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Brasília-DF. Estrutura E FuncionamEnto da Educação Básica Elaboração Renata Malta Vilas-Bôas Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 5 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 6 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 8 UNIDADE I O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA ............................................................. 9 CAPÍTULO 1 ORGANIZAÇÃO E ESTRUTURA DO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO ...................................... 9 CAPÍTULO 2 A EDUCAÇÃO BÁSICA E A SUA CLASSIFICAÇÃO ..................................................................... 12 CAPÍTULO 3 DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E FINALIDADES DA EDUCAÇÃO BÁSICA ......................................... 18 UNIDADE II EDUCAÇÃO INFANTIL COMO PRIMEIRA ETAPA DA EDUCAÇÃO BÁSICA ................................................. 22 CAPÍTULO 1 A EDUCAÇÃO INFANTIL .......................................................................................................... 22 UNIDADE III ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA ................................................ 43 CAPÍTULO 1 CONCEITO, CARACTERÍSTICAS, OBJETIVOS E IMPORTÂNCIA DO ENSINO FUNDAMENTAL ......... 43 CAPÍTULO 2 DURAÇÃO E OBRIGATORIEDADE DO ENSINO FUNDAMENTAL .................................................. 47 CAPÍTULO 3 ENSINO FUNDAMENTAL E SUAS NUANCES ............................................................................... 54 UNIDADE IV ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA ............................................................... 61 CAPÍTULO 1 O ENSINO MÉDIO .................................................................................................................. 61 CAPÍTULO 2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS DO ENSINO MÉDIO .......................................................................... 66 CAPÍTULO 3 A AVALIAÇÃO E AS DISCIPLINAS NO ENSINO MÉDIO ............................................................... 71 CAPÍTULO 4 EJA - EDUCAÇÃO PARA JOVENS E ADULTOS ........................................................................... 78 PARA (NÃO) FINALIZAR ..................................................................................................................... 83 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 85 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do aluno. 7 Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 Introdução Neste Caderno de Estudos e Pesquisa, abordaremos o sistema educacional brasileiro. Dessa forma vamos tratar da organização e da estrutura do sistema de educação brasileiro, dando ênfase à Educação Básica. Na primeira unidade será abordado o sistema de educação brasileiro e a Educação Básica com a sua classificação, bem como a finalidade da Educação Básica. Já na segunda unidade, vamos tratar da Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica, analisando as responsabilidades do Ministério da Educação – MEC, bem como a competência de cada um dos entes federados para a viabilização do direito à Educação Infantil. Na unidade três o foco é o Ensino Fundamental como escolaridade mínima obrigatória. A unidade quatro tem como foco o Ensino Médio, reconhecido como a etapa final da Educação Básica. Como podemos ver, vamos estudar, ao longo deste Caderno, aspectos interessantes e relevantes para a compreensão da sistemática da Educação Básica brasileira. Com isso, vamos nos deparar com, por exemplo, a real função das creches e a importância do Ensino Médio. Acreditamos na importância da educação, e, seguindo a evolução dos direitos fundamentais, acreditamos na importância da educação de qualidade e, para isso, faz-se necessário conhecer tanto a estrutura normativa que ampara o sistema educacional, como compreender o papel fundamental da educação para o crescimento e desenvolvimento, inicialmente, de nossas crianças e, posteriormente, dos adolescentes e dos adultos. A educação como forma de mudança de perspectiva, como forma de crescimento e engrandecimento do ser humano, estará presente em nosso texto, pois mais do que simplesmente a colocação de um sistema normativo, faz-se necessária a compreensão das transformações que a educação pode ocasionar, tanto do ponto de vista individual/ pessoal quanto social. Objetivos » Analisar o sistema educacional brasileiro. » Compreender a organização e a estrutura do sistema educacional brasileiro. » Compreender cada uma das etapas do sistema educacional brasileiro. 9 UNIDADE I O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA CAPÍTULO 1 Organização e estrutura do sistema educacional brasileiro Neste primeiro capítulo,creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em consequência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a Educação Infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “crianças até 5 (cinco) anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A Educação Infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no Ensino Fundamental e na Educação Infantil (CF, art. 211, § 2o) - não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político-administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social. - Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político - jurídicos que sobre eles incidem em caráter impositivo, vierem a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL. - O Poder Público - quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no próprio texto constitucional - transgride, com esse comportamento negativo, a 39 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I própria integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.. - A inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais traduz inaceitável gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado. É que nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos. - A intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais previstas e determinadas no texto constitucional, notadamente na área da Educação Infantil (RTJ 199/1219-1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República assegura à generalidade das pessoas. Precedentes. A CONTROVÉRSIA PERTINENTE À “RESERVA DO POSSÍVEL” E A INTANGIBILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL: A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS”. - A destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras “escolhas trágicas”, em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efetividade às normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. - A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso 40 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. Doutrina. Precedentes. - A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1o, III, e art. 3o, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV). A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. - O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. LEGITIMIDADE JURÍDICA DA IMPOSIÇÃO, AO PODER PÚBLICO, DAS “ASTREINTES”. - Inexiste obstáculo jurídico-processual à utilização, contra entidades de direito público, da multa cominatória prevista no § 5o do art. 461 do CPC. A “astreinte” - que se reveste de função coercitiva - tem por finalidade específica compelir, legitimamente, o devedor, mesmo que se cuide do Poder Público, a cumprir o preceito, tal como definido no ato sentencial. Doutrina. Jurisprudência. 41 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I (ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em23/8/2011, DJe-177 DIVULG 14/9/2011 PUBLIC 15/9/2011 EMENT VOL-02587-01 PP-00125) O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo analisando o tema no âmbito de sua atuação formulou a seguinte súmula: Súmula 63: É indeclinável a obrigação do Município de providenciar imediata vaga em unidade educacional a criança ou adolescente que resida em seu território. Conforme o julgado transcrito acima e a súmula do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, podemos perceber que a preocupação maior é com a inserção da criança no ambiente escolar e que as autoridades competentes deverão providenciar para que isso ocorra, não podendo usar como argumento que não tem valores direcionados para a educação suficientes para atender a toda a demanda existente. Esse deixou de ser um argumento válido, no momento em que se tornou de responsabilidade dos entes pela concretização do direito à educação. Creche próxima à residência O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 53 prevê em seu inciso V que a criança e o adolescente têm direito à educação e de forma especificamente a sua residência. Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: [...] V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. Apesar dessa ser a regra, encontramos um julgado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça que sopesando diversos valores entendeu que essa possibilidade poderá ser afastada se for para beneficiar a criança, vejamos: MANDADO DE SEGURANÇA - MATRÍCULA EM ESTABELECIMENTO PÚBLICO DE ENSINO - CRITÉRIO DE GEORREFERENCIAMENTO - INAPLICABILIDADE - VIOLAÇÃO DO ART. 53, I e V, DA LEI 8.069/1990 - INOCORRÊNCIA. 1. O inciso V do art. 53 da Lei no 8.069/1990 visa garantir a alunos (crianças e adolescentes) estudar em escola próxima de sua residência, evitando deslocamento de longas distâncias para acesso à educação pública e gratuita. 42 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA 2. A regra não constitui uma imposição e sim uma possibilidade, com opção em benefício do aluno. 3. A manutenção do aluno na escola já frequentada em anos anteriores mostra-se mais benéfico do que a transferência para atender à regra da aproximação. 4. Recurso especial não provido. (REsp 1175445/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 4/3/2010, DJe 18/3/2010) Em que pese a regra da proximidade ser a mais benéfica como regra geral, esta pode ser afastada se for para beneficiar o menor. 43 UNIDADE III ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA CAPÍTULO 1 Conceito, características, objetivos e importância do Ensino Fundamental O Ensino Fundamental pode ser conceituado como um dos níveis da Educação Básica no Brasil. Mas, esse conceito não reflete a importância efetiva do Ensino Fundamental e para tanto precisamos nos socorrer dos dados apresentados pelo Instituto de Ensino e Pesquisa de São Paulo, que no ano de 2011, após uma análise detalhada, concluiu que o bom aproveitamento da criança nessa fase é decisivo ao seu ingresso na universidade, consequentemente mais vem preparada para enfrentar o mercado de trabalho. A meta 2 do Plano Nacional de Educação nos traz que todas as crianças devem estar inseridas no Ensino Fundamental a partir dos 6 anos de idade. Podemos localizar os objetivos do Ensino Fundamental no art. 32 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação: Tabela 6. Ob je tiv os d o En si no Fu nd am en ta l o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo; a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade; o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se assenta a vida social. Fonte: Elaborada pela autora 44 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Esse mesmo artigo 32 estabelece que a criança com 6 (Seis) anos deve ser, obrigatoriamente, matriculada no Ensino Fundamental obrigatório. Figura 4. Fonte: Contudo, diante dessa determinação discute-se qual é o momento adequado para esse ingresso e se é possível fazer esse corte em razão do mês em que a criança completa 6 anos de idade. Num primeiro momento, foi fixado que somente aquelas crianças que completarem 6 anos até o dia 31 de março do corrente ano é que poderiam ingressar no primeiro ano, como recomendação do CNE – Conselho Nacional de Educação. Contudo por tratar-se de recomendação, cada município fixou um prazo específico, assim podemos verificar, como exemplo, São Paulo que posteriormente ampliou-se até 30 de junho, mas esse corte etário ainda está sendo discutido nos municípios e nos tribunais brasileiros. Em 18 de maio de 2014, o jornal Último Segundo noticiou que o Poder Judiciário, para o estado de São Paulo, teria mudado as regras do corte etário permitindo assim que independentemente da data do aniversário da criança ela, completando 6 anos naquele ano, poderia ingressar no 1o ano. (Último Segundo, 2014). Contudo essa divergência ainda é grande em nossos tribunais, vejamos a recente decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios: AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ANTECIPADA. Educação Infantil. CRIANÇA COM CINCO ANOS COMPLETOS. AVANÇO PARA A PRIMEIRA SÉRIE 45 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III DO ENSINO FUNDAMENTAL. IDADE MÍNIMA DE 6 ANOS NÃO ALCANÇADA. IDADE INFANTIL. OBSERVÂNCIA DAS REGRAS DE REGÊNCIA. CORTE ETÁRIO. LEGITIMIDADE. 1. A Carta Federal, em seu art. 208, I, determina como obrigatória a educação a partir dos quatro anos de idade, bem como o art. 54, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a obrigatoriedade da educação a partir do Ensino Fundamental, motivo pelo qual a oferta de creche pelo Estado não está abrangida no conceito de “Educação Básica obrigatória”. Sob esse panorama, a Educação Infantil será oferecida em creche e pré-escola a crianças, no primeiro caso, até três anos de idade, e, no segundo, de quatro a seis anos (art. 30 da Lei Federal no 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação). 2. Revela-se inviável o pedido de matrícula de criança de 5 anos de idade na primeira série do Ensino Fundamental, mediante avanço escolar formalizado por meio de avaliação a ser realizada pela escola, frente à necessidade de que os 6 anos sejam completados até 31 de março do ano escolar. 3. Deve ser considerado legítimo o corte etário estabelecido pela Resolução no 6/2010 do CNE e pela Resolução no 1/2012 do CEDF (necessidade de a idade mínima para matrícula no curso correspondente ser atingida até 31 de março), uma vez que tal critério foi fixado de conformidade com diversos requisitos de desenvolvimento e capacidade relativos a cada idade previstos na própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Precedente do STJ. 4. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (Acórdão no 864622, 20140020330633AGI, Relator: SIMONE LUCINDO, 1a Turma Cível, Data de Julgamento: 29/4/2015, Publicado no DJE: 8/5/2015. Pág.: 163). Como podemos verificar pela recente decisão do E.TJDFT ainda há muito a ser questionado e discutido com relação à idade de corte, o certo é que quanto mais tempo a criança permanece na escola melhor é para o seu desenvolvimento.Contudo cumpre ressaltar que em recente acórdão o Egrégio Superior Tribunal de Justiça se manifestou no sentido de que não existe direito à matrícula se não for preenchido o requisito da idade mínima, vejamos no julgado colacionado abaixo: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO À MATRÍCULA. REQUISITO ETÁRIO NÃO CUMPRIDO. ACÓRDÃO RECORRIDO LASTREADO EM PRECEITOS 46 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA CONSTITUCIONAIS E LEI LOCAL. SÚMULAS 280/STF. NÃO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 126/ STJ. 1. A Corte de origem consignou que inexiste direito líquido e certo à matrícula na segunda série do Ensino Fundamental da criança que não tenha completado idade estabelecida pela Resolução 2, de 23 de setembro de 2009 do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso e da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. 2. Constata-se que, da leitura do aresto, que este, além de amparar suas razões em dispositivos e princípios da Constituição Federal, também o julgou com base em lei local, o que atrai a incidência das Súmulas 280/ STF e 126/STJ. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1539731/MT, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 1/9/2015, DJe 11/9/2015) Assim, o que irá prevalecer é a determinação do Conselho Nacional de Educação quando no Estado não houver nenhuma outra determinação. 47 CAPÍTULO 2 Duração e obrigatoriedade do Ensino Fundamental Inicialmente a duração do Ensino Fundamental era de 8 anos, contudo com a alteração ocorrida em 2006 passou a ser de 9 anos, isso ocorreu porque a Lei de Diretrizes e Bases da Educação teve os seus artigos alterados mediante a Lei no 11.274/2006, estabelecendo o ano de 2010 como o prazo final para implementação do Ensino Fundamental de 9 anos. Figura 5. Ensino Fundamental Anos Iniciais: compreende do 1o ao 5o ano Anos Finais: compreende do 6o ao 9o ano É obrigatório que as crianças sejam matriculadas no Ensino Fundamental, caso isso não ocorra estamos diante de uma situação em que seus pais ou representante legal irá responder pelo crime de abandono intelectual previsto no Código Penal art. 246, vejamos: Abandono intelectual Art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. O abandono intelectual trata-se de crime próprio, que somente podem praticá-lo os genitores, responsáveis pelas ações tipificadas; doloso, pois não há previsão legal para a figura culposa; também de forma livre, podendo ser praticado por qualquer meio, forma ou modo; instantâneo, pois sua consumação não se alonga no tempo, e unissubjetivo que pode ser praticado, em regra, por um agente, individualmente, e ainda plurissubsistente, pois pode ser desdobrado em vários atos, que, no entanto, integram uma mesma conduta. (BITENCOURT, 2004, p. 155) 48 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Além da previsão no Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente vem reforçando, afirmando que Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino. Diante então da hipótese de os pais deixarem de realizar a matrícula dessa criança ou adolescente, então estaremos diante de uma conduta tipificada em nosso Código Penal e nesse caso há previsão de pena de detenção ou o pagamento de multa. Além da matrícula ainda encontramos previsão legal determinando que compete ao Poder Público providenciar o recenseamento dos educandos no Ensino Fundamental, fazendo-lhes a chamada e assim zelar, junto aos pais e responsáveis, pela frequência de nossas crianças e adolescentes à escola, conforme previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 54, § 3o. Mas além das consequências na vertente criminal, o STJ já se posicionou no sentido de denegar mandado de segurança de pais que solicitavam autorização para ministrarem aos filhos as disciplinas do Ensino Fundamental em sua própria residência familiar. Negou, também, o pedido de afastá-los de frequência regular à escola, pois compareciam apenas à aplicação de provas, vejamos: MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO FUNDAMENTAL. CURRÍCULO MINISTRADO PELOS PAIS INDEPENDENTE DA FREQUÊNCIA À ESCOLA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ILEGALIDADE E/OU ABUSIVIDADE DO ATO IMPUGNADO. INOCORRÊNCIA. LEI No 1.533/51, ART. 1o, CF, ARTS. 205 E 208, § 3o; LEI No 9.394/1960, ART. 24, VI E LEI 8.096/1990, ARTS. 5o, 53 E 129. 