Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

<p>Editora CRV</p><p>Curitiba – Brasil</p><p>2021</p><p>Ana Paula Wilvert</p><p>Camilla Volpato Broering</p><p>(organizadoras)</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA:</p><p>reflexões e possibilidades de intervenção</p><p>Copyright © da Editora CRV Ltda.</p><p>Editor-chefe: Railson Moura</p><p>Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV</p><p>Imagem da Capa: Camilla Volpato Broering</p><p>Revisão: Analista de Escrita e Artes</p><p>2021</p><p>Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004</p><p>Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV</p><p>Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV</p><p>Tel.: (41) 3039-6418 - E-mail: sac@editoracrv.com.br</p><p>Conheça os nossos lançamentos: www.editoracrv.com.br</p><p>ESTA OBRA TAMBÉM ENCONTRA-SE DISPONÍVEL</p><p>EM FORMATO DIGITAL.</p><p>CONHEÇA E BAIXE NOSSO APLICATIVO!</p><p>DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)</p><p>CATALOGAÇÃO NA FONTE</p><p>Bibliotecária Responsável: Luzenira Alves dos Santos CRB9/1506</p><p>AT886</p><p>A Atuação da Psico-oncologia: refl exões e possibilidades de intervenção / Ana Paula Wilvert,</p><p>Camilla Volpato Broering (organizadoras) – Curitiba: CRV, 2021.</p><p>282 p.</p><p>Bibliografi a</p><p>ISBN Digital 978-65-251-1082-0</p><p>ISBN Físico 978-65-251-1081-3</p><p>DOI 10.24824/978652511081.3</p><p>1. Psicologia 2. Psicologia da saúde 3. Psicologia hospitalar 4. Oncologia I. Wilvert, Ana</p><p>Paula, org. II. Broering, Camilla Volpato, org. III. Título IV. Série.</p><p>CDU 616-006 CDD 150</p><p>616.99</p><p>Índice para catálogo sistemático</p><p>1. Psicologia hospitalar - 150</p><p>Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.</p><p>Comitê Científico:</p><p>Andrea Vieira Zanella (UFSC)</p><p>Christiane Carrijo Eckhardt Mouammar (UNESP)</p><p>Edna Lúcia Tinoco Ponciano (UERJ)</p><p>Edson Olivari de Castro (UNESP)</p><p>Érico Bruno Viana Campos (UNESP)</p><p>Fauston Negreiros (UFPI)</p><p>Francisco Nilton Gomes Oliveira (UFSM)</p><p>Helmuth Krüger (UCP)</p><p>Ilana Mountian (Manchester Metropolitan</p><p>University, MMU, Grã-Bretanha)</p><p>Jacqueline de Oliveira Moreira (PUC-SP)</p><p>João Ricardo Lebert Cozac (PUC-SP)</p><p>Marcelo Porto (UEG)</p><p>Marcia Alves Tassinari (USU)</p><p>Maria Alves de Toledo Bruns (FFCLRP)</p><p>Mariana Lopez Teixeira (UFSC)</p><p>Monilly Ramos Araujo Melo (UFCG)</p><p>Olga Ceciliato Mattioli (ASSIS/UNESP)</p><p>Regina Célia Faria Amaro Giora (MACKENZIE)</p><p>Virgínia Kastrup (UFRJ)</p><p>Conselho Editorial:</p><p>Aldira Guimarães Duarte Domínguez (UNB)</p><p>Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN)</p><p>Anselmo Alencar Colares (UFOPA)</p><p>Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ)</p><p>Carlos Alberto Vilar Estêvão (UMINHO – PT)</p><p>Carlos Federico Dominguez Avila (Unieuro)</p><p>Carmen Tereza Velanga (UNIR)</p><p>Celso Conti (UFSCar)</p><p>Cesar Gerónimo Tello (Univer .Nacional</p><p>Três de Febrero – Argentina)</p><p>Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG)</p><p>Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL)</p><p>Elizeu Clementino de Souza (UNEB)</p><p>Élsio José Corá (UFFS)</p><p>Fernando Antônio Gonçalves Alcoforado (IPB)</p><p>Francisco Carlos Duarte (PUC-PR)</p><p>Gloria Fariñas León (Universidade</p><p>de La Havana – Cuba)</p><p>Guillermo Arias Beatón (Universidade</p><p>de La Havana – Cuba)</p><p>Helmuth Krüger (UCP)</p><p>Jailson Alves dos Santos (UFRJ)</p><p>João Adalberto Campato Junior (UNESP)</p><p>Josania Portela (UFPI)</p><p>Leonel Severo Rocha (UNISINOS)</p><p>Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO)</p><p>Lourdes Helena da Silva (UFV)</p><p>Marcelo Paixão (UFRJ e UTexas – US)</p><p>Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar)</p><p>Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNOESC)</p><p>Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA)</p><p>Paulo Romualdo Hernandes (UNIFAL-MG)</p><p>Renato Francisco dos Santos Paula (UFG)</p><p>Rodrigo Pratte-Santos (UFES)</p><p>Sérgio Nunes de Jesus (IFRO)</p><p>Simone Rodrigues Pinto (UNB)</p><p>Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)</p><p>Sydione Santos (UEPG)</p><p>Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)</p><p>Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)</p><p>AGRADECIMENTOS</p><p>Agradeço em primeiro lugar aos pacientes que cruzaram o meu caminho</p><p>ao longo destes anos de jornada profissional, me ensinando a importância</p><p>da empatia, do cuidado e do amor. Agradeço também aos colegas de saúde</p><p>mental que toparam o convite em disseminar o seu conhecimento nesta obra,</p><p>primando pela responsabilidade ética e comprometimento com a nossa profis-</p><p>são. À Camilla Volpato Broering por abraçar a causa e juntas fazermos desta</p><p>obra um recurso utilitário aos demais colegas de profissão.</p><p>Ana Paula Wilvert</p><p>Quando se decide escrever um livro, sabe-se o quanto isso envolve</p><p>várias etapas, e pessoas sérias e competentes no que fazem. Tive a parceria de</p><p>pessoas incríveis que se dedicaram a escrever de forma única e responsável</p><p>sobre seus pacientes e suas formas de atuar.</p><p>Agradeço a todos aqueles que contribuíram com capítulos para esta obra,</p><p>pois além de confiarem na proposta, se empenharam no projeto. Agradeço a</p><p>Ana Paula Wilvert pelo convite em fazer parte deste desafio!</p><p>Também agradeço a todos os pacientes que num momento de dificuldade,</p><p>nos ensinam tanto, não só na nossa prática, como também, na nossa forma de</p><p>poder contribuir com o fazer do outro.</p><p>Dedico este livro a eles, que são nossa inspiração!</p><p>Camilla Volpato Broering</p><p>SUMÁRIO</p><p>APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... 11</p><p>PREFÁCIO ................................................................................................................13</p><p>Tânia Rudnicki</p><p>PRÓLOGO ................................................................................................................17</p><p>Maria Balbina de Magalhães</p><p>PARTE I</p><p>CAPÍTULO 1</p><p>AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE DE PACIENTES ONCOLÓGICOS .............21</p><p>Sueli Terezinha Bobato</p><p>Kátia Baltoré Floriani</p><p>CAPÍTULO 2</p><p>GESTALT-TERAPIA E ADOECIMENTO: a abordagem desenvolvida pela Dra.</p><p>Adriana Schnake para trabalhar com pacientes oncológicos.....................................41</p><p>Ana Carolina Seara</p><p>CAPÍTULO 3</p><p>O MULTIFATORIAL DO CÂNCER:</p><p>intervenções e desafios no tratamento psicológico ....................................................53</p><p>Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida</p><p>Rodrigo Serrão de Farias</p><p>CAPÍTULO 4</p><p>AS REPERCUSSÕES EMOCIONAIS DO CÂNCER ASSOCIADAS À</p><p>GRAVIDEZ: uma revisão integrativa .........................................................................75</p><p>Igor Weyber da Silva Ramos</p><p>Isabel Regiane Cardoso do Nascimento</p><p>Keyssiane Maria de Alencar Lima</p><p>CAPÍTULO 5</p><p>CUIDADOS PALIATIVOS: compreensão dos profissionais .....................................87</p><p>Marina Mesquita Geraldeli Carvalho Cavalcanti</p><p>CAPÍTULO 6</p><p>TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS EM PACIENTES ONCOLÓGICOS ...........107</p><p>Cleonice Zatti</p><p>Stefania Teche</p><p>Lúcia Helena Machado Freitas</p><p>CAPÍTULO 7</p><p>O LUTO ANTECIPATÓRIO ....................................................................................121</p><p>Paula Abaurre Leverone</p><p>CAPÍTULO 8</p><p>A ESPIRITUALIDADE E O CÂNCER: uma luz na escuridão ...............................131</p><p>Patrícia Pessatto da Silva</p><p>Maria Balbina de Magalhães</p><p>CAPÍTULO 9</p><p>MULHERES SOBREVIVENTES DE CÂNCER DE MAMA:</p><p>crescer a partir do sofrimento ...................................................................................145</p><p>Tânia Rudnicki</p><p>CAPÍTULO 10</p><p>ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO (COPING) DE DOENÇA EM</p><p>SITUAÇÃO DE TRATAMENTO HOSPITALAR .....................................................165</p><p>Grazielle Rocha França</p><p>CAPÍTULO 11</p><p>LUTO E PERDAS IMPLICADOS NO TRATAMENTO ONCOLÓGICO ...............183</p><p>Ana Paula Wilvert</p><p>CAPÍTULO 12</p><p>O FEMININO FRENTE AO CÂNCER DE MAMA .................................................191</p><p>Heloisa Canteri Langa</p><p>CAPÍTULO 13</p><p>RECURSOS LÚDICOS E O CÂNCER INFANTIL ................................................199</p><p>Camilla Volpato Broering</p><p>CAPÍTULO 14</p><p>PSICOLOGIA PEDIÁTRICA E ONCOLOGIA: intervenções</p><p>da terapia cognitiva .................................................................................................... 217</p><p>Marisa B. L. Marantes Sanchez</p><p>PARTE II</p><p>CAPÍTULO 15</p><p>O PACIENTE IDOSO ONCOLÓGICO E A COVID-19 ..........................................233</p><p>Camilla Volpato Broering</p><p>Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida</p><p>Vanessa Schmitz Bulcão</p><p>CAPÍTULO 16</p><p>CÂNCER NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19:</p><p>Repercussões Psicológicas e Implicações Práticas.................................................253</p><p>Daniela Barsotti Santos</p><p>Beatriz Schmidt</p><p>Débora</p><p>apenas o objetivo de citar elementos desencadeadores de estresse, conhecido</p><p>e temido vilão da modernidade, mas também serve para entender o que mais</p><p>a frente vamos tratar, a saber, as características do comportamento de uma</p><p>célula neoplásica.</p><p>Desafios do Trabalho Clínico com Adoecimento</p><p>Trabalhar com adoecimento na Gestalt-Terapia é uma tarefa desafiadora</p><p>e, ao mesmo tempo, encantadora, já que essa abordagem oferece recursos</p><p>terapêuticos incríveis que propiciam aberturas para ressignificações e verda-</p><p>deiras mudanças de (na) vida nas (das) pessoas. A Gestalt-Terapia é uma teoria</p><p>de base fenomenológica, que enfoca a descrição dos fenômenos e não está</p><p>42</p><p>preocupada com a interpretação, pois não está embasada em uma perspectiva</p><p>de causa-efeito. A Gestalt se baseia no aqui-agora do que acontece na sessão,</p><p>entendendo que, no presente, está contido nosso passado (como retenção das</p><p>vivências que experimentamos) e nossas perspectivas de futuro (como as</p><p>possibilidades que se abrem a cada nova vivência), mas de forma virtual. O</p><p>entendimento dessa abordagem sobre o conceito de saúde não acontece de</p><p>forma dissociada. Saúde e doença fazem parte do mesmo continuum, poderiam</p><p>ser descritas como polaridades da mesma questão.</p><p>Ao me referir ao meu estado físico, só posso dizer que estou saudável</p><p>porque identifico a ausência de doenças e o contrário também é verdadeiro,</p><p>o adoecimento é identificado pela ausência de saúde. No entanto, nossa per-</p><p>cepção poderia ser mais precisa se pudéssemos perceber que ora estamos</p><p>mais saudáveis (quando não estamos identificando sintomas físicos descon-</p><p>fortáveis), ora um pouco mais adoecidos (quando percebemos a ausência de</p><p>um bem estar); e que essas polaridades vão oscilar para mais ou menos ao</p><p>longo de nossa vida. Como a Gestalt-Terapia não faz separação entre mente e</p><p>corpo, já que a mente (entendida aqui como a área do corpo responsável pela</p><p>capacidade de refletir e raciocinar) faz parte do corpo, o desequilíbrio na pola-</p><p>ridade saúde-doença nos diz que algo está acontecendo com este ser humano,</p><p>que invariavelmente tem relação com a forma como lida com seu entorno, ou</p><p>seja, na repetição de hábitos ou na criação de novas formas para lidar com as</p><p>demandas. E é o comprometimento no seu desenvolvimento e crescimento</p><p>pessoal que pode indicar um desequilíbrio que resulte em sintomas.</p><p>O recorte que será desenvolvido neste capítulo diz respeito ao desenvol-</p><p>vimento teórico-prático de uma autora da Gestalt-Terapia que trabalha com</p><p>adoecimento, em específico, na questão central desta obra, com pacientes</p><p>oncológicos. A escolha por trazer esta autora e o trabalho que desenvolveu</p><p>ao longo de sua vida profissional se deu pelo fato de que ela não apenas dis-</p><p>cute um modelo teórico de trabalho, como mostra e desenvolve uma forma</p><p>específica de trabalho, ou seja, um recurso terapêutico para psicoterapeutas</p><p>aplicarem em seu cotidiano clínico. Com seis livros publicados (nenhum deles</p><p>traduzido para o português), a doutora Adriana Schnake é Médica Psiquiatra e</p><p>Gestalt-Terapeuta e natural do Chile. Em suas obras, relata o desenvolvimento</p><p>dos seus estudos em Gestalt-Terapia até a criação do “Enfoque Holístico da</p><p>Saúde e da Doença”, assim como traz relatos de inúmeros casos clínicos, das</p><p>experiências nos grupos terapêuticos e nos cursos de aprofundamento nesta</p><p>metodologia. Ao longo de sua carreira, esteve em vários centros de Gestalt-</p><p>-Terapia da América Latina, difundindo esta forma de trabalho e na década</p><p>de noventa se dedicou à criação de um centro de ensino e práticas clínicas</p><p>localizado no sul do Chile, na ilha de Chiloé, o Centro Anchimalén. Neste</p><p>centro, manteve-se à frente das aulas do diplomado (curso de especialização</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 43</p><p>com duração de 280 horas presenciais) e na coordenação dos grupos tera-</p><p>pêuticos até próximo aos seus 90 anos. Atualmente, reside em Santiago e</p><p>colabora com o centro de Gestalt de Santiago, centro que fundou em 1995 e</p><p>que é coordenado por uma de suas filhas, Psicóloga Marina Varas Schnake,</p><p>e seu genro, também Psicólogo, Alberto Martínez Ribes.</p><p>Adriana Schnake é presidente Honorária da Associación Gestaltica de</p><p>Buenos Aires y de Córdoba, membro honorário da Associación Española de</p><p>Terapia Gestática e é conhecida no mundo de língua espanhola como uma das</p><p>figuras mais relevantes da Psicoterapia Gestáltica. Seu enfoque da Saúde e da</p><p>Doença se revelou um aporte inovador e criativo tanto dentro da comunidade</p><p>gestáltica, quanto na contribuição para a medicina atual1. A proposta de trabalho</p><p>que desenvolveu é revolucionária por ter como meta devolver a cada indivíduo</p><p>seu poder de ação e de responsabilização pelo seu próprio corpo. Esse traba-</p><p>lho visa, antes de tudo, auxiliar no processo de restabelecimento da saúde por</p><p>meio do entendimento da mensagem contida na experiência de adoecimento</p><p>de cada pessoa.</p><p>Gestalt-Terapia e Autorregulação Organísmica</p><p>Em Gestalt-Terapia, quando se trabalha com a clínica da Neurose, em</p><p>que, na fronteira de contato, a função de ego está vulnerável, impedida de</p><p>atuar, vemos a repetição de hábitos que não permitem a assimilação da vivên-</p><p>cia, assim como impedem sua ampliação na direção de novas experiências de</p><p>contato, em consequência de um hábito inibitório que retornou do horizonte</p><p>de passado (a inibição reprimida). (MULLER-GRANZOTTO e MULLER-</p><p>-GRANZOTTO, 2007). A Neurose foi um ajustamento amplamente discutido</p><p>por Fritz Perls, como era mais conhecido, o então médico de origem alemã,</p><p>formado em Berlim. Frederick Solomon Perls (1893-1970) tinha formação</p><p>psicanalítica, foi dissidente de Freud (Psicanálise), e fundador e criador da</p><p>Gestalt-Terapia (1951), alguns anos após seu rompimento com Freud e com</p><p>a Psicanálise. Entre as formas de manejo clínico para os ajustamentos neu-</p><p>róticos, desenvolvidas pela Gestalt-Terapia, estão: a pontuação da forma,</p><p>frustração habilidosa e utilização de experimento clínico.</p><p>Para Perls (1977), o trabalho da Gestalt-Terapia é promover o processo</p><p>de crescimento e desenvolver o potencial humano que, segundo ele, é um</p><p>processo demorado. Um dos grandes entraves à fluidez é a ansiedade, que</p><p>seria “o vácuo entre o agora e o depois. Se você estiver no agora não pode</p><p>estar ansioso, porque a excitação flui imediatamente em atividade espontânea”</p><p>(p. 15). Outro conceito importante trazido pelo autor é o de “organismo”, que</p><p>1 Informações coletadas no site do Centro de Gestalt de Santiago em dezembro de 2019. www.gestalt.cl</p><p>44</p><p>seria descrito como qualquer ser vivo que possua órgãos, tenha organização e</p><p>se autorregule, lembrando que todo organismo precisa do ambiente para trocas</p><p>essenciais (respiração, nutrição, relações pessoais). É importante lembrar que o</p><p>organismo trabalha como um todo e não como um somatório de partes. Nesse</p><p>sentido, não somos um somatório de órgãos, somos um todo coordenado; não</p><p>temos um coração, fígado, pulmões, somos fígado, coração, pulmões. “Saúde</p><p>é um equilíbrio apropriado de tudo aquilo que somos” (p. 20)</p><p>A partir dessas definições, entra outro conceito fundamental na Gestalt-</p><p>-Terapia, a autorregulação organísmica. A auto-regulação precisa ser distin-</p><p>guida da regulação externa. A primeira pode deixar o organismo dirigir sem</p><p>interferência, confiando na sabedoria do organismo. “A tomada de consciência</p><p>em si - e de si mesmo - pode ter efeito de cura” (p. 34). Já a regulação externa</p><p>se refere à patologia da auto-manipulação, do controle ambiental que atrapalha</p><p>o sutil auto-controle organísmico; nossa auto-manipulação que costumamos</p><p>chamar de “consciência” (Perls, 1977).</p><p>Diálogos com o Corpo</p><p>O Enfoque Holístico da Saúde e da Doença, desenvolvido pela Dra.</p><p>Adriana Schnake, a Nana, como é conhecida por seus pacientes, alunos e</p><p>pessoas mais próximas, pretende devolver um olhar integrado para a saúde,</p><p>tem caráter educativo, pois trabalha com informações sobre o funcionamento</p><p>do nosso próprio corpo como um organismo vivo, inteiro, integrado,</p><p>sobre</p><p>o funcionamento e interrrelação entre tudo o que somos (órgãos, sistemas) e</p><p>não se baseia em divisões, diferenciando-se dos enfoques casualistas, duais,</p><p>baseados em causa e efeito (mente versus corpo; saúde versus doença etc.).</p><p>Não se trata de uma medicina “alternativa”, mas de um caminho com base na</p><p>descrição da nossa fisiologia e anatomia e nos conceitos gestálticos que tem</p><p>como tarefa norteadora tirar dos sintomas e doenças o caráter de “inimigos”.</p><p>Esta é a grande mudança que se pretende com este método de intervenção:</p><p>mostrar para aqueles que buscam os terapeutas no processo de um adoeci-</p><p>mento que, além dos sintomas não serem seus inimigos, estão presentes em</p><p>nosso organismo para nos dar uma mensagem, para nos conectarmos com</p><p>aspectos essenciais do que significa ser humano (Schnake, 2007).</p><p>Adriana Schnake (2007), em seu último livro sobre o EHSD (Enfoque</p><p>Holístico da Saúde e da Doença), “Enfemedad Síntoma e caracter: diálogos</p><p>gestálticos con el cuerpo”, elenca os postulados básicos com os quais o</p><p>Enfoque trabalha:</p><p>“(1) devolver à pessoa sua característica de ser humano, olhando-a em sua</p><p>totalidade; (2) entregar ao ser-humano os conhecimentos que vieram consigo</p><p>mesmo para que reconheça sua própria estrutura e capacidade de cura; (3)</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 45</p><p>entender a doença como um ato de DETENÇÃO total, que permite chegar a uma</p><p>realidade diferente; (4) entender que cuidar da saúde não é lutar contra nada, nem</p><p>contra as doenças, é conhecer o que somos e aceitar limites e possibilidades; (5)</p><p>por fim, colaborar na tarefa de deter o ser humano na escalada de onipotência</p><p>e autossuficiência em que se encontra empenhado” (Schnake, 2007, p. 22)2.</p><p>Segundo esta autora, quando uma pessoa busca ajuda em função de um</p><p>adoecimento localizado em um órgão específico e que já foi identificado e</p><p>diagnosticado como responsável pela suposta doença, está diante de uma divi-</p><p>são nítida: um é o paciente e o outro é o adoecimento que o “ataca”. Então, a</p><p>primeira tarefa do terapeuta é a restituição da integridade do olhar e vivência</p><p>desse organismo, desse corpo. Ou seja, que a pessoa possa se dar conta de</p><p>que esse órgão de que ela “se queixa” é uma parte inseparável de si mesma.</p><p>O trabalho desenvolvido no EHSD é bem específico e exige uma forma-</p><p>ção nesta metodologia de trabalho. Para isso, é necessário que o terapeuta não</p><p>o utilize apenas como uma técnica descolada de seu sentido mais global, pois</p><p>assim faria o que Perls, ao longo de sua vida, criticou nos Gestalt-Terapeutas</p><p>sem aprofundamento teórico e técnico (aqueles que assistiam um ou dois</p><p>workshops que ele promovia e depois saiam replicando seus experimentos,</p><p>sem entender o cerne do que estavam fazendo) que se constituía, no final</p><p>das contas, num trabalho de charlatão, e foi responsável pela má-fama que</p><p>a Gestalt recebeu durante certo tempo. Mas, para que se possa compreender</p><p>basicamente como é feito o trabalho neste Enfoque, farei uma breve descri-</p><p>ção. O primeiro passo é conhecer a demanda do adoecimento; em seguida,</p><p>explicar no que se baseia o trabalho que será desenvolvido e como ele vai</p><p>acontecer, fornecendo dados para que a pessoa possa compreender a dinâ-</p><p>mica do que vai ser proposto; depois, pede-se uma descrição pormenorizada</p><p>sobre o adoecimento e convidamos o paciente para o trabalho. Caso não haja</p><p>nenhuma resistência, inicia-se o experimento, que consiste em localizar no</p><p>espaço três lugares distintos: em um, fica o terapeuta, em outro, o paciente e,</p><p>no terceiro, o órgão (onde está localizado o adoecimento).</p><p>O trabalho do terapeuta é mediar esta conversa a partir do conhecimento</p><p>apurado sobre o órgão a ser trabalhado para que, no momento adequado, possa</p><p>intervir trazendo as características anatômicas e fisiológicas correspondentes</p><p>ao órgão. O terapeuta também está atento à forma como o paciente se mostra</p><p>na condução do diálogo (ou seja, a entonação da voz, movimentos corporais,</p><p>expressões faciais, silêncios etc.); e também é ele que faz a troca de lugares</p><p>durante o processo. É importante lembrar que não há uma interpretação do sen-</p><p>tido, mas sim um exercício no aqui e agora da sessão que pretende fazer com</p><p>que a pessoa possa se apropriar dos conflitos que tem com as características</p><p>2 Traduzido pela autora.</p><p>46</p><p>daquele órgão, das suas identificações com essas características e da percepção</p><p>(que muitas vezes ocorre) de características ou polaridades negadas ou difí-</p><p>ceis de reconhecer em si mesmo que faz com que esse órgão seja rechaçado e</p><p>visto como menos importante do que os demais. Há um conflito, e o diálogo</p><p>com o órgão tem por objetivo evidenciá-lo e promover uma compreensão</p><p>da mensagem que o órgão quer passar para o paciente. Muitas vezes, esse</p><p>processo não se finaliza em apenas uma sessão, é comum que continue por</p><p>mais sessões, ainda mais quando se trata de um adoecimento que ameaça a</p><p>vida, como, por exemplo, no câncer. Nesses casos, algumas vezes é necessário</p><p>dar continuidade ao trabalho em outros encontros para possibilitar diálogos</p><p>clínicos, envolvendo também outros sistemas relacionados ao adoecimento</p><p>em questão, como sistema imunológico, células neoplásicas etc.</p><p>Em vista disso, este trabalho parte de uma visão do adoecimento como</p><p>forma de entender algo que o corpo está revelando, sobre um conflito que nosso</p><p>organismo está tentando equacionar, a mensagem que o órgão traria seria o</p><p>modo de compreender o que precisa ser ajustado. Ou seja, que se permita que</p><p>o corpo possa fazer sua auto-regulação, sem que imponhamos nossa vontade</p><p>sobre ele, querendo que funcione deste ou daquele modo. Mas, para chegar</p><p>nisso, precisamos do auxílio de um profissional e, ainda mais importante, que</p><p>estejamos dispostos a entender nossos equívocos. É preciso uma postura de</p><p>abertura e confiança em relação ao que nosso corpo irá nos revelar, entendendo</p><p>o conceito, explanado por Perls, de que a confiança é diametralmente oposta ao</p><p>controle, e é nossa necessidade de controle que nos faz duvidar e não confiar.</p><p>EHSD e o Trabalho com Pacientes Oncológicos</p><p>Desde seu primeiro livro, Adriana Schnake se interessou pelo trabalho</p><p>com pacientes em tratamento oncológico, talvez pela demanda que chegava</p><p>aos grupos de trabalho clínico ou ao seu consultório. Talvez também, como</p><p>ela mesma sinalizou em alguns pontos das suas cinco obras que tratam do</p><p>Enfoque, porque, atualmente, no mundo ocidental, temos valorizado carac-</p><p>terísticas como: onipotência, autossuficiência, competitividade, rivalidade,</p><p>dentre outras que nos colocam em risco, pois, ao analisarmos as características</p><p>das células neoplásicas, identificamos que essas descrições também estão entre</p><p>as principais características dessas células.</p><p>No livro, Enfermedad síntoma e caracter, esta autora cria um formato de</p><p>“fichas anátomo-fisiológicas”, tendo como finalidade auxiliar os profissionais</p><p>no trabalho de descrição das características e funcionamento dos órgãos. Essas</p><p>fichas foram preparadas por uma junta profissional (psicólogos, muitos médi-</p><p>cos, e profissionais da saúde) a fim de desenvolver um estudo aprofundado</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 47</p><p>e fidedigno das características encontradas nos órgãos e sistemas que seriam</p><p>trabalhados no Enfoque. Como exemplo, podemos ver a descrição das carac-</p><p>terísticas da célula neoplásica:</p><p>Células neoplásicas são: invasivas, destrutivas, desobedientes ao seu ciclo</p><p>vital (diferente de outras células, não morrem, nem envelhecem); rebeldes, capri-</p><p>chosas; moldáveis e rápidas; astutas; controladoras (manejam o entorno conforme</p><p>sua conveniência), devastadoras (destrutivas); combativas; cínicas; onipotentes</p><p>(acreditam que podem tudo, não aceitam limites, são como adolescentes, se mul-</p><p>tiplicam e se mantêm jovens; são manipuladoras e vingativas). (Schnake, 2007)</p><p>Adriana Schnake (2008) acreditava existir uma relação entre câncer e</p><p>depressão e assinalava que ambos possuem uma característica marcante:</p><p>a oni-</p><p>potência. Nos pacientes deprimidos, há uma alteração na percepção do tempo</p><p>vivido, um bloqueio relativo ao tempo futuro e possuem muita dificuldade de</p><p>perceber uma saída para seu estado. A relação com o entorno perde o signifi-</p><p>cado, é como se tudo fosse perdendo sentido, as coisas fossem se desfazendo</p><p>e tendendo ao caos. No paciente oncológico, uma parte do organismo se com-</p><p>porta desta mesma maneira, as células neoplásicas invadem e tomam o lugar</p><p>de células específicas, tendendo ao caos e à desorganização (Schnake, 2008) .</p><p>Segundo Schnake (1995), nesse experimento proposto pelo Enfoque,</p><p>quando se faz o encontro entre a pessoa e o suposto câncer, é muito comum</p><p>aparecerem diálogos tremendamente violentos e destrutivos. Muito similar</p><p>ao que acontece quando alguém que tem depressão grave se encontra com</p><p>seu lado “todo-poderoso” (em algum exercício clínico proposto pelo psicote-</p><p>rapeuta): esses diálogos costumam ser de uma agressividade e violência que</p><p>não se permitiria, nem com seu maior inimigo. E essa semelhança também</p><p>fica evidente ao perceber que câncer e depressão são duas doenças cada vez</p><p>mais graves e respeitáveis (e eu acrescentaria, cada vez mais comuns), já que</p><p>são formas de adoecimento que geram compaixão.</p><p>Um aspecto que Adriana Schnake trata e busca lembrar e relembrar</p><p>durante toda a sua obra é que não se deve lutar contra a doença, não se deveria</p><p>encará-la como um inimigo, afinal “quem escuta conselhos de um inimigo?” A</p><p>meu ver este é um aspecto central em suas obras, no que se refere ao trabalho</p><p>com pacientes oncológicos, já que a postura mais amplamente difundida por</p><p>grande parte dos profissionais da saúde é a de estimular um movimento de</p><p>resgate da força do sujeito para lutar contra a doença, na busca por vencer o</p><p>inimigo se apostam todas as “fichas”, inclusive com a necessidade de mutila-</p><p>ção e tratamentos extremamente agressivos. Não se trata aqui de contrariar as</p><p>recomendações médicas relativas ao encaminhamento do tratamento e reabi-</p><p>litação, mas de agregar algum sentido a esta experiência. No ensino formal,</p><p>como na vida, as lições realmente aprendidas não precisam ser repetidas e, ao</p><p>mudar o modo de enfrentamento da situação por parte daquele que adoece,</p><p>48</p><p>aquilo que está vivenciando ganha outra dimensão. Nesse sentido, também é</p><p>possível trabalhar com percepções equivocadas em que o paciente acha que</p><p>está “sendo punido” por algo que teria feito de errado; ou quando acredita que</p><p>é vítima e, nesse caso, não aciona sua energia vital para lidar com o conflito</p><p>que está vivendo. Afinal, se o adoecimento puder me ensinar algo sobre minha</p><p>forma de estar no mundo e fazer com que eu entenda o que se passa comigo,</p><p>uma vez que de forma habitual ou “inconsciente” não consigo perceber, por</p><p>que não experimentar?</p><p>São inúmeros os relatos de casos de pacientes oncológicos trazidos pela</p><p>autora. Trabalhos com órgãos adoecidos pelo câncer, já que é muito comum,</p><p>quando se identifica o primeiro órgão afetado, que exista um conflito claro</p><p>com as características e funções desse órgão. Outros trabalhos são realizados</p><p>com a célula neoplásica, visto que as características dessa célula evidenciam</p><p>uma forma de ser “anti-humana”, pois somos finitos, mortais, temos limites</p><p>claros, precisamos uns dos outros, somos seres dependentes desde que nas-</p><p>cemos, dentre outras características, que precisam ser evidenciadas, pois a</p><p>onipotência e demais características dessa célula ameaçam a organização</p><p>social da qual fazemos parte enquanto seres humanos. A célula oncológica,</p><p>se não for parada, cresce até acabar com sua possibilidade de sobrevivência,</p><p>pois extermina o seu “hospedeiro” (surpreende perceber que o comportamento</p><p>humano, muitas vezes, é muito semelhante).</p><p>Também são desenvolvidos trabalhos com o sistema imunológico, dado</p><p>que foi através de um descuido desse sistema que o câncer pôde se fixar e</p><p>desenvolver-se em um corpo-humano. Como se sabe, nosso sistema imu-</p><p>nológico está diariamente identificando células com potencial risco para o</p><p>organismo e as elimina sem problema algum, uma vez que essa tarefa faz parte</p><p>de uma de suas funções. Quando esse sistema falha, há uma mensagem que</p><p>precisa ser compreendida. Algumas vezes para auxiliar o paciente com câncer</p><p>a entender todas as mensagens implicadas no seu adoecimento é importante</p><p>realizar essas três possibilidades de trabalho clínico: (1) com o órgão afetado,</p><p>(2) com a célula neoplásica e (3) com o sistema imunológico.</p><p>Diferente de outras formas de trabalho psicológico e entendimento rela-</p><p>tivos ao adoecimento somático, o EHSD não pretende correlacionar um adoe-</p><p>cimento específico com uma característica de personalidade, já que se baseia</p><p>em uma postura fenomenológica e descritiva. Assim, seu formato permite que</p><p>o paciente possa perceber as identificações com determinada característica</p><p>relativas às funções que determinado órgão desempenha (o terapeuta, neste</p><p>caso, apenas conduz o processo).</p><p>Ilustrando esse processo, talvez nos surpreenderíamos ao perceber que</p><p>conhecemos muito pouco a respeito do nosso organismo, poderíamos exempli-</p><p>ficar com um órgão de vital importância para nossa saúde, o Intestino Grosso.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 49</p><p>A grande maioria de nós tem uma vaga ideia de onde ele se localiza e sente</p><p>seus efeitos já que ele é a parte final do intestino, antes do ânus. Geralmente</p><p>as pessoas sentem um pouco de asco ao se referir ao intestino, ignorando sua</p><p>extrema importância no processo digestivo para nosso bem estar geral. E por</p><p>esta razão é muito comum não conhecermos todo seu potencial de lidar com</p><p>os dejetos (restos não assimilados dos alimentos que ingerimos) e fazer sua</p><p>parte no trabalho de eliminação, sem questionar, apenas cumprindo sua fun-</p><p>ção. Podemos conhecê-lo um pouco mais em parte da descrição personalizada</p><p>desenvolvida na sistematização contida nas fichas de cada órgão: “Sou um</p><p>tubo flexível, grosso, tenho movimentos, um ritmo próprio e estou aqui para</p><p>receber todos os dejetos e tudo o que o intestino delgado (que é muito maior</p><p>do que eu) não absorveu. Eu não questiono o que me chega, recebo tudo e</p><p>começo a separar, já que minha principal função é absorver a grande quantidade</p><p>de líquidos que me chega. [...] Características de personalidade: eliminador,</p><p>limpador, desintoxicador, reclamão, forte, rítmico [...]” (Schnake, 2007, p. 89).</p><p>É, a partir dessas características, que se inicia o primeiro contato com</p><p>determinado órgão, mas de forma vivencial, pois nossa racionalidade talvez</p><p>atrapalhasse o processo de conexão com o órgão caso estivéssemos apenas</p><p>lendo a descrição das características. É na dinâmica do experimento clínico</p><p>que se pode viver com intensidade a experiência de contato e permitir dar-se</p><p>conta do que a experiência possibilita para se chegar ao entendimento da</p><p>mensagem do órgão, que é única para cada sujeito, assim como cada pessoa</p><p>possui uma história de vida particular e singular. Ou seja, é no trabalho</p><p>vivencial que o sujeito, ao conhecer as funções e características dos órgãos,</p><p>vai se identificando ou não com cada característica e pode perceber sua relação</p><p>com o órgão em questão.</p><p>Para Schnake, haveria aspectos nossos que poderiam favorecer a presença</p><p>de um tipo de doença que nos afeta. Ainda que não saibamos estatisticamente</p><p>o tamanho da influência de nos dar conta dessas características na melhora da</p><p>doença, é sabido que as mudanças de personalidade permitem uma maior har-</p><p>monia e um melhoramento da relação consigo mesmo e com seu entorno. Para</p><p>que essas mudanças aconteçam, é fundamental entender e conhecer a relação</p><p>que a pessoa tem com o órgão afetado. No trabalho com o EHSD, percebemos</p><p>que cada sistema ou órgão do nosso corpo tem suas características e muitas</p><p>vezes elas são violentamente rechaçadas, e este rechaço, a autora arrisca dizer</p><p>que, pela sua experiência, coincide com a “não defesa” ou o “deixar-se invadir</p><p>sem dar aviso”. Segundo Adriana Schnake (2001), as ideias</p><p>que cada pessoa</p><p>possui sobre si mesmo geralmente correspondem a um “eu” idealizado e são,</p><p>muitas vezes, altamente perturbadoras e quase em oposição às características</p><p>dos órgãos que estão adoecendo. As exigências sociais vigentes, os padrões de</p><p>50</p><p>conduta que privilegiam determinadas características em detrimento de outras</p><p>são responsáveis pelas neuroses e a grave deformidade, não só do mundo em</p><p>que vivemos, mas como grandes males da humanidade.</p><p>O Legado que Transforma Sofrimento em Aprendizado</p><p>Meu contato com o Enfoque Holístico da Saúde e da Doença (EHSD)</p><p>aconteceu em 2011, quando eu e minha parceira de trabalho, Maria Balbina</p><p>de Magalhães, fomos ao Uruguai apresentar o trabalho Gestalt-Oncologia:</p><p>de um lugar além da doença à construção de um caminho, no XII Congresso</p><p>Internacional de Terapia Gestalt. Lá conhecemos o enfoque desenvolvido por</p><p>esta Médica e Gestalt-Terapeuta chilena até então pouco conhecida por nós.</p><p>Encantamo-nos com as possibilidades que esta forma de intervenção nos</p><p>revelava e decidimos fazer a formação (Diplomado) em Chiloé - Chile, no</p><p>Centro Anchimalén. E foi lá que vivencialmente pudemos então compreender</p><p>a dimensão e alcance desses ensinamentos.</p><p>O legado de Adriana Schnake, ao promover o encontro entre a abordagem</p><p>gestáltica, de base fenomenológica, com seus conhecimentos médicos psiquiá-</p><p>tricos, através do seu olhar clínico que partiu de sua extensa experiência como</p><p>terapeuta, promoveu um salto quântico no modo de compreensão dos fatores</p><p>humanos implicados no adoecimento e na sua possibilidade de restauração</p><p>rumo a uma maior integração do sujeito.</p><p>“Para mim, uma verdadeira cura implica uma transformação, e não neces-</p><p>sariamente no sentido místico, mas num sentido de verdadeiro crescimento;</p><p>de uma verdadeira expansão e ampliação do dar-se conta ou tomada de cons-</p><p>ciência. As perturbações podem oferecer uma transformação e as doenças</p><p>podem ser consideradas como perturbações, também os tratamentos, incluindo</p><p>a compreensão inicial da Mensagem da doença até a quimioterapia” (Sch-</p><p>nake, 2001).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 51</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Müller – Granzotto, M. J. & Müller – Granzotto, R. L. (2007). Fenomenologia</p><p>e Gestalt-Terapia. São Paulo: Summus.</p><p>Perls, F. (1977). Gestalt-Terapia Explicada. São Paulo: Summus.</p><p>Schnake, A. (2007). Enfermedad, sintoma y caráter: diálogos gestálticos con</p><p>el cuerpo. Buenos Aires: Del Nuevo Extremo: Cuatro Vientos.</p><p>Schnake, A. (2001). La Voz Del Síntoma. Santiago do Chile: Editorial Cua-</p><p>tro Vientos.</p><p>Schnake, A. (1995). A. Los diálogos del cuerpo. Santiago do Chile: Editorial</p><p>Cuatro Vientos.</p><p>Schnake, A. (2008). Sonia, te envio los cuadernos cafés. Santiago do Chile:</p><p>Editorial Cuatro Vientos.</p><p>CAPÍTULO 3</p><p>O MULTIFATORIAL DO CÂNCER:</p><p>intervenções e desafios no</p><p>tratamento psicológico</p><p>Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida</p><p>Rodrigo Serrão de Farias</p><p>O cenário das condições de vida e saúde no Brasil foi marcado por</p><p>mudanças epidemiológicas significativas nas últimas décadas, ao passo que</p><p>o atual panorama é caracterizado por um aumento da expectativa de vida</p><p>que acarreta no envelhecimento da população, no entanto, sem garantia na</p><p>qualidade de saúde. Isto se deve aos avanços tecnológicos e científicos que</p><p>estimulam o consumo da saúde com a crescente oferta de tratamento e cura</p><p>para as doenças, exigindo menos esforços, cuidado e responsabilidade de cada</p><p>indivíduo com sua saúde. Com isso, padrões de trabalho, lazer e alimentação</p><p>foram modificados e hábitos de vida menos saudáveis e inadequados passaram</p><p>a predominar e se reproduzirem nas famílias brasileiras. Estas transformações</p><p>inter-relacionadas refletiram diretamente no aumento das doenças crônicas</p><p>não transmissíveis (DCNT) (Monego & Jardim, 2006; Schmidt et al., 2011).</p><p>As DCNT representam um grupo de enfermidades cuja formação ocorre</p><p>progressivamente no organismo, com pequenas alterações, muitas vezes imper-</p><p>ceptíveis ao indivíduo, que se agravam e se manifestam, ao longo do tempo,</p><p>enquanto patologia crônica. Seus agravos são, em grande maioria, irreversíveis,</p><p>levando a complicações com graus variáveis de incapacidade, perda de qualidade</p><p>de vida e morte, sendo consideradas, na atualidade, as principais causas de mor-</p><p>bimortalidade no mundo. No Brasil, as DCNT também são instituídas como o</p><p>problema de saúde com maior magnitude, responsáveis por 72% das causas de</p><p>morte, com destaque para as doenças cardiovasculares (DCV) com 31,3% dos</p><p>óbitos, neoplasias com 16,3%, doenças respiratórias com 5,8% e diabetes mellitus</p><p>(DM) com 5,3% (Goulart, 2011; Brasil, 2012; Duncan, Chor, Aquino, Bensenor,</p><p>Mill, Schmidt, Lotufo, Vigo & Barreto, 2012; Mansur & Favarato, 2012).</p><p>Neste cenário uma pessoa que enfrenta o diagnóstico de câncer está</p><p>sujeita a mudanças em seu corpo, mas também no que diz respeito a sua visão</p><p>de si e de suas relações sociais e sobre o seu futuro. A partir desse momento,</p><p>o paciente pode refletir sobre seu passado e se adaptar ao presente, bem como</p><p>adaptar-se aos planos para o futuro. A autoimagem pré-existente, a qualidade</p><p>dos relacionamentos interpessoais e o sentimento de pertencimento são fatores</p><p>54</p><p>de proteção ou podem ser uma fonte de maior vulnerabilidade (Holland &</p><p>Rowland, 1989; Holland & Gooen-Piels, 2000; Watson & Kissane, 2011).</p><p>Kreitler (2019) refere que as doenças crônicas afetam a vida do paciente</p><p>em muitos aspectos. Neste sentido, o câncer acomete em maior grau, ou pelo</p><p>menos tem a reputação e a imagem para fazê-lo, em qualquer idade. Para alguns</p><p>indivíduos, as alterações na imagem corporal podem ser de importância crucial,</p><p>manifestadas na depressão e até na agressão, enquanto para outros, dificuldades</p><p>no trabalho podem ser a causa da depressão (Holland & Gooen-Piels, 2000).</p><p>O tratamento do sofrimento psíquico em pacientes acometidos pelo cân-</p><p>cer exige uma avaliação cuidadosa, a fim de determinar a intervenção mais</p><p>apropriada, que pode ser o tratamento de um fator biológico ou o fornecimento</p><p>de tratamentos psicológicos, psico-farmacêuticos ou combinados (Figura 1).</p><p>O câncer evoca um espectro diversificado de necessidades psicossociais, de</p><p>acordo com Holland, Wiesel, Nelson, Roth e Alici (2015) que pode dividir a</p><p>doença, para fins de tratamento, de acordo com: 1. o início, sintomas agudos</p><p>versus leves; 2. o curso clínico, progressivo (câncer metastático), estável (cân-</p><p>cer de mama em estágio inicial), recorrente (leucemia, mieloma); 3. resultado:</p><p>doenças que geralmente não influenciam a vida útil, por exemplo carcinoma</p><p>de base celular estão em alta em um extremo do continuum e no outro extremo</p><p>existem doenças terminais progressivas, como câncer metastático, entre outras</p><p>doenças imprevisíveis, que podem encurtar a vida e causar morte súbita; 4. cau-</p><p>sar invalidez, doenças significativamente versus insignificantes causam prejuízo</p><p>ao funcionamento. Aquelas doenças que se apresentam em grupos separados</p><p>implicam situações psicológicas distintas de pacientes e suas famílias.</p><p>Figura 1 – Modelo Integrativo de tratamento médico</p><p>Fonte: Os autores, baseado em Holland et al. (2015).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 55</p><p>Cordella e Poiani (2014) ressaltam que os distúrbios psiquiátricos ou</p><p>comprometimentos na saúde mental mais observados em pacientes com câncer</p><p>são os de ajuste e os afetivos (ansiedade e depressão), que na maioria dos</p><p>pacientes são causados por estressores relacionados à ocorrência e ameaça</p><p>da doença, e vulnerabilidades psicológicas pré-existentes; no entanto, eles</p><p>também podem ser uma consequência direta de causas biológicas resultantes</p><p>de modificações corporais induzidas pelo câncer ou de efeitos colaterais do</p><p>tratamento (por exemplo, tratamento com interferon ou radioterapia, metás-</p><p>tases cerebrais, hipercalcemia, síndromes paraneoplásicas).</p><p>Observa-se que os tratamentos contra o câncer são reconhecidos como</p><p>extremamente desafiadores. O desenvolvimento e a intervenção psicológica</p><p>tornaram-se uma atividade detalhada, qualificada e organizada, guiada por</p><p>evidências. Apoiar os pacientes nesses desafios e dificuldades faz parte de uma</p><p>abordagem holística ao tratamento do câncer que os pacientes têm como foco</p><p>o tratamento e não o tumor. É importante que aqueles que lidam diariamente</p><p>com pacientes em sua prática clínica psicológica tenham habilidade sufi-</p><p>ciente para oferecer atendimento especializado. Quanto a equipe de saúde, o</p><p>treinamento nessas habilidades deve ser integrado as atividades rotineiras de</p><p>cada área profissional. À medida que os problemas e as emoções se tornam</p><p>mais difíceis e os pacientes se esforçam para lidar com isso, também o tipo</p><p>de atendimento psicológico oferecido se torna mais complexo, detalhado e</p><p>específico, e o nível de habilidade profissional necessário para prestar o aten-</p><p>dimento é aumentado (Hodges et al., 2011; Holland et al., 2015; Nice, 2004).</p><p>Dessa forma, compreendemos ser importante ressaltar esta seção para</p><p>contribuir em um livro que destina-se ao trabalho com essa população assistida</p><p>por equipe multiprofissional, a fim de promover a atenção e a qualidade de vida.</p><p>Psico-oncologia, um breve histórico</p><p>A psico-oncologia, tem acumulado evidências nas últimas três décadas,</p><p>confirmando o valor da intervenção psicológica. Isso contribuiu para uma</p><p>discussão específica sobre como as necessidades psicológicas e emocionais</p><p>dos pacientes com câncer, amigos, familiares e pessoas próximas a elas podem</p><p>ser melhor assistidas (Watson & Kissane, 2011). O termo psico-oncologia,</p><p>surgiu em 1961 na Argentina, através do médico José Schavèlson, mas foi</p><p>nos Estados Unidos, nos anos 70 que ganhou mais adeptos, através dos tra-</p><p>balhos de Jimmie Holland. Há três aspectos fundamentais para o nascimento</p><p>da psico-oncologia: (1) otimismo em relação ao diagnóstico e a possibili-</p><p>dade de sobrevivência, devido às constantes melhorias no tratamento; (2)</p><p>relatos de celebridades e personalidades públicas acerca de seus processos</p><p>de adoecimento e tratamento; e (3) movimentos sociais que defendiam os</p><p>56</p><p>direitos humanos, inclusive de pacientes oncológicos. Nessas condições a</p><p>população passou a ter mais informações sobre o câncer e isso contribuiu</p><p>para a diminuição do preconceito da doença, o que possibilitou o avanço de</p><p>pesquisas e com o conhecimento maior que os pacientes passaram a obter</p><p>de sua condição, essas respostas puderam ser melhor estudadas (Holland &</p><p>Rowland, 1989; Vilaça, 2018).</p><p>O livro de Holland, Handbook of Psychooncology (1989), apresentou</p><p>a sistematização sobre os cuidados emocionais dos pacientes oncológicos,</p><p>identificando os aspectos que deveriam ser estudados: 1. O impacto do câncer</p><p>na função psicológica do paciente, de sua família e da equipe; 2. O papel que</p><p>as variáveis psicológicas e comportamentais podem ter no risco de câncer e</p><p>na sobrevivência (Holland & Rowland, 1989).</p><p>A importância do paciente em participar do seu próprio processo saúde-</p><p>-doença, no seu tratamento e recuperação, de forma a melhorar sua qualidade</p><p>de vida e até ultrapassar a expectativa de sobrevida, é ressaltada por Vilaça</p><p>(2018). Potencializar essa participação do indivíduo, compreender suas for-</p><p>mas de lidar com a doença e reações emocionais é necessário na atuação da</p><p>área psico-oncológica.</p><p>Rudnick, Oliveria e Rosa (2018) e National Institute for Health and Clini-</p><p>cal Excellence (NICE, 2004) referem que todos os profissionais de saúde estão</p><p>envolvidos no controle da doença, dessa forma, precisam ter conhecimentos</p><p>suficientes sobre a patologia para que “possa informar, cuidar e encaminhar</p><p>cada paciente”. Informações sobre variáveis como idade do paciente, condi-</p><p>ção clínica, tamanho e localização do tumor, além de tratamentos fármacos,</p><p>deve perpassar a gama de conhecimentos que o profissional deve possuir para</p><p>melhor atendimento ao indivíduo.</p><p>Dentre as consequências psicológicas do câncer estão sintomas depressi-</p><p>vos, ansiosos e perturbações neuropsiquiátricas. Além de aspectos fisiológicos,</p><p>o tratamento visa fortalecer a autonomia do paciente, sua aceitação frente ao</p><p>quadro clínico, melhorar sua compreensão acerca de sua condição e aprender</p><p>a regular emoções e sentimentos associados ao câncer.</p><p>Intervenções psicológicas em pacientes oncológicos</p><p>O apoio social e psicológico dos pacientes e de seus familiares deve</p><p>ser considerado parte fundamental da assistência à saúde (Lassen, Gat-</p><p>tinger & Saxer, 2013). As intervenções psicológicas nessa área são as</p><p>ferramentas mais simples e mais complexas que desenvolvemos nesse</p><p>ambiente de saúde. Os terapeutas devem ter conhecimento sobre a doença</p><p>câncer como um distúrbio médico, ser habilidosos em avaliar e administrar</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 57</p><p>psicologicamente os pacientes e transmitir certa segurança com a experiên-</p><p>cia subjetiva em face a situações médicas complexas e tensas. Além disso,</p><p>ter a capacidade de reconhecer as mudanças nas necessidades psicológicas</p><p>do paciente que requer o julgamento clínico e flexibilidade. O atendimento</p><p>psicossocial é cada vez mais reconhecido como um componente essencial</p><p>do atendimento integral ao indivíduo com câncer. Melhorar o acesso dos</p><p>pacientes aos cuidados psicossociais é importante; no entanto, garantir que</p><p>os cuidados disponibilizados tenham se mostrado eficazes é igualmente</p><p>fundamental no processo de tratamento (Holland et al., 2015).</p><p>A partir do momento do diagnóstico do câncer, o paciente modificará</p><p>sua percepção de si mesmo, seus relacionamentos interpessoais e seu</p><p>sentimento de pertencer aos outros (saudáveis ou não): ele pode refletir</p><p>sobre seu passado e se adaptar ao presente, e dessa forma adaptar-se aos</p><p>planos para o futuro. A autoimagem pré-existente, a qualidade dos rela-</p><p>cionamentos interpessoais e o sentimento de pertencimento são fatores de</p><p>proteção ou podem ser uma fonte de maior vulnerabilidade. A adaptação a</p><p>esse novo momento e à doença está associada a seis obstáculos distintos,</p><p>conforme definido por Faulkner e Maguire (1994): (1) gerenciamento da</p><p>incerteza sobre o futuro, (2) busca de significado para a vida, (3) trata-</p><p>mento de perda (exercer o controle), (4) com necessidade de abertura a</p><p>possibilidades e (5) apoio emocional, e (6) médico. Frente aos desafios,</p><p>deixar de lidar com esses obstáculos pode levar ao sofrimento psicossocial.</p><p>Para Souza e Araújo (2010), as intervenções psicológicas em pacien-</p><p>tes oncológicos são eficientes quando o paciente consegue manejar seus</p><p>sofrimentos, solucionar problemas específicos e obter algum controle</p><p>sobre consequências da doença, a partir disso, podem regular seu sofri-</p><p>mento emocional e continuar com atividades que julgam importantes.</p><p>Nesse sentido, para que os objetivos citados anteriormente sejam alcan-</p><p>çados, ressalta-se dentre eles, as que proporcionam o desenvolvimento de</p><p>“atitudes e crenças individuais quanto à capacidade de mudar aspectos</p><p>desfavoráveis; estratégias para lidar com as limitações funcionais; habili-</p><p>dades para estabelecer e manter uma rede de apoio; percepções positivas,</p><p>reestruturações de pensamentos negativos, objetivos realistas e planos</p><p>para o futuro” (Souza & Araújo, 2010, p. 188). Além disso, considerar</p><p>os aspectos sociais, psicológicos e econômicos do paciente em relação à</p><p>doença são de extrema relevância. A realização de uma avaliação e inter-</p><p>venções interdisciplinares facilitam o cuidado integral e humanizado a</p><p>esses indivíduos (Andrade & Azevedo, 2018).</p><p>Pacientes com câncer também são mais suscetíveis a transtornos</p><p>psicológicos, entre eles, o transtorno depressivo grave é quatro vezes</p><p>58</p><p>mais comum nesses indivíduos do que em pessoas saudáveis, acometendo</p><p>entre 10 a 20% dos pacientes durante a doença (Rudnick, Oliveira &</p><p>Rosa, 2018). Além do risco ao transtorno de ansiedade, transtornos sexuais</p><p>e suicídio (Lourenção, Junior & Luiz, 2010).</p><p>Analisando as necessidades do campo da oncologia, as intervenções</p><p>psicológicas devem focar na adaptação do paciente a sua</p><p>nova condição,</p><p>promover adesão ao tratamento, auxiliar no manejo da dor e estresse,</p><p>intervenções psicoprofiláticas para realização de procedimentos cirúrgicos</p><p>ou invasivos dolorosos, promover melhoria na qualidade de vida e reabi-</p><p>litação; apoio aos familiares e atenção aos cuidados paliativos (Andrade</p><p>& Azevedo, 2018; Holland et al., 2015).