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1 CONTROLE BIOLÓGICO N A A G R IC U L T U R A : FUNDAMENTOS & APLICAÇÕES ALEXANDRE IGOR DE AZEVEDO PEREIRA CARMEN ROSA DA SILVA CURVÊLO CATARINA DE MEDEIROS BANDEIRA 2 CONTROLE BIOLÓGICO NA AGRICULTURA: FUNDAMENTOS & APLICAÇÕES Autores: Alexandre Igor de Azevedo Pereira Carmen Rosa da Silva Curvelo Catarina de Medeiros Bandeira Areia – PB Dezembro / 2007 REALIZAÇÃO: PATROCÍNIO: 3 CONTROLE BIOLÓGICO NA AGRICULTURA: FUNDAMENTOS & APLICAÇÕES ÍNDICE PREFÁCIO_________________________________________________________________________ 4 CAPÍTULO 1________________________________________________________________________ 6 FUNDAMENTOS ECOLÓGICOS DO CONTROLE BIOLÓGICO CAPÍTULO 2_______________________________________________________________________ 18 CONCEITO, IMPORTÂNCIA E MÉTODOS DE CONTROLE EMPRAGADOS ÀS PRAGAS AGRÍCOLAS CAPÍTULO 3_______________________________________________________________________ 41 CONTROLE BIOLÓGICO: CONCEITO, HISTÓRICO, VANTAGENS & DESVANTAGENS E TERMINOLOGIAS EMPREGADAS CAPÍTULO 4_______________________________________________________________________ 57 PREDADORES X PARASITÓIDES: VANTAGENS & DESVANTAGENS CAPÍTULO 5_______________________________________________________________________ 77 INTERAÇÃO ENTRE PRODUTOS QUÍMICOS & INIMIGOS NATURAIS CAPÍTULO 6_______________________________________________________________________ 93 CONTROLE BIOLÓGICO & MANEJO INTEGRADO DE PRAGAS CAPÍTULO 7_____________________________________________________________________ 123 CRIAÇÃO MASSAL E LIBERAÇÃO DE AGENTES DE CONTROLE BIOLÓGICO CAPÍTULO 8_____________________________________________________________________ 146 COMERCIALIZAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO & EXPORTAÇÃO DE INIMIGOS NATURAIS CAPÍTULO 9_____________________________________________________________________ 155 CONTROLE BIOLÓGICO DE DOENÇAS DE PLANTAS CAPÍTULO 10____________________________________________________________________ 168 FUTURO DO CONTROLE BIOLÓGICO SESSÃO DE FOTOS_______________________________________________________________ 173 AGRADECIMENTOS______________________________________________________________ 174 Página 4 PREFÁCIO É com grande satisfação que retornamos ao Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal da Paraíba, Campus II, Areia (PB) para realizarmos, pelo segundo ano seguido, mais um curso sobre Controle Biológico de Pragas Agrícolas. O primeiro curso proferido em Março de 2006 foi realizado com pleno êxito e participação efetiva de alunos de graduação em Agronomia e Técnicos Agrícolas do centro e de outras localidades do Estado da Paraíba. Os principais assuntos relacionados ao controle biológico de pragas agrícolas foram apresentados de maneira clara e suscinta onde objetivou-se explicar desde os fundamentos básicos, dessa área da entomologia agrícola, como conceitos e definições até assuntos mais complexos como a integração dos inimigos naturais com os inseticidas químicos e o manejo integrado de pragas. Para o nosso segundo curso sobre Controle Biológico intitulado: “Controle Biológico na Agricultura: Fundamentos & Aplicações”, iremos iniciá-lo através de um enfoque ecológico das interações entre predadores e presas que são a base para o entendimento de como as populações de ambos podem se comportar no meio ambiente. Posteriormente, haverá a necessiade de se conhecer e entender o conceito verídico do que de fato seja uma praga agrícola e porque tantos recursos financeiros são investidos em seu controle. O conceito do termo Controle Biológico será moldado através do seu próprio histórico, vantagens, desvantagens e terminologias empregadas para cada agente específico de mortalidade natural. Discutiremos, também, vantagens e desvatagens do uso dos dois inimigos naturais que são mais utilizados em termos de abrangência: predadores e parasitóides. A relação desses com os produtos químicos será também discutida atribuindo-a ao manejo integrado de pragas (MIP). A criação massal de insetos e as principais observações quanto à liberação de inimigos naturais, além da comercialização, regulamentação e protocolos para importação e exportação de inimigos naturais serão igualmente abordados. Diferenciando-se do curso anterior, além da ecologia da predação, o Controle Biológico de Doenças de Plantas será abordado para que possamos entender e aprender que a técnica de controle natural de pragas abrange, com similar eficiência, muito mais organismos vivos do que simplesmente artrópodes. Por acreditar que o controle biológico é hoje uma das principais ferramentas alternativas de controle às pragas, caracterizando-se por ser uma tecnologia não poluidora, de baixo custo e rentável, em sistemas agrícolas ou florestais, desde que manipulada com sabedoria, é que todos os esforços são válidos para que mais estudantes possam conhecer e tirar dúvidas, aprender e aplicar essa tecnologia que foi descoberta a mais de 500 anos na China e que nos dias atuais desponta como um dos pilares para uma agricultura sustentável ecologicamente e financeiramente. Dessa forma, boa leitura. Os Autores 5 CONTROLE BIOLÓGICO NA AGRICULTURA: FUNDAMENTOS & APLICAÇÕES 6 FUNDAMENTOS ECOLÓGICOS DO CONTROLE BIOLÓGICO APRESENTAÇÃO Os surtos de pragas ocorrem repetidamente e, dessa forma, se faz necessário, em muitas oportunidades, a aplicação de pesticidas. Entretanto, tais produtos químicos podem ser substituídos por ferramentas biológicas que realizam a mesma função e custam bem menos. Tais procedimentos envolvem a manipulação dos inimigos naturais de pragas. Entretanto, para se conhecer as premissas de qualquer programa de controle biológico se faz necessário o entendimento do que hoje existe em relação à dinâmica populacional entre predadores e suas presas. Aspectos ecológicos dessa relação serão discutidos desde a denominação empregada para cada agente que provoca mortalidade natural além de outras relações, como os efeitos subletais da predação. O importante é observar que nem sempre o predador é o único responsável pela morte de sua presa e que a competição também pode desempenhar importante papel na regulação populacional dos organismos vivos. De maneira geral, a interação entre a predação e a competição é a base para o entendimento da dinâmica populacional entre predadores e presas. 1 7 No meio ambiente, todo organismo se alimenta e é alimento para outro organismo, sendo essa a idéia básica do conceito de cadeia alimentar, onde cada organismo desempenha um papel importante na regulação populacional de sua presa e também serve como fonte de energia e nutrientes para o seu agente de mortalidade natural. Mesmo os animais considerados em posição de “topo” da cadeia alimentar, ou seja, aqueles que não apresentam, aparentemente, inimigos naturais (p.ex.: Águias, Crocodilos, Tubarões, o próprio Homem e etc.), servem de alimento para organismos que utilizam-nos, após a morte, como fonte de alimento e energia, como é o caso dos decompositores. De maneira geral, cada organismo possui mais de um agente de mortalidade natural, que pode atuar em todas as fases de desenvolvimento da sua presa ou em fases específicas (predadores generalistas ou especialistas). Esta relação fica mais fácil de ser entendida quando citamos os insetos que possuem diferentes estádios de desenvolvimento, sendo que muitas vezes o estádio atual difere totalmente do anterior (p.ex.: pupa – mariposa), fazendo com que determinadoinibidores oriundos do feijoeiro aumentaram a resistência desse material a Callosobruchus maculatus e C. chinensis, duas importantes pragas de grãos dessa cultura. As lectinas são proteínas que se ligam a carboidratos e são encontradas em sementes de diversas espécies vegetais, conferindo, em alguns casos, proteção contra ataque de insetos. Um exemplo é a lectina isolada de ervilha (P-lec) em plantas de fumo, que se tornam resistentes a Heliothis virescens. Mais recentemente, outros genes alternativos vêm sendo estudados incluindo outros grupos de proteínas tóxicas ou enzimas provenientes de microrganismos, além de diversos peptídeos isolados de aranhas e escorpiões. 3.7. CONTROLE QUÍMICO O controle químico é feito através de substâncias denominadas inseticidas. Estes produtos também podem receber outras denominações, quando agrupados com outros compostos (agrotóxicos, pesticidas, defensivos, praguicidas; ou em casos mais específicos: cupincida, formicida, larvicida, ovicida, etc.). Estes são aplicados direta ou indiretamente sobre os insetos, em concentrações adequadas, provocando a sua morte. De acordo com o Decreto nº 4.074, de 4 de janeiro de 2002, que regulamenta a Lei nº 7802/1989, os defensivos agrícolas, ou agrotóxicos, são produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou plantadas, e de outros ecossistemas e de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, bem como as substâncias de produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento. Com o desenvolvimento da química orgânica, no início do século passado, o homem começou a sintetizar moléculas e, desta forma, formatar produtos mais 36 eficazes ao controle de pragas. Surgiam os inseticidas orgânicos. Antes, o agricultor só dispunha de inseticidas inorgânicos para o controle (como o arsênio, por exemplo, de ação restrita). Esses inseticidas orgânicos têm várias origens; os de origem vegetal, de origem petrolífera, de origem virulífera e microbiana. Os inseticidas orgânicos sintéticos foram os mais promissores e ainda hoje são comercializados. Dentre eles, existem os clorados, fosforados, fosforados sintéticos, carbamatos, carbamatos sintéticos e piretróides. Os inseticidas foram inicialmente desenvolvidos para controlar o maior espectro possível de insetos pragas. Freqüentemente, eram necessárias várias aplicações para proporcionar um controle duradouro. Porém, como os produtos apresentavam o mesmo modo de ação, rapidamente algumas espécies de insetos passaram a demonstrar resistência. Em outras palavras, os inseticidas perdiam seu efeito. Na agricultura atual, o controle de pragas por estas substâncias, ainda é o mais utilizado tanto por pequenos, médios, como por grandes produtores (Ramalho, 1994). Este método de controle mesmo quando utilizado de forma adequada causa impacto ambiental, muitas vezes bastante considerável. O grande problema que tem se constatado atualmente é que o mesmo está sendo usado de forma indiscriminada ou sem obedecer os critérios técnicos pré-estabelecidos para o seu uso; isso tem acarretado por conseguinte, enormes problemas, como por exemplo, desequilíbrio ecológico (contaminação de solo, água e ar), afetando a saúde das pessoas, fauna e flora. O pequeno agricultor que muitas vezes não tem nenhuma formação técnica e nem dispõe deste serviço (assistência técnica) usa os pesticidas sem nenhum procedimento técnico muitas vezes cometendo erros de dosagem, erros no horário de aplicação e usando produtos não ideais para determinada praga (aplicação de carrapaticida, por exemplo, para o combate do curuquerê-do-algodoeiro, no município de Areial-PB – observação pessoal do autor) ou doença. Geralmente estas pessoas têm o controle químico como a única alternativa para se controlar as moléstias (pragas e doenças) desprezando, portanto, outras medidas de controle que são bastante eficientes e que praticamente não apresentam nenhum custo ambiental e nem afeta a saúde das pessoas. Alguns produtores já estão utilizando com muito sucesso outros métodos de controle (cultural, biológico, físico, etc.) 37 outros até aboliram de vez o controle químico, trabalhando desta forma com uma agricultura livre de pesticidas. Alguns por consciência ecológica, outros porém simplesmente com o objetivo de explorar novos nichos de mercado que eventualmente venham lhe proporcionar maior lucratividade (é comprovado fatidicamente, que os preços de produtos orgânicos, isentos de controle químico, são maiores do que os convencionais em feiras livres e mercados consumidores). Citricultores do sudeste, por exemplo, estão controlando o cancro cítrico (principal doença dos citros na região) utilizando o controle biológico onde eles importam do exterior moscas que são predadoras do vetor da doença. Estes insetos são multiplicados em laboratório e levados para o campo. O controle é bem mais eficiente do que o químico, aliás, foi o controle químico um dos principais responsáveis para que a doença se caracterizasse na região como a principal moléstia, quando utilizou-se de forma indiscriminada os inseticidas para se controlar na época a praga que é o vetor da doença. Em algumas circunstâncias, porém, o controle químico não tem condições de ser abolido ou substituído, neste caso se aconselha que o mesmo seja utilizado com muito critério técnico, obedecendo normas de segurança, como no caso da pessoa que vai manusear o produto químico usar EPI (equipamento de proteção individual), respeitar ao máximo o meio ambiente observando, por exemplo, horário de aplicação, utilizar produtos que sejam pouco solúveis, que tenham poder residual curto, seletivo, ou seja, tenha ação mais específica, adotar manejo ecológico de pragas (MEP) que consiste em procurar conhecer melhor as pragas (biologia e comportamento, etc), conhecer o nível de infestação que causa prejuízo econômico e só utilizar o produto químico quando realmente for necessário, fazer aquisição do produto (pesticida) somente mediante receituário agronômico, constituindo-se assim uma medida muito importante para evitar amadorismos. Infelizmente, algumas casas de produtos agropecuários não obedecem a essa norma (receituário agronômico) e alem disso não há uma fiscalização eficiente no sentido de obrigá-las a fazê- lo; tendo em vista esses aspectos aqui abordados fica claro a necessidade do uso correto dos agroquímicos atentando para que sua aplicação cause o mínimo de impacto possível, ao aplicador, consumidor e meio ambiente, e que sua utilização ocorra apenas quando não se 38 dispuser de um método de controle economicamente viável. Tal problemática acima demonstrada, envolvendo os inseticidas químicos fez com que estes tivessem que transformar-se, ganhar nova roupagem e identidade, surgindo assim os inseticidas seletivos, os quais como o próprio nome já diz selecionam o alvo de aplicação, diminuindo o seu espectro, e atingindo apenas o inseto- praga alvo; mantendo os agentes benéficos de controle biológico em campo. Entretanto muito ainda deve ser efeito, para que se possa encontrar um produto com total seletividade aos agentes de controle natural. Predadores podem resistir a uma maior dosagem de inseticidas seletivos quando estes são aplicados topicamente (sobre o inseto), devido à baixataxa de absorção pelo seu exoesqueleto quitinoso; entretanto os produtos seletivos podem ser igualmente tóxicos, como os produtos convencionais, quando ingeridos diretamente através do aparelho bucal, como foi verificado por Pereira et al., (2005), estudando os efeitos de um inseticida seletivo sobre Podisus nigrispinus, Heteróptero, Pentatomídeo predador da lagarta curuquerê-do- algodoeiro, Alabama argillacea (Lepidoptera: Noctuidae). fggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggggggggggggggggggggggggggggggg gggg 39 SUGESTÃO DE LEITURA Azevedo, Aderdilânia Iane Barbosa de; Lucena, Wagner Alexandre; Souza Júnior, José Dijair Antonino de; Moreira, Marciene Dantas; Santos, João Batista dos; Miranda, José Ednilson. Efeitos do extrato de sisal sobre o curuquerê (Lepidoptera: Noctuidae). In: XX Congresso brasileiro de entomologia, 2004, Gramado. Anais do XX Congresso Brasileiro de Entomologia. 2004. Batista, J.L. Entomologia aplicada à agronomia. Areia: Apostila de apoio disciplinar, 2001. 190p. Bleicher, E. 1993. Importância relativa das principais pragas do algodoeiro em alguns estados do Brasil. Anais da Sociedade Entomológica do Brasil. 22: 553-562. Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. Insetos. In: Enciclopédia brasa. São Paulo: Companhia melhoramentos, 1994. p. 298. (volume 9). Pacheco, I.A.; Paula, D.C. Insetos de grãos armazenados – identificação e biologia. Campinas: Fundação cargill, 1995. 229p. Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. Controle biológico: terminologia. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Pereira, A.I.A.; Ramalho, F.S. and Zanuncio, J.C. 2005. Susceptibility of Podisus nigrispinus (Dallas)(Heteroptera: Pentatomidae) to gamma-cyhalothrin under laboratory condictions. Scientia Agricola. 62: 478-482. Picanço, M.C.; Moura, M.F.; Moreira, M.D.; Antônio, A.C. Biologia, identificação e manejo de moscas-brancas em fruteiras. In: Zambolin, L. (Ed.). Manejo integrado; 40 produção integrada; fruteiras tropicais; doenças e pragas. Viçosa: Suprema, 2003. p.243-284. Praga. In: Weiszflog, W. Michaelis. 10 ed. São Paulo: Companhia melhoramentos, 1998. p 1679. Ramalho, F.S. 1994. Cotton pest management: part 4. A Brazilian perpective. Annual Review of Entomology. 39: 563-578. Van Lenteren, J.C. Critérios de seleção de inimigos naturais a serem usados em programas de controle biológico. In:Paes Bueno, V.H. (Ed.). Controle biológico de pragas: produção massal e controle de qualidade. Lavras: UFLA, 2000. p.1-19. 41 CONTROLE BIOLÓGICO: CONCEITO, HISTÓRICO, VANTAGENS & DESVANTAGENS E TERMINOLOGIAS EMPREGADAS APRESENTAÇÃO O Controle Biológico faz parte do grupo de métodos de controle de pragas agrícolas atualmente conhecidos e utilizados. Em diversos países tal controle já se faz presente, apoiando o combate às mais variadas pragas. A entomologia aplicada impulsionou tal método de controle, não apenas por suprir informações e conhecimentos sobre os insetos-praga existentes nas culturas, mas também por ter desenvolvido o conhecimento profundo sobre os hábitos, comportamento e características das principais ferramentas deste método de controle, que são: Predadores, Parasitóides e Entomopatógenos. Laboratórios de criação massal nos quais pode-se multiplicar insetos entomófagos e microrganismos entomopatogênicos, através de dietas artificiais ou naturais, e substratos, possibilitando que tais agentes pudessem adaptar-se à condições de temperatura e umidade impostas, além da massa crítica formada por cientistas, pesquisadores, estudantes e técnicos nos últimos 50 anos, fez com que o controle biológico progredisse em proporções geométricas. Hoje o Controle Biológico pode ser considerado uma medida emergencial, semelhante, em alguns casos, ao controle químico. A busca por alimentos concebidos sem contaminação por produtos químicos, também contribuiu para tal avanço. No segundo capítulo do nosso curso discutiremos sobre as terminologias empregadas no controle biológico de pragas, para que possamos diferenciar os agentes de controle biológico de outros seres vivos. Ainda discutiremos sobre o conceito deste método de controle, sua evolução como ciência aplicada e sua praticidade. 3 41 1. CONCEITO Controle biológico é um fenômeno natural que consiste na regulação do número de plantas e animais por inimigos naturais, os quais se constituem nos agentes de mortalidade biótica. Assim, todas as espécies de plantas e animais têm inimigos naturais atacando seus vários estágios de vida. Dentre tais inimigos naturais existem grupos bastante diversificados, como insetos, vírus, fungos, bactérias, nematóides, protozoários, rickéttsias, micoplasmas, ácaros, aranhas, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos. Os animais insetívoros (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos), por serem inespecíficos, apesar de destruírem grande número de insetos, não são usados em controle biológico pelo homem de uma maneira massal. Nesse grupo incluem-se, por exemplo, lagartixas, sapos, rãs, tamanduás, tatus, sagüis, morcegos e pássaros (anu, pica- pau, bem-te-vi, alma-de-gato, etc.). Segundo Van Den Bosch et al., (1982), citado por Parra et al., (2002), o controle biológico é um fenômeno dinâmico que sofre influência de fatores climáticos, da disponibilidade de alimentos e da competição, assim como de aspectos independentes e dependentes da densidade. O controle biológico foi primeiramente utilizado para controlar insetos, ácaros e ervas daninhas. Com o tempo, a aplicação do método tornou-se mais ampla e outros invertebrados, patógenos de plantas e mesmo alguns vertebrados são agora considerados alvo. 2. BREVE HISTÓRIA DO CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS A idéia de que os insetos podem reduzir populações de pragas é muito antiga. Foram os chineses os primeiros a usar predadores - a espécie de formiga OecophyIIa smaragdina (Fabr.) - para controlar lepidópteros desfolhadores e coleobrocas de citros no século III a.C. Entretanto, com relação a parasitóides, foi U. Aldrovandi, em 1602, a primeira pessoa a observar o parasitismo de insetos. Ele relatou o controle da lagarta das crucíferas, Pieris rapae (L.), por Apanteles gIomeratus L., apesar de ter confundido os casulos do parasitóide com ovos da praga. Seguiram-se outros relatos equivocados em termos técnicos. Por esse motivo, Antonio Vallisnieri de Pádua é considerado o primeiro a relatar o parasitismo por insetosem sua publicação de 1706, embora Van Leeuwenhoek em 1701 tenha descrito corretamente o parasitóide de uma 42 vespa ("sawfly") que atacava salgueiro, portanto, anterior a Vallisnieri. O primeiro caso de sucesso de controle biológico clássico, e mais relatado, foi obtido com a introdução, na Califórnia, de Rodolia cardinalis (Mulsant), trazida da Austrália em 1888 para controlar o "pulgão" branco, Icerya purchasi Maskell, e que em dois anos já havia exercido total controle da praga. A partir daí, houve um grande avanço na área de controle biológico, totalizando, entre 1890 e 1975, 176 casos de programas de controle biológico com sucesso parcial ou total, em diferentes países. Greathead & Greathead (1992), citado por Parra et al., (2002), relataram que 543 espécies de insetos foram alvo de mais de 1.200 introduções em programas de controle biológico, e outras tantas, segundo esses autores, passaram pela tentativa de controle por meio de programas de conservação e/ou aumento (multiplicação). Dentre esses inimigos naturais, os mais utilizados são da ordem Hymenoptera e, em menor grau, da ordem Díptera. Das famílias de Hymenoptera, as mais freqüentemente empregadas são representantes de Braconidae e Ichneumonidae em Ichneumonoidea e Eulophidae; Pteromalidae, Encyrtidae e Aphelinidae em Chalcidoidea. Dentre os dípteros, o grupo mais usado é o dos Tachinidae. Os representantes das ordens Strepsiptera, Coleoptera (Carabidae, Staphylinidae, Meloidae e Rhipiphoridae), Lepidoptera (Pyralidae e Epipyropidae) e Neuroptera (Mantispidae) são de menor importância como parasitóides. Das diversas famílias de predadores de pragas, Anthocoridae, Pentatomidae, Reduviidae, Carabidae, Coccinellidae, Staphylinidae, Chrysopidae, Cecidomyiidae, Syrphidae e Formicidae são as mais comumente encontradas. Os ácaros fitoseídeos são importantes como agentes de controle biológico, bem como as aranhas, estas ainda pouco estudadas em nosso país. No total, são 22 ordens de predadores e cinco de parasitóides. Atualmente, o controle biológico assume importância cada vez maior em programas de manejo integrado de pragas (MIP), principalmente em um momento em que se discute muito a produção integrada rumo a uma agricultura sustentável. Nesse caso, o controle biológico constitui, ao lado da taxonomia, do nível de controle e da amostragem, um dos pilares de sustentação de qualquer programa de MIP. Além disso, é importante como medida de controle para manutenção 43 das pragas abaixo do nível de dano econômico, junto a outros métodos, como o cultural, o físico, o de resistência de plantas a insetos e os comportamentais (feromônios), que podem até ser harmoniosamente integrados com métodos químicos (especialmente produtos pouco agressivos, da última geração de agroquímicos, seletivos) ou mesmo com plantas transgênicas. Nesse MIP devem ser adotados os procedimentos básicos de controle biológico, que são: introdução, conservação e multiplicação. Desde a introdução de R. cardinalis para controlar o "pulgão" branco, o que se fazia, basicamente, era o controle biológico clássico, que era uma medida de controle de longo prazo e que se aplicava especialmente a culturas perenes ou semiperenes, uma vez que as liberações eram inoculativas (pequena quantidade de parasitóides ou predadores) e, portanto, havia necessidade de adaptação e aumento da quantidade do inimigo natural (parasitóide ou predador) com o decorrer do tempo, exigindo a presença da cultura para multiplicação do inimigo natural introduzido, com posterior ação de controle. No Brasil, introduziram-se diversos inimigos naturais, entre eles: 1921 - Prospaltella berlesei Howard (Hymenoptera: Aphelinidae), introduzido dos EUA para controlar a cochonilha branca do pessegueiro, Pseudaulacaspis pentagona (Targ- Tozz) (Hemíptera: Diaspididae); 1923 - Aphelinus mali (Haldeman) (Hymenoptera: Aphelinidae), introduzido do Uruguai para controlar o pulgão lanígero, Eriosoma lanigerum (Hausmann) (Hemíptera: Aphididae); 1928 - Prorops nasuta (Waterson) (Hymenoptera: Bethylidae), a vespa de Uganda, introduzido da África para controlar a broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleptera: Scolytidae), que havia sido registrada no Brasil na década de 20; 1937 - Tetrastichus giffardianus Silvestri (Hymenoptera: Eulophidae), introduzido do Havaí para controlar a mosca-do-mediterrâneo, Ceratitis capitata (Wied.) (Díptera: Tephritidae); 1944 - Macrocentrus ancylivorus Rohwer (Hymenoptera: Braconidae), introduzido dos EUA para controlar a mariposa oriental, Grapholita molesta (Busck) (Lepidóptera: Tortricidae). 44 A partir daí diminuíram muito as importações e, conseqüentemente, a utilização do controle biológico clássico, pois em 1939 foi sintetizado o DDT, seguindo-se a síntese dos demais produtos organossintéticos que passaram a ser considerados a "solução" de todos os problemas e usados de forma indiscriminada. Essa utilização (principalmente de 1940 a 1960) gerou uma série de malefícios, como a resistência de insetos e ácaros a agroquímicos; aparecimento de novas pragas, antes tidas como secundárias; ressurgência de pragas; desequilíbrios biológicos e efeitos prejudiciais ao homem, polinizadores, inimigos naturais, peixes e outros organismos, além de resíduos nos alimentos, água e solo. Segundo Kogan (1998), citado por Parra et al., (2002), essa época foi considerada o "período negro" do controle de pragas. Em 1962, a publicação do livro Primavera silenciosa provocou uma reviravolta na forma de ver o controle de insetos, pois sua autora, RacheI Carson, chamava a atenção, de maneira esclarecedora, contundente e alarmante, para todos os problemas advindos do uso inadequado de produtos químicos. E a comunidade científica reagiu para proteger a biodiversidade, com uma nova filosofia de controle de pragas, o MIP. Dentro desse contexto, houve um ressurgimento do controle biológico, com novas facetas dessa alternativa de controle, ou seja, a conservação e multiplicação de inimigos naturais, hoje incorporados em programas de MlP. Atualmente, com produtos químicos cada vez mais seletivos devido à preocupação e conscientização da necessidade de manutenção da qualidade ambiental, o controle biológico clássico tende a voltar com bastante força, como mais um componente de programas de MIP. 3. PRATICIDADE DO CONTROLE BIOLÓGICO Mesmo durante o período em que o controle biológico foi principalmente baseado numa abordagem de tentativas e erros, sua taxa de sucesso foi impressionantemente boa. Tem sido sempre muito melhor do que o registro de sucesso do controle químico e geralmente ele se compara muito vantajosamente com tal controle. Os dados que serão fornecidos na tabela 1, mais adiante, ilustram a importância mundial e a aplicabilidade do controle biológico. A Tabela 1 foi 46 Tabela 1. Comparação de características do controle químico e biológico. CONTROLE QUÍMICO CONTROLE BIOLÓGICO Número de “ingredientes” testados > 1 milhão 5.500 Taxa de sucesso 1:30.000 1:20 Custo de desenvolvimento US$ 100 milhões US$ 2 milhões Tempo de desenvolvimento 10 anos 10 anos Benefício por unidade monetária investida importante lado positivo. Inimigos naturais são usualmente tão específicos em suas escolhas de hospedeiros ou presas, que não atacam mais do que poucas espécies, no geral, estreitamente relacionadas. O lado positivo desse aspecto é o fato de não ser necessário se preocupar com efeitos colaterais indesejáveis, como a morte de outros insetos benéficos ou insetos interessantes; o lado problemático é que se faz necessário identificar uma espécie de inimigo natural para cada espécie de praga (importância da taxonomia). Isso significa que quando um complexo de pragas ocorre numa cultura, a introdução de vários inimigos naturais será necessária, enquanto que com a pulverização de um inseticida ou um coquetel de inseticidas, poder-se-á reduzir várias pragas ao mesmo tempo. A liberação de um complexo de inimigos naturais não é, entretanto, uma prática penosa ou anti-econômica. Programas bem sucedidos de controle biológico em casas-de-vegetação têm 47 sido obtidos com a liberação de 5 a 10 espécies de inimigos naturais. Evidências empíricas e um grande número de estudos sobre programas de controle biológico realizados nos últimos 100 anos têm mostrado que o controle biológico praticado por especialistas é um método muito econômico de controle de pragas. Além de sua boa capacidade de redução de pragas, o controle biológico tem benefícios altamente positivos, sociais, econômicos e ecológicos. Além disso, uma vez que um bom inimigo natural tenha sido identificado, ele pode ser usado indefinidamente, sem o aparecimento de problemas de resistência, como comumente acontece com produtos fitossanitários. Entretanto, deveria ser, usualmente, a primeira tática de controle de praga a ser explorada. A lista mais recente de análise de benefício/custo para 30 programas de controle biológico inoculativo mostra que os benefícios estão entre 18 e 1500:1, sendo, então melhor do que qualquer outro método de controle de pragas. Embora nenhum esforço consciente tenha sido feito para medir os benefícios econômicos globais do controle biológico e natural, os benefícios totais estão estimados em bilhões de dólares. A análise mais completa de custo/benefício para diferentes métodos de controle de pragas foi realizada na Austrália. Cientistas australianos apresentaram dados de quatro projetos de controle biológico e nove de controle químico. Ambos os tipos de controle, biológico e não biológico, foram considerados um sucesso, porque os benefícios foram de A$ 350.4 (A$ = dólar australiano) e os custos A$ 32.93, correspondendo a uma razão global benefício/custo de 10,6:1. Entretanto, tanto o impacto econômico absoluto, como o retomo relativo dos recursos usados pela Divisão de Entomologia Australiana no controle biológico de pragas foram muito maiores do que para projetos de meios não biológicos de controle. Além disso, os benefícios continuam a aumentar, uma vez que nenhuma atividade adicional tem sido necessária para manter as pragas sob controle biológico. Somente para a Austrália, eles excederam A$ 1 bilhão. A taxa de benefício/custo para o programa global africano de controle biológico da cochonilha-da-mandioca foi calculada em 149:1. Os benefícios do Programa FAO, para o controle integrado de pragas de arroz na Ásia, correspondem, para os cofres públicos nacionais, com redução ou eliminação de subsídios aos produtos fitossanitários, a uma economia de US$ 48 5-60 milhões, de acordo com o país considerado. Para os agricultores, a implementação do manejo integrado de pragas significou a manutenção ou o aumento da produtividade, proporcionando grandes lucros, menores riscos devido à melhor estabilidade do rendimento e menores efeitos sobre a saúde pública. De uma revisão recente de programas europeus de MIP aplicados comercialmente, torna-se evidente que, em todos os maiores programas de MIP, os inimigos naturais desempenham um papel chave na redução de pragas. Em vários programas, outros métodos de controle são completamente focalizados em torno do controle natural (por exemplo: pomares de maçã, pêra, pêssego, cereja, sistemas de vinhedos, etc.). Em outros, o controle biológico por meio de liberações inoculativas, inoculativas sazonais e inundativas é central (exemplo: pomares, principais hortaliças cultivadas em casas-de- vegetação e milho). A área e o número de pragas sob controle natural são imensos, e a extensão na qual o controle natural atua somente pode ser percebida nas situações nas quais o homem interfere na natureza, de maneira que o controle natural é alterado. É evidente que o papel do controle natural vem da experiência com o controle químico. Este controle pode reduzir fortemente ou erradicar localmente inimigos naturais e, portanto, levar à ressurgência de pragas-alvo e à síntese de novas pragas. É difícil de se estimar a área atualmente sob controle biológico clássico ou inoculativo. Resultados obtidos com esse tipo de controle são rapidamente esquecidos, porque não são necessárias repetidas ações para manter baixo o número de pragas. O papel importante e contínuo que a joaninha Rodolia cardinalis tem desempenhado desde 1888 na Califórnia e, mais tarde, em muitos países ao redor do mundo, para manter a cochonilha-branca-dos- citros Icerya purchasi abaixo do nível de dano, foi enfatizado pela ressurgência dessa praga em 1947, como o resultado do amplo emprego de DDT nesta cultura. A cochonilha- branca-dos-citros é agora controlada, sem custos, pela Rodolia em 55 países, após seu sucesso inicial na Califórnia em 1889. O pulgão lanígero da macieira Eriosoma lanigerum (Hausmann) está sendo controlado pelo parasitóide Aphelinus mali (Hald.) em 42 dos 51 países, após sua introdução inicial na Nova Zelândia no começo deste século. Tanto a praga como seu inimigo natural originaram-se no Oeste dos Estados 49 Unidos. Esses dois exemplos mostram o enorme potencial do controle biológico com parasitóides e predadores em programas inoculativos. Seria benéfico para o controle biológico se áreas sob controle biológico inoculativo se tornassem mais conhecidas. Especificações de tais benefícios (econômicos) aumentariam o respeito pelo controle biológico de pragas. Durante o século passado, o controle biológico inoculativo foi direcionado para 416 artrópodes-praga, dos quais 75 estão sob completo controle (redução permanente abaixo do nível de dano econômico) e outras 89 pragas estão sob controle substancial ou parcial (com controle químico reduzido em pelo menos 50%). Como o controle biológico é permanente, esse é um resultado considerável. Até 19,884,226 inimigos naturais de artrópodes-praga haviam sido importados ao redor do mundo (incluindo repetições). Desses, 1,251 (29,6%) espécies foram estabelecidas em novas áreas, 932 casos estão ainda sendo acompanhados e o estabelecimento permanente ainda não é conhecido com certeza, e 2,038 casos não resultaram em estabelecimento. É mais fácil obter dados para aqueles tipos de controle biológico em que os inimigos naturais têm que ser liberados regularmente. Diz-se que o controle biológico inundativo é extensivamente aplicado na antiga União Soviética em 20 milhões de hectares para o controle de vários lepidópteros-praga, sendo Trichogramma (pequena vespinha parasitóide) o inimigo natural mais utilizado. Entretanto, ainda não está constatado o efeito dessas liberações sobre a população das pragas. Na China, cerca de 2 milhões de hectares estão sob controle inundativo com o uso de Trichogramma para manejo de vários lepidópteros-praga. No Sudoeste da Ásia, o controle de brocas-de-caule é feito com uma espécie de Trichogramma emcerca de 300 mil hectares. Na América do Sul e do Norte, o controle de lepidópteros em algodoeiro e cana-de-açúcar com espécies de Trichogramma tem sido realizado em cerca de 800,000 hectares. O controle biológico de ácaros e vários insetos-praga vem sendo feito em pomares de maçã, pêra e vinhedos (cerca de 150,000 hectares) na Europa. Nos Estados Unidos, o controle de cochonilhas ocorre em geral, com parasitóides (gênero Aphytis) e predadores do gênero Chrysoperla e Cryptolaemus em aproximadamente 20,000 ha de citros. Em vários países, cerca de 15,000 ha estão sob controle biológico sazonal inoculativo e/ou inundativo em casas-de-vegetação. 50 Estima-se que a área total mundial sob formas sazonais inoculativas e inundativas de controle biológico seja de cerca de 32 milhões de hectares. Sem a existência de inimigos naturais, as perdas nas culturas causadas pelas pragas seriam catastróficas e os custos do controle químico aumentariam enormemente. Desta forma, o controle biológico, atualmente, pode ser considerado uma medida emergencial, semelhante, em alguns casos, a inseticidas. Essa mudança se deveu principalmente ao desenvolvimento de técnicas de criação, em especial com dietas artificiais, nas décadas entre 60 e 80, aumentando-se as possibilidades de criações massais de insetos e posteriores liberações inundativas (em grandes quantidades de insetos). Tais liberações reduziram os danos às culturas, pelo impedimento da evolução populacional da praga, de forma rápida e sem prejuízos ao meio ambiente. 4. TERMINOLOGIAS 4.1. TIPOS DE CONTROLE BIOLÓGICO Controle biológico clássico. Importação e colonização de parasitóides ou predadores, visando ao controle de pragas exóticas (eventualmente nativas). De maneira geral, as liberações são realizadas com um pequeno número de insetos (liberações inoculativas), por uma ou mais vezes no mesmo local; por isso, o controle biológico, nesse caso, é visto como uma medida de controle a longo prazo, pois a população dos inimigos naturais tende a aumentar com o passar do tempo e, portanto, somente se aplica a culturas semiperenes ou perenes. Controle biológico natural. Refere- se à população de inimigos que ocorrem naturalmente. Atendendo a um dos preceitos básicos de controle biológico, ou seja, conservação. Tais parasitóides ou predadores devem ser preservados (e, se possível, aumentados) por meio da manipulação de seu ambiente de forma favorável (usar inseticidas seletivos em épocas corretas, reduzir dosagens de produtos químicos, evitar práticas culturais inadequadas, preservar hábitat ou fontes de alimentação para inimigos naturais). São muito importantes em programas de manejo de pragas, pois são responsáveis pela mortalidade natural no agroecossistema e, conseqüentemente, pela manutenção do nível de equilíbrio das pragas. Controle biológico aplicado. Trata- se de liberações inundativas de parasitóides ou predadores, após a 51 criação massal em laboratório, visando a redução rápida da população da praga para seu nível de equilíbrio. Esse tipo de controle biológico é bem-aceito pelo usuário, pois tem um tipo de ação rápida, muito semelhante à de inseticidas convencionais. Como comentado anteriormente, quando apenas existia o controle biológico clássico,uma vez que as técnicas de criações de insetos eram incipientes, entre as desvantagens do controle biológico apontadas estavam na sua ação lenta e sua aplicação exclusivamente em culturas perenes ou semiperenes. Com o desenvolvimento do controle biológico aplicado, tais desvantagens foram superadas. O CBA refere-se ao preceito básico de controle biológico atualmente chamado de multiplicação (criações massais), que evoluiu muito com o desenvolvimento das dietas artificiais para insetos, especialmente a partir da década de 70. Esses "inseticidas biológicos" são mais utilizados para parasitóides ou predadores nativos, embora possam ser aplicados a inimigos naturais exóticos. Nesse tipo de controle não se espera estabelecimento dos indivíduos liberados nas áreas visadas. Existem muitos casos de sucesso de CBA, sendo bastante freqüente, por exemplo, a liberação de Trichogramma spp., de forma inundativa, em diversos países do mundo. 4.2. TIPOS DE LIBERAÇÕES Segundo Williams & Leppla (1992), citado por Parra et al., (2002), existem três formas de liberação de inimigos naturais: inoculativa, inundativa e inoculativa estacional (ou sazonal), que são dependentes do sistema visado (alvo). Assim, inoculação é para sistemas abertos com baixa variabilidade temporal. Aplica-se a culturas perenes ou semiperenes e florestas. É, portanto, típica do controle biológico clássico. Já a liberação inundativa é para sistemas (culturas) com alta variabilidade temporal (culturas anuais). A liberação inoculativa estacional é normalmente feita em casas-de- vegetação, no período de ocorrência da praga (cultivos de curta duração). Esperam-se efeitos por várias gerações da praga. É uma mistura do método inundativo e inoculativo, pois é liberada uma grande quantidade de insetos para se obter um controle imediato e espera- se o crescimento das populações para controle das gerações tardias. É muito comum na Europa, por exemplo, para controle da mosca-branca, Trialeurodes 52 vaporariorum (Westwood), utilizando- se Encarsia formosa Gahan. Em sistemas fechados com baixa variabilidade temporal, como armazéns de cereais, o controle de pragas pode ser feito com liberações inundativas ou inoculativas estacionais. O mesmo se aplica a casas-de-vegetação em que as liberações podem também ser inundativas. Existem exceções, e para Lymantria dispar (L.), praga de florestas, excelentes resultados são obtidos com liberações inundativas. 