Prévia do material em texto
XVII CONGRESSO BRASILEIRO DE ASSISTENTES SOCIAIS 11 a 13 de outubro de 2022 “Crise do capital e exploração do trabalho em momentos pandêmicos: Repercursão no Serviço Social, no Brasil e na América Latina” Autores: Andressa De Souza Litter 1, Eglê Angela Ronsoni 1 DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO SERVIÇO SOCIAL NA SAÚDE MENTAL: reflexões a partir da inserção em um CAPS Infanto-juvenil Resumo: Apresenta-se a reflexão sobre a inserção profissional em um CAPSi. Destaca-se os desafios do desmonte da Política de Saúde Mental e a subalternização da profissão no trabalho em equipe interdisciplinar. Como possibilidades para efetivar a intencionalidade do Serviço Social no cotidiano, considera-se a mediação na relação com a equipe e a inserção estratégica nos espaços do serviço de saúde mental. Abstratc: A reflection on professional insertion in a CAPSi is presented. The challenges of dismantling the Mental Health Policy and the subordination of the profession in interdisciplinary teamwork are highlighted. As possibilities to implement the intentionality of Social Work in everyday life, mediation in the relationship with the team and strategic insertion in the spaces of the mental health service are considered. Palavras-chave: Serviço Social. Trabalho Profissional. Saúde Mental. Grupos. 1 INTRODUÇÃO O presente artigo tem como proposta apresentar uma reflexão teórico-prática, advinda da inserção profissional, enquanto Assistente Social residente, no espaço sócio ocupacional de um Centro de Atenção Psicossocial Infanto-juvenil (CAPSi) da região metropolitana do estado do Rio Grande do Sul - RS. Tal ocupação realiza-se por intermédio da Residência Multiprofissional em Saúde da Escola de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Sul, no programa de Saúde Mental Coletiva. No transcorrer das práticas profissionais, destacaram-se atividades como o acolhimento, grupos de familiares, grupo de adolescentes, visitas domiciliares e oficinas temáticas. A inserção do profissional de Serviço Social na Política de Saúde Mental, ganha 1 Escola De Saúde Pública Do Rio Grande Do Sul destaque a partir de 1970, com a Reforma Psiquiátrica brasileira, conquistada pelos Movimento dos Trabalhadores de Saúde Mental (MTSM) e Movimento Nacional de Luta Antimanicomial (MNLA). Assim, passa-se a planejar e colocar em prática, serviços de cuidado em saúde mental de base territorial, em substituição aos hospitais psiquiátricos, como os CAPS. Em contraponto, a inserção deste profissional em equipes multiprofissionais de saúde mental, contém uma carga histórica permeada por contradições, algumas presentes até os dias atuais. Dentre estas, a subalternização2 da profissão em comparação a outras áreas do saber na saúde, as contrarreformas, o desmonte do SUS e das políticas públicas, dentre outros. Diante do exposto, a presente reflexão teórico-prática possui como objetivo, refletir e analisar a inserção do Serviço Social na Política Nacional de Saúde Mental, mais especificamente em um CAPSi. Também, as possíveis estratégias para efetivar o Projeto Ético Político do Serviço Social brasileiro no cotidiano da prática, dando destaque ao trabalho com grupos, visto que este possibilita a transformação de demandas individuais em demandas coletivas, ponto imprescindível para universalização de direitos e no almejo de sociedade democrática de fato. 2 A POLÍTICA DE SAÚDE MENTAL E O SERVIÇO SOCIAL A Política de Saúde e a Política de Saúde Mental tem sua historicidade permeada por manifestações e reivindicações, que ocorriam no período de efervescência democrática, na luta pelo fim da ditadura militar. Não é por coincidência que o Sistema Único de Saúde (SUS) surge neste período, visto que as demandas da classe trabalhadora ganham prioridade a partir do momento em que a manutenção da ordem burguesa é ameaçada (NETTO, 2011). Assim, surgem os movimentos sociais em prol de um sistema de saúde, público, democrático, de qualidade e voltado para as reais demandas da classe trabalhadora. Na área da saúde mental, o início do processo da Reforma Psiquiátrica é protagonizado por dois movimentos sociais principais, o MTSM, datado da década de 1970, movimento que “[...] passa a protagonizar e a construir a partir deste período a denúncia da violência dos manicômios [...] e a construir coletivamente uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na assistência 2Refere-se ao histórico da profissão do Serviço Social, em que desde seus primórdios, nas primeiras Escolas de Serviço Social na área da saúde, a profissão era pensada como “ajudante do médico” (BARBOSA, 2019). Esta carga permeia as relações sociais e de poder até os dias atuais. às pessoas com transtornos mentais” (BRASIL, 2005, p. 7). O MNLA, caracteriza-se por ser um “[...] movimento social, de abrangência nacional, que nasce no contexto da redemocratização do Estado brasileiro e defende, em suas origens, a luta por profundas transformações da sociedade [...] e a reestruturação da atenção em saúde mental do país” (AGUIAR, 2020, p. 79). As reivindicações decorrentes do MTSM e do MNLA e a 8ª Conferência Nacional de Saúde (CNS), datada de 1986, tornam-se um marco no processo de mobilização social em torno do que viria a ser a Política Nacional de Saúde Mental. Para Iamamoto (2011), a questão social engloba a desigualdade, mas também a rebeldia, além de envolver os sujeitos que as vivenciam e a elas se opõem, e foi por meio desta rebeldia e resistência, que surgiu a reivindicação da saúde como direito do povo e dever do Estado. A 8º CNS deliberou a formulação de um sistema de saúde de nível nacional, tendo como princípios norteadores: a universalidade do acesso aos serviços, a integralidade do cuidado e a igualdade da assistência (BRASIL, 1990). Tido como conceito ampliado de saúde, como não somente ausência de doença, mas sim um estado de pleno bem-estar, englobando o direito ao trabalho, à renda digna, qualidade da água, acesso à moradia, educação, segurança pública e informação e que respeite a livre opinião e organização da população (AROUCA, 1987). Com base nesta afirmação, identifica-se a determinação social do processo saúde-doença, como também um processo que “[...] atravessa todas as dimensões da vida social” (FLEURY-TEIXEIRA, 2009, p. 381). Por intermédio da teoria marxista, pode-se perceber expressões da questão social, visto que “[...] é no processo de acumulação capitalista que encontramos a determinação essencial para a problemática da saúde” (SOUZA; SILVA; SILVA, 2013, p. 44). Estes fatores, por meio de seus sistemas de desigualdades socioculturais, econômicas e políticas, contribuem para a crescente do fenômeno do sofrimento mental. A 8ª CNS, deliberou ainda, a realização de conferências para as especialidades das áreas da saúde, dentre elas, a saúde mental, marcando a realização da I Conferência Nacional de Saúde Mental (CNSM), no ano de 1987 (AGUIAR, 2020), onde pautou-se os princípios da Reforma Psiquiátrica no campo legislativo, com o Projeto de Lei n.º 3.657 de 1989, posteriormente Lei n.º 10.216 de 2001. A partir desta I CNSM, as próximas conferências de saúde mental foram marcadas por avanços e retrocessos na caminhada da efetivação da Reforma Psiquiátrica. Em uma realidade mais recente, após o golpe jurídico parlamentar e midiático de 2016, em uma linha de retrocessos que chega até os dias atuais, a Política de Saúde Mental sofre, sendo esta “[...] a primeira vez, em cerca de 35 anos, que visivelmente marchamos para trás” (DELGADO, 2019, p. 1). Com a promulgação da Emenda Constitucional n.º 95 (EC n.º 95), a qual congela os gastos públicos com saúde e demaispolíticas públicas e sociais, em 20 anos, houve um agravamento do desmonte das políticas públicas. A EC 95 abre precedente para o sucateamento e à precarização dos serviços de saúde, como a reformulação da Política Nacional de Saúde Mental, por intermédio da Portaria n.º 3.588 de 2017. Tais mudanças foram autoritárias e não contaram com a participação e o controle social, definidas pelo SUS por meio da Lei n.