</p><p>As intervenções psicológicas tornaram-se uma atividade detalhada,</p><p>qualificada e organizada, guiada por evidências científicas, são concebidas</p><p>para ajudar o paciente a lidar e se adaptar à doença e permitirão ter um</p><p>efeito positivo no sofrimento, na ansiedade, na depressão, e na angústia</p><p>(McLoone, Menzies, Meiser, Mann, Kasparian et al., 2013). De forma sus-</p><p>cinta, destaca-se uma definição mais específica da intervenção psicológica</p><p>formal, proposta aqui e inclui quatro características: 1. Uma intervenção</p><p>direta de um profissional especializado; 2. A intervenção segue um método</p><p>baseado em evidências científicas; 3. O método de intervenção e o resultado</p><p>da terapia são claramente descritos e definidos, possibilitando que outras</p><p>pessoas saibam como usar a intervenção e avaliar seus efeitos e eficácia;</p><p>4. O foco principal da intervenção é trabalhar com pessoas para aumentar</p><p>seus recursos pessoais ao lidar com aspectos do câncer que causam estresse</p><p>/ angústia indevidos e, a esse respeito, as metas de mudança serão compor-</p><p>tamentais, emocionais, cognitivas e relacionais / interpessoais.</p><p>A seguir, debruçaremos sobre as possibilidades de intervenções psi-</p><p>cológicas em TCC, discutiremos as duas versões apropriadas e benéficas</p><p>no atendimento ao adulto com câncer.</p><p>Psicoterapia cognitiva-comportamental (TCC)</p><p>A terapia cognitivo-comportamental é uma das versões da TCC, com</p><p>base na abordagem de Beck, J. (1995), tem sido amplamente utilizada em</p><p>pacientes com câncer para promover o ajuste psicológico. A TCC em doen-</p><p>ças físicas e fisiológicas consiste em modificar esses pensamentos e compor-</p><p>tamentos, que podem sustentar problemas mentais mesmo que seu cérebro</p><p>esteja lutando contra uma doença física. Essa terapia é estruturada e focada</p><p>no problema, onde o reconhecimento ou acesso consciente a pensamentos</p><p>e crenças são centrais. As sessões de TCC podem ser divididas em etapas</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: refl exões e possibilidades de intervenção 59</p><p>que iniciam com a coleta de informações importantes sobre o paciente (a</p><p>sua história de vida e doença) e terminam com um estágio fi nal que auxilia</p><p>o paciente a integrar o que foi aprendido nas sessões de modo a fazê-lo</p><p>lidar com as preocupações, associadas à vida com o câncer (Daniels, 2015).</p><p>Quando à doença parece ser a principal tarefa de desenvolvimento para</p><p>um paciente e sua família, dar à experiência da doença um signifi cado que</p><p>reforce sua competência e efi cácia (Quadro 1). A TCC ajuda os pacientes</p><p>a controlar se a visão atual sobre uma determinada situação é adequada ou</p><p>útil, questionar suas opiniões, bem como apoiar a exploração de pensamen-</p><p>tos alternativos e na aplicação de habilidades de resolução de problemas</p><p>que promovem o enfrentamento (Beck, J., 1995; Knapp & Beck, A. 2008).</p><p>Figura 2</p><p>O terapeuta convida o paciente</p><p>para refletir sobre qual a</p><p>atitude ou solução que pode</p><p>adotar.</p><p>O terapeuta pergunta ou faz um resumo em que o paciente considere</p><p>a sua opinião uma conclusão construtiva ou não para aquela situação em</p><p>discussão (Figura 2).</p><p>Quadro 1 – Habilidades ensinadas ao paciente com câncer na TCC</p><p>• Obter uma compreensão completa dos fatores que mantêm o sofrimento emocional e a evitação</p><p>situacional.</p><p>• Identifi car e modifi car padrões negativos de pensamento.</p><p>• Desenvolver habilidades de resolução de problemas.</p><p>• Dominar técnicas, entre outras a de relaxamento e respiração profunda.</p><p>• Aprender a enfrentar gradualmente situações temidas, em vez de evitá-las.</p><p>• Desenvolvimento de habilidades organizacionais.</p><p>• Melhorar as interações sociais e parentais.</p><p>Fonte: Os autores.</p><p>60</p><p>As sessões têm uma forma estruturada, de acordo com o plano estabe-</p><p>lecido pelo terapeuta, que inicia geralmente, na identificação do problema,</p><p>e incluem as tarefas de casa, criação de novas e a verificação das anteriores,</p><p>cujo objetivo é testar crenças e novas maneiras de lidar entre as sessões</p><p>(continuum). As interações de pensamentos, comportamentos, emoções e</p><p>sensações físicas são enfatizadas nas suposições (Moorey & Watson, 2015). O</p><p>Quadro 2 traz algumas modificações que podem ser incluídas e adaptadas para</p><p>o tratamento com adultos e os idosos, de acordo com o contexto e o paciente.</p><p>Quadro 2 – Modificações da terapia TCC adaptadas para o tratamento do câncer</p><p># As sessões são menos formais, mais flexíveis e mais favoráveis.</p><p># As sessões podem ser mais breves e ajustadas às condições físicas, fisiológicas do paciente.</p><p># As sessões podem ser realizadas em estabelecimentos de saúde ou nas casas dos pacientes.</p><p># As técnicas são ajustadas às condições físicas, fisiológicas dos pacientes.</p><p># A terapia inclui familiares e profissionais de saúde.</p><p># Os objetivos da terapia são mais circunscritos.</p><p># As sessões podem ser fornecidas pela Internet podem servir como um complemento às intervenções</p><p>presenciais existentes (Evert, van der Lee & Meezenbroek, 2015).</p><p># O objetivo principal da terapia é promover a mudança máxima com a intervenção mínima.</p><p>Fonte: Adaptado de Holland et al. (2015).</p><p>O terapeuta ensina o paciente a identificar e modificar pensamentos,</p><p>crenças e comportamentos inúteis, além de reforçar o senso de autoeficácia.</p><p>O terapeuta e o paciente trabalham juntos para definir o objetivo da terapia e</p><p>criar uma conceitualização cognitiva compartilhada. Os objetivos terapêuti-</p><p>cos estão claramente definidos, desde o início do processo e revisto ao longo</p><p>das sessões. O terapeuta ajuda o paciente a tratar suas crenças negativas</p><p>como hipóteses sobre si mesmo, concomitantemente são testadas usando</p><p>técnicas cognitivas e comportamentais, através do empirismo baseada na</p><p>colaboração. Ensina o paciente a ser especialista em seus próprios problemas</p><p>e experiências. Propõe a busca conjunta de soluções para os problemas,</p><p>enquanto o paciente oferece dados brutos, como pensamentos e comporta-</p><p>mentos, e viabiliza a estrutura e as competências na resolução de problemas.</p><p>Continuamente, o progresso do paciente é monitorado e avaliado o tempo</p><p>todo, à medida que é solicitado a receber e dar feedback durante cada sessão</p><p>(Beck, A. et al., 1979; Beck, A. 1995; Daniels, 2015).</p><p>Durante as intervenções, podem surgir os pensamentos negativos, por</p><p>exemplo: “Sou vulnerável”, “Ninguém pode me ajudar”, “A situação ruim</p><p>mudará em breve para pior “, “Estou desamparado” e “ Não posso lidar com</p><p>isso”. O objetivo nas intervenções incide sobre o ajuste do paciente à nova</p><p>situação na relação com as suas respostas, de ansiedade, depressão, por exem-</p><p>plo. O treino com o paciente consiste em ele aprender a dar respostas úteis e</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 61</p><p>positivas às ideias pessimistas, nesse processo gradual (por exemplo, ideias</p><p>de prevenir ou tornar menos intensa a depressão e outras respostas do tipo</p><p>desamparo e desesperança). A atenção às questões emocionais e interpessoais</p><p>é particularmente importante nos pacientes que passam por um processo de</p><p>ajuste. O terapeuta precisa alcançar um equilíbrio entre apoiar o ajuste e pro-</p><p>mover a solução de problemas. O gerenciamento de interações desadaptativas</p><p>com os cuidadores e o apoio social são componentes significativos da terapia.</p><p>A eficácia da TCC nesses domínios foi comprovada em estudos controlados</p><p>em larga escala (Telch & Telch 1986; Lejouez, Hopko & Hopko, 2001; Hopko,</p><p>Funderburk, Shorey, McIndoo, Ryba, File & Vitulano, 2013).</p><p>A identificação de pensamentos automáticos e disfuncionais frente aos</p><p>sintomas é importante para descobrir quais são as crenças intermediárias</p><p>e centrais do paciente (por exemplo, cefaleia, insônia). A partir daí, em</p><p>conjunto com o terapeuta, pode realizar-se a reestruturação</p><p>cognitiva, que</p><p>tem por objetivo ensinar aos pacientes que nem sempre seus pensamentos</p><p>condizem com a realidade, e mostrar que pode desenvolver estratégias para</p><p>diminuir a intensidade do episódio doloroso ou difícil de lidar, além de ter</p><p>mais controle sobre as crises. Nesse processo, o terapeuta auxilia na pre-</p><p>venção de recaídas (Daniels, 2015).</p><p>A coleta dessas informações ajuda o paciente a identificar qual abor-</p><p>dagem e técnica que mais o beneficiará. As técnicas cognitivas e comporta-</p><p>mentais geralmente proporcionam alívio rápido dos sintomas de angústia e</p><p>não exigem que o paciente seja excessivamente introspectivo. O foco aqui</p><p>é fornecer experiências de enfrentamento bem-sucedidas que reforçam a</p><p>autoeficácia e o controle (Wenzel, 2012).</p><p>O resultado pode ser um alívio do sofrimento e uma mudança do pensa-</p><p>mento negativo para uma visão mais positiva da capacidade do paciente em</p><p>lidar com o problema. Crenças negativas são transformadas em hipóteses,</p><p>isto é, se põe à prova esse pensamento e a emoção envolvida. Para pacientes</p><p>inseguros ou com sintomas de ansiedade, sem esperança, o agendamento de</p><p>atividades pode ajudar a superar a inatividade. Para pacientes deprimidos</p><p>ou mais doentes físicos, preferencialmente as tarefas precisam ser dividi-</p><p>das em pequenas etapas, de modo que possam ser graduadas. É necessária</p><p>alguma criatividade para encontrar atividades e adequá-las à situação. Os</p><p>familiares podem ser convidados a participarem e para fazer sugestões com</p><p>base em seus conhecimentos sobre o paciente (Kreitler, 2019). Para pacien-</p><p>tes ansiosos, experimentos comportamentais podem ser configurados para</p><p>testar situações temidas (Watson & Kissane, 2011). O Quadro 3 mostra</p><p>sucintamente alguns manejos com as técnicas cognitivas e comportamentais</p><p>a partir do questionamento dos pensamentos automáticos.</p><p>62</p><p>Quadro 3 – Técnicas cognitivas e comportamentais</p><p>no manejo nas sessões com adultos</p><p>Questionando pensamentos automáticos</p><p>*Qual é a evidência?</p><p>*Existe uma maneira alternativa de encarar a situação?</p><p>*Qual é o efeito de pensar dessa maneira?</p><p>*O que diria a um amigo se ele estivesse nessa situação?</p><p>*Existe uma maneira alternativa de encarar a situação?</p><p>*Qual o pior que poderia acontecer?</p><p>*Qual o melhor que poderia acontecer?</p><p>*O que acontecerá provavelmente?</p><p>*O que eu diria a um amigo se ele ou ela estivessem nessa situação?</p><p>*Como posso lidar com isso?</p><p>Fonte: Os autores, baseado em Wenzel (2012).</p><p>O paciente é confrontado com suas respostas cognitivas e comportamen-</p><p>tais inadequadas, sendo incentivado a explorar alternativas cognitivas ou em</p><p>ação, a fim de obter um melhor ajuste. Existem evidências empíricas sobre a</p><p>melhoria da qualidade de vida após a aplicação deste modelo (Daniels, 2015).</p><p>Dentre as técnicas mais utilizadas da TCC, algumas se fazem essenciais</p><p>junto ao paciente oncológico, como: Psicoeducação, mindfulness, estratégias</p><p>do manejo do estresse, habilidades sociais, regulação emocional (manejo da</p><p>raiva), reestruturação cognitiva, treino de assertividade, distração, dessensi-</p><p>bilização sistemática, manejo de contingência e modelação (Kreitler, 2019;</p><p>Rudinick, Oliveira & Rosa, 2018; Wenzel, 2012).</p><p>A psicoeducação é uma técnica eficaz no âmbito da saúde, sendo a psico-</p><p>-oncologia beneficiada pela sua utilidade e aplicabilidade, desde intervenções</p><p>com crianças e seus familiares, a cuidados paliativos de idosos e seus cuida-</p><p>dores (Lemos & Neto, 2017). As intervenções psicoeducacionais podem ser</p><p>feitas através de diversas maneiras, seja a partir da comunicação entre equipe</p><p>de saúde, paciente e familiares, vídeos educativos, palestras em salas de espera</p><p>etc. Quando nos referimos ao processo da TCC, um instrumento bastante uti-</p><p>lizado são os coping cards ou cartões de enfrentamento com registros sobre</p><p>conteúdos discutidos durante a psicoterapia (Santana, 2016). O paciente é</p><p>incentivado a guardar em lugares estratégicos (bolsos, gavetas, mochilas), e</p><p>sempre que se perceber em alguma situação-problema, ele acessa esses car-</p><p>tões com informações que podem lhe ajudar a enfrentar a situação que está</p><p>causando alguma perturbação emocional. Santana (2016) e Wenzel (2012)</p><p>sugerem que com a utilização do cartão-lembrete o paciente pode revisar seus</p><p>pensamentos disfuncionais, identificados com a ajuda do psicoterapeuta, e</p><p>avaliar qual forma mais adaptativa pode lidar com os sentimentos e pensa-</p><p>mentos que está experenciando, favorecendo uma reestruturação cognitiva.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 63</p><p>As intervenções psicoeducacionais também podem ser feitas com fami-</p><p>liares, cuidadores de pacientes infantis e na terapia em grupo. O impacto da</p><p>doença altera o modo como os pais se comportam e lidam com as contingên-</p><p>cias, como o estabelecimento de limites e uso de práticas coercitivas, o que</p><p>influencia a criança com câncer a ter ganhos secundários e desenvolver maior</p><p>dependência (Herman & Miyazaki, 2007; Kreitler, 2019). Desenvolver junto</p><p>aos pais práticas educativas positivas e participativas, favorecem o desenvol-</p><p>vimento da criança e também o tratamento da doença. Herman e Miyazaki</p><p>(2007) comentam sobre duas práticas positivas, a monitoria positiva com</p><p>“o uso adequado de privilégios, regras, distribuição de atenção e afeto” e o</p><p>comportamento moral, envolvendo o senso de justiça, generosidade e “certo e</p><p>errado”. As intervenções psicoeducacionais objetivam a promoção e fortaleci-</p><p>mento dessas práticas positivas. Em intervenções com crianças (Graner, Junior</p><p>& Rolim, 2010), adultos e idosos (Kreitler, 2019) ressaltam que a técnica</p><p>da imaginação dirigida é bastante frequente. É importante também associar</p><p>a utilização de desenhos, para proporcionar um alívio da dor e ansiedade,</p><p>distanciamento da realidade e aumento da consciência corporal. Outro ponto</p><p>a salientar é o reforçamento positivo, principalmente em pacientes infantis e</p><p>idosos com o objetivo de favorecer o comportamento de cooperação (Graner,</p><p>Junior & Rolim, 2010; Kreitler, Martin & Ben-Arush, 2012).</p><p>Souza e Araújo (2010) ressaltam a eficácia da psicoeducação no trata-</p><p>mento em grupo, com objetivos principais de desenvolver habilidades adapta-</p><p>tivas de enfrentamento, minimizar o estresse e melhorar a qualidade de vida.</p><p>Pacientes em início de tratamento quimioterápico podem ser submetidos à</p><p>intervenções em grupo, as quais visam “reduzir dificuldades relacionadas ao</p><p>diagnóstico e à quimioterapia, bem como seus efeitos (treino de soluções de</p><p>problemas), para auxiliar na adaptação à doença e tratamento (manejo do</p><p>estresse), ajudar no equilíbrio emocional (regulação emocional) e desenvolver</p><p>habilidades de comunicação (assertividade).</p><p>Em relação aos efeitos do tratamento, a técnica de relaxamento se mos-</p><p>tra eficaz para melhorar e aliviar os efeitos colaterais, além de minimizar a</p><p>ansiedade. O objetivo principal “é ensinar o paciente a entrar em um estado de</p><p>relaxamento”, focar em imagens agradáveis, ensinar a tensionar os músculos</p><p>e controlar a respiração, são algumas formas de se alcançar o relaxamento</p><p>(Kreitler, 2019; Rudinick, Oliveira & Rosa, 2018; Wenzel, 2012). Além disso,</p><p>proporciona uma redução considerável nos níveis de ansiedade, muito presente</p><p>em pacientes com câncer devido às expectativas dos resultados do tratamento</p><p>que envolvem estados de tensão, hiperatividade, apreensão, vigilância e alerta</p><p>(Andrade e Azevedo, 2018). Neste sentido, o relaxamento progressivo é bas-</p><p>tante utilizado no controle da dor, por exemplo, em que os pacientes aprendem</p><p>a tensionar e relaxar grupos de músculos separadamente com o objetivo, ao</p><p>64</p><p>longo do tempo, de aprender a controlar seus músculos simultaneamente</p><p>(Graner, Junior e Rolim, 2010). Tais estímulos podem exigir maior atenção</p><p>através de Biofeedback, o paciente pode perceber as respostas que seu orga-</p><p>nismo emite com a dor e com isso controlar e manejar essas respostas.</p><p>A prática da terapia cognitiva baseada em Mindfulness, ou atenção plena,</p><p>é um outro recurso, na qual o paciente</p><p>concentra-se no “aqui e agora”, sem</p><p>julgamentos, o que favorece o gerenciamento do estresse, além de contribuir</p><p>para o doente lidar com a dor, fadiga, náusea e vômitos (Holland et al., 2015;</p><p>Rudinick, Oliveira e Rosa, 2018).</p><p>Moorey e Watson (2012) e Graner, Junior e Rolim (2018), destacam a</p><p>técnica comportamental da modelação utilizada tanto em adultos como em</p><p>crianças e adolescentes principalmente quando estão com medo ou não de</p><p>receberem informações suficientes acerca de algum procedimento médico</p><p>doloroso necessário. Em crianças, pode ser feita através da apresentação</p><p>de filmes onde se descrevem passos do procedimento que irá acontecer.</p><p>Já o ensaio comportamental tem como principal objetivo a promoção de</p><p>comportamentos de enfrentamento e dessensibilização de componentes</p><p>que provocam sofrimento ao doente, além de favorecer a participação</p><p>ativa da pessoa em seu tratamento.</p><p>Terapia de aceitação e compromisso (ACT)</p><p>É uma terceira versão recente da TCC cujo objetivo é alterar a função</p><p>de pensamentos problemáticos ou angustiantes para o indivíduo, em vez de</p><p>alterá-los, adaptá-los ou eliminá-los (Hayes & Lillis, 2012). O modelo de</p><p>psicopatologia da ACT é utilizado para conceitualizar casos e para delinear</p><p>intervenções. Assim, pensamentos ou expressões angustiantes são vistos</p><p>como normais no caso de uma situação desafiadora, e a terapia deve ajudar</p><p>o paciente a aceitá-los e a conviver com eles. O tratamento consiste em ensi-</p><p>nar os pacientes a reconhecer os pensamentos perturbadores e suas emoções</p><p>concomitantes, além de perceber que ter um pensamento não significa que</p><p>ele necessariamente se tornará realidade. Além disso, o paciente é ensinado</p><p>a continuar funcionando na vida, dar continuidade e a promover os objetivos</p><p>e valores, apesar das mudanças na situação devido ao câncer (Kreitler, 2019).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: refl exões e possibilidades de intervenção 65</p><p>Figura 3 – Modelo ACT de mudança de comportamento,</p><p>adaptado de Finlay, Peacock e Elander (2018)</p><p>O modelo de fl exibilidade psicológica é, portanto, ao mesmo tempo,</p><p>um modelo de psicopatologia, de saúde mental e de intervenção psicoló-</p><p>gica. Os processos subjacentes à psicopatologia e ao sofrimento, conforme</p><p>a Teoria das Molduras Relacionais (TMR), emergem de características da</p><p>linguagem e cognição humanas. Os processos centrais estão relacionados</p><p>e são apresentados grafi camente como um hexágono (Figura 3). Cada um</p><p>dos seis vértices desse hexágono corresponde a um processo associado à</p><p>infl exibilidade psicológica: esquiva de experiência ou esquiva experiencial;</p><p>fusão cognitiva; predominância do passado conceitual e do futuro temido;</p><p>apego ao eu conceitualizado; inércia, impulsividade e persistência na esquiva;</p><p>e falta de clareza de valores (Finlay, Peacock & Elander, 2018).</p><p>A avaliação deve abordar o contexto biopsicossocial dos adultos. É</p><p>essencial que o terapeuta colabore com o médico de cuidados primários do</p><p>paciente para entender melhor quaisquer comorbidades médicas ou defi -</p><p>ciências funcionais que possam infl uenciar o tratamento. Alem de conside-</p><p>rar várias características clínicas importantes ao conduzir a avaliação dos</p><p>processos principais relacionados ao ACT com adultos. É particularmente</p><p>importante avaliar os indícios de suicídio quando se trabalha com pessoas</p><p>mais velhas, sendo que o suicídio pode ser considerado a forma mais extrema</p><p>de evitação experiencial. Além disso, avaliar o uso ou abuso de substâncias</p><p>66</p><p>como uma estratégia de controle interno, pois esses problemas são geral-</p><p>mente diagnosticados ou não detectados nessa população (Loukissa, 2007).</p><p>A doença crônica e o comprometimento funcional são comumente</p><p>co-mórbidos em idosos deprimidos e ansiosos. É importante avaliar até que</p><p>ponto o cliente está se fundindo com um senso de si danificado que pode estar</p><p>surgindo de doenças crônicas e comprometimento funcional (isto é, definindo o</p><p>eu como indefeso ou enfermo). Semelhante às atitudes sobre o envelhecimento,</p><p>a fusão com um eu conceitual danificado decorrente de uma doença crônica</p><p>precisa ser abordada no tratamento e pode representar uma barreira à mudança</p><p>de comportamento (Hayes & Lillis, 2012; Finlay, Peacock & Elander, 2018).</p><p>A perda do contato com os valores da vida pode ocorrer após eventos</p><p>importantes nela experimentados, como aposentadoria ou novas deficiências</p><p>funcionais que surgem de uma doença crônica. Assim, se o paciente não con-</p><p>seguir fazer a transição para novos objetivos comportamentais consistentes</p><p>com esses valores após a aposentadoria, ele poderá experimentar descone-</p><p>xão com os valores essenciais. Além disso, novas deficiências funcionais</p><p>decorrentes de doenças crônicas podem tornar os objetivos atuais fisicamente</p><p>inatingíveis. Se esses objetivos inatingíveis não forem substituídos por obje-</p><p>tivos atingíveis que estejam de acordo com os valores, o paciente poderá</p><p>perder o contato com um valor de vida profundamente enraizado. Ressalta-se</p><p>que esclarecer sobre os valores tem os seguintes objetivos: ajudar o doente</p><p>a se reconectar com os valores que dão sentido e propósito à sua vida. Um</p><p>segundo objetivo é aumentar a conscientização sobre direções valiosas da</p><p>vida e maneiras pelas quais o comportamento atual não está de acordo com</p><p>esses valores anteriormente introjetados. Identificar esses valores, deve ser a</p><p>tarefa do terapeuta para trabalhar no sentido de criar estratégias alternativas</p><p>para chegar em direção a esses valores, obtendo assistência de outras pessoas</p><p>ou para identificar metas alternativas que ainda são atingíveis. O atendimento</p><p>psicoterápico mostra que a maioria dos pacientes não consegue, por exem-</p><p>plo, se desvencilhar de regras disfuncionais, aceitar aquilo que não pode</p><p>ser mudado, viver o momento presente e viver de acordo com seus valores.</p><p>As barreiras mais comuns encontradas no tratamento, por exemplo, são a</p><p>fadiga, experimentar emoções desconfortáveis e a fusão com experiências</p><p>internas autoavaliativas (Finlay, Peacock & Elander, 2018).</p><p>A fusão cognitiva é outra área importante de avaliação em adultos mais</p><p>velhos. É importante avaliar até que ponto o indivíduo está fundido com um</p><p>eu conceitualizado como danificado. É importante avaliar com o paciente a</p><p>respeito das suas atitudes sobre o envelhecimento, e ter opiniões negativas</p><p>sobre o envelhecimento pode se transformar em um auto-estereótipo negativo</p><p>que tendem a ter piores resultados funcionais e de saúde mental na idade adulta</p><p>(Hayes & Lillis, 2012). A fusão cognitiva com esse eu envelhecido conceituado</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 67</p><p>e danificado pode criar uma barreira à mudança comportamental. Também é</p><p>importante avaliar a fusão cognitiva entre idosos com deficiência e doentes</p><p>crônicos. A doença crônica e o comprometimento funcional são comumente</p><p>co-mórbidos em idosos deprimidos e ansiosos. Sugere-se que uma das perguntas</p><p>que o terapeuta deve fazer, é como os desafios médicos influenciam seus com-</p><p>portamentos. Os pacientes que limitam suas atividades além do que é imposto</p><p>pela incapacidade física, embora atribuam essas limitações exclusivamente à</p><p>saúde, provavelmente estão se fundindo com esse eu conceitual danificado.</p><p>Schaie (2005) sugere que o tratamento deve ser limitado no tempo e,</p><p>dependendo do cliente e de seu comprometimento (físico, fisiológico, por</p><p>exemplo) pode consistir em 12 a 16 sessões de cinquenta minutos. As alte-</p><p>rações cognitivas, como velocidade de processamento reduzida, memória de</p><p>trabalho e atenção, ocorrem como parte do processo normal de envelhecimento,</p><p>portanto o processo terapêutico geralmente é mais lento com pacientes com</p><p>problemas cognitivos ou funcionais, por isso podem ser necessárias mais ses-</p><p>sões para dar maior atenção aos componentes importantes. Uma das formas</p><p>para auxiliar muitos adultos e idosos com dificuldade em perceber e identificar</p><p>experiências internas, é realizar um exercício de atenção plena, como respira-</p><p>ção consciente, no início</p><p>de cada sessão, a fim de desenvolver e praticar essa</p><p>habilidade (Zettle, 2007). Em seguida, é interessante revisar os tarefas de casa</p><p>e aquilo que foi abordado na sessão anterior. O novo material para a sessão é</p><p>aceito (agenda) e a tarefa de casa é atribuída. Para essa clientela, normalmente,</p><p>os folhetos explicativos das tarefas de casa são fornecidos em papel colorido</p><p>diferente (com letras em negrito ou em fonte maior, para queles com deficiências</p><p>sensoriais, por exemplo), com objetivo de distinguir as tarefas e os pacientes</p><p>são solicitados a repetir o que conseguiram realizar ou não, com suas próprias</p><p>palavras para garantir que eles entendam o que devem fazer entre as sessões.</p><p>Psicoterapias específicas propostas para o cenário</p><p>de oncologia: os cuidados paliativos</p><p>Quando nos referimos ao câncer, a possibilidade de morte está presente</p><p>e perpassa por vários indivíduos, seja através do paciente, seus familiares</p><p>ou pela equipe de saúde. Essa possibilidade torna-se mais palpável e real</p><p>quando a pessoa se encontra no critério para cuidados paliativos, no qual o</p><p>tratamento volta-se ao controle da dor e outros sintomas, além de preservar</p><p>aspectos cognitivos, sociais e espirituais dos pacientes e sua família (Castro e</p><p>Barroso, 2012). Os cuidados paliativos são uma habilidade cujos os esforços</p><p>recentes nessa área demonstraram que a prestação de cuidados paliativos é</p><p>parte integrante da prestação de cuidados de câncer compassivos e de alta</p><p>68</p><p>qualidade, especificamente no que se refere aos resultados físicos e emocionais</p><p>dos pacientes e de seus cuidadores (Kaufmann & Kamal, 2017).</p><p>Dor e sofrimento são duas variáveis presentes no tratamento da pessoa</p><p>com câncer, comentam Castro e Barroso (2012), Kaufmann e Kamal (2017)</p><p>embora tenham conceitos diferentes. Enquanto a primeira refere-se a uma</p><p>experiência sensorial e emocional, geralmente uma lesão; a segunda está rela-</p><p>cionada à subjetividade do sujeito, podendo existir a ruptura do eu e refletir</p><p>a vulnerabilidade como pessoa; contém também o medo de ficar sozinho, de</p><p>perder quem se ama, e interromper os planos. O adoecimento e a eminência</p><p>da morte dentro da família desestabilizam o sistema e que deverá ser reorga-</p><p>nizado frente às demandas da condição imposta através da doença. Mas isso</p><p>não significa uma resolução, e sim uma “descoberta de maneiras de seguir</p><p>em frente com a vida” através de um compartilhamento da realidade que se</p><p>apresenta entre todos os membros.</p><p>Neste sentido, Castro e Barroso (2012) enfatizam o papel da dor e as</p><p>crenças que os pacientes possuem em relação a ela, além das estratégias de</p><p>enfrentamento que eles utilizam. Ao experenciar com mais controle sobre à</p><p>vida, o paciente pode perceber menos intensidade da dor e utiliza estratégias</p><p>mais adaptativas, ao contrário, quando se percebe indefeso, aumenta-se a</p><p>frequência e a intensidade das dores. Assim, educar pacientes, familiares e</p><p>cuidadores é essencial para o controle da dor. Além de possuir quadro clínico</p><p>específico em relação à doença, o paciente mostra-se vulnerável às influên-</p><p>cias externas, contribuindo para que os processos cognitivos favoreçam o</p><p>surgimento de comportamentos disfuncionais, resultando em uma percepção</p><p>equivocada de suas dores.</p><p>Em cuidados paliativos, como dito anteriormente, o controle da dor é</p><p>fundamental, e intervenções não medicamentosas, como “apoio emocional,</p><p>físicos, educacionais e cognitivo-comportamentais” também são importan-</p><p>tes (Castro e Barroso, 2012). Outras técnicas da TCC, podem ser também</p><p>aplicadas, como: Psicoeducação, Treino Assertivo e Habilidades Sociais,</p><p>Reestruturação Cognitiva e Técnicas de Aquisição de Estratégias para alívio</p><p>dos estados de tensão e ansiedade.</p><p>Cabe aos profissionais de saúde envolvidos no tratamento, orientar os</p><p>pacientes em relação aos sintomas, visando ao bem-estar e promovendo uma</p><p>forte aliança terapêutica. A equipe multiprofissional (quando trabalham em</p><p>conjunto) com os prestadores de cuidados longitudinais do paciente forne-</p><p>cem uma camada adicional de apoio. Acolher, melhorar a autoestima e o</p><p>autocuidado são fundamentais no processo de cuidado paliativo (Kaufmann</p><p>& Kamal, 2017) bem como, de intervenção ao paciente, familiares e cuida-</p><p>dores. Sendo assim, cabe ao psicólogo oportunizar a escuta e contribuir para</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 69</p><p>aceitação do quadro clínico por seu paciente, fortalecendo a união dos fami-</p><p>liares favorecendo uma oportunidade de validar sentimentos difíceis como</p><p>culpa, raiva e à possibilidade de morte.</p><p>Considerações finais</p><p>A relação terapêutica, que perpassa todo o processo da TCC, se mostra</p><p>uma habilidade profissional fundamental para a eficiência de qualquer inter-</p><p>venção psicoterápica. Essa habilidade, atuando diretamente com pacientes</p><p>oncológicos, vai além do estabelecimento da intimidade e confiança, torna-se</p><p>também uma responsabilidade mútua, por um lado, o terapeuta, conhecedor de</p><p>teorias e técnicas acolhe não só o paciente e familiares, mas todo o peso que</p><p>o câncer representa na história de vida daquele indivíduo. Compreender que</p><p>a condição da doença é algo além de aspectos físicos, influenciando na vida</p><p>afetiva, profissional, pessoal, emocional e espiritual, cumpre também o cuidado</p><p>biopsicossocial que perpassa o processo saúde/doença de todo indivíduo. Por</p><p>outro lado, com o ganho de autonomia que recebe da intervenção terapêutica, o</p><p>paciente se envolve com o próprio processo saúde/doença e contribui para seu</p><p>bem-estar, funcionando também como agente de mudanças de seus familiares,</p><p>o que pode favorecer e fortalecer o vínculo com a equipe de saúde.</p><p>70</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Andrade, A. M., & Azevedo, J. M. (2018). O Impacto do Diagnóstico Onco-</p><p>lógico: Contribuições da Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista</p><p>Científica Hospital Santa Izabel, 36-40. https://www.hospitalsantaiza-</p><p>bel.org.br/ensino-e-pesquisa/revista-cientifica/index.html</p><p>Beck, J. S. (1995). Cognitive Therapy: Basics and Beyond. New York: Guil-</p><p>ford Press; 4.</p><p>Beck, A. T., Rush, A. J., Shaw, B. F., & Emery, G. (1979). Cognitive Therapy</p><p>for Depression. New York: Guilford.</p><p>Brasil (2012). Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José de Alen-</p><p>car Gomes da Silva. Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O controle</p><p>do tabaco no Brasil: uma trajetória. Rio de Janeiro: INCA.</p><p>Castro, M. M., & Barroso, C. L. (2012). Contribuições da Terapia Cogni-</p><p>tivo-Comportamental nos Cuidados Paliativos. Revista Psicologia,</p><p>Diversidade e Saúde, 101-108. https://www5.bahiana.edu.br/index.</p><p>php/psicologia/article/view/48</p><p>Cordella, M., & Poiani, A. (2014). Behavioural Oncology: Psychological,</p><p>Communicative, and Social Dimensions. Spinger. New York.</p><p>Daniels, S. (2015). Cognitive behavioral therapy for cancer patients. Journal</p><p>Advanced Practice Nursing, 6 (1), 54-56. https://www.researchgate.net/</p><p>publication/282343281_Cognitive_Behavior_Therapy_for_Patients_</p><p>With_Cancer</p><p>Duncan, B.; Chor, D.; Aquino, E.; Bensenor, I.; Mill, J.; Schmidt, M.; Lotufo,</p><p>P.; Vigo, A. & Barreto, S. (2012). Doenças crônicas não transmissíveis</p><p>no Brasil: prioridade para enfrentamento e investigação. Revista Saúde</p><p>Pública, v. 46, p. 126-134, Suplemento 1. https://doi.org/10.1590/</p><p>S0034-89102012000700017</p><p>Faulkner & Maguire, 1994. Faulkner A, Maguire P (1994). Talking to Cancer</p><p>Patients and Their Relatives. Oxford University Press, London.</p><p>Finlay, K. A, Peacock, S. & Elander, J. (2018). Developing successful social</p><p>support: An interpretative phenomenological analysis of mechanisms</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 71</p><p>and processes in a chronic pain support group. Psychological Health.</p><p>33 (7), 846-871). https://doi.org/10.1080/08870446.2017.1421188</p><p>Goulart, F. (2011). Doenças Crônicas Não Transmissíveis: estratégias de</p><p>controle e desafios para os sistemas de saúde. Organização Paname-</p><p>ricana de Saúde/ Organização Mundial de Saúde. Brasília: Ministério</p><p>da Saúde.</p><p>Graner, K. M., Junior, A. L., & Rolim,</p><p>G. S. (2010). Dor em Oncologia:</p><p>Intervenções Complementares e Alternativas ao Tratamento Medica-</p><p>mentoso. Temas em Psicologia, 345-355. http://pepsic.bvsalud.org/</p><p>scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X2010000200009</p><p>Hayes, S. C., & Lillis, J. (2012). Acceptance and Commmmitment Therapy.</p><p>American Psychological Association. Washington, DC. https://www.</p><p>apa.org/pubs/books/4317286</p><p>Herman, A. R., & Miyazaki, M. C. (2007). Intervenção psicoeducacional em</p><p>cuidador de criança com câncer: relato de caso. Arquivos de Ciência</p><p>da Saúde, 238-244. http://bases.bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/</p><p>online/?IsisScript=iah/iah.xis&src=google&base=LILACS&lang=p&-</p><p>nextAction=lnk&exprSearch=514624&indexSearch=ID</p><p>Holland, J & Gooen-Piels, J. (2000). Principles of psychooncology. W: Hol-</p><p>land J, red. Cancer Medicine. Ontario: B. C. Decker. 943-958.</p><p>Holland, J. C.; Wiesel, T. W.; Nelson, C. J.; Roth, A. J & Alici, Y. (2015).</p><p>Geriatric Psycho-Oncology: A Quick Reference on the Psychosocial</p><p>Dimensions of Cancer Symptom Management. Oxford. New York.</p><p>Hopko, D. R., Funderburk, J. S., Shorey, R. C., McIndoo, C. C., Ryba, M. M.,</p><p>File, A. A., & Vitulano, M. (2013). Behavioral activation and problem-</p><p>solving therapy for depressed breast cancer patients: Preliminary sup-</p><p>port for decreased suicidal ideation. Behavior Modification, 37 (6), p.</p><p>747-767. https://doi.org/10.1177/0145445513501512</p><p>Kaufmann, T. L., & Kamal, A. H. (2017). Oncology and Palliative Care</p><p>Integration: Cocreating Quality and Value in the Era of Health Care</p><p>Reform. Journal of Oncology Practice, 13 (9), 580-588. https://doi.</p><p>org/10.1200/JOP. 2017.023762</p><p>72</p><p>Knapp, P., & Beck, A. T. (2008). Fundamentos, modelos conceituais, aplicações</p><p>e pesquisa da terapia cognitiva. Revista Brasileira de Psiquiatria, 30</p><p>(Supl II), 54-64. https://doi.org/10.1590/S1516-44462008000600002</p><p>Kreitler, S. (2019). Psycho-Oncology for the Clinician. The Patient Behind</p><p>the Disease. Switzerland. https://doi.org/10.1007/978-3-030-06126-5.</p><p>Kreitler, S., Martin, A., 7 Ben-Arush, M. W. (2012). Pediatric psycho-oncol-</p><p>ogy: psychosocialaspects and clinical interventions. 2nd ed. Oxford.</p><p>Wiley Black-Well.</p><p>Lassen B, Gattinger H., & Saxer S. (2013). A systematic review of physi-</p><p>cal impairments following radical prostatectomy: effect of psycho-</p><p>educational interventions. Journal of Advanced Nursing; 69 (12):</p><p>2602Y2612. https://doi.org/10.1111/jan.12186</p><p>Lemes, C. B., & Neto, J. O. (2017). Aplicações da Psicoeducação no Con-</p><p>texto da Saúde. Temas em Psicologia, 17-28. https://doi.org/10.9788/</p><p>TP2017.1-02</p><p>Loukissa, D. (2007). Under diagnosis of alcohol misuse in the older adult</p><p>population. British Journal of Nursing. 16: 1254-1258. [PubMed:</p><p>18073655]</p><p>Lourenção, V. C., Junior, R. S., & Luiz, A. M. (2010). Aplicações da Terapia</p><p>Cognitivo-Comportamental em Tratamentos de Câncer. Revista Bra-</p><p>sileira de Terapias Cognitivas, 45-58. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.</p><p>php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872009000200006</p><p>Mansur, A. & Favarato, D. (2012). Mortalidade por doenças cardiovasculares</p><p>no Brasil e na Região Metropolitana de São Paulo: Atualização 2011.</p><p>Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 99, n. 2, p. 755-761. https://</p><p>doi.org/10.1590/S0066-782X2012005000061</p><p>McLoone J, Menzies S, Meiser B, Mann G.J., & Kasparian N.A. (2013).</p><p>Psycho-educational interventions for melanoma survivors: a systematic</p><p>review. Psycho-Oncology, 22 (7): 1444-1456. Doi: 10.1002/pon.3165.</p><p>https://doi.org/10.1002/pon.3165</p><p>Monego, E. T; Jardim, P. C. B. V. (2006). Determinantes de risco para</p><p>doenças cardiovasculares em escolares. Arquivos Brasileiros de</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 73</p><p>Cardiologia, São Paulo, v. 87, n. 1, p. 37-45. https://doi.org/10.1590/</p><p>S0066-782X2006001400006</p><p>Moorey, S., Watson, M. (2015). Cognitive therapy. W: Holland J, Breitbart</p><p>W, Butow P, Jacobsen P, Loscalzo M, Mccorkle R. Psychooncology.</p><p>Oxford: Oxford University Press. s. 458-463.</p><p>Rudnicki, T., Oliveira, C. d., & Rosa, M. (2018). Terapia Cognitivo-Compor-</p><p>tamental e Intervenções com Pacientes Oncológicos. In: C. Neufeld,</p><p>E. Falcone, & B. Rangé, PROCOGNITIVA Programa de Atualização</p><p>em Terapia Cognitivo-Comportamental: Ciclo 5 (p. 55-76). Porto</p><p>Alegre: Artmed Panamericana.</p><p>Santana, V. S., & Lopes, R. F. (2016). Coping Cards com Pacien-</p><p>tes oncológicos: uma proposta de instrumento psicoeducativo.</p><p>Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 12-19. https://doi.</p><p>org/10.5935/1808-5687.20160003</p><p>Schaie, K. W. (005). What Can We Learn From Longitudinal Studies of Adult</p><p>Development? Research on Human Development. 2: 133-158. https://</p><p>doi.org/10.1207/s15427617rhd0203_4</p><p>Schmidt, M. I., Duncan, B. B., Silva, G. A., Menezes, A. M., Monteiro, C. A.,</p><p>Barreto, S. M., Chor, D., &Menezes, P. S. (2011). Doenças crônicas</p><p>não transmissíveis no Brasil: carga e desafios atuais. The Lancet Series,</p><p>v. 4, p. 61-74. https://www.scielo.br/pdf/rsp/v46s1/17.pdf</p><p>Souza, J. R., & Araújo, T. C. (2010). Eficácia Terapêutica de Intervenção</p><p>em grupo psicoeducacional: um estudo exploratório em Onco-</p><p>logia. Estudos de Psicologia, 187-196. https://doi.org/10.1590/</p><p>S0103-166X2010000200006</p><p>Telch, C. F., & Telch, M. J. (1986). Group coping skills instruction and sup-</p><p>portive group therapy for cancer patients: A comparison of strategies.</p><p>Journal of Consulting and Clinical Psychology, 54 (6), 802. https://</p><p>doi.org/10.1037/0022-006X.54.6.802</p><p>Vilaça, A. P. (2018). A Psico-Oncologia à Luz da Terapia Cognitivo-Com-</p><p>portamental: Modelo Cognitivo Funcional para Paciente Portador</p><p>de Câncer. 1-158. São Paulo, SP.</p><p>74</p><p>Watson, M. & Kissane, D. (2011). Handbook of Psychotherapy in Cancer</p><p>Care. Oxford, UK. Wiley-Blackwell.</p><p>Wenzel, A. (2012). Modifications of core beliefs in cognitive therapy. Rijeka,</p><p>Croatia: In Tech.</p><p>Zettle, R. (2007). A.C.T. for depression: A clinician’s guide to using accep-</p><p>tance and commitment therapy in treating depression. Oakland, CA:</p><p>New Harbinger Publications.</p><p>CAPÍTULO 4</p><p>AS REPERCUSSÕES EMOCIONAIS DO</p><p>CÂNCER ASSOCIADAS À GRAVIDEZ:</p><p>uma revisão integrativa</p><p>Igor Weyber da Silva Ramos</p><p>Isabel Regiane Cardoso do Nascimento</p><p>Keyssiane Maria de Alencar Lima</p><p>As mulheres têm progressivamente adquirido mais independência, con-</p><p>quistando mais autonomia tanto profissionalmente quanto em relação à família,</p><p>dentro do modelo socioeconômico vigente, seu espaço na sociedade vem se</p><p>consolidando cada vez mais. Para Cipriano e Oliveira (2016) isso justifica a</p><p>tendência atual das mulheres optarem pela gravidez para a terceira ou quarta</p><p>década de vida.</p><p>No entanto, devido a alguns fatores de risco como a idade e o maior</p><p>tempo de exposição das mulheres a condições ambientais e agentes cance-</p><p>rígenos exógenos, existe a possibilidade de o diagnóstico de câncer ocorrer</p><p>durante a gravidez ou no período de amamentação.</p><p>Em contraste, há também a contribuição da crescente incidência do câncer</p><p>de mama em pacientes jovens pelo avanço da história natural da doença, que</p><p>está se modificando pelas condições ambientais e também pela disseminação dos</p><p>programas de prevenção e conscientização relativos ao câncer, que elevaram o</p><p>número de mulheres cada vez mais jovens à procura de exames de rastreamento,</p><p>diagnosticando o câncer mais precocemente (Cipriano & Oliveira, 2016).</p><p>Costa et al. (2006) apontam que entre as mulheres os tipos de cânceres</p><p>mais prevalentes são o câncer no colo do útero, câncer de mama, melanoma,</p><p>câncer de ovário, câncer de tireóide, leucemia, linfoma e câncer colorretal.</p><p>Nesse sentido, o câncer associado à gestação pode ser definido como aquele</p><p>que ocorre durante a gravidez ou até um ano pós-parto, ou qualquer período</p><p>durante a amamentação (Carvalho et al., 2008).</p><p>Compreende-se que o diagnóstico de câncer traz consigo a representa-</p><p>ção sociocultural de morte e sofrimento acarretando inúmeras repercussões</p><p>emocionais negativas no indivíduo. No caso do câncer associado à gravi-</p><p>dez, Ferrari (2018) refere que este acometimento simultâneo potencializa os</p><p>sentimentos</p><p>da Silva Noal</p><p>ÍNDICE REMISSIVO ..............................................................................................267</p><p>SOBRE OS AUTORES E ORGANIZADORES .....................................................275</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>Esta obra é a junção da teoria com as experiências práticas de diversos</p><p>profissionais de saúde mental atuantes no contexto da Cancerologia. Com</p><p>olhares voltados para todas as fases do desenvolvimento humano: iniciando</p><p>pela infância, adolescência, fase adulta e idosa. Assim como para todas as</p><p>etapas do processo de tratamento oncológico, suas perdas e lutos implicados,</p><p>estando o paciente em condições clínicas curativas ou não.</p><p>Aborda também questões como a estrutura de personalidade do sujeito</p><p>e criação de modos de enfrentamento do câncer, as repercussões psicológicas</p><p>que este diagnóstico acarreta, podendo, inclusive, evoluir para um transtorno</p><p>psiquiátrico. Sendo assim, possibilidades de intervenção em diversas abor-</p><p>dagens do estudo da psicologia são mencionadas, assim como a eficácia da</p><p>terapia lúdica com as crianças em tratamento oncológico.</p><p>Por fim, o livro apresenta dois capítulos relacionados ao tratamento do</p><p>câncer em tempos de COVID-19, tema atual, que trouxe uma crise sanitária e</p><p>econômica sem precedentes no Brasil e no mundo, e exigiu dos profissionais</p><p>que trabalham na área da Oncologia adaptações constantes de seu fazer para</p><p>dar continuidade ao tratamento oncológico de seus pacientes. Portanto, trata-se</p><p>de um livro completo na medida em que abrange espiritualidade, cuidados</p><p>paliativos e luto, e temas atuais. Assim como aponta que os envolvidos neste</p><p>processo de doença vão além do paciente, implicando em questões emocionais</p><p>também em seus familiares e na equipe de saúde.</p><p>Portanto, trata-se de um livro completo na medida em que abrange espi-</p><p>ritualidade, cuidados paliativos e luto. Assim como aponta que os envolvidos</p><p>neste processo de doença vão além do paciente, implicando em questões</p><p>emocionais também em seus familiares e na equipe de saúde.</p><p>PREFÁCIO</p><p>Nos dias de hoje, muito se fala sobre os temas tratados nesta obra. Sua</p><p>publicação é uma ótima notícia, pois estamos ainda carentes de elementos</p><p>aqui trabalhados por profissionais da área da saúde. Desta forma, me sinto</p><p>honrada pelo convite de prefaciar este livro.</p><p>Na prática do psicólogo, é importante ter uma boa orientação ao longo do</p><p>caminho, tendo em vista que muitas variáveis estão em jogo na vida cotidiana</p><p>de todos: bem-estar, equilíbrio mental, qualidade de vida, relacionamentos e</p><p>comportamento frente a dificuldades. Tenho certeza de que as mãos experien-</p><p>tes dos autores poderão nos guiar nessa labuta. Os capítulos estão apoiados</p><p>na prática cotidiana dos autores e em estudos fidedignos. Desta forma, é com</p><p>grande entusiasmo que prefacio a publicação da primeira edição do livro “A</p><p>Atuação da Psico-oncologia: reflexões e possibilidades de intervenção”.</p><p>Os capítulos trazem contribuições de profissionais em diferentes práticas</p><p>e formas de abordar sua vivência, tecendo uma rede de cuidados que inclui</p><p>diversos espaços pelos quais os pacientes, família e equipe transitam. Desta</p><p>forma o Livro oferece caminhos através de pesquisas e reflexões.</p><p>A história da psicologia no que se refere ao trabalho com pacientes</p><p>oncológicos, no combate e adaptação ao tratamento do câncer percorreu um</p><p>longo caminho. O Livro foi construído enfatizando a psicologia baseada em</p><p>evidências, para que seus leitores tenham clareza de que cada opção de abor-</p><p>dagem é singular e de reconhecida importância, introduzindo o que é ímpar</p><p>a cada ator presente na situação de doença oncológica – o paciente, a família</p><p>e a equipe de saúde, visando cuidar e crescer em termos de conhecimento,</p><p>buscando melhorar o atendimento ao enfermo.</p><p>A presente obra traz temas diretamente relacionados à psicologia na</p><p>área da oncologia, desde atendimento infantil ao adulto, cooperação e escla-</p><p>recimentos sobre abordagens da psicologia e a prática profissional de cada</p><p>colaborador. O título sugere a vinculação entre esses temas – ‘Psicologia na</p><p>Oncologia’, caminhos, reflexões e comportamento humano.</p><p>O capítulo 1 fala do tema da ‘Avaliação da personalidade’, retratando a</p><p>situação atual do câncer, mostrando questões da personalidade e suas influên-</p><p>cias na vida dos enfermos. O capítulo 2 trata da abordagem da Gestalt terapia</p><p>no adoecimento, e sua prática junto à pacientes oncológicos.</p><p>O capítulo 3 aborda o aspecto ‘multifatorial do câncer: intervenções e</p><p>desafios no tratamento psicológico’. Abrange o câncer enquanto doença crô-</p><p>nica e o quanto afeta a vida do paciente em muitos aspectos, como na imagem</p><p>corporal e depressão. Dessa forma, os autores identificam, através de exce-</p><p>lente revisão bibliográfica, aspectos que devem ser estudados, apresentando</p><p>14</p><p>dados da eficácia da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) junto ao</p><p>paciente oncológico.</p><p>O capítulo seguinte (4) trata das ‘repercussões emocionais do câncer</p><p>associado à gravidez: uma revisão integrativa’ e mostra sensações ambíguas de</p><p>vida e morte, gerando conflitos emocionais e éticos para todos os envolvidos,</p><p>desafiando cada vez mais o alcance da integralidade do cuidado prestada pela</p><p>equipe médica e multiprofissional.</p><p>Logo em seguida, o capítulo 5, trata de tema atual e instigante, os ‘cui-</p><p>dados paliativos: compreensão dos profissionais’. A partir do avanço da medi-</p><p>cina, a luta contra doenças potencialmente fatais e a própria morte tem se</p><p>estendido, prolongando a vida e o próprio sofrimento daqueles que já não</p><p>apresentam possibilidade de cura. O capítulo aponta dois temas importantes</p><p>– o cuidado com o doente e família e a própria equipe. Os profissionais que</p><p>atuam atualmente com cuidado paliativo (CP) necessitam de um treinamento</p><p>diferenciado, conhecimento e reconhecimento sobre o real significado deste</p><p>cuidado. O capítulo refere conteúdo sobre a bioética e aborda conceitos</p><p>presentes no modelo do CP e no processo de morte.</p><p>O capítulo 6 trata dos ‘Transtornos psiquiátricos em pacientes oncológi-</p><p>cos’. O diagnóstico de um câncer possui um efeito devastador para o paciente,</p><p>trazendo ainda a ideia de morte, embora atualmente ocorram muitos casos de</p><p>cura. O câncer facilita um aumento na morbidade psiquiátrica, tornando-se</p><p>assim, fator de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais em geral.</p><p>Sintomas de sofrimento psíquico e físico podem emergir ao longo do tratamento</p><p>oncológico, frequentemente combinado com os sintomas da própria doença.</p><p>O capítulo 7 trata sobre o ‘luto antecipatório’, mostrando que o fenômeno</p><p>do luto é um processo psíquico natural e indispensável para a elaboração da</p><p>perda e reajustamento ao mundo e à vida diante da ausência do que foi perdido.</p><p>O contexto histórico do tema foi trabalhado pelas autoras, dando significado ao</p><p>trabalho. O termo foi utilizado pela primeira vez por Lindemann, em 1944, a</p><p>partir da observação das esposas de soldados que iam para a guerra. Saber que</p><p>talvez eles não voltassem, acionava o gatilho do sentimento de perda e todas</p><p>as consequências emocionais que a situação evocava. De um lado, temos que</p><p>nos preparar para a morte que se avizinha e, de outro, precisamos dedicar toda</p><p>atenção e carinho ao paciente em fase terminal. Esse contraponto da vivência</p><p>mostra, no dizer de Arantes, que ‘a morte nos ensina a viver’.</p><p>O capítulo seguinte (8), traz um tema atual e de importância fundamental,</p><p>a espiritualidade. Até pouco tempo atrás, falar em espiritualidade se resumia</p><p>a considerar os temas pertinentes à religião. Atualmente, é temática que atra-</p><p>vessa o interesse de várias áreas do conhecimento. As autoras mostram que</p><p>é uma forma de enxergar e encarar a realidade, não se relacionando, neces-</p><p>sariamente, com religião. Trata dos sentimentos que nutrem a pessoa no seu</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 15</p><p>cotidiano, na forma como ela encara seus problemas. O próximo capítulo (9),</p><p>trata do ‘Crescimento Pós-Traumático, em mulheres sobreviventes</p><p>de medo, culpabilização, ansiedade e depressão. Além disso, é</p><p>compreensível que nessas mulheres coexistam sensações ambíguas de vida</p><p>e morte, gerando conflitos emocionais e éticos tanto para a paciente como</p><p>76</p><p>para seus familiares, desafiando cada vez mais o alcance da integralidade do</p><p>cuidado prestada pela equipe médica e multiprofissional.</p><p>Para Costa e Souza (2018) no contexto em que a doença oncológica</p><p>ocorre simultaneamente à gravidez, o processo de decisão sobre a terapêutica</p><p>e os cuidados a serem realizados é muito mais complexo, pois os protocolos a</p><p>serem usados no tratamento devem ponderar entre os riscos que podem existir</p><p>tanto para a mãe quanto para o feto.</p><p>Nessa conjuntura, as produções científicas em sua maioria são voltadas</p><p>para a intervenção biológica do câncer com enfoque no tratamento e reabilita-</p><p>ção do processo de adoecimento oncológico associado à gravidez. Capelozza,</p><p>Peçanha, Mattar e Sun (2014) afirmam que são escassos os estudos sobre os</p><p>sentimentos das pacientes, seus familiares, como também dos membros da</p><p>equipe de saúde frente à associação gravidez e câncer.</p><p>Visando contribuir com ampliação de discussões sobre temática, o pre-</p><p>sente trabalho objetiva debater através de revisão integrativa da literatura</p><p>sobre as principais repercussões emocionais que acometem mulheres e seus</p><p>familiares ao enfrentarem o adoecimento oncológico associado à gravidez.