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ARTIGO DE REVISÃO 1Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 2Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 3Universidade Veiga de Almeida, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. RESUMO Objetivo: Este trabalho teve como objetivo revisar a literatura sobre a eficiência dos protocolos de higienização oral que utilizaram digluconato de clorexidina como agente antimicrobiano de escolha em pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva. Métodos: Para o levantamento dos protocolos, foram analisadas as plataformas de dados científicos Scientific Electronic Library Online e National Library of Medicine, utilizando descritores específicos em português e em inglês, respectivamente. Resultados: Dos 59 trabalhos inicialmente analisados, 27 artigos foram lidos na íntegra e seis destes foram selecionados para o estudo. Os estudos utilizaram digluconato de clorexidina em concentrações variando de 0,05% a 2%. Os dispositivos utilizados para higiene oral variaram entre escovas de dentes, cotonete e gaze. A frequência de higienização apresentou variação, sendo realizada duas ou três vezes ao dia. Conclusão: Devido à heterogeneidade dos protocolos de higiene oral utilizando digluconato de clorexidina em Unidades de Terapia Intensiva, apresentados na literatura, não foi possível compará-los em relação à sua eficiência na redução da pneumonia aspirativa por ventilação mecanica. ABSTRACT Objective: This study aimed to review the literature on the efficiency of oral hygiene protocols that used chlorhexidine digluconate as an antimicrobial agent in patients admitted to Intensive Care Units. Methods: To research the protocols, the scientific data platforms Scientific Electronic Library Online and National Library of Medicine were analyzed, using specific descriptors in Portuguese and in English, respectively. Results: Of the 59 studies initially analyzed, 27 articles were read in full and six of these were selected for the study. The studies used chlorhexidine digluconate in different concentrations, 0.05% to 2%. The devices used for oral hygiene varied between toothbrushes, cotton swabs, and gauze. The frequency varied, being performed two or three times a day. Conclusion: Due to the heterogeneity of oral hygiene protocols using chlorhexidine digluconate in Intesive Care Units, presented in the literature, it was not possible to compare them in relation to their efficiency in ventilator-associated pneumonia reduction. RESUMEN Objetivo: Este estudio tuvo como objetivo revisar la literatura sobre la eficacia de los protocolos de higiene bucal que utilizan digluconato de clorhexidina como agente antimicrobiano en pacientes ingresados en unidades de cuidados intensivos. Métodos: Para investigar los protocolos, se analizaron las plataformas de datos científicos Scientific Electronic Library Online y National Library of Medicine, utilizando descriptores específicos en portugués y en inglés, respectivamente. Resultados: De los 59 estudios inicialmente analizados, se leyeron 27 artículos en su totalidad y seis de estos fueron seleccionados para el estudio. Los estudios utilizaron digluconato de clorhexidina en concentraciones que van desde 0.05% a 2%. Los dispositivos utilizados para la higiene bucal variaron entre cepillos de dientes, hisopos de algodón y gasas. La frecuencia de la limpieza varió, realizándose dos o tres veces al día. Conclusión: Debido a la heterogeneidad de los protocolos de higiene oral que utilizan el digluconato de clorhexidina en las Unidades de Cuidados Intensivos, presentados en la literatura, no fue posible compararlos en relación con su eficiência en la reducción de la neumonía asociada al ventilador. Descritores Unidade de Terapia Intensiva; Pneumonia associada à ventilação mecânica; Higiene bucal; Clorexidina; Promoção da saúde Descriptors Intensiva Care Units; Pneumonia ventilator-associated; Oral hygiene; Chlorhexidine; Health promotion Descriptores Unidades de