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HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 1 FONOAUDIOLOGIA FLUÊNCIA E DISFLUÊNCIA TIPOLOGIA DAS DISFLUÊNCIAS HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 2 As disfluências correspondem às rupturas que podem ocorrer no fluxo da fala. Podem ser classificadas em dois grupos, as outras disfluências ou disfluências comuns e as disfluências típicas da gagueira ou disfluências gagas. A presença de disfluências no fluxo da fala são características que permitem identificar a gagueira (EGGERS; VAN EERDENBRUGH, 2018). A repetição de sons, sílabas e palavras monossilábicas, os prolongamentos de sons e os bloqueios são considerados marcadores da gagueira, e essas tipologias podem ser encontradas nas próprias descrições do distúrbio (KRONFELD-DUENIAS et al., 2014; VANHOUTTE et al., 2015). Já a presença de interjeições, revisões e repetições de palavra não monossilábica é uma característica de todos os falantes, com ou sem distúrbio da fluência, e essas tipologias são classificadas como outras disfluências (BLOODSTEIN et al., 2021; YARUSS, 1997). Segundo a literatura, os indivíduos fluentes podem apresentar até 10% de outras disfluências em sua fala (MARTINS; ANDRADE, 2008). Estudos pontuam que as outras disfluências refletem o planejamento linguístico (GANTHOUS; ROSSI; GIACHETI, 2013) bem como as incertezas e imprecisões linguísticas, visando ampliar a compreensão da mensagem. A presença de disfluências na fala fornece tempo para que o indivíduo organize sua mensagem e consiga transmiti-la de forma adequada e eficiente (CELESTE; RUSSO; FONSECA, 2013). As hesitações geralmente aparecem antes das palavras de baixa frequência, palavras imprevisíveis, em situações com múltiplas possibilidades semânticas ou sintáticas, e demais situações de incerteza (COREY et al., 2007). As interjeições transmitem informações sobre o falante como certeza, incerteza, ansiedade e excitação (ROBERTS; MELTZER; WILDING, 2009). A seguir, será apresentado o quadro 1 para melhor compreensão e visualização de cada tipologia das outras disfluências com suas definições e exemplos. INTRODUÇÃO HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 3 Quadro 1. Classificação e exemplo das outras disfluências. Tipo de Outras Disfluências Definição Exemplo Interjeição (I) Acréscimo de sons e/ou pa- lavras desnecessárias na mensagem. Eu tava na escola né i ela chegou. Hesitação (H) Caracterizada pela demora de até 3 segundos para ini- ciar a fala. Eu fui é na escola. Revisão (Rv) Mudança no conteúdo ou na forma gramatical da mensa- gem ou na pronúncia da pa- lavra. O meu bolo era de ni- nho de nozes. Palavra Não Terminada (PNT) Apresenta uma palavra não terminada, geralmente se- guida por sua correção. O meu bolo era de choco de nozes. Repetição de Segmento (RSeg) Caracterizada pela repetição de segmento com duas pala- vras ou mais da frase, no en- tanto não da frase inteira. O menino o menino caiu. Repetição de Frase (RF) Repetição da frase dentro da mensagem. O menino caiu. O me- nino caiu. Repetição de Palavra Não Monossilábica (RPNM) Repetição de uma palavra não monossilábica na frase. O menino menino caiu Fonte: Adaptação de Andrade (2011) e Oliveira et al. (2023). As disfluências típicas da gagueira caracterizam a principal manifestação do distúrbio, ou seja, a presença de rupturas no fluxo da fala. É comum a presença de disfluências durante a infância devido ao fato de se encontrarem em processo de aquisição e desenvolvimento de linguagem, geralmente ocorre a presença de pausas, hesitações, repetição de sons, sílabas ou palavras. O esperado é que em 80% destas crianças essas disfluências tendem a desaparecer em seis meses e a fala começa a se estabilizar a partir do momento em que adquirem um maior domínio das características morfológicas, sintáticas e semânticas que constituem a sua língua. HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 4 O tempo de duração das disfluências é variável, por volta dos quatro anos de idade, a maioria das crianças que gaguejam já apresentam disfluências típicas da gagueira em sua fala. A identificação das disfluências na fala é fundamental para a realização do diagnóstico, uma vez que a presença de 3% ou mais desse tipo de disfluência já caracteriza o distúrbio como gagueira, independentemente de qualquer outro tipo de manifestação. A