</p><p>Faz-se necessário contribuir para produção de estudos que explorem os</p><p>aspectos emocionais e psicológicos dos que sofrem com o câncer durante o</p><p>período que envolve a gestação, pois é refletindo sobre o paradoxo de vida</p><p>e morte coexistente nessas mulheres e suas famílias que os profissionais de</p><p>saúde poderão desenvolver competências e habilidades que norteiem atitudes</p><p>humanizadas dentro do processo de cuidado em saúde.</p><p>Metodologia</p><p>O presente trabalho é de natureza qualitativa e cunho exploratório, estru-</p><p>turado a partir dos fundamentos metodológicos da revisão integrativa, que</p><p>permite a combinação de dados teóricos e empíricos, conceitos, teorias e</p><p>problemas, para uma compreensão completa dos fenômenos analisados. A</p><p>partir da síntese dos conhecimentos adquiridos é possível a incorporação de</p><p>suas aplicações significativas na prática (Souza, Silva & Carvalho, 2010).</p><p>Para o levantamento de dados bibliográficos foram realizadas pesquisas</p><p>nas seguintes bases eletrônicas: US National Library of Medicine (PubMed),</p><p>Medical LiteratureAnalysisandRetrievalSistem on-line (Medline), ScientificE-</p><p>lectronic Library Online (Scielo) e Literatura Latino-Americana e do Caribe</p><p>em Ciências da Saúde (Lilacs). Foram utilizados como descritores de pesquisa</p><p>nas línguas portuguesa e inglesa: ‘Gestantes’, ‘Neoplasias’ e ‘Psicologia’.</p><p>Foram definidos como critérios de inclusão: artigos publicados na ínte-</p><p>gra nos idiomas Português e/ou Inglês e indexados nos últimos cinco anos</p><p>(2014-2019); pesquisas realizadas com seres humanos, e que delinearam como</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 77</p><p>escopo de estudo os fatores psicossociais que permeiam as neoplasias malig-</p><p>nas em mulheres, seus impactos frente à expectativa gestacional, durante a</p><p>gestação ou no período puerperal. Foram excluídos deste estudo os trabalhos</p><p>que tratam exclusivamente de métodos, técnicas, procedimentos e avaliações</p><p>medicamentosas e biomédicas. Artigos que não estavam disponíveis na íntegra</p><p>não foram incluídos nesta revisão.</p><p>A Tabela 1 apresenta os resultados quantitativos dos periódicos encon-</p><p>trados e selecionados a partir dos descritores definidos. Como resultados da</p><p>busca inicial, foram obtidos: PubMed = 17 artigos; Medline = 21 artigos;</p><p>Lilacs = 01 artigo; a base de dados Scielo não gerou resultados; somando um</p><p>total de 39 artigos. A seleção dos periódicos foi realizada de forma descritiva</p><p>a partir do título, do resumo e dos objetivos da pesquisa. Após análise dos</p><p>artigos quanto aos critérios de inclusão, estes foram apreciados em sua ínte-</p><p>gra, resultando em uma seleção quantitativa de 07 artigos da PubMed e 04</p><p>da Medline. Dentre os periódicos selecionados, 04 estavam disponíveis em</p><p>ambas bases de dados, resultando em uma seleção de 07 artigos.</p><p>Tabela 1 – Resultados quantitativos dos periódicos encontrados e selecionados</p><p>PubMed Medline Lilacs Scielo Total</p><p>Resultados da busca 17 21 1 0 39</p><p>Periódicos selecionados 7 4 0 0 11*</p><p>*Os periódicos semelhantes encontrados em diferentes bases de dados foram levados em</p><p>conta na análise quantitativa, e estão apontados na coluna “Base de dados” do Quadro 1.</p><p>Resultados</p><p>O Quadro 1 descreve os artigos selecionados a partir das buscas rea-</p><p>lizadas nas bases de dados e da avaliação de adequação aos critérios. São</p><p>descritos o título do artigo, as respectivas bases de dados, os autores, ano de</p><p>publicação e objetivos do trabalho.</p><p>Quadro 1 – Descrição dos periódicos selecionados</p><p>Nº Título</p><p>Base de</p><p>dados</p><p>Autores/Ano Objetivos</p><p>01</p><p>PregnancyOutcomesAfter a Breast-</p><p>CancerDiagnosis: A Systematic Re-</p><p>view and Meta-analysis.</p><p>PUBMED</p><p>Gerstl B, Sullivan E,</p><p>Ives A, Saunders C,</p><p>Wand H, Anazodo</p><p>A, 2018</p><p>Explorar os</p><p>resultados reprodutivos, con-</p><p>siderando a gravidez, aborto,</p><p>interrupção da gravidez e nas-</p><p>cidos vivos, após o tratamento</p><p>de câncer de mama.</p><p>continua...</p><p>78</p><p>Nº Título</p><p>Base de</p><p>dados</p><p>Autores/Ano Objetivos</p><p>02</p><p>Risk-benefitperceptionofpregnan-</p><p>cyamongbreastcancersurvivors.</p><p>PUBMED/</p><p>MEDLINE</p><p>Hsieh P. L, Huang S.</p><p>M, Chien L. Y, Lee</p><p>C. F, Hsiung Y, Tai</p><p>C. J, 2017</p><p>Compreender os aspectos de</p><p>risco-benefício na escolha pela</p><p>concepção ou contracepção</p><p>após o tratamento de câncer</p><p>em Taiwan.</p><p>03</p><p>AfterChemotherapyTreatment for</p><p>Maternal CancerDuringPregnancy,</p><p>IsBreastfeedingPossible?</p><p>PUBMED</p><p>Stopenski S, Aslam</p><p>A, Zhang X, Car-</p><p>donick E, 2017</p><p>Relatar as queixas de aleita-</p><p>mento materno de mulheres</p><p>diagnosticadas com câncer</p><p>durante a gravidez, correlacio-</p><p>nando positividade no prognós-</p><p>tico com as características de</p><p>seu tratamento.</p><p>04</p><p>Psychologicaldistressandcogniti-</p><p>vecoping in pregnantwomendiag-</p><p>nosedwithcancerandtheirpartners.</p><p>PUBMED</p><p>Vandenbroucke T, et</p><p>al. 2017</p><p>Identificar risco de altos índices</p><p>de sofrimento em mulheres</p><p>diagnosticadas com câncer</p><p>durante a gravidez e seus par-</p><p>ceiros, com base em seu perfil</p><p>de enfrentamento.</p><p>05</p><p>Unintendedpregnancy: a system-</p><p>atic review ofcontraception use</p><p>andcounseling in womenwithcan-</p><p>cer.(Report)</p><p>PUBMED/</p><p>MEDLINE</p><p>Britton L, 2017</p><p>Identificar as necessidades</p><p>não atendidas de serviços de</p><p>planejamento familiar entre</p><p>mulheres com câncer, descre-</p><p>vendo a prevalência de aconse-</p><p>lhamento sobre contracepção,</p><p>uso de contraceptivos, gravidez</p><p>indesejada e aborto.</p><p>06</p><p>Counsellingpregnantwomenwith-</p><p>cancer.</p><p>PUBMED/</p><p>MEDLINE</p><p>Karunaratne K,</p><p>Premaratne S,</p><p>Hapuachchige C,</p><p>Ihalagama H, 2016</p><p>Descrever a importância da prá-</p><p>tica do Aconselhamento por parte</p><p>da equipe multidisciplinar junto a</p><p>mulheres grávidas com câncer.</p><p>07</p><p>Family ties: youngbreastcancerpa-</p><p>tientsandtheirchildren.</p><p>PUBMED/</p><p>MEDLINE</p><p>Güth U, Huang D.</p><p>J, Alder J, Moffat R,</p><p>2015</p><p>Avaliar a interação de</p><p>laços familiares em pacientes</p><p>jovens com câncer de mama.</p><p>Caracterização dos Dados</p><p>Os artigos selecionados foram produzidos com diferentes objetivos e</p><p>abordagens metodológicas, fornecendo subsídios para aquisição de conhe-</p><p>cimentos variados e uma melhor compreensão do fenômeno estudado, das</p><p>produções existentes sobre a temática, e as interfaces psicossociais existentes</p><p>entre o contexto estudado.</p><p>Conforme representado no Quadro 1, percebe-se uma maior frequência</p><p>de publicações no ano de 2017 (2, 3, 4, 5). Apenas uma publicação no ano</p><p>continuação</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 79</p><p>de 2018 (1),uma em 2016 (6) e uma em 2015 (7). Todos os artigos são pro-</p><p>duções internacionais (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7), dentre os quais foram publicados</p><p>respectivamente: 1 – Clinical Breast Cancer; 2 – European Journal of Cancer</p><p>Care; 3 – Breastfeeding Medicine; 4 – Psycho‐Oncology; 5 – Clinical Journal</p><p>of Oncology Nursing; 6 – Best Practice & Research Clinical Obstetrics and</p><p>Gynaecology; e 7 – Swiss Medical Weekly. As características metodológicas</p><p>dos trabalhos selecionados são: dois artigos de abordagem qualitativa (2, 4),</p><p>com a realização de entrevistas em profundidade e aplicação de questionários;</p><p>três estudos de caráter quantitativo, uma metanálise (1), com predomínio em</p><p>estudos de coorte prospectivo (3, 7); uma revisão sistemática (5); e outra de</p><p>caráter descritivo (6).</p><p>Discussão</p><p>A vivência do sofrimento psíquico decorrente do risco de infertilidade,</p><p>recidiva da doença relacionada à gravidez, e efeitos tardios da doença após</p><p>tratamento de câncer foram apontados nos estudos como fatores ansiogênicos</p><p>e que causam medo nas mulheres, o que leva ao retardo do planejamento</p><p>familiar ou colabora para a interrupção da gestação, podendo esta decisão</p><p>está associada a preocupações psicossociais e também relacionada à saúde</p><p>do feto, tendo em vista a incerteza de uma gestação segura.</p><p>Os estudos de Gerstl et al. (2018) exploraram os resultados reprodutivos,</p><p>considerando a gravidez, aborto, interrupção da gravidez e nascidos vivos,</p><p>após o tratamento de câncer de mama, de mulheres com idade reprodutiva</p><p>e sobreviventes da doença e tratamento do câncer de mama, que optaram</p><p>pela tentativa de gestação. A pesquisa englobou 54 estudos, distribuídos em</p><p>estudos populacionais, estudos de coorte, estudo de controle de caso, ensaio</p><p>controlado randomizado, estudo retrospectivo em corte transversal e revisões</p><p>retrospectivas, nos quais analisaram 2.523 mulheres que engravidaram após</p><p>tratamento de câncer de mama, num período que variou de 11-63 meses, tendo</p><p>como intervalo médio 29 meses.</p><p>O estudo ressalta a importância da informação às mulheres que vivenciam</p><p>o adoecimento e tratamento de câncer de mama e que passam por diferen-</p><p>tes formas de tratamento, a exemplo, cirurgia, quimioterapia, radioterapia e</p><p>hormonioterapia, sobre os efeitos de curto e longo prazo no funcionamento</p><p>geral do corpo, incluindo fertilidade e qualidade de vida (Gerstl et al., 2018).</p><p>Mulheres com diagnóstico de câncer de mama RER positivo são apontadas</p><p>nos estudos como aquelas que apresentam maior impossibilidade de gestar</p><p>quando comparadas as com RER negativo. A taxa de aborto esteve em torno</p><p>de 12% nos casos de tratamentos combinados.</p><p>80</p><p>As contribuições de Hsieh et al. (2017) compreendem os aspectos de</p><p>risco-benefício na escolha pela concepção ou contracepção após o tratamento</p><p>de câncer em Taiwan. Participaram 16 mulheres, destas 9 estavam tentando</p><p>engravidar e 7 usavam métodos contraceptivos, a média de anos após trata-</p><p>mento foi em torno de 6,8. Frente à possibilidade de gravidez após quimio-</p><p>terapia, as participantes demonstraram a ponderação com base na análise</p><p>do risco-benefício entre concepção e contracepção baseando-se na situação</p><p>pessoal e estado clínico.</p><p>As dimensões apontadas sobre o risco-benefício da gestação após tra-</p><p>tamento para câncer de mama: o estado de saúde (relacionada ao bem-estar</p><p>da paciente); a segurança (envolve o medo de que o tratamento para o câncer</p><p>possa afetar a saúde do bebê); o prejuízo (riscos de danos potenciais para</p><p>a saúde da gestante); ganho esperado (refere-se aos benefícios de gestar e</p><p>criar um filho); carregando (percepção do risco de desgaste físico durante a</p><p>gravidez); apoio e suporte (implicado a percepção do nível de assistência de</p><p>familiares, amigos e profissionais de saúde); tempo (limitação pelo risco de</p><p>uma idade reprodutiva) (Hsieh et al., 2017).</p><p>As pesquisas incluídas nesta revisão, também mostraram que pacientes</p><p>cuja fertilidade foi afetada pelo tratamento do câncer estiveram propensas</p><p>a experimentar reações emocionais negativas. A angústia psicossocial rela-</p><p>cionada à gravidez interrompida é considerada intensa e persistente, prin-</p><p>cipalmente entre mulheres em nuliparidade. As preocupações com a vida</p><p>reprodutiva e o desejo de gestar também estiveram relacionados aos sintomas</p><p>depressivos (Hsieh et al., 2017).</p><p>Os estudos de Stopenski et al. (2017) relataram as queixas de aleita-</p><p>mento materno de mulheres diagnosticadas com câncer durante a gravidez,</p><p>correlacionando positividade no prognóstico com as características de seu</p><p>tratamento. Foram incluídas no estudo mulheres que engravidaram e tentaram</p><p>amamentar após vivenciar o diagnóstico e tratamento por diferentes tipos</p><p>de câncer, sendo os mais recorrentes no estudo os casos de mama, linfoma</p><p>Hodgkin e não- Hodgkin, ovário, colorretal e tireóide, incluídas no registro</p><p>do Hospital Universitário de Cooper, totalizando 96 mulheres. Destas, 45</p><p>produziram leite e conseguiram amamentar, 32 não conseguiram produzir</p><p>leite e 19 produziram pouco leite, não sendo suficiente para amamentar. A</p><p>diferença entre as participantes esteve relacionada ao período da gestação</p><p>em que foi administrada a quimioterapia e aquelas que não foram tratadas</p><p>por quimioterapia.</p><p>Quando submetidas à quimioterapia durante a gravidez as participan-</p><p>tes apresentaram uma produção de leite reduzida, no entanto, ao realizar</p><p>o tratamento em torno de 3 semanas antes do parto, não foram percebi-</p><p>dos efeitos adversos sobre as crianças amamentadas. Fatores como tipo de</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 81</p><p>câncer, o estágio, a idade materna, depressão, idade gestacional ao término</p><p>da quimioterapia, não estiveram relacionadas ao sucesso da amamentação.</p><p>Considerando o possível impacto da quimioterapia sobre a amamentação,</p><p>conclui que é necessário orientar as pacientes sobre a probabilidade de ocor-</p><p>rência de diminuição ou nenhuma produção de leite materno, evitando ou</p><p>minimizando efeitos de um sofrimento adicional, visto que a amamentação</p><p>beneficia a criança e também a mãe ao proporcionar dentre outros ganhos a</p><p>experiência do vínculo materno (Stopenski et al., 2017).</p><p>A identificação do risco de altos índices de sofrimento em mulheres</p><p>diagnosticadas com câncer durante a gravidez e seus parceiros, com base em</p><p>seu perfil de enfrentamento, foi o objetivo da produção de Vandenbroucke et</p><p>al. (2017), que dada à raridade da gestação concomitante ao diagnóstico de</p><p>câncer, recrutou mulheres e seus parceiros oriundos da Bélgica e da Holanda,</p><p>retrospectivamente após o parto e prospectivamente antes do parto, no registro</p><p>da Rede Internacional sobre o Câncer, Infertilidade e Gravidez, totalizando 122</p><p>participantes. Mulheres grávidas diagnosticadas com câncer apresentaram</p><p>níveis significativos de angústia, quando comparadas a mulheres grávidas</p><p>saudáveis. O estudo apontou o uso de estratégias de enfrentamento usadas</p><p>para melhor lidar com o fator estressor, a saber, autoculpa, catastrofização,</p><p>aceitação e focar no planejamento.</p><p>A aceitação e focar no planejamento foram estratégias consideradas como</p><p>facilitadoras do processo emocional vivenciado, estando, portanto, associados</p><p>com menos sintomas depressivos e de ansiedade. Ainda foi relatada a escassez</p><p>de conhecimento sobre as preocupações experienciadas por mulheres grávidas</p><p>diagnosticadas com câncer e seus parceiros (Vandenbroucke et al., 2017).</p><p>Vandenbroucke et al. (2017) evidenciam que as repercussões emocio-</p><p>nais vivenciadas pelas mulheres grávidas diagnosticadas com câncer e por</p><p>seus parceiros foram semelhantes em relação a preocupação com a saúde da</p><p>criança, sobre a doença e tratamento, a gravidez e o parto, diferenciando-se no</p><p>que concerne a manutenção da gravidez, cujas mulheres se mostraram mais</p><p>favoráveis quando comparadas aos parceiros. Mulheres e parceiros que utili-</p><p>zaram estratégias de enfrentamento positivas apresentaram nível de estresse</p><p>reduzido. Com base nos resultados encontrados, os autores ressaltam sobre a</p><p>importância da avaliação dos níveis de angústia e preocupação por mulheres</p><p>e seus parceiros para que seja verificada a necessidade de apoio psicossocial.</p><p>As pesquisas apontam que há possibilidade de gravidez ao longo de todo</p><p>o processo de tratamento contra o câncer, porém, é um fenômeno dotado de</p><p>incertezas,</p><p>tendo em vista a existência de poucos estudos que abordam essa</p><p>temática e a limitação para tais evidências. Embora a gravidez nem sempre</p><p>afete diretamente o prognóstico da doença, as opções de tratamento para</p><p>o câncer aumentam os riscos de parto prematuro e de abortamento. Nesse</p><p>82</p><p>sentido, são muito importantes as ações de aconselhamento por parte da</p><p>equipe multidisciplinar e com profissional especialista sobre as temáticas de</p><p>contracepção e fertilidade durante e após o tratamento para as mulheres com</p><p>câncer, favorecendo assim o planejamento familiar e desmistificando concei-</p><p>tos previamente concebidos, evitando risco de gravidez indesejada durante</p><p>o manejo clínico do tratamento contra o câncer (Britton, 2017; Karunaratne,</p><p>Premaratne, Hapuachchige & Ihalagama, 2016).</p><p>O trabalho de revisão sistemática realizado por Britton (2017) demonstra</p><p>que há ocorrência de casos de gravidez indesejada e aborto em todo o período</p><p>dos cuidados oncológicos, que corresponde o diagnóstico, o tratamento e o</p><p>prognóstico. Estudos apontam que no período do tratamento as mulheres</p><p>continuavam sexualmente ativas, sem desejar conceber gravidez e sem fazer</p><p>ou parando o uso de contraceptivos, tendo por base a crença de infertilidade,</p><p>o que aumentaria a ocorrência de gravidez indesejada durante o tratamento</p><p>ou depois de finalizado. A fertilidade, nesse sentido, é aspecto de frustração e</p><p>incertezas, somando-se a sobrecarga adquirida com o diagnóstico e as reper-</p><p>cussões do tratamento.</p><p>Os estudos apresentam produções científicas que evidenciam a neces-</p><p>sidade de aconselhamento por parte da equipe multiprofissional sobre con-</p><p>tracepção, aborto e gravidez não planejada, para mulheres acometidas pelo</p><p>câncer e suas famílias, tendo em vista a necessidade de planejamento familiar</p><p>nessas circunstâncias. Nesse sentido, o autor pontua como de fundamental</p><p>importância a identificação das preferências da paciente, a investigação de</p><p>suas experiências e suas perspectivas com relação à gravidez durante o diag-</p><p>nóstico, o tratamento e o prognóstico (Britton, 2017).</p><p>Receber um diagnóstico de câncer durante a gravidez é um acontecimento</p><p>inesperado e traumático, tanto para a paciente, quanto para seu companheiro e</p><p>família. Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) ressaltam</p><p>que os profissionais da equipe multidisciplinar, devidamente treinados em</p><p>habilidades comunicativas, podem minimizar o sofrimento da paciente e de</p><p>seus familiares. O método do Aconselhamento, centrado fundamentalmente</p><p>na paciente, aborda efetivamente os aspectos emocionais e comportamentais,</p><p>levando em consideração suas preocupações, ideais e desejos.</p><p>Há existência de medos por parte das mulheres grávidas relacionados ao</p><p>tratamento e a evolução da gravidez, bem como, também após o tratamento</p><p>existe receio de engravidar e haver recorrência da doença, nesse sentido, é</p><p>experienciado uma eclosão de emoções conflitantes de felicidade pela gravidez</p><p>e o risco de sua vida pelo diagnóstico de câncer (Karunaratne, Premaratne,</p><p>Hapuachchige & Ihalagama, 2016).</p><p>Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) apontam</p><p>que durante o processo de Aconselhamento de mulheres grávidas com câncer,</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 83</p><p>devem ser levados em consideração os seguintes fatores que envolvem o</p><p>bem-estar materno e fetal por parte da equipe oncológica e obstétrica: a possi-</p><p>bilidade da história natural do câncer ser afetada pela gravidez; a possibilidade</p><p>do feto ser afetado pelo câncer; as vantagens terapêuticas da interrupção da</p><p>gravidez; a possibilidade do feto ser prejudicado pelo tratamento; a necessi-</p><p>dade de acompanhamento no período pré-natal e pós-natal; e a possibilidade</p><p>de futuras gestações.</p><p>As informações prestadas à paciente e aos familiares devem sempre ser</p><p>embasadas em evidências científicas, prestadas de forma clara, imparcial, e</p><p>que levem em consideração os valores, crenças, interesses, prioridades e preo-</p><p>cupações da paciente, a fim de que facilite uma tomada de decisão importante</p><p>como a interrupção da gravidez ou a continuação do tratamento. A família e o</p><p>parceiro, quando em um papel ativo, podem ser um importante recurso cola-</p><p>borativo, fortalecendo a paciente emocionalmente fragilizada. Porém, quando</p><p>compartilham dos mesmos sentimentos ou com maiores intensidades que a</p><p>paciente, podem reduzir a eficácia do seu apoio ou intervir negativamente</p><p>(Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige & Ihalagama, 2016).</p><p>Já é conhecido que o estresse durante a gestação tem resultados adversos,</p><p>tais como, parto prematuro, baixo peso ao nascer e deficiências no desen-</p><p>volvimento neurológico. A angústia vivenciada afeta diretamente a relação</p><p>materno-infantil, impactando o desenvolvimento e a identidade materna. Nesse</p><p>sentido, Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) apontam a</p><p>eficácia das técnicas de relaxamento e meditação como formas de minimizar o</p><p>estresse e a ansiedade vivenciada durante a gravidez durante o acometimento do</p><p>câncer, reduzindo também os possíveis riscos de depressão pós-parto e outros</p><p>transtornos desadaptativos, tendo em vista que suas emoções circundam sobre</p><p>o status da doença, o bem-estar do bebê e a preparação para a maternidade.</p><p>Güth, Huang, Alder e Moffat (2015) ao avaliarem a interação de laços</p><p>familiares em pacientes jovens com câncer de mama, ressaltam como é</p><p>importante a disponibilização de apoio psico-oncológico para a família e</p><p>crianças. Seus estudos apontam repercussões sintomatológicas emocionais</p><p>e comportamentais relevantes. As mulheres sentem mais intensamente a</p><p>sensação de responsabilidade quando acometidas pelo câncer e sendo mãe</p><p>de crianças, e também preferem interromper precocemente as terapias de</p><p>tratamento do câncer do que correr o risco de não poder ser mãe, dando pre-</p><p>ferências claras do desejo de manter a fertilidade a receber recomendações</p><p>de terapia oncológica.</p><p>Güth, Huang, Alder e Moffat (2015) ainda apontam que a interrupção</p><p>precoce do tratamento pode ser associada à falta de informação ou prestadas</p><p>de forma incompreensível sobre as terapias oncológicas, os efeitos colaterais</p><p>e apoio social insuficiente.</p><p>84</p><p>É importante que as mulheres em idade reprodutiva com diagnóstico de</p><p>câncer sejam orientadas sobre o efeito do tratamento sob a fertilidade, sendo</p><p>recomendado que estas adiem a gravidez para dois anos após o final do trata-</p><p>mento, e sejam dadas orientações, no momento do diagnóstico, relacionadas</p><p>à preservação da fertilidade e tratamentos para concepção e gravidez segura</p><p>após tratamento.</p><p>Considerações Finais</p><p>Os resultados dos estudos desta revisão refletiram sobre diferentes pers-</p><p>pectivas, o modo como o diagnóstico e o tratamento de câncer repercutem na</p><p>gestação, apontando como mulheres grávidas lidam com a ambivalência entre</p><p>o adoecer e o gestar, considerando os riscos relacionados à sua própria vida</p><p>e do bebê. Verifica-se que os avanços com relação ao tratamento e diagnós-</p><p>tico precoce convergem para um maior aumento de sobrevida das pacientes.</p><p>Entretanto, apesar de observarmos um crescente aumento de pesquisas sobre</p><p>o câncer, ainda é considerada pequena a produção de estudos publicados sobre</p><p>o tema associado à gestação, principalmente no que tangem aos apontamentos</p><p>de pesquisas sobre os aspectos emocionais desse processo.</p><p>Em geral, percebe-se que o diagnóstico de câncer atinge toda a família</p><p>que passa por momentos de grande sofrimento. As emoções repercutem de</p><p>modo singular a partir do diagnóstico de câncer. Diante da gestação associada</p><p>ao câncer, percebe- se vivências ambíguas sobre vida e doença, desejo e medo,</p><p>alegria e angústia, no enlace entre gestação e câncer.</p><p>Ficou evidente a necessidade de que os profissionais de saúde consigam</p><p>estabelecer uma comunicação assertiva, criando vinculação terapêutica com</p><p>a paciente, orientando-a sobre fertilidade, amamentação, e possíveis riscos</p><p>do tratamento sobre a gestação e a criança. Também deve ser parte da assis-</p><p>tência prestada pela equipe de saúde oferecer escuta compreensiva e acolhe-</p><p>dora, além do apoio contínuo, visto que essas intervenções poderão auxiliar</p><p>a paciente e o companheiro na tomada de decisão e no enfrentamento das</p><p>questões decorrentes do diagnóstico do câncer antes, durante e após a gesta-</p><p>ção, minimizando possíveis repercussões emocionais e sofrimento psíquico</p><p>na paciente e seus familiares.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 85</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Britton, L. (2017). Unintended pregnancy: a systematic review of contra-</p><p>ception use and counseling in women with cancer. (Report). Clin J</p><p>Oncol Nurs. April 01; 21 (2): 189-196. https://doi.org/10.1188/17.</p><p>CJON.189-196</p><p>Capelozza, M. de L. da S. S., Peçanha, D. L., Mattar, R., & Sun, S. Y. (2014).</p><p>A dinâmica emocional de mulheres com câncer e grávidas. Boletim</p><p>- Academia Paulista de Psicologia, 34 (86), 151-170. Recuperado</p><p>em 20 de maio de 2019, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?s-</p><p>cript=sci_arttext&pid=S1415711X2014000100011&lng=pt&tlng=pt.</p><p>ISSN: 1415-711X</p><p>Carvalho, V. A. de, Franco, M. H. P., Kovács, M. J., Liberato, R. P., Macielra,</p><p>R. de C., Velt, M. T., & Barros, L. H. de C. (Org.). (2008). Temas em</p><p>psico-oncologia. São Paulo: Summus.</p><p>Cipriano, P., & Oliveira, C. de. (2016). Gestação e câncer de mama: Pro-</p><p>posta de guia de orientações / Pregnancy and breast cancer: proposal</p><p>of recomendações. Fisioter. Bras. 17 (2): f: 148-I: 157, mar./abr.</p><p>ISSN Eletrônico: 2526-9747</p><p>Costa, A. E. L. da, & Souza, J. R. (2018). Implicações psicossociais rela-</p><p>cionadas à assistência à gestante com câncer: percepções da equipe</p><p>de saúde. Rev. SBPH, v. 21 no. 2, Rio de Janeiro, jul./dez. ISSN:</p><p>1516-0858.</p><p>Costa, C. L. R. da, Loures, L. F., Araújo, D. A. C. de, & Souza, L. C. de.</p><p>(2006). Câncer de mama durante a gestação: Revisão bibliográ-</p><p>fica. HU Revista, 32 (4), 109-114. Recuperado de https://periodicos.</p><p>ufjf.br/index.php/hurevista/article/view/26.</p><p>Ferrari, Solimar. (2018). Câncer na gestação: Avaliação de depressão, ansie-</p><p>dade, autoestima e vínculo materno-infantil. (Tese de Doutorado apre-</p><p>sentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).</p><p>https://doi.org/10.11606/T.5.2019.tde-07022019-150110</p><p>Gerstl B., Sullivan E., Ives A., Saunders C., Wand H., & Anazodo A. (2018).</p><p>Pregnancy outcomes after a breast cancer diagnosis: A systematic</p><p>86</p><p>review and meta-analysis. Clinical Breast Cancer, v. 18, n. 1, p. 79-88.</p><p>http://dx.doi.org/10.1016/j.clbc.2017.06.016</p><p>Güth, U., Huang, D. J., Alder, J., & Moffat, R. (2015). Family ties: young</p><p>breast cancer patients and their children. Swiss Med Wkly. https://doi.</p><p>org/10.4414/smw.2015.14163</p><p>Hsieh P. L., Huang S. M., Chien L. Y., Lee C. F., Hsiung Y., & Tai, C. J. (2017).</p><p>Risk-benefit perception of pregnancy among breast cancer survivors.</p><p>Eur J Cancer Care. 2018;27:e12696. https://doi.org/10.1111/ecc.12696</p><p>Karunaratne, K., Premaratne, S., Hapuachchige, C., & Ihalagama, H. (2016).</p><p>Counselling pregnant women with cancer. Best Practice & Research</p><p>Clinical Obstetrics and Gynaecology, 33, 117-123. http://dx.doi.</p><p>org/10.1016/j.bpobgyn.2015.10.001</p><p>Souza, M. T. de, Silva, M. D. da, & Carvalho, R. de. (2010) Revisão integrativa:</p><p>O que é e como fazer. Einstein, 8 (1 Pt 1):102-6. ISSN 2317-6385.</p><p>Stopenski, S., Aslam. A., Zhang, X., & Cardonick, E. (2017). After Chemo-</p><p>therapy Treatment for Maternal Cancer During Pregnancy, Is Breast-</p><p>feeding Possible? Breastfeeding Medicine, Volume 12, Number 2.</p><p>https://doi.org/10.1089/bfm.2016.0166</p><p>Vandenbroucke, T., Han, S. N., Calsteren, K. V., Wilderjans, T. F., Bergh, B. R.</p><p>H. V. den., Claes, L., & Amant, F. (2017). Psychological distress and</p><p>cognitive coping in pregnant women diagnosed with cancer and their</p><p>partners. Psycho‐Oncology, 26: 1215-1221. https://doi.org/10.1002/</p><p>pon.4301</p><p>CAPÍTULO 5</p><p>CUIDADOS PALIATIVOS:</p><p>compreensão dos profissionais</p><p>Marina Mesquita Geraldeli Carvalho Cavalcanti</p><p>Neste capítulo será falado sobre um tema atual e extremamente impor-</p><p>tante para os profissionais que trabalham na área da saúde, os Cuidados</p><p>Paliativos. Este assunto tem sido alvo de muitas dúvidas por estar cres-</p><p>cendo em significado a cada dia, e também pela sua disseminação nas</p><p>instituições de saúde. Sabe-se que este tema ainda é desconhecido entre</p><p>muitas pessoas, mas quem conhece seu verdadeiro significado se encanta</p><p>com sua filosofia.</p><p>Em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu pela primeira</p><p>vez os Cuidados Paliativos como um “cuidado ativo e total para pacientes</p><p>cuja doença não é responsiva a tratamento de cura” (ANCP, 2009, p. 15).</p><p>Mais tarde, em 2002 o conceito de Cuidados Paliativos foi reformulado e</p><p>ampliado, sendo definido pela OMS como uma “abordagem que promove a</p><p>melhora da qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças</p><p>que ameaçam a continuidade da vida, através da prevenção e alívio do sofri-</p><p>mento. Requer identificação precoce, avaliação e tratamento impecável não</p><p>somente da dor, mas de todos os sintomas de natureza física, social, emocional</p><p>e espiritual” (ANCP, 2009, p. 16).</p><p>Observa-se que a primeira definição restringia os Cuidados Paliativos</p><p>ao cuidado dispensado somente quando não existia a possibilidade de cura</p><p>da doença. Após a reformulação do seu conceito, os Cuidados Paliativos</p><p>começaram a ser vistos como um cuidado presente não só neste momento,</p><p>mas presente também desde a descoberta do diagnóstico de uma doença que</p><p>ameaça a vida, em conjunto com o tratamento curativo, e até o momento de</p><p>progressão da doença e incurabilidade; momento em que os Cuidados Palia-</p><p>tivos ganham total força e se torna exclusivo.</p><p>Os Cuidados Paliativos surgiram para inovar e ampliar a assistência ao</p><p>paciente doente. Seu valor se dá pelo foco na assistência à saúde, através do</p><p>cuidado integral em consideração com os sintomas dos pacientes ampliando o</p><p>cuidado para sua família e cuidadores, que o acompanham e também sofrem</p><p>com sua doença (Matsumoto, 2012). A descoberta de uma doença crônica e</p><p>incurável pode acarretar tanto no paciente quanto em sua família um impacto</p><p>88</p><p>emocional, desencadeando os sentimentos de tristeza, sofrimento e medo</p><p>da morte.</p><p>A doença surge como uma ameaça à vida das pessoas, podendo adiar</p><p>planos e sonhos, e também pode trazer alterações no funcionamento familiar.</p><p>Após o diagnóstico de doenças graves e incuráveis, a pessoa adoecida poderá</p><p>vivenciar o sentimento de angústia e quando este diagnóstico e o tratamento</p><p>são acompanhados da notícia de que os Cuidados Paliativos são o único</p><p>cuidado a ser recebido, podem surgir diversos questionamentos sobre esta</p><p>conduta. Apesar do movimento dos Cuidados Paliativos ter chegado ao Bra-</p><p>sil há mais de vinte anos, ele ainda é mal compreendido por muitas pessoas,</p><p>inclusive por alguns profissionais.</p><p>O movimento dos Cuidados Paliativos teve seu início em 1960 no</p><p>Reino Unido, tendo como precursora a médica Cicely Saunders. Na década</p><p>de 70 a psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross, influenciada pelos tra-</p><p>balhos de Cicely, levou este movimento para a América. A partir deste</p><p>momento o movimento dos Cuidados Paliativos foi disseminado para</p><p>diversos países (Matsumoto, 2012). No Brasil este movimento teve início</p><p>em 1990 e neste mesmo ano o conceito de Cuidados Paliativos foi definido</p><p>pela primeira vez pela Organização Mundial de Saúde, como já citado</p><p>anteriormente, e sua definição foi disseminada para 90 países e em 15</p><p>idiomas (Gomes & Othero, 2016).</p><p>Segundo a OMS, inicialmente os Cuidados Paliativos eram direcionados aos</p><p>pacientes oncológicos, e seu objetivo era promover assistência integral a estes</p><p>pacientes, com um olhar para os cuidados no fim da vida, tornando-se um dos</p><p>pilares básicos do tratamento ao paciente com câncer (Gomes & Othero, 2016).</p><p>Atualmente sabe-se que os Cuidados Paliativos não estão presentes somente</p><p>na doença oncológica, mas em todas as doenças que ameaçam a vida, como</p><p>doenças cardiovasculares, degenerativas, autoimunes, entre outras e ele visa a</p><p>minimização</p><p>do sofrimento físico e emocional, o alívio de sintomas desagradá-</p><p>veis, o respeito aos desejos e a manutenção da autonomia da pessoa que adoece.</p><p>Ao falar sobre Cuidados Paliativos, não podemos esquecer de falar sobre</p><p>a espiritualidade e a religião, que se apresentam como mecanismos de enfren-</p><p>tamento. A espiritualidade destaca-se pela busca pessoal pelo significado do</p><p>final da vida, e a religião corresponde a um sistema de crenças que facilitam</p><p>o contato com o sagrado (Evangelista et al., 2016). Sendo assim, observa-se</p><p>que a espiritualidade e religião se complementam e podem estar presentes</p><p>em um mesmo momento frente às situações enfrentadas. A literatura destaca</p><p>a importância de falar sobre a espiritualidade na vida das pessoas adoecidas,</p><p>pois esta os auxilia a enfrentar este momento.</p><p>Segundo Evangelista et al. (2016) foi realizada uma pesquisa com pacien-</p><p>tes internados em uma unidade de Cuidados Paliativos, e foi observado que</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 89</p><p>a espiritualidade apresenta uma repercussão positiva em relação ao enfrenta-</p><p>mento do adoecimento e possibilidade de morte. Em se tratando de pacientes</p><p>oncológicos é possível observar a utilização destes recursos de enfrentamento,</p><p>principalmente no momento em que a limitação terapêutica é definida pelos</p><p>profissionais, momento em que o paciente pode se fragilizar emocionalmente</p><p>e necessitar de um fortalecimento, que muitas vezes acontece através da fé.</p><p>No momento em que a finitude se apresenta próxima, os pacientes podem</p><p>se apegar mais ainda à espiritualidade e religião. Sabe-se que a morte é vista</p><p>de diferente forma por diferentes religiões, e a crença de cada pessoa pode</p><p>facilitar a elaboração do paciente e de sua família frente ao fim da vida. Sendo</p><p>assim, cabe salientar a importância do profissional que trabalha com Cuidados</p><p>Paliativos e com Oncologia estar preparado para lidar com estas situações,</p><p>pois a morte estará muito presente em seu dia a dia. É importante também que</p><p>este profissional saiba respeitar a crença de cada paciente e de cada família.</p><p>Como já foi dito, os Cuidados Paliativos são um modelo de cuidado muito</p><p>presente na doença oncológica. Sabe-se que atualmente existem diversos tra-</p><p>tamentos para o câncer, e entre eles destacam-se as cirurgias convencionais,</p><p>cirurgias robóticas, quimioterapia, radioterapia, imunoterapia, entre outros. Há</p><p>também formas de se prevenir o câncer, que atualmente são proporcionadas pela</p><p>oncogenética; área que estuda e avalia a predisposição genética do paciente e de</p><p>sua família virem a desenvolver esta doença. Apesar de todos os avanços na medi-</p><p>cina, sabe-se que hoje em dia muitas pessoas ainda morrem vítimas do câncer.</p><p>Ao receber o diagnóstico de câncer, o paciente e seus familiares neces-</p><p>sitarão de um tempo de reorganização psíquica, pois neste momento pode-</p><p>rão surgir muitos conflitos e dúvidas sobre o diagnóstico e tratamento a ser</p><p>realizado. É neste momento que o paciente – acompanhado de sua família</p><p>– irá buscar respostas para suas dúvidas. Ao receber as orientações sobre o</p><p>tratamento, o paciente poderá sentir-se confuso neste primeiro momento, e é</p><p>importante que o profissional de saúde o auxilie durante todo o processo; o</p><p>que pode facilitar sua elaboração frente ao processo de adoecimento.</p><p>Quando o tratamento curativo não é possível; chega então o momento</p><p>do profissional de saúde (na maioria das vezes o médico) dar a notícia sobre</p><p>a incurabilidade da doença. Este momento é vivenciado por algumas pessoas</p><p>como uma “sentença de morte”; e isto acontece devido ao estigma social que</p><p>o câncer carrega, e por esta doença provocar tanto medo nas pessoas. Após a</p><p>notícia de incurabilidade da doença, chega o momento do profissional falar</p><p>mais enfaticamente sobre os Cuidados Paliativos, que neste momento pode</p><p>se intensificar e se tornar um tratamento exclusivo.</p><p>Os Cuidados Paliativos passam a ser exclusivos e ganham mais força no</p><p>momento em que a equipe de saúde detecta a irreversibilidade da doença e a</p><p>possibilidade do desfecho para a morte, através de uma avaliação criteriosa</p><p>90</p><p>baseada em estudos, reuniões e protocolos. Moritz et al. (2011) ressaltam</p><p>alguns aspectos a serem considerados na conduta com o paciente em CP,</p><p>como não realizar condutas desnecessárias e fúteis, priorizar a comunicação</p><p>entre membros da equipe, paciente e família, oferecer um cuidado individua-</p><p>lizado, verificar a existência de diretivas antecipadas, investigar a compreen-</p><p>são dos pacientes e familiares a respeito das informações recebidas sobre o</p><p>paciente em Cuidados Paliativos.</p><p>No momento em que os Cuidados Paliativos tornam-se exclusivos podem</p><p>surgir questionamentos sobre a possibilidade de morte do paciente, que pode</p><p>acarretar o sentimento de medo. A morte pode então se apresentar como uma</p><p>realidade iminente. Sabe-se que quando os Cuidados Paliativos são realiza-</p><p>dos em conjunto com as medidas de cura ainda existe o pensamento de que</p><p>algo ainda pode ser feito e há esperança, mas, a partir do momento em que as</p><p>medidas curativas deixam de ser realizadas e os Cuidados Paliativos tornam-se</p><p>exclusivos, esta esperança pode desaparecer, causando sentimentos de angústia,</p><p>impotência, tristeza e revolta, ao pensar que não há nada a se fazer.</p><p>A concepção de que não há nada a fazer pelo paciente também pode ser</p><p>vista pelos profissionais de saúde, e caso isto aconteça, podemos pensar que</p><p>essa falta de conhecimento sobre o assunto pode se apresentar como uma</p><p>barreira frente à disseminação deste modelo de cuidado dentro das instituições</p><p>hospitalares. Outra barreira encontrada pelos profissionais na disseminação</p><p>dos Cuidados Paliativos é o confronto da equipe com a morte, uma morte</p><p>incerta, que pode acontecer em horas, dias e até meses e que propiciará para os</p><p>profissionais o confronto com a sua própria morte. A morte é vista por muitos</p><p>profissionais da saúde como uma inimiga, o que desencadeia o pensamento de</p><p>combatê-la a qualquer custo. Isto pode levar estes profissionais à obstinação</p><p>terapêutica e ao desejo incessante de salvar o paciente. Como consequência o</p><p>paciente poderá sofrer com o prolongamento de sua vida, sem prognóstico de</p><p>cura, e os profissionais manifestarem o sentimento de frustração e sofrimento</p><p>quando a morte acontecer. Frente a isto acredita-se na importância de cuidar</p><p>da saúde mental dos profissionais que trabalham com paciente em Cuidados</p><p>Paliativos e que vivenciam a morte frequentemente.</p><p>Antigamente a morte era vista como natural e os rituais a ela relacionados</p><p>eram vividos naturalmente. As pessoas decidiam morrer em suas casas quando</p><p>chegasse o momento, os velórios eram realizados nas suas residências, as</p><p>crianças participavam dos velórios e enterros. Hoje em dia observa-se uma</p><p>resistência das pessoas ao falar sobre a morte, que muitas vezes tem se tornado</p><p>institucionalizada, artificial, e vista pelas pessoas como algo fora do normal, o</p><p>que vai contra a filosofia do CP, que enxerga a morte como um processo natural.</p><p>No momento em que surge a possibilidade de morte do paciente, os Cui-</p><p>dados Paliativos sintetizam a busca do conforto para ele, através do alívio das</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 91</p><p>dores e dos sintomas desagradáveis da doença, oferecendo apoio e respeito à</p><p>sua autonomia, até o momento de sua morte. Os Cuidados Paliativos preco-</p><p>nizam também o cuidado com a família do paciente, durante todo o processo</p><p>e após a morte de seu ente querido. Sendo assim, acredita-se que os Cuidados</p><p>Paliativos propiciam a humanização no processo de adoecimento e de morte,</p><p>e quem será responsável pela disseminação deste cuidado humanizado nas</p><p>instituições será a equipe multiprofissional.</p><p>A equipe multiprofissional pode ser composta por diversos profissionais,</p><p>entre eles: médico, enfermeiros, técnicos de enfermagem, psicólogos, farma-</p><p>cêuticos, fisioterapeutas, entre outros. A equipe também será responsável pela</p><p>condução do caso clínico</p><p>do paciente. Frente a isto, salienta-se novamente a</p><p>importância de que esta equipe tenha conhecimento e compreensão sobre o</p><p>significado dos Cuidados Paliativos nos dias de hoje, bem como seu conceito</p><p>e princípios, pois a falta de conhecimento sobre o assunto pode refletir em</p><p>suas condutas e disseminação.</p><p>Os profissionais que atuam atualmente com Cuidados Paliativos necessi-</p><p>tam de um treinamento diferenciado, já que é um modelo de cuidado que sofreu</p><p>mudanças de conceituação ao longo do tempo e é permeado por significados</p><p>baseados no senso comum e estigmas. A falta de conhecimento e de interpreta-</p><p>ção sobre o real significado de Cuidados Paliativos pode ter como consequência,</p><p>dentro do ambiente hospitalar, os conflitos éticos. Surge, portanto, a necessidade</p><p>de falar sobre a bioética, que aborda os conceitos presentes no modelo do CP</p><p>e no processo de morte, como a eutanásia, distanásia e ortotanásia.</p><p>Estes dilemas éticos podem se apresentar como barreira frente à dis-</p><p>seminação deste modelo de cuidado no ambiente hospitalar, pois a falta de</p><p>compreensão do real significado dos Cuidados Paliativos pode acarretar uma</p><p>visão distorcida da realidade, como a crença de que não há nada a se fazer</p><p>para o paciente em Cuidados Paliativos. Esta concepção pode ser confundida</p><p>por muitas pessoas com a eutanásia, que é vista pelo senso comum como</p><p>“o deixar morrer”. Segundo Marta, Hanna e Da Silva (2010) a eutanásia é</p><p>definida como a prática que busca abreviar, sem dor e sofrimento, a vida de</p><p>um doente com uma doença incurável.</p><p>Isto demonstra o equívoco frente aos dois conceitos, já que o paciente em</p><p>Cuidados Paliativos não tem a vida abreviada – como na eutanásia – e sim,</p><p>deixa de receber medidas invasivas que não vão curar e prolongar a vida, mas</p><p>causar sofrimento. Segundo Marta, Hanna e Silva (2010) outros dois concei-</p><p>tos importantes de serem compreendidos pelo profissional que trabalha com</p><p>Cuidados Paliativos também devem ser ressaltados: a ortotanásia, também</p><p>conhecida como a “boa morte”, e definida como o processo de morte natural,</p><p>que visa o respeito pelo bem-estar do paciente e a garantia de dignidade no</p><p>tempo de vida que ainda lhe resta; e a distanásia, conhecida como obstinação</p><p>92</p><p>terapêutica e definida como a manutenção da vida por meio de procedimentos</p><p>desproporcionais, ocasionando uma morte com sofrimento.</p><p>Sendo assim, ressalta-se a importância do conhecimento destas questões</p><p>éticas, pois atualmente elas estão muito presentes no trabalho dos profissionais</p><p>dentro das instituições de saúde. Isto é importante para garantir o bem-estar</p><p>do paciente, de sua família, e dos profissionais que ali se encontram, pois</p><p>todos fazem parte da unidade de cuidado. É muito importante lembrar que o</p><p>trabalho interdisciplinar é essencial no tratamento do paciente em Cuidados</p><p>Paliativos, e que cada profissional irá contribuir com seu conhecimento nas</p><p>condutas do caso clínico.</p><p>Frente a isto, observa-se a criação de leis que buscam o respaldo legal para</p><p>os profissionais e para os pacientes em Cuidados Paliativos. Em se tratando dos</p><p>profissionais, sabemos que mesmo que toda a equipe participe das decisões,</p><p>é o médico que é responsável pelas condutas a respeito do quadro clínico do</p><p>paciente, pois é ele quem possui o estudo e o conhecimento específico para</p><p>tal tarefa. Em alguns casos este profissional e toda a sua equipe são expostos</p><p>e mal compreendidos por familiares dos pacientes. Por este motivo o conselho</p><p>federal de medicina criou resoluções para proteger estes profissionais. Estas</p><p>resoluções também visam o cuidado com os pacientes e sua família, pois estes</p><p>podem se informar e ter uma melhor compreensão frente às condutas dos pro-</p><p>fissionais, acarretando menos prejuízo emocional para todos os envolvidos.</p><p>O Conselho federal de medicina (CFM) publicou em 2006 a resolução</p><p>de Nº 1.805, que permite ao médico “limitar ou suspender procedimentos e</p><p>tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados</p><p>necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspec-</p><p>tiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu</p><p>representante legal” (Publicada no D.O.U., 28 nov. 2006, Seção I, pg. 169).</p><p>Esta resolução foi criada para orientar os profissionais, pacientes e fami-</p><p>liares no momento da tomada de decisão, resultante da avaliação do médico,</p><p>principalmente quando a conduta realizada é a não indicação de medidas</p><p>invasivas. Neste momento a conduta pode ser questionada pelas famílias, que</p><p>estão envolvidas emocionalmente com a pessoa adoecida e poderão apresentar</p><p>falta de compreensão sobre o caso clínico e sobre as condutas. É importante</p><p>salientar que o médico irá definir a melhor conduta a ser realizada com o</p><p>paciente, tendo em vista seu conhecimento médico e científico e seguindo</p><p>protocolos criados pela equipe.</p><p>Quando se trata dos Cuidados Paliativos, destaco a importância da comu-</p><p>nicação e do compartilhamento das informações com as famílias, propiciando</p><p>sua participação nas decisões, podendo chegar a um consenso. Cabe ao profis-</p><p>sional médico e sua equipe receber a família do paciente, ouvir suas dúvidas</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 93</p><p>e esclarecê-las através de conferências familiares (reuniões planejadas com</p><p>a família), visando uma melhor compreensão sobre as informações afinal,</p><p>na impossibilidade de decisão do paciente, cabe à sua família, junto com a</p><p>equipe, tomar as decisões sobre qual caminho seguir.</p><p>Outra resolução publicada pelo Ministério da Saúde em 23 de novembro</p><p>de 2018 reforça o que foi dito acima, que o paliativismo deve ser realizado</p><p>por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar; ressaltando o quanto é</p><p>importante que os profissionais tenham uma comunicação sensível e empá-</p><p>tica com o paciente e sua família. Esta resolução destaca ainda que os Cui-</p><p>dados Paliativos deveriam estar disponíveis em todos os pontos da rede,</p><p>atenção básica, domiciliar, ambulatorial, hospitalar e urgência e emergência,</p><p>e que este cuidado deve ser incluído como parte dos cuidados continuados</p><p>integrados no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS (Valadares, 2018).</p><p>Frente a isto observa-se a importância em oferecer os Cuidados Palia-</p><p>tivos em todas as instituições hospitalares e unidades de atendimento. Os</p><p>Cuidados Paliativos também podem estar presente dentro das Unidades de</p><p>Terapia Intensiva (UTI) e pode acontecer por dois motivos. No primeiro caso</p><p>o paciente pode ter sido encaminhado à UTI já com o diagnóstico de uma</p><p>doença que ameaça a vida e em Cuidados Paliativos ou Cuidados Paliativos</p><p>exclusivo. No segundo caso ele pode ter sido internado sem diagnóstico e</p><p>receber nesta unidade o diagnóstico de uma doença que ameaça a vida, que</p><p>receberá Cuidados Paliativos e que este cuidado pode se tornar exclusivo.</p><p>A primeira situação pode acontecer devido à dificuldade no consenso</p><p>entre os profissionais que assistem o paciente e também por solicitação da</p><p>família, que pode apresentar dificuldade na aceitação da conduta indicada;</p><p>já a segunda situação pode ocorrer devido à uma internação repentina por</p><p>um quadro agudo sem diagnóstico prévio. Em ambos os casos, destaca-se a</p><p>importância da postura dos profissionais, inclusive os que trabalham nas UTI’s</p><p>frente aos cuidados com o paciente e sua família, já que ele estará à frente da</p><p>situação, com suas orientações, condutas e decisões.</p><p>Os autores Santana, Rigueira e Dutra (2010) falam sobre a importância</p><p>da comunicação entre paciente, família e equipe durante todo o processo de</p><p>adoecimento e tomada de decisões para que todos tenham uma boa compreen-</p><p>são do quadro clínico real do paciente e compreendam as condutas e decisões</p><p>realizadas pelos profissionais. Acredita-se que a comunicação é um facilitador</p><p>durante este processo, e quando ela é realizada de forma correta, pode auxiliar</p><p>muito os profissionais frente ao seu papel com o paciente e sua família.</p><p>Vargas (2013) destaca algumas ações paliativas que devem</p><p>ser realizadas:</p><p>habilidade de comunicação da equipe com o paciente e unidade de cuidado,</p><p>diferenciação de informação médica de conferência familiar (momento no qual</p><p>o profissional irá esclarecer as dúvidas do familiares, afinal as conferências</p><p>94</p><p>são realizadas com maior disponibilidade de tempo para perguntas), a com-</p><p>preensão do desejo dos familiares envolvidos nas decisões; desenvolvimento</p><p>de protocolos visando as condutas dos profissionais e a resolução de conflitos,</p><p>e a aderência de todos os envolvidos às ações paliativas. Sendo assim, obser-</p><p>va-se a importância da formação dos profissionais de saúde que trabalhem</p><p>com este modelo de cuidado.</p><p>É importante que estes profissionais consigam desenvolver habilidade</p><p>de comunicação para poder transferir suas posições aos envolvidos e possam</p><p>realizar suas condutas baseadas em seu conhecimento e compreensão sobre</p><p>o assunto. A sensibilidade para lidar com situações delicadas que envolvam a</p><p>morte e o manejo de acolhimento com paciente e sua família também são ações</p><p>importantes durante todo o processo, pois a decisão deles poderá influenciar no</p><p>desfecho do caso. O atendimento e cuidado dos profissionais com os pacientes</p><p>também devem se estender após a morte do paciente e processo de luto.</p><p>Observa-se atualmente um grande avanço na tecnologia, e como resul-</p><p>tado há um aumento na procura pela formação profissional. Os cursos na</p><p>área da saúde estão sendo procurados cada vez mais, e o conhecimento tem</p><p>sido dividido em especialidades e subespecialidades. Frente a isto, há uma</p><p>preocupação com a formação destes profissionais e com sua postura frente à</p><p>humanização do cuidado com o paciente, e que com o excesso de conheci-</p><p>mento, o profissional deixe de lado sua humanidade.</p><p>Tendo em vista o aumento da procura por cursos na área da saúde,</p><p>acredita-se também na importância da preparação destes profissionais para</p><p>aprenderem a lidar com assuntos que tratam sobre conflito ético e situações</p><p>que envolvam a morte, como a bioética e a tanatologia (assunto que trata da</p><p>morte), temas que devem ser discutidos e disseminados entre os profissionais,</p><p>por se tratar de uma realidade muito presente em suas vidas. Os profissionais</p><p>que trabalham com pacientes em CP estão em um contato maior com a morte</p><p>pois o paciente em CP, pode evoluir rapidamente para este fim.