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Novos paradigmas de gestão de segurança do trabalho Embora durante milênios saúde e trabalho tenham sido tratados como conceitos sem qualquer relação, hoje em dia são basicamente inseparáveis. Quando se fala em Segurança e Saúde do Trabalho (SST) nas Organizações não se faz referência apenas aos profissionais que constituem o Serviço de Engenharia e Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), aos gestores e líderes responsáveis pela tomada de decisões nas Organizações; mas sim a Gestão da SST (BRISTOT, 2019). A gestão de saúde e segurança do trabalho contempla as ações preventivas, o conhecimento dos pontos de vulnerabilidade e dos riscos que possibilitem a ocorrência de sinistros, cujo fim, em última instância, é a implementação de uma cultura de prevenção e um cronograma de atividades em prol da preservação da saúde dos indivíduos (BRISTOT, 2019). Nesse sentido, os próximos tópicos trarão conceitos relativos à engenharia de resiliência, discutindo o erro humano e suas influências nos sistemas sob uma ótica um pouco diferente da usual: mostrando que o erro é inevitável. Portanto, será abordada a importância das defesas dos sistemas e como elas atuam em um sistema resiliente. Resiliência e segurança do trabalhador Embora resiliência seja uma palavra bastante difundida, sua associação com a engenharia originou o termo engenharia de resiliência de resiliência, que é relativamente novo. A resiliência consiste na capacidade de organização de um sistema para que este se mantenha em funcionamento ou recupere rapidamente um a sua estabilidade mediante a existência de perturbações ou tensões significativas. Resiliência envolve as habilidades de absorção das tensões, da preservação em operação contínua apesar da presença de adversidades, bem como a construção de aprendizados a partir de eventos prévios para sua recuperação em outros futuros (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Assim, os sistemas resilientes são aqueles que possuem a capacidade de retornar ao para o estado inicial, após um evento adverso, sem gerar consequências severas para o universo do qual fazem parte. Por esse motivo, são mais seguros e produtivos, uma vez que toleram estresses e mesmo assim se mantêm operando. Quando tratamos da segurança do trabalhador, ter um sistema resiliente é determinante para minimizar os possíveis desdobramentos de uma situação indesejada que culmine num acidente de trabalho, evitando consequências mais sérias e até mesmo fatais (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Nessa perspectiva, um sistema resiliente deve impedir a morte de um trabalhador frente a sua capacidade de absorver as perturbações não esperadas ou desejadas. Isso significa que organizações que possuem altas taxas de gravidade de acidentes de trabalho não são dotadas de sistemas resilientes, visto os acidentes são severos e produzem consequências muito impactantes para as vítimas, para os colegas desse trabalhador, para a família do acidentado e para a sociedade no geral (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Sabendo então qual é o caminho a ser trilhado, Mattos e Másculo esclarece que é preciso reconhecer que as seguintes afirmações não são realistas sobre as organizações (MATTOS; MÁSCULO, 2019): · Os sistemas são bem desenhados e mantidos que a planta física é segura; · Os designers dos sistemas são capazes de antecipar as possíveis contingências de forma eficiente, não sendo prováveis as surpresas; · Os procedimentos são completos, apropriados, factíveis e aplicáveis a qualquer ocasião; · As pessoas se comportarão da forma que foram treinadas e conforme o esperado; · Estar de acordo com os requisitos nos mantém seguros; · Se as avaliações e auditorias obtêm resultados positivos, não é necessário mudar nada, pois tudo vai bem. Apenas desmistificando de uma vez que todas essas afirmações são falsas, pois não importa o quanto se planeje, se previna e se preocupe com a ocorrências de falhas e eventos incomuns, nenhum sistema é perfeito. Logo, para criar segurança e confiabilidade é impreterível ter resiliência (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Sistemas resilientes e suas defesas Sempre que se fala de acidentes de trabalho pensa-se nos trabalhadores, visto que estes interagem com os sistemas de forma