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TOXICOLOGIA 
AULA 4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof.ª Rachel Picada Bulcão 
 
 
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CONVERSA INICIAL 
Nesta aula, abordaremos diversos pontos ligados à toxicidade de alguns 
medicamentos, bem como alguns tratamentos e análises toxicológicas. O 
objetivo é compreender a importância do conhecimento farmacêutico diante das 
particularidades e toxicidade dos diversos medicamentos e suas interações. 
Nesta aula, trataremos dos seguintes temas: 
• intoxicação por medicamentos; 
• neurolépticos; 
• antidepressivos; 
• anticonvulsivantes; 
• anti-inflamatórios não esteroidais. 
TEMA 1 – INTOXICAÇÃO POR MEDICAMENTOS 
Até início do século XX, os medicamentos tinham origem natural, eram 
preparados artesanalmente em farmácias e comercializados de modo limitado. 
Um ritmo intenso tomou as escalas de produção e comercialização de produtos 
farmacêuticos, decorrente do crescimento econômico global. 
Os medicamentos são importantes ferramentas terapêuticas utilizadas 
para a prevenção, manutenção e recuperação das condições de saúde, 
entretanto, seu uso irracional e indiscriminado causa inúmeras consequências 
negativas, como não controle ou cura do problema de saúde, intoxicações e até 
óbito. Os medicamentos ocupam o primeiro lugar nos registros de intoxicações 
e constituem a segunda causa de mortalidade relacionada às intoxicações 
humanas. Em contrapartida, são de muita importância, assim como a nutrição, a 
moradia, entre outros, na modificação dos indicadores de saúde. Entretanto, 
transformaram-se em tema controvertido em razão de prática abusiva, uma vez 
que, à sua função terapêutica, agregam-se funções sociais e econômicas, 
necessariamente, não relacionadas com saúde e doença (Bortoletto; Bochner, 
1999). 
Nos últimos anos, o desenvolvimento tecnológico possibilitou o grande 
progresso na produção de medicamentos, facilitando sua distribuição e 
consumo. Contudo, essa facilidade de acesso aos medicamentos facilita a 
 
 
3 
ocorrência de intoxicações, o que continua acontecendo com incidência 
preocupante. 
Vários fatores facilitam a exposição a um produto químico, por exemplo: 
• fatores relacionados à frequência de exposição a um produto químico – 
disponibilidade no mercado, marca comercial e facilidade de acesso; 
• fatores que influenciam os padrões de consumo dos produtos – preço, 
qualidade, utilidade para o consumidor; 
• fatores importantes quando o produto é um medicamento – atitudes do 
prescritor, do farmacêutico e dos responsáveis pela regulamentação e 
vigilância. 
Intoxicações medicamentosas surgem em decorrência de mecanismos 
complexos, que podem estar relacionados a características de cada indivíduo, a 
processos farmacodinâmicos e farmacocinéticos, o que pode variar em relação 
às propriedades farmacêuticas do produto e apresentação, e também podem 
estar envolvidas com interações entre medicamentos e alimentos (Nóbrega et 
al., 2015). 
O índice elevado de intoxicações medicamentosas no Brasil é 
caracterizado por vários fatores, dentre eles: a grande variedade de formulações 
presentes no mercado varejista, que podem apresentar segurança e eficácia 
duvidosas; a proliferação de farmácias e drogarias, o que facilita o acesso de 
forma indiscriminada ao medicamento; erros de prescrição médica e 
dispensação farmacêutica; o incremento da propaganda por parte da indústria 
farmacêutica, aliada a uma fragilidade nas medidas preventivas e da capacidade 
de fiscalização e controle por parte das autoridades; a prática da automedicação, 
que é reforçada pela propaganda não ética de alguns produtos farmacêuticos, o 
que favorece o estoque de grandes quantidades de medicamentos no ambiente 
doméstico e leva ao uso irracional dos medicamentos (Souto et al., 2013). 
No entanto, as intoxicações por medicamentos costumam ser facilmente 
identificadas e ter o diagnóstico preciso, principalmente se houver: 
• história clínica bem conduzida; 
• qualidade da informação prestada; 
• exame físico detalhado; 
• avaliação dos sinais vitais, alterações metabólicas, neurológicas e 
comportamentais. 
 
