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DEFINIÇÃO A cefaleia, um sintoma muito comum, pode ser secundária a um problema subjacente, mas se trata, mais comumente, de uma causa primária, como enxaqueca, cefaleia tipo tensional, cefaleia em salvas e hemicrania paroxística. EPIDEMIOLOGIA Cerca de 90% de todos os adultos sentem cefaleia em algum momento da vida, e mais de 75% das crianças já apresentaram alguma dor de cabeça por volta dos 15 anos. Nos EUA, os custos diretos e indiretos associados à enxaqueca são superiores a US$ 20 bilhões anuais. A Organização Mundial da Saúde coloca a enxaqueca no topo entre as 10 condições de saúde mais incapacitantes de sua lista. Os pacientes com enxaqueca crônica e cefaleia crônica diária apresentam elevado risco para dias perdidos de trabalho. Em estudos de grandes populações, o risco relativo de sofrer de enxaqueca, cefaleia tensional ou cefaleia em salvas aumenta em até quatro vezes se um parente de primeiro grau tiver esses mesmos tipos de cefaleia. Estudos com gêmeos, especialmente idênticos, também mostram suscetibilidade semelhante. BIOPATOLOGIA A cefaleia começa pelos aferentes trigeminais primários que inervam os vasos sanguíneos, a mucosa, os músculos e os tecidos. As fibras dessas fontes coalescem no gânglio trigeminal, especialmente a primeira divisão. Os aferentes trigeminais terminam no núcleo sensorial primário do V nervo craniano e seu núcleo espinal, que apresenta vários subnúcleos pequenos, o mais importante dos quais é o subnúcleo caudal. Esse subnúcleo recebe aferentes dos vasos meníngeos dos neurônios sensíveis da dura-máter e até da medula cervical superior e então projeta esses aferentes para o tálamo lateral e medial, por meio do trato espinotalâmico e para as regiões do diencéfalo e do tronco encefálico envolvidas na regulação das funções autonômicas. As informações nociceptivas talâmicas ascendem para o córtex sensorial, assim como para as outras áreas do cérebro. Embora as cefaleias secundárias possam estimular essa via por meio de processos, como inflamação e compressão, os distúrbios primários de cefaleia ocorrem espontaneamente por meio de mediadores químicos, como o peptídio relacionado com o gene da calcitonina. A sequência de eventos começa com a ativação periférica causada por extravasamento de plasma neurogênico ativada espontaneamente ou por depressão cortical alastrante. O complexo trigeminocervical, especialmente o núcleo caudal, é então ativado e os pacientes podem sofrer alodinia, um quadro no qual um estímulo não nocivo é percebido como dolorido. Aura é definida como um sintoma neurológico focal visual, sensorial ou motor que pode ocorrer com ou sem cefaleia. Acredita-se que ela ocorra quando a depressão cortical alastrante causa despolarização das membranas neuronais. Ambos os neurônios e a glia podem mediar tanto a constrição quanto a dilatação dos vasos sanguíneos. A enxaqueca tem claramente um componente genético, evidente na enxaqueca hemiplégica familiar, que pode ser causada por mutações no gene CACNA1A, localizado no cromossomo 19p13.2-p13.1, que codifica canais de cálcio neuronais. As mutações no gene CACNA1A também causam episódios de ataxia e epilepsia. Outra mutação está em ATP1A2, também chamado de gene 2 (FMH2) da enxaqueca hemiplégica familiar, localizado no cromossomo 1q21-q23 e que codifica a proteína de transporte adenosina trifosfatase sódio-potássio (Na+,K+-ATpase). Um terceiro locus genético é o gene SCN1A no cromossomo 2q24.3, que é um canal de sódio. Além disso, muitos polimorfismos de nucleotídio único foram associados à enxaqueca.1 Embora haja ligações a muitos loci genéticos para as formas mais comuns de enxaqueca, esta e outras cefaleias também têm interações2 epigenéticas múltiplas com fatores ambientais, ficando claro que as contribuições genéticas são complexas. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Os pacientes com cefaleia podem descrever a dor como latejante, em faixa ou dolorida (ou pressão ou tensão ao redor da cabeça). Com frequência, a dor é unilateral, mas pode ser bilateral. A cefaleia decorrente de enxaqueca está quase sempre associada a náuseas, vômito, fotofobia ou fonofobia. É invariavelmente moderada a grave e interfere nas atividades de vida diária. Outras manifestações autonômicas que podem acompanhar a enxaqueca, a cefaleia em salvas e outras variantes incluem ptose, hiperemia conjuntival, lacrimejamento, rinorreia, síndrome de Horner e edema facial. As cefaleias secundárias podem parecer, às vezes, similares às cefaleias tensional ou à enxaqueca, mas existem sinais de alerta que podem sugerir um distúrbio de cefaleia secundário, em vez de primário (Tabela 370.1). Atenção especial deve ser dedicada ao início súbito de cefaleias intensas, as quais apresentam, com frequência, uma causa secundária subjacente.3 Tabela 370.1 Razões para avaliação complementar na busca de cefaleias secundárias (sinais de alerta). Primeiros sintomas de cefaleias em idade avançada, sem história prévia ou história familiar positiva Piora inexplicável e anormal de enxaquecas existentes anteriormente Alteração dramática ou incomum na característica do pródromo ou da enxaqueca presente anteriormente Cefaleias que despertam o paciente no meio da noite (exceto para a cefaleia em salvas) Cefaleias muito piores quando o paciente está inclinado, só quando em pé, ou quando com tosse, espirrando ou com a manobra de Valsalva (cefaleia agravada pelo esforço) Cefaleia intensa de início súbito não usual (“a pior dor de cabeça da minha vida”) Déficits focais que não desaparecem depois que a cefaleia se resolveu Qualquer achado neurológico anormal ou psiquiátrico novo no exame Um quadro novo de cefaleia em paciente com infecção pelo vírus da imunodeficiência humana, malignidade ou gravidez DIAGNÓSTICO Cinco elementos de anamnese são essenciais para avaliação de cefaleias: a história familiar ajuda a determinar se uma pessoa tem predisposição genética; a história de vida da cefaleia determina se o problema é novo ou evoluiu no curso da vida; a história da crise fornece as características clínicas para sua identificação; a história patológica pregressa e a psiquiátrica determinam se existem condições de comorbidade que possam causar ou piorar a cefaleia; e a história medicamentosa determina se a cefaleia poderia ser causada ou piorada por medicamentos ou drogas ilícitas em uso pelo paciente. O diagnóstico do tipo de cefaleia se baseia no tipo de dor, na sua duração e nas características que a acompanham (Tabela 370.2). Cefaleias secundárias são causadas em geral por um quadro subjacente, como um tumor cerebral (ver Capítulo 180), pressão intracraniana aumentada ou baixa, doença de seios venosos (ver Capítulo 398) ou malformação vascular (ver Capítulo 380), com a melhora do quadro ao se remover ou tratar a causa. Cefaleias que ocorrem na frequência de menos de 15 dias ao mês são chamadas de episódicas, enquanto as cefaleias que ocorrem mais de 15 dias ao mês são consideradas crônicas. A avaliação diagnóstica para cefaleia depende dos achados clínicos. Se a anamnese for típica e o exame neurológico completamente normal, nenhuma avaliação complementar será necessária. As características da anamnese com mais probabilidade de prognosticar uma cefaleia por enxaqueca incluem fotofobia, náuseas e natureza incapacitante. Entretanto, se houver características atípicas da anamnese ou qualquer anormalidade no exame neurológico, recomenda-se a avaliação adicional. Pacientes com cefaleia em salvas e aquelas de causa indeterminada precisam de