º 8.142 de 1990. As medidas dirigidas às RAPS são vistas como “[...] um retrocesso pelos movimentos da luta antimanicomial, ao fortalecer o processo de internação em hospitais psiquiátricos e a criação de leitos em hospitais gerais’’ (BRAVO; PELAEZ; LIMA; SOUZA, 2019, p. 150). Nesse contexto, há a Atuação na contramão do que preza a Reforma Psiquiátrica brasileira, onde a atenção em saúde mental é centrada no cuidado de base territorial, além de ser baseada na convivência familiar e comunitária. A inserção do Serviço Social, nos espaços sócio ocupacionais de saúde mental, ficam condicionadas ao movimento da realidade concreta em que se encontram. Nesse sentido, o objeto de trabalho de assistentes sociais, em seus mais variados espaços sócio ocupacionais, mas aqui, em específico, voltado para os serviços de saúde mental, por conseguinte, são as expressões da questão social, identificadas “nas suas mais variadas expressões quotidianas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde” (IAMAMOTO, 2011, p. 14). Neste campo, expressas na vida dos usuários da saúde mental via determinação social do processo saúde-doença, como as moradias precárias, a divisão sexual do trabalho no contexto familiar e de cuidado, a violência intrafamiliar, racismo, LGBTfobia, direito à educação negligenciado, vulnerabilidade socioeconômica, dentre outros. Assim, considera-se que a inserção do Serviço Social, enquanto profissão, expõe a divisão social e técnica do trabalho, no espaço sócio ocupacional do CAPSi, além de pautar sua intervenção nas expressões da questão social, presentes no cotidiano dos usuários deste serviço. 3 A PRÁTICA PROFISSIONAL DA ASSISTENTE SOCIAL NA SAÚDE MENTAL A inserção do Serviço Social nos campos da saúde e também da saúde mental tem grande histórico, tendo seu início na década de 1945, anterior ao Movimento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro. Neste período, as práticas eram calcadas em julgamento moral e análises de cunho psicológico, onde o fazer profissional se realizava por meio da “[...] tarefa educativa, com intervenção nos modos de vida da ‘clientela’, com relação aos hábitos de higiene e saúde” (BRAVO; MATOS, 2009, p. 199). Assim, possuía papel fiscalizatório e coercitivo. Durante o período de redemocratização, concomitante ao período do Movimento de Reconceituação do Serviço Social, a partir das décadas de 1970 e 1980, as transformações na área da saúde também repercutiram na prática do Serviço Social. Cria-se “[...] um conjunto de instituições de assistência psiquiátrica que são inspiradas tipicamente do Movimento da Reforma Psiquiátrica, como os Centros de Atenção Psicossocial” (BISNETO, 2007, p. 32). Assim, no cotidiano do cuidado em saúde mental, surge uma corrente teórica que compreende “[...] a loucura como fenômeno social, político, histórico e institucional pela perspectiva crítica e dialética” (BISNETO, 2007, p. 33). O Serviço Social insere-se no espaço sócio ocupacional dos CAPS dentro desta linha, visto a hegemonia da vertente à intenção de ruptura. Porém, no cotidiano da prática, ainda há muitos resquícios do modelo de cuidado em saúde mental que se pretende superar, como o cuidado médico-centrado, onde fica evidente a relação de poder imposta ao saber médico. Nem sempre esta situação se dá pela postura do profissional da medicina, mas pela carga histórica e cultural existente entre os sujeitos sociais envolvidos. Assim, no cotidiano da prática profissional, o assistente social vê-se por um lado no desafio do atendimento direto aos usuários, na luta pela saúde como política pública e das demais políticas que compõem a Seguridade Social em seu sentido ampliado, e por outro, reivindicando a defesa do Projeto Ético Político do Serviço Social brasileiro, permeado por desafios, incluindo a carga histórica do caráter subalterno da profissão. Barbosa (2019, p. 241) afirma que essa “luta vai de encontro à supremacia do saber médico, inscrita na formação profissional da primeira escola de Serviço Social na América Latina”. Assim, a assistente social insere-se no espaço sócio ocupacional dos CAPS, de maneira legitimada, visto que se encontra na equipe mínima estipulada nas portarias, como na do CAPSi II, modalidade de serviço de onde partiu-se as inquietações contidas nesta produção, em que se estipula: A equipe técnica mínima para atuação no CAPSi II, para o atendimento de 15 (quinze) crianças e/ou adolescentes por turno, tendo como limite máximo 25 (vinte e cinco) pacientes/dia, será composta por: [...] c - 04 (quatro) profissionais de nível superior entre as seguintes categorias profissionais: psicólogo, assistente social, enfermeiro, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, pedagogo ou outro profissional necessário ao projeto terapêutico [...] (BRASIL, 2002). Entretanto, o cotidiano da prática profissional vê-se por vezes “engolido” devido às demandas do cotidiano, visto que o contingente populacional atendido excede consideravelmente o indicado na legislação, em contraponto