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<p>1</p><p>LUTO E CUIDADOS PALIATIVOS</p><p>2</p><p>NOSSA HISTÓRIA</p><p>A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empre-</p><p>sários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação</p><p>e Pós-Graduação. Com isso foi criada a nossa instituição, como entidade ofere-</p><p>cendo serviços educacionais em nível superior.</p><p>A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de</p><p>conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a partici-</p><p>pação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação</p><p>contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos</p><p>e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber atra-</p><p>vés do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.</p><p>A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma</p><p>confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base</p><p>profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições</p><p>modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,</p><p>excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.</p><p>3</p><p>Sumário</p><p>1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 4</p><p>2. O QUE SÃO CUIDADOS PALIATIVOS E COMO PODEM AJUDAR .......... 10</p><p>2.1 Cuidados Paliativos Na Terceira Idade: Educação Para O</p><p>Enfrentamento Da Morte ..................................................................... 12</p><p>3. ENVELHECIMENTO, FINITUDE, MORTE E CUIDADOS PALIATIVOS ..... 15</p><p>3.1 Cuidados Paliativos na Gerontologia ............................................. 17</p><p>3.2 A intervenção psicossocial nos cuidados paliativos ....................... 19</p><p>3.3 O suporte familiar / trabalhar a família ........................................... 21</p><p>4. O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO .................................................. 26</p><p>5. LUTO: ALGUMAS QUESTÕES ................................................................... 35</p><p>6. POR QUE REFLETIR SOBRE A MORTE?.................................................. 39</p><p>6.1 Os cuidados paliativos e a compreensão do limite da vida ........... 41</p><p>6.2 Suporte para o fim da vida e para o luto ........................................ 43</p><p>7. LUTO ANTECIPATÓRIO EM CUIDADOS PALIATIVOS ............................. 46</p><p>7.1 Os Sentimentos Da Equipe Interdisciplinar Na Assistência Ao</p><p>Paciente Em Cuidados Paliativos ........................................................ 48</p><p>8. REFERÊNCIAS ............................................................................................ 51</p><p>4</p><p>1. INTRODUÇÃO</p><p>No âmbito da saúde contemporânea, as discussões sobre a finitude hu-</p><p>mana vêm ganhando ênfase na sociedade, principalmente, quando se trata das</p><p>inovações tecnológicas, das possibilidades de se prolongar a vida e a cura das</p><p>enfermidades. Entretanto, a cura, em alguns casos, é impossível, e a morte, con-</p><p>sequentemente, inevitável. Diante dessa realidade, emergiram os cuidados pali-</p><p>ativos, difundidos pelo mundo como uma forma de cuidar, que prima pelo bem-</p><p>estar do paciente e é promovido no estágio inicial do curso de determinada do-</p><p>ença progressiva, avançada e incurável. Na assistência paliativa, o limite da vida</p><p>é aceito e o objetivo é o cuidado, e não a cura. Visa o respeito à dignidade hu-</p><p>mana e deve ser iniciado desde o diagnóstico de doenças graves, progressivas</p><p>e incuráveis, designando-se a promover conforto e bem-estar para a pessoa.</p><p>Vale ressaltar que, na práxis desses cuidados, insere-se a assistência em todo</p><p>o processo de finitude humana e na fase do luto vivenciado pelo paciente e por</p><p>sua família. O luto apresenta-se como uma reação normal e prevista com a que-</p><p>bra de um vínculo, de um laço afetivo com significado posto de maneira indivi-</p><p>dual, vivenciado de forma contextual e subjetiva.</p><p>O luto pode ser antecipatório, que é qualificado pela perda esperada vivida</p><p>pelo paciente e por sua família, na fase compreendida entre o diagnóstico e a</p><p>morte propriamente dita; o normal, ou luto no tempo certo, que se caracteriza</p><p>como o evento depois da morte; e o complicado ou patológico, quando a angús-</p><p>tia e a lamentação diante da perda podem variar desde a dor da ausência, até</p><p>uma tristeza devastadora, que pode aparecer associada a ideações suicidas e</p><p>sintomas psicóticos. O luto representa, essencialmente, a resposta a um fato</p><p>potencialmente desestruturante e inevitável, e que todos os seres humanos vi-</p><p>venciarão em algum momento no decorrer de suas vidas. O cuidado ao luto varia</p><p>de acordo com as necessidades de cada pessoa e da família afetada. Embora a</p><p>maioria dos indivíduos tenha recursos internos e informais suficientes para se</p><p>adaptar a essa transição de vida, alguns são mais vulneráveis e podem estar em</p><p>risco de desenvolver problemas de ordem física ou psíquica e até de procurar</p><p>serviços de emergência médica e de internação hospitalar, como referido em</p><p>5</p><p>estudo. Por essa razão, é inegável a relevância dos cuidados paliativos como</p><p>uma modalidade de cuidar que alivia os sintomas físicos, espirituais e dá apoio</p><p>psicossocial desde o diagnóstico de uma doença sem cura até o fim da vida e</p><p>ao longo do processo de luto do paciente e da família. Então, considerando-se</p><p>que os cuidados paliativos e o luto vêm se tornando uma temática em cresci-</p><p>mento no âmbito nacional.</p><p>Assim surge a necessidade de explorar o conhecimento produzido sobre a</p><p>referida temática. O luto, adquire importância na filosofia de cuidados paliativos</p><p>e se estabelece objeto de sua ação. Amenizar a dor e o sofrimento humano fi-</p><p>guram como objetivos principais dos cuidados paliativos. Sendo assim, na ter-</p><p>ceira idade, fase que corresponde a uma maior vulnerabilidade, seja de origem</p><p>física, a associada à redução da reserva fisiológica, social – relacionado à rápida</p><p>e intensa transição demográfica, e de origem psicossomática, multifatorial, com</p><p>predominância de transtornos depressivos e cognitivos.</p><p>Deste último aspecto incute-se uma discussão aprofundada sobre a morte</p><p>iminente e o envelhecimento, uma aspiração natural de toda sociedade. Dessa</p><p>forma, a educação para o processo de enfrentamento da morte confere extrema</p><p>valia e desafio para os componentes envolvidos, tanto para o idoso (na concep-</p><p>ção de “aprender a morrer”), quanto para a família (no processo de luto). Os</p><p>cuidados paliativos foram definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS)</p><p>em 1990 com um viés taxado em cuidados nos pacientes terminais ou em paci-</p><p>entes com doença fora de possibilidades de cura, ou seja, vislumbrava-se o cui-</p><p>dado paliativo voltado para a morte. De fato, em concomitância com a origem da</p><p>palavra “paliativa”, que vem de palliun, significando cobrir, amparar, ou seja, pro-</p><p>teger aqueles em que a medicina curativa já não mais acolhe. Contudo, atual-</p><p>mente, contrasta-se com esta ideia, uma nova abordagem mais ampla, pensada</p><p>holisticamente, em torno dos cuidados paliativos, referido pela OMS, já em 2002.</p><p>A qual aprimora a qualidade de vida dos pacientes e famílias que enfrentam pro-</p><p>blemas associados com doenças através da prevenção e alívio do sofrimento,</p><p>por meio de identificação precoce, avaliação correta e tratamento da dor, e ou-</p><p>tros problemas de ordem física, psicossocial e espiritual. Portanto, atualmente,</p><p>alinhava-se na esfera dos cuidados paliativos um eixo de ações que perpassa</p><p>pela vida e não mais pela morte.</p><p>6</p><p>Nesse linha, é necessário propor um aprofundamento e integração de po-</p><p>líticas públicas voltadas à educação para a morte, desde o manejo no fluxograma</p><p>curricular da formação dos profissionais de saúde para inclusão de disciplinas</p><p>afins com o tema até uma ação profissional de preparação psicológica da morte</p><p>iminente para o idoso. Portanto,</p><p>“A essência dos cuidados paliativos é</p><p>a aliança entre a equipa de cuidados e o doente e a sua família” (TWYCROSS,</p><p>2003, p. 18).</p><p>5. LUTO: ALGUMAS QUESTÕES</p><p>O processo de luto pode iniciar muito antes da perda de um ente querido.</p><p>O sentimento de perda do paciente e da sua família pode se manifestar antes da</p><p>36</p><p>perda iminente. O luto se configura como a resposta emocional a essa perda.</p><p>Semelhante aos estágios da morte, os indivíduos passam por um processo para</p><p>ajudá-los a enfrentar e ser capazes de viver com essa ausência. Na perspectiva</p><p>de Nascimento (2020) o luto é entendido como o mecanismo de reação quando</p><p>o corpo experimentar uma perda. O luto é uma resposta normal, natural e inevi-</p><p>tável à perda e pode afetar todas as partes de nossas vidas. O luto pode parecer</p><p>um passeio de montanha-russa com altos e baixos, ou pode parecer que esta-</p><p>mos sendo espancados como um bote em uma tempestade. Às vezes, pode</p><p>parecer opressor e assustador o luto permite que o indivíduo se ajuste gradual-</p><p>mente à perda e encontre uma maneira de continuar a vida. Diferentes indivíduos</p><p>respondem a este processo de maneiras diversas. A idade, a saúde física e emo-</p><p>cional, a cultura e a experiência anterior com perdas de uma pessoa podem afe-</p><p>tar a maneira como ela sofre durante esse período de tempo. De acordo com</p><p>Santos, Yamamoto e Custódio (2017) o luto pode consistir em reações físicas,</p><p>emocionais, cognitivas e comportamentais à perda.</p><p>A pessoa enlutada pode sentir a dor de sua perda de uma ou de todas</p><p>essas maneiras. Algumas das manifestações físicas de luto podem incluir: sentir-</p><p>se fisicamente doente por causa da perda, dores de cabeça, peso ou pressão,</p><p>tremores, dores musculares, exaustão e insônia. As manifestações cognitivas</p><p>podem incluir: incapacidade de concentração, sensação de confusão ou des-</p><p>crença, preocupação com o falecido e experiências alucinatórias. As respostas</p><p>emocionais incluem: ansiedade, culpa, raiva, tristeza, sentimentos de desam-</p><p>paro e alívio. Por fim, as manifestações comportamentais podem incluir: retrai-</p><p>mento, desempenho prejudicado no trabalho ou na escola, evitar qualquer coisa</p><p>que faça lembrar o falecido ou possuir lembranças constantes do falecido. Em</p><p>semelhante esteira, Freitas (2020) salienta que todos experimentam o luto à sua</p><p>maneira. Os corpos podem experimentar sentimentos intensos como choque,</p><p>caos, tristeza, raiva, ansiedade, descrença, pânico, alívio ou mesmo dormência.</p><p>Os pensamentos podem ficar confusos, sendo que a pessoa pode ter dificuldade</p><p>para se concentrar. Além disso, durante o luto existem ressonâncias na saúde</p><p>física, nos relacionamentos e no comportamento social. Na literatura é possível</p><p>encontrar três estágios comuns em um processo de luto, sendo: notificação e</p><p>choque, vivência da perda e reintegração.</p><p>37</p><p>O primeiro estágio, diz respeito ao momento em que, inicialmente o indiví-</p><p>duo descobre ou reconhece a perda. Nessa fase, há um sentimento de choque</p><p>e dormência, levando o sujeito enlutado a isolar-se de outras pessoas. No se-</p><p>gundo estágio, vivência da perda, o indivíduo realmente vivencia a perda tanto</p><p>emocional quanto cognitivamente. Uma série de sentimentos podem ocorrer du-</p><p>rante esta fase, à guisa de exemplo: raiva, tristeza, vazio, bem como manifesta-</p><p>ções físicas (insônia, perda de apetite). No estágio final, reintegração, o indivíduo</p><p>se reorganiza e se reintegra na sociedade. Este último estágio caracteriza a cura</p><p>que deveria ocorrer idealmente no final do luto. Destaca-se que existem vários</p><p>tipos diferentes de reações de luto que as pessoas podem apresentar. Alguns</p><p>deles são considerados normais, enquanto outros significam uma alteração no</p><p>modo de lidar com a perda. Um luto sem complicações é um processo que sim-</p><p>boliza a reação mais desejável e universal à perda e é considerado normal.</p><p>Nesse tipo de luto o indivíduo apresenta reações físicas, emocionais, cognitivas</p><p>e comportamentais após a perda, porém acaba se adaptando a ela. O período</p><p>de tempo nesse processo pode variar conforme a natureza do relacionamento,</p><p>tipo de perda e fatores individuais relacionados ao enlutado.</p><p>O luto antecipatório é aquele que ocorre antes da perda de um ente querido</p><p>e é iniciado no momento do diagnóstico terminal e pode prosseguir até a morte</p><p>da pessoa. Tanto os pacientes quanto os familiares podem sentir uma perda</p><p>antecipatória, causando muita dor e ansiedade se não for fornecido o suporte</p><p>adequado. O luto complicado, por sua vez, demanda de assistência profissional</p><p>dependendo de sua gravidade e pode ser classificado em quatro tipos diferentes,</p><p>quais sejam: Luto crônico (Reações normais de luto que continuam por um longo</p><p>período de tempo); Luto retardado (Reações normais de luto que são suprimidas</p><p>ou adiadas porque o sobrevivente evita a dor da perda consciente ou inconsci-</p><p>entemente); Luto Exagerado (Uma reação intensa à perda que pode incluir pen-</p><p>samentos suicidas, fobias ou pesadelos); Luto mascarado (O sobrevivente não</p><p>está ciente de que seus comportamentos são resultado da perda). Nessa situa-</p><p>ção, os indivíduos experimentam perdas repentinas ou traumáticas ou resultan-</p><p>tes de suicídio/homicídio. Se a pessoa já teve perdas recentes ou anteriores das</p><p>quais não resolveu seu luto, isso pode contribuir para o desenvolvimento de uma</p><p>reação de luto complicada com a nova perda.