4.3. PARASITO, PREDADOR e PARASITÓIDE Parasito. É um organismo usualmente menor que o hospedeiro, e um único indivíduo não mata esse hospedeiro. Por exemplo: tênia, piolhos, pulgas e pernilongos. Os parasitos podem completar seu ciclo de vida em um único hospedeiro (piolhos), ser de vida livre e não parasitar durante parte de sua vida (pernilongos e pulgas) ou ter um ciclo de vida envolvendo diversas espécies hospedeiras (tênias). Predador. É um organismo de vida livre durante todo o ciclo de vida, que mata a presa; usualmente é maior do que ela e requer mais do que um indivíduo para completar o desenvolvimento. Parasitóide. Tem sido incluído na categoria de parasito, mas um parasitóide é muitas vezes do mesmo tamanho do hospedeiro, mata este e exige somente um indivíduo para completar o desenvolvimento; o adulto tem vida livre. Os entomologistas usam o termo parasito para designar insetos que parasitam insetos e patógenos para organismos que causam doenças em insetos. Por outro lado, os parasitologistas (relacionados com ciências médicas e veterinárias) empregam "parasitos" para qualquer organismo que viva em um hospedeiro, incluindo microrganismos e organismos multicelulares. Assim, para evitar confusão, os autores sugerem que os entomologistas considerem os parasitos como parasitóides e usem esse termo de forma generalizada, pois, como dito anteriormente, muitos consideram como parasitos as duas categorias (parasitos e parasitóides). Os predadores, após um ataque bem- sucedido, subjugam rapidamente o hospedeiro ou presa. Como conseqüência, a presa é morta e consumida, resultando na interrupção do fluxo genético para a próxima geração. A inter-relação evolucionária existente entre os dois organismos ocorre durante a localização e o ataque 53 da presa pelo predador e o comportamento furtivo (camuflagemou abrigo), fuga ou defesa por parte da presa. Geralmente, certo número de presas deve ser consumido para que o predador possa crescer e se reproduzir, sem ocorrer interação fisiológica entre ambos. Os parasitos raramente localizam um novo hospedeiro. Muitas gerações de parasitos podem ocorrer dentro do hospedeiro, o qual também se reproduz. Como resultado, vários indivíduos de todos os diferentes estágios parasíticos podem ocorrer em um hospedeiro. O aumento do número de parasitos na população do hospedeiro ocorre por meio de sua transferência durante o contato entre hospedeiro-hospedeiro, que ocorre durante o ato sexual ou na produção de novos hospedeiros. A fisiologia dos dois organismos é sempre influenciada, mas não dominada ou controlada pelo outro. Os genes do hospedeiro passam de uma geração a outra. Os parasitóides, após um ataque bem- sucedido, não matam imediatamente seu hospedeiro, mas podem permanecer como parasitos por períodos variáveis. Entretanto, no final, o hospedeiro é morto ou, pelo menos, não ocorre a transferência de genes para a próxima geração. O hospedeiro pode ser considerado como um recipiente para o desenvolvimento do parasitóide e, como tal, impõe certas restrições ao seu desenvolvimento. Além disso, a fisiologia e o comportamento do hospedeiro, enquanto ele vive, são em beneficio do parasitóide que se desenvolve e, quando necessário, ele pode controlá-Ios. Como resultado, o parasitóide tem a oportunidade de regular a fisiologia do hospedeiro. Apesar de haver algumas interações comportamentais e fisiológicas que se sobrepõem entre parasitos, parasitóides e predadores, os aspectos evolucionários dos três são diferentes. Por exemplo, vários parasitóides exibem comportamento adulto predatório, mas isso não altera as inter- relações evolucionárias entre o parasitóide em desenvolvimento e o hospedeiro. Trichogramma também pode utilizar ovos estéreis do hospedeiro. Assim, a duração do período de desenvolvimento de um parasitóide como carnívoro ou saprófita é contínuo em algumas espécies, enquanto Trichogramma mata rapidamente o hospedeiro e se alimenta dos tecidos preservados. Por outro lado, o braconídeo endoparasitóide, Microplitis croceipes (Cresson), completa seu desenvolvimento e emerge deixando o hospedeiro vivo, apesar de 54 reprodutivamente morto. Em ambos os casos, a relação evolucionária é a mesma. 4.4. CATEGORIAS DE PARASITISMO Parasitóide primário. Espécie que se desenvolve sobre hospedeiros não parasitados. Hiperparasitóide (ou parasitóide secundário). Parasitóide que se desenvolve em outro parasitóide (é um parasitóide de um parasitóide). Podem existir vários níveis de hiperparasitismo. Endoparasitóide. Parasitóide que se desenvolve dentro do corpo do hospedeiro. O endoparasitóide pode ser solitário (quando uma única larva completa seu desenvolvimento em determinado hospedeiro) ou gregário (quando várias larvas se desenvolvem até a maturidade em um único hospedeiro). Ectoparasitóide. Espécie que se desenvolve fora do corpo do hospedeiro (a larva se alimenta inserindo as peças bucais através do tegumento da vítima). Como os endoparasitóides, existem ectoparasitóides solitários e gregários. Parasitismo múltiplo. Situação na qual mais de uma espécie de parasitóide ocorre dentro ou sobre um único hospedeiro. Em muitos casos, somente um indivíduo sobrevive, os outros sucumbem. Em casos raros, como espécies de Trichogramma (parasitóides de ovos de Lepidoptera), mais do que uma espécie pode completar seu desenvolvimento no ovo. Superparasitismo. Fenômeno no qual vários indivíduos de uma espécie de parasitóide podem se desenvolver em um hospedeiro. Quando ocorre superparasitismo com endoparasitos solitários, destruição mútua ou supressão fisiológica das larvas ou ovos excedentes, pode resultar em sobrevivência de um indivíduo dominante. Em alguns casos, entretanto, o hospedeiro morre prematuramente, antes que os excedentes sejam eliminados, e todos morrem. Adelfoparasitismo. Também chamado autoparasitismo, fenômeno no qual uma espécie de parasitóide é parasito de si mesma. Por exemplo, em Coccophagus scutellaris Dalman o macho é parasitóide obrigatório da fêmea. Cleptoparasitismo. Fenômeno no qual um parasitóide ataca preferencialmente hospedeiros que já estejam parasitados por outras espécies. O cleptoparasitóide não é hiperparasitóide, mas no caso existe um multiparasitismo, no qual há competição das duas espécies, com a espécie cleptoparasitóide usualmente dominando. 55 Heterônomos. O macho e a fêmea do parasitóide têm hospedeiros diferentes (caso raro, pois geralmente os parasitóides são altamente específicos). Poliembrionia. O adulto coloca um único ovo por hospedeiro, o qual, posteriormente, divide-se em muitas células, cada uma desenvolvendo-se independentemente. Formam-se diversos embriões a partir de um ovo parasitado. É comum em Encyrtidae e Braconidae. O encirtídeo A. citricola, parasitóide do minador-dos-citros, P. citrella, produz de dois a dez indivíduos por ovo parasitado. Existem parasitóides de ovos, larvas (ou ninfas), pupas e adultos. Parasitóides que ovipositam em um estágio mas emergem em outro são denominados de acordo com o início e final do parasitismo. Assim, um encirtídeo que parasita o ovo e emerge na larva é um parasitóide ovo-larva. 56 SUGESTÃO DE LEITURA Driesche R.G.V. & Bellows Jr. T.S. (1996). Biological Control. Chapman & Hall Ed. 539 p. Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. Controle biológico: terminologia. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Van Lenteren, J.C. Critérios de seleção de inimigos naturais a serem usados em programas de controle biológico. In: Paes Bueno, V.H. (Ed.). Controle biológico de pragas: produção massal e controle de qualidade. Lavras: UFLA, 2000. p.1-19. Venzon M., Paula Júnior T.J. & Pallini. A. (2006). Tecnologias alternativas para o controle de pragas e doenças. EPAMIG. 378p. 57 PREDADORES X PARASITÓIDES: VANTAGENS & DESVANTAGENS APRESENTAÇÃO Predadores e parasitóides são as principais ferramentas do controle biológico de pragas. Entretanto, como são diferentes em vários aspectos (da sua ordem até os seus hábitos alimentares, por exemplo) eles podem ter comportamento diferente frente às condições de campo. Desta forma, é lançada a pergunta: Quem é melhor na supressão efetiva de pragas agrícolas? Predadores ou parasitóides? Neste capítulo iremos estudar o controle biológico e seus dilemas mais específicos. Iremos conhecer o comportamento e atuação de cada agente de controle biológico, dependendo de cada situação. Iremos também relatar por que os predadores pentatomídeos são considerados modelo de inimigo natural. Além de citar os agentes de controle biológico para culturas de importância econômica no Brasil. 4 58 1. SUSCINTA REVISÃO DO TERCEIRO CAPÍTULO "Controle biológico" é uma expressão que foi usada pelaprimeira vez em 1919, pelo pesquisador Harry S. Smith, quando se referiu ao uso de inimigos naturais no controle de insetos-praga. Desde então, ao longo dos anos, muitos pesquisadores, principalmente entomologistas, têm definido esse tipo de controle. Desta forma, podemos dizer que o controle biológico é a ação de parasitos, predadores e patógenos que mantém a densidade populacional de outros organismos em uma média mais baixa do que ocorreria em sua ausência. O controle biológico é a regulação do número de plantas e animais por inimigos naturais ou, simplesmente, o restabelecimento do balanço da natureza; podendo ser ainda a regulação de populações de organismos vivos resultante de interações antagonísticas como parasitismo, predação e competição. É fato notório que todas as espécies vivas são atacadas por inimigos naturais que se alimentam delas e, em muitos casos, regulam sua densidade populacional. Linnaeus, em 1760, já afirmava que cada organismo tem um inimigo natural. Então, qualquer organismo que se alimente de outro organismo é um inimigo natural. Por exemplo, lobos (cordeiros), falcões (pequenos pássaros), corujas (pequenos mamíferos), joaninhas (pulgões), tamanduá (formigas) e etc. Tratando dos Artrópodes, e, dentre estes, especificamente os insetos, que são o interesse primeiro deste nosso curso, os inimigos naturais podem ser agrupados em três categorias: predadores, parasitos ou parasitóides e patógenos (como já foi discutido no capítulo 2 do nosso curso). Patógenos, ou agentes entomopatogênicos, são microrganismos que vivem e se alimentam sobre ou dentro de um inseto hospedeiro. Além de microrganismos como fungos, bactérias, vírus e protozoários, os nematóides, que não são microrganismos, também são considerados agentes entomopatogênicos, usados no controle microbiano, que é uma parte do controle biológico estudada em patologia de insetos. Predadores e parasitos são agentes entomófagos. Predador é um organismo que, para seu completo desenvolvimento, necessita de mais de um indivíduo da presa (por exemplo, a joaninha sobre os pulgões). Parasito, também chamado de parasitóide ou de parasito protélico, é um organismo que 59 necessita de apenas um indivíduo hospedeiro para completar seu desenvolvimento (por exemplo, a vespinha Cotesia flavipes sobre a lagarta Diatrea saccharalis, broca-da- cana). Parasitos coinobiontes são parasitos que se desenvolvem em hospedeiros que continuam a crescer e sofrer metamorfose durante os estágios iniciais do parasitismo e parasitos idiobiontes são aqueles que se desenvolvem em hospedeiros que cessaram o crescimento e estão paralisados. Os parasitos protélicos são aqueles insetos cujos estágios imaturos são parasíticos. Os parasitóides são parasitos protélicos que atacam invertebrados e quase sempre destroem seus hospedeiros e formam o grande grupo de parasitos dominado por espécies de Díptera e Hymenoptera. São chamados de parasitóides para diferenciar-se dos parasitos típicos, que são bem menores que seus hospedeiros e adaptados a causar um mínimo de dano. Os termos "parasito", "parasitóide" e "parasito protélico" podem ser usados como sinônimos, e Mackauer & Sequeira (1993), citado por Berti Filho & Ciociola (2002), usaram o termo "parasito” como sinônimo de parasitóide. Os parasitóides geralmente se comportam como parasitos típicos nos primeiros ínstares larvais e só nos últimos é que mostram comportamento alimentar predatório. Comparativamente, os parasitos movem-se menos que os predadores e levam mais tempo para matar o hospedeiro. 2. PARASITÓIDES OU PREDADORES? Insetos entomófagos parasitos e predadores são semelhantes porque geralmente matam o hospedeiro/presa. Qual seria, então, o melhor dos dois? Os dois organismos são similares em vários aspectos, mas um predador seria mais valioso que um parasito, uma vez que destrói um grande número de presas durante sua vida, enquanto um parasito elimina apenas um hospedeiro. A idéia de que os predadores são menos efetivos que os parasitos é devida, principalmente, à crença de que eles são menos específicos na escolha de suas presas. Isso, provavelmente, decorre do fato de os insetos predadores serem móveis nos estágios predatórios e freqüentemente serem observados movendo-se de uma presa para outra, enquanto os parasitos ficam permanentemente em contato com o hospedeiro durante o estágio parasítico. Os parasitos coinobiontes seriam mais 60 específicos devido a sua maior dependência na fisiologia e no desenvolvimento de seus hospedeiros. As evidências demonstram que a predação pode ser tão específica quanto o parasitismo, pois a grande maioria dos parasitos e dos predadores está restrita a uma só espécie de hospedeiro ou presa. Entretanto, a especificidade é discutível, porque a falta de estreita especificidade de um predador significaria que ele teria de competir, sem as vantagens que tal especialização conferiria, com o complexo de predadores nativos, o que causaria grandes problemas no estabelecimento de um predador exótico. Portanto, a especificidade hospedeira seria um fator importante a levar em conta em um programa de controle biológico clássico. Nesse tipo de controle, foram registradas 13 espécies de predadores introduzidos com sucesso, em comparação com mais de 23 espécies de parasitóides. Embora em baixo número, os predadores tiveram grande sucesso no controle, especialmente no de pragas sésseis, que não entram em diapausa, não são migratórias e estão associadas a culturas perenes ou semiperenes, como as cochonilhas de carapaça (diaspidídeos), os piolhos farinhentos (pseudococcídeos) e ovos de cigarrinhas. Muitas vezes, o fato de haver tantos casos de fracasso no uso de predadores é conseqüência direta da falta de atributos que um predador deveria ter para ser efetivo. Tais atributos seriam: multivoltinismo (que não entram em diapausa); estreita especificidade hospedeira; adultos longevos e com alta capacidade de busca; limiar térmico inferior de atividade muito próximo ao da presa; maior número de gerações do que o da presa. Os predadores são mais efetivos nos locais em que as populações da presa são densas, ou concentradas, do que nos em que estão esparsas. Isso decorre do fato de os predadores imaturos serem incapazes de se locomover como os adultos (voando, por exemplo), estando, portanto, limitados à busca da presa em áreas mais restritas ou mais confinadas. Guardadas as devidas proporções, também os parasitos têm dificuldade de atacar populações de seus hospedeiros que estejam esparsas. Chega-se, então, à questão do valor relativo de parasitos e predadores. Nesse aspecto, destaca-se um ponto muito importante referente às 61 taxas reprodutivas. Certos parasitos, como os Tachinidae (Diptera), podem produzir milhares de ovos, fato que ainda não foi constatado para qualquer espécie de predador. Entretanto, isso não garante que esse parasito seja necessariamente mais eficiente que um predador, pois de tal quantidade de ovos poucas larvas conseguirão atingir o hospedeiro. No entanto, é mais difícil avaliar o impacto de predadores do que o de parasitos, pois estes podem ser observados em seus hospedeiros, enquanto os predadores não deixam sinal de seu ataque, principalmente quando consomem a presa totalmente. Também quanto ao controle químico os predadores são diretamente mais afetados quando entram em contato com o produto químico e indiretamente pela falta de suas presas, eliminadas pelos inseticidas. Mas, em uma avaliação abrangente dos agentes entomófagos, os predadores, comparativamenteaos parasitos, apresentam atributos mais favoráveis, quais sejam: destroem um grande número de presas durante seu desenvolvimento; apesar de serem considerados polífagos, apresentam uma estreita faixa de especificidade hospedeira, podendo, inclusive, se restringir a determinados hábitats; têm menores exigências nutricionais que os parasitos; e em muitos complexos de agentes entomófagos os predadores são as espécies mais abundantes. O próprio histórico do controle biológico comprova a importância dos predadores. Os chineses, no século III a.C., criavam e vendiam formigas para controlar as pragas dos citros; nos séculos IV a VI, no Oriente Médio, formigas eram usadas contra formigas; em 1600, agricultores e naturalistas europeus observaram Carabidae e Coccinellidae (Coleóptera) alimentando-se de insetos. Os primeiros casos de controle biológico clássico bem-sucedidos foram aqueles que introduziram predadores como agentes de controle e o exemplo mais notável refere-se à introdução de R. cardinalis (Coleóptera: Coccinelidae) para o controle da cochonilha-dos-citros, Icerya purchasi (Hemíptera: Margarodidae). Na classe Insecta, o número de ordens que contêm espécies predadoras é 22, enquanto que o de ordens com espécies parasíticas é 5. As ordens nas quais não ocorrem espécies entomófagas são 6. Há que se considerar, entretanto, que tais afirmações não podem ser generalizadas, na medida em que se reconhece, hoje em dia, a grande importância da existência de “raças” de 62 uma mesma espécie que apresentam comportamentos diferentes segundo as condições climáticas de sua origem. Portanto, é imprescindível conhecer a origem das espécies entomófagas para aumentar a probabilidade de sucesso de um programa de controle biológico. Além disso, programas de manejo integrado de pragas (MIP), em que o controle biológico tem o papel importante, levam cada vez mais em conta fatores referentes às causas do desequilíbrio biológico em agroecossistemas e não apenas a sua mera existência. Geralmente, em programas de MIP, procuram-se aplicar técnicas de controle de pragas após a constatação da existência de uma praga, mas poucos são aqueles que buscam explicações de como essa situação foi alcançada. Para a manutenção de uma cultura qualquer em uma situação de equilíbrio biológico, e sem que haja danos econômicos pela ação de artrópodes fitófagos, é necessário que se conheçam os detalhes da biologia das espécies presentes em cada ecossistema e o papel de cada uma. 3. PREDADORES PENTATOMÍDEOS: EXEMPLO DE ADAPTABILIDADE Como já foi discutido no tópico anterior, o uso de predadores e parasitóides tem suas vantagens e desvantagens. E a melhor escolha dependerá bastante das condições do meio ambiente, da densidade populacional da presa, da região geográfica onde irá ser realizado o programa de controle biológico (devido à disponibilidade e adaptabilidade do agente), dentre outros fatores. Entretanto, o inimigo natural que mais assemelha-se ao “status” de perfeição, em se tratando da escolha de um agente para controle biológico, principalmente de lagartas desfolhadoras, sem dúvida é o predador entomófago pentatomídeo (ordem Heteroptera). Existem várias espécies de predadores pentatomídeos sendo utilizadas nas mais diversas situações, em todo o mundo, como por exemplo: Podisus maculiventris, Troilus luridus, Cermatulus nasalis, Oechalia schellenbergi, Perillus bioculatus, Supputius cincticeps, Eocanthecona furcellata, Podisus nigrispinus, Arma custos, Picromerus bidens, etc. Sendo que das 300 espécies conhecidas de asopíneos, apenas 10% têm-se estudado mais intensamente. Os trabalhos desenvolvidos nos últimos dez anos vêm insistentemente apontando os percevejos predadores (Heteroptera, Pentatomidae, Asopinae), 63 especialmente a espécie, Podisus nigrispinus (Dallas), como um dos agentes de uso com maior potencial na supressão de determinadas pragas agrícolas (Zanuncio et al., 2002). Geralmente tais predadores, quando inseridos em um contexto de monocultura, alimentam-se de qualquer inseto que esteja em abundância; sendo que mesmo em situações onde são incapazes de exercer o controle natural, devido aos baixos níveis populacionais, eles lentamente reduzem os picos populacionais das pragas, enquanto que muitos inimigos naturais específicos são ineficientes. Tais espécies ainda são predadores de numerosas pragas agrícolas (tanto nos estágios imaturos, como na fase adulta), por isso são denominados generalistas, de até oito ordens, como lepidóptera (sendo capazes de predar ovos, lagartas, pupas e adultos)(Morris, 1963; De Clercq & Degheele, 1994), coleóptera (Waddil & Shepard, 1975; Legaspi & O´Neil, 1994; Hough-Goldstein & McPherson, 1996) e alimentam-se também de presas alternativas, como no caso de dípteros (p.ex.: Musca domestica)(Zanuncio et al., 1998). Podisus maculiventris, por exemplo, já foi constatado predando mais de 90 espécies de insetos em diversas culturas (Yu, 1988). Além disso, percevejos do gênero Podisus tendem a ser mais prolíferos e mais adaptados às condições nas quais lhes são impostas, do que outros inimigos naturais. Segundo Medeiros (1997), P. nigrispinus é um predador de ocorrência em vários países da América do Sul e no Brasil; já foi coletado em diversos estados. Ainda são capazes de manter sua ocorrência em diferentes condições de temperatura em relação às demais espécies de inimigos naturais (Medeiros et al., 2003); além da possibilidade de quiescência, na fase adulta em baixas temperaturas (De Clercq & Degheele, 1993). P. nigrispinus ainda aparentam levar vantagem sobre altas densidades de presas, em condições de laboratório. Segundo Pereira (2005), tal predador consumiu uma maior quantidade de lagartas quando a quantidade de alimento oferecido (densidade da presa) aumentou. Entretanto, tais resultados podem variar quando ocorrerem mudanças de tamanho da presa, tipo de presa e condições do meio. Segundo o mesmo autor, fêmeas de P. nigrispinus ainda tiveram ganho de peso mesmo em condições de escassez de alimento (uma lagarta de curuquerê-do-algodoeiro fornecida diariamente); graças à quebra de gordura dos seus tecidos para manter suas necessidades metabólicas. 64 Tratando-se de escassez de alimento, tais predadores ainda podem aumentar a sua longevidade (seu período de vida), em um mecanismo de como que “esperando” melhores condições alimentares; reduzindo, entretanto, o seu gasto de energia com a reprodução (pondo ovos, acasalando, etc.). É como que o inseto pudesse escolher entre gastar energia na sua reprodução ou gastá-la vivendo mais esperando melhores condições para reproduzir-se e garantir a sobrevivência de sua progênie; geralmente ele prefere a segunda opção quando falta alimento e/ou água. O hábito fitofágico (de alimentar-se de substâncias e componentes constituídos pelas plantas) também faz parte da dieta de P. nigrispinus. Nezara viridula, o percevejo verde da soja (que é um pentatomídeo) possui o hábito de alimentar-se de plantas (fitofagia), e inclusive através deste, pode transmitir doenças às plantas. P. nigrispinus alimenta-se também de partes de inúmeras espécies de vegetais, entretanto, não causa danos econômicos a estes por não transmitir doenças e nem provocar injúrias consideráveis. Este hábito deve-se à necessidade deste predador usufruir de uma fonte de água extra (sem ser apenas aquela constituinte da hemolinfa da presa); a chamada água metabólica, que no caso da fonte vegetal, ainda vem enriquecida por alguns nutrientes e minerais. A criação deste agente de controle é fácile de poucos detalhes. A começar pela diferenciação entre machos e fêmeas, que pode ser feita através de características morfológicas externas, como tamanho, coloração corpórea e forma da genitália. Geralmente os casais são mantidos em potes plásticos (de 500ml) com a sua tampa adaptada com algum tipo de ventilação que não deixe o inseto escapar, e ainda permita a entrada e saída de ar. A água também é importante para seu metabolismo, e geralmente esta é oferecida através de um tubo tipo “anestésico odontológico”, acoplado à tampa. Devido à sua característica de polifagia, o predador (em condições de laboratório) pode alimentar-se da sua presa “oficial” que seria lagartas de curuquerê-do- algodoeiro (que irá depender da disponibilidade em campo), ou de presas alternativas, que substituem as “oficiais” quando estas estão em escassez (e que não dependem da disponibilidade em campo). Larvas de mosca e de teneberio (coleóptero) substituem muito bem as lagartas de curuquerê. Os percevejos ainda podem passar até 4 dias sem alimentarem-se. Entretanto, para otimização de sua 65 criação em laboratório, é necessário diminuir este intervalo de alimentação, além de nunca oferecer presas alternativas por longos períodos de tempo, oferecer material vegetal para absorção extra de nutrientes e sais minerais, além de regular as condições de temperatura (aproximados 25 - 27º) e umidade relativa de ≈ 60%. As condições do meio ambiente são sempre instáveis, diferentemente das condições controladas em laboratório ou casas-de-vegetação. Atualmente, por exemplo, estamos passando por um aquecimento global nunca antes sentido por nossos avós. E a tendência é que ocorra aumento tanto em intensidade quanto em frequência deste fenômeno nos próximos anos. A umidade do ar também é dependente do clima, e há clara diferença da quantidade de água em forma de vapor no ar até mesmo entre regiões. A disponibilidade de presas também pode variar, dependendo do manejo de pragas adotado para a monocultura que está sendo explorada. O uso de veneno diminui a quantidade de presas para os inimigos naturais e ainda podem prejudicá-los. E outro fator, não menos importante, seria a competição entre inimigos naturais; competição esta intra ou inter- específica, já que no meio ambiente existe uma gama, uma rede de interações onde a variação do primeiro, segundo e terceiro níveis tróficos pode ser encontrada a milímetros de distância de uma para outra cadeia alimentar. Por causa de alguns fatores sujeitos à variação em monocultivos (exemplificados acima), é tarefa árdua indicar um único agente de controle biológico para solucionar o problema de pragas, pois as plantas em sistemas agrícolas dependem de inúmeras variáveis para germinar, crescer, florir, reproduzir e frutificar. Entretanto, inimigos naturais, predadores, como os do gênero Podisus certamente detêm um lugar de destaque como agente real estabilizador de pragas, pela gama de características favoráveis que interferem positivamente na sua permanência em campo, em comparação com outros agentes de controle biológico de pragas agrícolas. 4. POTENCIAL DOS PREDADORES NO CONTROLE DOS MAIS DIVERSOS INSETOS-PRAGA algodoeiro_______________________ Cerca de 45 espécies de artrópodes benéficos encontram-se associadas aos insetos herbívoros presentes na cultura do algodoeiro. Entre os principais destacam-se Cycloneda sanguinea 66 (Linnaeus), Calosama sp. (Coleoptera), crisopídeos (Neuroptera), Nabis sp., Geoeoris spp., Zellus sp., Podisus spp., Supputius (Heteroptera), tesourinhas (Dermaptera), sirfídeos (Diptera), Polybia spp., Polistes spp., Cerceris sp. e formigas (Hymenoptera), salientando- se Solenopsis invicta Buren. Esses insetos constituem-se em agentes potenciais de predação de pulgões, tripes, cigarrinhas, ácaros, moscas- brancas, ovos e formas jovens de muitos outros artrópodes, verificando-se maior densidade populacional desses inimigos naturais em parcelas sob influência do MIP do que naquelas de manejo convencional. O principal inseto desfolhador do algodoeiro no Brasil é Alabama argillacea (Hübner) (Lepidoptera, Noctuidae) e muitos predadores têm contribuído para a manutenção de sua densidade populacional em níveis aceitáveis. A redução média do número de ovos e de pequenas lagartas de A. argillacea, devido à ação de várias espécies de predadores em campo experimental nos EUA, foi de 88,7 e 88,4%, respectivamente. Entre a ampla gama de predadores que normalmente ocorrem na cultura encontram-se os percevejos, cuja capacidade predatória pode ser afetada pelo tamanho da presa e pelo estágio de desenvolvimento do predador. Ninfas de P.nigrispinus predaram em média, 31,5, 15,8, 8,6 e 9,0 lagartas de segundo, terceiro, quarto e quinto instares desse noctuídeo, respectivamente. Os geocorídeos também são comuns no algodoeiro, represenrando 35,7% dos heterópteros e 5,4% dos predadores coletados, consumindo, em média, 50% dos ovos de A. argillacea. O percevejo Geocoris ventralis (Fieber) (Hemiptera, Lygaeidae), atraído possivelmente pelas secreções dos nectários extraflorais do algodoeiro, representou 96.7% dos adultos coletados. Um complexo de predadores formado especialmente por fomigas, percevejos e joaninhas 'presentes na cultura do algodoeiro nos EUA foi responsável por uma redução média de 73% dos ovos de Heliothis virescens (Fabricius) (Lepidoptera, Noctuidae) durante 24 horas, chegando a atingir 100% quando o período de exposição foi de 72 horas. Ninfas de quinto instar de Tropiconabis capsiformis (Germar) (Hemiptera, Nabidae), larvas de terceiro instar de Mallada signata (Schneider) (Neuroptera, Chrysopidae) e de Micromus tasmaniae (Walker) (Neuroptera, Hemerobiidae) consumiram 119,0, 250,9 e 24,3 ovos de Heliothis punctigera Wallengren 67 (Lepidoptera, Noctuidae) durante um período de 48 horas, respectivamente. O bicudo do algodoeiro, Anthonomus grandis Bohernan (Coleoptera, Curculionidae), possui diversos inimigos naturais em todas as fases de seu desenvolvimento, os quais, atuando isoladamente, não são efetivos como reguladores de suas populações, devido ao tipo e local de ataque desse curculionídeo na planta. Contudo, nos EUA, as formigas S. invictae Solenopsis geminata (Fabricius) foram os mais importanres predadores desse inseto- praga, com uma capacidade predatória crescente ao longo do ciclo da cultura, atingindo 84,4%. No Brasil. Larvas, pupas e adultos do bicudo no interior das "maçãs" ainda verdes e fendidas também foram predadas por formigas e pela vespa Brachygastra lecheguana (Latreille) (Hymenoptera, Vespidae). cafeeiro_________________________ As vespas Brachygastra augusti (Saussure), B. lecheguana, Protonectarina silveirae (Saussure), Polybia scutellaris (White), Polybia paulista (Ihering), Polybia occidentalis (White) e Synoeca surinama cyanea (Linnaeus) são eficienres predadoras do bicho mineiro do cafeeiro, Leucoptera coffela (Lepidoptera, Lyonetiidae), atuando preferencialmente em lesões encontradas em folhas periféricas da planta. Os vespídeos, especialmente P. silveirae e B. lecheguana, apresentaram urna capacidade de predação de 56 a 81 %, com uma média de 69%. Vespas sociais podem predar até 91.8 e 70.8%, de lagartas de L. coffeella, pelas páginas inferior e superior, respectivamente. Em São Paulo, vespídeos apresentaram eficiente ação predatória do bicho- mineiro, verificando-se um controle de 55% desse inseto-praga pela ação de predadores, especialmente aqueles da família Vespidae. A preservação de ninhos de vespas em vegetação próxima aos cafezais é fundamental para o sucesso do controlebiológico do bicho- mineiro. Além dos vespídeos, a formiga Solenopsis sp. foi urna eficiente predadora de L. coffeella. Além do bicho-mineiro, outro inseto de grande importância na redução da produtividade dessa cultura é a broca do café, Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera, Scolytidae). Entre seus inimigos naturais, a formiga Crematogaster curvispinosus Mary (Hymenoptera, Formicidae) é uma predadora ocasional de suas fases imaturas. cana-de-açúcar___________________ 68 Destacam-se como importantes insetos-praga da cultura a broca da cana-de-açúcar, Diatraea sp. (Lepidoptera. Crambidae) e as cigarrinhas Mahanarva fimbriolata (Stal), M. posticata (Stãl) e M. rubicunda indentata (Walker) (Hemiptera, Cercopidae). Uma rica fauna benéfica ocorre no ecossistema canavieiro, mas pouco se conhece a respeito da eficiência do controle biológico natural nas condições brasileiras. Os predadores Amblycoleus platyderus Chaud., Leptotrachelus puncticollis Bates (Coleoptera, Carabidae), Doru lineare Eschso (Dermaptera, Forficulidae) e Apiomerus lanipes Fabricius (Hemiptera, Reduviidae) constituem-se em agentes naturais de controle de ninfas e adultos de M. posticata. Uma tentativa de controle dessa cigarrinha no Nordeste do Brasil foi realizada em 1967, com a introdução de Salpingogaster nigra Schiner e Salpingogaster pygophora Schiner (Diptera, Syrphidae). Esses sirfídeos são também os principais agentes de controle natural de M. fimbriolata e M. rubicunda indentata. No que concerne à Diatraea sp., os predadores foram mencionados como importantes supressores de populações desse inseto-praga; dentre eles, os crisopídeos, os coccinelídeos Coleomegilla maculata (DeGeer) e C. sanguinea, a formiga Solenopsis sp. e a tesourinha D. lineare. O dermáptero Labiduria riparia (PalIas) foi também registrado como importante predador das fases imaturas da broca da cana, verificando-se que durante a fase adulta predaram em média. 3.437,6 ovos desse piralídeo. Muitos outros insetos-praga dessa cultura têm suas populações normalmente controladas pela ação de uma grande diversidade de predadores nativos. frutíferas________________________ Os danos causados pelos pulgões Anuraphis helichrysi (Kaltenbach), A. schwartzi (Borner), Brachycaudus (Appelia) schwartzi Borner e Myzus persicae (Sulzer) (Hemiptera, Aphididae) em pessegueiros são significativos em viveiros e pomares em formação; contudo, em plantas adultas, o aumento da densidade populacional desses insetos pode ser controlado pela presença de inimigos naturais. Allograpta neotropica Curran (Diptera, Syrphidae) representou 86,7% do total de sirfídeos amostrados e, entre os coccinelídeos, destacou-se Scymnus (Pullus) argentinicus (Weise) (Coleoptera, Coccinellidae), com 43,9%. Na França, Epistrophe balteata 69 Deg. foi a mais importante espécie de sirfídeo predadora de M. persicae em pomares de macieiras e pessegueiros, podendo consumir entre 400 e 500 pulgões durante a fase de larva. Apesar da importância econômica que a citricultura representa para a economia brasileira, muitas pesquisas em entomologia direcionadas a essa cultura têm-se limitado aos levantamentos e flutuações populacionais de insetos-praga e de seus inimigos naturais. Várias espécies de predadores encontram-se associadas às plantas cítricas, exercendo papel relevante no controle das principais pragas dessa cultura. Sob esse aspecto, os crisopídeos e os coccinelídeos merecem destaque pela abundância e freqüência com que ocorrem em um agroecossistema citrícola, constituindo- se em agentes efetivos na regulação da densidade populacional de insetos fitófagos. Apesar da estreita relação predador/presa, diversas pesquisas têm demonstrado que o fornecimento de uma só espécie de presa poderá interferir no desenvolvimento do predador. Uma interação negativa entre o predador C.sanguinea e o pulgão Toxoptera citricida (Kirkaldy) foi caracterizada por uma inadequabilidade nutricional ou mesmo por uma toxicidade da presa para esse coccinelídeo. Da mesma forma, larvas de Chrysoperla externa (Hagen) (Neuroptera, Chrysopidae), espécie freqüentemente encontrada em pomares de citros, quando alimentadas somente com o afídeo Toxoptera citricida (Kirkaldy), não atingiram o terceiro ínstar, apresentando 100% de mortalidade. fumo___________________________ Diversos insetos fitófagos atacam a cultura do fumo, destacando-se lagartas, pulgões, percevejos, tripes e alguns coleópteros, pelos danos significativos que podem ocasionar. Entre seus inimigos naturais, o vespídeo Polybia occidentalis (Olivier) tem grande capacidade predatória de lagartas. Vespas do gênero Polistes constituem importantes predadoras de Manduca sexta (Linnaeus) (Lepidoptera, Sphingidae) na Carolina do Norte, EUA, e são utilizadas no controle biológico aplicado, dispensando-se o uso de inseticidas para seu controle. Polistes exclamans exclamans Viereck e Polistes fuscatus fuscatus (Fabricius), associados a outros vespídeos, causaram uma redução de 68% no número de lagartas de M. sexta, mantendo sua população abaixo do nível de dano econômico. A transferência de colônias 70 de Polistes para as proximidades da cultura reduziu a densidade populacional de lagartas de quinto ínstar desse esfingídeo em 60% e seus danos em 74%. No Brasil, o potencial predatório de P. versicolor foi demonstrado quando se efetuou a transferência de ninhos para as proximidades de diversas culturas de importância econômica. hortaliças_______________________ Amostragens de artrópodes benéficos em tomateiro evidenciaram a presença dos percevejos Geocoris spp., Orius sp., P. nigrispinus e T. capsiformis, de carabídeos, joaninhas, formigas, tesourinhas e aracnídeos. Os geocorídeos apresentaram picos populacionais em épocas secas do ano, com um aumento gradativo da densidade populacional do início para o fim do ciclo da cultura. Os carabídeos Lebia, Calosoma e Selenophorus foram relatados como predadores de lagartas e coccinelídeos C. sanguinea, C. maculata e E. connexa, como eficientes inimigos naturais de afídeos e cochonilhas. Entre os himenópteros, a vespa Polistes melanosoma Saussure foi considerada um impoortante organismo auxiliar efetivo na regulação das populações de larvas de vários insetos-praga em tomateiro. Entre os insetos-praga que ocorrem na cultura da batata destacam-se Epitrix spp., Diabrotica speciosa (Germar) (Coleoptera, Chrysomelidae), Empoasca kraemeri Ross & Moore (Hemiptera, Cicadellidae) e diversas espécies de afídeos. Em levantamentos realizados no Paraná, constatou-se a presença de diversos predadores associados a essa cultura, salientando-se C. sanguinea, E. connexa, Hyperaspis festiva Mulsant, Scymnus spp. (Coleoptera, Coccinellidae), Orius spp. (Hemiptera, Anthocoridae) e Lebia concinna Brullé (Coleoptera, Carabidae), os quais foram mais freqüentes durante a safra da seca (Hohmann, 1989). Liberações inoculativas de pentatomídeos visando o controle de Leptinotarsa decemlineata (Say) (Coleoptera, Chrysomelidae), o mais importante inseto desfolhador da cultura da batata nos EUA e na Europa, foram capazes de reduzir a densidade populacional desse crisomelídeo em 50%. Assim, a liberação de três indivíduos de Perillus bioculatus (Fabricius) (Hemiptera, pentatomidae) por planta causou uma redução de 62% na densidade populacional desse inseto- praga, acarretando um aumento significativo na área foliar e um 71 incremento de 65% na produção em relação à testemunha. Em áreas cultivadas com brássicas em Minas Gerais, verificaram-se várias espécies de Vespidae, Coccinellidae,agente de mortalidade natural se especialize ao longo dos anos de coexistência, em determinado estádio que, provavelmente, terá menor resistência quando manipulada, reduzindo desta forma o gasto de energia no ataque pelo seu predador, o que aumenta a possibilidade de gerar indivíduos para a sua próxima geração. Essa coexistência, anteriormente citada, é o mecanismo básico do entendimento das relações entre presas e predadores ao longo de milhares de anos. Muitos autores referem-se à coexistência, como a uma corrida pela sobrevivência, onde o predador sempre procura reduzir os gastos (de tempo e energia) para encontrar, manipular e digerir a sua presa, enquanto que, em contrapartida, a presa se aperfeiçoa em fugir ou defender-se do predador, reproduzindo-se com maior eficiência. O que é observado e sabido hoje em dia na natureza, com relação aos diferentes tipos de predadores, seus mecanismos de ataque e predação, suas diferentes estratégias de forrageamento (procura pela presa) e manipulação da mesma, além dos diferentes tipos de presas, com seus peculiares mecanismos de defesa e ataque ao predador, além dos seus mais variados comportamentos de fuga, possui preceitos evolutivos, sendo “construído” pela natureza por milhares de anos, ou seja, as presas que escapavam da predação, ou os 8 predadores que atacavam mais eficientemente as suas presas perpetuaram-se e reproduziram-se originando o que temos hoje. As que não conseguiram driblar o ataque, ou os que não apresentavam eficiência em atacar extinguiram-se. A partir dessa visão ecológica sobre predadores, presas e suas interações é que o controle biológico de pragas agrícolas se desenvolveu e se aperfeiçoou. Certamente, no passado, ao observar, de maneira empírica, agentes de mortalidade natural de outros organismos, o homem foi capaz de entender a predação e manipular organismos vivos com o intuito de serem utilizados em seu próprio benefício. Há mais de 500 anos atrás, populações de formigas e aranhas foram manipuladas na China e no Yemen, visando ao controle de pragas de Citrus spp. Na Europa, o primeiro projeto de pesquisa com o intuito de se utilizar predadores para o controle de pragas, foi escrito em 1752 pelo taxonomista Carl Linnaeus, de acordo com o qual todo artrópodo tem seu predador, que o segue e o destrói; assim sendo, tais predadores poderiam ser coletados e manipulados contra as pragas. Na verdade, surtos de pragas em plantios constituídos por monocultivos ocorrem repentinamente e de maneira repetitiva, havendo assim, a necessidade de se utilizar métodos de controle que possam ser eficientes naquele curto prazo, o que faz dos inseticidas um dos métodos, ainda hoje, mais utilizados na prevenção e combate às pragas agrícolas, em todo o mundo. Entretanto, como os produtos químicos sintetizados em laboratório não fazem parte do sistema natural no qual são utilizados, não há como a natureza retomar o equilíbrio estável, de outrora, fazendo com que os organismos vivos que são expostos a essas moléculas (além das pragas) se contaminem de maneira fatal. Além disso, muitos princípios ativos dos agroquímicos não se degradam facilmente no meio ambiente o que acarreta, certamente, em contaminação de solo, água e também do ar. Produtos químicos, veridicamente, atuam com maior rapidez no alvo almejado (no caso, a praga), pelo fato de serem depositados no meio ambiente com o auxílio de diferentes tecnologias, como a pulverização manual, mecânica ou motorizada, ou ainda por poderem contaminar a praga através de diferentes formas, como por contato tópico, ação residual, ingestão ou indiretamente através do consumo de organismos previamente contaminados. Entretanto, quando se mede a relação 9 custo/benefício dessa tecnologia, os custos, certamente, superam os benefícios, principalmente em longos intervalos de tempo, pois desvantagens do uso de produtos químicos na agricultura, diagnosticadas por diversos trabalhos de caráter científico, em todo o mundo, como o surto de pragas secundárias, ressurgência de pragas, morte de polinizadores, resíduos na alimentação e contaminação ambiental, alto custo de aquisição e aplicação, redução dos inimigos naturais, resistência das pragas às moléculas inseticidas e a deriva desses produtos não recompensam o valor financeiro investido. Outro fator que interfere, favoravelmente, quanto à escolha de produtos químicos na agricultura é que em relação ao controle biológico, aquele possui resultado mais rápido. Realmente, o controle com agentes biológicos tende a ser mais lento, pois, organismos vivos, como artrópodes, por mais que possuam alto potencial biótico (que é sinônimo de alta multiplicação) precisam de certo tempo para se adaptar às novas condições impostas, de encontrarem parceiros sexuais para acasalarem e, por conseqüência, se reproduzirem (considerando-se, apenas, alguns dos processos básicos exigidos ao aumento populacional). Entretanto, para essa possível desvantagem, há o uso de liberações inundativas (grandes quantidades de inimigos naturais), além do uso de predadores generalistas que são capazes de persistirem no meio ambiente mesmo quando a sua presa não esteja presente no momento, além do manejo cultural que propicia condições ótimas a esses organismos benéficos no meio, implicando em um menor espaço de tempo para se multiplicarem. Tais medidas possuem viabilidade, quanto a sua execução, tanto em sistemas agrícolas como em florestais. Nesses últimos, há uma tendência para a redução do uso de produtos químicos, em detrimento do uso de inimigos naturais, pois como são sistemas de maior longevidade (décadas de uso) e que são, relativamente, pouco modificados (manuseados) pelo homem, há a tendência dos inimigos naturais adaptarem-se com maior facilidade e desempenharem total controle das pragas. Inimigos naturais liberados em sistemas agrícolas também podem realizar o controle de pragas de maneira equivalente ao que é proposto em sistemas florestais, entretanto, como o ciclo do monocultivo, em geral, é bastante curto (dias ou meses de uso), os inimigos naturais precisam encontrar condições ótimas para desempenhar satisfatório controle de suas presas. 