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LINGUAGEM E CONSCIÊNCIA: 
MEDIAÇÃO PARA UMA PRÁTICA REFLEXIVA 
 
 
Clarice Vaz Peres Alvesi 
 
 
RESUMO 
 
Este artigo discute a importância de se conceber a linguagem como processo interlocutivo 
nas práticas educacionais e o papel desse sistema simbólico na formação da consciência do 
indivíduo. Também chama atenção para a importância de o docente desenvolver uma práti-
ca reflexiva e uma formação continuada não só na construção de novos caminhos, mas 
também na desconstrução de outros já instaurados. 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
A linguagem é um dos principais instrumentos de ação e de práticas sociais forma-
dora do mundo cultural, pois ela traz em si a construção e a expressão do conheci-
mento, os valores e as normas de conduta que norteiam a vida do indivíduo em so-
ciedade. Através desse sistema simbólico, podemos julgar, defender, condenar, o-
cultar, argumentar, enfim, expressar idéias e sentimentos. 
 
Além de ser um instrumento revelador do sujeito, a linguagem também faz parte da 
formação da consciência desse sujeito, uma vez que ela ocupa espaço privilegiado 
na constituição do psíquico, do social e da educação. A esse respeito, Palangana 
(1996) diz que, através da linguagem que circula em sala de aula, o aluno adquire 
um conjunto de riquezas produzidas pelos próprios homens, dentre elas a consciên-
cia, que pode ser um fato alienado ou um forte instrumento na leitura de mundo. Por-
tanto, compete à escola assumir a parte que lhe é de direito e obrigação, viabilizan-
do aos indivíduos que a freqüentam, condições necessárias à formulação de consci-
ência para que possam atuar como ‘cidadãos’ na realidade social em que estão in-
seridos. 
 
LINGUAGEM – CONSCIÊNCIA – PRÁTICAS EDUCACIONAIS 
 
O desenvolvimento do indivíduo está entrelaçado à linguagem, pois é através dela 
que o sujeito compreende e age no mundo. Ele se constitui como tal à medida que 
interage com os outros, visto que sua concepção e conhecimento de mundo resul-
tam desse trabalho social de interação. Esse sistema comunicativo é, pois, uma 
forma de ação, um lugar de interação que possibilita aos indivíduos de uma socie-
dade a prática de diversas ações. É na interlocução que a linguagem e o sujeito se 
constituem. 
 
Assim, uma das funções da escola é proporcionar um encontro adequado entre o a-
luno e a linguagem para que ele tenha condições de fazer uso adequado desse sis-
tema simbólico a fim de atender às necessidades básicas de comunicação em uma 
sociedade que está em constante transformação. Entendemos que abordar a lin-
guagem como processo interlocutivo nas práticas educacionais exige uma práxis 
permanente, sem cristalização de caminhos. 
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O texto, escrito ou oral, é uma unidade lingüística básica de comunicação, pois as 
pessoas organizam seu dizer em textos, frutos de suas formações discursivas e in-
terdiscursivas. Logo, partimos do pressuposto de que o aluno é perpassado pelas 
práticas discursivas predominantes na instituição escolar e que as formulações (isto 
é, aquilo que o enunciador diz) das crianças revelam suas filiações a regiões de um 
saber que circula na escola. Esse saber discursivo é que constitui a identidade da 
criança enquanto aluno, uma vez que as práticas, os valores e os significados de 
uma determinada sociedade são organizados por comportamentos específicos que 
são revelados através da linguagem. 
 
Geraldi (1997) diz que, na escola o “eu” do professor indica a sua objetividade dis-
cursiva. O “eu” do aluno é sempre silenciado ou, dito de outra forma, na relação de 
trocas eu/tu, o “eu” que se destaca é sempre o “locutor-professor”, e, quando o “tu-
aluno” produz lingüisticamente, tem sua fala marcada pelo “eu-professor-escola”, 
sua voz não é a voz que fala, mas a voz que devolve, re-produz a fala do “eu-
professor-escola”. Dessa forma, percebemos que a realidade escolar inibe o diálogo, 
pela prática de linguagem em que cada locutor se apresenta como sujeito do discur-
so. Essa prática faz instaurar, na sala de aula, a autoridade da voz do “eu-
professor”, ocasionando uma ruptura em um espaço que deveria emanar a interação 
e a produção de novos sentidos. 
 