 
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1.1 Diagnóstico e tratamento das intoxicações 
As intoxicações dependem do agente, do hospedeiro e do ambiente. 
Nenhuma intervenção que considere apenas um desses elementos será 
completamente efetiva e, antes de ser escolhida uma estratégia de prevenção, 
deve-se ter um conhecimento profundo das condições que envolvem 
especificamente as ocorrências. 
Como grande parte das exposições a medicamentos está relacionada às 
crianças de 2 a 4 anos, e, em geral, o produto é um medicamento prescrito para 
o seu próprio uso ou para um familiar, não se torna difícil identificar o agente 
causador. Entretanto, a quantidade ingerida, o momento da exposição e as 
circunstâncias que envolvem a ocorrência nem sempre são conhecidas. Nessas 
ocasiões, o diagnóstico e o tratamento corretos dependem do exame clínico 
detalhado e atencioso. Situações mais difíceis envolvem pacientes suicidas, 
usuários de drogas e abuso e suspeita de violência. Porém, a maioria das 
intoxicações evolui de forma satisfatória apenas com medidas de suporte. 
Os centros de informações toxicológicas no Brasil, apesar de geralmente 
atuar utilizando medidas secundárias – ou seja, responder às ocorrências, 
orientando sobre as primeiras medidas de tratamento, auxiliar no 
estabelecimento do diagnóstico e do prognóstico, facilitando o acesso à 
utilização de antídotos –, costumam ter soluções bastante importantes e rápidas, 
sendo um meio extremamente eficaz, auxiliando nessas situações. 
Existem dois tipos de intoxicação: 
• ativa – que requer uma ação consistente do indivíduo; 
• passiva – que requer pouca ou nenhuma ação individual. 
Os tratamentos para intoxicações variam dependendo da causa e do 
estado clínico do indivíduo, podendo ser iniciado nos primeiros minutos 
(ambulância) ou no momento da chegada ao pronto-socorro, pela equipe 
médica, e envolve preferencialmente avaliação dos sinais vitais – pressão, 
batimentos cardíacos e oxigenação do sangue –; identificação das causas – 
histórico clínico, sintomas e exame físico –; descontaminação, que diminui a 
exposição à substância tóxica – lavagem gástrica, carvão ativado, lavagem 
intestinal etc. –; antídoto, quando se sabe a substância e quando existir antídoto 
específico. 
 
 
5 
A incidência de intoxicações no Brasil não é bem conhecida. Várias fontes 
coletam dados adotando classificações diferentes e nenhuma delas tem 
abrangência total da população. Os dados de mortalidade seriam os mais 
confiáveis porque provêm de uma única fonte, que é o registro de óbito. 
Entretanto, mortes por intoxicação podem ocorrer antes que as pessoas 
obtenham assistência médica. A identificação da causa desses óbitos é da 
competência dos Institutos de Medicina Legal (IML), que nem sempre têm as 
condições necessárias para isso, em razão da carência nas estruturas dos 
laboratórios de análises toxicológicas. As informações disponíveis referem-se 
praticamente aos registros de casos dos Centros de Informação e Assistência 
Toxicológica (Ciat), que são consolidadas e divulgadas pelo Sinitox, vinculado à 
Fiocruz. 
As exposições a medicamentos têm representado 27% dos casos 
registrados pelo Ciat, com letalidade de 0,5%, em média. O banco de dados do 
órgão estadunidense tem 49 milhões de registros de intoxicações, sendo que 
cerca de 40% envolvem medicamentos. Desses, quase 30% foram intoxicações 
intencionais. Entre os casos fatais, os medicamentos representam cerca de 85% 
dos casos. 
Educar as pessoas e persuadi-las a mudar de comportamento, modificar 
a legislação e a regulamentação, adaptar produtos e o ambiente para proteger 
os indivíduos são medidas importantes que auxiliariam tanto no registro com 
vistas à geração de dados, imprescindíveis na tomada de decisões e de 
planejamentos de prevenção, como na redução dos casos, ou ainda, melhoriano atendimento e tratamento dessas intoxicações. 
1.2 Prevenção das intoxicações por medicamentos 
As medidas de prevenção podem ser primárias, que impedem a 
ocorrência do dano, ou secundárias, quando procuram tornar mínima a sua 
extensão uma vez ocorrido. São três as estratégias utilizadas na prevenção de 
injúrias acidentais. 
• Prevenção de intoxicações acidentais: as intoxicações ocorrem quando 
vários fatores coincidem em um local, em um dado momento. Alguns 
aspectos devem ser considerados: 
− orientação da população sobre a toxicidade dos medicamentos; 
 
 
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− divulgação dos telefones dos centros de informações toxicológicas. 
• Prevenção de intoxicações intencionais: as medidas que minimizam as 
consequências fazem parte das estratégias mais utilizadas – controle de 
produção, distribuição, prescrição, dispensação e uso de psicofármacos. 
• Prevenção dos erros de medicação: os eventos adversos resultantes dos 
erros de medicação podem estar relacionados à prescrição, transcrição, 
dispensação, administração, monitoramento e uso do medicamento. O 
erro pode estar relacionado à prática profissional, ao produto ou 
procedimento, a problemas de comunicação etc. Na prescrição do 
medicamento é quando a maioria dos erros ocorrem. 
Algumas medidas específicas podem ser aplicadas aos pais de crianças 
pré-escolares, por exemplo, como verificar se há plantas e cogumelos tóxicos na 
casa ou no jardim, armazenar produtos domissanitários e medicamentos em 
locais apropriados etc. Alguns estudos indicam que o médico pediatra pode 
ajudar na prevenção de intoxicações acidentais, incorporando na sua rotina de 
ambulatório informações à família das crianças em relação à prevenção de 
acidentes. Esses estudos indicam que são necessários somente 3 minutos e 17 
segundos de tempo gasto na consulta para aconselhamento dos pais. 
As intoxicações intencionais envolvem comportamentos muito complexos 
(suicídio, uso abusivo de medicamentos e automedicação) que constituem 
grandes desafios para os profissionais envolvidos em medidas preventivas. Por 
isso, as medidas que minimizam as consequências fazem parte das estratégias 
mais utilizadas. 
Os psicofármacos são os fármacos mais envolvidos nesses casos. 
Medidas de controle de produção, distribuição, prescrição, dispensação e uso 
desses medicamentos devem ser consideradas pelos responsáveis pelas várias 
etapas desse processo. As circunstâncias acidentais são as mais frequentes, 
seguidas pelas tentativas de suicídio, uso terapêutico e erros de medicação. 
TEMA 2 – NEUROLÉPTICOS 
Os antipsicóticos ou neurolépticos são medicamentos inibidores das 
funções psicomotoras, prescritos em estados de excitação ou de agitação, por 
exemplo. Paralelamente, eles atenuam também os sintomas neuropsíquicos 
considerados psicóticos, tais como os delírios e as alucinações. 
 
