senis, a</p><p>esquizofrenia e as alterações decorrentes do alcoolismo, da sífilis, das drogas, da arteriosclerose e dos</p><p>traumatismos crânio- encefálicos. São inimputáveis, via de regra</p><p>Demências</p><p>De acordo com o pensamento de Seglas, as demências ou deteriorações mentais são caracterizadas por</p><p>um enfraquecimento (deterioração) intelectual progressivo, global e incurável. Podem ser exemplificadas</p><p>pelas senis (arteriosclerose, demência e Alzheimer) e pelos traumatismos. São inimputáveis, via de regra.</p><p>Personalidades Psicopáticas</p><p>Personalidades psicopáticas ou antissociais são as determinadas por conduta anormal, social ou não</p><p>(reação antissocial).</p><p>Segundo entendimento de Maranhão são indivíduos cronicamente antissociais, sempre em dificuldades,</p><p>que não tiram proveito das experiências vividas, nem das punições sofridas e que não mantém lealdade</p><p>real a qualquer pessoa, grupo ou código.</p><p>Apresentam ausência de sentimentos, incluindo sentimento de culpa, tendência à impulsividade,</p><p>agressividade, falta de motivação e intolerância à frustração. Normalmente são religiosos. São</p><p>semi-imputáveis, via de regra.</p><p>Os criminosos em série geralmente são psicopatas. Um termo usado para designar não somente</p><p>doenças mentais. "Um psicopata pode não ser exatamente um doente mental", afirma a psicóloga Maria</p><p>de Fátima Franco dos Santos professora de Psicologia Forense da Puc de Campinas - SP. São pessoas</p><p>com personalidades de difícil relacionamento social. A personalidade é uma peça que começa a ser</p><p>formada bem cedo no ser humano, desde a sua concepção e termina por volta dos cinco anos de idade.</p><p>Neste período, a criança recebe os elementos necessários vão servir de base para o seu comportamento</p><p>pelo resto da vida. Daí grande parte dos criminosos psicopatas serem frutos de famílias desestruturadas</p><p>e de lares violentos.</p><p>Já os doentes mentais interagem com o mundo a partir de uma realidade que eles mesmos criam. Os</p><p>psicopatas, ao contrário, interferem na realidade a partir de sua personalidade desajustada aos padrões</p><p>sociais. São assim alguns estupradores e assassinos de série, sendo estes últimos os casos mais</p><p>graves.</p><p>Veja algumas características deste tipo de criminoso:</p><p>- São em grande maioria psicopatas;</p><p>- Gostam de demonstrar poder (são narcisistas, onipotentes, dominadores, machistas);</p><p>- Sempre reincidentes, raramente comete o crime somente uma vez.;</p><p>- Sadismo, sentem prazer em assistir o sofrimento alheio;</p><p>- Não assumem o crime, geralmente só confessam por deslizes movidos pelo prazer em reviver</p><p>o</p><p>momento do crime.</p><p>-São levados ao crime por motivos diversos: uma homossexualidade latente pode levar à violência contra</p><p>a mulher, por ser a criatura odiada, ou à violência contra homens, em uma tentativa de atacar a</p><p>morbidade encontrada em si mesmo.</p><p>Atenção: psicopatas não são tipos raros. Estima-se que 40% da população seja formada por psicopatas,</p><p>ou seja, pessoas que sofrem de sérios distúrbios de personalidade a ponto de interferir em seu</p><p>relacionamento social.</p><p>Preste atenção nos detalhes abaixo para se proteger:</p><p>Como agem? - Modus Operandis</p><p>- Atacam em locais públicos;</p><p>- Escolhem vítimas sozinhas;</p><p>- Os ataques são, em sua maioria, noturnos e durante finais de semana;</p><p>- Abordam pedindo informação ou oferecendo algo atrativo;</p><p>Personalidade Delinquente</p><p>Os indivíduos com personalidade delinquente são portadores de defeitos graves do caráter, quase</p><p>sempre estruturados e geralmente irreversíveis. Considerados delinquentes essenciais, primários ou</p><p>verdadeiros, são também conhecidos como portadores de personalidades dissociais.