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<p>PROGRAMA</p><p>DE EDUCAÇÃO</p><p>PERMANENTE</p><p>EM SAÚDE</p><p>DA FAMÍLIA</p><p>UNIDADE 2</p><p>Câncer de próstata</p><p>Abordagem do</p><p>câncer na Atenção</p><p>Primária à Saúde</p><p>Frederico Fernando Esteche</p><p>Marco Túlio Aguiar</p><p>2</p><p>Aula 2</p><p>NÃO ME TOQUE: Rastreamento,</p><p>diagnóstico precoce e seguimentos</p><p>pela APS</p><p>Prezados cursistas, a Unidade II irá dispor sobre o câncer de próstata. Temos ciência de que</p><p>é um tema que envolve alguns tabus e que, para desmistificá-lo, é preciso um conhecimento</p><p>aprofundado e, em paralelo, compreendermos o papel da saúde pública nesse contexto.</p><p>Na nossa situação-problema, a equipe da unidade estava organizando as atividades para</p><p>o Novembro azul. Uma das dificuldades era vencer o preconceito e trazer os homens para</p><p>realizar o toque retal. Como vamos ajudar a nossa equipe de APS a vencer esse preconceito?</p><p>Assim, convidamos você para leitura e reflexão crítica sobre o câncer de próstata, de forma</p><p>a reconhecer a importância desse tema e discuti-lo sempre com a sua equipe de saúde.</p><p>Vamos aprender sobre alguns elementos de interesse</p><p>epidemiológico?</p><p>O câncer de próstata é, no Brasil, o segundo mais incidente entre</p><p>os homens, ficando atrás apenas do câncer de pele não melanoma.</p><p>• 4° causa de morte por neoplasias.</p><p>• Taxa de mortalidade bruta com ritmo de crescimento acentuado.</p><p>• 50% dos homens acima dos 80 anos terão esta doença.</p><p>• 100% terão se chegarem aos 100 anos.</p><p>• É a segunda causa mais comum de morte por câncer entre os</p><p>homens no Brasil.</p><p>• 1% dos óbitos masculinos.</p><p>Fonte: INCA (2017).</p><p>3</p><p>É uma glândula presente nos homens, localizada na frente do reto, abaixo da bexiga, envol-</p><p>vendo a parte superior da uretra. A função da próstata é produzir um líquido que compõe</p><p>parte do sêmen, que nutre e protege os espermatozoides” (INCA, 2017, p. 5).</p><p>Ao toque, as próstatas “normais” têm tamanho de uma “noz” grande, regular, simétrica,</p><p>depressível, apresenta superfície lisa, consistência elástica (borracha), contornos precisos e</p><p>é discretamente móvel.</p><p>Agora que já recordamos um pouco sobre a glândula sobre a qual estamos falando, vamos</p><p>conversar sobre as controvérsias existentes acerca do tema. Quando falamos em controvér-</p><p>sias, sem sombra de dúvidas, o rastreamento é a principal delas.</p><p>Figura 1 – Localização da próstata</p><p>Recordar é viver</p><p>Vamos relembrar sobre a localização anatômica da próstata? Veja a figura a seguir.</p><p>4</p><p>Visite o Caderno nº 29 da Atenção Básica e entenda a diferença</p><p>entre rastreamento, detecção precoce, abordagem populacional</p><p>e outros conceitos. Acesse o link para obter mais informações:</p><p>http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderno_aten-</p><p>cao_primaria_29_rastreamento.pdf</p><p>Rastrear é preciso?</p><p>O número de autores que discorrem sobre fazer o rastreamento apenas em grupos selecio-</p><p>nados, com fatores de riscos sólidos, desaconselhando o rastreamento nos demais é cres-</p><p>cente (GUSSO; LOPES, 2012). Isso em razão do aumento de diagnóstico da patologia, sem a</p><p>esperada redução na mortalidade. Veja bem: estamos falando de rastreamento.</p><p>“Recomenda-se a não adoção do rastreamento de câncer da próstata em homens assin-</p><p>tomáticos com idade superior a 75 anos, uma vez que existe nível adequado de evidência</p><p>mostrando que essa estratégia é ineficaz e que os danos superam os benefícios” (BRASIL,</p><p>2010, p. 74).</p><p>É aqui onde reside o maior labor da APS no que diz respeito a essa patologia: detec-</p><p>tar precocemente sem o risco de incorrer a excessos de intervenções, minimizando a</p><p>possibilidade de iatrogenias1 , o que chamamos de Prevenção Quaternária.