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Adriana Vinhas Bueno DIREITOS REAIS 2 POSSE 4 PROPRIEDADE 18 USUCAPIÃO 32 DIREITOS DE VIZINHANÇA 39 CONDOMÍNIO 46 DIREITOS REAIS EM COISA ALHEIA 54 DIREITOS REAIS 1- Conceito Para Orlando Gomes estabelece-se uma relação de gênero e espécie entre bem e coisa, sendo possível a existência de bens com ou sem qualquer expressão econômica, enquanto a coisa sempre apresenta economicidade e é inevitavelmente corpórea. A materialidade é o traço que aparta. O direito das coisas regula o poder do homem sobre certos bens suscetíveis de valor e os modos de sua utilização econômica. 2- Características fundamentais dos direitos reais a) Absolutismo: significa o poder de agir sobre a coisa, que é oponível erga omnes, eis que os direitos reais acarretam sujeição universal ao dever de abstenção sobre a prática de qualquer ato capaz de interferir na atuação do titular sobre o objeto. Como consequência do princípio do absolutismo, surge o princípio da publicidade, por excelência para os bens imóveis. Refuta-se a clandestinidade, eis que os direitos reais só se podem exercer contra todos se forem ostentados publicamente. OBS: no estágio atual da ciência do Direito, no se pode mais enaltecer todos se forem ostentados publicamente. scetiveis ão se pode mais enaltecer a dicotomia entre direitos reais e obrigacionais com base no absolutismo. Há uma necessária mitigação da eficácia entre os dois grandes direitos subjetivos patrimoniais, a ponto de se afirmar o caráter unitário da relação patrimonial, com base no princípio constitucional da solidariedade, o que demanda o respeito por parte de todos às situações jurídicas regularmente estabelecidas, sejam elas reais ou obrigacionais. A ideia de que a obrigação apenas impõe deveres aos contratantes, excluindo-se completamente da esfera de terceiros, é absolutamente incompatível com a evolução do direito. b) Sequela: a inerência do direito real ao objeto afetado é tão substancial a ponto de fazer com que o seu titular possa persegui-lo em poder de terceiros onde quer que se encontre. c) Preferência: presente predominantemente nos direitos reais de garantia, consiste no privilégio do titular do direito real em obter o pagamento de um débito com o valor do bem aplicado exclusivamente à sua satisfação. Havendo o concurso de diversos credores, a coisa dada em garantia é subtraída da execução coletiva, pois o credor real (pignoratício ou hipotecário) prefere a todos os demais. d) Taxatividade: inseridos em regime de ordem pública, os direitos reais são números clausus, de enumeração taxativa, localizados no rol pormenorizado do art. 1225 do CC e em leis especiais diversas. Não obstante a isso, os tipos de direito real são abertos, pois há um espaço no qual a autonomia privada pode se manifestar, desde que não sejam criadas figuras atípicas, sem previsão legal. OBS: a doutrina mais moderna considera que o rol é exemplificativo. Assim, legislação extravagante pode criar novos direitos reais. 3- A relação jurídica de direito real Não se admite relação jurídica entre pessoas e coisas, pois todo vínculo só ocorre em função do homem em sociedade. Nos direitos reais, o bem é meramente o objeto sobre o qual se exercitam as situações jurídicas de poder e domínio, das quais decorrem as faculdades de usar, gozar e dispor. Ou seja, não há relação jurídica entre o sujeito e a coisa, mas direito de dominação ou de poder. Em suma, não é censurável a ideia da configuração de uma relação jurídica envolvendo de um lado o titular do direito real e, do outro, um hipotético sujeito passivo universal ou uma virtual comunidade de pessoas. Percebe-se a ocorrência de uma evidente obrigacionalização do direito das coisas, na medida em que todos os direitos reais, sem exceção, abrigam em sua estrutura uma relação jurídica de direito real e uma outra relação jurídica, de direito obrigacional. A primeira, pautada pela situação de domínio do titular sobre a coisa; a segunda, na relação jurídica de conteúdo intersubjetivo, envolvendo uma necessária cooperação entre o titular do direito real e a coletividade. POSSE 1- Noções conceituais e a mera detenção Durante muito tempo se afirmou que a posse era um mero apêndice da propriedade, sem autonomia científica. Foi Savigny quem apresentou a primeira teoria da posse, que consistia na união do corpus (apreensão) e do animus rem sibi habendi. O relevante histórico dessa 1a teoria foi conferir à posse uma autonomia científica. A teoria de Savigny é conhecida como teoria subjetiva da posse. A posse seria um fato na origem e um direito nas consequências. Posteriormente, R. Von Ihering estabeleceu o que se chama de teoria objetiva da posse, entendendo que para ter a posse basta a apreensão (corpus), abandonando-se a ideia da intensão de ter a coisa como sua (animus), já que este estaria implícito no próprio poder de fato exercido sobre a coisa. Por outro lado, Ihering entende que o elemento corpus não demanda, para sua caracterização, a apreensão física do bem. Esse elemento, em vez disso, consubstancia o poder físico da pessoa sobre a coisa, fato exterior em oposição ao fato anterior (a visibilidade do domínio). OBS: a crítica que se faz é a de que nenhuma dessas duas teorias seriam mais capazes de explicar o fenômeno possessório à luz de uma teoria material dos direitos fundamentais. Atualmente a semântica da posse passa a ser melhor compreendida por meio dos sentidos de permanência, habitação, produção econômica e sustentável – a posse desperta para seus fins sociais, como exigência humana integradora, e não de dominação e estratificação, apenas a serviço do direito de propriedade. Atualmente vige no direito brasileiro a teoria objetiva da posse, como regra. Exceção: ao tratar, p. ex., do usucapião, o CC exige a posse com animus domini (teoria subjetiva). A natureza da posse (fato ou direito) é uma das mais discutidas controvérsias sobre o tema, sendo que Savigny combina a visão de posse como fato e como direito, sustentando a tutela possessória no acautelamento da pessoa humana, que merece ser protegida de toda a forma de violência, como conduta antijurídica (teoria eclética). Já para Ihering a posse é mera exteriorização de um direito de propriedade. O entendimento mais acertado é no sentido de que a posse é um DIREITO subjetivo dotado de estrutura peculiar, pois as normas que a tutelam são a ela direta e imediatamente dirigidas. Para Ihering, trata-se de um direito subjetivo real, mas outros doutrinadores concebem-na como direito obrigacional (não taxatividade, impossibilidade de oponibilidade contra todas as demais pessoas, irregistrabilidade). Por fim, o próprio legislador teria conceituado a posse como um direito obrigacional. O art. 1228 estabelece que a posse significa o exercício de um dos poderes do proprietário sobre a coisa, quais sejam: uso ou gozo/fruição. A posse é autônoma e independente em relação à propriedade, sendo que esta, ao contrário do que ocorre com a posse, não reclama necessariamente contato físico com a coisa. Existe, no entanto, situações em que, apesar de o sujeito ter o contato físico com a coisa, o ordenamento jurídico lhe retira a qualidade de possuidor, como também é possível a posse sem o contato físico (desqualificação e qualificação da posse, respectivamente). Tais hipóteses precisam estar previstas em lei, necessariamente. Qualificação da condição de possuidor: quem não tem contato físico, mas o ordenamento reconhece como possuidor. I. Desdobramento de posse em posse indireta e direta (art. 1197): é a existência de uma relação contratual base conferindo a posse à um terceiro sem que o legítimo possuidor perca a qualidade e a defesa possessória em razão disso. O possuidor indireto, apesar de não ter contato físico com a coisa, não deixa de sê-lo. Ex.: locação, depósito, usufruto. II. Constituto possessório, cláusula constitute, posse civil ou posse contratual (arts. 1203 e 1205): é a aquisição de posse por força de uma relação contratual, mesmo sem o contato físico. Desqualificação da condição de possuidor: quem temnesse mesmo local. Não são exigidos o justo título e a boa-fé. Doutrina e jurisprudência não admitem, neste caso, a adição da posse, pois requer requisitos personalíssimos incompatíveis com a aludida soma. OBS: a presença da União ou de qualquer de seus entes na ação de usucapião especial não afasta a competência do foro da situação do imóvel (Súm.11, STJ). O mesmo raciocínio aplica-se à ação de usucapião proposta contra a massa falida, não prevalecendo o foro universal do juízo da falência. É obrigatória a presença do MP em qualquer ação de usucapião. Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. Inf. 566, STJ: Determinada pessoa preencheu os requisitos para obter o direito à usucapião especial rural, prevista no art. 191 da CF/88. Ocorre que o juiz negou o pedido alegando que a área usucapienda era muito inferior ao mínimo legal permitido para desmembramento ou divisão de gleba rural. Em outras palavras, o magistrado juiz argumentou, que apesar de o autor preencher os requisitos constitucionais, a legislação não permite que uma área tão pequena seja desmembrada e se torne um imóvel com matrícula própria. A decisão do magistrado está correta? O fato de haver essa limitação na legislação infraconstitucional impede que a pessoa tenha direito à usucapião especial rural? NÃO. Presentes os requisitos exigidos no art. 191 da CF/88, o imóvel rural cuja área seja inferior ao "módulo rural" estabelecido para a região poderá ser adquirido por meio de usucapião especial rural. A CF/88, ao instituir a usucapião rural, prescreveu um limite máximo de área a ser usucapida, sem impor um tamanho mínimo. Assim, estando presentes todos os requisitos exigidos pelo texto constitucional, não se pode negar a usucapião alegando que o imóvel é inferior ao módulo rural previsto para a região. STJ. 4a Turma. REsp 1.040.296-ES, Rel. originário Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/6/2015 (Info 566). A USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA ou “pro misero” – inovação da Constituição Federal de 1988 - também foi tratada no Código Civil, que repete literalmente os termos da Carta. Por eles, aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2o O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. Tal espécie não se aplica à posse de terreno urbano sem construção, pois é requisito a sua utilização para moradia do possuidor ou de sua família. Por outro lado, também não reclama justo título e boa-fé. Nada obsta que se adquira por usucapião especial imóvel urbano inserido em área maior quando delimitada a posse ao limite de duzentos e cinquenta metros quadrados. O Estatuto da Cidade possui preceito quase idêntico ao artigo 1.240 do CC/02, donde se denota que a usucapião urbana está contida em três importantes diplomas: Código Civil, Estatuto da Cidade e Constituição Federal (art. 183). Enunciado 85 do CJF: “Art. 1240: Para efeitos do art. 1240, caput, do NCC, entende-se por ‘área urbana’ o imóvel edificado ou não, inclusive unidades autônomas vinculadas a condomínios edilícios”. Inf. 783, STF: Determinada pessoa preencheu os requisitos para obter o direito à usucapião especial urbana, prevista no art. 183 da CF/88. Ocorre que o juiz negou o pedido alegando que o plano diretor da cidade proíbe a existência de imóveis urbanos registrados com metragem inferior a 100m2. Em outras palavras, fixou que o módulo mínimo dos lotes urbanos naquele Município seria de 100m2 e, como a área ocupada pela pessoa seria menor que isso, ela não poderia registrar o imóvel em seu nome. A decisão do magistrado está correta? O fato de haver essa limitação na lei municipal impede que a pessoa tenha direito à usucapião especial urbana? NÃO. Se forem preenchidos os requisitos do art. 183 da CF/88, a pessoa terá direito à usucapião especial urbana e o fato de o imóvel em questão não atender ao mínimo dos módulos urbanos exigidos pela legislação local para a respectiva área (dimensão do lote) não é motivo suficiente para se negar esse direito, que tem índole constitucional. Para que seja deferido o direito à usucapião especial urbana basta o preenchimento dos requisitos exigidos pelo texto constitucional, de modo que não se pode impor obstáculos, de índole infraconstitucional, para impedir que se aperfeiçoe, em favor de parte interessada, o modo originário de aquisição de propriedade. Inf. 584, STJ: não obsta o pedido declaratório de usucapião especial urbana o fato de a área do imóvel ser inferior à correspondente ao "módulo urbano" (a área mínima a ser observada no parcelamento de solo urbano por determinação infraconstitucional). STJ. 4a Turma. REsp 1.360.017-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/5/2016 3.4- Usucapião coletiva urbana Artigo 10 do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/01): Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. Em face do artigo acima, o que significa população de baixa renda? A grande maioria dos autores (SILVIO VENOSA, MÁRIO DELGADO e outros) tem entendido que se trata de um conceito aberto, que será definido pelo juiz diante do caso concreto. Entretanto, há julgados indicando alguns critérios objetivos: a) renda familiar de até 3 SM; b) bolsa-família, quando a renda per capita máxima seja de R$100,00. Porque os movimentos dos sem-teto não têm invocado esse direito? O prazo de 5 anos deve ser contado a partir do vigor da lei, ou seja, o prazo anterior de posse não pode ser somado, já que a lei é de 2001. Este entendimento de que o prazo da usucapião começa a contar a partir da entrada em vigor da lei é fundado em posição do STF (RE 145.004). Esse instituto visa