Cuidados Intensivos; Neumonía asociada al ventilador; Higiene bucal; Clorhexidina; Promoción de la salud Submetido 17 de Maio de 2020 Aceito 03 de Novembro de 2021 Conflitos de interesse: nada a declarar. Autor correspondente Fernanda Brito E-mail: fernanda.brito.s@hotmail.com Editor Associado (Avaliação pelos pares): Aurilene Josefa Cartaxo de Arruda Cavalcanti (https://orcid.org/0000-0003-2325-4647) Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, PB, Brasil PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENÇÃO À PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAÇÃO MECÂNICA ORAL HYGIENE PROTOCOLS AND PREVENTION OF ASPIRATION PNEUMONIA BY MECHANICAL VENTILATION PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL Y PREVENCIÓN DE LA NEUMONÍA POR ASPIRACIÓN MEDIANTE VENTILACIÓN MECÁNICA Rayane Fernanda Fortunato de Oliveira1 (https://orcid.org/0000-0003-4490-5592) Guilherme Goulart Cabral-Oliveira1 (https://orcid.org/0000-0001-9762-4669) Brenda do Amaral Almeida2 (https://orcid.org/0000-0002-2247-0308) Fernanda Brito1,3 (https://orcid.org/0000-0003-4067-9372) Como citar: Oliveira RF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA, Brito F. Protocolos de higiene oral e a prevenção à pneumonia aspirativa por ventilação mecânica. Enferm Foco. 2023;14:e-202301. DOI: https://doi.org/10.21675/2357-707X.2023.v14.e-202301 Enferm Foco. 2023;14:e-202301 1 mailto:fernanda.brito.s@hotmail.com https://orcid.org/0000-0003-2325-4647 https://orcid.org/0000-0003-4490-5592 https://orcid.org/0000-0001-9762-4669 https://orcid.org/0000-0002-2247-0308 https://orcid.org/0000-0003-4067-9372 PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENçãO à PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAçãO MECâNICA Oliveira RF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA, Brito F INTRODUÇÃO A pneumonia aspirativa por ventilação mecânica (PAVM), considerada uma infecção relacionada à assistência à saú- de, possui diversos agentes etiológicos como fungos, vírus e principalmente bactérias. Sua incidência em unidades de terapia intensiva (UTI) ou centros de terapia intensiva (CTI) é elevado e apresenta alta mortalidade, principal- mente em pacientes com comorbidades.(1,2) Bactérias como Staphylococcus aureus, Klebsiella sp., Pseudomonas sp., Acinetobacter baumannii e Escherichia coli são frequente- mente associadas a esta infecção. Diferentes vias podem possibilitar o acesso desses microrganismos ao trato res- piratório, como a inoculação direta por aspiração, inalação de aerossóis infectados, disseminação hematogênica, e área com infecções extensas.(2,3) Tais potenciais patógenos respiratórios não são comuns na microbiota oral de indiví- duos saudáveis, porém pacientes internados em UTI estão mais susceptíveis a apresentarem o biofilme colonizado por eles,(3) especialmente os que possuem periodontite.(4) Os biofilmes são comunidades microbianas estrutu- radas de forma tridimensional, aderidas a uma superfície biótica ou abiótica. Quando maduro, confere proteção as ações ambientais, à desidratação e ao sistema imune do hospedeiro.(5) Essa estrutura pode ser formada e amadure- cida sobre a superfície dos dentes ou em sítios periodontais como resultado de uma higiene bucal inadequada, poden- do acarretar no aparecimento de lesões de cárie, agravar o processo inflamatório dos tecidos periodontais e causar infecções em outras regiões do organismo.(3-5) A aspiração desses patógenos da cavidade oral é a via mais comum de infecção pulmonar, demonstrando o papel significativo da microbiota oral na etiologia da pneumonia aspirativa por ventilação mecânica.(2,4) Protocolos de higienização oral, baseados na limpeza da cavidade bucal com a utilização de antimicrobianos de baixo custo, como o digluconato de clorexidina (DGC), pas- saram a ser utilizados como um método de prevenção ao desenvolvimento da PAVM, além de auxiliar na promoção, conscientização e integração da equipe de saúde, incluin- do médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos,enfermeiros e cirurgiões-dentistas.