1. Direito líquido e certo é o expresso em lei, que se manifesta inconcusso e insuscetível de dúvidas. 2. Inexiste previsão constitucional e legal, como reconhecido pelos impetrantes, que autorizem os pais ministrarem aos filhos as disciplinas do Ensino Fundamental, no recesso do lar, sem controle do poder público mormente quanto à frequência no estabelecimento de ensino e ao total de horas letivas indispensáveis à aprovação do aluno. 3. Segurança denegada à míngua da existência de direito líquido e certo. (STJ – 1a Seção – MS 7.407/DF, relator Ministro Francisco Peçanha Martins, Data do Julgamento 24/4/2002 publicado no DJ 21/3/2005, p. 203.) 49 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III Cumpre ressaltar que o Ministro Francisco Peçanha Martins assim se posiciona em seu voto: Os filhos não são dos pais, como pensam os Autores. São pessoas com direitos e deveres, cujas personalidades se devem forjar desde a adolescência em meio a iguais, no convívio social formador da cidadania. Aos pais cabem, sim, as obrigações de manter e educar os filhos consoante a Constituição e as leis do País, asseguradoras do direito do menor à escola (art. 5o e 53, I, da Lei no 8.096/1990) e impositivas de providências e sanções voltadas à educação dos jovens como se observa no art. 129, e incisos, da Lei no 8.096/1990 supra transcritos, e art. 246, do Código Penal, que define [como crime] contra a assistência familiar “deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar” , cominando a pena de “detenção de quinze dias a um mês, ou multa, de vinte centavos a cinquenta centavos”. Voto-Vista do Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS Pedi vista, porque me impressionou o choque dos brilhantes argumentos que acabo de resumir. Não sou técnico em educação. Minha experiência, no assunto resulta de haver criado quatro filhos que resultaram em atuais bons cidadãos. Procurei criá-los como cidadãos comuns, evitando, mesmo, que eles tirassem proveito de minhas circunstanciais vitórias profissionais, transmiti-lhes três preocupações que meu saudoso pai guardava em relação a mim: não tirar dez em comportamento; não ser primeiro da classe e não chegar em casa humilhado. Dizia ele: menino que tira dez em comportamento está doente ou é mau caráter; ser primeiro de classe é fator de soberba; apanhar sem reagir é covardia, inadmissível em quem pretende ser cidadão. Embora me tenha proporcionado acesso à boa cultura humanística, para ele, o convívio escolar funcionava como vacina contra a submissão e a arrogância: para ele, duas terríveis doenças da cidadania. Diante de tão pragmática experiência, não me sinto habilitado a avançar considerações políticas em torno do tema. Limito-me à seara do juiz, no julgamento do Mandado de Segurança: o ordenamento jurídico. Neste terreno, observo que nossa Constituição Federal trata a educação como algo que transcende o mero implante de conhecimentos. Em verdade o direito à educação tem como meta o “preparo para o exercício da cidadania” (CF, Art. 205). 50 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Bem ou mal, o Constituinte entendeu que o preparo para a cidadania não dispensa o convívio escolar, tanto que o zelo pela frequência escolar é um dos encargos do poder público (arts. 205 e 208, § 3o). Se assim ocorre, a exigência de frequência,inscrita no Art. 24, VI, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação afina-se com o sistema constitucional. Se assim ocorre, o ato impugnado não padece de ilegalidade. Por isso, acompanho o eminente Relator, denegando a Segurança. Voto-vista da Ministra Laurita Vaz Contudo, não posso me permitir olvidar da função em que estou investida, qual seja, a de Juíza. E como tal, meu dever é de dirimir as querelas, aplicando a Legislação vigente. Boa ou ruim, adequada ou inadequada, retrógrada ou progressista, oportuna ou inoportuna, é a Lei vigente, elaborada, discutida, votada, aprovada e sancionada por legítimos representantes do povo, democraticamente eleitos, que deve disciplinar a vida em sociedade. É o nosso sistema, que pode não ser o ideal, mas é o que temos. (...) Resta indubitável a exigência da Lei da frequência escolar como fator organizacional do sistema de educação. Esse aspecto foi bem delineado no Parecer denegatório da pretensão - Parecer no 34/2000 da Câmara de Ensino Básico do Conselho Nacional de Educação - CEB/CNE. Com efeito, a Lei no 9.394/1996 (LDBEN), além de determinar que o Ensino Fundamental seja presencial na escola (art. 32, §4o), ainda exige um mínimo de 75% de frequência para aprovação (art. 24, inciso VI). Assim, bem ou mal, com acerto ou desacerto, o fato é que há disposição legal expressa (constitucional e infraconstitucional) determinando a frequência obrigatória, inclusive com a estipulação de carga horária mínima a ser cumprida pela escola, bem como com a imposição de limite de faltas para aprovação. Como, então, proclamar a liquidez e certeza do direito dos autores, se há perfeita compatibilidade entre o sistema constitucional e o legal, no que diz respeito à exigência da frequência escolar? De outro lado, não poderia me esquivar de apresentar alguns argumentos, agora não mais jurídicos, mas de natureza político-educacional, em prol 51 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III do atual sistema. E me arrisco a fazê-lo apenas como cidadã, mãe e com alguma experiência de alguém que já foi professora, diretora e secretária geral de escolas de 1o e 2o graus, e ainda hoje exerce o magistério como professora universitária. Educar é um processo bastante complexo. E, portanto, não pode ser encarado sob uma perspectiva singular, restrita. Há nesse processo pressupostos éticos, políticos, e pedagógicos a serem observados, tendo em vista o objetivo que se pretende atingir ao final. Vivemos em um mundo onde o indivíduo, para ter uma participação crítica e coerente, capaz de interferir com discernimento nos rumos da sociedade e decidir o seu próprio destino, precisa interagir com ele. E só assim se cresce. A Escola, com diretrizes traçadas pelo Estado, refletindo a cultura e os interesses da sociedade que representa, é uma das Instituições mais importantes para firmar os pilares fundamentais, os princípios balizadores para a formação do indivíduo, do cidadão. E essa formação não se restringe aos aspectos formais de conteúdos previamente estabelecidos. É mais que isso. O ambiente escolar possibilita o convívio com o diferente, com o igual, com o parecido, com o desconhecido. Aprende-se o significado da palavra participação. O aluno não é um mero receptor passivo, ao revés, é provocado a interagir, a opinar, a concordar ou discordar. Aprende-se o significado da palavra cidadão, do que é cidadania. Cumpre ressaltar que o papel da família nesse processo, por certo, é fundamental e imprescindível. É uma preciosa fonte de referências. A família, não só pode, deve engajar-se na formação do indivíduo. O que não quer dizer que seja capaz de, sozinha, suprir todos os flancos. Não creio que restringir o processo, limitando os filhos às experiências dos pais, por melhor e mais bem intencionados que sejam, venha a ser uma boa opção. De qualquer sorte, voltando às fronteiras do processo judicial, pelas razões já expostas, com a vênia do eminente Colega que, com substanciosas razões, demonstrou porque pensa de forma diversa, não vejo como conceder a segurança pleiteada. Acompanho o voto do eminente Relator, denegando a segurança. 52 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Diante dessa obrigatoriedade dos pais em matricular seus filhos no Ensino Fundamental podemos nos deparar com diversas notícias sobre intimação de pais em decorrência dessa situação específica, vejamos essa notícia de 2010: Pai intimado por não mandar filho à escola entregou cartão Bolsa Família a traficante CARLA EINSFELD - GAZETA ONLINE A pedido da Prefeitura da Serra, a 1a Vara da Infância e da Juventude e o 1o Juizado Especial Criminal do município intimaram, desde o início das aulas este ano, 290 pais por não obrigarem os filhos a frequentar à escola periodicamente. Entre os intimados está um homem que repassou o cartão do Bolsa Família a um traficante para quitar dívidas com drogas. “Quando a Secretaria de Educação da Serra disponibiliza os nomes dos alunos que não estão frequentando a escola para os comissários eu mando uma carta de intimação para os pais. Em uma dessas intimações o comissário perguntou ao pai de uma criança onde estava o cartão e ele disse que estava na mão de um traficante. Nós ficamos perplexos. Na verdade eu nunca me deparei com uma circunstância tão danosa”, frisou a titular do Juizado Especial Criminal, Hemínia Azoury. Não prover educação aos filhos é crime de abandono intelectual. O trabalho de conscientização dos responsáveis pelas crianças tem dado resultados, avalia a juíza. “Já caiu a evasão escolar. Caiu porque nós estamos combatendo. A nossa média era de 17%, agora caiu para 0,9%”. A juíza da 1o Vara da Infância e da Juventude da Serra, Janete Pantaleão, salienta que quando é constatada situação de vulnerabilidade social, a criança é encaminhada a uma instituição de acolhimento. “Na entidade eles têm todos os projetos sociais à disposição: escola, lazer, se for adolescente, curso profissionalizante. Passa a ter uma convivência muito melhor do que a que tinha com os pais. Mas se esta criança tem um tio ou uma avó que têm condições de criar, nós a entregamos para eles. Justamente para evitar que ela vá para o abrigamento”. Segundo a juíza Janete Pantaleão, muitas das crianças que estão fora da escola passam por problemas dentro de casa como abandono, uso de drogas ou agressões. Este ano, de acordo com dados repassados pela Prefeitura da Serra, 149 crianças foram identificadas como faltosas na escola durante o primeiro semestre.(Gazeta on line, 2010). 53 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III Guilherme de Souza Nucci analisando o art.55 do ECA complementa afirmando que Além disso, é falha grave no contexto educacional, servindo de causa para a suspensão ou destituição do poder familiar, conforme o caso concreto (2014, p. 225). 54 CAPÍTULO 3 Ensino fundamental e suas nuances Desdobramento em ciclos provisórios e terminalidade É perfeitamente possível o desdobramento do Ensino Fundamental em ciclos, conforme previsto expressamente no art. 32, § 1o, vejamos: § 1o É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o Ensino Fundamental em ciclos. Diante dessa faculdade cada Estado poderá estruturar-se em quantos ciclos entender como necessário. Figura 6. Secretaria de Educação do Estado de São Paulo Primeira Etapa: Compreende do 1o ao 3o ano Segunda Etapa: Compreende do 4o ao 6o ano Terceira Etapa: Compreende do 7o ao 9o ano No Estado de São Paulo, foi reestruturado o modelo então vigente e a partir de 2014 o Ensino Fundamental começou a contar com a estrutura de três ciclos com novo formato de progressão continuada. Essa nova estruturação começo como debate no ano de 2011 em conjunto com servidores da rede, assim, com a mudança no sistema de progressão continuada o Ensino Fundamental passou acontar com três etapas. Mas, qual a distinção entre Ciclos e Séries ? Quem responde a esse questionamento é Maria Pastore (2011), vejamos: “A grande diferença entre os dois modelos é que a organização em ciclos nasce da ideia de que nem todas as crianças aprendem do mesmo jeito, ao mesmo tempo”, explica a professora Márcia Jacomini, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Geralmente, o sistema é organizado em períodos que duram de dois a quatro anos e, dentro de cada um destes ciclos de ensino, o aluno não pode ser reprovado. Já a 55 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III educação seriada trabalha com a ideia contrária. “É uma construção do século XVIII, com os princípios e crenças daquele tempo tão longínquo: um ensino de massa para todos. Quem não conseguir aprender ao mesmo tempo e da mesma forma que os outros deve entrar de novo na fila”, lamenta a professora Claudia Fernandes, coordenadora do programa de pós-graduação em Educação da Unirio. Pesquisas mostram que a implantação dos ciclos atingiu o objetivo de diminuir as taxas de repetência e evasão escolar. Além disso, os ciclos evitam que o conteúdo fique segregado no curto período de um ano letivo. “Deveria existir um currículo com base mais longa. É isso o que muda com os ciclos: posso ensinar outro tipo de coisa, porque tenho mais tempo”, afirma o professor Ocimar Munhoz Alavarse, da Faculdade de Educação da USP. Assistam ao vídeo de apresentação da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo sobre os ciclos do Ensino Fundamental. Já com relação à terminalidade, a previsão também se encontra expressa na Lei de Diretrizes e Bases. Em seu artigo Maria Aparecida Zanetti (1997) nos traz que [No Ensino Fundamental], a LDB faculta aos sistemas de ensino o desdobramento em ciclos. O primeiro, segundo argumentações de Darcy Ribeiro, seria caracterizado pela unidocência, enquanto o segundo pela pluridocência. Esta definição pode dar caráter de terminalidade já no primeiro ciclo, ao invés de garantir tal obrigatoriedade [...]. Analisando o art. 59, inciso II da Lei de Diretrizes e Bases nos deparamos com a seguinte determinação: Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. (Redação dada pela Lei no 12.796, de 2013) [...] II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do Ensino Fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; 56 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Esse inciso é a expressão máxima de tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual. Assim, ele reconheceu a existência de duas desigualdades tanto para aqueles que de alguma forma apresentam alguma deficiência bem como para aqueles que apresentam ser superdotados. Dessa feita, faz-se necessário ter um tratamento diferenciado para atender a essas duas categorias de pessoas. Progressão continuada: condições para sua adoção e para eliminação da repetência Maria Pastore (2011) nos traz que esse sistema, que surgiu na década de 1960, veio como forma de buscar eliminar os índices de repetência e de evasão escolar, vejamos: A implantação deste sistema, nos anos 1960, surgiu como forma de combater os problemas da repetência e da evasão escolar, contribuindo para a melhoria da qualidade do ensino público”, explica a professora Claudia Fernandes, coordenadora do programa de pós-graduação em Educação da Unirio. Pesquisas mostram que o aluno tende a ganhar mais quando o processo de aprendizagem não é interrompido. “A reprovação é uma medida pedagógica que pode ser usada quando o aluno tem baixa proficiência”, explica o professor Ocimar Munhoz Alavarse, da Faculdade de Educação da USP. “Mas, por mais que o aluno repetente esteja abaixo do nível esperado, ele não está no grau zero de conhecimento. Ainda assim, no ano seguinte, ele não recebe o tratamento diferenciado que deveria - isso para não falar do rótulo de repetente. Em consonância com esse entendimento, o Art. 32 da LDB em seu § 2o determina que Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por série podem adotar no Ensino Fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino. Não é pacífica a utilização da progressão continuada e, analisando os Estados brasileiros, verificamos que são poucos os que utilizam essa forma Em algumas redes públicas, como a estadual e municipal de São Paulo, a progressão continuada já é aplicada de forma obrigatória. Mas, na maioria das escolas brasileiras ainda prevalece a organização por séries: apenas 31% das escolas brasileiras adotam o regime de ciclos no Ensino Fundamental. Em São Paulo, 82% aplicam os ciclos, seguido por Minas Gerais (74,5%) e Mato Grosso (57,5%). Mesmo entre os Estados que 57 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III adotam os ciclos, o número de etapas e a duração de cada uma podem ser diferentes. (PASTORE, 2011). Com relação à progressão continuada, há uma discussão sobre seus benefícios;’ vejamos a reportagem veiculada pelo Bom Dia Brasil: Ciclos e progressão continuada - Reprovação - Avaliação na Educação Diferença entre progressão continuada e aprovação automática Ensino a distância como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais O art. 32 em seu parágrafo quarto deixa claro que o Ensino Fundamental será presencial, contudo é possível utilizar o ensino a distância como forma de complementação ou ainda em situações de emergência: § 4o O Ensino Fundamental será presencial, sendo o ensino a distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais. Figura 7. Ensino Fundamental a Distância 1a Hipótese: Nesse caso estamos diante de uma forma de complementação da aprendizagem. 2a Hipótese: Nesse caso estamos diante de uma situação de emergência em que não é possível a presença do educando. Assim, apesar da regra geral ser presencial podemos nos deparar com duas situações distintas em que poderá ocorrer o ensino presencial à distância. 