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<p>O�cina literária</p><p>Aula 6: Outras formas de narrar – a crônica</p><p>Apresentação</p><p>Nesta aula, veremos o que existe de mais simples no nosso cotidiano pode gerar um texto literário. Veremos também as</p><p>diferenças entre a crônica e os outros tipos textuais.</p><p>Objetivo</p><p>Conhecer as características da crônica.</p><p>Perceber a diferença entre a crônica e outros tipos de texto.</p><p>Veri�car a linguagem particular da crônica.</p><p>Introdução</p><p>Vamos esta aula lendo o texto A velha contrabandista, de Stanislaw Ponte Preta.</p><p> A velha contrabandista, de Stanislaw Ponte Preta.</p><p> Clique no botão acima.</p><p>"Diz que era uma velhinha que sabia andar de lambreta. Todo dia ela passava pela fronteira montada na lambreta,</p><p>com um bruto saco atrás da lambreta. O pessoal da Alfândega - tudo malandro velho - começou a descon�ar da</p><p>velhinha.</p><p>Um dia, quando ela vinha na lambreta com o saco atrás, o �scal da Alfândega mandou ela parar. A velhinha parou</p><p>e então o �scal perguntou assim pra ela:</p><p>- Escuta aqui, vovozinha, a senhora passa por aqui todo dia, com esse saco aí atrás. Que diabo a senhora leva</p><p>nesse saco?</p><p>A velhinha sorriu com os poucos dentes que lhe restavam e mais outros, que ela adquirira no odontólogo, e</p><p>respondeu:</p><p>- É areia!</p><p>Aí quem sorriu foi o �scal. Achou que não era areia nenhuma e mandou a velhinha saltar da lambreta para</p><p>examinar o saco. A velhinha saltou, o �scal esvaziou o saco e dentro só tinha areia. Muito encabulado, ordenou à</p><p>velhinha que fosse em frente. Ela montou na lambreta e foi embora, com o saco de areia atrás.</p><p>Mas o �scal �cou descon�ado ainda. Talvez a velhinha passasse um dia com areia e no outro com muamba,</p><p>dentro daquele maldito saco. No dia seguinte, quando ela passou na lambreta com o saco atrás, o �scal mandou</p><p>parar outra vez. Perguntou o que é que ela levava no saco e ela respondeu que era areia, uai! O �scal examinou e</p><p>era mesmo. Durante um mês seguido o �scal interceptou a velhinha e, todas as vezes, o que ela levava no saco</p><p>era areia.</p><p>Diz que foi aí que o �scal se chateou:</p><p>- Olha, vovozinha, eu sou �scal de alfândega com 40 anos de serviço. Manjo essa coisa de contrabando pra burro.</p><p>Ninguém me tira da cabeça que a senhora é contrabandista.</p><p>- Mas no saco só tem areia! - insistiu a velhinha. E já ia tocar a lambreta, quando o �scal propôs:</p><p>- Eu prometo à senhora que deixo a senhora passar. Não dou parte, não apreendo, não conto nada a ninguém,</p><p>mas a senhora vai me dizer: qual é o contrabando que a senhora está passando por aqui todos os dias?</p><p>- O senhor promete que não "espáia"? - quis saber a velhinha.</p><p>- Juro - respondeu o �scal.</p><p>- É lambreta."</p><p>, Stanislaw Ponte Preta.</p><p>Vamos, a partir da leitura responder a algumas perguntinhas?</p><p>1 Para que servia a areia do saco?</p><p>2 O que signi�cou o sorriso do �scal?</p><p>3 A história é contada em que pessoa?</p><p>4 Qual informação o autor do texto pretende passar?</p><p>Bom, a areia no saco servia apenas para enganar o �scal da alfândega. O �scal sorriu não porque estava achando tudo</p><p>aquilo engraçado, mas porque tinha compreensão das intenções da velhinha. Ele sabia que tinha algo errado e,</p><p>construindo esta situação, o autor mostra de uma forma engraçada a desonestidade das pessoas.</p><p>O primeiro aspecto que percebemos é o bom humor do texto. É ou não é</p><p>engraçada essa velhinha?</p><p>O texto de Stanislaw Ponte Preta, portanto, trata-se de uma história curta que mostra com bom humor a questão da</p><p>corrupção, do contrabando no Brasil. Mas, para mostrar isto, o autor não utilizou grandes recursos de linguagem nem</p><p>criou situações complexas.</p><p>O texto é leve, fácil de ser compreendido pelo leitor. Fica claro que um pequeno episódio do cotidiano da alfândega dá</p><p>origem a um texto. Claro que não exatamente como ele é, mas recheado de alguns detalhes que nos possibilita classi�cá-</p><p>lo como literário.</p><p>O texto é imaginado, é criado a partir de um fato que faz parte do movimento da alfândega. Isto é o que chamamos,</p><p>dentro da criação literária, de crônica.</p><p>Origem da crônica</p><p>A palavra crônica deriva  do grego Chrônos, que signi�ca tempo. Sendo assim, entendemos crônica como um</p><p>conjunto de acontecimentos, de fatos,  que são relacionados seguindo a ordem cronológica.