com a capacidade física do local que é consideravelmente pequena. Desta forma, por vezes não se consegue planejar as intervenções ou realizar articulação com a rede intersetorial. Ainda, as atividades propostas nestas portarias, possuem caráter psicossocial e não possuem diferenciação estipulada sobre quais devem ser desempenhadas por cada profissão. Assim, são atividades propostas, A assistência prestada ao paciente no CAPS i II inclui as seguintes atividades: a - atendimento individual (medicamentoso, psicoterápico, de orientação, entre outros); b - atendimento em grupos (psicoterapia, grupo operativo, atividades de suporte social, entre outros); c - atendimento em oficinas terapêuticas executadas por profissional de nível superior ou nível médio; d - visitas e atendimentos domiciliares; e - atendimento à família; f - atividades comunitárias enfocando a integração da criança e do adolescente na família, na escola, na comunidade ou quaisquer outras formas de inserção social; g - desenvolvimento de ações inter-setoriais, principalmente com as áreas de assistência social, educação e justiça (BRASIL, 2002). Neste sentido, o/a assistente social necessita utilizar da mediação - tanto entre as demandas institucionais e as demandas sociais, como as demandas que advém especificamente das expressões da questão social -, para efetivar a intencionalidade do fazer profissional no cotidiano de trabalho. Aqui vale o destaque do uso da mediação enquanto categoria central da atuação profissional, uma vez que ela auxilia na atuação à perspectiva da totalidade. Nesse sentido, é imperioso valer-se de leituras da realidade que vão para além do imediato e que fornecem ferramentas que auxiliam no acesso da realidade concreta. Essa categoria, por sua vez, também nos conduz para uma intervenção como articuladoras e potencializadoras de mediações. Ou seja, atuando “[...] nos sistemas de mediações que infiltram às refrações da “questão social” constitutivas das demandas sociais à profissão” (PONTES, 2010, p. 177). A análise da realidade sob a luz da atuação, a partir de tal categoria, qualifica, portanto, a relação do Serviço Social no trabalho interdisciplinar, neste caso no âmbito da saúde mental. Aprofissão considera relevante a atuação interdisciplinar, no escopo de garantia do cuidado integral dos usuários, onde busca-se a não fragmentação dos atendimentos (BRASIL, 1993). Assim, dialeticamente, observa-se os “[...] desafios encontrados para materialização das ações profissionais tendo em vista a preservação das especificidades [...] e, também, as contribuições que são proporcionadas por meio da interação/troca” (COUTINHO; COUTINHO, 2017, p. 01). Assim, a assistente social é inserida nos espaços de cuidado ofertados pelo serviço de saúde, por meio de escala pré-estipulada, onde existe a demanda institucional de permear por todos os espaços. É necessário, neste momento, o diálogo e as relações interpessoais com a equipe de trabalhadores do serviço, para que esta inserção se dê de maneira a ser concomitante com o fazer profissional e assim, proporcionar um atendimento de maior qualidade ao usuário. Considera-se imprescindíveis a reflexão e a crítica sobre as especificidades da profissão, para não realizar práticas de caráter terapêutico, visto que a Resolução nº 569 de 2010, do Conselho Federal de Serviço Social - CFESS, veda a prática de atividades terapêuticas por este profissional. Assim, busca-se estratégias metodológicas para a realização do fazer profissional como assistente social, inserida em um CAPSi, de acordo com o Projeto Ético Político profissional. Prates (2006), concebe como instrumentos e técnicas as estratégias sobre as quais se faz a opção, de acordo com o contexto e o conteúdo a ser mediado. Neste sentido, utiliza-se no cotidiano da prática, das atividades em que o profissional se insere por meio da escala do serviço, de maneira a efetivar a intencionalidade profissional. Sendo elas, neste espaço sócio ocupacional em específico, consolidadas por intermédio da Semana Típica da Assistente Social Residente: o acolhimento; os atendimentos individuais; grupos de familiares; grupo de adolescentes; visitas domiciliares; oficinas temáticas e a assembleia dos usuários e trabalhadores. Destaca-se neste artigo, o trabalho com grupos. Salienta-se que a grande maioria das atribuições realizadas, neste