</p><p>38</p><p>A falta de uma rede de apoio ou estressores concomitantes, como proble-</p><p>mas de saúde ou relacionamentos, também podem contribuir para esse tipo de</p><p>luto. Há, ainda, o luto desprivilegiado definido como luto que não foi validado ou</p><p>reconhecido. Esse tipo de luto geralmente se desenvolve em indivíduos que per-</p><p>deram entes queridos devido a doenças estigmatizadas, como a AIDS, ou por</p><p>meios socialmente inaceitáveis, como o aborto. A perda de um relacionamento</p><p>previamente rompido, como o divórcio, também pode contribuir para esse tipo</p><p>de luto, porque o indivíduo pode não ser capaz de lamentar abertamente por</p><p>aquele ente querido devido às circunstâncias que envolvem seu relacionamento.</p><p>Por fim, temos o luto não resolvido configurado onde o enlutado não conseguiu</p><p>passar pelos estágios de luto. Muitos fatores podem contribuir para a manifesta-</p><p>ção desse tipo de luto e podem incluir: falta de fechamento formal (o corpo da</p><p>pessoa amada nunca foi encontrado ou colocado para descansar), perdas múl-</p><p>tiplas ou simultâneas ou isolamento social. Em relação aos cuidados com o pro-</p><p>cesso de luto é importante frisar que tanto o apoio formal quanto o informal po-</p><p>dem ser utilizados para ajudar os indivíduos enlutados a lidar com a perda do</p><p>ente querido. O tipo de apoio que uma pessoa demanda varia, sendo vital que</p><p>um profissional realize uma avaliação completa do luto.</p><p>A avaliação do luto ocorre em intervalos regulares durante o curso da do-</p><p>ença e, idealmente, deve começar no diagnóstico. O luto deve ser avaliado com</p><p>frequência no período de luto para que seja possível desenvolver um plano efi-</p><p>caz para auxiliar o enlutado a lidar com sua perda. O acompanhamento do luto</p><p>com as famílias faz parte da maioria dos programas de hospitais e pode incluir</p><p>atividades e eventos formais para promover o fechamento e a aceitação. Boa</p><p>parte das organizações e / ou sistemas de saúde tem vários grupos de apoio</p><p>para indivíduos, alguns dos quais são específicos para um determinado tipo de</p><p>doença (por exemplo, câncer), com isso o aconselhamento individual ou em</p><p>grupo ou psicoterapia são alguns métodos que podem ajudar os enlutados a lidar</p><p>com sua perda. Metodologias informais que podem ajudar os enlutados são: as</p><p>visitas de familiares e amigos, a participação em grupos informais de apoio ou o</p><p>apoio de membros da igreja do enlutado. Os profissionais que continuam envol-</p><p>vidos com o enlutado após a morte do paciente devem fornecer apoio ao sobre-</p><p>vivente para ajudá-lo a sentir a perda, expressar a perda e completar as</p><p>tarefas</p><p>39</p><p>do processo de luto. Profissionais da saúde estão em posição estratégica para</p><p>auxiliar o paciente a identificar e expressar seus sentimentos em relação à perda.</p><p>Um dos maiores facilitadores desse processo é a escuta ativa. Ouvir ativamente</p><p>o enlutado ajuda-o a expressar seus sentimentos e a sentir que está sendo ou-</p><p>vido.</p><p>6. POR QUE REFLETIR SOBRE A MORTE?</p><p>Recentemente, foi divulgado um relatório pela Economist Intelligence Unit</p><p>(EIU) que apresenta um ranking da qualidade da morte em diversos países do</p><p>mundo. De um total de 80 países, o Brasil ocupa o 42º lugar, o que aponta para</p><p>a necessidade de se repensar a atenção que se destina à nossa condição exis-</p><p>tencial de seres finitos. A resistência humana para abordar a temática da morte</p><p>é histórica. Evoluímos em muitos aspectos, somos dotados de conhecimentos</p><p>diversos que nos permitem superar doenças anteriormente incuráveis e acom-</p><p>panhamos o aumento da expectativa de vida da população como resultado do</p><p>acesso a melhores condições de subsistência. Mas o fato é que, em algum mo-</p><p>mento, a nossa máquina para de funcionar. Mais cedo ou mais tarde, a morte</p><p>nos alcançará. Considerando essa realidade, precisam ser ampliados os espa-</p><p>ços de reflexão, formação e cuidado que permitam uma assistência digna aos</p><p>pacientes e a seus familiares durante todas as etapas do tratamento, o que na-</p><p>turalmente inclui os cuidados paliativos.</p><p>40</p><p>Abordar, de modo claro, a inevitabilidade da morte em decorrência de um</p><p>prognóstico reservado se constitui em um desafio para o profissional de saúde</p><p>que, durante a sua formação, não desenvolveu habilidades de comunicação ade-</p><p>quadas que o capacitassem para expor o delicado tema. É preciso estar dispo-</p><p>nível para lidar com a angústia experimentada pela família que acompanha o</p><p>paciente durante todo o processo e que se dedica a evitar o sofrimento a qual-</p><p>quer custo, o que inclui, na maioria das vezes, proteger o paciente de qualquer</p><p>informação que possa causar tristeza e desespero. O que se tem, então, são</p><p>indivíduos, em momentos distintos de suas vidas, membros de uma mesma so-</p><p>ciedade que resiste em admitir a realidade da morte e, por isso, fortemente afe-</p><p>tada pela ideia da mesma no momento da constatação de que nada poderá mo-</p><p>dificar o curso da doença. A morte não é uma hipótese, mas uma verdade incon-</p><p>teste. Dessa forma, torna-se cada vez mais urgente e necessário educarmo-nos</p><p>para a compreensão plena do ciclo vital, que contempla todas as fases do de-</p><p>senvolvimento humano. A história natural do câncer avançado se divide entre as</p><p>fases de crise, crônica e terminal.</p><p>A fase de crise refere-se ao período em que ocorre a percepção de que</p><p>algo está acontecendo, mas ainda não está claro para o paciente e para a famí-</p><p>lia, havendo a necessidade de investigação. É uma fase de reajuste aos sinais</p><p>e sintomas característicos da recidiva e da redefinição do plano de tratamento</p><p>indicado. A fase crônica refere-se ao período entre o diagnóstico da recidiva,</p><p>podendo compreender um período curto ou longo, até que advenha a fase ter-</p><p>minal, quando emergem as questões relacionadas à inevitabilidade da morte:</p><p>separação, morte, tristeza, resolução do luto e retomada de uma vida familiar</p><p>“normal” depois da perda. Sendo assim, doença crônica assume, essencial-</p><p>mente, três formas gerais denominadas: progressiva, constante e reincidente/</p><p>episódica, caracterizando a evolução do câncer avançado. Cada uma dessas</p><p>fases exige, de certa forma, diversas maneiras de enfrentar a doença de modo</p><p>a minimizar a dor o sofrimento que essa condição impõe. Um enfrentamento</p><p>funcional favorece o espaço para o questionamento aberto e a redefinição das</p><p>tarefas desempenhadas pelos envolvidos que possibilite a adequação às exi-</p><p>gências de cada etapa do processo de adoecimento.</p><p>41</p><p>Um enfrentamento disfuncional pode levar à resistência às mudanças e à</p><p>desestabilização e, na fase terminal, pode conduzir à não aceitação do contexto</p><p>da finitude, levando o paciente e seus familiares a experimentar um sofrimento</p><p>ainda mais intenso. Contudo, na medida em que nenhuma estratégia é efetiva o</p><p>bastante para evitar a concretude da morte, trazer para o centro da discussão as</p><p>necessidades relacionadas a esse evento imponderável da vida pode tornar o</p><p>processo menos solitário, angustiante e negligenciado. Daí a importância de se</p><p>oferecer cuidados paliativos de qualidade, o que inclui, em sua última etapa, os</p><p>cuidados ao fim da vida.</p><p>6.1 Os cuidados paliativos e a compreensão do limite da vida</p><p>As ações de uma equipe de cuidados paliativos são permeadas por muitos</p><p>desafios, principalmente no que se refere a proporcionar conforto e esperança</p><p>ao paciente. O ponto de partida para o trabalho tem como base uma escuta ativa</p><p>e empática, atitude essa que deve fazer parte do cotidiano de todos os profissi-</p><p>onais envolvidos na tarefa e que permite que se conheçam mais profundamente</p><p>as expectativas, os anseios, os medos e as preocupações do paciente e de sua</p><p>família. O trabalho deve se apoiar no bom emprego dos princípios norteadores</p><p>dos cuidados paliativos: comunicação clara e cuidadosa, efetivo controle dos</p><p>sintomas, atuação interdisciplinar, alívio do sofrimento e suporte à família du-</p><p>rante todas as etapas do acompanhamento, inclusive no luto. Na última etapa</p><p>do acompanhamento, que se refere aos últimos dias de vida do paciente, é na-</p><p>tural e esperado que ocorra a intensificação dos sintomas. A morte mobiliza as</p><p>nossas emoções mais profundas, que emergem diante da inevitável separação.</p><p>Sendo assim, paciente, equipe e família podem experimentar um sentimento de</p><p>impotência, porque se sentem fracassados diante do morrer.</p><p>Não raramente, expressões como: “perdeu a batalha contra o câncer”,</p><p>“morreu vítima do câncer”, “lutou contra o câncer” são utilizadas para manifestar</p><p>o pesar e a sensação de derrota diante da morte pela doença. A dificuldade de</p><p>compreender o limite entre o curável e o tratável é fruto de nossa angústia frente</p><p>ao processo de finitude. Para se avançar nessa direção, é preciso trazer a refle-</p><p>xão sobre a finitude humana, que é da ordem do imponderável. Há que se legi-</p><p>timar o espaço para se discutirem as necessidades do paciente no fim da vida.</p><p>42</p><p>E o primeiro passo é admitir que a vida termina. Na filosofia dos cuidados palia-</p><p>tivos, a família é considerada uma unidade de cuidados. Assim como o paciente,</p><p>familiares e cuidadores também necessitam de informação e suporte para sus-</p><p>tentar a tarefa de cuidar daquela pessoa que passará, gradativamente, a depen-</p><p>der de ajuda para a realização das atividades mais simples, como se alimentar,</p><p>fazer a higiene, se locomover, tomar os medicamentos nos horários previstos,</p><p>entre outras coisas fundamentais para o seu bem-estar.</p><p>Todo o processo, apesar das limitações progressivas que se impõem,</p><p>tende a ser bem-sucedido no que se refere ao cuidado mais adequado, quando</p><p>o paciente encontra na família e em seus cuidadores o apoio eficaz para atenção</p><p>às suas necessidades. Nesse sentido, o acesso às informações que possam</p><p>facilitar o cotidiano do cuidado deverá ser assegurado nos espaços que visam</p><p>ao esclarecimento sobre a doença, sobre os sintomas esperados, passíveis de</p><p>controle, sobre o entendimento de que existirão sintomas mais refratários ao tra-</p><p>tamento, sobre as mudanças pelas quais o paciente passará. Do ponto de vista</p><p>psicológico, o paciente poderá apresentar distintas reações emocionais de ajus-</p><p>tamento, resultantes das alterações provocadas pelo adoecimento. A reação de</p><p>ajustamento é uma resposta emocional que varia conforme a absorção do signi-</p><p>ficado pessoal e subjetivo da doença física, que está relacionada às caracterís-</p><p>ticas de personalidade, a circunstâncias pessoais, à própria natureza da doença</p><p>e ao impacto tratamento. O lugar destinado aos cuidados com a família deve se</p><p>constituir</p><p>como uma ferramenta de qualificação do suporte. Os cuidados paliati-</p><p>vos pressupõem uma organização que inclua na rotina do atendimento reuniões</p><p>da equipe interdisciplinar com os cuidadores familiares e não familiares.</p><p>Dada a complexidade dos sintomas, é necessário que as diversas especi-</p><p>alidades envolvidas estejam disponíveis para essa aproximação, a fim de prover</p><p>os cuidadores de orientações numa atmosfera de acolhimento e empatia. Por-</p><p>tanto, é importante que a equipe busque capacitação para reconhecer os vários</p><p>modelos de família, que traz consigo valores, crenças, espiritualidade, resistên-</p><p>cia, negação e esperança. Além disso, a história de cada família pode estar car-</p><p>regada de conflitos prévios ao adoecimento, além de perdas anteriores, o que</p><p>poderá acarretar dificuldades no manejo desse momento. Daí a necessidade de</p><p>43</p><p>uma abordagem biopsicossocioespiritual que abrange as diversas dimensões</p><p>que constituem a história dos sujeitos envolvidos. Em consonância com essa</p><p>proposta de cuidados, o Conselho Federal de Medicina (CFM) definiu, por meio</p><p>de resoluções, as orientações para a boa prática em cuidados paliativos. Entre</p><p>elas, a Resolução nº 1.805/2006, que permite ao médico limitar ou suspender</p><p>procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente.</p><p>Corroborando essa indicação, mais recentemente, o CFM publicou uma</p><p>nova resolução, a de nº 2.156, de 28/10/2016, que estabelece os critérios de</p><p>admissão e alta em Unidade de Terapia Intensiva, prevendo que, nos casos de</p><p>doença incurável, o médico deva oferecer todos os cuidados paliativos disponí-</p><p>veis, evitando empreender ações diagnósticas e terapêuticas fúteis e obstinadas.</p><p>Considerando as expectativas do paciente, a Resolução nº 1995, de agosto de</p><p>2012, do CFM, define Diretivas Antecipadas de Vontade que se referem ao con-</p><p>junto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cui-</p><p>dados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver in-</p><p>capacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade. O que se pre-</p><p>tende evitar a partir dessas resoluções é o advento de intervenções inadequa-</p><p>das, incapazes de alterar o prognóstico da doença e podendo ainda causar dano</p><p>e desproporcional ao doente e à família.</p><p>6.2 Suporte para o fim da vida e para o luto</p><p>Considerando as etapas do desenvolvimento humano, desde muito cedo,</p><p>apresentamos condições de entender a morte como algo que afeta tudo o que</p><p>vive. Quando crianças muito pequenas, temos dificuldades para dar um sentido</p><p>para a experiência da perda e entender a sua irreversibilidade, o que não nos</p><p>impede de sermos apresentados a essa realidade. Mas comumente, somos pro-</p><p>tegidos das experiências de perdas na família, impedidos de participar de rituais</p><p>fúnebres. Os adultos acreditam que as crianças não entendem o que é o morrer</p><p>e evitam que elas se confrontem com o sofrimento que se abate sobre todos. O</p><p>que parece não se perceber é que a criança também sofre e, dessa maneira,</p><p>não encontra um lugar para expressar a sua própria dor. Isso pode impedi-la de</p><p>receber o apoio e a orientação necessários. À medida que cresce, passa a com-</p><p>preender o morrer como um processo irreversível e universal e identifica no seu</p><p>44</p><p>sistema familiar os modos de enfrentamento diante de uma vivência de perda.