58 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA Como forma de complementação de aprendizagem, podemos imaginar a utilização da plataforma Moodle ou do Blackboard como forma de inserir textos, realizar fóruns e chats sobre a disciplina. Ou ainda inserir vídeos do Youtube para que o educando possa ter acesso a outras informações além das que já foram disponibilizadas na forma tradicional, ou seja, presencial. Na segunda hipótese, podemos nos deparar com a possibilidade de uma situação de emergência em que os estudos não devem ser interrompidos. Podemos pensar tanto nas grandes tragédias, em que, restabelecendo-se a comunicação, é possível, numa emergência, utilizar-se desse mecanismo para manter os educandos concentrados nos estudos. Ensino fundamental: jornada mínima de quatro horas com progressão para tempo integral Inicialmente a LDB estabelece que a jornada escolar deve ter no mínimo quatro horas, contudo estabelece ainda que deve ser implantado o tempo integral de forma progressiva. Art. 34. A jornada escolar no EnsinoFundamental incluirá pelo menos quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, sendo progressivamente ampliado o período de permanência na escola. § 1o São ressalvados os casos do ensino noturno e das formas alternativas de organização autorizadas nesta Lei. § 2o O Ensino Fundamental será ministrado progressivamente em tempo integral, a critério dos sistemas de ensino. Os Estados têm buscado atingir a meta de aumentar a jornada escolar, como, por exemplo, podemos citar o Rio Grande do Sul. Figura 8. Fonte: 59 ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA │ UNIDADE III O Plano Nacional de Educação estabelece como meta que 50% das escolas públicas deverão estar com educação integral até o ano de 2024. Figura 9. Fonte: Mas, o que efetivamente é a educação integral ? O conceito de Educação Integral vem ganhando cada vez mais espaço no debate público sobre propostas educacionais para o país. A expectativa em torno de bons resultados proporcionados pela Educação Integral é reforçada por pesquisas que evidenciam um papel estratégico na promoção da qualidade com equidade em diferentes sistemas educacionais do mundo. Mas essa promessa só se concretizará se o poder público e a sociedade civil somarem esforços e dialogarem sobre o tema e sobre os processos de instituição das políticas públicas. Um primeiro passo a dar nesse sentido é compreender que a Educação Integral não pode ser assumida apenas como oferta de maior tempo de permanência na escola. A ampliação do tempo e o aumento do número de horas das disciplinas formais, por si sós, não caracterizam o conceito de Educação Integral referido neste documento. Educação Integral é uma concepção que considera a multidimensionalidade do ser de forma integrada. Reconhece que o desenvolvimento pleno de indivíduos só é possível quando se observam diferentes dimensões: física, afetiva, cognitiva, socioemocional e ética. Assim, os conhecimentos e experiências proporcionados pela escola, embora constituam grande parte do patrimônio cultural necessário, não esgotam o conjunto de saberes necessários para uma participação atuante na sociedade contemporânea. O desenvolvimento pleno que se espera da Educação Integral só será efetivo se a proposta pedagógica for composta por diferentes linguagens, numa perspectiva integrada, visando ao aprofundamento 60 UNIDADE III │ ENSINO FUNDAMENTAL COMO ESCOLARIDADE MÍNIMA OBRIGATÓRIA de saberes e ao aprimoramento de habilidades e competências. Para isso, é imprescindível promover a reconstrução do Projeto Político Pedagógico (PPP), de forma coletiva e compartilhada, potencializando os conhecimentos e saberes que os estudantes, as famílias e a comunidade trazem para a escola. Nesse diálogo entre os diferentes saberes, deixam-se claras as intencionalidades e expectativas de aprendizagem, acolhendo os interesses dos estudantes e da comunidade e ampliando os repertórios. Assim, a Educação Integral implica o aproveitamento planejado da variedade de oportunidades de aprendizagem, da diversidade dos espaços e da ampliação de tempos, em estreita articulação com o território, a comunidade, a família e as novas tecnologias. E assume a importância dos conhecimentos proporcionados por essa articulação, integrando-os aos saberes sistematizados nos ditos conteúdos escolares. O resultado desse arranjo é capaz de responder não só aos padrões de qualidade desejados para a Educação pública, mas também às exigências de uma formação voltada para o mundo contemporâneo, cada vez mais complexo e dinâmico. (Todos pela Educação Integral, 2015) No quadro abaixo podemos acompanhar a evolução do número de matrículas no Ensino Fundamental regular referente ao aumento de matrículas no tempo integral - Brasil 2008 a 2014. Tabela 7. Evolução do número de matrículas no Ensino Fundamental por dependência administrativa, segundo a duração do turno de escolarização - Brasil - 2008/2014 Ano Ensino fundamental regular Total geral Pública Privada Total Tempo integral Total Tempo integral Total Tempo integral 2008 32.086.700 767.492 28.468.696 722.830 3.618.004 44.662 2010 31.005.341 1.327.129 27.064.103 1.264.309 3.941.238 63.120 2012 29.702.498 2.184.079 25.431.566 2.101.735 4.270.932 82.344 2014 28.459.667 4.477.113 23.982.657 4.371.298 4.477.010 105.815 % 2008/2014 -11,3 483,3 -15,8 504,7 23,7 136,9 Nota: 1) O tempo integral é calculado somando-se a duração da escolaridade com a duração do atendimento complementar. Considera-se tempo integral quando esta soma for superior ou igual a 7h. Fonte:MEC/Inep/DEED 61 UNIDADE IV ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA CAPÍTULO 1 O Ensino Médio Até o ano de 1967 o Ensino Médio era dividido em três cursos denominados curso científico, curso normal e curso clássico. Posteriormente foi alterada a terminologia e passou a ser denominado de curso colegial que também apresentava uma subdivisão. Assim os três primeiros anos eram os mesmos para todos e, posteriormente, aqueles que quisessem poderiam cursar mais um ano que seria o normal ou o profissionalizante. Contudo, no ano de 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional surge o Ensino Médio como etapa final da Educação Básica, na forma como iremos estudar a seguir. Podemos definir o Ensino Médio como a etapa final da Educação Básica, devendo ter a duração mínima de três anos. O Ensino Médio apresenta como finalidade: I. a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; II. a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III. o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV. a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina. 62 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA Analisando as Diretrizes Nacionais da Educação Básica no Brasil, especialmente com relação ao Ensino Médio, o referido documento trata de analisar quem são efetivamente os sujeitos/estudantes do Ensino Médio. Os sujeitos/estudantes do Ensino Médio As juventudes Os estudantes do Ensino Médio são predominantemente adolescentes e jovens. Segundo o Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE), são considerados jovens os sujeitos com idade compreendida entre os 15 e os 29 anos, ainda que a noção de juventude não possa ser reduzida a um recorte etário (BRASIL, 2006). Em consonância com o CONJUVE, esta proposta de atualização das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio concebe a juventude como condição sócio-histórico-cultural de uma categoria de sujeitos que necessita ser considerada em suas múltiplas dimensões, com especificidades próprias que não estão restritas às dimensões biológica e etária, mas que se encontram articuladas com uma multiplicidade de atravessamentos sociais e culturais, produzindo múltiplas culturas juvenis ou muitas juventudes. Entender o jovem do Ensino Médio dessa forma significa superar uma noção homogeneizante e naturalizada desse estudante, passando a percebê-lo como sujeito com valores, comportamentos, visões de mundo, interesses e necessidades singulares. Além disso, deve-se também aceitar a existência de pontos em comum que permitam tratá-lo como uma categoria social. Destacam-se sua ansiedade em relação ao futuro, sua necessidade de se fazer ouvir e sua valorização da sociabilidade. Além das vivências próprias da juventude,o jovem está inserido em processos que questionam e promovem sua preparação para assumir o papel de adulto, tanto no plano profissional quanto no social e no familiar. Pesquisas sugerem que, muito frequentemente, a juventude é entendida como uma condição de transitoriedade, uma fase de transição para a vida adulta (DAYRELLL, 2003). Com isso, nega-se a importância das ações de seu presente, produzindo-se um entendimento de que sua educação deva ser pensada com base nesse “vir a ser”. Reduzem-se, assim, as possibilidades de se fazer da escola um espaço de formação para a vida hoje vivida, o que pode acabar relegando-a a uma obrigação enfadonha. Muitos jovens, principalmente os oriundos de famílias pobres, vivenciam uma relação paradoxal com a escola. Ao mesmo tempo em que reconhecem seu papel fundamental no que se refere à empregabilidade, não conseguem atribuir-lhe um sentido imediato (SPOSITO, 2005). 63 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV Vivem ansiosos por uma escola que lhes proporcione chances mínimas de trabalho e que se relacione com suas experiências presentes. Além de uma etapa marcada pela transitoriedade, outra forma recorrente de representar a juventude é vê-la como um tempo de liberdade, de experimentação e irresponsabilidade (DAYRELL, 2003). Essas duas maneiras de representar a juventude – como um “vir a ser” e como um tempo de liberdade – mostram-se distantes da realidade da maioria dos jovens brasileiros. Para esses, o trabalho não se situa no futuro, já fazendo parte de suas preocupações presentes. Uma pesquisa realizada com jovens de várias regiões brasileiras, moradores de zonas urbanas de cidades pequenas e capitais, bem como da zona rural, constatou que 60% dos entrevistados frequentavam escolas. Contudo, 75% deles já estavam inseridos ou buscando inserção no mundo do trabalho (SPOSITO, 2005). Ou seja, o mundo do trabalho parece estar mais presente na vida desses sujeitos do que a escola. Muitos jovens abandonam a escola ao conseguir emprego, alegando falta de tempo. Todavia, é possível que, se os jovens atribuíssem um sentido mais vivo e uma maior importância à sua escolarização, uma parcela maior continuasse frequentando as aulas, mesmo depois de empregados. O desencaixe entre a escola e os jovens não deve ser visto como decorrente, nem de uma suposta incompetência da instituição, nem de um suposto desinteresse dos estudantes. As análises se tornam produtivas à medida que enfoquem a relação entre os sujeitos e a escola no âmbito de um quadro mais amplo, considerando as transformações sociais em curso. Essas transformações estão produzindo sujeitos com estilos de vida, valores e práticas sociais que os tornam muito distintos das gerações anteriores (DAYRELL, 2007). Entender tal processo de transformação é relevante para a compreensão das dificuldades hoje constatadas nas relações entre os jovens e a escola. Possivelmente, um dos aspectos indispensáveis a essas análises é a compreensão da constituição da juventude. A formação dos indivíduos é hoje atravessada por um número crescente de elementos. Se antes ela se produzia, dominantemente, no espaço circunscrito pela família, pela escola e pela igreja, em meio a uma razoável homogeneidade de valores, muitas outras instituições, hoje, participam desse jogo, apresentando formas de ser e de viver heterogêneas. A identidade juvenil é determinada para além de uma idade biológica ou psicológica, mas situa-se em processo de contínua transformação individual e coletiva, a partir do que se reconhece que o sujeito do Ensino Médio é constituído e constituinte da ordem social, ao mesmo tempo em que, como demonstram os comportamentos juvenis, preservam autonomia relativa quanto a essa ordem. Segundo Dayrell, a juventude é “parte de um processo mais amplo de constituição de sujeitos, mas que tem especificidades que marcam a vida de cada um. A juventude constitui um momento determinado, mas não se reduz a uma passagem; ela assume uma 64 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA importância em si mesma. Todo esse processo é influenciado pelo meio social concreto no qual se desenvolve e pela qualidade das trocas que este proporciona”. (2003). Zibas, ao analisar as relações entre juventude e oferta educacional observa que a ampliação do acesso ao Ensino Médio, nos últimos 15 anos, não veio acompanhada de políticas capazes de dar sustentação com qualidade a essa ampliação. Entre 1995 e 2005, os sistemas de ensino estaduais receberam mais de 4 milhões de jovens no Ensino Médio, totalizando uma população escolar de 9 milhões de indivíduos (2009). É diante de um público juvenil extremamente diverso, que traz para dentro da escola as contradições de uma sociedade que avança na inclusão educacional sem transformar a estrutura social desigual – mantendo acesso precário à saúde, ao transporte, à cultura e lazer, e ao trabalho – que o novo Ensino Médio se forja. As desigualdades sociais passam a tensionar a instituição escolar e a produzir novos conflitos (idem). Segundo Dayrell (2009), o censo de 2000 informa que 47,6% dos jovens da Região Sudeste de 15 a 17 anos frequentavam o Ensino Médio; no Nordeste apenas 19,9%; e a média nacional era de 35,7%. O autor assinala, com base em dados do IPEA (2008), que há uma frequência líquida no Sul/Sudeste de 58%, contra 33,3% no Norte/Nordeste. Em que pese essa presença ser expressivamente maior na Região Sul do país, observa-se um quadro reiterado de desistência da escola também nessa região. Esse quadro parece se intensificar no Ensino Médio, devido à existência de forte tensão na relação dos jovens com a escola (CORREIA; MATOS, 2001; DAYRELL, 2007; KRAWCZYK, 2009 apud DAYRELL, 2009). Entre os fatores relevantes a se considerar está a relação entre juventude, escola e trabalho. Ainda que não se parta, a priori, de que haja uma linearidade entre permanência na escola e inserção no emprego, as relações entre escolarização, formação profissional e geração de independência financeira por meio do ingresso no mundo do trabalho vêm sendo tensionadas e reconfiguradas conforme sinalizam estudos acerca do emprego e do desemprego juvenil. O Brasil vive hoje um novo ciclo de desenvolvimento calcado na distribuição de renda que visa à inclusão de um grande contingente de pessoas no mercado consumidor. A sustentação desse ciclo e o estabelecimento de novos patamares de desenvolvimento requerem um aporte de trabalhadores qualificados em todos os níveis, o que implica na reestruturação da escola com vistas à introdução de novos conteúdos e de novas metodologias de ensino capazes de promover a oferta de uma formação integral. Os jovens, atentos aos destinos do País, percebem essas modificações e criam novas expectativas em relação às possibilidades de inserção no mundo do trabalho e em relação ao papel da escola nos seus projetos de vida. Diante do exposto, torna-se premente que as escolas, ao desenvolverem seus projetos político-pedagógicos, se debrucem 65 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV sobre questões que permitam ressignificar a instituição escolar diante de uma possível fragilização que essa instituição venha sofrendo, quando se trata do público alvo do Ensino Médio, considerando, ainda, a necessidade de acolhimento de um sujeito que possui, entre outras, as características apontadas anteriormente. Assim, sugerem-se questões como: Que características sócio-econômico-culturais possuem os jovens que frequentam as escolas de Ensino Médio? Que representações a escola, seus professores e dirigentes fazem dos estudantes? A escola conhece seus estudantes? Quais os pontos de proximidade e distanciamento entre os sujeitos das escolas (estudantes e professores particularmente)? Quais sentidos e significados esses jovens têm atribuído à experiência escolar? Que relações se podem observar entre jovens, escola e sociabilidade? Quais experiênciasos jovens constroem fora do espaço escolar? Como os jovens interagem com a diversidade? Que representações fazem diante de situações que têm sido alvo de preconceito? Em que medida a cultura escolar instituída compõe uma referência simbólica que se distancia/aproxima das expectativas dos estudantes? Que elementos da cultura juvenil são derivados da experiência escolar e contribuem para conferir identidade(s) ao jovem da contemporaneidade? Que articulações existem entre os interesses pessoais, projetos de vida e experiência escolar? Que relações se estabelecem entre esses planos e as experiências vividas na escola? Em que medida os sentidos atribuídos à experiência escolar motivam os jovens a elaborar projetos de futuro? Que expectativas são explicitadas pelos jovens diante da relação escola e trabalho? Que aspectos precisariam mudar na escola tendo em vista oferecer condições de incentivo ao retorno e à permanência para os que a abandonaram? Viabilizar as condições para que tais questões pautem as formulações dos gestores e professores na discussão do seu cotidiano pode permitir novas formas de organizar a proposta de trabalho da escola na definição de seu projeto político-pedagógico. (MEC,2013c, p. 157) 66 CAPÍTULO 2 Objetivos específicos do Ensino Médio O MEC atendo-se à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional com relação ao [currículo] do Ensino Médio, conforme o art. 36, também «destacará a educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania» e, ainda, «adotará metodologias de ensino e de avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes». De acordo com os princípios estéticos, políticos e éticos da LDBEN, as escolas de Ensino Médio observarão, na gestão, na organização curricular e na prática pedagógica e didática, as seguintes diretrizes: identidade, diversidade, autonomia, currículo voltado para as competências básicas, interdisciplinaridade, contextualização, a importância da escola, base nacional comum e parte diversificada, formação geral e preparação básica para o trabalho. Descrição das áreas As três áreas descritas a seguir devem estar presentes na base nacional comum dos currículos das escolas de Ensino Médio, cujas propostas pedagógicas estabelecerão: » As proporções de cada área no conjunto do currículo. » Os conteúdos a serem incluídos em cada uma delas, tomando como referência as competências descritas. » Os conteúdos e competências a serem incluídos na parte diversificada, os quais poderão ser selecionados em uma ou mais áreas, reagrupados e organizados de acordo com critérios que satisfaçam as necessidades da clientela e da região. (MEC, p. 123 e segs.) Analisando as diretrizes e bases da educação nacional, temos que o currículo do Ensino Médio acaba sendo dividido em três grandes áreas: Tabela 8. Ár ea s Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias. Fonte: Elaborada pela autora 67 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV Cada uma dessas áreas tem objetivos distintos assim, quando se tratar da primeira área, ou seja: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, o objetivo que se tem é que o educando adquira as seguintes habilidades e competências, vejamos: a. Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da realidade, por meio da constituição de significados, expressão, comunicação e informação. b. Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas. c. Analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função, organização e estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção. d. Compreender e usar a língua portuguesa como língua materna, geradora de significação e integradora da organização do mundo e da própria identidade. e. Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s) moderna(s) como instrumento de acesso a informações e a outras culturas e grupos sociais. f. Entender os princípios das tecnologias da comunicação e da informação, associando-as aos conhecimentos científicos, às linguagens que lhe dão suporte e aos problemas que se propõem solucionar. g. Entender a natureza das tecnologias da informação como integração de diferentes meios de comunicação, linguagens e códigos, bem como a função integradora que elas exercem, na sua relação com as demais tecnologias. h. Entender o impacto das tecnologias da comunicação e da informação na sua vida, nos processos de produção, no desenvolvimento do conhecimento e na vida social. i. Aplicar as tecnologias da comunicação e da informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para sua vida. (MEC, pp. 124-125). Já quando se trata das Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias é necessário permitir que o educando desenvolva habilidade e competências no sentido de: a. Compreender as ciências como construções humanas, entendendo como elas se desenvolvem por acumulação, continuidade ou rupturas 68 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA de paradigmas, relacionando o desenvolvimento científico com a transformação da sociedade. b. Entender e aplicar métodos e procedimentos próprios das ciências naturais. c. Identificar variáveis relevantes e selecionar os procedimentos necessários para a produção, análise e interpretação de resultados de processos ou experimentos científicos e tecnológicos. d. Apropriar-se dos conhecimentos da Física, da Química e da Biologia e aplicar esses conhecimentos para explicar o funcionamento do mundo natural, planejar, executar e avaliar ações de intervenção na realidade natural. e. Compreender o caráter aleatório e não determinístico dos fenômenos naturais e sociais. f. Compreender a necessidade de utilizar instrumentos adequados para medidas, determinação de amostras e cálculo de probabilidades. g. Compreender conceitos, procedimentos e estratégias matemáticas e aplicá-las a situações diversas no contexto das ciências, da tecnologia e das atividades cotidianas. h. Identificar, analisar e aplicar conhecimentos sobre valores de variáveis representados em gráficos, diagramas ou expressões algébricas, realizando previsão de tendências, extrapolações/interpolações e interpretações. i. Analisar qualitativamente dados quantitativos representados gráfica ou algebricamente, relacionados a contextos socioeconômicos, científicos ou cotidianos. j. Identificar, representar e utilizar conhecimentos geométricos para o aperfeiçoamento da leitura, da compreensão e da ação sobre a realidade. k. Entender a relação entre o desenvolvimento das ciências naturais e o desenvolvimento tecnológico e associar as diferentes tecnologias aos problemas que se propõem solucionar. l. Entender o impacto das tecnologias associadas às ciências naturais na vida pessoal, nos processos de produção, no desenvolvimento do conhecimento e na vida social. 69 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV m. Aplicar as tecnologias associadas às ciências naturais na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para sua vida. Compreender conceitos, procedimentos e estratégias matemáticas e aplicá-las a situações diversas no contexto das ciências, da tecnologia e das atividades cotidianas. (MEC, p. 125). E por fim, a terceira grande área, e não menos importante, é a de Ciências Humanas e suas Tecnologias que se propõem a desenvolver as habilidades e competênciasque permitam que o educando venha a a. Compreender os elementos cognitivos, afetivos, sociais e culturais que constituem a identidade própria e dos outros. b. Compreender a sociedade, sua gênese e transformação e os múltiplos fatores que nelas intervêm, como produtos da ação humana, a si mesmo como agente social e os processos sociais como orientadores da dinâmica dos diferentes grupos de indivíduos. c. Compreender o desenvolvimento da sociedade como processo de ocupação de espaços físicos e as relações da vida humana com a paisagem, em seus desdobramentos político-sociais, culturais, econômicos e humanos. d. Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as às práticas dos diferentes grupos e atores sociais, aos princípios que regulam a convivência em sociedade, aos direitos e deveres da cidadania, à justiça e à distribuição dos benefícios econômicos. e. Traduzir os conhecimentos sobre a pessoa, a sociedade, a economia e práticas sociais e culturais em condutas de indagação, análise, problematização e ação diante de situações novas, problemas ou questões de vida social, política, econômica e cultural. f. Entender os princípios das tecnologias associadas ao conhecimento do indivíduo, da sociedade e da cultura, entre as quais as de planejamento, organização, gestão, trabalho de equipe e associá-las aos problemas que se propõem resolver. g. Entender o impacto das tecnologias associadas às ciências humanas sobre sua vida pessoal, os processos de produção, o desenvolvimento do conhecimento e a vida social. 70 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA h. Entender a importância das tecnologias contemporâneas de comunicação e informação para o planejamento, gestão, organização, fortalecimento do trabalho de equipe. i. Aplicar as tecnologias das ciências humanas e sociais na escola, no trabalho e outros contextos relevantes para sua vida. (MEC, p. 125) Cumpre ressaltar ainda que o Plano Nacional de Educação estipulou como meta para o Ensino Médio: A universalização do Ensino Médio, até o ano de 2016, o atendimento escolar para toda a população de 15 a 17 anos e elevar, até o final do período de vigência deste PNE, a taxa líquida de matrículas no Ensino Médio para 85%. 71 CAPÍTULO 3 A avaliação e as disciplinas no Ensino Médio Com relação à avaliação dos estudantes muito se tem discutido sobre a sua função e não há consenso sobre a sua necessidade ou não e se ela representa ou não o conhecimento. Independentemente dessas diversas correntes o certo é que nosso ensino está centrado na avaliação como forma de analisar o desenvolvimento do estudante, especialmente no Ensino Médio. Em apertada síntese verifica-se que historicamente ainda utilizamos as práticas da época dos Jesuítas, em termos dos métodos de aprendizagem e de avaliação. Conforme Luckesi (2001) a tradição dos exames escolares tem sua origem nas atividades que foram realizadas pelos padres Jesuítas no século XVI e na visão de Comênio no século XVII. Eles são a base do que temos hoje, tanto na questão do rigor quanto no cerimonial que envolve o momento de realização da prova. Comênio defendia que as provas são as condições para que o aluno venha a estudar. Conforme Sousa (1997, p.271) que Nos primeiros anos da década de 20, surgem nos Estados Unidos os exames – testes padronizados - movimento que influenciou o Brasil. Os testes passaram a enfatizar a medida do comportamento humano, resultando em avaliações padronizadas para medir habilidades e aptidões dos alunos. Diante da necessidade da avaliação as diretrizes curriculares nacionais gerais para a Educação Básica aponta três dimensões básicas de avaliações, vejamos: Figura 10. Avaliações Avaliação de Aprendizagem Avaliação Institucional Interna e Externa Avaliação de Redes de Educação A avaliação da aprendizagem, que conforme a LDB pode ser adotada com vistas à promoção, aceleração de estudos e classificação, deve ser desenvolvida pela escola refletindo a proposta expressa em seu projeto político-pedagógico. Importante observar 72 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA que a avaliação da aprendizagem deve assumir caráter educativo, viabilizando ao estudante a condição de analisar seu percurso e, ao professor e à escola, identificar dificuldades e potencialidades individuais e coletivas. A avaliação institucional interna é realizada a partir da proposta pedagógica da escola, assim como do seu plano de trabalho, que devem ser avaliados sistematicamente, de maneira que a instituição possa analisar seus avanços e localizar aspectos que merecem reorientação. A Emenda Constitucional no 59/2009, ao assegurar o atendimento da população dos 4 aos 17 anos de idade, com oferta gratuita determina um salto significativo no processo de democratização do ensino, garantindo não só o atendimento para aqueles matriculados na idade tida como regular para a escolarização, como para aqueles que se encontram em defasagem idade-tempo de organização escolar ou afastados da escola. O esforço necessário para cumprir tais objetivos exige mais do que investimentos em infraestrutura e recursos materiais e humanos. E necessário estabelecer ações no sentido de definir orientações e práticas pedagógicas que garantam melhor aproveitamento, com atenção especial para aqueles grupos que até então estavam excluídos do Ensino Médio. Um dos aspectos que deve estar presente em tais orientações é o acompanhamento sistêmico do processo de escolarização, viabilizando ajustes e correções de percurso, bem como o estabelecimento de políticas e programas que concretizem a proposta de universalização da Educação Básica. A avaliação de redes de ensino é responsabilidade do Estado, seja realizada pela União, seja pelos demais entes federados. Em âmbito nacional, no Ensino Médio, ela está contemplada no Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), que informa sobre os resultados de aprendizagem estruturados no campo da Língua Portuguesa e da Matemática, lembrando-se o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que mede a qualidade de cada escola e rede, com base no desempenho do estudante em avaliações do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP) e em taxas de aprovação. Para tratar das exigências relacionadas com o Ensino Médio, além do cumprimento do SAEB, o Ministério da Educação vem trabalhando no aperfeiçoamento do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) que, gradativamente, assume funções com diferentes especificidades estratégicas para estabelecer procedimentos voltados para a democratização do ensino e ampliação do acesso a níveis crescentes de escolaridade. Neste sentido, este exame apresenta hoje os seguintes objetivos, conforme art. 2o da Portaria no 109/2009: I. oferecer uma referência para que cada cidadão possa proceder à sua autoavaliação com vistas às suas escolhas futuras, tanto em relação ao mundo do trabalho quanto em relação à continuidade de estudos; 73 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV II. estruturar uma avaliação ao final da Educação Básica que sirva como modalidade alternativa ou complementar aos processos de seleção nos diferentes setores do mundo do trabalho; III. estruturar uma avaliação ao final da Educação Básica que sirva como modalidade alternativa ou complementar a processos seletivos de acesso aos cursos de Educação Profissional e Tecnológica posteriores ao Ensino Médio e à Educação Superior; IV. possibilitar a participação e criar condições de acesso a programas governamentais; V. promover a certificação de jovens e adultos no nível de conclusão do Ensino Médio nos termos do art. 38, §§ 1o e 2o da Lei no 9.394/1996 (LDB); VI. promover avaliação do desempenho acadêmico das escolas deEnsino Médio, de forma que cada unidade escolar receba o resultado global; VII. promover avaliação do desempenho acadêmico dos estudantes ingressantes nas Instituições de Educação Superior. Assim, cada um destes objetivos delineia o aprofundamento de uma função do ENEM: I. avaliação sistêmica, que tem como objetivo subsidiar as políticas públicas para a Educação Básica; II. avaliação certificatória, que proporciona àqueles que estão fora da escola aferir os conhecimentos construídos no processo de escolarização ou os conhecimentos tácitos construídos ao longo da vida; III. avaliação classificatória, que contribui para o acesso democrático à Educação Superior. Nesse caminho, o ENEM vem ampliando o espectro de atendimento apresentando um crescimento que veio de 156.000 inscritos, em 1998, e alcançou 4,6 milhões, em 2009. À medida que se garantir participação de amostragem expressiva do sistema, incluindo diferentes segmentos escolares, se estará aproximando de uma percepção mais fiel do sistema, na perspectiva do direito dos estudantes. Nesse sentido, deve manter-se alinhado com estas Diretrizes e com as expectativas de aprendizagem a serem elaboradas. O INEP deve continuar desenvolvendo metodologia adequada no sentido de alcançar esta multifuncionalidade do sistema de avaliação. (MEC, 2013c, pp. 175-176). Chegando aos dias de hoje, encontramos a determinação da LDB, em seu art. 36 de que o currículo do Ensino Médio deverá adotar metodologias de ensino e de avaliação 74 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA que estimulem a iniciativa dos estudantes. E para que isso ocorra é necessário que os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação sejam organizados de tal forma que ao final do Ensino Médio o educando demonstre: a) domínio dos princípios científicos e tecnológicos que presidem a produção moderna e b) conhecimento das formas contemporâneas de linguagem. Para tanto, faz-se necessário ter como diretriz um destaque especial da educação tecnológica básica, a compreensão do significado da ciência, das letras e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania. Além da língua portuguesa deverá ser incluída uma língua estrangeira moderna de caráter obrigatória e uma língua estrangeira moderna de caráter optativo. Tabela 9. Ao fi na l d o En si no M éd io o e st ud an te de ve rá d om in ar , no m ín im o, d ua s lín gu as . A língua portuguesa de caráter obrigatório Uma língua estrangeira moderna - de caráter obrigatório Uma língua estrangeira moderna - de caráter optativo. Fonte: Elaborada pela autora Apesar dessa previsão, não é isso que constatamos na realidade das escolas brasileiras. Não que não haja a oferta, mas ela é mais simbólica do que efetiva. Vejamos a entrevista concedida pelo escritor Marcos Bagno sobre esse tema: O escritor Marcos Bagno considera lamentável, para dizer o mínimo, que a imagem da língua portuguesa tenha sido empobrecida e reduzida a uma nomenclatura profusa e confusa e a exercícios mecânicos de análise sintática e morfológica. Para ele, essas são “práticas que se revelam, ao fim e ao cabo, inúteis e irrelevantes para, de fato, levar alguém a se valer dos muitos recursos que a língua oferece”. Ganhador do Prêmio Jabuti, Bagno é professor da Universidade de Brasília (UnB), pesquisador associado do Instituto da Língua Galega – Universidade de Santiago de Compostela, e atua no campo da educação linguística. No livro Preconceito linguístico, reeditado pela Parábola Editorial, o escritor reitera seu discurso em favor de uma educação linguística voltada à inclusão social, ao reconhecimento e à valorização da diversidade cultural brasileira. Nesta entrevista à Profissão Mestre, ao falar sobre o resultado do último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que revelou desempenho fraco dos estudantes brasileiros em redação, Bagno dispara: “O ensino de língua portuguesa e de produção de texto é um fracasso”. O linguista afirma que o maior problema do Brasil é a deficiência de 75 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV letramento que atinge não só a maioria de nossa população (75% dos brasileiros são analfabetos funcionais), como também as pessoas que supostamente deveriam trabalhar para a inserção dos aprendizes na cultura letrada: as professoras e os professores de Português (e, por tabela, os das outras disciplinas). “A formação que se dá nos cursos de Pedagogia e de Letras em nosso país é péssima, anacrônica, ultrapassada”, critica. Acompanhe a seguir a entrevista com o autor. Profissão Mestre: “Português é muito difícil”. Como derrubar esse mito? Marcos Bagno: Como nosso ensino da língua sempre se baseou na norma gramatical literária de Portugal, as regras que aprendemos na escola em boa parte não correspondem à língua que realmente falamos e escrevemos no Brasil. Por isso, achamos que “português é uma língua difícil”: porque temos de decorar conceitos e fixar regras que não significam nada para nós. No dia em que nosso ensino de português se concentrar no uso real, vivo e verdadeiro da língua portuguesa do Brasil, é bem provável que ninguém mais continue a repetir essa ideia falsa. Todo falante nativo de uma língua sabe essa língua. Saber uma língua, na concepção científica da linguística moderna, significa conhecer intuitivamente e empregar com facilidade e naturalidade as regras básicas de funcionamento dela. Se tanta gente continua a repetir que “português é difícil”, é porque o ensino tradicional da língua no Brasil não leva em conta o uso brasileiro do português. Um caso típico é o da regência verbal. A professora pode mandar o aluno copiar quinhentas mil vezes a frase “Assisti ao filme”. Quando esse mesmo aluno puser o pé fora da sala de aula, ele vai dizer ao colega: “Ainda não assisti o filme novo do Batman!”. Isso porque a gramática brasileira não sente a necessidade daquela preposição a, que era exigida na norma clássica literária, cem anos atrás, fixada em Portugal, a dez mil quilômetros daqui. É um esforço árduo e inútil, um verdadeiro trabalho de Sísifo, tentar impor uma regra que não encontra justificativa na gramática intuitiva do falante. No fundo, a ideia de que “português é muito difícil” serve como mais um dos instrumentos de manutenção do status quo das classes sociais privilegiadas. Essa entidade mística e sobrenatural chamada “português” só se revela aos poucos “iniciados”, aos que sabem as palavras mágicas exatas para fazer ela se manifestar. Tal como na Índia Antiga, o conhecimento da gramática é reservado a uma casta sacerdotal, encarregada de preservá- 76 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA la “pura” e “intacta”, longe do contato infeccioso dos párias. O mito de que o “português é muito difícil” tem sua origem também na confusão, gerada no ambiente escolar, entre a língua propriamente dita e a codificação tradicional da língua, isto é, a gramática normativa. Para muita gente, “saber português” é saber o que é uma oração subordinada substantiva objetiva direta reduzida de infinitivo ou saber distinguir um complemento nominal de um adjunto adnominal. É lamentável, para dizer o mínimo, que a imagem da língua tenha sido empobrecida desse jeito, reduzida a uma nomenclatura profusa e confusa e a exercícios mecânicos de análise sintática e morfológica, práticas que se revelam, ao fim e ao cabo, inúteis e irrelevantes para, de fato, levar alguém a se valer dos muitos recursos que a língua oferece.