contínua. Tal interação está associada à tomada de decisão, com base no comportamento e nas mensagens que o sistema envia. Mattos e Másculo (2019, p.485) exemplificam com a seguinte situação: Um operador de máquina, por exemplo, vai tomar a decisão de aumentar o fluxo de lubrificação, diminuir a rotação, ou até mesmo parar a máquina, de acordo com as informações que esta mesma máquina envia (nesse caso, leitura do nível de óleo, temperatura/vibração, e limites de segurança excedidos respectivamente). Nessa relação existem vários fatores que influenciam diretamente o comportamento do trabalhador, que pode, dependendo de como esses fatores o influenciam, cometer um erro e gerar um desequilíbrio no sistema (MATTOS; MÁSCULO, 2019, p. 485). Entre 80 e 90% dos acidentes no ambiente de trabalho são causados por erros humanos, sendo de extrema importância o controle e monitoramento das causas dos erros e a preparação dos sistemas para lidar com eles com resiliência. É importante estar ciente de que esses erros são induzidos pelo sistema aos trabalhadores pela existência de procedimentos confusos e dúbios, sinalização de deficiente, sensores sem manutenção, dentre outras condições existentes nos sistemas que podem gerar uma ação (ou não ação) equivocada por parte do trabalhador (MATTOS; MÁSCULO, 2019). De acordo com Mattos e Másculo (2019) alguns fatores localizados podem ser manipulados e gerenciados com inteligência a fim de mudar um comportamento de risco bruscamente, tais como: · Expectativas da empresa em relação ao trabalhador, as quais devem ser claras, sendo propriamente compreendido pelo funcionário que sua atuação deve ser pautada primeiramente em prol da segurança e só depois na produção. Quando não está bem estabelecido esse entendimento, pode o trabalhador tomar decisões equivocadas. Vale a máxima “segurança em primeiro lugar”, segundo a qual tanto os indivíduos quanto o processo serão preservados. · Ferramentas e recursos disponíveis para a execução das tarefas são fatores essenciais para a segurança do processo, pois guardam relação direta com o método e os procedimentos de trabalho, devendo atender a padrões rígidos de segurança. Se ocorrer, por exemplo, do trabalhador adaptar uma ferramenta, a possibilidade de algum erro inesperado ocorrer aumenta muito. · Incentivos e desincentivos: a postura e atuação dos gerentes e supervisores têm um reflexo gigantesco no comportamento dos trabalhadores, pois estes percebem como seus líderes recompensam ou não seus subordinados. Caso a quantidade produzida seja mais determinante para a recompensa do que a qualidade e a correta aplicação do método, os trabalhadores terão uma tendência a focar na produção e não na forma com que o produto é entregue. Esses três fatores são oriundos da própria organização e, dependendo da sua cultura de segurança, podem ser mudados com a finalidade de exercer uma influência positiva no comportamento do trabalhador, aumentando a probabilidade de ele tomar decisões acertadas (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Quando uma falha ocorre e não há uma ou várias defesas, ela tende a ser a razão de um acidente. Do contrário, a existência de defesas pode reduzir acidentes e suas respectivas consequências. Vale lembrar que a segurança não é a não inexistência de erros, e sim a garantia da existência de defesas no sistema, para absorver os erros e evitar os acidentes (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Exemplos práticos de defesas Há defesas do tipo proativas, as quais permitem a antecipação do erro, evitando a sua intercorrência. Outra categoria de defesa são as reativas, as quais visam eliminar, controlar, ou remediar o erro, reduzindo as suas consequências. As defesas podem ser posicionadas em diferentes partes do sistema e se dividem em três classes: · Controles: primeira linha de defesa do sistema,a qual tenta fazer com que o trabalhador execute a tarefa exatamente da forma como ela deve ser realizada. Tem a finalidade de moldar a ação do funcionário para que esteja o mais próximo possível do imaginado e desejado. São exemplos desse tipo de defesa os procedimentos, a sinalização, os alarmes e os treinamentos. · Barreiras: são defesas que protegem o sistema de perigos que não estão sob controle. Mesmo que haja controles implementados, é certo que o ser humano vai errar. As barreiras