</p><p>Ainda assim, não há garantias de que haverá um espaço efetivo para se falar</p><p>abertamente sobre o morrer, concebido em muitos casos como um tabu inaces-</p><p>sível e indizível. Por vezes, vivencia, de maneira mais próxima, a morte de um</p><p>animal de estimação que, não raramente, é rapidamente substituído por outro,</p><p>sem que haja um tempo para se processar a perda. Afinal, é preciso superar a</p><p>dor! Adaptar-se à ausência de alguém que amamos é e será sempre doloroso,</p><p>resultado da formação do vínculo, palavra que se origina do latim vinculum, e</p><p>que significa união, aquilo que nos mantém ligados uns aos outros, com carac-</p><p>terística de ligação duradoura.</p><p>Isso, por si só, deveria ser motivo para sermos educados para o melhor</p><p>manejo possível frente a uma doença grave e fatal, que levará ao rompimento</p><p>do convívio, a partir da identificação precoce de recursos que possam minimizar</p><p>o sofrimento de quem vai partir e de quem vai ficar. O adoecimento é uma expe-</p><p>riência subjetiva e complexa que afeta as várias dimensões que estruturam a</p><p>pessoa ao longo da vida. Entre elas, observa-se a importância da dimensão es-</p><p>piritual e a influência da espiritualidade no processo de enfrentamento da doença</p><p>e da morte. Diversos estudos mais recentes apontam para a importância da fé</p><p>no manejo da doença e na adoção de estratégias que desenvolvem a resiliência</p><p>diante da morte. Vale ressaltar que esse é um aspecto considerado relevante na</p><p>prática dos cuidados paliativos, o que tem permitido uma improvável aproxima-</p><p>ção entre espiritualidade e ciência. Antes de tudo, é importante esclarecer que</p><p>espiritualidade não é sinônimo de religiosidade. A espiritualidade diz respeito à</p><p>busca do ser humano por um sentido e significado transcendente da vida.</p><p>A religião, por outro lado, é um conjunto de crenças, práticas rituais e lin-</p><p>guagem litúrgica que caracteriza uma comunidade que está procurando dar um</p><p>significado transcendente às situações fundamentais da vida, desde o nascer</p><p>até o morrer. Acolher a dimensão espiritual como parte integrante das necessi-</p><p>dades do paciente e de sua família é um importante exercício de empatia da</p><p>equipe, pois traz conforto e autoriza o paciente a compartilhar a sua compreen-</p><p>são acerca do sentido que ele atribui à doença e à morte18. Dessa forma, pensar</p><p>o processo de morrer envolve, para além da dimensão clínica que atesta o fim</p><p>45</p><p>da vida, um cuidado com todos os aspectos que possibilitam dignidade e con-</p><p>forto para quem morre e para aqueles que precisam continuar vivendo; isto é, a</p><p>família enlutada pela perda e os profissionais de saúde no exercício necessário</p><p>de saber perder. A etapa posterior à perda é descrita como luto, que se refere</p><p>aos processos mentais que se seguem às vivências da perda. Compreende um</p><p>processo penoso e doloroso para quem se desvincula do objeto amado. O pro-</p><p>cesso de luto na situação de doença terminal se instala antes mesmo da perda</p><p>concreta e é descrito como luto antecipatório, conceito cunhado pela primeira</p><p>vez em 1944, por Lindermann.</p><p>A partir dele, já se estabelece o contato com a realidade da morte iminente,</p><p>embora possa haver uma oscilação entre a negação e a aceitação, com períodos</p><p>de maior ou menor ansiedade, frente à expectativa de separação. Essa resposta</p><p>é fruto da consciência da morte e pode ser experimentada pelo paciente e pela</p><p>família quando há um lugar destinado a acolher esses sentimentos e, mais do</p><p>que isso, a ajudar à família e ao paciente a se reorganizarem e acomodarem as</p><p>inquietações características desse momento. Oferecer suporte no luto, além de</p><p>prover cuidado ao sofrimento emocional, ajuda àqueles que ficam a reajustar- -</p><p>se à realidade após a perda, de modo a ressignificar o vínculo com o ente perdido</p><p>e a permitir o reinvestimento na vida.</p><p>46</p><p>7. LUTO ANTECIPATÓRIO EM CUIDADOS PALIATIVOS</p><p>Durante a idade média a morte era um fenômeno comum e natural, ocor-</p><p>rendo em casa e junto a seus familiares, com o passar do tempo e o surgimento</p><p>de tecnologias avançadas teve o deslocamento para o hospital. No século XX</p><p>ocorreu uma transformação revolucionária na forma de lidar com a morte, a qual</p><p>deixa de ser parte alienável do curso da vida, passando a ser ocultada no cotidi-</p><p>ano com aparente indiferença. A morte na contemporaneidade deixa de ocorrer</p><p>em casa, passando para o âmbito hospitalar, tendo em vista que haverá todo um</p><p>suporte e assistência dos profissionais da saúde ao indivíduo no processo de</p><p>finitude e aos seus familiares que vivenciam o conflito de</p><p>ter a responsabilidade</p><p>pelo cuidado ao paciente em processo de morte. Valorizando nesse momento a</p><p>dignidade humana enfatizando a solidariedade entre o paciente e seus familiares</p><p>resultando em sentimento de compaixão afetiva, amenizando assim a dor e o</p><p>sofrimento psicológico diante do enfrentamento de uma doença sem possibili-</p><p>dade de cura e o do luto. Tendo em vista a complexidade da temática e da sub-</p><p>jetividade que envolve o luto antecipatório a questão norteadora que envolve a</p><p>morte e o morrer, do estudo foi: o luto antecipatório e o enfrentamento familiar</p><p>no processo de morte e morrer de paciente oncológico em cuidados paliativos.</p><p>47</p><p>O luto é um processo complexo que envolve sentimentos de tristeza e pe-</p><p>sar, podendo ser definido como uma reação à perda de algo ou de alguém sig-</p><p>nificativo, quanto do rompimento de vínculo. É uma experiência humana vivida</p><p>de maneira única, em que a ausência da pessoa que se foi deve ser percebida</p><p>como definitiva, exigindo-se assim, adaptação à realidade e reorganização in-</p><p>terna e externa. O luto antecipatório é aquele que se inicia antes da morte pro-</p><p>priamente dita, permitindo absorver gradualmente a realidade da perda ao longo</p><p>do tempo ou ainda aquele que ocorro antes da perda real. De acordo com pes-</p><p>quisadores, o luto antecipatório pode ser entendido também como um processo</p><p>de construção de significado presente na elaboração do luto a partir do processo</p><p>do adoecimento ou de perdas concretas ou simbólicas. No âmbito dos cuidados</p><p>paliativos, o luto antecipatório é caracterizado pela construção do significado da</p><p>perda partindo do processo adoecimento, considerando a família como um sis-</p><p>tema de relações mútua no que diz respeito ao apoio e reorganização da vida</p><p>como forma de progressão à perda iminente de um ente querido.</p><p>Ressalta-se portanto, a filosofia dos cuidados paliativos no que diz respeito</p><p>a afirmar a vida e encarar a morte como um processo natural; não apressa e</p><p>nem adia a morte; procura aliviar a dor e outros sintomas angustiantes; integra</p><p>os aspectos psicológicos e espirituais nos cuidados do paciente; disponibiliza</p><p>uma rede de apoio para auxiliar o paciente a viver ativamente quanto possível</p><p>até sua morte; oferece um sistema de apoio para a família na vivência no pro-</p><p>cesso do luto. Contudo, os cuidados paliativos deve considerar o paciente um</p><p>ser único, complexo e multidimensional: biológico, emocional, saúde e espiritual.</p><p>No entanto, a filosofia dos cuidados paliativos procura atender a pessoa na fase</p><p>final da vida na sua globalidade de ser, promovendo o bem-estar global e a dig-</p><p>nidade do doente crônico e terminal e sua possibilidade de não ser expropriado</p><p>do momento final de sua vida, mais de viver a própria morte. Nesse contexto,</p><p>para entendera filosofia dos cuidados paliativos, se faz necessário a procedência</p><p>da palavra “paliativo” que quer dizer manto, cobrir, amparar, abrigar É notório</p><p>48</p><p>destacar que a filosofia dos cuidados paliativos iniciou-se na Inglaterra em 1967,</p><p>a partir da iniciativa de Cicely Mary StrodSoundres (assistente social, enfermeira</p><p>e médica, que dissiminou essa nova maneira de cuidar aos pacientes que viven-</p><p>ciam a terminalidade e a proximidade com a morte).</p><p>No Brasil os cuidados paliativos teve início na década de 1980. E segundo</p><p>a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2002, cuidados palia-</p><p>tivos que promove a qualidade de vida do paciente e seus familiares diante de</p><p>doença que ameaçam a continuidade da vida através de prevenção e alívio do</p><p>sofrimento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento impecável da</p><p>dor e outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual. (OMS, 2002).</p><p>Diante desse contexto, é pertinente questionar-se: como a família que cuida do</p><p>paciente na fase final de vida em cuidados paliativos enfrenta o processo de luto</p><p>antecipatório? Desse modo a presente pesquisa tem como objetivo: investigar o</p><p>enfrentamento o processo de luto antecipatório da família que cuida do paciente</p><p>na fase final de vida em cuidados paliativos.</p><p>7.1 Os Sentimentos da Equipe Interdisciplinar na Assistência ao</p><p>Paciente em Cuidados Paliativos</p><p>A assistência prestada em pacientes que estão sob cuidados paliativos</p><p>gera os mais diversos tipos de sentimentos na equipe interdisciplinar, isso por-</p><p>que a tarefa de cuidar envolve uma responsabilidade muito grande e que por</p><p>vezes acaba por sobrecarregar esses profissionais. O cuidado envolve uma re-</p><p>lação com a pessoa cuidada como também com sua família. Os profissionais de</p><p>saúde devem ter um preparo para poder atender melhor o paciente, tendo em</p><p>vista que este carrega toda uma expectativa, cultura e crenças a respeito de sua</p><p>doença. Um estudo realizado por Klarare et al (2018) evidencia esclarecimentos</p><p>a respeito dos sentimentos que envolvem a equipe interdisciplinar. Ao descrever</p><p>equipes especializadas em cuidados paliativos na Suécia, foram identificados</p><p>sentimentos mistos ao que diz respeito aos problemas da equipe, resultando em</p><p>grau de satisfação variado. Possivelmente os cuidados prestados no ambiente</p><p>doméstico com estruturas e necessidades variadas acarreta maior tensão e re-</p><p>49</p><p>quer maior flexibilidade dos profissionais. Um outro exemplo de sentimento ge-</p><p>rado que se pode destacar é o processo do luto. Mesmo que os cuidados palia-</p><p>tivos venham evoluindo ao longo do tempo, os profissionais da área da saúde</p><p>ainda têm muito o que avançar numa prática de assistência voltada para a ges-</p><p>tão do fim da vida, na qual distingue-se “o curar do cuidar e o manter a vida”.</p><p>Nesse sentido, é importante diferenciar o luto, processo natural e consti-</p><p>tuinte de nossas vidas, de um processo patológico, pois, apesar de existirem</p><p>muitas variáveis a serem consideradas, se ocorrer a exacerbação do processo</p><p>do luto com uma longa duração, configura-se um processo de luto complicado.</p><p>Muitas vezes a equipe de saúde na ânsia de promover a vida, acaba por retardar</p><p>a morte. Favorecendo uma cultura de que a morte não é um processo natural, e</p><p>sim uma doença. Essa conduta pode ser modificada através do conhecimento</p><p>dos fatores que podem influenciar o processo de luto, os quais incluem variáveis</p><p>como qualidade da relação estabelecida entre profissionais, paciente e familia-</p><p>res; recursos de enfrentamento do enlutado; experiências prévias com morte e</p><p>perda; fundamentos culturais e religiosos do indivíduo que vivencia o luto. Todos</p><p>esses fatores oferecem possibilidades de compreensão do processo do luto</p><p>sendo fundamentais para uma boa formação profissional. Ao contrário do que se</p><p>pensa sobre o trabalho com os cuidados paliativos, os profissionais dessa área</p><p>relatam que a exposição frequente à morte pode ajudá-los a viver no presente,</p><p>cultivando uma vida espiritual e desenvolver a curiosidade sobre a continuidade</p><p>da vida.</p><p>No entanto, os estressores inerentes ao trabalho como aumento da de-</p><p>manda clínica e culturas negativas no local de trabalho podem impactar a saúde</p><p>e o bem-estar dos profissionais levando ao estresse, esgotamento, morbidade</p><p>psicológica e fadiga da compaixão. Segundo o mesmo autor, foi identificado que</p><p>a meditação é um recurso utilizado para melhorar a forma de atuação da equipe</p><p>interdisciplinar proporcionando um maior equilíbrio. Essa pesquisa foi realizada</p><p>em um hospital comunitário religioso em Bonn, na Alemanha. Os resultados</p><p>mostraram melhorias significativas em dois dos três componentes do Burnout</p><p>(exaustão emocional e realização pessoal). Além disso, as taxas de adesão e</p><p>aceitação foram altas e os dados qualitativos revelaram uma melhora percebida</p><p>do autocuidado e na conexão interpessoal.</p><p>50</p><p>O profissional é visto pelo paciente e por sua família como aquele que irá</p><p>reestabelecer a segurança e a saúde, diminuindo a sensação de vulnera-</p><p>bilidade e sofrimento experimentadas. No entanto, frente a doença terminal e a</p><p>proximidade com a finitude, o paciente e familiares tendem a ficar mais inseguros</p><p>e demandando ainda mais do profissional, o que gera uma grande sobrecarga</p><p>física e emocional, podendo interferir diretamente na disponibilidade deste pro-</p><p>fissional para esta relação de cuidado. Conclui-se que para que o cuidado seja</p><p>prestado de uma forma efetiva é necessária uma abordagem multidisciplinar e</p><p>que esta equipe apresente uma boa integração e compromisso com o paciente.</p><p>Também é fundamental inteligência emocional. Por isso, as instituições devem</p><p>incluir capacitações profissionais não só a nível técnico como também a nível</p><p>emocional, estimulando o autoconhecimento e reflexões da sua própria história</p><p>de vida.</p><p>Alguns vídeos relacionados ao assunto abordado que agregarão mais co-</p><p>nhecimento ao conteúdo estudado.