[...] (Todos pela Educação, 2015.) Em 2008 foi incluída na LDB a obrigatoriedade das disciplinas - em todas as séries do Ensino Médio - de Filosofia e de Sociologia. Em Consulta sobre essa alteração o Conselho Nacional de Educação emitiu o PARECER CNE/CEB no 38/2006 quevamos abordar o direito educacional e suas noções introdutórias. Assim, faz-se necessário ater-se ao atual conceito jurídico de direito à educação, e como isso é analisado e compreendido pelo nosso ordenamento jurídico. Iniciemos, portanto, com o conceito de educação de Celso Ribeiro Bastos que nos traz que a educação consiste num processo de desenvolvimento do indivíduo que implica a boa formação moral, física, espiritual e intelectual, visando ao seu crescimento integral para um melhor exercício da cidadania e aptidão para o trabalho. (1999, p. 485). O sistema de educação brasileiro é regido, em primeiro lugar, pela Constituição Federal seguido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional conhecida por LDB, que foi instituída em 1996 sob a Lei no 9.394 e suas alterações. O sistema educacional regular está estruturado em duas grandes etapas, a primeira denominada de Educação Básica que se subdivide em Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio e a segunda etapa que abarca a Educação Superior. Em 2006, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi alterada pela Lei no 11.274 de 6 de fevereiro de 2006, dessa forma o Ensino Fundamental passou a contar com a duração de 9 (nove) anos, com matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade. Assim, o art. 32 da LDB passou a ter a seguinte redação: Art. 32. O Ensino Fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: [...] Porém, essa determinação não entrou em vigor de forma automática, ficando o prazo final para 2010 para que todos os municípios se adequassem a essa nova estrutura. 10 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA Vejamos o processo de transição, em 2010, relativo à adaptação dessa alteração para a duração de 9 anos O fato de termos mais um ano no Ensino Fundamental é importante para o desenvolvimento da criança. Na realidade, a adequação foi apenas no sistema público, porque no ensino particular, já era normal a criança de 6 anos estar inserida no sistema educacional. A maioria das crianças que não tinham acesso à escolarização nessa idade eram as crianças que pertenciam às classes mais baixas. Quando analisamos a Lei de Diretrizes e Bases, verificamos que a União, os Estados, o Distrito Federal organizam, em regime de colaboração, os seus respectivos sistema de ensino. Isso significa que cada um dos entes ficará responsável por sua área de abrangência, mas que todos deverão atuar de forma cooperativa. Com relação à União, cabe ressaltar que cabe a esta a coordenação e a estipulação da Política Nacional de Educação, de tal sorte que articulará com os diferentes níveis e sistemas de forma normativa, redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias. Dessa forma, os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos moldes da Lei de Diretrizes e Bases. A União organiza-se no sistema federal que compreende as escolas federais, as escolas particulares de Educação Superior e ainda os órgãos federais de educação. E ela encontra-se incumbida de: Tabela 1. Un iã o Elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais do sistema federal de ensino e o dos Territórios; prestar assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória, exercendo sua função redistributiva e supletiva; estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum; coletar, analisar e disseminar informações sobre a educação; assegurar processo nacional de avaliação do rendimento escolar no Ensino Fundamental, médio e superior, em colaboração com os sistemas de ensino, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade do ensino; baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação; assegurar processo nacional de avaliação das instituições de Educação Superior, com a cooperação dos sistemas que tiverem responsabilidade sobre este nível de ensino; autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de Educação Superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino. Fonte: Elaborada pela autora. 11 O sistema estadual compreende as escolas estaduais, as escolas municipais de Educação Superior, as escolas particulares de Ensino Fundamental e médio e ainda os órgãos estaduais de educação, dessa forma os Estados, bem como o Distrito Federal, apresentam as seguintes atribuições específicas, que são elas: Tabela 2. Es ta do s e Di st rit o Fe de ra l Organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino; definir, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do Ensino Fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do Poder Público; elaborar e executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação, integrando e coordenando as suas ações e as dos seus Municípios; autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de Educação Superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino; baixar normas complementares para o seu sistema de ensino; assegurar o Ensino Fundamental e oferecer, com prioridade, o Ensino Médio a todos que o demandarem, respeitado o disposto no art. 38 da Lei de Diretrizes e Bases; assumir o transporte escolar dos alunos da rede estadual. Fonte: Elaborada pela autora O sistema municipal, por sua vez, compreende as escolas municipais de Educação Básica, as escolas particulares de Educação Infantil e os órgãos municipais de educação. Já por sua vez os municípios e o Distrito Federal apresentam as seguintes incumbências: Tabela 3. M un ic íp io s e Di st rit o Fe de ra l Organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados; exercer ação redistributiva em relação às suas escolas; baixar normas complementares para o seu sistema de ensino; autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino; oferecer a Educação Infantil em creches e pré-escolas e, com prioridade, o Ensino Fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino; assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. Fonte: Elaborada pela autora É possível, ainda, aos municípios, optarem por se integrar ao sistema estadual de ensino ou com eles compor um sistema único de Educação Básica. 12 CAPÍTULO 2 A Educação Básica e a sua classificação Neste segundo capítulo, vamos analisar a Educação Básica com a sua classificação: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio. A Educação Básica tem como função precípua desenvolver o educando de tal sorte que venha a lhe assegurar uma formação comum indispensável para o exercício da cidadania e com isso fornecer-lhe os meios para progredir tanto no trabalho quanto em estudos posteriores. Figura 1. Educação Básica Educação Infantil: gratuita na escola pública, porém, não é obrigatória. Ensino Fundamental: gratuita na escolafoi homologado em 2006 assim ressaltou a importância da inclusão das disciplinas de Filosofia e Sociologia: Preliminarmente, reitera-se a importância e o valor da Filosofia e da Sociologia para um processo educacional consistente e de qualidade na formação humanística de jovens que se deseja sejam cidadãos éticos, críticos, sujeitos e protagonistas. Essa relevância é reconhecida não só pela argumentação dos proponentes, como por pesquisadores e educadores em geral, inclusive não filósofos ou não sociólogos. O legislador, por seu lado, reconheceu essa importância ao destacar nominalmente os conhecimentos de Filosofia e de Sociologia, dando-lhes valor essencial e não acidental, com caráter de finalidade do processo educacional do Ensino Médio. (artigo 36, § 1o, inciso III, da Lei no 9.394/1996). Não é demais destacar que, na ótica da LDB, os conhecimentos de Filosofia e Sociologia são justificados como “necessários ao exercício da cidadania” (artigo 36, § 1o , inciso III, da Lei no 9.394/1996). Com os demais componentes da Educação Básica, devem contribuir para uma das finalidades do Ensino Médio, que é a de “aprimoramento como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico” (art. 35, inciso II, da LDB). E devem, ainda, mais especialmente, seguir a diretriz de “difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos 77 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática” (art. 27, inciso I, da LDB). Outro ponto a considerar é a realidade, expressa na adoção crescente do ensino de Filosofia e de Sociologia pela maioria das redes de escolas públicas estaduais. Segundo informação do MEC, em 17 estados da Federação, a Filosofia e a Sociologia foram incluídas no currículo, sendo optativas em 2 deles. Muitas escolas particulares, em todo o país, por seu lado, também, decidiram livremente a sua inclusão. Essa inclusão crescente não foi determinada por lei federal ou por norma nacional, mas, sim, pelos próprios sistemas estaduais de ensino para suas redes públicas escolares, seja por iniciativa própria, seja por força de legislação estadual, em todos os casos como resultado de uma persistente mobilização de amplos setores ligados à educação, que defendem a Sociologia e a Filosofia no contexto dos esforços de qualificação do Ensino Médio no Brasil. Esses avanços, ocorridos na maioria dos Estados, acabaram por criar uma situação desigual no acesso aos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia. Nos Estados que ainda não incluíram o ensino da Filosofia e da Sociologia no currículo do Ensino Médio, há toda uma população jovem posta à margem do acesso aos seus conhecimentos. Essa desigualdade ocorre, igualmente, na rede particular de ensino, na qual, malgrado a iniciativa de inclusão por uma parte das escolas, muitas outras não o fizeram. Essa reflexão impõe a manifestação deste Conselho, propiciadora de uma equalização, visando à igualdade de direitos de acesso a esses conhecimentos no Ensino Médio do país. Essas duas disciplinas visam trazer uma formação humanística e crítica para o educando. Isso decorre de serem disciplinas que contextualizam a sociedade em que estamos inseridos e ainda demonstrando a forma de questionar e criticar todas as assertivas que lhe forem apresentadas. Relembrando que o objetivo da educação conforme previsto no corpo constitucional é propiciar que o educando seja efetivamente um cidadão, a introdução dessas duas disciplinas possibilita que o educando seja um cidadão ativo. 78 CAPÍTULO 4 EJA - Educação para Jovens e Adultos Para aqueles Jovens e Adultos que não conseguiram estudar na idade correta foi prevista a EJA - Educação para Jovens e Adultos. Como parcela da população brasileira não conseguiu concluir todas as etapas do ensino básico, vem a EJA para buscar sanar essa deficiência existente. Contudo, a EJA precisa ser encarada como uma exceção, uma forma de atender a uma grande demanda de brasileiros que precisam estudar, mas não puderam fazer no momento certo. A estrutura da EJA permite que o jovem ou o adulto conclua o ensino básico num período menor do que o ensino “tradicional”. Ocorre porém, que quando se fez essa escolha por reduzir a carga horária, isso acaba impactando de forma direta no conteúdo e assim, a EJA acaba não oferecendo o mesmo conteúdo do ensino básico na forma tradicional. Isso implica dizer que há um ganho em educação, mas, infelizmente não da mesma forma que no sistema tradicional. Porém, na atualidade estamos nos deparando com uma situação muito curiosa e temerosa e que acaba chegando aos tribunais. Estamos diante de uma leva de jovens adolescentes que passaram no vestibular antes de ter concluído o Ensino Médio. O Art. 37 da LDB é claro ao afirmar que a educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram aceso ou continuidade de estudos no Ensino Fundamental e médio na idade própria. Contudo não é esse o grande problema que envolve a questão da educação de jovens e adultos. Temos nos deparado com uma situação em que adolescentes - a maioria em escolas particulares - conseguem passar no vestibular do meio do ano e com isso pedem para ingressar na EJA para concluir o Ensino Médio antes do tempo. Assim, ocorre uma banalização do ensino supletivo que perde o seu objetivo principal que é recuperar aqueles que não tiveram oportunidade na época adequada, para atender aqueles que ainda deveriam estar cursando no seu tempo próprio o Ensino Médio. Os tribunais pátrios, em específico o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal, têm-se manifestado sobre esse tema, vejamos alguns julgados 79 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV AGRAVO DE INSTRUMENTO - CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE CURSO SUPLETIVO – VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES E RISCO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. 1. A aprovação de menor de 18 anos em concurso vestibular para o curso superior que escolheu demonstra sua capacidade intelectual e amadurecimento precoce devendo ser mitigada a limitação de idade preconizada pela lei no 9.394/1996. 2. Permitir que o menor adquira a capacidade plena em razão de colação de grau em curso superior (CC 5o, parágrafo único, IV), e negar-lhe, em razão da sua idade, o acesso a esse ensino, é contraditório, o que exige a interpretação sistemática das leis garantindo-se, assim, a sua aplicação harmônica e em obediência aos fins sociais a que se destinam. 3. Deu-se provimento ao agravo de instrumento. (Acórdão no 868575, 20150020023705AGI, Relator: SÉRGIO ROCHA, 4a Turma Cível, Data de Julgamento: 20/5/2015, Publicado no DJE: 2/6/2015. Pág.: 267) CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. APROVAÇÃO EM VESTIBULAR. CONCLUSÃO DO ENSINO MÉDIO. EJA - EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS. CRITÉRIO ETÁRIO. PREVISÃO LEGAL.TEORIA DO FATO CONSUMADO. 1. Havendo previsão na legislação de regência, a exigir idade mínima para matrícula no EJA - Educação de Jovens e Adultos, referidos preceptivos devem ser aplicados, sob pena de inversão do sistema e ferimento ao Princípio da Legalidade. 2. O rigor da norma deve ser atenuado quando, por força de concessão de antecipação de tutela, já se encontra instalada a situação de fato, devendo ser homenageada a Teoria do fato Consumado. 3. Recurso provido. (Acórdão no 875775, 20140110805043APC, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Revisor: JOÃO EGMONT, 2a Turma Cível, Data de Julgamento: 17/6/2015, Publicado no DJE: 29/6/2015. Pág.: 83) DIREITO CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – APROVAÇÃO EM VESTIBULAR – AVANÇO ESCOLAR NA 80 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA MODALIDADE ENSINO A DISTÂNCIA - EJA – 1o ANO DO ENSINO MÉDIO . 1. A modalidade de educação de jovens e adultos - EJA - não tempor intuito encurtar o tempo de duração do Ensino Médio, tampouco representa caminho alternativo para o acesso mais rápido ao ensino superior. Cuida-se, sim, de modalidade de ensino destinada a pessoas que não tiveram a oportunidade de frequentar o ensino regular na idade adequada, e que se valem desse modelo para viabilizar a conclusão de seus estudos. 2. Não se admite avanço escolar a aluno que não comprova a satisfação do requisito referente ao prazo mínimo (75% da carga horária) de frequência no Ensino Médio, essenciais à modalidade de ensino à distância – o EJA. 3. Recurso conhecido e improvido. (Acórdão no 846440, 20140020289165AGI, Relator: ANA CANTARINO, 3a Turma Cível, Data de Julgamento: 28/1/2015, Publicado no DJE: 5/2/2015. Pág.: 120) Como podemos perceber pelos recentes julgados, tem-se mitigado a regra prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, inclusive com relação à idade mínima, vejamos: Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. § 1o Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão: I - no nível de conclusão do Ensino Fundamental, para os maiores de quinze anos; II - no nível de conclusão do Ensino Médio, para os maiores de dezoito anos. Por sua vez o Colendo Superior Tribunal de Justiça em emblemático acórdão prolatado em 2011 mantém-se contrário à possibilidade de utilização do exame supletivo como forma de ingresso no vestibular para aqueles que ainda não concluíram o Ensino Médio estando inseridos de forma correta no sistema, vejamos: » Inscrição. » Supletivo. » Menor. 81 ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE IV » Idade. » Aprovação. » Vestibular. A quaestio juris debatida no caso versa sobre a inscrição em curso supletivo de aluno menor de idade que pretendia obter certificado de conclusão do Ensino Médio e, assim, ingressar em instituição de ensino superior em cujo exame de admissão, vestibular, logrou êxito. O Min. Relator ressalvou que não compartilha do entendimento de que a aprovação no exame vestibular antes do término do Ensino Médio seria uma prova hábil a demonstrar a capacidade já atingida pelo estudante para iniciar curso superior, conforme o disposto no art. 208, V, da CF/1988, que assegura acesso aos níveis mais elevados de ensino conforme a capacidade de cada um. Ainda, segundo o Min. Relator, tal entendimento enfoca o Ensino Médio como mera ferramenta de acesso aos cursos superiores, desfazendo todo o planejamento concebido pelo legislador e implementado pela Administração para proporcionar aos cidadãos seu crescimento, a tempo e modo definidos, de acordo com o desenvolvimento próprio e intelectual do ser humano. Assim, ressaltou que, diante da importância do Ensino Médio no ambiente macro, a aprovação de um estudante em exame vestibular para uma das centenas de milhares de vagas oferecidas a cada ano no País não é capaz de demonstrar, por si só, que foram aprendidas todas as habilidades programadas para serem desenvolvidas no Ensino Médio. Logo, a inscrição de menor de 18 anos no exame supletivo subverte sua concepção, pois ele busca promover cidadania ao facilitar a inclusão educacional daqueles que não tiveram oportunidade em tempo próprio. Porém, no caso, o recorrente obteve uma liminar que garantiu sua imediata inscrição para realização do exame supletivo, que foi posteriormente confirmada pela sentença. Agora, após a realização do exame supletivo, expedição de certificado de conclusão do Ensino Médio e matrícula do aluno em curso superior, o qual já se encontra no segundo semestre, deve-se aplicar a teoria do fato consumado, uma vez que o decurso do tempo consolida fatos jurídicos que devem ser respeitados, sob pena de causar desnecessário prejuízo e afronta ao disposto no art. 462 do CPC. Daí, a Turma deu provimento ao recurso. Precedentes citados: AgRg no Ag 997.268-BA, DJe 19/12/2008; REsp 969.633-BA, DJe 4/3/2009; REsp 900.263-RO, DJ 12/12/2007, e REsp 887.388-RS, DJ 13/4/2007.REsp 1.262.673-SE, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18/8/2011. Apesar de ser orientação jurisprudencial o tema ainda não se encontra pacificado, posto como vimos nos acórdãos do E.TJDFT que foram prolatados em data posterior a da decisão proferida pelo E. STJ seguindo caminho totalmente contrário ao externado nos julgados do E. TJDFT. 