agirão nesse momento, para impedir que este erro gere um acidente. Essa é a segunda linha de defesa. São exemplos de barreiras são: poka yokis (soluções simples que evitam falhas em processos e reduzem custos), sensores de intertravamento, sensores de leitura digitais, guardas de máquinas etc. · Salvaguarda: se tanto a primeira quanto a segunda defesa não funcionarem, o dano acontecerá. Daí a importância de ter uma terceira e última linha de defesa para mitigá-lo, o dano. São exemplos de salvaguardas: equipamento de proteção individual, airbags, sistemas de sprinklers etc. Percebe-se, com isso, que um sistema resiliente conta com várias defesas para reduzir as chances de ocorrência de acidentes. Para que o erro consiga vencer todas as defesas, resultando no acidente, é necessário que as defesas estejam alinhadas. Tal alinhamento é raro em virtude da multiplicidade de defesas. Porém, as defesas sofrem a ação do tempo e acabam se deteriorando e quanto mais defesas tiver um sistema, menores serão as chances das debilidades se alinharem, culminando num sinistro. Como é impossível eliminar o erro, é primordial que o sistema esteja preparado para enfrentá-lo (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Gestão de sistemas resilientes Para gerenciar sistemas resilientes, é preciso desenvolver uma nova visão baseada nas seguintes ideias (MATTOS; MÁSCULO, 2019): 1. Sim, as pessoas falham; 2. Culpá-las por isso não adiciona valor para compreensão das falhas. 3. A responsabilidade pela segurança volta-se para os cargos ascendentes na hierarquia da organização. 4. Os processos organizacionais influenciam o comportamento dos indivíduos. 5. Os futuros acidentes advêm de sementes que estão sendo plantadas hoje. 6. Tudo o que uma organização precisa para viabilizar uma falha já faz parte dos sistemas, processos e ambientes de trabalho. Por isso as falhas acontecem. Se as falhas vão acontecer, visto que não podem ser totalmente previstas e nem evitadas, o que é determinante para contorná-las é a forma como a organização reagirá a elas. É imprescindível assimilar que as pessoas vão errar e que as falhas devem ocorrer, o foco está em eliminar as possíveis armadilhas e fatores que possam reforçar as consequências, adicionando controles para minimizar a probabilidade de acidentes. Logo, após um erro, a reação da organização será determinante para manter a resiliência do sistema. Estudos sobre a engenharia de resiliência apontam quatro pilares do pensamento que podem ser integrados no dia a dia da operação: antecipar (saber o que esperar), monitorar (saber no que prestar atenção), responder (saber o que fazer) e aprender (saber o que aconteceu e o que tem que mudar). Do chão de fábrica até o CEO, as Organizações com performance excelente pensam dessa forma, antecipando, monitorando, respondendo e aprendendo com os erros (MATTOS; MÁSCULO, 2019). Atividade extra Leia o artigo intitulado “Gestão da segurança e saúde no trabalho em empresas produtoras de baterias automotivas: um estudo para identificar boas práticas” para conhecer mais sobre as práticas, ações e as principais dificuldades relacionadas à gestão da Segurança e Saúde do Trabalho em empresas fabricantes de baterias automotivas (Link de acesso: https://www.scielo.br/j/prod/a/9WSN7NYR7MkQ6pD5fW3wZ7p/?format=pdf&lang=p) Referência Bibliográfica BRISTOT, V. M. Introdução à engenharia de segurança do trabalho [Recurso eletrônico]. Criciúma, SC: UNESC, 2019. MATTOS, U. A.; MÁSCULO, F. S. Higiene e segurança do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. 2 – 3- 4- image6.png image7.png image8.png image9.png image10.png image11.png image12.png image13.png image14.png image15.png image16.png image17.png image18.png image19.png image20.png image21.png image22.png image23.png image24.png image25.png image26.png image27.png image28.png image29.png image30.png image31.png image32.png image33.png image34.png image35.png image36.png image37.png image38.png image39.png image40.png image41.png image42.png image43.png image44.png image45.png image1.png image46.png image47.png image48.png image49.png image50.png image51.png image52.png image53.png image54.png image55.png image2.png image56.png image57.png image58.png image59.png image60.png image61.png image62.png image63.png image64.png image65.png image3.png image66.png image4.png image5.png