</p><p>51</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=7wP2yJK5b98</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=PLECniSeC2M</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=f2b9nOTpC9k</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=V80qgv3_LEM</p><p>52</p><p>8. REFERÊNCIAS</p><p>BERTACHINI L. Pessini L. A importância da dimensão espiritual na prática</p><p>dos cuidados paliativos. Rev Bioethikos. 2010;4(3):315-23.</p><p>BOFF, L. Saber cuidar: ética do humano: compaixão pela terra. Petrópolis:</p><p>Vozes, 2003.</p><p>BRAZ, Mariana Sarkis; FRANCO, Maria Helena Pereira. Profissionais Paliati-</p><p>vistas e suas Contribuições na Prevenção de Luto Complicado. Psicol. ci-</p><p>enc. prof., Brasília, v. 37, n. 1, p. 90-105, Jan. 2017.</p><p>Centro de Ensino Nova Dimensão. Saúde do idoso/08. Cuidados paliativos</p><p>ao idoso com doença terminal. Prof. Tacio. YouTube. Disponível em: <</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=V80qgv3_LEM>. Acessado em 26 de ja-</p><p>neiro de 2022.</p><p>FRANCO, Maria Helena Pereira. Luto como experiência vital. Cuidados palia-</p><p>tivos: discutindo a vida, a morte e o morrer. São Paulo: Editora Atheneu, 2009.</p><p>KOVACS, MJ. Educação para a morte. Psicol Cienc Prof. 2005;25(3):484-97.</p><p>Liga Nacional da FisioIntensiva. Cuidados Paliativos: Como é de verdade?</p><p>YouTube. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=7wP2yJK5b98>.</p><p>Acessado em 26 de janeiro de 2022.</p><p>MARENGO MO, Flávio DA, Silva RHA. Terminalidade de vida: bioética e hu-</p><p>manização em saúde. Medicina (Ribeirão Preto). 2009;42(3):350-7.</p><p>MAUES, Raymundo Heraldo. "Morte moderna" e "morte contemporânea": for-</p><p>mas distintas e contemporâneas de expropriação. Physis, Rio de Janeiro, v. 16,</p><p>n. 2, p. 351-358, 2006.</p><p>NAMU. Ana Claudia Quintana Arantes: como lidar com o luto. YouTube.</p><p>Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=PLECniSeC2M>. Aces-</p><p>sado em 26 de janeiro de 2022.</p><p>QUEIROZ, Ana Helena Araújo Bomfim et al. Percepção de familiares e profis-</p><p>sionais de saúde sobre os cuidados no final da vida no âmbito da atenção</p><p>primária à saúde. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 18, n. 9, p. 2615-</p><p>2623, Sept. 2013 .</p><p>SANTOS, J. L. dos; CORRAL-MULATO, S.; BUENO, S. M. V. Morte e luto: a</p><p>importância da educação para o profissional de saúde. Arq. Cienc. Saúde UNI-</p><p>PAR, Umuarama, v. 18, n. 3, p, 199-203, set./dez. 2014.</p><p>SANTOS, T. C. F. dos; FENSTERSEIFER, L. Educação para a morte na for-</p><p>mação do psicólogo da PUC Minas São Gabriel. Pretextos - Revista da Gra-</p><p>duação em Psicologia da PUC Minas, v. 1, n. 1, jan./jun. 2016.</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=V80qgv3_LEM</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=7wP2yJK5b98</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=PLECniSeC2M</p><p>53</p><p>SAITO, Danielle Yuri Takauti; ZOBOLI, Elma Lourdes Campos Pavone. Cuida-</p><p>dos paliativos e a atenção primária à saúde: scoping review. Rev. Bioét. Bra-</p><p>sília , v. 23, n. 3, p. 593-607, Dec. 2015 .</p><p>TV Oncoguia. Cuidados Paliativos: Aos pacientes e também aos familia-</p><p>res. YouTube. Disponível em: < https://www.you-</p><p>tube.com/watch?v=f2b9nOTpC9k>. Acessado em 26 de janeiro de 2022.</p><p>WORDEN JW. Aconselhamento do luto e terapia do luto: um manual para</p><p>profissionais da saúde mental. São Paulo: Roca; 2013.</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=f2b9nOTpC9k</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=f2b9nOTpC9k</p><p>percebe-se, uma tendência dos cuidados palia-</p><p>tivos que fomenta a busca em proporcionar novas estratégias de promoção de</p><p>saúde e de políticas governamentais, como: oferecer abordagem multiprofissio-</p><p>nal para um envelhecimento ativo; influenciar positivamente o curso da doença;</p><p>discutir e considerar a morte como processo natural da vida, integrando aspectos</p><p>psicológicos e espirituais ao cuidado do paciente; implantar sistema de apoio à</p><p>família no processo de luto. A Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)</p><p>conceitua o envelhecimento sem omitir o que lhe é naturalmente próprio, ou seja,</p><p>a possibilidade da morte:[...] um processo sequencial, individual, acumulativo,</p><p>irreversível, universal, não-patológico, de deterioração de um organismo ma-</p><p>duro, próprio a todos os membros de uma espécie, de maneira que o tempo o</p><p>torne menos capaz de fazer frente ao estresse do meio ambiente e, portanto,</p><p>aumente sua possibilidade de morte.</p><p>Zinn e Gutierrez (2008) ressaltam que o envelhecimento, conforme descrito</p><p>pela OPAS, quer lembrar um caminhar para o fim da vida, no qual a morte pode</p><p>ser compreendida, não como um ponto final na existência e, sim, como um ele-</p><p>mento constitutivo dela. Nesse sentido, Pessini e Siqueira (2013, ao citarem a</p><p>frase do jornalista Roger Rosemblat no periódico New York Times, vem ilustrar</p><p>a postura da sociedade atual diante da morte, ao dizer que: “quando a morte</p><p>era considerada um evento metafisico, exigia certo tipo de respeito[...] hoje</p><p>que o processo se prolonga grandemente é vista como prova de fracasso</p><p>[...]”,apontando também para o modo de como os profissionais da saúde lidam</p><p>com esse evento e de como em nosso tempo temos transformado “a</p><p>morte-mistério em morte-problema” (p.111). Compreendendo assim, segundo</p><p>os autores, que o problema é algo que está fora de nós e que barra nosso cami-</p><p>nho e mistério, faz parte do nosso eu interior, da nossa existência. Para Pessini</p><p>e Siqueira (2013), a morte é sempre algo muito pessoal, e responder aos medos</p><p>e as condições humanas da pessoa na fase final de vida envolve responder a</p><p>nós mesmos.</p><p>7</p><p>No processo de evolução da medicina e postergação da morte, fomos de-</p><p>saprendendo o que fazer com os pacientes que estavam se aproximando do fim,</p><p>e a morte passou a ser tratada como doença e de forma insensata buscou-se</p><p>curá-la. Iniciou-se um movimento denominado de obstinação terapêutica ou dis-</p><p>tanásia, no qual se adia o inevitável: “Há dois limites opostos: de um lado, a</p><p>convicção profunda de não abreviar intencionalmente a vida (eutanásia); de ou-</p><p>tro, a visão para não prolongar o sofrimento e adiar a morte (distanásia). Entre o</p><p>não abreviarás e não prolongarás a vida, está o amarás” (Pessini, & Siqueira,</p><p>2013, p.116). A distanásia ou obstinação terapêutica utiliza-se da tecnologia mé-</p><p>dica para prolongar penosa e inutilmente o processo de morrer. Nesse contexto,</p><p>iniciam-se novas problematizações em que o paciente vai ocupando o centro do</p><p>debate no que diz respeito à “gestão do fim da vida” (Marinho, & Aran, 2011,</p><p>p.1). Para Marinho e Aran (2011), a noção de “boa morte” como uma morte</p><p>rápida, inconsciente, discreta, é questionada em prol da concepção de uma</p><p>morte consciente, controlada e antecipada. Introduzem-se, assim, novas preo-</p><p>cupações, como aquelas relativas à eutanásia, às quais a proposta dos cuidados</p><p>paliativos vem se opor, como um modelo alternativo de “boa morte”.</p><p>Em 2002, a OMS definiu cuidados paliativos como uma abordagem que</p><p>promove qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças</p><p>que ameaçam a continuidade da vida, por meio da prevenção e do alívio do so-</p><p>frimento, o que requer identificação precoce, avaliação e tratamento impecável</p><p>da dor e de outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual. Atual-</p><p>mente, mesmo considerando os inúmeros avanços propostos pela filosofia</p><p>dos cuidados paliativos, os profissionais da área da saúde ainda têm muito</p><p>o que avançar numa prática de assistência voltada para a gestão do fim da</p><p>vida, na qual distingue-se o curar do cuidar e o manter a vida, quando isto for</p><p>o procedimento correto, e permitir que a pessoa morra,quando sua hora chegou,</p><p>de acorodo com Martin (1998). Dentro dessa temática, destaca-se também a</p><p>questão do luto, que seriam as reações de um indivíduo diante da perda. Rea-</p><p>ções que variam de indivíduo para indivíduo, dependendo da relação construída</p><p>entre duas pessoas, ou entre a pessoa e seu objeto de amor.</p><p>As reações mais comuns observadas no processo de luto são as reações</p><p>físicas (falta de ar, dor física, alteração do sono etc.); as reações emocionais</p><p>8</p><p>(choque, negação, sensação de abandono etc.); as reações comportamentais</p><p>(busca constante da pessoa morta, apatia, choro etc.); as reações sociais (iso-</p><p>lamento, dificuldades de interagir etc.); as reações espirituais (perda da fé, apro-</p><p>ximação de Deus etc.) É nesse sentido que Manfrinato (2011), no seu estudo</p><p>sobre o luto complicado, aponta a perda da pessoa amada como desestabiliza-</p><p>dora do mundo como o conhecemos, fazendo com que o processo de luto repre-</p><p>sente um período de reorganização “da cognição, emoção, bem-estar fisiológico</p><p>e do mundo sem a pessoa” (p.5). É importante observar que algumas pessoas,</p><p>na iminência da morte de um ente querido, comecem a demonstrar sinais de</p><p>vulnerabilidade antes mesmo da perda real. Nesses casos, os sentimentos em</p><p>relação à perda podem se prolongar, dando origem a complicações psiquiátricas</p><p>levando, portanto, ao que se tem denominado luto complicado. Termo este que</p><p>adotaremos no presente trabalho, em substituição ao termo luto patológico.</p><p>Nesse sentido, é importante diferenciar o luto, processo natural e consti-</p><p>tuinte de nossas vidas, de um processo patológico, pois, apesar de existirem</p><p>muitas variáveis a serem consideradas, “se ocorrer a exacerbação do processo</p><p>do luto com uma longa duração, juntamente a características de obsessividade,</p><p>configura-se um processo de luto complicado” (Flach, Lobo, Potter, & Lima,</p><p>2012, p.88). Bowlby (1990), nos seus estudos, apontava algumas características</p><p>dos vínculos que predisporiam as pessoas a um luto complicado, como</p><p>relacionamentos ambivalentes, insegurança, cuidado exagerado, nervosismo,</p><p>instabilidade emocional, dependência afetiva, falsa autossuficiência. Portanto,</p><p>diante de tais características, que podem emergir na crise suscitada pela inter-</p><p>nação hospitalar, antes da perda efetiva, cabe à equipe de saúde se colocar em</p><p>alerta para prevenir ou minimizar a vivência de um luto complicado, como se</p><p>apresentou no caso em estudo. O DSM-Vtraz, na sessão “Condições para</p><p>Estudos Posteriores”, o “Transtorno do Luto Complexo e Persistente”, uma outra</p><p>nomenclatura para o termo luto complicado, que tem como principais caracterís-</p><p>ticas diagnósticas:</p><p>a) Intervalo de, ao menos 12 meses (6 meses para criança), desde a morte</p><p>de alguém com quem o enlutado tinha um relacionamento próximo. Esse</p><p>intervalo discrimina o luto normal do luto persistente.</p><p>9</p><p>b) Saudade persistente do falecido; intenso pesar e choros frequentes; pre-</p><p>ocupação com o falecido; preocupação sobre a maneira como a pessoa</p><p>morreu;</p><p>c) Dificuldade acentuada de aceitar que o indivíduo morreu; descrença em</p><p>que o indivíduo esteja morto; lembranças angustiantes do falecido; raiva</p><p>com relação à perda; avaliações desadaptativas sobre si mesmo em rela-</p><p>ção ao falecido ou à morte; evitação excessiva de lembranças da perda;</p><p>desejo de morrer para estar com o falecido; não confiar nos outros; sentir-</p><p>se isolado; acreditar que a vida não tem proposito ou sentido, sem o fale-</p><p>cido; experimentar um senso diminuído de identidade, no qual sente que</p><p>uma parte de si morreu ou foi perdida; ter dificuldade em se engajar em</p><p>atividades, buscar relações ou planejar o</p><p>futuro.</p><p>d) Sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento psi-</p><p>cossocial;</p><p>e) A natureza ou a gravidade do luto devem estar além das normas espe-</p><p>radas para o contexto cultural relevante, grupo religioso ou estágio do de-</p><p>senvolvimento.</p><p>A morte de um familiar pode trazer alívio, mas também acarretar culpa,</p><p>sensação de vazio pelo longo período de dedicação, e fantasias de que seu cui-</p><p>dado não foi adequado e suficiente e que, por isso, não evitou a morte do familiar.</p><p>No ambiente hospitalar, e mais especificamente junto a pacientes idosos, porta-</p><p>dores de doenças crônicas e em estágio terminal, com períodos longos de inter-</p><p>nações, é possível trabalhar antecipadamente as perdas, o luto. O momento da</p><p>internação faz com que o indivíduo e seus familiares passem por diversas per-</p><p>das, trazendo dor e sofrimento diante da iminência da morte, promovendo o pro-</p><p>cesso de luto antecipatório que, segundo Flach, et al. (2012), seria como o tipo</p><p>de luto que ocorre antes da perda real. Nesse contexto, o papel da equipe de</p><p>saúde, incluindo o psicólogo hospitalar, vai além do atendimento/acompanha-</p><p>mento do paciente idoso; objetiva também propiciar alívio para os próprios cui-</p><p>dadores. Nas situações de doenças terminais, Kübler-Ross (1998) também res-</p><p>salta a importância de se considerar o estado dos familiares do doente, pois o</p><p>10</p><p>papel desempenhado por eles contribui no atendimento ao paciente, conside-</p><p>rando que, nessas situações, vêm à tona problemas que foram postergados du-</p><p>rante a vida e que necessitam ser resolvidos. Nesse sentido, o papel do psicó-</p><p>logo hospitalar como membro da equipe de saúde seria de realçar a expressão</p><p>dos sentimentos, a melhora da qualidade de vida e facilitar a comunicação, entre</p><p>todos, inclusive envolvendo toda a equipe nesse processo de terminalidade.