82 UNIDADE IV │ ENSINO MÉDIO COMO ETAPA FINAL DA EDUCAÇÃO BÁSICA Por outro lado, o Ensino Médio tornou-se tão massificado, buscando “acertar” as questões do vestibular ao invés de trazer um conhecimento que será útil para a vida do acadêmico que se faz necessário repensar todo o sistema educacional e descobrir o que realmente queremos com a educação, em todos os seus níveis. 83 Para (não) Finalizar Analisamos ao longo deste trabalho a Educação Básica. Verificamos que esta se encontra classificada, ou estruturada em três etapas, quais sejam: a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e Ensino Médio. Das três somente uma é obrigatória - o Ensino Fundamental, enquanto que a Educação Infantil e o Ensino Médio são facultativos, sendo que apenas uma parcela da sociedade tem acesso a essas duas etapas. Conquanto o Estado tenha a obrigação de ofertar as três etapas, às crianças e aos adolescentes só é cobrada a inserção em apenas uma delas que é o Ensino Fundamental. Contudo, essa obrigatoriedade deve ser estendida às outras duas etapas. Cumpre ressaltar que a visão da sociedade do que vem a ser a Educação Infantil ainda está muito distante do que ela realmente significa. Verifica-se que parte da sociedade ainda visualiza a Educação Infantil, especialmente com relação às creches, uma situação meramente assistencial, ou seja, lugar para colocar a criança porque os pais não tem com quem deixar. Essa visão é completamente equivocava, posto que as creches possuem fundamental papel para o desenvolvimento da criança nessa faixa etária. Assim, não basta ter um espaço físico para a creche, faz-se necessário que atenda as determinações previstas nas normativas referentes à Educação Infantil. A creche desempenha um papel fundamental na formação da criança, iniciando com o conceito de socialização, em que o universo da criança se abre - saindo da sua estrutura familiar, que era limitada, e encontrando outras crianças com outros conhecimentos, outras formações. Além desse aspecto da socialização, deparamo-nos com a questão de iniciar - de forma lúdica - os primeiros conhecimentos, desde noção de higiene quanto os fundamentos da matemática, das ciências, entre outros aspectos. Por sua vez o Ensino Fundamental é obrigatório e por isso acarreta consequências para os pais ou responsáveis que deixarem de matricular a criança/adolescente na escola, inclusive com incidência na seara penal na qual se verifica a tipificação do crime de abandono intelectual. O Ensino Fundamental preocupa-se em formar a criança/adolescente tanto no aspecto humanístico quando no aspecto de conhecimento da área de exatas. Fizemos a opção expressa por esse sistema, em nossa Constituição, por entendermos que há uma necessidade primordial do desenvolvimento do ser humano enquanto pessoa. E que a educação é o caminho para esse desenvolvimento. 84 PARA (NÃO) FINALIZAR Mas, não basta ser obrigatório, é necessário que seja adequado, de qualidade. Assim, o Ensino Fundamental apesar de obrigatório, ainda não cumpre a sua função, porque não é de qualidade, criando duas classes distintas de crianças/adolescentes: aqueles que, por terem uma educação de qualidade, conseguirão ingressar no mercado de trabalho nos postos mais bem remunerados, ao passo que, aqueles que não tiverem acesso a uma educação de qualidade, talvez nem ingressem no mercado de trabalho, dada a ausência do conhecimento necessário para que possam competir numa situação igualitária. Dessa forma, discute-setambém a federalização da Educação Básica, em que se espera que toda e qualquer criança tenha uma educação de qualidade, não sendo aceitável que determinadas crianças tenham maior facilidade de acesso - por exemplo, por viverem nos centros urbanos - do que as crianças que vivem na área rural. A educação de qualidade deve ser fornecida a todas as crianças, e não apenas a algumas que conseguem ingressar em um colégio melhor equipado, melhor conduzido. Por sua vez o Ensino Médio destaca-se para os adolescentes numa visão de aproximá- los de forma mais qualificada para o mercado de trabalho e para o prosseguimento dos estudos no ensino superior. Apesar de ser esse o objetivo do Ensino Médio, verificamos que estamos diante de situações em que a preparação é apenas para o vestibular ou Enem, deixando de lado a ideia da aprendizagem de forma integral e ampla. Passa-se a ser apenas uma estrutura para a próxima etapa. E diante dessa visão de “cursinho” acaba se distanciando do mercado de trabalho e não prepara o aluno para o ingresso no mercado de trabalho. Em que pese ser interessante o ingresso do aluno no ensino superior, nem todas as pessoas precisam cursar o ensino superior, contudo deverá ser necessário que o Ensino Médio desempenhe um papel fundamental para o desenvolvimento desse adolescente para que ele esteja apto a ingressar no mercado de trabalho. Basta verificarmos os editais de concurso público para nível médio. Quando nos deparamos com esses editais descobrimos que o que está sendo solicitado não está em conformidade com o conteúdo que foi ensinado e trabalhado ao longo dos três anos de Ensino Médio. Com isso há um desequilíbrio muito grande entre o que o mercado de trabalho quer, precisa, e o que os concluintes do Ensino Médio têm a oferecer. Nesse nosso caminhar, verificamos ainda que estamos atrelados às mesmas técnicas que os padres jesuítas utilizavam para aplicar as avaliações naquela época, e que apesar de ter sido relevante naquele momento histórico, faz-se necessário atualizar essas técnicas de modo a atender toda essa modernidade em que estamos inseridos. 85 Referências BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1999. BITTAR, Eduardo C. B., Direito e ensino jurídico: Legislação Educacional. São Paulo: Editora Atlas, 2001. ÚLTIMO SEGUNDO. Justiça muda regra de matrícula e extingue data de corte etário em escolas de São Paulo. Disponível em . Acesso em 1 de junho de 2015. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. São Paulo: E Atlas, 2004. BOAVENTURA, Edivaldo Machado. A educação brasileira e o direito. Belo Horizonte: Nova Alvorada, 1977. CAMPOS, Maria Malta e ROSEMBERG, Fúlvia. Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças. 6ª edição. Brasília: MEC, SEB, 2009. Disponível em . EINSFELD, Carla. Gazeta online. Pai intimado por não mandar filho à escola entregou cartão Bolsa Família a traficante. 2010. Disponível em . FILGUEIRAS, Cristina A. Cunha. A creche comunitária na nebulosa da pobreza. Caderno de Pesquisa, (88), Fev – 1994, pp. 18-29. LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 11a ed. São Paulo: Cortez, MEC. Dúvidas mais frequentes sobre Educação Infantil. Brasília: MEC, 2013a. ______. Política Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à educação. Brasília: MEC, 2013b. Disponível em . Acesso em 10 de junho de 2015. ______. Sistema educativo nacional do Brasil. Disponível em: 86 REFERÊNCIAS MIRANDA, Henrique Savonitti. Curso de Direito Constitucional. 5a ed. Brasília: Senado Federal,2007. NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da criança e do adolescente comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2014. OLIVEIRA, Z.M.R. et alii. Creches: crianças, faz de conta e companhia. Petrópolis- Rio de Janeiro: Vozes, 1992. PASTORE, Maria. 9 Respostas sobre Progressão Continuada. 2011. Disponível em SOUSA, Sandra Maria Zákia Lian. A avaliação do rendimento escolar como instrumento de gestão educacional. In: Oliveira , Dalila Andrade (org.) Gestão democrática da educação: desafios contemporâneos. Petrópolis: Vozes, 1997. Todos pela educação integral. Educação integral - Um caminho para a qualidade e a equidade na Educação pública. 2015. Disponível em Todos pela educação. Ensino da língua portuguesa é um fracasso. 2015. Disponível em ZANETTI, Maria Aparecida. Política educacional e LDB: Algumas reflexões. 1997. Disponível em .pública e obrigatória, iniciando-se aos 6 anos de idade. Ensino Médio: Gratuito na escola pública, contudo não é obrigatório. O entendimento que se tem atualmente é pela progressiva obrigatoriedade. Sendo a educação um dever do Estado, este deverá providenciar os meios adequados para fornecer a Educação Básica para cada cidadão brasileiro que dele necessite. No caso da Educação Infantil, é dever do Estado providenciar o atendimento gratuito de crianças de zero a cinco anos de idade. Ao completar seis anos a criança deverá ingressar no Ensino Fundamental que é obrigatório e gratuito nas escolas públicas. O poder público deverá providenciar os meios para que as crianças sejam atendidas, seja na Educação Infantil, seja no Ensino Fundamental. No caso de o poder público omitir-se quanto ao fornecimento de vagas suficientes para atender as crianças, tanto na Educação Infantil quanto no Ensino Fundamental, faz-se necessário recorrer ao Poder Judiciário, para determinar o cumprimento da norma; vejamos no julgado a seguir a posição externada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça: 13 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MATRÍCULA E FREQUÊNCIA DE MENORES DE ZERO A SEIS ANOS EM CRECHE DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL. DEVER DO ESTADO. 1. Hipótese em que o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou Ação Civil Pública com o fito de assegurar a matrícula de duas crianças em creche municipal. O pedido foi julgado procedente pelo Juízo de 1o grau, porém a sentença foi reformada pelo Tribunal de origem. 2. Os arts. 54, IV, 208, III, e 213 da Lei no 8.069/1990 impõem que o Estado propicie às crianças de até 6 (seis) anos de idade o acesso ao atendimento público educacional em creche e pré-escola. 3. É legítima a determinação da obrigação de fazer pelo Judiciário para tutelar o direito subjetivo do menor a tal assistência educacional, não havendo falar em discricionariedade daAdministração Pública, que tem o dever legal de assegurá-lo. Precedentes do STJ e do STF. 4. Recurso Especial provido. (STJ – 2a Turma – Resp 511645/SP – Relator Ministro Herman Benjamin. Data do Julgamento: 18/8/2009) Analisando esse tema, também o Egrégio Supremo Tribunal Federal assim se manifestou. Primeira Jurisprudência do STF: EMENTA: CONSTITUCIONAL. ATENDIMENTO EM CRECHE E PRÉ- ESCOLA. I. - Sendo a educação um direito fundamental assegurado em várias normas constitucionais e ordinárias, a sua não observância pela administração pública enseja sua proteção pelo Poder Judiciário. II. - Agravo não provido. (STF - Ministro Carlos Velloso. AgRe no RE 463.210 - 2a Turma - Julgamento 6/12/2005) Segunda Jurisprudência do STF: EMENTA: CRIANÇA DE ATÉ CINCO ANOS DE IDADE - ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - SENTENÇA QUE OBRIGA O MUNICÍPIO DE SÃO PAULO A MATRICULAR CRIANÇAS EM UNIDADES DE ENSINO INFANTIL PRÓXIMAS DE SUA RESIDÊNCIA OU DO ENDEREÇO DE TRABALHO DE SEUS RESPONSÁVEIS 14 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA LEGAIS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA POR CRIANÇA NÃO ATENDIDA - LEGITIMIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DAS “ASTREINTES” CONTRA O PODER PÚBLICO - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - OBRIGAÇÃO ESTATAL DE RESPEITAR OS DIREITOS DAS CRIANÇAS - Educação Infantil - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV, NA REDAÇÃO DADA PELA EC No 53/2006) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2o) - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM CASO DE OMISSÃO ESTATAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO - INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - PROTEÇÃO JUDICIAL DE DIREITOS SOCIAIS, ESCASSEZ DE RECURSOS E A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS” - RESERVA DO POSSÍVEL, MÍNIMO EXISTENCIAL, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL - PRETENDIDA EXONERAÇÃO DO ENCARGO CONSTITUCIONAL POR EFEITO DE SUPERVENIÊNCIA DE NOVA REALIDADE FÁTICA - QUESTÃO QUE SEQUER FOI SUSCITADA NAS RAZÕES DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PRINCÍPIO “JURA NOVIT CURIA” - INVOCAÇÃO EM SEDE DE APELO EXTREMO - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO CONCRETIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE Educação Infantil: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL. - A Educação Infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de Educação Básica, o atendimento em creche e o acesso à pré- escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em consequência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a Educação Infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “crianças até 5 (cinco) anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A Educação Infantil, por 15 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no Ensino Fundamental e na Educação Infantil (CF, art. 211, § 2o) - não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político- administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social. - Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos politico-jurídicos que sobre eles incidem em caráter impositivo, vierem a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL. - O Poder Público - quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no próprio texto constitucional - transgride, com esse comportamento negativo, a própria integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.. - A inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais traduz inaceitável gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado. É que nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicávelsomente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos. - A intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais 16 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA previstas e determinadas no texto constitucional, notadamente na área da Educação Infantil (RTJ 199/1219-1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República assegura à generalidade das pessoas. Precedentes. A CONTROVÉRSIA PERTINENTE À “RESERVA DO POSSÍVEL” E A INTANGIBILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL: A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS”. - A destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá- los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras “escolhas trágicas”, em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efetividade às normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. - A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. Doutrina. Precedentes. - A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1o, III, e art. 3o, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV). A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO 17 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. - O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. LEGITIMIDADE JURÍDICA DA IMPOSIÇÃO, AO PODER PÚBLICO, DAS “ASTREINTES”. - Inexiste obstáculo jurídico- processual à utilização, contra entidades de direito público, da multa cominatória prevista no § 5o do art. 461 do CPC. A “astreinte” - que se reveste de função coercitiva - tem por finalidade específica compelir, legitimamente, o devedor, mesmo que se cuide do Poder Público, a cumprir o preceito, tal como definido no ato sentencial. Doutrina. Jurisprudência. (STF - ARE 639.337 AgR/SP - 2a. Turma - Ministro Celso de Mello - Julgamento 23/8/2011) Portanto, como vimos, a Educação Básica precisa ser ofertada de forma a atender à demanda. Conforme consta nas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica desenvolvida pelo MEC temos que Na Educação Básica, o respeito aos estudantes e a seus tempos mentais, socioemocionais, culturais, identitários, é um princípio orientador de toda a ação educativa. É responsabilidade dos sistemas educativos responderem pela criação de condições para que crianças, adolescentes, jovens e adultos, com sua diversidade (diferentes condições físicas, sensoriais e socioemocionais, origens, etnias, gênero, crenças, classes sociais, contexto sociocultural), tenham a oportunidade de receber a formação que corresponda à idade própria do percurso escolar, da Educação Infantil, ao Ensino Fundamental e ao Médio. (BRASIL, 2013). 