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II Conquistas na luta e no luto

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Conquistas na luta e no luto 
Ao contrário do que ressalta o imaginário feminista, o 8 de março não surgiu a 
partir de um incêndio nos Estados Unidos, mas foi fruto do acúmulo de mobilizações no 
começo do século passado 
por Maíra Kubík Mano
1
 
© AKG IMAGES /LATINSTOCK 
 
Na Alemana, cartaz convoca para a marcha do Dia das Mulheres, em 8 de março de 1914 na Alemanha 
Se as operárias russas do início do século XX recebessem bombons e flores em 
comemoração ao Dia da Mulher, talvez se sentissem ofendidas. Afinal, quando os protestos do dia 8 
de março foram deflagrados, o que elas queriam mesmo eram melhores condições de trabalho. Não 
agüentavam mais as jornadas de 14 horas e os salários até três vezes menores que os dos homens. 
Na época, as fábricas dos países desenvolvidos, que fazia pouco mais de um século haviam 
passado pela Revolução Industrial, estavam atulhadas de homens, mulheres e crianças. O movimento 
operário reagia à exploração desenfreada organizando protestos, muitos com cunho socialista. Entre as 
reivindicações, o fim do emprego infantil e remuneração adequada. A igualdade de gênero, porém, 
nunca era pautada. Por mais que as trabalhadoras argumentassem, sua renda era vista como 
complementar à do marido ou pai, e um pedido de salários iguais parecia afetar as “exigências gerais”. 
É nesse contexto de eclosão popular, sindical e feminista que surge o Dia Internacional da Mulher. 
Os Estados Unidos foram, sem dúvida, um dos palcos dessa luta. Desde meados do século 
XIX, os operários organizavam greves para pressionar os proprietários das indústrias, principalmente 
as têxteis. Em terras americanas foi registrado o primeiro Dia da Mulher, em 3 de maio de 1908. 
Segundo o jornal The Socialist Woman, “1.500 mulheres aderiram às reivindicações por igualdade 
econômica e política no dia consagrado à causa das trabalhadoras”. No ano seguinte, a data foi 
 
1
 Maíra Kubík Mano é jornalista e mestranda em Ciência Política da PUC-SP. 
 
oficializada pelo partido socialista e comemorada em 28 de fevereiro. Em Nova York, reuniu cerca de 
3 mil pessoas em pleno centro da cidade, na ilha de Manhattan. 
 
BIBLIOTECA DO CONGRESSO, WASHINGTON 
 
O incêndio da fábrica Triangle Shirtwaist Company, em 25 de março de 1911, popularmente tido como o marco 
que deu origem ao Dia da Mulher 
 
A celebração foi mais um dos elementos no caldo político que irrompeu na greve geral dos 
trabalhadores do vestuário, em sua maioria mulheres jovens, em novembro de 1909. A paralisação 
durou 13 semanas e provocou o fechamento de mais de 500 fábricas de pequeno e médio portes. As 
condições de trabalho, no entanto, não melhoraram muito. Os proprietários das indústrias continuavam 
forçando o cumprimento de jornadas massacrantes. Para evitar que seus empregados saíssem mais 
cedo, boa parte deles trancava as portas durante o expediente e cobria os relógios de parede. 
Em 1911, ocorreu um episódio marcante, que ficou conhecido no imaginário feminista como 
a consagração do Dia da Mulher: em 25 de março, um incêndio teve início na Triangle Shirtwaist 
Company, em Nova York. Localizada nos três últimos andares de um prédio, a fábrica tinha chão e 
divisórias de madeira e muitos retalhos espalhados, formando um ambiente propício para que as 
chamas se espalhassem. A maioria dos cerca de 600 trabalhadores conseguiu escapar, descendo pelas 
escadas ou pelo elevador. Outros 146, porém, morreram. Entre eles, 125 mulheres, que foram 
queimadas vivas ou se jogaram das janelas. Mais de 100 mil pessoas participaram do funeral coletivo. 
Até hoje, muitas organizações e movimentos afirmam que essa tragédia aconteceu em 1857 e 
por isso reivindicam o mês de março como a data para comemorar a luta pelos direitos das mulheres. 
Como não há provas nem registros de que um evento similar tenha ocorrido, essa versão não é 
considerada verdadeira. Para os estudiosos, esse foi apenas mais um acontecimento que fortaleceu a 
organização feminina. 
De fato, o Dia Internacional da Mulher já havia sido proposto em 1910, um ano antes do 
incêndio, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, realizada em Copenhague, 
Dinamarca. Clara Zetkin, militante e intelectual alemã, apresentou uma resolução para que se criasse 
uma “jornada especial, uma comemoração anual de mulheres”. A inspiração nas trabalhadoras do 
outro lado do Atlântico é explícita: para Clara, elas deveriam “seguir o exemplo das companheiras 
americanas”. 
 