</p><p>Um dos aspectos a serem valorizados nas estratégias de intervenção da</p><p>equipe de saúde, especialmente do psicólogo hospitalar junto ao doente idoso</p><p>terminal, é o “ritual de despedida”, como ação preventiva para o surgimento de</p><p>sintomas psicopatológicos, importante para a reaproximação da família e para a</p><p>definição de questões do relacionamento familiar que estejam pendentes. Se-</p><p>gundo Lisboa e Crepaldi (2013), esse momento de despedida entre o paciente</p><p>na iminência da morte e seus familiares, é feito “de forma cerimonial, mas sem</p><p>dramatização excessiva, sendo uma atitude familiar e próxima” (p.107). Tem-se</p><p>a intenção, segundo os autores, de fazer com que “a morte seja percebida, que</p><p>se fale sobre ela” e que “a oportunidade de poder se despedir do paciente com</p><p>este ainda em vida, parece fazer diferença na aceitação da morte, podendo-se</p><p>cogitar que facilita também a elaboração do luto pós-óbito” (Lisboa, & Crepaldi,</p><p>2013, p.107).</p><p>2. O QUE SÃO CUIDADOS PALIATIVOS E COMO PODEM AJU-</p><p>DAR</p><p>Cuidados paliativos são uma modalidade em saúde que vem evoluindo nos</p><p>últimos anos. Atualmente, têm-se discutido novos procedimentos para interven-</p><p>ção e tratamento de diversos tipos de doenças. Por meio de novas tecnologias</p><p>e qualificação de profissionais da saúde capacitados para diagnosticar e melhor</p><p>atender o paciente, temos conseguido aumentar a expectativa de vida. Esse me-</p><p>lhor atendimento que buscamos para os nossos pacientes visa a otimizar a qua-</p><p>lidade de vida. Não queremos simplesmente prolongar a vida.</p><p>11</p><p>Mas, quando a doença é incompatível com a vida, será que estamos prepa-</p><p>rados para lidar com a morte?</p><p>Muito se discute sobre como ter qualidade de vida, mas, também devemos</p><p>nos preocupar com a qualidade da morte, mesmo com doenças que aproximam</p><p>o fim da vida, há muito trabalho pela frente.</p><p>No que se refere às doenças terminais, os cuidados paliativos podem focar</p><p>o alívio da dor, minimizando o sofrimento, tanto do paciente quanto de sua famí-</p><p>lia (se possível). Os cuidados oferecidos a pacientes com doença terminal é uma</p><p>especialidade denominada Cuidados Paliativos. Os cuidados paliativos são cui-</p><p>dados prestados geralmente no fim de vida, tanto para o paciente quanto para</p><p>os seus familiares, que vivenciam, muitas vezes, o luto antecipatório. O objetivo</p><p>é aliviar o sofrimento físico, mental e social. Cuidados paliativos são oferecidos</p><p>por médicos, psicólogos, fisioterapeutas, dentre outros profissionais, mediante a</p><p>um curso de especialização nesta modalidade.</p><p> Saúde Social.</p><p>Hoje em dia, existe o conceito de cuidados paliativos não terminais. Esta-</p><p>mos falando de cuidar de pessoas que sofrem de algum problema de saúde que</p><p>vai levá-las à morte em período mais longo. Por exemplo, idosos em fases finais</p><p>http://162.214.104.137/~wwidos/saude-social/</p><p>12</p><p>da doença de Alzheimer, que já estão acamados e se alimentam exclusivamente</p><p>por sonda. Pessoas assim, podem viver por vários meses, ou até anos. São pes-</p><p>soas que necessitam de cuidados de uma equipe multiprofissional de saúde,</p><p>assim como suas famílias. O foco dos Cuidados Paliativos é oferecer alívio da</p><p>dor. Muitas vezes essa dor não é só física. Também estamos falando da dor que</p><p>vai além do corpo. Pensar na morte faz muitas pessoas buscarem o significado</p><p>de tudo o que viveram e porquê estão passando por isso. Por essa razão, muitos</p><p>pesquisadores têm discutido a respeito do impacto da espiritualidade (e de ora-</p><p>ções/prece) para a saúde física do ser humano.</p><p>Estudos apontam que mais de 90% dos brasileiros acreditam em uma di-</p><p>vindade superior, sendo possível verificar consequências da religiosidade na sa-</p><p>úde mental. É notória a importância da espiritualidade e religiosidade em casos</p><p>de doença terminal na família. Em enfermidades crônicas e incuráveis, como as</p><p>doenças neuro-degenerativas, é comum os pacientes procurarem métodos al-</p><p>ternativos como complemento ao tratamento clínico. Indícios apontam que a es-</p><p>piritualidade parece estar relacionada a capacidade de lidar melhor com uma</p><p>condição de doença incurável. A espiritualidade tem uma ação benéfica na qua-</p><p>lidade de vida do paciente. Estudos apontam que apresentam melhoras mesmo</p><p>em quadros depressivos. Não importa a religião que seguimos. O importante é</p><p>desenvolver a espiritualidade para amenizar a dor de uma doença ou familiar</p><p>doente. Para os católicos e simpatizantes, temos um texto muito bonito escrito</p><p>por um monge beneditino.</p><p>2.1 Cuidados Paliativos na Terceira Idade: Educação para o En-</p><p>frentamento da Morte</p><p>Discorrer sobre a morte é um desafio por causa da sua recorrente aborda-</p><p>gem cercada de polêmicas, apesar de ser um tema bastante recorrente ao redor</p><p>de todos, às vezes até banalizado, seja em mídias televisivas dos noticiários,</p><p>seja nas redes sociais, no compartilhamento diário de tragédias, e até em sim-</p><p>ples conversas com as pessoas. E ainda mais frequente na redoma da saúde, a</p><p>morte implica, muitas vezes, o não conhecimento na condução deste processo,</p><p>tanto para os profissionais de saúde, quanto para o idoso, que, devido à idade,</p><p>http://162.214.104.137/~wwidos/uma-espiritualidade-para-e-do-doente-terminal/</p><p>http://162.214.104.137/~wwidos/uma-espiritualidade-para-e-do-doente-terminal/</p><p>13</p><p>há uma maior proximidade da morte. Sendo assim, a atuação dos cuidados pa-</p><p>liativos na terceira idade, no tocante à educação para a morte, é de extrema</p><p>importância, pois todos, sem exceção, irão falecer, e uma condução adequada,</p><p>visando a minimização de danos psicológicos é essencial. Portanto, “essa edu-</p><p>cação envolve comunicação, relacionamento, perdas, situações-limite, nas quais</p><p>reviravoltas podem ocorrer durante a vida, como por exemplo: fases do desen-</p><p>volvimento, perda de pessoas significativas, doenças, acidentes, até o confronto</p><p>com a própria morte.” (KOVÁCS, 2005, 486). Além disso, trata-se de uma refle-</p><p>xão de conduta, diante da mortalidade humana, buscando equilibrar o conheci-</p><p>mento científico e a humanização.</p><p>De fato, pensar nos cuidados paliativos, educando para a morte requer</p><p>mu-</p><p>danças de paradigmas e exclusão de tabus. Nesse sentido, recorrer a uma hu-</p><p>manização no processo da morte, incita uma discussão sobre o histórico dos</p><p>cuidados paliativos, a “qualidade de morte”, a abordagem dos profissionais en-</p><p>volvidos, além do envolvimento das políticas públicas no estofo da educação</p><p>para a morte. É factível que a absorção do “morrer” está em constante transfor-</p><p>mação, além de que o significado de morte difere de uma cultura para outra.</p><p>Desde a forma de se “velar” o defunto: cremando, enterrando, mumificando; até</p><p>as cerimônias: dança, rituais, dedicações, há uma heterogeneidade na aceitação</p><p>e significação da morte. Na Idade Média, a morte era tida com uma naturalidade</p><p>ímpar, ao ponto do indivíduo ao perceber a aproximação da morte considerar de</p><p>fundamental importância reunir toda a família. Já nos séculos XVI, XVII e XVIII</p><p>houve uma transição abrupta ao encarar a morte, na medida em que, em pleno</p><p>final de Idade Média, pico da peste negra, que dizimou sociedades inteiras, e</p><p>início do Iluminismo, a morte passa a ser considerada como uma inimiga cruel e</p><p>assustadora, que irá violar o direito à vida do indivíduo, constando nessa época</p><p>o estereótipo imaginativo de “esqueleto e foice” da morte, tão explorada pelas</p><p>artes em geral na atualidade.</p><p>No século XIX, a morte é retratada com intensa melancolia e, de certo</p><p>modo, glamourizada pelos romancistas. Contudo, no século XX e XXI, a morte</p><p>deve ser escondida a todo custo e o processo de luto interiorizado, uma vez que,</p><p>com o avanço das tecnologias, o enfermo é isolado e internado em unidades de</p><p>14</p><p>terapia em centros médicos, envolvidos por tubos, agulhas, medicamentos, e</p><p>que, na maioria das vezes, tratado de forma desumanizada no último estágio da</p><p>vida. Esse último modelo de morte é caracterizado por Menezes como “morte</p><p>moderna” e é justamente nesse modelo que a educação para a morte deve ser</p><p>inserida, com objetivo de humanizar este processo. O conceito de cuidados pa-</p><p>liativos surgiu na Inglaterra, graças a Cicely Saunders que, em 1967, fundou o</p><p>Christopher’s Hospice, voltado para o cuidado integral do moribundo, orgânica,</p><p>psicológica e socialmente. Contudo, os cuidados paliativos, nessa época, limita-</p><p>vam-se ao zelo de pacientes terminais, o que difere conceitualmente da OMS</p><p>hoje em dia, como já explicitado.</p><p>No Brasil, só a partir de 1990, que começaram os serviços mais padroniza-</p><p>dos, ainda que rudimentares. Referencia-se a esse início de abordagem à medi-</p><p>cina paliativa a criação do Instituto Nacional do Câncer – INCA, do Ministério da</p><p>Saúde, que inaugurou em 1998 o hospital Unidade IV, exclusivamente dedicado</p><p>aos Cuidados Paliativos. Já a partir de 2005, houve a criação da Academia Na-</p><p>cional de Cuidados Paliativos, que aprofundou os estudos e ações nessa pers-</p><p>pectiva, além de propor definição precisa e regularização dos cuidados paliati-</p><p>vos. A partir disso, houve em 2009, a inclusão pelo Conselho Federal de Medi-</p><p>cina, no seu Código de Ética Médica, os “Cuidados Paliativos” como princípio</p><p>fundamental. Entretanto, esse avanço emperra na falta de regularização da Me-</p><p>dicina Paliativa como área de atuação médica e, ainda, da democratização do</p><p>acesso e universalização dos serviços. O cenário atual da “qualidade de morte”</p><p>- conceito que se refere à “melhor” forma de processo de morrer do paciente, no</p><p>sentido de boa assistência e controle de sintomas,no Brasil é ainda antiquado,</p><p>ao ponto de haver muito preconceito e confusão, no que concerne ao conceito</p><p>de cuidados paliativos e eutanásia.</p><p>Nesse aspecto, verificam-se como dificuldades: a inclusão dos Cuidados</p><p>Paliativos na atenção básica; o atestado de óbito em domicílio; a “cesta básica”</p><p>de medicamentos, que é muito cara; e, o armazenamento, a distribuição e o des-</p><p>carte de remédios opiáceos que aliviam a dor. Em contraste a isso, o Reino</p><p>Unido se mostra como referência na “qualidade da morte” nos critérios a seguir:</p><p>o ambiente dos cuidados paliativos em particular e dos cuidados de saúde em</p><p>15</p><p>geral; os recursos humanos; o preço e a qualidade dos cuidados paliativos; e o</p><p>envolvimento na comunidade em geral. A respeito dos profissionais envolvidos</p><p>há uma criticidade recorrente no âmbito de formação deficitária no tema da morte</p><p>nos seguintes eixos temáticos: provocação de sensibilidade dos alunos, e futuros</p><p>profissionais, para a reflexão acerca da morte; apresentação por partes dos do-</p><p>centes de várias abordagens do tema morte. Com isso, o profissional ao longo</p><p>de sua carreira se limitará à sua própria carga teórica sobre o tema, o que poderá</p><p>significar uma abordagem falha.</p><p>3. ENVELHECIMENTO, FINITUDE, MORTE E CUIDADOS PALIA-</p><p>TIVOS</p><p>Quando a doença e a morte atingem um indivíduo idoso dentro de um nú-</p><p>cleo familiar onde não há o conhecimento sobre o processo de envelhecimento</p><p>e a morte, o sofrimento é sempre acompanhado de sentimentos como desam-</p><p>paro e solidão. Desde que, a partir do século XX, as pessoas passaram a viver</p><p>mais tempo, torna-se necessário o conhecimento sobre o processo de envelhe-</p><p>cimento, porque é através dele que aprendemos a lidar com as modificações que</p><p>as limitações impostas pela longevidade apresentam. A reflexão sobre a longe-</p><p>vidade traz inúmeras questões, até agora mal resolvidas, relativas a aspectos</p><p>financeiros, enfermidades crônicas e/ou degenerativas, alterações emocionais,</p><p>mudanças nos papéis sociais, etc. Surge a necessidade urgente da educação</p><p>gerontológica nas instituições que abrigam seres humanos, como a família, a</p><p>16</p><p>escola, os locais de trabalho e as igrejas, na mídia e nas políticas sociais, trans-</p><p>formando conceitos e significados relativos à velhice, proporcionando o planeja-</p><p>mento de vida na longevidade, apontando para o exercício da cidadania e evi-</p><p>tando que o envelhecer se torne um período de sofrimento, isolamento e tristeza.</p><p>Conhecendo o processo de envelhecer, passamos a entender que a vida é</p><p>um período finito, pois o envelhecimento em si apresenta uma perspectiva de</p><p>morte. A grande maioria das pessoas não reflete sobre a morte, pois considera</p><p>que “ela não faz parte da vida”. No entanto, aprendemos na escola, desde tenra</p><p>idade, que “todo ser vivo nasce, cresce, desenvolve-se e morre”. Então ela faz</p><p>parte da vida, mas procuramos evitar pensar no fim, pois a morte é um tabu, um</p><p>tema que traz constrangimento e sofrimento. Assim como deve haver educação</p><p>para a longevidade, também é necessário que se pense a morte em diversos</p><p>locais e instituições, como escolas, hospitais, meios de comunicação, incluindo</p><p>o tema também na formação dos profissionais de saúde para que, em grupos</p><p>multidisciplinares, cuidadores e familiares também possam ser acolhidos e ori-</p><p>entados nos cuidados ao paciente portador de doenças crônicas e/ou em fase</p><p>terminal. A velhice pode ser um tempo de se preparar para a morte com maior</p><p>reflexão, pois a morte chega onde houve vida, e a morte de um idoso revela uma</p><p>vida cheia de experiências, relações, alegrias, tristezas, frustrações, perdas, ga-</p><p>nhos, aprendizados. O desenvolvimento tecnológico possibilita o prolongamento</p><p>da vida, e este pode ser um período de novas experiências e aprendizados, mais</p><p>tempo para o lazer e para estar ao lado de quem amamos. Mas, nem sempre</p><p>encontramos qualidade de vida nesse período.