</p><p>Outro argumento para a mudança de paradigma sugerida é o fato de que os métodos dis-</p><p>poníveis de rastreamento carecem de especificidade e sensibilidade necessárias. E o que é</p><p>especificidade e sensibilidade?</p><p>Sensibilidade é a capacidade de detectar indivíduos com determinada doença, ou seja, é a</p><p>capacidade do exame de dizer se a pessoa está doente (BRASIL, 2010).</p><p>Especificidade é a “capacidade de excluir o diagnóstico nos casos dos não doentes”, ou seja,</p><p>é a capacidade do exame dizer se a pessoa não está doente (BRASIL, 2010, p. 24).</p><p>Esses conceitos da epidemiologia clínica nos ajudarão a entender melhor algumas informa-</p><p>ções mais adiante! Lembre-se bem delas!</p><p>1. “A iatrogenia consiste num dano, material ou psíquico, causado ao paciente pelo médico. Todo pro-</p><p>fissional possui um potencial iatrogênico, e tal aspecto depende não somente da capacidade técnica,</p><p>como também da relação médico-paciente estabelecida” (TAVARES, 2007, p. 180).</p><p>http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderno_atencao_primaria_29_rastreamento.pdf</p><p>http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderno_atencao_primaria_29_rastreamento.pdf</p><p>5</p><p>Detecção precoce</p><p>Quais estratégias para detecção precoce e diagnóstico do câncer de próstata são mais utili-</p><p>zadas? São elas: Toque Retal e PSA (da sigla em inglês: Antígeno Prostático específico).</p><p>O toque retal já foi a vedete entre as duas estratégias mencionadas, mas é essencialmente</p><p>dependente da experiência do examinador e, portanto, tem pouca sensibilidade, entretan-</p><p>to, se aliada ao PSA, teremos uma maior sensibilidade e especificidade.</p><p>Parece que o interno Felipe da situação problema deste módulo precisa aprimorar sua técni-</p><p>ca a respeito do tema. Ressaltando-se que ele está ali para isso, não é mesmo? Você recorda</p><p>o que ele propôs para a campanha do Novembro azul? Todos os homens que estão indo</p><p>para a unidade básica para a ação educativa iriam passar pelo toque retal, mas pode ser que</p><p>isso não seja necessário.</p><p>Agora que entendemos um pouco de rastreamento, vamos ver sobre detecção precoce e</p><p>diagnóstico precoce.</p><p>6</p><p>Figura 2 – Posição adequada: Lateral esquerda (Sims)</p><p>Técnica do toque retal: O exame pode ser realizado em alguma das posições a seguir.</p><p>7</p><p>Figura 4 – Posição de decúbito supino</p><p>Figura 3 – Posição genopeitoral</p><p>8</p><p>O que avaliar no toque retal?</p><p>• Tamanho.</p><p>• Consistência.</p><p>• Superfície.</p><p>• Contornos.</p><p>• Sulco Mediano.</p><p>• Mobilidade.</p><p>Ao toque retal, poderemos encontrar a glândula aumentada em tamanho, endurecida, com</p><p>ou sem presença de nódulos.</p><p>Sobre o PSA</p><p>Sobre este assunto, ainda pairam muitas dúvidas. Em 2005, um grande</p><p>estudo, que acompanhou aproximadamente 18 mil homens por sete anos,</p><p>demonstrou que o PSA não tem um ponto de corte que atenda simulta-</p><p>neamente a uma alta sensibilidade e especificidade para a monitorização</p><p>dos homens saudáveis, mas sim um contínuo de risco em todos os níveis</p><p>de PSA (WATSON, 2002).</p><p>O teste de PSA pode identificar o câncer de próstata localizado. Porém,</p><p>existem limitações que dificultam a sua utilização como marcador desse</p><p>câncer (WATSON, 2002).</p><p>Suas principais limitações são:</p><p>- PSA enquanto tecido-específico, mas não tumor-específico. Logo, outras</p><p>condições, como o aumento benigno da próstata, prostatite e infecções do</p><p>trato urinário inferior, podem elevar o nível de PSA.</p><p>- Cerca de 2/3 dos homens com PSA elevado não têm câncer de próstata</p><p>detectado na biópsia.</p><p>- Até 20% de todos os homens com câncer de próstata clinicamente signi-</p><p>ficativo têm PSA normal.