10 Essas condições ótimas podem ser manipuladas pelo agricultor, como através do uso de produtos químicos seletivos aos inimigos naturais ou técnicas de manejo cultural que propiciem maior sobrevivência dos agentes de mortalidade natural. O próprio Manejo Integrado de Pragas (MIP), que já é utilizado para a maioria dos monocultivos de importância econômica ao homem, reduz impactos negativos aos inimigos naturais de maneira significativa. O que é necessário, de fato, é a conscientização do pequeno, médio, ou grande produtor agrícola de que os benefícios do controle biológico de pragas superam seus custos em qualquer sistema agrícola ou florestal, desde que utilizado de maneira correta e bem planejada. A manipulação e uso de agentes de mortalidade natural vai muito mais além do que simplesmente criar um determinado organismo (inseto, por exemplo) e liberá-lo no campo na hora em que se achar conveniente. Esse “muito mais além” refere-se ao entendimento das relações ecológicas existentes entre predadores e presas e o tipo de ambiente envolvido. Apesar da complexidade do tema, iremos apresentá-lo por partes. A primeira delas relacionada com as denominações existentes para o conceito de predador. É interessante notar que quase que de maneira instantânea, se qualquer pessoa lhe pedir para pensar em um exemplo de predador, certamente, o primeiro exemplo em mente seria um leão, um tigre, um urso pardo, uma águia, etc. Entretanto,Syrphidae, Chrysopidae, Hemerobiidae, Asilidae e Forficulidae, destacando-se as joaninhas C. sanguinea e Scymnus (Pullus) sp. e os sirfídeos, em associação com os pulgões Brevicoryne brassicae (Linnaeus) e M. persicae, na cultura da couve. Poucas pesquisas foram feitas no sentido de determinar o número de afídeos necessários para induzir a oviposição entre os coccinelídeos. Adultos de Hippodamia convergens Guerin consumiram um total médio de 446 e 127 espécimens de Therioaphis trifolii (Monell) e Acyrthosiphon pisum (Harris) (Hemiptera, Aphididae), respectivamente. O coccinelídeo Semiadalia undecimnotata Schneider foi responsável pela predação diária de 20 mg de M. persicae e a oviposição foi iniciada somente após a ingestão de 70 a 90 mg de presas. Nos EUA, verificou- se que o dermáptero L. riparia foi capaz de predar, em um período de três dias, até 96% das pupas de Trichoplusia ni (Hübner) (Lepidoptera, Noctuidae) presentes na cultura do repolho. Nessa mesma cultura, ocorreu uma redução de 44% na população de lagartas de Pieris rapae (Linnaeus) (Lepidoptera,Pieridae) devido à ação do vespídeo P.fuscatus. Vespas do gênero Polistes também foram mencionadas como eficientes agentes de controle de P. rapae, pois uma única colônia capturou cerca de 2 mil lagartas, sendo consideradas potencialmente importantes na supressão da população desse pierídeo, quando da introdução de colônias dessas vespas nas proximidades de determinada cultura. Predadores das famílias Anthocoridae, Reduviidae (Hemiptera), Cantharidae. Carabidae, Coccinellidae, Staphylinidae (Coleoptera), Sphecidae, Vespidae (Hymenoptera) e Syrphidae (Diptera) ocorreram em um agroecossistema hortícola em manejo orgânico na região de Viçosa, MG, verificando-se uma estreita relação entre as populações de predadores e de presas. A presença de plantas floridas e diversidade de culturas sob manejo orgânico proporcionaram maior abundância e riqueza de espécies entre herbívoros, os predadores e os parasitóides. milho___________________________ Um dos insetos-praga da cultura do milho é a lagarta do cartucho, Spodoptera frugiperda (J.E. Smith) (Lepidoptera, Noctuidae), cujo ataque 72 pode ocasionar perdas da ordem de 34%. Entre os organismos responsáveis pela predação de ovos e pequenas lagartas desse noctuídeo, destacam-se o percevejo Podisus sp. e a tesourinha Doru luteipes (Scudder). Ninfas de D. luteipes consumiram, em média, 496 ovos ou 531 lagartas de primeiro ínstar de S. frugiperda, e os adultos podem predar mais de 2.349 lagartas neonatas. A presença de pelo menos um casal de D. luteipes por planta de milho foi suficiente para manter a população da lagarta do cartucho sob controle e promover um aumento de 7% na produção. Um adulto dessa espécie foi capaz de predar, em média, 42 ovos de lepidoptera por dia, enquanto uma ninfa consumiu 24 ovos por dia. soja____________________________ Na cultura da soja, os hemípteros e os lepidópteros destacam-se como os mais importantes insetos-praga. Embora a utilização de insetos parasitóides e de Baculovirus anticarsia seja um dos métodos atualmente empregados para o controle de percevejos e de A. gemmatalis, o agroecossistema formado em função do manejo adotado nessa cultura poderá apresentar um complexo de predadores capazes também de atuar na regulação das populações de insetos- praga. Muitos desses predadores alimentam-se de ovos de Nezara viridula (Linnaeus) (Hemiptera, Pentatomidae), podendo contribuir com reduções de até 17,3%. Das posturas de N. viridula avaliadas, 68,9% apresentaram sinais de predação e 25,5% dos ovos foram consumidos, chegando a 100% em um dos anos estudados. Geoeoris sp. foi o predador mais comum associado à cultura da soja no Brasil, alimentando-se de ácaros, tripes, afídeos, cigarrinhas, ovos de outros insetos, lagartas e pequenos artrópodes. Geoeoris punetipes Say (Hemiptera, Lygaeidae) predou 39,6% de ovos ou 28,0% de ninfas de N. viridula ou, ainda, uma média de 3,4 lagartas do primeiro e segundo ínstares de noctuídeos, enquanto Nabis roseipennis Reuter (Hemiptera, Nabidae) consumiu 6,2 lagartas dessa mesma família. Entre as causas de mortalidade natural da fase de ovo do pentatomídeo Eusehistus heros (Fabricius) destaca-se a ação de P. nigrispinus, Chrysoperla sp., Nabis sp., C.sanguinea e Geoeoris sp., considerados os mais eficientes predadores, cuja importância poderá ser ainda maior em função da potencialidade que desempenham como organismos de controle biológico. Nos EUA, ninfas de quinto ínstar dos 73 percevejos P. maeuliventris e Stiretrus anehorago (Fabricius) (Hemiptera, pentatomidae) foram responsáveis por uma predação média de 61,7 e 42,0 larvas de segundo ínstar de Epilaehna varivestis Mulsant (Coleoptera, Coccinellidae), respectivamente. O carabídeo C.granulatum é um importante predador de lagartas e pupas de A. gemmatalis. As larvas e os adultos dessa espécie foram mais freqüentes em plantios antecipados que em plantios tardios, constatando-se que sua atividade larval esteve mais relacionada à umidade do hábitat do que à disponibilidade de presas. Fêmeas de Calosoma sayi DeJean, uma espécie de carabídeo freqüentemente encontrada em culturas de soja dos EUA, consumiram de uma a três pupas de noctuídeos por dia, com preferência por aquelas de menor tamanho, e apresentaram uma capacidade predatória média diária de até 18,9 lagartas de A. gemmatalis. Para L. riparia verificou-se um consumo diário de duas pupas de Noctuidae e de até 54,6 lagartas de Pseudoplusia includens (Walker) (Lepidoptera, Noctuidae). sorgo___________________________ Os mais importantes insetos-praga dessa cultura são a mosca-do-sorgo, o percevejo-castanho, o pulgão-verde e um complexo de lagartas, cuja densidade populacional poderá ser mantida em níveis. aceitáveis devido à ação de insetos entomófagos. Pode ocorrer a presença de diversos inimigos naturais nessa cultura, especialmente dos coccinelídeos e dos sirfídeos. A joaninha S. (Pullus) argentinicus apresenta uma grande capacidade de predação de afídeos, consumindo em média 156,2 ± 5,1 ninfas de Schizaphis graminum (Rondani) durante seu período larvaI. A tesourinha D. luteipes também é um predador de pupas de T. ni, ovos e lagartas pequenas de S. frugiperda, ninfas e adultos de S.graminum e Helicoverpa zea (Bodie) (Lepidoptera, Noctuidae). Esse dermáptero ocorre no cartucho e na espiga do milho e do sorgo em todas as épocas de plantio, e o total de plantas contendo pelo menos um indivíduo poderá ultrapassar 70%. A interação do uso de D. luteipes e cultivares de sorgo resistentes a S. graminum é uma tática viável para o MIP do sorgo. Ninfas e adultos de D. luteipes consumiram um maior número de S. graminum oriundos de genótipos resistentes, pelo fato de essas plantas proporcionarem o desenvolvimento de afídeos de menor tamanho e peso. Assim, em condições de campo, poderá ocorrer um aumento 74 do número de insetos predados ao utilizar D. luteipes associado à cultivares resistentes. Ácaros predadores de pupas de Stenodiplosis sorghicolla (Coquillet) (Diptera, Cecidomyiidae) foram encontrados no interior das espículas e, apesar de ser considerada a praga-chave da cultura, a literatura registra tão- somente a ocorrência de predadores generalistas desse inseto. trigo____________________________ Nessa cultura é encontrado um complexo de pulgões e lagartas, normalmente causadores de danos significativos. Larvas e adultos de carabídeos e estafilinídeos, com destaque para Paederus brasiliensis Erichson (Coleoptera, Staphylinidae), são importantes predadoresde insetos que vivem no solo. Algumas espécies de Coccinellidae foram observadas alimentando-se de pulgões, ovos, larvas e certos insetos adultos que possuem tegumento facilmente perfurável, constatando-se que um adulto pode predar, em média, 20 mg de pulgões por dia. Os forficulídeos, especialmente D. lincare, e alguns dípteros são predadores de ovos, pulgões e larvas que se desenvolvem no solo. Entre os sirfídeos destacam-se A. exotica, Pseudodorus clavatus (Fabricius) e Taxomerus spp., cujas larvas alimentam-se de pulgões. Na França, ocorre três espécies de sirfídeos como as mais eficientes predadoras do pulgão Diuraphis noxia (Kurdjumov) (Hemiptera, Aphididae) na triticultura. Ninfas e adultos dos percevejos Orius, Geocoris, Nabis, Alcaeorrhynchus grandis (Dallas), Oplomus cruentus, Podisus sp., Rasahus hamatu (Fabricius), Zelus sp. e Sinea sp., comuns nessa cultura, são importantes predadores, auxiliando no controle de ácaros, ovos, larvas, lagartas, pulgões, percevejos, besouros, tripes e outros pequenos insetos. Os himenópteros predadores também são freqüentes na triticultura, embora seja quase desconhecida sua atuação como agentes reguladores de populações de insetos fitófagos. Os formicídeos das subfamílias Dolichoderinae, Dorylinae, Formicinae e Ponerinae realizam na superfície do solo e da planta uma busca constante de presas utilizadas em sua alimentação, não podendo ser excluídos dos programas de MIP do trigo. Muitas espécies de vespídeos dos gêneros Polistes e Polybia são encontradas nas lavouras de trigo predando lagartas e diversos outros artrópodes. 75 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Parasitóides ou predadores? Analisando-se as características de um e de outro, e à luz dos conhecimentos atuais, é difícil determinar qual dos dois seria mais eficiente no controle de pragas. Da mesma forma, a simples determinação da espécie é insuficiente para assegurar que determinado parasitóide ou predador tem um bom potencial no controle biológico de pragas, podendo-se afirmar que são múltiplos os fatores que devem ser levados em conta. Em vez de tentar determinar qual tipo de entomofagia é a mais eficiente, considera-se mais adequado analisar as espécies envolvidas e o ecossistema a ser trabalhado antes de optar pelo emprego de um predador ou um parasitóide no controle biológico de um inseto-praga. 76 SUGESTÃO DE LEITURA Berti Filho, E. Ciociola, A.I. Parasitóides ou predadores? Vantagens e Desvantagens. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Foerster, L.A. Seletividade de inseticidas a predadores e parasitóides. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. Pereira, A.I.A.; Coelho, R.R.; Ramalho, F.S.; Zanuncio, J.C. Efeito hormético de doses subletais de gamma cyhalothrin na reprodução de Podisus nigrispinus (Dallas)(Heteroptera: Pentatomidae), predador do curuquerê-do-algodoeiro. In: IV Congresso Brasileiro de Algodão, 2003, Goiânia. Anais do IV Congresso Brasileiro de Algodão. 2003. 77 INTERAÇÃO ENTRE PRODUTOS QUÍMICOS & INIMIGOS NATURAIS APRESENTAÇÃO Os produtos que possuíam pouca ou nenhuma seletividade fizeram muitos estragos no que concerne aos prejuízos ambientais e para o manejo de pragas e conservação de inimigos naturais; preceito básico do manejo integrado de pragas. Com o avanço da química, empresas começaram a disponibilizar no mercado produtos com modo de atuação mais específicos; produtos químicos que prejudicassem mais as pragas do que aos inimigos naturais. Definição básica de produtos seletivos. Os tipos de seletividade, as diferenças entre a seletividade de predadores e parasitóides e várias outras ramificações desta parte da entomologia agrícola, serão nesse capítulo. 5 78 1. INTRODUÇÃO O grande sucesso alcançado pelos inseticidas sintéticos a partir da década de 40 no controle de pragas agrícolas relegou as pesquisas sobre inimigos naturais a um plano secundário. A alta eficiência dos tratamentos e a aparente incompatibilidade entre os métodos químico e biológico dividiram os entomologistas em dois campos opostos: os defensores do método químico e os adeptos do controle biológico. O interesse pela integração dos dois métodos somente aumentou quando, a partir da década de 50, apareceram as primeiras conseqüências negativas do uso indiscriminado e abusivo de inseticidas. Paralelamente, a importância dos agentes naturais de controle em ecossistemas agrícolas voltou a ser reconhecida, o que culminou com o estabelecimento dos primeiros programas de manejo integrado de pragas agrícolas nos anos 70. Dentro desse conceito, o principal objetivo é maximizar os efeitos de inseticidas sobre as pragas, com o mínimo impacto nos inimigos naturais. Devido à similaridade fisiológica no mecanismo de transmissão dos impulsos nervosos entre os artrópodes, inseticidas neurotóxicos são, de modo geral, pouco seletivos, afetando indistintamente insetos fitófagos e entomófagos. A partir da década de 70, novos princípios ativos, baseados em mecanismos fisiológicos específicos dos artrópodes, como tipo de crescimento e processos hormonais, aumentaram consideravelmente a seletividade desses produtos em relação a outros grupos animais, assim como abriram espaço para seu uso de forma seletiva em relação a inimigos naturais. Mais recentemente, moléculas tóxicas a insetos foram sintetizadas a partir de produtos naturais produzidos por microrganismos, plantas e animais, aumentando a diversidade de princípios ativos disponíveis e conseqüentemente fornecendo maior gama de opções em busca de seu uso seletivo no controle de insetos-praga. Desta forma, neste capítulo do nosso curso, serão abordadas as formas de seletividade, as implicações advindas de efeitos subletais e indiretos de inseticidas sobre inimigos naturais e as propriedades dos inseticidas e dos inimigos naturais que conferem toxicidade diferencial a insetos-praga em relação a predadores e parasitóides. 2. TIPOS DE SELETIVIDADE seletividade fisiológica – inseticidas seletivos________________________ 79 Seletividade fisiológica é definida como a maior atividade de um inseticida sobre a praga do que sobre o inimigo natural, quando ambos entraram em contato direto com o inseticida ou seus resíduos. Primariamente, ela envolve o movimento do inseticida sobre ou no corpo do inseto e sua interação com o ponto de ação. Portanto, é uma propriedade inerente ao inseticida em determinada dose e opera primeiro no nível fisiológico ou de organismo. Na seletividade fisiológica estão envolvidos os processos de absorção, penetração, transporte e ativação de inseticidas, os quais, quando agem em diferentes intensidades, resultam em toxicidade diferencial entre duas espécies. Outros processos envolvidos na seletividade fisiológica incluem a retenção do inseticida em tecido gorduroso e sua excreção e metabolismo seletivos, este último englobando a destoxificação e a insensibilidade dos pontosde ação no inseto. O grau de seletividade fisiológica é expresso pela razão entre a dose letal média (DL50) à praga e ao inimigo natural ou pela relação entre a dosagem recomendada para o controle da praga e a DL50 ao inimigo natural. Alternativamente, a seletividade ideal pode ser definida como o ponto da curva em que a diferença entre a mortalidade da praga e do inimigo natural é máxima. A possibilidade de obtenção de seletividade fisiológica com inseticidas neurotóxicos é reduzida em virtude da similaridade no processo de transmissão dos impulsos nervosos não apenas entre as diferentes ordens de insetos, como também entre os vários filos animais. No entanto, apesar da similaridade no modo de ação de inseticidas neurotóxicos dentro da classe Insecta, inúmeros resultados apontam a existência de mecanismos fisiológicos em predadores e parasitóides, os quais conferem a esses inimigos naturais maior tolerância a certos inseticidas neurotóxicos, em função de níveis diferenciais de absorção, penetração, metabolismo e excreção em relação a insetos fitófagos. É possível alcançar, ou ao menos aumentar, a seletividade fisiológica por meio da manipulação de dosagens; densidades populacionais de pragas podem ser posicionadas abaixo do limiar de controle com baixas dosagens de inseticidas fisiologicamente seletivos que permitam a sobrevivência e a reprodução de inimigos naturais. O grande avanço verificado no desenvolvimento de inseticidas “biorracionais”, como os análogos do hormônio juvenil, inibidores do 80 crescimento e inseticidas de origem microbiana, ampliou os limites para a exploração da seletividade fisiológica, aumentando as possibilidades de sobrevivência de predadores e parasitóides em agroecossistemas. seletividade ecológica – uso seletivo de inseticidas_______________________ O emprego de inseticidas de maneira ecologicamente seletiva minimiza a exposição de inimigos naturais e, ao mesmo tempo, controla as espécies- praga. A seletividade ecológica é classificada de acordo com a forma pela qual a exposição diferencial de pragas e inimigos naturais é obtida; essa diferenciação pode se dar no tempo ou no espaço. A separação temporal pode ser alcançada explorando-se diferenças existentes nos ritmos de atividade diária de uma ou mais gerações ou mesmo em períodos de tempo mais amplos. Adultos do predador Calosoma granulatum (Perty) (Coleóptera: Carabidae), por exemplo, apresentam um ritmo de atividade essencialmente noturno, o que permite evitar o contato direto dos adultos com inseticidas aplicados durante o dia. Price & Shepard (1978), citados por Foerster (2002), verificaram que aplicações de inseticidas convencionais efetuadas na presença de altas densidades populacionais do predador Calosoma sayi Dejean reduziram em mais de 50% sua incidência em soja comparativamente a áreas não tratadas; entretanto, tratamentos efetuados antes da ocorrência do predador tiveram efeito inverso, ou seja, um número significativamente maior de predadores foi encontrado nas áreas tratadas do que na testemunha. Como verificado por Price & Shepard (1978), o número de larvas e adultos de C.granulatum nas parcelas tratadas com monocrotofós e metil paration chegou a ultrapassar o número de predadores encontrados na testemunha não tratada, devido ao curto poder residual do inseticida e à ressurgência de presas na área tratada. A separação espacial entre pragas e inimigos naturais pode ocorrer em diferentes partes de uma planta, entre plantas em um campo e mesmo entre culturas, abrangendo todo um agroecossistema. O uso de inseticidas granulados sistêmicos no solo, a deposição seletiva de inseticidas em pontos localizados da planta ou o tratamento de algumas fileiras de plantas, deixando as demais como um reservatório para a reprodução de predadores e parasitóides, são exemplos de seletividade espacial. A seletividade 81 ecológica pode envolver simultaneamente separação temporal e espacial. Além da forma da separação entre pragas e inimigos naturais, a seletividade ecológica pode ser obtida por meio de métodos alternativos de aplicação e de formulações apropriadas de inseticidas, assim como da exploração de diferenças na biologia e no comportamento das espécies envolvidas. Diferenças biológicas incluem aspectos do ciclo de vida, atividade locomotora e características comportamentais, como alimentação, acasalamento e reprodução. Muitos dos mecanismos usados para se obter seletividade ecológica dependem do conhecimento detalhado da biologia de pragas e inimigos naturais, daí a necessidade de pesquisas básicas sobre sua biologia. Embora a literatura entomológica tenha crescido acentuadamente nos últimos dez anos no Brasil, os conhecimentos disponíveis sobre o comportamento de predadores e parasitóides são ainda insuficientes para que se faça melhor uso da seletividade ecológica em agroecossistemas. Para tanto, são necessários maiores conhecimentos nas áreas da biologia, da dinâmica populacional e da ecologia de comunidades, a fim de que inseticidas e dosagens seletivas sejam integrados aos princípios ecológicos no controle seletivo de insetos-praga. 3. IMPACTO DE INSETICIDAS SOBRE INIMIGOS NATURAIS Existe um considerável volume de dados sobre os efeitos de inseticidas específicos sobre espécies particulares de predadores e parasitóides. Revisões sobre os efeitos de inseticidas sobre inimigos naturais têm sido realizadas desde o estabelecimento dos primeiros programas de manejo integrado de pragas. As primeiras, na década de 60, tinham um caráter generalista, envolvendo todos os grupos de inseticidas e de inimigos naturais. A partir de 1970, as revisões se tornaram mais específicas, em virtude da grande quantidade de trabalhos sobre seletividade publicados. As revisões passaram a tratar de classes individuais de inseticidas, como os piretróides sintéticos, microbianos e inibidores do crescimento. A partir de 1980, aumentou a preocupação com a necessidade de padronização de métodos para a avaliação dos efeitos de inseticidas sobre predadores e parasitóides, ao mesmo tempo que as revisões passaram a enfocar a seletividade em culturas específicas ou 82 mesmo em comunidades ecológicas, como predadores do solo. Diante da elevada quantidade de resultados individuais sobre seletividade de inseticidas à espécies de predadores e parasitóides, todas as informações disponíveis vêm sendo agrupadas em um banco de dados denominado SELCTV, no qual mais de 600 espécies de insetos e 400 agrotóxicos, incluindo inseticidas, fungicidas, acaricidas, repelentes e inibidores do crescimento, foram indexados de forma a fornecer uma visão global do efeito dessas substâncias sobre predadores e parasitóides a partir de diferentes atributos, como grupo químico do inseticida, tipo de inimigo natural (predador ou parasitóide), categoria taxonômica do inimigo natural estágio de desenvolvimento, etc. Resultados de cerca de mil trabalhos científicos envolvendo toxicidade de inseticidas e outros pesticidas a inimigos naturais estão incluídos no banco de dados. A despeito das limitações decorrentes do uso de diferentes metodologias de aplicação, delineamentos experimentais e níveis de precisão dos resultados, o banco de dados permite verificar tendências que seriam difíceis de visualizar nos trabalhos individualmente. Analisados em conjunto, os resultados demonstram que predadores são menos suscetíveis a inseticidas do que parasitóides, ao passo que existe menor variabilidade nos resultados obtidos com parasitóides do que com predadores. Segundo o critério do grupo químico, verifica-seque os piretróides compõem o grupo dos inseticidas menos seletivos, seguidos pelos organofosforados, quando se leva em conta o conjunto de resultados disponíveis tanto a predadores como a parasitóides. Inseticidas microbianos e inibidores do crescimento, no outro extremo, são os grupos mais seletivos. Ainda que extremamente útil pela visão global das tendências que fornecem, as informações obtidas de um banco de dados como o SELCTV devem ser interpretadas com cautela, uma vez que algumas das generalizações podem não refletir a realidade. A aparente seletividade de inseticidas a endoparasitóides, por exemplo, talvez advenha do fato de que a maioria dos experimentos tenha sido realizada no estágio larval dos parasitóides, protegidos no interior dos hospedeiros. Resultados diferentes poderiam ser obtidos se a avaliação fosse realizada em outro estágio do mesmo parasitóide diretamente exposto ao inseticida. Da mesma maneira, a classificação de uma espécie de predador ou parasitóide como tolerante a inseticidas pode estar 83 relacionada ao fato de que uma parte significativa dos resultados disponíveis sobre essa espécie tenha sido obtida com inseticidas reconhecidamente seletivos, como os microbianos e os inibidores do crescimento. Apesar dessas limitações, a utilização da tecnologia de bancos de dados na manipulação de grandes quantidades de informação apresenta a vantagem da visão global dos resultados e a possibilidade de visualização de tendências por meio da análise conjunta dos dados. 4. EFEITOS INDIRETOS DE INSETICIDAS Além dos efeitos fisiológicos, resultantes do contato direto do inseticida ou de seus depósitos residuais sobre os insetos ou seus substratos, dois tipos de efeitos indiretos devem ser levados em conta: a indisponibilidade de presas ou hospedeiros, resultante do nível de controle alcançado sobre a espécie-alvo do tratamento, e os efeitos subletais tanto sobre pragas como sobre predadores e parasitóides. È fato, a ocorrência de efeitos subletais de inseticidas sobre inimigos naturais; existem ainda os efeitos indiretos à longo prazo de inseticidas sobre predadores, com ênfase nas conseqüências resultantes da escassez de presas sobre a reprodução e o repovoamento de predadores em áreas repetidamente tratadas com inseticidas. 5. IMPACTO DE INSETICIDAS NA DENSIDADE DE PRESAS/HOSPEDEIROS Mesmo inseticidas seletivos podem provocar a redução ou até a extinção local de determinado predador ou parasitóide pela eliminação de suas presas ou hospedeiros. Como por exemplo, os inseticidas pirimicarb e fenvalerate, fisiologicamente seletivos a coccinelídeos e a sirfídeos predadores de afídeos respectivamente. Aplicações desses dois inseticidas em cereais, entretanto, mostraram-se altamente prejudiciais aos dois predadores devido à elevada eficiência de ambos no controle de pulgões, resultando na indisponibilidade de alimento aos predadores. Muitos inimigos naturais exploram melhor certas densidades populacionais e padrões de distribuição de suas presas/hospedeiros do que outras densidades e padrões de agregação. Inseticidas não reduzem apenas densidades populacionais, mas também afetam os padrões de distribuição de pragas, tornando-os mais regulares e 84 agregados. Assim, se a distribuição remanescente de presas/hospedeiros após a aplicação de inseticidas for pequena demais para estimular a atração de uma população de inimigos naturais, estes abandonam a cultura, contribuindo para a ressurgência da praga. Outro efeito indireto do uso de inseticidas sobre inimigos naturais resulta da sincronização dos estágios sobreviventes após a aplicação. Em muitas culturas, pragas e inimigos naturais exibem sobreposição de gerações, de forma que todos os estágios de ambos estão presentes na maior parte do tempo. Nessas comunidades, o tempo de cada geração dos inimigos naturais é consideravelmente menor que o das pragas, e os inimigos naturais persistem graças à superposição das gerações, o que assegura um constante suprimento do estágio da praga necessário ao inimigo natural. Se um inseticida eliminar os estágios suscetíveis da praga, ocorrerá uma sincronização no desenvolvimento dos estágios tolerantes, criando uma estrutura etária uniforme na população; essa uniformização nos estágios presentes na cultura é denominada "sincronização catastrófica". Para um inimigo natural com um tempo de desenvolvimento mais curto que o da praga, tal sincronização provoca uma lacuna de até uma geração na disponibilidade do estágio apropriado do hospedeiro para sua reprodução. Nessa situação, pode ocorrer a extinção local do inimigo natural, aumentando indiretamente os efeitos letais do inseticida sobre os inimigos naturais. A compatibilização entre a eficiência do inseticida e a disponibilidade de presas/hospedeiros assumiu maior importância com a implantação de programas de manejo integrado de pragas agrícolas. A necessidade de reduzir os níveis de dano, associada à preservação de inimigos naturais preconizada pela filosofia do manejo integrado de pragas, conduziu às primeiras investigações sobre o uso de dosagens mínimas efetivas de inseticidas. Com isso, muitos inseticidas tiveram sua dosagem diminuída sem que houvesse perdas significativas em sua eficiência, ao mesmo tempo que se tornou possível a sobrevivência de predadores e parasitóides. Como exemplo, a dosagem recomendada de diflubenzuron para o controle da lagarta da soja Anticarsia gemmatalis (Hübner) é de 7,5g i.a./ha; no entanto, as primeiras avaliações desse inseticida contra o mesmo inseto foram feitas utilizando dosagens entre 75 g e 562 g i.a./ha, ou seja, entre 10 e 75 vezes 85 acima da dosagem necessária para obter um efetivo controle de A. gemmatalis. No Brasil, pesquisas sobre baixas dosagens de inseticidas tiveram grande impulso, principalmente nas culturas do algodão e da soja, o que contribuiu significativamente para a redução de dosagens e conseqüentemente para o incremento da ação de predadores e parasitóides nessas culturas. 6. EFEITOS SUBLETAIS Tradicionalmente, as pesquisas relacionadas aos efeitos de inseticidas sobre insetos têm-se restringido a sua ação letal. No entanto, doses subletais podem afetar a fisiologia tanto das espécies-alvo das aplicações como das espécies benéficas (Pereira, 2003). O reconhecimento da importância dos efeitos secundários de inseticidas, além da letalidade, aumentou com o surgimento de inseticidas fisiologicamente seletivos, como os análogos do hormônio juvenil, ecdisteróides e inibidores do crescimento. O conhecimento dos efeitos subletais é relevante não apenas sobre os inimigos naturais, mas também sobre as espécies-praga, pois alterações nos processos fisiológicos desses insetos provocadas por efeitos subletais podem ser favoráveis à atuação de predadores e parasitóides, pelo enfraquecimento da presa/hospedeiro. Os parâmetros biológicos mais comumente afetados pela ação subletal de inseticidas são fecundidade, longevidade, taxa de desenvolvimento e razão sexual. Os efeitos no comportamento são principalmente observados na capacidade de busca do predador/parasitóide e em sua mobilidade, além de ocorrerem modificações no comportamento reprodutivo e alimentar. Todas essas alterações vêm merecendo crescente atenção, à medida que os programas de manejo integrado de pragas se aperfeiçoam. Efeitos de caráter fisiológico compreendem alterações na fecundidade e na taxa de eclosão, tanto reduzindo-as como aumentando-as; na velocidade de desenvolvimento, seja acelerando-o, seja retardando-o; na redução da longevidade; e na razão sexual.Alterações no comportamento de predadores e parasitóides foram observadas com relação à atividade locomotora, à capacidade de busca, à alimentação e à oviposição. Sobre o tipo de reação de predadores e parasitóides a subdosagens de inseticidas, verifica-se que uma parte significativa dos resultados encontrados na literatura aponta para um incremento no desempenho de inimigos naturais 86 diante de doses subprejudiciais. Esses efeitos estimulantes não se restringem somente a insetos, mas são observados também em plantas, culturas de células, microrganismos fermentadores e até mamíferos (Luckey, 1968, citado por Foerster, 2002). Esse autor propôs o termo "hormoligose" (do grego hormon = estimular, oligo = pequenas quantidades) para descrever situações em que dosagens subletais de inseticidas favorecem o desempenho do inseto atingido. Luckey (1968), citado por Foerster (2002) sugere que o princípio da hormoligose aplicado a insetos fitófagos ajuda a explicar muitos casos de ressurgência de pragas após a aplicação de inseticidas no campo. Com a crescente ênfase no estudo das relações entre inseticidas e inimigos naturais e à medida que o conhecimento dos efeitos indiretos se aprofunda, a utilização de doses subletais para aumentar a eficiência dos agentes naturais de controle pode ser aperfeiçoada, visando maximizar a atuação de predadores e parasitóides. 7. FATORES QUE AFETAM A SELETIVIDADE atributos dos inseticidas____________ A seletividade fisiológica é uma propriedade inerente a determinado inseticida e, portanto, refere-se a inseticidas seletivos, enquanto a seletividade ecológica é inerente ao inimigo natural e diz respeito ao uso seletivo de inseticidas, mesmo daqueles fisiologicamente não seletivos. Inseticidas neurotóxicos, por seu modo de ação, são fisiologicamente pouco seletivos, embora alguns inseticidas desses grupos sejam individualmente seletivos a algumas espécies de inimigos naturais. Com o desenvolvimento de inseticidas biorracionais, ampliaram-se as oportunidades para o desenvolvimento de inseticidas fisiologicamente seletivos. Os inibidores do crescimento de insetos (ICls) dividem-se em dois grupos principais, com base em seu modo de ação. Um deles compreende os análogos do hormônio juvenil, os análogos anti-hormônio juvenil e os ecdisteróides, que interferem no sistema endócrino; compostos dessa natureza comprometem os processos de ecdise e metamorfose e são aplicáveis apenas a insetos que causam danos na fase larval. O outro grupo é composto pelas benzoilfenil uréias, que inibem a síntese da quitina, originando larvas e pupas malformadas e que resultam na morte do inseto. 87 Os principais fatores que influenciam o efeito de ICls no desenvolvimento de predadores e parasitóides são o método de administração e o estágio de desenvolvimento tanto do inimigo natural como da presa/hospedeiro. Entre os métodos utilizados para avaliar os efeitos dos ICls estão: aplicações tópicas em hospedeiros parasitados; pulverização ou imersão de folhas contendo insetos parasitados; alimentação de predadores com presas tratadas com ICls; fornecimento de alimento tratado com ICls ao hospedeiro; aplicações tópicas em predadores e parasitóides e testes de campo tratando plantas que contenham espécies-praga e benéficas. Diferentes métodos de aplicação resultam em modos de absorção diversos, que, por sua vez, podem causar distintos efeitos do ICI sobre um inimigo natural. Por exemplo, o tratamento direto de um parasitóide é geralmente mais prejudicial que o tratamento do hospedeiro parasitado, onde o parasitóide se encontra mais protegido. Devido a seu modo de ação característico, os ICls provocam respostas mais variadas do que inseticidas convencionais com relação ao estágio de desenvolvimento do predador ou parasitóide, embora o estágio do hospedeiro também possa afetar o parasitóide. Em outros experimentos, tanto o método de exposição como o estágio de desenvolvimento do inimigo natural afetaram parasitóides e predadores. Os resultados disponíveis demonstram que diferenças na suscetibilidade aos ICls em relação aos estágios de inimigos naturais comparados com suas presas ou hospedeiros podem ser exploradas a fim de permitir o controle seletivo de pragas, por meio da aplicação nos estágios de maior suscetibilidade do hospedeiro/presa e de maior tolerância do inimigo natural. Além do método de aplicação e do estágio de desenvolvimento, predadores e parasitóides apresentam reações em relação à dose utilizada; o aumento na dose geralmente amplia os efeitos, manifestados principalmente pela baixa emergência ou pelo aumento na mortalidade. Inimigos naturais diferem quanto a sua tolerância intrínseca a diferentes ICls, donde alguns produtos podem ser seletivos a uma espécie e prejudiciais à outra. Por outro lado, a mesma espécie pode responder de forma distinta a diferentes ICls. Independentemente do emprego de inseticidas fisiologicamente seletivos ou do uso seletivo de inseticidas, é imprescindível que os programas de manejo integrado de pragas levem em 88 consideração a disponibilidade de presas/hospedeiros para a sobrevivência de populações de predadores e parasitóides em agroecossistemas. Mesmo inseticidas altamente seletivos são de pouca utilidade em situações onde ocorre a eliminação da presa/hospedeiro, provocando a extinção local de predadores e parasitóides e obrigando essas espécies a emigrar por falta de alimento ou substrato para a oviposição. Testes de seletividade fisiológica somente serão úteis se acompanhados por pesquisas de campo que identifiquem níveis de dano econômico e que possibilitem a manutenção de populações-estoque das espécies fitófagas para a alimentação e reprodução de predadores e parasitóides. atributos aos inimigos naturais_______ Muitas características biológicas dos inimigos naturais podem afetar sua suscetibilidade a inseticidas, como, por exemplo, a idade, o sexo, o tamanho e, principalmente, seu estágio de desenvolvimento. Este último é particularmente importante, pois permite explorar possíveis diferenças na suscetibilidade em relação aos diferentes estágios de desenvolvimento de pragas e inimigos naturais. Croft (1990), citado por Foerster (2002) apresenta, por meio dos resultados globais do banco de dados SELCTV, as principais conclusões sobre a relação entre seletividade e estágio de desenvolvimento de predadores e parasitóides; adultos dos dois grupos são particularmente suscetíveis a inseticidas, assim como larvas de dípteros e neurópteros predadores. Ovos e pupas, por outro lado, são os estágios de parasitóides e predadores mais tolerantes a inseticidas, mesmo quando expostos diretamente aos produtos. A maior tolerância demonstrada por determinado estágio pode advir de fatores fisiológicos ou de características comportamentais; por exemplo, um endoparasitóide pode estar associado a um estágio do hospedeiro fisiologicamente tolerante a inseticidas ou o estágio do parasitóide ser imune à penetração cuticular do inseticida, como em ovos e pupas. Parasitóides de ovos ocorrem exclusivamente na ordem Hymenoptera e são particularmente efetivos na regulação de populações de insetos- praga. Seu potencial de utilização se torna maior à medida que as pesquisas avançam no sentido de sua criação massal, especialmente quanto à possibilidade de sua produção in vitro. Além disso, parasitóides de ovos são 89 menos específicos do que parasitóides de outros estágios, o que possibilita sua criação em hospedeiros alternativos, facilitando ou barateando sua produção. Sob o ponto devista de tolerância a inseticidas, parasitóides de ovos mostram-se particularmente promissores, uma vez que todos os estágios imaturos desses parasitóides se desenvolvem sob a proteção do córion do ovo hospedeiro. Além disso, esses parasitóides são altamente efetivos, pois impedem a eclosão do hospedeiro antes que qualquer dano seja causado à planta. Parasitóides de ovos independem da sobrevivência do hospedeiro, diferentemente de insetos que parasitam larvas/ninfas e adultos, nos quais a morte do hospedeiro, mesmo que provocada por inseticidas seletivos, resulta também na morte do parasitóide. O córion representa uma barreira à penetração de muitos inseticidas, impedindo o contato do parasitóide com o inseticida. A crescente utilização de parasitóides de ovos para o controle de insetos-praga agrícolas tem sido acompanhada por um aumento proporcional nas pesquisas sobre seletividade, principalmente com parasitóides das famílias Trichogrammatidae e Scelionidae. Os métodos para a avaliação dos efeitos de inseticidas a parasitóides de ovos incluem: (1) a exposição de adultos a resíduos aplicados nas plantas ou sobre superfícies de vidro; (2) o tratamento de ovos parasitados por pulverização ou imersão; (3) a aplicação sobre ovos não parasitados que são posteriormente oferecidos às fêmeas do parasitóide; e (4) a avaliação da capacidade de parasitismo de fêmeas emergidas de ovos tratados com inseticidas. Os resultados demonstram que adultos de parasitóides de ovos são altamente suscetíveis a inseticidas neurotóxicos, mas pouco afetados por inibidores do crescimento ou por Bacillus thuringiensis. Os estágios imaturos, por outro lado, costumam ser afetados por inibidores do crescimento, porém são mais resistentes a muitos inseticidas neurotóxicos. No entanto, três fatores podem atuar sobre a posterior emergência dos adultos: a idade do parasitóide no momento da aplicação, a localização dos ovos parasitados na planta e o sexo do parasitóide. A suscetibilidade em função da idade do parasitóide ou de seu estágio de desenvolvimento por ocasião da aplicação tem apresentado resultados inconsistentes, possivelmente por causa da espécie do parasitóide e do poder residual de cada inseticida. A maior suscetibilidade dos estágios mais avançados desse parasitóide é atribuída 90 à maior quantidade de resíduo presente nos ovos tratados próximo à emergência dos adultos. A localização das posturas na planta também apresenta efeito significativo, com maior emergência de adultos sendo obtida de posturas localizadas na parte inferior da planta, onde a folhagem oferece maior proteção contra o impacto direto dos inseticidas sobre os ovos. A influência do sexo do parasitóide em relação a inseticidas indica que fêmeas de T. basalis são significativamente menos suscetíveis do que machos. Além dos fatores apresentados, a seletividade aos estágios imaturos depende das propriedades intrínsecas de cada inseticida quanto a sua toxicidade, persistência e dosagem utilizada. Assim, permetrina é apontada como altamente seletiva aos estágios imaturos de parasitóides de ovos, enquanto clorpirifós é considerado altamente tóxico, independentemente do estágio de desenvolvimento do parasitóide. Metil paration e metomil, entretanto, devido a seu curto poder residual, têm forte efeito inicial, o qual diminui no intervalo de poucas horas ou dias. A persistência dos resíduos nas plantas, todavia, depende da dosagem aplicada; metomil na dosagem de 0,5 kg i.a./ha afetou a emergência de adultos e a capacidade de parasitismo de Trichogramma nubilale por até 21 dias após a aplicação, enquanto na dosagem de 0,1 kg i.a./ha seu efeito residual cessou após sete dias. Desses resultados, ficam evidentes três tipos de respostas do parasitóide em relação aos inseticidas utilizados: (1) os inseticidas formulados como soluções não aquosas concentradas (metamidofós, monocrotofós e triclorfon) foram nitidamente menos tóxicos, independentemente do estágio de desenvolvimento do parasitóide por ocasião da aplicação, do que os inseticidas concentrados emulsionáveis (betaciflutrina, clorpirifós, lambdacialotrina e metil paration) ou solúveis (carbaril); (2) os inseticidas betaciflutrina e carbaril mostraram uma relação entre o estágio de desenvolvimento do parasitóide e a porcentagem de adultos emergidos; quanto mais avançado o desenvolvimento, menor a porcentagem de emergência; e (3) os tratamentos com clorpirifós e lambadacialotrina não foram seletivos, independentemente do estágio de desenvolvimento de T. basalis no momento da aplicação. Nos tratamentos com carbaril e clopirifós, uma proporção acentuada dos ovos chegou a ser parasitada, tendo ocorrido o desenvolvimento dos estágios imaturos, indicado pela 91 coloração escura dos ovos, sem que houvesse a emergência dos adultos. O efeito de alguns desses inseticidas sobre os adultos do parasitóide, quando ingeridos com o alimento, mostra que todos os inseticidas neurotóxicos, inclusive aqueles que se mostraram seletivos aos estágios imaturos, são extremamente tóxicos a adultos de T. basalis, conseqüentemente inviabilizando ou reduzindo drasticamente sua capacidade de oviposição. Inibidores do crescimento, entretanto, não afetaram a sobrevivência e a capacidade de parasitismo dos adultos, quando ingeridos com o alimento. Portanto, com relação a esse parasitóide e, provavelmente à maioria dos parasitóides de ovos, a seletividade no campo é maximizada por meio do uso de inseticidas de curta persistência e fisiologicamente seletivos aos estágios imaturos e que tenham sua ação cessada ou ao menos reduzida por ocasião da emergência dos adultos. 