A instituição escolar precisa abrir espaço para que os alunos expressem sua “voz”, 
visto que diversos problemas podem ser resolvidos de maneira menos desgastante 
e bem mais eficaz quando os alunos são sistematicamente ouvidos. Eles estão inse-
ridos no processo educativo, por isso percebem com facilidade determinadas situa-
ções que ocorrem no cotidiano da sala de aula. Se a escola oportunizar um momen-
to para uma escuta atenta e qualificada, um fecundo diálogo pode emergir desse 
contexto. Esse caminho contribui não só para a formação de cidadania, como tam-
bém para a uma nova concepção de ensino. Como diz Moretto (1999) “Aprender é 
construir significados e ensinar é oportunizar essa construção”. 
 
A linguagem é um trabalho social e histórico do sujeito com o outro e é para o outro 
e com o outro que ela se constitui, visto que não há sujeito dado, pronto, que entra 
na interação, mas um sujeito se completando e se constituindo nos seus textos orais 
e escritos através de uma relação interlocutiva. Assim, se desejarmos traçar uma 
especificidade para nossa prática docente é no trabalho reflexivo com textos que a 
encontraremos. 
 
Cabe ressaltar que, o trabalha com leitura e com prática de textos na sala de aula 
não é responsabilidade apenas do professor de língua materna, mas de todos pro-
fissionais envolvidos no processo educativo, já que é através da linguagem verbal 
que o docente constrói conhecimento com seus alunos. Não existe disciplina que 
possa realizar sua ‘caminhada’ sem fazer uso da língua. Portanto, se esse compro-
misso com a linguagem for assumido por todas as áreas, certamente nossos alunos 
serão mais críticos e as atividades de leitura e escritas não se tornarão tão comple-
xas. Além disso, o educando desenvolverá a capacidade de ‘entrelaçar’ as informa-
ções adquiridas em cada disciplina, pois sabemos que a construção do conhecimen-
to não se dá de forma compartimentada como a escola, normalmente, trabalha. 
 
Na instituição escolar, não raro, assiste-se a um apagamento da voz do aluno ou a 
manifestação dela apenas para fins gramaticais, no caso de línguas, ou de repetição 
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de conteúdos, em outras disciplinas (Souza, 2003). O ensino da língua materna, 
consideradas algumas exceções, tem adotado duas tendências diferenciadas. Uma 
está direcionada para o ensino da metalinguagem, ou seja, privilegia-se o saber a 
respeito da língua em detrimento do uso da língua. A outra está centrada na super-
valorização do texto produzido pelo aluno, sem nenhuma análise reflexiva sobre sua 
ação lingüística, com o objetivo de adequar o escrito a intenção comunicativa. 
 
A primeira tendência explica-se não só pela forte valorização histórica da gramática, 
mas também porque ser ‘gramatiqueiro’ dá menos trabalho ao professor. Na gramá-
tica não há reflexão; é um conjunto de regras que está à disposição dos usuários da 
língua. Com isso, não se pretende dizer que a gramática não seja importante. É, 
mas como uma ‘ferramenta’ a serviço da língua. Na segunda tendência, há ausência 
de práticas reflexivas sobre os elementos da tessitura. Os professores raramente 
privilegiam a construção do sentido, a organização de idéias, a imagem do leitor e o 
contexto durante as atividades de leitura e produção. Assim, o alunonão concebe o 
texto como uma prática social. 
 
Urge, enquanto educadores, termos claro que não iremos obter muito sucesso em 
nossa atividade docente se não mudarmos a concepção de língua e de ensino que 
norteiam as ações educativas, pois a aprendizagem é resultado de práticas significa-
tivas e contextualizadas. Furlanetto (2003) diz que “Desenvolvimento “pleno” não se 
obtém sem práticas específicas e sistemáticas, que envolvem socialização, cogni-
ção, ética. O elemento fundamental de mediação para a apropriação e manuseio de 
conhecimentos é a linguagem verbal”. Portanto, para que tenhamos alunos capazes 
de compreender o mundo e nele agir, é preciso abordar a linguagem como atividade 
interlocutiva e com esse olhar direcionar o processo educacional instaurando–o so-
bre a singularidade dos sujeitos em contínua constituição. 
 
Nas palavras de Geraldi (1997), o aluno não desempenha uma função de sujeito 
dentro da prática escolar. Ele está assujeitado às condições ideológicas da cultura 
predominante na escola. É produto do meio das práticas discursivas escolares, e 
não produto de interações verbais onde ao mesmo tempo em que repete atos e ges-
tos constrói novos atos e gestos através de um movimento histórico em que a repe-
tição e a criação andam juntas. 
 