auxiliar a solução do problema de distribuição de imóveis urbanos. DIREITOS DE VIZINHANÇA 1- Noções gerais Nos direitos de vizinhança a norma jurídica limita a extensão das faculdades de usar e gozar por parte de proprietários e possuidores de prédios vizinhos, impondo-lhes um sacrifício que precisa ser suportado para que a convivência social seja possível e para que a propriedade de cada um seja respeitada (princípio da função social da propriedade). A expressão propriedade vizinha não se aplica restritamente aos prédios confinantes, mas engloba todos os prédios que puderem sofrer repercussão de atos propagados de prédios próximos. Já o vocábulo prédio não distingue entre o imóvel urbano ou rural, comercial ou residencial, abrangendo até mesmo o terreno não edificado. Os direitos de vizinhança são obrigações propter rem; vinculam-se ao prédio, assumindo-os quem quer que esteja em sua posse (determinação indireta dos sujeitos). Excluem-se dos conflitos de vizinhança as situações nas quais se configura a chamada interferência direta ou imediata, quando seus efeitos já começam no prédio vizinho (p. ex.: canalizo a fumaça para que ela seja lançadadiretamente no prédio de 3o). Neste caso, o que se tem na verdade é ato ilícito, verdadeira violação da propriedade alheia. Em princípio estariam excluídos da legislação sobre direito de vizinhança todos os conflitos nos quais já existe relação jurídica entre as partes envolvidas (p. ex., locação e condomínio edilício), que devem resolver suas pendências de acordo com cada contrato/legislação específica. Todavia, nada impede que o locatário e o condômino prejudicados pelo uso anormal da propriedade possam se valer das regras gerais que se aplicam indistintamente a qualquer vizinho. Os direitos de vizinhança, chamados dconvencionaism com as servidoes propriedade possam se valer das regras gerais que se aplicam indistintamente a qualquer vizinhoe servidões prediais legais, não se confundem com o direito real de servidão (as servidões convencionais). A servidão consiste na disciplina voluntária do conflito de vizinhança e, em sua falta, prevalecem as normas supletivas referentes à vizinhança, sendo que o referido direito real exige um aumento de direito para o prédio dominante e consequente diminuição ao prédio serviente, enquanto os direitos de vizinhança pressupõem a reciprocidade e igualdade. Por outro lado, os direitos de vizinhança são criados por lei, inerentes ao próprio direito de propriedade, sem a finalidade de incrementar a utilidade de um prédio, mas com o fito de assegurar a convivência amistosa entre vizinhos. Já a servidão é fruto de um ato complexo, iniciado por um negócio jurídico que objetiva aumentar a utilidade ou a beleza de um prédio em detrimento de outro, necessariamente seguido do registro no ofício imobiliário. Daí o equivoco de adotar-se a expressão servidão legal em similitude aos direitos de vizinhança. 2- Uso anormal da propriedade O direito de vizinhança tem o seu cerne vinculado ao mau uso da propriedade, pela mensuração de condutas de proprietários e possuidores que excedem o razoável e prejudicam a segurança, sossego e saúde de vizinhos. A legitimidade ativa para a propositura das ações pertinentes estende-se aos aparentes proprietários, abrangendo os titulares de direitos reais e obrigacionais que exercem ingerência socioeconômica sobre o bem imóvel na qualidade de possuidores, sem qualquer relação com o proprietário. O art. 1277 do CC é numerus clausus e não comporta interpretação extensiva, portanto, se as interferências prejudiciais causadas a um morador não repercutirem sob o trinômio saúde/segurança/sossego, a questão extrapolará do conflito de vizinhança. São defesos somente os atos que acarretem ao vizinho dano ou incômodo anormal, de grave intensidade, de acordo com o senso médio do local em que é verificado (atos ilegais, abusivos ou excessivos). O mau uso (que pode incluir a subutilização ou não-uso) da propriedade é aferido objetivamente, sem que se perscrute o erro, a falha do causador do dano – que terá, portanto, responsabilidade objetiva em relação aos danos causados pelos possuidores ou proprietários dos prédios vizinhos. a) Uso normal, causando incômodos normais: nenhum direito existirá para o prejudicado (danos lícitos e ato lícito). b) Uso normal, causando incômodos anormais, mas socialmente necessários: existirá direito do prejudicado à indenização (dano ilícito oriundo de ato lícito). OBS: em alguns casos, os danos serão tão intensos a ponto de o magistrado determinar a indenização como verdadeira verba expropriatória privada, permitindo aos vizinhos a alteração do próprio domicílio. c) Uso anormal, causando danos anormais, sem justificação social, por inexistir interesse coletivo na atividade: o prejudicado poderá exigir a cessação do uso (dano ilícito oriundo de ato ilícito). 3- Árvores limítrofes Art. 1.282. A árvore, cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se pertencer em comum aos donos dos prédios confinantes. Art. 1.283. As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio, poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido. Art. 1.284. Os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao dono do solo onde caíram, se este for de propriedade particular. OBS: se os frutos caírem em solo de domínio público, pertencerão ao dono da árvore, incorrendo no crime de furto quem os colher. 4- Passagem forçada Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário. § 1o Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem. § 2o Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes perca o acesso a via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem. § 3o Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes da alienação, existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra. Enunciado 88 do CJF: o direito de passagem forçada, previsto no art. 1.285 do CC, também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica (princípio da função social da propriedade). Este é o entendimento doutrinário e jurisprudencial mais moderno. OBS: é de se entender possível a extensão da legitimação ativa para a propositura da ação para fixação de passagem forçada também ao possuidor, em respeito ao princípio da função social da posse. 5- Da passagem de cabos e tubulações Art. 1.286. Mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa. Parágrafo único. O proprietário prejudicado pode exigir que a instalação seja feita de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel. 6- Das águas Art. 1.288. O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo; porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior. Art. 1.289. Quando as águas, artificialmente levadas ao prédio superior, ou aí colhidas, correrem dele para o inferior, poderá o dono deste reclamar que se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo que sofrer. Parágrafo único. Da indenização será deduzido o valor do benefício obtido. Art. 1.290. O proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas pluviais, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir, ou desviar o curso natural das águas remanescentes pelos prédios inferiores. Art. 1.291. O possuidor do imóvel superior não poderá poluir as águas indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis inferiores; as demais, que poluir, deverá recuperar, ressarcindo os danos que estes sofrerem, se não for possível a recuperação ou o desvio do curso artificial das águas. Enunciado 244 do CJF: o art. 1.291 deve ser interpretado conforme a CF, não sendo facultada a poluição das águas, quer sejam essenciais ou não às primeiras necessidades da vida. Art. 1.292. O proprietário tem direito de construir barragens, açudes, ou outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido. Art. 1.293. É permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agriculturae à indústria, bem como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de terrenos. Enunciado 245 do CJF: muito embora omisso acerca da possibilidade de canalização forçada de águas de prédios alheios, para fins de agricultura ou indústria, o art. 1.293 não exclui a possibilidade da canalização forçada pelo vizinho, com prévia indenização aos proprietários prejudicados. § 1o Ao proprietário prejudicado, em tal caso, também assiste direito a ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da infiltração ou irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a canalizá-las. § 2o O proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea a canalização que atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais. § 3o O aqueduto será construído de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários dos imóveis vizinhos, e a expensas do seu dono, a quem incumbem também as despesas de conservação. Art. 1.294. Aplica-se ao direito de aqueduto o disposto nos arts. 1.286 e 1.287. Art. 1.295. O aqueduto não impedirá que os proprietários cerquem os imóveis e construam sobre ele, sem prejuízo para a sua segurança e conservação; os proprietários dos imóveis poderão usar das águas do aqueduto para as primeiras necessidades da vida. Art. 1.296. Havendo no aqueduto águas supérfluas, outros poderão canalizá-las, para os fins previstos no art. 1.293, mediante pagamento de indenização aos proprietários prejudicados e ao dono do aqueduto, de importância equivalente às despesas que então seriam necessárias para a condução das águas até o ponto de derivação. Parágrafo único. Têm preferência os proprietários dos imóveis atravessados pelo aqueduto. 7- Limites entre prédios e direito de tapagem Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas. § 1o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação. § 2o As sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco divisório, só podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietários. § 3o A construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem provocou a necessidade deles, pelo proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas. Art. 1.298. Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão de conformidade com a posse justa; e, não se achando ela provada, o terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro. 8- Direito de construir O direito de construir não pode mais ser entendido como uma simples faculdade a ser exercitada pelo proprietário, limitado apenas pelos direitos de vizinhança e pelos regulamentos administrativos. Diante da sistemática constitucional que elevou o princípio da função social da propriedade à categoria de direito fundamental da pessoa humana, o referido direito deve ser exercido de acordo com uma política de desenvolvimento urbano que priorize a melhoria das condições de moradia e vivência das cidades, destinada ao pleno desenvolvimento da personalidade dos indivíduos que a compõem. Podemos evidenciar a existência de 4 limites ao direito de construir: a) limitações convencionais oriundas de cláusulas contratuais; b) observância dos regulamentos administrativos; c) direitos de vizinhança; d) a função social da propriedade. Art. 1.300. O proprietário construirá de maneira que o seu prédio não despeje águas, diretamente, sobre o prédio vizinho. Art. 1.301. É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho. OBS: a distância mínima é contada a partir da linha divisória entre os imóveis/terrenos. Súmula 120, STF: parede de tijolos de vidro translúcido pode ser levantada a menos de metro e meio do prédio vizinho, não importando servidão sobre ele. § 1o As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros. § 2o As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso. Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho. Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade. Art. 1.303. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos de três metros do terreno vizinho. Art. 1.304. Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento, o dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio contíguo, se ela suportar a nova construção; mas terá de embolsar ao vizinho metade do valor da parede e do chão correspondentes. Art. 1.305. O confinante, que primeiro construir, pode assentar a parede divisória até meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio valor dela se o vizinho a travejar, caso em que o primeiro fixará a largura e a profundidade do alicerce. Parágrafo único. Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não tiver capacidade para ser travejada pelo outro, não poderá este fazer-lhe alicerce ao pé sem prestar caução àquele, pelo risco a que expõe a construção anterior. Art. 1.306. O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da espessura, não pondo em risco a segurança ou a separação dos dois prédios, e avisando previamente o outro condômino das obras que ali tenciona fazer; não pode sem consentimento do outro, fazer, na parede-meia, armários, ou obras semelhantes, correspondendo a outras, da mesma natureza, já feitas do lado oposto. Art. 1.307. Qualquer dos confinantes pode altear a parede divisória, se necessário reconstruindo-a, para suportar o alteamento; arcará com todas as despesas, inclusive de conservação, ou com metade, se o vizinho adquirir meação também na parte aumentada. Art. 1.308. Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer aparelhos ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais ao vizinho. Parágrafo único. A disposição anterior não abrange as chaminés ordinárias e os fogões de cozinha. Art. 1.309. São proibidas construções capazes de poluir, ou inutilizar, para uso ordinário, a água do poço, ou nascente alheia, a elas preexistentes. Art. 1.310. Não é permitido fazer escavações ou quaisquer obras que tirem ao poço ou à nascente de outrem a água indispensável às suas necessidades normais. Art. 1.311. Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias. Parágrafo único. O proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias. Art. 1.312. Todo aqueleque violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos. Art. 1.313. O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para: I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório; II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente. § 1o O disposto neste artigo aplica-se aos casos de limpeza ou reparação de esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos, poços e nascentes e ao aparo de cerca viva. § 2o Na hipótese do inciso II, uma vez entregues as coisas buscadas pelo vizinho, poderá ser impedida a sua entrada no imóvel. § 3o Se do exercício do direito assegurado neste artigo provier dano, terá o prejudicado direito a ressarcimento. CONDOMÍNIO 1- Noções gerais Condomínio é o exercício simultâneo do mesmo direito de propriedade por duas ou mais pessoas (copropriedade). É pluralidade de sujeitos + a indivisibilidade do objeto. O reconhecimento do condomínio não viola o caráter exclusivo da propriedade (teoria da propriedade integral), tendo-se, assim, uma situação qualitativamente igual (todos os condôminos possuem os mesmos direitos), mas quantitativamente diferente (cada condômino tem a sua fração ideal). Subjetivamente, o condomínio é uma comunhão; objetivamente é uma indivisão. 2- Condomínio comum ou tradicional 2.1- Conceito É disciplinado integralmente pelo CC/02. Consiste no exercício do mesmo direito de propriedade por diferentes sujeitos. 2.2- Direitos dos condôminos a) Uso e fruição da integralidade da coisa, independentemente de sua fração ideal; OBS: quando um condomínio exercer sua posse alijando a dos demais caberá usucapião (STJ). Trata-se de exceção, pois em regra não cabe usucapião de condômino. b) Possibilidade de defesa possessória do todo, independentemente de sua fração ideal; c) Alienar ou dar em garantia a sua fração ideal; Admite-se o suprimento judicial se um condômino se recusar imotivadamente à alienação ou gravame. d) Direito de preferência dos demais; É indispensável que se garanta o direito de preferência dos demais condôminos, por meio de notificação judicial ou extrajudicial, em se tratando de alienação. O conflito de preferência se decide em favor daquele que tiver o maior volume de benfeitorias, posteriormente em favor de quem tem o maior quinhão e, ao final, em favor de quem fizer o maior lance. A consequência da não-observância do direito de preferência é a mera ineficácia em relação aos condôminos preteridos, que disporão do prazo decadencial de 180 dias da data do conhecimento da alienação para ajuizar ação de adjudicação compulsória, pressupondo-se o depósito do valor. Há litisconsórcio passivo necessário unitário entre o condômino alienante e o 3o adquirente, que não pode alegar a boa-fé em face da ausência de notificação. OBS: a regra do direito de preferência é inaplicável ao condomínio edilício. e) Direito de voto; O CC condiciona o direito de voto ao adimplemento das cotas condominiais, em aplicação da função social da propriedade. f) Direito de preferência em caso de deliberação pelo aluguel da coisa condominial. 2.3- Deveres dos condôminos a) Respeitar a finalidade da coisa condominial; b) Não dar posse a terceiros sem o consentimento dos demais; c) Partilhar as despesas comuns (obrigação propter rem); Segue uma regra de proporcionalidade em relação às frações ideais. A responsabilidade será proporcional, e não solidária. d) Responsabilidade pelos frutos colhidos isoladamente. OBS: o STJ já reconheceu a responsabilidade do cônjuge que permanece morando sozinho por metade do aluguel da coisa. 2.4- Administração Será fixada pela maioria das frações ideais (critério econômico). Havendo empate, será caso de decisão judicial e, de qualquer modo, deve se preservar o direito da minoria vencida, que poderá reclamar seus direitos. 2.5- Espécies a) Condomínio legal: pode ser forçado (resulta do inevitável estado de indivisão de certos bens, p. ex. cercas e muros) ou fortuito (é a que se estabelece entre vários herdeiros, no momento da abertura da sucessão). b) Condomínio voluntário: deriva de um negócio jurídico. 2.6- Extinção O condomínio tradicional, desde que voluntário, pode ser extinto, pois a temporariedade é seu elemento intrínseco – todo condomínio nasce para se extinguir. O CC autoriza aos condomínios o estabelecimento de um prazo de indivisibilidade, dentro do qual não se pode requerer a divisão, que será de no máximo 5 anos, prorrogável uma vez. Não será possível a prorrogação se o condomínio foi formado por doação ou testamento. Mesmo dentro do prazo de indivisibilidade, será possível requerer a divisão se houver indicação de justa causa, por meio de ação de divisão. Ação de alienação judicial de bem comum: é procedimento especial utilizado nos casos de coisa indivisível. O condômino terá preferência em relação a terceiros. O STJ vem entendendo que, se for cabível a divisão, não se admite a ação de alienação (é residual). 3- Condomínio edilício 3.1- Conceito É disciplinado pelo CC e, subsidiariamente, pela Lei 4.591/64 (que foi parcialmente revogada por aquele). Consiste em um regime especial de condomínio, constituindo em uma simbiose entre propriedade individual (sobre as unidades autônomas) e propriedade coletiva (sobre as partes comuns). O STJ vem entendendo que toda simbiose constitui condomínio edilício, inclusive a vila de casas. A jurisprudência vem reconhecendo os chamados condomínios de fato, com a observação de que para o STJ não é possível a associação forçada. No entanto, pela proibição do enriquecimento sem causa, se a pessoa obtiver alguma vantagem, deverá contribuir proporcionalmente pelo benefício recebido. 3.2- Elementos componentes O condomínio edilício é composto por unidades autônomas e áreas comuns, não se admitindo separação entre elas (formam um todo indivisível). As unidades autônomas não admitem usucapião, mas admitem a ocorrência do instituto da supressio (STJ e Enunciado 247 da Jornada). Cada condômino tem legitimidade para exercer a tutela possessória das áreas comuns. OBS1: o terraço ou cobertura é área comum, salvo disposição contrária do ato de constituição do condomínio. Assim, só pode ser alienada com a concordância de todos os condôminos. OBS2: o CC estabelece 3 regimes jurídicos de garagens. A garagem pode ser unidade autônoma, integrante da unidade autônoma (teoria da gravitação) ou pertencente a área comum do condomínio. Súmula 449, STJ: a vaga de garagem com matrícula própria (como unidade autônoma) não constitui bem de família, podendo ser penhorada. OBS3: só se admite o aluguel de garagem a terceiro por expressa autorização da convenção do condomínio, sendo que o condômino tem preferência em relação ao 3o. 3.3- Natureza jurídica Para o CC/02, a natureza do condomínio edilício é de ente despersonalizado. No entanto, tem capacidade e legitimidade processual, tanto que pode inclusive adquirir unidades autônomas. Enunciado 246 da Jornada: reconheceu a personalidade jurídica do condomínio nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar interesse. O objetivo é evitar o árduo e lento processo de obtenção de assentimento da totalidade de condôminos para a tomada de importantes deliberações, em resposta ao pragmatismo a à operabilidade. O STJ, por sua vez, já reconheceu que o condomínio edilício é pessoa jurídica para fins de contribuição previdenciária. Ocorre uma inversão da teoria da gravitação para evitar que o acessório siga o principal, quando o condomínio é construído de boa-fé em terreno alheio (este será indenizado pelo condomínio). OBS: se a penhora recair sobre imóvel que não comporta cômoda divisão, há de se proceder a alienação do bem em hasta pública por inteiro, reservando-se ao cônjuge não executado a metade do preço alcançado (protege-se a sua meação). 3.4- Time sharing ou multipropriedade imobiliária Trata-se de um novo modelode condomínio criado de forma diferenciada – é um condomínio no tempo, e não no espaço. Os condôminos terão direito de uso da coisa em um determinado número de dias do ano. Todo time sharing exige uma administradora para congregar os diferentes interesses, harmonizando-os. 3.5- Elementos constitutivos (3 atos) a) Ato de instituição ou de criação (art. 1332): institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou por testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis (ao contrário do condomínio horizontal, o condomínio edilício é sempre corolário de um negócio jurídico). b) Convenção do condomínio (art. 1334): trata-se de norma interna na qual são estipulados os direitos e deveres recíprocos dos condôminos, de perfil estatutário (ato-regra). A convenção não pode ser vista como um contrato, à medida que a sua força coercitiva ultrapassa as pessoas que assinaram o instrumento de sua constituição. Por outro lado, a natureza estatutária da convenção autoriza a imediata aplicação do regime jurídico previsto no NCC mesmo aos condomínios que existiam antes de sua vigência. OBS: não há como arguir a exceção de contrato não cumprido na ação de cobrança de despesas condominiais, visto que só aplicável a contratos bilaterais, e não à convenção de condomínio, que possui caráter normativo e institucional. OBS: caso o prédio não delibere por assumir a responsabilidade civil por danos decorrentes de furtos ou avarias que danifiquem veículos no estacionamento, por mais que o condomínio conte com serviços de vigilância e segurança, cada comproprietário arcará com os seus prejuízos. As restrições impostas na convenção só serão consideradas eficazes se efetivamente objetivarem coibir o mau uso da propriedade, e se observarem as normas de ordem pública e a razoabilidade. c) Regimento interno: é ato meramente administrativo, complementar à convenção, que contem as orientações acerca do dia-a-dia da vida do condomínio. Enunciado 248, CJF: o quórum para alteração do regimento interno do condomínio pode ser livremente fixado na convenção. OBS: o mesmo não se verifica na convenção condominial, demandando a sua alteração o quórum qualificado de 2/3 dos votos dos condôminos. 3.6- Sanções punitivas condominiais O CC estabelece que incide uma cláusula penal moratória de 2% sobre o débito do condômino que descumpre a obrigação de pontualmente contribuir para as despesas do prédio, ficando ele ainda sujeito aos juros moratórios (1% ao mês, caso não seja estipulada) convencionados. A natureza estatutária da convenção de condomínio autoriza a imediata aplicação do regime jurídico previsto no NCC, regendo-se a multa pelo previsto no art. 1335, p. 1o. O STJ entende que é possível fixar na convenção do condomínio juros moratórios acima de 1% ao mês, em caso de inadimplemento das taxas condominiais. Para boa parte da doutrina, esses juros deveriam se submeter ao teto do art. 406 (1%), porque esses juros não podem ser equiparados aos juros moratórios livres previstos exclusivamente na Lei de Mercado de Capitais. Considera-se constrangimento ilegal, por abuso de direito, o cerceamento ao exercício das faculdades dominiais ao condômino em decorrência do inadimplemento das contribuições condominiais. Verificando-se que a sanção pecuniária mostrou-se ineficaz, a garantia fundamental da função social da propriedade e a vedação do abuso de direito justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior assembleia prevista na parte final do paragrafo único do art. 1337 do CC delibere a propositura de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal. Não se vulnera o direito de propriedade, mas sim o direito de moradia especifico daquela pessoa (poderá alugar o imóvel, p. ex.). Inf. 527, STJ: o prazo prescricional para cobrança de cotas condominiais é de 5 anos, contados do vencimento de cada parcela. Inf. 570, STJ: o Código Civil prevê que, se o condômino apresentar reiterado comportamento antissocial, poderá ser punido com multa (art. 1.337, parágrafo único). Essa sanção para o comportamento antissocial reiterado de condômino só poderá ser aplicada se antes foram conferidas ao condômino as garantias da ampla defesa e do contraditório. Enunciado 92-CJF: Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo. 3.7- Administração do condomínio edilício a) Síndico: é escolhido pela assembleia para administrar o condomínio, por prazo não superior a 2 anos, o qual poderá renovar-se (no silêncio da convenção, poderá ser reeleito indefinidamente). Os condôminos são representados ativa e passivamente pelo síndico, que poderá ser PJ ou PF, ainda que não condômino, e a quem incumbe defender, judicial e extrajudicialmente, os interesses comuns do condomínio, bem como praticar todos os atos da administração (instituto da presentação). b) Assembleia geral: é o órgão deliberativo do condomínio, constituído por todos os condôminos. c) Conselho Fiscal: será composto por 3 membros eleitos pela assembleia, com a exclusiva finalidade de analisar e auditar as contas prestadas pelo sindico. Não se trata mais de órgão obrigatório. 