 
7 
São substâncias químicas sintéticas, capazes de atuar seletivamente nas 
células nervosas que regulam os processos psíquicos no ser humano e a 
conduta em animais. 
A descoberta da clozapina (dibenzodiazepina) entre 1955 e 1959 
representou o início de uma nova geração de antipsicóticos. Com efeito, doses 
clinicamente eficazes de clozapina (protótipo desse grupo) como antipsicótico 
produziram uma baixa incidência de efeitos extrapiramidais. Cabe ressaltar que 
a clozapina tem um perfil ímpar entre os fármacos atípicos, pois é eficaz na 
melhoria das psicoses em doentes esquizofrênicos resistentes à terapia 
antipsicótica, reduz a taxa de suicídio e aumenta a longevidade desses 
pacientes. A olanzapina, quetiapina, risperidona, entre outros, constituem 
outros fármacos antipsicóticos relevantes dessa classe. 
Os neurolépticos são drogas lipossolúveis e, portanto, facilmente 
absorvidas no sistema nervoso central (SNC). Os antipsicóticos têm sua primeira 
passagem pelo fígado, portanto, sofrem metabolização hepática. A grande 
maioria apresenta meia-vida longa, entre 20 e 40 horas, e consequentemente 
pode demorar em média cinco dias para se estabilizar no organismo. 
Diferentes medicamentos antipsicóticos bloqueiam diferentes tipos de 
neurotransmissores. Os mais eficazes bloqueiam os receptores de dopamina e 
a maior parte deles tem efeitos subjetivos desagradáveis em indivíduos não 
psicóticos. Os fármacos típicos mais antigos podem condicionar efeitos 
extrapiramidais que incluem síndrome parkinsônica (bradicinesia, rigidez, 
tremores variáveis, expressão facial de máscara, andar arrastado, entre 
outros), acatisia (inquietação incontrolável) e distonia aguda (espasmo dos 
músculos da língua, da face, do pescoço e das costas). A flufenazina e, 
principalmente, o haloperidol são os neurolépticos típicos que mais 
condicionam toxicidade extrapiramidal. Os novos antipsicóticos, como a 
clozapina, olanzapina e a quetiapina, tem muito baixa ou nenhuma toxicidade 
extrapiramidal (Dinis-Oliveira; Bastos; Carvalho, 2018). 
Alguns desses fármacos apresentam toxicidade cardiovascular, 
portanto, doentes com histórico de doenças cardíacas, arritmias, síncope ou 
parada cardíaca súbita devem evitar fármacos dessa classe que aumentam 
esses riscos. Podem também ocasionar efeitos metabólicos e endócrinos, por 
exemplo, o aumento de peso; especialmente a obesidade abdominal está 
associada ao uso prolongado de clozapina, olanzapina e de clorpromazina, 
 
 
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impondo monitorização na ingestão de carboidratos. O uso de alguns 
antipsicóticos também pode contribuir para hiperglicemia e dislipidemia, dois 
relevantes efeitos adversos metabólicos. 
A toxicidade é dependente da dose, das outras patologias associadas e 
da faixa etária, e frequentemente, o histórico de ingestão relatado por familiares 
é pouco confiável. A toxicidade do sistema cardiovascular e do SNC 
condicionada pela superdosagem de antipsicóticos tem sido alvo de 
preocupação. Apesar de os atípicos serem mais prescritos dos que os típicos, 
não parecem ser mais seguros em casos de superdosagem aguda. 
O diagnóstico pode ser difícil, pois nem história e exame físico 
isoladamente conseguem realizar um diagnóstico específico pelo fato de haver 
a possibilidade de ser semelhante a um grande número de intoxicações. As 
síndromes não toxicológicas também podem simular a intoxicação por 
antipsicóticos, como a hipoglicemia, as infecções do SNC, entre outras 
situações. 
Os exames complementares devem incluir hemograma completo, função 
renal, eletrólitos. O sódio pode estar baixo, particularmente em pacientes com 
convulsões associadas. Em pacientes em uso de clozapina ou clorpromazina 
com febre, é fundamental realizar um hemograma completo em razão do risco 
de agranulocitose. Importante ressaltar que níveis séricos não se relacionam 
com achados clínicos. É necessário também monitorar função cardíaca e renal 
(Hampton et al., 2014). 
Além disso, deve ser feito tratamento de suporte. A maioria dos pacientes, 
na apresentação, raramente manifesta depressão respiratória; ainda assim, 
como em qualquer outra intoxicação aguda, a preocupação inicial é proteger as 
vias aéreas, ou seja, é importante fazer a monitorização respiratória, com 
suplementação de oxigênio se necessário (Brandão Neto, 2018b). Em pacientes 
com rebaixamento do nível de consciência, deve-se realizar a avaliação da 
glicemia e considerar o uso de naloxona e tiamina. As convulsões podem ser 
tratadas com benzodiazepínicos, como o lorazepam, e em casos de distonia, a 
indicação é administrar biperideno (Hampton et al., 2014). 
TEMA 3 – ANTIDEPRESSIVOS 
Nas últimas décadas, a farmacologia da depressão evoluiu muito e 
rapidamente. Os primeiros antidepressivos, os antidepressivos tricíclicos (ADTs) 
 