18 CAPÍTULO 3 Das disposições gerais e finalidades da Educação Básica Para cumprir sua função a Educação Básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, competência ou outros critérios, ou ainda outra forma de organização sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar. Diante disso, é possível à escola reclassificar os alunos, inclusive quando se tratar de transferências entre estabelecimentos situados no país e no exterior, tendo como base as normas curriculares gerais. Outro ponto importante refere-se ao calendário escolar que deverá ser adequado às peculiaridades locais, inclusive em decorrência das condições climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, conduto para fazer essa adequação, não sendo possível reduzir o número de horas letivas previsto na legislação. A Constituição Federal trata do tema da educação em diversos momentos, o primeiro deles que se refere ao art. 22, inciso XXIV que estabelece como competência privativa da União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional e em decorrência dessa determinação acabou sendo promulgada a Lei Federal no 9.394 de 1996. Além disso, outros artigos tratam de forma expressa sobre a educação e inicialmente podemos contemplar o seguinte artigo: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Ou ainda no art. 22 da Lei de Diretrizes e Bases, vejamos: Art. 22. A Educação Básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores. 19 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I Extrai-se desse artigo que a educação apresenta as seguintes finalidades: Figura 2. Finalidades da Educação Pleno desenvolvimento do educando Preparo para o exercício da Cidadania Qualificação para o trabalho Para que o educando possa se desenvolver plenamente, faz-se necessário que a escola lhe forneça condições necessárias. E para isso, é necessária a oferta tanto de um meioambiente escolar adequado, como também todo o suporte necessário, passando pelo transporte, forma de acesso, assistência médica e odontológica e ainda a alimentação saudável e adequada. Como se fala em desenvolvimento pleno, é necessário, então, tratar tanto o físico, quanto o psicológico e o social, abarcando o conceito maior do princípio da dignidade da pessoa humana. Para que o educando possa ser preparado para o exercício da cidadania, é necessário que a sua participação na vida social ocorra de forma plena, integrando e interagindo com a sua comunidade e com o país de forma geral. Nessa premissa, é necessário que o educando seja instruído sobre os seus direitos e deveres. E ainda tem como finalidade a qualificação para o trabalho. Sendo o trabalho uma das formas de dignificação do ser humano, preparar o educando para o ingresso no mercado de trabalho de forma competitiva e adequada torna-se uma das finalidades da educação. Assim, faz-se necessário que o conteúdo ofertado permita que esse educando ingresse no mercado de trabalho de forma qualificada, estando portanto o conteúdo ofertado, respeitando as diretrizes básicas, em consonância com o que é necessário para atender ao mercado de trabalho específico em que o educando será inserido de acordo com a região, município em que ele reside. Buscando concretizar o previsto no art. 205 da Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases aponta em seu artigo 27 as diretrizes que devem ser contempladas pelos conteúdos curriculares da Educação Básica, vejamos: 20 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA Art. 27. Os conteúdos curriculares da Educação Básica observarão, ainda, as seguintes diretrizes: I - a difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática; II - consideração das condições de escolaridade dos alunos em cada estabelecimento; III - orientação para o trabalho; IV - promoção do desporto educacional e apoio às práticas desportivas não formais. Com isso percebe-se que o desenvolvimento físico, psíquico e social está plenamente coberto pelas diretrizes curriculares. Para atender a esses objetivos, a Educação Básica, nos níveis fundamental e médio, precisa dispor de uma carga horária mínima anual de oitocentas horas, que deverão ser distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, com a exclusão do tempo que for destinado aos exames finais, na instituição que ofertar essa possibilidade. É necessário que a escola faça a verificação e a análise da frequência dos educandos, posto que é necessário para aprovação, além da nota mínima exigida, a frequência mínima de 75% da carga horária letiva. Tanto para o nível fundamental quanto para o médio, exceto para a primeira série do Ensino Fundamental, a classificação em qualquer série ou etapa poderá ser feita por promoção, por aqueles alunos que cursarem, com aproveitamento, a série ou fase anterior, na própria escola. No caso de alunos procedentes de outras escolas, temos a possibilidade de transferência. E ainda é possível, mediante avaliação de escola, conforme o grau de desenvolvimento e experiência do candidato, e as normas do respectivo sistema de ensino, que seja feita uma avaliação para a definição de qual série ou etapa irá cursar. É interessante ressaltar que está prevista de forma expressa a possibilidade de organização de classes ou turmas, com alunos de séries distintas com níveis equivalentes de adiantamento na matéria, para o ensino de línguas estrangeiras, artes ou outros componentes curriculares. Isso decorre da necessidade de manter a classe com certa uniformidade entre os alunos com conhecimentos diferenciados. Com relação à verificação do rendimento escolar, faz-se necessário observar os seguintes critérios: 21 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I Tabela 4. Cr ité rio s pa ra ve rifi ca çã o do re nd im en to e sc ol ar a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais; b) possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar; c) possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado; d) aproveitamento de estudos concluídos com êxito; e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos; Que tal vermos a explicação da Meta 2 do Plano Nacional de Educação? Assistam também ao vídeo a seguir. 22 UNIDADE II EDUCAÇÃO INFANTIL COMO PRIMEIRA ETAPA DA EDUCAÇÃO BÁSICA CAPÍTULO 1 A Educação Infantil Quando analisamos a Lei de Diretrizes e Bases verificamos que foi feita uma divisão da Educação Infantil em duas etapas distintas, que são elas: Figura 3. Educação Infantil Creches ou entidades equivalentes Pré-escolas Em 2013 ocorreu uma alteração na redação da Lei de Diretrizes e Bases que passou a ter a seguinte redação, vejamos: Art. 29. A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. Analisando o artigo supracitado, verificamos que a Educação Infantil irá ocorrer até os cinco anos de idade, quando então adotamos um critério cronológico. Sendo que a finalidade é o desenvolvimento integral de cada criança em seus aspectos psicológico, físico, intelectual e social. E isso deverá ocorrer de forma a complementar a atuação da família e da comunidade em que a criança está inserida. 23 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I Outro importante artigo dessa norma é o artigo 30 que nos apresenta com a seguinte redação, vejamos: Art. 30. A Educação Infantil será oferecida em: I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II - pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade. (Redação dada pela Lei no 12.796, de 2013) Cumpre ressaltar, todavia, que essa alteração ocorrida nesse artigo surgiu apenas em 2013 na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e fez-se necessária em decorrência da Emenda Constitucional no 53 de 2006 que deu nova redação ao inciso IV do Art. 208, vejamos: Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: IV - Educação Infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela Emenda Constitucional no 53, de 2006) Assim, depois de mais de cinco anos é que foi providenciada a alteração no corpo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para se adequar à Emenda Constitucional no 53. As transformações da Educação Infantil; assistam ao vídeo: As creches As creches podem ser em período parcial ou integral conforme a necessidade dos responsáveis pela criança. Porém, é preciso centrar que as creches não estão apenas preenchendo uma necessidade dos responsáveis pelas crianças, não se trata apenas de certo espaço para acomodar as crianças enquanto seus responsáveis estão trabalhando. Na realidade a creche desempenha um papel fundamental para o desenvolvimento das crianças. Contudo cumpre ressaltar que as creches preenchem determinadas finalidades para o desenvolvimento sadio da criança. Assim, é preciso que seja desconstruída a ideia 24 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA de que uma creche é apenas um espaço destinado às crianças enquanto os seus responsáveis estão trabalhando. Não é esse o objetivodas creches. Apesar de algumas pessoas, desavisadas, ainda acharem que é essa a única função, ou função principal da creche. Essa visão decorre da origem histórica da creche que, conforme Oliveira, [liga-se] às modificações do papel da mulher na sociedade e suas repercussões no âmbito da família, em especial no que diz respeito à educação dos filhos. Essas modificações inserem-se no conjunto complexo de fatores contraditórios presentes na organização social, com suas características econômicas, políticas e culturais. Em especial, a creche deve ser compreendida dentro de um contexto social que inclui expansão da industrialização do setor de serviços, ao mesmo tempo em que a urbanização se torna cada vez maior. (1992, p. 17). Contudo, essa visão vem a ser alterada nas décadas de 1970 e 1980, quando começam a surgir movimentos buscando uma redefinição e conceituação do direito à Educação Infantil, e isso, precipuamente em decorrência dos movimentos que cobravam uma política social ligada à criação e manutenção das creches pelo poder público, conforme podemos constatar pela afirmação apresentada por Filgueiras. Devem-se principalmente às iniciativas populares surgidas no final dos anos 70 a redefinição da creche como um equipamento pedagógico específico e como direito – e não mais como uma ajuda às famílias nos centros urbanos, as creches muitas vezes funcionam como um equipamento de “mil e uma finalidades”, pois a ela chegam demandas de todo tipo (de saúde, de higiene, de nutrição e de educação) (1994, p. 19). Ocorre, todavia, que, somente com o advento da Lei de Diretrizes e Bases Nacional – a LDB, é que as creches passaram a integrar o sistema educacional passando assim a ser consideradas, do ponto de vista jurídico, como sendo um direito e devendo atender aos fins educativos. O Ministério da Educação e Cultura disponibiliza os critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças, assim, faz-se necessário que as creches ofertadas propiciem às crianças seu pleno desenvolvimento conforme a sua faixa etária. (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009). Vejamos esses critérios: As crianças nas creches têm direito a um(a): 25 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I Tabela 5. contato com a natureza desenvolver sua identidade cultural, racial e religiosa uma especial atenção durante seu período de adaptação à creche expressar seus sentimentos proteção, ao afeto e à amizade movimento em espaços amplos desenvolver a sua curiosidade, imaginação e capacidade de expressão alimentação sadia higiene e à saúde brincadeira atenção individual ambiente aconchegante, seguro e estimulante Fonte: As pré-escolas As pré-escolas são voltadas para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade, conforme previsto no art. 30, inciso II da LDB, com a redação dada pela Lei no 12.796, de 2013. A criança inserida na pré-escola precisa ter um desenvolvimento esperado e pautado pelo MEC em suas diretrizes. Dessa forma, cabe à pré-escola promover o desenvolvimento dessa criança ofertando condições para que ela possa desenvolver-se. Conforme as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica: 26 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA Assim, a gestão da convivência e as situações em que se torna necessária a solução de problemas individuais e coletivos pelas crianças devem ser previamente programadas, com foco nas motivações estimuladas e orientadas pelos professores e demais profissionais da educação e outros de áreas pertinentes, respeitados os limites e as potencialidades de cada criança e os vínculos desta com a família ou com o seu responsável direto. Dizendo de outro modo, nessa etapa, deve-se assumir o cuidado e a educação, valorizando a aprendizagem para a conquista da cultura da vida, por meio de atividades lúdicas em situações de aprendizagem (jogos e brinquedos), formulando proposta pedagógica que considere o currículo como conjunto de experiências em que se articulam saberes da experiência e socialização do conhecimento em seu dinamismo, depositando ênfase: I. na gestão das emoções; II. no desenvolvimento de hábitos higiênicos e alimentares; III. na vivência de situações destinadas à organização dos objetos pessoais e escolares; IV. na vivência de situações de preservação dos recursos da natureza; V. no contato com diferentes linguagens representadas, predominantemente, por ícones – e não apenas pelo desenvolvimento da prontidão para a leitura e escrita –, como potencialidades indispensáveis à formação do interlocutor cultural. (Brasil, 2013). Novamente a visão ainda de alguns no sentido de que possuem caráter meramente assistencialista precisa ser desconstruída na medida em que As creches e pré-escolas se constituem, portanto, em estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de zero a cinco anos de idade por meio de profissionais com a formação específica legalmente determinada, a habilitação para o magistério superior ou médio, refutando assim funções de caráter meramente assistencialista, embora mantenha a obrigação de assistir às necessidades básicas de todas as crianças. (BRASIL, 2013). Critérios para admissão e avaliação na Educação Infantil Não é porque estamos falando de criança em sua tenra idade que isso signifique que essas crianças não serão avaliadas. Ao contrário, é de suma importância que as crianças sejam avaliadas como uma forma de reflexão em busca dos melhores caminhos para 27 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I orientar as aprendizagens das crianças e é assim que as Diretrizes Nacionais do MEC nos apontam o caminho para a avaliação na Educação Infantil, vejamos: As instituições de Educação Infantil, sob a ótica da garantia de direitos, são responsáveis por criar procedimentos para avaliação do trabalho pedagógico e das conquistas das crianças. A avaliação é instrumento de reflexão sobre a prática pedagógica na busca de melhores caminhos para orientar as aprendizagens das crianças. Ela deve incidir sobre todo o contexto de aprendizagem: as atividades propostas e o modo como foram realizadas, as instruções e os apoios oferecidos às crianças individualmente e ao coletivo de crianças, a forma como o professor respondeu às manifestações e às interações das crianças, os agrupamentos que as crianças formaram, o material oferecido e o espaço e o tempo garantidos para a realização das atividades. Espera- se, a partir disso, que o professor possa pesquisar quais elementos estão contribuindo, ou dificultando, as possibilidades de expressão da criança, sua aprendizagem e desenvolvimento, e então fortalecer, ou modificar, a situação, de modo a efetivar o Projeto Político-Pedagógico de cada instituição. A avaliação, conforme estabelecido na Lei no 9.394/1996, deve ter a finalidade de acompanhar e repensar o trabalho realizado. Nunca é demais enfatizar que não devem existir práticas inadequadas de verificação da aprendizagem, tais como provinhas, nem mecanismos de retenção das crianças na Educação Infantil. Todos os esforços da equipe devem convergir para a estruturação de condições que melhor contribuam para a aprendizagem e o desenvolvimento da criança sem desligá-la de seus grupos de amizade. A observação sistemática, crítica e criativa do comportamento de cada criança, de grupos de crianças, das brincadeiras e interações entre as crianças no cotidiano, e a utilização de múltiplos registros realizados por adultos e crianças (relatórios, fotografias, desenhos, álbuns etc.), feitos ao longo do período em diversificados momentos, são condições necessárias para compreender como a criança se apropria de modos de agir, sentir e pensar culturalmente constituídos.Conhecer as preferências das crianças, a forma de elas participarem nas atividades, seus parceiros prediletos para a realização de diferentes tipos de tarefas, suas narrativas, pode ajudar o professor a reorganizar as atividades de modo mais adequado ao alcance dos propósitos infantis e das aprendizagens coletivamente trabalhadas. A documentação dessas observações e outros dados sobre a criança devem acompanhá-la ao longo de sua trajetória da Educação Infantil e ser entregue por ocasião de sua matrícula no Ensino 28 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA Fundamental para garantir a continuidade dos processos educativos vividos pela criança. (BRASIL, 2013, p. 95). Com relação à admissão, muito se tem discutido se o critério da idade é um critério determinante ou meramente norteador, assim temos a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios assim se manifestando: REMESSA OFICIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. Educação Infantil. NEGATIVA DE MATRÍCULA EM PRÉ-ESCOLA. IDADE MÍNIMA Resolução no 1/2012 do Conselho de Educação do Distrito Federal. INAPLICABILIDADE. RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O art. 134, parágrafo único, da Resolução no 1/2012, do Conselho de Educação do Distrito Federal, que exige a data de 31 de março como limite de idade para o ingresso na Educação Infantil, deve ser interpretado em harmonia com a Constituição Federal, sem imposição de data limite para a matrícula. 2. Remessa oficial não provida. (Acórdão no 864786, 20140111774246RMO, Relator: ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS, 4a Turma Cível, Data de Julgamento: 29/4/2015, Publicado no DJE: 7/5/2015. Pág.: 236) Ou ainda CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ACESSO À Educação Infantil. PRÉ-ESCOLA. IDADE MÍNIMA EXIGIDA NÃO CUMPRIDA. DISPENSA DO CRITÉRIO ETÁRIO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APLICAÇÃO. MATRÍCULA. POSSIBILIDADE. DECISÃO REFORMADA. 1. O desenvolvimento intelectual da criança deve ser prestigiado, especialmente, quando faltar poucos dias para implementação da idade mínima exigida para matrícula na educação pré-escolar, a fim de lhe autorizar o ingresso nessa etapa do ensino, conforme os ditames do Princípio da Proteção Integral (CF, art. 227), da garantia de acesso à Educação Infantil e da valorização da capacidade de cada um (CF, arts. 6o, 205 e 208, IV e V), obedecidos ainda os Princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade. 2. Com efeito, a maturidade intelectual e o desenvolvimento da criança devem ser privilegiados em detrimento da idade cronológica, notadamente 29 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I quando a diferença entre a idade do aluno e a idade exigida pela norma não gere prejuízos ao seu aprendizado e, reflexamente, à turma que irá frequentar, até porque ele irá compor o critério etário apenas 4 dias após a data de referência. 3. Conquanto o autor tenha pugnado na origem liminar para que a vaga lhe seja disponibilizada, ele próprio informou na inicial apresentada que haveria vagas, porém fora impedido de ser matriculado em razão de sua idade. Logo, percebe-se que na verdade, em sede de cognição perfunctória, impõe-se apenas que ele seja autorizado a se matricular na série desejada, dispensando-lhe o critério etário previsto na norma de regência. 4. Desobrigando o menor do requisito etário estabelecido na Resolução no 1/2012 – CEDF, deve (ou pode) o agente público competente matriculá- lo na série pré-escolar requerida, de preferência na escola indicada (ECA, art. 53, V), desde que atendidos os demais critérios legais exigidos, tais como o oferecimento do aludido ensino e a existência de vaga nessa instituição para o acolher na referida etapa do ensino infantil. 5. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO REFORMADA. (Acórdão no 868282, 20150020013866AGI, Relator: ALFEU MACHADO, 3a Turma Cível, Data de Julgamento: 20/5/2015, Publicado no DJE: 25/5/2015. Pág.: 208) É necessário compreender que a Educação Infantil é um direito de todas as crianças e em decorrência dessa previsão legal ocorre que não há necessidade de nenhuma espécie de seleção para o ingresso na Educação Infantil. Contudo apesar de não termos nenhuma espécie de óbice para o ingresso na Educação Infantil o MEC estabeleceu alguns critérios para admissão e, entre eles, podemos destacar os seguintes: Em geral os critérios de matrícula combinam vários fatores como, por exemplo: índice de vulnerabilidade social; faixa etária da criança; local de moradia; sorteio; atendimento a irmãos, mãe trabalhadora e outros. Deverá ser assegurada a vaga, em caráter compulsório, para criança com deficiência - Lei 7.853, de 24/10/1989. É importante que os critérios sejam transparentes, amplamente discutidos e divulgados na comunidade, inclusivos e regulamentados pelo Conselho Estadual ou Municipal de Educação. Entretanto, é necessário esclarecer que qualquer família que questione os critérios de matrícula tem direito à vaga. Por outro lado, considerando a forte demanda por atendimento, os municípios que organizaram critérios, envolvendo discussão com os diferentes setores como a Secretaria de Assistência Social, Secretaria de Saúde, Conselho 30 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA Tutelar, Conselho de Educação, Fórum de Educação Infantil, Ministério Público, entre outros, têm conseguido apoio da população com relativo sucesso. É importante ressaltar também que, apesar de existirem critérios para a seleção das crianças a serem matriculadas nas creches e pré-escolas, esses critérios não podem restringir, impedir ou dificultar o direto da criança à educação e na verdade devem ser entendidos como critérios de prioridade e não de exclusividade. (MEC, 2013). Isso implica dizer que todas as crianças deverão ser matriculadas na Educação Infantil, contudo, critério como idade é relevante em decorrência do próprio desenvolvimento saudável da criança que precisa estar em conformidade com o seu amadurecimento, inclusive físico. Competência dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e a viabilização à Educação Infantil Em 2001, foi aprovado o Plano Nacional de Educação, que assim se expressa em relação às competências dos entes federados: Na distribuição de competências referentes à Educação Infantil, tanto a Constituição Federal quanto a LDB são explícitas na corresponsabilidade das três esferas de governo – município, estado e União – e da família. A articulação com a família visa, mais do que qualquer outra coisa, ao mútuo conhecimento de processos de educação, valores, expectativas, de tal maneira que a educação familiar e a escolar se complementem e se enriqueçam, produzindo aprendizagens coerentes, mais amplas e profundas. Quanto às esferas administrativas, a União e os Estados atuarão subsidiariamente, porém necessariamente, em apoio técnico e financeiro aos municípios, consoante o art. 30, VI, da Constituição Federal. (MEC, 2013b). Assim, temos que todas as esferas são responsáveis para promover a Educação Infantil, não podendo, portanto, um responsabilizar o outro pelo descumprimento da norma. O que deve ser feito é, em conjunto, todas as esferas assumirem conscientemente o seu papel no desenvolvimento de nossas crianças. Responsabilidade dos dirigentes de creches e pré-escolas e dos governantes O Estatuto da Criança e do Adolescente não aborda os dirigentes de creches e pré- escolas, ele, infelizmente, apenas se limita ao Ensino Fundamental, conforme podemos verificar pelo art. 56 do ECA: 31 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de Ensino Fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de: I - maus-tratos envolvendo seus alunos; II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares; III- elevados níveis de repetência. Contudo, apesar da previsão expressa nesse artigo referir-se apenas aos dirigentes de estabelecimentos de Ensino Fundamental, acarretando responsabilização caso eles não o façam, a previsão para que os dirigentes de creches e pré-escolas encontra-se inserido de forma mais ampla, como podemos verificar na hipótese do art. 208 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que está inserido no tópico referente a proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos, vejamos: Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular: I - do ensino obrigatório; II - de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência; III - de atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; Assim, torna-se obrigatório aos governantes se estruturarem para ofertarem creche e pré-escolas, vejamos os julgados do Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA ARTIGOS 54 E 208 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MATRÍCULA E FREQUÊNCIA DE MENORES DE ZERO A SEIS ANOS EM CRECHE DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL. 1. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei no 8.069/1990) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei no 9.394/1996, art. 4o, IV) asseguram o atendimento de crianças de zero a seis anos em creches e pré-escolas da rede pública. 2. Compete à Administração Pública propiciar às crianças de zero a seis anos acesso ao atendimento público educacional e a frequência em creches, de forma que, estando jungida ao princípio da legalidade, é 32 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA seu dever assegurar que tais serviços sejam prestados mediante rede própria. 3. “Consagrado por um lado o dever do Estado, revela-se, pelo outro ângulo, o direito subjetivo da criança. Consectariamente, em função do princípio da inafastabilidade da jurisdição consagrado constitucionalmente, a todo direito corresponde uma ação que o assegura, sendo certo que todas as crianças nas condições estipuladas pela lei encartam-se na esfera desse direito e podem exigi-lo em juízo” (REsp no 575.280-SP, relator para o acórdão Ministro Luiz Fux, DJ de 25/10/2004). 4. A consideração de superlotação nas creches e de descumprimento da Lei Orçamentária Municipal deve ser comprovada pelo Município para que seja possível ao órgão julgador proferir decisão equilibrada na busca da conciliação entre o dever de prestar do ente público, suas reais possibilidades e as necessidades, sempre crescentes, da população na demanda por vagas no ensino pré-escolar. 5. No caso específico dos autos, não obstante tenha a municipalidade alegado falta de vagas e aplicação in totum dos recursos orçamentários destinados ao Ensino Fundamental, nada provou; a questão manteve- se no campo das possibilidades. Por certo que, em se tratando de caso concreto no qual estão envolvidas apenas duas crianças, não haverá superlotação de nenhuma creche. 6. Recurso especial provido. (REsp 510.598/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/4/2007, DJ 13/2/2008, p. 148). Ou ainda: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. ALÍNEA “C” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. DIREITO A CRECHE E A PRÉ-ESCOLA DE CRIANÇAS ATÉ SEIS ANOS DE IDADE. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL. LESÃO CONSUBSTANCIADA NA OFERTA INSUFICIENTE DE VAGAS. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 33 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I 2. Na ordem jurídica brasileira, a educação não é uma garantia qualquer que esteja em pé de igualdade com outros direitos individuais ou sociais. Ao contrário, trata-se de absoluta prioridade, nos termos do art. 227 da Constituição de 1988. A violação do direito à educação de crianças e adolescentes mostra-se, em nosso sistema, tão grave e inadmissível como negar-lhes a vida e a saúde . 3. O Ministério Público é o órgão responsável pela tutela dos interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos relativos à infância e à adolescência, na forma do art. 201 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. 4. Cabe ao Parquet ajuizar Ação Civil Pública com a finalidade de garantir o direito a creche e a pré-escola de crianças até seis anos de idade, conforme dispõe o art. 208 do ECA. 5. A Administração Pública deve propiciar o acesso e a frequência em creche e pré-escola, assegurando que esse serviço seja prestado, com qualidade, por rede própria. 6. De acordo com o princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5o, XXXV, da CF), garantia básica do Estado Democrático de Direito, a oferta insuficiente de vagas em creches para crianças de zero a seis anos faz surgir o direito de ação para todos aqueles que se encontrem nessas condições, diretamente ou por meio de sujeitos intermediários, como o Ministério Público e entidades da sociedade civil organizada. 7. No campo dos direitos individuais e sociais de absoluta prioridade, o juiz não deve se impressionar nem se sensibilizar com alegações de conveniência e oportunidade trazidas pelo administrador relapso. A ser diferente, estaria o Judiciário a fazer juízo de valor ou político em esfera na qual o legislador não lhe deixou outra possibilidade de decidir que não seja a de exigir o imediato e cabal cumprimento dos deveres, completamente vinculados, da Administração Pública. 8. Se um direito é qualificado pelo legislador como absoluta prioridade, deixa de integrar o universo de incidência da reserva do possível, já que a sua possibilidade é, preambular e obrigatoriamente, fixada pela Constituição ou pela lei. 9. Se é certo que ao Judiciário recusa-se a possibilidade de substituir- se à Administração Pública, o que contaminaria ou derrubaria a 34 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA separação mínima das funções do Estado moderno, também não é menos correto que, na nossa ordem jurídica, compete ao juiz interpretar e aplicar a delimitação constitucional e legal dos poderes e deveres do Administrador, exigindo, de um lado, cumprimento integral e tempestivo dos deveres vinculados e, quanto à esfera da chamada competência discricionária, respeito ao due process e às garantias formais dos atos e procedimentos que pratica. 10. Recurso Especial não provido. (REsp 440.502/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 24/9/2010) Analisando ainda o Estatuto da Criança e do Adolescente nos deparamos com o art. 245 que nos traz o seguinte comando: Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de Ensino Fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. Aqui a conduta ilícita, conforme Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 737) [trata-se] de omissão, consistente em deixar de comunicar (não avisar, não alertar) maus-tratos detectados em criança ou adolescente dos quais o agente tem conhecimento. Cuida-se de uma omissão administrativamente relevante, impondo o dever de garante aos profissionais mencionados no artigo (vide sujeito ativo). Não se trata de situação de fácil constatação, mas a lei indica ser viável a comunicação ainda que calcada em suspeita. Exige, entretanto, fundada suspeita, para que não se processe levianamentequalquer pessoa. Conclui-se, portanto, que além do professor, o médico e o responsável pelo estabelecimento de saúde o de educação em que a criança esteja inserido tem o dever de comunicar as suspeitas de maus-tratos que a criança vem sofrendo. Dados interessantes foram recentemente apurados em que o número de crianças que tentaram cometer suicídio aumentou exponencialmente no Brasil. E é interessante registrar ainda que dessas crianças que tentaram suicídio mas que não conseguiram obter êxito na sua tentativa, verificou-se que um percentual expressivo vinha se cortando há 35 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I mais de um ano e que ninguém - pais, professores, médicos - sabia ou tinha percebido. Assim, apesar da proteção prevista no Estatuto da criança e do adolescente isso não significa que tem surtido efeito no mundo prático. Ao menos no caso das crianças que estão cometendo suicídio. Vaga em creche sob responsabilidade do Poder Público Quando se analisa a questão de vagas em creches, faz-se necessário analisar sob o ângulo daquelas instituições que estão sob responsabilidade do Poder Público e aquelas creches privadas sob responsabilidade do Poder Público. Cumpre ressaltar ainda que se faz necessário lembrar que algumas crianças possuem deficiência e que essas crianças também têm direito a uma vaga em creche. Funcionamento de creche em período de férias Questão tormentosa é com relação ao funcionamento de creche em período de férias, principalmente porque a colocação das crianças em creche acaba atendendo a uma necessidade maior dos responsáveis que não tem com quem deixar sua prole. Contudo, na ideia de que a creche não é um mero depósito de crianças e que é preciso pensar no desenvolvimento saudável dos menores, faz-se necessário que sejam instituídos os períodos de férias para os pequeninos. O MEC teve oportunidade de debater esse tema, funcionamento de creche em período de férias, e é interessante transcrever parte do voto do relator do PARECER CNE/ CEB no 8/2011 posterior reexaminado pelo Parecer CNE/CEB no 23/2012 PARECER HOMOLOGADO Despacho do Ministro, publicado no D.O.U. de 19/3/2013, Seção 1, Pág. 10. 2. Nas creches e pré-escolas mostra-se adequada uma estrutura curricular que se fundamente no planejamento de atividades durante um período, sendo normal e plenamente aceitável a existência de intervalo (férias ou recesso), como acontece, aliás, na organização das atividades de todos os níveis, etapas e modalidades educacionais. Tal padrão de organização de tempo de operacionalização do projeto político-pedagógico, com inclusão de intervalos, não constitui obstáculo ou empecilho para a consecução dos objetivos educacionais, ao tempo em que contribui para o atendimento de necessidades básicas de desenvolvimento das crianças relacionadas à convivência intensiva com suas famílias e a vivências de outras experiências e rotinas distintas daquelas organizadas pelas instituições de educação. 36 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA 3. Considera-se que muitas famílias necessitam de atendimento para suas crianças em períodos e horários que não coincidem com os de funcionamento regular dessas instituições educacionais, como o horário noturno, finais de semana e em períodos de férias e recesso. Contudo, esse tipo de atendimento, que responde a uma demanda legítima da população, enquadra-se no âmbito de “Políticas para a Infância”, devendo ser financiado, orientado e supervisionado por outras áreas, como assistência social, saúde, cultura, esportes e proteção social. O sistema de ensino define e orienta, com base em critérios pedagógicos, o calendário, os horários e as demais condições para o funcionamento das creches e pré-escolas, o que não elimina o estabelecimento de mecanismos para a necessária articulação que deve haver entre a educação e outras áreas, como a saúde e a assistência, a fim de que se cumpra, do ponto de vista da organização dos serviços nessas instituições, o atendimento às demandas das crianças. Dessa forma, instalações, equipamentos, materiais e outros recursos, sejam das creches e pré-escolas, sejam dos outros serviços, podem e devem ser mobilizados e articulados para o oferecimento de cuidados e atividades às crianças que delas necessitarem durante o período de férias e recesso das instituições educacionais. 4. Portanto, necessidades de atendimento a crianças em dias ou horários que não coincidam com o período de atividades educacionais previsto no calendário escolar das instituições por elas frequentadas, deverão ser equacionadas segundo os critérios próprios da assistência social e de outras políticas sociais, como saúde, cultura, esportes e lazer, em instituições especializadas na prestação desse tipo de serviços, e, na falta ou insuficiência destas instituições, nas próprias instalações das creches e pré-escolas, mediante o emprego de profissionais, equipamentos, métodos, técnicas e programas adequados a essas finalidades, devendo tais instituições atuar de forma articulada com as instituições educacionais. Percebe-se com isso que a análise da questão perpassa pela necessária compreensão da função educacional da creche e não uma atuação meramente assistencial como muitos ainda visualizam. Previsão orçamentária e a reserva do possível Tratando-se de direito fundamental, o direito à educação, o argumento apresentado como reserva do possível, ou seja, que o município não tem previsão orçamentária ou diante da 37 O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA │ UNIDADE I insuficiência orçamentária para implementação não deve ser óbice para a implementação de creche e pré-escola. O Supremo Tribunal Federal, manifestou-se a respeito entendendo que é perfeitamente possível que o ente estatal seja responsabilizado por não ter previsto número de creches e pré-escolas para as crianças, vejamos: EMENTA: CRIANÇA DE ATÉ CINCO ANOS DE IDADE - ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - SENTENÇA QUE OBRIGA O MUNICÍPIO DE SÃO PAULO A MATRICULAR CRIANÇAS EM UNIDADES DE ENSINO INFANTIL PRÓXIMAS DE SUA RESIDÊNCIA OU DO ENDEREÇO DE TRABALHO DE SEUS RESPONSÁVEIS LEGAIS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA POR CRIANÇA NÃO ATENDIDA - LEGITIMIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DAS “ASTREINTES” CONTRA O PODER PÚBLICO - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - OBRIGAÇÃO ESTATAL DE RESPEITAR OS DIREITOS DAS CRIANÇAS - Educação Infantil - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV, NA REDAÇÃO DADA PELA EC No 53/2006) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2o) - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM CASO DE OMISSÃO ESTATAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO - INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - PROTEÇÃO JUDICIAL DE DIREITOS SOCIAIS, ESCASSEZ DE RECURSOS E A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS” - RESERVA DO POSSÍVEL, MÍNIMO EXISTENCIAL, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL - PRETENDIDA EXONERAÇÃO DO ENCARGO CONSTITUCIONAL POR EFEITO DE SUPERVENIÊNCIA DE NOVA REALIDADE FÁTICA - QUESTÃO QUE SEQUER FOI SUSCITADA NAS RAZÕES DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PRINCÍPIO “JURA NOVIT CURIA” - INVOCAÇÃO EM SEDE DE APELO EXTREMO - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO CONCRETIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE Educação Infantil: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL. - A Educação Infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu 38 UNIDADE I │ O SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO E A EDUCAÇÃO BÁSICA desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de Educação Básica, o atendimento em