</p><p>De acordo com Jerkins, citado por maranhão, o psicopata (personalidade psicopática) apresenta falta de</p><p>adequadas inibições, o que o leva a desordens do comportamento e à ação antissocial, enquanto a</p><p>personalidade pseudo-social (delinquente) se mostra capaz de se adaptar a grupos de comportamento</p><p>desviado.</p><p>Neuroses</p><p>As neuroses manifestam-se por alterações frequentes, geralmente sem base anatômica conhecida, que</p><p>não alteram a personalidade. Caracterizam-se por perturbações afetivas, inadaptação à realidade e</p><p>sensação de insuficiência afetiva e social, dentre outras.</p><p>São exemplificadas por distúrbios neuro-vegetativos (azia, dor e/ou batedeira no peito etc.), doenças</p><p>psicossomáticas (gastrite, colite etc.), fobias (“medo” de altura, de pontas, de aranha etc.), histeria,</p><p>angústia e compulsão, dentre outros.</p><p>As pessoas portadoras de neuroses são pessoas capazes, pois a personalidade está preservada.</p><p>Incidente de Sanidade Mental</p><p>Quando há dúvida sobre a integridade psíquica do agente criminal, determina-se o “exame prévio”, nos</p><p>termos dos arts. 149 e 151 do Código de Processo Penal.</p><p>Como complemento, apresentamos, baseadas nos trabalhos de maranhão, as diferenças mais</p><p>significativas entre as neuroses e a personalidade delinquente.</p><p>Neuroses Personalidade delinquente</p><p>Com conflito interno Sem conflito interno</p><p>Agressividade voltada a si Agressividade voltada à sociedade</p><p>Gratifica-se por fantasias Alivia tensões internas por meio de ações</p><p>criminosas</p><p>Admite seus impulsos e os reconhece como seus Atribui seus impulsos ao mundo exterior</p><p>Desenvolve relações emocionais positivas Desenvolve defesas emocionais</p><p>Socialmente ajustado Comportamento dissocial</p><p>Reage à passividade e dependência com</p><p>sofrimento, mas admite a situação</p><p>Procura negar a passividade e a dependência com</p><p>atitudes agressivas</p><p>Caráter normal Caráter deformado (dissocial)</p><p>Considerações</p><p>As características psicológicas profundas da delinquência estão catalogadas, hoje, graças às</p><p>investigações de autores muito sérios.</p><p>Os menores delinquentes, por exemplo, raramente apresentam sintomas neuróticos. São de manejo</p><p>difícil, mas procuram conquistar a atenção e os sentimentos de pena dos circunstantes, assim como só</p><p>excepcionalmente apresentam dificuldade de aprendizagem escolar em relação a certas matérias, o que,</p><p>no entanto é frequente, nas crianças neuróticas, devido à inibição intelectual de causa afetiva. O que lhes</p><p>é comum, a menores neuróticos e menores delinquentes, é a instabilidade da atenção.</p><p>Consequentemente, atrasam-se na escola. O menor delinquente devaneia menos, pois está dominado</p><p>pelas tendências a dramatizar suas fantasias em ações. Quanto à conduta sexual, as diferenças mais</p><p>significativas que se registram entre menores delinquentes e menores neuróticos dizem respeito às</p><p>perversões manifestas, mais comumente observadas naqueles. No referente à formação da</p><p>personalidade, o que se aponta com mais frequência nos delinquentes é a distorção do superego.</p><p>De ordinário, os menores delinquentes sofrem pressões ambientais mais traumatizantes que os</p><p>neuróticos. E ainda ressalta o fato de terem passado, muitas vezes, um bom tempo de sua infância</p><p>recolhidos a instituições, do gênero reformatório. Os neuróticos provêm de lares que aparentam uma</p><p>relativa estabilidade, enquanto, entre delinquentes, o habitual é que provenham de lares totalmente</p><p>destruídos. Os pais de menores delinquentes dão mostras de instabilidade temperamental ou mesmo de</p><p>tendências ou atuações antissociais francas. Os pais de crianças rotuladas como neuróticas são em</p><p>geral neuróticos manifestos. Os laços emocionais entre filho e pai, entre filho e mãe, assim como os dos</p><p>pais entre si, são de hábito conturbados no caso de delinquentes, muito mais do que nos lares de onde</p><p>provêm os jovens obsessivos fóbicos.