 
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e os inibidores da monaminooxidase (IMAOs), foram descobertos por meio da 
observação clínica. Os ADTs apresentavam boa eficácia em decorrência de sua 
ação, aumentando a disponibilidade de noradrenalina e serotonina. Porém, teve 
seu uso limitadoem função do bloqueio de receptores de histamina, receptores 
colinérgicos e receptores alfa-adrenérgicos que acarretavam efeitos colaterais, 
levando à baixa tolerabilidade e risco de toxicidade. Da mesma forma, o uso dos 
IMAOs ficava comprometido em função do risco da interação com tiramina e o 
risco de crises hipertensivas potencialmente fatais (Moreno; Moreno; Soares, 
1999). 
A nova geração de antidepressivos é constituída por medicamentos que 
agem em um único neurotransmissor, por exemplo, os inibidores seletivos de 
recaptação de serotonina ou de noradrenalina, ou aqueles que agem em 
múltiplos neurotransmissores/receptores, como a venlafaxina, a bupropiona, a 
trazodona e a mirtazapina, sem ter como alvo outros receptores cerebrais não 
relacionados com a depressão (tais como histamina e acetilcolina) (Moreno; 
Moreno; Soares, 1999). 
Os antidepressivos tricíclicos (ADT) são indicados para depressão 
severa, pois são capazes de bloquear a receptação dos três neurotransmissores 
referidos (noradrenalina, serotonina e dopamina). Esse é o mecanismo de ação 
inerente a esses fármacos, sendo os principais a nortriptilina, a desipramina, a 
amitriptilina, a imipramina, entre outros, que condiciona a um aumento 
persistente da biodisponibilidade dessas monoaminas nas sinapses nervosas 
centrais. Os antidepressivos tricíclicos são altamente lipofílicos, cruzam 
facilmente a barreira hematoencefálica e atingem picos de concentração 
plasmática entre 2 e 6 horas após a ingestão em doses terapêuticas. Em casos 
de intoxicação, a absorção gastrintestinal pode ser prolongada em razão do 
efeito antimuscarínico na motilidade intestinal. A biodisponibilidade é de apenas 
30 a 70% em decorrência do extenso metabolismo hepático de primeira 
passagem. Os níveis de antidepressivos tricíclicos tissulares são mais de 10 
vezes maiores do que os níveis plasmáticos, e apenas 1 a 2% da carga corporal 
total de antidepressivos cíclicos é encontrada no sangue. Os antidepressivos 
tricíclicos são eliminados quase inteiramente por oxidação hepática (Brandão 
Neto, 2018a). 
A toxicidade cardiovascular desses fármacos é amplamente conhecida, 
bem como o bloqueio dos receptores muscarínicos provoca um leque 
 
 
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característico dos efeitos periféricos anticolinérgicos adversos, como taquicardia, 
retenção urinária, midríase, secura da boca e das mucosas, entre outros. Em 
nível central, e em situações de superdosagem, os efeitos colinérgicos podem 
incluir agitação psicomotora, descoordenação motora, convulsões, delírios e 
depressão respiratória. Assim, os efeitos tóxicos dos antidepressivos tricíclicos 
se dão pela combinação dos efeitos anticolinérgicos, antiadrenérgicos, e 
também pelos efeitos depressores diretos sobre a atividade miocárdica, podendo 
ocorrer morte súbita por fibrilação ventricular ou parada cardíaca. Outro dado 
importante é que a toxicidade desses medicamentos geralmente dura mais do 
que a atividade original em razão da produção de metabólitos ativos, bioativos. 
O diagnóstico é essencialmente clínico, sendo importantes os achados 
característicos com história de exposição. Os achados eletrocardiográficos 
característicos e as dosagens séricas das medicações corroboram o diagnóstico. 
Pelo menos metade das exposições antidepressivas tricíclicas envolve a 
coingestão de outras substâncias, que pode aumentar ou alterar bastante as 
manifestações tóxicas (Brandão Neto, 2018a). 
A quantificação dos níveis plasmáticos é útil no monitoramento 
terapêutico, em longo prazo. Porém, podem ocorrer resultados falso-positivos 
em triagens qualitativas na urina, não devendo direcionar ou alterar as medidas 
de manejo clínico associadas a esse tipo de intoxicação, que podem ser medidas 
básicas de suporte. Recomenda-se lavagem gástrica até 24 horas após 
ingestão. O carvão ativado liga-se a esses medicamentos, diminuindo, portanto, 
a absorção, sendo indicado em ingestões ocorridas até duas horas antes. 
Recomenda-se tratar arritmias com bicarbonato de sódio e evitar o uso de 
agonistas colinérgicos, flumazenil, betabloqueadores e antagonistas dos canais 
de cálcio. 
Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) 
apresentam um índice terapêutico maior, uso mais seguro e um quadro de 
intoxicação menos grave que ADT. 
Os mais prescritos são o citalopram, a fluoxetina, a paroxetina e a 
sertralina, fármacos mais tolerantes e seguros. Os ISRSs inibem de forma 
potente e seletiva a recaptação de serotonina, resultando em potencialização da 
neurotransmissão serotonérgica. Embora compartilhem o principal mecanismo 
de ação, os ISRS são estruturalmente distintos com marcadas diferenças no 
perfil farmacodinâmico e farmacocinético. A potência da inibição de recaptação 
 