</p><p>O prolongamento da vida, acompanhado de situações como as doenças</p><p>crônico-degenerativas, exige cuidados abrangentes, que vão muito além do tra-</p><p>tamento farmacológico, para que seja mantida a qualidade de vida não só do</p><p>paciente, mas também de familiares e cuidadores. Nesse sentido, surgem os</p><p>Cuidados Paliativos que promovem essa qualidade de vida quando do enfrenta-</p><p>mento de doenças que ameacem o viver, prevenindo e aliviando o sofrimento.</p><p>Através de uma equipe multidisciplinar, os cuidados paliativos visam manter a</p><p>qualidade de vida e a dignidade humana</p><p>durante o decorrer da doença, na ter-</p><p>minalidade da vida, na morte e no período de luto, promovendo o alívio da dor e</p><p>17</p><p>outros sintomas, considerando a morte como um processo normal da vida, ofe-</p><p>recendo suporte para que o paciente viva o mais ativamente possível até sua</p><p>morte, e amparando os familiares durante a doença e no enfrentamento do luto.</p><p>Os Cuidados Paliativos têm crescido no Brasil desde a década de 1980,</p><p>mas ainda há necessidade de formação profissional e humanização no atendi-</p><p>mento para que as necessidades no país possam ser atendidas. Não existe um</p><p>Programa Nacional para assistência à terminalidade da vida e a medicina atual-</p><p>mente tem seu maior foco em questões relacionadas à cura e à tentativa de</p><p>recuperação de pacientes que apresentam doenças sem possibilidade de cura.</p><p>Prolonga-se o processo de morrer, ignorando o sofrimento do paciente e seus</p><p>familiares. Até o momento, são poucos os indivíduos que tem acesso a esses</p><p>conhecimentos e serviços, transformando a vida e a morte da grande maioria em</p><p>dúvidas, angústias e sofrimento. A humanização em Medicina e em outras pro-</p><p>fissões da área da saúde está sendo acompanhada pela conscientização do ser</p><p>integral que não se resume a uma doença a ser curada, a uma vida a ser pro-</p><p>longada a qualquer custo. O respeito ao ser no fim da vida é uma meta a ser</p><p>atingida, exigindo formação adequada dos profissionais envolvidos no atendi-</p><p>mento, para que também saibam orientar os pacientes e familiares em questões</p><p>relativas aos seus direitos e amenizando o sofrimento durante o período de do-</p><p>ença, morte e luto.</p><p>3.1 Cuidados Paliativos na Gerontologia</p><p>Os Cuidados Paliativos são uma necessidade humana e podem ser aplica-</p><p>dos em qualquer indivíduo, não necessariamente a um paciente em fase termi-</p><p>nal, a fim de proporcionar uma melhor atenção e conforto às pessoas enfermas,</p><p>seus familiares e cuidadores, além de contribuir para a garantia de todos os di-</p><p>reitos estabelecidos no Estatuto do Idoso. De acordo com a (Academia Nacional</p><p>de Cuidados Paliativos (ANCP), “o significado de paliar é proteger. Paliar, deri-</p><p>vado do latim pallium, termo que nomeia o manto que os cavaleiros usavam para</p><p>se proteger das tempestades pelos caminhos que percorriam. Proteger alguém</p><p>é uma forma de cuidado, tendo como objetivo amenizar a dor e o sofrimento</p><p>sejam eles de origem física, psicológica, social ou espiritual. Por esse motivo,</p><p>18</p><p>quando ouvir que você ou alguém que conhece é elegível a cuidados paliativos,</p><p>não há o que temer.”</p><p>De acordo com a SBGG, “originalmente, a atenção dos Cuidados Paliativos</p><p>centrava-se em pacientes na fase final da vida. Hoje, se considera que eles vão</p><p>além dessa prática: devem estar disponíveis para pacientes e seus familiares</p><p>durante todo o processo de doença ameaçadora à continuidade da vida e tam-</p><p>bém no transcurso do luto. Os Cuidados Paliativos são prestados mais efetiva-</p><p>mente por uma equipe interdisciplinar, como médicos, enfermeiros, assistentes</p><p>sociais, psicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, fisioterapeutas,</p><p>nutricionistas, capelães e voluntários que sejam competentes e habilidosos em</p><p>todos os aspectos do processo de cuidar relacionados à sua área de atuação.”</p><p>Segundo Gutierrez, infelizmente no Brasil, ainda existe uma carência de conhe-</p><p>cimentos teóricos muito significativa quando o assunto envolve cuidados paliati-</p><p>vos. Isso ocorre devido à insuficiência de incentivos relacionados à educação</p><p>paliativa, que é fator influenciador da atitude profissional, em conjunto com as</p><p>experiências decorrentes da formação. Devemos, porém, refletir que diante do</p><p>aumento da expectativa de vida, com o consequente envelhecimento da popu-</p><p>lação, temos também uma maior prevalência de doenças crônicas, o que traz</p><p>uma nova demanda, uma vez que a cura, em alguns casos, deixa de ser priori-</p><p>dade em caso de doentes crônicos, necessitando proporcionar qualidade de vida</p><p>a esses indivíduos e assim temos como opção o uso dos Cuidados Paliativos.</p><p>Pensando na população idosa, torna-se indispensável a atuação dos pro-</p><p>fissionais especializados em gerontologia junto com toda a equipe multidiscipli-</p><p>nar em cuidados paliativos, pois em muitos quadros como câncer, hipertensão</p><p>arterial, cardiopatias, diabetes, doença pulmonar crônica, Acidente Vascular En-</p><p>cefálico (AVE), entre outras doenças, é indispensável um tratamento medica-</p><p>mentoso para amenizar os sintomas, contudo proporcionar qualidade de vida à</p><p>pessoa torna-se tarefa imprescindível. Como Terapeuta Ocupacional posso afir-</p><p>mar que uma das maiores conquistas como profissional é conseguir proporcionar</p><p>um sorriso de um paciente que está acamado e totalmente acometido por al-</p><p>guma patologia, e melhor ainda é ouvir dos familiares, cuidadores e enfermeiros</p><p>que fazia dias que ele chorava ou apenas reclamava de dores e então com al-</p><p>guma atividade simples ou apenas uma boa conversa você consegue fazer</p><p>19</p><p>aquele paciente esquecer de sua doença e muitas vezes das dores em 1 hora</p><p>de atendimento. Dessa forma é de responsabilidade de todos os profissionais</p><p>envolvidos em um caso clínico, atingir os principais objetivos dos cuidados pali-</p><p>ativos que proporcionam, juntamente com a qualidade de vida, controle de dor,</p><p>melhora de sintomas físicos, emocionais, problemas sociais e até mesmo espi-</p><p>rituais.</p><p>Vale lembrar que o cuidado paliativo também é indispensável não apenas</p><p>para o idoso, mas também para sua família, devido à sobrecarga física e emoci-</p><p>onal que surge diante do quadro clínico, necessitando da orientação e apoio dos</p><p>profissionais de saúde junto aos familiares e também cuidadores. De acordo com</p><p>a SBGG, “o cuidador pode apresentar sintomas de sobrecarga, como dor lombar,</p><p>irritabilidade, humor deprimido, insônia, dentre outros. A equipe envolvida no cui-</p><p>dado precisa ficar atenta a esses sinais de alarme. Um cuidador em sobrecarga</p><p>precisa de atenção imediata para si mesmo e também para que não perca o</p><p>alcance máximo do seu potencial de cuidar, correndo o risco de não suprir as</p><p>necessidades da pessoa doente. Por vezes, basta uma ajuda de outros cuida-</p><p>dores ou então um afastamento, ainda que temporário. Alguns cuidadores de-</p><p>senvolvem estratégias de enfrentamento que reduzem o risco de sobrecarga.</p><p>Frequentar grupos de apoio oferecidos pela comunidade pode ser útil, assim</p><p>como ter uma rotina de lazer e a possibilidade de férias programadas.” Cuidados</p><p>Paliativos, portanto, possuem uma abordagem muito ampla, uma vez que pode</p><p>ser aplicada em qualquer indivíduo, não necessariamente a um paciente em fase</p><p>terminal. Entretanto, no Brasil ainda, infelizmente, são necessárias especializa-</p><p>ções e maiores conhecimentos por parte dos profissionais de saúde, pois so-</p><p>mente dessa forma poderemos proporcionar uma melhor atenção e conforto aos</p><p>pacientes, seus familiares e cuidadores, além de contribuir para a garantia de</p><p>todos os direitos estabelecidos no Estatuto do Idoso. Afinal, é muito mais do que</p><p>uma simples abordagem, trata-se de uma necessidade humanitária.</p><p>3.2 A intervenção psicossocial nos cuidados paliativos</p><p>A intervenção psicossocial visa à capacitação do doente e da família pro-</p><p>movendo a sua autodeterminação. Assente em conhecimentos e metodologias</p><p>específicas, esta intervenção permite diagnosticar, avaliar e intervir em situações</p><p>20</p><p>de crise e emergência quer a nível individual, organizacional e social. Segundo</p><p>Novellas (2000), o assistente social é o profissional privilegiado que trabalhará</p><p>inserido numa equipa interdisciplinar e que, apelando à sua capacidade, criativi-</p><p>dade e disponibilidade, deverá efetuar a sua intervenção em diferentes níveis</p><p>psicossociais, consoante a fase em que o doente, a família e a equipa se encon-</p><p>tram e assim adequar a sua função ao objetivo de trabalho naquele momento</p><p>concreto. Em relação à equipa, o assistente social terá como principais funções</p><p>participar no</p><p>plano de ação de cada caso individual, estabelecendo prioridades</p><p>de trabalho de ordem assistencial, investigação e docência, fornecendo ao grupo</p><p>feedback dos conhecimentos que possui. Deve ainda apresentar e trabalhar res-</p><p>postas sociais disponíveis na comunidade, consoante as necessidades detecta-</p><p>das quer no grupo doente/família quer no próprio grupo de profissionais.</p><p>Sempre visando estabelecer uma relação de ajuda por meio de uma atitude</p><p>empática, o profissional deve saber comunicar-se com o doente, a fim de ajudá-</p><p>lo na resolução de problemas sociais, emocionais, econômicos, entre outros. In-</p><p>dividual e personalizadamente, o assistente social avalia o processo de adapta-</p><p>ção à doença e reavalia as preocupações sócio familiares que vão surgindo, in-</p><p>formando, orientando e contatando os recursos pretendidos e acordados. Muitas</p><p>vezes a família não sabe como lidar com a doença terminal do ente querido, e</p><p>isso suscita nela alterações emocionais por vezes incompreendidas na equipa.</p><p>A atenção do profissional de serviço social deve ir de encontro às necessidades</p><p>da família, prestando-lhe informação, apoio e educação nos cuidados. O profis-</p><p>sional alia-se à família na descoberta de recursos que possam promover/devol-</p><p>ver a estabilidade e equilíbrio familiar. A função do assistente social incorre na</p><p>detecção de problemas, levantamento e avaliação de necessidades.</p><p>Quanto mais precocemente os indicadores de risco social forem identifica-</p><p>dos, mais cedo serão trabalhados e resolvidos. Um estudo prospectivo, obser-</p><p>vacional analítico, pioneiro na área dos cuidados paliativos em Portugal, levado</p><p>a cabo por Reigada, Gonçalves e Silva (2008), comprovou isso mesmo. Por meio</p><p>de um questionário assente nos indicadores de risco social, foram abordados</p><p>200 doentes pertencentes a um Serviço de Cuidados Paliativos no norte de Por-</p><p>tugal onde foi realizada uma avaliação sócio familiar no espaço de 48 horas após</p><p>21</p><p>o ingresso do doente nesta equipa. Nesta avaliação foi possível identificar 171</p><p>casos que apresentavam indicadores considerados de risco, ou seja, a avaliação</p><p>social inicial e sistematizada foi considerada importante para poder intervir pre-</p><p>cocemente e assim, trabalhar desde cedo na resposta psicossocial mais eficaz</p><p>e consequentemente mais eficiente, que permitirá adequar a alta social com a</p><p>alta clínica.</p><p>3.3 O suporte familiar / trabalhar a família</p><p>A família é entendida como um sistema aberto de seres humanos em inte-</p><p>ração mútua ao longo dos tempos, onde as mudanças que nela ocorrem são</p><p>condicionadas pelo meio externo. A família é então vista como um subsistema e</p><p>ela própria pode ser dividida em vários subsistemas. A doença, quando surge,</p><p>não afeta uma pessoa nem uma família de igual forma. Cada ser humano possui</p><p>uma realidade interna formada pelo que se poderia chamar de “sedimentação</p><p>de experiências”, isto é, uma realidade interna intimamente ligada a um processo</p><p>em que se misturam sentimentos, afetos, relações e recordações resultantes do</p><p>intercâmbio entre o meio e o sujeito. Face a realidades externas similares, o</p><p>indivíduo pode desenvolver realidades internas muito diferentes. Ter presente</p><p>este aspecto quando se trabalha com famílias pode ajudar os profissionais a não</p><p>prejudicar, ou a estabelecer semelhanças interpretativas, entre os vários ele-</p><p>mentos que compõem o grupo familiar, o que poderia conduzir a erros na defini-</p><p>ção de objetivo e intervenções. Em cuidados paliativos (CP), o principal objetivo</p><p>no apoio à família assenta em ajudá-las a cumprir a sua função cuidadora, a fim</p><p>de que a participação no processo de perda que vivenciam seja concluída da</p><p>forma mais saudável possível.</p><p>As primeiras e mais importantes premissas para conseguir apoiar bem uma</p><p>família num processo de doença avançada são o conhecimento e a compreen-</p><p>são. Essas capacidades facilitam e ajudam a encontrar a forma mais adequada</p><p>de tratar cada situação em particular, possibilitando a identificação dos determi-</p><p>nantes e condicionantes circunstanciais, que aparecem no seio familiar e, assim,</p><p>realizar um enquadramento da situação do momento que está se está a viver. É</p><p>adequado realizar uma visão introdutória dos acontecimentos, dinâmicas ou con-</p><p>dutas familiares que muitas vezes ocorrem neste processo. A doença em fase</p><p>22</p><p>terminal pode provocar nos familiares uma série de reações emocionais, com-</p><p>portamentais, relacionais, etc. Nesse sentido, a tarefa da equipa é estabelecer</p><p>uma relação de ajuda que permita aos familiares passarem por este processo</p><p>sentindo que são acompanhados. Para além de se proporcionarem os cuidados</p><p>necessários à pessoa doente, os profissionais de cuidados paliativos devem</p><p>também direcionar os seus esforços aos familiares e/ou pessoas relacionadas,</p><p>com o objetivo de reforçar as suas capacidades e potencialidades, possibilitando</p><p>assim que a família recupere a confiança, tantas vezes perdida.