REPRODUÇÃO 
 
Ação política das operárias russas que desencadeou a revolução de fevereiro e deu origem ao Dia da Mulher, em 
1917 
 
ORIGEM REVOLUCIONÁRIA 
Sem data definida, mobilizações anuais pelos direitos das mulheres prosseguiram em meses 
distintos, em diversos países. Em 8 de março de 1917, uma ação política das operárias russas contra a 
fome, contra o czar Nicolau II e contra a participação do país na Primeira Guerra Mundial precipitou 
os acontecimentos que desencadearam na revolução de fevereiro. O líder Leon Trotsky registrou assim 
esse evento: “Em 23 de fevereiro (8 de março no calendário gregoriano) estavam planejadas ações 
revolucionárias. Pela manhã, a despeito das diretivas, as operárias têxteis deixaram o trabalho de 
várias fábricas e enviaram delegadas para solicitarem sustentação da greve. Todas saíram às ruas e a 
greve foi de massas. Mas não imaginávamos que este „dia das mulheres‟ viria a inaugurar a 
revolução”. 
A situação econômica e política da Rússia era então insustentável. Mais de 90 mil pessoas 
marcharam, exigindo pão e paz. Os protestos e as greves subseqüentes culminaram na queda da 
monarquia. Alexandra Kollontai, uma das principais dirigentes feministas da revolução de outubro, 
afirmou que “o dia das operárias em 8 de março de 1917 foi uma data memorável na história”. 
Em 1921, de acordo com a pesquisadora canadense Renée Coté, referência no estudo da 
história das mulheres, o 8 de março foi estabelecido como data oficial. Pesquisando arquivos da 
Conferência Internacional das Mulheres Comunistas, ela encontrou um documento que registrava que 
“uma camarada búlgara propôs o Dia Internacional da Mulher, lembrando a iniciativa das mulheres 
russas”. 
REPRODUÇÃO 
 
Desenho de Raul Pederneiras de 1914 retrata o movimento sufragista, por meio do qual as mulheres brasileiras 
reivindicavam o direito de votar 
 
Com as duas guerras mundiais que se seguiram, o Dia da Mulher ficou em segundo plano. 
Foi apenas na década de 60 que o movimento feminista retomou com força as comemorações, em 
meio a leituras de O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, e à fogueira de sutiãs nos Estados 
Unidos. 
 
A LUTA NOS TRÓPICOS 
No Brasil, nesse mesmo período, a direita e a esquerda tensionavam o cenário político. 
Manifestações como a Marcha da Família com Deus e pela Liberdade, com propostas absolutamente 
opostas às das feministas, que pregavam a legalização do aborto, precipitaram o golpe militar de 1964 
e dificultaram a ascensão das organizações de mulheres. Movimentos contra a carestia, pela anistia e 
clubes de mães, cuja pauta central não era a libertação da mulher, ganharam as ruas. Mesmo assim, 
havia uma história de luta reivindicada pelas brasileiras, similar à européia e à americana. No início do 
século XX, as mulheres e crianças constituíam quase 75% dos operários têxteis. Além de péssimas 
condições de higiene e longas jornadas de trabalho, elas sofriam com o assédio constante de seus 
patrões e também tentavam se organizar. Em 1906, o jornal anarquista A Terra Livre divulgou um 
texto de três costureiras que criticavam a não-adesão da categoria à greve operária: “Companheiras! É 
necessário que nos recusemosa trabalhar também de noite porque isso é vergonhoso e desumano. 
Como se pode ler um livro quando se vai para o trabalho às 7 da manhã e se volta para casa às 11 da 
noite?”, dizia. Essas passagens, ligadas principalmente às anarquistas, ainda são pouco conhecidas em 
nossa trajetória. A vertente que ganhou mais notoriedade no feminismo brasileiro foi a das sufragistas, 
que lutaram pelo direito a voto. Fundadoras do Partido Republicano Feminino, essas mulheres da elite 
nacional conseguiram sua reivindicação na Constituição de 1932, promulgada por Getúlio Vargas. 
Resultado de todo esse processo, em 1975 comemorou-se o Ano Internacional da Mulher e, 
em 1977, a ONU (Organização das Nações Unidas) reconheceu o 8 de março como Dia Internacional 
da Mulher. Fruto de décadas de batalhas e séculos de opressão, a data que lembra a necessária 
igualdade entre homens e mulheres foi mundialmente – e finalmente – assegurada.

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