</p><p>- O valor preditivo positivo do teste está em torno de 33%, o que significa que</p><p>67% dos homens com PSA positivo serão submetidos desnecessariamente</p><p>à biópsia para confirmação do diagnóstico.</p><p>- O teste de PSA leva à identificação de cânceres de próstata que não teriam</p><p>se tornado clinicamente evidentes durante a vida do paciente.</p><p>- O teste de PSA não vai, por si só, distinguir entre tumores agressivos que</p><p>estejam em fase inicial (e que se desenvolverão rapidamente) e aqueles</p><p>que não são agressivos.</p><p>(BRASIL, 2010).</p><p>9</p><p>A seguir, pontua-se o que outras associações científicas inter-</p><p>nacionais recomendam sobre o rastreamento de câncer de</p><p>próstata com PSA.</p><p>- Instituto Nacional de Câncer americano aponta que as evi-</p><p>dências são insuficientes para estabelecer se há diminuição na</p><p>mortalidade por câncer da próstata com o rastreamento pelo</p><p>toque retal ou dosagem do PSA.</p><p>- A American Cancer Society postula o rastreamento popula-</p><p>cional para o câncer da próstata pelo toque retal em conjunto</p><p>com a dosagem do PSA, com periodicidade anual, em homens</p><p>com idade igual ou superior a 50 anos.</p><p>- Recentemente, os dois maiores ensaios clínicos em andamento</p><p>sobre o rastreamento de câncer da próstata (European Study</p><p>of Screening for Prostate Cancer – ERSPC e o Prostate, Lung,</p><p>colorectal and Ovary – PLCO) divulgaram resultados parciais</p><p>conflitantes. No PLCO, após sete anos de acompanhamento,</p><p>observou-se aumento de 22% no índice de diagnósticos rea-</p><p>lizados, mas não houve redução da taxa de mortalidade por</p><p>câncer da próstata no grupo rastreado. Já os resultados do</p><p>ERSPC apontam redução de 20% na taxa de mortalidade por</p><p>câncer de próstata no grupo rastreado (redução de sete mortes</p><p>por esse câncer a cada 10.000 homens rastreados).</p><p>Sobre a situação problema apresentada no início do módulo, a Dra. Denise está bastante</p><p>atualizada, não acha? Ela falou para Carlos e Amélio que o rastreamento com o PSA já não é</p><p>tão recomendado como era antes.</p><p>Diante de tais evidências, a tomada de decisão a respeito da investigação deverá ser um</p><p>processo compartilhado entre o(a)médico(a) e a pessoa em questão. Para que se considere</p><p>compartilhada uma decisão, a pessoa deverá:</p><p>1- Compreender o risco da doença que se quer prevenir.</p><p>2- Conhecer a estratégia de prevenção, inclusive os riscos, benefícios e incertezas.</p><p>3- Reconhecer o valor da decisão tomada.</p><p>4- Envolver-se no processo decisório até o ponto desejado (GUSSO; LOPES, 2012).</p><p>Dessa forma, uma Comunicação Centrada na Pessoa é fundamental, visto que foca na</p><p>particularidade de cada indivíduo, possibilitando uma atenção mais direcionada para as</p><p>necessidades de cada um.</p><p>10</p><p>- Pesquisadores destacam que diferenças no ponto de corte</p><p>na dosagem do PSA, no desenho dos estudos e nas diferenças</p><p>raciais podem explicar os resultados distintos entre si.</p><p>- Em consonância com as evidências científicas disponíveis</p><p>e as recomendações da OMS, a organização de ações de ras-</p><p>treamento para o câncer da próstata não é recomendada.</p><p>- Homens que espontaneamente demandem a realização</p><p>do exame de rastreamento devem ser informados por seus</p><p>médicos sobre os riscos e benefícios associados a essa prática</p><p>e, posteriormente, definirem em conjunto com a equipe de</p><p>saúde pela realização ou não do rastreamento.</p><p>Fonte: Brasil (2010)</p><p>Quanta informação, não é mesmo?! Mas, assim, teremos mais elementos para ajudar</p><p>as pessoas a se tornarem protagonistas da própria saúde, com uma autonomia esclare-</p><p>cida, como bem colocou a Dra. Denise, na sua conversa com Amélio e Carlos na nossa</p><p>situação problema.