</p><p>Esta confiança refere-se à tomada de consciência das suas próprias capa-</p><p>cidades (do doente/família) que irão permitir transitar por este período de vida</p><p>tão sobrecarregado de experiências agudas e assim para chegar à etapa da</p><p>morte da melhor maneira possível. Observar e analisar situações de pré-morte</p><p>e pré-luto, tanto na pessoa doente como na família, é, em si mesmo, um ele-</p><p>mento preventivo de grande riqueza para a equipa. O aparecimento dessas ma-</p><p>nifestações constitui o ponto de partida para trabalhar num processo gradual de</p><p>consciência, sobretudo se previamente se detectaram dificuldades na família.</p><p>Talvez a família, mesmo ainda com expectativas de cura em relação à pessoa</p><p>doente, não se encontre capacitada para lidar com esta situação ou, mesmo es-</p><p>tando consciente do que está a acontecer, mostre sentimentos de fúria e raiva</p><p>contra a sua própria família, contra a equipa, contra o sistema de saúde, entre</p><p>outros. Nos doentes terminais (e nas suas famílias), as raízes dessas indigna-</p><p>ções estão, com frequência, na frustração e nos comportamentos aparente-</p><p>mente estranhos ou contraditórios que devem ser compreendidos e acolhidos</p><p>pelos profissionais. Pode acontecer também que uma família adote um compor-</p><p>tamento dominado por mecanismos de defesa, por não ter podido realizar um</p><p>amadurecimento adequado e uma análise da realidade antes da iminência da</p><p>morte.</p><p>Quando isso acontece e perdura até ao falecimento da pessoa doente, é</p><p>muito provável que o apoio que a família esteja a dar ao doente, quer a nível</p><p>emocional quer a nível prático, não seja de todo favorável. Para além disso, po-</p><p>dem surgir temas relacionados como a culpa e aspectos práticos que possam</p><p>ter ficado pendentes ou não resolvidos (cuidado com os filhos, propriedades…).</p><p>23</p><p>Sem minimizar o impacto do sofrimento que os processos de morte naturalmente</p><p>comportam, seria importante ter em conta que a morte pode ser algo que pode</p><p>trazer algumas oportunidades. Alizade (1995) fala de “viver a morte” e faz refe-</p><p>rência a uma participação ativa da pessoa que está neste processo de morrer.</p><p>Para que tal seja permitido, devem cumprir-se três fatores facilitadores:</p><p>1. Que a equipa seja receptiva e tenha por objetivo permitir o crescimento do</p><p>doente e família;</p><p>2. Que a família integre o processo pelo qual está a passar e possa exercer a</p><p>sua função cuidadora com confiança;</p><p>3. Que a pessoa doente esteja em condições de realizar este auto processo.</p><p>A interação entre os níveis de comunicação paciente-família-equipa permi-</p><p>tirá construir, de maneira mais ou menos sólida, o espaço necessário para que</p><p>se instale a morte. Mas também podemos falar de formas de viver, quando se</p><p>faz referência a formas de morrer. Se se pensa na morte e se já se construíram</p><p>atitudes através de experiências de mortes alheias, quando esta chega à própria</p><p>família existem condições mais propícias para fazer frente às tarefas do cuidado</p><p>e aos aspectos práticos que esta fase comporta. Cada</p><p>elemento desta composi-</p><p>ção (doente-família-equipa) tem um papel a desempenhar neste processo de</p><p>doença. Os profissionais devem proporcionar o apoio à família a nível organiza-</p><p>tivo e educativo, com especial atenção aos aspectos que vão surgindo e desta</p><p>forma proporcionar o aumento do bem-estar da pessoa doente, da família e tam-</p><p>bém da própria equipa que se envolve neste ato humano e emotivo: o ato de</p><p>cuidar. Para além dos fatores mencionados anteriormente, de carácter intrapes-</p><p>soal, existem variáveis que afetam os membros do grupo e o grupo na sua tota-</p><p>lidade, e que se devem ter em conta ao planear uma intervenção profissional,</p><p>que são:</p><p> Idade da pessoa doente, sexo, estatuto e papel que ocupa na família/rede</p><p>de apoio familiar;</p><p>24</p><p> Fase do ciclo de vida em que se encontra a família.</p><p>Da interrelação desses dois fatores surge uma série de combinações cuja</p><p>análise oferece a possibilidade de sistematizar a informação (nem sempre ver-</p><p>bal) que se oferece à família. Os principais objetivos do apoio familiar são:</p><p>1. Facilitar o apoio na reorganização familiar mediante o aconselhamento</p><p>e a promoção do envolvimento de outros elementos familiares nos cuida-</p><p>dos da pessoa doente, dentro das suas possibilidades; esses elementos</p><p>deverão igualmente ser acompanhados no seu processo de adaptação e</p><p>no processo de restruturação de papéis dentro da coexistência;</p><p>2. Otimizar as potencialidades dos diferentes membros implicados, tra-</p><p>zendo aqueles elementos que irão permitir reforçar as capacidades e os</p><p>fatores protetores familiares, a fim de melhorar a sua intercomunicação,</p><p>oportunizando a resolução das suas necessidades;</p><p>3. Mediar situações de conflitos familiares face às dificuldades para tomar</p><p>decisões e facilitar os processos de negociação familiar em caso de ten-</p><p>sões relacionais, geradas pela situação de crise que estão a vivenciar;</p><p>4. Promover canais de comunicação aos problemas de comunicação inter-</p><p>familiares;</p><p>5. Apoiar os problemas relacionados com as dificuldades em expressar</p><p>sentimentos ou pensamentos que se queira transmitir a outros membros da</p><p>família ou em torno desta;</p><p>6. Aconselhar a comunicação com menores ou pessoas que apresentem</p><p>especial dificuldade para a compreensão daquilo que está a acontecer;</p><p>7. Intervir precocemente nas situações de risco de claudicação familiar;</p><p>8. Facilitar a conexão, a derivação e o reforço das redes de apoio social;</p><p>25</p><p>9. Prevenir situações de isolamento social ou solidão promovendo o envol-</p><p>vimento familiar adequado e, no caso de não existirem familiares, promover</p><p>o apoio do voluntariado;</p><p>10. Detectar situações de risco de luto complicado.</p><p>Para que a intervenção psicossocial seja adequada, é conveniente que o</p><p>trabalhador social realize uma avaliação diagnóstica da situação sócio familiar,</p><p>para alcançar um tratamento idôneo, com finalidades resolutivas e preventivas,</p><p>proporcionando capacidades de adaptação aos membros implicados, tanto para</p><p>desenvolver favoravelmente a capacidade de cuidar como para realizar posteri-</p><p>ormente um processo de luto saudável. O quadro de diagnóstico ou de avaliação</p><p>familiar é fundamental para um plano de trabalho possível e resolutivo. Os dados</p><p>que se obtêm no diagnóstico familiar não só resultam dos dados recolhidos pelo</p><p>trabalhador social, como também pelos dados recolhidos pelo demais membros</p><p>da equipa com intuito de complementar e contrastar informações. É da respon-</p><p>sabilidade do trabalhador social fazer a compilação dos dados recolhidos e sin-</p><p>tetizá-los, utilizando uma linguagem adequada e compreensiva para os demais</p><p>profissionais da equipa. No diagnóstico social, é muito importante destacar os</p><p>aspectos que facilitaram o processo de doença, bem como aqueles que possam</p><p>representar uma dificuldade para a evolução do mesmo.</p><p>Os instrumentos básicos para um bom acompanhamento psicossocial no</p><p>processo de doença avançada, são os seguintes:</p><p> Reforço das potencialidades para manter uma boa dinâmica familiar, re-</p><p>conhecendo aqueles elementos que permitem otimizar a intercomunicação,</p><p>as relações e a organização;</p><p> Promoção de atitudes e favorecimento de expressão de emoções e sen-</p><p>timentos;</p><p>26</p><p> Promoção da análise e compreensão das preocupações, medos, dúvidas,</p><p>dificuldades etc. que vão acontecendo ao longo do processo de doença e</p><p>posteriormente, no luto;</p><p> Nos casos em que haja situações de complexidade familiar não associa-</p><p>dos diretamente ao processo de doença, como as situações de dependên-</p><p>cia de outros membros da unidade de convivência, deve-se encaminhar a</p><p>situação para o serviço competente de modo a que esta seja atendida e</p><p>acompanhada.</p><p>4. O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO</p><p>Uma pessoa com uma doença terminal, sobretudo em estado avançado,</p><p>pode perder o controle sobre quase todos os aspectos da sua vida diária: o tra-</p><p>balho, as tarefas domésticas, a higiene pessoal, a mobilidade, a alimentação…</p><p>O funcionamento familiar poderá não ter condições de integrar corretamente to-</p><p>das estas alterações devido ao seu elevado grau de complexidade repentina.</p><p>Para além disso, os diferentes serviços de saúde, sociais, laborais, escolares</p><p>etc., que conhecem e tratam a família, nem sempre estão, por motivos diversos,</p><p>27</p><p>em condições de atender e assumir estas novas situações decorrentes da do-</p><p>ença. Neste contexto de perda de autonomia e nova condição social, a família e</p><p>a pessoa doente deveriam dispor de: informação, comunicação, controlo e auto-</p><p>nomia para a tomada de decisões. Apoiar as famílias requer, por parte das equi-</p><p>pas terapêuticas, a incorporação de uma filosofia de trabalho com os seguintes</p><p>pontos:</p><p> Proporcionar elementos materiais e atender às funções emocionais; para</p><p>oferecer apoio familiar é necessário conhecer o grau de disposição de to-</p><p>dos os elementos que englobam o grupo família;</p><p> Conhecer os mecanismos de defesa que podem ajudar ou prejudicar o</p><p>seu desenvolvimento posterior;</p><p> Compreender os fatores macrossociais; as mudanças sociais, tais como</p><p>a incorporação da mulher no mercado de trabalho, a instabilidade laboral</p><p>cada vez mais frequente, as migrações, etc. provocam dificuldades quando</p><p>é necessário levar a cabo a tarefa de cuidar de um elemento doente, inca-</p><p>pacitado ou dependente.</p><p>O apoio que a equipa deve oferecer deve ser compatível com as capacida-</p><p>des e potencialidades que a família possui, para que esta possa assimilá-lo. Al-</p><p>guns aspectos a ter com conta são: a informação, a educação e a autonomia.</p><p>A informação</p><p>Se a família e o doente apresentam grandes dificuldades em assumir todo</p><p>o peso consequente da doença e a equipa dá a informação muito precisa acerca</p><p>da sua evolução e prognóstico, não está a intervir de forma frutífera. As comuni-</p><p>cações neste caso não acontecerão devido ao facto de existirem níveis de cons-</p><p>ciência não coincidentes. Um exemplo extremo deste tipo de situações em como</p><p>não deve atuar uma equipa de saúde, é a que Callanan e Kelley (1993) nos</p><p>apresentam. Os autores referem que não é prudente dizer a uma pessoa que se</p><p>encontra no seu processo final de vida que deve fazer frente a essa realidade</p><p>28</p><p>(da morte), pois, na verdade, está confrontação pode tornar-se bastante agres-</p><p>siva para o paciente. Às vezes, e com intenção de ajudar a família, os profissio-</p><p>nais não respeitam os tempos de adaptação e precipitam processos que ainda</p><p>não estão preparados de se iniciarem. Este descuido, gera muito sofrimento, e</p><p>a família não só não é ajudada, como irá sentir-se questionada e atacada.</p><p>De igual forma, também pode haver casos excepcionais em que a pessoa</p><p>doente e a família decidam não querer sair do seu processo de negação; neste</p><p>caso, a equipa deverá avaliar e decidir se o benefício da informação superará o</p><p>custo emocional e as possíveis consequências. Promover ações que possam</p><p>romper o silêncio (quando o silencio é incapacitante e pouco facilitador) mediante</p><p>gestos, olhares, palavras e devolver às famílias o seu papel de protagonista na</p><p>resolução das suas próprias necessidades (com ajuda da equipa), pode resultar</p><p>que, de uma maneira eficaz, se recupere a confiança e o controlo. Um dos be-</p><p>nefícios e contribuições que a equipa oferece à família é o de esclarecer alguns</p><p>aspectos práticos; por exemplo, às vezes se desconhece que com uma grua</p><p>adaptável para a banheira pode-se solucionar o problema da higiene da pessoa</p><p>doente sem que a pessoa cuidadora se sinta sobrecarregada. Trata-se de pe-</p><p>quenas coisas que melhoram a autonomia e a qualidade de vida como: adapta-</p><p>ções no domicílio, informação sobre os recursos, prestações, serviços públicos</p><p>e privados, informação de gestões, entre outros.</p><p>A educação</p><p>As intervenções de carácter educativo e preventivo podem não ter um re-</p><p>sultado imediato, mas não será por isso que a equipa as deve suprimir. Associa-</p><p>se o conceito de cuidar ao método de atenção ou atos que são realizados com</p><p>pessoas doentes, pelas pessoas cuidadoras. Cada membro do grupo familiar</p><p>coloca no cuidado diferentes aspectos com finalidades distintas. Cuidar, mais</p><p>que um ato, é uma atitude, e esta, por sua vez, requer vários atos. Para Boff</p><p>(2003), o cuidado é intrínseco ao ser humano e faz parte dele, pois se assim não</p><p>fosse deixaria de ser humano, uma vez que: se o ser humano não receber cui-</p><p>dado desde que nasce até que morre desestrutura-se e perde o sentido. Alguns</p><p>estudiosos derivam a palavra cuidado do latim, cogitatu, que significa reflexão,</p><p>29</p><p>pensamento… Mas outros autores filósofos defendem que a palavra deriva de</p><p>cogitare, ou seja, pensar, colocar em atenção, mostrar interesse, revelar uma</p><p>atitude, uma preocupação. Assim sendo, cuidado significa atitude e ligação de</p><p>atenção para com o outro e para consigo mesmo (BOFF, 2003).</p><p>Este é o conceito de cuidado que pretendemos reconhecer em cuidados</p><p>paliativos e ter como referência: cuidar significa ter atitudes de cuidado, ou seja,</p><p>atenção pelo outro de forma a suprimir as suas necessidades. Esta é notoria-</p><p>mente uma das funções da rede de suporte do doente paliativo, como também</p><p>é função de uma equipa de cuidados paliativos. O modelo da atenção paliativa</p><p>considera o ato de cuidar como um ato que, para além do que foi mencionado e</p><p>das motivações, permite às pessoas aproximar-se do doente estabelecendo dis-</p><p>tintos laços ou vínculos em relação, como parte do processo de despedida. No</p><p>ato de cuidar estão implícitas motivações dos cuidadores, tais como: o senti-</p><p>mento de gratidão por apoios que anteriormente receberam da pessoa doente;</p><p>uma expressão de humanidade e solidariedade, por apreço e compaixão pela</p><p>pessoa doente; uma forma de obter reconhecimento pela pessoa que se cuida,</p><p>etc. Na medida em que se cria um vínculo entre o cuidador e o cuidado, entra-</p><p>se numa dinâmica espiral que permite trazer para a pessoa doente, ainda que</p><p>de forma simbólica, aqueles sentimentos de ternura que tanto podem beneficiar.