92 SUGESTÃO DE LEITURA Berti Filho, E. Ciociola, A.I. Parasitóides ou predadores? Vantagens e Desvantagens. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Foerster, L.A. Seletividade de inseticidas a predadores e parasitóides. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. Pereira, A.I.A.; Coelho, R.R.; Ramalho, F.S.; Zanuncio, J.C. Efeito hormético de doses subletais de gamma cyhalothrin na reprodução de Podisus nigrispinus (Dallas)(Heteroptera: Pentatomidae), predador do curuquerê-do-algodoeiro. In: IV Congresso Brasileiro de Algodão, 2003, Goiânia. Anais do IV Congresso Brasileiro de Algodão. 2003. 93 CONTROL BIOLÓGICO E MANEJO INTEGRADO DE PRAGAS APRESENTAÇÃO O manejo integrado de pragas (MIP) pode ser convenientemente empregado em agroecossistemas e dentre uma das táticas do manejo, encontra-se o controle biológico. Com referência à luta contra as pragas agrícolas, iremos relatar o que tem sido feito e o que ainda é necessário fazer em termos de aplicação prática do controle biológico em programas de MIP. Apesar de ser um assuntocomplexo, e com carência de pesquisas a serem desenvolvidas aqui no Brasil, esta interação já conta muitas vantagens práticas no que diz respeito ao controle de pragas agrícolas. 6 94 1 – INTRODUÇÃO O controle de pragas, principalmente após a descoberta dos inseticidas sintéticos, a partir da Segunda Guerra Mundial, foi baseado quase exclusivamente nesses produtos. Durante muitos anos, a aplicação de agroquímicos na lavoura visava um ou mais insetos, independentemente de serem ou não pragas. Durante a década de 50, os trabalhos científicos sobre o controle de pragas basicamente tratavam de defensivos, principalmente clorados, como o BHC e o DDT. Esses produtos, aliás, eram considerados muito seguros e propiciaram controle eficiente de várias pragas das lavouras. Na verdade, os inseticidas químicos ofereciam a melhor resposta para o controle das pragas. Entretanto, com o uso indiscriminado dos pesticidas químicos, começaram a surgir problemas anteriormente não imaginados pelo homem: alguns insetos passaram a mostrar resistência aos inseticidas e, com isso, mais e mais produtos foram necessários. Talvez o problema mais alarmante seja o que ocorreu em campos de algodão de alguns países com as pragas Helicoverpa zea (Boddie) e Heliothis virescens (Fabricius). Esses insetos desenvolveram resistência e tornaram- se, em pouco tempo, praticamente imunes a todos os inseticidas disponíveis. Além da resistência desenvolvida por diferentes pragas, alguns insetos considerados pragas secundárias, normalmente mantidos em baixo número por inimigos naturais, passaram à categoria de pragas-chave. Em um esforço para controlar tais pragas, foi necessário aumentar as aplicações de produtos altamente tóxicos, como parathion, usando, em certos casos, até 60 aplicações em algodão durante apenas um ano agrícola. Nessas condições, o custo de controle tornou-se tão alto que provocou um colapso na indústria em certas áreas dos EUA. Além desses acontecimentos, com o uso indiscriminado dos defensivos, também passaram a ser observados inúmeros efeitos adversos sobre a qualidade ambiental e sobre a saúde humana. Somente depois de verificar a resistência de pragas ao inseticida DDT e, subseqüentemente, a outros produtos clorados, os pesquisadores começaram a concluir que a dependência unilateral dos inseticidas químicos para o controle de pragas não era a melhor solução ou mesmo a panacéia anteriormente imaginada. Já por volta de 1950, o pensamento geral de muitos pesquisadores era ao respeito do retorno às pesquisas sérias sobre outras técnicas 95 de controle. Nos EUA, por exemplo, tanto as universidades como o Departamento de Agricultura, no início dos anos 60, já estavam profundamente envolvidos com métodos alternativos de controle, especialmente em função das preocupações da sociedade, após a publicação do livro Primavera silenciosa (Rachel Carson, em 1962), e do contínuo desenvolvimento de resistência, por espécies importantes de pragas, às novas classes de inseticidas, tais como os carbamatos e fosforados. Durante esses anos até o início da década de 70, o campo da entomologia atingiu grandes progressos no desenvolvimento de táticas individuais de controle de espécies de importância econômica e mesmo da integração de diferentes estratégias de controle. Controle biológico, resistência de plantas a insetos, patologia de insetos, feromônios, manipulações ecológicas para favorecer predadores e parasitóides, criação massal para liberações inoculativas e inundativas de inimigos naturais, criação massal e esterilização de espécies de pragas, bem como outras técnicas de controle, foram combinados em alguns programas de manejo de pragas. Entretanto, pouca consideração foi dada, durante esse tempo, ao impacto dessas táticas de controle sobre outras áreas, tais como doenças, plantas daninhas e nematóides; em outras palavras, houve pouca preocupação com o sistema agrícola como um todo. O aumento das preocupações com as condições ambientais e com a saúde pública em relação aos problemas causados pelos agroquímicos, especialmente nos países mais desenvolvidos, no início da década de 70, e o contínuo desenvolvimento de resistência dos insetos aos inseticidas levaram os pesquisadores voltados ao assunto a considerar uma base ecológica mais ampla na proteção de plantas e reconhecer que tanto os fatores químicos como os físicos e naturais deveriam ser levados em conta para uso contra as pragas. Um estudo conduzido pela Intersociety Consortium for Plant Protection for Experiment Station Committee on Organization and policy, por exemplo, chegou à conclusão de que os cinco tópicos de pesquisa cruciais na área de entomologia, para o desenvolvimento de programas efetivos de manejo integrado de pragas, eram, em ordem decrescente de importância, os estudos da ecologia e do comportamento de insetos, a determinação e análise do limiar de dano, o controle biológico, a resistência de plantas e o controle químico. 96 No Brasil, a história do controle biológico não difere muito da de outros países. No entanto, vale ressaltar que nos últimos vinte anos houve um grande progresso nas pesquisas, especialmente com a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que, ao longo de todos esses anos, tornou possível o desenvolvimento de profissionais na área de entomologia, vários deles dedicando-se total ou parcialmente a pesquisas sobre controle biológico. Também as universidades têm atuado nesse sentido, especialmente devido ao pionerismo na área de entomologia, culminando com os cursos de pós-graduação em nível de mestrado e, em alguns casos, de doutorado já há muitos anos. Apesar de todos os avanços na área de controle biológico, traduzidos no grande número de trabalhos apresentados em simpósios e congressos nacionais e internacionais, pode ser observado que ainda falta muito trabalho, especialmente em condições de campo. Essa lacuna na pesquisa brasileira, sem dúvida, é o principal entrave atualmente e será o desafio para os pesquisadores interessados em desenvolver programas de manejo integrado de pragas com ênfase no controle biológico. Segundo Stehr (1982), citado por Cruz (2002), para a implantação de programas de manejo utilizando controle biológico, existem linhas básicas a serem seguidas, umas mais importantes que outras, dependendo da cultura ou do local: fazer um estudo completo em relação ao controle biológico antes de tirar uma conclusão sobre sua atuação. O controle biológico é geralmente considerado o mais eficiente em sistemas muito estáveis, tais como florestas, pastagens, pomares e parques; entretanto, ele pode ser efetivo também em cultivos semi- estáveis, tais como alfafa, e se for usado o manejo adequado, mesmo em cultivos anuais, em que o ambiente é continuamente modificado e a diversidade é mínima, ele tem chance de sucesso; conhecer o ciclo de vida, a biologia, a ecologia e a dinâmica populacional dos inimigos naturais, pragas e cultivos, de tal forma que todas as práticas de manejo possam favorecer apenas os inimigos naturais e não as pragas; evitar a perturbação do controle biológico natural pela escolha errada e/ou uso de inseticidas e práticas culturais prejudiciais; 97 determinar e usar níveis de danos econômicos realistas. Parasitóides e predadores não matam 100% de seus hospedeiros ou presas. A aceitação de danos que não afetam o produto final de mercado é uma consideração muito relacionada ao assunto; educar os agricultores é também essencial para qualquer tipo de manipulação intensiva deinimigos naturais. Na realidade, a educação constitui parte fundamental de todo o programa de manejo de pragas, e não somente um componente do controle biológico; evitar a eliminação completa das pragas se forem usados produtos químicos em conjunto com inimigos naturais. Parasitóides e predadores devem possuir algum hospedeiro ou presa para sobreviver; manter a diversidade em áreas de plantas cultivadas e não cultivadas, se necessário, para propiciar abrigos, alimentos e outras necessidades, tanto para os inimigos naturais como para suas presas; aumentar as chances de sucesso no uso de parasitóides e predadores por meio da minimização do número de espécies de pragas que necessitam de controle químico; se um inseticida for necessário para controlar uma ou mais pragas, usar aquele que for mais seletivo de alguma maneira, visando controlar a praga e provocar um efeito mínimo sobre os inimigos naturais. Caso contrário, procurar inimigos naturais tolerantes ou resistentes; ter sempre um conhecimento atualizado das populações das pragas em relação a limiar de dano, nível de dano econômico, taxas de parasitismo e razão predador/presa, de modo que medidas adequadas possam ser tomadas para mantê-Ias favoráveis; considerar que cada cultivo é diferente e as pragas e condições podem variar de uma região para outra, de modo que uma avaliação cuidadosa deve ser feita para cada cultivo e situação; o manejo de populações de uma praga em áreas nativas tem de fazer parte dos esforços do MIP, uma vez que as pragas se movem de tais refúgios para a área cultivada; 98 continuar sempre com as pesquisas, uma vez que novas raças, espécies e técnicas de manejo podem ser descobertas e usadas; levar em conta que o controle biológico não é a resposta para tudo, mas as oportunidades existem para fazer muito mais do que tem sido feito até hoje com muitas pragas. 2 – CONTROLE BIOLÓGICO Todas as espécies de plantas e animais possuem inimigos naturais (parasitas, parasitóides, predadores ou patógenos), os quais atacam em vários estágios de vida. O impacto desses inimigos naturais varia desde um pequeno efeito, temporário, até a eliminação total do hospedeiro ou presa. Embora tenha sido há muito tempo reconhecido, o primeiro exemplo real da manipulação intencional de um inimigo natural da classe Insecta foi a importação da joaninha Rodolia cardinalis (Mulsant) para o controle da cochonilha Icerya purchasi Maskell em citros na Califórnia, EUA. A introdução do inimigo natural teve sucesso imediato e propiciou, como conseqüência, um grande suporte para muitos projetos de controle biológico. Em todo o mundo, cerca de 160 diferentes espécies de pragas sujeitas a tentativas de controle biológico, por meio da importação de inimigos naturais, têm sido parcial, substancial ou completamente controladas. Mais de 170 casos adicionais de sucesso, em diferentes países, vêm ocorrendo, pela transferência de inimigos naturais de países que tiveram sucesso inicial para uma mesma praga. Além disso, inúmeras espécies de inseto com grande potencial para se tornar pragas são mantidas em níveis não econômicos por inimigos naturais nativos. Didaticamente, divide-se o controle biológico em natural e aplicado. O controle natural, também chamado de "balanço da natureza", pode ser definido como a manutenção do número de uma população (ou biomassa) dentro de certos limites inferiores e superiores, por uma ação completa do ambiente, incluindo, necessariamente, um elemento que é induzido pela densidade, ou seja, um elemento regulador, em relação às condições do ambiente e às propriedades da espécie. O controle natural é a ação combinada tanto das condições bióticas como das abióticas do ambiente na manutenção da população de qualquer espécie em um nível característico, porém flutuante. Esse nível possui limites que podem variar de uma área geográfica para outra 99 ou mudar com o tempo na mesma área geográfica, à medida que as condições se alteram. O controle natural afeta em algum grau cada espécie viva. As populações podem estar relativamente livres do controle natural por pequenos intervalos, mas isso não dura muito tempo. A longo prazo, o número de insetos que nascem precisa igualar-se ao daqueles que morrem, pois, se isso não ocorrer, fatalmente haverá escassez do recurso alimentar (geralmente com conseqüências desastrosas tanto para a espécie como para o recurso alimentar) e a espécie será extinta. Isso se aplica também a uma espécie de praga. Quando a combinação de condições lhe é favorável, ocorrem surtos; porém, quando as condições se tornam menos favoráveis, ou quando o ser humano introduz um ou mais fatores de mortalidade (xenobiontes), tais como inseticidas, novos inimigos naturais etc., a população da praga atinge um nível menor. Se esse nível está ou não abaixo do de dano econômico ou se permanece naquela condição é outra questão, embora os inimigos naturais, em muitos casos, tenham o potencial de manter ou ajudar a manter o nível populacional de uma praga abaixo do de dano econômico. O controle biológico, natural ou aplicado, tem várias e distintas vantagens sobre muitos outros tipos de controle, uma vez que é relativamente seguro, permanente e econômico. Uma desvantagem é que ele pode levar muito tempo para ser implementado, em função das pesquisas e de outros esforços iniciais envolvidos no trabalho. Em contraste, os inseticidas químicos são de ação rápida (e de amplo espectro de ação); porém, se o tempo de desenvolvimento para registro for considerado, ele também é longo para o controle químico. A segurança no uso do controle biológico é uma qualidade superior, uma vez que muitos inimigos naturais são específicos ou restritos a poucas espécies próximas. Portanto, é improvável que espécies que não sejam alvos possam ser afetadas, desde que se tenham realizado, com critério, as pesquisas taxonômicas, biológicas e ecológicas para evitar o estabelecimento de um organismo indesejável. O controle biológico é relativamente permanente, pois os inimigos naturais eficientes em geral continuam a ter efeito por vários anos, com pouca ou quase nenhuma assistência do homem, desde que não sofram qualquer interferência. Entretanto, considerando que é quase impossível erradicar uma espécie já estabilizada, é de grande importância que somente inimigos 100 naturais desejáveis sejam liberados. Ocasionalmente, a população de um hospedeiro desenvolve imunidade aos inimigos naturais, pela evolução de uma alta taxa de encapsulação ou por algum outro mecanismo que reduza a eficiência de seus inimigos naturais, o que não tem sido o caso da maioria das populações das pragas. Além disso, os inimigos naturais podem também evoluir de tal modo que a imunidade do hospedeiro não se torna um problema de grande extensão, corno tem sido verificado para a resistência de populações de pragas a inseticidas. O controle biológico é também relativamente econômico, uma vez que, se for eficiente, os inimigos naturais (tanto o nativo como o importado) estarão presentes e pouco precisará ser feito, a não ser evitar práticas que os afetem. O controle biológico baseia-se na premissa de que parasitóides, predadores e patógenos são capazes de manter a população de seus hospedeiros em níveis mais baixos do que se eles estivessem ausentes. Portanto, seu objetivo é manter a população da praga no nível atual, desde que este seja aceitável, ou, caso contrário, reduzi-Ia a um nível mais baixo pela manipulação dos inimigos naturais e do ambiente. À primeira vista, inimigos naturaiscujo efeito se amplia com o aumento da densidade do hospedeiro, ou vice-versa, são os mais desejáveis, uma vez que tendem a diminuir a população quando ela atinge certa densidade (que pode ser ou não uma densidade suficiente para causar danos, dependendo da tolerância à injúria) e reduzir a pressão sobre a praga a níveis mais baixos. Entretanto, o ideal é obter um controle consistente, sem oscilação; desse modo, os inimigos naturais que mantêm seus hospedeiros abaixo do nível de dano são os preferidos. Desta forma, um inimigo natural potencialmente eficiente no campo seria aquele que tivesse: (1) grande capacidade de busca; (2) alta taxa reprodutiva; (3) alto grau de especificidade; (4) boa sincronização com o hospedeiro; e (5) alto grau de adaptabilidade a uma ampla variação de condições ecoclimáticas. Logo, um inimigo natural que tenha esses atributos muito provavelmente não permitiria que o hospedeiro ou presa oscilasse acima do nível de dano econômico. Do ponto de vista do MIP, o inimigo natural que mantém a população da praga abaixo do nível de dano econômico é o ideal, uma vez que nenhum manejo adicional se faz necessário. Como, infelizmente, é difícil 101 encontrar um inimigo natural com essas características para muitas pragas importantes, será preciso, em muitos casos, a integração de duas ou mais técnicas de manejo para manter as pragas em níveis tais que não causem danos econômicos. Mesmo assim, o uso de parasitóides e predadores deve ser prioritário em qualquer programa de manejo. O controle biológico não pode ser visto como uma segunda linha de defesa a ser usada se outros métodos falharem. Fazer uma previsão sobre as reais possibilidades de sucesso do controle biológico é praticamente impossível, pois cada cultivo deve ser considerado em função de um complexo de pragas e de outros fatores que diferem de área para área (Stehr, 1982, citado por Cruz, 2002). Segundo esse autor, a resposta a algumas perguntas-chave pode sugerir que decisão deve ser tomada na implantação de programas de MIP, utilizando o controle biológico como uma das táticas. Quanto de dano é tolerado? A tolerância ao dano talvez seja a consideração fundamental, porque, se pouco ou nenhum dano é tolerado, o controle biológico será invariavelmente limitado. Qual é o valor da cultura? A situação da economia pode também ditar a maneira de resolver um problema. No controle de pragas ou de plantas daninhas de culturas de baixo valor por unidade de área, tais como pastagens, sorgo etc., o controle biológico com a utilização de sistemas auto-regulatórios pode ser o único meio economicamente viável, uma vez que o uso de pesticidas ou de outras técnicas de controle não seria econômico. A cultura é anual ou perene? Historicamente, os maiores sucessos em controle biológico têm ocorrido em culturas que persistem por mais de um ano. Isso não significa, porém, que o controle biológico de pragas em culturas anuais não possa ser utilizado, mas sua implantação será mais difícil, por causa da instabilidade anual dos sistemas agrícolas. Além disso, os cultivos anuais geralmente envolvem espécies de plantas de baixo poder competitivo com as plantas daninhas; logo, ao se eliminarem essas competidoras, eliminam-se também diversidade, abrigo e hospedeiros alternativos para os inimigos naturais, diminuindo a eficiência destes. Do ponto de vista biológico, práticas culturais também afetam, de maneira diversa, os sistemas anuais de cultivo, pela movimentação contínua do solo e 102 pela mudança freqüente da área de plantio para novos locais, a cada ano, a fim de evitar problemas com doenças e pragas. Apesar de poder controlar as pragas, essas práticas, com certeza, controlam também os inimigos naturais que passam o inverno no solo ou nos restos culturais. A praga é nativa ou exótica? A origem da praga deve ser considerada um fator importante, embora o controle biológico possa ser alcançado tanto para a praga nativa como para a exótica. No caso da praga exótica, a estratégia inicial é investigar seus inimigos naturais no local em que se originou; se é nativa, pode-se tentar manejar os inimigos naturais locais, porém sem descartar a possibilidade de importação de exóticos mais eficientes. Em alguns casos, pragas exóticas também têm sido reguladas por inimigos naturais nativos. Portanto, no estudo da origem da praga, todas as opções têm de ser levadas em conta. Qualquer inimigo natural pode propiciar o controle? A resposta a essa pergunta está bastante relacionada ao primeiro fator, isto é, quanto menor for a tolerância ao dano, menor será a probabilidade de encontrar inimigos naturais em condições de propiciar o controle exigido. Pode-se afirmar que cada espécie de praga é atacada por alguns ou vários inimigos; no entanto, é difícil de prever se apenas um ou vários agentes, usados em combinação, podem manter a praga no nível não econômico estabilizado. As possibilidades de manejar inimigos naturais existentes na área ou introduzir outros melhores devem ser cuidadosamente analisadas. Quantas pragas devem ser controladas e que nível de controle é desejado? Obviamente, se as espécies de pragas são numerosas e a tolerância ao dano é baixa, outros meios de controle, como inseticidas, serão provavelmente necessários. Isso pode reduzir as chances de um manejo satisfatório usando apenas o controle biológico, mas não elimina necessariamente seu uso. Significa, na realidade, que o sistema agrícola terá, provavelmente, de ser manejado de forma mais intensiva e cuidadosa, de maneira a favorecer os inimigos naturais potencialmente úteis presentes na área. Existem inseticidas seletivos ou inimigos naturais tolerantes ou resistentes? Deve-se considerar a possibilidade de um inseticida matar uma praga, mas não o inimigo natural que a ataca (ou, igualmente importante, não matar o inimigo natural que controla outra praga). Infelizmente, não há muitos deles, uma vez que a maioria 103 é também tóxica para os parasitóides e predadores. Entretanto, na maior parte dos casos, a seletividade pode ser obtida pela atenção cuidadosa na dose aplicada, época, formulação e outras manipulações, de modo a manter o inseticida longe do inimigo natural (capítulo 3, parte 2, do nosso curso). Um fator igualmente importante é a disponibilidade de inimigos naturais resistentes ou tolerantes aos inseticidas usados para regular uma ou mais pragas onde outras precisam ser controladas por aplicações freqüentes e/ou pesadas de inseticidas. Esses inimigos naturais resistentes a inseticidas ou os genes para resistência podem ser introduzidos em uma população na qual a resistência não tenha sido desenvolvida. O controle biológico tem tido sucesso contra a mesma praga ou pragas ecologicamente semelhantes em outras áreas? O grande número de transferências de inimigos naturais de locais em que se obteve sucesso com o controle biológico atesta a validade da pressuposição de que sucesso semelhante pode ser esperado contra a mesma praga, na mesma cultura, em condições semelhantes. Êxitos no controle de pragas de citros são exemplos clássicos. Fundamentalmente, todas as questões citadas, em maior ou menor grau, devem ser levadas em consideração para se estabelecerem em programas de manejo integrado de pragas em que o controle biológico seja uma tática eficiente e estável. 3. CONSIDERAÇÕES SOBRE O MANEJO O tema controle biológico em sistemas agrícolas de manejo integrado é de grande interesse atual, devido à percepção da urgência em desenvolver e adotar métodos eficientes e seguros para o controle de pragas. Em muitos casos,ou talvez na maioria deles, o controle biológico sozinho não propiciaria um controle de pragas nos sistemas agrícolas economicamente aceitável. Portanto, o controle biológico deve ser desenvolvido e implementado como componente do manejo. O controle biológico e o MIP, juntos ou separadamente, enfrentam sérios obstáculos, que surgiram pela falta de dados biológicos fundamentais e de conhecimentos necessários para o desenvolvimento de sistemas de produção econômicos, porém social e ecologicamente adequados. Os problemas encontrados com o controle biológico possuem três dimensões: 104 desenvolvimento de métodos eficientes e eficazes; expansão e integração do controle biológico dentro do sistema de MIP; proposição de uma visão científica, social, econômica e educacional para sensibilizar a opinião pública sobre as técnicas de MIP envolvendo o controle biológico. Portanto, o desenvolvimento do controle biológico como tática confiável é importante tanto no âmbito científico como no tecnológico. Relativamente poucos trabalhos sobre o uso de agentes de controle biológico em programas de MIP vêm sendo desenvolvidos e adequadamente documentados. Neste sentido, têm sido mais discutidas as possibilidades do que provada sua utilização comercial em larga escala. Apesar do fluxo de mais de 20 milhões de dólares para o desenvolvimento de programas de MIP para alguns cultivos de importância econômica, nos EUA, somente uma pequena parcela foi alocada para desenvolver pesquisas sobre o potencial de uso de inimigos naturais. Fundamentalmente, quando se pensa na utilização de controle biológico, devem-se distinguir os diferentes tipos de sistemas agrícolas. O controle biológico clássico ou mesmo o aumento periódico dos inimigos naturais têm sido historicamente mais efetivos sozinhos em sistemas nos quais, por razões econômicas ou outras, é mínimo o uso em larga escala de inseticidas ou de outras práticas danosas, como queimadas. Sistemas florestais, pastagens ou áreas agrícolas pequenas, onde a utilização de defensivos é evitada em função da demanda de mercados especiais (como lojas de produtos naturais), ou em sistemas nos quais o custo de controle seja proibitivo são exemplos. Além disso, as condições mais promissoras para o controle biológico clássico geralmente incluem cultivos em que a maioria das pragas já está sob controle natural. Por outro lado, a agricultura comercial em larga escala envolvendo cultivos que possuem um complexo de pragas importantes muito provavelmente vai requerer a integração de outros métodos, tais como o químico e o cultural, com o uso de inimigos naturais. O controle biológico efetivo pode, às vezes, ser alcançado e mantido em grandes áreas, apesar do uso de inseticidas; entretanto, em várias outras circunstâncias, os benefícios advindos de agentes de controle biológico, introduzidos ou naturais, podem ser mantidos somente em áreas sem uso ou com uso cuidadoso de inseticidas. Na verdade, a grande questão é como usar 105 da melhor maneira possível os agentes de controle biológico contra uma praga em situações em que os inseticidas químicos são necessários para controlar outras pragas que não possuam inimigos disponíveis em quantidade suficiente. Nesses casos, sempre é útil tentar protegê-Ias, evitando o uso de práticas inadequadas ou mesmo conservando ou aumentando seu número em épocas críticas. Pode-se também pensar no desenvolvimento de raças de inimigos naturais mais tolerantes aos inseticidas. Uma vez que se tenha decidido pelo uso do controle biológico, sua implementação dependerá da conservação e da melhoria dos parasitóides e predadores já disponíveis, por meio da manipulação do ambiente de alguma maneira favorável, da importação e colonização de parasitóides e predadores contra pragas nativas ou exóticas e da eficiência e economicidade da criação massal em laboratório. O número e a variedade de fatores passíveis de manejo são quase ilimitados e muitos podem ser empregados para manejar as pragas de um único cultivo; no entanto, tem-se tornado cada vez mais evidente que a chave para qualquer um deles está no conhecimento completo do ambiente físico e biótico, da sistemática, biologia, ecologia, comportamento, genética etc. tanto das pragas como de seus inimigos naturais e das plantas ou animais atacados. Há, no entanto, um pré- requisito fundamental a ser levantado antes mesmo de estimar o valor potencial de qualquer um dos fatores: o estabelecimento realista do nível de dano econômico ou limiar de dano. 3.1. NÍVEL DE DANO ECONÔMICO, LIMIAR DE DANO E CONTROLE BIOLÓGICO O controle biológico tem o mesmo objetivo fundamental de qualquer outra medida de controle: evitar ou minimizar perdas econômicas. Entretanto, se ele deve ou não ser tentado é uma questão que depende do uso realista dos níveis de danos econômicos. O nível de dano econômico tem sido definido como a menor população da praga que causa dano econômico, enquanto limiar de dano é uma população ainda menor com relação à qual algum tipo de ação deve ser tomado, para evitar que a praga atinja o nível de dano econômico. Ambos são importantes no manejo de parasitóides e predadores, embora a primeira preocupação em controle biológico deva ser a adoção de níveis de danos econômicos realísticos que permitam o 106 uso efetivo de parasitóides e predadores. Stern (1973), citado por Cruz (2002), revisou os conceitos de limiar de dano e nível de dano econômico em relação à necessidade de tratamento (geralmente com inseticidas químicos) para a proteção de plantas. O autor concluiu que, com algumas exceções, existe pouca informação disponível relacionando rendimento de cada cultivo e densidade da praga, e essa falta de conhecimento tem levado a freqüentes julgamentos errados e a aplicações de medidas de controle desnecessárias. Algum progresso vem sendo alcançado, mas a resistência à mudança é muito grande e, além do mais, envolve modificações de atitude desde o produtor rural até o consumidor. Parasitóides e predadores, pela própria natureza, não podem evitar todo o dano provocado pelo inseto, uma vez que suas relações com a praga tendem a evoluir para o ponto em que ambos sobrevivam e o hospedeiro não seja reduzido a zero. Portanto, se não for aceita qualquer intensidade de dano (o que é irreal, mas ocorre em alguns casos), na maioria das situações o controle biológico raramente poderá ser empregado. A não tolerância ao dano significa que a densidade da praga deve ser mantida em níveis baixos. Significa também que se deve manter a praga abaixo de sua densidade de equilíbrio característica, o que, freqüentemente, só tem sido conseguido pelo uso de inseticidas. A tolerância ao dano causado por uma praga muitas vezes está relacionada à parte atacada do hospedeiro. Nesse caso, é interessante pensar nos danos direto e indireto. Dano direto é aquele provocado às partes da planta consumidas, como no caso de uma maçã, por exemplo. Dano indireto é aquele que afeta partes da planta não consumidas diretamente, como, por exempio, os causados por cochonilhas, pulgões ou ácaros sugadores de seiva. Algum dano ou mesmo uma grande quantidade de danos indiretos podem ser tolerados, mas não os danos diretos, em função de leis governamentais ou mesmo de atitudes do consumidor ou processador quanto à qualidade cosmética, com pouca ou nenhuma relação com valores nutricionais. É óbvio que, se a tolerância ao dano ou à presença do inseto ou de seus fragmentos for zero, fazendo com que o produto seja rejeitado ou.seu preço de venda substancialmente reduzido, o controleem âmbitos ecológicos, o termo predador pode abranger vários tipos de organismos que obtêm seus recursos pelo consumo de outros organismos vivos. Segundo Townsend et al., (2006) nem todos os predadores são necessariamente grandes, agressivos ou instantaneamente letais. Esses mesmos autores definem um predador como qualquer organismo vivo que consome todo ou parte de outro organismo vivo, no caso, sua presa ou hospedeiro, beneficiando-se dessa fonte de alimento e reduzindo, de maneira direta ou indireta, o crescimento, a fecundidade ou a sobrevivência de sua presa. Devido a finalidades didáticas e por conveniência temos três tipos de predadores: os predadores verdadeiros, os pastejadores e os parasitos. Predadores verdadeiros matam, invariavelmente, suas presas e o fazem imediatamente após atacá-las e podem consumir diversos itens de presas no curso de suas vidas. Exemplos: leão, 11 tigre, urso pardo, águia, aranhas, percevejos predadores, baleias de barbatana que filtram o plâncton do mar, aves, roedores e formigas que consomem sementes, plantas carnívoras e etc. Os pastejadores, ou também denominados de herbívoros, podem também atacar diversos itens de presas no curso de suas vidas, mas consomem somente parte de cada item da presa. Geralmente, não matam suas presas, especialmente em curto prazo. Como exemplos temos bovinos, ovinos, gafanhotos, lagartas desfolhadoras que se movem de planta para planta, sanguessugas hematófagas e etc. Já os parasitos possuem características peculiares pelo fato de atacarem um ou poucos itens de sua presa no curso de suas vidas, com as quais eles, por isso, geralmente formam uma associação relativamente íntima. Como características peculiares aos demais, os parasitas também consomem somente parte de cada item da presa (geralmente denominado de hospedeiro) e também não matam suas presas especialmente a curto prazo. Como exemplos temos: os parasitos de animais e patógenos (as tênias e a bactéria da tuberculose, por exemplo), fitopatógenos como por exemplo o vírus do mosaico do fumo, plantas parasitas e etc. Os afídeos que extraem seiva de uma ou muito poucas plantas, com as quais desenvolvem uma associação estreita, e mesmo lagartas, que passam toda a sua curta vida em uma única planta hospedeira são também parasitos de fato. Os termos microparasitos e macroparasitos foram, certamente, criados para facilitar o entendimento a cerca da abrangência do grupo parasitas. Apesar da dificuldade quanto à interpretação de alguns desses grupos de predadores acima relatados, a mensagem interessante é que nem todos os organismos que conhecemos se adequam claramente ou perfeitamente a somente uma categoria. Só para “esquentar” a discussão e polêmica sobre o tema, citemos o exemplo dos parasitóides. De maneira geral, esses consomem por dentro as larvas dos insetos hospedeiros, tendo sido lá depositados pelas mães sob a forma de ovo. Dessa forma, eles não se ajustam à categoria de parasita nem à de predador verdadeiro o que confirma a impossibilidade de se estabelecer limites claros entre as categorias de predadores citados. Dependendo da área de estudo, esses termos podem (ou não) ser empregados com o objetivo de relacionar organismos com funções ecológicas estabelecidas. Por exemplo, na área de controle biológico, através do uso de artrópodes, empregam-se os 12 termos predadores (referindo-se aos predadores verdadeiros), herbívoros (referindo-se aos pastejadores, que na sua grande maioria constituem-se por pragas agrícolas), parasitas (referindo-se muitas vezes aos fungos entomopatogênicos e outros parasitas, como nematóides) e parasitóides (que também são chamados de parasitas em alguns livros, principalmente estrangeiros, sobre esse tipo de controle biológico) e etc. A partir de agora abordaremos alguns aspectos ecológicos que são de fundamental importância para o entendimento do processo de predação como, por exemplo, o efeito subletal da predação. O termo subletal remete-nos a algo que não seria totalmente danoso a um determinado organismo sob baixa dose (ou quantidade). De maneira geral, herbívoros e parasitos exercem seus danos não pela morte imediata da presa, como os predadores verdadeiros o fazem, mas sim tornando-as mais vulneráveis para alguma outra fonte de mortalidade. Como exemplo, temos o caso do Cosmopolites sordidus (Germar) (Coleoptera: Curculionidae) que é uma severa praga da bananeira (Gold et al., 2001) e que, como os curculionídeos em geral, broqueiam (abrem galerias) o pseudocaule da planta para alimentar-se e colocar seus ovos. A partir dessa injúria física na planta, patógenos oportunistas que, geralmente, vivem em associação com esse besouro, penetram de maneira facilitada no tecido vegetal, consumindo-o e provocando danos. Dessa forma, relata-se que o C. sordidus provoca danos diretos e indiretos nas plantas de bananeira, por alimentar-se do pseudocaule e por “abrir as portas” para o estabelecimento de patógenos, respectivamente, que não estariam presentes se o dano iniciado pelo besouro não tivesse acontecido. Ou seja, o ataque do C. sordidus, em alguns casos, não mata a planta por si, porém, a morte da planta pode ser agravada pelo seu ataque que proporcionou a entrada de outros agentes de mortalidade natural. E isso é efeito subletal da predação. Na prática esse efeito é difícil de ser quantificado, não só para o caso das bananas, sendo que muitos autores denominam que a associação de ambos (o predador e o parasita) provocaram a morte do organismo. Agora, imaginemos uma população de presas na qual 90% dos seus indivíduos tenham sido predados. Entretanto, em pouco tempo, as presas remanescentes originaram três vezes mais indivíduos do que na condição anterior. Nesse caso, pasmem, a predação aumentou a população de 13 presas. “Em outras palavras, embora a predação seja ruim para a presa que é comida, pode ser boa para aqueles que não são” (Townsend et al., 2006). Essa situação pode acontecer claramente na natureza e é uma das premissas básicas sobre a flutuação populacional existente entre presas e predadores. Ou seja, antes da predação a população de presas encontrava-se sob um alto nível. A competição intra-específica nesse caso poderia levar à escassez de recursos, certamente. Entretanto, após a predação de 90% dos indivíduos, o que ocorreu foi que os indivíduos sobreviventes depararam-se com um nível alto de recursos alimentares e poucos indivíduos para competir (apenas 10%). Dessa forma, a tendência dessa população que escapou da predação seria aumentar seu contingente populacional caso ocorresse duas alternativas: (1) algum agente de mortalidade natural tivesse atuado sobre a população dos seus predadores ou (2) a fonte de recursos alimentares tivesse aumentado em abundância, após um mês de chuvas, por exemplo. Nota-se claramente que tal efeito é altamente dependente de fatores bióticos e abióticos para acontecer, mas uma combinação de resultados poderá certamente levar ao paradoxo do aumento populacional da presa em detrimento da predação. No caso anterior, os predadores “ajudaram” as presas a expandir sua população. Além disso, há casos em que os predadores praticamente não interferem em absolutamente nada sobre a população de suas presas. Ou seja, dependendo do tipo de presa consumida, a sua população pode continuar a crescer sem interrupções. Muitos carnívoros de grande porte, por exemplo, concentram seus ataques sobre os velhos (ou débeis), jovens (ou inexperientes) ou até mesmo doentes. Por exemplo, guepardos e cães selvagens podem matar um número bem maior de gazelas pertencentes às classesbiológico não será apropriado. Há também a possibilidade de um controle biológico, apesar de eficaz, não ser suficiente se o produto for contaminado pelos insetos benéficos, 107 pois as leis não fazem distinção entre contaminações por pragas e por seus inimigos naturais. Portanto, quanto maior a tolerância à injúria ou aos fragmentos de insetos, melhores são as perspectivas de atingir algum grau de controle biológico. Isso não significa que o controle biológico não possa ter sucesso contra pragas que causam danos diretos, mas simplesmente que as chances do controle não químico contra qualquer praga são maiores quando se aceita a tolerância a algum tipo de dano. O estabelecimento realista de nível de dano econômico é um dos problemas mais difíceis de serem resolvidos no manejo de pragas, por causa das complexas interações entre a severidade de uma infestação da praga e o clima local, a estação, o vigor, a variedade e a idade da planta quando atacada, práticas culturais, mudanças nas condições econômicas, etc. Essas interações complexas tornam necessário o uso de níveis de danos econômicos e limiar de danos dinâmicos que mudarão à medida que as condições mudarem. Essa é, talvez, a principal razão pela qual o limiar de dano ou o nível de dano econômico não tenham sido determinados ou usados para a maioria das culturas - além da difícil determinação, necessitam ajustamentos ao longo da safra. Apesar das dificuldades inerentes, é importante que eles sejam determinados quando se pretende avaliar as chances de sucesso do controle biológico. Se o nível de dano econômico é relativamente alto, a amplitude das opções de controle é muito maior do que se ele fosse baixo ou nulo. 3.2. CONSERVAÇÃO E MELHORIA Importação e colonização, produção massal e liberação, além da conservação dos agentes de controle biológico e da melhoria de seu desempenho, são fatores importantes em programas de manejo de pragas. Entretanto, a conservação e a melhoria de inimigos naturais devem estar em primeiro lugar em cada programa, uma vez que, se esses dois fatores forem adequadamente estabelecidos, a necessidade de outras medidas de controle pode ser reduzida ou mesmo eliminada para algumas pragas. Conservação e melhoria são diferentes elos de uma mesma corrente; a primeira visa evitar o uso de medidas que destruam os inimigos naturais e a segunda, o uso de medidas para aumentar sua longevidade e reprodução ou a atratividade de uma área aos inimigos naturais. Em função da grande variação de clima, cultivos, pragas, 108 inimigos naturais e pesticidas, cada problema, real ou potencial, precisa ser examinado individualmente. Algumas medidas para a conservação e a melhoria têm sido empregadas com relativo sucesso ou mesmo merecido consideração por parte da pesquisa, tais como uso racional de agroquímicos com ênfase aos produtos seletivos aos agentes de controle, utilização de inimigos naturais tolerantes ou resistentes aos inseticidas e preservação de estágios inativos. 3.3. USO RACIONAL DE AGROQUÍMICOS São inúmeros os exemplos de surtos de pragas secundárias em função da eliminação de seus inimigos naturais pelo mau uso de produtos químicos. Diferentes tipos e formulações de materiais inorgânicos e orgânicos podem provocar, em maior ou menor grau, efeitos adversos sobre predadores e parasitóides. Ajustes nos esquemas de pulverizações podem manter as populações dos inimigos naturais em equilíbrio com a praga. A mais ampla interferência nos inimigos naturais tenha sido a eliminação de ácaros predadores pelo uso de vários pesticidas para o controle de ácaros fitófagos e de outras pragas da classe Insecta. Como conseqüência, muitos ácaros fitófagos, que sempre foram considerados pragas de importância secundária, passaram à condição de pragas-chave. A situação foi também agravada pelo rápido desenvolvimento de resistência aos inseticidas. A utilização de um inseticida em um sistema agrícola visando, ao mesmo tempo, o controle de pragas e a preservação de inimigos naturais é complexa. Geralmente, os pesquisadores que trabalham com controle biológico clássico são os mesmos que avaliam os inseticidas a serem usados na mesma cultura. Os preceitos modernos do MIP exigem que se considerem simultaneamente as pragas, os inimigos naturais e todas as práticas culturais a serem empregadas. Portanto, é essencial a evolução das pesquisas com produtos químicos, tanto para desenvolver a seletividade inerente ao produto como para conseguir a seletividade ecológica, por meio de métodos corretos de aplicação. 