3.8- Extinção do condomínio edilício Enquanto o condomínio ordinário pode ser extinto a qualquer tempo, sendo suficiente o exercício do direito potestativo por qualquer condômino, o condomínio edilício (espécie de condomínio forçado) só chegará a seu momento derradeiro em circunstâncias especiais pela sua natureza indivisível (p. ex., ruina do prédio). DIREITOS REAIS EM COISA ALHEIA 1- Noções gerais Os direitos reais em coisa alheia nascem da propriedade, que é o direito real em coisa própria. Assim, é possível fracionar os poderes inerentes ao domínio/propriedade, quais sejam: o uso, o gozo ou fruição, a livre disposição e a reinvindicação, sendo que este fracionamento decorre da complexidade do direito de propriedade (o que se fraciona/desmembra é o domínio, pois a propriedade se mantém ilesa). Nos direitos reais em coisa alheia, como consequência do fracionamento dos poderes inerentes ao domínio (princípio da elasticidade), ocorre o esvaziamento deste, mas a propriedade em si não perde seu caráter de exclusividade. A constituição de um direito real em coisa alheia ocorre, ordinariamente, por meio de um negócio jurídico (ato voluntário), mas também pode ocorrer por decisão judicial (p. ex. usucapião) ou por força de lei. Hoje já se fala na função social dos direitos reais em coisa alheia, que consiste no cumprimento da função social pelo destinatário da fração destacada do domínio. Apesar de o direito real em coisa alheia ser exercido sobre a coisa, é inegável que também deve cumprir uma função social em relação às pessoas. Ademais, a despatrimonialização e a repersonalização do direito privado não encontram ressonância apenas na propriedade, mas em qualquer outra forma de apropriação de bens regulada no ordenamento. A titularidade, no exercício dos direitos reais limitados, volta-se a relações intersubjetivas dinâmicas e repersonalizadas, nos quais os titulares desses direitos limitados têm a obrigação de coordenar a satisfação de seu interesse com a do proprietário que lhe desdobrou parcelas do domínio, sem se olvidar no exercício de condutas benéficas ao interesse coletivo. Súmula 308, STJ: a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração de promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel. 2- Classificação OBS: a lei 11.481/07 criou dois novos direitos reais em coisa alheia especiais (que não se encaixam na classificação abaixo): a concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de uso. Foram criados especialmente para o Poder Público, com a finalidade de conceder a este um instrumento mais célere para a regularização fundiária. 2.1- Direitos reais em coisa alheia de gozo ou fruição A finalidade é permitir que o terceiro retire as utilidades da coisa, tendo-a consigo. Nestes termoso CC prevê o usufruto, a habitação, o uso, a superfície e a servidão. Além destes, tem-se também as enfiteuses constituídas até o advento do CC/02, que são disciplinadas pelo CC/16. 2.2- Direitos reais em coisa alheia de garantia Neste caso, o terceiro poderá dispor da coisa para garantir o cumprimento de uma obrigação pré-existente. O direito real terá natureza acessória e assecuratória. Extinto o negócio jurídico de direito obrigacional por qualquer dos meios legalmente previstos, os direitos reais de garantia também perdem a existência. O contrário não se aplica – as nulidades que possam invalidar a garantia real não influenciam o contrato, apenas subtraem de si os atributos de sequela e preferência. São direitos reais de garantia a anticrese, a hipoteca, o penhor e a alienação fiduciária em garantia. 2.3- Direito real em coisa alheia de aquisição A finalidade consiste em propiciar ao terceiro a possibilidade de adquirir o título da propriedade. O único direito real de aquisição previsto pelo CC é a promessa irretratável de compra e venda. 3- Promessa irretratável de compra e venda O art. 1.088 do CC de 1916 conferiu à promessa irretratável de compra e venda natureza meramente obrigacional, enfraquecendo-a, o que se manteve apenas até o advento do Dec. Lei 58/37, ao que se seguiu a Lei 6.766/79 e o CC/02. Os três diplomas citados são os responsáveis por conferir eficácia real à promessa de compra e venda, sendo que o promitente comprador passou a ter o direito à aquisição da coisa se adimplida a dívida. Sob o ponto de vista do ser, a promessa de compra e venda irretratável é um contrato preliminar, portanto com natureza obrigacional, mas a lei optou por conferir-lhe eficácia real (é uma obrigação convertida em DIREITO REAL). O promitente comprador detém e exerce todos os poderes inerentes ao domínio com a finalidade de adquirir a coisa, e pode desistir do negócio sempre, qualquer que seja a natureza do contrato (ao contrário do promitente vendedor). A contrario sensu, havendo cláusula de arrependimento, a promessa de compra e venda terá natureza meramente obrigacional. Neste caso, o promitente vendedor também pode desistir do negócio a qualquer tempo, desde que o contrato não tenha sido integralmente cumprido (não há prazo decadencial). Exceção: aplicação da teoria do adimplemento substancial. Por outro lado, a cláusula de arrependimento será nula: a) quando se tratar de relação de consumo (art. 51 do CDC) e nos contratos de adesão; b) quando se tratar de imóveis loteados, rurais ou urbanos (art. 25 da Lei 6.766/79); c) quando o contrato for celebrado de acordo com o Dec. Lei 58/37 (súmula 166 do STF). O fundamento dessas três objeções (taxativas) é a boa-fé objetiva. A execução específica é incompatível com a previsão de arras penitenciais (constituem cláusula implícita de arrependimento). A promessa de compra e venda com função de garantia produz imediatos efeitos substanciais, considerando-se que já ao tempo de sua celebração o comprador se imitirá na posse do bem, detendo as faculdades de uso e fruição do mesmo. À medida que integralize as prestações consolida o domínio. Ao tempo da quitação só restará ao vendedor a titularidade formal do bem, posto esvaziada de conteúdo econômico. A promessa de compra e venda também exige a outorga do cônjuge, sob pena de anulabilidade, salvo se o regime for o da separação convencional de bens. A Lei 6.766/79 preconiza que a sentença declaratória de falência ou de insolvência de qualquer das partes não rescindirá os contratos de compromisso de compra e venda, incumbindo-se o síndico de dar cumprimento aos referidos contratos. Inf. 543, STJ: deve ser extinto sem resolução de mérito o processo decorrente do ajuizamento, por loteador, de ação ordinária com o intuito de, em razão da suposta inadimplência dos adquirentes do lote, rescindir contrato de promessa de compra e venda de imóvel urbano loteado sem o devido registro do respectivo parcelamento do solo, nos termos da Lei 6.766/1979. 3.1- Efeitos jurídicos da promessa irretratável de compra e venda a) Conferir posse ao promitente comprador; O STJ reconhece a legitimidade do promitente comprador para a ação reivindicatória, posto que a cada dia ele vai adquirindo a propriedade da coisa. b) Permitir a aquisição forçada da coisa. Processualmente, a aquisição forçada pode se apresentar por meio de ação de adjudicação compulsória ou ação de outorga de escritura pública. Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. Súmula 239, STJ: o direito à adjudicação compulsória (entenda-se: direito à aquisição forçada, pois na verdade neste caso só é possível a ação de outorga de escritura pública) não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis (função social da posse). Enunciado 95 da I Jornada de Direito Civil: O direito à adjudicação compulsória (art. 1.418 do novo Código Civil), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula n. 239 do STJ). Vantagem no caso de a promessa ter sido registrada para fins de adjudicação compulsória Se a promessa estiver registrada no RI, o promissário comprador tem uma vantagem: ele poderá ajuizar a ação de adjudicação compulsória com base em um rito sumário (mais rápido e simples) previsto no art. 25 da Lei nº 6.766/79 e art. 15 do DL nº 58/37. Já se o contrato não estiver registrado, a ação de adjudicação compulsória será proposta como uma ação de conhecimento, de rito ordinário. (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Vol. 5. Salvador : Juspodivm, 2014, p. 840). Além disso, conforme já explicado acima, se a promessa estiver registrada, a adjudicação compulsória poderá ser proposta inclusive contra terceiros. Súmula 84, STJ: é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro. Na prática, o registro da promessa de compra e venda (que o transforma em direito real à aquisição) só serve para impedir que o promitente vendedor aliene novamente o imóvel para outra pessoa (eficácia erga omnes), que presumidamente estará de boa-fé. Enunciado 253 CJF: O promitente comprador, titular de direito real (art. 1.417), tem a faculdade de reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda. Inf. 570, STJ: A promessa de compra e venda (ou compromisso de compra e venda) é uma espécie de contrato preliminar por meio do qual uma pessoa (promitente vendedor) se compromete a vender o seu bem ao promissário comprador após este pagar integralmente o preço que foi ajustado. Se o promitente vendedor, mesmo após receber o preço integral combinado, recusar-se a outorgar a escritura pública, o promissário comprador poderá ajuizar ação de adjudicação compulsória. Existe um prazo para que o promissário comprador proponha a ação de adjudicação compulsória? Depois de pago integralmente o preço, se o promitente vendedor se recusar a outorgar a escritura pública, qual o prazo que o promissário comprador possui para requerer a adjudicação compulsória? Não há prazo. O promitente comprador, amparado em compromisso de compra e venda de imóvel cujo preço já tenha sido integralmente pago, tem o direito de requerer judicialmente, a qualquer tempo, a adjudicação compulsória do imóvel. 3.2- Aspectos controvertidos a) É necessária a constituição em mora para a rescisão contratual. Apesar de a mora na promessa de compra e venda ser ex re, por se tratar de direito de moradia, exige-se prévia notificação no prazo de 30 dias, se o imóvel for loteado, ou 15 dias, se não o for (prazo mínimo de interpelação). A ideia é possibilitar a extinção da mora. O STJ vem entendendo que é condiçãopara a propositura de ação pelo promitente comprador (ação de rescisão contratual ou possessória) a prova da prévia interpelação do promitente comprador. b) Se o promitente vendedor for casado exige-se a anuência do cônjuge, sob pena de anulabilidade, salvo se for casado no regime de separação convencional de bens, ou se casado na participação final nos aquestos e o pacto antenupcial assim dispuser. OBS: o consentimento não é exigível na união estável, em nenhum caso. c) A jurisprudência vem entendendo que é abusiva/nula a chamada cláusula de decaimento ou perdimento, que estabelece que, em caso de arrependimento pelo promitente comprador, este perderá todas as parcelas anteriormente pagas (função social da cláusula penal). Por outro lado, neste caso será possível o estabelecimento de uma taxa de ocupação (espécie de aluguel), que pode inclusive ser arbitrado pelo juiz. Assim, do valor a ser devolvido ao promitente comprador que se arrepende desconta-se a cláusula penal (multa) e a taxa de ocupação, acrescidos de juros e correção monetária. O STJ também entende que á abusiva, por ofensa ao CDC, a cláusula contratual que determina, em caso de rescisão de promessa de compra e venda de imóvel, a restituição das parcelas somente ao término da obra. 4- Teoria geral dos direitos reais de garantia Até o advento da lex poetelia papiria as obrigações eram garantidas com a personalidade do devedor. De acordo com o CC, as garantias creditícias podem ser fidejussórias (prestadas por uma pessoa, p. ex. fiador) ou reais (ofertadas pelo devedor sobre as coisas que lhe pertencem). Todo direito real de garantida tem natureza acessória em relação à uma obrigação principal. O CC proíbe a instituição de cláusula comissória (art. 1.428), que é a que permite ao credor ficar com a coisa para si em caso de inadimplemento da obrigação principal, em virtude da proibição do enriquecimento sem causa. Neste caso, o credor deve executar a garantia. Essa proibição se estende para os negócios simulados, p. ex., uma aparente compra e venda cujo objetivo é mascarar um contrato de empréstimo com juros extorsivos. Exceção: nos imóveis hipotecados do SFH é possível a execução extrajudicial da garantia pela instituição bancária (Dec. Lei 70/66) e, a despeito das críticas da doutrina, o STJ entende ser disposição plenamente aplicável. O art. 83 da Lei de Falências estabelece os privilégios creditícios em ordem de preferência, quais sejam: crédito trabalhista, crédito com garantia real e crédito fiscal. Enquanto o crédito privilegiado (trabalhista) é universal, ou seja, incide sobre todo o patrimônio do devedor (até o limite de 150 SM, salvo em se tratando de acidente de trabalho); o crédito com garantia real é singular, pois só incide sobre a coisa. OBS1: a preferencia dos direitos reais de garantia perdeu parte de seu rigor diante da criação por outras normas dos chamados privilégios legais, que são as mais variadas hipóteses, inclusive, p. ex., as despesas do condomínio edilício em relação ao imóvel (STJ). OBS2: mesmo o titular de um crédito obrigacional, desprovido de qualquer privilégio de direito material, poderá obter os requisitos da sequela e preferência perante outros credores da mesma classe, sendo para tanto necessário que, no âmbito do processo de execução, culmine por promover o registro da penhora. O direito real de garantia é a vinculação do poder do credor sobre um bem específico, integrante do patrimônio do devedor. 