</p><p>Por este motivo salienta-se a importância de oferecer apoio psicológico,</p><p>treinamento, rodas de conversa a estes profissionais. Braz e Franco (2017)</p><p>relatam que os estudos sobre educação para a morte são escassos e Kóvacs</p><p>(2003) salienta a importância de uma equipe ser preparada para o processo</p><p>de morte do paciente, já que ela está próxima do paciente, e pode auxiliar</p><p>a sua família a lidar com o luto. Ambos demonstram a preocupação com o</p><p>assunto. Hoje em dia os autores falam sobre a morte moderna, vista como um</p><p>processo de despersonalização dos pacientes hospitalizados no qual ocorre</p><p>uma desumanização.</p><p>Segundo Menezes (2003) com o surgimento de recursos para a manuten-</p><p>ção da vida, como respiradores, monitores de funções corporais, desfibrilado-</p><p>res, entre outros equipamentos utilizados em hospitais – principalmente em</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 95</p><p>UTI, o homem vive como se nunca fosse morrer; o que acarreta a distanásia</p><p>(prolongamento da morte) e a obstinação terapêutica dentro do hospital. Os</p><p>autores também falam sobre o conceito de “boa morte”, que consiste em uma</p><p>morte humanizada e tem como objetivo oferecer cuidado integral ao paciente</p><p>até o fim de sua vida – sem a presença de desconforto e sofrimento provocado</p><p>pela doença – incluindo suporte emocional e espiritual. Na “boa morte” evi-</p><p>ta-se tratamentos invasivos quando não há chance de cura e quando não irá</p><p>acrescentar benefícios à sobrevida do paciente, mas vão apenas causar dor e</p><p>sofrimento (Menezes, 2003).</p><p>Conclui-se então que a “boa morte” é a morte idealizada pelos Cuidados</p><p>Paliativos, ou seja, digna e humanizada. Serão descritos dois casos clínicos</p><p>de pacientes que foram atendidos pela autora, que atua como psicóloga e</p><p>que receberam Cuidados Paliativos. Estes casos ilustram condutas da equipe</p><p>multiprofissional ao lidar com pacientes em Cuidados Paliativos. Salienta-</p><p>-se que para que o trabalho fosse realizado com sucesso, contou-se com a</p><p>ajuda de todos (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, nutricionistas,</p><p>fisioterapeutas).</p><p>Relatos de Caso</p><p>Caso 1</p><p>O primeiro caso trata-se de um paciente do sexo masculino, 60 anos,</p><p>casado, com filhos, etilista. Chega à instituição hospitalar para realizar tria-</p><p>gem e recebe o diagnóstico de câncer no estômago. Realizou os tratamentos</p><p>de quimioterapia neoadjuvante e cirurgia. Ficou internado alguns dias na UTI</p><p>e depois foi para o quarto. O primeiro atendimento psicológico foi solicitado</p><p>pela enfermagem e foi realizado durante sua internação, após uma cirurgia.</p><p>No momento do atendimento o paciente apresentava humor deprimido e</p><p>fragilidade emocional, relatando tristeza pela perda da autonomia reativo</p><p>à doença e internação.</p><p>O atendimento foi realizado com o paciente e sua esposa, auxiliando-os</p><p>frente ao enfrentamento do processo de adoecimento. O paciente reclamava</p><p>de ter que usar fralda e tomar banho de leito. Apresentava comportamento</p><p>agressivo com os profissionais. Foi conversado com a equipe, pois o paciente</p><p>apresentava um quadro de delirium hiperativo, reativo ao longo tempo de</p><p>internação, e este quadro intensificava seus sentimentos, resultando em</p><p>comportamento agressivo.</p><p>Realizou-se o atendimento com o paciente através do acolhimento e</p><p>foram trabalhadas questões relacionadas à perda de autonomia. O quadro</p><p>de delirium em que o paciente se encontrava foi avaliado e manejado pelos</p><p>96</p><p>médicos da equipe. Após o manejo do quadro clínico, os médicos conversa-</p><p>ram com a sua família sobre como utilizar medidas preventivas de delirium</p><p>através de orientação têmporo-espacial, conversas com o paciente, presença</p><p>da família, entre outras. No dia seguinte o paciente ainda demonstrava humor</p><p>entristecido, mas demonstrava mais tranquilidade. Neste mesmo dia o paciente</p><p>recebeu alta e foi para sua casa.</p><p>Após 9 meses o paciente retornou ao hospital para realizar alguns</p><p>exames, e recebeu a notícia de progressão da sua doença (metástase hepá-</p><p>tica), sendo encaminhado ao serviço de Cuidados Paliativos para Cuidados</p><p>Paliativos exclusivos. Após ouvir esta notícia o paciente procurou atendi-</p><p>mento psicológico, apresentando humor deprimido e dificuldade de aceitação</p><p>frente ao seu prognóstico. Neste momento foi realizado acolhimento com</p><p>o paciente e sua esposa, ouvindo suas questões diante do sofrimento, inse-</p><p>gurança e medo da morte. Avaliei também qual a compreensão deles frente</p><p>à doença e informações recebidas sobre prognóstico do paciente e sobre o</p><p>encaminhamento ao serviço de Cuidados Paliativos.</p><p>No momento do atendimento o paciente demonstrava pouca compreen-</p><p>são sobre Cuidados Paliativos e um pouco de resistência frente à consulta</p><p>com os médicos paliativistas. Referia que não havia mais nada a ser feito,</p><p>“apenas esperar a sua morte”. Foi conversado com o paciente sobre a filoso-</p><p>fia dos Cuidados Paliativos e sobre os cuidados que ele iria receber naquele</p><p>setor, que tinham como objetivo oferecer qualidade de vida, neste momento</p><p>de incurabilidade da doença. Foi conversado sobre tudo que poderia ser</p><p>realizado, visando o seu conforto, alívio da dor, respeito aos seus desejos</p><p>e autonomia, cuidado com sua família, e muitas outras ações que visavam</p><p>o cuidado integral.</p><p>O discurso do paciente demonstrou como a falta de compreensão sobre</p><p>o real significado de Cuidados Paliativos (visto como o não fazer nada” e “ser</p><p>deixado para morrer”) pode causar angústia, medo e dificultar o processo de</p><p>aceitação e elaboração do prognóstico e das novas ações a serem realizadas.</p><p>Precisei conhecer a compreensão de todos sobre os Cuidados Paliativos para</p><p>trabalhar as questões emocionais que estavam surgindo tanto</p><p>com o paciente,</p><p>quanto com sua família. Frente a isto, salienta-se a necessidade de ações que</p><p>auxiliem as pessoas na compreensão deste modelo de cuidado, afinal, as dire-</p><p>trizes dos Cuidados Paliativos ressaltam que neste momento ainda há muito</p><p>a se fazer, inclusive quando este cuidado se torna exclusivo.</p><p>Freitas (2012) realizou um trabalho sobre a concepção terapêutica ativa,</p><p>e salienta o que já foi citado acima, que mesmo com o esgotamento das pos-</p><p>sibilidades terapêuticas de cura, ainda existem condutas a serem realizadas</p><p>como a oferta de cuidados globais, que são os cuidados que visam o bem-</p><p>-estar físico, emocional e espiritual do paciente, e destaca que estas ações</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 97</p><p>devem ser prestadas de forma única e contínua. Sendo assim, acredita-se</p><p>que os profissionais da saúde que trabalham com estes pacientes, podem</p><p>e devem promover uma reflexão sobre o assunto, visando a mudança na</p><p>compreensão das pessoas acerca dos Cuidados Paliativos.</p><p>Para que os Cuidados Paliativos sejam disseminados, é importante que</p><p>os profissionais de saúde também tenham compreensão sobre o assunto,</p><p>e sua formação profissional irá influenciar no manejo de suas condutas</p><p>realizadas em seus locais de trabalho. Acredito que a instituição também</p><p>pode auxiliar os profissionais através de treinamentos, rodas de conversas,</p><p>palestras, entre outras ações que visem à compreensão e disseminação dos</p><p>Cuidados Paliativos. Após o atendimento com o paciente, atendi sua esposa</p><p>que também estava abalada emocionalmente com a notícia recebida.</p><p>Realizei acolhimento, atendimento e a acompanhei até o serviço de Cui-</p><p>dados Paliativos da instituição, para resolução das questões práticas, como</p><p>o agendamento da próxima consulta. É importante acompanhar a família</p><p>do paciente na resolução de questões burocráticas, pois neste momento,</p><p>os familiares podem ficar confusos diante de muitas informações. Sales e</p><p>D’artibale (2011) também consideram importante ter um olhar voltado aos</p><p>familiares do paciente em Cuidados Paliativos exclusivo, visando a huma-</p><p>nizar o tratamento e garantir suporte à saúde mental de todos.</p><p>Após 20 dias deste atendimento, o paciente foi internado apresentando</p><p>piora de seu quadro clínico, e sua família procurou o serviço de psicologia</p><p>solicitando atendimento. Eles haviam conversado com a equipe e nesta</p><p>conversa lhes foi dito que o quadro do paciente era grave, e que havia pos-</p><p>sibilidade de evolução para a morte. Também foi conversado sobre a não</p><p>indicação de medidas invasivas e não indicação de transferência do paciente</p><p>para a UTI, devido à evolução de sua doença. Os familiares do paciente</p><p>demonstraram sofrimento frente às informações recebidas, e acreditavam</p><p>que o etilismo era a causa de sua doença. Este pensamento os conduziu ao</p><p>processo de luto antecipatório.</p><p>Segundo Flach et al. (2002) o luto antecipatório é a vivência do luto</p><p>antes mesmo da perda real acontecer e possui as mesmas características</p><p>do luto normal, como choque, negação, revolta, barganha, depressão e</p><p>aceitação. O luto antecipatório pode ser visto como um mecanismo de</p><p>enfrentamento frente a perda, agindo como facilitador na preparação para</p><p>a morte do seu familiar doente. Durante o processo de luto antecipató-</p><p>rio, os familiares deste paciente demonstraram utilizar este mecanismo de</p><p>enfrentamento.</p><p>Realizei os atendimentos com esta família através do acolhimento e</p><p>escuta, com o objetivo de auxiliá-los a lidar com os sentimentos desenca-</p><p>deados frente ao luto antecipatório e possibilidade de morte do seu familiar</p><p>98</p><p>e fortalecer seus mecanismos de enfrentamento. Criei uma relação de con-</p><p>fiança com o paciente e com sua família, e a partir deste momento me tornei</p><p>a profissional de confiança da família, quem eles procuravam quando preci-</p><p>savam resolver algo, ou para estar presente nas conversas com a equipe. Esta</p><p>relação também foi um facilitador frente ao processo de luto antecipatório</p><p>vivenciado pela família do paciente.</p><p>Hermes e Lamarca (2013) ressaltam que a escuta, o acolhimento e</p><p>a boa comunicação interpessoal são imprescindíveis para o trabalho do</p><p>psicólogo, visando o conhecimento das suas questões, com o objetivo de</p><p>criar uma relação de confiança com o paciente. Neste momento a relação de</p><p>confiança foi reforçada. Durante os atendimentos, sua esposa e seus filhos</p><p>relembraram dos momentos felizes vivenciados ao lado do paciente. Em</p><p>seus discursos, falavam do paciente como se ele já tivesse morrido, o que</p><p>demonstra a vivência do luto antecipatório.</p><p>O paciente apresentava sentimentos de raiva e revolta frente à sua</p><p>situação. Falava sobre seus medos e sobre sua vida antes da doença.</p><p>Demonstrava esforços para manter sua autonomia e falava sobre seus dese-</p><p>jos mesmo nos momentos em que apresentava confusão mental, desenca-</p><p>deado pelo quadro em que se encontrava. A equipe proporcionou momentos</p><p>de escuta a este paciente, teve empatia e permitiu que ele tivesse seus</p><p>desejos, vontade e autonomia respeitados. O paciente apresentou rebai-</p><p>xamento do nível de consciência e faleceu um mês após sua internação.</p><p>O trabalho foi realizado com este paciente e sua família utilizando meu</p><p>conhecimento sobre Cuidados Paliativos. Possibilitei um espaço de escuta</p><p>para que eles pudessem falar sobre seus sentimentos e sobre a dor frente</p><p>ao adoecimento, fase final de vida e morte. Também foi auxiliei a equipe</p><p>no contato com o paciente e com sua família, já que havia um vínculo de</p><p>confiança com todos.</p><p>Segundo Hermes e Lamarca (2013) o papel do psicólogo frente ao fim</p><p>da vida é através da busca pela manutenção da qualidade de vida do paciente,</p><p>e com isto favorecer a minimização dos sintomas desagradáveis e do sofri-</p><p>mento, mesmo diante da morte. O trabalho do psicólogo deve ser realizado</p><p>durante todo o processo do tratamento, visando também auxiliar o paciente e</p><p>sua família a falar sobre seus sentimentos, o que poderá facilitar a elaboração</p><p>acerca do adoecimento e morte (Nunes, 2009).</p><p>Acredito que o meu conhecimento sobre os Cuidados Paliativos e a</p><p>postura da equipe multiprofissional foram facilitadores no processo de ela-</p><p>boração e enfrentamento desta família. O discurso médico era claro, e todos</p><p>foram empáticos e atenciosos, o que facilitou a compreensão das informações</p><p>recebidas. Realizávamos reuniões de equipe semanalmente para discussão dos</p><p>casos, o que proporcionou o contato de todos os membros da equipe com este</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 99</p><p>paciente e sua família e o conhecimento de seus sentimentos, proporcionando</p><p>confiança e segurança em todos os envolvidos.</p><p>Furtado e Leite (2017) salientam a importância do cuidado com a famí-</p><p>lia do paciente em Cuidados Paliativos informando-os de maneira clara e</p><p>empática, pois a falta de informação e um lugar onde os indivíduos possam</p><p>expressar seus sentimentos de forma adequada, pode dificultar o processo de</p><p>elaboração. Foi disponibilizado atendimento psicológico à família do paciente</p><p>após sua morte, tendo em vista a importância do cuidado com a família do</p><p>paciente em Cuidados Paliativos mesmo após sua morte. Não retornaram ao</p><p>hospital, mas sua esposa entrou em contato para agradecer minha ajuda em</p><p>todos os momentos.</p><p>Caso 2</p><p>O segundo caso trata-se de uma paciente do sexo feminino, 65 anos,</p><p>divorciada, reside com o filho e a nora, com diagnóstico de tumor de reto</p><p>e recidiva local extensa. Foi submetida aos tratamentos de cirurgia, qui-</p><p>mioterapia e radioterapia. Durante a cirurgia foi necessário realizar o pro-</p><p>cedimento de colostomia. A paciente retornou dias após a cirurgia para a</p><p>consulta com o médico, e este a encaminhou ao serviço de psicologia, por</p><p>apresentar humor deprimido.</p><p>Chegou ao ambulatório de psicologia para o primeiro atendimento acom-</p><p>panhada pela nora. No momento do atendimento psicológico a paciente apre-</p><p>sentou humor deprimido e fragilidade emocional, com episódios de choro.</p><p>Pelo relato da paciente, seu estado</p><p>emocional era reativo ao adoecimento e às</p><p>dificuldades enfrentadas na adaptação ao uso da bolsa de colostomia. Referia</p><p>perda da autonomia após adoecimento e uso da bolsa, pois precisava da ajuda</p><p>do filho e da nora com o tratamento e com os cuidados diários. Relatou tam-</p><p>bém isolamento de pessoas e de locais onde costumava ir, inclusive da igreja</p><p>que frequentava, o que causava tristeza.</p><p>Durante o processo de adoecimento, a paciente começou a se queixar</p><p>de dor com muita frequência, motivo pelo qual a equipe assistente solicitou</p><p>avaliação e acompanhamento do serviço de dor e Cuidados Paliativos para</p><p>avaliação e controle de dor. A paciente começou a ser acompanhada também</p><p>por esta equipe, em conjunto com a equipe de Oncologia e cirurgia. Após</p><p>realizar todos os tratamentos curativos, sem resposta de cura, a paciente apre-</p><p>sentou recidiva da doença e piora do quadro clínico, e através da avaliação</p><p>da equipe médica foi verificado a incurabilidade da doença.</p><p>A partir deste momento os Cuidados Paliativos, que já eram realizados</p><p>em conjunto com as outras equipes, se tornou exclusivo. Isto demonstra que</p><p>os Cuidados Paliativos foram realizados de acordo com o que é estabelecido</p><p>100</p><p>atualmente pela OMS, e que a compreensão dos profissionais sobre como</p><p>realizar este cuidado está se transformando e se disseminando. A paciente</p><p>demonstrava pouca compreensão sobre o que eram Cuidados Paliativos e o</p><p>motivo de seu encaminhamento. Apesar da pouca compreensão sobre estes</p><p>dois conceitos a paciente demonstrava percepção de sua piora, e manifes-</p><p>tava os sentimentos de tristeza e revolta, verbalizando medo da morte. Pude</p><p>observar que a paciente utilizava a negação como mecanismo de defesa e</p><p>enfrentamento; sabemos que este mecanismo pode estar presente ao enfrentar</p><p>doenças incuráveis.</p><p>Com a piora de seu quadro clínico e a intensificação das dores, a paciente</p><p>demonstrou exacerbação dos sintomas depressivos. Dizia que o que mais</p><p>lhe causava sofrimento era a dor física, causada pelo tumor e complicações</p><p>da doença. Através dos atendimentos pude constatar que ela também estava</p><p>sofrendo de mais de três tipos de dor: a dor emocional, reativa às implicações</p><p>do adoecimento em sua vida e prognóstico reservado; a dor social reativa à</p><p>perda do controle de sua vida e isolamento; e a dor espiritual, causada pela</p><p>perda da esperança. Frente a esta avaliação pude avaliar em conjunto com a</p><p>equipe multiprofissional que a dor da paciente não era só a dor física, mas</p><p>também se tratava da ‘dor total’.</p><p>A “dor total” foi definida por Cicely Saunders (precursora dos Cuidados</p><p>Paliativos) como uma dor multidimensional, na qual o componente físico da</p><p>dor pode ser influenciado pelos componentes emocionais, sociais e espirituais.</p><p>Sabe-se que a dor física pode ser a maior causa de sofrimento, mas a dor emo-</p><p>cional também pode causar sofrimento, podendo ter como consequência alte-</p><p>ração do humor e sentimentos de desesperança. Também podem ser incluídas</p><p>neste conceito de ‘dor total’, a dor social, resultante da perda do papel social</p><p>exercido junto à família, amigos e a dor espiritual, reativa à perda do sentido</p><p>da vida e da esperança) (Hennemann-Krause, 2012). Este conceito de dor</p><p>total se encaixa no caso desta paciente e na filosofia dos Cuidados Paliativos.</p><p>Acolhi a paciente e trabalhei com ela questões relacionadas à dor total</p><p>através da escuta, apoio, interpretações e ressignificações. O trabalho realizado</p><p>através da escuta, apoio, interpretações e ressignificações. Auxiliei a paciente</p><p>na elaboração do momento vivido, na resolução de questões burocráticas do</p><p>tratamento, fortalecimento de sua autonomia frente à sua vida, criação e poten-</p><p>cialização de mecanismos de enfrentamento e das suas redes de suporte. O</p><p>vínculo com a paciente foi extremamente importante na condução deste caso.</p><p>Este vínculo se estendeu também aos seus familiares, que também foram acom-</p><p>panhados durante todo o processo de adoecimento, tratamento e morte.</p><p>Sendo assim, o trabalho foi realizado com a paciente e sua família</p><p>seguindo a filosofia dos Cuidados Paliativos, e isto só foi possível devido ao</p><p>meu conhecimento sobre o assunto, o que me guiou e auxiliou nas intervenções</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 101</p><p>a serem realizadas. Segundo Reigada et al. (2014) os Cuidados Paliativos tem</p><p>como um de seus objetivos oferecer apoio a família do paciente, frente à sua</p><p>função de cuidar, para que este momento seja vivenciado por eles de uma</p><p>forma saudável, apesar de todas as dificuldades enfrentadas. O conhecimento</p><p>da história de vida do paciente e de sua família, e a compreensão frente aos</p><p>sentimentos desencadeados e comportamentos manifestados são facilitado-</p><p>res no enfrentamento do processo de doença avançada, e é importante que</p><p>o apoio seja prestado a todos de forma singular, pois cada paciente e cada</p><p>família é única.</p><p>O meu conhecimento sobre a história de vida destas pessoas, que foi</p><p>possível através do vínculo e da minha escuta, foi extremamente importante</p><p>na condução deste caso. Os familiares da paciente demonstravam compreen-</p><p>são do que era Cuidados Paliativos exclusivos, mas continuavam buscando</p><p>respostas e continuavam mantendo a esperança de cura como mecanismo</p><p>de enfrentamento. A esperança destes familiares só se transformou em</p><p>desesperança no momento em que foi conversado com os médicos na visita</p><p>domiciliar, sobre a possibilidade de morte em um curto período. Foi aí que</p><p>surgiram os sentimentos de medo, angústia, impotência e tristeza.</p><p>Segundo Hudson (2006) tanto o paciente quanto sua família podem</p><p>vivenciar na fase final de vida diferentes sentimentos e comportamentos.</p><p>Frente a isto é importante que a equipe estabeleça uma relação de confiança</p><p>com todos, para que eles sintam que não estão sozinhos. Também é importante</p><p>auxiliar estas pessoas a reforçar suas capacidades e potencialidades, visando</p><p>a tomada de consciência de cada um frente às situações difíceis e utilização</p><p>de mecanismos de enfrentamento frente ao processo de morte.</p><p>Durante a visita domiciliar também foi ofertada uma escuta empática</p><p>aos familiares da paciente, enquanto a médica e enfermeira a atendiam. Eles</p><p>demonstravam estar tristes e em sofrimento, mas estavam conscientes da</p><p>real situação. Falavam sobre tudo que fizeram para ajudá-la, relembrando</p><p>todos os momentos. Eles demonstravam a vivência do luto antecipatório,</p><p>o preparo para a morte da paciente e aceitação da realidade como se apre-</p><p>sentava. Referiam que estavam fazendo tudo que a paciente gostaria que</p><p>fosse feito neste momento, e que seu desejo era estar em sua casa e morrer</p><p>perto da família e dos amigos. A visita de amigos e de familiares, a pre-</p><p>sença de sua cachorrinha de estimação e o carinho de todos a amparavam</p><p>naquele momento.</p><p>Isto demonstra mais uma vez que os Cuidados Paliativos estavam sendo</p><p>realizados de acordo com seus princípios, inclusive pela família da paciente,</p><p>que buscava proporcionar a ela conforto, controle da dor, respeito à sua dig-</p><p>nidade e carinho para que ela tivesse uma ‘boa morte’ em sua casa. A boa</p><p>morte, que também recebe o nome de ortotanásia é a morte idealizada na</p><p>102</p><p>filosofia dos Cuidados Paliativos. Segundo Santoro (2003) este tipo de morte</p><p>é a morte digna e sem sofrimento, que acontece através da conduta correta</p><p>sem antecipar ou retardar o processo.</p><p>Sua família já havia conversado com ela, e ambos haviam decidido não</p><p>prolongar a vida da paciente, como não havia possibilidade de cura. Inclusive,</p><p>na última internação da paciente, foi decidido por ela e por sua família sua ida</p><p>para casa, pois o desejo de todos eles era que a paciente morresse em casa,</p><p>próximo de sua família.</p><p>Durante a visita domiciliar, também conversei com a paciente, e mesmo</p><p>com dificuldade de se comunicar, pronunciou algumas palavras. Segurei</p><p>em sua mão naquele momento e a escutei. Neste momento foi possível</p><p>sentir a importância do vínculo estabelecido por nós. Ela falou sobre sua</p><p>casa, sobre a visita da</p><p>equipe e continuou pensativa e quieta. Demonstrava</p><p>naquele momento estar sem dor, confortável, bem cuidada, esperando o</p><p>momento de sua morte ao lado de sua família. Tanto a paciente, quanto sua</p><p>família demonstravam aceitação do momento que estavam vivendo, com a</p><p>proximidade de morte.</p><p>A paciente demonstrava também o sentimento de gratidão pelos cuidados</p><p>oferecidos por mim, pela equipe e por sua família. A paciente faleceu alguns</p><p>dias após a visita, e fomos informados por sua família, que me procurou</p><p>solicitando atendimento psicológico durante o processo de luto. Os familiares</p><p>foram encaminhados ao grupo de luto da instituição. Continuei realizando os</p><p>atendimentos com eles por alguns meses. Mais uma vez o CP se fez presente,</p><p>pois tem como um de seus princípios oferecer assistência aos familiares do</p><p>paciente, mesmo após a morte do paciente.</p><p>Este caso ilustra como a filosofia dos Cuidados Paliativos é um modelo</p><p>de cuidado humanizado, e o quanto é importante conhecê-lo e compreendê-lo</p><p>para que ele seja utilizado e disseminado em todas as instituições de saúde. Os</p><p>Cuidados Paliativos preconizam acima de tudo o respeito com o paciente, com</p><p>o objetivo de promover seu bem-estar físico, psicológico, social e espiritual,</p><p>tendo em vista seus sentimentos, desejos e escolhas. Este cuidado também</p><p>tem como objetivo o cuidar da família do paciente em todos os momentos.</p><p>O vínculo com o paciente e sua família foi um facilitador do meu trabalho,</p><p>pois trabalhei como um ego auxiliar, um elo entre eles e a equipe multipro-</p><p>fissional, auxiliando-os em todos os momentos. É importante pensarmos que</p><p>os Cuidados Paliativos é um direito humano, e deve ser ofertado a todos, pois</p><p>ele propicia uma vida digna e uma morte humanizada.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 103</p><p>Considerações Finais</p><p>A experiência da autora com Cuidados Paliativos se deu através do traba-</p><p>lho com pacientes oncológicos, e sua filosofia me encantou desde o primeiro</p><p>atendimento realizado com estes pacientes. Aprofundei-me neste assunto atra-</p><p>vés de uma pesquisa realizada para avaliar qual a compreensão dos profissionais</p><p>de uma UTI oncológica sobre os Cuidados Paliativos. O conceito dos Cuidados</p><p>Paliativos sofreu reformulações ao longo dos anos, o que se apresenta como</p><p>um ponto positivo, afinal o conceito foi ampliado. Inicialmente os Cuidados</p><p>Paliativos eram restritos à fase final de vida, mas hoje sabemos que este cuidado</p><p>está presente inclusive em conjunto com o tratamento curativo.</p><p>Mesmo após essas reformulações, através de minha pesquisa constatei</p><p>que os Cuidados Paliativos ainda são vistos por alguns profissionais como</p><p>um cuidado dispensado somente no fim da vida. Frente a isto acredito que</p><p>os profissionais necessitam ter um aprofundamento teórico sobre este tema</p><p>através de sua formação profissional, visando uma maior compreensão sobre</p><p>o assunto. Os princípios dos Cuidados Paliativos ressaltam a importância em</p><p>oferecer cuidado à família dos pacientes, que são sua rede de apoio. Ressaltam</p><p>também a importância em oferecer um cuidado integral, realizado através de</p><p>uma equipe multiprofissional.</p><p>Entre os objetivos dos Cuidados Paliativos se destacam o respeito à</p><p>autonomia do paciente e independência, e a promoção de ações que visem</p><p>o seu conforto, e uma avaliação criteriosa dos sintomas e da dor, cuidados</p><p>com alimentação e higiene. A bioética contribui de forma direta com a com-</p><p>preensão, disseminação e realização das ações dos Cuidados Paliativos nas</p><p>instituições de saúde, através de explicações dos conceitos de eutanásia, dis-</p><p>tanásia e ortotanásia, entre outros assuntos evitando a ocorrência de dilemas</p><p>éticos frente a um assunto tão delicado como é a morte.</p><p>Sendo assim, acredita-se que seja importante criar um espaço de dis-</p><p>cussão sobre os Cuidados Paliativos e assuntos como a bioética dentro das</p><p>instituições de saúde e universidades, visando um maior conhecimento e</p><p>compreensão sobre o tema, o que poderá influenciar positivamente nas ações</p><p>destes profissionais que atuam com Cuidados Paliativos. Acredita-se também</p><p>na importância de incluir disciplinas sobre este assunto nos cursos de gradua-</p><p>ção dos profissionais de saúde, já que a maioria dos participantes de minha</p><p>pesquisa não tiveram conteúdos relacionados ao assunto em sua formação.</p><p>Concluiu-se então que o CP visa a qualidade de vida do paciente, inclu-</p><p>sive no momento final de sua vida. Sua assistência é humanizada e a morte é</p><p>encarada como um estágio final da vida. O CP tem como ideal a ‘boa morte’,</p><p>que é a morte com o mínimo de sofrimento tanto para o paciente, quanto</p><p>104</p><p>para sua família. Enfim, espero que as instituições de saúde possam levar aos</p><p>seus profissionais o conhecimento sobre o CP, com o objetivo de oferecer um</p><p>cuidado humanizado ao paciente e sua família, tendo em vista que o cuidado</p><p>paliativo não é uma opção de tratamento, e sim uma complementação do</p><p>acompanhamento do paciente.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2009). Manual de cuidados</p><p>paliativos. [Versão digital em Adobe Reader]. Recuperado de: https://</p><p>paliativo.org.br/biblioteca/09-09-2013_Manual_de_cuidados_paliati-</p><p>vos_ANCP.pdf</p><p>Braz, M. S., & Franco, M. H. P. (2017) Profissionais Paliativistas e suas Contri-</p><p>buições na Prevenção de Luto Complicado. Psicologia: Ciência e Pro-</p><p>fissão, 37 (1), 90-105. https://doi.org/10.1590/1982-3703001702016</p><p>Evangelista, C. B., Lopes, M. E. L., Costa, S. F. G., Batista, P. S. S., Batista,</p><p>J. B. V., & Oliveira, A. M. M. (2016). Palliative care and spirituality:</p><p>an integrative literature review. Revista Brasileira de Enfermagem, 69</p><p>(3), 554-563. https://doi.org/10.1590/0034-7167.2016690324</p><p>Flach, K., Lobo, B. O. M., Potter, J. R., & Lima, N. S. (2012). O luto ante-</p><p>cipatório na unidade de terapia intensiva pediátrica: relato de expe-</p><p>riência. Revista da SBPH, 15 (1), 83-100. Recuperado de http://</p><p>pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-</p><p>08582012000100006&lng=pt&tlng=pt</p><p>Fonseca A, Geovanini F. (2013). Cuidados paliativos na formação do</p><p>profissional da área de saúde. Rev. bras. educ. med, 37 (1), p. 120-</p><p>125. https://doi.org/10.1590/S0100-55022013000100017</p><p>Furtado, M. E. M. F., & Leite, D. M. C. (2017). Cuidados paliativos sob a ótica</p><p>de familiares de pacientes com neoplasia de pulmão. Interface Botu-</p><p>catu, 21 (63), 969-80. https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0582</p><p>Gomes, A. A., Luisa, A. Z., & Othero, M. B. (2016). Cuidados paliati-</p><p>vos. Estudos avançados, 30 (88), 155-166. https://doi.org/10.1590/</p><p>s0103-40142016.30880011</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 105</p><p>Hennemann-Krause, L. (2012) Dor no Fim da Vida: Avaliar para tratar. Revista</p><p>do Hospital Universitário Pedro Ernesto, UERJ. [Versão digital em</p><p>adobe Reader] Recuperado de https://www.e-publicacoes.uerj.br/</p><p>index.php/revistahupe/article/view/8923/6832</p><p>Hermes, H. R., & Lamarca, I. C. A. (2013). Cuidados paliativos: uma</p><p>abordagem a partir das categorias profissionais de saúde. Ciên-</p><p>cia & Saúde Coletiva, 18 (9), 2577-2588. https://doi.org/10.1590/</p><p>S1413-81232013000900012</p><p>Hudson, P. (2006) How well do family caregivers cope after caring for a relative</p><p>with advanced disease and how can health professionals enhance their</p><p>support? Palliat Care Med, 9 (3), p. 694-703. https://doi.org/10.1089/</p><p>jpm.2006.9.694</p><p>Kovács, M. J. Educação para a morte. (2003). Temas e reflexões,</p><p>(p, 224). Recuperado de http://www.scielo.br/scielo.php?script=</p><p>sci_arttext&pid=S141498932005000300012</p><p>Marta, G. N., Hanna, S. A., & Silva, J. L. F. (2010) Cuidados paliativos e</p><p>ortotanásia. Diagnóstico e Tratamento, 15 (2), 58-60. http://files.bvs.</p><p>br/upload/S/1413-9979/2010/v15n2/a58-60.pdf.</p><p>Matsumoto, D. Y. (2012) Cuidados Paliativos: conceito, fundamentos e princí-</p><p>pios. In: Carvalho, R. T.; PARSONS, H. A. (Org.) Manual de Cuidados</p><p>Paliativos, (p. 23-30) São Paulo, SP. Academia Nacional de Cuidados</p><p>Paliativos (ANCP).</p><p>Menezes, R. A. (2003) Tecnologia e “Morte</p><p>de câncer</p><p>de mama’. Este conceito foi anunciado por Calhoun e Tedeschi, na década</p><p>de 1990 onde, para algumas pessoas, acontecimentos traumáticos passam a</p><p>ter oportunidades de crescimento pessoal e relacional. É apontada a vivência</p><p>do câncer de mama em mulheres sobreviventes, como evento estressor, uma</p><p>experiência traumática que pode servir como oportunidade para aprenderem</p><p>e, portanto, crescerem enquanto pessoas.</p><p>O capítulo 10 mostra a importância do coping, através de um relato</p><p>de experiência, junto ao paciente infantil hospitalizado e sua mãe. O câncer</p><p>durante a infância, se caracteriza como um elemento estressor para os pais,</p><p>pois é uma ameaça real e imprevisível, na mesma medida em que, receber notí-</p><p>cias de que seu filho tem uma doença que oferece risco de vida, é um evento</p><p>que pode se tornar traumático. A autora nos mostra como se torna fundamental</p><p>auxiliar os pais no enfrentamento da doença e alívio de seu sofrimento, pois</p><p>são fundamentais para apoio emocional a criança em tratamento oncológico.</p><p>O próximo capítulo (11), fala sobre ‘lutos e perdas no tratamento onco-</p><p>lógico’. Quando adoecemos ou quando acompanhamos uma pessoa em seu</p><p>processo de adoecimento, as perdas são partes marcantes do enfrentamento da</p><p>situação. Cada perda sofrida traz consequências e geram processos de luto para</p><p>pacientes, familiares, cuidadores, profissionais da saúde, entre outros. A autora</p><p>mostra que o luto, diante de qualquer uma destas perdas, é uma reação normal e</p><p>esperada em consequência à uma perda significativa. É parte natural da existência</p><p>humana, acompanha todo o ciclo vital e precisa ser vivido para ser superado.</p><p>O capítulo 12 trata do ‘feminino frente ao câncer de mama’, através de</p><p>um entendimento psicodinâmico. Trata da visão subjetiva da mulher, porta-</p><p>dora de câncer de mama, buscando compreender aspectos implicados no seu</p><p>adoecimento. Mostra da importância do atendimento multidisciplinar e do</p><p>papel do psicólogo no contexto.</p><p>Os capítulos 13 e 14 trazem os recursos lúdicos e o câncer infantil, mos-</p><p>trando que no tratamento oncológico infantil, atividades prazerosas e alegres</p><p>devem ser proporcionadas à criança como aliadas ao seu desenvolvimento e</p><p>reabilitação, e não como simples passatempo. O brincar é apresentado como</p><p>de ajuda à criança, frente as suas necessidades socioemocionais preservando,</p><p>na medida do possível, estas necessidades, pois quando brinca ela se comu-</p><p>nica, se expressa, se diverte e relaxa. A psicologia pediátrica é inserida através</p><p>de intervenções pela terapia cognitiva. A autora mostra que a abordagem</p><p>cognitiva, é aquela que melhor se aproxima da prática assistencial em saúde,</p><p>devido a sua agilidade.</p><p>O capítulo 15, trata do ‘paciente idoso oncológico e a Covid-19’. As</p><p>autoras apontam o envelhecimento humano como fenômeno universal, além</p><p>16</p><p>de apontarem para a mudança da pirâmide epidemiológica. Esta transição</p><p>demográfica e epidemiológica traz grandes desafios, sendo responsável pelo</p><p>surgimento de novas demandas de saúde, principalmente aquelas relacionadas</p><p>a doenças crônicas, como é o caso do câncer. O capítulo mostra que adaptar-</p><p>-se ao processo de envelhecimento, bem como às mudanças impostas pela</p><p>vivência do adoecimento por câncer, se constituiu em uma forma de cuidar</p><p>de si. Isso porque, a convivência do envelhecer com o câncer pode causar</p><p>efeitos diversos na vida do paciente se ele não souber utilizar estratégias de</p><p>enfrentamento adequadas.</p><p>Como última contribuição, o capítulo seguinte (16), apresenta tema atual</p><p>e instigante – ‘o câncer no contexto da pandemia de COVID-19’. As autoras</p><p>abordam as repercussões psicológicas e suas implicações práticas na assistên-</p><p>cia a pessoas com câncer e seus familiares nesta pandemia. Caracterizam, de</p><p>forma geral, a pandemia, com destaque aos impactos psicossociais, discutem</p><p>aspectos relacionados ao câncer, enfatizando as repercussões psicológicas que</p><p>podem ser experienciadas pelos pacientes oncológicos e seus familiares na</p><p>vigência da pandemia, finalizando com a apresentação dos desafios e poten-</p><p>cialidades das intervenções psicológicas diante do cenário atual.</p><p>Meu obrigada às organizadoras.</p><p>Que este Livro seja proveitoso a todos os leitores.</p><p>Tânia Rudnicki</p><p>PRÓLOGO</p><p>Pensar o homem a partir de intervenções dentro de uma abordagem holís-</p><p>tica, integral, já faz parte de qualquer protocolo do profissional que trabalha</p><p>com saúde. A Psicologia Hospitalar, apesar de todas as críticas que possa</p><p>receber, nesse aspecto, está à frente em relação a outras áreas de cuidado.</p><p>Tarefa desafiadora e nada fácil se for levado em conta a diversidade e as</p><p>condições socioeconômicas e políticas de nosso País, além da falta de inves-</p><p>timento em pesquisa na área de saúde. Esse contexto adverso, no entanto, não</p><p>impede os profissionais na busca de melhores estratégias para trabalhar com</p><p>seus pacientes, no sentido de minimizar os efeitos do adoecimento.</p><p>Quando falamos de câncer sabemos que os efeitos emocionais são ainda</p><p>mais devastadores. É uma doença que é atravessada por uma série de signi-</p><p>ficados e que o psicólogo precisa ter uma escuta qualificada para perceber</p><p>qual é realmente a demanda e de onde parte essa demanda. É do paciente?</p><p>Da família? Da Equipe? De onde vem realmente esse pedido?</p><p>O cenário quase sempre é o mesmo: a pessoa que se encontra, nesse</p><p>momento existencial, com uma doença chamada câncer, não é a protago-</p><p>nista da cena de seu tratamento. Quem ou o que ocupa esse lugar pode ser</p><p>muitas coisas, inclusive a própria doença. Daí a importância do profissional</p><p>psicólogo junto a pessoa em sofrimento, ajudando a trabalhar as situações</p><p>críticas que o câncer provoca. Desde os sentimentos que emergem quando</p><p>recebe o diagnóstico, todo o processo de negação do câncer, depois durante</p><p>o acompanhamento do tratamento, final do tratamento e pós-tratamento, que</p><p>nem sempre recebe atenção. Fase importante, porque em muitos casos as</p><p>pessoas conseguem lidar com o processo, até porque têm todo o apoio de</p><p>uma equipe de profissionais.</p><p>No entanto, quando retornam para seu cotidiano se deparam com seus</p><p>medos e outros sentimentos e não sabem o que fazer, além de se encontrarem</p><p>sozinhas. Nesse momento, há uma cobrança de que está na hora de voltar à</p><p>vida normal, de que está tudo bem. Porém, para elas não está. E pior, elas não</p><p>sabem dizer o que não está bem.</p><p>A necessidade de um profissional que possa fazer essa tradução é vital.</p><p>Sabemos que estas situações não são exclusivas dos tratamentos de câncer,</p><p>outros tipos de adoecimento também trazem grande sofrimento psíquico. A</p><p>diferença é que o câncer traz colado ainda a questão da morte. Ter o diagnós-</p><p>tico de câncer é se deparar com a questão de finitude. Além disso, emergem</p><p>diferentes sentimentos e percepções que necessitam ser compreendidos, tais</p><p>como ansiedade, raiva, angústia, culpa e depressão e, muitas vezes, tentativas</p><p>de suicídio como mecanismo de enfrentamento.</p><p>18</p><p>O relato do manejo destas e outras situações, que fazem parte do coti-</p><p>diano do psicólogo, nos diferentes contextos de saúde, é resultado da expe-</p><p>riência de cada profissional desta publicação. Todo conhecimento produzido e</p><p>divulgado sempre é muito bem-vindo, pois é uma forma de compartilhar o que</p><p>está sendo pesquisado ou vivido na prática. E, como professora universitária</p><p>isso é muito comemorado, porque estamos sempre buscando novos materiais</p><p>para levar para a formação dos alunos.</p><p>Minha alegria de participar deste livro não se limita a uma questão única.</p><p>Fiquei muito contente de ter sido convidada para fazer a apresentação deste</p><p>livro, pois há um carinho todo especial por esta publicação. Tudo começou</p><p>em Salvador, durante o XII Congresso da Sociedade Brasileira de Psicologia</p><p>Hospitalar, em 2019, quando começamos a pensar qual seria o nome deste</p><p>livro. Estávamos eu, Camilla Volpato Broering e Ana Carolina Seara no quarto</p><p>conversando e, depois de muitas sugestões e risadas, um nome saiu e foi con-</p><p>senso, quando alguém gritou: – Escreve, senão vamos esquecer! E</p><p>Natural”: o morrer na con-</p><p>temporaneidade. Physis, 13 (2), 367-385. https://doi.org/10.1590/</p><p>S0103-73312003000200008</p><p>Moritz, R. D. A., Capalbo, M., Forte, D. N., Kretzer, L. P., & Lago, P. et al.</p><p>(2011). II Fórum do “Grupo de Estudos do fim da vida do Cone Sul”:</p><p>definições, recomendações e ações integradas para cuidados paliati-</p><p>vos na unidade de terapia intensiva de adultos e pediátrica. Revista</p><p>Brasileira de Terapia Intensiva. São Paulo, 23 (1), p. 24-29. https://</p><p>doi.org/10.1590/S0103-507X2011000100005</p><p>Nunes, L. (2009). O papel do psicólogo na equipe de Cuidados Paliativos.</p><p>In: Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de</p><p>106</p><p>Cuidados Paliativos (p. 218-220), São Paulo, SP. Academia Nacional</p><p>de Cuidados Paliativos (ANCP).</p><p>Reigada, C.; Ribeiro, J. L. P., Novellas, A., & Pereira, J. L. (2014). O Suporte</p><p>à Família em Cuidados Paliativos. Textos & Contextos. Porto Alegre, v.</p><p>13, n. 1, p. 159-169. https://doi.org/10.15448/1677-9509.2014.1.16478</p><p>Resolução CFM Nº 1.805/2006 (2006). Publicada no D.O.U., 28 nov. 2006,</p><p>Seção I, p. 169. Recuperado de http://www.portalmedico.org.br/reso-</p><p>lucoes/cfm/2006/1805_2006.htm</p><p>Sales, C. A., & D’Artibale, E. F. (2012). O cuidar na terminalidade da vida:</p><p>escutando os familiares. Ciência, Cuidado E Saúde. 10 (4), 666-673.</p><p>https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v10i4.18309</p><p>Santana J. C. B, Rigueira, A. C. de M., & Dutra, B. S. (2010). Distanásia:</p><p>reflexões sobre até quando prolongar a vida em uma Unidade de Tera-</p><p>pia Intensiva na percepção dos enfermeiros. Revista Bioethikos, São</p><p>Camilo, 4 (4), p. 402-411. Recuperado de http://www.saocamilo-sp.</p><p>br/pdf/bioethikos/80/Bioethikos_402-411_.pdf</p><p>Santoro D. C., & Oliveira, C. M. (2003) Considerações sobre morte súbita</p><p>no contexto do cuidado. Rev Enferm Brasil. 2 (5), 309-13. Recu-</p><p>perado de https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_nlinks&re-</p><p>f=000148&pid=S0104-0707200900010000500022&lng=en</p><p>Ministério da saúde normatiza cuidados paliativos no SUS. (2018). Ministé-</p><p>rio da saúde 2018. Recuperado de https://www.saude.gov.br/noticias/</p><p>agencia-saude/44723-ministerio-normatiza-cuidados-paliativos-no-sus</p><p>Vargas, M. A. de O. Silva, D. M. G.; Meirelles, B.; Zanetti, M. L.; Almeida,</p><p>A. M.; & Alves, L. M. M. (2013) Cuidados Paliativos a pessoas em</p><p>condição crônica de saúde: Tecnologias do cuidado em saúde. UFSC;</p><p>PEN. (Org.). Curso de Especialização em Linhas de Cuidado em Enfer-</p><p>magem, 1. ed. FLORIANOPOLIS: UFSC, v. 1, p. 1-126. Recuperado</p><p>de http://www.corensc.gov.br/wp-content/uploads/2016/11/Cuidados-</p><p>-Paliativos-Parte-1-Site.pdf</p><p>CAPÍTULO 6</p><p>TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS</p><p>EM PACIENTES ONCOLÓGICOS</p><p>Cleonice Zatti</p><p>Stefania Teche</p><p>Lúcia Helena Machado Freitas</p><p>Os anos 1950 marcaram a inserção da Psiquiatria no Hospital Geral no</p><p>Brasil (Sampaio, 1956). Desde então, o médico psiquiatra trabalha em con-</p><p>junto com redes de cuidado, buscando compreender cada paciente dentro do</p><p>contexto de mudanças provocadas pelo câncer.</p><p>Quando um indivíduo recebe diagnóstico de câncer, ocorrem mobiliza-</p><p>ções de ordem emocional, que trazem questões de finitude, colocam-no diante</p><p>da impossibilidade de se controlar os eventos da vida, o que leva a perturba-</p><p>ções emocionais. Sendo assim, o atendimento em saúde mental é fundamental</p><p>para que haja uma melhor aderência ao tratamento e contribui positivamente</p><p>para que o paciente enfrente a situação inesperada de adoecimento.</p><p>A incidência de novos casos de câncer no Brasil, em 2018, em homens,</p><p>foi de 300.140 para todas as neoplasias e, em mulheres foi de 282.450, sendo</p><p>os tipos mais prevalentes de próstata, pulmão e cólon nos homens e mama,</p><p>cólon e útero nas mulheres, conforme consulta realizada na base de dados</p><p>on-line do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA).</p><p>Os quadros psiquiátricos se encontram presentes em mais de 50% dos</p><p>pacientes diagnosticados com câncer, sendo necessária uma ação conjunta</p><p>entre psiquiatras e oncologistas para definir abordagens de tratamento</p><p>(Capristano, 2018).</p><p>O paciente, ao receber o diagnóstico de câncer, passa a lidar com diver-</p><p>sos sentimentos em relação a esse evento estressante, o que pode causar</p><p>angústia e medo da morte (Massie, 2004). A notícia da doença pode trazer</p><p>um efeito devastador em função de vir acompanhada da ideia de morte,</p><p>embora se saiba que a maioria dos casos são tratáveis e têm cura quando</p><p>diagnosticados precocemente.</p><p>O tratamento da doença vem acompanhado de radioterapia, quimiotera-</p><p>pia e muitas vezes de procedimentos cirúrgicos, o que pode levar o paciente</p><p>a ter medo da mutilação, inclusive trazendo uma incapacidade para realizar</p><p>tarefas no dia a dia devido a sintomas gerais que afetam sua saúde mental</p><p>108</p><p>(Meijer et al., 2011), como cansaço, preocupações, tristeza, dor, sonolência</p><p>diurna, insônia e perda do apetite.</p><p>O impacto psicológico na pessoa ao ser diagnosticada com câncer traz</p><p>uma quebra na rotina diária e na sensação de segurança; e ainda, os pacientes</p><p>entram em um luto pela ruptura da vida saudável e passam a enfrentar os pro-</p><p>cedimentos terapêuticos. As reações emocionais pós-diagnóstico podem ser</p><p>entendidas como expressões do luto antecipatório (Cardoso & Santos, 2013).</p><p>Os quadros psiquiátricos nos pacientes diagnosticados com câncer,</p><p>demonstram a magnitude e importância da ação conjunta entre psiquiatras e</p><p>oncologistas. Os principais transtornos se referem a depressão ou problemas</p><p>de ajustamento (Capristano, 2018).</p><p>Portanto, os princípios de tratamento para os pacientes com câncer</p><p>incluem uma boa avaliação da situação clínica da doença, o estágio de</p><p>desenvolvimento do câncer e as condições de tratamento. Há ainda uma</p><p>investigação da história psiquiátrica atual e passada, incluindo as questões</p><p>psicológicas sobre o entendimento e o significado da doença, além da ava-</p><p>liação da situação atual com a família, com a equipe de tratamento, com os</p><p>suportes sociais e com as questões econômicas para o tratamento.</p><p>Na clínica psiquiátrica é bastante comum atendimento a pacientes diagnos-</p><p>ticados com a doença, além das repercussões emocionais naturais pós-diagnós-</p><p>tico. No momento da primeira internação em hospital geral para o tratamento</p><p>do câncer, a Síndrome de Delirium, o Transtorno de Ajustamento e Transtorno</p><p>de Estresse Agudo são manifestações psiquiátricas prevalentes. Este último</p><p>podendo evoluir, em alguns casos, para Transtorno de Estresse Pós-Traumático.</p><p>Ao longo do tratamento ambulatorial, algumas comorbidades psiquiátricas</p><p>podem se desenvolver, como Transtorno de Ansiedade, Transtorno Somatoforme</p><p>e dor crônica e Transtorno Depressivo. A seguir, são descritos os principais</p><p>transtornos psiquiátricos e seu manejo adequado em pacientes com câncer.</p><p>Delirium</p><p>Esta é uma condição psiquiátrica encontrada frequentemente quando se</p><p>trata de pacientes com câncer, seja no diagnóstico inicial ou estágios avançados</p><p>da doença; contudo, muitas vezes é esquecida na avaliação clínica geral. O</p><p>Delirium é uma síndrome de etiologia orgânica multifatorial que se manifesta</p><p>de forma súbita, está associado a uma perturbação na atenção e consciência,</p><p>podendo ser acompanhado por perturbação no comportamento psicomotor.</p><p>Existem três subtipos de Delirium, baseados nos níveis de vigília e no compor-</p><p>tamento psicomotor: o subtipo hiperativo (agitação), o subtipo hipoativo (letar-</p><p>gia) e o subtipo misto (flutua entre os dois anteriores) (Prayce et al., 2018).</p><p>Em pacientes oncológicos a incidência de Delirium é elevada, podendo chegar</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 109</p><p>a 80% em fases mais avançadas da doença. Segundo pesquisas, os opioides,</p><p>tratamento para a dor, são responsáveis por aproximadamente 60% desses epi-</p><p>sódios e outras drogas, como corticosteroides, anticolinérgicos, antieméticos</p><p>e benzodiazepínicos, também podem estar relacionadas com eles (Centeno et</p><p>al., 2004; Santos, 2010). Para Cosetino et al. (2012), as avaliações rotineiras</p><p>por meio de ferramentas validadas para diagnóstico precoce de</p><p>Delirium</p><p>devem ser incluídas na prática dos profissionais de saúde.</p><p>Em pacientes internados que se encontram em cuidados paliativos, o</p><p>Delirium tem uma prevalência de 13-42% na admissão e de 88% nas últimas</p><p>semanas ou horas de vida. O Delirium causa em pacientes e familiares um</p><p>significativo sofrimento psíquico, e está associado com aumento da mortali-</p><p>dade (Bush et al., 2017).</p><p>Dentro do quadro de Delirium os pacientes oncológicos também podem</p><p>apresentar outros sintomas para além dos manuais psiquiátricos, sintomas</p><p>como ansiedade, medo, depressão, irritabilidade, raiva, euforia, apatia, dis-</p><p>túrbio do ciclo sono-vigília, delírios, disgrafia e labilidade emocional.</p><p>Um quadro grave de Delirium pode ser um evento pré-terminal ou um</p><p>sinal de distúrbio fisiológico, geralmente envolvendo múltiplas etiologias,</p><p>como infecção, disfunção de múltiplos órgãos, distúrbios hidroeletrolíticos,</p><p>deficiências nutricionais ou até mesmo efeitos colaterais do próprio tratamento</p><p>quimioterápico. Estima-se que dos casos de Delirium em pacientes com cân-</p><p>cer avançado, em torno de 50% seriam reversíveis (Cosetino et al., 2012). O</p><p>Delirium pode incidir em uma outra etapa da evolução da doença, como nas</p><p>situações de metástase cerebral, síndrome paraneoplásica ou encefalopatia por</p><p>insuficiência de múltiplos órgãos, merecendo atenção especial e tratamento.</p><p>O tratamento para o Delirium é remover a causa disfuncional que está</p><p>causando a condição. É acompanhado de medidas comportamentais não far-</p><p>macológicas, como um ambiente silencioso, com iluminação natural, a pre-</p><p>sença de familiares e conhecidos que auxiliem na orientação espaçotemporal</p><p>e tentem manter preservado o ciclo sono-vigília de acordo com os horários</p><p>de dia e noite. Caso seja necessária alguma medicação, esta deve ser pres-</p><p>crita de acordo com a causa do Delirium, mais frequentemente são usados os</p><p>antipsicóticos em baixas doses por um período específico.</p><p>Transtorno de Adaptação</p><p>Embora o distúrbio de adaptação seja comum, existe uma escassez</p><p>de pesquisas sobre suas consequências para a saúde física. Em estudos</p><p>anteriores que investigaram mecanismos biológicos e comportamentos</p><p>relacionados ao estresse, sugere-se que o câncer pode ser um desenca-</p><p>deante do Transtorno de Adaptação.</p><p>110</p><p>Embora ocorra em circunstâncias clínicas frequentes após importantes</p><p>eventos da vida, como o diagnóstico de câncer, o distúrbio de adaptação muitas</p><p>vezes não é considerado para a definição do diagnóstico principal. Uma vez</p><p>que prevalecem sintomas semelhantes de tristeza e preocupações, é nomeado</p><p>como depressão maior e transtorno de ansiedade por serem mais conhecidos.</p><p>No DSM-5 (APA, 2013), o Transtorno de Ajustamento (TA) é apresen-</p><p>tado como um dos transtornos psiquiátricos que compõem um conjunto hete-</p><p>rogêneo de sintomas em resposta ao estresse, desencadeados posteriormente</p><p>à ocorrência de um evento estressante, podendo ser traumático ou não.</p><p>A condição psiquiátrica do TA pode ser diagnosticada logo após a vivên-</p><p>cia de uma experiência estressante, e, conforme descrito no DSM-5, o estressor</p><p>não precisa ser necessariamente traumático. Alguns sintomas emocionais</p><p>perante um estressor podem ser entendidos como uma reação humana normal,</p><p>ao invés de um estado psicopatológico, e, portanto, com menos estigma.