(1) Apesar de a literatura apresentar diferentes modelos de protocolos de higienização oral para a prevenção de pneu- monia aspirativa por ventilação mecânica com diferentes índices de sucesso,(6-11) não há um consenso sobre a eficiên- cia, a padronização do antimicrobiano ou a concentração do mesmo e dos dispositivos de higiene utilizados. Sendo assim, este trabalho tem como objetivo revisar a literatura sobre a eficiência dos protocolos de higienização oral que utilizaram DGC como agente antimicrobiano de escolha em pacientes internados em UTIs. MÉTODOS Trata-se de uma revisão narrativa da literatura. Para o levantamento dos protocolos, foram utilizadas as plata- formas de dados científicos SciELO e PubMed, durante o período de setembro de 2019, utilizando como descritores: “protocol”, “oral care” e “pneumonia ventilator associated”, e “protocolo”, “higiene oral” e “pneumonia”, respectivamen- te em cada base analisada. Como critérios de inclusão para o estudo, foram acei- tos trabalhos publicados em português e inglês que apre- sentaram protocolos postos em prática e seus respectivos resultados. Como critérios de exclusão, não foram incluí- dos no estudo trabalhos publicados antes de 2012, que não utilizavam o DGC como agente antimicrobiano de escolha, revisões de literatura e relatos de casos. Dois avaliadores selecionaram os artigos e em caso de dúvida um terceiro avaliador foi consultado. Os trabalhos foram avaliados quanto às etapas e período de aplicação dos protocolos empregados, a concentração de DGC, o uso de instrumentos para a remoção mecânica do biofil- me e o emprego de atividades educativas associadas aos protocolos. RESULTADOS A revisão realizada encontrou um total de 59 trabalhos que tiveram seus resumos lidos e avaliados por dois autores. Após a leitura dos resumos e a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 27 artigos foram lidos na íntegra por dois avaliadores, sendo um terceiro avaliador consultado no caso de eventuais dúvidas. Dos trabalhos lidos, seis fo- ram considerados adequados para o estudo (Figura 1). Os trabalhos selecionados apresentaram diferentes intervalos de duração dos protocolos. Além disso, utiliza- ram a clorexidina na forma de digluconato de clorexidina em diferentes concentrações, variando de 0,05% a 2%. A frequência média da realização da higiene oral também apresentou variação. Cinquenta por cento dos artigos se- lecionados realizaram a higiene oral duas vezes ao dia,(6,8,9) enquanto os outros 50% realizaram a higiene oral três ve- zes ao dia.(7,10,11) Além da utilização da solução de digluconato de clorexi- dina, alguns protocolos contaram com instrumentos para a higienização e remoção mecânica do biofilme oral, como escovas dentais, cotonetes e compressas,(6-8,11) e utilizaram de atividades educativas para a conscientização sobre a pneumonia aspirativa por ventilação mecânica (Tabela 1).(9,11) Enferm Foco. 2023;14:e-2023012 PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENçãO à PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAçãO MECâNICA Oliveira RF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA, Brito F Busca nas bases de dados científicos PubMed e SciELO no período de setembro de 2019 Leitura dos resumos e aplicação dos critérios de inclusão e exclusão Leitura integral dos trabalhos por dois avaliadores Resultado da busca 59 artigos 27 artigos 6 artigos selecionados Figura 1. Organograma da revisão realizada Tabela 1. Categorização dos trabalhos selecionados na revisão Autor Período de aplicação Etapas do protocolo Concentração de Digluconato de Clorexidina (DGC) Frequência da aplicação do protocolo (nº de vezes ao dia) Presença de atividades educativas sobre a Pneumonia aspirativa por ventilação mecânica (PAVM) associadas ao protocolo Alja’afreh et al. (2019)(11) 6 meses Higiene realizada através de escovação dos dentes.Aplicação de solução de DGC com um cotonete nos dentes, língua, palato duro e lubrificação dos lábios a cada 6 horas. Sucção da boca e faringe a cada 2 horas ou quando necessário. 