</p><p>Trata-se apenas de um registro de fatos sem grandes interpretações, sem grandes aprofundamentos.</p><p> Fonte: Mohamed Hassan por Pixabay</p><p>A crônica, muitas vezes, utiliza o jornal como veículo de divulgação.</p><p>Porém, seu per�l não é exclusivamente jornalístico.</p><p>O cronista capta o cotidiano, mas o reveste de fantasia, de imaginação, como acabamos de ver em A velha</p><p>contrabandista. Não estamos falando da representação do real como ele é, mas daquele real que o cronista vê através de</p><p>um olhar singular. É um processo de recriação.</p><p>Claro que, em toda crônica, há um toque jornalístico. No entanto, esse toque se mistura ao literário. Sendo assim,</p><p>podemos, através dessas características da �cção, considerar a crônica como texto literário.</p><p>Como vimos, ela é sempre algo leve, breve e de fácil digestão. A�nal de contas, deve ser dirigida a qualquer tipo de leitor,</p><p>pois apresenta ingredientes que tornam a leitura interessante. Há elementos como novidade, surpresa e assuntos variados</p><p>do dia a dia das pessoas.</p><p>Você imagina, então, quais sejam as características da crônica?</p><p>Características</p><p>A primeira característica da crônica é a brevidade. Por ser um tipo de</p><p>texto destinado ao jornal ou à revista, deve ser curto, ocupando uma</p><p>coluna de jornal ou uma página de revista.</p><p>Outra questão importante: quem fala na crônica?</p><p>Embora a crônica A velha contrabandista seja uma narrativa em terceira pessoa, muitas crônicas possuem um narrador</p><p>em primeira pessoa.</p><p>Quando isso acontece, temos, com maior ênfase, uma visão pessoal dos acontecimentos. Há uma forte carga de</p><p>subjetividade. O que é levado em consideração é a visão que o cronista tem dos fatos, os quais ele classi�ca como</p><p>importantes para si e para o leitor.</p><p>Sendo assim, onde está a verdade dos fatos? Ora, não</p><p>sabemos ao certo, pois a veracidade é emotiva.</p><p>Devido à subjetividade, há um diálogo natural com o leitor.</p><p>Tudo acontece como se o cronista estivesse conversando</p><p>com o leitor.</p><p>No entanto, existe um detalhe: o interlocutor é mudo. O</p><p>leitor não pode expor suas considerações diante daquilo</p><p>que está sendo contado. Concluímos, então, que ele fala</p><p>consigo, mergulhado em suas re�exões.</p><p>Vamos ler a crônica O padeiro, de Rubem Braga, para</p><p>essa questão �car mais clara?</p><p> (Fonte: Alexas_Fotos por Pixabay ).</p><p> O padeiro, de Rubem Braga</p><p> Clique no botão acima.</p><p>"Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento -</p><p>mas não encontro o pão costumeiro. No mesmo instante me lembro de ter lido alguma coisa nos jornais da</p><p>véspera sobre a "greve do pão dormido". De resto não é bem uma greve, é um lock-out, greve dos patrões, que</p><p>suspenderam o trabalho noturno; acham que obrigando o povo a tomar seu café da manhã com pão dormido</p><p>conseguirão não sei bem o que do governo.</p><p>Está bem. Tomo o meu café com pão dormido, que não é tão ruim assim. Enquanto tomo café vou me lembrando</p><p>de um homem modesto que conheci antigamente. Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele</p><p>apertava a campainha, mas, para não incomodar os moradores, avisava gritando:</p><p>- Não é ninguém, é o padeiro!</p><p>Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de gritar aquilo? "Então você não é ninguém?"</p><p>Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a</p><p>campainha de uma casa e ser atendido por uma empregada ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha</p><p>lá de dentro perguntando quem era; e ouvir a pessoa que o atendera dizer para dentro: "não é ninguém, não,</p><p>senhora, é o padeiro". Assim �cara sabendo que não era ninguém...</p><p>Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis detê-lo para explicar que</p><p>estava falando com um colega, ainda que menos importante. Naquele tempo eu também, como os padeiros, fazia</p><p>o trabalho noturno. Era pela madrugada</p><p>que deixava a redação de jornal, quase sempre depois de uma passagem</p><p>pela o�cina - e muitas vezes saía já levando na mão um dos primeiros exemplares rodados, o jornal ainda</p><p>quentinho da máquina, como o pão saído do forno.</p><p>Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me julgava importante porque no jornal que levava para</p><p>casa, além de reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu nome. O</p><p>jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade</p><p>daquele homem entre todos útil e entre todos alegre; "não é ninguém, é o padeiro!"