serviço, não são de responsabilidade de apenas uma profissão. Porém, cabe ressaltar que ao conseguir imprimir a intencionalidade do Serviço Social em sua instrumentalidade, mesmo em ações realizadas, conjuntamente, com outras áreas, tem-se uma relevância aos usuários do serviço. E consolida o cuidado em saúde realizado de maneira interdisciplinar, como preconiza a Reforma Psiquiátrica. Enquanto inserção estratégica da assistente social na área da saúde, tem-se as instâncias de controle e participação social. Este espaço sócio ocupacional é realizado pela Assembleia de Usuários e Trabalhadores. Destaque-se a inserção, neste espaço, com a intencionalidade de contribuir no processo de construção de sujeitos políticos que reivindicam seu direito à saúde na agenda pública. Visto que, para uma atuação competente e crítica do Serviço Social, na área da saúde, é necessário estar “[...] articulado e sintonizado ao movimento dos trabalhadores e de usuários que lutam pela real efetivação do SUS” (BRAVO; MATOS, 2009, p. 214). Neste espaço, pauta-se as propostas aprovadas na última Conferência Municipal de Saúde Mental e maneiras de reivindicar sua efetivação. Com a intencionalidade de fortalecimento da autonomia e empoderamento dos participantes enquanto sujeitos de direitos, sendo o princípio de democratização das políticas públicas (BRASIL, 1993). Considera-se o trabalho com grupos de grande relevância neste espaço sócio ocupacional, visto que esta estratégia metodológica vai ao encontro dos preceitos da Reforma Psiquiátrica. Definido “[...] a partir da presença simultânea de indivíduos em uma mesma atividade sócio institucional coordenada por um ou mais profissionais e que apresente período de duração, objetivos e metodologias definidas” (MOREIRA, 2019, p. 81-82). Assim, a prática da assistente social, no grupo de familiares, utiliza- se de instrumentos como abordagens grupais, dinâmicas de grupo, informação e reunião. Este possui como intencionalidade o fortalecimento dos vínculos familiares, buscando uma melhor convivência entre criança/adolescente atendido e seu responsável legal. Há também o fortalecimento e mapeamento das redes familiares e do acesso à rede intersetorial, onde se identifica a rede de apoio do responsável, para que ocorra uma diminuição da sobrecarga do cuidado, que recai geralmente em mulheres e também o fortalecimento das relações desta família com os outros serviços da rede intersetorial em que permeiam o modo de garantia de seus direitos sociais. Por meio da dimensão político-pedagógica (ABREU, 2016) presente na intervenção do Assistente Social, aborda-se temáticas relevantes ao processo de desalienação, que exigem o uso da mediação em tempo integral. O grupo de adolescentes em que a assistente social residente está inserida, é denominado como “grupo de transição”. Neste, utiliza-se também instrumentos como informação, abordagens e dinâmicas de grupo, dentre outros. A intencionalidade deste grupo é, em destaque, a reinserção social, visto que os participantes se encontram na fase de “receber alta” do serviço. Assim, o objetivo consolida-se na construção de autonomia destes enquanto cidadãos, buscando a ampliação de sua cidadania, na forma de inserção no mundo de trabalho e em outros dispositivos da rede do território. Em adendo há a descentralização do cuidado para as Unidades Básicas de Saúde e sua vinculação com outros espaços da comunidade, como voltados para o esporte, lazer e cultura, de modo a buscar o cuidado em saúde mental de maneira intersetorial. Cabe ainda abordar, as oficinas temáticas, como o espaço coletivo intitulado de “CineCAPSi” que busca associar o acesso à cultura e à arte e o cuidado em saúde mental, realizado uma vez ao mês. Considera-se que as abordagens grupais nesse trabalho profissional possibilitam não só “[...] a apreensão das demandas individuais como expressões de demandas coletivas, mas o próprio grupo mostrando a força que a organização tem” (VASCONCELOS, 2015, p. 302). Portanto, identifica-se a inserção do profissional de Serviço Social como necessária nos espaços de saúde mental que visam o cuidado em liberdade e a reinserção social. Assim, encontra-se na relação dialética entre reivindicar seu espaço profissional e pautar o atendimento aos usuários com base no Código de Ética e do Projeto Ético Político profissional. 