 
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da serotonina é variada, assim como a seletividade por noradrenalina e 
dopamina. Sertralina e paroxetina são os mais potentes inibidores de 
recaptação. O citalopram e a fluoxetina são misturas racêmicas de diferentes 
formas quiral que apresentam perfis farmacodinâmico e farmacocinético 
variados. A fluoxetina apresenta metabólito de ação prolongada e 
farmacologicamente ativo. Os ISRSs também apresentam perfis 
farmacocinéticos variados, que incluem meia vida, farmacocinética linear versus 
não linear, efeito da idade na sua depuração e no seu potencial de inibir 
isoenzimas metabolizadoras de medicamentos do citocromo P450 (CYP). Essas 
diferenças farmacológicas e farmacocinéticas sustentam as diferenças clínicas 
cada vez mais importantes dos ISRSs (Cordás; Moreno, 2008). 
A paroxetina tem maior probabilidade de estar associada ao ganho de 
peso e à disfunção sexual. Outros efeitos adversos neurológicos associados aos 
ISRSs incluem cefaleia, sedação, insônia, tontura, fraqueza ou fadiga, tremor e 
dose média diária recomendada na meia-vida de inibição da inibição da inibição. 
Os ISRSs devem ser usados com cautela com agentes antipsicóticos, pois 
podem potencializar a atividade antidopaminérgica (Brandão Neto, 2018a). 
Os sintomas da intoxicação por ISRS incluem sintomas gastrointestinais 
leves como náuseas e vômitos e, eventualmente, diarreia. Sintomas de 
depressão do SNC como sedação pode ocorrer, mas coma e convulsões 
ocorrem somente em intoxicações graves. Outros sintomas incluem 
manifestações adrenérgicas como tremor e taquicardia sinusal. Menos 
frequentemente são observadas hipertensão e hipotensão (Brandão Neto, 
2018a). 
Não se recomenda utilizar lavagem gástrica, xarope de ipeca, carvão 
ativado e irrigação intestinal. No entanto, os benzodiazepínicos podem ser 
utilizados inicialmente como anticonvulsivantes, e caso as convulsões persistam, 
por fenobarbital. Recomenda-se que os pacientes devem ser observados por um 
período de em média seis horas, pois pode ocorrer necessidade de suporte. 
O carbonato de lítio é usado para o tratamento do transtorno bipolar e 
de outros transtornos psiquiátricos. A toxicidade é causada mais comumente 
pelo excesso de medicação crônica em pacientes com comprometimento renal. 
A superdosagem aguda, em contrapartida, em geral é menos grave. O lítio é 
completamente absorvido em seis a oito horas após a ingestão. A penetração no 
cérebro é lenta, o que explica o retardo entre os picos dos níveis sanguíneos e 
 
 
12 
os efeitos observados sobre o SNC após uma superdosagem aguda. 
Praticamente toda a eliminação ocorre pelos rins, com uma meia-vida de 14 a 
30 horas; não é metabolizado, 95% é excretado inalterado na urina, 4 a 5% 
eliminado no suor e 1% nas fezes (Olson, 2012). 
A intoxicação crônica poderá ocorrer em pacientes submetidos a doses 
terapêuticas estáveis. Como o lítio é excretado pelos rins, no qual é tratado como 
o sódio, qualquer estado que cause desidratação, depleção de sódio ou 
reabsorção excessiva de sódio poderá levar ao aumento da reabsorção de lítio, 
ao seu acúmulo e, possivelmente, a uma intoxicação (Olson, 2012). 
Aintoxicação branda a moderada resulta em letargia, fraqueza muscular, 
fala arrastada, ataxia, tremor e movimentos mioclônicos. Rigidez e efeitos 
extrapiramidais também podem ser observados. A intoxicação grave poderá 
levar a delirium agitado, coma, convulsões e hipertermia. A recuperação em 
geral é bastante lenta, e os pacientes poderão permanecer confusos ou 
enfraquecidos por dias a semanas. O diagnóstico é comprovado pelo nível 
elevado de lítio (Olson, 2012). 
A maioria dos laboratórios clínicos hospitalares pode avaliar a 
concentração sérica basal de lítio. Entretanto, o nível sérico de lítio não 
representa uma previsão precisa da toxicidade. Na intoxicação crônica, a 
toxicidade poderá estar associada a níveis apenas levemente “superiores à faixa 
terapêutica” (Olson, 2012). 
• Intoxicação aguda: sintomas gastrintestinais. 
• Intoxicação crônica: 
− leve (1,5 a 2,5mEq/L) – náusea, vômito, dor abdominal, diarreia, 
letargia, fadiga, lapso de memória, tremor fino; 
− moderada (1,5 a 2,5mEq/L) – confusão mental, agitação e/ou 
depressão do SNC, delírio, tremor grosseiro, rigidez muscular, disartria, 
nistagmo, ataxia, fasciculação, taquicardia, hipertensão; 
− grave (2,5 a 3mEq/L) – bradicardia, bloqueio sinoatrial e 
atrioventricular, coma, convulsão; 
− fatal (>3mEq/L) – arritmias, colapso vascular, hipotensão. 
O que pode ser feito para complementar o diagnóstico é distinguir não 
usuário do usuário crônico, além da quantificação do lítio (eletrodo seletivo) (faixa 
terapêutica: 0,8 a 1,25mEq/L). Como os resultados quantitativos podem não 
 