3.4. INIMIGOS NATURAIS RESISTENTES OU TOLERANTES Como existem vários casos comprovados de resistência de pragas a diferentes inseticidas, não há razão 109 alguma para pensar que os parasitóides ou predadores não possam desenvolver resistência aos pesticidas. Entretanto, nesse caso a situação é mais complexa; os pesticidas têm como alvo principal a praga e não o inimigo natural e, portanto, a pressão de seleção sobre este não é geralmente tão grande, embora seja o suficiente para romper o controle biológico. Além do mais, é quase impossível obter genótipos resistentes de inimigos naturais quando os pesticidas são altamente efetivos, pois normalmente diminuem tanto a sobrevivência do hospedeiro ou presa que é impossível a sobrevivência dos inimigos naturais. Por outro lado, quando a praga desenvolve resistência a um inseticida, este não é mais utilizado, eliminando, dessa maneira, a pressão seletiva sobre os inimigos naturais no momento em que uma presa se torna abundante o suficiente para suportá-los. A maioria dos casos de resistência de inimigos naturais diz respeito a predadores, talvez devido à menor capacidade de dispersão em relação aos parasitóides, que, portanto, ficam mais expostos à pressão de seleção. Embora exista sempre a possibilidade de desenvolver inimigos naturais resistentes, deve-se ter em mente que é mais simples, em primeiro lugar, evitar a necessidade de tal agente de controle biológico, utilizando práticas que não os eliminem. Entretanto, quando a tolerância ao dano for pequena ou não existir e os inseticidas forem freqüentemente utilizados, o desenvolvimento e/ou a detecção e uso de predadores e parasitóides resistentes podem se tornar uma alternativa cada vez mais importante para o sucesso de programas de manejo de pragas no futuro. Pode-se, também, pensar na seleção de inimigos naturais resistentes que sejam mais aptos para controlar uma praga sob programas de pulverização usados para outras, uma vez que diferentes inimigos naturais que atuam sobre a mesma espécie de praga têm mostrado resistência a diferentes inseticidas. 3.5. PRÁTICAS CULTURAIS O controle cultural é conceituado como a alteração deliberada do agroecossistema para reduzir a população de uma praga ou seus danos à planta. Algumas práticas culturais costumam ser parte valiosa do manejo de pragas, mas outras, tais como aração, gradagem, subsolagem, queima de restos culturais etc., podem ser igualmente prejudiciais aos inimigos naturais. Os efeitos de tais operações 110 sobre os agentes de controle biológico devem ser totalmente avaliados para eliminar ou modificar aqueles prejudiciais. Por exemplo, nos desertos irrigados da Califórnia, EUA, onde a taxa de sobrevivência de muitos inimigos naturais fora da área irrigada é muito baixa em qualquer época do ano, o corte de alfafa por faixa e a prática de não cortar o campo todo de uma vez têm resultado em uma sobrevivência muito maior dos inimigos naturais e dos hospedeiros necessários para mantê-Ios vivos.Alguns métodos de controle cultural se operam pela ação benéfica de inimigos naturais. Por outro lado, métodos de controle biológico de sucesso requerem uma alteração nas práticas culturais convencionais. Em resumo, controle cultural e controle biológico podem ser econômicos e ecologicamente desejáveis; são também meios de reduzir os danos das pragas aos cultivos. O agroecossistema pode ser modificado de várias maneiras para melhorar os benefícios advindos dos organismos de controle biológico. Por exemplo, é possível melhorar o desempenho dos inimigos naturais dando-lhes condições adequadas de hábitat, o que pode ser feito tanto pela alocação na área desses hábitats como pela modificação das condições locais, para tornar mais propícias as condições para sua colonização e aumento populacional. Entre tais práticas culturais, tem-se demonstrado o efeito da manutenção da diversidade de plantas hospedeiras como alternativa para o fornecimento de abrigo e alimentos naturais, como néctar, pólen, honeydew, entre outros. Tais plantas hospedeiras podem ser silvestres. ou mesmo daninhas. Em sistemas naturais nativos e "maduros", geralmente há uma relação geral entre diversidade e estabilidade; já nos agroecossistemas, que não são nem "maduros" nem naturais, as mesmas relações podem não ocorrer. Desta forma, a diversidade estrutural e espacial pode ser desejável, o que nem sempre acontece, no entanto, com a diversidade de espécies, porque, em função da instabilidade dos agroecossistemas, as espécies de pragas também são poucas e instáveis; logo, a diversidade de inimigos naturais (que supostamente promoveria estabilidade) não é necessariamente a melhor solução em uma situação instável. A manutenção de plantas daninhas e de outra diversidade floral em áreas externas ao cultivo comercial, mas dentro do agroecossistema, deve ser encorajada até que se tenha certeza de 111 que seus benefícios possam ser obtidos por diversidade ou outras medidas planejadas. A disponibilidade na época e local corretos do estágio ou estágios apropriados do hospedeiro é essencial para garantir a sobrevivência de inimigos naturais durante todo o ano. Muitas vezes, essa disponibilidade é obtida por meio de hospedeiros alternativos, pelo plantio de diferentes cultivos próximos à área comercial e até mesmo deixando algumas plantas daninhas na área. Por exemplo, foi demonstrado que a eficiência do parasitóidede ovos Anagrus epos (Girault), um inimigo natural importante de Herythroneura elegantula Osborn, em vinhedos da Califórnia, estava ligada à presença de uma planta selvagem, Rubus spp., próxima aos vinhedos (Doutt & Nakata, 1973, citado por Cruz, 2002); os arbustos dessa planta suportavam populações não econômicas da cigarrinha Dikrella cruentata (Gillette), que se multiplicavam e propiciavam ovos para A. epos durante todo o ano. Constatou-se, ainda, que os indivíduos de A. epos eram eliminados durante o inverno, em vinhedos instalados bem longe dos arbustos nativos, porque seu outro hospedeiro, E. elegantula, entrava em diapausa e não produzia os ovos necessários para a multiplicação contínua de A. epos, que não entra em diapausa. Como regra geral, os predadores requerem alimentação no estágio adulto para que possam colocar ovos. As presas do predador adulto não são sempre as mesmas espécies do predador imaturo. Tampouco alguns são predadores no estágio adulto e, portanto, precisam obter outros alimentos, como néctar, pólen ou honeydew, antes de ovipositar e reproduzir. Esses alimentos para os adultos podem não estar disponíveis dentro da área de cultivo ou mesmo nas proximidades. Alguns parasitóides, especialmente das ordens Hymenoptera e Díptera, também dependem de outros alimentos que não sejam seus hospedeiros antes de se tornarem reprodutivamente ativos. Geralmente, as monoculturas, juntamente com a falta de algumas plantas daninhas, freqüentemente eliminam o alimento necessário para o adulto, mesmo que a presa ou hospedeiro das formas imaturas estejam presentes. Por exemplo, a disponibilidade de pólen em pomares de abacate, na Califórnia, mesmo quando suas presas estavam ausentes, foi fundamental para manter a abundância do ácaro predador Amblyseius hibisci (Chant) (McMurtry 112 & Johnson, 1964, citado por Cruz, 2002). A presença de flores produzindo néctar em pomares de maçã sem pulverização foi responsável por um parasitismo muito maior em ovos e pupas de uma espécie de Lepidoptera em Ontário, Canadá, quando em comparação com pomares contendo poucas dessas flores. O desenvolvimento e uso de variedades que sejam boas produtoras de alimentos para inimigos naturais é uma opção que tem sido pouco considerada por entomologistas e melhoristas. Na Carolina do Norte, EUA, reduções substanciais de Manduca sexta Linnaeus foram obtidas pela predação de Polistes,após a colocação de locais para construção de ninhos próximos às margens da lavoura. O controle de plantas daninhas por meio de repetidas passagens de cultivadores aumenta substancialmente a quantidade de pó depositada sobre a vegetação, diminuindo drasticamente a eficiência de alguns inimigos naturais, porém com pouca influência sobre seus hospedeiros. Época e densidade de plantio, espaçamento e adubação também podem ser manuseados para favorecer determinados agentes de controle biológico, como foi discutido no nosso capítulo1. 3.6. SUPLEMENTOS ALIMENTARES ARTIFICIAIS As dietas artificiais usadas para manipular inimigos naturais variam desde uma simples solução açucarada até alimentos nutricionalmente completos. A complexidade da dieta depende da biologia do predador ou parasitóide a ser manipulado e de se o objetivo é mantê-los na área ou na planta, atraí-los para determinado alvo ou mesmo estimulá-Ios para a produção de ovos. Alguns dos alimentos usados podem, inclusive, induzir todas essas respostas em certos predadores. Em cultivos onde os inimigos naturais estão presentes, mas que provavelmente irão se dispersar ou passar fome porque a população da presa está em nível muito baixo, é necessário aplicar um suplemento alimentar artificial para mantê-los até que a população de sua presa ou hospedeiro comece a crescer. A simples pulverização com soluções de açúcar ou melaço, em várias plantas, tem sido suficiente para rnanter na área alguns predadores. A pulverização com urna solução de sacarose a 10%, em plantas de milho, resultou no aumento de adultos de joaninhas, ovos e adultos de crisopídeos e, conseqüentemente, aumentou a eficiência do controle do pulgão Rhopalosiphum maidis no 113 campo. Como por exemplo, nem coccinelídeos nem crisopídeos são atraídos pela sacarose. Todavia, entrando em contato com ela por acaso, durante a busca do alimento natural, ocorre a agregação dos insetos. 3.7. REDUÇÃO DE INSETOS INDESEJÁVEIS O controle biológico do pulgão Chromaphis juglandicola (Kaltenbach) por um ecotipo diferente de Trioxys pallidus (Haliday) importado do Irã estava sendo ameaçado em algumas áreas da Califórnia, porque a formiga argentina, Iridomyrrmex humilis (Mayr), tinha preferência por predar pulgões parasitados, em vez de insetos sadios. Também é bastante conhecida a proteção de espécies de cochonilhas e pulgões, entre outros, por formigas que se alimentam de honeydew, o que pode tornar o controle biológico ineficiente. 3.8. USO DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS MODIFICADORAS DO COMPORTAMENTO. As substâncias químicas produzidas tanto pela planta como pelos insetos podem ser utilizadas com vantagem para melhorar o desempenho dos inimigos naturais. Os semioquímicos, por possuírem atividadebiológica potente e por serem em geral altamente específicos na natureza, são de grande potencial para uso como ferramenta em MIP, sendo empregados, inclusive, para melhorar o desempenho dos inimigos naturais, como já demonstrado, por exemplo, no primeiro capítulo do nosso curso. Sabe-se que as plantas produzem substâncias químicas que podem tanto inibir o crescimento e o desenvolvimento de outras plantas quanto atrair, repelir ou estimular a alimentação e oviposição por insetos herbívoros, assim como atrair ou estimular as atividades de inimigos naturais das pragas. Tais interações são denominadas tritróficas (envolvem 03 níveis tróficos da cadeia alimentar). Por outro lado, os insetos fitófagos produzem semioquímicos que influenciam outros membros da mesma espécie, outras espécies fitófagas, espécies de inimigos naturais e hiperparasitóides. De maneira análoga, os inimigos naturais produzem semioquímicos que influenciam outros parasitóides e predadores e mesmo hiperparasitóides. Existem casos em que alguns parasitóides respondem tanto a estímulos da planta como do inseto hospedeiro. 114 As plantas exercem um papel importante no comportamento de seleção do hospedeiro ou presa de insetos entomófagos que atacam insetos fitófagos. Por exemplo, o parasitismo de ovos de H. zea por parasitóides do gênero Trichogramma varia de acordo com o hospedeiro da praga. Essa variação na escolha de plantas decorre freqüentemente de diferenças de produção de semioquímicos pelas distintas espécies vegetais. Estudos sobre o comportamento de seleção de hospedeiros e presas de inimigos naturais revelam que muitos dependem quase exclusivamente de cairomônios tanto para localização como aceitação do alimento. Semioquímicos também podem ser utilizados para melhorar a atividade de entomofagia, tanto em programas de liberação como na própria manipulação do ambiente. Por exemplo, liberações eficientes de inimigos naturais (inoculativas ou inundativas) requerem uma alta proporção dos insetos na área em que foram liberados, mas o que se observa é uma tendência de dispersão para outras áreas. 3.9. MODIFICAÇÃO GENÉTICA DE INIMIGOS NATURAIS Outra possibilidade que tem sido atualmente estudada é a melhoria do desempenho de inimigos naturais por meio da modificação genética das populações, no laboratório ou no campo, de tal maneira que eles se tornem adaptados às condições nas quais eles devem operar. Provavelmente por causa da grande restrição do número de genes disponíveis em laboratório quando comparado ao número da população selvagem, é difícil selecionar uma população, em laboratório, que não será inferior uma vez liberada no campo. Atualmente, a melhor estratégia tem sido a busca, em áreas domésticas ou estrangeiras, de outras populações de inimigos naturais que possuam as qualidades desejadas. 3.10. IMPORTAÇÃO E COLONIZAÇÃO O uso de inimigos naturais importados é, geralmente, um componente muito importante em programas de controle biológico, especialmente se a praga ou pragas são de origem exótica, embora, às vezes, a busca de inimigos naturais no exterior também seja feita para pragas nativas, visando a identificação de espécies mais eficientes do que inimigos nativos já presentes. 115 De maneira geral, quando uma espécie de inseto se estabelece como praga em uma nova área, todos ou a maioria de seus inimigos naturais são deixados para trás. Muitas vezes, na região de origem, a espécie não chega a ser considerada praga devido ao controle biológico natural, às diferenças climáticas, às diferenças em plantas hospedeiras ou a outros fatores. Portanto, pode haver alta probabilidade de que inimigos naturais eficientes sejam encontrados nessas regiões e proporcionem um controle parcial, se não completo, na nova área. Embora a maior busca de inimigos naturais tenha sido para pragas exóticas, a importação não é limitada para tais pragas. Mesmo uma praga nativa pode ser hospedeira adequada para inimigos naturais obtidos de hospedeiros próximos, em outros países. O exemplo clássico de controle biológico de inimigos naturais importados é o da mariposa Cactoblastis cactorum (Berg), praga do cacto argentino, Opuntia aurantiaca Lindl., que foi levada à Austrália para controlar essa espécie de cacto. A mariposa não obteve sucesso no controle do cacto, mas foi extremamente eficaz no controle de O. stricta (Harv.) e O. inermis (DC.), originários da Flórida e do Texas, respectivamente, que também eram problemas na Austrália, onde infestavam aproximadamente 24 milhões de hectares. O objetivo da introdução de qualquer espécie de inimigo natural de outra área (não necessariamente exótico) é causar uma ruptura na cadeia ecológica de determinada praga. Para que se atinja sucesso nessa ruptura, primeiramente é necessário que tenha sido corretamente identificada a praga, de tal maneira que sua origem ou a de seus parentes possa ser encontrada. Uma vez conhecido o local de origem da praga, seus inimigos naturais também podem ser encontrados (e corretamente identificados). São fundamentais os estudos bioecológicos dos parasitóides obtidos, tanto para determinar suas potencialidades e qualidades, para sua introdução em uma nova área, como para identificar e excluir qualquer espécie com características indesejáveis. Ao se decidir pela coleta de inimigos naturais para o controle biológico de pragas exóticas ou nativas, algumas considerações devem ser levadas em conta. Por exemplo, geralmente, na área de coleta, o hospedeiro não é tão comum e pode estar sendo mantido em baixa densidade pela presença de maior número de inimigos naturais; entretanto, é necessário certificar-se da 116 possibilidade de atuação também de algum ou alguns fatores abióticos. Muitas espécies de inimigos naturais são capazes de atuar em diferentes níveis de abundância da praga; no entanto, algumas são aptas apenas a manter determinada população de uma praga em nível baixo e não reduzem a população até esse nível, uma vez que a praga tenha alcançado um nível alto. Por outro lado, há espécies que conseguem baixar a população da praga, mas não são aptas a mantê-Ia naquele nível. Os parasitóides da mosca Diprion hercyniae (Hartig), Dahlbominus fuscipennis (Zett.) e Exenterus claripennis (Thom.), ambos da família Ichneumonidae, em populações relativamente altas, em 1938 e 1939, foram virtualmente eliminados por uma severa epizootia virótica de 1940 a 1942. Após esse colapso, dois diferentes parasitóides introduzidos, Drino bohemica Mesnil (Tachinidae) e Exenterus vellicatos Cushman (Ichneumonidae), foram recuperados em bom número e, juntamente com o vírus, mantiveram as populações de D. hercyniae em um nível razoavelmente baixo após 1945. Uma vez que coletados os inimigos naturais no exterior, é fundamental observar certos cuidados na manipulação e envio para o país em que será liberado. Antes de ir para o campo, os insetos são geralmente transportados via aérea para locais de quarentena, onde são multiplicados ou armazenados em câmaras ambientais até a próxima safra. Entretanto, as funções mais importantes das estações de quarentena são os estudos adicionais dos inimigos naturais, para garantir que eles não tenham qualidades indesejáveis e, especialmente, para eliminar qualquer outro elemento que não seja o organismo desejável. 4. FATORES QUE AFETAM A LIBERAÇÃO DE INIMIGOS NATURAIS As condições climáticas, os hospedeiros, a predação e a qualidade na produção podem influenciar, isolada ou simultaneamente, a eficiência dos inimigos naturais liberados. O clima provavelmente sejao fator de maior impacto, em função da complexidade das variáveis meteorológicas que podem afetar o desenvolvimento, a emergência, a sobrevivência, a atividade e a fecundidade do inimigo natural liberado. Entre os componentes do clima, a temperatura e a umidade, especialmente em extremos, têm sido relacionadas com resultados negativos no campo. Estudos de campo, embora 117 em pequeno número, sugerem, por exemplo, que Trichogramma evita condições de orvalho, temperaturas extremas, áreas de intensa luminosidade, chuvas pesadas e ventos com velocidade acima de 1,1 km/h. Dessa maneira, se não é possível evitar o clima rigoroso, a taxa e a freqüência de liberações devem ser ajustadas para cima, com uma preocupação específica com o modo e a extensão de emergência. O hospedeiro da praga é também uma variável importante que pode afetar o desempenho de parasitóides, tanto pelos efeitos físicos como pelos químicos. Diversos níveis de parasitismo podem ser encontrados para um mesmo hospedeiro em diferentes cultivos. Já foi demonstrado, por exemplo, que o parasitismo de Trichogramma é proporcional ao tamanho da planta, a sua área foliar, à área ocupada e mesmo à própria arquitetura da planta. 4.1. AVALIAÇÃO A real contribuição de um agente de controle biológico para um programa de manejo integrado de pragas depende de uma avaliação criteriosa de seu impacto sobre a praga-alvo. Essa avaliação é de suma importância, pois, uma vez realizada a liberação do inimigo natural, não há como alterar ou repetir o processo. Em outras palavras, não é possível voltar e tentar inimigos naturais diferentes ou os mesmos em uma seqüência diferente, sob as mesmas condições, uma vez que eles tenham sido estabelecidos na área. Isso obviamente não pode ser feito com insetos nativos. Entre as situações esperadas da atuação de um agente de controle biológico, o controle total é o mais fácil. de ser avaliado, já que não é preciso instalar experimentos ou tirar amostras para concluir que a população da praga foi reduzida a um nível não econômico. Embora não seja necessariamente verdadeiro, em muitos casos assume-se que foi o inimigo natural o responsável pela redução da praga. Se os níveis de abundância característica da praga são determinados antes que o inimigo natural seja introduzido (método de "antes e depois"), é possível comparar, até de maneira convincente, os níveis populacionais, embora a prova seja somente circunstancial. No entanto, não se consegue separar os efeitos do controle biológico natural. É preciso ter confiabilidade e certeza de que os dados sobre a abundância da praga foram obtidos antes da introdução dos inimigos naturais e que as populações 118 da praga não tenham sido estabilizadas antes das introduções. A situação inversa, ou seja, quando não verificado "controle algum", também é relativamente fácil de ser avaliada, uma vez que a praga continua sendo problema sério. Já o sucesso parcial é o de mais difícil avaliação, a qual se complica ainda mais quando se trabalha com inimigos naturais que são efetivos somente em baixas densidades do hospedeiro. Qualquer fator que permita à praga alcançar uma densidade mais alta pode tornar impossível a atuação dos inimigos naturais. Stehr (1982), citado por Cruz (2002), relacionou as técnicas disponíveis para medir a eficiência dos inimigos naturais em três grupos: (1) correlação entre abundância da praga e do inimigo natural; (2) método de exclusão (experimental) do inimigo natural; e (3) modelo matemático dos processos populacionais. Segundo o autor, o método a ser usado depende de um sistema particular que esteja sendo avaliado, porém o mais importante é que ele demonstre se o controle biológico funcionou ou não e, se possível, como ele funcionou. O método de correlação é baseado em tabela de vida e em dados de densidade tanto das pragas, como de seus inimigos naturais. Ele tenta mostrar uma relação de causa e efeito entre o aumento dos inimigos naturais e o decréscimo na praga ou pragas e vice-versa. As limitações do método estão na falta de qualquer testemunha ou controle e na impossibilidade de demonstrar o controle quando o inimigo natural é efetivo somente em baixas densidades (em alta densidade o hospedeiro aumenta e diminui sem qualquer relação com a mudança na densidade do inimigo natural) e quando o inimigo natural é tão eficiente que o hospedeiro "nunca' tem a chance de aumentar. Para implementar o método experimental de avaliação do impacto de um inimigo natural liberado em uma área, é necessária uma distinção clara entre duas questões: (1) A regulação da praga pelos inimigos naturais ocorre? (2) Como ela ocorre? A regulação foi determinada por esses autores como a manutenção da densidade de um organismo entre limites inferiores e superiores característicos ao longo do tempo. Um fator regulatório é definido como aquele que é inteira ou parcialmente responsável pela regulação, observada sob determinadas condições ambientais, e sua remoção ou mudança na eficiência ou grau resulta no aumento da densidade populacional média. Isso pode ser testado por técnicas experimentais. 119 Todas as técnicas experimentais envolvem o uso de algum procedimento que exclua, elimine ou reduza drasticamente os inimigos naturais em algumas parcelas, que são, então, comparadas a outras nas quais tais métodos nunca foram usados. São, portanto, técnicas de “presença e ausência" e semelhantes ao método “antes e depois", exceto que as condições são mais cuidadosamente reguladas e as parcelas controle podem ser usadas. Muitas técnicas diferentes têm sido usadas. Às vezes, parcelas idênticas são instaladas e os inimigos naturais adicionados em algumas e não em outras; essa técnica, obviamente, funciona melhor para inimigos naturais de dispersão lenta, uma vez que não se podem aumentar muito as distâncias entre parcelas para não reduzir suas similaridades. É possível também usar gaiolas visando excluir inimigos naturais, mas, nesse caso, devem-se usar gaiolas similares em todas as parcelas, para eliminar qualquer efeito da gaiola.Existe, ainda, o método de testemunha com inseticidas, no qual são usados produtos que, de maneira seletiva, matam os inimigos naturais por meio das diferenças em toxicidade, dose, formulação, época etc., com um efeito mínimo sobre a praga. A remoção manual de inimigos naturais tem sido uma técnica bastante usada, e é ideal para evitar qualquer influência, qualquer coisa, exceto os inimigos naturais. No entanto, tem como desvantagens o trabalho excessivo requerido em descobrir e remover a maioria dos inimigos naturais antes que tenham qualquer impacto, a necessidade de trabalhar com pragas que produzam muitas gerações por ano ou que continuamente invadam a área protegida e a constatação de que as populações da praga estão prestes a aumentar de modo que os resultados possam ser obtidos em um período razoável de tempo. O método de armadilha é uma modificação do método de testemunha com inseticida, no qual uma área central não tratada é circundada por uma tratada, fazendo com que os inimigos naturais que tentarem sair ou entrar na área não tratada sejam mortos. O método é restrito a situações em que o inimigo natural é móvel, mas a praga se move muito pouco, a exemplo de insetos sugadores, como cochonilhas. O advento de computadores que permitem manusear rapidamente grandes quantidades de dados levou ao desenvolvimento de modelos de sistemas biológicos que podem ser usados em manejo e avaliação. Esses modelos, com a adequada entrada de 120 parâmetros biológicos e ambientaisdo campo, são desenhados para tornar possível a avaliação de uma situação corrente, prever o que provavelmente vai acontecer, dadas certas condições, e recomendar procedimentos para obter o resultado desejado. Entretanto, os subcomponentes do inimigo natural para esses modelos são ainda pouco desenvolvidos. Aproximações experimentais (quando viáveis), provavelmente, são, ainda, as melhores técnicas para demonstrar os efeitos de inimigos naturais, mas têm pouco valor de previsibilidade ou de manejo por si sós. Logo, o desenvolvimento de sistemas melhores ainda continuará, embora modelos relativamente simples, tais como aqueles usados para o manejo de pragas de oliveira, por métodos químicos, culturais e biológicos, tenham sido efetivos. Além disso, naturalmente, opções de manejo podem ser investigadas pela manipulação de parâmetros em modelos de computador, quando for quase impossível ou economicamente proibitiva a comprovação experimental no campo. 5. CONSIDERAÇÃO FINAL A implementação de táticas de controle biológico como parte importante do manejo integrado de pragas, no Brasil, embora tenha tido grande impulso nos últimos anos, particularmente em relação às pesquisas básicas desenvolvidas em laboratórios, ainda carece de vários estudos de campo. É preciso uma maior integração de pesquisadores e instituições não só ligados à entomologia, mas também de profissionais de outras áreas, como estatística, biotecnologia, meteorologia etc. Fóruns específicos devem ser incentivados em nosso país, como acontece no exterior. O impacto de outros métodos naturais de controle de pragas, como resistência genética ou o uso de plantas geneticamente modificadas (plantas transgênicas), sobre o desempenho de diferentes predadores e parasitóides, bem como o próprio melhoramento genético, por meio de seleção, hibridação ou técnicas de engenharia genética, deve receber atenção especial em anos futuros. Por exemplo, a integração do predador Doru luteipes (Dermaptera, Forficulidae) com cultivares resistentes de sorgo para o controle do pulgão-verde, S. graminum, foi demonstrada como sendo altamente favorável. Desta forma, o sucesso do controle biológico, já registrado em diferentes países, indica ser possível e desejável que situação semelhante também ocorra no Brasil, especialmente considerando 121 as inúmeras desvantagens verificadas pelo uso unilateral dos produtos químicos de largo espectro de ação. 122 SUGESTÃO DE LEITURA Cruz, I. Controle biológico em manejo integrado de pragas. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.1-16. Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. 123 CRIAÇÃO MASSAL E LIBERAÇÃO DE AGENTES DE CONTROLE BIOLÓGICO APRESENTAÇÃO Uma das principais etapas de qualquer programa de controle biológico refere-se à criação massal de inimigos naturais. Insetos predadores e parasitóides, além de microrganismos entomopatogênicos são criados em vários laboratórios do Brasil e do Mundo com as mais diversas finalidades. De maneira geral, insetos desenvolvem-se adequadamente em laboratório, bastando-se, apenas, disponibilizar um ambiente próximo ao natural. Dietas podem ser oferecias com material natural ou artificial, sendo que esse último deve, pelo menos, deter dos nutrientes básicos para o completo desenvolvimento do inseto. É suposto que predadores generalistas sejam mais fáceis de criar pelo fato de terem maior abrangência alimentar. Todavia, pesquisas têm sido desenvolvidas com o intuito de adequar criações laboratoriais de parasitóides com hospedeiros alternativos, barateando os custos, sem prejudicar a eficiência do controle em campo. E como é o campo, na maioria das vezes, o destino dos inimigos naturais criados em laboatório, o esquema de liberação deve ser feito de tal forma que não prejudique a eficiência dos inimigos naturais. Detalhes devem ser seguidos para que ao expor o inimigo natural à condições inóspitas, como são as de campo, esses possam desenvolver-se e reproduzirem-se sem demais problemas. Esses serão os temas discutidos nesse capítulo. 7 124 1. INTRODUÇÃO Embora o homem produza insetos desde há muito tempo, podendo-se incluir como exemplo as criações de muitas espécies de bicho-da-seda pelos chineses ou mesmo de abelhas por diversos povos como agentes polinizadores de várias culturas, foi no século XX que houve um grande avanço na área de criação de insetos. No início desse século, a rotineira utilização de Drosophila spp. como suporte para estudos genéticos representou um grande avanço, bem como o desenvolvimento de técnicas para produção de inimigos naturais para liberações inoculativas, uma vez que o controle biológico clássico vinha crescendo desde a introdução de Rodolia cardinalis (Mulsant) em 1888 para controlar Icerya purchasi Maskell nos EUA (Capítulo 2); essas técnicas continuaram a se desenvolver até o final da década de 30, especialmente por pesquisadores da Universidade da Califórnia, EUA. Nessa época, em 1939, foi sintetizado o DDT, que representou um marco negativo para o controle biológico, pois daí até 1960 praticamente apenas foram utilizados inseticidas organossintéticos para controle de pragas. Como resposta da comunidade científica aos problemas gerados pelo uso inadequado de agroquímicos na agricultura, surgiu o manejo integrado de pragas (MIP) que demanda o conhecimento da bioecologia das pragas e como mantê-Ias em laboratório de forma contínua, sem depender de sua ocorrência natural, o que, muitas vezes, especialmente para pragas de ocorrência cíclica, atrasa muito as pesquisas ou programas em entomologia aplicada. Para isso, o desenvolvimento de dietas artificiais, especialmente para Lepidotera, Coleoptera e Diptera, foi fundamental a partir da década de 60, possibilitando a criação de insetos para diversos fins, entre eles o controle biológico. Assim, a ciência e profissão de criação ganhou maior reconhecimento e aceitação na década de 50 e cresceu exponencialmente nas décadas seguintes. Para criar um determinado inseto, temos que coletá-lo em campo, capturá- lo e assim, manipulá-lo de forma e maneira positiva com os propósitos do programa de criação massal. A seguir, iremos estudar as formas de obtenção de presas, ou seja, insetos fitófagos. 2. OBTENÇÃO DE INSETOS FITÓFAGOS 125 Existem, basicamente, três formas de obter insetos: (a) coletando populações no campo; (b) mantendo, em laboratório, populações em hospedeiros naturais (plantas intactas, folhas, raízes, bulbos, caules, etc.); e (C) mantendo em laboratório, populações em dietas artificiais. Coleta de populações no campo. É a forma mais antiga e muito aceita pelos "conservadores" por se tratar de populações selvagens. Entretanto, tais populações têm como desvantagens não indicar periodicidade de ocorrência e apresentar procedência, nutrição e idade desconhecidas, o que pode limitar determinados tipos de estudos e trabalhos; em alguns casos, como em estudos de resistência de plantas a insetos, que são longos, tal periodicidade de ocorrência pode prolongar ainda mais esses programas de pesquisa. Manutenção de populações em hospedeiros naturais.Demandam muita mão-de-obra, mas são fundamentais para alguns grupos de insetos, como hemípteros e tisanópteros; nesse caso, deve-se investir em plantas fáceis de serem cultivadas e manipuladas (nem sempre são os hospedeiros naturais). Para manutenção desses vegetais, dependendo da região, há necessidade de dispor de locais (casas de vegetação) com controle de temperatura, umidade relativa (UR) e fotoperíodo. Cuidados devem ser tomados para espécies pequenas (tripes, moscas-brancas), pois, se não forem mantidas em locais com telas muito finas, pode haver mistura de espécies. O caso mais citado é o de criação de espécies de moscas-brancas em ervas daninhas, hospedeiras dessa praga. Manutenção de populações em dietas artificiais. As dietas artificiais apresentam uma série de vantagens, especialmente por permitirem menor mão-de-obra, mas, como são preparadas em função do hábito alimentar e do aparato bucal do inseto, são mais utilizadas para Lepidóptera, Coleoptera e Diptera. A dieta deve conter todos os nutrientes exigidos pelo inseto (proteínas, vitaminas, sais minerais, carboidratos, lipideos e esteróis), e alguns grupos exigem ainda ácidos nucléicos. Entretanto, isso não é suficiente, pois a ausência de certas propriedades físicas e de fagoestimulantes (físicos e químicos), assim como do balanceamento de nutrientes, pode determinar um desenvolvimento inadequado do inseto. Insetos dependentes de simbiontes podem apresentar obstáculos à formulação de uma dieta artificial. 126 Assim, uma dieta artificial corretamente formulada possui propriedades físicas e contém produtos químicos que estimulam e mantêm a alimentação, com nutrientes (essenciais e não-essenciais) em proporções balanceadas para produzir ótimo crescimento e desenvolvimento, e deve ser livre de microrganismos contaminantes. Os problemas associados com a formulação de dietas artificiais têm correlação direta com seu conteúdo de água. Para pulgões, a dieta tem de ser líquida; para fitófagos mastigadores, semi-líquida, ou seja, com bastante água, mas com uma consistência que ofereça resistência ao aparato bucal do inseto; já para baratas ou pragas de grãos armazenados, a dieta deve ser em pó ou friável. Quanto mais água tiver a dieta, maior será o problema de contaminação. Uma dieta artificial adequada é aquela com as seguintes características: Propicia alta viabilidade larval; Produz insetos com duração da fase larval igual à da natureza; Dar origem a adultos com alta capacidade reprodutiva; Serve para mais de uma espécie e, se possível, para mais de uma ordem de insetos; Tem em sua composição componentes de baixo custo (facilmente adquiridos no mercado); Apresenta uma viabilidade total, superior a 75%; Mantém a qualidade do inseto ao longo das gerações. Nós já vimos as formas de obtenção de presas, ou seja, de3 insetos fitófagos. Vamos agora discutir sobre as formas de obtenção de inimigos naturais, ou seja, insetos entomófagos. Desta forma, existem três formas de obter inimigos naturais: (a) sobre o hospedeiro natural; (b) sobre hospedeiros alternativos ou de substituição; e (c) em meios artificiais (in vitro). Sobre o hospedeiro natural. É a forma atualmente mais utilizada no mundo. demandando a criação de duas espécies de insetos: o hospedeiro e o inimigo natural. Assim, para criar o braconídeo Cotesia flavipes (Cameron), há necessidade de ter disponível seu hospedeiro natural Diatraea saccharalis (Fabr.). Nesse caso, a criação é facilitada pois existem inúmeras dietas artificiais para a broca-da-cana. Em outros casos, não existem dietas e o hospedeiro tem de ser criado sobre a planta. Podem ser citadas como exemplos a produção de pulgões do trigo para criação de seus parasitóides e a de Ageniaspis citricola, parasitóide de 127 Phyllocnistis citrella, praga que é criada em tubetes contendo plantas cítricas. Como já comentado, nos últimos anos, o desenvolvimento de dietas artificiais para Coleóptera, Lepidóptera e Díptera tem facilitado a produção de inimigos naturais. Sobre hospedeiros alternativos ou de substituição. Assim como existem insetos que são criados em hospedeiros alternativos, também os inimigos naturais podem ser criados nesses hospedeiros alternativos ou de substituição. É muito comum o fato de algumas cochonilhas que atacam Citrus serem criadas em abóboras ou outras cucurbitáceas para produção de coccinelídeos e nitidulídeos. Em meios artificiais (in vitro). Seria a forma ideal de criaçâo, pois reduziria o custo de produção, eliminando uma série de etapas. Embora as exigências nutricionais qualitativas de todos os insetos sejam semelhantes, independentemente de sua posição sistemática e hábito alimentar, são poucos os casos de sucesso de dieta artificial para parasitóides ou predadores, seja qual for o hospedeiro. Existem, basicamente, três tipos de criações de insetos, aplicáveis às criações de inimigos naturais; (a) criações em pequena escala; (b) criações comerciais; e (c) criações massais. Criações em pequena escala (uma pessoa é suficiente para conduzir a criação). São as chamadas criações de pesquisa, que podem ser aumentadas para pesquisas aplicadas, especialmente nos casos de controle biológico que demandem liberações inoculativas. Em julho de 1998, o parasitóide A. citricola foi importado no brasil para o controle de P. citrella. Nesse caso, estabeleceu- se uma criação de parasitóide, o qual foi liberado em todo o estado de São Paulo, mantendo-se tal criação com a atuação permanente de três técnicos de laboratório. Criações comerciais. Muitas empresas da Europa, dos EUA e de vários países do primeiro mundo comercializam inimigos naturais, e na Europa é muito freqüente a comercialização para uso em casas de vegetação. Esse processo cultural foi iniciado nos EUA e na Europa na década de 70, e no Brasil apenas agora começam a aparecer as primeiras empresas interessadas na comercialização de inimigos naturais. Em nosso país, além do problema de desconhecimento dessa possibilidade, não há uma legislação forte para evitar que surjam "aventureiros" nesse mercado que poderiam fazer diminuir a credibilidade no controle biológico. 128 As criações comerciais podem, dependendo do mercado, ser de pequeno, médio ou grande porte. Criações massais. Geralmente envolvem operações semelhantes às de uma fábrica para servir de suporte a um programa de controle biológico. Em países mais desenvolvidos, existem criações massais de inimigos naturais que são comercializados como “inseticidas biológicos”. Um dos insetos mais produzidos no mundo hoje é o Trichogramma, e, especialmente em países socialistas, extensas áreas são tratadas com esse parasitóide. Na Rússia, há um grande número de "biofábricas" produzindo milhões de insetos por dia, chegando a uma produção anual de 50 bilhões de insetos; no México, essa produção é de 28 bilhões por ano, e em alguns países da América do Sul, como Colômbia, o número de insetos produzidos é bastante elevado. Essas criações massais envolvem produções diárias de milhões de insetos e, na verdade, assemelham-se a uma linha de fabricação de um produto qualquer. Assim, no caso do controle de Cochliomyia hominivorax, (Coquerel) por meio da técnica do inseto estéril nos EUA; eram produzidos e liberados de 50 a 200 milhões de moscas estéreis por semana. No final do programa, constatou-se que para cada fêmea da natureza foram liberadas 49 fêmeas estéreis, relação bem maior do que a prevista teoricamente para esse método, que é de 1:9. Em tal "fábrica" eram empregados mais de trezentos funcionários. Nesse caso, além dos problemas biológicosde criação, surgem outros, como inventário, compra e armazenamento de material e manutenção das instalações e equipamentos. À medida que se aumenta o número de insetos produzidos, crescem os problemas relacionados a instalações, custos, microrganismos (contaminantes) e controle de qualidade dos insetos, e torna-se necessário pensar em automatização (mecanização). Essa mecanização deve ser incentivada a partir de uma produção de 3 mil a 5 mil adultos por semana. 