</p><p>O DSM-5 definiu o Transtorno de Adaptação como um conjunto de</p><p>diferentes sintomas emocionais e mudança de comportamento em resposta</p><p>a um estressor recente (3 meses do início do estressor) e identificável, como</p><p>no caso de um diagnóstico de câncer ou doença grave que ameace a vida.</p><p>Essas alterações causam sofrimento desproporcional à gravidade do estres-</p><p>sor, prejuízo significativo e não são adequadamente representadas por uma</p><p>exacerbação de um transtorno mental prévio.</p><p>O TA apresenta uma prevalência de 5 a 20%, podendo chegar a 50% em</p><p>ambiente de consultoria psiquiátrica hospitalar. O número de diagnóstico de</p><p>TA em mulheres é duas vezes maior do que em homens, porém entre crianças</p><p>e adolescentes não há diferença de gênero, destacando-se que esse último</p><p>grupo tem um risco maior para evolução de outro transtorno psiquiátrico em</p><p>comparação aos adultos (Strain & Friedman, 2013).</p><p>Um estudo alemão indicou que as mulheres com histórico clínico com</p><p>suspeita de diagnóstico de câncer de mama ou em órgãos genitais exibiram</p><p>um risco aumentado de ter diagnóstico de transtorno de ansiedade, depressão</p><p>ou distúrbios de ajustamento. De acordo com a pesquisa, esse risco foi supe-</p><p>rior a metade do risco de mulheres com diagnóstico confirmado de câncer</p><p>de mama ou em órgãos genitais. Kostev et al. (2017) e Hayes Balmadrid et</p><p>al. (2015) indicam que o diagnóstico suspeito de câncer é um fator de risco</p><p>para o desenvolvimento de condições psiquiátricas (Kostev et al., 2017; Hayes</p><p>Balmadrid et al., 2015).</p><p>Normalmente, o desenvolvimento é agudo após um estressor e tende a</p><p>resolver-se dentro de 6 meses após a resolução do estressor. As consequências</p><p>funcionais do Transtorno se dão no desempenho profissional ou acadêmico</p><p>e nas relações interpessoais. Além do mais, a consequência mais grave que</p><p>pode se desenvolver neste transtorno é a ideação suicida.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 111</p><p>O tratamento para o transtorno de Adaptação são intervenções não</p><p>farmacológicas psicoterápicas juntamente com a melhora e o desenvolvi-</p><p>mento do apoio social para a resolução e o enfrentamento dos estressores</p><p>(Appart et al., 2017).</p><p>A área clínica reconhece a utilidade de se usar o especificador “des-</p><p>moralização” para descrever a natureza de um Transtorno de Ajustamento</p><p>quando um paciente é desafiado a lidar com um grave estressor, como o câncer</p><p>avançado. Um estudo australiano investigou vinhetas que foram avaliadas</p><p>por 280 clínicos, e exibiu o especificador de “Desmoralização” (presença de</p><p>baixa moral, otimismo reduzido, sentimento de bloqueio, indefeso, sensação</p><p>de baixo enfrentamento, sentimento de baixo valor na vida) no campo clínico</p><p>este termo parece ser bem compreendido no cuidado de pacientes com câncer.</p><p>O Transtorno de Ajustamento com desmoralização obteve 77% em compara-</p><p>ção com 33% Transtorno de Ajustamento com ansiedade (teste de McNemar,</p><p>p</p><p>sintomas de TEPT,</p><p>como memórias intrusivas ou reexperimentação de estressores relacionados</p><p>112</p><p>ao câncer que já ocorreram. Ou seja, as lembranças traumáticas de eventos</p><p>relacionados ao câncer no passado devem ser referentes a algo já vivenciado,</p><p>em vez de eventos futuros temidos (Cordova et al., 2017).</p><p>O fato de a doença representar uma ameaça existencial não é uma questão</p><p>irrealista ou distorcida, pois as pessoas que enfrentam o câncer se preocupam</p><p>com a possibilidade de encurtamento da vida. Embora essa ameaça existencial</p><p>possa levar a um sofrimento intenso, ela também pode provocar mudanças</p><p>nas prioridades e valores, visões de si e dos outros e senso de significado e</p><p>espiritualidade (Cordova et al., 2017).</p><p>A avaliação de TEPT na oncopsiquiatria deve levar em consideração o</p><p>histórico psiquiátrico prévio e de trauma dos pacientes. Dado o poder preditivo</p><p>da história prévia de trauma para o desenvolvimento de sintomas de TEPT</p><p>em resposta ao câncer, o contexto no qual a experiência da doença está se</p><p>desenvolvendo precisa ser compreendido (Stanton et al., 2015; Cordova et</p><p>al., 2017). É cabível a cautela quanto à patologização nos primeiros sintomas</p><p>de estresse em relação à doença, bem como é aconselhável a aplicação de</p><p>diretrizes gerais para a avaliação e o tratamento de TEPT em pacientes com</p><p>câncer. Pesquisadores descobriram que os β bloqueadores pareciam reduzir a</p><p>memória intrusiva em 32% em pacientes recém-diagnosticados com câncer (p</p><p>mental, sendo que de 10% a 40% possuem Transtorno</p><p>Depressivo clinicamente significativo. Estudos longitudinais de pacientes com</p><p>câncer de próstata sugerem que a disfunção erétil após o tratamento curativo</p><p>pode ter um efeito psicológico significativo e levar à depressão e risco de</p><p>suicídio em homens (Klaassen et al., 2018).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 115</p><p>Na Coreia do Sul um estudo de caso-controle, pareados 1:2, comparou</p><p>uma amostra de pacientes oncológicos internados em um hospital geral. Nesta</p><p>pesquisa 40% dos casos cometeram suicídio durante o primeiro ano de desco-</p><p>berta do diagnóstico da doença, e quanto mais o estágio avançado da doença</p><p>prevaleceu, mais foi associado com um aumento no risco de suicídio nesse</p><p>período de um ano pós-diagnóstico (Ahn et al., 2015).</p><p>Pacientes com câncer que estão em risco de comportamento suicida</p><p>devem estar inscritos em programas de prevenção de suicídio (Lin et al., 2017).</p><p>Os sintomas de alerta para essa condição incluem: tristeza, desesperança,</p><p>dor não controlada, cansaço extremo, ansiedade, uso abusivo de substâncias,</p><p>sensação de desamparo e baixo suporte social.</p><p>Um estudo brasileiro em um hospital geral universitário avaliou 5.357</p><p>pacientes, sendo que destes 675 eram pacientes oncológicos. A prevalência</p><p>de Transtorno Depressivo foi de 18,3% e risco de suicídio de 4,7%. Esse</p><p>último resultado coincide com dados de um estudo anterior realizado pelos</p><p>pesquisadores, que utilizou o Mini International Neuropsychiatric Interview</p><p>(MINI) em amostra aleatória de 253 indivíduos internados, sucedendo assim</p><p>aos profissionais uma maior atenção na detecção e no tratamento do Trans-</p><p>torno Depressivo, haja vista que a depressão afeta a adesão ao tratamento,</p><p>bem como influencia a evolução do câncer e a qualidade de vida dos pacien-</p><p>tes (Fanger et al., 2010). Estudo multicêntrico recente confirma as taxas de</p><p>prevalência para transtornos depressivos em 16% e informa que idade mais</p><p>jovem, queixas de sintomas físicos, bem como de desamparo e desesperança,</p><p>foram significativamente relacionados ao diagnóstico de transtorno depressivo</p><p>maior, necessitando tratamento farmacológico (Shim et al., 2017).</p><p>O tratamento para o Transtorno Depressivo e ideação suicida inclui</p><p>medidas não farmacológicas, como intervenções psicoterápicas, e fármacos</p><p>antidepressivos a serem avaliados em suas diferentes classes e opções.</p><p>Síndrome Psicótica</p><p>Os transtornos psiquiátricos se manifestam com uma diversificada gama</p><p>de sintomas na clínica de pacientes oncológicos. A síndrome psicótica é um</p><p>sintoma significativo que se apresenta principalmente em pacientes com tumo-</p><p>res malignos graves. Nesse caso, independentemente da parte do corpo em</p><p>que se localiza o tumor, os sintomas psicóticos serão temporários. As pertur-</p><p>bações transitórias geralmente se estinguem em até 2 semanas. Na síndrome</p><p>psicótica, há uma perda de conexão com a realidade, delírios e alucinações.</p><p>Os efeitos iatrogênicos dos esteroides são bem definidos e incluem efeitos</p><p>sistêmicos como ganho de peso, insuficiência adrenal, osteoporose, formação</p><p>de catarata, psicose, miopatia e hiperglicemia (Sengupta, Lee & Wen, 2012).</p><p>116</p><p>Foram encontrados poucos estudos sobre este sintoma em pacientes</p><p>oncológicos devido ao fato de sua baixa prevalência. O tratamento para esta</p><p>condição inclui o uso de fármacos antipsicóticos típicos e atípicos a serem</p><p>avaliados pelo psiquiatra.</p><p>Cuidados Paliativos</p><p>Chama-se uma condição de cuidado paliativo a situação na qual o câncer</p><p>não apresenta chance de cura, porém é possível realizar tratamento para o</p><p>manejo dos sintomas disfuncionais. Neste cenário, foi realizado um estudo mul-</p><p>ticêntrico em sete países, em contextos de cuidados paliativos, incluindo 4.007</p><p>indivíduos. A prevalência de depressão maior nesse grupo foi de 16,5%. A</p><p>prevalência do distúrbio de adaptação isoladamente foi de 15,4% e dos trans-</p><p>tornos de ansiedade 9,8% (Mitchell et al., 2011). O tratamento dessas condições</p><p>e comorbidades melhora a qualidade de vida no estágio terminal da doença.</p><p>Conclusão</p><p>Neste capítulo, descrevemos os transtornos separadamente, porém na</p><p>prática clínica eles podem aparecer concomitantes, a separação serviu para</p><p>apresentá-los de forma didática. Conclui-se que, ao receberem a notícia de uma</p><p>doença grave, que aparece de forma inesperada, é natural os pacientes apresen-</p><p>tarem sintomas como ansiedade, tristeza, desesperança e ideias sobre a morte.</p><p>O câncer em estágio avançado, ou predisposição à doença psiquiátrica, pode</p><p>levar o paciente a manifestar esses sintomas de forma mais acentuada, portanto</p><p>é de grande importância a avaliação psíquica e distinção do que é um senti-</p><p>mento e reação esperada de sintomas que podem desenvolver psicopatologia.</p><p>Algumas condições influenciam significativamente o risco de desenvolver</p><p>uma psicopatologia, porém, se tratadas precocemente, pode-se modificar o</p><p>desfecho negativo. Essas condições são medidas gerais de saúde em relação</p><p>ao manejo adequado da dor, a manutenção da higiene do sono e do ciclo sono-</p><p>-vigília e medidas que atentem para o apetite e uma boa alimentação, assim</p><p>como a atenção ao comportamento sexual, medidas de lazer e de interação</p><p>com pessoas queridas.</p><p>A avaliação completa trará possibilidades para uma intervenção ade-</p><p>quada, considerando os princípios gerais do tratamento. As principais indica-</p><p>ções de tratamento para o paciente com câncer são intervenções cirúrgicas ou</p><p>farmacológicas no sítio do tumor. Além disso, o que contribuirá para amenizar</p><p>o sofrimento psíquico será a ajuda do serviço social, o tratamento psiquiátrico,</p><p>se necessário, a psicoterapia individual e grupos de apoio na comunidade. O</p><p>tratamento integrado para as necessidades do paciente dá um suporte adicional</p><p>e aumenta consideravelmente o desfecho positivo de cura e de bem-estar.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 117</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Ahn, M. H., Park, S., Lee, H. B., Ramsey, C. M., Na, R., Kim, S. O., Kim, J.</p><p>E., Yoon, S., & Hong, J. P. (2015). Suicide in cancer patients within</p><p>the first year of diagnosis. Psychooncology. 24 (5), 601-7. https://doi.</p><p>org/10.1002/pon.3705</p><p>American Psychiatric Association (APA) (2013). Diagnostic and statistical</p><p>manual of mental disorders: DSM-5 (5th ed). Arlington: APA.</p><p>Bush, S. H., Tierney, S., & Lawlor, P. G. (2017). Clinical Assessment and</p><p>Management of Delirium in the Palliative Care Setting. Drugs. 77</p><p>(15), 1623-1643. https://doi.org/10.1007/s40265-017-0804-3</p><p>Cardoso, É. A. O., & Santos, M. A. Luto antecipatório em pacientes com indi-</p><p>cação para o Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas. (2013).</p><p>Ciência & Saúde Coletiva, 18 (9): 2567-75. https://doi.org/10.1590/</p><p>S1413-81232013000900011</p><p>Centeno, C., Sanz, A., & Bruera, E. (2004). Delirium in advanced can-</p><p>cer patients. Palliat Med. 18 (3): 184-94. https://doi.org/10.1191/</p><p>0269216304pm879oa</p><p>Corn, B. W. (2009). Ending end-of-life phobia - A prescription for enlightened</p><p>health care reform. New England Journal of Medicine. 361 (27), e63.</p><p>https://doi.org/10.1056/NEJMp0909740</p><p>Fanger, P. C, Azevedo, R. C. S., Mauro, M. L. F., Lima, D. D., Gaspar, K. C.,</p><p>Silva, V. F., Nascimento, W. T. J., & Botega, N. J. (2010). Depressão</p><p>e comportamento suicida em pacientes oncológicos hospitalizados:</p><p>prevalência e fatores associados. Rev. Assoc. Med. Bras. [online]. 56</p><p>(2), 173-178. http://doi.org/10.1590/S0104-42302010000200015</p><p>Hayes Balmadrid, M. A, Shelby, R. A., Wren, A. A., Miller, L. S., Yoon, S.</p><p>C., & Baker, J. A. et al. (2015). Anxiety prior to breast biopsy: rela-</p><p>tionships with length of time from breast biopsy recommendation to</p><p>biopsy procedure and psychosocial factors. J Health Psychol. https://</p><p>doi.org/10.1177/1359105315607828</p><p>118</p><p>Instituto Nacional de Câncer José de Alencar Gomes da Silva (INCA). (2018).</p><p>https://www.inca.gov.br/; Accessed December 27, 2019.</p><p>Inhestern, L., Beierlein, V., Bultmann, J. C., Möller, B., Romer, G., Koch, U.,</p><p>& Bergelt,</p><p>C. (2017). Anxiety and depression in working-age cancer</p><p>survivors: a register-based study. BMC Cancer. 19; 17 (1), 347. https://</p><p>doi.org/10.1186/s12885-017-3347-9</p><p>Jimenez-Fonseca, P., Calderón, C., Hernández, R., Ramón, Y., Cajal, T., Mut,</p><p>M., Ramchandani, A., Donnay, O., & Carmona-Bayonas, A. (2018).</p><p>Factors associated with anxiety and depression in cancer patients prior</p><p>to initiating adjuvant therapy. Clin Transl Oncol. 20 (11), 1408-15.</p><p>https://doi.org/10.1007/s12094-018-1873-9</p><p>Kissane, D. W.; Bobevski, I.; Gaitanis, P.; Brooker, J.; Michael, N.; Lethborg,</p><p>C.; Richardson, G.; Webster, P.; & Hempton, C. (2017). Exploratory</p><p>examination of the utility of demoralization as a diagnostic specifier</p><p>for adjustment disorder and major depression. Gen Hosp Psychiatry;</p><p>46:20-4. https://doi.org/10.1016/j.genhosppsych.2017.01.007</p><p>Klaassen, Z., Arora, K., Wilson, S. N., King, S. A., Madi, R., Neal, de</p><p>J. R, Kurdyak, P., Kulkarni, G. S., Lewis, R. W., & Terris, M. K.</p><p>(2018). Decreasing suicide risk among patients with prostate cancer:</p><p>Implications for depression, erectile dysfunction, and suicidal ide-</p><p>ation screening. Urol Oncol. 36 (2), 60-6. https://doi.org/10.1016/j.</p><p>urolonc.2017.09.007</p><p>Kostev, K., Jacob, L., & Kalder, M. (2017). Risk of depression, anxiety,</p><p>and adjustment disorders in women with a suspected but uncon-</p><p>firmed diagnosis of breast or genital organ cancer in Germany. Can-</p><p>cer Causes Control. 28 (10), 1021-1026. https://doi.org/10.1007/</p><p>s10552-017-0948-1</p><p>Lin, Y. H., Kao, C. C., Wu, S. F., Hung, S. L., Yang, H. Y., & Tung, H. Y.</p><p>(2017). Risk factors of post-traumatic stress symptoms in patients</p><p>with cancer. J Clin Nurs. 26 (19-20), 3137-43. https://doi.org/10.1111/</p><p>jocn.13662</p><p>Lindgren, M. E., Fagundes, C. P., Alfano, C. M., Povoski, S. P., Agnese, D.</p><p>M., Arnold, M. W., Farrar, W. B., Yee, L. D., Carson, W. E., Schmidt,</p><p>C. R., & Kiecolt-Glaser, J. K. (2013). Beta-blockers may reduce</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 119</p><p>intrusive thoughts in newly diagnosed cancer patients. Psychoonco-</p><p>logy. 22, 1889-94. https://doi.org/10.1002/pon.3233</p><p>Madeira, N., Albuquerque, E., Santos, T., Mendes, A., & Roque, M. (2011).</p><p>Death ideation in cancer patients: contributing factors. Journal of Psy-</p><p>chosocial Oncology. 29 (6), 636-42. http://doi.org/10.1080/0734733</p><p>2.2011.615381</p><p>Massie, M. J. (2004). Prevalence of depression in patients with cancer. J Natl</p><p>Cancer Inst Monogr. 32, 57-71. https://doi.org/10.1093/jncimonographs/</p><p>lgh014</p><p>Meijer, A., Roseman, M., Milette, K., Coyne, J. C., Stefanek, M. E., Zie-</p><p>gelstein, R. C., Arthurs, E., Leavens, A., Palmer, S. C., Stewart, D.</p><p>E., de Jonge, P., & Thombs, B. D. (2011). Depression Screening and</p><p>Patient Outcomes in Cancer: A Systematic Review. PLoS ONE. 6 (11),</p><p>e27181. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0027181</p><p>Mitchell, A. J., Chan, M., Bhatti, H., Halton, M., Grassi, L., Johansen, C., &</p><p>Meader, N. (2011). Prevalence of depression, anxiety, and adjustment</p><p>disorder in oncological, haematological, and palliative-care settings: a</p><p>meta-analysis of 94 interview-based studies. Lancet Oncol. 12 (2), 160-</p><p>74. https://doi.org/10.1016/S1470-2045(11)70002-X</p><p>Mulligan, E., Shuster Wachen J., Naik, A., Gosian, J., & Moye, J. (2014).</p><p>Cancer as a criterion A traumatic stressor for veterans: prevalence and</p><p>correlates. Psychol Trauma. 6 (1), S73-81. https://doi.org/10.1037/</p><p>a0033721</p><p>National Cancer Institute, 2015. Cancer-Related Post-traumatic Stress</p><p>(PDQ®) Prevalence. http://www.cancer.gov/cancertopics/pdq/suppor-</p><p>tivecare/post-traumatic-tress/HealthProfessional/page2. Accessed</p><p>December 27, 2019.</p><p>Padmaja, G., Vanlalhruaii, C., Rana, S., Nandinee, D., & Hariharan, M. (2016).</p><p>Care givers’ depression, anxiety, distress, and somatization as predic-</p><p>tors of identical symptoms in cancer patients. J Cancer Res Ther, 12</p><p>(1), 53-7. https://doi.org/10.4103/0973-1482.146088</p><p>Prayce, R., Quaresma, F., & Neto, I. G. (2018). Delirium: O 7º Parâmetro</p><p>Vital? Acta Med Port. 1, 51-58. https://doi.org/10.20344/amp. 9670</p><p>120</p><p>Saad, A. M., Gad, M. M., Al-Husseini, M. J., AlKhayat, M. A., Rachid, Um.,</p><p>Alfaar, A. S., & Hamoda, H. M. (2018). Suicidal death within a year of</p><p>a cancer diagnosis: A population-based study. Rev. Câncer. 125, 972-</p><p>979. https://doi.org/10.1002/cncr.31876</p><p>Shim, E. J., Hahm, B. J., Yu, E. S., Kim, H. K., Cho, S. J., Chang, S. M.,</p><p>Yang, J. C., & Kim, J. H. (2018). Prevalence, correlates, and impact of</p><p>depressive and anxiety disorder in cancer: Findings from a multicenter</p><p>study. Palliat Support Care. 16 (5), 552-565. https://doi.org/10.1017/</p><p>S1478951517000736</p><p>Strain, J. J., & Friedman, M. Adjustment Disorders. ACP Medicine. 2013.</p><p>Disponível em: http://www.medicinanet.com.br/conteudos/acpmedi-</p><p>cine/6304/transtornos_de_ajustamento.htm. Acesso em: 11 jan. 2020.</p><p>Sampaio, A. P. (1956). Serviço psiquiátrico do hospital geral de ensino. Neu-</p><p>robiologia. 19 (1), 72-82. Disponível em: https://repositorio.ufpe.br/</p><p>bitstream/123456789/17835/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o_Juliano_</p><p>Biblioteca.pdf. Acesso em: 11 jan. 2020.</p><p>Santos, F. S. (2010). Delirium em Cuidados Paliativos. In: Franklin Santana</p><p>Santos. (Org.). Cuidados Paliativos-Diretrizes, Humanização e Alívio</p><p>de Sintomas. São Paulo: Ed. Atheneu.</p><p>Sengupta, S., Lee, E, Q, & Wen, P. Y. (2012). Neurologic complications of</p><p>cancer. ACP Medicine. http://www.medicinanet.com.br/conteudos/</p><p>acp-medicine/6477/complicacoes_neurologicas_do_cancer.htm</p><p>Stanton, A. L., Rowland, J. H., & Ganz, P. A. (2015). Life after diagnosis and</p><p>treatment of cancer in adulthood: contributions from research in psy-</p><p>chosocial oncology. Am Psychol. 70, 159-74. https://doi.org/10.1037/</p><p>a0037875</p><p>Wang, S. M., Chang, J. C., Weng, S. C., Yeh, M. K., & Lee, C. S. (2018).</p><p>Risk of suicide within 1 year of cancer diagnosis. Int J Cancer. 142</p><p>(10), 1986-93. https://doi.org/10.1002/ijc.31224</p><p>CAPÍTULO 7</p><p>O LUTO ANTECIPATÓRIO</p><p>Paula Abaurre Leverone</p><p>Nem todas as partidas, dentre as tantas que a vida nos reserva, comportam</p><p>uma despedida como a morte anunciada é capaz de fazer.</p><p>O tempo passa a ter um valor diferente quando a realidade da morte se</p><p>aproxima, a vida se torna urgente por um lado e demoradamente intensa por</p><p>outro. O choque da má notícia denuncia o que ficou por fazer e reivindica o</p><p>que ainda pode ser feito.</p><p>É nesse período entre o diagnóstico e a morte que se dá o luto anteci-</p><p>patório, um processo que possibilita ir aos poucos entrando em contato com</p><p>o sentimento de perda e organizando a partida, tanto por parte do paciente</p><p>doente, ao vivenciar o final da vida, quanto por parte das pessoas a ele vin-</p><p>culadas, pela perda do ente querido.</p><p>O anúncio de uma doença fora de possibilidades curativas afeta significa-</p><p>tivamente o sistema familiar e social no qual o paciente está inserido, exigindo</p><p>dos envolvidos uma reorganização de funções e tarefas e uma revisão de</p><p>olhares que tendem a ser de grande impacto emocional e relacional. A ameaça</p><p>de rompimento de vínculo abala o funcionamento normal do sistema, altera</p><p>a rotina familiar e faz com que recursos internos e externos sejam acionados</p><p>para enfrentar todas as mudanças no caminho.</p><p>Um diagnóstico de doença crônica por si só, por todas as perdas que</p><p>comporta e a proximidade com a morte ali implícita, pode levar a esse processo</p><p>de enlutamento, que chamamos de luto antecipatório. Tal nome é atribuído</p><p>ao fato de que o enlutado antecipa o contato com a morte iminente e inicia a</p><p>vivência e a elaboração de seu luto desde então.</p><p>O fenômeno do luto é um processo psíquico natural que se dá a partir</p><p>de uma perda significativa para o sujeito (Parkes, 1998), é algo indispensável</p><p>para a elaboração dessa perda, para o reajustamento ao mundo e da vida diante</p><p>da falta e da ausência daquele ou daquilo que foi perdido.</p><p>As perdas vão sendo sentidas em uma série de tarefas e atividades que</p><p>eram antes executadas rotineiramente e se veem inviabilizadas pelo avançar da</p><p>doença. A pessoa ainda não morreu, mas as perdas já precisam</p><p>ser elaboradas</p><p>(Kovács, 1992 apud Flach, 2012).</p><p>Para o paciente, o luto vem relacionado às diversas perdas impostas</p><p>pela doença como: a perda da sua condição de saúde e debilidades físicas; a</p><p>mudança na imagem corporal; a perda da autonomia que a doença impõe; a</p><p>122</p><p>intimidade que fica nas mãos e aos cuidados dos outros; a autoestima conse-</p><p>quentemente abalada; as mudanças no cotidiano; as funções desempenhadas</p><p>em cada papel de sua vida, que estão impossibilitadas de serem exercidas; a</p><p>identidade do sujeito que passa por uma crise e precisa ser revista; as pessoas</p><p>e coisas que deixará quando partir; e claro, a perda da própria vida.</p><p>Por parte dos amigos e familiares do paciente doente também são vividas</p><p>múltiplas perdas e, consequentemente, seus lutos: pelo estado físico e psí-</p><p>quico do ente querido doente; pelo papel e significados contidos na relação</p><p>com aquela pessoa; pelas alterações na rotina que uma doença exige; pela</p><p>antecipação do enfrentamento de um mundo sem a presença física daquele</p><p>ente e pela quebra com tudo que é conhecido, provocada pela doença e pela</p><p>aproximação da morte.</p><p>Fonseca (2012) explica que paciente e familiares podem experimentar</p><p>seus lutos a partir do momento em que entendem e assumem que o diagnóstico</p><p>da doença é terminal e com isso se veem diante da necessidade de reorganizar</p><p>seus recursos para enfrentar a perda iminente. Essas perdas (concretas e sim-</p><p>bólicas), segundo o autor, desencadeiam o luto antecipatório que possibilita</p><p>uma elaboração do luto, a partir do processo de adoecimento (Fonseca, 2004).</p><p>Sendo assim, o luto antecipatório pode ter a importante função de auxiliar</p><p>os pacientes e familiares na preparação para o convívio com uma enfermidade</p><p>crônica ou para uma morte iminente (Cardoso & Santos, 2013).</p><p>Origem e Definições do Conceito de Luto Antecipatório</p><p>O termo ‘luto antecipatório surgiu a partir das observações de Lindemann</p><p>(1944) apud Fonseca (2012) de esposas de soldados que apresentavam reações</p><p>de luto diante da partida dos maridos para guerra. A possibilidade da morte</p><p>antecipava um processo de desligamento afetivo, como forma de proteção e</p><p>defesa diante das circunstâncias, o que foi considerado por Lidemann como</p><p>um fenômeno adaptativo e a partir daí, esse fenômeno passou a ser estudado</p><p>também em casos de pessoas que enfrentam doenças fora de possibilidades</p><p>curativas e seus familiares. Flach et al. (2012) reuniram em sua pesquisa</p><p>algumas definições do termo ‘luto antecipatório’ de diferentes autores área</p><p>da saúde transcritas a seguir: Lebow (1976) entende esse processo como um</p><p>conjunto de reações cognitivas, afetivas, culturais e sociais, experienciadas</p><p>pelo paciente e por sua família quando a morte é iminente. Pine (1986) diz</p><p>que o luto antecipatório é parte de um processo global de enlutamento, quando</p><p>se tem uma percepção consciente da realidade da perda, antecipando o luto</p><p>e com ele o eliciamento de todas as suas reações. Para Rando (1986) o luto</p><p>antecipatório é um conjunto de processos deflagrados pelo paciente e pela</p><p>família quando há uma ameaça progressiva de perda, sendo este um processo</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 123</p><p>psicossocial de enlutamento, vivido pelo paciente e pela família, na fase</p><p>compreendida entre o diagnóstico e a morte propriamente dita. Finalmente,</p><p>Worden (1998), define como o tipo de luto, que ocorre antes da perda, de fato</p><p>tem as mesmas características e sintomatologia do luto normal.</p><p>Este último autor, Worden (1998) apud Fonseca (2012), complementa</p><p>que o luto antecipatório permite iniciar, a partir do momento em que recebe o</p><p>aviso prévio de morte, a realização das tarefas do luto, listadas por ele próprio.</p><p>São elas: aceitar a realidade da perda; elaborar as dores físicas, emocionais</p><p>e comportamentais associadas à perda; ajustar-se ao ambiente e a perda de</p><p>papéis e funções próprias do relacionamento com essa pessoa; e reposicio-</p><p>nar-se em termos emocionais à pessoa e continuar a vida, ou seja encontrar</p><p>um lugar apropriado em sua vida emocional para colocar o ente querido de</p><p>forma que seja possível continuar a conviver com a ausência dele.</p><p>Outro importante trabalho que permite compreender o processo de luto</p><p>antecipatório foi desenvolvido por Elisabeth Kübler-Ross (2008). O convívio</p><p>e o trabalho com pessoas no final de suas vidas permitiu que a pesquisadora</p><p>identificasse semelhanças nos processos vividos por eles que deram origem</p><p>à teoria dos cinco estágios do luto, enfrentados pelo paciente e pelos seus</p><p>familiares diante da morte iminente.</p><p>O primeiro estágio chamado pela autora de ‘negação e isolamento’ é</p><p>uma defesa temporária que faz com que os envolvidos não precisem entrar</p><p>em contato com a realidade do fato negando-o; o segundo estágio, a ‘raiva’ é</p><p>quando não é mais possível sustentar a negação e dá-se lugar então à revolta,</p><p>à indignação com a vida, com o mundo, com Deus e com as pessoas; o ter-</p><p>ceiro estágio é chamado de ‘barganha’, onde paciente e familiares tentam</p><p>negociar com àqueles contra os quais se revoltou anteriormente sem obter</p><p>sucesso e nesse momento tentam trocas, pedidos, clemências para que aquela</p><p>realidade venha a ser modificada; em um quarto estágio a perda passa a ser</p><p>indiscutível dando lugar à ‘depressão’, uma grande tristeza e um pesar por</p><p>todas as perdas que vão sendo constatadas; por fim o quinto e último estágio</p><p>recebeu o nome de ‘aceitação’, entendido como uma assimilação da realidade</p><p>de perda, quando se torna possível conviver com ela e viver apesar dela, ou</p><p>seja uma adaptação à nova realidade.</p><p>Bowlby (1979, 1980) e Parkes (1998) apud Marrone (2009) também des-</p><p>creveram o luto através de fases ressaltando os limites difusos e a possibilidade</p><p>de sobreposição entre elas. Para esses autores o luto atravessa quatro fases:</p><p>‘entorpecimento’, ‘anseio e protesto’, ‘desespero’ e ‘recuperação e restituição’,</p><p>que podem ser identificadas, igualmente, no processo de luto antecipatório.</p><p>De acordo com esses autores a fase de entorpecimento é a reação ime-</p><p>diata à perda e representa uma rejeição a novidade, como uma anestesia</p><p>124</p><p>para amortecer o momento numa tentativa de enfrentar as emoções que a</p><p>perda desencadeia. A fase de anseio e protesto é quando o enlutado começa</p><p>a perceber a realidade da perda, busca pelo objeto perdido e experimenta</p><p>a raiva e a tristeza diante dessa realidade. A fase de desespero é reconhe-</p><p>cida por uma depressão e apatia ao constatar que a perda é irreversível. A</p><p>quarta e última fase de recuperação e restituição é onde se aceita a realidade</p><p>de perda e que à vida deve ter uma nova forma frente às ausências e às</p><p>mudanças (Marrone, 2009).</p><p>Cada teoria mencionada propõe uma visão didática do luto em geral</p><p>e não invalida a singularidade e o dinamismo da vida de cada indivíduo,</p><p>suas experiências, sua história e tudo aquilo que poderá exercer influência na</p><p>vivência do seu processo de luto.</p><p>A Morte e o Luto Antecipatório</p><p>Todos carregam convicções, crenças e significados que atribuem a vida,</p><p>às coisas, ao mundo e à morte. Diante de situações extremas, como ameaças à</p><p>vida ou o enfretamento concreto da morte, o mundo presumido se desconstrói.</p><p>Mundo presumido é o mundo que o ser humano efetivamente conhece, que</p><p>inclui tudo o que sabe ou pensa saber, desde sua interpretação do passado, as</p><p>expectativas do futuro, planos e preconceitos (Parkes, 1971 apud Franco, 2012).</p><p>Desta forma, tudo o que conhecemos, entendemos e como significamos o</p><p>mundo precisa ser revisado e reorganizado, já que muitas das visões anterio-</p><p>res parecem não fazer mais sentido depois do impacto de uma perda. Esse é o</p><p>momento que chamamos de crise e que pode ser ocasionado por qualquer tipo</p><p>de perda, ameaça ou mudança significativa na vida de um sujeito.</p><p>Diante da crise, faz-se necessária então a reconstrução dos pressupostos</p><p>acerca de si mesmo e do mundo que foram destruídos (Worden, 2009). Essas</p><p>circunstâncias também obrigam os envolvidos a lidarem com as várias ques-</p><p>tões contidas</p><p>na tão evitada finitude humana, com a qual não costumamos</p><p>dialogar no dia a dia. Keleman (1997) apud Flach et al. (2012) explica que</p><p>a morte de alguém que amamos faz uma aproximação com a nossa própria</p><p>morte, uma espécie de ensaio ou ameaça à própria vida. Tomamos consciência</p><p>e entramos em contato com a nossa morte (que um dia virá), através da morte</p><p>do outro e tudo isso traz à tona um misto de sentimentos característicos do</p><p>luto, que vai desde o choque e a negação até a impotência diante da realidade</p><p>imposta; passa pela tristeza e a dor da perda; pela raiva do mundo, dos outros</p><p>e até de Deus; pelo medo de um mundo que parece se tornar mais inseguro</p><p>naquele momento; a culpa pelo que poderia ter feito diferente ou pelos senti-</p><p>mentos e pensamentos experimentados; e muitas vezes até o alívio, em casos,</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 125</p><p>por exemplo, de doenças que se prolongam e exigem demais de todos os</p><p>envolvidos, ou em casos de relacionamentos muito abusivos e complicados.</p><p>A degeneração física e/ou psíquica causada pela doença pode provocar</p><p>uma ambivalência entre o desejo que o familiar morra para aliviar o sofrimento</p><p>de todos e a culpa sentida por experimentar esse desejo. Presenciar a dor e o</p><p>sofrimento de alguém que amamos traz uma grande sensação de impotência</p><p>e sofrimento. Entretanto, em alguns casos, após a morte do ente querido, o</p><p>enlutado que era responsável pelos cuidados e acompanhamento do familiar</p><p>doente pode experimentar também uma sensação de vazio depois de tanto</p><p>tempo de dedicação, com uma rotina que era tão voltada para esses cuidados</p><p>e se vê de repente sem saber lidar com o tempo livre e isento das tarefas de</p><p>cuidador que exercia antes (Kovács, 1992 apud Flach, 2012).</p><p>Os sentimentos se apresentam ao enlutado de forma desorganizada</p><p>e costumam ser descritos por muitos como uma “montanha russa” com</p><p>grandes oscilações.</p><p>São justamente essas “ondas” que traçam o percurso da elaboração do</p><p>luto oscilando entre momentos voltados para a perda e momentos voltados</p><p>para a restauração da vida é que é possível assimilar e ressignificar a expe-</p><p>riência de perda (Stroebe & Schut, 1999).</p><p>No luto antecipatório, a vivência e intensidade desse processo estão rela-</p><p>cionadas com a evolução da doença, com o grau de certeza do prognóstico e</p><p>com a perspectiva de tempo, porém mesmo diante de doenças incuráveis existe</p><p>sempre uma esperança, um constante conflito entre a perda e o surgimento de</p><p>alguma possibilidade curativa, um milagre ou uma nova descoberta que venha</p><p>salvar o paciente, essas expectativas positivas são estratégias de controle que</p><p>fazem parte do ajustamento emocional. As esperanças não devem ser tolhidas,</p><p>porém tampouco alimentadas de forma irreal. Devem ser mantidas de maneira</p><p>realista, dentro da perspectiva dos cuidados que podem ser oferecidos, das</p><p>possibilidades de alívio da dor física que existem, do acompanhamento e</p><p>atenção que será oferecido e etc. Já as falsas esperanças, quando alimentadas,</p><p>costumam ser prejudiciais para os envolvidos (Tizón, 2013).</p><p>Muitas outras manifestações e sensações são observadas no processo de</p><p>luto e podem trazer impacto em todas as áreas da vida do enlutado: social,</p><p>físico, espiritual, emocional, cognitivo e comportamental.</p><p>Todas essas sensações e características do luto antecipatório, também</p><p>são experimentadas no luto pós morte, a diferença é que no luto antecipatório</p><p>elas ocorrem antes mesmo da perda se concretizar. Isso não vem subtrair a</p><p>dor ou amenizar a saudade após a morte efetiva, mas antecipa o processo de</p><p>forma que torna possível entrar em contato, ensaiar a perda, criar cenas de dor</p><p>e de enfrentamento, além de possibilitar a resolução de questões importantes</p><p>quando a pessoa ainda está viva. A realidade da perda vai sendo absorvida</p><p>126</p><p>gradualmente, ao longo do tempo, como pontua Rando (1997), e os envol-</p><p>vidos se veem diante da possibilidade de resolver questões pendentes com a</p><p>pessoa doente (expressar sentimentos, perdoar e ser perdoado), além de ini-</p><p>ciar mudanças de concepção sobre vida e identidade e inclusive fazer planos</p><p>para o futuro de maneira que não sejam sentidos como traição ao doente, o</p><p>que poderia ser mais custoso após a perda, já que a pessoa morta não está</p><p>mais ali para dialogar e dividir as questões que se apresentam no luto. Tudo</p><p>isso, porém, supõe que exista um espaço e uma abertura para esse diálogo,</p><p>ou seja, uma atenção e um cuidado para as questões emocionais, relacionais</p><p>e espirituais de todos esses envolvidos, o que nem sempre é oportunizado,</p><p>apesar de ser tão útil para a elaboração do luto.</p><p>Facilitadores e Dificultadores do Luto Antecipatório</p><p>No individualismo da nossa sociedade atual, o enfrentamento do luto e</p><p>o sofrimento causado pela morte, ou pela iminência da mesma, são encarados</p><p>por muitos como uma inadequação social, um ‘problema a ser resolvido’ por</p><p>aquele que está passando pela perda, sem dizer respeito aos demais. O luto</p><p>é vivenciado de forma, muitas vezes, solitária. Escutar e entrar em contato</p><p>com a dor do outro leva a um envolvimento incômodo e a saída passa a ser o</p><p>afastamento e o isolamento do enlutado. Sem ter quem escute e compreenda, o</p><p>enlutado mergulha em uma vivência solitária de angústia e de dor (Freire, 2006</p><p>apud Flach, 2012).</p><p>A falta ou ineficiência de uma rede de apoio, ou seja, não ter com quem</p><p>contar, não se sentir validado, respeitado e apoiado na sua dor pode ser um</p><p>importante complicador para o processo de luto.</p><p>Além disso, o relacionamento e a dinâmica familiar, a comunicação</p><p>entre os familiares e também a comunicação com os profissionais de saúde</p><p>têm grande influência na qualidade do luto antecipatório. Poder falar do que</p><p>sente, o que espera, o que gostaria e o que não gostaria, tratar abertamente de</p><p>temas relacionados à doença e questões a serem resolvidas, pode ser muito</p><p>organizador e positivo para o processo de luto de todos os envolvidos.</p><p>O espaço para o diálogo, quando não promovido pelo próprio sistema</p><p>familiar, pode e deve ser facilitado por profissionais de saúde e outras pes-</p><p>soas capacitadas ao redor de pacientes fora de possibilidades curativas e</p><p>suas famílias. Essa intervenção e apoio devem ser feitos sempre de forma</p><p>empática, ética e respeitosa, ajudando a pessoa a expressar preocupações e</p><p>desejos, possibilitando a despedida, priorizando o bem-estar dos envolvidos</p><p>e prevenindo a complicação nos processos de luto antes e depois da perda.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 127</p><p>O Luto complicado</p><p>Franco (2014) afirma que em alguns casos o luto antecipatório pode</p><p>possibilitar que questões pendentes sejam abordadas e resolvidas ao longo</p><p>do período que antecede a morte, representando um fator de prevenção</p><p>para o luto complicado, mas em outros casos pode também intensificar o</p><p>vínculo e os cuidados, de forma a tornar-se um fator de risco para o luto</p><p>complicado (Franco, 2014).</p><p>O que observa Worden (2009) é que ter um anúncio prévio de morte e a</p><p>possibilidade de realizar um luto antecipatório é apenas um dos determinantes</p><p>que influenciam no processo de luto são muitas as variáveis, os fatores de</p><p>risco e de proteção a serem analisados e seria simplificar demais levar em</p><p>conta apenas a variável de ser uma “morte anunciada” ou não.</p><p>Parkes (1998) complementa que em qualquer processo de luto o que</p><p>interfere no trabalho de elaboração do luto são graus elevados de dor, podendo</p><p>levar a um luto crônico, ou os casos em que são expressos poucos ou nenhum</p><p>sinal de luto, no qual o luto pode estar sendo inibido ou adiado. Sendo assim,</p><p>um processo de luto, para ser entendido como um luto complicado, é aquele</p><p>em que o enlutado não apresenta alternâncias entre os movimentos voltados</p><p>para a perda, dor, sofrimento e os movimentos voltados para a restauração,</p><p>reorganização da vida e reconstrução, ao contrário, ele permanece numa</p><p>constante de sofrimento intenso ou de completa negação do luto que podem</p><p>comprometer</p><p>seu processo de elaboração da perda.</p><p>Em algum momento, que não é possível precisar em dias, meses ou</p><p>anos, o enlutado vai encontrando um novo lugar dentro dele para aquele ente</p><p>querido que morreu, a ausência vai sendo assimilada e a perda passa a ter</p><p>um significado, um novo sentido para essa pessoa. Esse é o que chamamos</p><p>de luto elaborado, o que não quer dizer que nunca mais será experimentada</p><p>a dor ou falta, mas que agora isso não controla mais a pessoa. Quando o luto</p><p>se estende em tempo e intensidades extremas, sem serem sentidas como uma</p><p>oscilação, mas sim como uma constante, isso pode sinalizar a necessidade de</p><p>uma atenção especial e de um apoio especializado para esse enlutado.</p><p>Alguns aspectos são de grande ajuda nesse processo, como por exemplo,</p><p>a presença de uma rede de apoio (amigos, familiares, equipe multiprofissio-</p><p>nal); a existência de uma crença, fé ou religião; o preparo, o acolhimento, a</p><p>ética e o respeito a questões religiosas, culturais e pessoais dos pacientes por</p><p>parte da equipe multiprofissional.</p><p>Assim como uma crise pode representar uma oportunidade de mudanças</p><p>e crescimentos, o luto pode resultar em um importante processo de aprendi-</p><p>zagem, que permite uma nova concepção de mundo e um reposicionamento</p><p>128</p><p>em relação à vida, quando predomina uma avaliação positiva das experiências</p><p>adversas (Cardoso & Santos, 2013), as boas lembranças e toda a bagagem</p><p>deixada pela relação com o ente querido que morreu.</p><p>Considerações Finais</p><p>O luto antecipatório possibilita organizar questões, revisar a dinâmica</p><p>relacional da família, fazer planejamentos importantes e iniciar o processo de</p><p>elaboração da perda diante de uma doença potencialmente fatal.</p><p>É um processo anterior à perda, que não elimina a vivência de um luto</p><p>posterior, mas que pode atenuar diversos aspectos por possibilitar o contato</p><p>e o ensaio de situações relativas à perda, antes mesmo dela se concretizar.</p><p>Quando se dá em um contexto de qualidade, com o devido apoio e cui-</p><p>dado pode representar um fator de proteção para o enlutado e deve, portanto,</p><p>ser conhecido e compreendido pelos profissionais de saúde que lidam com</p><p>perdas e morte em suas rotinas de trabalho, para que possam identificar, validar</p><p>e oferecer o apoio necessário nesse processo, para pacientes e seus familiares.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 129</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Cardoso, E. A. O., & Santos, M. A. (2013). Luto antecipatório em</p><p>pacientes com indicação para o Transplante de Células-Tronco</p><p>Hematopoéticas. Disponível em: .</p><p>Flach, K. et al. (2012). O luto antecipatório na unidade de terapia intensiva</p><p>pediátrica: relato de experiência. Disponível em: .</p><p>Acesso: 10 dez. 2019.</p><p>Fonseca, J. P. (2012). Luto antecipatório: experiências pessoais, familiares e</p><p>sociais diante de uma morte anunciada. São Paulo: PoloBooks.</p><p>Franco, M. H. P. (2012). Crises e desastres: a resposta psicológica diante do</p><p>luto. O Mundo da Saúde, São Paulo – 36 (1), 54-58. Disponível em:</p><p>.</p><p>Franco, M. H. P. (2014). Luto antecipatório em cuidados paliativos. In:</p><p>Franco, M. H. P., & Polido, K. K. Atendimento psicoterapêutico no</p><p>luto, 27-35. São Paulo, SP: Zagodoni.</p><p>Kübler-Ross, E. (2008). Sobre a morte e o morrer. 9° edição. São Paulo:</p><p>Martins Fontes.</p><p>Marrone, M. (2009). La teoría del apego: un enfoque actual. 2° edição.</p><p>Madrid: Editorial Psicomática.</p><p>Parkes, C. M. (1998). Luto: estudos sobre a perda na vida adulta. 3° edição.</p><p>São Paulo: Summus.</p><p>Stroebe, M., & Schut, H. (1999). The Dual Process Model of bereavement:</p><p>rationale and description. Death Studies, Philadelphia, 23 (3), p.</p><p>197-224.</p><p>Walsh, F., & McGoldrick, M. (1998). Morte na família: Sobrevivendo às</p><p>Perdas. Porto Alegre: ArtMed.</p><p>130</p><p>Worden, J. W. (2009). Aconselhamento do luto e terapia do luto: um manual</p><p>para profissionais de saúde mental. 4° edição. São Paulo: Editora</p><p>Roca Ltda.</p><p>CAPÍTULO 8</p><p>A ESPIRITUALIDADE E O CÂNCER:</p><p>uma luz na escuridão</p><p>Patrícia Pessatto da Silva</p><p>Maria Balbina de Magalhães</p><p>No dia a dia, raras vezes toma-se consciência de que a morte é um evento</p><p>certo para todas as pessoas, mesmo o homem sabendo disso, desde que se</p><p>percebe como ser humano. Postergar a ideia da finitude da vida, jogando este</p><p>pensamento para o futuro, é um fato que sempre acontece quando a iminência</p><p>da morte é uma possibilidade, como, por exemplo, diante de um diagnóstico</p><p>de uma doença grave, como um câncer.</p><p>Uma reação normal, diante da gravidade da doença, já que segundo estu-</p><p>dos estatísticos da Organização Mundial da Saúde (OMS) o câncer está no</p><p>ranking das dez doenças que mais causam mortes no mundo (OMS, 2020).</p><p>O câncer de mama, por sua vez, é a neoplasia maligna que mais acomete as</p><p>mulheres, não só no Brasil, mas também no mundo (Instituto Nacional de Cân-</p><p>cer, 2020); sendo considerada a maior causa de mortes por esse tipo de doença.</p><p>O diagnóstico de câncer remete à perda da esperança na vida futura. É</p><p>ver sonhos, projetos e anseios relegados a um segundo plano, pois o foco</p><p>agora é manter-se vivo. Quem tem câncer é acometido de muitos sentimen-</p><p>tos, dentre eles a desesperança; logo, acreditar em algo é ter sua esperança</p><p>renovada. Todos os esforços são empreendidos em busca da melhora ou cura</p><p>da doença. Neste sentido, a busca por outros tratamentos, além do ministrado</p><p>por médicos especialistas na área (oncologistas) é a realidade vivida por</p><p>quem se defronta com uma doença. Diante da desesperança e do sofrimento</p><p>causado pela descoberta, doentes e familiares buscam na espiritualidade dar</p><p>um sentido positivo às experiências pelas quais estão passando.</p><p>Até pouco tempo atrás, falar em espiritualidade se resumia a considerar os</p><p>temas pertinentes à religião. Hoje, no entanto, é uma temática que atravessa o</p><p>interesse de várias outras áreas do conhecimento. A fé e a razão desde sempre</p><p>se estranharam. A convivência foi necessária e aconteceu aos poucos, permi-</p><p>tindo assim o conhecimento mútuo, possibilitando o surgimento de respostas</p><p>e explicações sobre a crença de que o homem precisa acreditar em algo fora</p><p>do sistema usual, do convencional da ciência (Estefan, 2014; Lopes, 2007).</p><p>Essa necessidade, entretanto, surge quando o homem começa a se dar conta</p><p>de que ele não é só matéria e que deve ter algo mais, não importando o nome</p><p>132</p><p>que se dê , já que não se sabe explicar o surgimento do homem, de onde veio</p><p>e para onde vai (Estefan, 2014).</p><p>Diante do sofrimento e da morte, estados inevitáveis na existência</p><p>humana, surgem inúmeros sentimentos que tendem a afastar o ser humano</p><p>do que ele poderia aprender com os reveses da vida. Para Frankl (1982),</p><p>a necessidade de aprender a tirar do sofrimento inevitável e da finitude</p><p>da vida um sentido, encarando-os de frente, é assumir a responsabilidade</p><p>pela própria vida, aproveitando o tempo disponível que se tem para não</p><p>deixar passar as ocasiões que aparecem e que não irão mais se repetir,</p><p>porque cada dia é único.</p><p>Documentários, pesquisas e entrevistas divulgadas nas mídias sociais,</p><p>a todo o momento, mostram os impactos causados pela adoção de uma vida</p><p>espiritualizada nos tratamentos. Um exemplo é o Psiquiatra Harold Koe-</p><p>ning, professor da Universidade de Carolina do Norte e que há 28 anos se</p><p>dedica a estudos da relação entre fé e saúde. Sua tese é de que a fé religiosa</p><p>ajuda as pessoas em diversos aspectos da vida cotidiana, reduzindo o estresse,</p><p>fazendo-as adquirir hábitos saudáveis e dando-lhes o conforto nos momentos</p><p>difíceis, entre outros benefícios. O autor tem 40 livros e mais de 300 artigos</p><p>publicados. Para Koening (2005), a religião é usada por muitas pessoas como</p><p>estratégia de enfrentamento (coping) em relação às doenças, trazendo conforto</p><p>e reduzindo o estresse emocional causado pelas mudanças decorrentes</p><p>dos</p><p>processos patológicos.</p><p>Confirmando a importância dessa dimensão, a OMS incluiu em seu</p><p>Manual de prevenção ao suicídio, as crenças religiosas, culturais e étnicas</p><p>como fator de proteção (Organização Mundial de Saúde, 2006). O Instituto</p><p>Pazanesse, por sua vez, reuniu quase 250 artigos de todo o mundo, para com-</p><p>provar a tese da importância das crenças religioso-espirituais e concluiu que a</p><p>prática regular de atividades religiosas (sejam elas quais forem) pode reduzir</p><p>o risco de morte em 30% (Universidade Federal do Espírito Santo, 2019).</p><p>Considerar a espiritualidade hoje como condição de saúde é ir ao encontro</p><p>da concepção holística do termo saúde, pois a dimensão espiritual foi incluída</p><p>no conceito multidimensional de saúde pela OMS, junto com as dimensões</p><p>corporal, psíquica e social, mostrando a importância da discussão do tema</p><p>espiritualidade dentro da Academia. Nesse sentido, é fundamental que tam-</p><p>bém os profissionais da área da saúde possam se questionar sobre o tema e</p><p>entender como acontece esse processo, considerando que a espiritualidade</p><p>contribui para um melhor bem-estar do paciente e sua família.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 133</p><p>Breve Histórico do Câncer</p><p>Câncer3 é uma doença que está envolta, geralmente, em pensamentos</p><p>relacionados ao sofrimento e à morte quando se ouve o seu pronunciamento:</p><p>“Quando a doença é diagnosticada como oncológica, a percepção da finitude da</p><p>vida torna-se presente” (Farinhas, Wendling, & Dellazzana-Zanon, 2013, p. 4)</p><p>Apesar do avanço tecnológico da medicina, o seu diagnóstico ainda é</p><p>encarado, muitas vezes, como sentença de morte. Desse modo, embora</p><p>seja comprovado que 50% dos casos são passíveis de cura ou controle, esta</p><p>imagem persiste, principalmente pelo rótulo “terminal” (Silva, Aquino,</p><p>& Santos, 2008, p. 6).</p><p>Dessa forma, câncer e morte tornam-se sinônimos: “Em nossa socie-</p><p>dade, o câncer está relacionado à crença de que seu portador está condenado</p><p>a morrer”. (Caetano, Gradim, & Santos, 2009, p. 258). O estigma surge das</p><p>poucas chances de sobrevivência de um paciente oncológico, no passado,</p><p>onde os recursos ainda eram escassos e a medicina não tão avançada (Caetano,</p><p>Gradim, & Santos, 2009).</p><p>A origem do nome vem do grego karkinos, que significa caranguejo,</p><p>denominação dada pela semelhança da forma do tumor (veias ao redor) e</p><p>as pernas do crustáceo (Silva, Aquino, & Santos, 2008). Esta denominação</p><p>foi utilizada pela primeira vez por Hipócrates, o pai da Medicina, aproxima-</p><p>damente em 400 A.C., tendo sido detectado em múmias egípcias, fato que</p><p>comprova sua existência há milhares de anos A.C. Existe há milhares de anos</p><p>3 De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), câncer é o nome dado a um grupo de doenças</p><p>que tem em comum o crescimento desordenado de células. Este tumor maligno (câncer) tem a capaci-</p><p>dade de espalhar-se para outras regiões do corpo, multiplicando-se rapidamente, e sua cura está muito</p><p>relacionada com sua descoberta precoce. É fator relevante a mulher estar informada para poder perceber</p><p>em seu corpo alterações que podem surgir na mama, acompanhadas ou não de dor mamária, como por</p><p>exemplo, mudança de tamanho ou formato (acompanhadas ou não de dor mamária); nódulo ou aumento de</p><p>espessura em determinada região, observando no mamilo nódulo ou aumento da espessura, retraimento,</p><p>saída de sangue. Nos braços: é preciso estar atento ao aparecimento de inchaço ou nódulo na axila, sendo</p><p>esses nódulos palpáveis ou não, podendo o câncer de mama ser também detectado precocemente através</p><p>de diferentes estratégias, tais como: autoexame das mamas, realizado mensalmente pela própria mulher,</p><p>exame clínico anual com ginecologista e solicitação para encaminhamento ao mastologista, sendo este é</p><p>o profissional mais indicado para realizar a palpação e exame minucioso da mama, abordando histórico</p><p>familiar de doenças, e caso o mastologista perceber a presença qualquer anormalidade poderá solicitar</p><p>alguns exames, como: mamografia, em que a mama é comprimida no mamógrafo, de forma a fornecer</p><p>melhor capacidade de diagnóstico e mostrar lesões em fase inicial, sendo este exame muito utilizado em</p><p>mulheres com mais de 35 anos; ultrassonografia (USG), que consiste em um exame de avaliação por</p><p>imagem, utilizado frequentemente em mulheres com menos de 35 anos, e em mulheres com mais de 35</p><p>anos como complementação à mamografia. A USG é usada para detectar um nódulo sólido ou com fluido</p><p>(um cisto) e também é capaz de identificar lesões no interior de cistos.</p><p>134</p><p>e persiste frente a tantos avanços na medicina e na tecnologia, conferindo um</p><p>status de invencibilidade, associando uma imagem de forte poder, tornando</p><p>natural o temor que as pessoas demonstram frente ao seu diagnóstico.