 
13 
representar o verdadeiro cenário, recomenda-se realizar eletrocardiograma, 
dosagem de sódio, potássio, cálcio, magnésio, glicemia, hemograma etc. 
O tratamento constitui a manutenção das funções vitais. A lavagem 
gástrica em até duas horas e hemodiálise em casos graves. 
TEMA 4 – ANTICONVULSIVANTES 
São medicamentos que que visam ao tratamento da epilepsia e da 
convulsão. A convulsão é definida como intervalos temporais da função cerebral, 
e pode ocorrer em razão de uma agitação desordenada das atividades elétricas 
cerebrais, provocando contrações por todo o corpo. 
São medicamentos que apresentam um índice terapêutico baixo, sendo, 
portanto, responsáveis por um grande número de intoxicações. Os principais 
anticonvulsivantes são o fenobarbital (barbitúrico), a carbamazepina, a fenitoína, 
o ácido valproico, a lamotrigina, entre outros. As intoxicações normalmente estão 
associadas à tentativa de suicídio, abuso, doses excessivas, ingestão acidental 
e interações medicamentosas. 
Podem ser classificados como: 
• seletivos ou não sedativos – agem alterando o fluxo de íons (Na+) 
transmembrana, por exemplo, a fenitoína e a carbamazepina; 
• não seletivos ou sedativos – agem alterando o GABA pós-sináptico, por 
exemplo, o fenobarbital. 
Há os agentes cujo mecanismo de ação não foi completamente elucidado, 
por exemplo, a lamotrigina. O ácido valproico tem propriedades comuns aos dois 
primeiros grupos. 
Entre os anticonvulsivantes está a classe dos barbitúricos que 
desempenham papel importante para o controle de quase todos os tipos de 
crises epilépticas, cujo mecanismo de ação é a potencialização da ação do ácido 
gama-aminobutírico (GABA). São medicamentos de controle especial, logo, os 
pacientes devem ser bem orientados quanto ao seu uso, como também a 
respeito de reações adversas e possíveis interações, as quais podem se tornar 
fatores para intoxicação (Souza et al., 2019). 
Um dos mais importantes fármacos dessa classe é o fenobarbital, que é 
frequentemente reportado e encontrado em intoxicações. Prescrito tanto para 
 
 
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tratamento de epilepsia quanto como anestésico geral por sua ação como 
depressor não seletivo do SNC, ele age principalmente no centro da vigília. 
Medicamentos barbitúricos normalmente agem reduzindo a atividade 
cerebral, cujos efeitos são indução da excitabilidade (efeito paradoxal), leve 
sedação, falta de coordenação motora, e efeito na musculatura lisa esquelética, 
cardíaca e nervosa. 
O fenobarbital apresenta rápida absorção pelo trato gastrointestinal, 
ampla distribuição pelo organismo, além de atravessar a barreira placentária. 
São importantes indutores do sistema enzimático P450, sendo responsáveis 
pela indução do próprio metabolismo. Usuários crônicos podem desenvolver 
tolerância a essa substância. As principais manifestações clínicas são 
sonolência, ataxia, nistagmo, miose, e em casos graves, pode evoluir para coma, 
hipotonia, hiporreflexia, hipotermia e depressão respiratória. 
Uma vez que o paciente esteja estável e se a ingestão for recente (até 
duas horas), deve-se iniciar a descontaminação por meio da utilização de carvão 
ativado (CA) em doses múltiplas seriadas. Em casos graves, com instabilidade 
hemodinâmica ou insuficiência renal, pode-se considerar hemodiálise e 
alcalinização urinária, a fim de prevenir ou reduzir a rabdomiólise. 
Os exames complementares para confirmação da intoxicação podem ser 
feitos pela dosagem sérica de fenobarbital, a qual apresenta boa correlação com 
o quadro clínico. 
A carbamazepina bloqueia canais de sódio no SNC e no coração, além 
de apresentar ação anticolinérgica. Clinicamente, é usada como 
anticonvulsivante no tratamento de neuralgia do trigêmeo e no controle de mania 
e agressividade. A toxicidade da carbamazepina se relaciona diretamente com 
a sua concentração no sangue. 
A absorção pelo trato gastrointestinal (TGI) lenta e irregular apresenta 
grande afinidade por proteínas plasmáticas. O metabolismo é hepático, e um dos 
principais motivos de sua toxicidade é a formação de carbamazepina-10,11-
epóxido (metabólito ativo). Outra característica importante é o fato de ser um 
indutor enzimático de outros fármacos e dele mesmo, portanto, deve-se levar 
isso em consideração em casos de associações medicamentosas para evitar 
uma interação importante e que, muitas vezes, dependendo das condições, pode 
ser fatal. 
 
