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1 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO Valvulopatias Na ausculta cardíaca, auscultamos duas bulhas durante o ciclo cardíaco. A primeira bulha (B1) refere-se ao fechamento das valvas atrioventriculares (mitral e tricúspide), definindo o início da sístole ventricular. Logo após, ocorre a segunda bulha (B2) relativo ao fechamento das valvas semilunares (aórtica e pulmonar) e abertura das valvas atrioventriculares, iniciando assim a diástole ventricular. Portanto, temos dois tipos de valvopatias: Estenoses: a valva não se abre de forma adequada, proporcionando um fluxo turbilhonado; e Insuficiência: a valva não se fecha completamente, permitindo refluxo de sangue. Logo, na sístole encontramos as valvas aórtica e pulmonar abertas e as valvas atrioventriculares fechadas. Por conseguinte, na diástole, encontraremos as valvas atrioventriculares abertas e as valvas semilunares fechadas. Desta forma, entre B1 e B2 temos a sístole, e entre B2 e B1 a diástole. Sopros sistólicos: estenose aórtica, estenose pulmonar, insuficiência mitral, insuficiência tricúspide; e Sopros diastólicos: estenose mitral, estenose tricúspide, insuficiência aórtica, e insuficiência pulmonar. Estenose Aórtica Suas principais etiologias são: doença degenerativa ou calcificada (comum em idosos), doença congênita bicúspide, e doença reumática (mais comum em países subdesenvolvidos). A estenose aórtica possui uma tríade clássica de sintomas composta por precordialgia, síncope e dispneia, com o surgimento destes sintomas correspondendo a piora do prognóstico e da sobrevida. Pacientes com precordialgia possuem sobrevida média de 5 anos, síncope sobrevida média de 3 anos, e dispneia sobrevida média de apenas 2 anos. Logo, ao aparecimento de qualquer um desses sintomas está indicado a troca valvar. Exame físico Os achados no exame físico são: Pulsos parvus et tardus (atraso do pico de fluxo e amplitude reduzida); Sopro sistólico rude, ejetivo, crescendo e decrescendo (em diamante), mais audível em foco aórtico, com irradiação para as carótidas e fúrculas; Fenômeno de gallavardin (irradiação do sopro para o ápice); Hipofonese de B1; e Desdobramento paradoxal de B2. Exames complementares O eletrocardiograma (ecg) pode evidenciar sobrecarga ventricular esquerda, e o raio x pode ser normal, sem aumento do índice cardiotorácico, pois estenose aórtica cursa com hipertrofia concêntrica do ventrículo esquerdo. No entanto, o principal exame para estimar gravidade, complicações e definir a etiologia é o ecg. Abaixo temos uma tabela 2 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO que estima gravidade da estenose aórtica através do seu uso: Complicações As principais complicações dessa valvopatia são: edema agudo de pulmão, endocardite infecciosa, eventos trombóticos e até morte súbita. A síndrome de Heyde é outra complicação que, apesar de rara, é bem frequente em provas, sendo composta pela tríade: estenose aórtica, disfunção plaquetária e angiodisplasia colônica com sangramento gastrointestinal. Tratamento dasValvopatias Para pacientes sintomáticos graves é obrigatório o tratamento intervencionista. No entanto, os assintomáticos com estenose crítica também devem ser submetidos ao tratamento intervencionista. Os três tipos principais de intervenção que podem ser propostas são: troca valvar por uma prótese, o implante de prótese trasncateter (TAVI) e valvuloplastia por balão. A troca valvar por prótese é indicada em pacientes: com menos de 70 anos e risco cirúrgico baixo a moderado; a TAVI nos pacientes com mais de 70 anos e risco cirúrgico alto ou proibitivo; e a valvuloplastia com balão sendo considerado um procedimento ponte ou paliativo. Insuficiência Aórtica As principais causas de IA são: febre reumática, valva bicúspide, doenças que dilatam a aorta (HAS, sífilis, espondilite anquilosante, dissecção aorta e síndrome de Marfan), degenerativa e endocardite. No Brasil sua principal causa ainda é a febre reumática. Diagnóstico daValvopatias A maioria dos pacientes são assintomáticos nas fases iniciais da doença, porém quando sintomáticos, o principal sintoma é a dispneia. Eleva-se a suspeita para esse diagnóstico em condições, no qual o ventrículo esquerdo se encontra com sobrecarga de volume devido ao refluxo de sangue da aorta em direção ao