</p><p>Curiosamente, porém, assinalam alguns autores, não se verificam diferenças de vulto no trato entre os</p><p>irmãos, quer consideremos um ou outro dos grupos comparados.</p><p>A conduta leviana, incoerente, dos pais, influi de modo nocivo na estruturação da personalidade da</p><p>criança que poderá vir a ser um psicopata delinquente. Também importa mencionar aqui a proporção de</p><p>menores perturbados da conduta que foram amamentados pela mãe é insignificante e, quando o foram,</p><p>o desmame se deu precocemente. Com os conhecimentos que possuímos hoje acerca da formação da</p><p>personalidade, é fácil compreender que esses fatores negativos estão no núcleo dinâmico e genético do</p><p>problema que ora nos ocupa. A base de toda a situação psicopática-delinquente é um impulso, devido à</p><p>carência das funções de adaptação aloplástica do ego. Entretanto, como a confusão é frequente, importa</p><p>salientar que impulso e compulsão são diferentes. A compulsão caracteriza o ato obsessivo, mandato</p><p>interior para fazer algo sentido como desagradável, por doloroso, cruel ou repugnante. Na prática clínica,</p><p>os atos compulsivos podem às vezes com fundir-se com os impulsos, principalmente se estes estão</p><p>sobrecarregados de culpa.</p><p>A delinquência, que se impõe como expressão mais ostensiva da psicopatia, é um transtorno psíquico</p><p>essencialmente evolutivo, que atinge o processo de personificação. Em consequência, há um déficit do</p><p>sentido de realidade, de sentimento de identidade, da noção do esquema corporal e da capacidade de</p><p>síntese do ego. A adaptação à realidade, não obstante a fachada de lucidez, é uma pseudo adaptação,</p><p>decorrente da falta de integração adequada no nível afetivo e da inaptidão a aprender com a experiência.</p><p>E sobre isso somem-se as deficiências de abstração, o que leva o psicopata delituoso a incorporar</p><p>experiências concretas sem seu correspondente valor simbólico. Portanto, se não vivencia o significado</p><p>efetivo de muitas situações existenciais, importantes, consegue apenas verbalizar suas emoções e tem</p><p>extremamente comprometido o processo do pensamento. Com efeito, pensar implica retardar a ação,</p><p>esperar o momento apropriado para a gratificação desejada.</p><p>Como explicar, então, as habilidades mentais e motoras que caracterizam a maioria dos delinquentes, a</p><p>ponto de escaparem impunes de inúmeros roubos, assassínios, embustes, etc.? É que, como salientou</p><p>Edgardo Rolla, esse "indivíduos fizeram de sua forma de viver um tipo de especialização da coordenação</p><p>motora estriada, e consequentemente da coordenação do pensamento, que lhes permite cometer com o</p><p>máximo de impunidade as ações fundamentais características do psicopata".</p><p>Acentua-se ainda que, na psicopatologia desses indivíduos, se evidencia uma outra peculiaridade do</p><p>psiquismo, que é a perturbação de função sintética do ego, da qual depende a integração dos impulsos e</p><p>o seu aproveitamento para o desenvolvimento da personalidade. Daí o déficit de autocrítica, a</p><p>desconsideração da realidade e a sempre possível eclosão criminosa.</p><p>Um dos aspectos do nosso tema, que talvez seja o que mais empolga no momento, é o da delinquência</p><p>juvenil cujo substrato psicopatológico pode consistir em qualquer tipo de psicopatia. Duas séries de</p>