3. PROBLEMAS EM CRIAÇÕES MASSAIS É muito difícil separar os problemas de uma criação de um inseto qualquer daqueles ligados à produção de inimigos naturais. Trata-se, no caso de inimigos naturais, da criação de duas espécies, e esse é o grande fator complicador. Há necessidade, portanto, de conhecer a biologia, ecologia, 129 comportamento, fisiologia, nutrição etc. do hospedeiro e do inimigo natural e, evidentemente, suas inter-relações. Não é possível realizar uma criação massal sem antes ter sido feita uma criação de pesquisa (pequena escala). Os problemas, em qualquer criação, se avolumam à medida que se aumenta o número de insetos produzidos. Obviamente que, se o número de insetos criados for aumentando, o primeiro problema será relacionado às instalações. Enquanto em um laboratório, para criar um inseto em dieta artificial, bastam três ou quatro setores, evidentemente, para criação de inimigos naturais, será necessário o dobro de áreas ou de salas de criação. Outro problema de uma criação massal são os custos, pois de 60 a 80% dos gastos totais da criação de insetos referem-se à mão-de-obra; quanto maior o número de insetos criados, maiores serão tais gastos. Os problemas de mão- de-obra são maiores em países mais ricos, onde há necessidade de automatizar (mecanizar) tais criações, pois o custo salarial inviabiliza as criações massais sem automatização. No Brasil, por exemplo, é comum em laboratórios que produzem de 10 milhões a 15 milhões de C.flavipes por mês trabalharem de 25 a 30 pessoas. Isso só é possível devido aos baixos salários pagos em nosso país. Como a maioria dos hospedeiros utilizados para criação de inimigos naturais são mantidos em dietas artificiais, os problemas de sanidade (contaminações) aumentam à medida que cresce o número de insetos criados. Nesse caso, separação de locais para preparo de dietas, para desenvolvimento larval e pupal, para manutenção dos hospedeiros e para inoculação e desenvolvimento do parasitóide deve constar da lista de cuidados a serem tomados em uma criação massal. A limpeza constante e o revestimento de paredes, balcões e pisos com materiais que permitam descontaminações são fundamentais. Produtos como quaternários de amônio, hipoclorito de sódio, formaldeído etc. são empregados para esse fim. O hipoclorito de sódio é muito utilizado, pois, além de ser barato, apresenta boa estabilidade, solubilidade e baixa toxicidade para mamíferos. Além dessas vantagens, por ser um forte oxidante, inativa proteínas e elimina vírus, bactérias, fungos, algas e protozoários. É interessante também que os pisos recebam um tratamento diário com esse tipo de produtos. A entrada de pessoas nos laboratórios deve ser rigorosamente controlada, com 130 a utilização de, no mínimo, revestimentos para sapatos. A esterilização de equipamentos e recipientes com agentes físicos (autoclave, irradiação e calor seco) é fundamental para o sucesso da criação. Entretanto, a esterilização externa dos ovos (hipoclorito de sódio, formaldeído, sulfato de cobre, ácido acético glacial, ácido tricloroacético) e a da dieta artificial [metil-parahidroxibenzoato (nipagin), butil e propilparahidroxibenzoato, hipoclorito de sódio, ácido propiônico, benzo ato de sódio, ácido benzóico, sorbato de potássio, ácido sórbico, dIltibióticos] constituem etapas importantes para evitar contaminações. Os agentes físicos, como irradiação ou autoclave, também podem ser importantes na esterilização do meio. O ajuste de pH é um método alternativo para evitar contaminações, pois, em pH baixo, a quantidade de anticontaminante a ser utilizado pode ser menor. Para um bom sistema de controle sanitário, deve ser feita esterilização das pupas (hipoclorito de sódio). De qualquer forma, para dietas artificiais, alguns aspectos devem ser levados em consideração na escolha do anticontaminante: Dose (fazer teste para cada produto); Umidade da dieta, pH e formulação do produto; Estágio de exposição do inseto Efeito no crescimento,em uma geração e nas subseqüentes; Ordem do inseto. Coleópteros e dípteros são mais sensíveis a anticontaminantes, embora existam famílias de Lepidoptera bastante afetadas pelo ácido sórbico. A qualidade do inseto produzido é outro fator importante em uma criação massal. Para evitar problemas com o inseto de laboratório, deve-se iniciar a criação com um número razoável de insetos, ou seja, de 200 a 500 indivíduos. Em geral, quando a população é introduzida no laboratório, haverá queda da variabilidade genética em virtude da deriva genética, da seleção e do cruzamento entre irmãos (inbreeding) nas primeiras gerações. Somente por volta da quinta à sétima geração é que ocorre uma recuperação dessa variabilidade devido a mutações e recombinações. Assim, existem várias maneiras de avaliar a qualidade dos insetos produzidos em laboratório e verificar se eles são competitivos com os da natureza. Os componentes da qualidade são a adaptabilidade, mobilidade, atividade sexual, reprodução e 131 colonização, e, de acordo com o objetivo da criação massal, a importância relativa de cada componente é variável. Além desse acompanhamento de qualidade do inseto em laboratório com padrões preestabelecidos, devem ser introduzidos, periodicamente, indivíduos selvagens na população de laboratório. Alguns preconizam que as criações de laboratório de inimigos naturais sejam conduzidas em temperaturas flutuantes, para evitar adaptações às condições de temperatura, UR (umidade relativa) e fotoperíodo constantes. Um inseto em laboratório pode sofrer modificações em função de variações, em relação às condições naturais de temperatura, luz, umidade, alimento, abrigo, pressão parasitóides/predadores, competição, presença humana, microambiente, busca e aceitação de cópula, local de postura, vento, dispersão, feromônios e água livre. O controle de qualidade deve ser mais ou menos rigoroso de acordo com o objetivo da criação. Assim, por exemplo, se o objetivo for a multiplicação de um vírus, a lagarta a ser produzida deverá apenas apresentar uma massa corpórea grande, suficiente para tal multiplicação, independentemente de sua agilidade ou capacidade de consumo. Em casos de controle biológico aplicado, devem ser levadas em conta, no controle de qualidade, as características de laboratório (preferência hospedeira e adequação), semicampo (capacidade de busca) e campo (eficiência) (adaptação, localização do hábitat e hospedeiro, aceitação e adequação do hospedeiro e sincronização com o hospedeiro). Outro problema das criações massais é o armazenamento. Uma vez que as criações massais de insetos são pouco freqüentes em nossas condições, uma das dificuldades que o entomologista encontra para o desenvolvimento de estudos básicos é a não existência de insetos em qualquer período do ano. Uma das soluções encontradas para contornar esse problema seria a manutenção do inseto em temperaturas que paralisassem temporariamente seu desenvolvimento. Este tipo de armazenamento também facilitaria o intercâmbio de insetos entre laboratórios de diferentes regiões, impedindo a eclosão ou aemergência de insetos durante o transporte. Em casos de produção massal contínua de inimigos naturais, seria interessante que se pudesse armazenar o hospedeiro no período do ano em que 132 não houvesse necessidade de utilização dos parasitóides ou predadores. Espécies de Trichogrammatidae podem ser criadas em ovos armazenados a - 10°C por mais de um ano. Como média, à temperatura entre 8 e 12°C, os ovos parasitados por Trichogramma conseguem se manter por 20 a 22 dias. Ovos hospedeiros de Trichogramma spp. podem ser armazenados em nitrogênio (N) líquido por até nove meses sem perda de suas características ao parasitismo. Muitos predadores aceitam material morto para sua criação, mas os parasitóides exigem material vivo para oviposição e desenvolvimento. Exceções ocorrem em ectoparasitóides que atacam estágios imóveis do hospedeiro e que apresentam exigências nutricionais mais simples. Assim, alguns pteromalídeos que atacam Musca domestica L., parasitam pupários que foram armazenados a -21°C por mais de um ano. Existem ainda parasitóides de ovos, como espécies de Trichogrammatidae e Encyrtidae, que podem ser mantidos em "ovos mortos" (ou seja, que tiveram os embriões inviabilizados) por ultravioleta, por radiações gama ou mesmo por combinações de altas temperaturas e umidades relativas (50 a 55°C e UR próxima à saturação por 15 minutos de exposição à lâmpada ultravioleta). Essa inviabilização do embrião é necessária pelo fato de algumas espécies de traças, nas quais os parasitóides são criados, serem canibais, alimentando-se, quando eclodissem, de ovos parasitados ou não se encontrassem disponíveis. A pupa é outra fase do inseto que pode ser armazenada. Por exemplo, Stinner et aI. (1974), citado por Parra (2002), armazenaram pupas de último dia de T. pretiosum a 16,7°C por 4 a 10 dias sem efeitos prejudiciais na emergência. Esse armazenamento pôde ser aumentado para 12 dias, quando no sexto dia a temperatura foi alterada para 15°C. Esses autores conseguiram uma média de 93% de emergência em um período de quatro horas a 26,7°C. Uma das formas de iniciar o armazenamento de uma fase de desenvolvimento do inseto (ovo, pupa) é por meio da determinação do limiar térmico de desenvolvimento (temperatura-base). Como essa temperatura paralisa o desenvolvimento, sem matar o inseto, poderia ser utilizada como temperatura ideal para armazenamento. Outra forma seria a indução da diapausa; nesse caso, seriam oferecidas condições favoráveis ao estágio sensível quando fosse necessário. A mosca da cebola, Delia antiqua (Meigen), pode ser armazenada 133 por até um ano como pupa (em diapausa) a 1,0 + 0,5°C; após esse período, a emergência chega a ser superior a 80%. Pupas de Trichogramma evanescens West., podem ser armazenadas por seis meses a um ano, obtendo, posteriormente, emergência superior a 90%; em períodos menores de armazenamento (três a seis meses), houve emergência de 95%. A técnica utilizada foi a seguinte: ovos de A. kuhniella recém-colocados foram oferecidos ao parasitóide por quatro horas a 20°C; a incubação foi realizada por 24 horas a 20°C com fotofase de 8 horas; para induzir a diapausa, os ovos foram mantidos por 40 dias a 14°C com 8 horas de fotofase. Posteriormente, os ovos foram armazenados a 3°C com 70% de UR. No Brasil, Schmidt (1991), citado por Parra (2002), conseguiu armazenar ovos de A. kuehniella parasitados por Trichogramma por 96 dias. Na Embrapa Soja, em Londrina, PR, os pesquisadores utilizam a seguinte técnica para armazenamento de ovos de Nezara viridula (L.) para produção de Trissolcus basalis (Wollaston): para períodos de até 30 dias, colocam em geladeira (5°C); para períodos de até seis meses, mantêm em nitrogênio líquido (Corrêa-Ferreira & Moscardi, 1993) (Capítulo 27). Em nosso país, há necessidade de estudos mais aprofundados sobre diapausa de insetos (incluindo parasitóides). Até que se conheçam os mecanismos de interrupção de desenvolvimento das espécies neotropicais, uma forma de aumentar o período de armazenamento é a seguinte: após o parasitismo, manter os ovos parasitados a 18°C; retirá-Ios dessa temperatura aproximadamente no vigésimo dia e levá-Ios a 10°C, o que permitirá um armazenamento de ovos parasitados por até 40 dias, facilitando, assim, programações de liberações no campo. Portanto, à medida que cresce o número de insetos criados em laboratório, aumentam os problemas, especialmente os aqui mencionados: instalações, custos, automatização, sanidade, qualidade do inseto e armazenamento. 134 4. LIBERAÇÃO DE INIMIGOS NATURAIS 4.1. INTRODUÇÃO O controle de pragas no Brasil está atravessando uma das fases mais importantes de toda sua história. Em virtude das pressões sociais e políticas, que exigem cada vez mais uma melhor qualidade de vida, os agricultores das diversas regiões brasileiras estão se informando e se interessando sobre as vantagens que outras táticas de controle, em relação ao controle químico, apresentam. Essa procura mais racional, diferentemente do que ocorreu com o uso dos organoclorados na metade do século XX, tem chegado lentamente a uma das propostas inteligentes de manejo ambiental de pragas, que é o controle biológico. Toda essa evolução da mentalidade do setor agrícola brasileiro certamente é devida ao esforço incansável de diversos pesquisadores brasileiros que mantiveram firmes seus ideais e à liberação de recursos pelos órgãos financiadores de pesquisa, visando a implantação definitiva do controle biológico. A aceitação do controle biológico pelos produtores pode ser avaliada pelo surgimento crescente de empresas que criam e comercializam inimigos naturais em diversas localidades do país. Entretanto, muitos programas de controle biológico de pragas já desenvolvidos ficam impossibilitados de serem transferidos para as empresas e para os produtores pela falta de informação sobre uma das etapas: a tecnologia de liberação. A maioria das pesquisas brasileiras e internacionais concentra esforços na constatação da eficiência do agente biológico no controle da praga visada ou no desenvolvimento e/ou aprimoramento de técnicas de criação. Todo esse esforço tem como objetivo atender à demanda dos produtores quando o inimigo natural estiver sendo utilizado e, conseqüentemente, comercializado. No entanto, aspectos finais e importantes, como tecnologia para armazenamento, preparo, transporte e liberação desses agentes de controle biológico, são negligenciados pela maioria dos "pacotes tecnológicos". Poucas, se não raras, são as pesquisas que visam determinar qual a melhor técnica de liberação e as adaptações que ela deve sofrer, minimizando o efeito do ambiente sobre o "sensível" material biológico. Se já não bastasse a escassez de trabalhos, existe grande dificuldade no levantamento de informações a respeito da liberação em si, pois a 135 maioria das publicações na área de controle biológico omite detalhes importantes. Dentre estes podem ser citados: a forma de liberação do parasitóide ou predador, o horário de liberação, a relação entre a densidade populacional da praga e o número de predadores/parasitóides liberado, o recipiente utilizado, etc. A falta de conhecimento sobre os aspectos da liberação afeta não somente os resultados finais de um programa, mas também, muitas vezes, as fases iniciais dos projetos. Certamente, vários inimigos naturais foram considerados inadequados para serem empregados em programas de controle biológico pela forma inadequada de utilizá-Ios. Por outro lado, inimigos naturais tidos como excelentespara o controle de determinada praga não o foram em diversas outras situações por falta de detalhamento da metodologia de liberação. O desconhecimento parcial ou total de como o inimigo natural deve ser liberado em campo é, sem dúvida, um fator limitante para o sucesso de programas de controle biológico de diversas pragas no Brasil e no mundo. O mais preocupante é que esse desconhecimento poderá vir a comprometer muitos outros programas bem elaborados já existentes. Dentre os inimigos naturais, o parasitóide de ovos Trichogramma é, sem dúvida, o mais estudado quanto aos aspectos mencionados; muito pouco se sabe sobre os demais parasitóides e sobre os predadoresem geral. Vários outros aspectos devem ser levados em conta em um programa de controle biológico antes de o parasitóide ou predador ser introduzido no campo, como identificação, seleção de linhagens, armazenamento, preparo, transporte de agentes biológicos, etc. Desta forma, o conhecimento dos fatores envolvidos no processo de liberação de parasitóides e predadores no agroecossistema, será discutido neste capítulo. 4.2. FATORES QUE AFETAM A LIBERAÇÃO Sempre que um programa de controle biológico está para ser implementado, todos os fatores relacionados com o ato de liberação em si devem ser cuidadosamente levantados e estudados e os problemas solucionados antes que a nova tecnologia seja levada até o produtor. Se esses fatores não forem levados em consideração, poderão surgir problemas que certamente resultarão no insucesso de todo o programa. 136 A decisão da melhor época de liberação de um parasitóide ou predador, intimamente ligada ao nível populacional da praga, tem sido bem estudada por pesquisadores brasileiros e estrangeiros. A liberação do inimigo natural após o início da infestação da praga é a situação mais recomendada pela maioria das pesquisas, pois garante uma interrupção no aumento populacional da praga e a sobrevivência do agente biológico por mais tempo na cultura. Carnero (1997), citado por Pinto & Parra (2002), observou, em casa de vegetação, que a liberação da presa Tetranychus cinnabarinus (Boisduval), juntamente com o inimigo natural Phytoseiulus persimilis Athias- Henriot, garantiu um bom controle, mas a liberação deste uma semana após a infestação da praga proporcionou maior eficiência. Além da época, a fase de desenvolvimento da praga para que o inimigo natural possa ser liberado também é relevante. A liberação de Chrysoperlalucasina (Lacroix) contra Aphis fabae Scopoli deve ser feita antes que os primeiros adultos alados da praga apareçam. Trichogrammagalloi Zucchi prefere parasitar ovos de Diatraea saccharalis (Fabr.) com três dias de idade. Algumas vezes não é tão fácil realizar um levantamento populacional da praga e ainda saber em qual fase a maioria da população se encontra. Nesses casos podem-se utilizar meios indiretos para a determinação do momento ideal de liberação do agente. Isso se faz necessário quando a praga não é facilmente detectável, como acontece com lagartas broqueadoras de caules, ovos de difícil localização na planta etc. Por exemplo, para o controle da broca- da-cana, D. saccharalis,em cana-de- açúcar, utilizando-se o parasitóide de ovos T.galloi, as liberações devem ser iniciadas a partir do momento em que os primeiros machos forem capturados nas armadilhas de feromônio, pois é muito difícil determinar a densidade de ovos. O parasitóide larval Cotesia flavipes (Cameron), empregado para controlar a broca-da-cana, pode ser liberado na safra em que a praga está sendo prejudicial, quando as amostragens dos colmos indicarem que a maioria das lagartas apresenta cerca de 1,5cm de comprimento, ou na safra seguinte, quando a intensidade de infestação da broca, no momento da colheita, estiver ao redor de 3%. Entretanto, como já discutido, somente os aspectos mencionados não são suficientes para que a liberação dos inimigos naturais no campo tenha total 137 sucesso. São muitos os fatores que devem ser observados nessa etapa da pesquisa, assim como muitas vezes são enormes os obstáculos a serem suplantados. Como não é possível criar um guia passo a passo para solucionar os problemas no momento da liberação, uma vez que estes estão intimamente ligados ao inimigo natural, serão abordados aqui os problemas mais comumente encontrados no decorrer dos estudos de técnicas de liberação. Os fatores a serem levados em consideração no momento da liberação dos agentes de controle biológico estão relacionados com: (2.1) a arquitetura e a idade da planta; (2.2) as condições climáticas no momento da liberação; (2.3) a quantidade e a fase de desenvolvimento dos organismos liberados; (2.4) o número de pontos de liberação; (2.5) as técnicas de liberação; e (2.6) a freqüência e o intervalo entre liberações. 4.2.1. ARQUITETURA E IDADE DA PLANTA As espécies vegetais utilizadas para consumo humano e animal no mundo todo apresentam diferentes formas e tipos de crescimento, fatores estes inerentes à espécie. Tal variação na arquitetura das plantas compreende a disposição das folhas no ramo, a disposição dos ramos no caule, a disposição de flores e frutos na planta, a largura e o comprimento de folhas e folíolos, o tipo de crescimento, etc. Mesmo dentro da espécie há uma mudança na arquitetura da planta de acordo com o estádio fenológico em que se encontra a cultura (em função da idade da planta) ou em função de seu genótipo (variedade, cultivar, híbrido etc.). A arquitetura da planta pode influenciar o comportamento dos inimigos naturais. A joaninha Adalia bipunctata (L.) é encontrada principalmente em árvores (Gordon, 1985), enquanto a joaninha Hippodamia convergens (Guérin-Méneville), em vegetações mais baixas (Hodek, 1973), e ambas são predadoras de afídeos. Em contrapartida, as joaninhas Scymnus sp., Hyperaspis festiva Mulsant, Cycloneda sanguinea (L.), entre outras, têm sido observadas tanto na copa de plantas cítricas como na vegetação de cobertura de pomares de laranjeiras. Os efeitos da arquitetura vegetal no comportamento do agente de controle biológico podem ser significativos no bom desempenho do controle populacional da praga, podendo afetar a capacidade de busca, a eficiência e a dispersão do parasitóide ou predador. 138 Uma cultura ou um estádio da cultura em que a folhagem seja densa propicia a formação de um microambiente (microclima) adequado para a sobrevivência do inimigo natural liberado, onde a umidade é mantida e a insolação, evitada. Entretanto, um ambiente muito fechado pode dificultar a dispersão do inimigo natural e a localização da presa/hospedeiro por ele. 4.2.2. CONDIÇÕES CLIMÁTICAS O clima, sem dúvida, é um dos fatores mais importantes para toda decisão a ser tomada em qualquer uma das etapas de um programa de controle biológico com insetos e ácaros, visto que está sendo manuseado um ser vivo que é pecilotérmico (ou seja, sua temperatura interna é alterada de acordo com a variação térmica do ambiente) e que responde às variações de umidade do ar ou do solo, duração do período de luz, insolação etc. A liberação de um inimigo natural a uma temperatura acima ou abaixo da faixa térmica considerada ótima para o desenvolvimento pode afetar drasticamente sua sobrevivência em campo. Tal efeito costuma ser amenizado, ou não, de acordo com o método de liberação desse agente. As precipitações pluviométricas podem afetar um inimigo natural no momento de sua liberação. Se os inimigos naturais forem liberados na forma de pupa (como para Trichogramma) ou de ovo (como para crisopídeos), uma chuva logo apósa liberação pode carregá-Ias para o solo. Além disso, dependendo do recipiente de liberação (caso este fique no campo), é possível haver encharcamento e afogamento dos agentes liberados na forma de ovo, larva ou pupa (como para Trichogramma liberado em copos plásticos). O mesmo não ocorre para artrópodes liberados na fase adulta (como é o caso de C.flavipes para o controle da broca-da-cana, por exemplo, que se deslocarão no momento em que o recipiente for aberto. Temperaturas muito altas, associadas à insolação, também podem afetar a sobrevivência do agente de controle, assim como temperaturas baixas costumam diminuir sua eficiência de controle. Um bom exemplo de como o clima pode influenciar a liberação de inimigos naturais é o fato da liberação de T. galloi em diferentes formas e técnicas para o controle de ovos da broca-da- cana, ter sido observado que a condição climática é o principal fator a ser levado em conta no momento da liberação. As 139 chuvas que ocorreram nos dias das liberações ou logo depois delas carregaram as pupas de parasitóides e diminuíram sua eficiência de parasitismo. As baixas temperaturas de inverno acarretaram baixos índices de parasitismo, porém levaram a maior permanência do parasitóide no campo. A umidade relativa do ar não afetou o parasitismo, em função do estádio fenológico da cultura, que certamente sempre garantiu um microclima favorável para a sobrevivência e atuação do parasitóide. Finalmente, quando as condições climáticas são favoráveis ao parasitóide, a técnica de liberação não interfere na eficiência de parasitismo. Várias pesquisas apontam aumento na capacidade de busca de fêmeas de várias espécies do gênero Trichogramma à medida que se aumentava a temperatura, mantida constante, de 20 a 35°C, e outros verificaram que, abaixo da temperatura mínima (20°C), a atividade das fêmeas de Trichogramma chilonis Ishii ficava reduzida. 4.2.3. QUANTIDADE E FASE DE DESENVOLVIMENTO A quantidade de indivíduos a ser liberada dependerá sempre da quantidade da praga existente, verificada por meio de amostragens. Infelizmente, são raros os estudos que levam em conta a população da praga. Para o controle biológico clássico, quando se tem por objetivo a introdução de um novo agente de controle em determinada região, a quantidade a ser liberada não tem tanta importância quanto àquela exigida para o controle biológico aplicado. No primeiro, o agente deve ser liberado em pequenas quantidades para se perpetuar no novo ambiente, e no segundo, em grandes quantidades para regular a população da praga antes que esta atinja níveis prejudiciais à cultura em estudo. No entanto, para a definição da quantidade correta de artrópodes a ser liberada no ambiente, faz-se necessário o conhecimento da relação agente/praga ideal para que o controle seja bem- sucedido. Inicialmente, essa relação é definida em estudos de laboratório, onde a capacidade de predação/parasitismo do agente de controle biológico será determinada. Embora não possa ser extrapolada para as condições de campo, uma vez que foi estabelecida em ambiente fechado, livre de influências diversas, tais como efeitos do clima, da competição entre os inimigos naturais, capacidade de dispersão, etc., tal relação fornece ao 140 pesquisador uma idéia muito boa da real capacidade de controle do agente em estudo. Posteriormente, em estudos de campo, poderá ser definida de forma mais adequada a relação ideal. A liberação do inimigo natural em quantidades menores que a necessária para o efetivo controle da praga acarretaria ineficiência do agente, o que seria extremamente maléfico para um programa de controle biológico aplicado. Em contrapartida, a liberação de uma quantidade excessiva de artrópodes para o controle de determinada praga, além de um desperdício de recursos, que resultaria em um aumento no custo de aplicação, poderia também diminuir a eficiência de controle. Este último fato é mais importante para parasitóides, pois muitos desses insetos utilizam-se de cairomônios para a marcação dos hospedeiros parasitados. As fêmeas que chegam primeiro sobre um grupo de hospedeiros realizam o parasitismo de alguns e os marcam com cairomônios específicos. O excesso de cairomônios no microambiente pode provocar sua saturação, causando nas fêmeas que chegarão depois uma falsa impressão de que todos os hospedeiros já foram parasitados e fazendo com que esses parasitóides se dispersem. Dessa forma, alguns hospedeiros escapariam ilesos no meio da confusão, diminuindo, assim, a eficiência de parasitismo do agente de controle biológico. Esse fato foi observado por Pinto (1999), citado por Pinto & Parra (2002), para o parasitóide T. galloi parasitando ovos de D. saccharalis em cana-de- açúcar, porém em uma situação inversa. O autor constatou que, quanto maior era a densidade de ovos por ponto de infestação, menor era a eficiência de parasitismo registrada. Isso ocorria provavelmente devido à confusão causada nas fêmeas pelo excesso de cairomônios no local, onde os ovos mais periféricos eram parasitados por uma ou mais fêmeas e, com a chegada de novas fêmeas, estas constataram os sinais ali deixados (nos ovos periféricos) e migraram para novos locais, deixando os ovos centrais sem sofrerem parasitismo. Tal situação dificilmente aconteceria em condições naturais, onde as posturas da praga são bem distribuídas pelas plantas; entretanto, em parcelas experimentais, aquela seria uma situação muito comum, pois freqüentemente são colocadas grandes quantidades de ovos por ponto de infestação. Nem sempre as tentativas de descobrir a quantidade de inimigo natural ideal a ser liberada resultaram em melhoria na eficiência do controle biológico. Na 141 Nicarágua, Dufour et al. (1996), citados por Pinto & Parra (2002), avaliaram o efeito da liberação de duas densidades do parasitóide C.stephanoderis para o controle da broca-do-café, após a colheita e concluíram que quatro liberações na razão de um parasitóide para quatro frutos infestados ou duas liberações na razão de um parasitóide para cinco frutos infestados não resultaram em uma diferença significativa na eficiência de parasitismo, que ficou ao redor de 53%. Além da quantidade, a fase de desenvolvimento do inimigo natural a ser liberado também é um fator muito importante. Geralmente as fases são escolhidas pela facilidade de manuseio e obtenção ou resistência às condições adversas que possuem. A fase de ovo é preferida para liberação de algumas espécies predadoras que são canibais na fase larval, como no caso de crisopídeos, mas para algumas pragas essa fase não tem sido eficiente. Por exemplo, a liberação de ovos de C. carnea para o controle de Leptinotarsa decimlineata (Say) mostrou-se ineficiente, enquanto a liberação de larvas de segundo e terceiro ínstares causou uma redução populacional da praga de mais de 85%. Entretanto, a fase adulta é a mais liberada entre os predadores e os parasitóides. No caso dos predadores, os adultos dispersam com mais eficiência, e coccinelídeos, dermápteros, etc. são mais vorazes. Entre os parasitóides, além da dispersão, esta é a fase em que eles prontamente parasitam. Historicamente, os tricogramatídeos são liberados na fase adulta. No entanto, a liberação de pupas dentro dos ovos de seus hospedeiros, quando protegidas em embalagens adequadas, tem mostrado melhor eficiência no parasitismo. 4.2.4. NÚMERO DE PONTOS DE LIBERAÇÃO O número de pontos de liberação está diretamente associado à capacidade de dispersão do inimigo natural. Quanto maior é a capacidade de dispersão (distribuição)etárias mais baixas por que: (1) os animais mais jovens são mais fáceis de capturar; (2) eles apresentam menor vigor e velocidade; (3) são menos capazes de superar as estratégias dos predadores e (4) podem mesmo não ter a capacidade de reconhecer os predadores. Por esse motivo, os efeitos da predação sobre a população de presas terão sido menores do que seriam de outra maneira, porque as gazelas jovens não teriam contribuído reprodutivamente para a população e muitas teriam morrido por outras causas antes de estarem adequadas para reproduzir. O mesmo raciocínio pode 14 ser seguido para presas velhas, ou seja, aquelas que já passaram da idade reprodutivamente viável. Uma das, se não a principal, polêmica da relação entre predadores e presas refere-se, certamente, à amplitude alimentar de cada predador. Será que há um predador que possa devorar tudo pela frente? Predadores generalistas são de fato generalistas? Qual seria a importância de um especialista? Qual organismo deveria desempenhar melhor controle de sua presa em campo: um predador especialista ou generalista? De fato, tais dúvidas são corriqueiras quanto ao planejamento do uso de inimigos naturais de pragas agrícolas, pois como nem todos os predadores, também nem todas as pragas são iguais ou do mesmo tipo. Tanto predadores (especialistas ou generalistas) quanto suas presas, possuem funções ecológicas diferenciadas como resultado de milhões de anos de evolução. Assim os profissionais que trabalham com o controle biológico possuem o desafio de adequar suas ferramentas (predadores, parasitóides ou entomopatógenos) ao problema existente e ainda obter êxito em tal operação. Tal adequação dependerá de vários fatores, dentre eles, da amplitude alimentar do predador. A amplitude seria a faixa de variação dos tipos de alimentos consumidos por um predador e depende, consideravelmente, do seu ato de forrageio. De maneira geral, qualquer predador precisa desprender tempo e energia, primeiro na busca de sua presa e depois na manipulação (perseguição, subjugação e ingestão). No ato da busca, um predador está propenso a encontrar uma ampla variedade de itens alimentares. A amplitude da dieta, portanto, depende da resposta dos predadores, uma vez que eles tenham encontrado as presas. Os generalistas, aqueles com larga composição na dieta, perseguem uma grande proporção dos tipos de presa que encontram. Os especialistas, aqueles com uma estreita composição na dieta, continuam as buscas, até encontrar a presa de seu tipo específico preferido. Predadores generalistas têm a vantagem de gastar, relativamente, pouco tempo de busca – a maior parte dos itens que encontram eles perseguem e, se tiverem sucesso, consomem. Mas, por outro lado, sofrem a desvantagem de incluir em sua dieta itens com baixo proveito nutricional. Dessa forma, os generalistas contam com o benefício do consumo líquido de energia, sobretudo oriundo do tempo – mas sua taxa de consumo é, em geral, relativamente baixa. Os especialistas, por outro lado, 15 têm a vantagem de somente incluir itens altamente proveitosos em suas dietas. Entretanto, esses sofrem a desvantagem de despender um tempo relativamente grande na busca de presas. Assim, os especialistas expandem relativamente longos períodos com desperdício de energia líquida – mas, quando consomem algo energético, eles o fazem numa taxa relativamente elevada. A determinação da estratégia de forrageio ótimo prevista para um predador em particular compreende a determinação de como estes pontos a favor e contra deveriam ser balanceados no sentido de maximizar a taxa líquida global de consumo de energia, durante a busca e manipulação da presa. A sentença verdadeira é que qualquer predador incluirá em sua dieta o tipo mais proveitoso de presa, ou seja, aquele para o qual a taxa líquida de consumo de energia é mais alta. O último aspecto importante para discussão das relações entre predadores e presas seria a ocorrência inevitável de ciclos populacionais. A maioria das pragas agrícolas e dos inimigos naturais surgem através de surtos (ou explosões) populacionais repentinas detectadas em campo. Mas, quais seriam os fatores que poderiam propiciar aumento da população de presas? (1) escassez de predadores, (2) abundância alimentar, (3) ausência de competição intra ou inter-específica e (4) condições abióticas favoráveis. Dessa forma, supondo que exista uma grande população de presas, supostamente, os predadores deveriam sair-se bem diante dessa população, consumindo muitas presas e dessa forma aumentando sua própria abundância. A grande população de presas permite, então, a existência de uma grande população de predadores. Dessa forma, a grande população de predadores é a causa da existência de uma pequena população de presas. Assim, os predadores enfrentam um dilema: um grande número deles e muito pouco alimento. Suas abundâncias declinam. Porém, isso provoca um alívio da pressão sobre as presas; a pequena população de predadores provoca o surgimento de uma grande população de presas – e as populações voltam ao que eram quando começaram. Ou seja, há uma tendência básica de os predadores e suas presas experimentarem oscilações conjuntas na abundância, sendo que tais oscilações também são chamadas de ciclos populacionais, essencialmente devido ao tempo de atraso na resposta da abundância do predador em relação àquela da presa, e vice-versa. 16 A previsão e quantificação (através de amostragens) de tais oscilações possuem sua importância em programas de controle biológico, pois pode-se incrementar o nível populacional de predadores quando esses encontrarem-se em baixas quantidades através de liberações inundativas, inoculativas ou técnicas específicas de manejo cultural. Entretanto, como vimos nesse capítulo, a regulação populacional de qualquer organismo por agentes de mortalidade natural não é tão simples como se imagina sendo que o conhecimento sobre o tipo de presa (no caso, a praga), sobre o tipo de predador que se deseja utilizar para o controle daquela, além do próprio sistema onde estão contidos esses dois componentes são aspectos básicos que devem ser considerados em qualquer programa de controle biológico onde se almeje obter sucesso. 17 SUGESTÃO DE LEITURA Begon M., Townsend C.R. & Harper J.L. (2005). Ecology form individuals to ecosystems. Blackwell Publishing. 4th. Ed. 759 p. Gold C.S., Pena J.E. & Karamura E.B. (2001). Biology and integrated pest management for the banana weevil Cosmopolites sordidus (Germar) (Coleoptera: Curculionidae). Integrated Pest Management Reviews. 6: 79-155. Townsend C.R., Begon M. & Harper J.L. (2006). Fundamentos em ecologia. Artmed. 2ª Ed. 18 CONCEITO, IMPORTÂNCIA E MÉTODOS DE CONTROLE EMPREGADOS ÀS PRAGAS AGRÍCOLAS APRESENTAÇÃO As pragas agrícolas farão parte do cotidiano do ser humano enquanto este aventurar-se em produzir alimentos, fibras e matérias primas para as suas necessidades alimentares e econômicas. E dentre a enormidade de seres vivos que competem por alimento com o Homo sapiens, destacam-se os insetos, em quantidade (1 milhão de espécies, sendo que apenas 10% são pragas) e enormidade de prejuízos (prejuízos econômicos de bilhões de dólares por ano em todo o mundo). Apenas o bicudo do algodoeiro, Anthonomus grandis, um curculionídeo de apenas 7 mm de comprimento, devido ao potencial crescente de infestação, pode acarretar prejuízos de até 100% da produção se as medidas de controle nãodo agente, menor será o número de pontos de liberação dentro de uma área determinada, e vice-versa. A quantidade de pontos de liberação, dessa forma, pode variar bastante, pois a dispersão do inimigo natural está relacionada com a espécie e linhagem escolhidas com a arquitetura da planta (espécie ou variedade) e com as condições climáticas. Yu & Byers (1994), citado por Pinto & Parra (2002), utilizaram Trichogramma brassicae Bezdenko para controlar Ostrinia nubilalis (Hübner) em milho e 142 observaram que liberações realizadas em 25 pontos/ha foram tão efetivas quanto aquelas realizadas em 49 pontos. No Brasil, Trichogramma tem sido liberado em 25 pontos/ha para a broca- da-cana em cana-de-açúcar e em 130/ha para a lagarta-da-soja em soja. Muitas vezes, a quantidade exagerada do número de pontos de liberação acaba por inviabilizar a liberação manual do inimigo natural. 4.2.5. TÉCNICAS DE LIBERAÇÃO A técnica de liberação é o ato de liberação propriamente dito. Nesse caso, inúmeros fatores devem ser levados em conta, pois a omissão de qualquer dado pode resultar no insucesso de um projeto. Alguns aspectos relacionados ao ato de liberação que se têm mostrado importantes em muitas pesquisas são os seguintes: Tipo de recipiente para liberação. Além de garantir proteção aos inimigos naturais contra predadores e adversidades climáticas, deve ser de material atóxico, economicamente viável e de fácil manuseio, transporte e distribuição pela área a ser tratada. Fase de desenvolvimento em que o inimigo natural é liberado. A fase e a idade do inimigo natural são de extrema importância para a eficácia da técnica de liberação adotada. Nesse caso, devem ser levados em consideração aspectos relacionados à bioecologia do parasitóide/predador. Modo de liberação. Independentemente de a liberação ser manual ou mecanizada, via terrestre ou aérea, em pontos fixos ou por meio de espalhamento dos agentes, em um ou vários pontos dentro da área, em um ponto central ou nas laterais da área etc., tais fatores devem ser testados e levados em consideração. A liberação de inimigos naturais protegidos da ação de predadores e do clima, como a chuva, tem sido referida por diversos autores como a forma mais adequada para obter sucesso. A maioria dos inimigos naturais é liberada simplesmente pela soltura de adultos no campo. Uma das exceções é para Trichogramma, pois existe uma grande variedade de métodos de liberação. 4.2.6. FREQUÊNCIA E INTERVALO ENTRE LIBERAÇÕES Outros fatores muito importantes para o sucesso da liberação de um agente de controle biológico são a freqüência e o intervalo entre liberações. Muitos inimigos naturais atuam por pouco tempo no campo após a liberação e, depois de certo tempo, necessitam ser 143 novamente liberados para que a praga seja mantida em níveis não prejudiciais à cultura. Esse é o caso dos inimigos naturais que atuam específica e/ou eficientemente sobre curtos intervalos do desenvolvimento da praga, característica esta mais comum aos parasitóides. Um exemplo é o parasitóide T.galioi, que parasita ovos da broca-da-cana (com período de incubação de dez dias, aproximadamente) e prefere aqueles com dois a cinco dias de idade. Se a broca-da-cana, a partir do aparecimento do primeiro adulto no canavial, permanece ovipositando por um período de cerca de três meses consecutivos e T. galioi atua durante seis dias após sua liberação, tem-se uma idéia da importância da manutenção desse agente de controle biológico no campo durante todo o período de oviposição da praga. Para que isso seja possível, somente o aumento da freqüência de liberações em intervalos regulares garantirá o sucesso do programa. Devido à necessidade de manutenção de T.galioi em campo para o controle da broca-da-cana, chegou-se à conclusão de que seriam necessárias três liberações desse parasitóide (200 mil insetos cada), associadas a uma liberação do parasitóide larval C.flavipes (6 mil insetos), para que os resultados fossem considerados satisfatórios. No Japão, Iga (1997), citado por Pinto & Parra (2002), realizou liberações do parasitóide importado Diadegma semiclausum (Hellen) (Hymenoptera, Ichneumonidae) para o controle da traça Plutelia xylostelia (L.) em repolho, em diferentes freqüências, durante três anos. Quando o parasitóide foi liberado uma única vez, em 1991, o autor conseguiu 30% de controle da praga durante um mês. Em 1992, quatro liberações foram realizadas, em intervalos de dez dias, e o parasitismo atingiu cerca de 70% após cinqüenta dias da primeira liberação. Entretanto, quando o número de liberações foi aumentado para oito em 1993, constatou-se que esse acréscimo não foi benéfico, pois o parasitismo manteve-se ao redor de 70%. Ao discutir a liberação de predadores, todos os fatores mencionados anteriormente são válidos para esse grupo, mas os mais importantes são a quantidade de agentes liberada e a forma como são liberados. Secundariamente, pode-se considerar a dispersão do predador um problema. Dispersão do predador. A dispersão do predador tem sido considerada um problema especialmente nos casos de liberação inoculativa sazonal, pois 144 dificilmente o inseto permanece no local de liberação. Entretanto, deve-se levar em consideração que o problema da dispersão ocorre em condições experimentais, devido ao pequeno tamanho das parcelas; em grandes áreas, certamente tal problema será menos evidente. Realizaram-se muitas pesquisas sobre liberação com predadores cujas asas foram removidas ou coladas. No entanto, tratam-se de técnicas economicamente inviáveis para serem utilizadas em controle biológico aplicado. A utilização de cairomônios e sinomônios conjuntamente com a liberação do predador pode favorecer a permanência deste no local desejado e estimular o aumento da procura e controle da praga, como foi observado para Stethorus punctum (LeConte), C.carnea, H. convergen e Harmonia axyridis (Pallas). 4.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora muitos programas de controle biológico aplicado sejam uma realidade em todo o mundo, as informações sobre técnicas de liberação são escassas. Fazem-se necessárias pesquisas nessa área para evitar perdas, principalmente devido às condições climáticas adversas e à ação de predadores. Esses problemas agravam-se nas regiões tropicais, como o Brasil, onde a diversidade e a quantidade de predadores, em especial de formigas, são tão grandes que, se não forem tomadas medidas para evitar tal predação, as perdas podem chegar a ser totais. Deve-se investir essencialmente em técnicas de liberação terrestres, pois é muito difícil que as técnicas mecanizadas sejam utilizadas no Brasil, particularmente nessa fase inicial do controle biológico. Contudo, é conveniente salientar que para o sucesso do programa é fundamental que, ao lado de uma técnica de liberação apropriada, se levem em consideração outros parâmetros, como qualidade do inseto produzido para liberação, número de inimigos naturais liberados, época e número de pontos de liberação e freqüência e intervalo de liberações. 145 SUGESTÃO DE LEITURA Gallo, D.; Nakano, O.; Silveira Neto, S.; Carvalho, R.P.L.; Baptista, G.C.; Berti Filho, E.; Parra, J.R.P.; Zucchi, R.A.; Alves, S.B.; Vendramim, J.D.; Marchini, L.C.; Lopes, J.R.S.; Omoto, C. Entomologia agrícola. Piracicaba: FEALQ, 2002. 920p. Parra, J.R.P. Criação massal de inimigos naturais. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.143-164. Pinto, A.S. & Parra, J.R.P. Liberaçãode inimigos naturais. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.325-339. 146 COMERCIALIZAÇÃO, REGULAMENTAÇÃO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE INIMIGOS NATURAIS APRESENTAÇÃO Inimigos naturais podem ser considerados como produtos comerciais. A prova disto é que hoje, apenas falando do Brasil, o número de empresas privadas que comercializam agentes de mortalidade natural mais que triplicou nos últimos dez anos. Na Europa, Estados Unidos e parte da Ásia esse tipo de comércio já vem sendo realizado a bastante tempo. Entretanto, há a necessidade de se impor barreiras, em âmbitos de fiscalização, aos organismos vivos que chegam em nosso país. Vários exemplos de insetos que utilizam como hospedeiros diversas culturas de importância econômica, aqui no Brasil, foram originários de outros países e por descuido dos órgãos de fiscalização brasileiros, hoje possuem status de praga-chave. Um exemplo clássico é o do bicudo-do-algodoeiro, Anthonomus grandis. Entretanto, inúmeros casos de sucesso também são relatados de inimigos naturais exóticos (originários de outros países) que mantiveram, sob baixo nível populacional, várias pragas importantes perpetuando a idéia de quanto é eficiente a idéia do controle biológico clássico. 