</p><p>Diagnóstico precoce</p><p>Na área oncológica, o diagnóstico precoce é uma estratégia que possibilita terapias mais</p><p>simples e efetivas, ao contribuir para a redução do estágio de apresentação do câncer (WHO,</p><p>2007, p. 3). A detecção precoce pode salvar vidas, reduzir a morbidade e diminuir custos de</p><p>tratamento no sistema de saúde (BRASIL, 2010).</p><p>A população em geral e os profissionais de saúde precisam saber reconhecer os sinais de</p><p>alerta dos cânceres passíveis de melhor prognóstico se descobertos no início. Os principais</p><p>sinais e sintomas do câncer de próstata são: demora em iniciar e finalizar a micção, frequen-</p><p>te ato de urinar durante a noite (nictúria) (BRASIL, 2010).</p><p>Você conhecia esses sinais de alerta para o câncer de próstata? Que tal prestar mais atenção</p><p>neles na comunidade da unidade básica que você atua? Será que existem muitos homens</p><p>com esses sinais no seu território?</p><p>O câncer de próstata, como já informado anteriormente, na maioria das vezes, é assintomá-</p><p>tico, mas pode se expressar com sintomas de prostatismo.</p><p>11</p><p>Sintomas de armazenamento (anteriormente conhecidos como “irritativos”)</p><p>1. Frequência miccional aumentada.</p><p>2. Urgência.</p><p>3. Urge-incontinência (perda involuntária de urina).</p><p>4. Nictúria (eliminação de urina durante a noite) (OELKE, 2012).</p><p>Sintomas de esvaziamento (anteriormente conhecidos como “obstrutivos”)</p><p>5. Jato fraco.</p><p>6. Hesitância (demora para o início da micção).</p><p>7. Gotejamento terminal (urina continua após o jato principal em jatos ou golfadas).</p><p>8. Esvaziamento incompleto (sensação de que ainda há urina na bexiga) (OELKE,</p><p>2012).</p><p>PRÓSTATA NORMAL PRÓSTATA AUMENTADA</p><p>Bexiga</p><p>Urina</p><p>Urina</p><p>Uretra</p><p>Próstata</p><p>Próstata</p><p>Aumentada</p><p>Figura 5 – Próstata normal e próstata aumentada</p><p>12</p><p>Prognóstico e seguimento</p><p>O prognóstico é outro ponto de grande controvérsia. A análise prognóstica é utilizada em</p><p>pacientes com câncer de próstata localizado e obtida a partir da análise de três variantes: o</p><p>estadiamento, os níveis do antígeno prostático específico (PSA) e o escore de Gleason, que</p><p>já foi descrito como indicador mais informativo de desfecho no câncer de próstata (LÖBLER</p><p>et al., 2012).</p><p>Se, por um lado, há razoável evidência de que o tumor localizado e de baixo grau (escore</p><p>de Gleason menor que 4) não tem diferença na mortalidade com relação à população em</p><p>geral, por outro, sabe-se que uma maior escore de Gleason (entre 8 e 10), além de pessoas</p><p>de pele negra, velocidade de aumento de PSA superior a 2 ng/ml ao ano e intervalo curto de</p><p>duplicação na concentração do PSA são fatores de mau prognóstico. Um estudo evidenciou</p><p>que pessoas com Gleason menor que 7 têm chances muito pequenas de morrer em função</p><p>do câncer (LÖBLER et al., 2012).</p><p>Após a suspeita diagnóstica, a avaliação (referenciada pela APS) e as condutas adotadas</p><p>pelo especialista (urologista), a atribuição da equipe é o monitoramento da doença e o enco-</p><p>rajamento para que esse homem adote mudanças em seu estilo de vida que propiciem a</p><p>melhora na sua qualidade.</p><p>Para fins de monitoramento da doença, vimos que a velocidade de crescimento do PSA</p><p>pode ser um marcador prognóstico. Após prostatectomia radical, ou terapia antiandrogê-</p><p>nica, espera-se que o PSA fique suprimido e que valores maiores que 0,2 ng/ml devem ser</p><p>considerados como suspeitos também (GUSSO; CERATTI, 2012).</p><p>Finalizando</p><p>Nesta unidade, aprendemos mais sobre o câncer de próstata para desmistificar algumas</p><p>dúvidas e preconceitos. Você se sente mais preparado para o manejo do câncer de próstata</p><p>na APS agora? Pensando na reunião de planejamento da nossa situação problema, como</p><p>seria a campanha do Novembro azul na sua unidade de saúde?</p><p>Vamos continuar nossos estudos com o tema da campanha do Outubro Rosa: câncer de</p><p>mama.</p>