A escola necessita deslocar o processo de ensino como transmissão e entender a 
sala de aula como espaço de interação onde aluno e professor tenham a oportuni-
dade de aprender e ensinar um ao outro, construindo novos contextos e situações, 
assim, transformando os sentidos que circulam na sociedade (Alves, 2003). Dessa 
forma, o diálogo é o caminho para uma ação docente mais humanizante e construti-
va. A preocupação de um educador comprometido com sua prática deve estar vol-
tada para a construção de novos caminhos, visto que muitos alunos não terão aces-
so a uma nova forma de ‘olhar’ o mundo se a escola não a disponibilizar. Vasconcel-
los(2007, p.119) diz que: 
 
Enquanto não houver uma mudança mais radical na forma de organização da 
sociedade, não sairemos totalmente da alienação, mas podemos combatê-la, 
criar espaços de desalienação, onde as pessoas possam tomar consciência e 
ter uma experiência alternativa de relacionamento (ainda que limitada). Os 
sujeitos vão sendo despertados para uma nova consciência pela convivência 
reflexiva, e isto permite a cada um assumir tarefas num nível cada vez mais 
profundo e crítico. Esta prática vai minando a corrente da alienação e prepara 
um movimento maior de mudança. A escola deve participar deste processo: 
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uma nova estrutura, para favorecer a reagregação do homem, deve permitir o 
encontro, a reflexão, a ação sobre a realidade, numa práxis libertadora. 
 
 
 Uma práxis libertadora exige além de construir um novo caminho, desconstruir outros 
já enraizados. Para isso, é preciso não só desencadear um conjunto de ações, mas 
também sustentar um processo de mudança. Não podemos imaginar que vamos im-
plantar de repente um ensino de qualidade. Muitas vezes, só vamos encontrar um pon-
to de equilíbrio, embora provisório, depois de algumas tentativas e alguns erros come-
tidos. Esses erros, freqüentemente, são usados como justificativa para interromper a 
nova caminhada, ao invés de servirem de elemento de aprendizado e avanço. Alterar 
a realidade é um desafio. Uma transformação significativa depende de uma série de 
pequenas transformações na mesma direção. Por isso, é preciso perseverança, paci-
ência e clareza de onde se quer chegar. 
 
Entendemos que o papel da escola, numa práxis libertadora “deve ser o de preparar 
gerentes de informação e não meros acumuladores de dados” (Moretto, 1999). Po-
rém, para que tenhamos realmente ‘gerentes’ em nossas salas de aula, é preciso 
que os profissionais da educação tenham clara a função social da escola, como se 
dá a construção do conhecimento e a responsabilidade que cabe a cada educador 
no contexto escolar. É o professor quem gerencia o processo de aprendizagem; que 
investiga o conhecimento que o aluno já tem sobre o assunto que será trabalhado; 
que propõe atividades significativas para que ocorra aprendizagem; que está em 
contato dia-a-dia com a criança, observando se a mesma está construindo ou não 
conhecimento. Portanto, o educador é a ‘essência’ para que se tenha uma educação 
de qualidade, pois o que transforma a realidade é a ação. 
 
Estamos inseridos em uma sociedade do conhecimento. Essa situação redefine o 
perfil dos profissionais, principalmente os da educação. Logo, o desafio maior é criar 
uma ação docente na qual leve o aluno “a aprender a aprender’. Para que isso ocor-
ra, é preciso compromisso, reflexão, renovação teórica, quebra de caminhos cristali-
zados e, principalmente, força de vontade para a ação, porque o caminho é longo e 
árduo. 
 
Jacques Delors (1998) no “relatório para a Unesco da Comissão Internacional sobre 
Educação para o Século XXI” diz que a sociedade do conhecimento exige uma for-
mação continuada. O educador deve estar em constante renovação, visto que o co-
nhecimento é uma produção social, portanto um conjunto de verdades relativas que 
se transformam em função do desenvolvimento das sociedades e dos recursos dis-
poníveis. Assim, a visão de terminalidade que anteriormente foi atribuída aos cursos, 
em especial aos de graduação, deve ser substituída pela formação profissional con-
tinuada. 
 
Delors propõe para a educação uma aprendizagem ao longo de toda a vida firmada 
em quatro pilares: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a viver juntos e 
aprender a ser. 
 