4 CONCLUSÃO Considera-se a inserção do Serviço Social na saúde mental, mais especificamente no CAPSi, como de relevância social para os usuários do serviço, visto que os princípios do Projeto Ético Político do Serviço Social brasileiro fazem articulação direta com os princípios da Reforma Psiquiátrica e com os princípios do SUS, sobretudo o princípio da integralidade. Assim, há a atuação nas expressões da questão social vivenciadas pelos usuários destes serviços, de modo a considerar as redes primárias e secundárias. Apesar de a inserção da profissão estar consolidada na equipe mínima, regulamentada pelas portarias que direcionam o funcionamento dos CAPS, a prática profissional, nestes espaços, possui imensos desafios. Dentre estes, destacam-se a interdisciplinaridade, como parte integrante do cuidado em saúde mental, com a possibilidade do cuidado integral e não fragmentado ao usuário, mas que também coloca em risco a perda da especificidade da profissão, principalmente ao se levar em consideração o histórico de subalternização existente desde a gênese do Serviço Social. Também, o desmonte da Política de Saúde Mental e das demais políticas públicas e sociais, que tornam-se uma constante no períodopós-golpe de 2016. Ainda assim, apesar das demandas institucionais, há a mediação com a equipe de trabalhadores, inserida nos serviços, sendo possível colocar em prática a intencionalidade da especificidade do Serviço Social e das outras áreas do saber e da saúde com inserção estratégica nos espaços ofertados. Neste sentido, o fazer profissional da assistente social, no espaço sócio ocupacional do CAPSi, tem a possibilidade de pautar o cuidado em liberdade, a reinserção social, o fortalecimento do trabalho em rede e a integralidade do cuidado. REFERÊNCIAS ABREU, M. M. Serviço Social e a organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional. São Paulo, Cortez Editora, 2016. AROUCA, Sérgio. Conferência: Democracia é Saúde. In: Anais da 8ª Conferência Nacional de Saúde; 17-21 Mar. 1986; Brasília, DF: Centro de Documentação do Ministério da Saúde; 1987. Disponível em: http://www.ccs.saude.gov.br/cns/pdfs/8conferencia/8conf_nac_anais.pdf AGUIAR, Lauren Janine. Por uma sociedade sem manicômios: (im) possibilidades da Reforma Psiquiátrica no capitalismo brasileiro. 2020. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2020. Disponível em: http://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/9099/2/Disserta%c3%a7%c3%a3o%20- %20Laurem%20Janine%20Pereira%20de%20Aguiar.pdf BARBOSA, Viviane Cristina. Serviço Social e saúde: relação antiga, desafios presentes. EM PAUTA, Rio de Janeiro 2º Semestre de 2019 - n. 44, v. 17, p. 240 - 254. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaempauta/article/view/ 45242/30955 BISNETO, José Augusto. Serviço Social e Saúde Mental: uma análise institucional da prática. 3ª edição. Cortez Editora, São Paulo, 2007. BRASIL. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm BRASIL. PORTARIA Nº 336, DE 19 DE FEVEREIRO DE 2002. Estabelece que os http://www.ccs.saude.gov.br/cns/pdfs/8conferencia/8conf_nac_anais.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaempauta/article/view/45242/30955 https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaempauta/article/view/45242/30955 http://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/9099/2/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20-%20Laurem%20Janine%20Pereira%20de%20Aguiar.pdf http://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/9099/2/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20-%20Laurem%20Janine%20Pereira%20de%20Aguiar.pdf Centros de Atenção Psicossocial poderão constituir-se nas seguintes modalidades de serviços: CAPS I, CAPS II e CAPS III, definidos por ordem crescente de porte/complexidade e abrangência populacional. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2002/prt0336_19_02_2002.html BRASIL. Reforma Psiquiátrica e política de Saúde Mental no Brasil: Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. Brasília, 2005. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf BRASIL. Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Brasília, 2001. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LEIS_2001/L10216.htm BRASIL. Código de Ética do/a Assistente Social. Lei 8.662/93 de regulamentação da profissão. - 10º ed. rev. e atual. - [Brasília]: Conselho Federal de Serviço Social, 2012. BRASIL. Emenda Constitucional n 95, de 15 de dezembro de 2016. Altera o ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para incluir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providencias. Brasília, 2016. Disponível em: http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21295527/ do1-2016-12-16-emenda-constitucional-n-95-21295459 BRAVO, Maria Inês Souza. PELAEZ, Elaine Junger. LIMA, Marcela Natacha dos Santos Caxias de. SOUZA, Rodriane de Oliveira. Avanço das contrarreformas na saúde na atualidade: o SUS submetido ao mercado. In: Crise do capital e fundo público: implicações para o trabalho, os direitos e a política social. Cortez Editora, São Paulo, 2019. BRAVO, Maria Inês Souza. MATOS, Maurílio Castro de. Projeto Ético-Político do Serviço Social e sua Relação com a Reforma Sanitária: Elementos para o Debate. In: Saúde e Serviço Social. BRAVO, Maria Inês Souza… [et al], (orgs.). 5ª edição. São Paulo: Cortez Editora; Rio de Janeiro: UERJ, 2012. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. RESOLUÇÃO CFESS Nº 569, de 25 de março de 2010. Dispõe sobre a VEDAÇÃO da realização de terapias associadas ao título e/ou ao exercício profissional do assistente social. Disponível em: http://www.cfess.org.br/arquivos/RES.CFESS_569-2010.pdf COUTINHO, Dalsiza Cláudia Macedo. COUTINHO, Wellington Macedo. A PROPÓSITO DA INTERDISCIPLINARIDADE: o serviço social e o trabalho em equipe na saúde mental. Anais do II Seminário Nacional de Serviço Social, Trabalho e Políticas Sociais Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2017. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/180076/101_00280.pdf? sequence=1&isAllowed=y DELGADO, Pedro Gabriel. Reforma psiquiátrica: estratégias para resistir ao https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/180076/101_00280.pdf?sequence=1&isAllowed=y https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/180076/101_00280.pdf?sequence=1&isAllowed=y http://www.cfess.org.br/arquivos/RES.CFESS_569-2010.pdf http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21295527/do1-2016-12-16-emenda-constitucional-n-95-21295459 http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21295527/do1-2016-12-16-emenda-constitucional-n-95-21295459 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LEIS_2001/L10216.htm http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2002/prt0336_19_02_2002.html desmonte. Trab Educ Saúde 2019; 17:e0021241. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/tes/v17n2/1678-1007-tes-17-02-e0020241.pdf FLEURY-TEIXEIRA, Paulo. Uma Introdução Conceitual à Determinação Social em Saúde. Saúde em Debate, vol. 33, núm. 83, septiembre-diciembre, 2009, pp. 380-389, Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, Rio de Janeiro, Brasil. Disponível em https://www.redalyc.org/pdf/4063/406345800005.pdf IAMAMOTO, Marilda Villela. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. São Paulo, 20 ed., Cortez, 2011. MOREIRA, Carlos Felipe Nunes. O Trabalho com Grupos em Serviço Social: a dinâmica de grupo como estratégia para reflexão crítica. 5ª ed, São Paulo. Cortez Editora. 2019. NETTO, José Paulo. Capitalismo monopolista e Serviço Social. 8ª edição. São Paulo. Cortez Editora, 2011. PONTES, Reinaldo Nobre. Mediação e Serviço Social: um estudo preliminar sobre a categoria e sua apropriação e sua apropriação pelo serviço social . 7ª Edição. SP- Cortez Editora, 2010. PRATES, Jane Cruz. A questão dos instrumentais técnico-operativos numa perspectiva dialética crítica de Inspiração Marxiana. Revista Virtual Textos & Contextos, nº 2, dez. 2006. Disponível em:https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/fass/article/view/948 SOUZA, D. O. SILVA, S. E. V. SILVA, N. O. Determinantes Sociais na Saúde: reflexões a partir das raízes da questão social. Rev. Saúde e Soc., São Paulo, v.22, n. 1, p. 44-56, 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/sausoc/v22n1/06.pdf VASCONCELOS, Ana Maria. A/o assistente social na luta de classes: projeto profissional e mediações teórico-práticas. 1ª edição. São Paulo. Cortez Editora, 2015.https://www.scielo.br/pdf/sausoc/v22n1/06.pdf https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/fass/article/view/948 https://www.redalyc.org/pdf/4063/406345800005.pdf https://www.scielo.br/pdf/tes/v17n2/1678-1007-tes-17-02-e0020241.pdf