0,05% 3 Sim Jadot et al. (2018)(10) 72 meses Avaliação diária da sedação. Elevação da cabeceira da cama para ao menos 30°; aspiração oral, higiene oral com solução de DGC. 2% 3 Não Burja et al. (2018)(9) 4 meses Elevação da cama para ao menos 30°, higiene oral com solução de DGC, aspiração subglótica a cada 4 horas, uso de sistemas fechados de sucção. Não mencionada 2 Sim Ory et al. (2017)(7) Protocolo 1 (6 meses) Higiene oral com escovação, cotonete e compressas embebidas em solução de clorexidina. 0,50% 3 Não Protocolo 2 (7 meses) Higiene oral com duas escovas acopladas ao equipamento de aspiração, embebidas em solução de DGC clorexidina, da linha. 0,50% 3 Não Zand et al. (2017)(8) Protocolo 1 (5 meses) Higiene oral a cada 12 horas, com solução de DGC, sucção subglótica, higienização dos dentes com uma escova pediátrica macia (pacientes dentados) ou cotonete (para pacientes edêntulos) e cotonete embebido em clorexidina para gengiva, mucosa oral, palato duro e língua. 0,20% 2 Não Protocolo 2 (5 meses) Higiene oral realizada a cada 12 horas, com solução de DGC, sucção subglótica, higienização dos dentes com uma escova pediátrica macia (pacientes dentados) ou cotonete (para pacientes edêntulos) e cotonete embebido em clorexidina para gengiva, mucosa oral, palato duro e língua. 2,00% 2 Não Conley et al. (2013)(6) 12 meses Higienização com escovação realizada na língua, mucosa oral, dentes e lábios durante um período de 1 a 2 minutos com dentifrícios, logo após a escovação foi realizado o enxague com uma pequena quantidade de água, que era aspirada em seguida. Por fim foi aplicado uma solução de DGC de 30 a 60 minutos. 0,12% 2 Não Tabela 2. Protocolo de Higiene Oral Simplificado para Higienização Oral e Utilização do Digluconato de Clorexidina Protocolo Perfil do paciente internado em Unidade de Terapia Intensiva e submetido à Ventilação Mecânica Solução de Digluconato de Clorexidina 0,12% 15mL ou 0,2% 10mL, 2x/dia Dentado Edentado Limpeza da mucosa oral com gaze ou cotonetes embebidas em solução de Digluconato de Clorexidina X X Escovação com escovas de dente embebidas em solução de Digluconato de Clorexidina X - Higienização do dorso da língua com raspador lingual e aplicação da solução de Digluconato de Clorexidina no dorso da língua X X Em pacientes edentados que continuarão utilizando as próteses enquanto estiverem internados, uma pequena quantidade adicional de Digluconato de Clorexidina 0,12% deve ser utilizada para higienização da prótese. Em pacientes que não utilizarão a prótese durante a internação, a prótese pode ser higienizada com Digluconato de Clorexidina a 2% antes de ser armazenada pela equipe de Enfermagem ou entregue à família. Todos os artigos selecionados relataram uma queda no número de novos casos de pneumonia aspirativa por venti- lação mecânica. Após a realização da pesquisa foi confec- cionado um protocolo simplifidado de higiene oral utilizan- do o digluconato de clorexidina (Tabela 2). DISCUSSÃO O resultado dessa revisão demonstrou que a literatura é escassa e apresenta trabalhos com metodologias hetero- gêneas sobre protocolos de higienização bucal utilizando digluconato de clorexidina em pacientes internados em UTI e/ou CTI. Por esses motivos, não foi possível comparar a eficiência dos protocolos de higienização avaliados, mas alguns dos aspectos abordados nos estudos selecionados devem ser discutidos. A clorexidina é uma bisbiguanida catiônica com eleva- da atividade antimicrobiana e de baixa toxicidade em ma- míferos. Essa substância é usualmente selecionada como antisséptico de primeira escolha devido ao seu efeito an- timicrobiano de amplo espectro – agindo sobre bactérias Enferm Foco. 2023;14:e-202301 3 PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENçãO à PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAçãO MECâNICA Oliveira RF, Cabral-OliveiraGG, Almeida BA, Brito F gram-positivas, gram-negativas, fungos e vírus – e à sua substantividade, uma vez que esse composto é capaz de aderir a diferentes superfícies da cavidade oral e à saliva, podendo exercer sua atividade antimicrobiana por um perí- odo em torno de 12 horas.