O autor apresenta como primeiro pilar o aprender a conhecer: 
 
Este tipo de aprendizagem que visa não tanto à aquisição de um repertório 
de saberes codificados, mas antes ao domínio dos próprios instrumentos do 
conhecimento pode ser considerado, simultaneamente, como meio e como fi-
nalidade da vida humana. Meio porque se pretende que cada um aprenda a 
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compreender o mundo que o rodeia, pelo menos na medida em que isso lhe 
é necessário para viver dignamente, para desenvolver as suas capacidades 
profissionais, para comunicar. Finalidade, porque seu fundamento é o prazer 
de compreender, de conhecer, de descobrir. (Delors 1998, p. 91) 
 
 
Através dessa visão privilegia-se o prazer da descoberta, da análise e compreensão 
da realidade, da construção e reconstrução do saber. Aprender a conhecer é tam-
bém refletir sobre o conhecimento e concebê-lo como um processo inacabado, em 
constante renovação. Assim, compreendemos que o aprender a aprender deve ser 
uma constante nas práticas educacionais. O sujeito precisa ser provocado a buscar 
o conhecimento, a desenvolver e a organizar o pensamento a fim de transformar a 
realidade da qual faz parte. 
Delors (idem, p. 93) aponta o aprender a fazer como o segundo pilar e diz que: 
 
Aprender a fazer não pode, pois, continuar a ter o significado simples de pre-
parar alguém para tarefa material bem determinada, para fazê-lo participar no 
fabrico de alguma coisa. Como conseqüência, as aprendizagens devem evo-
luir e não podem mais ser consideradas como simples transmissão de práti-
cas mais ou menos rotineiras, embora estas continuem a ter um valor forma-
tivo que não é de desprezar. 
 
 
O segundo pilar revela que a criticidade deve permear o ato educativo. Não há mais 
espaço na nova concepção de educação para o simples exercício da repetição. O 
desenvolvimento das habilidadese das competências deve nortear o processo de 
ensino-aprendizagem. Assim, os dois pilares: aprender a conhecer e aprender a fa-
zer exigem que teoria e prática caminhem juntas na ação docente. Toda a prática 
deve ter como base uma boa teoria, caso contrário, o fazer docente corre o risco de 
tornar-se sem sentido – tanto para o educador como para o aprendiz. 
 
De acordo com Delors, o terceiro pilar refere-se ao aprender a viver juntos, “levar os 
alunos a tomarem consciência das semelhanças e da interdependência entre todos 
os seres humanos do planeta” (idem, p.97). Entendemos que o indivíduo está inseri-
do em um contexto social amplo e, por isso, precisa conviver harmoniosamente com 
todos os seres. Aprender a viver juntos é aprender a viver em uma sociedade mar-
cada por imensas diferenças sociais, econômicas e intelectuais. É respeitar e com-
preender o outro com suas limitações e seus conflitos. É participar cooperativamente 
na organização de uma sociedade mais igualitária, de uma educação realmente para 
todos. 
 
Conforme Moram (2004) “A visão de inter-relacionamento, de interconexão e de to-
talidade, proposta pelo novo paradigma da ciência, busca a superação das verdades 
absolutas e inquestionáveis, do positivismo, da racionalidade e do pensamento con-
vergente.” A concepção do aprender a viver juntos exige uma nova postura da esco-
la e das práticas docentes, visto que a relação interativa passa a ser privilegiada no 
contexto de sala de aula e professor e aluno caminham lado a lado na construção do 
conhecimento. Não há mais espaço na sociedade do conhecimento para um profes-
sor autoritário, que diz deter o conhecimento, e sim para um professor que se apro-
xima do aluno num processo de colaboração e de parceria, e juntos vão refletir e a-
prender administrar as diferenças existentes e desenvolver senso crítico frente à 
realidade da qual fazem parte. Se assim não for a postura do educador, a escola 
não estará preparando o aluno para enfrentar as exigências da nova sociedade. 
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O quarto pilar refere-se ao aprender a ser. Delors diz que: 
 
A educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa, espírito 
e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pesso-
al, espiritualidade. Todo o ser humano deve ser preparado, especialmente, 
graças à educação que recebe na juventude, para elaborar pensamentos au-
tônomos e críticos e para formular os seus próprios juízos de valor, de modo 
a poder decidir, por si mesmo, como agir nas diferentes circunstâncias da vi-
da. (Idem, p.99) 
 
 
O quarto pilar nos faz refletir que tipo indivíduo a escola está formando? O processo 
de hominização está presente em nossas práticas ou somos profissionais apenas 
preocupados com o conteúdo? É urgente proporcionarmos a formação de um sujeito 
mais “humano”, mais social – social no sentido de comprometido com o bem-estar 
da coletividade. O homem está voltado para si, preocupado com competitividade e-
xagerada. Cabe à escola realizar o caminho inverso, pois sabemos que ela é o prin-
cipal pilar na formação da sociedade. 
 