investigação por imagens para excluir as causas secundárias. Em pacientes com cefaleia de início agudo, a tomografia computadorizada é a melhor técnica para avaliar hemorragia aguda como causa, enquanto a investigação por imagens de ressonância magnética é melhor para avaliar as cefaleias mais persistentes à procura de lesões de massa, evidência de hipertensão ou hipotensão intracraniana, hemossiderina (hemorragia antiga) e anormalidades congênitas (p. ex., malformação de Chiari). Em indivíduos com mais de 60 anos com manifestaçãode cefaleia nova não explicada ou incomum, os índices de velocidade de hemossedimentação (VHS) e/ou de proteína C reativa (CRP) deverão ser medidos para avaliar quadro de arterite de células gigantes (ver Capítulo 69). A análise do líquido cefalorraquidiano (LCR), incluindo pressão de abertura, proteína, glicose, células, cultura e citologia, é indicada a pacientes com suspeita de hipertensão intracraniana ou meningite. TRATAMENTO O tratamento da cefaleia aguda depende do tipo e da intensidade. Para casos mais leves, analgésicos simples, como paracetamolA1 (500 a 1.000 mg), paracetamol com cafeína, ácido acetilsalicílico (250 a 1.000 mg)A2 e anti-inflamatórios não esteroidais ([AINEs],A3 por exemplo, ibuprofeno, 400 a 800 mg; naproxeno sódico, 220 a 500 mg; diclofenaco, 50 a 100 mg) serão suficientes. PREVENÇÃO Os medicamentos preventivos são recomendados quando as cefaleias são frequentes ou suficientemente intensas para interferir na qualidade de vida. A escolha de medicamentos deve se basear no tipo de cefaleia (enxaqueca ou tipo tensional), nos perfis de efeitos colaterais e nas comorbidades do paciente (Tabela 370.3). PROGNÓSTICO A história natural da cefaleia depende de muitos fatores, incluindo o tipo de cefaleia, as comorbidades que a acompanham e o sucesso do tratamento.4 Os fatores de risco para cefaleia crônica incluem sexo feminino, enxaqueca, cefaleias frequentes, obesidade, baixa escolaridade e nível socioeconômico, abuso de medicamentos, depressão, ansiedade, episódios estressantes da vida e apneia do sono. ENXAQUECA DEFINIÇÃO A enxaqueca é um distúrbio hereditário de dor de cabeça que se mostra tipicamente unilateral, mas, às vezes, bilateral, moderado a intenso, que piora com a atividade física, está associado a náuseas e/ou vômito e é acompanhado por fotofobia e fonofobia. A cefaleia ocorre a qualquer momento e persiste por 4 a 72 horas, podendo ocorrer com ou sem aura (um sintoma neurológico focal que pode ser visual, sensorial ou motor). Auras visuais podem mostrar características positivas (fotopsia) e negativas (escotomas). EPIDEMIOLOGIA A prevalência da enxaqueca é de 15 a 20% nas mulheres e de 4 a 7% nos homens. Nas crianças, a prevalência pode chegar a 17% e é igual em garotos e garotas. Na puberdade, a prevalência aumenta nas meninas, permanecendo mais alta em mulheres durante toda a vida, com pico entre os 25 e 55 anos. A enxaqueca com aura afeta 5% da população adulta e 90% das auras são visuais. Ela prevalece mais na população caucasiana e naquelas com situação socioeconômica ou renda mais baixa. As comorbidades que podem estar associadas à enxaqueca são epilepsia, acidente vascular encefálico (AVE), depressão ansiedade, infarto do miocárdio, forame oval patente, fenômeno de Raynaud, síndrome do intestino irritável e condições álgicas, como a fibromialgia. A menstruação e a ovulação podem aumentar a frequência de crises de enxaqueca. Tabela 370.2 Diagnóstico diferencial de cefaleia. CEFALEIA GENÉTICA EPIDEMIOLOGIA ASPECTOS CARACTERÍSTICOS DURAÇÃO SINAIS ASSOC Enxaqueca Genética complexa, mas geralmente história familiar Mais frequente nas mulheres Unilateral, bilateral; latejante; moderada a intensa; piora com o esforço Horas a dias Fotofob fonofo náuse vômit Cefaleia tensional Geralmente história familiar Frequência igual em homens e mulheres Dor semelhante a uma faixa apertada; bilateral; a dor pode ser leve a moderada; melhora com a atividade física Horas a dias Sem ná vômit sensi luz ou mas n Cefaleia em salvas Pode ter história familiar Mais frequente nos homens Dor intensa unilateral na face Minutos a horas Ptose ip miose edem pálpe lacrim Hemicraniana paroxística Em geral sem história familiar Mais frequente nas mulheres Dor unilateral na face Minutos Ptose ip miose edem pálpe lacrim respo indom Cefaleia curta unilateral com hiperemia conjuntival e lacrimejamento Sem história familiar Mais frequente nos homens Dor unilateral no olho; dor na órbita Segundos a 240 s Hiperem conju lacrim Hemicraniana contínua Sem história familiar Mais frequente nas mulheres Cefaleia unilateral contínua com Contínua Aspecto autôn episódio de dor aguda ipsila ptose rinorr de pá lacrim respo indom Tabela 370.3 Medicamentos preventivos para cefaleia. MEDICAMENTO USO RACIONAL DOSAGEM EFEITOS COLATERAIS CONTRAINDICAÇÕES/CU Betabloqueadores (p. ex., propranolol, nadolol, timolol) Enxaqueca, qualquer pessoa com pressão arterial elevada Propranolol, 20 a 80 mg: pode aumentar Letargia, depressão Asma, pressão arterial baix Antagonistas dos canais de cálcio: verapamil, anlodipino Cefaleia em salvas, pressão arterial elevada Verapamil, 120 a 480 mg/dia Pressão arterial baixa Anti-inflamatórios não esteroidais: Naproxeno, ibuprofeno Indometacina Enxaqueca, cefaleia tipo tensional e menstrual Hemicrania paroxística, hemicrania contínua Naproxeno, 200 a 600 mg/dia Ibuprofeno, 600 a 800 mg, 2 a 3 vezes/dia Indometacina, 25 a 50 mg, 3 vezes/dia Gastrintestinal Gastrintestinal Úlceras, sensibilidade, ale Úlceras; insuficiência rena Antidepressivos tricíclicos: amitriptilina, nortriptilina, imipramina Enxaqueca, cefaleia tipo tensional, qualquer pessoa com sono ruim 10 a 25 mg/noite; pode aumentar Boca seca, hipotensão ortostática, ganho de peso Sensibilidade Anticonvulsivos: topiramato, valproato Enxaqueca, cefaleia em salvas Topiramato, 25 a 50 mg, 2 vezes/dia; valproato, 250 a 500 mg, 2 vezes/dia Topiramato: perda de peso, cálculos renais, Gravidez – classificação D ambos hipertensão intraocular Valproato: ganho de peso Anticorpos bloqueadores de receptores de peptídios relacionados com o gene da calcitonina: erenumabe, fremanezumabe, galcanezunabe Enxaqueca, enxaqueca crônica Erenumabe 70 a 140 mg SC mensalmente; fremanezumabe 225 mg SC mensalmente; galcanezumabe 120 mg ou 240 mg SC mensalmente Vermelhidão no local da injeção; sintomas nasais Efeito desconhecido na gra BIOPATOLOGIA Acredita-se que aura da cefaleia por enxaqueca seja causada, em parte, pela depressão alastrante cortical, que está associada à breve redução de fluxo de sangue seguida por hiperemia.5 Essas alterações não parecem se correlacionar com a fase da cefaleia. A dor ocorre quando os aferentes trigeminais da dura-máter são estimulados. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A enxaqueca começa, com frequência, com um pródromo que pode persistir por horas a dias, quando os pacientes notam a dificuldade de concentração ou fadiga sem cefaleia. Pode haver ocorrência ou não de aura, geralmente presente antes que a cefaleia tenha início. A dor de cabeça pode ser uni ou bilateral, latejante, moderada a intensa e piorar com a atividade. As características clínicas que a acompanham incluem náuseas, vômito e sensibilidade à luz e ao som. Outras características clínicas incluem dor no pescoço, às vezes vertigem, osmofobia (sensibilidade a odores) e dificuldade de pensar de maneira clara. Em geral, a aura da enxaqueca é visual, mas pode ser sensorial ou incluir afasia ou vertigem. A aura da enxaqueca sem cefaleia começa com um transtorno neurológico (p. ex., um fenômeno visual), mas sem cefaleia subsequente. Embora se acredite que uma aura tradicionalmente venha antes da cefaleia, ela pode estar presente durante a fase desta. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de enxaqueca baseia-se na anamnese e no exame neurológico normal. O diagnóstico diferencial inclui principalmente a cefaleia tipo tensional, mas a maioria das cefaleias moderadas a intensas são enxaquecas.6 Em pacientes com anamnese sugestiva de uma cefaleia secundária, a avaliação complementar com a investigação por imagens de ressonância magnética deverá ser considerada (ver Tabela 370.2). Entretanto, se a cefaleia for típica de enxaqueca e os achados no exame neurológico estiverem normais, não há necessidade de estudos complementares. TRATAMENTO O tratamento da enxaqueca é dividido em tratamento da crise aguda e prevenção de ataques subsequentes. O tratamento agudo é mais efetivo com cuidados específicospara enxaqueca: um agente analgésico inespecífico ou a associação de analgésicos para crise mais leve e, com mais frequência, a terapia mais agressiva quando indicada (Tabela 370.4). Por exemplo, ataques leves podem, em geral, ser tratados com sucesso com analgésicos de venda livre, como paracetamol (dose sugerida de 650 a 1.000 mg) ou AINEs (ácido acetilsalicílico, 250 a 1.000 mg; ibuprofeno, 1.000 a 1.200 mg; naproxeno, 500 a 825 mg; diclofenaco, 50 mg; ou cetoprofeno, 75 mg). Se a enxaqueca for moderada a intensa, os pacientes se beneficiarão de terapias específicas para enxaqueca (ver Tabela 370.4), como triptanas (sumatriptana, zolmitriptana, rizatriptana, almotriptana, naratriptana, frovatriptana e eletriptana), ergotamina (di-hidroergotamina, tartarato de ergotamina) ou isometepteno,7 podendo a combinação de naproxeno mais sumatriptana ser melhor que qualquer um deles isoladamente.A4 (ver Tabela 370.4). Durante a gravidez, ataques leves a moderados podem ser tratados com paracetamol. Cefaleias moderadas podem responder à combinação de paracetamol, mucato de isometepteno (um vasoconstritor leve, 65 mg) e dicloralfenazona (sedativo leve, 100 mg). Agentes antieméticos incluem proclorperazina (10 a 25 mg) e metoclopramida (2,5 a 10 mg). A estratificação dos cuidados, incluindo adaptação do tratamento ao tipo de cefaleia, resulta em menos dias de incapacidade e menor uso de medicamentos. A melhor atuação de um fármaco específico para enxaqueca dependerá de paciente a paciente. É importante evitar o uso excessivo de analgésicos e de outros medicamentos (especialmente os opioides), porque pode causar cefaleia crônica diária em pacientes suscetíveis. O tratamento imediato melhora o desfecho da cefaleia, quando comparado ao tratamento tardio. As contraindicações ao uso de triptana (ver Tabela 370.4) incluem hipertensão não controlada, evidência clínica de doença cardíaca isquêmica e angina de Prinzmetal. Os opioides, como o N-acetil-p-aminofenol (APAP) com codeína, ou butorfanol, beneficiam algumas pacientes, mas a meperidina não é efetiva. Os opioides orais não devem ser usados para cefaleias primárias crônicas recorrentes, embora, às vezes, eles (p. ex., paracetamol, 325 mg, com codeína, 30 mg) costumem ser a única opção durante a gravidez ou em pacientes com doença vascular grave. Todo cuidado é exigido quando do uso dos opioides, com o reconhecimento dos riscos associados de cefaleia de rebote e dependência tanto pelo paciente quanto pelo médico. Os barbituratos (com cafeína e ácido acetilsalicílico ou paracetamol) não foram eficazes em estudos controlados, mas podem ser úteis em pacientes individuais nos quais outros fármacos específicos para enxaqueca não possam ser usados ou são contraindicados. Para ataques moderados a graves, as opções incluem di-hidroergotamina (1 a 2 mg intranasal), administração oral, intranasal ou subcutânea (SC) de sumatriptana (25 a 100 mg por via oral [VO], 20 mg intranasal ou 4 a 6 mg SC) ou outras triptanas (p. ex., naratriptana, 2,5 mg; zolmitriptana, 5 mg; rizatriptana, 10 mg; eletriptana, 40 mg; frovatriptana, 2,5 mg; ou almotriptana, 12,5 mg).A5 A ergotamina (2 mg sublingual ou 1 a 2 mg VO), quando aplicada logo no início do ataque de enxaqueca, pode ser efetiva se as náuseas associadas e a vasoconstrição periférica forem toleráveis. Os antagonistas do receptor de peptídios relacionados com o gene da calcitonina de moléculas pequenas são uma abordagem promissora para o tratamento de ataques de enxaqueca. Tanto o rimegepanto (75 mg VO) quanto o ubrogepanto (50 a 100 mg) podem fornecer cerca de 10% de alívio da dor dentro de 2 horas, quando comparados ao placebo.A5b,A5c Para ataques muito graves, a di-hidroergotamina (1 mg SC ou 0,5 a 1 mg por via intravenosa [IV]) é em geral efetiva, mas, em geral, demanda um antiemético (p. ex., prometazina, 25 mg) antes do uso IV. O cetorolaco de trometamina (60 mg por via intramuscular [IM] ou 30 mg IV), a proclorperazina (10 a 25 mg IM ou 10 mg IVA6 aplicados durante 5 minutos) ou a metoclopramida (10 mg IV)A7 são úteis para pacientes que não respondem ou tenham contraindicações aos agentes abortivos vasoativos. Uma abordagem experimental é a estimulação elétrica da pele dos braços, especialmente se aplicada nos primeiros 20 minutos do início da dor.A8 Tabela 370.4 Triptanas para tratamento de enxaqueca aguda. SUMATRIPTANA ZOLMITRIPTANA NARATRIPTANA RIZATRIPTANA Formas SC, nasal (NS), oral Oral: comprimido/ZMT, NS Oral Oral: comprimido/MLT Dose Oral: 50 a 100 mg(200 mg/24 h máx.) SC: 4 a 6 mg (12 mg/24 h máx.) NS: 5 a 20 mg (40 mg/24 h máx.) Nasal (22 mg) 2,5 a 5 mg (10 mg/24 h máx.) 5 mg (10 mg/24 h máx.) 1 a 2,5 mg (5 mg/24 h máx.) 5 a 10 mg (30 mg/24 h máx.) Meia-vida 2 a 3 h 3 a 4 h 6 a 8 h 2 a 3 h Cruza a barreira hematencefálica – + + + Uso com inibidor da monoamina oxidase (IMAO) – – + – Bom para recorrências – – + – Resposta rápida SC, 10 a 15 min NS, 15 a 20 min Oral, 30 min 30 min 1 a 4 h 30 min Enxaqueca menstrual + + + + Outras Combinado com naproxeno Reduzir dose à metade com propranolol máx. = máximo; MT = rizatriptana comprimido de fusão rápida; NS = spray nasal; SC = subcutâneo; ZMT = zolmitriptana comprimido de fusão rápida. PREVENÇÃO O tratamento preventivo (Tabela 370.3) é recomendado quando as cefaleias interferirem nas atividades em três ou mais dias por mês, se mostrarem intensas ou prolongadas ou a enxaqueca for complicada por eventos, como um infarto cerebral. As opções profiláticas incluem os bloqueadores beta- adrenérgicos, os antagonistas dos canais de cálcio, os AINEs, os antidepressivos tricíclicos, o valproato e o topiramato. Topiramato, valproato, timolol, propranolol, metoprolol, atenolol, nadolol, acebutolol, captopril, lisinopril e candesartana reduzem a frequência da enxaqueca em 50% ou mais, em comparação ao placebo, sem diferenças estatisticamente significativas entre eles.A9 Outras alternativas incluem cipro-heptadina, um fármaco serotoninérgico (4 a 20 mg), ou fenelzina (30 a 60 mg), um IMAO. A acupuntura e o biofeedback foram usados sem sucesso. A injeção de toxina onabotulínica A também é efetiva para a profilaxia da enxaqueca crônica.A10 A estimulação do nervo supraorbitárioA11 também foi aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) para prevenir enxaquecas. Uma abordagem nova e muito promissora são os anticorpos de peptídios relacionados com o gene da calcitonina.8 O erenumabe foi atualmente aprovado (70 a 140 mg SC mensalmente)A12,A13 e resultados benéficos semelhantes foram observados com fremanezumbe (225 mg SC mensalmente ou 675 mg por trimestre)A14,A15 e galcanezumabe (dose de carga de 240 mg e 120 mg mensalmente).A16,A16b PROGNÓSTICO O prognóstico para pacientes com enxaqueca varia. Em muitos, as cefaleias diminuem de intensidade com a idade, mas a aura da enxaqueca sem cefaleia torna-se mais frequente com a idade mais avançada. A modificação de fatores incitantes, como evitar gatilhos dietéticos (tiramina, feniletilamina, etanol), melhorar ou prevenir a insônia e evitar os gatilhos ambientais (luz, som, odor), pode melhorar o desfecho. As enxaquecas podem se tornar crônicas, definidas como mais de 15 dias por mês, especialmente quando associadas a obesidade, roncos, depressão e baixo status socioeconômico. Uma vez que a suscetibilidade genética para a enxaqueca com aura e AVE isquêmico parece ser compartilhada, é importante a atenção cuidadosa aos fatores de risco cardiovascular. CEFALEIA TENSIONAL DEFINIÇÃO A cefaleia tensional é definida como dor holocraniana leve ou moderada sem náuseas ou vômitos. Os pacientes podem manifestar fotofobia ou fonofobia, mas não ambas, e a cefaleia não piora com a atividade física. EPIDEMIOLOGIA A prevalência de 1 ano é de 14 a 93 por 100.000 indivíduos para a cefaleia tensional episódica e de 8,1 por 100.000 para cefaleia tensional crônica, sendo mais comuns nas mulheres que nos homens, independentemente da idade, da etnia e da escolaridade. Essas cefaleias são mais comuns nos países ocidentaise menos frequentes nos asiáticos, e são mais habituais em caucasianos que em afro- americanos. BIOPATOLOGIA A biopatologia da cefaleia tensional é menos compreendida que a de outros tipos de cefaleia, havendo aumento da sensibilidade miofascial, especialmente nos casos crônicos. Os fatores genéticos são incertos. As cefaleias de enxaqueca e tipo tensional coexistem em geral; embora estas não sejam causadas por emoção ou contração muscular, os gatilhos de uma cefaleia desse tipo são similares àqueles associados à enxaqueca: esforço, fadiga e falta de sono. As comorbidades em pacientes com cefaleia tipo tensional incluem depressão e ansiedade em mais de 50% dos indivíduos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Em geral, as cefaleias tensionais costumam ser leves a moderadas em intensidade, e a maioria dos indivíduos não busca atendimento médico. A cefaleia tensional pode ser episódica ( 15 dias por mês). Em muitos pacientes, a cefaleia permanece episódica, mas aproximadamente 25% dos casos progride para a cefaleia crônica. Entre os portadores de cefaleia tipo tensional crônica, cerca de um quarto a um terço continua crônica, a metade pode progredir para episódicas e em cerca de um quarto pode haver o desenvolvimento de cefaleia por abuso de medicamentos. Cefaleias episódicas tensionais podem durar minutos, horas ou dias. DIAGNÓSTICO As cefaleias que podem ser diagnosticadas de maneira incorreta como tensional incluem enxaqueca, hemicrania contínua, cefaleia nova e persistente desde o início e cefaleias causadas por tumores cerebrais, por pressão intracraniana alta ou baixa, ou por arterite de células gigantes. Uma anamnese cuidadosa é o melhor meio de diferenciar os outros tipos de cefaleia. TRATAMENTO Em geral, o tratamento das cefaleias tensionais episódicas é bem-sucedido9com paracetamol (650 a 1.000 mg) ou AINEs (ácido acetilsalicílico, 250 a 1.000 mg; naproxeno, 250 a 500 mg; ibuprofeno, 200 a 800 mg; cetoprofeno, 12,5 a 75 mg). Entretanto, o uso de analgésicos por mais de 3 dias por semana pode piorar as cefaleias e levar à cefaleia induzida por abuso de medicamentos. PREVENÇÃO As cefaleias tensionais crônicas podem se beneficiar do tratamento profilático com amitriptilina (com 10 mg ao deitar, aumentando-se lentamente até 100 mg, até que o paciente melhore ou efeitos colaterais intoleráveis se desenvolvam), nortiptrilina (25 a 100 mg no começo da noite), doxepina (25 a 75 mg/dia), maprotilina (10 a 25 mg/dia) ou fluoxetina (10 a 20 mg/dia). Os agentes tricíclicos são, em geral, mais eficazes que os inibidores seletivos de recaptação de serotonina.A17 Relaxantes musculares, fisioterapia, injeção de toxina botulínica localizada e acupuntura podem ser úteis.A18 PROGNÓSTICO O prognóstico para cefaleia tensional é variável. Adolescentes com esse tipo de cefaleia e dois ou mais fatores psiquiátricos (p. ex., depressão e ansiedade) têm pior prognóstico. CEFALEIA EM SALVAS E OUTRAS CEFALALGIAS AUTÔNOMAS TRIGEMINAIS DEFINIÇÃO As cefalalgias autônomas trigeminais, incluindo as cefaleias em salvas, são cefaleias unilaterais associadas a características autonômicas ipsilaterais. As outras cefalalgias autônomas trigeminais incluem hemicrania paroxística, caracterizada por surtos de cefaleia que persistem por 5 a 30 minutos, em geral unilateral, com ocorrência usual nas mulheres; esse tipo de cefaleia costuma responder à indometacina. A hemicrania contínua, outro tipo de cefaleia responsiva à indometacina e observada em homens e mulheres, caracteriza-se pela dor unilateral contínua e com características autônomas leves associadas; essa doença coexiste quase sempre com uma forma de cefaleia crônica diária. A cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento é uma cefalalgia autônoma trigeminal rara de ocorrência em homens; as dores individuais persistem por um curto período (segundos a 2 minutos). EPIDEMIOLOGIA A cefaleia em salvas ocorre em 56 a 401 por 100.000 indivíduos, sendo mais frequente nos homens (3:1 a 7:1). Em geral, os ataques aparecem entre os 20 e 30 anos. A hemicrania paroxística ocorre em 56 a 381 por 100.000 pessoas e afeta mais as mulheres (2:1), podendo aparecer em qualquer idade, mas com início, de modo geral, entre os 34 e os 41 anos. A cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento é rara, com preponderância leve nos homens (2:1). BIOPATOLOGIA A cefaleia em salvas pode ter predisposição genética. Os estudos de imagem, como a tomografia por emissão de pósitrons e a investigação por imagens de ressonância magnética funcional, mostram ativação hipotalâmica posterior inferior nos primeiros sintomas da cefaleia em salvas e outras cefalalgias autônomas trigeminais. Além disso, o complexo trigeminovascular e o sistema craniano autônomo são ativados. A biopatologia da hemicrania contínua ainda é desconhecida: existe um debate sobre se está associada ao envolvimento hipotalâmico ou mais próxima da enxaqueca. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A cefaleia em salvas é quase sempre unilateral, raramente bilateral e tem aspectos autonômos ipsilaterais característicos, incluindo lacrimejamento e hiperemia conjuntival e, às vezes, congestão nasal, rinorreia, ptose, miose, rubor e edema de pálpebra (Tabela 370.5).9b A dor se manifesta em geral atrás ou acima do olho, ou na têmpora, mas pode incluir testa, bochecha, dentes ou mandíbula. Ela atinge intensidade máxima em aproximadamente 9 minutos e tende a terminar de maneira abrupta. Os ataques ocorrem de 1 a 8 vezes/dia, sendo geralmente descrita como dor excruciante perfurante ou “penetrante”, que persiste por 15 minutos a 2 horas. Podem coexistir sintomas da enxaqueca, incluindo fotofobia unilateral, fonofobia e raramente uma aura. Diferentemente dos pacientes com enxaqueca, que, em geral, tentam descansar, os pacientes com cefaleia em salvas caminham de forma inquieta e não conseguem sentar ou deitar. As cefaleias em salvas, precipitadas quase sempre por álcool, histamina ou nitroglicerina, apresentam periodicidade diária e também sazonal. Por exemplo, um episódio de cefaleia em salvas pode ocorrer anualmente ou a cada 2 anos, em geral na mesma estação toda vez. A cefaleia