</p><p>O Instituto Nacional de Câncer (2020) estima que no Brasil, para cada</p><p>ano do triênio 2020-2022, que ocorrerão 625 mil casos novos de câncer,</p><p>enquanto em nível mundial, as estatísticas de 2018 apontaram a ocorrência</p><p>de 18 milhões de casos novos. O câncer de pulmão é o mais incidente no</p><p>mundo (2,1 milhões), seguido pelo câncer de mama (2,1 milhões), cólon e reto</p><p>(1,8 milhão) e próstata (1,3 milhão). Para o Brasil, a previsão de incidência</p><p>aponta o câncer de mama (66 mil) em primeiro lugar, junto com o câncer</p><p>de próstata (66 mil), seguido pelo câncer de cólon e reto (41 mil), traqueia,</p><p>brônquio e pulmão (30 mil) e estômago (21 mil). A estimativa de 66 mil casos</p><p>novos de câncer de mama, para cada ano do triênio 2020-2022, corresponde</p><p>a um risco estimado de 61,61 casos novos a cada 100 mil mulheres.</p><p>A Espiritualidade e a Vivência do Adoecimento</p><p>As pessoas buscam na religião, na psicologia e em outros tipos de terapias</p><p>algo além da medicalização que a medicina propicia que é a crença em algo</p><p>superior, que faz ter esperanças de uma vida futura melhor. Os pacientes e os</p><p>familiares, diante da desesperança e do sofrimento causados pela descoberta</p><p>da doença, buscam na espiritualidade um sentido positivo a essas experiências</p><p>(Guerrero, Zago, Sawada, & Pinto, 2011). Essa crença é corroborada pela</p><p>teoria existencialista de Viktor Frankl, criador da Logoterapia4, que acredita</p><p>que a motivação primeira do ser humano é a busca por um sentido na vida,</p><p>seja para criar, fazer ou sofrer. O mesmo autor diz ainda que o trágico não</p><p>deve ser evitado, uma vez que essa experiência pode ser usada como forma</p><p>de desenvolver a capacidade para enfrentar o sofrimento.</p><p>Nesse processo de cura e/ou alívio no tratamento de câncer, missão de</p><p>muitos grupos que atuam em hospitais e instituições de saúde, como por</p><p>exemplo, a Capelania5, apresenta aos pacientes uma oportunidade de vivência</p><p>4 Criada por Viktor Emil Frankl, e desenvolvida enquanto o seu criador esteve preso em Campos de Concen-</p><p>tração, durante a Segunda Guerra Mundial, a Logoterapia, percebe o ser humano como um ser que tem a</p><p>livre escolha perante as pressões internas e externas a ele. Esta escolha está direcionada para a que tiver</p><p>maior sentido na vida de quem escolhe, dessa forma, acredita que os humanos se autoconstroem, ou seja,</p><p>são livres e responsáveis pelas próprias escolhas.</p><p>5 Capelania é uma Assistência Religiosa e Social prestada aos serviços Civis e Militares, prevista e garantida</p><p>pela Constituição Federal de 1988, sob a Lei n. 6.923 art. 5 e inciso VII. A Capelania ganhou muita força</p><p>nestes últimos anos, principalmente no Brasil pelas Lideranças Evangélicas, já que os hospitais, presídios,</p><p>escolas, universidades e outras instituições vem se preocupando com a qualidade no atendimento das</p><p>pessoas com carências espirituais, afetivas e emocionais, necessitando de uma pessoa de estímulo e</p><p>entusiasmo. (BRASIL, 1981).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 135</p><p>de espiritualidade, por meio de palavras de conforto, orações e um espaço</p><p>para que possam falar de suas angústias, medos e sofrimento causados pelo</p><p>contexto de adoecimento em que se encontram.</p><p>A espiritualidade de que estamos falando</p><p>diz respeito àquilo que difere</p><p>do material palpável, objetivo e concreto, e, portanto, contrário à ciência</p><p>positivista. Assim, compreendida em uma dimensão mais abrangente, dife-</p><p>renciando-se do termo religiosidade, a espiritualidade expressa a prática do</p><p>crente, que pode estar relacionada com alguma instituição religiosa, diferindo</p><p>também de religião, que determina regras e ritos. Dessa forma, a espiritua-</p><p>lidade pode ser pensada como um sistema de crenças que enfoca elementos</p><p>intangíveis, que transmite vitalidade e significado a eventos da vida. Tais</p><p>crenças podem mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com</p><p>potencial ilimitado para melhorar a qualidade de vida das pessoas (Saad,</p><p>Masiero, & Battistella, 2001).</p><p>A espiritualidade é, portanto, uma forma de enxergar e encarar a realidade</p><p>e não se relaciona necessariamente a religiões. Trata-se dos sentimentos que a</p><p>pessoa nutre no dia a dia e na forma como encara seus problemas. A religião</p><p>pode servir como um recurso para a pessoa experimentar a espiritualidade,</p><p>porém não é sempre que esta relação ocorre. Assim, existirão pessoas reli-</p><p>giosas que não experimentam bem-estar espiritual, enquanto existem pessoas</p><p>espiritualizadas sem seguir nenhuma religião.</p><p>Os estudos sobre o tema apontam, de maneira geral, uma forte relação</p><p>entre bem-estar espiritual e maior qualidade de vida, saúde mental e física e</p><p>menos necessidades de serviços de saúde, além da recuperação mais rápida de</p><p>doenças (Teixeira, Müller & Silva, 2004; Koening, 2012). “Estudos mostram</p><p>que a religiosidade pode ser fator positivo na saúde das pessoas” (Camboim</p><p>& Rique, 2010, p. 252).</p><p>A influência dos fatores psicológicos sobre os aspectos biológicos é</p><p>demonstrada através de estudos com um tipo de célula produzida pelo</p><p>sistema imunológico, a célula natural killer (NK). Eles mostram uma</p><p>associação entre algumas variáveis psicossociais e o funcionamento dessas</p><p>células. Os mesmos trazem evidências de que um baixo nível de ajusta-</p><p>mento ao câncer, falha no apoio social, alto nível de estresse e presença de</p><p>sintomas depressivos diminuem a produção e atividade da NK. Sendo essa</p><p>célula responsável pela vigilância imunológica sobre o câncer, controlando</p><p>a difusão das células malignas, a paciente tenderá a ter um pior prognós-</p><p>tico. De acordo com esses dados, conclui-se que o sistema imunológico</p><p>é fortemente afetado por fatores emocionais e que determinadas atitudes</p><p>psicológicas podem influenciar positivamente no sistema de defesa, favo-</p><p>recendo uma maior e melhor sobrevida (Venâncio, 2014, p. 61).</p><p>136</p><p>Assim sendo, entende-se que o homem amparado socialmente, com apoio</p><p>psicológico e com sua fé fortalecida, encontra-se espiritualizado e, portanto,</p><p>em maior capacidade de enfrentar a vida e suas mazelas, ou seja, “Mais</p><p>essencial do que iluminar as profundezas escuras da alma é a descoberta das</p><p>alturas iluminadas” (Frankl, 2009, p. 10).</p><p>De base existencial fenomenológica, é a isso que se propõe a Logoterapia:</p><p>a crença de que o homem tem em si um inegável impulso que é o de superar a</p><p>si mesmo, devotando à sua vida a um sentido maior (Frankl, 2009)6. Segundo</p><p>Frankl (1982), cada pessoa tem uma instância que nenhuma doença jamais</p><p>conseguirá atingir, que é a dimensão noética, a espiritualidade imaculada, o</p><p>Deus vivo na intimidade da pessoa humana.</p><p>As pessoas que, de alguma forma, tem presente em sua vida a espiri-</p><p>tualidade, vão experimentando, ao longo do tempo, uma ampliação da cons-</p><p>ciência e sentem-se pessoas empoderadas, capazes e mais capacitadas para</p><p>lidar com as situações que lhe incomodam de forma mais funcional. Esta</p><p>vivência propicia uma atitude mais empática nas pessoas, convidando-as a</p><p>sair do próprio eu, e a olhar para o sofrimento do outro. Frankl (1982) propõe</p><p>que no tratamento com pessoas com diagnóstico de depressão, se trabalhe a</p><p>estratégia de um olhar ao outro, ao sofrimento do outro, pois segundo ele,</p><p>as pessoas nesse estado olham muito para si mesmas, e assim, ao sair de si</p><p>e voltar seu foco ao outro, acabam encontrando respostas para o seu próprio</p><p>sofrimento. Essa alegria em “servir”, em ajudar ao outro, pode possibilitar</p><p>que a pessoa encontre um sentido para ela mesma que a preenche, ou seja,</p><p>“[...] a existência humana no fundo significa existência responsável e que o</p><p>homem, em última análise, é um ser que luta espiritualmente pelo sentido</p><p>concreto de sua existência pessoal” (Frankl, 1982, p. 11).</p><p>Gomes (1992), por sua vez, lembra que o foco em si mesmo leva as</p><p>pessoas a olharem só para seu mundo, perdendo o sentido da vida e entrando</p><p>num grande vazio existencial. Em contrapartida, pessoas mesmos doentes</p><p>fisicamente, mas altruístas, interessadas não só em seu bem, mas no bem</p><p>comum, “são indivíduos extremamente saudáveis” do ponto de vista emo-</p><p>cional. (Lopes, 2007, p. 57). A Logoterapia tem como meta que cada pessoa</p><p>possa encontrar o seu “para que” viver, isto é, um sentido individual para sua</p><p>vida. Essa perspectiva de buscar formas saudáveis de ser/estar no mundo é</p><p>alimento mental para o indivíduo, que também pode expandir a consciência</p><p>6 “Frankl não conheceu o valor deste sentido da vida nos momentos confortáveis e cômodos da sua vida, mas</p><p>nos mais escuros e difíceis: no campo de concentração, quando soube da morte da sua família, nas horas</p><p>de mais profunda humilhação e esgotamento físico. Ele o transmite agora aos seus pacientes, e provoca</p><p>verdadeiro milagre, tanto em terapia individual, como através da influência coletiva de seus milhões de</p><p>livros editados. É como se a indescritível ingenuidade de sua tese ‘a vida tem um sentido’ tivesse um efeito</p><p>semelhante ao da não menos ingênua ordem bíblica: ‘levanta-te e anda’”. (Frankl, 2009, p. 10).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 137</p><p>de vida e bem-estar a outras pessoas dentro de seu convívio. Lopes (2007, p.</p><p>44) argumenta que “trabalhar-se interiormente para ser reconhecido com o</p><p>que possui em sua vida é uma qualidade imprescindível para a saúde mental</p><p>de qualquer pessoa”. Esse altruísmo é parte das pessoas espiritualizadas e sua</p><p>influência é notória para os que as cercam. Assim, percebe-se que as pessoas</p><p>que buscam essa vivência maior, fortalecendo sua espiritualidade também</p><p>reagem melhor frente a desafios, sejam de ordem econômica, social ou de</p><p>saúde. O confronto com o tema morte e como se lidará com ele depende da</p><p>história de vida e da personalidade de cada pessoa. Rodrigues (2011) lembra</p><p>que a qualidade da saúde mental está diretamente ligada à forma como a</p><p>pessoa se responsabiliza ela própria vida, assim como com a própria morte.</p><p>Sentimentos e Dificuldades Encontrados Frente ao Câncer de Mama</p><p>Quando se adoece, o percurso natural vivido no cotidiano, que é nor-</p><p>malmente uma vida com afazeres, com desafios é alterado. Ou seja, a rotina</p><p>conduzida diariamente quando se está saudável é interrompida por outras</p><p>obrigações: consultas, exames etc., que buscam novamente o equilíbrio da</p><p>saúde comprometida. A mudança brusca no dia a dia durante o tratamento</p><p>produz uma ruptura na rotina diária, descaracterizando hábitos, capacidade</p><p>de autorregulação, cuidado pessoal, atingindo também a família (Rodrigues</p><p>& Polidori, 2012). O tratamento do câncer, além de obrigar pacientes e seus</p><p>familiares a assumir atribuições impostas pelo adoecimento, impõe outros</p><p>ônus, como abandonar sonhos, planos e perspectivas futuras.</p><p>Além da mudança na rotina, existem as reações ao tratamento medica-</p><p>mentoso. São diversos os efeitos colaterais, e as mulheres com câncer de mama</p><p>relatam essa questão como uma das fases mais difíceis durante o tratamento.</p><p>Os efeitos colaterais mais comuns são náuseas, vômitos, fadiga, alopecia</p><p>(perda de cabelo), menopausa precoce, fadiga, infecções, ferida na boca e</p><p>garganta, ganho de peso, fraqueza nas unhas e perda de memória. No entanto,</p><p>a lista é bem mais longa e não está restrita apenas a esses efeitos mais comuns.</p><p>A quimioterapia é um tratamento sistêmico, que afeta todo o corpo,</p><p>foi escrito</p><p>num guardanapo. É bem verdade que ele passou por algumas alterações. Mas,</p><p>tudo começou lá na Bahia, abençoado pelos orixás.</p><p>Assim, você vai encontrar neste livro pesquisas e muitas informações,</p><p>mas todas permeadas por muitos afetos, mesmo que você não perceba à pri-</p><p>meira vista, porque, no fim, ele trata de vidas valiosas que são nossos pacien-</p><p>tes. Encantou-me de muitas formas ter participado desta publicação.</p><p>Maria Balbina de Magalhães</p><p>PARTE I</p><p>CAPÍTULO 1</p><p>AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE</p><p>DE PACIENTES ONCOLÓGICOS</p><p>Sueli Terezinha Bobato</p><p>Kátia Baltoré Floriani</p><p>O câncer agrupa um conjunto de mais de duzentas doenças com carac-</p><p>terísticas comuns relacionadas ao processo de divisão das células de forma</p><p>anormal e descontrolada, com invasões a outros tecidos, constituindo-se</p><p>como um problema de saúde pública mundial. Configura-se como a segunda</p><p>principal causa de morte no mundo, responsável por seis milhões de óbitos</p><p>anuais, e a estimativa é que sua incidência continue em ascensão, se não</p><p>forem tomadas medidas de prevenção ativa e mudança no estilo de vida</p><p>(INCA, 2017; Saito et al., 2015).</p><p>A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima, para o ano de 2030,</p><p>cerca de 27 milhões de novos casos de câncer, 17 milhões de mortes, e apro-</p><p>ximadamente 75 milhões de pessoas convivendo, anualmente, com algum tipo</p><p>de neoplasia (Modena et al., 2014). A situação é ainda mais preocupante nos</p><p>países em desenvolvimento, onde foram observados 60% dos novos casos</p><p>em 2012, e onde se concentrou 70% da taxa de mortalidade devido a doenças</p><p>oncológicas no mundo. Hoje, nos países em desenvolvimento, são estimados</p><p>aproximadamente 16 milhões de casos novos na década de 2016-2025, ou</p><p>seja, 80% da estimativa mundial (INCA, 2015). Guimarães et al. (2016),</p><p>ao analisarem alguns estudos atuais que consideram índices epidemiológi-</p><p>cos do câncer em diversos países, relacionando-os ao seu IDH (Índice de</p><p>Desenvolvimento Humano), estabelecem uma relação direta entre o padrão</p><p>de morbimortalidade oncológico e o contexto socioeconômico dos países.</p><p>O desenvolvimento das neoplasias é de etiologia multifatorial, com</p><p>interação entre os fatores externos, como os hábitos ou costumes próprios</p><p>de um ambiente social e cultural; e os fatores internos ao organismo, geral-</p><p>mente pré-determinados geneticamente e ligados à nossa capacidade de</p><p>defesa. No entanto, estima-se que aproximadamente 80% das neoplasias</p><p>estejam associadas aos fatores ambientais como tabagismo, alcoolismo,</p><p>obesidade, medicalização, questões ocupacionais, contaminação por vírus</p><p>e exposição à radiação solar, os quais alteram a estrutura do DNA celular</p><p>(Saito et al., 2015; INCA, 2017).</p><p>22</p><p>Os fatores de risco para o desenvolvimento do câncer também podem</p><p>ser herdados geneticamente (INCA, 2017). No entanto, apesar de se reco-</p><p>nhecer que a hereditariedade exerce um papel importante na oncogênese, os</p><p>casos de doenças oncológicas desenvolvidas exclusivamente devido a fatores</p><p>genéticos são considerados raros (cerca de 10%). Em relação aos casos de</p><p>câncer de mama e de estômago, por exemplo, nos quais se observa haver um</p><p>forte elemento familiar operante, estuda-se a existência de uma exposição</p><p>comum a todos os membros da família a determinados fatores ambientais</p><p>de risco, que se converteriam na principal causa da doença (INCA, 2017).</p><p>Chammas (2010) apud Saito et al. (2015) salienta que o progressivo</p><p>aumento da longevidade humana contribuiu para investimentos em pesquisas</p><p>relacionadas às doenças crônico-degenerativas nos últimos 40 anos, inclu-</p><p>sive no Brasil, mais sistematicamente a partir da década de 80, trazendo</p><p>novos conhecimentos. No entanto, o desafio para o século XXI será o de</p><p>compreender e atuar nas escalas sistêmica e social, para além das escalas</p><p>molecular, celular, tecidual e orgânica.</p><p>Partindo dessa premissa, teorias e estudos sobre as questões da personali-</p><p>dade também têm sido conduzidos, a fim de se investigarem suas influências na</p><p>vida dos seres humanos. Dentre eles, destacamos a existência dos estudos que</p><p>se debruçam sobre a personalidade e a sua relação com a saúde (Bandeira, Bar-</p><p>bieri, 2007; Peres, Santos, 2009; Carvalho, 2010; Paiva, 2014; Pinto, 2016).</p><p>Nesse contexto, Patrão e Leal (2004) afirmam que a relação entre persona-</p><p>lidade e saúde pode estar na questão etiológica da doença, ao considerar-se</p><p>que determinados traços de personalidade tendem a produzir determinadas</p><p>alterações neuroendócrinas e imunológicas; na questão de mediação do stress,</p><p>como estilos de coping com os diversos problemas e conflitos da vida e; na</p><p>probabilidade de adotar comportamentos de risco ou não para a saúde.</p><p>Peres e Santos (2009) realizaram uma revisão sistemática da literatura</p><p>entre o período de 1995 a 2005, dedicada especificamente ao papel da perso-</p><p>nalidade na evolução da condição clínica e emocional de mulheres acometidas</p><p>por câncer de mama, e encontraram resultados que concluem que pacientes</p><p>que sofrem um comprometimento clinicamente significativo da condição</p><p>emocional quando da descoberta da enfermidade, tendem a apresentar níveis</p><p>reduzidos de linfócitos B e células T4 após a cirurgia e obtêm resultados</p><p>pouco efetivos com a quimioterapia. Os autores também encontraram estudos</p><p>que sustentam que mulheres que demonstram locus de controle intermediário,</p><p>referem satisfação com o suporte familiar e não experimentam perda subjetiva</p><p>de controle, sendo pouco propensas à recidiva precoce.</p><p>Paiva (2014) também afirma que diversos estudos têm sido conduzi-</p><p>dos por pesquisadores do mundo inteiro, com o intuito de compreender um</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 23</p><p>pouco melhor a relação entre traços de personalidade e o desenvolvimento</p><p>de patologias. Segundo a autora, muitos apontam para a existência de</p><p>influências psicológicas e de perfis de personalidade sobre o desenvolvi-</p><p>mento do câncer (Rubinow, 1990; Friedman, 1994; Nagano et al., 2001;</p><p>Nabi et al., 2008 apud Paiva, 2014).</p><p>De acordo com Paiva (2014), um estudo realizado em Paris, por Con-</p><p>soli, Cordier e Ducimetiére, em 1993, aponta para a ligação entre certos</p><p>traços de personalidade e o desenvolvimento de patologias, considerando</p><p>tanto o desencadeamento como sua evolução. Conforme este estudo, atitudes</p><p>como a de autopunição, por exemplo, detectadas em pessoas com câncer,</p><p>podem causar efeitos inibidores no sistema imunológico e, consequente-</p><p>mente, estimular a proliferação de tumores. Ainda, há indicativos de que a</p><p>ansiedade seja uma característica redutora da eficácia da quimioterapia para</p><p>o câncer. Assim, entende-se que o perfil psicológico seja ponto importante,</p><p>pois afeta a história clínica do paciente (Consoli, 1999, apud Paiva, 2014).</p><p>A autora assinala ainda que o perfil autopunitivo tem sido associado ao</p><p>câncer, assim como a característica do declínio progressivo na percepção do</p><p>prazer. Essa dificuldade em identificar o prazer, por sua vez, está relacionada</p><p>à queda ou à supressão de imunidade em pacientes oncológicos, devido a</p><p>linfopenia total ou redução de linfócitos (Rubinow, 1990; Jankovic, 1994;</p><p>Antoni, 2003 apud Paiva, 2014).</p><p>Em revisão da literatura brasileira que relacionam características de</p><p>personalidade com o câncer, foram encontrados os estudos de Bandeira e</p><p>Barbieri (2007), Peres e Santos (2009), Carvalho (2010), Paiva (2014) e</p><p>Pinto (2016). Para Honorato et al. (2017), há ainda poucos estudos científicos</p><p>que exploram a influência das características da personalidade dos sujeitos,</p><p>assim como da sua forma cognitiva e comportamental de agir e lidar com</p><p>situações de conflito, no processo de ajustamento individual psicológico.</p><p>Messina (2010, apud Paiva, 2014) e Pinto (2016) afirmam ser fundamental</p><p>compreender aspectos da personalidade dos pacientes oncológicos, buscando</p><p>a integração dos pontos de vista psíquico e emocional ao seu processo de</p><p>tratamento.</p><p>Conforme Pinto (2016), mesmo sabendo que o estado emocional do</p><p>paciente influencia o prognóstico da doença neoplásica, a</p><p>podendo</p><p>provocar inúmeros efeitos colaterais, tais como: diminuição da libido, infec-</p><p>ções vaginais fúngicas, déficit cognitivo, alterações no paladar, problemas</p><p>nas unhas que podem até cair e refluxo (Prado, 2019). Os diversos efeitos</p><p>colaterais da quimioterapia e radioterapia interferem na vida, trazendo efeitos</p><p>que potencializam o mal-estar sentido ao receberem o diagnóstico inicial.</p><p>Conviver com o câncer traz para as mulheres outros agravantes, poten-</p><p>cializando o sofrimento vivido. Além dos efeitos da medicação e da perda do</p><p>cabelo, a perda da mama, símbolo da feminidade, é um golpe forte, abrindo</p><p>138</p><p>brechas com marcas profundas no autoconceito da mulher. As mamas, desde</p><p>sempre, são a representação da sexualidade e a maternidade, sendo um órgão de</p><p>contato, de atração sexual, assim como símbolo da identidade corporal feminina,</p><p>representando os sentimentos de autoestima e valor-próprio (Soares, 2006). A</p><p>presença do companheiro no tratamento é fundamental, uma vez que frente a</p><p>mastectomia muitas mulheres evitam o relacionamento sexual, acarretando</p><p>grandes dificuldades para o relacionamento afetivo/amoroso do casal.</p><p>No adoecimento, a rotina familiar passa por várias mudanças e transtor-</p><p>nos, que vão desde as questões de ordem prática do cotidiano até situações</p><p>mais pontuais da própria dinâmica do tratamento, gerando sentimentos de</p><p>temor e desespero. Em função de seu estigma social e de sua associação com</p><p>a morte, o câncer é a doença que mais provoca medo nas pessoas. (Farinhas,</p><p>Wendling & Dellazzana-Zanon, 2013; Rodrigues, 2011.) As pesquisas com</p><p>mulheres com câncer de mama apontam o desespero e a perplexidade como</p><p>sentimentos mais vividos frente ao diagnóstico da doença. Rodrigues (2011)</p><p>explica que os sentimentos experienciados não são provocados somente pela</p><p>constatação da finitude da vida, mas que o medo e a ansiedade advêm tam-</p><p>bém do sofrimento gerado pelo próprio processo da enfermidade em si. Ou</p><p>seja, quando a paciente toma conhecimento de algo importante e grave que</p><p>se passa com seu corpo do dia para a noite, isto pode causar certa alienação,</p><p>para além do choque inicial causado pelo diagnóstico. No momento de rece-</p><p>bimento da notícia, é comum notar-se um estado de estranhamento em relação</p><p>a si, demonstrando a dificuldade de aceitação de estar doente (Soares, 2014).</p><p>A todo esse emaranhado de sentimentos, somam-se ainda outras questões</p><p>emocionais, a preocupação com os filhos ou outros parentes dependentes.</p><p>Para enfrentar este contexto de sofrimento psíquico, as pessoas acometi-</p><p>das pelo câncer e seus familiares procuram no tratamento espiritual, além do</p><p>medicamentoso, condições de enfrentamento ao sofrimento e a possibilidade</p><p>de morte. A fé em algo que transcende o mundo material atua no paciente,</p><p>portanto, como o combustível que fará com que ele tenha força, motivação e</p><p>esperança para encarar essa difícil etapa da vida. Agora contam com a espe-</p><p>rança da cura capitalizada em um Deus e na medicina (Caetano, Gradim &</p><p>Santos, 2009). Rodrigues (2011) explica que a espiritualidade é um fator que</p><p>funciona como um facilitador, ajudando as pessoas a compreender e decidir</p><p>sobre quais comportamentos assumir frente aos efeitos das vivências sociais</p><p>e psíquicas do adoecimento, assim como habilita a capacidade da pessoa</p><p>para dar significado exato às experiências do adoecer. A essas capacidades</p><p>o autor dá o nome de autodistanciamento e autotranscedência, as quais são</p><p>desenvolvidas a partir da vivência da espiritualidade, como uma condição</p><p>humana que o diferencia dos demais seres vivos.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 139</p><p>Para alguns pesquisadores, no entanto, a vivência religiosa atua como um</p><p>placebo, inspirando pensamentos de otimismo e esperança, bem como expec-</p><p>tativas positivas, com resultados observados não somente nos mecanismos</p><p>psicológicos, como também nos efeitos fisiológicos provocados no organismo.</p><p>Ou seja, crenças subjetivas profundas geram alterações bioquímicas, hormo-</p><p>nais e fisiológicas (Santos & Guimarães, 2011). Os estudos nessa área apontam</p><p>que as mulheres que apresentam determinação para enfrentar a doença têm</p><p>maior sobrevida, ou seja, há uma expressiva ligação entre o prognóstico e</p><p>comportamentos de desesperança e desamparo (Venâncio, 2004). O bem-estar</p><p>promovido por essa nova disposição interior diminuirá a ansiedade/estresse e</p><p>fará com que haja um reforço na imunidade. Ao imaginar o contrário, a ausên-</p><p>cia de espiritualidade, considerando apenas o aspecto materialista e científico,</p><p>o paciente poderá se tornar apenas o espectador da própria narrativa com final</p><p>pré-estabelecido, como nos casos em que ocorre a metástase, por exemplo.</p><p>A capacidade de optar intelectualmente por encontrar sentido no enfren-</p><p>tamento a uma doença é possível, desde que o paciente consiga fazer uma</p><p>retrospectiva, analisando os fatos que viveu, recordando as experiências posi-</p><p>tivas e assim retirar a carga social e psicológica do adoecimento. De acordo</p><p>com Rodrigues (2011, p. 8), “[...] o sentido para a vida pode ser encontrado</p><p>em qualquer situação, mesmo diante do sofrimento que traz a possibilidade</p><p>de mudar a si mesmo, [...] e da morte que motiva o indivíduo a fazer o melhor</p><p>possível frente à finitude da existência”. Assim, pode-se dizer que o homem</p><p>espiritualizado se encontra mais capacitado para enfrentar a vida e suas angús-</p><p>tias, pois torna-se mais potente para lidar com estas questões. Lopes (2007)</p><p>acrescenta que há uma distinção entre as pessoas que desenvolvem a espiri-</p><p>tualidade e as que não valorizam. Segundo o autor, as pessoas que se nutrem</p><p>da fé, da oração e outros recursos transpessoais, suas células funcionam em</p><p>padrões mais saudáveis. Ainda de maneira tímida, na área médica as pesqui-</p><p>sas já levam em consideração e valorizam a influência da espiritualidade no</p><p>enfrentamento de doenças e na esperança de cura. Outros tratamentos com-</p><p>plementares utilizados como ferramentas terapêuticas no enfrentamento do</p><p>câncer são o Reiki e o passe espírita, além da meditação.</p><p>Por mais doloroso e traumático que possa ter sido receber o diagnóstico</p><p>de um câncer, o ser humano pode encontrar sentido na vida mesmo ante a</p><p>finita existência humana, porque é ele quem constrói a própria realidade por</p><p>meio das oportunidades de criar, de experienciar e, portanto, de recriar novas</p><p>realidades, ou seja, a percepção do seu sofrimento é alterada, pois este sofrer</p><p>alcança outro significado.</p><p>Uma discussão importante que está acontecendo é o questionamento da</p><p>validade do paradigma ‘ciência versus espiritualidade’, que seria substituído</p><p>140</p><p>por ‘ciência e espiritualidade’, isto é, a relação entre esses dois conhecimentos</p><p>seria de complementariedade e não de confronto. A ciência ajuda a qualificar</p><p>e conscientizar o tema espiritualidade, enquanto a espiritualidade torna o</p><p>desafio da ciência algo transcendental, acima da razão. Isto evitaria a falta de</p><p>argumentos que a ciência, por vezes, se encontra como, por exemplo, quando</p><p>precisa explicar a cura de um paciente desenganado.</p><p>A crença em Deus, na espiritualidade, na vida, modifica a forma de encarar</p><p>a adversidade e o sofrimento, favorecendo harmonia e capacidade para enfrentar</p><p>desafios extremos como as doenças terminais. A forma como a pessoa se posi-</p><p>ciona frente ao adoecimento, poderá piorar ou melhorar o tratamento.</p><p>Sabe-se que o estado emocional poderá alterar a imunidade do corpo,</p><p>consequentemente, das defesas do organismo, criando predisposição para a</p><p>ação de células cancerígenas ou de doenças semelhantes. Da mesma forma,</p><p>uma mente que se harmoniza com o aspecto religioso e/ou espiritual poderá</p><p>proporcionar uma ação na produção de anticorpos para o combate da doença.</p><p>Mas, é quando tudo foge ao habitual e o que se tem é apenas um emaranhado</p><p>de diferentes emoções que as pessoas recorrem à espiritualidade como uma</p><p>alternativa para se adaptar e fortalecer frente ao que ameaça sua vida. Não</p><p>que as dificuldades (doenças) não acometam as</p><p>pessoas que tem fé. Mas ter</p><p>fé acalenta, conforta e fortalece, dá o encorajamento diante do conflito, da</p><p>dúvida e da dor. Embora a fé seja incompreensível à luz do conhecimento</p><p>científico, ela permite a compreensão dos ciclos, da complexidade do processo</p><p>do adoecimento e até mesmo da finitude humana. Ter fé alimenta o humano</p><p>de esperança e coragem para viver a vida e também pensar na morte.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 141</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Brasil. Lei n. 6.923, de 29 de junho de 1981. Dispõe sobre o Serviço de</p><p>Assistência Religiosa nas Forças Armadas. Recuperado de: http://</p><p>www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6923.htm.</p><p>Caetano, E. A., Gradim, C. V. C., & Santos, L. E. S. (2009). Câncer de Mama:</p><p>reações e enfrentamento ao receber o diagnóstico. Revista Enferma-</p><p>gem, Rio de Janeiro, 17, 257-261. https://pesquisa.bvsalud.org/portal/</p><p>resource/pt/int-1351</p><p>Camboim, A., & Rique, J. (2010, julho). Religiosidade e Espiritualidade</p><p>de adolescentes e jovens adultos. Revista Brasileira de História das</p><p>Religiões, 7, 251-263. http://repositorio.ufjf.br:8080/jspui/bitstream/</p><p>ufjf/6822/1/amandalopesgusmao.pdf</p><p>Estefan, M. (2014). Espiritualidade é saúde: o poder por trás de uma oração.</p><p>Recuperado 9 novembro 2019, de: http://noticiaurbana.com.br/.</p><p>Farinhas, G. V., Wendling, M. I., & Dellazzana-Zanon, L. L. (2013). Impacto</p><p>psicológico do diagnóstico de câncer na família: um estudo de caso a</p><p>partir da percepção do cuidador. Pensando Famílias, Porto Alegre, 17</p><p>(2), 111-129. http://pepsic.bvsalud.org/.</p><p>Frankl, V. (2009). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concen-</p><p>tração. Rio de Janeiro: Vozes.</p><p>Frankl, V. (1982). A psicoterapia na prática. São Paulo: Artmed.</p><p>Gomes, J. C. V. (1992). Logoterapia: a Psicoterapia Existencial Humanista</p><p>de Vitor Emil Frankl. São Paulo: Loyola.</p><p>Guerrero, G. P., Zago, M. M. F., Sawada, N. O., & Pinto, M. H. (2011, janeiro).</p><p>Relação entre espiritualidade e câncer: perspectiva do paciente.</p><p>Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, 64 (1), 53-59. https://</p><p>doi.org/10.1590/S0034-71672011000100008</p><p>Koening, H. G. (2005). Espiritualidade no cuidado com o paciente: por quê,</p><p>como, quando e o quê. São Paulo: FE Editora.</p><p>142</p><p>Instituto Nacional de Câncer (INCA). (2020). Ranking câncer. http.www2.</p><p>inca.gov.br.</p><p>Lopes, S. L. (2007). Leis morais e saúde mental. Porto Alegre: Fran-</p><p>cisco Spinelli.</p><p>Organização Mundial de Saúde (OMS). (2020). Câncer. Recuperado 14</p><p>março 2020, de: nacoesunidas.org.</p><p>Organização Mundial de Saúde (OMS). Prevenção do suicídio: um recurso</p><p>para conselheiros. Genebra: OMS, 2006. https://www.who.int/men-</p><p>tal_health/media/counsellors_portuguese.pdf.</p><p>Prado, P. E. B. (2019). Devita Centro Oncológico. Tratamentos: orientação</p><p>ao paciente em quimioterapia. http://oncologiadevita.com.br/.</p><p>Rodrigues, F. S. de S., & Polidori, M. M. (2012). Enfrentamento e Resiliência</p><p>de Pacientes em Tratamento Quimioterápico e seus Familiares. Revista</p><p>Brasileira de Cancerologia, Porto Alegre, 58 (4), 619-627. https://doi.</p><p>org/10.32635/2176-9745.RBC.2012v58n4.564</p><p>Rodrigues, I. A. (2011). Paciente terminal: como dar sentido ao sofrimento</p><p>diante da morte? Revista Tema, Campina Grande, 11 (16). http://revis-</p><p>tatema.facisa.edu.br/index.php/revistatema/article/viewArticle/74</p><p>Saad, M., Masiero, D., & Battistella, L. R. (2001). Espiritualidade baseada em</p><p>evidências. Acta Fisiátrica, 8 (3), 107-112. https://doi.org/10.5935/</p><p>0104-7795.20010003</p><p>Santos, A. das N., & Guimarães, D. D. (2011). Espiritualidade, saúde e o</p><p>cuidado de enfermagem. Curso de Enfermagem, Faculdade Católica</p><p>Salesiana do Espírito Santo, Vitória (Trabalho de Conclusão de Curso</p><p>de Graduação). http://www.catolica-es.edu.br/fotos/files/espirituali-</p><p>dade,%20saude%20e%20o%20cuidado%20de%20enfermagem.pdf.</p><p>Universidade Federal do Espírito Santo (UFFE). (2019). Produção cientifica</p><p>em saúde e espiritualidade. Vitória, Espírito Santo. http://www.sauesp.</p><p>org.br/.</p><p>Silva, S. de S., Aquino, T. A. A., & Santos, R. M. (2008). O paciente com cân-</p><p>cer: cognições e emoções a partir do diagnóstico. Revista Brasileira de</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 143</p><p>Terapia Cognitiva, Rio de Janeiro, 4 (2), 73-89. http://pepsic.bvsalud.</p><p>org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872008000200006</p><p>Soares, R. G. (2014). Aspectos emocionais do câncer de mama. http://www.</p><p>clinicaceaap.com.br/.</p><p>Teixeira, E. F. B., Müller, M. C., & Silva, J. D. T. (org.). (2004). Espirituali-</p><p>dade e Qualidade de Vida. Porto Alegre: Edipucrs.</p><p>Venâncio, J. L. (2004). Importância da atuação do psicólogo no tratamento de</p><p>mulheres com câncer de mama. Revista Brasileira de Cancerologia,</p><p>Rio de Janeiro, 1 (50), 55-63. http://www1.inca.gov.br/rbc/n_50/v01/</p><p>pdf/revisao3.pdf</p><p>CAPÍTULO 9</p><p>MULHERES SOBREVIVENTES</p><p>DE CÂNCER DE MAMA:</p><p>crescer a partir do sofrimento</p><p>Tânia Rudnicki</p><p>O modo de vida em sociedade vem sofrendo contínuas mudanças,</p><p>levando, em geral, a alterações no estilo de vida das pessoas. O aumento da</p><p>ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) tem sido impul-</p><p>sionado por vários fatores de risco, oriundos do uso do cigarro e do álcool, a</p><p>falta de exercício físico, dietas pouco saudáveis e a poluição do ar, entre outras</p><p>causas (Souza, 2018). As enfermidades classificadas desta forma resultam</p><p>em perda de qualidade de vida, limitações e incapacidades (Brasil, 2013).</p><p>A vivência de uma doença crônica afeta o indivíduo em todo seu contexto,</p><p>acarretando diversas alterações no seu dia a dia.</p><p>O câncer é provavelmente uma das experiências mais difíceis que alguém</p><p>poderia viver, devido à multiplicidade de fatores envolvidos e pela mesma</p><p>razão, não há maneira específica de lidar com isso. Abruptamente, ele muda</p><p>muitos aspectos da vida e da rotina diária, tanto do paciente quanto da família</p><p>e de seu ambiente próximo. As reações que podem ser observadas; como o</p><p>choque de primeiro momento, onde o enfermo não consegue entender a situa-</p><p>ção que está enfrentando, congelando, sentindo-se perturbado, incrédulo, sem</p><p>esperança entre muitos outros pensamentos e sentimentos que são comuns e</p><p>considerados como parte de um processo normal de adaptação.</p><p>Considerado como doença crônica, o câncer é a principal causa de morte</p><p>imposta por enfermidades não transmissíveis no mundo, portanto, é um pro-</p><p>blema de saúde pública importante, tanto em países desenvolvidos como</p><p>em países a caminho do desenvolvimento (Prolla, Silva, Netto, Goldim, &</p><p>Ashton-Prolla, 2015). Conforme dados do Instituto Nacional de Câncer José</p><p>Alencar Gomes da Silva – INCA (2019ª), a carga global de câncer em todo o</p><p>mundo, foi estimada no ano de 2018, em 18,1 milhões de novos casos e 9,6</p><p>milhões de mortes por câncer.</p><p>O câncer tornou-se uma doença crônica relacionada cultural e histori-</p><p>camente à dor e à morte. Devido a isso, e à complexidade da doença e seu</p><p>tratamento, o momento do diagnóstico resulta em um forte impacto emocional</p><p>para o paciente e sua família; portanto, geralmente leva tempo para a pessoa</p><p>146</p><p>assimilar e aceitar a situação que é viver e se submeter ao tratamento sugerido</p><p>(Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013). Entre as mulheres (INCA, 2019b), o</p><p>câncer de mama é o mais comumente diagnosticado e a principal causa de</p><p>morte por câncer. De acordo com estatísticas mundiais do Globocan-2018</p><p>(Bray et al., 2018), a estimativa gira em torno de 2,1 milhões de casos novos</p><p>de câncer e 627 mil óbitos pela doença.</p><p>O câncer de mama é a neoplasia maligna mais incidente em mulheres na</p><p>maior parte do mundo, sendo uma doença que carrega consigo a possibilidade</p><p>de morte e de tratamentos mutilantes, provocando intenso sofrimento. No Bra-</p><p>sil, é o tipo de câncer que mais acomete as mulheres excetuando-se os tumores</p><p>de pele não melanoma, além de ser o que mais leva a óbito (INCA, 2019b).</p><p>Devido ao aumento de sua prevalência dentro das doenças não trans-</p><p>missíveis, o câncer de mama tornou-se um problema de saúde pública para o</p><p>sistema de saúde brasileiro, exigindo</p><p>intervenções vinculadas a tecnologias</p><p>leves, leve-duras e duras, concomitante a mudanças de estilo de vida inseridas</p><p>em um projeto terapêutico de cuidado contínuo (Silva et al., 2014).</p><p>O expressivo aumento da incidência deste tipo de câncer ocorreu, nos paí-</p><p>ses ocidentais, no final dos anos de 1980 e nos anos 1990. Pode-se entender tal</p><p>fato como um reflexo de mudanças no padrão reprodutivo e no estilo de vida,</p><p>impostos pelo mundo industrializado (Silva, 2012). Com esse ritmo agitado,</p><p>ocorre aumento da taxa de sedentarismo, a alimentação torna-se inadequada</p><p>e as pessoas ficam mais expostas ao estresse. O ritmo de vida é acelerado,</p><p>sendo esperado que se trabalhe de forma intensa (Pereira et al., 2017).</p><p>A incidência do câncer de mama tende a crescer progressivamente a partir</p><p>dos 40 anos, assim como a mortalidade por essa neoplasia. Para o seu controle,</p><p>estudos epidemiológicos têm apontado a relevância da determinação dos fatores</p><p>de risco no intuito de identificar mulheres com risco aumentado para a promoção</p><p>do diagnóstico precoce e tratamento adequado, buscando prevenir intercorrên-</p><p>cias. Para o Brasil, foram estimados quase 60 mil novos casos em 2019, com</p><p>risco estimado de 56 casos a cada 100 mil mulheres (INCA, 2019b).</p><p>Atualmente, o diagnóstico, o tratamento local e o tratamento sistêmico</p><p>para o câncer de mama estão sendo aprimorados de forma rápida, em razão</p><p>de um melhor conhecimento da história natural da doença e das característi-</p><p>cas moleculares dos tumores. Nesse cenário, o planejamento de estratégias</p><p>de controle do câncer de mama por meio da detecção precoce é fundamental</p><p>(Silva, 2012; Pereira et al., 2017; INCA, 2019b).</p><p>Quanto mais cedo um tumor invasivo é detectado e seu tratamento iniciado,</p><p>maior a probabilidade de cura. Entretanto, em razão da individualização orgânica</p><p>e da grande heterogeneidade tumoral associada à presença de fatores de risco</p><p>conhecidos e não conhecidos, este tipo de câncer é considerado uma doença de</p><p>comportamento dinâmico, em constante transformação (INCA, 2019b).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 147</p><p>O tratamento classificado como sistêmico, é aquele onde é utilizada</p><p>quimioterapia, hormonioterapia e/ou terapia-alvo molecular e local; cirúrgico,</p><p>radical ou conservador, além de radioterápico. Quando realizado antes da</p><p>cirurgia curativa, o tratamento sistêmico é chamado de neoadjuvante e tem</p><p>por objetivo eliminar possíveis micrometástases, que são aquelas células que</p><p>disparam da mama, para outros órgãos do corpo (NCCN, 2018; Rudnicki,</p><p>Oliveira, & Rosa, 2018).</p><p>Além dos aspectos físicos e biológicos, envolve a dimensão existen-</p><p>cial da mulher, no que concerne à sexualidade, maternidade, autoimagem e</p><p>estética (Prolla, Silva, Netto, Goldim, & Ashton-Prolla, 2015). Ao receber</p><p>esse diagnóstico ela se sente ameaçada de diferentes formas, podendo trazer</p><p>consequências diversas, que podem se manifestar como desconforto físico e</p><p>psicológico, ansiedade, estado depressivo, mudanças na autoimagem, baixa</p><p>na autoestima, alterações nos hábitos e estilo de vida, medo quanto ao trata-</p><p>mento e pela possibilidade de recorrência da doença, além do temor da morte</p><p>(Rudnicki, Oliveira, & Rosa, 2018).</p><p>Ela terá de enfrentar, em seu cotidiano, dificuldades as mais diversas,</p><p>como a condição de viver com uma doença que, em nossa sociedade, ainda é</p><p>intensamente ligada a estigmas. O diagnóstico deste tipo de câncer é sempre</p><p>conflituoso, fazendo com que a mulher experiencie um trauma emocional,</p><p>que a fará sentir-se sem esperança, deprimida, revoltada, retraída e na maioria</p><p>das vezes, solitária (Rudnicki, Oliveira, & Rosa, 2018).</p><p>A essa condição se aliam sofrimento, dor e agravamento da situação,</p><p>que pode ter como consequência a morte, além de produzir conflitos emocio-</p><p>nais associados ao sofrimento e ao medo do futuro. Ao se descobrir doente,</p><p>a mulher vai trilhar as etapas do diagnóstico, do tratamento agressivo e da</p><p>mudança corporal. Poderá experienciar sentimentos como negação, raiva e</p><p>frustração pela doença. Seu estado emocional pode ser afetado por vários</p><p>fatores, como a incerteza do diagnóstico ou a confirmação deste, o ato cirúr-</p><p>gico ou seu resultado, mudanças na imagem corporal e em sua rotina diária</p><p>(Dolina, Bellato, & Araujo, 2013).</p><p>É uma doença que carrega a possibilidade concreta de morte, gerando</p><p>medo, e angustia, expondo a mulher à fragilidade e finitude. Somando-se</p><p>a isso, a necessidade de se afastar das atividades rotineiras, dos papéis que</p><p>desempenham como mães, filhas, esposas, as possíveis utilizações no corpo,</p><p>principalmente no órgão feminino e a dor dos tratamentos, como o cirúrgico</p><p>e a quimioterapia (Dolina, Bellato, & Araujo, 2013). Crenças e esperança</p><p>possuem a capacidade de influenciar o bem-estar físico, emocional e espiritual</p><p>da mulher e familiares.</p><p>148</p><p>Sentimentos Vivenciados pela Mulher com</p><p>Diagnóstico de Câncer de Mama</p><p>O luto pelo câncer é um processo normal, adaptável e necessário, caracte-</p><p>rizado por um primeiro período em que um sentimento ou estado de perturba-</p><p>ção (atordoamento) e negação podem aparecer. É comum ouvir das pacientes:</p><p>“isso não pode estar acontecendo comigo, devem ter errado”. Muitos desejam</p><p>que seja apenas “um pesadelo ruim, é terrível”.</p><p>Neste processo, há momentos que são vividos com maior intensidade,</p><p>como nos momentos de início do tratamento, caracterizado por muito medo</p><p>e incerteza, sendo em alguns casos vivido como verdadeiro terror, às vezes</p><p>chegando até ser paralisante. O medo, como mencionado, é uma das emoções</p><p>que geralmente acompanham todo o tratamento e mesmo além deste. Medo de</p><p>efeitos colaterais, reações familiares, sociais e de trabalho, mudanças na vida</p><p>sexual, quando enfrentam seus próprios receios de perda ou mudança na identi-</p><p>dade pessoal e corporal, sendo comum não saber com certeza o que vai acontecer</p><p>com sua própria existência e até mesmo com a possibilidade de recidiva após o</p><p>término do tratamento. É incomum que a paciente seja mais emocionalmente</p><p>instável, o que se traduz em tristeza, tristeza e mudanças no nível emocional.</p><p>Podendo ser acompanhado por ansiedade, angústia, sentimento de desamparo</p><p>e desesperança, que muitas vezes é confundida com depressão clínica.</p><p>Muitas vezes o paciente com câncer pode sentir muita raiva, além da</p><p>sensação de solidão. Podem apresentar uma certa tendência ao isolamento, por</p><p>incerteza e insegurança. E não é estranho ouvir da família do paciente, que ele</p><p>é muito irritado. Estes últimos são manifestações de a raiva e frustração que</p><p>vem de estar sob pressão ter uma doença crônica tão complexa quanto o câncer.</p><p>A presença de sofrimento aumentado na paciente com câncer está associada</p><p>a um grande número de pontos negativos, incluindo baixa adesão ao tratamento</p><p>médico, pouca satisfação com os cuidados de saúde e baixa qualidade de vida.</p><p>Além disso, é difícil diagnosticar angústia em tempo de levar a um tratamento</p><p>psicológico e/ou farmacológico adequados, podendo assim, proporcionar melho-</p><p>rias importantes no bem-estar da paciente (Burgess et al., 2005).</p><p>O sofrimento excessivo ou sua má gestão pode trazer distúrbios psiquiá-</p><p>tricos importantes que interferem na qualidade de vida da paciente e impactar</p><p>visivelmente o processo de tratamento e adaptação a novos desafios vitais</p><p>impostos pela experiência do câncer. A população de câncer é significati-</p><p>vamente mais prevalente nos Transtornos Depressivos em contraste com a</p><p>população normal, havendo algumas diferenças relevantes de acordo com a</p><p>idade, sexo e tipo de câncer (Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013).</p><p>A partir do diagnóstico confirmado, a doença pode causar impactos de</p><p>diferentes formas à paciente em relação à forma de encarar a doença. Grande</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 149</p><p>parte dos casos diagnosticados gera sentimentos de medo e de vergonha e faz</p><p>com que a mulher tente ocultar a doença do ambiente social, muitas vezes,</p><p>escondendo o diagnóstico ou adiando a revelação</p><p>pública de sua condição</p><p>(Scorsolini-Comin, Santos, & Souza, 2009).</p><p>No curso da doença oncológica, a paciente vive um inevitável processo</p><p>de luto, entendendo o luto como o processo de adaptação a uma série de per-</p><p>das, não apenas relacionadas à saúde, mas também, relacionado à perda de</p><p>estabilidade e segurança, perda da rotina e da vida cotidiana, perda do papel</p><p>que costumava ter dentro da família, do mundo do trabalho ou social, perda</p><p>de controle, entre outros. Desta forma, portanto, é importante destacar que a</p><p>perda de controle, pode se tornar uma das perdas mais desestabilizadoras e</p><p>desestruturais no ser humano (Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013).</p><p>Pontuado como a doença que incide sobre um dos símbolos do corpo,</p><p>relacionado à sexualidade, sensualidade e maternidade, compromete, além da</p><p>condição física, a saúde mental (Pelegrini, Cerqueira, & Peres, 2008). O diag-</p><p>nóstico de câncer de mama interfere no desenvolvimento emocional, social</p><p>e profissional da mulher (Ferlay et al., 2015; Ramos & Patrão, 2015). Assim,</p><p>ele vem acompanhado de fatores estressores que transformam a patologia em</p><p>uma vivência traumática, podendo desencadear sintomatologias de ansiedade</p><p>e depressão (Hansen, Silva, & Rudnicki, 2015). Em estudo de Cordova et al.</p><p>(2001), composto por uma amostra de 70 mulheres com câncer de mama, 61%</p><p>referiu perceber o diagnóstico como um evento estressor traumático. Em seu</p><p>estudo, a partir de uma amostra de 746 mulheres, Lo-Fo-Wong et al. (2016)</p><p>encontraram que 41% das participantes referiu experimentar sentimentos de</p><p>aflição, seis meses após o diagnóstico e 32%, após 15 meses.</p><p>As intervenções propostas pela Psicologia, desde seu início, através da</p><p>clínica, estiveram sempre focadas nos aspectos negativos e patológicos do</p><p>diagnóstico. Entretanto, cada vez mais, a literatura vem explorando as inter-</p><p>venções interligadas aos aspectos positivos. Estudos na linha da Psicologia</p><p>Positiva têm direcionado seu foco de atenção a diferentes populações e con-</p><p>textos, mas é, em especial, no campo da reabilitação de doenças que têm</p><p>encontrado resultados mais efetivos (Sheldon & King, 2001).</p><p>Traumas são inesperados e estão fora do controle. Muitos sobreviven-</p><p>tes são assombrados pelas cenas do ocorrido pelo resto de suas vidas. O</p><p>entendimento de crescimento pós-traumático não nega esse fato. Porém, ele</p><p>reconhece que há um outro lado na moeda, a dor também pode representar</p><p>novas perspectivas (Ramos & Patrão, 2015; Rudnicki, 2020).</p><p>A maioria dos estudos mostra dados e exemplos de um viés negativo que</p><p>permeia grande parte da psicologia teórica. É importante que os psicólogos</p><p>tentem cultivar esta perspectiva mais apreciativa da natureza humana. Tal fato</p><p>limita a compreensão sobre o funcionamento humano típico e bem-sucedido</p><p>150</p><p>(Sheldon & King, 2001). A abordagem da Psicologia Positiva busca estudar o</p><p>desenvolvimento da força pessoal, o incentivo de sentimentos positivos, bem-</p><p>-estar, satisfação com a vida e crescimento pessoal. As abordagens que buscam</p><p>desenvolver crescimento pós-traumático (CPT) se encontram neste grupo.</p><p>Acontecimentos adversos, incontroláveis e imprevisíveis, as crises, trau-</p><p>mas ou eventos estressores, estão presentes na vida de todo ser humano. Carac-</p><p>teriza-se um trauma quando a resposta é dada por um medo intenso ou uma</p><p>sensação de impotência (Martins-Monteverde, Padovan, & Juruena, 2017).</p><p>A forma como cada pessoa encara a vivência de um evento traumático</p><p>é pessoal, subjetiva (Madeira, 2013). Mudanças positivas, após uma adver-</p><p>sidade, já há algum tempo são reconhecidas em diversas áreas, como em</p><p>casos de câncer, violência física e sexual, em acidentes de aviação, catástrofes</p><p>naturais, nas doenças crônicas, entre outros. Estas mudanças partilham o fator</p><p>comum de luta contra a adversidade.</p><p>É através deste processo de luta que as mudanças podem ocorrer e levar</p><p>o indivíduo a um nível mais elevado de funcionamento do que aquele exis-</p><p>tente antes do acontecimento (Joseph & Linley, 2012). Desta forma, carac-</p><p>teriza-se o CPT, trazendo oportunidades para crescer através da dor e abrir</p><p>novos horizontes, assumindo uma nova perspectiva na vida e desenvolvendo</p><p>a perseverança através das dificuldades (Rudnicki, 2020).</p><p>O CPT é um dos vários conceitos que estuda as mudanças positivas e</p><p>aprendizagens realizadas a partir das experiências consideradas negativas. É</p><p>uma mudança positiva resultante da vivência de uma situação percebida como</p><p>difícil ou traumática, que desestrutura intensamente os esquemas mentais</p><p>fundamentais (Tedeschi & Calhoun, 2004).</p><p>O processo cognitivo inicia com a vivência de algum evento que abala</p><p>o sistema de crenças centrais da pessoa. Desta forma, o indivíduo irá dispor</p><p>de aspectos próprios que interferem na possibilidade de desenvolvimento de</p><p>CPT como, por exemplo, espiritualidade e traços como otimismo. A partir</p><p>destes, a pessoa irá usar diferentes processos para lidar com a situação, como</p><p>o apoio social e as estratégias de coping, para assim, manejar com o estresse</p><p>e rever suas crenças (Danhauer et al., 2013).</p><p>No que se refere a vivência de um evento traumático, Cann, Calhoun e</p><p>Tedeschi (2010) constataram que ela pode levar o indivíduo a reexaminar os</p><p>elementos principais das suas crenças de visão de mundo. Quanto maior a</p><p>necessidade de reexaminar as crenças, maior a probabilidade de experienciar</p><p>crescimento após o trauma (Triplett, Tedeschi, Cann, Calhoun, & Reeve, 2012;</p><p>Medeiros, Fonseca, Brito, Castro, & Serra, 2016).</p><p>Estudo de Wortman e Silver (1989) mostra que um grande número de</p><p>pessoas que sofre uma perda irreparável não se deprime e que as reações</p><p>intensas de luta e sofrimento não são inevitáveis e a sua ausência não significa</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 151</p><p>necessariamente que exista ou vá existir alguma perturbação. Assim, elimina</p><p>a ideia tradicional de que uma experiência traumática seria inevitavelmente</p><p>desestabilizadora para a pessoa, passando-se a admitir que não se deve esperar</p><p>que todas as pessoas, frente a situações extremas tenham reações iguais. Frente</p><p>à experiência traumática as reações das pessoas podem variar num contínuo</p><p>e adotar diferentes formas (Vázquez, Castilla, & Hervás, 2008).