8 147 1. INTRODUÇÃO O interesse pelo controle biológico tem crescido consideravelmente no mundo em resposta aos efeitos adversos dos agrotóxicos sobre o ambiente e a biodiversidade, e em função do novo direcionamento internacional da produção agrícola, para favorecer a conservação e o uso sustentável dos recursos biológicos, requisitos básicos da Convenção da Biodiversidade. Políticas internacionais demandam fortemente alternativas para os pesticidas químicos, portanto o uso de inimigos naturais de pragas é uma alternativa promissora. O Brasil é um dos poucos países do mundo detentores da chamada megadiversidade biológica, ou seja, de ecossistemas importantes ainda íntegros. Essa biodiversidade pode oferecer oportunidade ímpar para o controle de pragas tanto no Brasil como em outros países, com a identificação de novos organismos com potencial para serem utilizados no controle biológico. Mundialmente, 164 espécies entre insetos e ácaros já foram controlados total ou parcialmente com a introdução de agentes de controle biológico, o que tem representado a economia de uma soma vultosa de divisas por parte de diferentes países. Uma análise das tentativas de controle biológico de plantas invasoras anteriores a 1980, foi realizada; as informações coletadas de 174 projetos pára o controle de 101 espécies mostraram que 39% dos projetos foram considerados bem sucedidos e elevaram o nível de controle de 38 plantas. Os insetos compreenderam 98% das liberações e mais de 94% foram de Coleoptera, Lepidoptera, Hemiptera e Diptera. O uso de agentes nativos resultou em 62% de controle efetivo (11 espécies de insetos), no entanto, ecologicamente, podem ser considerados "exóticos" pois muitas liberações foram realizadas onde as espécies não habitavam anteriormente. 2. O CONTROLE BIOLÓGICO CLÁSSICO NO BRASIL O controle biológico de pragas pela introdução e estabelecimento permanente de inimigos naturais exóticos tem sido praticado por anos. No Brasil, a primeira tentativa nesse sentido data do início deste século, com a introdução em 1916 de Prospaltella berlesi (Howard) (Hymenoptera:Aphelinidae) para o controle da cochonilha-branca-da- 148 amoreira Pseudaulacaspis pentagona (Farg-Tozz) no Estado de São Paulo. Várias outras introduções de agentes de controle biológico foram realizadas nos anos seguintes contribuindo para programas de grande sucesso principalmente no controle de insetos pragas, como as introduções de inimigos naturais para o controle da cochonilha australiana, Icerya purchasi Maskell em 1920; do pulgão-lanígero- da-macieira, Eriosoma lanigerum (Hausmann) em 1923; da broca-do-café, Hypotenemus hampei (Ferrari) em 1929; da broca-da-cana-deaçúcar, Diatraea saccharalis (Fabricius) em 1934, 1942 e 1951 e da cochonilha-das- pastagens, Antonina graminis (Maskell) em 1967. A partir da década de 1970 ocorreram os casos de maior sucesso de controle biológico clássico de pragas no país, como a introdução de parasitóides dos gêneros Aphelinus, Aphidius, Ephedrus e Praon,e dos predadores dos gêneros Hippodamia e Coccinella no controle de pulgões do trigo na região sul. Também no caso da broca da cana-de- açúcar desde 1975, as usinas de açúcar das regiões sul e nordeste do país vinham criando massivamente e liberando no campo o parasitóide Cotesia flavipes (Cameron) com grande sucesso, conseguindo-se reduzir a porcentagem de infestação da broca de 6,6 para 3,7%, entre 1975 a 1990; sem o uso de produtos químicos. Mais de 30 laboratórios produziram esse parasitóide no Brasil, para a realização de liberações periódicas. Na cultura da soja,o uso do vírus da poliedrose nuclear Baculovirus anticarsia (VPN Ag) aplicado em mais de 1 milhão de hectares de soja para o controle da lagarta Anticarsia gemmatalis Hübner., tem representado ganhos de divisas para o Brasil. O cntrole biológico da traça-do- tomateiro, Tuta absoluta (Meyrick), é outra contribuição da Embrapa, especialmente do Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico SemiÁrido (CPATSA), Petrolina-PE, pela importação do parasitóide Trichogramma pretiosum, Riley, da Colombia. Esta introdução resultou em um importante programa de controle biológico a essa praga até então pouco conhecida no país, onde empresas particulares e órgãos públicos iniciaram a operação de laboratórios de criação deste parasitóide, para uso próprio ou para comercialização. O manejo integrado dessa praga pela associação de métodos cultural, microbiológico, biológico, químico e legislativo apresentou como destaque para o controle bilógico o principal 149 suporte desse programa, resultando na adoção por parte dos produtores de tomate do uso do parasitóide T. pretiosum. Uma série de outros programas de controle biológico clássico estão sendo desenvolvidos no Brasil com grande potencial de sucesso, podendo ser citados entre outros: o controle da vespa-da-madeira Sirex noctilio Fabricius, importante praga de Pinus sp., com os inimigos naturais Megarhyssa nortoni (Cresson) (parasitóide introduzido da Austrália) e com a utilização do nematóide Deladenus siricidicola (Bedding). Este último tem proporcionado controle de até 72% da praga. 3. ATIVIDADES DE QUARENTENA O controle biológico clássico envolve a transferência de organismos vivos inimigos naturais de pragas, de seus ecossistemas nativos para novos ecossistemas, na expectativa de que estes organismos se estabeleçam e promovam o controle da praga desejada. No transporte de organismos vivos ocorrem riscos, uma vez que juntamente com os organismos benéficos podem ser transferidos outros organismos contaminantes, passíveis de causarem efeitos indesejáveis ao ambiente, como também o próprio agente de controle pode se mostrar indesejável no ecossistema receptor após determinado período de tempo. No caso de agentes de controle biológico exóticos, toda introdução apresenta um risco potencial, levando- se em consideração a expectativa de que o organismo possa tornar-se permanentemente estabelecido e sua erradicação praticamente inexequível, ou mesmo impossível após sua disseminação. Vários trabalhos recentes têm questionado a segurança do controle biológico clássico, e especificadamente,o uso de inimigos naturais generalistas. Tais trabalhos, citaram muitos exemplos de introduções que resultaram em severos impactos sobre organismos não visados, extinções, perda de biodiversidade e desbalanço de comunidades nativas. Entretanto, muitos dos exemplos não apresentam comprovação científica e são baseados em informações circunstanciais. Poucos exemplos existem documentados, de impactos negativos do uso de agentes de controle biológico. Quanto aos agentes de controle nativos, geralmente usados de forma inundativa como é o caso dos bioinseticidas, eles também apresentam potencial de dano, pois estarão 150 distribuídos espacialmente e temporalmente de forma diferente da usual, podendo atingir diferentes ambientes e organismos normalmente não expostos. Apesar da escassa comprovação das conseqüências negativas do uso de agentes de controle biológico, seus possíveis impactos sobre a biodiversidade necessitam ser melhor estudados e compreendidos, e isso tem feito com que muitos governos, instituições e agências de regulamentação aumentem o rigor nessas atividades. Projetos de lei, códigos de conduta e implementação de protocolos de testes de especificidade mais rigorosos, visando à segurança do uso de agentes de controle biológico, têm sido elaborados nos últimos anos. A garantia de segurança de cada introdução de agentes biológicos é de vital importância e deve ser realizada de maneira oficial por instituições e pessoas credenciadas, justificando a existência de Laboratórios de Quarentena para Agentes de Controle Biológico (capítulo 1). No Brasil a partir de 1991, foi credenciado pela Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária, do Ministério a Agricultura e do Abastecimento, mediante Portaria no. 106 de 14 de novembro de 1991, o Laboratório de Quarentena "Costa Lima" especializado no intercâmbio de agentes de controle biológico. Compete ao Laboratório "Costa Lima" avaliar tecnicamente os pedidos de introduções de inimigos naturais exóticos, proceder à quarentena e exportação de organismos úteis para fins de controle biológico de pragas, atendendo às demandas nacionais e internacionais; como também auxiliar o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) com pareceres técnicos sobre pedidos de importações/ exportações de organismos exóticos, não agentes de controle. O número de introduções de agentes biológicos de controle no Laboratório de Quarentena aumentou consideravelmente, de 32 no período de 1991 a 1996 (incluindo artrópodes, nematóides e microrganismos) para um total de 80 introduções de inimigos naturais até maio 1999. Estas introduções correspondem a 42 organismos úteis diferentes, sendo 29 importações parasitóides (Hymenoptera), 11 de ácaros predadores (Phytoseiidae e Acarophenacidae), 4 de nematóides (Neotylenchidae e Steinernematidae), 2 de predadores (Coccinellidae e Pentatomidae) e 34 de microorganismos (Fungos e Bactérias), atendendo 151 solicitações de diferentes Instituições de Pesquisa brasileiras. Foram exportados no mesmo período para Instituições de Pesquisa Internacionais, por intermédio de projetos cooperativos, 30 remessas de agentes de controle biológico, correspondendo a 18 espécies diferentes. Para os Estados Unidos foi exportado um parasitóide, Encarsia formosa Gahan, para controle da mosca- branca; 8 espécies de moscas parasitóides da família Phoridae para o controle biológico da formiga lava-pés e a mosca, Ormia depleta (Towns.), para controle da paquinha do gênero Scapteriscus. Para a África foram enviados 5 espécies de ácaros predadores da família Phytoseiidae, e uma espécie do microrganismo Neozygites sp. para controle do ácaro- verde-da-mandioca. Para o Japão o predador Trissolcus basalis (Wollaston) para o controle do percevejo Nezara viridula Linneu na soja; e para a Holanda o parasitóide Trichogramma sp. para estudos taxonômicos. 4. REGULAMENTAÇÃO SOBRE O TRÂNSITO DE INIMIGOS NATURAIS 4.1. Importação de organismos. A importação de agentes de controle biológico exótico no Brasil, estão estabelecidas em uma série de regulamentações. No caso desses agentes exóticos é competência do Ministério da Agricultura e do Abastecimento (MA) emitir o parecer final de permissão de importação e liberação no ambiente. Nestes casos, o Laboratório de Quarentena "Costa Lima" desempenha um papel primordial, fornecendo ao MA o parecer técnico sobre a conveniência ou não de cada introdução, após a realização de uma avaliação de risco que leva em consideração principalmente o efeito adverso sobre organismos benéficos não visados. 4.2. Exportação de organismos. Para realizar a exportação de agentes de controle biológico do Brasil é exigido do país importador o "Import Licence", remetido pela Instituição solicitante. Também deverá ser anexado ao processo uma Declaração ("Statement", em português e inglês) sobre o organismo a ser exportado. Toda a documentação mais o pacote contendo os organismos a serem exportados serão encaminhados ao MA no Aeroporto, para a obtenção do Atestado Fitossanitário e posterior remessa ao destinatário. Para a coleta de agentes de controle biológico no Brasil por cientistas estrangeiros, pertencentes a 152 Instituições oficiais ou oficializadas, é necessário juntamente com uma contraparte nacional, solicitar uma licença especial de coleta de material biológico para estudos científicos; à Superintendência de Cooperação Internacional, Diretoria de Programas Especiais/CNPq; do Ministério da Ciência e Tecnologia-MCT , Brasília- DF. Informações sobre essa solicitação poderão ser acessadas no site do CNPq (http://www.cnpq.br). 4.3. Comercialização de organismos. Para a comercialização dos agentes microbianos de controle biológico no Brasil, a legislação é a mesma para os agrotóxicos e afins, dentre os quais se incluem biopesticidas, e somente recentemente uma legislação específica para o registro de biopesticidas foi proposta. Em 1997 o Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal (MMA) pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA) publicou Portaria Nornativa IBAMA n° 131, de 03 de Novembro de 1997 que trata da avaliação de risco de agentes microbianos de controle; estabelecendo que esta deverá ser realizada com base nas características do produto, referente à sua identificação, ao processo de fabricação, às suas propriedades físico- químicas, aos aspectos tóxico- patológicos sobre organismos não- visados e o comportamento ambiental do agente microbiano de controle. Para a comercialização de artrópodes benéficos no país ainda não existe ainda legislação específica. Os requisitos exigidos pelos Órgãos Federais para o Registro Comercial de um produto microbiano incluem informações sobre a identidade dos agentes de controle e possível efeito adverso sobre os organismos não- visados benéficos do ambiente, incluindo o homem. As informações e testes exigidos são estabelecidos em Protocolos Oficiais publicados pelos Órgãos Registrantes. No caso de produtos que contenham agentes microbianos com moléculas ADN recombinantes, como também para as plantas transgênicas, estes deverão ser analisados pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) de acordo com a Lei Brasileira de Biotecnologia n° 8974/95. No Brasil, até o momento, só foi permitida a introdução de plantas transgênicas para fins experimentais, não existindo ainda regulamentação para os microrganismos. 5. O CONTATO ENTRE OS ADEPTOS DO CONTROLE BIOLÓGICO 153 Para tornar as informações sobre o intercâmbio de organismos benéficosdisponíveis ao usuário e demais interessados, o Laboratório de Quarentena "Costa Lima", em parceria com a Fundação Tropical de Pesquisa e Tecnologia "André Tosello" em Campinas-SP, disponibilizou via Internet desde 1994 pelo endereço http://www.bdt.org.br/bdt/biocontrol o "Sistema Internacional de Informações sobre Controle Biológico" o qual é formado por diversas bases de dados e uma lista de discussão (Biocontrol- I). As bases de dados são referentes a "Quem é quem em Entomologia", em "Biodiversidade" e em "Análise de Risco"; "Legislação sobre Controle Biológico"; "COSAVE", "Relatório das Introduções/Exportações de Agentes de Biocontrole no Brasil" e "Publicações sobre Controle Biológico da Embrapa Meio Ambiente". A Biocontrol- l possui 500 subscritos provenientes dos cinco continentes, discutindo questões relativas ao controle biológico de pragas. Essa lista pode ser acessada pelo endereço: listserv@bdt.org.br. 154 SUGESTÃO DE LEITURA Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.. O futuro do controle biológico. In: Parra, J.R.P.; Botelho, P.S.M.; Corrêa-Ferreira, B.S.; Bento, J.M.S. (Ed.). Controle biológico no Brasil. São Paulo: Manole, 2002. p.581-587. Sá, L.A.N.; Tambasco, F.J.; Lucchini, F. Importação, exportação e regulamentação de agentes de controle biológico no Brasil. In:Paes Bueno, V.H. (Ed.). Controle biológico de pragas: produção massal e controle de qualidade. Lavras: UFLA, 2000. p.187-196. 155 CONTROLE BIOLÓGICO DE DOENÇAS DE PLANTAS APRESENTAÇÃO O pressuposto de que todo organismo alimenta-se e é alimento de outro ser vivo adequa-se também a um ramo do controle biológico relacionado com as doenças de plantas. Fungos (e outros microrganismos) podem se alimentar de vários microrganismos danosos às plantas. Dessa forma objetiva-se que as atividades determinantes da doença envolvendo crescimento, infectividade, agressividade, virulência e outras qualidades do patógeno ou processos que determinam infecção, desenvolvimento dos sintomas e reprodução sejam prejudicadas por um agentede mortalidade natural. Ao invés de predadores e/ou parasitóides que já foram bastante referidos ao longo do curso, para o controle biológico de doenças o termo antagonista é melhor empregado e designa agentes biológicos com potencial para interferir nos processos vitais dos fitopatógenos, estando estas raças ou espécies adaptadas ecologicamente ao mesmo tecido das plantas que os ocupados pelos patógenos, mas sendo apatogênicas às mesmas. Pouco é estudado na literatura científica sobre esse tipo de controle biológico, principalmente no Brasil, o que desperta o interesse e abre perspectivas promissoas de controle efetivo pelo fato das doenças de plantas, junto com os insetos herbívoros, serem os principais fatores de prejuízos agrícolas. 9 156 1. INTRODUÇÃO O incremento dos custos do controle químico, a perda de eficiência de alguns desses produtos e os problemas ambientais advindos destas práticas, indicam a necessidade da busca de alternativas para o controle de fitopatógenos, dentre os quais a utilização de agentes biológicos se coloca em destaque. O controle biológico de doenças de plantas iniciou-se como ciência em 1926, quando B.B. Sanford publicou um trabalho sobre fatores que afetavam a patogenicidade de Streptomyces scabies, agente causal da sarna comum da batata. Em 1931, Sanford e W.C. Broadfoot empregaram pela primeira vez o termo “controle biológico”, em um artigo sobre o mal-do-pé do trigo, causado por Gaeumannomyces graminis var. tritici. No contexto do controle biológico, doença é o resultado de uma interação entre hospedeiro, patógeno e diversos não patógenos que também habitam o sítio de infecção e que apresentam potencial para limitar a atividade do patógeno ou aumentar a resistência do hospedeiro. Deste modo, os componentes do controle biológico são o patógeno, o hospedeiro e os antagonistas, sob a influência do ambiente, todos interagindo num sistema biológico. O controle biológico de doenças de plantas pode ser definido como “a redução da densidade de inóculo ou das atividades determinantes da doença, através de um ou mais organismos”. Nesta definição, as atividades determinantes da doença envolvem crescimento, infectividade, agressividade, virulência e outras qualidades do patógeno ou processos que determinam infecção, desenvolvimento dos sintomas e reprodução. Os organismos incluem indivíduos ou populações avirulentas ou hipovirulentas dentro das espécies patogênicas; e antagonistas dos patógenos. O termo antagonista é empregado para designar agentes biológicos com potencial para interferir nos processos vitais dos fitopatógenos, estando estas raças ou espécies adaptadas ecologicamente ao mesmo tecido das plantas que os ocupados pelos patógenos, mas sendo apatogênicas às mesmas, enquanto que o termo "formas de antagonismo" designam os mecanismos pelos quais os antagonistas agem sobre os patógenos. 2. MECANISMOS DAS INTERAÇÕES ANTAGÔNICAS 157 O conhecimento dos mecanismos de antagonismo é essencial no desenvolvimento de modelos racionais para a introdução de biocontroladores em agroecossistemas. Os mecanismos básicos de antagonismo podem ser divididos em: • Antibiose: interação entre organismos, na qual um ou mais metabólitos produzidos pelo antagonista têm efeito negativo sobre o fitopatógeno, resultando na inibição do crescimento e/ou germinação. • Competição: interação entre dois ou mais organismos empenhados na mesma ação, ocorrendo principalmente por alimentos (carbohidratos, nitrogênio e fatores de crescimento), por espaço e por oxigênio. • Parasitismo: fenômeno em que determinado microrganismo se nutre das estruturas vegetativas e/ou reprodutivas do outro. Os hiperparasitas atacam hifas, estruturas de resistência e de reprodução dos fitopatógenos. • Hipovirulência: introdução de linhagem do patógeno menos agressiva ou não patogênica, que pode transmitir esta característica para as linhagens patogênicas. • Predação: quando um organismo obtém alimento a partir de fitopatógenos e de várias outras fontes. • Indução de resistência: estímulo dos mecanismos de defesa do hospedeiro pela introdução de organismos não patogênicos e/ou seus metabólitos e/ou linhagens fracas ou avirulentas do patógeno. Na prática, provavelmente poucos organismos exerçam um único mecanismo antagônico. Um antagonista pode atuar através de um ou mais mecanismos, o que constitui uma característica muito desejável, pois as chances de sucesso do controle biológico serão otimizadas. Além disso, os mecanismos não são mutuamente exclusivos ou excludentes, pois sua importância relativa pode variar com as condições ambientais e estado de desenvolvimento do agente biocontrolador e do fitopatógeno. 3. SELEÇÃO DE MICRORGANISMOS ANTAGÔNICOS A seleção de microrganismos antagônicos constitui a base fundamental de todo o programa de controle biológico de doenças de plantas, determinando as chances de sucesso. Todos os métodos de seleção de antagonistas são baseados em evidências de que o organismo candidato interfere, de algum modo, no 158 desenvolvimento do patógeno ou reduz a doença, sendo que interferência implica em algumas formas de destruição ou inibição, podendo ser avaliada tanto “in vitro” como “in vivo”. Um protocolo de seleção de antagonistas para controle biológico progride logicamente através de vários estágios, sendoem teoria de “in vitro” (testes em placas de Petri e/ou lâminas) para “in vivo” sob condições controladas (testes em plantas desenvolvidas em câmara de crescimento e/ou casa-de-vegetação) e, finalmente, para “in vivo” sob condições não controladas (testes em campo). Entretanto, a experiência têm demonstrado que testes de antagonismo "in vitro" devem ser utilizados apenas para o entendimento dos mecanismos envolvidos no biocontrole. As principais características desejáveis em um agente biocontrolador de doenças de plantas incluem: Ser geneticamente estável; Ser efetivo a baixas concentrações; Não ser exigente em requerimentos nutricionais; Ter habilidade para sobreviver sob condições adversas; Ser eficiente contra uma vasta gama de patógenos em várias hospedeiras; Ser hábil para desenvolver em um meio de cultura barato em fermentadores; Ser preparável em uma forma de efetivo armazenamento; Ser tolerante a pesticidas; Ser compatível com outros tratamentos físicos e químicos; Não ser patogênico ao homem. A escolha da espécie ou isolado do antagonista depende de vários fatores, sendo um dos mais importantes a natureza do patógeno a ser controlado, o que pode auxiliar na seleção do mecanismo apropriado. A distinção entre atividade antagônica e capacidade de biocontrole necessita ser efetuada claramente, pois um microrganismo pode ser um excelente antagonista através de todos os testes realizados em condições controladas e não demonstrar atividade na natureza, simplesmente porque não coloniza o hospedeiro. Na Tabela 1 são apresentadas algumas doenças fúngicas que tem sido pesquisadas visando o controle através de microrganismos antagonistas. Fungos dos gêneros Trichoderma e Gliocladium, bem como bactérias dos 159 gêneros Bacillus e Pseudomonas do grupo fluorescente, destacam-se dentre os agentes de biocontrole mais intensamente pesquisados e/ou utilizados. 4. ESTRATÉGIAS DE UTILIZAÇÃO DO CONTROLE BIOLÓGICO Na utilização do controle biológico de doenças de plantas três amplas estratégias podem ser seguidas: a) Controle biológico do inóculo do patógeno; b) Proteção biológica da superfície da planta; c) Controle biológico através da indução da resistência. O controle biológico do inóculo do patógeno ocorre longe da planta hospedeira e envolve a destruição ou mutilação do inóculo do patógeno ou a prevenção de sua formação, providos por rotação de culturas, aração e aplicação de antagonistas em pré- plantio ou no sulco de plantio. A proteção biológica da superfície da planta ocorre sobre a planta e agrupa a maior parte dos sucessos recentes do controle biológico pela introdução massal de antagonistas. A indução de resistência ocorre dentro da planta, aplicada ao controle de viroses e patógenos vasculares. O emprego de microrganismos como agentes de controle biológico de fitopatógenos ocorre principalmente: a) No tratamento de sementes; b) No tratamento do solo; c) No tratamento da parte aérea das plantas; d) No tratamento de ferimentos de poda. 5. CONTROLE BIOLÓGICO DE PATÓGENOS DE SEMENTES O tratamento de sementes, mudas ou outros órgãos de propagação com antagonistas pode promover a proteção durante a germinação, emergência, emissão de raízes e brotos. Existem indicações que os antagonistas protegem as sementes, mas não o sistema radicular. O maior sucesso com a microbiolização de órgãos de propagação, sem dúvida, é o controle da galha bacteriana (Agrobacterium tumefaciens) das rosáceas com a estirpe K84 de Agrobacterium radiobacter. O sucesso do controle biológico através da microbiolização de órgãos de propagação depende do estabelecimento e da manutenção de um limiar populacional dos antagonistas sobre as sementes, raízes ou solo. O tratamento de sementes com microrganismos antagônicos, denominado microbiolização de 160 sementes, pode proporcionar o controle de patógenos habitantes da superfície das sementes e de patógenos veiculados pelo solo. Os principais organismos utilizados para tratamento de sementes são fungos (Aspergillus spp., Chaetomium spp, Gliocladium spp. e Trichoderma spp.) e bactérias (Agrobacterium radiobacter, Bacillus spp. e Pseudomonas spp.). A nível mundial, são registrados e utilizados para tratamento de sementes: Agrobacterium radiobacter, para o controle da galha da coroa das rosáceas, causada por Agrobacterium tumefaciens; Pseudomonas fluorescens, para o controle de Rhizoctonia e Pythium do algodoeiro; Bacillus subtilis, para o controle de Rhizoctonia solani em amendoim. 6. CONTROLE BIOLÓGICO DE PATÓGENOS HABITANTES DO SOLO A ocorrência de doenças de plantas causadas por patógenos habitantes do solo indica a existência de um desequilíbrio biológico no solo. Assim, para obter um controle satisfatório destas doenças há necessidade de se conhecer as interações existentes neste ambiente. A alta taxa de mortalidade dos patógenos e a baixa incidência das doenças em condições naturais são devidas a diversos mecanismos naturais, como parasitismo e predação, estímulo à germinação seguida de exaustão e lise, diminuição das reservas do patógeno e antibiose. Os patógenos habitantes do solo são controlados pela ação de medidas que atuam destruindo as unidades propagativas (propágulos) prevenindo a formação do inóculo no solo ou destruindo o inóculo presentes em resíduos infectados, reduzindo o vigor e a virulência do patógeno, e promovendo o desenvolvimento das plantas. O controle biológico de patógenos habitantes do solo pode ser obtido pela manipulação do ambiente e pela introdução de antagonistas, tanto no solo quanto nos órgãos de propagação das plantas. 6.1. Manipulação do Ambiente A manipulação do ambiente do solo procura prevenir o aumento e a formação de inóculo do patógeno, desalojar os patógenos dos resíduos das culturas, destruir os propágulos dos patógenos e estimular a população de microrganismos benéficos e/ou antagônicos. As interações microbianas em alguns solos podem naturalmente prevenir o estabelecimento de patógenos ou inibir suas atividades 161 patogênicas. Entretanto, pouca atenção tem sido dada a esse fenômeno, que é denominado de solo supressivo, oposto de solo conducente. Solo supressivo não significa, necessariamente, que ocorreu a eliminação do patógeno mas, sim, indica que a doença foi suprimida. Como o controle biológico raramente erradica os patógenos, o controle depende da manipulação do equilíbrio biológico existente no solo. As chances de sucesso do controle biológico são aumentadas quanto maior e mais variada for a população microbiana do solo, havendo necessidade de intensificar as atividades dos antagonistas desejáveis que estão presentes no solo. Esta intensificação das atividades pode ser obtida utilizando rotação de cultura; acréscimo de substratos orgânicos que estimulem os antagonistas; alteração do pH do solo a um nível favorável aos antagonistas e desfavorável aos patógenos; utilização de métodos de cultivo que melhorem a estrutura do solo; escolha de época de semeadura que seja mais favorável ao desenvolvimento do hospedeiro e dos antagonistas que do patógeno; acréscimo de materiais orgânicos que, por competição, reduzam a disponibilidade de nitrogênio; utilização de irrigação que assegure o desenvolvimento do hospedeiro e favoreça os antagonistas; seleção de métodos de cultivo que favoreçam os antagonistas na profundidade do solo em que a infecção do hospedeiro ocorre. 6.2. Introdução de Antagonistas no Solo Para que os antagonistas sejam eficientes no desalojamento dos patógenos presentes no solo, um períodode tempo é necessário. Dessa forma, as estruturas dos patógenos podem ser parasitadas ou predadas ou inviabilizadas pela liberação de metabólitos produzidos pelos antagonistas. 7. CONTROLE BIOLÓGICO DE PATÓGENOS DA PARTE AÉREA Com a compreensão da natureza física, química e microbiológica da superfície foliar, tornou-se largamente reconhecido que grandes populações de microrganismos epifíticos vivem na superfície foliar e são capazes de influenciar as espécies patogênicas no processo de infecção das folhas e caules. 7.1. Sucessão Microbiana na Superfície das Folhas Antes de penetrar no tecido foliar, os patógenos estão expostos a interações com os microrganismos residentes e transeuntes da superfície foliar. O ambiente da superfície foliar 162 difere sensivelmente daquele do solo, caracterizando-se pela ocorrência de maiores e mais rápidas variações. Temperatura e umidade variam mais ampla e rapidamente, estando os microrganismos expostos à ação das chuvas. Outro aspecto importante é a disponibilidade de nutrientes (exsudatos foliares, resíduos orgânicos, grãos de pólen, secreções de afídios, macro e microelementos, diversas substâncias orgânicas, etc.). Como conseqüência das mudanças no ambiente e na disponibilidade de nutrientes, ocorrem sensíveis alterações nas populações microbianas patogênicas e epifíticas da superfície foliar. Os microrganismos do filoplano comumente encontrados são bactérias, leveduras e fungos filamentosos. No início do desenvolvimento da planta, as bactérias constituem-se nas colonizadoras mais freqüentes. Com o desenvolvimento do hospedeiro, ocorre o aumento a quantidade de açúcares nas folhas e, com isso, inicia o próximo estágio da sucessão microbiana, marcada pelo aumento da população de leveduras. Os esporos dos fungos filamentosos, mesmo depositados na superfície foliar permanecem dormentes. Entretanto, quando as folhas atingem o estádio de senescência, a dormência pode ser vencida, ocorrendo inclusive a colonização dos tecidos internos da planta. Assim, na senescência, aumenta a população de fungos filamentosos, que inclusive passam a nutrir bactérias e leveduras. A sucessão apresentada considera a população dominante nos diferentes estádios pois, de modo geral, os diversos microrganismos estão presentes simultaneamente, sendo este fato de relevante importância para o controle biológico natural. O equilíbrio da população microbiana do filoplano pode ser facilmente quebrado pela influência humana. A modificação da superfície foliar e de seu microambiente pode ocorrer devido à poluição ou à aplicação de produtos químicos (fungicidas, inseticidas, herbicidas, hormônios, acaricidas e fertilizantes). Essas alterações podem interferir na ocorrência de doenças, pois haverá uma redução da população microbiana saprofítica, surgindo a oportunidade de desenvolvimento de um outro patógeno que tinha, inicialmente, importância secundária. 7.2. Controle Biológico Natural Microrganismos parasitas de plantas constituem uma pequena fração dos habitantes das proximidades e das superfícies dos órgãos das plantas. Freqüentemente a severidade da doença 163 aumenta quando o patógeno é reintroduzido em sítios de infecção pré- esterilizados, indicando que os habitantes das superfícies dos órgãos das plantas servem como um tampão biológico. A ocorrência natural do controle biológico é comprovada pelas mudanças causadas pelo emprego continuado de fungicidas. A população de microrganismos antagônicos do filoplano consiste, basicamente, de bactérias e fungos (filamentosos e leveduriformes). Neste ambiente, a competição, a antibiose, o parasitismo e a indução de resistência são intensas, resultando num controle natural de doenças foliares. É possível que o parasitismo seja o mecanismo mais eficiente no controle biológico natural, pois hiperparasitas, por viverem às custas do próprio patógeno, são menos sujeitos às variações do ambiente. 7.3. Utilização de Antagonistas para Controle Biológico A maneira usual de controlar biologicamente um patógeno do filoplano é através da introdução de antagonistas na folha. Para ser bem sucedido, o antagonista deve, preferencialmente, multiplicar-se e colonizar a superfície da planta. Para cada patossistema existe um local mais apropriado para realizar a seleção de antagonistas. No entanto, as chances de obtenção de microrganismos efetivamente antagônicos são aumentadas fazendo-se isolamentos no próprio ambiente onde os antagonistas serão utilizados. A utilização de microrganismos com reconhecida capacidade antagônica e não residentes no filoplano também é técnica comum em controle biológico de doenças da parte aérea. Uma das vantagens é abreviar o período de seleção de antagonistas nas fases iniciais do trabalho. O sucesso do controle biológico de doenças da parte aérea depende do modelo biológico escolhido. Para as culturas perenes, a utilização de antagonistas que atuam através do hiperparasitismo conduz a resultados mais promissores, pois o estabelecimento do antagonista é facilitado. Para as culturas anuais, os antagonistas que atuam através da antibiose apresentam maiores chances de sucesso, sendo mais indicados para doenças que ocorrem em períodos definidos e, preferencialmente, isoladas. 8. CONTROLE BIOLÓGICO DE DOENÇAS PÓS-COLHEITA O controle biológico de patógenos que ocorrem em pós-colheita 164 pode ser realizado durante o ciclo da cultura ou após a colheita. O controle, ainda no campo, tem por objetivo evitar a penetração dos patógenos nos tecidos dos frutos e hortaliças e seu posterior desenvolvimento durante o armazenamento. O controle após a colheita tem dois objetivos: evitar que os patógenos latentes nos tecidos causem podridões e impedir novas infecções. Uma das grandes dificuldades na utilização de antagonistas para o controle de doenças é a impossibilidade do controle das condições ambientes. São inúmeros os exemplos de antagonistas bem sucedidos em laboratório e condições controladas que fracassam quando submetidos ao ambiente natural, com baixa umidade e presença de raios ultravioleta. E, como os produtos armazenados normalmente estão sob condições controladas de temperatura e umidade relativa, três fatores indicam ser o controle biológico em pós-colheita viável e passível de exploração: controle das condições ambientes; limitação da superfície de aplicação dos antagonistas; economicamente praticável sob condições de armazenamento. 9. CONSIDERAÇÕES GERAIS Apesar dos microrganismos antagônicos terem como objetivo o controle de fitopatógenos, diversos efeitos podem ser observados, após a sua aplicação, sobre outros organismos presentes no ambiente. Entretanto, como originalmente acreditava-se que esses agentes não apresentavam inconvenientes ao ambiente, são poucas as informações sobre os efeitos dos antagonistas liberados sobre os diferentes ecossistemas. Assim, há necessidade de estudos pormenorizados no sentido de avaliar os possíveis impactos causados pelo uso dos agentes de controle biológico sobre o ambiente. Vários produtos são comercializados para o controle biológico de doenças de plantas a nível mundial (Tabela 2), embora o mesmo não aconteça no Brasil, onde, até o momento, não existem produtos desta natureza registrado no Ministério da Agricultura (Agrofit98). O controle biológico, ao contrário do químico, não apresenta efeito imediato e espetacular. O nível de controle obtido com o método biológico, isoladamente, pode estar abaixo do necessário para que danos à produção não ocorram. Assim, há necessidade de integração dos métodos, de modoa haver mínima interferência entre os métodos aplicados. 165 Adicionalmente, seria interessante a ocorrência de um efeito aditivo ou sinergístico, em que cada medida de controle reforce as demais. Dessa forma, o controle biológico deve atuar em um contexto de equilíbrio biológico, sem o qual sua chance de sucesso será menor. A imensa dificuldade no entendimento dos fatores que influenciam a atividade microbiana no solo e na superfície das plantas têm impedido o desenvolvimento do controle biológico como uma prática de benefício comercial, fazendo com que alguns autores refiram-se ao controle biológico de plantas como uma área de estudo fascinante e desafiadora, mas por outro lado desilusiva e frustrante. 166 Tabela 1. Doenças de plantas, agentes causais e antagonistas estudados para o controle biológico. Doenças Agentes Causais Antagonistas Tombamento de plântulas Rhizoctonia solani, Pythium Pseudonomas, Bacillus, Enterobacter, Trichoderma, Gliocladium Podridões de sementes, raízes e caules Rhizoctonia, Pythium, Sclerotium, Phytophthora, Thielaviopsis, Sclerotinia, Gaeumannomyces Bacillus, Pseudomonas, Trichoderma, Gliocladium, Coniothyrium, Verticilium Murchas vasculares Fusarium, Verticilium Bacillus, Pseudomonas, Trichoderma, Talaromyces, Fusarium Manchas e queimas foliares Cercospora, Alternaria, Curvularia, Venturia Bacillus, Pseudomonas, Trichoderma, Athelia, Alternaria Ferrugens Puccinia, Uromyces, Melampsora, Cronartium Bacillus, Pseudomonas, Darluca, Scytalidium, Verticilium Mildios e oídios Sphaerotheca, Podosphaera Ampelomyces Cancros de caule Nectria Bacillus, Trichoderma Podridões de frutos Botrytis, Monilinia, Mucor, Penicillium, Rhizopus Bacillus, Enterobacter, Pseudomonas, Trichoderma, Gliocladium, leveduras Declínios de árvores Heterobasidium, Chondrosterem Bacillus, Pseudomonas, Trichoderma, Cryphonectria, Peniphora Tabela 2. Exemplos de produtos biológicos comercializados para o controle de fitopatógenos a nível mundial. Produtos (s) Antagonista formulado Patógeno (s) controlado (s) Norbac 84-C; Agtrol; Galtrol; Diegal Agrobacterium radiobacter Agrobacterium tumefaciens Kodiak Bacillus subtilis Rhizoctonia spp. e Pythium spp. Blue Circle; Intercept Pseudomonas cepacia Rhizoctonia spp. e Pythium spp. Dagger Pseudomonas fluorescens Rhizoctonia spp. e Pythium spp. Polygandron Pythium oligandrum Pythium ultimun Binab – T Trichoderma harzianum Verticillium malthousei Trichodex Trichoderma harzianum Rhizoctonia spp., Pythium spp. e Slerotium rolfsii Royal 350 Arthrobotrys superba Meloidogyne spp. Mycostop Streptomyces griseovirides Alternaria sp. e Fusarium spp. Coniothyrin Coniothyrium minitans Sclerotinia sclerotiorum Glio Gard Gliocladium virens Rhizoctonia spp. e Pythium spp. 167 SUGESTÃO DE LEITURA AGRIOS, G.N. Control of plant diseases. In: AGRIOS, G.N. Plant pathology. 4th. ed. San Diego: Academic Press, 1997. p.171-221. AGROFIT98. Informações de produto fitossanitários registrados no Ministério da Agricultura. [CD-ROM]. Brasília: Ministério da Agricultura,1998. BETTIOL, W. Controle biológico de doenças de plantas. Jaguariúna: EMBRAPA/CNPDA, 1991. 388p. BETTIOL W.; GHINI, R. Controle biológico. In: BERGAMIN FILHO, A.; KIMATI, H.; AMORIM, L. (Eds.). Manual de fitopatologia: princípios e conceitos. 3. ed. São Paulo: Agronômica Ceres, 1995. v.1, p.717-727. COOK, R. J.; BAKER, K. F. The nature and practice of biological control of plant pathogens. St. Paul: The Ameriacn Phytopathological Society, 1983. 539p. MELO, I.S. Agentes microbianos de controle de fungos fitopatogênicos. In: MELLO, I.S.; AZEVEDO, J.L. (Eds.). Controle biológico. Jaguariúna: EMBRAPA, 1998. v.1, 264p. 168 FUTURO DO CONTROLE BIOLÓGICO 10 169 O FUTURO DO CONTROLE BIOLÓGICO NA: BIOTECNOLOGIA Sem dúvida, a biotecnologia terá papel fundamental seja na identificação das pragas (taxonomia) por meio de técnicas moleculares, seja na "produção" de plantas transgênicas contendo características de resistência com "Bt" ou mesmo inibidores de proteinase. No estudo de simbiontes, ela já tem mostrado sua grande importância. Por exemplo, Wolbachia, alfa-protobactéria que começou a ser estudada no final dos anos 80, hoje é encontrada em mais de 76% dos insetos. Transmitida através do citoplasma dos ovos, ela tem envolvimento com vários mecanismos para manipular reprodução do hospedeiro, incluindo indução de incompatibilidade reprodutiva, partenogênese e feminização. A produção in vitro de parasitóides e predadores deverá desvendar as relações hospedeiros/inimigos naturais, possibilitar estudos da dependência de hormônios do hospedeiro, respiração e digestão. O Brasil já começa a despontar nessa área com produção in vitro de Trichogrammaspp. e Bracon hebetor (Say). RELAÇÕES TRITRÓFICAS Entendimento dessas relações será fundamental para criar o inseto com maior facilidade em laboratório, propiciando, no futuro, as criações massais in vitro e favorecendo o uso de semioquímicos no controle biológico. UTILIZAÇÃO DE PRODUTOS SELETIVOS Estudos envolvendo seletividade serão cada vez mais importantes para a adoção do controle biológico. O crescimento do controle biológico aplicado e a volta do controle biológico clássico dependem da utilização de produtos cada vez mais seletivos, especialmente para culturas com grande número de pragas. COMERCIALIZAÇÃO Empresas deverão surgir para disponibilizar os inimigos naturais ao usuário. A ética na produção tem de ser considerada para evitar que surjam problemas de credibilidade. Uma legislação forte com acompanhamento 170 da qualidade dos insetos criados por parte das universidades e institutos de pesquisa é fundamental nesse tipo de atividade. CONTROLE DE QUALIDADE, TÉCNICAS DE PRODUÇÃO E ARMAZENAMENTO Um acompanhamento da qualidade, das técnicas de liberação e de armazenamento antes da liberação é imprescindível para que o agricultor tenha sucesso no controle biológico. Especialmente para alguns grupos de parasitóides ou predadores, é fundamental que sejam desenvolvidas linhagens para determinadas condições microclimáticas. È o caso de Trichogramma, em que muitas vezes o fracasso na liberação se deve à utilização de uma linhagem inadequada. APLICAÇÃO DE SISTEMAS DE MANEJO DE CRIAÇÃO PARA PREVISÃO DA PRODUÇÃO O sistema de manejo de criação de insetos (MCl), com base em exigências térmicas, é essencial para previsão de produção e de liberação e sobretudo para intercâmbio de laboratórios. Câmaras climatizadas sem grande sofisticação poderão servir para esse objetivo. 