seguir, será apresentado o quadro 2 com as tipologias, definições e exemplos das disfluências típicas da gagueira. Quadro 2. Classificação e exemplo das disfluências típicas da gagueira. Tipo de Disfluências Típicas da Gagueira Definição Exemplo Repetição de Palavra Monossilábica (RPM) Repetição de três ou mais palavras monossilábicas. Eu quero ir ir ir ir ir ir em- bora. Repetição de Parte da Palavra (RPP) Repetição de uma ou mais sílabas da palavra. Eu quequequequero ir embora. Repetição de Som (RS) Repetição de um fonema que compõe a palavra. Eeeeeeeu quero ir em- bora. Prolongamento (P) Duração inapropriada de um som na fala. E_u quero ir embora. Bloqueio (B) Tempo inadequado para co- meçar a falar o início de uma palavra. Eu quero ir /embora. Pausa (Pa) Pausa usada em lugares ina- propriados para adiar ou evi- tar a gagueira. Eu quero ir ____ embora. Intrusão (In) Produção de sons que não pertencem à frase. Eu quero ir /KKK/ embora Fonte: Adaptação de Andrade (2011) e Oliveira et al. (2023). Prolongamentos e bloqueios são as tipologias consideradas como fatores de risco para a gagueira persistente (TUMANOVA et al., 2011). Nesse sentido, alguns pesquisadores descrevem o prolongamento de som e o bloqueio como um sinal de maior gravidade da gagueira (TUMANOVA et al., 2011). Os prolongamentos são disfluências mais incomuns e mais característicos do que os ouvintes percebem como gagueira. Além disso, essas disfluências têm uma relação negativa mais forte com a HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 5 velocidade de fala quando comparadas com as outras disfluências apresentadas pelas crianças com gagueira (TUMANOVA et al., 2011). A repetição de palavra monossilábica é considerada disfluência típica da gagueira por alguns pesquisadores (AMERICA PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2004; BOHNEN, 2009; PICOLOTO; OLIVEIRA, 2016; YAIRI; AMBROSE, 2013) enquanto outros autores a descrevem como outras disfluências (COOK; DONLAN; HOWELL, 2013; TODD et al., 2014). Essa diferença de conceitos pode prejudicar o diagnóstico do distúrbio, uma vez que estudos com pessoas que gaguejam apresentam alta frequência dessa tipologia tanto em crianças como adultos (BOHNEN, 2009; PICOLOTO; OLIVEIRA, 2016; YAIRI; AMBROSE, 1999). A seguir será apresentado o quadro 3 com as características e diferenças entre outras disfluências e disfluências típicas da gagueira. Quadro 3. Características e diferenças entre outras as outras disfluências e disfluências típicas da gagueira. Características Outras Disfluências (OD) Disfluências Típicas da Gagueira (DTG) População que apresenta Todos os falantes Pessoas com gagueira Outras terminologias utili- zadas Disfluências comuns Disfluências gagas . Qual a porcentagem é normal? Até 10% Até 2,5% . Fatores qualitativos asso- ciados Não ocorrem Ocorrem com frequência Tipos Hesitações; interjeições; repetições de palavras não monossilábicas, de seg- mentosou de frases; revi- sões, e; palavras não ter- minadas. Repetições de palavras monossilábicas, de síla- bas e de sons; prolonga- mentos; bloqueios; pau- sas e intrusões. Fonte: Elaborado pela autora. HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 6 Para concluir o diagnóstico é de suma importância saber a diferença entra as tipologias e como classificá-las, além de realizar a análise quantitativa e qualitativa das disfluências. O conhecimento sobre as tipologias irá auxiliar a elaboração e planejamento das técnicas terapêuticas. ANDRADE, C.R.F. Fluência. In: ANDRADE, C. R. F.; BÉFI-LOPES, D. M.; FERNANDES, F.D.M.; WERTZNER, H.F. (org.). ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. Carapicuíba: Pró-Fono, p. 61-75, 2011. BLOODSTEIN, O. et al. A Handbook on Stuttering, 7th Edn. San Diego, CA: Plural Publishing, 2021. BOHNEN, A.J. Estudo das palavras gaguejadas por crianças e adultos: caracterizando a gagueira como um distúrbio de linguagem. Tese, Programa de Pós- Graduação em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2009. CELESTE, L.; RUSSO, L.; FONSECA, L Media influence on the pedagogical look of the stuttering: initial reflections. Rev. CEFAC, v. 15, n. 5, p. 1202- 1213,2013. COREY, M.; et al. It’s the way that you, or, say it: Hesitations in speech affect language comprehension. Cognition. v.105, p.658-668, 2007. EGGERS, K.; VAN EERDENBRUGH, S. 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