ventrículo esquerdo. Exame físico: Pressão arterial divergente ou pressão de pulso aumentada; Pulso em martelo d’água ou pulso de Corrigan; Sopro protodiastólico, aspirativo e decrescente, mais audível no foco aórtico acessório, com irradiação cervical; B2 hipofonética ou ausente; Pulso bisferiens (dois picos sistólicos); e Ictus cordis aumentado e desviado para a esquerda. Um tema muito abordado em provas são os sinais clássicos da insuficiência aórtica. Confira: Musset: oscilações discretas da cabeça sincronizadas com o batimento cardíaco; Quincke: Pulsação do leito ungueal; Gerhard: Pulsação do baço; https://med.estrategia.com/portal/aluno-de-medicina/dicas-de-estudo/disseccao-de-aorta-e-outras-sindromes-aorticas/ https://med.estrategia.com/portal/aluno-de-medicina/dicas-de-estudo/dispneia/ https://med.estrategia.com/portal/aluno-de-medicina/dicas-de-estudo/dispneia/ 3 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO Minervini: Pulsação da base da língua; Rosemback: Pulsação do fígado; Muller: Pulsação da úvula; Hill: Pressão sistólica da artéria poplítea maior que 20 mmHg em relação a artéria braquial, com o paciente em decúbito dorsal; Landolfi: Pulsação das pupilas; Corrigan: Pulso em martelo d’água; Duroziez: Aumento do sopro quando se comprime a artéria femoral; e Traube ou pistol shot: Som forte audível em algumas artérias. Atenção: o sopro de Austin Flint ocorre devido a uma estenose mitral funcional, decorrente do regurgitamento do jato aórtico em direção ao folheto anterior da valva mitral, o que impede sua abertura na diástole, produzindo um sopro diastólico em ruflar mais audível em foco mitral. Exames complementares: Devido a sobrecarga crônica de volume em câmaras esquerdas, pode-se encontrar no ecg sobrecargas de átrio e ventrículo esquerdo, além do aumento do índice cardiotorácico na radiografia de tórax. Ao ecocardiograma, graduamos a insuficiência aórtica, de acordo com sua fração regurgitante, e na presença de sinais de insuficiência cardíaca está indicada a cirurgia. Tratamento Em casos de insuficiência aórtica grave, é indicada a troca valvar. Abaixo, detalharemos outras indicações de cirurgias em caso de insuficiência aórtica grave crônica: Presença de sintomas como dispneia grave limitando a qualidade de vida; Indicação de outra cirurgia cardíaca concomitante; Paciente assintomático, porém com disfunção ventricular e fração de ejeção do ventrículo esquerdo menor que 50%; e Assintomáticos com dilatação de ventrículo esquerdo importante, com diâmetro maior que 75 mm e diâmetro sistólico maior que 55 mm. Estenose Mitral No Brasil, 95% dos casos de estenose mitral têm origem reumática. Decorre essencialmente da dificuldade do esvaziamento do átrio esquerdo durante a diástole ventricular, ocasionando uma sobrecarga atrial esquerda isolada. Cronicamente, essa sobrecarga atrial esquerda leva a um aumento da pressão venocapilar pulmonar, congestão pulmonar e hipertensão pulmonar. Corresponde a valvulopatias mais comum na gravidez. Diagnóstico Os sintomas mais comuns são dispneia, ortopneia, hemoptise, e dispneia paroxísticas noturna. Com o crescimento do átrio esquerdo devido a sobrecarga volumétrica o paciente pode apresentar rouquidão pela compressão do nervo laríngeo recorrente – síndrome de Ortner. A disfagia pode ocorrer por compressão extrínseca do esôfago pelo átrio esquerdo dilatado. Exame físico: 4 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO B1 hiperfonética; Estalido de abertura da mitral; Sopro diastólico em ruflar com reforço pré-sistólico em foco mitral; e P2 hiperfonética ( em casos de hipertensão pulmonar). Exames complementares: No ecg, podemos encontrar: Sobrecarga de átrio esquerdo: onda P com duração maior ou igual a 120 ms ou porção negativa da onda P em V1 maior que 1 mm2; e Sobrecarga de câmaras direitas por congestão retrógrada: amplitude maior ou igual a 2,5 mm, desvio do eixo cardíaco para a direita e para anterior e onda S em V5 e V6 maior que 7 mm. Já no raio x de tórax, encontraremos sinais de sobrecarga de átrio esquerdo (sinal do duplo contorno, sinal da bailarina e sinal do 4º arco), com ventrículo esquerdo de tamanho normal. Para graduar a gravidade da estenose mitral utilizaremos essa tabela abaixo: Tratamento O tratamento clínico da estenose mitral merece uma atenção especial pois ele se baseia em um tripé: Controle da frequência cardíaca – betabloqueadores e bloqueadores do canal de cálcio. Controle da volemia – diuréticos com cautela; e Pacientes com fibrilação atrial e estenose mitral moderada- grave: uso de Varfarina No entanto, para as estenoses mitrais existem três abordagens intervencionistas que podem ser propostas: valvoplastia percutânea com balão (VMCB), comissurotomia cirúrgica e troca valvar. Normalmente, o procedimento de escolha é a VCMB e para sua indicação é necessário utilizar um escore chamado de escore de Wilkins e Block, que leva em consideração 4 parâmetros: mobilidade de folhetos, espessamento dos folhetos, calcificação valvar e aparato subvalvar comprometido. Portanto, escore 11 pontos indica-se troca valvar e escore 9-11 pontos devemos individualizar qual seria a melhor conduta. Devido a elevada probabilidade de descompensação clínica da estenose mitral no período gestacional, devemos acompanhar a gestação de perto pois se trata de uma gestação de alto risco. Será indicado procedimento cirúrgico caso a paciente tenha uma área valvar muito reduzida 30%; 6 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO IM crônica grave primária em paciente assintomático se fração de ejeção do VE entre 30-60 % e diâmetro sistólico do VE maior ou igual a 40 mm; IM crônica grave primária em assintomáticos, com função do VE preservada e novo episódio de fibrilação atrial nos últimos 6 meses ou hipertensão pulmonar; e IM secundária de etiologia isquêmica, se o paciente for submetido a cirurgia de revascularização do miocárdio. As três principais opções cirúrgicas são: plastia valvar, cirurgia de troca valvar e a clipagem percutânea, sendo a plastia valvar o melhor procedimento cirúrgico, devido a maior durabilidade da intervenção, apesar de ser tecnicamente mais difícil e ter resultados ruins na etiologia reumática. Caso a plastia não seja recomendada, a troca valvar está indicada, com o uso de próteses mecânicas ou biológicas. Por fim, a clipagem percutânea é reservada a pacientes com alto risco cirúrgico ou contraindicações às outras abordagens. Estenose Tricúspide É uma valvulopatia extremamente rara, cuja principal etiologia é a febre reumática. Comumente, se apresenta acompanhada de outras valvulopatias. Os principais sintomas são: fadiga, turgência jugular, hepatomegalia, edema de membros inferiores e refluxo hepatojugular. Ao exame físico temos um sopro em ruflar diastólico, com reforço pré-sistólico e B1 hiperfonético e estalido de abertura. Insuficiência Tricúspide Possui a mesma divisão da insuficiência mitral em causas primárias (lesões do aparato valvar) e secundárias(dilatação do anel ou incompetência dos músculos papilares). Sendo as causas secundárias as mais comuns. Exame clínico Os principais sintomas são Fadiga; Dispneia; Turgência jugular; Hepatomegalia; B3 de ventrículo direito; e Hiperfonese de B2, em caso de hipertensão pulmonar, edema de membros inferiores e até anasarca. Ademais, classicamente apresenta onda V gigante no pulso venoso jugular. Na ausculta o sopro é holossistólico, regurgitativo, mais audível em borda esternal baixa, sem irradiação para axilas, com piora a manobra de Rivero-Carvalho. Tratamento O tratamento é baseado no uso de diuréticos e restrição salina, visando minimizar os sintomas congestivos. O implante de prótese ou plastia estão indicados apenas nos casos de insuficiência tricúspide primária grave, sintomática e refratária ao tratamento clínico. Doenças da Valva Pulmonar As estenoses pulmonares são raras e na maioria das vezes possuem etiologia congênita. Já a insuficiência pulmonar pode ter causa iatrogênica, por exemplo, ao utilizar um balão para dilatar a valva, 7 ALEXSANDRA CARVALHO- REUMATO endocardite, síndrome carcinóide ou secundária a dilatação da artéria pulmonar em casos de hipertensão pulmonar. Na ausculta, temos um sopro holodiastólico melhor audível em foco pulmonar, que aumentade intensidade durante a manobra de Rivero-Carvalho. OBS: o sopro de Graham Steel, um epônimo muito cobrado em provas de residência, corresponde ao sopro da insuficiência pulmonar secundária a dilatação da artéria pulmonar devido à hipertensão pulmonar. O tratamento cirúrgico será feito em caso de insuficiência pulmonar grave e sintomática ou quando houver disfunção de ventrículo direito, através de um implante de prótese valvar.