4.1- Requisitos dos direitos reais de garantia Na falta de qualquer dos requisitos a garantia será inválida, mas a dívida permanecerá eficaz como crédito quirografário ou comum. I. Formal: é o registro (se imóvel) ou tradição (se móvel) e a especialização do crédito. II. Objetivo: é qualquer bem provido de alienabilidade. Logo, não podem ser objeto de direito real de garantia as coisas inalienáveis. OBS1: o DL 8.618/46 e 70/66 estabelecem a impossibilidade de garantia sobre imóvel financiado, em relação a terceiros. OBS2: a Lei 8.009/90 torna o bem de família impenhorável mas não inalienável, portanto pode ser objeto de garantia, mas apenas para assegurar o cumprimento de dívidas em proveito da família. III. Subjetivo: o devedor deve ter capacidade e legitimação, que consistirá na possibilidade pessoal de alienar os bens (ex.: consentimento do cônjuge se o devedor for casado). OBS: em se tratando de bem pertencente a incapaz só será possível a instituição do gravame após autorização judicial, ouvido o MP. 4.2- Características dos direitos reais de garantia I. Sequela: como reflexo de sua oponibilidade erga omnes, o direito real adere à coisa de tal forma que a garantia subsiste, mesmo diante da transmissão inter vivos ou mortis causa da propriedade do bem móvel ou imóvel vinculado ao pagamento do débito originário. II. Preferência ou prelação: é característica apenas do penhor e da hipoteca, sendo que o seu titular preferirá no pagamento aos outros credores apenas em relação ao produto da venda do bem dado em garantia real. III. Excussão: quando do inadimplemento, os bens dados em garantia serão necessariamente penhorados e submetidos à hasta pública. IV. Indivisibilidade: o devedor não poderá obter a liberação parcial do vínculo real, pelo simples fato de amortizar parcialmente o débito, salvo disposição expressa no título ou quitação. V. Especialização: é fator fundamental de eficácia do contrato que institui a garantia real, consistindo na vinculação de bens determinados do devedor ou de terceiro, para garantia da obrigação principal. VI. Registro: o ônus real só é oponível em caráter geral quando aperfeiçoado pelo registro, servindo igualmente para conceder publicidade e sequela. 5- Anticrese Alguns doutrinadores entendem a anticrese como um direito real de segunda categoria. É instituto que incide sempre sobre um bem frugível (que produz frutos, p. ex. uma fazenda), e consiste no direito do credor de retirar os frutos da coisa e aliená-los, abatendo o valor recebido da dívida (primeiro os juros, depois o principal). Neste caso, o devedor deve transferir a posse para o credor, o que lhe acarreta inúmeros prejuízos. A anticrese tem o prazo máximo de 15 anos, após o qual ela se extinguirá e a dívida permanecerá como quirografária. O instituto civil da imputação do pagamento torna a anticrese um instituto inconveniente e de quase nenhuma aplicabilidade. OBS: a constituição da anticrese permite a constituição de outra garantia sobre a coisa, em virtude de restringir-se ao colhimento dos frutos (especificidade). A ação de prestação de contas estará disponível ao devedor para que ele reclame do credor a especificação dos frutos colhidos. 6- Penhor Penhor é direito real de garantia sobre coisa móvel, logo todo penhor, em regra, só se constitui com a tradição do bem ao credor pignoratício. OBS: aeronaves e navios tem natureza mobiliária, mas são considerados bens imóveis exclusivamente para fins de hipoteca. Se a coisa produzir frutos enquanto estiver na posse do credor pignoratício estes deverão ter seu valor abatido do total da dívida (dá-se imputação do pagamento). O penhor tem natureza acessória, ou seja, quitada a dívida, extingue-se automaticamente o penhor. Se houver roubo ou furto da coisa empenhada a dívida permanece, mas cessa-se a garantia. Por outro lado, o STJ já entendeu que neste caso o credor pignoratício tem a obrigação de ressarcir ao devedor o valor de mercado da coisa, perante a qual tem responsabilidade objetiva. O penhor é exemplo de desdobramento da posse, na medida em que o credor recebe a posse direta do bem e o devedor permanece com a posse indireta. Em virtude da boa-fé objetiva (dever de informação), o credor pignoratício tem a obrigação de comunicar ao devedor eventuais tentativas de violação da integridade da coisa, sob pena de violação positiva do contrato. O credor se obriga à restituição da coisa empenhada quando adimplida a dívida garantida pelo penhor, sendo desnecessária a constituição do devedor em mora por via de interpelação (o simples cumprimento da prestação jáimplica em automática obrigação de restituição). 6.1- Características do penhor I. É necessária solenidade (contrato escrito), podendo ser por instrumento particular; II. Exige-se registro no Cartório de Títulos e Documentos (art. 127 da LRP) como condição de eficácia do penhor em relação à terceiros; OBS: se não for registrada, a garantia permanecerá válida mas não poderá produzir efeitos em relação à terceiros. III. Admissibilidade de sub-penhor ou penhor de 2o grau, salvo disposição contrária; IV. Ordinariamente é necessária a tradição da coisa, da qual decorre a possibilidade de colheita de frutos e o direito de retenção pelo credor pignoratício; Direito de retenção: diz respeito ao pagamento das despesas geradas pela coisa. Direito de excussão: diz respeito ao pagamento da dívida (proíbe-se a cláusula comissória). V. Possibilidade de exigir caução na hipótese de perecimento ou deterioração da coisa, sob pena de vencimento antecipado da dívida. 6.2- Espécies de penhor no CC a) Penhor convencional: decorre da vontade das partes e baseia-se na tradição do bem. b) Penhores especiais: constituem exceções à regra do penhor convencional. I. Penhor rural (agrícola ou pecuário): dispensa-se a tradição do bem e o registro se dá no Cartório de Imóveis. O credor pignoratício não detém a posse da coisa mas terá direito de inspeção ou vistoria, desde que não o faça com abuso do direito. Para o penhor agrícola o prazo máximo é de 3 anos, para o penhor pecuário o prazo máximo é de 4 anos, ambos prorrogáveis uma vez. II. Penhor industrial ou mercantil: possui as mesmas peculiaridades do penhor rural. III. Penhor de veículos: exige registro no Detran sob pena de ineficácia em relação a terceiros e a contratação de seguro como condição para o registro. Tem prazo máximo de 2 anos, admitida uma prorrogação. Se o devedor alienar o veículo ocorrerá vencimento antecipado da dívida. IV. Penhor de direitos (títulos de crédito): o penhor pode ter como objeto bens incorpóreos, como o crédito. Assim, sob o ponto de vista prático, o penhor de direitos é caução de TC. c) Penhor legal ou forçado: I. Os hospedeiros sobre os bens móveis dos hóspedes. II. O dono do prédio sobre os bens móveis do rendeiro ou locatário. III. Artistas e auxiliares cênicos sobre o material da peça teatral (Lei 6.533/78). IV. Locador industrial sobre máquinas e aparelhos da indústria (DL 4.191/42). Nestas hipóteses, o credor terá a prerrogativa de apossar-se de bens do devedor, independentemente de seu assentimento, com a finalidade de constituir direito de garantia até o pagamento do débito. É uma legítima forma de autotutela. Por consistir em ato unilateral, a excepcional medida de urgência necessariamente será seguida de imediato acesso ao Judiciário, mediante pleito de homologação de penhor legal, hábil a formalizar o penhor em processo de jurisdição voluntária. Trata-se de verdadeiro ato complexo, em que o direito real de garantia será resultado da aquisição privada da posse, acrescida da homologação judicial que ratifica a conduta. A constituição do penhor legal poderá ser evitada, se o locatário oferecer caução idônea. Em qualquer caso, bens impenhoráveis não são aptos a ser objeto de penhor legal. OBS: para uma importante parte da doutrina o art. 1.467, II do CC deve ser considerado inconstitucional por ofensa aos direitos fundamentais de consumidores (direito de não sofrer nenhum tipo de constrangimento na cobrança de dívidas), haja vista a costumeira conduta arbitraria de fornecedores de serviços hoteleiros, arbitrando preços com exclusividade, procederem a utilização do penhor legal como técnica de cobrança de dívidas. 7- Hipoteca É direito real de garantia sobre bens imóveis ou sobre aeronaves e navios (exceção). O direito de uso especial para fins de moradia e a propriedade superficiária também podem ser hipotecados. Não se exige a transferência do bem, na medida em que o interesse do credor hipotecário estará assegurado pelo registro. Se a coisa vier a perder valor, em virtude de negligencia do proprietário em sua conservação, dar-se-á o vencimento antecipado da dívida se, depois de intimado, o devedor não reforçar ou substituir a garantia. A constituição de uma hipoteca não retira do devedor o real aproveitamento do bem. Assim, é nula a cláusula que impede a alienação do bem hipotecado (o devedor tem livre disposição). Exceção: a Lei 8.004/90 estabelece a possibilidade de proibição de alienação nas hipotecas do SFH, sendo que o STJ entendeu que esta lei afasta a regra geral, ainda que anterior ao CC/02, sendo válida tal cláusula nessas circunstâncias. Por outro lado, nada impede estipulações de direito obrigacional, como cláusula que define o vencimento antecipado da dívida, na hipótese de alienação ou constituição de sub-hipoteca. O bem de família convencional gera impenhorabilidade e inalienabilidade, portanto não pode ser hipotecado. Já o bem de família legal gera apenas impenhorabilidade, podendo ser hipotecado – mas apenas se a dívida contraída reverteu em proveito do núcleo familiar (entendimento do STJ). As pertenças não estão abrangidas pela hipoteca, justamente por não serem consideradas bens acessórios. No direito brasileiro toda hipoteca é indivisível, ou seja, independentemente do valor já pago da dívida, a hipoteca somente se extingue com o adimplemento integral. Assim, a remissão/remição somente extinguirá a hipoteca quando for total. É necessária a vênia conjugal para a constituição da hipoteca, salvo se o casamento for no regime de separação convencional de bens ou em se tratando de aeronaves e navios. O mesmo requisito não existe na união estável, de acordo com o entendimento majoritário. Consistindo a hipoteca em título executivo extrajudicial, em caso de inadimplemento, inicia-se o processo de execução, penhorando-se o bem com consequente desapossamento do devedor. O STJ já entendeu que é nula a penhora se não houve citação do proprietário do bem hipotecado em garantia de dívida alheia. 7.1- Espécies a) Hipoteca convencional: o devedor oferece voluntariamente o bem para assegurar o pagamento da dívida. A hipoteca convencional terá duração máxima de 30 anos, sendo vedada a instituição do ônus real por prazo superior ao da própria obrigação (pode ser inferior). Superado o prazo trintenário de vigência do registro da hipoteca, surge o fenômeno da usucapião de liberdade, extinguindo-se o direito real. b) Hipoteca judicial: tem índole processual (art. 466 do CPC) e decorre de sentença condenatória, sendo determinada pelo juiz como forma de garantir o cumprimento de uma obrigação em prestações periódicas. Enquanto efeito secundário da sentença, a hipoteca judicial dispensa requerimento da parte (o único pressuposto é a publicação da sentença), e independe da existência de recurso ou de qualquer outro requisito. A especialização terá a função de identificar o bem, já o registro propiciará eficácia do ato contra terceiros. Não se pode cogitar de preferencia sobre os bens do devedor, em virtude de um débito comum, justamente pelo fato de a hipoteca judicial não ser um direito real. c) Hipoteca legal: é uma proteção diferenciada para determinados credores. É taxativamente restrita às 5 hipóteses do art. 1.489 do CC, quais sejam: I. Os bens dos servidores públicos do Fisco. II. Os bens dos pais de filhos menores que casam novamente sem realizar a partilha do leito anterior. III. Os imóveis do delinquente em relação ao ofendido e seus herdeiros, para a satisfação do dano e pagamento das custas processuais. IV. Tutela-se o herdeiro em relação ao coerdeiro reponente que adjudicou isoladamente um imóvel indivisível na partilha e comprometeu-se a devolver a diferença em pecúnia (art. 2.019). V. Incide sobre o bem arrematado em hasta pública por terceiros, como forma de garantir ao credor-exequente que o arrematante lhe pagará o preço pelo qual se propôs a adquirir os bens em hasta. 