 
15 
As principais manifestações clínicas, em casos de intoxicação aguda são 
ataxia, nistagmo, midríase, distonia, mioclonia, convulsões, hipotensão, 
hipertermia, coma, podendo levar à morte por falência respiratória. Pode ser 
realizada lavagem gástrica em até 12 horas após a ingestão, o carvão ativado 
em doses seriadas em até 48 horas após a ingesta. Em casos mais graves, pode 
ser feita a hemoperfusão com filtros de carvão ativado. 
A quantificação sérica de carbamazepina (faixa terapêutica de 4 a 
10 µg/mL) é recomendada, pois os valores são condizentes com os sinais e 
sintomas. 
TEMA 5 – ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDAIS (AINES) 
Os analgésicos não opioides e anti-inflamatórios não esteroides (AINES) 
estão entre os fármacos mais utilizados e prescritos no mundo, principalmente 
por terem efeito sintomático nas doenças ou processos inflamatórios para os 
quais são prescritos. Internacionalmente, são conhecidos pelo uso de “over-the-
counter” – OTCs (“sobre o balcão”), pelo fato de serem medicamentos que não 
requerem prescrição e que têm sua venda livre, desconsiderando-se restrições 
de indicação, efeitos adversos e potenciais interações medicamentosas 
prejudiciais com outros fármacos comumente utilizados, por exemplo, os 
protetores gástricos (Farias, 2016). 
No Brasil, a dificuldade de acesso aos serviços de saúde principalmente 
pelos grupos populacionais mais socialmente vulneráveis contribui para grande 
utilização desses fármacos. Eles apresentam grande variedade de oferta com 
marcante investimento da indústria farmacêutica para sua prescrição e uso. 
Esses aspectos colaboram para o aumento da automedicação e dos casos de 
óbito por intoxicação com medicamentos (Farias, 2016). 
Os AINES têm três efeitos principais: 
• analgésico; 
• antipirético; 
• anti-inflamatório. 
Podem ser classificados como não seletivos (inibem as duas isoformas da 
COX, ou seja, COX-1 e COX-2)e seletivos para COX-2. Os inibidores não 
seletivos da COX (AINE- anti-inflamatório não esteroidal) geralmente bloqueiam 
as duas isoformas da COX em diferentes graus e reversivelmente. São eles os 
 
 
16 
salicilatos, os derivados do ácido propiônico, derivados do ácido acético, 
derivados do oxicam, derivados das sulfonamidas, paracetamol (acetaminofeno) 
e inibidores da COX-2: celecoxibe, meloxicam, etoricoxibe. 
Os derivados do ácido salicílico (salicilatos) estão entre os fármacos 
mais importantes dessa classe. A forma não ionizada é absorvida passivamente 
por difusão pelo TGI na parte superior do intestino delgado, com distribuição para 
quase todos os tecidos, com mais de 50% de ligação com as albuminas 
plasmáticas. São biotransformadas pelas esterases do plasma e enzimas do 
retículo endoplasmático hepático. A principal via de biotransformação é a 
formação do ácido salicilúrico, seguida pelo salicilglicurônico fenólico. É 
excretado pela urina na forma de ácido salicílico livre (10%), ácido saicilúrico 
(75%), salicilglicuronato fenólico (5%) e ácido gentístico e gentisúrico (40mg/dL associados à toxicidade. Para o 
diagnóstico e tratamento da intoxicação aguda é importante estabelecer a 
correlação entre a concentração de salicilato no soro e o tempo (Figura 1), porém 
a interpretação deve ser cuidadosa, pois em alguns casos o nomograma pode 
subestimar a toxicidade, devendo ser avaliado em conjunto com outros sinais e 
exames complementares (Brandão Neto, 2018c). Caso haja suspeita do uso de 
altas doses, iniciar o tratamento sem esperar o diagnóstico laboratorial. 
Figura 1 – Nomograma de Done 
 
Fonte: com base em Done, 1960. 
Os testes comercialmente disponíveis podem qualitativamente detectar o 
salicilato na urina, mas esses testes têm limitações. O nível sérico isoladamente 
 
 
18 
não ajuda a determinar se o paciente está ou não intoxicado por salicilatos, e 
não pode ajudar a orientar o tratamento. Da mesma forma, o teste de cloreto 
férrico é muito sensível a pequenas quantidades de ácido salicílico, mas um 
resultado positivo não indica intoxicação por salicilato ou toxicidade (Brandão 
Neto, 2018c). 
Outro fármaco bastante utilizado e importante do ponto de vista 
toxicológico é o paracetamol ou acetaminofeno, que é um analgésico-
antipirético derivado do p-aminofenol que tem ação antipirética alta, analgésica 
média e anti-inflamatória baixa. Atualmente é o analgésico mais utilizado, 
principalmente em pediatria, substituindo o uso de salicilatos para evitar a 
síndrome de Reye (Sebben et al., 2010). 
O paracetamol é rapidamente absorvido no TGI, com ligação variável com 
as proteínas plasmáticas. A principal via de biotransformação é a hepática, que 
ocorre por meio de três mecanismos metabólicos: conjugação com ácido 
glicurônico (40% a 67%), sulfatação (20% a 46%) e oxidação (5% a 15%). 
A hepatotoxicidade pode ocorrer após a ingestão de dose única de 10 a 
15 gramas de paracetamol em adultos. Em sobredosagem, após saturação das 
vias metabólicas principais, maior quantidade de paracetamol sofre oxidação, 
gerando maior quantidade de metabólito tóxico (n-acetil-p-benzoquinonimina – 
NAPBQI), excedendo a capacidade de desintoxicação da glutationa. O tempo de 
meia-vida é de uma a três horas e em sobredose pode chegar a 12 horas. Doses 
de 150 e 200 mg/kg, respectivamente, em adultos e crianças são passíveis de 
causar danos hepáticos. Quando as reservas de glutationa chegam a menos de 
30%, o NAPBQI livre exerce sua ação tóxica sobre os hepatócitos, ligando-se 
covalentemente a proteínas intracelulares, podendo levar à morte celular. Além 
desse mecanismo oxidativo, outras vias fisiopatológicas complementares têm 
sido propostas experimentalmente, como formação de radicais livres, 
perturbação da homeostase do cálcio, inibição da cadeia respiratória 
mitocondrial etc. (Sebben et al., 2010). 
Os sintomas que aparecem durante os dois primeiros dias de intoxicação 
podem não refletir sua gravidade potencial. O quadro clínico de intoxicação por 
paracetamol apresenta geralmente três períodos bem definidos, podendo chegar 
a um quarto, resolutivo. Nas primeiras 24 horas, o paciente se apresenta 
assintomático ou com leve mal-estar, náuseas, vômitos, palidez e epigastralgia. 
Entre 24 e 72 horas, o paciente pode seguir clinicamente assintomático ou 
 