</p><p>E assobiava pelas escadas.</p><p>O padeiro, Rubem Braga.</p><p>O narrador do texto começa a nos contar um fato que</p><p>pareceu a ele digno de re�exão, ou melhor, digno de ser</p><p>contado. Devemos observar que ele se encontra em uma</p><p>situação completamente trivial: “Levanto cedo, faço</p><p>minhas ablusões, ponho a chaleira no fogo para fazer</p><p>café e abro a porta do apartamento – mas não encontro</p><p>o pão costumeiro.”</p><p>Uma das características essenciais da crônica é esta: a</p><p>trivialidade. Atos como acordar, fazer o café e procurar o</p><p>pão ganham uma relevância a ponto de se</p><p>transformarem em objetos de criação literária.</p><p> (Fonte: Pexels por Pixabay ).</p><p>Escrito em primeira pessoa, o texto questiona, sob um</p><p>determinado olhar, a importância do padeiro como ser</p><p>humano. Como ele pode falar que não é ninguém?</p><p>“Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele</p><p>apertava a campainha , mas, para não incomodar os</p><p>moradores, avisava gritando: - Não é ninguém, é o</p><p>padeiro! Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de</p><p>gritar aquilo? “Então você não é ninguém?”.</p><p>Como se vê, são re�exões do narrador. Re�exões que o levam à comparação com seu próprio trabalho: “Naquele tempo</p><p>eu também, como os padeiros, fazia o trabalho noturno.”</p><p>Como jornalista, dividia com o padeiro o mesmo horário de trabalho. Apesar de se achar importante pelo desempenho de</p><p>sua função, constatou que não é superior, em nada, ao padeiro. Em suas re�exões, o cronista expressa, também, um</p><p>sentimento de saudade. Ele recorda o tempo de rapaz, imprimindo ao texto as marcas de sua subjetividade.</p><p>Através da leitura de O padeiro, você percebeu que as personagens não têm nomes? O mesmo acontece em A velha</p><p>contrabandista. Sabemos que existe uma velha, um �scal, um padeiro, mas não sabemos o nome de nenhum deles. Nem</p><p>do narrador sabemos o nome. Isto também é uma característica da crônica. Ela tem por objetivo registrar os fatos de</p><p>forma breve.</p><p>O seu foco está nos acontecimentos rotineiros. Por isso, os nomes das</p><p>personagens não têm nenhuma importância. Além disso, elas se</p><p>apresentam em número reduzido e sem qualquer carga de profundidade</p><p>psicológica.</p><p>Linguagem da crônica</p><p>Percebemos, nas crônicas, uma linguagem direta,</p><p>espontânea, jornalística e, por isto tudo, fácil de ser</p><p>compreendida, mas com alguns aspectos literários.</p><p>Não há espaço para devaneios. O cronista tem de se</p><p>manter preso aos fatos. Mesmo quando a subjetividade</p><p>a�ora, ou seja, torna-se mais perceptível pelo leitor, o</p><p>cronista não pode perder de vista o fato real.</p><p>Trata-se, então de uma linguagem que �utua entre a</p><p>referencialidade do jornal e a plurissigni�cação das</p><p>palavras da literatura. Joga, portanto, com os dois lados</p><p>da moeda.</p><p>O cronista capta uma situação qualquer e dá a ela,</p><p>através da linguagem, uma outra dimensão. Ao dar a uma</p><p>situação banal um estilo ágil e, muitas vezes poético, a</p><p>crônica conquista o leitor.</p><p> (Fonte: PIRO4D por Pixabay).</p><p>Crônica e outros tipos de texto</p><p>Como podemos comparar a crônica a outros tipos de texto? Vejamos:</p><p>1</p><p>ensaio</p><p>A crônica se aproxima do ensaio por trabalhar com a</p><p>subjetividade. Há um movimento do eu. Entretanto, são</p><p>diferentes,  pois o ensaio tem sempre uma intenção e a</p><p>crônica repele a intencionalidade.</p><p>2</p><p>poesia</p><p>A crônica aproxima-se da poesia, pois ambas estão focadas</p><p>no eu. Na crônica, assim como na poesia, o eu é o assunto e</p><p>o narrador ao mesmo tempo.</p><p>3</p><p>conto</p><p>A crônica aproxima-se do conto, porque existe nela a</p><p>preocupação com os fatos narrados, a preocupação com as</p><p>situações que provocaram a atenção do escritor, dando</p><p>origem ao texto.</p><p>Aula Teletransmitida em LIBRAS</p><p>Assista a versão na Linguagem Brasileira de Sinais da Aulateletransmitida.</p><p>Notas</p><p>Referências</p><p>Próxima aula</p><p>características do dramático;</p><p>tensão trágica e a tensão cômica;</p><p>unidade de ação;</p><p>pathos e o problema;</p><p>tempo no universo dramático;</p><p>homem trágico e o homem cômico.</p><p>Explore mais</p>

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