</p><p>O fato de se poder prestar apoio valoriza os sentimentos do cuidador dando</p><p>uma paz interna que ajuda a estabilizar o seu estado emocional em benefício</p><p>concreto e depois da perda. Daí o facto de em CP se dar tanta importância em</p><p>implicar o outro no ato de cuidar, trabalhando capacidades e aumentando o nú-</p><p>mero de componentes familiares. Esta relação conjunta produz efeitos de cres-</p><p>cimento da autoestima de ambos: por se sentirem merecedores de atenção, e</p><p>os cuidadores por poderem observar as suas próprias capacidades que, porven-</p><p>tura, jamais suspeitariam ter. Implicar um maior número de elementos nos cui-</p><p>dados significa que todos podem beneficiar-se desta espiral de sentimentos.</p><p>Para isso, será necessário encontrar formas para que todos possam participar</p><p>de maneira direta ou indireta, repartindo ou compartilhando tarefas e responsa-</p><p>bilidades. Frequentemente acontece aos cuidadores e familiares que, quando</p><p>30</p><p>começam a cuidar do corpo de uma pessoa doente, expressam sérias dificulda-</p><p>des. Este receio pode estar condicionado por:</p><p> Se considerarem incompetentes e esperarem que a equipa expert as-</p><p>suma esta função, porque querem o melhor cuidado para o seu ente que-</p><p>rido;</p><p> Sentirem que poderiam provocar algum dano físico devido à sua inexpe-</p><p>riência;</p><p> Notarem que o doente não aprecia a sua dedicação;</p><p> Se sentirem censurados ou questionados pela equipa de cuidados ou ou-</p><p>tros familiares e cuidadores.</p><p>Alguns familiares não são capazes de explicar os seus receios e escon-</p><p>dem-se no facto de que é dever de uma equipa terapêutica cuidar desses as-</p><p>pectos. Este tipo de respostas ou outras similares devem ser entendidos como</p><p>mecanismo de defesa perante sentimentos de incapacidade. Os profissionais</p><p>devem estar atentos a essas situações como possíveis condicionantes na parti-</p><p>cipação dos cuidados, facilitando todo o tipo de informação com o objectivo de</p><p>transmitir segurança. As etapas a seguir seriam as seguintes:</p><p> Convidar os familiares a participarem nos cuidados, logo que o doente</p><p>fique no internamento;</p><p> Explicar os benefícios resultantes desta participação;</p><p> Dar a entender que o momento em que se prestam os cuidados são mo-</p><p>mentos de intimidade, o que, por sua vez, permite manter diálogos do tipo</p><p>informal, em que os sentimentos podem surgir de forma espontânea;</p><p> Repartir os cuidados para que se possam aprender distintas técnicas que</p><p>possivelmente irão diminuir o cansaço do cuidador;</p><p>31</p><p> Reconhecer os seus progressos e capacidades ao mesmo tempo que se</p><p>reconhecem dificuldades, minorando a importância das mesmas.</p><p>Existem situações claramente patológicas nas quais é mais difícil de inter-</p><p>vir. Seria o caso de algum tipo de fobia, obsessão ou quadro depressivo e que</p><p>requereria outro tipo de intervenções profissionais (psicoterapia, psiquiatria, en-</p><p>tre outros) ou pelo menos, uma consulta prévia com os mesmos.</p><p>A autonomia</p><p>Uma das causas que provoca atitudes de hostilidade ou ira e que dificultam</p><p>a comunicação é a impotência registada pela perda de autonomia. Se a família</p><p>tem dificuldades para responder a esta vicissitude ou não o faz de forma ade-</p><p>quada, a equipa deve facilitar o caminho para que a família tome decisões rela-</p><p>tivamente à repartição de tarefas. Nas palavras de Callaman e Kelley (1993), é</p><p>adequado que se respeitem a autonomia e a “vontade de controlar” que a pessoa</p><p>em final de vida muitas vezes transmite. A equipa deve por isso responder as-</p><p>sertivamente à frustração e não à ira. Trata-se das responsabilidades que a pes-</p><p>soa doente pode assumir, dentro das suas capacidades. Mesmo que sejam te-</p><p>mas que aparentemente têm pouca importância para ela, ao tratar-se de uma</p><p>pessoa altamente dependente ou em previsão de o ser, ser capaz de ter parcelas</p><p>de autonomia e encarregar-se de aspectos relacionados com a alimentação, as</p><p>visitas, disposições práticas de pagamento de faturas, etc. vai gerar-lhe um sen-</p><p>timento de pertença ao grupo, o que, também irá beneficiar a família, permitindo</p><p>a cerração de uma dinâmica de distensão e, quem sabe, de diálogo. Desta ma-</p><p>neira, e mediante estas adaptações, a família poderá melhorar paulatinamente</p><p>a sua comunicação. Para além da autonomia física, é necessário ter em conta a</p><p>capacidade mental em que a família se encontra para poder reorganizar e tomar</p><p>decisões.</p><p>Uma postura cômoda para os profissionais da equipe pode ser proporcio-</p><p>nar instruções de atuação familiar e incentivá-los a tomar decisões que conside-</p><p>ram mais idóneas. É importante ter em conta que, embora sem intenção malici-</p><p>osa, os profissionais normalmente aconselham o que beneficiaria mais a família,</p><p>32</p><p>mas não indicam o que seja mais adequado para a família. Porém, uma atitude</p><p>paternalista por parte da equipa irá condicionar a motivação e a implicação das</p><p>pessoas</p><p>e também as responsabilidades familiares poderão ficar diluídas. Em-</p><p>bora possa requerer um esforço adicional, a orientação que os profissionais de-</p><p>vem proporcionar face às circunstâncias deverão ser no sentido de promover a</p><p>capacidade de autonomia e responsabilidade na sua própria reorganização e</p><p>tomada de decisões.</p><p>Capacidades familiares</p><p>Quando observamos a família com capacidades e recursos próprios sufici-</p><p>entes, constatamos que poderão levar o processo de doença de uma forma sau-</p><p>dável, mitigando possíveis problemas de adaptação à perda. Em caso contrário,</p><p>a situação pode complicar-se de maneira a que se gere um grande sofrimento</p><p>emocional. Este facto, também repercutirá na equipe onde se prevê o apareci-</p><p>mentos de frustração e impotência. A capacidade é considerada como algo ín-</p><p>timo, sendo entendida como a qualidade necessária a uma pessoa para alcançar</p><p>um determinado fim. Do latim capacitate, é por definição o espaço interior de um</p><p>corpo vazio que pode ser ocupado; volume interior; possibilidade de fazer al-</p><p>guma coisa; aptidão legal para determinados atos; pessoa de grande mereci-</p><p>mento. Segundo Gordinho et al. (2000), a capacidade funcional é caracterizada</p><p>pela faculdade de habilidades físicas e mentais que permitem ao indivíduo viver</p><p>autonomamente, ou seja, podemos entender capacidade funcional como a faci-</p><p>lidade para desempenhar atividades de vida diária. Em cuidados paliativos, as</p><p>capacidades podem ser treinadas no âmbito físico, cognitivo, emocional e rela-</p><p>cional.</p><p>Quando falamos da entrada inesperada de uma doença incurável e pro-</p><p>gressiva numa família até então esperançada na cura, falamos de um momento</p><p>de crise no ciclo vital familiar, e a superação dos sentimentos menos bons e</p><p>constrangimentos que esta situação acarreta só é possível de resolver se houver</p><p>motivação para tal. Vamos ao encontro ao que Du Ranquet (1996) defende</p><p>quando associa o conceito de capacidade a conceitos de imprevisibilidade e</p><p>33</p><p>ameaça à integridade pessoal. O autor refere que os acontecimentos imprevisí-</p><p>veis geram crises individuais e grupais que ameaçam a integridade física e emo-</p><p>cional dos intervenientes, principalmente quando se trata de uma doença como</p><p>o cancro, que continua intimamente ligada ao conceito de morte. Assim sendo,</p><p>em nosso entender, a capacidade de reajustamento emocional pode estar mais</p><p>associada à experiência de crise ativado pela doença. A noção de capacidade</p><p>no contexto de doença é exposta por Du Ranquet (1996), como a disposição das</p><p>famílias para se unirem em busca da resolução dos problemas que daí advêm e</p><p>fazem-no reestruturando-se e adaptando-se à sua nova condição. Falamos de</p><p>capacidades familiares quando falamos de habilidades, potencialidades, sabe-</p><p>res, atitudes e outras competências a diversos níveis que, através de atos moti-</p><p>vados satisfazem necessidades.</p><p>Capacidades familiares para cuidar</p><p>A “dor” no doente paliativo surge ligada à insatisfação, ao facto “de não ter”:</p><p>não ter saúde, não ter apoio da família, não ter relações ou ter alteração destas,</p><p>não ter uma boa imagem física, entre outros. É aqui que a rede de suporte tem</p><p>um papel central na medida em que tem a missão muitas vezes árdua, de apoiar</p><p>o doente. Para isso, a família é dotada de capacidades que irão influenciar a</p><p>resolução de problemas específicos inerentes à doença, capacidades relativas</p><p>à sua estrutura e organização, capacidades relacionais e emocionais. Se tiver-</p><p>mos em conta inúmeros fatores sociais, económicos, laborais, culturais, internos,</p><p>entre outros, entendemos que estes irão contribuir para o sucesso e ou insu-</p><p>cesso de cuidar, o que, por sua vez, irá suscitar sentimentos positivos e negati-</p><p>vos nos cuidadores, respectivamente. Por exemplo, o internamento do doente,</p><p>quando se concretiza, suscita nos familiares cuidadores sentimentos ambíguos</p><p>na medida em que esta resposta institucional pode ser entendida como uma der-</p><p>rota (incapacidade de cuidar) ou ser vista como um alívio (descanso do cuida-</p><p>dor).</p><p>Para além disso, o internamento surge devido a alguma situação que cor-</p><p>reu menos bem no domicílio, o que vai refletir-se numa experiência negativa no</p><p>percurso vital familiar e, por tal, está família terá de ser precocemente trabalhada,</p><p>34</p><p>já que esse momento de crise vivenciado pode vir a ser um entrave à alta. A</p><p>“Escala de Capacidade de Cuidados em Domicilio” apresentada por Carmona</p><p>Sáez et al. (2005) é considerada pelos autores como um instrumento de trabalho</p><p>em cuidados paliativos domiciliários, com objetivo de quantificar de forma obje-</p><p>tiva e numérica, o potencial da família para assegurar cuidados ao doente onco-</p><p>lógico no seu meio. Através de um questionário dirigido ao cuidador principal,</p><p>onde se quantifica individualmente cada pergunta relativamente à dimensão dos</p><p>cuidadores, características do domicílio, situação econômica, assistência mé-</p><p>dica e apoio social, é possível traduzir num resultado numérico de 0 a 100 se o</p><p>cuidador tem capacidade de cuidar no domicílio. Em estudos realizados por Sa-</p><p>peta (1998) podemos ler que as famílias ainda preferem cuidar dos seus entes</p><p>queridos em casa e que, por sua vez, estes preferem ser cuidados pelos seus</p><p>familiares. Mas tal situação requer treino e preparação para que a exaustão fa-</p><p>miliar, tão conhecida no contexto da doença oncológica avançada, não aconteça</p><p>e seja prevenida.</p><p>A equipe terapêutica poderá intervir e trabalhar todas essas situações com</p><p>distintos protocolos, objetivados para diferentes fins. Novellas (2004) refere-nos</p><p>que se uma família é emocionalmente frágil mais dificuldade tem em se adaptar</p><p>ao processo de doença e, por isso, menos capacidade terá para cuidar. Este</p><p>processo não adaptativo pode trazer claro sofrimento ao elemento familiar que,</p><p>por muito que deseje, não consegue acompanhar o doente, colocando-o numa</p><p>situação de esgotamento emocional ou exaustão familiar. Ao invés de sentimen-</p><p>tos positivos, permanecem nesta família sentimento de culpa, revolta, incompre-</p><p>ensão e medo, entre outros, que desencadearão voluntária ou involuntaria-</p><p>mente, comportamentos de agressão ou isolamento. Segundo Méltzer (1989),</p><p>as capacidades emocionais básicas na família, para que esta se torne funcional,</p><p>são: capacidade de gerar amor, capacidade de promover a esperança, capaci-</p><p>dade de expressar sentimentos de uma forma ajustada e capacidade de refle-</p><p>xão.</p><p>35</p><p>De um estudo levado a cabo por Reigada, Gonçalves e Silva, que teve</p><p>como objetivo detectar capacidades que facilitam e/ou dificultam o cuidado a do-</p><p>entes oncológicos paliativos, emergiram quatro eixos que comportam fatores</p><p>(categorias) condicionantes à capacidade para cuidar:</p><p>1. Eixo da prática – quando a família consegue ter acesso a recursos prá-</p><p>ticos como ajudas técnicas e serviços de apoio domiciliário de higiene e</p><p>alimentação, bem como, acesso rápido ao internamento quando necessá-</p><p>rio para controlo de sintomas ou descanso do cuidador, aumenta a capaci-</p><p>dade da família para cuidar.</p><p>2. Eixo relacional – quando numa família se encontram presentes vínculos</p><p>afetivos e boa comunicação, principalmente no que respeita à partilha de</p><p>experiências, a capacidade para cuidar aumenta.</p><p>3. Eixo da experiência interna – possuir estratégias de coping e conseguir</p><p>manifestar sentimentos positivos, como o amor, a segurança e a espe-</p><p>rança, são indicadores de maior capacidade familiar para cuidar.</p><p>4. Eixo do estado de saúde – ter conhecimento acerca do estado de saúde</p><p>do doente, conhecendo as consequências da doença e o que fazer quando</p><p>se deparar com agravamento/descontrole de sintomas, capacita a família</p><p>para cuidar.</p><p>As necessidades que o mundo envolvente do doente apresenta devem ser</p><p>colmatadas visando ao seu conforto, à autonomia, aceitação e adaptação. Por</p><p>isso é importante apostar na qualidade das equipas interdisciplinares que fazem</p><p>parte da prestação de cuidados paliativos.</p>