8- Alienação fiduciária em garantia A alienação fiduciária é um direito real de garantia, mas não é tão antigo/clássico como a hipoteca,o penhor e a anticrese. Por outro lado, a AFG é um direito moderno e muito utilizado pelo mercado na atualidade, apesar das suas controvérsias jurídicas. A AFG é muito usada na aquisição de automóveis e máquinas, semelhante ao leasing e à venda com reserva de domínio. Só que a AFG tem mais vantagens para o credor, por isso é a preferida do mercado, através de contratos de adesão. Conceito: AFG é um contrato pelo qual o devedor fiduciante transfere ao credor fiduciário a propriedade resolúvel de um bem móvel para garantir o pagamento da dívida contraída, com a condição de, ao ser liquidada a dívida, o devedor recuperar a propriedade plena do bem transferido (1361). Exemplo: José precisa comprar um carro mas não tem dinheiro. Procura então um banco que empresta o dinheiro, José assim vai na loja, compra o carro e transfere a posse indireta e a propriedade resolúvel do carro para o banco, enquanto José fica com a posse direta (§ 2o do 1361). O dono do carro é o banco, mas a propriedade é resolúvel, ou seja, a propriedade do banco será resolvida/extinta quando José pagar todas as prestações. A propriedade só se transfere ao credor para fins de garantia. Com o implemento da condição, qual seja, o pagamento da dívida, o domínio do credor se resolve. Durante os meses/anos de pagamento José pode usar o carro, pois tem sua posse direta. Mas se José não pagar as prestações, o banco vai tomar o carro, afinal o carro é de propriedade do credor. Ficção jurídica: esta aquisição que o consumidor faz e transfere para o credor é mera ficção jurídica, não ocorre na prática. Na verdade, nas lojas de automóveis já existem financeiras (ex: Banco Fiat, Banco GM), de modo que esta operação é muito simples, basta a pessoa ter crédito, ou seja, ter nome limpo na praça e um bom contracheque para adquirir a prazo, mediante AFG. Natureza jurídica: é controvertida. Trata-se de direito real de garantia, só que a garantia é na coisa própria, e não na coisa alheia/do devedor, como os demais direitos reais de garantia. O banco se torna o proprietário resolúvel da coisa. Apesar de estarmos estudando os jura in re aliena (direitos na coisa alheia), a AFG é um direito real na coisa própria. Mas esta não é a única controvérsia, pois a AFG desenvolveu-se no país no final da década de 60, quando estávamos no auge do regime militar. Foi publicado em 1969 o Decreto Lei 911, hoje incorporado pelo novo CC, cuja redação agradou os bancos e foi alvo de críticas pela doutrina, por favorecer demais o credor. Mas é o que eu digo a vocês, proteger o devedor é desestimular o credor a emprestar, e sem crédito a economia não funciona. Características: I. É negócio jurídico autônomo/principal, não é acessório, a AFG existe por si só. II. O credor é proprietário, mas independentemente de tradição, pois a coisa é entregue ao devedor (exceção ao 1267). III. O contrato de AFG é formal/solene via instrumento particular (1362 e § 1o do 1361); não exige escritura pública mas também não pode ser verbal. IV. O devedor não pode alienar a coisa a terceiros, pois é mero possuidor, já o banco pode vender sua propriedade resolúvel, sem alterar as condições para o consumidor. Antigamente, se o devedor alienasse a coisa era preso como depositário infiel. Objeto: a AFG do Código Civil se aplica a bens MÓVEIS infungíveis quando o credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica (sem ser banco) (ex: carros, máquinas, lanchas, etc.). A AFG para IMÓVEIS é regulada pela lei 9.514/97. A AFG para MÓVEIS fungíveis e infungíveis quando o credor fiduciário for instituição financeira é regulada pela Lei 4.728/65 e pelo Decreto 911/69. Obrigação do credor fiduciário/banco: transferir a propriedade da coisa ao consumidor após o pagamento integral do preço; se o banco não transferir, o consumidor pode exercer a sequela para, através do Juiz, adquirir a propriedade do bem que tem apenas posse. Direitos do credor fiduciário/banco: I. Vender a coisa caso as prestações não sejam pagas (1364 – observem que a lei autoriza até a venda extrajudicial, o que é muito ágil para o banco que não fica com o carro parado, se deteriorando, em pátios pela cidade), sendo vedado o pacto comissório (1365, 1428), mas admitindo-se posterior dação em pagamento mediante acordo (pú do 1365 e pú do 1428). II. Se mesmo vendida a coisa não satisfizer o crédito (ex: o carro está muito estragado), outros bens do devedor serão executados, por isso o devedor deve acompanhar a venda para obter um melhor preço (1366). III. O banco pode também alienar o bem a terceiros, mesmo que as prestações do devedor estejam em dia, embora vá alienar apenas a propriedade resolúvel e a posse indireta. IV. Caso o devedor entre em insolvência (= falência), não há risco para o credor porque o bem não estará sujeito ao concurso dos outros credores do devedor, já que o bem é de propriedade do credor fiduciário. Obrigação do devedor fiduciante/consumidor: pagar as prestações e conservar a coisa, usando-a para o seu devido fim, como depositário que é. Direito do consumidor: adquirir a propriedade da coisa após pagar todas as prestações, podendo reivindicar a coisa de quem a detenha, exercendo sequela. Conclusão: a AFG é juridicamente controvertida, perigosa para o consumidor, mas de grande importância econômica e muito ágil em termos processuais. Trata-se sem dúvida da mais eficiente forma de garantia de proteção ao crédito existente no direito brasileiro. Inf. 550, STJ: é nula a notificação extrajudicial realizada com o fim de constituir em mora o devedor fiduciante de imóvel, quando na referida comunicação constar nome diverso do real credor fiduciário. A notificação em questão produz severas consequências para o devedor, de forma que qualquer vício em seu conteúdo é hábil a tornar nulos seus efeitos, principalmente quando se trata de erro crasso, como há na troca da pessoa notificante. Inf. 552, STJ: Na alienação fiduciária de bem imóvel, é possível que ocorra a purgação da mora mesmo após já ter havido a consolidação da propriedade em nome do credor? Até que momento é possível a purgação? SIM. Mesmo que já consolidada a propriedade do imóvel dado em garantia em nome do credor fiduciário, é possível a purgação da mora. Em verdade, a purgação é admitida até a assinatura do auto de arrematação. Nos contratos de alienação fiduciária de bem imóvel (regido pela Lei 9.514/97) aplica, subsidiariamente, o Decreto-Lei 70/1966, que prevê o seguinte que “é lícito ao devedor, a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, purgar o débito”. AFG de bens móveis sendo o credor instituição financeira O que acontece em caso de inadimplemento do mutuário (em nosso exemplo, José)? Havendo mora por parte do mutuário, o procedimento será o seguinte (regulado pelo DL 911/69): Protesto do título ou notificação do credor: o credor (mutuante) deverá fazer o protesto do título ou a notificação extrajudicial do devedor, por meio do Cartório de Registro de Títulos e Documentos, de que este se encontra em débito, comprovando, assim, a mora. Súmula 72 do STJ: A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente. Obs: a notificação não precisa ser pessoal, bastando que seja entregue no endereço do devedor: Na alienação fiduciária, a mora do devedor deve ser comprovada pelo protesto do título ou pela notificação extrajudicial feita por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos, entregue no endereço do domicílio do devedor, sendo dispensada a sua notificação pessoal. STJ. 3ª Turma. AgRg no AREsp 418.617/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 06/02/2014. Ajuizamento da ação: após comprovar a mora, o mutuante (Banco “X”) poderá ingressar com uma ação de busca e apreensão requerendo que lhe seja entregue o bem (art. 3º do DL 911/69). Essa busca e apreensão prevista no DL 911/69 é uma ação especial autônoma e independente de qualquer procedimento posterior. Concessão da liminar: o juiz concederá a busca e apreensão de forma liminar (sem ouvir o devedor), desde que comprovada a mora ou o inadimplemento dodevedor (art. 3º do DL 911/69). Apreensão do bem: o bem é apreendido e entregue ao credor. Possibilidade de pagamento integral da dívida: no prazo de 5 dias após o cumprimento da liminar (apreensão do bem), o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus (§ 2º do art. 3º do DL 911/69). Veja o dispositivo legal: Art. 3º (...) § 1º Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária. (Redação dada pela Lei 10.931/2004) § 2º No prazo do § 1º, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus. (Redação dada pela Lei 10.931/2004) O que se entende por “integralidade da dívida pendente”? Para que o devedor consiga ter de volta o bem, ele deverá pagar todo o valor do financiamento ou somente as parcelas já vencidas e não pagas (purgação da mora)? Ex: José financiou o veículo em 60 parcelas. A partir da 21ª prestação, ele começou a não mais pagar. Estão vencidas 5 parcelas. Para ter de volta o bem, ele terá que pagar somente as 5 parcelas vencidas (purgação da mora) ou todo o financiamento restante (40 parcelas)? Todo o débito. Segundo decidiu o STJ, a Lei n. 10.931/2004, que alterou o DL 911/69, não mais faculta ao devedor a possibilidade de purgação de mora, ou seja, não mais permite que ele pague somente as prestações vencidas. Para que o devedor fiduciante consiga ter o bem de volta, ele terá que pagar a integralidade da dívida, ou seja, tanto as parcelas vencidas e vincendas (mais os encargos), no prazo de 5 dias após a execução da liminar. Em nosso exemplo, Antônio terá que pagar, em 5 dias, as 40 parcelas restantes. O devedor purga a mora quando ele oferece ao credor as prestações que estão vencidas e mais o valor dos prejuízos que este sofreu (art. 401, I, do CC). Nesse caso, purgando a mora, o devedor consegue evitar as consequências do inadimplemento. Ocorre que na alienação fiduciária em garantia, a Lei n. 10.931/2004 passou a não mais permitir a purgação da mora. Vale ressaltar que o tema foi decidido em sede de recurso repetitivo, tendo o STJ firmado a seguinte conclusão, que será aplicada em todos os processos semelhantes: Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. Nos contratos anteriores à vigência da Lei n. 10.931/2004, é permitida a purgação da mora? SIM. Antes da Lei n. 10.931/2004 era permitida a purgação da mora, desde que o devedor já tivesse pago no mínimo 40% do valor financiado. Tal entendimento estava, inclusive, consagrado em um enunciado do STJ: Súmula 284-STJ: A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A súmula 284-STJ ainda é válida? Para contratos anteriores à Lei 10.931/2004: SIM. Para contratos posteriores à Lei 10.931/2004: NÃO. Contestação: no prazo de 15 dias após o cumprimento da liminar (apreensão do bem), o devedor fiduciante apresentará resposta (uma espécie de contestação). Obs1: a resposta poderá ser apresentada, ainda que o devedor tenha decidido pagar a integralidade da dívida, caso entenda ter havido pagamento a maior e deseje a restituição. Obs2: nesta defesa apresentada pelo devedor, é possível que ele invoque a ilegalidade das cláusulas contratuais (ex: juros remuneratórios abusivos). Se ficar provado que o contrato era abusivo, isso justificaria o inadimplemento e descaracterizaria a mora. Sentença: da sentença proferida, cabe apelação apenas no efeito devolutivo. 9- Enfiteuse, aforamento ou aprazamento A enfiteuse tem origem antiquíssima e cumpriu a função de “povoar” lugares ermos, mas traz consigo o inconveniente da transmissão integral de todos os poderes do domínio. Assim, a enfiteuse é a transmissão integral de todos os poderes que compõem o domínio, em sua plenitude, para um terceiro (enfiteuta ou foreiro), sob contraprestação anual (foro, pensão ou canon), certa e invariável. Por outro lado, o proprietário (senhorio) mantém o título e, em consequência, o domínio direto do bem, embora sem poderes. O STJ já decidiu que a responsabilidade fiscal em relação aos tributos que decorrem da titularidade (IPTU e ITR) ficarão a cargo do enfiteuta, embora este não tenha o título. A dificuldade conceitual do instituto e a divergência com a função social da propriedade fizeram com que o CC/02 impossibilitasse a constituição de novas enfiteuses e subenfiteuses, embora tenha mantido as já existentes, que permanecem reguladas pelo CC/1916 e leis extravagantes. OBS: achando-se um tesouro no terreno enfiteutico ele será dividido por igual entre o descobridor e o enfiteuta (única regra sobre enfiteuse no CC/02). No Brasil a enfiteuse mais comum é a que diz respeito a terras públicas e terrenos de marinha, que tem uma sistemática própria estudada no direito administrativo (DL 9.760/46, Lei 9.636/98 e DL 2.398/87). Tais enfiteuses continuam podendo ser instituídas livremente, por motivos de interesse público, sendo ainda possível a cobrança do laudêmio. Se o enfiteuta parar de pagar o foro por 3 anos consecutivos estará caracterizado o comisso, extinguindo-se a enfiteuse. Súmula 169, STF: depende de sentença a aplicação da pena de comisso. Súmula 122, STF: até a prolação da sentença o enfiteuta pode purgar a mora e evitar o comisso. De acordo com o CC/1916, além do foro o enfiteuta deve pagar o laudêmio, que é um percentual de no mínimo 2,5% sobre as alienações onerosas ou dações em pagamento. O CC/02, por sua vez, impôs a proibição da cobrança do laudêmio e prestações análogas, intencionando exortar o senhorio a exercer o direito de preferência e a consequente facilitação da extinção da enfiteuse. Objeto da enfiteuse: diz respeito apenas a terras incultivas e terrenos para edificação. Todo enfiteuta tem direito potestativo ao resgate, que é a possibilidade de adquirir o título (única coisa que lhe falta) após no mínimo 10 anos de aforamento, mediante o pagamento de um número de pensões correspondente ao número de posse (visto que não é mais possível o pagamento do laudêmio). A enfiteuse adere à coisa e é perpétua, de modo que pode ser transmitida por meio de sucessão causa mortis. Exceção: a morte do enfiteuta que não deixa sucessores extingue a enfiteuse. Há possibilidade de o usucapião gerar a aquisição de outros direitos reais que não a propriedade. Assim, enfiteuses em terras privadas ou mesmo públicas podem ser adquiridas por usucapião. 