em salvas crônica ocorre sem remissão. A hemicrania paroxística é uma dor de curta duração, em geral de 2 a 30 minutos, que ocorre unilateralmente ao redor do olho, da têmpora ou da região maxilar, às vezes precipitada por movimentos da cabeça. Pode haver características autonômicas semelhantes à cefaleia em salvas. A taxa de ataque usual é de até 40 episódios ao dia. Ataques de dor podem ser episódicos, separados por uma remissão, mas a maioria dos pacientes apresenta hemicrania paroxística crônica sem remissão. Os ataques de cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento são unilaterais e consistentemente do mesmo lado. Embora a dor seja excruciante, o ataque é curto, em geral de segundos; a maioria dos pacientes fica sem dor entre os ataques, embora possa haver uma subjacente. Aspectos autônomos associados incluem hiperemia conjuntival ipsilateral e lacrimejamento. DIAGNÓSTICO Os critérios diagnósticos para cefaleia em salvas incluem vários episódios de dor unilateral, orbitária, supraorbitária ou temporal que persistem por 15 a 180 minutos com, pelo menos, um dos aspectos a seguir: hiperemia conjuntival ipsilateral ou lacrimejamento, congestão nasal ou rinorreia, edema de pálpebra, transpiração da face e da testa, miose com ou sem ptose e inquietação ou agitação.10 Os ataques ocorrem entre uma e frequentemente 8 vezes/dia. Não há outra causa da cefaleia. A hemicrania paroxística é definida pela dor unilateral que persiste por 2 a 30 minutos, cerca de 5 vezes/dia, com um ou mais aspectos autonômicos, como hiperemia conjuntival, congestão nasal, edema de pálpebra, suor facial e na testa e miose ou ptose (ou ambas). A remissão completa pode se dar com indometacina. Hemicrania contínua é uma cefaleia unilateral que ocorre diária e continuamente sem períodoslivres da dor; sua intensidade é moderada, com exacerbações de dor intensa, durante as quais há pelo menos um aspecto autonômico ipsilateral: conjuntiva avermelhada, lacrimejamento, congestão nasal, ptose ou miose. A dor aqui responde à indometacina. A cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento é diagnosticada por dor penetrante temporal, supraorbitária, orbitária unilateral que persiste durante 5 a 240 segundos, na frequência de 3 a 200 por dia. Esse quadro está associado a hiperemia conjuntival e lacrimejamento, com a duração curta como a dor. Um exame de imagem como ressonância magnética é indicado para todos os pacientes nos primeiros sintomas de cefaleias em salvas ou outras cefalalgias autônomas trigeminais, pois elas podem ser o resultado de infecção (ver Capítulos 384 a 386), malformações vasculares (ver Capítulo 380), dissecação da carótida ou neoplasia, especialmente um tumor da hipófise (ver Capítulo 180). No diagnóstico diferencial, outras possibilidades incluem enxaqueca, cefaleia hípnica (cefaleias raras de curta duração exclusivamente durante o sono nos idosos) e neuralgia do trigêmeo. Tabela 370.5 Características de distinção das cefalalgias autônomas trigeminais. CARACTERÍSTICA EM SALVAS HEMICRANIA PAROXÍSTICA HEMICRANIA CONTÍNUA CEFALEIA NEURALGIFORME UNILATERAL BREVE COM HIPEREMIA CONJUNTIVAL E LACRIMEJAMENTO Sexo – F:M 1:3 a 7 2:1 2:1 1:2 Unilateral + + + + Frequência do ataque 1 a 8/dia 1 a 40/dia 3 a 200/dia 3 a 200/dia Duração do ataque 15 a 80 min 2 a 30 min Contínua, com exacerbações episódicas 5 a 240/s Aspectos autonômicos + + + com exacerbações + Efeitos da indometacina – +++ +++ – Tratamento agudo nos primeiros sintomas Oxigênio, sumatriptana SC, spray nasal DHE; sumatriptana ou zolmitriptana nasal spray (evidência nível A) Nenhum Nenhum Nenhum Medicamentos preventivos Verapamil, lítio, corticosteroides, anticonvulsivantes (nível A) Indometacina (nível A) Indometacina (nível A) Lamotrigina, topiramato, gabapentina (nível B) DHE = di-hidroergotamina; SC = subcutâneo. TRATAMENTO Em razão da brevidade da cefaleia, os medicamentos orais levam muito tempo para serem efetivos. O uso de oxigênio a 100%, a 7 a 10 ℓ/min durante 15 a 30 minutos, beneficia alguns pacientes.19 O spray nasal de sumatriptana ou zolmitriptana ou sumatriptana SC (4 a 6 mg) pode ser útil.11 A di- hidroergotamina pode ser útil quando administrada por via nasal, intramuscular ou até intravenosa. A estimulação do nervo vago foi recentemente aprovada para cefaleia em salvas aguda.A20 Os casos refratários podem responder à estimulação do gânglio esfenopalatino e do nervo occipital. As hemicranias paroxísticas crônicas e a hemicrania contínua são caracterizadas por resposta à indometacina, 25 a 50 mg, 3 vezes/dia. Os ataques de cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento são tão breves que não há medicamentos para o tratamento agudo do episódio. PREVENÇÃO Os medicamentos preventivos devem ser iniciados no início de um surto de salvas, sendo o cloridrato de verapamil, 240 a 480 mg, o fármaco preferido. O lítio (300 mg, 2 vezes/dia) é uma alternativa. Os corticosteroides (p. ex., prednisona, 40 mg/dia, ou dexametasona, 4 mg, 2 vezes/dia, durante 2 semanas) atuam rapidamente como uma ponte para evitar a cefaleia em salvas, enquanto se iniciam outros medicamentos preventivos. Ácido valproico (500 a 1.500 mg/dia em doses divididas), topiramato (50 a 100 mg/dia), melatonina (4 mg ao deitar) e gabapentina (300 mg, 3 vezes/dia) são, às vezes, benéficos. Galcanezumabe, um anticorpo monoclonal para o peptídio relacionado com gene da calcitonina, na dose de 300 mg SC, 1 vez/mês, pode reduzir de maneira significativa a frequência semanal de ataques de cefaleia em salvas episódica.A20b Abordagens cirúrgicas, incluindo injeções suboccipitais de esteroides, estimuladores do nervo occipital, estimulação do gânglio esfenopalatino, estimulação hipotalâmica e procedimentos destrutivos, são, às vezes, necessárias para essa cefaleia incapacitante. A hemicrania paroxística e a hemicrania contínua respondem à indometacina (25 a 50 mg, 3 vezes/dia). Se o paciente não tolerar esse fármaco, bloqueadores dos canais de cálcio (p. ex., verapamil, 240 a 480 mg/dia) ou melatonina poderão ser úteis. O tratamento preventivo da cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento inclui lamotrigina (100 a 400 mg/dia), topiramato (50 a 100 mg), gabapentina (300 a 900 mg) ou lidocaína intravenosa (iniciando-se com 1 a 2 mg/min, com monitoramento cardíaco). A cefaleia neuralgiforme unilateral curta com hiperemia conjuntival e lacrimejamento é considerada a cefaleia mais difícil de prevenir. Lamotrigina e topiramato podem ser úteis. PROGNÓSTICO Com frequência, a cefaleia em salvas é um problema vitalício, mas as remissões podem persistir por períodos mais longos à medida que o paciente envelhece. As outras cefalalgias autônomas trigeminais são provavelmente perenes; mas, apesar disso, o tratamento sintomático, combinado com medicamentos preventivos, é útil. CEFALEIA CRÔNICA DIÁRIA DEFINIÇÃO Embora não seja um distúrbio específico, a cefaleia crônica diária, definida como a presença de cefaleia em mais de 15 dias por mês, é desafiadora para pacientes e médicos. Essas situações podem ser enxaqueca crônica, cefaleia tipo tensional crônica, cefaleia de aparecimento recente e persistente desde o início ou cefaleia em salvas crônica, com ou sem o uso exagerado de medicamentos. EPIDEMIOLOGIA Até 5% da população sofre de cefaleia crônica diária, mais em geral do tipo tensional crônica ou enxaqueca crônica. Os fatores que desencadeiam o episódio, como infecção prévia, lesão craniana leve ou episódio de vida extremamente desgastante, estão presentes em 40 a 60% dos pacientes com cefaleia nova e persistente desde o início. Os fatores de risco para cefaleia crônica diária incluem uso exagerado de medicamentos, história de cefaleia por enxaqueca, cefaleia frequente, depressão, sexo feminino, obesidade, roncos, episódios estressantes da vida e baixo nível educacional. BIOPATOLOGIA A cefaleia crônica diária está provavelmente relacionada com a enxaqueca, com anormalidades centrais e periféricas. Uma vez que a enxaqueca tenha sido prolongada e a cefaleia ocorra diariamente, a alodinia, ou a sensação de que um estímulo em geral não dolorido esteja se tornando dolorido, se desenvolve com frequência. O uso de um opioide por mais de 8 dias por mês, principalmente nos homens, de barbitúricos por mais de 5 dias por mês, em especial nas mulheres, ou de triptanas por mais de 10 a 14 dias por mês pode, com frequência, levar à cefaleia por enxaqueca crônica ou, pelo menos, à piora das cefaleias. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A cefaleia nova e persistente desde o início se caracteriza pela ocorrência diária, com início em um momento específico e em um curso implacável. Em geral, o episódio é bilateral, não pulsante, leve a moderado e associado a aspectos de enxaqueca, fotofobia, fonofobia ou náuseas. Náuseas e vômito graves são raros. Esse tipo de cefaleia pode ser incapacitante e difícil de tratar. A cefaleia crônica diária está com frequência associada a uma comorbidade psiquiátrica profunda, especialmente depressão e ansiedade; tal comorbidade psiquiátrica prognostica a situação de doença não tratável. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de cefaleia crônica diária baseia-se na anamnese. É importante identificar o tipo subjacente de cefaleia crônica diária primária: enxaqueca crônica, dor de cabeça tipo tensional crônica, cefaleia nova e persistente desde o início ou hemicrania contínua. As cefaleias com menos de 4 horas de duração também podem ser crônicas e diárias: cefaleia em salvas, hemicrania paroxística, cefaleias hipnóticas com ocorrência todas as noites (em geral nos idosos) e cefaleia penetrante episódica.12 É mais importante excluir as cefaleias secundárias (incluindo a cefaleia pós-traumática), as cefaleias associadas adistúrbios vasculares (p. ex., arterite de células gigantes, malformações arteriovenosas, dissecções da carótida e da artéria vertebral) e as cefaleias associadas a distúrbios não vasculares (p. ex., hipertensão ou hipotensão intracraniana, infecções). A investigação por imagens por ressonância magnética e os estudos laboratoriais (p. ex., VHS em um indivíduo idoso) são em geral recomendados. A punção lombar para avaliar a pressão intracraniana também pode ser indicada a pacientes selecionados. TRATAMENTO A causa mais comum de cefaleia crônica diária é o uso exagerado de medicamentos, de modo que os pacientes precisam ser desintoxicados do uso exagerado de medicamentos sintomáticos.13 O tratamento da depressão subjacente, ansiedade e dor também pode ser útil. Às vezes, a admissão ao hospital é necessária para romper o ciclo da cefaleia. Tratamentos específicos para cefaleia aguda (comentários anteriores), especialmente a di-hidroergotamina intravenosa (0,5 a 2 mg), ajudam na interrupção dos ataques dessas cefaleias. PREVENÇÃO Os medicamentos que ajudam a prevenir a ocorrência de cefaleia crônica diária incluem antidepressivos tricíclicos, inibidores seletivos de recaptação de serotonina – se os pacientes se mostrarem depressivos –, anticonvulsivantes, betabloqueadores e bloqueadores dos canais de cálcio (ver Tabelas 370.3 e 370.4). Para hemicrania contínua, a indometacina (25 a 50 mg, 3 vezes/dia) é o tratamento preferido. PROGNÓSTICO O prognóstico depende do diagnóstico da cefaleia subjacente. Depressão, ansiedade, sono ruim, estresse, uso exagerado de medicamentos e baixa autoestima estão associados a um prognóstico pior entre pacientes com cefaleias crônicas. Se o uso exagerado de medicamentos for a causa e a desintoxicação do paciente for bem-sucedida, haverá melhora de cerca de 75% dessa população quando tratada com medicamentos preventivos. O tratamento pode falhar se o diagnóstico for incorreto em razão do uso exagerado e contínuo de medicamentos, uso exagerado de cafeína, falta de sono ou outros gatilhos de vida dietéticos, fatores hormonais ou psiquiátricos. A explicação ao paciente da cefaleia por uso exagerado de medicamentos, a desintoxicação tanto do paciente internado quanto do ambulatorial e os tratamentos de cuidados multidisciplinares foram considerados úteis. A cefaleia nova e persistente desde o início não costuma responder à terapia clínica. CAUSAS SECUNDÁRIAS DE CEFALEIAS Cefaleia associada à sinusopatia A rinossinusite (ver Capítulo 398) caracteriza-se pela inflamação ou infecção da mucosa nasal e dos seios paranasais. Os seios são relativamente insensíveis, mas os ductos, as conchas nasais, os vasos sanguíneos e os óstios são estruturas doloridas. As cefaleias atribuídas à rinossinusite são frontais, com dor na face, nas orelhas ou nos dentes. O início da dor é simultâneo à rinossinusite, e a cefaleia e a dor na face se resolvem em 7 dias, após o tratamento bem-sucedido. O diagnóstico demanda exames de imagem e evidências clínicas que apoiem o diagnóstico de rinossinusite aguda. Muitas cefaleias agudas e a maioria das crônicas inicialmente consideradas resultantes de doença de seios paranasais foram identificadas como tipo de enxaqueca ou de tensão. A cefaleia deve desaparecer com o tratamento para sinusite aguda (ver Capítulo 398). Se isso não ocorrer, trata-se, provavelmente, de cefaleia primária subjacente. Arterite temporal (de células gigantes) A arterite temporal (ver Capítulo 255) é um processo inflamatório observado quase exclusivamente em indivíduos idosos. A cefaleia, especialmente dor na mandíbula na mastigação, é um dos aspectos mais comuns. Tem incidência de aproximadamente 12 por 100.000 e aumenta com a idade para 51 por 100.000 em indivíduos com mais de 80 anos. Esse quadro afeta mais as mulheres (3:1) e é mais comum em caucasianos, especialmente aqueles descendentes de escandinavos e ingleses, e está associado à polimialgia reumática. A cefaleia não tem aspecto específico, mas a dor é em geral contínua, generalizada e ocasionalmente penetrante. As têmporas ficam doloridas em geral, e os pacientes se queixam de dor quando executam algumas atividades da vida diária, como mastigar alimentos ou pentear os cabelos. Podem ocorrer também quadros de cegueira monocular transitória (amaurose fugaz), cegueira permanente e diplopia. A elevação da VHS e da proteína C reativa ocorre quase invariavelmente e o diagnóstico é feito pelo encontro de células gigantes em uma amostra de biopsia de artéria temporal. O tratamento imediato com corticosteroides, às vezes antes de o resultado da biopsia estar disponível, é necessário em doses entre 40 e 80 mg/dia, com a dose então titulada para baixo enquanto se monitora a VHS ou a proteína C reativa. Quando usados precocemente o suficiente, os corticosteroides (ver Capítulo 255), em geral, previnem as complicações da arterite temporal, incluindo a cegueira. Tocilizumabe (162 mg/semana SC, ou semana sim, semana não) está aprovado para fornecer remissão sustentada sem corticosteroides em pacientes com arterite.A21O problema pode ter longa duração. Hipertensão intracraniana e pseudotumor cerebral A hipertensão intracraniana pode ser primária e idiopática ou secundária a uma trombose venosa cerebral (ver Capítulo 379), lesão cerebral (ver Capítulo 180), hidrocefalia ou outros processos intracranianos. Pseudotumor cerebral é um termo abrangente que se refere ao aumento da pressão intracraniana sem lesões expansivas óbvias. A hipertensão intracraniana idiopática primária ocorre em mulheres obesas em idade fértil. Pseudotumor cerebral secundário causa síndrome semelhante, mas se deve a um agente causal, como medicamentos (p. ex., tetraciclina, minociclina, lítio, fluoroquinolonas, fármacos relacionados com a vitamina A, hormônio do crescimento), distúrbios endócrinos (p. ex., disfunção da paratireoide) e apneia do sono. Hipertensão intracraniana idiopática ocorre em 1 a 2 em 100.000 indivíduos, mas em 19 a 20 por 100.000 indivíduos (15 a 55 anos) em obesos. As mulheres são acometidas com mais frequência (6 a 8:1) e os primeiros sintomas surgem, em geral, no adulto jovem. A causa da pressão aumentada é a má absorção do LCR, pois se acredita que seja o problema em hipertensão intracraniana idiopática; hipertensão venosa, como se observa na trombose venosa; ou lesão expansiva, que causa aumento na pressão. Um componente genético também é possível, pois existem relatórios desse quadro com ocorrência em famílias. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A hipertensão intracraniana idiopática caracteriza-se por cefaleia em mais de 90% das pessoas, das quais 90% são obesas. A cefaleia pode ser pulsátil e é sentida principalmente atrás dos olhos. Os pacientes quase sempre informam dor no pescoço, dor na porção superior das costas ou até mesmo dor radicular. A intensidade da cefaleia não se correlaciona com o grau de elevação da pressão intracraniana. Uma manifestação associada frequente é tinido sincronizado com o pulso arterial, assim como alterações visuais transitórias e diplopia. A qualidade de vida relacionada à visão fica, em geral, reduzida. No exame, pode-se encontrar papiledema (ver Capítulo 395, Figura 395.25). O restante do exame geral e neurológico se mostra em geral normal em pacientes com hipertensão intracraniana idiopática, mas as anormalidades no exame podem apontar para uma causa secundária, como trombose do seio venoso subjacente (ver Capítulo 379), AVE isquêmico, infecção do sistema nervoso central (ver Capítulos 384 e 385) ou tumor cerebral (ver Capítulo 180). Embora a hipertensão intracraniana idiopática costume persistir durante anos, o quadro pode ser autolimitado. Em cerca de um terço dos pacientes ocorre sequelas visuais permanentes relacionadas com o efeito do papiledema. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de elevação da pressão intracraniana é feito pelos sinais e sintomas, como papiledema (ver Capítulo 395, Figura 395.25), mas em até 40% dos casos de hipertensão intracraniana presumida eles não são confirmados por avaliaçãode um especialista, em geral em razão de um diagnóstico inicialmente inexato de papiledema.14 A investigação por RM é necessária para excluir causas secundárias da pressão intracraniana aumentada. A venografia por ressonância magnética ou tomografia computadorizada é, com frequência, necessária para excluir a trombose de seio venoso (ver Capítulo 379). É preciso realizar punção lombar, a menos que o paciente tenha uma contraindicação, como lesão expansiva intracraniana, com a aferição da pressão do LCR. O diagnóstico será confirmado se a pressão estiver elevada (LCR > 250 mmH2O) e o líquido normal em termos de níveis de proteína, de glicose e de contagem de células. Os campos visuais precisam ser examinados formalmente, porque a acuidade visual só é comprometida em uma fase avançada da doença. TRATAMENTO A acetazolamida (doses variando de 500 a 4.000 mg/dia), combinada com um programa de perda de peso, é mais eficaz para indivíduos com hipertensão intracraniana idiopática e perda visual leve a moderada que o placebo.A22,A23 Qualquer causa secundária subjacente também deve ser tratada (p. ex., suspensão de um medicamento causal, tratamento da apneia do sono [ver Capítulo 377]). A perda de peso é benéfica em pacientes obesos. Se a perda visual piorar, procedimentos cirúrgicos deverão ser considerados. A fenestração da bainha do nervo óptico permite que o LCR escape pelas fendas ou janelas na órbita; às vezes, o tratamento de um lado também reduz o edema do disco óptico contralateral. As complicações incluem perda visual ou diplopia, de modo que os campos visuais devem ser cuidadosamente acompanhados para antecipar e prevenir a perda visual. Procedimentos de derivação ventrículo-peritoneal ou lomboperitoneal também reduzem a pressão intracraniana, mas suas complicações incluem infecção e obstrução da derivação. A colocação de stents no seio venoso tem sido usada às vezes para estenoses fixas.15 PROGNÓSTICO O prognóstico de pacientes com hipertensão intracraniana idiopática é bom com tratamento, mas até um terço dos pacientes não tratados de maneira adequada pode sofrer defeitos permanentes dos campos visuais ou perda da acuidade visual. Os indivíduos são suscetíveis à recorrência se ganharem peso de maneira súbita. Hipotensão intracraniana A hipotensão intracraniana (ou hipovolemia do LCR) causa cefaleia que melhora caracteristicamente quando o paciente se deita e piora quando ele está em pé. Ela pode ser primária (espontânea) ou secundária a outra causa subjacente, mais comumente uma punção lombar prévia. A hipotensão intracraniana já foi considerada rara, mas as técnicas modernas da investigação por imagens sugere incidência de aproximadamente 5 casos em 100.000 por ano, sendo o distúrbio levemente mais comum nas mulheres. Os primeiros sintomas se dão, em geral, por volta dos 40 anos, mas podem ocorrer em crianças e nos idosos. As cefaleias pós-punção lombar ocorrem de maneira mais usual, mas raramente persistem. BIOPATOLOGIA Acredita-se que a causa da hipotensão intracraniana primária seja um pequeno extravasamento ou laceração na dura-máter, em geral na região lombar ao redor de estruturas císticas denominadas cistos de Tarlov. A causa desse distúrbio não é a laceração, mas sim o baixo volume de LCR e a pressão venosa epidural baixa que ajuda no desenvolvimento da pressão mais baixa e, daí, no extravasamento. Esses extravasamentos ocorrem com frequência na coluna de junção torácica e cervicotorácica. A história prévia de traumatismo é informada em apenas um terço dos casos. Distúrbios genéticos e do tecido conjuntivo (p. ex., síndrome de Ehlers-Danlos, síndrome de Marfan [ver Capítulo 244]) podem predispor os indivíduos a apresentar esses extravasamentos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A hipotensão intracraniana caracteriza-se, clinicamente, por cefaleia posicional. O local da dor varia e a característica mais constante é a alteração ortostática na dor. Se o extravasamento não for tratado por muito tempo, a cefaleia pode perder a característica ortostática. Dor na nuca também pode ocorrer. Alterações da audição, do paladar e do equilíbrio, assim como borramento visual e diplopia, podem se desenvolver se ocorrer herniação do rombencéfalo. Se ocorre herniação significativa do rombencéfalo, os pacientes apresentam alterações no nível de consciência, higromas subdurais, ataxia e demência pseudofrontotemporal. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de hipotensão intracraniana é feito por ressonância magnética mostrando realce paquimeníngeo, ingurgitamento venoso, espessamento da dura-máter, alargamento da sela turca e herniação do rombencéfalo (Figura 370.1). A herniação do rombencéfalo aparece como uma inclinação descendente da fossa posterior com perda da cisterna pré-quiasmática, achatamento da ponte contra o clivo e descida das tonsilas cerebelares, o que é com frequência interpretado erroneamente como malformação de Chiari I. A punção lombar também pode mostrar pressão baixa do LCR (alimentos. Uma vez que o episódio de dor seja desencadeado, existe geralmente um período refratário no qual ela não ocorrerá. DIAGNÓSTICO Os critérios diagnósticos incluem ataques paroxísticos de dor que persistem durante 1 segundo a 2 minutos e afetam uma ou mais divisões do nervo trigêmeo. Para fazer o diagnóstico, a dor tem de ser intensamente aguda, penetrante ou precipitada por um gatilho. Cada ataque é estereotípico e não há, em geral, outros defeitos neurológicos. A neuralgia do trigêmeo idiopática não tem, por definição, uma lesão causal, ao passo que a neuralgia do trigêmeo sintomática tem uma causa, como compressão vascular da zona de saída da raiz do nervo trigêmeo. O diagnóstico diferencial inclui cefalalgia autônoma trigeminal, com manifestações autônomas não associadas à neuralgia do trigêmeo. Dor facial atípica, cefaleia penetrante idiopática e síndrome de Tolosa-Hunt, uma síndrome inflamatória do seio cavernoso anterior, também estão incluídas no diagnóstico diferencial. A RM é recomendada para avaliar causas secundárias possíveis de neuralgia do trigêmeo, como desmielinização, tumores e alças vasculares na zona de saída do nervo trigêmeo. TRATAMENTO A neuralgia do trigêmeo é tratada com medicamentos ou cirurgia.19 A carbamazepina (400 a 1.200 mg) é considerada o agente de primeira linha para a neuralgia. Fenitoína (200 a 300 mg), baclofeno (40 a 80 mg), clonazepam (2 a 6 mg), ácido valproico (500 a 1.500 mg), lamotrigina (100 a 400 mg), gabapentina (900 a 1.800 mg), oxcarbazepina (300 a 1.800 mg), levetiracetam (2 a 4 g) e topiramato (50 a 200 mg) também são usados. A toxina botulínica pode ser efetiva para esse transtorno. Os tratamentos cirúrgicos incluem descompressão microvascular, que alivia os sintomas e preserva a função sensorial. Outros tratamentos incluem a destruição parcial do nervo trigêmeo com calor (lesões por radiofrequência) ou com glicerol (destruição química). PROGNÓSTICO Pacientes com neuralgia trigeminal podem manifestar remissões espontâneas ou induzidas por medicamentos. A descompressão microvascular é, com frequência, curativa, quando adequadamente indicada. Em pacientes cuja dor é desencadeada pela mastigação, a perda de peso e a inanição podem se desenvolver e o tratamento imediato é essencial. Neuralgia do glossofaríngeo Menos comum que a neuralgia do trigêmeo, a neuralgia do glossofaríngeo é uma dor unilateral na distribuição dos nervos glossofaríngeo e vago na orelha, mandíbula, garganta e base da língua. Essa neuralgia é rara, com prevalência de menos de 1 por 100 mil pessoas. Acredita-se que a causa seja a compressão do nervo glossofaríngeo por vasos sanguíneos, tumor ou aneurisma e desmielinização ou infecção. Os episódios de dor são paroxísticos e persistem por menos de segundos a 2 minutos, mas os pacientes podem experimentar 30 a 40 ataques por dia. Como na neuralgia do trigêmeo, a dor é desencadeada ao mastigar, engolir ou falar. A1. A2. A3. A4. A5. A5b. A5c. A6. A7. A8. A9. A10. A11. A12. A13. A14. A15. A16. A16b. A17. A18. A19. A20. O diagnóstico é feito clinicamente. A ressonância magnética deve ser feita para avaliar o nervo glossofaríngeo, a fim de excluir um tumor ou uma anormalidade vascular. O diagnóstico diferencial inclui neuralgia do trigêmeo, neuralgia geniculada e síndrome de dor atípica. A terapia farmacológica é semelhante à da neuralgia do trigêmeo; a carbamazepina (200 a 800 mg) geralmente é o fármaco de escolha. Tratamento cirúrgico e descompressão microvascular ou ablação por radiofrequência devem ser considerados em pacientes cuja perda de peso não responda prontamente à medicação. Stephens G, Derry S, Moore RA. Paracetamol (acetaminophen) for acute treatment of episodic tension-type headache in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2016;6:CD011889. Derry S, Wiffen PJ, Moore RA. Aspirin for acute treatment of episodic tension-type headache in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1:CD011888. Derry S, Wiffen PJ, Moore RA, Bendtsen L. Ibuprofen for acute treatment of episodic tension-type headache in adults. Cochrane Database Syst Rev. 2015;7:CD011474. Law S, Derry S, Moore RA. Sumatriptan plus naproxen for the treatment of acute migraine attacks in adults. 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Resposta: A O diagnóstico mais provável é o de enxaqueca. Embora seja mais frequente em mulheres, os homens também têm enxaqueca. Se a cefaleia estiver associada a fotofobia/fonofobia e náuseas, o diagnóstico não pode ser cefaleia tensional. A hemicrania contínua, em geral, é unilateral e, embora possa durar por longos períodos, ela pode apresentar sintomas autônomos. A dor facial atípica não é, na verdade, um diagnóstico nesse caso, porque há aspectos de uma enxaqueca. Uma paciente de 35 anos apresenta cefaleia unilateral sobre o olho direito, bem como lacrimejamento, hiperemia conjuntival e dor ocular. As cefaleias persistem por 40 minutos e ocorrem diariamente, em geral no início da noite. O diagnóstico correto é de: Hemicrania paroxística. Cefaleia em salvas. Hemicrania contínua. Glaucoma agudo. Resposta: B Ela manifesta dor breve unilateral com dois aspectos autônomos diagnósticos de cefaleias em salvas. Embora os homens tenham mais probabilidade de ter esse transtorno, as mulheres também sofrem esse tipo de cefaleia. A hemicrania paroxística seria mais curta, com duração, em geral, de menos de 30 minutos. A hemicrania contínua tem duração mais longa e o glaucoma agudo não seria intermitente nem ocorreria somente em um momento específico. Mulher de 30 anos manifesta cefaleias cada vez mais frequentes, caracterizadas por cefaleia holocraniana bilateral, fotofobia, náuseas e, raramente, vômito. As cefaleias ocorrem 25 dias por mês, e ela está atualmente em uso de medicação combinada com paracetamol/butalbital quase diariamente. O diagnóstico mais provável é de: Enxaqueca crônica. Enxaqueca crônica por uso excessivo da medicação. Cefaleia tensional crônica. Cefaleia tensional crônica por uso excessivo de medicação. 4. A. B. C. D. E. Resposta: B O diagnóstico mais provável é de enxaqueca crônica por uso excessivo da medicação, porque ela tem cefaleia mais de 15 dias por mês e usa medicação que contém butalbital por mais de 3 dias na semana. A cefaleia pode reverter para enxaqueca episódica ou crônica quando da redução desse tratamento agudo diário de resgate. A cefaleia está associada a náuseas e, raramente, a vômito, de modo que essa não é uma cefaleia tipo tensional. Uma paciente de 30 anos apresenta cefaleia crônica diária, tinido pulsátil e episódios de borramento visual. Ao exame, ela manifesta papiledema. Qual avaliação você faria? Ressonância magnética (RM) e punção lombar (PL). RM, PL e campos visuais. Tomografia computadorizada (TC). PL somente. Nenhuma das anteriores. Resposta: B A RM é solicitada para investigar lesões expansivas e, com frequência, consegue mostrar trombose de seio venoso. A PL tem de ser feita não só para se ter certeza de que a pressão de abertura esteja elevada, mas também de que o líquido cefalorraquidiano se mostre normal. Os campos visuais têm de ser examinados e monitorados para prevenir cegueira; só a análise de acuidade visual não é suficiente. As TCs são úteis para descartar lesões expansivas, mas isoladamente não são adequadas. A PL isolada sem exames de imagem é contraindicada e também se o paciente tiver malformação de Chiari I significativa associada.