171 CONSIDERAÇÕES FINAIS Sem dúvida, com as exigências cada vez maiores do mercado internacional em relação à qualidade dos produtos importados, a chamada produção integrada, assume importância cada vez maior o controle biológico e outras medidas alternativas de controle. Barreiras sociais, econômicas e políticas devem ser removidas para a utilização crescente do controle biológico tanto no Brasil como em outros países. Para tal, é fundamental o comprometimento com a segurança e com a responsabilidade social por meio de incentivos à pesquisa e ao treinamento e de parcerias do setor público e privado. É uma grande oportunidade para os países em desenvolvimento se inserirem no contexto internacional, principalmenteo Brasil, com o potencial que apresenta. Há necessidade de mudanças, pois os casos de sucesso com controle biológico no Brasil são para pragas de culturas de exportação; é preciso investir em culturas de subsistência, principalmente quando se pensa em agricultura sustentável ou orgânica. Os pequenos agricultores não têm acesso às modernas tecnologias; talvez devam iniciar pela aplicação de produtos seletivos (controle biológico natural) ou mesmo pela liberação de inimigos naturais (controle biológico aplicado), desde que contem com um suporte técnico de empresas idôneas ou serviços de extensão competentes. O fato é que o Brasil tem um potencial muito grande em diversas culturas ainda inexploradas com relação aos inimigos naturais. Entretanto, obstáculos precisam ser transpostos para que o controle biológico seja cada vez mais utilizado, destacando- se: tradição em usar químicos; pressão das grandes empresas (multinacionais); maior conhecimento e divulgação sobre controle biológico; número de pragas das diferentes culturas - em culturas com menor número de pragas o controle biológico é mais facilmente adotado; naquelas com grande número de pragas, procura-se manter o que já existe (controle biológico natural), especialmente utilizando-se produtos seletivos, já que o controle biológico é específico; 172 nível cultural do agricultor, que dificulta a adoção de uma tecnologia como o controle biológico; pouca disponibilidade do produto biológico (as primeiras empresas que comercializam inimigos naturais começam a surgir no Brasil); 173 SESSÃO DE FOTOS A B C D E F G H I A B C D E F G H I Figura 1. Agentes de mortalidade natural. A – Podisus nigrispinus (Heteroptera: Pentatomidae) predando lagarta de Alabama argillacea (Lepidoptera: Noctuidae); B – Supputius cincticeps predando pupa de Musca domestica (Diptera: Muscidae); C – Criação massal do curuquerê-do-algodoeiro, A. argillaceae; D – Mimetismo por Mantidae; E – Parasitóide larval; F – Fungo entomopatogênico; G – Sintoma de ataque por um predador em lagarta no campo; H – Larvas de Haplostegus epimelas (Hymenoptera: Pergidae) efetuando o controle biológico em araçá, Psidium cattleyanum (Myrtaceae) e I – Casal de Harpactor angulosus (Heteroptera: Reduviidae) predando lagarta de Hylesia paulex (Lepidoptera: Saturniidae). 174 AGRADECIMENTOS Os professores que realizaram o curso: “Controle Biológico na Agricultura: Fundamentos & Aplicações” gostariam de expressar seus sinceros agradecimentos à Deus, primeiramente, por sempre zelar pela nossa saúde e por nos dar forças e estímulo ao trabalho; à Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e ao Centro de Ciências Agrárias, Campus II, Areia (PB) pela acolhida; às coordenações dos cursos de Agronomia e Biologia desse Centro pelo apoio e atenção; ao Banco do Brasil pelo apoio; ao MAE (Movimento Agroecológico) pela realização e suporte logístico; à comissão organizadora do curso, composta por Luiz Leonardo Ferreira, José Bruno Malaquias e Flávia Queiroz de Oliveira pela dedicação e esforços necessários para a concretização desse evento e a todos os alunos que fizeram parte dessa troca de experiências. 174 OS AUTORES Alexandre Igor de Azevedo Pereira é natural de Campina Grande (PB) e formou-se em Agronomia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus II, Areia (PB) em 2005. Durante a graduação foi bolsista de iniciação científica pelo CNPq com projetos vinculados à Embrapa Algodão na área de Controle Biológico de Pragas do Algodoeiro tendo como orientador o Dr. Francisco de Sousa Ramalho. Após a graduação desempenhou trabalhos de consultoria na área de Manejo Integrado de Curculionídeos em fazendas particulares de banana no município de Macaparana (PE) e foi professor de inglês pelo Estado da Paraíba. Atualmente é aluno de Mestrado em Entomologia pela Universidade Federal de Viçosa (MG) tendo como orientador o Dr. José Cola Zanuncio. Desempenha suas pesquisas nas áreas de Controle Biológico de Pragas Agrícolas com Percevejos Predadores, Monitoramento, Ecologia, Controle Químico e Comportamento de Insetos. Carmen Rosa da Silva Curvêlo é natural de Campina Grande (PB) e formou-se em Agronomia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus II, Areia (PB) em 2004. Durante a graduação foi bolsista de iniciação científica pelo CNPq com projetos vinculados na área de nutrição mineral de plantas tendo como orientador o Dr. Lourival Ferreira Cavalcante. Recebeu o premio “Jovem Pesquisador” oferecido pelo CNPq durante a iniciação científica. Após a graduação lecionou pelo Estado da Paraíba e estagiou na Embrapa Algodão, tendo participado ativamente de projetos com Algodão e Mamona nessa instituição. Atualmente é aluna de Mestrado em Fitotecnia pela Universidade Federal de Viçosa (MG) tendo como orientador o Dr. Paulo Berger. Desempenha suas pesquisas na área de Fitossanidade e Grandes Culturas. Catarina de Medeiros Bandeira é natural de Campina Grande (PB) e possui o curso de Licenciatura e Bacharelado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual da Paraíba desde 2004. Durante a graduação desenvolveu pesquisas na área de controle alternativo do mosquito da dengue, Aedes aegypti financiadas pelo Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado da Paraíba (FAPESQPB). Nesse período também estagiou na Embrapa Algodão nos laboratórios de Fitopatologia e Unidade de Controle Biológico tendo como orientadores o Dr. Nelson Dias Suassuna e o Dr. Francisco de Sousa Ramalho, respectivamente. Durante a I Reunião Anual da Sociedade Entomológica da Paraíba, em 2004, foi agraciada com o prêmio Melhor Trabalho Técnico-Científico (Categoria Estudante). Atualmente é aluna de Mestrado em Agricultura Tropical pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Campus II, Areia (PB). Desempenha suas pesquisas nas áreas de Agronomia e Fitossanidade. 175foram adequadas. A necessidade de se conhecer o inimigo, minuciosamente falando, fez com que o homem criasse um ramo da ciência Entomologia, denominado Entomologia Aplicada. A partir desta, cientistas puderam definir seu inimigo, estudar seu comportamento e características, observar os reais danos produzidos e assim, providenciar medidas de controle eficazes na redução dos prejuízos causados por estes invertebrados. Desta forma iremos estudar, no presente capítulo, o conceito de praga; ter noção dos danos produzidos pelos insetos na agricultura e conhecer os principais métodos de controle de pragas agrícolas atualmente empregados. 2 19 1. CONCEITO DE PRAGA Os insetos, animas do filo artrópoda, classe insecta, constituem o maior e mais diverso grupo de animais na Terra, com cerca de 1 milhão de espécies identificadas, mas, segundo alguns especialistas, esse número pode representar apenas 20% das espécies ainda a serem descobertas, identificadas e estudadas. Tais invertebrados ocupam os mais diferentes nichos ecológicos, habitando vegetais, solo e água, e são de extrema importância para as cadeias vitais do planeta. Além de inúmeros benefícios ao homem (p.ex.: polinização, produção de alimentos, etc.), servem de alimento básico para diversas espécies de pássaros, peixes, anfíbios, mamíferos e artrópodes; em algumas regiões do planeta, fazem parte da dieta do homem moderno (Homo sapiens). Os insetos surgiram na terra muito antes do aparecimento do homem, e consequentemente na agricultura. Desta forma, se considerarmos a ordem de aparecimento no planeta, certamente não foram os insetos que tornaram-se pragas, mas o homem e seus mecanismos de exploração agrícola que deram forma ao conceito de praga. Esta questão ainda é tema de debates e polêmicas; entretanto o conceito de praga, através dos dicionários, nos definirá tal palavra como: calamidade, grande desgraça, flagelo; abundância de coisas nocivas e desagradáveis; designação geral dos insetos e moléstias que atacam os animais e as plantas (conceito este mais relacionado ao lado agronômico). Outra polêmica refere-se à generalização do termo, “praga”, que pode tanto ser aplicada referindo-se a insetos, como a animais vertebrados (p.ex.: roedores e pássaros); além de vermes, como nematóides e seres microscópicos que causam doenças às plantas (p.ex.: fungos, bactérias e vírus). Desta forma, podemos dizer que o conceito de praga toma proporções antropogênicas, pois são organismos que entram em conflito com o interesse humano; competindo pelo alimento produzido (p.ex.: mosca-das-frutas), transmitindo doenças (p.ex.: Doença de Chagas), causando desconforto (p.ex.: pernilongos), desestruturando a conservação da natureza (p.ex.: Apis mellifera versus Mellipona), etc. Vale salientar que tal conceito é relativo no tempo e no espaço, pois o que é praga para um agricultor pode não ser para outro que cultiva a mesma cultura; ou, o que é praga para uma região pode não ser em outra; o que é praga hoje pode não ser amanhã, além de que muitas 20 pragas do passado não são motivo de preocupação hoje em dia. A praga-chave pode ser definida como aquela espécie de inseto que ataca uma determinada cultura, causando dano maior que o causado pelas demais pragas na mesma cultura. Considerando-se que o ataque de pragas varia de ano para ano e de região para região, esse conceito não é fixo e, assim, a praga-chave de uma cultura pode variar nos diferentes estádios de desenvolvimento da planta, bem como entre microrregiões e anos agrícolas Segundo Bleicher (1993), as inúmeras espécies de insetos e ácaros enquadram- se na categoria de pragas primárias (exigem controle todos os anos), secundárias (apenas esporadicamente atingem o nível de controle) e as esporádicas (raramente apresentam densidades populacionais passíveis de necessitarem controle). Entretanto, tal classificação pode sofrer adaptações no caso de insetos-praga de grãos armazenados. De acordo com o hábito alimentar, podem ser classificados como pragas primárias e secundárias. As pragas primárias podem ser internas (completam seu ciclo evolutivo no interior de apenas um grão; p.ex.: Sitophilus spp. e Araecerus fasciculatus De Geer) ou externas (alimentam-se da porção externa do grão, podendo atacar a parte interna após o rompimento da externa; p.ex.: as traças: Plodia interpunctella Hubner e o besouro: Tenebroides mauritanicus). As pragas secundárias desenvolvem-se exteriormente aos grãos e se alimentam destes quando previamente danificados pelas pragas primárias, ou quando trincados, quebrados ou defeituosos. Desta forma, iremos tratar neste material apenas as pragas correspondentes à classe Insecta. 2. DANOS Apenas cerca de 10% dos insetos pode ser considerado como, de alguma forma, prejudicial ao homem, mas, mesmo assim, eles provocam prejuízos da ordem de bilhões de dólares por ano em todo o mundo. Os danos causados pelos insetos às plantas são variáveis, devido ao modo de ação com que o inseto interage com a planta. Insetos sugadores podem sugar nutrientes em quase todos os tecidos da planta, causando, não raro, o completo definhamento da mesma. Além da inserção de substâncias tóxicas no ato da sucção, que ao reagirem com o tecido vegetal provocam alterações neste, ainda existe a possibilidade de transmissão direta de doenças, quando as pragas inserem o aparelho bucal no 21 interior dos vasos condutores de seiva, ou qualquer outra parte da planta, funcionando como vetores de microorganismos nocivos. Os insetos mastigadores comumente provocam danos diretos ao vegetal, por lesionarem e/ou destruírem os tecidos vegetais, incrementando na redução da sua área fotossintética; além dos danos indiretos, definidos como as lesões “abertas”, que certamente serão porta de entrada para microrganismos nocivos à planta. O potencial de um inseto em provocar danos agrícolas consideráveis pode ser demonstrado pelos exemplos abaixo: A broca-do-café, Hypothenemus hampei (Fer.), possui potencial biótico (capacidade de originar novos indivíduos) de aproximadamente: 6.233.394.767.830 de indivíduos! O pulgão-do-algodoeiro, Aphis gossypii (Glover), possui potencial biótico de 25.600.000.000 indivíduos! Certas mariposas colocam milhares de ovos durante a sua vida! ( o curuquerê-do-algodoeiro, por exemplo, põe mais de 500 ovos durante sua vida adulta !); Certas rainhas de cupins chegam a colocar mais de 80.000 ovos, correspondendo a cerca de 1 ovo por segundo! A mosca Drosophila pode produzir 25 gerações em um ano e cada fêmea colocar cerca de 100 ovos! Devido ao ataque de pragas, alguns países ou regiões tiveram sua economia fortemente abalada. Em 1967, a França sofreu tremendo impacto devido à presença do pulgão da videira Daktulospharia vitifoliae (Fitch) que dizimou em pouco tempo os vinhedos existentes; uma das maiores culturas do país na época. Outro exemplo, a mosca das frutas, Ceratitis capitata (Wied.), que para a erradicação, que durou 19 meses, exigiu dos americanos o gasto de milhões de dólares, em cultura de citrus na Flórida, EUA. A citricultura brasileira sofreu grande crise quando, em 1939, surgiu a doença de vírus denominada “tristeza”, arrasando com os pomares paulistas, devido à presença do pulgão Toxoptera citriciolus (KIRK.), eficiente transmissor dessa doença. Com o aparecimento do bicudo- do-algodoeiro, Anthonomus grandis (Boehman), em 1983, no nordeste brasileiro, perdas econômicas e sociais foram constatadas, como a desvalorização dos valores das 22 propriedades, fechamento de usinas de beneficiamentode semente e óleo comestível, desemprego e emigração de trabalhadores para o Sudeste do país (caracterizando o êxodo rural). 3. MÉTODOS DE CONTROLE Durante muito tempo o homem defendeu-se desses inimigos de forma mais ou menos empírica, até que observou que sem uma verdadeira investigação científica não chegaria a resultados efetivos. Assim nasceu um ramo da entomologia, que recebeu o nome de entomologia aplicada. O verdadeiro fundador e promotor dessa especialidade foi o cientista Leland O. Howard, que durante mais de 50 anos dirigiu esses estudos nos EUA e preparou muitos cientistas no seu país e no exterior. Atualmente é imprescindível a realização de um controle de pragas agrícolas de uma maneira conjunta, ou seja, “mesclando” dois ou mais tipos de controle com o intuito de otimizar os resultados desejados e minimizar efeitos indesejados, como a contaminação ambiental, do homem e da entomofauna benéfica; fato bastante comum nos primórdios do controle de pragas. Eis a definição de Manejo Integrado de Pragas em sua forma mais simplificada. O Manejo Integrado de Pragas (MIP) agrícolas depende fundamentalmente de requisitos básicos para que se possa tomar decisões visando o correto manejo. A observação da mortalidade natural de insetos-praga em campo (que pode ser incrementada com a utilização de inseticidas seletivos, matando apenas a praga-alvo e conservando predadores e parasitóides), a utilização de amostragem (que é um dos principais componentes do manejo, determinado a população relativa, absoluta ou o índice populacional do inseto), a taxonomia (pois para lidar de maneira objetiva com os insetos-praga é essencial que as espécies sejam conhecidas e classificadas) e a observação dos níveis de controle são esses requisitos básicos. Os níveis populacionais (de controle), que são parâmetros utilizados para obter-se uma relação da quantidade de insetos em uma determinada área, podem ser divididos em: Nível de Equilíbrio (representa a densidade média da população do inseto durante um longo período de tempo na ausência de mudanças permanentes no meio ambiente); Nível de Controle (densidade populacional na qual medidas de controle devem ser tomadas para evitar os prejuízos econômicos) e o Nível de Dano Econômico (representa a menor densidade populacional capaz de 23 causar perdas econômicas significativas ao agricultor). Logo após esta primeira etapa do MIP, adota-se o método de controle propriamente dito, que irá variar de acordo com a situação encontrada no campo. Os métodos de controle de pragas agrícolas têm aplicações diversas e encaixam-se nas mais diversas situações encontradas em campo. Para melhor entendimento destes métodos, citaremos a seguir os mais utilizados, separadamente e sucintamente. 3.1. CONTROLE LEGISLATIVO O primeiro passo na defesa contra as pragas de insetos consiste na adoção de leis que protejam um território contra o seu avanço ou até mesmo sua entrada. Na maioria dos países isso se efetua por meio de cuidadosas inspeções nos desembarques comerciais. Frutas, cereais e outros alimentos que os insetos possam utilizar como veículo de propagação são examinados no limite da zona livre da praga. Estabelecem-se barreiras sanitárias para impedir sua propagação e difusão. O controle legislativo depende diretamente do serviço de quarentena, ou quarentenário, que tem por objetivo evitar a entrada de pragas exóticas e impedir sua disseminação. Esse serviço é executado pelo Serviço de Defesa Sanitária Vegetal do Ministério da Agricultura, cujos técnicos inspecionam os portos, aeroportos e fronteiras com o objetivo de desinfestar, destruir ou impedir a entrada de vegetais atacados, mantendo-os em quarentena. Atua também nas exportações e importações, impedindo a saída e entrada de produtos agrícolas atacados por pragas. Os meios de transporte estão cada vez mais rápidos e globalizados. Como conseqüência desse progresso no transporte de pessoas e mercadorias, o risco de se introduzir uma praga agrícola num país é consideravelmente maior. Por esse motivo, vários países impõem barreiras alfandegárias que proíbem a importação de determinada planta hospedeira de uma praga que não ocorra em seu território. Por exemplo, o Brasil não exporta frutas in natura para os EUA e Japão devido ao risco de introduzir moscas-das-frutas naqueles países, que gastaram milhões de dólares para erradicar estas espécies desse grupo e, portanto, evitam uma reinfestação dessas pragas pela proibição da entrada de frutas in natura. Entretanto, melões do Brasil são exportados para os EUA, desde que tenham sido cultivados em regiões do semi-árido do Rio Grande do Norte (área isenta de Anastrepha grandis). 24 Os países legislam sobre o tipo de tratamento quarentenário que deve ser aplicado para determinado produto agrícola, a fim de eliminar a praga quarentenária e permitir a importação do produto. No Brasil, por exemplo, são aplicados os seguintes tratamentos quarentenários para fruteiras: fumigação, tratamento a frio, tratamento a quente e irradiação; banana, manga, melão, nectarina, pêssego e uva são algumas das frutíferas que sofrem tais tratamentos. 3.2. CONTROLE FÍSICO Consiste no emprego de métodos de origem física, que variam desde os mais simples, como o fogo para destruição de restos de cultura, até os mais sofisticados, como a radiação eletromagnética, com o objetivo de reduzir a população de uma praga. O fogo, por exemplo, tem utilização restrita e é mais utilizado como medida complementar a outros métodos, como por exemplo, em restos de cultura e ramos podados. A drenagem é empregada em casos especiais como em pântanos, para controle de larvas de mosquitos hematófagos, e em cultura de arroz irrigado, para controle dos gorgulhos aquáticos que atacam as raízes desta planta. A variação da temperatura, também é importante componente do método físico de controle. A ocorrência de temperatura fora da faixa ótima (15 a 38ºC) de desenvolvimento e atividade dos insetos normalmente interfere no metabolismo dos insetos e, consequentemente, reduz os prejuízos provocado por estes. Esta técnica pode ser utilizada em grãos armazenados, ou no tratamento pós- colheita de frutos. Embora o emprego da radiação eletromagnética seja recente no Brasil, no que concerne ao controle de pragas, é um método que desponta como bastante promissor. As faixas do espectro que têm sido utilizadas, e que chegam do sol à Terra em várias freqüências, são as radiações ultravioleta (UV), luminosa, infravermelha (IV) e sonora. Entretanto, entre os insetos existem aqueles que são diurnos (sujeitos à ação de ondas curtas) e outros que são noturnos (sujeitos à radiação de ondas longas). Para os diurnos, a manifestação da radiação solar durante o dia é por meio da cor do substrato; desta forma, as reações dos insetos às diferentes cores são de atratividade ou repelência, o que permite que sejam usadas como uma estratégia de controle. Enquanto que para os insetos de hábito noturno, a luz infravermelha e a luz visível (em 25 forma de armadilhas luminosas) são as mais indicadas. 3.3. CONTROLE MECÂNICO São medidas utilizadas em casos específicos como, por exemplo: controle do curuquerê-da-couve em pequenas hortas por meio de esmagamento de ovos e catação das lagartas; catação manual de bichos- cestos em cafezal; esmagamento de brocas de ramos e tronco em fruteiras como a figueira; corte de lagartas em fumo e mandioca com tesouras; formação de barreiras ou sulcos contra o ataque do curuquerê-dos-capinzais e gafanhotos em surtos graves, etc. 3.4. CONTROLECULTURAL Outro tipo de controle é o cultural, que é feito através de práticas agrícolas que proporcionem condições ótimas para o desenvolvimento da cultura e, ao mesmo tempo, condições adversas ao desenvolvimento da pragas. Várias táticas agrícolas podem ser utilizadas neste tipo de controle, como: rotação de cultura, aração do solo, época de plantio e colheita, destruição de restos culturais, cultura no limpo, poda, adubação e irrigação, plantio direto, etc. Existe a distinção entre as táticas de manejo de acordo com a situação populacional da praga em campo, podendo ser de dois grupos: as táticas de manejo de uso planejado e aquelas dependentes da intensidade de ataque do inseto-praga à cultura. As táticas de uso planejado devem ser adotadas previamente por meio de planejamento, antes que ocorra o ataque do inseto à cultura. Entre as táticas principais desse grupo estão a manipulação do ambiente de cultivo e a resistência de plantas ao inseto. Enquanto que as táticas dependentes das intensidades de ataque só devem ser adotadas quando as populações das pragas são iguais ou superiores ao nível de dano econômico; são mais emergenciais. A adoção das táticas de manejo de uso planejado apresenta uma série de vantagens, como o baixo custo, a preservação do ambiente e da saúde humana, a efetividade de controle e a compatibilidade com outros métodos de controle e demais práticas agrícolas. Apesar dessas grandes vantagens, sua adoção é difícil, por depender de corpo técnico treinado para educar os produtores, pelo conservadorismo de muitos deles, que resistem em adotar práticas agrícolas diferentes daquelas usuais, pela dificuldade do produtor em estabelecer uma relação entre a adoção 26 de uma prática cultural com a redução da população da praga e pela necessidade de adoção em nível local (produtores vizinhos) ou regional para que algumas práticas culturais sejam efetivas na redução de populações de pragas. Além disso, a maioria das práticas culturais deve ser realizada de forma planejada e preventiva, uma vez que sua adoção é anterior à ocorrência de pragas nas lavouras. A seguir, são relatadas as práticas culturais mais efetivas no manejo de moscas-brancas, em fruteiras. 3.4.1. POUSIO DA ÁREA DE CULTIVO Para fruteiras não-perenes, como melão, melancia, abacaxi e morango, a manutenção das áreas sem cultivos por algum tempo é uma forma de controle das moscas-brancas, por reduzir a disponibilidade de hospedeiros para esses insetos. Entretanto, para as fruteiras perenes, a adoção dessa prática cultural não é viável. Um exemplo de uso dessa tática de manejo ocorreu na década de 80, no sudoeste dos Estados Unidos, onde grandes áreas com cultivo de melão foram perdidas, devido à infecção das plantas por viroses transmitidas pela mosca-branca, B. tabaci. Nessas áreas, o cultivo de melão se inicia ao final de cultivos de algodão. Assim as moscas- brancas que ocorrem nos cultivos de algodão migram para os cultivos de melão. Por causa dessa situação, os plantios de melão nessa região foram bastante reduzidos. Para minimizar esse problema, os produtores de algodão passaram a adotar o plantio de cultivares precoces e os produtores de melão iniciaram seus plantios mais tardiamente, ficando os campos um período sem cultivo de plantas hospedeiras da mosca-branca. 3.4.2. OBTENÇÃO DE MUDAS ISENTAS DO ATAQUE DE MOSCAS- BRANCAS E VIROSES As mudas a serem utilizadas devem ser obtidas livres do ataque de moscas- brancas e de viroses. A presença de moscas-brancas nas mudas servirá como foco de infestação inicial, dificultando o controle deste inseto-praga. Se as mudas estiverem contaminadas com viroses, servirão de fonte de doenças, as quais poderão ser transmitidas pelas moscas- brancas e outros vetores às plantas sadias. Para a obtenção de mudas obtidas livres do ataque de moscas-brancas e de viroses, estas devem ser produzidas em ambientes protegidos, como estufas, 27 casas de vegetação e telados. As áreas de movimentação de pessoas nessas instalações devem dificultar a entrada de moscas-brancas e outros insetos. Devem ser feitas inspeções periódicas nessas instalações, para que sejam vedadas as partes de sua estrutura danificadas e eliminadas as plantas atacadas por moscas-brancas e, ou, com sintomas de viroses. Nos viveiros, devem-se utilizar, de forma criteriosa e rigorosa, outras práticas de manejo de moscas-brancas, no sentido de se obter mudas isentas do ataque de moscas- brancas e de viroses. 3.4.3. ELIMINAÇÃO DE PLANTAS HOSPEDEIRAS DE MOSCAS- BRANCAS Na área de instalação do pomar e durante o cultivo de fruteiras, devem-se eliminar as plantas hospedeiras de moscas-brancas e de viroses que ataquem a fruteira a ser cultivada. Devem também ser eliminados cultivos abandonados e restos culturais próximos ao pomar, os quais poderão servir de fonte de infestação de moscas-brancas. Essas plantas deverão ser arrancadas e enleiradas, devendo esses restos culturais ser incorporados ao solo por aração e gradagem. 3.4.4. SELEÇÃO DO LOCAL DE INSTALAÇÃO DO POMAR O pomar deve ser instalado distante de locais de cultivo de plantas que tenham pragas comuns à cultura cultivada. No caso das moscas-brancas, evitar o plantio próximo a cultivos de hortaliças, plantas ornamentais, leguminosas, malváceas e cucurbitáceas, que são importantes hospedeiros de moscas-brancas. Também evitar áreas que recebam correntes de ar de áreas cultivadas com plantas hospedeiras de moscas-brancas, já que o vento é o principal veículo de transporte destes insetos. 3.4.5. COBERTURA MORTA O uso de cobertura morta dificulta a localização de hospedeiros pelos adultos da mosca-branca. As coberturas mortas mais utilizadas são plásticos, folhas de papel-alumínio, serragem, palha e casca de arroz. As coberturas mortas modificam o espectro de ondas pela área de cultivo, dificultando a localização da cultura pelos adultos da mosca-branca. Outro mecanismo pelo qual a cobertura morta reduz as populações de insetos-praga nos cultivos é a mudança do microclima em tomo das plantas, que se toma mais 28 desfavorável aos insetos-praga do que quando não se usa cobertura morta. 3.4.6. MANEJO DO ESTADO NUTRICIONAL DAS PLANTAS É fundamental para a redução da suscetibilidade da fruteira a insetos- praga, sobretudo os sugadores, como as moscas-brancas. Também o uso de adubação equilibrada possibilita à fruteira tolerar maiores intensidades desses insetos-praga. Assim, tanto a adubação deficiente como a excessiva são favoráveis ao aumento da intensidade desses insetos-pragas nas plantas. Esse fato deve-se ao aumento da concentração de nutrientes na seiva, principalmente de aminoácidos livres. O uso de adubações excessivas também pode aumentar o tamanho das plantas, exigindo maior freqüência de podas e tornando difícil a aplicação de inseticidas e acaricidas. Essa adubação excessiva pode também prolongar a duração do período vegetativo e reduzir as defesas morfológicas das plantas (como espessura da epiderme e cutícula), o que aumenta o ataque de pragas. 3.4.7. MANEJO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA ÀS PLANTAS A disponibilidade de água para as plantas constitui importante fator de redução do ataque de moscas-brancas às fruteiras. Quando as plantas sofrem déficit hídrico, ocorre aumento da suscetibilidade às pragas, principalmente a insetos sugadores, como as moscas-brancas. lsso ocorre devido à redução das defesas químicas e morfológicas da planta e ao aumento da concentração de nutrientes na seiva, principalmente de aminoácidos livres. O fornecimento adequado de águapode elevar o teor de umidade do ar no microclima da cultura, o que geralmente provoca aumento da mortalidade das pragas, pela ação de fungos entomopatogênicos, importantes inimigos naturais das moscas-brancas. Também as gotas da irrigação por aspersão, quando caem nas folhas, têm efeito mecânico na remoção de ovos e adultos das moscas-brancas. Entretanto, o excesso de água pode prolongar o crescimento vegetativo e reduzir as defesas morfológicas das plantas (como espessura da epiderme e cutícula) contra insetos. 3.5. CONTROLE POR COMPORTAMENTO Utilizam substâncias que alteram o comportamento do inseto objetivando a 29 diminuição da sua população. Neste caso, são aplicados hormônios, atraentes e repelentes. O monitoramento de pragas, hoje em dia, é alicerçada no uso de substâncias que trabalham manipulando o comportamento dos insetos. Esta técnica emprega normalmente armadilhas contendo feromônios (substâncias secretadas por um indivíduo e liberadas no ambiente com o objetivo de estabelecer uma comunicação com outros indivíduos da mesma espécie, através do qual há uma mudança imediata no seu comportamento) sintéticos, em que é feita a contagem do número de insetos machos ou fêmeas capturados. No Brasil, o bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis), desde a sua introdução, tem sido monitorado por armadilhas de diversos tipos contendo o feromônio grandlure. Em armazéns de fumo, tem sido utilizado o feromônio serricornin para o monitoramento do bicho-do-fumo, L. serricorne. O controle de pragas através de feromônios pode ser feito através da aniquilação de machos, e da confusão de machos. A aniquilação de machos consiste na coleta de número significativamente alto de machos da espécie praga. O número de armadilhas com feromônio nos programas de coleta massal de insetos varia bastante, mas normalmente é alto, o que, muitas vezes, restringe o uso mais amplo desta técnica. Já a confusão de machos consiste na impregnação de uma área com feromônios sintéticos, visando o rompimento da comunicação química normalmente estabelecida entre machos e fêmeas da mesma espécie, reduzindo a probabilidade de encontros e/ou agregação dos sexos e dos acasalamentos. Os atraentes e repelentes são agentes físicos ou químicos que alteram o comportamento do inseto, provocando neste uma resposta positiva (atraente) ou negativa (repelente) no processo de seleção hospedeira para alimentação ou oviposição. Os agentes químicos normalmente são encontrados em plantas e incluem tanto nutrientes como substâncias, sem qualquer valor nutritivo, chamadas nesse caso de aleloquímicos; por exemplo: glicosídeos, alcalóides, terpenos, fenóis, etc. Os atraentes físicos, os mais utilizados, são as luzes e as cores, para o que são recomendados armadilhas, bandejas, etc., contendo luzes e cores preferidas pelos insetos a serem controlados. Enquanto que os atraentes químicos mais comuns são os atraentes de alimentação. Estas substâncias são 30 detectadas pelos insetos através dos pêlos olfativos localizados nas antenas. Tais substâncias são utilizadas normalmente através de iscas, que podem atuar isoladamente ou combinadas com inseticidas. Na categoria de repelentes físicos estão incluídos o som e a radiação visual. O som é particularmente importante para as mariposas, cujo principal predador é o morcego, que consegue localizar sua presa pela emissão de ultra-sons. No caso das radiações luminosas, podem ser citadas aquelas que apresentam baixo comprimento de onda, como as refletidas por palha de arroz, que repelem principalmente pulgões. Os repelentes químicos atuam através do odor liberado por certas substâncias, que podem ser aplicadas sobre o substrato a ser protegido, ou que são liberadas pelo próprio substrato. Quase todos os repelentes são voláteis e ativos na fase de vapor, sendo que, normalmente, o raio de ação de um repelente é bem menor que aquele apresentado por um atraente. A utilização de repelentes tem sido feita principalmente, contra moscas e mosquitos para proteção do homem e de animas domésticos. 3.6. RESISTÊNCIA DE PLANTAS A INSETOS Apesar de ser um dos métodos ideais para controle e ser conhecido de longa data, só a partir dos últimos vinte anos é que começou a ser estudado mais intensamente, concomitantemente ao progresso da ciência na área de síntese de organismos geneticamente modificados. Tem-se observado que algumas plantas possuem um certo grau de resistência a insetos e, há muitos anos, tem-se estudado a biossíntese e a regulação de compostos químicos de plantas associados com essas defesas. Atualmente, sabe-se que esses defensivos são encontrados em vários tecidos vegetais e entre esses compostos estão incluídos antibióticos, alcalóides, terpenos e proteínas. Entre as proteínas, estão incluídas enzimas tais como as quitinases, as lectinas e os inibidores de enzimas digestivas. A utilização de plantas inseticidas para controle de pragas não é uma técnica recente, sendo seu uso bastante comum em países tropicais antes do advento dos inseticidas sintéticos. As pesquisas com plantas inseticidas podem ser realizadas, basicamente, com dois objetivos: a descoberta de moléculas com atividade contra insetos 31 que permitam a síntese de novos produtos inseticidas e a obtenção de inseticidas naturais para uso direto no controle de pragas. Os produtos naturais são representados pelos pós secos e extratos aquosos que, uma vez obtidos, são imediatamente utilizados no controle de pragas, e pelos produtos que, após a obtenção, são formulados a partir da mistura com substâncias inertes, visando facilitar a aplicação, aumentar a eficiência ou evitar a rápida degradação, e que constituem produtos comerciais ou semicomerciais. Extratos de sisal, Agave sisalana Perrine, tem sido utilizado no controle do curuquerê-do- algodoeiro, Alabama argillacea, com promissores resultados (Azevedo et al., 2004). Entretanto, dentre as plantas inseticidas atualmente estudadas, a meliácea Azadirachta indica, nim, é considerada a mais importante e promissora. As principais vantagens desta planta, em relação às demais, seria a sua atividade sistêmica, eficiência em baixas concentrações, baixa toxicidade a mamíferos e menor probabilidade de desenvolvimento de resistência pela ocorrência de um complexo de princípios ativos. Atualmente, genes que conferem resistência a insetos podem ser introduzidos em plantas de interesse para reduzir sua susceptibilidade. Esses genes podem ser obtidos de plantas, bactérias ou de outra origem. Pode-se encontrar diferentes tipos de respostas de uma variedade, quando esta é atacada por um inseto; correspondendo a diferentes graus de resistência. Assim, o vegetal pode ser imune (não sofrer qualquer dano pela praga sob qualquer condição), apresentar alta resistência (sofre pouco dano sob determinadas condições), resistência moderada (sofre dano menor do que o dano sofrido pelas demais), suscetível (sofre dano semelhante ao dano médio sofrido pelas demais) e apresentar alta suscetibilidade (sofre dano maior que o dano médio sofrido pelas demais). Existem parâmetros que podem ser utilizados, em nível de campo, para a constatação da resistência, através da observação do vegetal. A mortalidade das plantas, a proporção de área foliar destruída, o número ou percentagem de órgãos vegetais danificados; a produtividade e a qualidade do produto são os mais utilizados. Em função do comportamento e biologia dos insetos, tem-se a diagnose da população das formas jovens e adultas; a oviposição; alimentação; duração das fases larval e pupal,ou ninfal; a mortalidade das formas imaturas; o tamanho e peso das 32 formas adultas além da longevidade e fecundidade dos adultos, como importantes parâmetros para a conclusão diagnóstica da resistência. As principais vantagens deste método de controle seriam a facilidade de utilização de material resistente, baixo custo, harmonia com o meio ambiente, persistência, interação com as demais práticas culturais e compatibilidade com outros métodos de controle. Enquanto que as suas desvantagens, ou limitações, seriam: grande intervalo de tempo para a confecção da variedade, limitação genética da planta e a ocorrência de biótipos (organismos com o mesmo genótipo, acarretando diminuição da variabilidade gênica populacional). 3.6.1. MELHORAMENTO GENÉTICO PARA RESISTÊNCIA DE INSETOS Considerando-se que os fatores de resistência têm base genética, é importante a definição do programa de melhoramento a ser utilizado. A resistência à pragas pode constituir o principal objetivo do programa de melhoramento ou pode ser apenas um dos itens do programa e ser estudado junto com o aumento de produtividade, melhoria de qualidade, resistência à seca, à moléstias, resposta a adubação, precocidade, altura da planta, etc. De qualquer forma, um programa de melhoramento que vise resistência a insetos deve ser bem planejado, envolvendo diversas etapas, dentre as quais as mais importantes são: definição da praga-chave, identificação e coleta de fontes de resistência e definição dos métodos de melhoramento a serem utilizados. A identificação e a coleta de fontes de resistência são etapas importantes num programa de melhoramento, já que este depende, na maioria das vezes, da variabilidade genética existente no germoplasma inicial. Essa variabilidade pode ser encontrada em coleções ou bancos de germoplasma, e o acesso a essas coleções de base genética ampla é de importância fundamental. Identificado o material genético a ser utilizado como fonte de resistência, este pode ser solicitado nos bancos de germoplasma ou nos centros de pesquisa, considerando que a introdução de materiais estrangeiros deve seguir as normas da Embrapa – Recursos Genéticos e Biotecnologia (Decreto-lei n. 24.114, Portarias nn. 224 e 148), que coordena essa atividade no Brasil. A definição do método de melhoramento começa a ser feita após a identificação dos parentais com genes de interesse (fontes de resistência). Quando esses parentais possuem boas 33 características agronômicas, a fonte de resistência pode ser incorporada nos programas em andamento. Materiais comerciais conhecidos podem ter boas fontes de resistência, o que pode ter sido ignorado pelo fato de esses materiais serem sempre cultivados sob pulverização de inseticidas. Materiais já melhorados e resistentes já estariam muito próximos do objetivo final do programa de melhoramento, o que, entretanto, não é uma situação muito comum. De qualquer modo, a simples manutenção de algumas plantas de cada genótipo sem aplicação de inseticidas já pode ser útil, por permitir a identificação de eventuais materiais resistentes. Quando as fontes de resistência são representadas por espécies selvagens, raças locais ou por materiais exóticos com pouco ou nenhum grau de melhoramento genético, há necessidade de serem cruzados com materiais que compõem o germoplasma elite. Isso porque, nesse caso, só interessa o caráter resistência, sendo descartados os demais caracteres da fonte de resistência. Além do grau de melhoramento do germoplasma inicial e do controle genético do caráter, o sistema reprodutivo da espécie também influencia na escolha do método de melhoramento, devido principalmente às diferenças de estrutura genética entre populações autógamas e alógamas. Atualmente, a resistência de plantas a insetos vem crescendo de importância dentro dos programas de melhoramento de plantas, o que leva a prever que brevemente essa técnica deverá ser definitivamente incorporada nos programas de controle de pragas. 3.6.2. PLANTAS TRANGÊNICAS A transferência de genes exógenos para plantas cultivadas a partir das novas técnicas de engenharia genética pode ser considerada um dos avanços mais significativos dentro das ciências biológicas nos últimos anos. Até há pouco tempo, só era possível utilizar os conjuntos genéticos primários e secundários de espécies cultivadas no melhoramento genético; porém, os recentes avanços nas técnicas de cultura de tecidos e biologia molecular tornaram possível a introdução, nas plantas cultivadas, de genes provenientes de diferentes vegetais, animais e microrganismos, de tal modo que a variabilidade genética na natureza é a fonte desses genes. A expressão desses genes exógenos nas plantas transformadas ou transgênicas pode aumentar funções já existentes ou criar novas características. 34 Essas novas técnicas podem ser utilizadas para criar plantas transgênicas com novos genes para resistência a insetos. No melhoramento genético clássico, grande parte do genoma é transferido por hibridização. Entretanto, esses métodos convencionais de melhoramento esbarram em diversos problemas genéticos. (redução de pool gênico, ligação gênica, incompatibilidade sexual, etc.), além do tempo necessário para a transferência dos caracteres desejáveis para os cultivares de interesse. As técnicas de engenharia genética resolvem a maior parte desses problemas, permitindo, num tempo relativamente curto, a introdução de genes simples (isolados) nos cultivares agronomicamente adequados. Os genes para resistência a insetos mais conhecidos e estudados até o momento são aqueles que expressam as proteínas da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt), os inibidores de proteinases, os inibidores de alfa- amilase e as lectinas. O Bt produz várias proteínas inseticidas, sendo as proteínas cristais as mais eficientes. O cristal, responsável pela ação inseticida da bactéria, é composto por uma ou mais proteínas (proteínas Bt), que inativa as células do intestino do inseto. As proteínas cristais são dissolvidas no suco gástrico no lúmen do intestino, e, pela ação das proteases intestinais do inseto, são transformadas em partículas tóxicas. As células do epitélio do intestino, em contato com essas partículas, incham e eventualmente estouram, causando a morte do inseto. Já foram identificados diversos genes de proteína cristal efetivos contra lepidópteros, coleópteros e dípteros. Os inibidores de protease são polipeptídeos que participam do sistema de defesa natural das plantas contra insetos, interferindo no processo digestivo. Eles combinam-se com as enzimas digestivas do inseto de modo que ocorra a inativação das moléculas de protease do inseto pelas moléculas do inibidor, o que irá impedir a assimilação do alimento ingerido pela praga. Os inibidores ocorrem naturalmente nos tecidos de reserva de uma grande variedade de plantas, como fumo, batata, tomate, soja, etc. O primeiro gene a expressar um inibidor de protease transferido com sucesso de uma planta a outra foi o inibidor de tripsina (CpTi) isolado de plantas de caupi e que afeta lepidópteros, ortópteros e coleópteros, reduzindo a sobrevivência e prolongando o período de desenvolvimento. Um outro exemplo são os inibidores do tipo II do tomate e batata, potentes inibidores de tripsina e 35 quimiotripsina e os inibidores de tripsina presentes na soja. Os inibidores de alfa-amilase também atuam no metabolismo de digestão de alguns insetos, inibindo, nesse caso, a digestão de carboidratos. Os inibidores de alfa-amilase mais estudados são os provenientes do feijoeiro comum e do trigo. Sementes de ervilha contendo