(12-14) O digluconato de clorexidina é indicado para a higieniza- ção da cavidade oral de pacientes internados em UTI, como também na higiene corporal, visto que o banho diário com esse composto tem sido indicado na prevenção de infecções comuns em UTI, principalmente em áreas onde são introdu- zidos cateteres.(15) Apesar das diversas vantagens, há relatos na literatura de efeitos adversos após o contato direto com a pele, mucosa ou objetos tratados com essa substância, principalmente quando em altas concentrações.(12,16) Dos estudos selecionados, dois protocolos utilizaram o digluconato de clorexidina na concentração de 2%.(8,10) Contudo, seu uso nessa concentração não é clinicamente indicado devido aos efeitos citotóxicos que esse produto apresenta sobre diferentes células humanas, e por causar queimadura em mucosa oral.(12,17) Essa concentração é uti- lizada para a higienização de próteses,(18) embora o uso da peça protética imediatamente após a higienização com a concentração de 2% não seja recomendado devido a pos- síveis efeitos anafiláticos ou deletérios em tecidos orais, decorrentes da presença residual do antisséptico.(12,16) Caso o paciente esteja consciente e venha a utilizar a prótese, é recomendada sua higienização nas concentrações de 0,12% ou 0,2%, a fim de evitar efeitos adversos. As concentrações de digluconato de clorexidina re- comendadas para o uso oral são as de 0,12% e 0,2%,(12,19) amplamente comercializadas. No Brasil, a solução de clo- rexidina a 0,12% é facilmente encontrada em farmácias, enquanto solução de clorexidina a 0,2% só é vendida sob manipulação. Em pacientes que apresentem a capacidade de expelir a solução, é recomendado o bochecho com 15mL de solução a 0,12% ou 10mL de solução a 0,2%. Em pacien- tes submetidos à Ventilação Mecânica, é recomendada a aplicação tópica dos antissépticos.(12,18) A frequência de aplicação do digluconato de clorexidina também apresentou divergências nos protocolos selecio- nados. Devido à substantividade de 12 horas, a aplicação duas vezes ao dia em cavidade oral é a frequência preconi- zada.(19) Uma frequência maior de sua utilização pode pro- vocar o aparecimento de efeitos colaterais indesejados de- correntes do uso excessivo do produto, como pigmentação extrínseca e alterações no paladar,(12,14,18) além de acarretar maiores despesas hospitalares. Gaze e cotonetes são recomendados para higienização da mucosa oral, tanto em pacientes edentados quanto em pacientes dentados. É importante ressaltar que em pa- cientes com dentes, a escova dentária é o instrumento im- prescindível para a remoção mecânica do biofilme dental, a prevenção de doenças periodontais e o aparecimento de lesões de cárie.(14,20) A escova de dente não pode ser substi- tuída por gaze ou cotonetes.(20) O uso de agentes químicos é uma etapa auxiliar para o controle da presença e a for- mação de biofilme, mas sua eficácia é diretamente depen- dente da remoção mecânica do mesmo, previamente à sua utilização.(5,14,21,22) O uso de dentifrícios na escovação, prévia à higieniza- ção com digluconato de clorexidina, foi encontrado em um dos protocolos selecionados.(6) Entretanto, o uso de cre- mes dentais não é indicado em pacientes internados devido a dois motivos principais. O primeiro é que os surfactantes presentes nos dentifrícios interagem com a clorexidina re- duzindo sua atividade.(12,23) Sendo assim, o ideal é que a clo- rexidina não seja empregada imediatamente após a escova- ção com dentifrícios, devendo-se manter um intervalo de tempo de no mínimo 30 minutos entre a utilização dos dois compostos.(23) O segundo motivo é a produção de espuma proveniente da utilização da pasta de dentes. A remoção da espuma gera mais uma etapa durante os protocolos de higiene, especialmente em pacientes intubados onde será necessária a aspiração da espuma, lavagem da cavidade oral e uma segunda aspiração da cavidade oral. As atividades educativas e programas de treinamento são implementados a fim de promoverem medidas de lim- peza e assepsia, objetivando a prevenção da aquisição de outras infecções ou comorbidades decorrentes da ausên- cia destas práticas.