Nosso compromisso como educadores é ajudar nossos alunos a se conhecerem, a 
entenderem o contexto histórico em que estão inseridos, a acompanharem a evolu-
ção das profissões e instrumentalizá-los para encontrar alternativas dignas de vida. 
Nossa juventude precisa acreditar em si, precisa de sonho e de esperança para re-
construir uma sociedade para todos. Vasconcellos 
(2007, p: 96:97) diz que: 
 
O que muda a realidade é a práxis; precisamos chegar a ela. Não há mais 
espaço para intenções genéricas; é preciso transformar idéias em ações con-
cretas, para assim, dialeticamente, transformar a própria consciência, enrai-
zando o lampejo inicial que provocou a ação, bem como alterando-a de acor-
do com o confronto com o movimento do real. Mas, se desejamos transformar 
realidade, não pode ser através de qualquer prática. Esta deve corresponder 
a uma nova visão (logo, pautada numa reflexão crítica) e, mais do que isto, a 
uma nova postura (adesão interior, crença, convicção). A práxis plena, por-
tanto, é muito complexa, já que envolve não apenas a reflexão e emoção 
(necessidade), mas também, para que possa realmente acontecer, a corres-
pondência a determinadas condições objetivas (possibilidades). 
 
 
A escola não pode ser vista apenas como local de trabalho. Ela deve ser ao também 
espaço de formação, de estudo, de reflexão, de análise e de mudança. O processo 
de transformação exige a prática, pois o que muda a realidade é a ação e a reflexão 
sobre essa ação, no entanto sabemos que não é qualquer ação que produz a mu-
dança que desejamos. Um dos caminhos para uma prática docente qualificada é o 
planejamento e a reflexão sobre esse planejamento. É fundamental que o professor 
tenha clareza da importância do planejamento para o desempenho de qualidade da 
atividade docente, visto que se não planejar conscientemente, a tendência é repro-
duzir. Não basta o docente dominar o assunto, é preciso refletir sobre o que preten-
de ensinar a partir da realidade do grupo, e assim organizar as informações de ma-
neira significativa, isto é, que corresponda a alguma necessidade do sujeito no seu 
processo de desenvolvimento, compreensão e transformação da realidade. Para 
saber o que fazer, devemos primeiramente localizar as necessidades. O ponto de 
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partida para mudar uma determinada situação é o desejo de mudança, de aperfei-
çoamento, de querer algo melhor. 
 
Devemos estar comprometidos com a construção de um sujeito que domine tanto o 
‘por que’, o ‘para que’ e o ‘como’ aprender determinados conteúdos. No processo de 
desenvolvimento, o indivíduo deve ser capaz buscar o conhecimento por si, construir 
sua autonomia. “Uma das maiores violências que se pode fazer a um ser humano é 
negar-lhe um horizonte de futuro, uma perspectiva de vida, um projeto onde ele pos-
sa se incluir.” (Vasconcellos, 2006) 
 
Acreditamos que as ações educativas são carregadas de valores, de intenções, inte-
resses e teorias que orientam o educador na construção de uma nova postura edu-
cativa. Porém, é fundamental que no decorrer do processo, esses elementos sejam 
teorizados e utilizados para guiar as ações e reflexões. Os professores precisam ter 
consciência acerca das ações que necessitam empreender para superar seus pro-
blemas e limitações. Mas para organizar a ação e suscitar transformações em nos-
sas práticas educacionais diárias, faz-se necessária uma investigação ativa e eman-
cipatória. Esse processo de tornar-se investigador de sua própria prática não pode 
se dar de forma isolada, pois essa investigação educacional deve ser uma investiga-
ção participativa para que a mudança seja possível nas diversas instâncias da soci-
edade. De acordo com Mion (2001, p. 121) 
 
Refletir sobre a própria prática significa verificar como se constrói, na prática, 
o conhecimento crítico. Isto implica em mostrar como se faz o afastamento 
para poder refletir sobre; inclusive, mostrar como a investigação-ação educa-
cional contribui para os processos de ensino-aprendizagem no ensino funda-
mental, médio e superior, além de mostrar a viabilidade desta parceria na 
formação inicial e continuada de professores. Isto implica também em res-
ponder a questão “O que é produzir conhecimento?” e encaminha-nos para o 
desenvolvimento profissional, entendendo esse desenvolvimento comoum 
processo de formação continuada, isto é, escolaridade formal. 
 