10- Servidões Constituem direito real na coisa alheia entre prédios, vinculando um prédio dominante à obtenção de uma vantagem que, originariamente, não possuía, em relação à um prédio dominado (serviente), de titulares distintos. As servidões são extintas pelo cancelamento do registro, ordinariamente, podendo ocorrer também pela desapropriação do imóvel, pelo perecimento da cosia, ou pelo não-uso por 10 anos consecutivos (o ônus de prova será do interessado). A usucapião do imóvel serviente, por ser modo originário aquisitivo da propriedade, também acarreta a extinção da servidão, sem que para tanto se solicite o cancelamento no registro imobiliário. Passagem forçada Servidão Decorre de lei e é direito de vizinhança. Decorre da vontade das partes e é direito real nacontato físico com a coisa, mas o ordenamento lhe retira a qualidade de possuidor. É a situação denominada de mera detenção. I. Fâmulo ou gestor da posse (art. 1198): é aquele que apreende a coisa por força de uma relação subordinativa com um terceiro (em nome deste). O detentor é obrigado a nomear à autoria o legítimo possuidor ou proprietário, sob pena de perdas e danos. II. Ato de mera tolerância ou permissão (art. 1208): o ato de mera tolerância ou permissão não induz posse. III. Permissão de uso de bem público: também gera mera detenção, mas apenas em relação ao Poder Público. Em diversas decisões, o STJ não reconhece a posse sobre bens públicos, de qualquer natureza*. IV. A prática de atos de violência ou clandestinidade: não autorizam a aquisição da posse, senão depois de cessada a violência ou clandestinidade. Trata-se da detenção independente ou autônoma, que pode dar ensejo, excepcionalmente, à proteção por meio dos interditos, sempre que os detentores se defrontassem não contra quem lhes houvessem praticado o esbulho, porém contra terceiros. OBS: pode acontecer de uma detenção se converter em posse, transmudando a sua natureza, através do desdobramento da posse direta precária em posse violenta. Deve haver, portanto, uma alteração da natureza da relação jurídica da posse. Inf. 579, STJ* (superação do entendimento?): É cabível o ajuizamento de ações possessórias por parte de invasor de terra pública contra outros particulares. A ocupação de área pública, sem autorização expressa e legítima do titular do domínio, não pode ser confundida com a mera detenção. Aquele que invade terras e nela constrói sua moradia jamais exercerá a posse em nome alheio. Não há entre ele e o proprietário uma relação de dependência ou subordinação. Ainda que a posse não possa ser oposta ao ente público, senhor da propriedade do bem, ela pode ser oposta contra outros particulares, tornando admissíveis as ações possessórias entre invasores. STJ. 3a Turma. REsp 1.484.304-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 10/3/2016 2- Objeto da posse A partir da teoria objetiva da posse conclui-se que o objeto da posse só pode ser bens corpóreos/materiais, já que os bens incorpóreos não são suscetíveis de apreensão. Dois efeitos decorrem do objeto da posse: a inadmissibilidade de uso dos interditos possessórios para a defesa dos bens incorpóreos (súm. 228 do STJ) e a impossibilidade de usucapião de bens incorpóreos*. Súmula 193, STJ: o direito de uso de linha telefônica pode ser adquirido por usucapião (exceção*). OBS: a defesa dos bens incorpóreos se dará por tutela específica ou perdas e danos. 3- A composse Para a existência da composse exige-se dois requisitos: a pluralidade de sujeitos e a indivisibilidade do objeto. No CC a composse gera duas consequências: cada copossuidor exerce seu direito de posse sobre o todo, independentemente de sua fração ideal; e cada copossuidor pode defender o todo, independentemente de sua fração ideal. Contudo, o STJ vem admitindo usucapião em composse quando um dos copossuidores estabelecer posse com exclusividade, alijando os demais. O art. 10 do CPC reconhece outro efeito jurídico para a composse, qual seja: Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários. § 1o ... § 2o Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de ato por ambos praticados. Neste caso, a necessidade de participação do cônjuge não decorre desta condição, mas sim da composse em si considerada. OBS: recentemente, uma alteração no próprio CC permite a composse em usucapião em uma hipótese – usucapião conjugal. Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. 4- A função social da posse Não há menção expressa à função social da posse nem na CF nem no CC, ao contrário do que se deu com a função social da propriedade. Contudo, Miguel Reale, na exposição de motivos do CC/02, estabelece que o Código acatou a função social da posse implicitamente. De fato, o CC/2002 é dirigido pela socialidade, eticidade e operabilidade. A posse será merecedora de tutela se (e somente se) exercida com observância dos valores constitucionais. Extrai-se, desse modo, aspecto dinâmico da posse, cujo conteúdo nEnunciado 240 do Conselho da JF: stacao o de dom com observancia fod ão é fixado apenas pela emanação dos poderes próprios de domínio, mas depende também de centros de interesse extraproprietários que justificam e legitimam a relação possessória. O direito à moradia, como dimensão fundamental da existência humana, transcende a ideia de prestação estatal ou particular e também não se restringe a uma função de defesa. A função social da posse ou teoria sociológica da posse é um sucedâneo da teoria sociológica da propriedade, de modo que, se o proprietário não cumprir a função social e alguém o fizer em seu lugar, desloca-se a proteção. Ex.: p. ún. dos arts. 1238 e 1242 (redução em 5 anos do prazo de usucapião). Art. 1238, parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Art. 1242, parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico. Outro exemplo da função social da posse é a impossibilidade de se discutir propriedade em sede de ação possessória, portanto, esta ação será julgada em favor do melhor possuidor, pouco interessando quem seja o proprietário (art. 1210, p. 2o – proibição de exceptio proprietatis). Ademais, o melhor possuidor é quem melhor cumpre a função social da posse. Súmula 487, STF: permitia a discussão de propriedade em sede de ação possessória quando ambas as posses estivessem baseadas na propriedade. Para Diddier este entendimento ainda se mantem, com base nos princípios de celeridade e economia processual. No entanto, a posição majoritária é no sentido de que, após o CC/02, esta exceção disposta na súmula 487 não mais se aplica, em virtude da não recepção de qualquer hipótese de exceção de propriedade. O melhor exemplo de função social da posse, entretanto, é a desapropriação judicial indireta (art. 1.228, p. 4o): Art. 1228, § 4o . O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores. Enunciado 308 da Jornada: a justa indenização do dispositivo antecedente somente deverá ser suportada pela ADM Pública no contexto das políticas públicas de reforma urbana ou agrária, em se tratando de possuidores de baixa renda e desde que tenha havido intervenção daquela nos termos da lei processual (União na zona rural e Município na zona urbana). Não sendo os possuidores de baixa renda, a indenização deverá ser paga pelos próprios possuidores interessados (aquisição compulsória onerosa). Enunciado 240 do Conselho da JF: esta justa indenização não temcoisa alheia. Garante acesso à via pública. Gera utilidade para a coisa. É sempre onerosa. Pode ser gratuita ou onerosa. OBS: a servidão do CC não se confunde com a servidão administrativa, nesta só há um prédio serviente, e a coisa dominante não é um imóvel, mas sim uma utilidade pública. 10.1- Características das servidões I. Estabelece um gravame de um prédio em favor de outro; II. Prédios pertencentes a titulares diversos, pois se pertencerem a um mesmo titular haverá mera serventia (figura de direito obrigacional); III. A vantagem é estabelecida em favor da coisa, e não do proprietário; IV. Perpetuidade; V. Não presunção. OBS: as servidões podem ser constituídas por negócios jurídicos unilaterais (p. ex. testamento), contrato ou decisão judicial (p. ex. usucapião). 10.2- Tutela processual Ação confessória: tem o objetivo de reconhecer a existência da servidão. Ação negatória: tem o objetivo de reconhecer a inexistência da servidão. Podem ser usadas ainda ações possessórias. 10.3- Classificação a) Quanto à intervenção humana: Servidões contínuas: consumadas as obras que lhe servem de pressupostos, dispensam a intervenção humana para a sua concretização. Ex.: escoamento e passagem de água. Servidões descontínuas: só se aperfeiçoam pela intervenção do homem. Ex.: servidão de passagem. b) Quanto à visualização por obras externas: Servidões aparentes: haverá posse e possibilidade de usucapião. OBS: de acordo com o Enunciado 251 do CJF, o prazo máximo para a usucapião extraordinário de servidões deve ser de 15 anos, em conformidade com o sistema geral de usucapião previsto no CC (essa interpretação decorre do princípio da operabilidade, vez que o CC manteve o prazo vintenário para a usucapião de servidão sem justo título). Servidões não aparentes: não há possibilidade de posse e usucapião. Súmula 415, STF: servidão de transito não titulada, mas tornada permanente pela natureza das obras realizadas, considera-se aparente, gerando proteção possessória. 11- Direito real de superfície Criado em Portugal e desenvolvido na Europa, o direito real de superfície tem visível conexão com a função social da propriedade, pois tem o intuito de garantir a finalidade social de um imóvel através da utilização da superfície. Foi primeiramente previsto pelo art. 21 do Estatuto da Cidade e depois foi generalizado pelo art. 1.369 do CC. Art. 21 do Estatuto da Cidade Art. 1.369 do CC Direito de superfície em área urbana; Prazo determinado ou indeterminado; Gratuito ou oneroso; Direito de superfície abrange subsolo e espaço aéreo. OBS: somente neste caso haverá direito de sobrelevação ou lage. Direito de superfície em área urbana ou rural; Sempre tem prazo determinado; Gratuito ou oneroso; Direito de superfície se restringe ao solo. O direito real de superfície consiste em dar a posse do bem a um 3o para construir ou plantar, sendo que este deverá posteriormente restituir a coisa. 12- Usufruto É o direito real na coisa alheia pelo qual se transfere a um terceiro o uso, a fruição, a posse e a administração de um bem. Assim, o 3o passa a ter o domínio útil da coisa, enquanto o proprietário passa a ter a chamada propriedade nua (porque desprovida dos seus poderes mais visíveis). Assim, o conteúdo do domínio é fracionado, pois, enquanto o usufrutuário percebe os frutos naturais, industriais e civis e retira proveito econômico da coisa, remanesce em poder do nu-proprietário a substancia do direito, vale dizer, a faculdade de disposição da coisa e o seu próprio valor, podendo alienar, instituir ônus real ou dar qualquer outra forma de disposição ao objeto, apesar de despido de importantes atributos. Como contrapartida ao aproveitamento do bem e às faculdades que lhe são concedidas, zelará o usufrutuário pela manutenção da integridade da coisa, em sua destinação econômica originária. O usufruto tem 3 grandes características: temporariedade, simultaneidade e pessoalidade. Tem conteúdo intuitu personae (direito real intransmissível), pois a única finalidade do instituto é beneficiar pessoas determinadas, ainda que jurídicas. O usufruto, em regra, dura até a morte do usufrutuário (caráter vitalício), salvo se for em favor de PJ, quando tem o prazo máximo de 30 anos. Eventual alteração na pessoa do nu-proprietário não impactará na continuação do exercício do direito real pelo usufrutuário. O objeto do usufruto deve ser sempre um bem frugível (que produza frutos) e infungível (pois há necessidade de restituição). Pode atingir bens móveis ou imóveis, corpóreos ou incorpóreos (inclusive um outro direito real ou um crédito), ou mesmo uma universalidade de bens. O indispensável é que o bem ou direito gravado seja transmissível. Assim, não se admite usufruto constituído sobre bens gravados com cláusula de inalienabilidade, nem sobre bem de família. O usufruto pode ser legal, convencional ou judicial. Nada impede que o atributo onerosidade esteja presente, apesar de ser mais comum a gratuidade. O usufruto pode ser restrito, se da sua constituição restar evidenciada uma limitação ao proveito da coisa por parte de quem instituiu o direito real. OBS: é responsabilidade do usufrutuário o pagamento de despesas incidentes sobre o imóvel, inclusive os impostos. Quanto às despesas condominiais, por se tratar de obrigação propter rem, serão responsáveis solidariamente perante o condomínio o usufrutuário e o nu-proprietário, sendo que este poderá questionar, em sede própria, o ressarcimento do que eventualmente pagar perante o usufrutuário. Não há necessidade de recorrer ao Poder Judiciário para averbar a extinção do ônus no registro competente, nos casos de morte, renúncia e advento do termo. Enunciado 252 do CJF: a extinção do usufruto pelo não-uso, de que trata o art. 1.410, VIII, independe do prazo decadencial previsto no art. 1.389, III, operando-se imediatamente. Tem-se por desatendida, nesse caso, a função social do instituto. Inf. STJ: a nua propriedade é suscetível de constrição judicial/penhora, salvo se o imóvel do executado for considerado bem de família. 13- Uso A distinção entre usufruto e direito real de uso repousa na impossibilidade de o titular deste gozar do objeto de seu direito. O usuário pode usar o bem móvel ou imóvel, inclusive perceber os frutos naturais da coisa, que atendam às necessidades de subsistência da sua família, sendo-lhe, todavia, interditada a sua fruição, assim entendida como a percepção de frutos civis ou industriais. Assim o direito real de uso é um usufruto em miniatura, sendo ainda mais personalíssimo que aquele, posto que não caberá qualquer forma de aproveitamento econômico por terceira pessoa, como na locação e comodato (o que é possível para o usufrutuário). Não existe o uso legal ou o uso judicial, pois o direito de uso é apenas constituído pela autonomia privada, inter vivos ou causa mortis. Também não é possível a constituição de direito real de uso em prol de PJ, mas apenas em favor da entidade familiar. 