(24) Apenas dois estudos(9,11), apresenta- ram atividades educativas associadas a seus protocolos. Considerando a importância desta abordagem, atividades de educação contínua em saúde deveriam ser realizadas em todas as unidades hospitalares. A média de ocorrência de PAVM apresenta uma variação entre 9-40%.(25) Sendo considerados grupos de risco para essa infecção pacientes com idade avançada, induzidos ao coma, intubados, submetidos à reintubação traqueal, com antecedente de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, sob ventilação mecânica prolongada (maior que 7 dias) e que aspiraram secreções contaminadas.(26) Sob o aspecto oral, pacientes com periodontite são mais propensos ao desen- volvimento de pneumonia nosocomial quando comparados aos indivíduos sem periodontite.(4) Os artigos selecionados neste estudo sugerem um grau de efetividade na redução de novos casos de pneu- monia por ventilação mecânica através das práticas de higiene oral utilizadas, visto que, ao final de seus estudos, Enferm Foco. 2023;14:e-2023014 PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENçãO à PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAçãO MECâNICA Oliveira RF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA, Brito F REFERÊNCIAS 1. 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A literatura ainda é escassa e inconsistente em rela- ção a utilização do agente antimicrobiano padrão-ouro nos protocolos de higiene oral em UTIs, o que foi demonstrado pelo número reduzido de artigos selecionados. Só foram selecionados artigos que utilizaram o digluconato de clo- rexidina como agente antimicrobiano. Este trabalho visa esclarecer as eventuais dúvidas so- bre a prática da higiene oral em pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva, oferecendo uma visão crí- tica da literatura para a equipe hospitalar. O protocolo de higiene oral simplicado descrevendo os procedimentos a serem realizados tanto nos pacientes dentados quanto nos edentados, é de grande valia para a sistematização da as- sistência de enfermagem e odontológica. CONCLUSÃO Devido à heterogeneidade dos protocolos de higiene oral utilizando digluconato de clorexidina em UTIs, apresentados na literatura, não foi possível compará-los em relação à sua eficiência na redução de pneumonia aspirativa por ventila- ção mecânica. Essa revisão ressalta a necessidade da rea- lização de mais pesquisas sobre protocolos de higienização oral em Unidades de Terapia Intensiva utilizando-se metodo- logias padronizadas. Agradecimentos à Professora Tereza de Abreu, da Faculdade de Odontologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, pela leitura e revisão gramatical do manuscrito. Contribuições Concepção e/ou desenho do estudo: Oliveira RFF, Cabral- Oliveira GG e Brito F; Coleta, análise e interpretação dos dados: Oliveira RFF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA e Brito F; Redação e/ou revisão crítica do manuscrito: Oliveira RFF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA e Brito F; Aprovação da versão final a ser pu- blicada: Oliveira RFF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA e Brito F. Enferm Foco. 2023;14:e-202301 5 PROTOCOLOS DE HIGIENE ORAL E A PREVENçãO à PNEUMONIA ASPIRATIVA POR VENTILAçãO MECâNICA Oliveira RF, Cabral-Oliveira GG, Almeida BA, Brito F 18. Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Departamentos de Odontologia e Enfermagem. Procedimento Operacional Padrão de Higiene Bucal (POP-HB) [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr 16]. Available from: http://abenti.org.br/pdf/2019_POP-HB_em_papel-carta_AMIB. pdf 19. Najafi MH, Taheri M, Mokhtari MR, Forouzanfar A, Farazi F, Mirzaee M, et al. 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