É preciso que o educador tenha consciência da incompletude; a percepção de que 
sempre há mais para conhecer, transformar, crescer; que educar é um constante 
desafio; uma luta diária à superação de si e à construção do outro. Ser educador é 
transformar-se continuamente, transformar o outro e a realidade, desvelando, assim, 
as condições de alienação e omissão que estão presentes no cotidiano. 
 
A prática reflexiva envolve um reconhecimento de que o professor necessita desem-
penhar uma função ativa na construção de metas e finalidades de seu trabalho e de 
que precisa desempenhar uma ação de liderança na reforma educativa. É importan-
te mencionarmos que a produção de novos conhecimentos sobre o ensino e a a-
prendizagem não é compromisso apenas dos pesquisadores, dos bancos universitá-
rios; os professores de ensino fundamental e médio também possuem teorias, de 
que podem contribuir com a construção de um conhecimento comum sobre as práti-
cas de ensino. O conceito de professor como um profissional reflexivo surge para 
compreender e aperfeiçoar a própria experiência docente. Como diz Esteban & Zac-
cur ( 2002 p. 21) 
 
É fundamental, portanto, que o/a professor/a se instrumentalize para obser-
var, questionar e redimensionar seu cotidiano. Tal movimento se torna con-
creto através do permanente diálogo prática-teoria-prática. A prática sinaliza 
questões e a teoria ajuda apreender estas sinalizações, a interpretá-las e a 
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propor alternativas, que se transformam em novas indagações, alimentando 
permanentemente o processo reflexivo que motiva a constante busca pela 
ampliação dos conhecimentos de que se dispõe. 
 
Alguns educadores fazem uma divisão entre teoria e prática e dizem p.ex., que a re-
flexão fica no “antes” da atividade pedagógica, no pólo da teoria, e a ação fica no 
“depois” da reflexão, no da prática. Essa visão faz uma justaposição (e não intera-
ção) e rompe a concepção de educação como práxis transformadora. Na perspecti-
va dialética, a atividade educativa engloba tanto a Elaboração quanto a Realização 
Interativa, qual seja, reflexão a partir da prática, prática refletida, reflexão sobre a 
prática e sobre a reflexão (Vasconcellos, 2005). 
 
Teoria e prática se completam. Somente uma prática embasada pela teoria se sus-
tenta, tem clareza de onde de quer chegar e que tipo de indivíduo quer formar. Por-
tanto, dissociar esses dois pólos é fragmentar o processo educativo, ou melhor, 
mascará-lo, visto que quando não se tem uma teoria corremos o risco de reproduzir 
outras que, muitas vezes, não correspondem a nossa concepção de educação. 
 
 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
A escola constitui-se espaço fundamental para a formação da consciência, por isso 
seu papel é essencial na construção de uma nova sociedade. No entanto, para que 
isso ocorra é preciso que os educadores percebam a função social da escola e a 
responsabilidade que os mesmos possuem para que essa função realmente seja 
cumprida. 
 
Não há dúvidas de que o sistema educacional como um todo precisa rever seus pro-
cessos pedagógicos e estratégias de ensino. Necessita também desenvolver a in-
terdisciplinaridade e a transversalidade, qualificar os docentes e ter uma postura ati-
va na formação de novos caminhos para a construção da cidadania, só assim tere-
mos uma práxis libertadora. 
 
Enquanto não houver um processo de conscientização por parte dos educadores e 
da sociedade que a transformação da realidade só acontecerá através da educação; 
que somente com uma prática reflexiva e uma formação continuada dos docentes 
poderá sustentar esse processo de mudança, todo esforço para a transformação se-
rá em vão. 
 
A escola deve ser o lugar que promove o espaço para a autoria vista como produção 
de sentidos e não como reprodutora de conhecimento. É preciso permitir que o alu-
no produza sentidos. A instituição escolar tem de perder o medo da heterogeneidade 
e assumir-se como sociedade de discurso e, assim, contribuir para a abertura, para 
o novo, construindo a heterogeneidade da linguagem e dos sujeitos. 
 
 
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