 
19 
apresentar sintomatologia leve, semelhante ao primeiro período e/ou iniciar com 
dor no hipocôndrio direito. Sua alteração característica é o aumento das 
transaminases hepáticas. O período de 72 horas a cinco dias é de máxima 
expressão da hepatotoxicidade, e pode evoluir para falência hepática aguda. Os 
sintomas clínicos podem variar de pouco expressivos até quadro de 
encefalopatia, coma e transtornos de coagulação, dependendo do grau de 
disfunção hepática. São observadas elevação extrema de transaminases, 
bilirrubina total e tempo de protrombina. Se a insuficiência hepática aguda não 
levar a óbito, a reversibilidade é total, estando o tecido hepático regenerado por 
completo entre cinco e sete dias até duas semanas (Sebben et al., 2010). 
Para a avaliação da severidade da hepatotoxicidade é necessária a 
determinação da concentração de paracetamol no plasma. O método mais 
utilizado no diagnóstico é o Nomograma de Rumack-Matthew (Figura 2), que 
avalia a concentração plasmática de paracetamol relacionada com o intervalo 
transcorrido desde a ingesta do medicamento até a coleta do sangue, indicando 
se o antídoto deve ser administrado. O resultado não somente tem valor de 
certeza diagnóstica como também avalia o risco de hepatotoxicidade, indicando 
uso do antídoto específico (n-acetilcisteína) (Sebben et al., 2010). 
Figura 2 – Nomograma de Rumack-Matthew: concentração de paracetamol (mg/L) 
relacionada ao tempoapós ingerido (h) para o estabelecimento de riscos ou danos 
prováveis 
 
 
Fonte: com base em Sebben et al., 2010. 
 
 
20 
Exames complementares incluem glicemia, atividade de protrombina, 
transaminases, bilirrubinas, ureia, creatinina, amilase, gasometria arterial. 
Se a concentração de paracetamol no sangue estiver elevada, administra-
se como antídoto a n-acetilcisteína (NAC) por via oral ou intravenosa, que é 
precursor da glutationa, reduzindo a toxicidade do paracetamol. Esse antídoto 
auxilia na prevenção de lesões hepáticas, porém não reverte a lesão já instalada. 
Em casos mais graves e com mau prognóstico, pode ser necessária a realização 
de um tratamento para a insuficiência hepática ou até mesmo de um transplante 
de fígado. 
NA PRÁTICA 
A intoxicação por medicamentos é questão de saúde pública, pois, além 
de serem de fácil acesso, existe uma quantidade significativa da prática de 
automedicação. A velocidade do manejo é muito importante, bem como a 
identificação do medicamento, pois possibilitam tanto o uso de antídoto 
específico, quando houver, quanto a realização de um prognóstico mais correto 
por meio dos nomogramas, por exemplo. Mesmo que os laboratórios dentro dos 
hospitais não tenham equipamentos mais específicos para a detecção de 
medicamentos em matrizes biológicas, a presença de um espectrofotômetro já 
auxilia no diagnóstico certeiro de diversos tipos de intoxicações. 
FINALIZANDO 
Nesta aula, foi apresentada uma abordagem resumida sobre a toxicidade 
de alguns medicamentos, diagnósticos, tratamentos e formas de prevenir 
algumas intoxicações. Entretanto, a lista de medicamentos considerados tóxicos, 
visto que a toxicidade está relacionada à dose, é imensa. Vale lembrar que 
sempre que um medicamento apresentar índice terapêutico baixo, seu potencial 
tóxico aumenta. Outro fator relevante em se tratando de toxicidade de 
medicamentos são as interações que podem ocorrer, assunto este inesgotável 
para ser abordado brevemente. 
 
https://www.msdmanuals.com/pt/casa/doen%C3%A7as-imunol%C3%B3gicas/transplante/transplante-de-f%C3%ADgado
https://www.msdmanuals.com/pt/casa/doen%C3%A7as-imunol%C3%B3gicas/transplante/transplante-de-f%C3%ADgado
 
 
21 
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