</p><p>Crescimento Pós-Traumático</p><p>Como um acontecimento traumático, o diagnóstico de um câncer se</p><p>constitui em experiência de choque emocional, para o qual a pessoa pode não</p><p>ter obtido preparação psicológica prévia e, consequentemente, não percebe os</p><p>recursos necessários para lhe fazer frente. Desta forma, compreende-se que o</p><p>confronto com um acontecimento traumático como este, pode gerar intenso</p><p>estresse e eclodir em respostas emocionais negativas, como ansiedade, humor</p><p>deprimido, entre outros (Silva, Moreira, Pinto, Souza, & Canavarro, 2009).</p><p>Alterações positivas foram caracterizadas na literatura, por meio de vários</p><p>conceitos, entre eles, o crescimento pós-traumático, crescimento relacionado</p><p>ao estresse, os benefícios percebidos, mudanças psicológicas positivas, flo-</p><p>rescimento, ajuste positivo, adaptação positiva, entre outros (Joseph & Lin-</p><p>ley, 2004; Tedeschi & Calhoun, 2004).</p><p>Ainda que a experiência de um câncer possa ter impactos físicos e psico-</p><p>lógicos negativos substanciais, existem algumas pessoas que veem aspectos</p><p>desta experiência como positivo ou benéfico. A literatura tem mostrado que</p><p>a exposição a um acontecimento traumático não precipita necessariamente</p><p>uma constelação significativa de sintomas negativos, a ponto de se constituir</p><p>como uma perturbação psiquiátrica (Silva et al., 2009; Rudnicki, 2020).</p><p>Muitos pacientes relatam melhores recursos pessoais, mais prudên-</p><p>cia, relações mais próximas com outros e mudanças nas prioridades de vida</p><p>após a experiência do câncer (Cordova, Cunningham, Carlson, & Andryko-</p><p>wski, 2001). As mudanças positivas percebidas no confronto com o aconteci-</p><p>mento traumático, como a doença oncológica, o Crescimento Pós-Traumático</p><p>(CPT) (Tedeschi & Calhoun, 1996; 2004), é definido como a percepção</p><p>de</p><p>mudanças positivas, resultante dos esforços individuais das formas de lidar/</p><p>enfrentar (coping) uma situação de crise.</p><p>O CPT é a construção mais usada para descrever as mudanças positi-</p><p>vas experimentadas como resultado de esforços psicológicos e cognitivos</p><p>realizados, cuja finalidade é lidar com circunstâncias difíceis (Calhoun &</p><p>Tedeschi, 2006). Conforme descrito pelos mesmos autores (2004), é a luta</p><p>do indivíduo com sua nova realidade, com o saldo do trauma, sendo decisivo</p><p>para determinar a extensão em que ocorre o CPT.</p><p>152</p><p>O estresse do acontecimento não produz necessariamente CPT, mas é</p><p>necessário que o sujeito entenda o acontecimento como estressante ou como</p><p>uma ameaça ao seu bem-estar biopsicossocial para que, como sobrevivente,</p><p>se envolva em estratégias de coping eficazes para lidar com o acontecimento e</p><p>para reestabelecer o equilíbrio, que foi afetado pelo choque do acontecimento</p><p>(Cann et al., 2011; Calhoun & Tedeschi, 2006).</p><p>A existência de CPT não é o regresso ao ponto inicial. É diferenciado</p><p>de resiliência, é uma experiência de melhoria do funcionamento psicoló-</p><p>gico, principalmente por proporcionar alterações intensas de vida e relevantes</p><p>expressões comportamentais (Silva et al., 2009; Tedeschi & Calhoun, 2004).</p><p>A experiência de CPT é um processo e um resultado, que ocorrem simulta-</p><p>neamente (Tedeschi & Calhoun, 2004).</p><p>Ele corre concomitantemente às tentativas ou esforços de adaptação às</p><p>situações de vida indutoras de elevados níveis de estresse e não como con-</p><p>sequência dos acontecimentos por si só. É um fenômeno que, mais do que a</p><p>exclusiva integração de novos dados nos esquemas preexistentes (assimilação),</p><p>requer um processo de transformação das estruturas cognitivas anteriores, de</p><p>forma a incorporar a nova informação relacionada com a situação traumática</p><p>(acomodação). Este processo acontece à medida que a pessoa se envolve</p><p>em estratégias (coping) para lidar com suas emoções negativas associadas</p><p>ao acontecimento e inicia a processar cognitivamente a situação traumática</p><p>(Silva et al., 2009). Para além das estratégias de coping, no processo cognitivo</p><p>da experiência traumática existem Dois fatores fundamentais e centrais no</p><p>desenvolvimento de CPT: a) reconstrução de crenças centrais; b) ruminação</p><p>(Cann et al., 2010; 2011).</p><p>Após a percepção de estresse subsequente ao confronto com o aconteci-</p><p>mento traumático é que vai ocorrer o rompimento de crenças centrais. Estas</p><p>são definidas como um conjunto de pressupostos-base sobre si mesmo, os</p><p>outros e o mundo, utilizados pelo sujeito para definir a priori os seus com-</p><p>portamentos e o seu lugar no mundo (Janoff-Bulman, 2006). São as crenças</p><p>centrais que permitem conferir alguma previsibilidade e certeza ao dia a dia</p><p>da pessoa. Após o trauma, tudo o que é previamente estabelecido é rompido e</p><p>questionado. Desenvolve-se, então, a necessidade de reestruturar e reconstruir</p><p>cognitivamente suas crenças centrais de modo a reestabelecer o equilíbrio</p><p>biopsicossocial (Cann et al., 2010). Assim, a pessoa se envolve no processo</p><p>de ruminação cognitiva sobre o acontecimento.</p><p>A ruminação é definida como um conjunto de pensamentos repetitivos</p><p>relacionados com determinada experiência estressante ou preocupante (Cann</p><p>et al., 2011), podendo ser intrusiva ou deliberada. A primeira define-se como</p><p>um conjunto de pensamentos de natureza estressante e negativa, que surge</p><p>de modo automático, sem a permissão do sujeito. Tendencialmente ocorre no</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 153</p><p>período mais próximo do acontecimento traumático, uma vez que se relaciona</p><p>com os esforços individuais em lidar com o impacto emocional da experiência</p><p>traumática (Cann et al., 2011).</p><p>De outra forma, a ruminação deliberada é definida como um conjunto de</p><p>pensamentos de natureza positiva e construtiva, sendo que, o sujeito envolve-</p><p>-se deliberadamente em tentativas de encontrar propósito e significado para</p><p>o acontecimento traumático (Cann et al., 2011). Este estilo de ruminação é</p><p>posterior aos pensamentos intrusivos; ocorre tendencialmente mais tarde no</p><p>tempo e à medida que aumenta a adaptação ao trauma.</p><p>Assim sendo, pode-se entender ruminação como um tipo característico</p><p>de pensamento relacionado à estado depressivo e/ou ansioso, frequentemente</p><p>manifestados nos pacientes oncológicos (Zanon & Teixeira, 2006). Pode ser</p><p>entendida como uma estratégia de regulação emocional, apresentando-se</p><p>como preditora significativa do CPT.</p><p>É no âmbito do processo cognitivo, restaurando as crenças centrais e</p><p>atribuindo significado à experiência, que o sujeito começa a compreender que</p><p>esse experimento traumático pode traduzir-se, também, em benefício para</p><p>diversas áreas da vida (Calhoun & Tedeschi, 2004). Desta forma, a mudança</p><p>de crenças centrais e a ruminação deliberada são reconhecidos como fortes</p><p>preditores de CPT, de acordo com o modelo sócio-cognitivo (Calhoun &</p><p>Tedeschi, 2006; 2013).</p><p>Assim sendo, os benefícios percebidos após o trauma estão diretamente</p><p>associados à busca de significado em meio à incerteza e à percepção de vulne-</p><p>rabilidade (Calhoun et al., 2000). Um processo reparador, uma reestruturação</p><p>em nível cognitivo que auxilia a encontrar explicações para o ocorrido.</p><p>Costa e Gil (2008) referem que tanto o processamento cognitivo como o</p><p>estilo de enfrentamento contribuem para a ocorrência de crescimento, asso-</p><p>ciado às experiências estressantes, embora os recursos de personalidade e/ou</p><p>aspectos socioculturais também devem ser considerados importantes contri-</p><p>buições. Tanto aspectos cognitivos como emocionais contribuem para o CPT</p><p>após um diagnóstico de câncer.</p><p>Em nível cognitivo, a busca por significados para a doença possibilita a</p><p>realização de uma avaliação das causas que podem ter levado ao seu desen-</p><p>volvimento. Por este ângulo, facilitar a expressão emocional fomenta o CPT;</p><p>porém, o objetivo sempre será oferecer ao paciente um espaço e um tempo para</p><p>depositar suas preocupações frente ao seu diagnóstico e não de racionalizar</p><p>seu mal-estar (Ramos & Patrão, 2015).</p><p>O CPT é um processo dinâmico e complexo que envolve vários fatores</p><p>em seu desenvolvimento (Taku, Cann, Tedeschi, & Calhoun, 2015). Fatores</p><p>sociodemográficos, como, idade, gênero, escolaridade; os clínicos ou relacio-</p><p>nados com o acontecimento, como o tempo desde o diagnóstico, a severidade</p><p>154</p><p>da doença, o estresse percebido; as características de personalidade, como</p><p>extroversão e otimismo; os fatores cognitivos, tais como, a ruminação e o</p><p>processo cognitivo, e os fatores sociais, como o suporte social e a expressão</p><p>emocional (Taku et al., 2015).</p><p>Os preditores de CPT têm sido estudados em diversos tipos de cân-</p><p>cer, sendo o de mama, aquele com um maior número de estudos (Shand,</p><p>Cowlishaw, Brooker, Burney, & Ricciardelli, 2015). A metanálise de Shand</p><p>et al. (2015) mostrou que, em doentes com câncer, o CPT associa-se positiva-</p><p>mente ao suporte social percebido, otimismo, espiritualidade, coping religioso</p><p>e tempo desde o diagnóstico. Esta última variável mantém algumas inconsis-</p><p>tências quanto à relação que estabelece com o CPT Contrariamente, outras</p><p>variáveis estabelecem uma associação significativa negativa com o CPT, como</p><p>a depressão, ansiedade e o estresse percebido. Apresenta-se, também, negati-</p><p>vamente correlacionado com idade e o gênero, ou seja, mulheres e indivíduos</p><p>com menor idade apresentam níveis mais elevados de CPT.</p><p>Crescimento Pós-Traumático, Instrumentos</p><p>de Medida e Verbalizações</p><p>Existe uma variedade de instrumentos que se propõem a avaliar o cresci-</p><p>mento decorrente do enfrentamento de situações adversas, entre eles: Changes</p><p>in Outlook Questionnaire (Joseph, Williams, & Yule, 1993); Stress Related</p><p>Growth Scale (Park, Cohen, & Murch, 1996); Perceived Benefit Scale (McMil-</p><p>len & Fisher, 1998), além do Posttraumatic Growth Inventory (Tedeschi &</p><p>Calhoun, 1996). Este último tem sido o mais comumente utilizado para mensu-</p><p>rar o crescimento proveniente do enfrentamento de situações</p><p>adversas (Hanley,</p><p>Peterson, Canto, & Garland, 2015; Wu, Leung, Cho, & Law, 2016), sendo</p><p>considerado, atualmente, o instrumento padrão para medir esse tipo de fenô-</p><p>meno (Steffens & Michael, 2015). Além de sua presença em estudos america-</p><p>nos, o instrumento tem sido utilizado em diversos países ao redor do mundo,</p><p>como Inglaterra (Linley & Andrews, 2007), Turquia (Dirik & Karanci, 2008),</p><p>China (Ho, Chan, & Ho, 2004), Holanda (Jaarsma, Pool, Sanderman, & Ran-</p><p>chor, 2006), Bósnia (Powell, Rosner, Butollo, Tedeschi, & Calhoun, 2003),</p><p>Austrália (Morris, Shakespeare-Finch, Rieck, & Newbery, 2005), Hungria</p><p>(Konkolÿ Thege, Kovács, & Balog, 2014), Itália (Prati & Pietrantoni, 2014),</p><p>Portugal (Resende, Sendas, & Maia, 2008), Espanha (Weiss, 2006) e França</p><p>(Cadell, Suarez, & Hemsworth, 2015).</p><p>Na versão original (Tedeschi & Calhoun, 1996), o Inventário é composto</p><p>por cinco dimensões: 1) relacionamento com outros; 2) novas possibilidades;</p><p>3) força pessoal; 4) mudança espiritual e 5) apreciação da vida (Calhoun &</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 155</p><p>Tedeschi, 2006; Tedeschi & Calhoun, 2004). Conforme os autores, a dimensão</p><p>relacionamento com os outros refere-se à valorização dos relacionamentos</p><p>interpessoais, à percepção de quem realmente importa na vida, à busca por um</p><p>grau maior de intimidade e profundidade nos relacionamentos ou mesmo ao</p><p>desenvolvimento de um nível de compaixão maior pelo sofrimento de outras</p><p>pessoas. Quanto a dimensão, novas possibilidades, esta refere-se à identifica-</p><p>ção de novos caminhos de vida, onde o indivíduo pode decidir lutar por algo</p><p>ou se engajar em uma determinada causa que passou a fazer sentido para ele.</p><p>Força pessoal refere-se a um aumento na percepção das próprias potenciali-</p><p>dades do indivíduo, que pode sentir-se mais preparado para enfrentar outros</p><p>desafios ou perceber-se tendo características positivas que desconhecia possuir.</p><p>Mudança espiritual refere-se ao desenvolvimento do interesse e engajamento</p><p>em questões existenciais, espirituais ou religiosas. Apreciação pela vida, em</p><p>geral, refere-se à valorização das pequenas alegrias cotidianas e à alteração</p><p>das prioridades em relação ao que realmente importa na vida.</p><p>O crescimento pós-traumático é um campo de estudo relativamente novo,</p><p>mas as descobertas já existentes são certamente instigantes. Especialistas da</p><p>área mostram que as pessoas podem crescer por meio da dor (Tedeschi &</p><p>Calhoun, 2004). Este crescimento pode acontecer na sequência de qualquer</p><p>acontecimento traumático.</p><p>Após o diagnóstico de um câncer de mama, por exemplo, compreendido</p><p>como aquilo que mudou a vida, a mulher pode perceber uma mudança nas suas</p><p>crenças e princípios norteadores de vida. Todos os dias acordamos pensando</p><p>que o amanhã vai ser igual e que nosso dia-a-dia vai seguir de acordo com</p><p>os princípios de segurança, estabilidade e conforto, mas quando ocorre um</p><p>acontecimento traumático, como o diagnóstico de um câncer, esses princípios</p><p>passam a ser desafiados (Rudnicki, 2020).</p><p>S. I., 45 anos, diz: “Não tive medo, disse que ia enfrentar a doença e tô</p><p>aqui até hoje.” L., 36 anos conta: “Tenho três filhos pra criar, então eu tive</p><p>que ser forte e enfrentar o câncer pra poder criar os meus filhos, não podia</p><p>deixar eles sozinhos no mundo.” Enquanto C., 44 anos verbaliza: “... eu me</p><p>levantei, tive coragem pra tratar a doença ... assim eu fiz. Eu já tô doente</p><p>mesmo, então agora tenho que me cuidar pra viver mais.”</p><p>Pode-se observar que a vida passa a ser olhada de forma diferente, pas-</p><p>sando a perceber que amanhã pode ser diferente; que de um dia para o outro,</p><p>tudo pode mudar, que a vida é imprevisível e que sou vulnerável a essa</p><p>imprevisibilidade e é através desta cognição que pode ocorrer o CPT. Ou seja,</p><p>depois que a mulher com câncer de mama percebe esta desestabilização da</p><p>vida, todo o processo (cognitivo, individual e social) subsequente – o pensar</p><p>156</p><p>sobre a doença, os pensamentos negativos e positivos, as relações que esta-</p><p>belece com os outros – pode levar a que experimente este CPT.</p><p>O acontecimento do câncer de mama enquanto evento marcante na</p><p>vida das mulheres é definido por sua intensidade e permanência, desde</p><p>experiências de vida, sentimentos negativos ou positivos (Grzybowshi,</p><p>Schmidt, & Borges, 2008).</p><p>A paciente I. (36 anos) mostrou o que aprendeu com sua doença: “Sofri!</p><p>Mas não morri, e acabou que esse mesmo sofrimento até me fez crescer.</p><p>Como eu trabalho na área da saúde, eu acredito que aprendi com a minha</p><p>doença a ajudar outras pessoas que, como eu, tinham câncer... ajudava essas</p><p>pessoas a não se desesperarem muito, mas aprenderem a viver com o que</p><p>tinham, falando com elas sobre o câncer e sobre o apoio todo que tinham.”</p><p>Pode-se entender que desse modo, a ameaça de desordem e instabilidade que</p><p>o câncer pode provocar perpassa por experiências compartilhados com outros</p><p>com os quais se vive, dialogando, negociando e debatendo para produzir</p><p>definições e modos de se manejo da doença (Ramos et al., 2012).</p><p>Outrossim, o CPT pode manifestar-se ou não, podendo aparecer num</p><p>aspeto ou em vários. O aspecto mais frequentemente relatado na literatura</p><p>é a clarificação das relações, torna-se claro para as mulheres as relações</p><p>investidas de ambas as partes, sejam com os amigos, com a família ou</p><p>com o parceiro, e as que não são.</p><p>“Tive muito apoio da minha família, eles não me deixavam ficar triste.</p><p>A minha família também me ajudou muito. Eu sou a menor dos irmãos,</p><p>eles me tratam como pequena ainda, cuidam muito bem de mim, graças</p><p>a Deus.” (D., 51 anos).</p><p>“Agora, depois do câncer eu levo uma vida de rainha! Não trabalho</p><p>mais, meu marido, meus filhos e noras estão sempre por perto, não me</p><p>deixam fazer nada. Se não fosse por eles, acho que eu não teria sido tão</p><p>forte.” (J., 55 anos)</p><p>“Eu não tenho mais força no braço pra trabalhar, mas eu não me</p><p>sinto uma inútil, faço o que eu posso e respeito isso, e minha família tá</p><p>sempre comigo, isso tá sendo muito importante.” (V., 69 anos).</p><p>Outro aspecto está relacionado a uma maior valorização da vida,</p><p>apreciar melhor cada dia e perceber o que é realmente importante para</p><p>si. E ainda a percepção do seu valor pessoal, onde passa a crer que, “se</p><p>fui capaz de lutar contra esta doença, sou capaz de muito mais ... só meu</p><p>cabelo que caiu, aí raspei logo tudo, cabelo cresce de novo, isso não seria</p><p>um problema.” (Paciente D., 55 anos).</p><p>“... depois que comecei a quimioterapia, que por sinal é muito ruim,</p><p>fico com muito mal-estar [...] meu cabelo caiu todinho, fiquei triste porque</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 157</p><p>eu tinha o cabelo bonito, era bem comprido, mas fazer o que, não é?</p><p>Quando acabou ele cresceu de novo” (P., 38 anos).</p><p>Importante pontuar que nem toda pessoa que passa por um aconteci-</p><p>mento traumático, como o câncer de mama, experiencia o crescimento. Esta</p><p>experiência é uma transformação pessoal, não se trata apenas de resiliência</p><p>para conseguir enfrentar o trauma, mas trata de conseguir transformar-se</p><p>a partir deste.</p><p>Considerações Finais</p><p>Uma visão abrangente do paciente com câncer significa aumento da cer-</p><p>teza de incluir o fator psicológico como um aspecto relevante no fenômeno da</p><p>doença. O câncer transcende a aparência somática se tornando fundamental</p><p>na experiência de vida e morte os aspectos emocionais associados.</p><p>Estudos que retratam os significados do câncer de mama podem repre-</p><p>sentar novas possibilidades de entendimento e compreensão de comportamen-</p><p>tos, sentimentos e comportamentos vinculados a esta experiência vivida. É</p><p>evidente também que os significados do câncer e seu tratamento são bastante</p><p>complexos, estando esta realidade sempre em movimento.</p><p>À medida que a pessoa começa a se sentir mais segura e tranquila, vai</p><p>reconhecendo os processos envolvidos no tratamento, as reações de seu corpo</p><p>frente as drogas, ao mesmo tempo, vai derrubando muitos dos mitos em torno</p><p>do diagnóstico do câncer, encontrando então, mais possibilidades</p><p>para se</p><p>adaptar ao tratamento e à doença.</p><p>Para finalizar, aponta-se a necessidade de um olhar sensível na direção</p><p>dessas mulheres, bem como a implementação de estratégias de manejo capazes</p><p>de romper com a fragmentação dos processos de trabalho que subdividem o</p><p>cuidado em saúde. Percebe-se a importância da atividade de uma psicologia</p><p>comprometida com a saúde e o cuidar de pessoas, nas diversas etapas de sua</p><p>vida. Espera-se que esse capítulo possa contribuir efetivamente para mudanças</p><p>de práticas em saúde.</p><p>158</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Brasil (2013). Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto</p><p>Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde.</p><p>Percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas:</p><p>2013. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.</p><p>ftp://ftp.ibge.gov.br/ PNS/2013/pns2013.pdf.</p><p>Brasil (2014). Ministério da Saúde, Portaria nº 483, Art. 2º de 2014, de 1º</p><p>de abril de 2014. Redefine a Rede de Atenção à Saúde das Pes-</p><p>soas com Doenças Crônicas no âmbito do Sistema Único de Saúde</p><p>(SUS) e estabelece diretrizes para a organização das suas linhas</p><p>de cuidado. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2014/</p><p>prt0483_01_04_2014.html</p><p>Brasil (2019). Ministério da Saúde. Sistema de Informação sobre Mortalidade.</p><p>Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissí-</p><p>veis e Promoção da Saúde (DANTPS). http://svs.aids.gov.br/dantps/</p><p>cgiae/sim/</p><p>Bray, F., Ferlay, J., Soerjomataram, I., Siegel, R. L., Torre, L. A., & Jemal,</p><p>A. (2018). Global cancer statistics 2018: GLOBOCAN estimates of</p><p>incidence and mortality worldwide for 36 cancers in 185 countries.</p><p>Cancer Journal Clinical, 68 (6), 394-424. DOI: 10.3322/caac.21492.</p><p>Burgess, C., Cornelius, V., Love, S., Graham, J., Richards, M., & Rami-</p><p>rez, A. (2005). Depression and anxiety in women with early</p><p>breast cancer: five-year observational cohort study. BMJ, 4 p. doi:</p><p>10.1136/bmj.38343.670868.D3 https://www.bmj.com/content/bmj/</p><p>early/2004/12/31/bmj.38343.670868.D3.full.pdf</p><p>Calhoun, L. G., & Tedeschi, R. G. (1999). Facilitating posttraumatic growth:</p><p>A clinician’s guide. Mahwah: Lawrence Erlbaum Associates.</p><p>Calhoun, L. G., Cann, A., Tedeschi, R. G., & McMillan, J. (2000). A correla-</p><p>tional test of the relationship between posttraumatic growth, religion,</p><p>and cognitive processing. Journal of Trauma and Stress, 13 (3), 521-</p><p>527. doi: 10.1023/A:1007745627077</p><p>Calhoun, L. G., & Tedeschi, R. G. (2006). The foundations of posttraumatic</p><p>growth: An expanded framework. In: L. G. Calhoun & R. G. Tedeschi</p><p>(Eds.). The handbook of posttraumatic growth: Research and practice</p><p>(pp. 1-23). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates Publisher.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 159</p><p>Calhoun, L. G., Cann, A., & Tedeschi, R. G. (2010). The posttraumatic growth</p><p>models. In T. Weiss & R. Berger (Eds.), Posttraumatic growth and cul-</p><p>turally competent practice: Lessons learned from around the globe</p><p>(pp. 1-14). New York: Wiley.</p><p>Cann, A., Calhoun, L. G., & Tedeschi, R. G. (2010). The Core Beliefs Inven-</p><p>tory: a brief measure of disruption in the assumptive world. Anxiety</p><p>Stress Coping, 23 (1), 19-34. doi:10.1080/10615800802573013</p><p>Cann, A., Calhoun, L. G., Tedeschi, R. G., Triplett, K. N., Vishnevsky, T.,</p><p>& Lindstrom, C. M. (2011). Assessing posttraumatic cognitive pro-</p><p>cesses: The Event Related Rumination Inventory. Anxiety, Stress &</p><p>Coping, 24, 137-156. doi:10.1080/10615806.2010.529901.</p><p>Cordova, M. J., Cunningham, L. C., Carlson, C. R., & Andrykowski, M. A.</p><p>(2001). Posttraumatic growth following breast cancer: a controlled</p><p>comparison study. Health Psychology, 20, 176-185. https://www.ncbi.</p><p>nlm.nih.gov/pubmed/11403215</p><p>Danhauer, S. C., Case, L. D., Tedeschi, R., Russell, G., Viscnevsky, T., Triplett,</p><p>K., Ip, E. H., & Avis, N. E. (2013). Predictors of posttraumatic growth</p><p>in women with breast cancer. Psychooncology, 22 (12), 2676-2683.</p><p>doi:10.1002/pon.3298.</p><p>Dolina, J. V., Bellato, R., & Araújo, L. F. S. (2013). O adoecer e morrer de mulher</p><p>jovem com câncer de mama. Ciência e Saúde Coletiva, 18 (9), 2671-</p><p>2680. https://dx.DOI.org/10.1590/S1413-81232013000900022.</p><p>Ferlay, J., Soerjomataram, I., Dikshit, R., Eser, S., Mathers, C., Rebelo, M.,</p><p>Parkin, D. M., Forman, D., & Bray, F. (2015). Cancer incidence and</p><p>mortality worldwide: Sources, methods and major patterns in Globo-</p><p>can 2012. International Journal of Cancer, 136, E359-E386. http://</p><p>portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/04/Fer-</p><p>lay_et_al-2015-International_Journal_of_Cancer.pdf</p><p>Globocan (2019). World Health Organization. International Agency for</p><p>Research on Cancer. https://gco.iarc.fr/today/</p><p>Grzybowski, M. A., Schmidt, C. B., & Borges, V. R. (2008). A percepção de</p><p>pacientes com câncer de mama em relação ao trauma emocional e o</p><p>aparecimento do tumor. Psicologia Hospitalar, 6 (1), 82-96. http://</p><p>pepsic.bvsalud.org/pdf/ph/v6n1/v6n1a07.pdf.</p><p>160</p><p>Hanley, W., Peterson, W., Canto, A. I., & Garland, L. (2015). The relationship</p><p>between mindfulness and posttraumatic growth with respect to con-</p><p>templative practice engagement. Mindfulness, 6 (3), 654-662. doi:</p><p>10.1007/s12671-014-0302-6.</p><p>Hansen, C., Cardoso, D., & Rudnicki, T. (2015). Diagnóstico oncológico em</p><p>mulheres: aspectos psicoemocionais e intervenção cognitivo-com-</p><p>portamental. In: Rudnicki, T. Ramos, C. Patrão, I. Pimenta, F. (Orgs).</p><p>Ciclo de vida da mulher: intervenção cognitivo-comportamental na</p><p>saúde e na doença (p. 196-213). Novo Hamburgo: Sinopsys.</p><p>INCA (2017) - Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. -</p><p>Ministério da Saúde. Estimativa 2018: incidência de câncer no Brasil.</p><p>Coordenação de Prevenção e Vigilância. Rio de Janeiro: INCA. 128</p><p>p. ISBN 978-85-7318-361-0. Disponível em: http://www1.inca.gov.</p><p>br/estimativa/2018/</p><p>INCA (2019a) - Estatísticas de câncer. Instituto Nacional de Câncer José</p><p>Alencar Gomes da Silva - Ministério da Saúde. Estimativa de números</p><p>de câncer no Brasil em 2018/2019. Coordenação de Prevenção e Vigi-</p><p>lância/Divisão de Vigilância e Análise de Situação. https://cbdl.org.br/</p><p>inca-solta-estimativa-de-numeros-de-cancer-no-brasil-em-2018-2019/.</p><p>INCA (2019b) - Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva A</p><p>situação do câncer de mama no Brasil: síntese de dados dos sistemas</p><p>de informação. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da</p><p>Silva. Rio de Janeiro: INCA. 85 p. ISBN 978-85-7318-377-1. https://</p><p>www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files//media/document//a_</p><p>situacao_ca_mama_brasil_2019.pdf</p><p>Janoff-Bulman, R. (2004). Posttraumatic growth: Three explanatory models.</p><p>Psychological Inquiry, 15, 30-34. doi: 10.1080/08870440903287926</p><p>Joseph, S., & Linley, P. A. (Eds) (2012). Trauma, Recovery, and Gro-</p><p>wth: Positive Psychological Perspectives on Posttraumatic Stress.</p><p>ISBN:9780470075029 |Online ISBN:9781118269718 https://doi.</p><p>org/10.1002/9781118269718.ch1</p><p>Joseph, S., Williams, R., & Yule, W. (1993). Changes in outlook following</p><p>disaster: The preliminary development of a measure to assess positive</p><p>and negative responses. Journal of Traumatic Stress, 6 (2), 271-279.</p><p>doi: 10.1002/jts.2490060209</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 161</p><p>Lo-Fo-Wong, D., Haes, H., Aaronson, N., Abbema, D., Boer, M., Hezewijk,</p><p>M., Immink, M., Kaptein, A., Menke-Pluijmers, M., Reyners, A., Rus-</p><p>sell, N., Schriek, M., Sijtsema, S., van Tienhoven, G., & Sprangers, M.</p><p>(2016). Predictors of enduring clinical distress in women with breast</p><p>cancer. Journal Breast Cancer Research and Treatment, 158 (3). doi:</p><p>10.1007/s10549-016-3896-7</p><p>Madeira, S. R. M. (2013). Relação entre as características da situação</p><p>vivida, suporte social e resiliência, após a vivência de um aconte-</p><p>cimento potencialmente traumático. Dissertação de mestrado. Uni-</p><p>versidade de Lisboa, Faculdade de Psicologia. https://repositorio.</p><p>ul.pt/bitstream/10451/10486/1/ulfpie046386_tm.pdf</p><p>Malta, D. C., Morais Neto, O. L., Silva, M. M. A., Rocha, D., Castro, A.</p><p>M., Reis, A. A. C., Akerman, M. (2016). Política Nacional de Pro-</p><p>moção da Saúde (PNPS): capítulos de uma caminhada ainda em</p><p>construção. Ciência e Saúde Coletiva, 21 (6), 1683-1694. doi:</p><p>10.1590/1413-81232018235.31552017</p><p>Martins-Monteverde, C. M. S., Padovan, T., & Juruena, M. F. (2017). Transtor-</p><p>nos relacionados a traumas e a estressores. Medicina (Ribeirão Preto,</p><p>Online.), 50 (Supl.1), 37-50. http://dx.DOI.org/10.11606/issn.2176-</p><p>7262.v50isupl1.p37-50</p><p>McMillen, J. C., & Fisher, R. H. (1998). The Perceived Benefits Scales: Mea-</p><p>suring perceived positive life changes after negative events. Social</p><p>Work Research, 22 (3), 173-187. doi: 10.1093/swr/22.3.173</p><p>Medeiros, E. D. C., Fonseca, R. N., Brito, P. N., Castro, R. C. S., Serra, L.</p><p>(2016). Correlatos valorativos do crescimento pós-traumático em uma</p><p>amostra brasileira. Psicologia e Saber Social, 5 (2), 112-125. Doi:</p><p>10.12957/psi.saber.soc.2016.21602</p><p>NCCN - National Comprehensive Cancer Network (2018). Clinical Practice</p><p>Guidelines (NCCN Guidelines). Breast Cancer. Versão 4. 2017. Esta-</p><p>dos Unidos da América: NCCN. https://www.nccn.org/professionals/</p><p>physician_gls/default.aspx.</p><p>Park, C. L., Cohen, L. H., & Murch, R. (1996). Assessment and prediction</p><p>of stress-related growth. Journal of Personality, 64 (1), 71-105. doi:</p><p>10.1111/j.1467-6494. 1996.tb00815.x</p><p>162</p><p>Pelegrini, L. G., Cerqueira, J. A., & Peres, R. S. (2008). Indicadores de quali-</p><p>dade de vida e sintomas de ansiedade, depressão e estresse em mulhe-</p><p>res mastectomizadas no período de reabilitação. Revista da Sociedade</p><p>de Psicologia do Triângulo Mineiro, 12 (2), 168-176. http://biblio-</p><p>tecaparalapersona-epimeleia.com/greenstone/collect/revista3/index/</p><p>assoc/HASH0168.dir/doc.pdf.</p><p>Pereira, W. A., Cutrin, N. L. R., Reis, T. S., Almeida, P. H. P., Motta, E. A. P.</p><p>(2017). Estudo do consumo de plantas medicinais obtidas em feiras</p><p>livres de São Luís, para o tratamento de doenças crônicas. Revista</p><p>Ceuma Perspectivas, 30 (1), 172-179. ISSN Eletrônico: 2525-5576.</p><p>http://www.ceuma.br/portalderevistas/index.php/RCCP/article/</p><p>view/111/pdf.</p><p>Prolla, C. M. D., Silva, P. S., Netto, C. B. O., Goldim, J. R., & Ashton-Prolla,</p><p>P. (2015). Conocimiento del cáncer de mama y cáncer de mama here-</p><p>ditario en el personal de enfermería de un hospital público. Revista</p><p>Latino-Americana de Enfermagem, 23 (1), 90-97. doi: 10.1590/0104-</p><p>1169.0185.2529 www.eerp.usp.br/rlae.</p><p>Ramos, C., & Patrão, I. (2015). Intervenção cognitivo-comportamental em</p><p>grupo com mulheres portadoras e sobreviventes de câncer de mama.</p><p>In: Rudnicki, T., Ramos, C., Patrão, I., & Pimenta, F. Ciclo de vida da</p><p>mulher: intervenção cognitivo-comportamental na saúde e na doença.</p><p>(p. 162-195). São Leopoldo: Sinopsys.</p><p>Ramos, W. S. R., Sousa, F. S., Santos, T. R., Silva Júnior, W. R., França, I.</p><p>S. X., Figueiredo, G. C. A. L. (2012). Sentimentos vivenciados por</p><p>mulheres acometidas por câncer de mama. Journal of Health Science</p><p>Institute, 30 (3), 241-248. https://www.unip.br/presencial/comunicacao/</p><p>publicacoes/ics/edicoes/2012/03_jul-set/V30_n3_2012_p241a248.pdf</p><p>Robert, V. M., Álvares, O. C., & Valdivieso, B. F. (2013). Psicooncología: Un</p><p>modelo de intervención y apoyo psicosocial. Revista Medico Clínica,</p><p>CONDES, 24 (4), 677-684. www.institutosalamanca.com</p><p>Rudnicki, T. (2020). Crescimento Pós-Traumático em Mulheres Sobrevi-</p><p>ventes de Câncer de Mama. 2ª ed. (p. 350-362). Em: Rudnicki, T.,</p><p>& Sanchez, M. M. (Orgs.) (2020). Psicologia da saúde: a prática de</p><p>terapia cognitivo-comportamental em hospital geral. 2. ed. rev. Novo</p><p>Hamburgo: Sinopsys. 384 p. ISBN 978-85-9501-150-2</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 163</p><p>Rudnicki, T., Oliveira, C., & Rosa, M. M. S. (2018). Terapia Cognitivo-Com-</p><p>portamental e intervenções com pacientes oncológicos. In Federação</p><p>Brasileira de Terapias Cognitivas, C. B. Neufeld, E. M. O, Falcone,</p><p>& B. P. Rangé (Orgs.) PROCOGNITIVA – Programa de Atualiza-</p><p>ção em Terapia Cognitivo-Comportamental: Ciclo 5 (p. 55-76) Porto</p><p>Alegre: Artmed Pan-Americana (Sistema de Educação Continuada a</p><p>Distância, v. 1).</p><p>Scorsolini-Comin, F., Santos, M. A., & Souza, L. V. (2009). Vivências e</p><p>discursos de mulheres mastectomizadas: negociações e desafios do</p><p>câncer de mama. Estudos de Psicologia, 14 (1), 41-50. ISSN: 1678-</p><p>4669 www.scielo.br/epsic</p><p>Seabra, C.R., Aguiar, M., & Rudnicki, T. (2016). Intervenções cognitivo-com-</p><p>portamentais no câncer de mama: relato de uma experiência. Revista</p><p>Saúde e Desenvolvimento Humano, 4 (1), 69-77. http://revistas.uni-</p><p>lasalle.edu.br/index.php/saude_desenvolvimento ISSN 2317-8582.</p><p>Shand, L. K., Cowlishaw, S., Brooker, J. E., Burney, S., & Ricciardelli, L. A.</p><p>(2015). Correlates of post-traumatic stress symptoms and growth in</p><p>cancer patients: a systematic review and meta-analysis Psychoonco-</p><p>logy, 24 (6), 624-634. doi: 10.1002/pon.3719.</p><p>Sheldon, K. M., & King, L. (2001). Why positive psychology is neces-</p><p>sary. American Psychologist, 56 (3), 216-217. https://doi.org/</p><p>10.1037/0003-066X.56.3.</p><p>Silva, G. A. (2012). Câncer de mama no Brasil: estratégias para o seu enfren-</p><p>tamento - Editorial. Caderno de Saúde Pública, 28 (1), 4-5. http://</p><p>www.scielo.br/pdf/csp/v28n1/01.pdf</p><p>Silva, K. B., Falangola, A., Bezerra, B., Chaves, L. D. P., & Tanaka, O. Y.</p><p>(2014). Integralidade no cuidado ao câncer do colo do útero: avaliação</p><p>do acesso. Revista de Saúde Pública, 48 (2), 240-248. doi: 10.1590/</p><p>S0034-8910.2014048004852</p><p>Silva, S. M., Moreira, H., Pinto, S., & Canavarro, M. C. (2009). Cancro da</p><p>mama e desenvolvimento pessoal e relacional: Estudo das caracte-</p><p>rísticas psicométricas do Inventário de Desenvolvimento Pós-Trau-</p><p>mático (Posttraumatic Growth Inventory) numa amostra de mulheres</p><p>da população Portuguesa. Revista Iberoamericana de Diagnóstico e</p><p>Avaliação Psicológica, 28, 105-133. ISSN: 1135-3848. https://www.</p><p>redalyc.org/articulo.oa?id=459645444007</p><p>164</p><p>Souza, E. N. (2018). Mapeando as abordagens sobre doenças crônicas não</p><p>transmissíveis no Brasil: Uma revisão sistemática de literatura. Tra-</p><p>balho de Conclusão de Curso. Universidade de Brasília, Campus</p><p>Ceilândia. Curso de Saúde Coletiva. 44 p. http://bdm.unb.br/bits-</p><p>tream/10483/20850/1/2018_EricaNogueiraSousa_tcc.pdf</p><p>Stephen J., & Linley, A. P. (2008). Trauma, Recovery, and Growth: Positive</p><p>Psychological Perspectives on Posttraumatic Stress. New Jersey: John</p><p>Wiley & Sons. 384 p.</p><p>Taku, K., Cann, A., Tedeschi, R. G., & Calhoun, L. G. (2015). Core beliefs</p><p>shaken by an earthquake correlate with posttraumatic growth. Psycho-</p><p>logical Trauma: Theory, Research, Practice, and Policy, 7 (6), 563-</p><p>569. https://doi.org/10.1037/tra0000054</p><p>Tedeschi, R. G., & Calhoun, L. G. (1996). The Posttraumatic Growth Inven-</p><p>tory: Measuring the positive legacy of Trauma. Journal of Traumatic</p><p>Stress, 9 (3), 455-471. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8827649</p><p>Tedeschi, R. G., & Calhoun, L. G. (2004). Posttraumatic Growth: Conceptual</p><p>Foundations and Empirical Evidence. Psychological Inquiry, 15, 1-18.</p><p>https://ptgi.uncc.edu/files/2013/01/PTG-Conceptual-Foundtns.pdf.</p><p>Triplett, K. N., Tedeschi, R. G., Cann, A., Calhoun, L. G., & Reeve, C. L.</p><p>(2012). Posttraumatic growth, meaning in life, and life satisfaction in</p><p>response to trauma. Psychological Trauma: Theory, Research, Prac-</p><p>tice, and Policy, 4, 1-11. doi:10.1037/a0024204</p><p>Vázquez, C., Castilla, C., & Hervás, G. (2008). Reacciones frente el trauma:</p><p>vulnerabilidad, resistencia y crecimiento. In E. Fernández-Abascal</p><p>(Ed.). Las Emociones Positivas (p. 375-392). Madrid: Ed. Pirámide.</p><p>Wortman, C., & Silver, R. (1989). The Myths of Coping with Loss. Jour-</p><p>nal of Consulting and Clinical Psychology. 57, 349-357. doi:</p><p>10.1037/0022-006X.57.3.349.</p><p>Wu, K. K., Leung, P. W. L., Cho, V. W., & Law, L. S. C. (2016). Posttraumatic</p><p>growth after motor vehicle crashes. Journal of Clinical Psychology in</p><p>Medical Settings, 23 (2), 181-191. doi: 10.1007/s10880-016-9456-9</p><p>Zanon, C., & Teixeira, M. A. P. (2006). Adaptação do Questionário de Rumi-</p><p>nação e Reflexão (QRR) para estudantes</p><p>universitários brasileiros.</p><p>Interação em Psicologia, 10 (1), 75-82. doi: http://dx.doi.ord/105380/</p><p>psi.v.10i.5771.</p><p>CAPÍTULO 10</p><p>ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO</p><p>(COPING) DE DOENÇA EM SITUAÇÃO</p><p>DE TRATAMENTO HOSPITALAR</p><p>Grazielle Rocha França</p><p>Este capítulo é uma adaptação de um trabalho de conclusão de curso inti-</p><p>tulado – o Processo de Interação Entre Mãe e Filho com Câncer em Situação</p><p>de Tratamento Hospitalar.</p><p>A pesquisa realizada visou compreender como acontece o processo de</p><p>interação e integração entre mãe e filho com câncer em situação de tratamento</p><p>hospitalar através da análise de estratégias de enfrentamento da mãe frente à</p><p>doença da criança. Ainda, identificar as mudanças da vida cotidiana materna</p><p>decorrentes de sua permanência no hospital para acompanhar seu filho.</p><p>Participou deste estudo a mãe de um menino com câncer (Tumor de</p><p>Wilms), 35 anos, solteira, faxineira, nível de escolaridade ensino fundamental</p><p>completo, selecionada entre as mães do setor de Oncologia, em um hospital</p><p>especializado no atendimento de crianças e adolescentes. A seleção da parti-</p><p>cipante ficou sob a responsabilidade da psicóloga do setor de Oncologia da</p><p>instituição. Gostaríamos que fosse alguém em acompanhamento psicológico.</p><p>Em comum acordo com a mãe iniciei a coleta de dados em duas fases</p><p>distintas: A Fase I, coleta de dados inicial, realizada no terceiro dia da quimio-</p><p>terapia da criança. Nesta fase, mãe e filho encontravam-se no ambulatório do</p><p>setor de Oncologia. A Fase II realizada 19 dias após a Fase I, com a mesma</p><p>mãe, no oitavo dia de internação da criança, devido a leucopenia (redução</p><p>do número de leucócitos na concentração sanguínea). Nesta fase, mãe e filho</p><p>encontravam-se no setor de isolamento.</p><p>As fases da coleta de dados descritas acima ocorreram de acordo com a</p><p>estruturação do tratamento da criança (quimioterapia realizada de 21 em 21</p><p>dias). Além disso, levou-se em conta a dinâmica da entrevista estruturada,</p><p>composta de quatro etapas relacionadas à vida da criança, à dinâmica familiar,</p><p>aos aspectos de interação existentes entre mãe e filho na época da gestação,</p><p>nascimento e desenvolvimento, e aos aspectos de interação entre eles após o</p><p>diagnóstico de câncer.</p><p>A revelação de um câncer na criança explode no seio familiar. Desde o</p><p>momento em que o diagnóstico é comunicado à família, profundas alterações</p><p>166</p><p>ocorrem nela, afetando não só a unidade familiar, como também, o relaciona-</p><p>mento de seus membros com as outras pessoas (Valle, 1997).</p><p>A época do diagnóstico é o período em que aparecem incertezas e sen-</p><p>timentos de angústia diante da possibilidade de morte. Geralmente, os pais</p><p>não acreditam no diagnóstico, questionam-no, procuram outros médicos e</p><p>realizam em suas crianças novos exames, na busca de confirmação da doença</p><p>e na esperança de reversão da realidade.</p><p>Uma grande dificuldade dos pais na aceitação do diagnóstico de câncer</p><p>em seus filhos, através da percepção a respeito da gravidade da doença, das</p><p>manifestações de tristeza, das dificuldades em compreender a doença e o</p><p>tratamento, e do sofrimento demonstrado pela criança (Valle, 1997).</p><p>Há muitas famílias que permanecem intactas enquanto as crianças estão</p><p>se desenvolvendo bem, mas que são incapazes de suportar a presença de uma</p><p>criança doente (Winnicott, 1993).</p><p>Uma das atitudes mais comuns da família é superproteger a criança. Por</p><p>medo de perdê-la a família passa a tratá-la de forma diferente da qual vinha</p><p>sendo tratada até então. Há pais que não conseguem controlar a sua angústia</p><p>diante da possibilidade de recaída e a todo instante têm a necessidade de tocar</p><p>a criança, observá-la, mesmo enquanto ela dorme (Valle, 1997).</p><p>Por causa das atitudes dos pais, muitas vezes as crianças se transfor-</p><p>mam em pequenas tiranas, cheias de manias e vontades, egoístas e ciumentas</p><p>(Valle, 1997). Esses tipos de atitudes podem afetar a relação entre os membros</p><p>da família, principalmente quando há irmãos envolvidos (Valle, 1997). Nesta</p><p>situação, quase sempre, os irmãos se tornam agressivos com os pais, sentem</p><p>raiva, ciúmes, revoltando-se com a proteção despendida ao filho doente.</p><p>As atitudes dos membros das famílias dependem muitas vezes do modo</p><p>como eles percebem o câncer, encaram-no, e reagem à doença. Em outras</p><p>palavras, dependem das estratégias de enfrentamento que cada membro fami-</p><p>liar dispõe para lidar com o câncer.</p><p>O coping é entendido como um conjunto de estratégias de enfrentamento</p><p>que as pessoas utilizam para a adaptação em situações adversas (Antonia-</p><p>zzi, 1998). É dividido em duas categorias funcionais: coping focalizado no</p><p>problema e coping focalizado na emoção (Folkman & Lazarus, 1980).</p><p>O coping focalizado na emoção é definido como um esforço para regular</p><p>o estado emocional que é associado ao estresse. A função desta estratégia é de</p><p>reduzir a sensação física desagradável que um estado de estresse proporciona</p><p>(Folkman & Lazarus, 1980). O coping relacionado ao problema consiste no</p><p>esforço para atuar na situação que deu origem ao estresse, tentando mudá-la</p><p>(Folkman & Lazarus, 1980).</p><p>Na perspectiva dos autores, coping é definido como um conjunto de esfor-</p><p>ços, cognitivos e comportamentais, utilizados pelos indivíduos com o objetivo de</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 167</p><p>lidar com as demandas específicas, internas ou externas, que surgem em situação</p><p>de stress e são avaliadas como sobrecarregando ou excedendo seus recursos</p><p>pessoais (Folkman & Lazarus, 1980). Tal definição implica que as estratégias de</p><p>coping são ações deliberadas que podem ser aprendidas, usadas e descartadas.</p><p>Os quatro conceitos que englobam o coping são (Folkman & Laza-</p><p>rus, 1980):</p><p>(a) coping é um processo ou uma interação que se dá entre o indivíduo</p><p>e o meio; (b) sua função é administrar a situação estressora, ao invés de con-</p><p>trolá-la e dominá-la; (c) os processos de coping pressupõem a noção de ava-</p><p>liação, ou seja, como o fenômeno é percebido, interpretado e cognitivamente</p><p>representado na mente do indivíduo; (d) o processo de coping se constitui em</p><p>uma mobilização de esforço, através do qual os indivíduos irão empreender</p><p>esforços cognitivos e comportamentais para administrar as demandas internas</p><p>ou externas que surgem da sua interação com o ambiente.</p><p>A disponibilidade de recursos afeta a avaliação do evento ou situação</p><p>estressante, e determina que estratégias de enfrentamento a pessoa vai usar</p><p>(Antoniazzi, 1998). Segundo o autor, as pessoas utilizam recursos pessoais e</p><p>sócio ecológicos para lidar com o evento estressor.</p><p>Os recursos pessoais de coping são constituídos por variáveis físicas e</p><p>psicológicas que incluem a saúde física, moral, crenças ideológicas, expe-</p><p>riências previas de coping e inteligência, e outras características pessoais</p><p>(Antoniazzi, 1998).</p><p>Quanto aos recursos sócio ecológicos, estes são encontrados no ambiente</p><p>do indivíduo ou em seu contexto social, incluem relacionamento conjugal,</p><p>características familiares, redes sociais, recursos funcionais ou práticos e</p><p>circunstâncias econômicas (Antoniazzi, 1998).</p><p>Recentemente, foi apresentada uma terceira estratégia de coping focali-</p><p>zada nas relações interpessoais, na qual o sujeito busca apoio nas pessoas do</p><p>seu círculo social para a resolução da situação estressante (Antoniazzi, 1998).</p><p>No caso específico da presente pesquisa, toda a gama de situações enfren-</p><p>tadas pela família, e a mãe, da criança com câncer implica necessariamente</p><p>em novas adaptações por parte de todos os membros. Este processo adap-</p><p>tativo gera uma grande quantidade de estresse e por consequência implica</p><p>em estratégias de enfrentamento que podem repercutir de modo positivo ou</p><p>negativo sobre o tratamento da criança. Uma vez que a mãe, geralmente, é a</p><p>principal cuidadora e acompanhante da criança em situação de tratamento e/</p><p>ou internação hospitalar suas estratégias de enfrentamento (coping) podem</p><p>influenciar significativamente neste processo.</p><p>A internação de uma criança em um hospital normalmente traz</p><p>con-</p><p>sigo um de seus pais, que altera sua rotina diária para acompanhar o filho</p><p>(Quaglia & Beier, 1997). Segundo as autoras, como consequência, além de</p><p>168</p><p>todos os sentimentos pertinentes ao momento, insegurança, medo da morte,</p><p>desconfiança, surgem problemas de ordem familiar estrutural (Quaglia &</p><p>Beier, 1997). Os demais filhos são deixados aos cuidados de terceiros, quando</p><p>não deixados a sós; é a empresa empregadora que não aceita o atestado do</p><p>filho doente como justificativa para as faltas ao trabalho; há a falta de recursos</p><p>financeiros para a alimentação ou transporte; é o hospital que impõe regras e</p><p>rotinas que divergem do cotidiano familiar, utilizando termos e procedimen-</p><p>tos desconhecidos.</p><p>A reação da criança frente à doença depende muito da forma de reação</p><p>de seus pais, por isso, cabe ressaltar a importância da participação deles</p><p>na hospitalização (Ortiz, 1997). Os vínculos amorosos e a valorização mais</p><p>efetiva dos pais junto aos seus filhos facilitam a permanência da criança no</p><p>hospital (Ortiz, 1997).</p><p>A permanência dos pais ou responsáveis no hospital não deixa que a</p><p>criança ou adolescente sintam a perda do ambiente amoroso e dos objetos</p><p>mais queridos, como também tendem a minimizar eventuais experiências</p><p>incômodas e dolorosas da hospitalização (Carvalho & Ceccin).</p><p>Parte 2</p><p>O presente subcapítulo tem por objetivo apresentar os dados coletados,</p><p>analisá-los e discuti-los simultaneamente levando em conta o processo de</p><p>interação entre mãe e filho com câncer em situação de tratamento hospitalar.</p><p>Nesta sessão de discussão dos resultados, busquei analisar as estratégias de</p><p>enfrentamento da mãe da criança com câncer frente às alterações da vida</p><p>cotidiana; bem como, identificar as questões da vida materna cotidiana que</p><p>se alteraram com a sua permanência no hospital para o acompanhamento do</p><p>seu filho doente.</p><p>Após a coleta de dados, os mesmos foram analisados conforme a metodo-</p><p>logia qualitativa de pesquisa, por meio do processo de categorização baseado</p><p>na análise do discurso. Os dados foram divididos em três categorias compostas</p><p>de subcategorias apresentadas a seguir:</p><p>A. Categoria: Relação mãe-filho</p><p>A. 1 Subcategoria: Diagnóstico e tratamento médicos;</p><p>A. 2 Subcategoria: Atitudes da mãe em relação à vida cotidiana da</p><p>criança.</p><p>B. Categoria: Estratégias de coping</p><p>B. 1 Subcategoria: Não responsabilização pela doença;</p><p>B. 2 Subcategoria: Esquiva;</p><p>B. 3 Subcategoria: Variáveis da personalidade;</p><p>B. 4 Subcategoria: Religiosidade;</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 169</p><p>B. 5 Subcategoria: Afastamento psicológico.</p><p>C Categoria: Mudanças nas questões cotidianas</p><p>De acordo com a Resolução número 196/96 sobre pesquisa envolvendo</p><p>seres humanos, os participantes das mesmas têm a garantia de sigilo que lhes</p><p>assegura a privacidade quanto aos dados confidenciais envolvidos. Para tanto,</p><p>para salvaguardar as identidades da participante e de seu filho foram criados</p><p>os pseudônimos Juliana e Leonardo.</p><p>Conforme o discurso de Juliana, sua gravidez foi normal. Do mesmo</p><p>modo, o desenvolvimento de Leonardo ocorreu normalmente, sem episó-</p><p>dios merecedores de maiores esclarecimentos. Fora o diagnóstico de câncer</p><p>ocorrido quando Leonardo tinha dois anos e dez meses de idade, nenhum</p><p>comprometimento físico foi evidenciado.</p><p>Juliana tinha 35 anos, solteira, mãe de cinco filhos, residente em Brusque,</p><p>casa própria conseguida com a ajuda de familiares, possuía o Ensino Fun-</p><p>damental completo, frequentava as igrejas católica e evangélica, e prestava</p><p>serviços de doméstica. Foi casada com o pai biológico de Leonardo por seis</p><p>anos. A separação entre eles ocorreu porque o marido era toxicômano e alcoo-</p><p>lista. Atualmente mantém um outro relacionamento, sendo que seu namorado</p><p>cumpre o papel de pai do menino. Em relação a seus familiares, não evidencia</p><p>os motivos, mas deixa claro que não se relaciona com eles.</p><p>A. Categoria: Relação mãe-filho</p><p>A.1 Subcategoria: Diagnóstico e tratamento médicos</p><p>Juliana estava ausente quando seu filho passou a apresentar os primeiros</p><p>sintomas da doença:</p><p>“O pai biológico do Leonardo que percebeu. Eu estava viajando, em São</p><p>Paulo, e o Leonardo estava com ele. O Leonardo ficou Dois dias sem fazer</p><p>xixi, um dia sem fazer coco. A barriga dele ficou enorme, bem grande. Ele</p><p>tinha 39o, 40o graus de febre. Ele começou a puxar a perna, daí, não andou</p><p>mais” (Juliana).</p><p>Ao saber do diagnóstico de uma doença grave a família passa pelos</p><p>mesmos estágios que o paciente, e a forma de enfrentamento vai depender da</p><p>estrutura de cada um e da relação entre eles. É frequente surgir perda em vida,</p><p>luto antecipado, ambivalência de sentimentos, impotência, culpa e tentativa</p><p>de reparação (Amaral, 1994).</p><p>A mãe esperou três dias para ver se a febre passava. Durante este tempo,</p><p>cuidou dele, sem saber do que se tratava. Após um encaminhamento do pedia-</p><p>tra, ela percebeu o que era.</p><p>“[...] dei remédio para a febre, fiz chá para ver se o xixi descia. Não des-</p><p>ceu. Então, eu esperei até o dia três de janeiro, procurei o hospital. O pediatra</p><p>fez Raios-X e ultrassom. Com o ultrassom apareceu uma massa tumoral. O</p><p>170</p><p>médico disse que era um tumor, só que ele não sabia de que tipo. Daí me</p><p>mandaram para cá. Depois me chamaram para ver o resultado e deu que era</p><p>Tumor de Wilms” (Juliana).</p><p>Desde o diagnóstico os pais, de modo geral, buscam informações sobre</p><p>o câncer e o seu tratamento, como se a posse de tais conhecimentos pudesse</p><p>ajudá-los a partilhar o mundo da doença com o filho, de adentrar esse mundo,</p><p>no sentido de que este se torne familiar para eles, ajudando-os assim, a superar</p><p>suas inquietações e conviver melhor com a criança (Valle, 1997). Desejam,</p><p>também que essas informações lhe tragam alguma esperança que possa aliviar</p><p>sua dor (Valle, 1997).</p><p>Dentre as neoplasias malignas localizadas primariamente no rim de crian-</p><p>ças, o tumor de Wilms destaca-se como o mais frequente e praticamente o</p><p>único crescimento tumoral maligno do rim na infância (Chaves, 1978). Tal</p><p>tumor afeta ambos os sexos e rins, entretanto, em apenas 5% dos casos existe</p><p>tumor bilateral (Chaves, 1978).</p><p>O tumor de Wilms, conhecido como nefroblastoma, pode estar associado</p><p>a certas anomalias congênitas, especificamente hemi-hipertrofia congênita</p><p>(membros de um lado do corpo maiores que do outro), aniridia congênita</p><p>(ausência congênita de íris), síndrome de Beckwiht, anomalias do trato geni-</p><p>to-urinário (Chaves, 1978). Conforme o autor, inicialmente, o tumor se apre-</p><p>senta como uma massa abdominal assintomática, frequentemente presente por</p><p>algum tempo e primeiramente detectada pelos próprios pais (Chaves, 1978).</p><p>Os diferentes procedimentos e tratamentos utilizados foram descritos</p><p>minuciosamente pela mãe:</p><p>“Dia 12 de fevereiro de 2001, eles começaram com a quimio pequena.</p><p>Era uma injeção de Oncovin, uma vez por semana, de 15 em 15 dias, por Dois</p><p>meses. Daí, O Leonardo fez os exames tudo de novo, e deu que o tumor havia</p><p>aumentado. Era de 8,5cm X 5cm. Ficou 13cm X 7cm. O rim dele era de 9 cm.</p><p>Eles mudaram a quimio. Era a quimio pesada. Eles chamam de círculo: quatro</p><p>vezes de cinco dias. Novamente, ele fez todos os exames, e deu que a quimio</p><p>diminuiu 30% do tumor. Eu já tinha visto que não tinha diminuído nada. Daí,</p><p>eles resolveram operar. Operou e agora, um ano de quimio”[...] (Juliana).</p><p>O tumor de Wilms é uma neoplasia que apresenta uma grande proclivi-</p><p>dade para o crescimento e para metastatizar em curto prazo (Chaves, 1978).</p><p>Tais tumores podem ser classificados em: T (tumor primário - intra-renal),</p><p>T1 (tumor unilateral - 80 cm2 do rim – além da cápsula), T3 (tumor unilateral roto), e T4</p><p>(tumores bilaterais) (Chaves, 1978).</p><p>O tratamento quimioterápico pode ser empregado antes dos procedimen-</p><p>tos cirúrgicos ou radioterápicos. Após as cirurgias, o tratamento é utilizado</p><p>para prevenir recidiva ou metástases (Chaves, 1978). Este tratamento pode</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA:</p><p>investigação do</p><p>perfil psíquico geralmente não é incluída nos procedimentos clínicos dos</p><p>pacientes com câncer, ou fica limitada à avaliação da qualidade de vida do</p><p>paciente. No contexto hospitalar, a identificação de aspectos psicológicos e</p><p>da personalidade do paciente neoplásico pode contribuir para o entendimento</p><p>sobre a resposta ao tratamento, apontando uma direção útil para melhor</p><p>24</p><p>orientação no processo de adesão ao tratamento. Além disso, também pos-</p><p>sibilita capacitar a equipe de saúde para a compreensão do funcionamento</p><p>emocional do paciente, com vistas a auxiliá-lo efetivamente, bem como</p><p>amplia as possibilidades de intervenção do psicólogo.</p><p>As Dimensões da Personalidade a partir do modelo dos Cinco</p><p>Grandes Fatores</p><p>Atualmente, há alguns modelos teóricos que buscam mapear as dimen-</p><p>sões da personalidade, dentre eles o modelo dos Cinco Grandes Fatores (CGF).</p><p>De acordo com Bertamoni (2013), o Modelo dos Cinco Grande Fatores da</p><p>Personalidade (CGF) é o modelo que tem gerado mais consenso no meio aca-</p><p>dêmico nas últimas décadas, apesar de se encontrarem algumas divergências</p><p>quanto às nomenclaturas que ele apresenta para as dimensões da personali-</p><p>dade. Esse modelo relaciona cada perfil a determinada combinação de traços</p><p>de personalidade, os quais foram definidos a partir de observações e análises</p><p>linguísticas e comportamentais de indivíduos de diversas culturas do mundo.</p><p>Nunes, Hutz e Nunes (2013) afirmam haver grande evidência da uni-</p><p>versalidade e aplicabilidade deste modelo em diversos contextos, elaborado</p><p>principalmente a partir das teorias de traço de personalidade, bem como das</p><p>teorias fatoriais, que colaboraram para a elaboração dos aspectos instrumen-</p><p>tais e metodológicos, permitindo que seus resultados sejam mais fidedig-</p><p>nos e valiosos, o que justificaria o crescente interesse por esse modelo na</p><p>comunidade científica. Também possibilita que a personalidade seja descrita</p><p>de maneira mais simples, elegante e econômica em relação a outros mode-</p><p>los fatoriais da personalidade, que são maiores e mais complexos. Silva e</p><p>Nakano (2011) apontam a existência de suficientes evidências da validade</p><p>da utilização do modelo dos CGF na população brasileira e afirmam que,</p><p>a partir da continuidade e do avanço dos estudos, será possível aprimorar</p><p>e ampliar os processos de avaliação da personalidade no Brasil, além de</p><p>justificar sua importância.</p><p>Assim, conforme o Modelo dos Cinco Grandes Fatores, são cinco os</p><p>fatores que abrangem todo o conjunto dos traços de personalidade: Neuroti-</p><p>cismo, Extroversão, Amabilidade, Abertura à experiência e Conscienciosidade.</p><p>Entende-se que este modelo dê conta de avaliar o perfil do sujeito, analisar como</p><p>os eventos estressores afetam cada tipo de perfil e como cada pessoa lida com os</p><p>processos de enfrentamento. Já é possível, também, relacionar comportamentos</p><p>e tipos de personalidade mais ligados à saúde física e mental (Bertamoni, 2013).</p><p>Em todas as diferentes abordagens já desenvolvidas a partir do modelo</p><p>CGF, os traços de personalidade são considerados equivalentes, apesar de</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 25</p><p>haver alguma diferença em suas nomenclaturas. Ele tem sido apontado como</p><p>um modelo capaz de descrever a personalidade de maneira simples e econô-</p><p>mica, com boa aceitação por apresentar consideráveis indicadores de univer-</p><p>salidade e aplicabilidade em contextos diversos. Em contextos de diagnósticos</p><p>clínicos, geram informações úteis para a identificação de demandas de tra-</p><p>tamentos ou para a identificação de sintomas significativos dos transtornos</p><p>psicológicos ou de personalidade (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).</p><p>A concepção de universalidade é atribuída ao CGF, pois, conforme</p><p>McGrae e Costa (1997 apud Nunes; Hutz; Nunes, 2013), o modelo parece</p><p>tratar-se de maneira eficiente de um agrupamento de traços comuns, cultural-</p><p>mente bastante gerais. Entende-se que os traços de personalidade apresentados</p><p>neste modelo dão conta de representar o conjunto de características biológicas</p><p>da nossa espécie, ou as consequências psicológicas das vivências humanas</p><p>compartilhadas socialmente. Segundo os autores, esta compreensão se apro-</p><p>ximaria das ideias de Allport (1961), as quais apontam para a possibilidade</p><p>de se representar aspectos comuns da personalidade da maior parte dos seres</p><p>humanos que compartilham de uma mesma cultura, através de traços comuns.</p><p>Segundo os respectivos autores, esse posicionamento decorre da hipó-</p><p>tese levantada por Goldberg em 1982, de que as características individuais</p><p>que fazem diferença significativa nas interações sociais cotidianas aparecem</p><p>codificadas na linguagem. Assim, se uma característica ou traço de persona-</p><p>lidade gera comportamentos relevantes para um determinado grupo social, as</p><p>pessoas falarão sobre esses traços e, consequentemente, criarão vocabulário</p><p>suficiente para citá-las e descrevê-las.</p><p>Dentre as cinco escalas que utilizam o modelo dos CGF para avaliação</p><p>da personalidade no Brasil, aprovadas no Sistema de Avaliação dos Testes</p><p>Psicológicos (SATEPSI), do Conselho Federal de Psicologia, destaca-se a</p><p>Bateria Fatorial de Personalidade (Silva; Nakano, 2011). Esta escala é utili-</p><p>zada em contextos como de pesquisa, avaliações clínicas e psicodiagnóstico,</p><p>avaliações de triagem em instituições de saúde, avaliação neuropsicológica,</p><p>entre outros fins (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).</p><p>O Quadro 1 apresenta os cinco fatores avaliados pela Bateria Fatorial de</p><p>Personalidade, suas definições resumidas, e os subfatores a eles relacionados.</p><p>26</p><p>Quadro 1 – Fatores e subfatores avaliados pela Bateria Fatorial de Personalidade</p><p>Fator Definição Subfatores</p><p>Neuroticismo</p><p>Relacionado à vivência intensa do sofrimento psico-</p><p>lógico, instabilidade emocional e vulnerabilidade, com</p><p>pouca ênfase aos aspectos positivos dos fatos. Em</p><p>alto nível, é associado à ocorrência de sintomas de</p><p>depressão e ansiedade.</p><p>N1 – Vulnerabilidade</p><p>N2 – Instabilidade</p><p>emocional</p><p>N3 – Passividade / Falta</p><p>de energia</p><p>N4 – Depressão</p><p>Extroversão</p><p>Tendência a um volume alto de fala e à busca de con-</p><p>tato com pessoas. Relacionado a um senso de intimi-</p><p>dade maior que a média, com facilidade de comparti-</p><p>lhar informações particulares. Geralmente indica alto</p><p>grau de atividade e de externalização de preferências</p><p>e crenças. Pode haver certa dominância e liderança.</p><p>E1 – Comunicação</p><p>E2 – Altivez</p><p>E3 – Dinamismo</p><p>E4 – Interações sociais</p><p>Socialização</p><p>Tendência a desenvolver confiança nas pessoas,</p><p>através da fácil percepção do seu lado positivo e de</p><p>uma rara suspeita de suas intenções, aspecto impor-</p><p>tante que se associa à formação da identidade e à</p><p>capacidade de estabelecer intimidade com os demais.</p><p>Relaciona-se à lealdade e à franqueza, assim como</p><p>a um alto nível de altruísmo, à submissão e ao aten-</p><p>dimento das necessidades de outros que lutam mais</p><p>ativamente por seus interesses.</p><p>S1 – Amabilidade</p><p>S2 – Pró-sociabilidade</p><p>S3 – Confiança nas</p><p>pessoas</p><p>Realização</p><p>Envolve motivação para o sucesso, perseverança,</p><p>capacidade de planejamento de ações em função de</p><p>uma meta, bem como nível de organização e pon-</p><p>tualidade. Tendência a buscar formas de alcançar</p><p>seus objetivos, mesmo envolvendo algum sacrifício</p><p>ou conflito com algum desejo imediato. Relacionado</p><p>à ambição, esforço e bastante dedicação ao trabalho.</p><p>R1 – Competência</p><p>R2 – Ponderação /</p><p>prudência</p><p>R3 – Empenho /</p><p>comprometimento</p><p>Abertura</p><p>Refere-se aos comportamentos exploratórios e de</p><p>reconhecimento da importância de ter novas expe-</p><p>riências. Relacionado à curiosidade, imaginação, cria-</p><p>tividade, diversão com novas ideias e com valores não</p><p>convencionais. Experienciação de uma gama ampla</p><p>de emoções de maneira mais vívida do que pessoas</p><p>fechadas (baixas em Abertura).</p><p>A1 – Abertura a ideias</p><p>A2 – Liberalismo</p><p>A3 – Busca por novidades</p><p>Por ser desenvolvida no Brasil, a bateria levou em conta a fala brasi-</p><p>leira, nossa cultura, diversidades regionais e especificidades clínicas, o que</p><p>diferencia a BFP de outros instrumentos</p><p>reflexões e possibilidades de intervenção 171</p><p>levar a cura nos linfomas, leucemias, tumores de ovários e testículos, entre</p><p>outros. Naqueles casos em que a cura é impossível, a quimioterapia é utilizada</p><p>como paliativo (Chaves, 1978).</p><p>Para o tumor de Wilms, como tratamento, a quimioterapia é realizada</p><p>geralmente antes da cirurgia (Voute, 1991.) Após um período de quatro a oito</p><p>semanas, o tumor é ressecado e o estádio da doença é determinado. Decisões</p><p>sobre o uso de terapia adicional (quimioterapia ou radioterapia) dependem</p><p>do estádio (estádios três e quatro com linfonodos positivos precisam de</p><p>radioterapia) (Voute, 1991). A radioterapia é necessária quando há doença</p><p>residual (Voute, 1991).</p><p>No tumor de Wilms, a quimioterapia consiste, para todos os pacientes, em</p><p>uma combinação de vincristina e actinomicina D. O tratamento quimioterápico</p><p>pode ser de três meses para estádio um e um ano para a doença avançada.</p><p>Quando as drogas são administradas antes da cirurgia pode ocorrer a diminui-</p><p>ção do tumor, facilitando-a, reduzindo também a morbidade (Voute, 1991).</p><p>85% dos pacientes com tumor de Wilms podem ser curados. A ênfase do</p><p>tratamento é centrada na possibilidade de cura e na redução da morbidade.</p><p>O estadiamento da doença e a análise histológica são essenciais para reduzir</p><p>a necessidade de radioterapia e a duração da quimioterapia (Voute, 1991).</p><p>No começo do tratamento quimioterápico Juliana permanecia com Leo-</p><p>nardo no colo, por causa de seu choro excessivo.</p><p>“No começo, o Leonardo incomodava bastante. Gritava, chorava, ber-</p><p>rava, queria colo. Agora não. Agora ele não me incomoda mais, fica quietinho.</p><p>Já se acostumou. Antes eu andava direto com ele no colo, ele não me deixava</p><p>sossegada. Hoje em dia é fácil de lidar com ele. Quem não viu como ele era</p><p>antes, acha que agora não é fácil de lidar com ele” (Juliana).</p><p>Pelo que foi exposto por Juliana sua dedicação no tratamento de seu filho</p><p>foi condizente com as necessidades da criança, não havendo por sua parte um</p><p>comprometimento extremo.</p><p>A. 2 Subcategoria: Atitudes da mãe em relação à vida cotidiana da criança</p><p>Leonardo não sofreu grandes alterações em sua vida depois do diagnós-</p><p>tico da doença. Percebo tal fato diante do relato de sua mãe:</p><p>“Antes e depois do câncer. A vida dele não modificou. Ele é a mesma pes-</p><p>soa. Ele come bem, brinca, pula, mexe em tudo. Ele sempre foi muito sapeca,</p><p>corre o dia inteiro. Aqui, todo mundo se admira. Eles dizem que eles nunca</p><p>viram uma criança tão forte. Desde que ele começou com a quimio, ele tem</p><p>ido para a escola normalmente. Ele nunca faltou porque deu alguma coisa. Ele</p><p>só falta, quando está aqui. Aí, as professoras já sabem porque ele está faltando.</p><p>Ele só ficou bem mal por uma semana. Ele não comeu nada” (Juliana).</p><p>Ainda, sobre o cotidiano do garoto, a mãe dele acrescentou:</p><p>172</p><p>“A rotina dele não se modificou com a doença. Ele acorda, toma banho e</p><p>vai para a aula. Eu vou buscar o Leonardo na hora do almoço. Ele chega em casa</p><p>e abre a geladeira, liga a TV. Ultimamente ele só assiste TV. É que faz pouco</p><p>tempo que a gente tem TV em casa. Ele sabe tudo sobre as novelas, assiste</p><p>Malhação, Coração de Estudante, Desejos de Mulher, até a Jade. Eu digo que</p><p>ele está por dentro de tudo. Ele não dorme mais à tarde. Ele vai para o serviço</p><p>comigo. Lá ele fica enchendo o saco dos padeiros, ele quer saber tudo” (Juliana).</p><p>Salienta-se que Leonardo leva uma vida adequada a sua idade. Além</p><p>disso, percebo também que Juliana o deixa levar a mesma vida que ele levava</p><p>antes de ter sido diagnosticado com câncer, o que não é muito comum aconte-</p><p>cer com crianças doentes, já que seus pais tentam protegê-las demasiadamente.</p><p>Uma das atitudes mais comuns por parte da família é a superproteção à</p><p>criança. Por medos de diversas ordens, sendo o maior deles o medo da morte,</p><p>a família passa a tratar a criança doente de forma diferente da qual vinha sendo</p><p>até então: não permite brincadeiras que envolvam maior atividade física, não</p><p>a deixa sair sozinha, ir brincar com outros amiguinhos, ir à escola, mesmo</p><p>estando em condições (Valle, 1997).</p><p>Percebo-se que o relacionamento de Leonardo e Juliana é baseado numa</p><p>relação afetuosa. Juliana demonstra-se rígida com ele, apesar da doença. Na</p><p>idade que ele se encontra, o controle e as regras são necessários porque tende</p><p>a passar rapidamente dos limites. O diagnóstico de câncer não colaborou para</p><p>que Juliana o superprotegesse, nem o deixasse livre demasiadamente.</p><p>“[...] Hoje ele ainda corre e grita: – Oh! Mãe. Oh! Mãe. É bom saber</p><p>que ele gosta da gente, que ele sente falta da gente [...] Eu te falei que ele é</p><p>bastante beijoqueiro, vive me beijando e me agarrando” (Juliana).</p><p>“[...] Quando eu brigo com ele, quando a coisa está feia para o lado</p><p>dele, ele me enche de beijos. Ele fala: – Oh! Mãezinha, mãezinha. Eu sempre</p><p>tenho que falar com a voz alta. Tem que falar brava com ele senão eu não</p><p>dou conta” (Juliana).</p><p>Leonardo é uma criança que quando contrariada, manifesta-se com pro-</p><p>vocações físicas e verbais:</p><p>“[...] Ele quer me bater. Ele me diz: – Eu não falo mais contigo. Eu não</p><p>gosto mais de ti” (Juliana).</p><p>As crianças consideradas agressivas evidenciam os seguintes tipos de</p><p>comportamento agressivo: elas são más para com os outros, atacam fisica-</p><p>mente as pessoas, envolvem-se em brigas, destroem seus pertences, destroem</p><p>pertences alheios e ameaçam machucar as pessoas. Esses tipos de comporta-</p><p>mentos agressivos são semelhantes aqueles manifestados por Leonardo, de</p><p>acordo com o relato de sua mãe (Bee, 1997).</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 173</p><p>B. Categoria: Estratégias de coping</p><p>B. 1 Subcategoria: Não responsabilização pela doença</p><p>Nas famílias as acusações mútuas entre os pais pela responsabilidade</p><p>da doença, a busca de explicação para essa realidade, tentando atribuir uma</p><p>causa ao câncer, procurando nas suas reminiscências que remontam à vida</p><p>uterina dos filhos algo que leve à compreensão do aparecimento do mesmo,</p><p>são bastante comuns (Valle, 1997). Contudo, percebo que a mãe de Leonardo</p><p>também recorreu a vida uterina, porém, ela se exime da culpa do câncer por</p><p>ter feito os exames pré-natais necessários para acompanhar o desenvolvimento</p><p>do feto, além de ter amamentado Leonardo por um ano e Dois meses. Noto</p><p>que Juliana aponta o acompanhamento pré-natal, o exame de ultrassom e a</p><p>amamentação como fortes indicativos de suas ações voltadas para uma gra-</p><p>videz saudável, e, portanto, para um bebê saudável também.</p><p>“Eu sempre me cuidei na gravidez, fiz pré-natal, fiz ultrassom. Ama-</p><p>mentei até um ano e Dois meses. Tem gente que diz que é emocional. Tudo é</p><p>possível. Eles acham que o Leonardo não nasceu com o tumor, eles não têm</p><p>certeza de nada” (Juliana).</p><p>A estratégia de enfrentamento – não responsabilização pela doença –</p><p>aponta uma das formas que Juliana utiliza para lidar com o câncer de Leonardo.</p><p>O processo de enfrentamento é dinâmico e particular a cada etapa</p><p>da doença.</p><p>O enfrentamento é um conjunto de estratégias para lidar com uma ameaça</p><p>iminente (Folkman & Lazarus, 1980). Outra concepção de enfrentamento se</p><p>refere como um comportamento instrumental que demonstra a capacidade da</p><p>pessoa para resolver problemas decorrentes da exigência e dos objetivos de sua</p><p>vida, envolvendo, portanto, o uso de habilidades diversas, técnicas e conheci-</p><p>mentos que a pessoa vem adquirindo ao longo de sua vida (Gimenez, 1997).</p><p>B. 2 Subcategoria: Esquiva</p><p>Em relação ao diagnóstico de câncer, Juliana evidencia sua posição:</p><p>“A gente custa a acreditar. Fiquei estranha. Não pensei que era uma coisa</p><p>tão grave. Só depois que vim para cá com ele, fazer quimioterapia, que eu vi</p><p>que era tão grave” (Juliana).</p><p>“Não tinha muita visão. A gente acha que não vai acontecer com a gente,</p><p>nem com a família da gente. Nunca procurei saber nada” (Juliana).</p><p>Ressalto que Juliana utilizou a negação frente ao impacto causado pelo</p><p>diagnóstico de câncer de seu filho como estratégia de enfrentamento.</p><p>O impacto do diagnóstico</p><p>de avaliação da personalidade com</p><p>base nos CGF, desenvolvidos para aplicação em outros países.</p><p>Considerando a necessidade de investimentos nas investigações clínicas</p><p>que colaborem na condução do acompanhamento psicológico de pacientes</p><p>em instituições de saúde, este estudo tem como objetivo geral avaliar a per-</p><p>sonalidade de pacientes oncológicos adultos, a partir da Bateria Fatorial de</p><p>Personalidade. Os objetivos específicos consistem em verificar a dimensio-</p><p>nalidade dos fatores neuroticismo, extroversão, socialização, realização e</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 27</p><p>abertura, bem como suas facetas; e identificar a existência de traços comuns</p><p>de personalidade e suas facetas, nos participantes investigados.</p><p>Metodologia</p><p>Esta pesquisa caracterizou-se como um estudo exploratório-descritivo, de</p><p>corte transversal, com abordagem quantitativa. Para a composição da amostra,</p><p>foi utilizada a técnica de amostragem não-probabilística, por conveniência.</p><p>A amostra foi constituída por sete pacientes em tratamento em um ambulató-</p><p>rio oncológico de um hospital particular localizado no Vale do Itajaí-SC, no qual,</p><p>à época da pesquisa, 55 pacientes encontravam-se em tratamento ou acompanha-</p><p>mento oncológico. Dos sete pacientes (12,72% da referida população), quatro</p><p>apresentavam diagnóstico de câncer em algum órgão do aparelho digestivo, e</p><p>três o diagnóstico de câncer de mama, sendo cinco mulheres e dois homens.</p><p>Todos os participantes, à época da etapa de coleta de dados desta pes-</p><p>quisa (setembro e outubro/2017), estavam em tratamento quimioterápico no</p><p>referido Ambulatório, e atenderam aos seguintes critérios de inclusão, a saber:</p><p>a) ter recebido diagnóstico oncológico há, no mínimo, três meses; b) estar em</p><p>tratamento de infusão quimioterápica, ou em acompanhamento de evolução</p><p>da doença; c) ser maior de idade; d) demonstrar interesse em participar da</p><p>pesquisa; e) ter sido indicado pela psicóloga do setor oncológico. A indica-</p><p>ção da psicóloga foi pautada por seu entendimento de que a participação do</p><p>paciente nesta pesquisa não interferiria negativamente em seu tratamento.</p><p>Estabeleceu-se o tempo mínimo de três meses entre ter recebido o diagnós-</p><p>tico e o convite de participação nesta pesquisa, para que o impacto da notícia</p><p>não interferisse de maneira intensa nos resultados. Como critérios de exclusão,</p><p>foram estabelecidos os impedimentos de ordem física que impossibilitariam os</p><p>pacientes de preencherem o instrumento de maneira autônoma, como proble-</p><p>mas de visão, tremores, dores ou hipotonia em braços ou mãos. Ainda, visto que</p><p>o teste solicita recuperação e avaliação de informações de vida, foram excluídos</p><p>da pesquisa os pacientes diagnosticados com alguma doença que interferisse</p><p>em seu funcionamento cognitivo, sobretudo em sua memória ou capacidade</p><p>de análise, como Parkinson ou Alzheimer, ou que estivessem fazendo uso de</p><p>medicamentos que preveem diminuição ou alteração de memória.</p><p>Instrumentos de Coleta de Dados</p><p>Os instrumentos usados para a coleta de dados, para cada participante,</p><p>foram uma ficha de dados sociodemográficos e clínicos e um formulário</p><p>da Bateria Fatorial de Personalidade (BFP). A BFP é um instrumento</p><p>psicológico que avalia a personalidade por meio do modelo dos Cinco</p><p>28</p><p>Grandes Fatores (CGF), em que, através de uma escala likert de 1 a 7, o</p><p>participante avalia o quão bem o descreve cada uma das 126 frases apresen-</p><p>tadas, sendo que 1 refere-se a “descreve-me muito mal” e 7 a “descreve-me</p><p>muito bem”. Cada item avaliado gera uma determinada pontuação para</p><p>um dos subfatores, os quais posteriormente compõem a avaliação de cada</p><p>uma das dimensões de análise: Neuroticismo, Extroversão, Socialização,</p><p>Realização e Abertura (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).</p><p>Procedimentos para a Coleta dos Dados e Aspectos Éticos</p><p>Todos os participantes, abordados e convidados pessoalmente, con-</p><p>cordaram em participar da pesquisa de maneira voluntária e assinaram o</p><p>“Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, conforme o que estabele-</p><p>cem as Resoluções CNS nº 466/2012 (BRASIL, 2013) e CNS nº 510/2016</p><p>(BRASIL, 2016), a partir do qual foram explicados os objetivos e proce-</p><p>dimentos da pesquisa.</p><p>Os participantes preencheram a avaliação individualmente, e o local</p><p>de aplicação do instrumento variou conforme a situação em que se encon-</p><p>travam: no ambulatório, durante o tratamento quimioterápico (n=3), em um</p><p>consultório médico, após a consulta médica de acompanhamento (n=2),</p><p>no leito hospitalar, durante internação (n=2).</p><p>A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade do</p><p>Vale do Itajaí, sob o Parecer Consubstanciado nº 2.164.415. A permissão</p><p>da Instituição para o desenvolvimento da pesquisa foi expressa e forma-</p><p>lizada mediante a assinatura do “Termo de Anuência da Instituição para</p><p>a Coleta de Dados”.</p><p>Procedimentos para a Análise dos Dados</p><p>Os dados foram analisados a partir do levantamento dos escores brutos de</p><p>cada fator e subfator da BFP, que se deu em conformidade com as instruções</p><p>do manual técnico do instrumento. Cada um dos escores brutos calculados</p><p>(fatores e subfatores) foram convertidos em escores percentílicos, mediante</p><p>o uso de tabelas de referência disponibilizadas no manual. Nesta pesquisa,</p><p>foram usadas as tabelas que comparam os resultados do indivíduo analisado</p><p>com os resultados de um grupo de pessoas do mesmo sexo. A partir disso,</p><p>cada escore percentílico foi classificado de acordo com as faixas de classifi-</p><p>cação dos percentis fornecida pelo manual, e que relacionam os escores dos</p><p>participantes com a frequência de respostas semelhantes nos grupos de refe-</p><p>rência. Assim, um valor percentílico de 75, por exemplo, indica que o escore</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 29</p><p>do participante é superior a 75% das pessoas do grupo de referência naquele</p><p>fator ou subfator, o que é classificado como um índice Alto.</p><p>A classificação dos percentis é definida pela seguinte escala: Muito Baixo</p><p>(MB) = até 14 pontos percentílicos; Baixo (B) = 15 a 29 pontos; Médio (M)</p><p>= 30 a 70 pontos; Alto (A) = 71 a 85 pontos; e Muito Alto (MA) = escore</p><p>maior que 85 pontos percentílicos.</p><p>Os dados advindos da ficha de dados sociodemográficos e clínicos, bem</p><p>como os dados da BFP foram sistematizados em tabelas, permitindo melhor</p><p>visualização e compreensão dos dados.</p><p>Resultados</p><p>Os resultados apresentam inicialmente os dados sociodemográficos da</p><p>amostra. Posteriormente são apresentados os dados relacionados à condição</p><p>de saúde dos participantes, como tipo de neoplasia, tempo de diagnóstico,</p><p>tratamento medicamentoso, percepção do estado de saúde, sentimento no</p><p>último mês, outros problemas de saúde relatados, demais condições psicos-</p><p>sociais e emocionais relatadas. Por fim, serão apresentados os dados relativos</p><p>aos aspectos da personalidade dos participantes.</p><p>A Tabela 1 apresenta os dados sociodemográficos, onde é possível</p><p>evidenciar que, dos 7 participantes que compuseram a amostra, houve</p><p>predomínio da idade acima de 50 anos (4) e do sexo feminino (5). Dos 7</p><p>participantes, 5 eram casados e a maioria possuia ensino médio (6), sendo</p><p>que 3 cursaram também o Ensino Superior. Todos os participantes residem</p><p>no Vale do Itajaí.</p><p>Tabela 1 – Caracterização dos participantes da pesquisa</p><p>Participante Idade Sexo Estado Civil Escolaridade Diagnóstico</p><p>de câncer</p><p>P1 81 anos Feminino Viúva Superior completo Intestino</p><p>P2 62 anos Masculino Casado Ensino Médio</p><p>completo</p><p>Cólon</p><p>P3 41 anos Feminino Casada Ensino Médio</p><p>incompleto</p><p>Reto</p><p>P4 38 anos Masculino Casado Ensino Médio</p><p>completo</p><p>Pâncreas</p><p>P5 57 anos Feminino Casada Superior completo Mama</p><p>P6 72 anos Feminino Viúva Ensino Médio</p><p>completo</p><p>Mama</p><p>P7 28 anos Feminino Casada Superior completo Mama</p><p>Fonte: Dados referentes à amostra coletada.</p><p>30</p><p>Dos sete participantes, quatro possuem diagnóstico de câncer do apa-</p><p>relho digestivo (pâncreas, intestino, reto, cólon) e três de câncer de mama.</p><p>A revelação diagnóstica ocorreu, na sua maioria,</p><p>há menos de um ano (5).</p><p>Todos os participantes foram submetidos à cirurgia e à quimioterapia, e um</p><p>destes também estava em tratamento de radioterapia.</p><p>Em relação a outros problemas de saúde, dois participantes não relataram</p><p>outro problema, dois relataram diabetes e hipertensão e os demais referiram</p><p>artrite ou reumatismo, problemas de pele, hérnia de disco, problema crô-</p><p>nico de pé, sobrepeso, tromboembolia pulmonar, bronquite, problema renal,</p><p>problema cardíaco e asma. No que se refere às condições psicossociais e</p><p>emocionais, destacaram-se a ansiedade (6), sendo um caracterizado como</p><p>síndrome do pânico e dificuldades relacionadas ao sono (3). Também foram</p><p>relatados irritabilidade (2), lapsos de memória (2), estresse, hiperatividade,</p><p>humor deprimido, ideação suicida pregressa, problemas de relacionamento</p><p>com o cônjuge e problemas de relacionamento com familiares.</p><p>Apesar de seus contextos, a percepção sobre o próprio estado de saúde</p><p>é referida como muito boa por 5 participantes; nem ruim, nem boa para 1</p><p>participante; e ruim para o outro participante. Quando questionados acerca dos</p><p>sentimentos vivenciados no último mês, os positivos foram os mais referidos:</p><p>confiança (7), felicidade (6), satisfação (6), otimismo (5), disposição (5) e</p><p>força (4). Os sentimentos negativos foram mencionados na seguinte propor-</p><p>ção: ansiedade (6), preocupação (4), cansaço (4), inquietude (3), irritação (2),</p><p>impaciência (1) e revolta (1).</p><p>Em relação à avaliação da personalidade, os resultados da Bateria Fatorial</p><p>de Personalidade são apresentados na Tabela 2. Mais da metade dos partici-</p><p>pantes avaliados (n = 4) apresentou escores classificados como Alto ou Muito</p><p>Alto nos fatores Extroversão, Socialização e Realização. Em relação ao fator</p><p>Neuroticismo, a maioria apresentou escore médio (n = 4), e no fator Abertura,</p><p>evidenciou-se variação nos escores.</p><p>As facetas com maior escore no fator Socialização foram Pró-sociabili-</p><p>dade (S2) e Confiança nas pessoas (S3). O fator Socialização está relacionado à</p><p>confiança nas pessoas, lealdade, franqueza, alto nível de altruísmo, submissão</p><p>e atendimento às necessidades de outros. Os altos escores em Pró-sociabilidade</p><p>(S2) (> 71% para 6 participantes; > 85% para 4 participantes) indica uma</p><p>tendência a evitar situações de risco, transgressões a leis ou regras sociais,</p><p>e pode revelar uma postura respeitosa, não-opositora e de submissão aos</p><p>demais. Na faceta Confiança nas pessoas (S3), o escore foi maior que 71%</p><p>para 4 participantes, revelando uma propensão a acreditar que os outros são</p><p>honestos e bem-intencionados. Esta tendência pode estar relacionada a uma</p><p>postura ingênua perante os outros, bem como a colocar-se em situações nas</p><p>quais facilmente pode ser prejudicado.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 31</p><p>Tabela 2 – Classificação dos percentis obtidos a partir</p><p>dos escores da BFP, por participante</p><p>P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7</p><p>N1. Vulnerabilidade B M MB A MB M MA</p><p>N2. Instabilidade M M MB M MB B M</p><p>N3. Passividade MB A M M M M B</p><p>N4. Depressão M MB / B MB A A M M</p><p>Neuroticismo M M MB A B M M</p><p>E1. Nível de comunicação MB A M M MA M MB</p><p>E2. Altivez MB A A MA A MB M</p><p>E3. Dinamismo – assertividade MB / B A MA A MA M B</p><p>E4. Interações sociais MB A MA A MA M MB</p><p>Extroversão MB MA MA MA MA B MB</p><p>S1. Amabilidade MB MA MA M M MA M</p><p>S2. Pró-sociabilidade MA A MA A M M / A MA</p><p>S3. Confiança nas pessoas M MA A A M A B</p><p>Socialização M MA MA A M MA M</p><p>R1. Competência MB MA M M MA M A</p><p>R2. Ponderação M MA M M A M M</p><p>R3. Empenho B MA M MA A MB MA</p><p>Realização B MA M A MA B A</p><p>A1. Abertura a ideias MB M A MB M A MB</p><p>A2. Liberalismo B M M M MA MB M</p><p>A3. Busca por novidades M M MA M MA MA MB</p><p>Abertura MB A MA B MA M MB</p><p>O fator Realização (> 71%, para 4 participantes) refere-se à motivação</p><p>para o sucesso, perseverança, planejamento em função de uma meta, orga-</p><p>nização e pontualidade, ambição, esforço e alta dedicação ao trabalho. O</p><p>alto escore na faceta Empenho (R3 > 85% para 3 participantes) revela uma</p><p>tendência ao detalhismo, assim como a um alto nível de exigência pessoal na</p><p>qualidade do que realiza. Geralmente, pessoas com altos escores nesse subfator</p><p>são perfeccionistas, dedicam-se bastante às atividades a que se propõem e</p><p>buscam um reconhecimento de seu esforço.</p><p>No fator Neuroticismo, a maioria dos participantes (4) apresentou</p><p>escores médios (entre 30% e 70%), o que indica que estes não apresentam</p><p>tendência a vivenciar intensamente o sofrimento psicológico. Também apre-</p><p>sentam estabilidade emocional, dando maior ênfase aos aspectos positivos</p><p>dos fatos, com tendência a retornar rapidamente a seu estado normal após</p><p>uma elevação emocional.</p><p>32</p><p>Discussão</p><p>A maioria dos participantes desta pesquisa apresentou altos escores nos</p><p>fatores de personalidade Extroversão, Socialização e Realização; escores</p><p>médios no fator Neuroticismo; e no fator Abertura os escores foram variados.</p><p>A respeito dos fatores Extroversão e Neuroticismo, os resultados diver-</p><p>gem de pesquisas semelhantes em outros países, também baseadas na teoria</p><p>dos Cinco Grandes Fatores, os quais apontam para níveis altos no fator</p><p>Neuroticismo e baixos em Extroversão em pacientes oncológicos. Em pes-</p><p>quisa conduzida na Espanha, Cardenal et al. (2012) investigaram aspectos</p><p>da personalidade, emoções e estratégias de enfrentamento de 131 pacientes</p><p>oncológicos, e referem que, em relação à personalidade, o grupo de pacien-</p><p>tes com câncer apresentou níveis mais altos de Neuroticismo e mais baixos</p><p>em Extroversão, Agradabilidade e Conscienciosidade que o grupo controle.</p><p>Os pesquisadores também referem não terem sido encontradas diferenças</p><p>significativas em níveis de depressão. No Irã, Hamzeh, Beyrami e Hashemi</p><p>(2011), através de uma comparação dos traços de personalidade, experiencia-</p><p>ção de emoções negativas e estilos de enfrentamento de mulheres saudáveis</p><p>com os mesmos itens em mulheres com câncer, encontraram evidências de</p><p>uma maior experienciação de emoções negativas (neuroticismo), assim como</p><p>baixos escores de extroversão, no grupo de mulheres com câncer.</p><p>No Brasil, os estudos avaliados evidenciam uma tendência oposta,</p><p>indicando que estes podem estar relacionados às influências do contexto</p><p>cultural na personalidade. Peres e Santos (2009), em uma revisão sistemá-</p><p>tica da literatura acerca do papel da personalidade na evolução da condição</p><p>clínica e emocional de mulheres acometidas por câncer de mama, evidenciou</p><p>que parte das referências dedicadas ao estudo das relações entre a persona-</p><p>lidade e o curso da condição emocional de mulheres acometidas por câncer</p><p>de mama sustenta que o otimismo se afigura como uma espécie de prote-</p><p>ção contra o impacto psicológico da doença. Outra pesquisa realizada por</p><p>Leite, Nogueira e Terra (2015), que avaliou a autoestima de 156 pacientes</p><p>oncológicos submetidos à quimioterapia em um hospital de médio porte</p><p>no Brasil, evidenciou que 70,5% da amostra apresentou uma autoestima</p><p>alta. Salienta-se que a Escala de Autoestima de Rosenberg, utilizada no</p><p>respectivo estudo, apresentou correlações significativas com os escores da</p><p>BFP (Nunes; Hutz; Nunes, 2017).</p><p>No que se refere aos resultados do fator Socialização, os altos escores</p><p>nos subfatores Pró-sociabilidade (S2) e Confiança nas pessoas (S3) parecem</p><p>estar de acordo os estudos que apontam uma relação entre personalidade e</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 33</p><p>câncer. A faceta Pró-sociabilidade (S2) caracteriza uma tendência a com-</p><p>portamentos não-opositores, submissos, e observadores de regras sociais,</p><p>enquanto Confiança nas pessoas (S3) evidencia uma propensão a acreditar</p><p>na honestidade e boas intenções das pessoas, geralmente apresentando uma</p><p>postura ingênua perante os outros, colocando-se em situações nas quais</p><p>facilmente pode ser prejudicado. Patrão e Leal (2004) citam uma revisão de</p><p>estudos sobre fatores psicossociais e desenvolvimento de câncer de mama</p><p>na qual se aponta um estilo de personalidade centrada no evitamento</p><p>do</p><p>conflito como fortemente associado a essa doença.</p><p>Conforme Paiva (2014), há algum tempo se tem buscado compreender</p><p>mais a respeito da natureza das relações entre traços de personalidade e</p><p>determinadas doenças. Em relação ao câncer, a autora aponta a referên-</p><p>cia, na literatura, a um perfil predisponente específico, chamado Tipo C,</p><p>característico de indivíduos cooperativos, conciliadores e pacientes, que</p><p>reprimem suas emoções consideradas negativas, particularmente a cólera,</p><p>com dificuldade de se afirmar, e tendência a submeterem-se a autorida-</p><p>des voluntariamente e a sacrificar suas necessidades em prol dos outros</p><p>(Temoshok, 1987, apud Paiva, 2014). Autores como Carvalho (2002), Patrão</p><p>e Leal (2004) e Sousa (2015), também fazem referência a personalidade</p><p>Tipo C, relacionando-a à doença oncológica.</p><p>Em relação ao questionário clínico aplicado, observou-se que os sen-</p><p>timentos vivenciados no último mês mais referidos pelos pacientes são,</p><p>predominantemente, sentimentos positivos (confiança, felicidade, satisfa-</p><p>ção, ansiedade, otimismo e disposição). Nesse contexto, observa-se ainda</p><p>que a maior parte dos participantes afirma perceber estar usufruindo de</p><p>boa (1) ou muito boa saúde (4), apesar de seu diagnóstico oncológico, dos</p><p>diversos outros problemas de saúde relatados (diabetes, hipertensão, artrite</p><p>ou reumatismo, problemas de pele, hérnia de disco, problema crônico de</p><p>pé, sobrepeso, tromboembolia pulmonar, bronquite, problema renal, pro-</p><p>blema cardíaco, asma), e das condições psicossociais e emocionais citadas</p><p>(ansiedade, síndrome do pânico, dificuldades relacionadas ao sono, irrita-</p><p>bilidade, lapsos de memória, estresse, hiperatividade, humor deprimido,</p><p>ideação suicida pregressa, problemas de relacionamento com o cônjuge,</p><p>problemas de relacionamento com familiares). Em conjunto, percebe-se</p><p>que os dados levantados nessa pesquisa apontam para uma postura predo-</p><p>minantemente satisfeita e otimista de enfrentamento da doença oncológica</p><p>no grupo analisado.</p><p>Diante disso, uma das hipóteses explicativas pode ser a do grupo ana-</p><p>lisado estar vivenciando, em alguma proporção, o fenômeno da tirania do</p><p>34</p><p>pensamento positivo, derivada de crenças populares sobre uma determinante</p><p>participação da tristeza na etiologia do câncer. Holland e Lewis (2000, apud</p><p>Peres; Santos, 2009, p. 617) descrevem esse fenômeno como algo que “faz</p><p>com que o paciente oncológico se sinta pressionado – tanto interna quanto</p><p>externamente – a experimentar apenas emoções consideradas positivas e,</p><p>assim, a reprimir sentimentos supostamente negativos, como se disso depen-</p><p>desse a sua sobrevivência”.</p><p>Os participantes apresentaram escores médios em Neuroticismo. Wat-</p><p>son; Hubbard apud Nunes, Hutz e Nunes (2017) concluíram que este fator</p><p>desempenha um papel importante no processo de coping. Isto nos remete a</p><p>uma segunda hipótese explicativa relacionadas aos resultados de autorrefe-</p><p>rência positiva: a capacidade de resiliência. Segundo Pinto et al. (2014), a</p><p>resiliência pode ser conceituada como a capacidade de a pessoa lidar com</p><p>situações adversas de forma positiva, não eliminando o problema, mas res-</p><p>significando-o. Os autores acreditam que as formas de pensar, agir e lidar</p><p>com a doença, fundamentais para a construção dos processos de resiliência,</p><p>estão permeadas pelos aspectos culturais.</p><p>O estabelecimento destas hipóteses traz importantes indicações de pes-</p><p>quisas subsequentes que averiguem esta variável, pois, neste contexto, tanto</p><p>a tirania do pensamento positivo, quanto os aspectos culturais, podem inten-</p><p>sificar as vivências de submissão e de repressão dos próprios sentimentos,</p><p>em um suposto perfil de personalidade oncológico. Uma maior clareza em</p><p>relação à existência ou não desses fenômenos, tanto no grupo analisado, como</p><p>nos demais pacientes oncológicos, contribuirá significativamente para uma</p><p>condução terapêutica mais sensível aos aspectos psicológicos do paciente.</p><p>Considerações Finais</p><p>Em relação aos objetivos deste estudo, através da avaliação dos fatores</p><p>de personalidade (Neuroticismo, Extroversão, Socialização, Realização e</p><p>Abertura) e de suas respectivas facetas, em pacientes oncológicos, a partir</p><p>da Bateria Fatorial de Personalidade, identificou-se, nos participantes desta</p><p>pesquisa, níveis predominantemente altos nos fatores Extroversão, Sociali-</p><p>zação e Realização, e médios nos fatores Neuroticismo. Os escores do fator</p><p>Abertura apresentaram variação.</p><p>Apesar deste estudo ter apontado semelhança de escores em alguns</p><p>fatores da personalidade entre os pacientes oncológicos participantes, não é</p><p>possível afirmar que a personalidade ou os referidos traços desempenhem um</p><p>papel significativo no desencadeamento ou no desenvolvimento do câncer,</p><p>devido, principalmente, ao número reduzido de participantes da pesquisa.</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 35</p><p>Assim, pesquisas com maior amostragem são necessárias para que se possa</p><p>corroborar ou refutar com segurança as análises aqui iniciadas, oferecendo</p><p>contribuições para o avanço do conhecimento científico no âmbito da perso-</p><p>nalidade de pacientes oncológicos.</p><p>Como limitações deste estudo, apontamos principalmente a amostra</p><p>reduzida. Devido ao pequeno número de participantes desta pesquisa, os resul-</p><p>tados não são suficientemente representativos da personalidade da população</p><p>oncológica, contudo trata-se de um resultado interessante, que abre espaço</p><p>para novos estudos direcionados à formulação de algumas hipóteses expli-</p><p>cativas para a compreensão de algumas possíveis especificidades do grupo</p><p>analisado, como a da tirania do pensamento positivo.</p><p>Além disso, entendemos que a personalidade, constructo complexo e</p><p>multifacetado, exige um processo de investigação que contemple uma maior</p><p>variedade de instrumentos de avaliação para que, de maneira parcimoniosa e</p><p>reflexiva, se atinja uma compreensão mais aprofundada dos aspectos levantados.</p><p>No contexto da saúde, ao articular pesquisa e assistência, a avaliação</p><p>psicológica colabora tanto para a produção do conhecimento quanto para o</p><p>atendimento das necessidades das pessoas. Salienta-se que a Bateria Fatorial</p><p>de Personalidade se constituiu como um instrumento adequado para a avalia-</p><p>ção da personalidade de pacientes oncológicos, já que apresentou resultados</p><p>compatíveis com as informações autorreferidas em relação aos seus posiciona-</p><p>mentos perante a própria vida e a doença. Os resultados trouxeram informações</p><p>confiáveis que poderão ser úteis ao psicólogo, favorecendo uma abordagem</p><p>mais adequada e efetiva diante da adaptação do paciente oncológico à nova</p><p>realidade imposta pelo câncer e seu tratamento, assim como a possibilidade de</p><p>trabalhar na prevenção de complicadores psicológicos específicos.</p><p>36</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>Bandeira, M. F., & Barbieri, V. (2007). Personalidade e câncer de mama e</p><p>do aparelho digestório. Psicologia: teoria e pesquisa. 23 (3), p. 295-</p><p>304. São Paulo. https://doi.org/10.1590/S0102-37722007000300008</p><p>Bertamoni, T., Ebert, G., & Dornelles, V. G. (2013). Estudo correlacional</p><p>sobre diferentes perfis de estratégias de coping de acordo com os</p><p>traços de personalidade. Revista Aletheia. 42, p. 92-105. Porto Ale-</p><p>gre. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_abstract&pi-</p><p>d=S1413-03942013000300009&lng=pt&nrm=iso</p><p>Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer (2015). Estima-</p><p>tiva 2016-2017. Incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA.</p><p>Brasil (2016). Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Conselho Nacio-</p><p>nal de Saúde.</p><p>Brasil (2016). Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Conselho Nacional</p><p>de Saúde.</p><p>Guimarães, R. M., Muzi, C. D., & Teixeira, M. P., Pinheiro, S. S. A. (2016).</p><p>Transição da Mortalidade por Cânceres no Brasil e a Tomada de</p><p>Decisão Estratégica nas Políticas Públicas de Saúde da Mulher.</p><p>Revista Políticas Públicas. 20 (1), p 33-50. São Luís. https://doi.</p><p>org/10.18764/2178-2865.v20n1p35-50</p><p>INCA (2017). Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva.</p><p>Disponível</p><p>em: Acesso em: 27 Mar. 2017.</p><p>Cardenal, V., Cerezo, M. V., Martinez, M. O., & Blanca, M. J. (2012). Person-</p><p>ality, emotions and coping styles: predictive values for the evolution of</p><p>cancer patients. The Spanish Journal of Psychology. 15 (2), p. 756-767.</p><p>https://doi.org/10.5209/rev_SJOP. 2012.v15.n2.38887</p><p>Carvalho, M. M. (2002). Psico-Oncologia: história, características e desafios.</p><p>Psicologia USP. 13 (1), p. 151-166. São Paulo. https://doi.org/10.1590/</p><p>S0103-65642002000100008</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 37</p><p>Carvalho, S. P. M. (2010). A personalidade na etiologia e progressão da doença</p><p>física. Monografia final de investigação. Universidade Católica Por-</p><p>tuguesa. Lisboa. Disponível em: http://www.psicologia.pt/artigos/</p><p>textos/TL0176.pdf.</p><p>Costa Júnior, Á. L. (2001). O Desenvolvimento da Psico-Oncologia: impli-</p><p>cações para a pesquisa e intervenção profissional em saúde. Psico-</p><p>logia: Ciência e Profissão. 21 (2). Brasília. https://doi.org/10.1590/</p><p>S1414-98932001000200005</p><p>Hamzeh, S., Beyrami, M., & Hashemi, N. T. (2011). Comparison of person-</p><p>ality trait, negative experienced emotions and coping styles between</p><p>healthy women and those suffering from cancer. J Shadid Sadoughi</p><p>Univ Med Sci. 19 (5), p. 627-636. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/</p><p>articles/PMC4201200/</p><p>Hesse, U., Capitão, C., Muner, Luana C., & Rossi, A. (2015). Estudo cor-</p><p>relacional entre o Human Guide e a Bateria Fatorial da Personali-</p><p>dade. Avaliação Psicológica, 14 (3), p. 403-411. Itatiba. https://doi.</p><p>org/10.15689/ap. 2015.1403.12</p><p>Honorato, N. P., Abumusse, L. V. M., Coqueiro, D. P., & Citero, V. A. (2017).</p><p>Personality Traits, Anger and Psychiatric Symptoms Related to Qual-</p><p>ity of Life in Patients with Newly Diagnosed Digestive System Can-</p><p>cer. Arquivos de Gastroenterologia, 54 (2), p. 156-162. Epub. https://</p><p>doi.org/10.1590/s0004-2803.201700000-04</p><p>Leite, F. P., Cruz, B. A. S., Bernuci, M. P., & Yamaguchi, M. U. (2016). Análise</p><p>cienciométrica sobre a relação da vivência de eventos de vida produto-</p><p>res de estresse e desenvolvimento de câncer. Cinergis. 17 (3), p. 257-</p><p>262. Santa Cruz do Sul. https://doi.org/10.17058/cinergis.v17i3.8133</p><p>Maia, B. M. M. R. (2011). Perfeccionismo e Depressão Pós-Parto. Dissertação</p><p>de Doutorado. Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.</p><p>Coimbra, Portugal.</p><p>Modena, C. M., Martins, A. M., Gazzinelli, A. P., Schall, S. S. L., & Almeida,</p><p>V. T. (2014). Câncer e masculinidades: sentidos atribuídos ao adoe-</p><p>cimento e ao tratamento oncológico. Temas em Psicologia, 22 (1),</p><p>p. 67-78. https://doi.org/10.9788/TP2014.1-06</p><p>38</p><p>Nunes, C. H. S. S., Hutz, C. S., & Nunes, M. F. O. (2013). Bateria Fatorial de</p><p>Personalidade (BFP): manual técnico. São Paulo: Casa do Psicólogo.</p><p>Paiva, S. A. (2014). Corações Hipermodernos: um estudo qualitativo realizado</p><p>com mulheres atendidas em serviços privados no Brasil sobre eventos</p><p>de vida, traços de personalidade e os sentidos e significados atribuídos</p><p>ao infarto do miocárdio e ao câncer de mama. Tese de Doutorado.</p><p>Unicamp: São Paulo.</p><p>Patrão, I., & Leal, I. (2004). Avaliação da personalidade em mulheres com</p><p>cancro da mama secundo o modelo dos Big Five. In: Ribeiro, J., Leal,</p><p>I. (Orgs.). Actas do 5º Congresso Nacional de Psicologia da Saúde.</p><p>Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa.</p><p>Patrão, I., & Leal, I. (2004). Abordagem do impacto psicossocial no adoecer</p><p>da mama. Psicologia, Saúde & Doenças. 5 (1), p. 53-73. Lisboa. http://</p><p>www.scielo.mec.pt/pdf/psd/v5n1/v5n1a04.pdf</p><p>Peres, R. S., & Santos, M. A. (2009). Personalidade e câncer de mama: produ-</p><p>ção científica em Psico-Oncologia. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 25</p><p>(4), p. 611-620. https://doi.org/10.1590/S0102-37722009000400017</p><p>Pinto, S. D. (2016). Identificação da tipologia psicológica em pacientes com</p><p>câncer de esôfago. Dissertação de mestrado. Faculdade de Medicina</p><p>da Universidade de São Paulo: São Paulo.</p><p>Prado, B. B. F. (2014). A influência dos hábitos de vida no desenvolvimento do</p><p>câncer. Ciência e cultura, 66 (1). São Paulo. https://doi.org/10.21800/</p><p>S0009-67252014000100011</p><p>Rabelo, M. O. A., Fernando, R., Rabelo, D. F., & Soares, P. B. M. (2016).</p><p>Mutirão de Prevenção ao Câncer: um relato de experiência no âmbito</p><p>da extensão universitária. Revista Intercâmbio, v. 7. http://www.inter-</p><p>cambio.unimontes.br/index.php/intercambio/article/view/109</p><p>Saito, R. F., Lana, M. V. G., Medrano, R. F. V., & Chammas, R. (2015). Fun-</p><p>damentos de Oncologia Molecular. 1ª edição. São Paulo: Atheneu.</p><p>Shapiro I. R., Ross-Petersen, L., Saelan, H., Garde, K., Olsen, J. H., & Johan-</p><p>sen, C. (2001). Extroversion and Neuroticism and the associated risk</p><p>A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 39</p><p>of cancer: a danish cohort study. American Journal ou Epidemiology.</p><p>153 (8), p. 757-763. https://doi.org/10.1093/aje/153.8.757</p><p>Shimada, Milena (2015). Evidências de validade concorrente entre o BBT-Br</p><p>e a BFP: um estudo com universitários. Tese de Doutorado. Univer-</p><p>sidade de São Paulo: São Paulo.</p><p>Silva, I. B., &Nakano, T. C. (2011). Modelo dos cinco grandes fatores da</p><p>personalidade: análise de pesquisas. Avaliação Psicológica, 10 (1),</p><p>p. 51-62. Porto Alegre.</p><p>Sousa, H., Guerra, M., & Lencastre, L. (2015) Preditores da qualidade de vida</p><p>numa amostra de mulheres com cancro da mama. Aná. Psicológica.</p><p>33 (1). Lisboa. https://doi.org/10.14417/ap. 832</p><p>Sousa, V. D., Driessnack, M., Mendes, & Isabel A. C. (2007). Desenhos de</p><p>pesquisa relevantes para enfermagem: parte 1: desenhos de pesquisa</p><p>quantitativa. Rev. Latino-am Enfermagem. 15 (3). São Paulo. https://</p><p>doi.org/10.1590/S0104-11692007000300022</p><p>Staliano, P., & Araujo, T. C. C. F. (2009). Estudos e pesquisas em Psico-</p><p>-Oncologia: levantamento realizado no Portal PePSIC. Rev. SBPH.</p><p>12 (2), 54-68. Rio de Janeiro. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?s-</p><p>cript=sci_abstract&pid=S1516-08582009000200006&lng=pt&nrm=iso</p><p>Terence, A. C. F., Filho, & E. Escrivão (2006). Abordagem quantitativa, qua-</p><p>litativa e a utilização da pesquisa-ação nos estudos organizacionais.</p><p>XXVI ENEGEP: Fortaleza.</p><p>Thomas, C. V., & Castro, E. K. (2012). Personalidade, comportamen-</p><p>tos de saúde e adesão ao tratamento a partir do modelo dos cinco</p><p>grandes fatores: uma revisão de literatura. Rev. Psicologia, Saúde</p><p>e Doenças. 13 (1), p. 100-109. http://www.scielo.mec.pt/scielo.</p><p>php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862012000100009</p><p>Veit, M. T., & Carvalho, V. A. (2010). Psico-Oncologia: um novo olhar para</p><p>o câncer. O Mundo da Saúde. 34 (4), p. 526-530. São Paulo. https://</p><p>doi.org/10.15343/0104-7809.20104526530</p><p>CAPÍTULO 2</p><p>GESTALT-TERAPIA E ADOECIMENTO:</p><p>a abordagem desenvolvida pela Dra.</p><p>Adriana Schnake para trabalhar</p><p>com pacientes oncológicos</p><p>Ana Carolina Seara</p><p>Ainda hoje, com todos os avanços tecnológicos da indústria farmacêutica,</p><p>das técnicas modernas de imagens e exames específicos para identificação</p><p>precoce e tratamento, a notícia do diagnóstico de câncer é devastadora. É como</p><p>se, neste momento, descobríssemos nossa mortalidade e tivesse sido iniciada</p><p>uma contagem regressiva. Não é de se estranhar que a maior parte das pessoas</p><p>tenha uma postura de evitação e fobia quando se trata de doenças com poten-</p><p>cial de ameaçar a vida, já que, em nossa cultura, principalmente a ocidental,</p><p>há uma extrema valorização do potencial da juventude e, em contrapartida,</p><p>um menosprezo pelas limitações e debilidades inerentes ao envelhecimento.</p><p>Esta postura é valorizada em sociedades que costumam perceber como</p><p>positivo apenas características relacionadas à força de trabalho, como produ-</p><p>tividade, alto-rendimento, proatividade, ambição, entre outras. A valorização</p><p>de tais características impulsiona as pessoas a trabalharem cada vez mais,</p><p>recorrerem a procedimentos estéticos para aparentar mais jovialidade e esti-</p><p>mulam uma postura competitiva em várias esferas da vida. Minha atenção</p><p>à descrição desses comportamentos e características da atualidade não tem</p>

Mais conteúdos dessa disciplina