14- Habitação No campo dos direitos reais de fruição, a menor amplitude quantitativa concerne ao direito real de habitação. É uma espécie do gênero direito de uso: cuida-se de direito real de uso limitado à habitação, pois, além de incessível, não admite qualquer forma de fruição. Constitui-se inter vivos com o registro no ofício imobiliário, causa mortis (por testamento), por usucapião ou pela via legal. Permite-se o exercício da atividade comercial, desde que a finalidade precípua do imóvel seja a habitação do favorecido, sozinho ou com a sua entidade familiar. Ao contrário do usufruto e do direito de uso, que recaem indistintamente sobre móveis e imóveis, o direito de habitação tem como objeto exclusivo o BEM IMÓVEL DE FINS RESIDENCIAIS. Com o direito real de habitação, embora partilhado o imóvel entre os herdeiros, o cônjuge reserva para si o direito gratuito de moradia, independentemente da existência de testamento em seu favor. Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba naherança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar. OBS: a Lei 10.050/2000 havia estendido o direito real de habitação ao filho portador de deficiência, impossibilitado para o trabalho (art. 1.611, p. 3o do CC/1916). Apesar de o CC/2002 não corroborar esta previsão humanitária, acreditamos, pelo princípio da proibição do retrocesso social, que ainda é possível aquela previsão, pois os direitos fundamentais incorporados ao Estado Democrático de Direito não podem ser simplesmente extirpados do sistema. Inf. 533, STJ: a companheira sobrevivente faz jus ao direito real de habitação (art. 1.831 do CC) sobre o imóvel no qual convivia com o companheiro falecido, ainda que tenha adquirido outro imóvel residencial com o dinheiro recebido do seguro de vida do de cujus. Enunciado 117 da I Jornada de Direito Civil: o direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja por não ter sido revogada a previsão da Lei 9.278, seja em razão da interpretação analógica do artigo 1.831, informado pelo artigo 6º, caput, da Constituição de 88. Inf. 543, STJ: ainda que o companheiro supérstite não tenha buscado em ação própria o reconhecimento da união estável antes do falecimento, é admissível que invoque o direito real de habitação em ação possessória, a fim de ser mantido na posse do imóvel em que residia com o falecido. OBS: pode-se invocar o direito real de habitação em ação de manutenção de posse. 15- Concessão de uso especial para fins de moradia É um contrato de direito público pelo qual o Estado outorga a alguém o direito de uso de um bem público, tendo como finalidade única a moradia. Trata-se de verdadeiro direito subjetivo do particular, sendo que o título de uso poderá ser obtido tanto pela via administrativa quanto pela via judicial, sempre que cumprido o suporte fático necessário para a constituição do direito real sobre coisa alheia. A concessão de uso especial pode ser objeto de hipoteca. A MP 2.220/2001 dispõe que: Art. 1o Aquele que, ATÉ 30 DE JUNHO DE 2001, possuiu como seu, por CINCO ANOS, ininterruptamente e sem oposição, ATÉ DUZENTOS E CINQUENTA metros quadrados de IMÓVEL PÚBLICO SITUADO EM ÁREA URBANA, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. § 1o A concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma GRATUITA ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo concessionário mais de uma vez. § 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, na posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão. Art. 2o Nos imóveis de que trata o art. 1o, com MAIS DE DUZENTOS E CINQUENTA metros quadrados, que, até 30 de junho de 2001, estavam ocupados por POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por possuidor, a concessão de uso especial para fins de moradia será CONFERIDA DE FORMA COLETIVA, desde que os possuidores não sejam proprietários ou concessionários, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural. § 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. § 2o Na concessão de uso especial de que trata este artigo, será atribuída igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os ocupantes, estabelecendo frações ideais diferenciadas. § 3o A fração ideal atribuída a cada possuidor NÃO PODERÁ SER SUPERIOR A DUZENTOS E CINQUENTA METROS QUADRADOS. Art. 3o Será garantida a opção de exercer os direitos de que tratam os arts. 1o e 2o também aos ocupantes, regularmente inscritos, de imóveis públicos, com até duzentos e cinquenta metros quadrados, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que estejam situados em área urbana, na forma do regulamento. Art. 4o No caso de a ocupação acarretar risco à vida ou à saúde dos ocupantes, o Poder Público garantirá ao possuidor o exercício do direito de que tratam os arts. 1o e 2o em outro local. Art. 5o É facultado ao Poder Público assegurar o exercício do direito de que tratam os arts. 1o e 2o em outro local na hipótese de ocupação de imóvel: I - de uso comum do povo; II - destinado a projeto de urbanização; III - de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental e da proteção dos ecossistemas naturais; IV - reservado à construção de represas e obras congêneres; ou V - situado em via de comunicação. Art. 6o O título de concessão de uso especial para fins de moradia será obtido pela via administrativa perante o órgão competente da Administração Pública ou, em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial. § 1o A Administração Pública terá o PRAZO MÁXIMO DE DOZE MESES para decidir o pedido, contado da data de seu protocolo. § 2o Na hipótese de bem imóvel da União ou dos Estados, o interessado deverá instruir o requerimento de concessão de uso especial para fins de moradia com certidão expedida pelo Poder Público municipal, que ateste a localização do imóvel em área urbana e a sua destinação para moradia do ocupante ou de sua família. § 3o Em caso de ação judicial, a concessão de uso especial para fins de moradia será declarada pelo juiz, mediante sentença. § 4o O título conferido por via administrativa ou por sentença judicial servirá para efeito de registro no cartório de registro de imóveis. Art. 7o O direito de concessão de uso especial para fins de moradia é transferível por ato inter vivos ou causa mortis. Art. 8o O direito à concessão de uso especial para fins de moradia extingue-se no caso de: I - o concessionário dar ao imóvel destinação diversa da moradia para si ou para sua família; ou II - o concessionário adquirir a propriedade ou a concessão de uso de outro imóvel urbano ou rural. Parágrafo único. A extinção de que trata este artigo será averbada no cartório de registro de imóveis, por meio de declaração do Poder Público concedente. Art. 9o É facultado ao Poder Público competente dar AUTORIZAÇÃO DE USO àquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para FINS COMERCIAIS. § 1o A autorização de uso de que trata este artigo será conferida de forma gratuita. § 2o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas. § 3o Aplica-se à autorização de uso prevista no caput deste artigo, no que couber, o disposto nos arts. 4o e 5o desta Medida Provisória. No dia 30/1/2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou a arguição de inconstitucionalidade 0041454-43.2012.8.26.0000, declarando, em consequência, constitucional que o Estado e o Município estejam subordinados às disposições normativas insertas na Medida Provisória 2.220/2001, a qual regulamenta a Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM). Dois destacados aspectos podem ser extraídos deste relevante julgado: o primeiro refere-se à reconhecida importância da intervenção do amicus curiae na qualificação e na democratização do debate processual; o segundo, o reconhecimento da convergência constitucional de um dos mais efetivos instrumentos de regularização fundiária inscritos em nosso ordenamento jurídico atual. A arguição de inconstitucionalidade, suscitada em um processo em que particulares buscavam o reconhecimento do seu direito à Concessão Especial de Uso para fins de Moradia (CUEM) em face do estado de SãoPaulo e o Departamento de Estradas e Rodagens (DER), contou com a participação da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que interveio no feito na qualidade de amicus curiae, termo traduzido como “amigo da corte”, de acordo com a autorização legal inscrita no artigo 482, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil. (...) Diante destas premissas, pode-se concluir que a arguição de inconstitucionalidade 0041454-43.2012.8.26.0000 reforça a imprescindibilidade de institutos democráticos, como o amicus curiae, consagrarem-se perante o modelo processual atual. Estes institutos de matriz democrática proporcionam um debate amplo e aberto acerca de assuntos de alta relevância política e social, o que, em última análise, franqueia maior legitimidade às decisões oriundas do Poder Judiciário, principalmente quando a intervenção judicial refere-se ao controle de atos emanados do Poder Legislativo e do Poder Executivo. Dada a relevância do instituto, o Tribunal de Justiça revisitou a matéria da constitucionalidade da CUEM que tinha sido anteriormente objeto de discussão no Órgão Especial. O Regimento Interno do Tribunal somente permite um novo julgamento de incidente de inconstitucionalidade quando presente motivo relevante (artigo 191 do RITJ/SP). E, no caso, o motivo relevante foi exatamente a participação da Defensoria Pública como amicus curiae. Vale apenas observar que não só rediscutiu-se a matéria, como houve uma modificação substancial do entendimento outrora manifestado. Consoante às razões de decidir, após o reconhecimento da importância da força dos precedentes em nosso sistema processual, concluiu-se que o instituto não é absoluto, diante da reconhecida oscilação da dinâmica social e da impossibilidade de encobrirem-se decisões injustas. Assim, após o amplo debate, o Tribunal de Justiça de São Paulo, por ampla maioria, entendeu pela constitucionalidade das disposições normativas previstas na Medida Provisória 2.220/2001 que estavam sendo questionadas pela Fazenda Pública Estadual. Neste sentido, afastou a tese de que a União, ao legislar sobre a concessão de uso especial para fins de moradia e instituí-la sobre os bens públicos de outros entes federados, Estado e Município, extrapolou seus poderes, transgredindo os artigos 24, inciso I, e 182, ambos da Constituição Federal. Utilizando-se da argumentação exposta em memoriais apresentados pela Defensoria Pública, o órgão julgador, por meio do voto condutor do desembargador Renato Nalini, afastou qualquer argumentação que pudesse infirmar a compatibilidade com as normas constitucionais deste importante instrumento de regularização fundiária: “Do ponto de vista formal, não há qualquer incompatibilidade com a Constituição. Adoto, nesse sentido, os argumentos trazidos pela combativa Defensoria Pública de São Paulo em seus memoriais: ‘os parâmetros gerais insertos na Medida Provisória em discussão visam apenas a regulamentar um instituto com previsão constitucional e, portanto, necessariamente, devem ser observados por todos os entes da federação. Neste sentido, as diretrizes gerais traçadas por diplomas de natureza de lei nacional prestam-se a garantir a isonomia de uma política pública, evitando-se que cada ente da federação prescreva requisitos diferenciados para a obtenção do referido instituto. O mesmo acontece com outros direitos sociais, a exemplo do direito à prestação à saúde, em que a competência legislativa também se caracteriza por ser concorrente aos entes federativos (artigo 24, inciso XII, CF). O direito à saúde é regulamentado pela Lei 8.080/1990 (Lei do SUS). Neste diploma legal são traçadas diretrizes gerais de uma política pública nacional, vinculando o estado e o município a deveres de assistência terapêutica, o que, em linha de consequência, exigem ônus financeiro do orçamento do respeito ente federativo. No mesmo sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/1996) também acarreta diretamente em ônus aos estados e municípios, o que não a torna constitucional.' Assim, reconheceu-se que a Medida Provisória 2.220/2001 não tem o escopo de dispor de bens municipais e estaduais específicos. Ao contrário, traça apenas requisitos gerais que, se cumpridos, ensejam o direito subjetivo à concessão especial de uso para fins de moradia. Com efeito, os parâmetros gerais insertos na Medida Provisória em discussão visam a regulamentar um instituto com previsão constitucional e, portanto, devem ser observados por todos os entes da federação. Neste sentido, as diretrizes gerais traçadas por diplomas de natureza de lei nacional prestam-se a garantir a isonomia de uma política pública, evitando-se que cada ente da federação prescreva requisitos diferenciados para a obtenção do título relacionado ao instituto. Caso isso fosse possível, haveria patente afronta ao princípio da isonomia (artigo 5º, CF/88), pois seria dado tratamento jurídico diverso a indivíduos inseridos no mesmo contexto fático, violando-se os parâmetros gerais de institutos aplicáveis à política habitacional. Portanto, estados e municípios, embora entes autônomos que compõem a federação, devem observância estrita aos requisitos gerais estabelecidos na Medida Provisória, diploma normativo que regulamenta a concessão de uso especial para fins de moradia, dando fiel cumprimento a um dos principais instrumentos que visa a dar efetividade ao direito constitucional de moradia, nas hipóteses de ocupação prolongada da propriedade pública. Na mesma linha da política habitacional nacional, tem-se a usucapião constitucional urbano, com requisitos traçados no artigo 183, caput, da Constituição Federal. Neste caso, as normas constitucionais delineiam os parâmetros gerais de uma política pública de âmbito nacional. Visando ao resguardo do princípio da igualdade e da função social da propriedade, a Medida Provisória 2.220/2001 traça os mesmos requisitos exigidos pela usucapião constitucional. O escopo é dar tratamento isonômico aos instrumentos de política habitacional destinada aos moradores de baixa renda que estabelecem moradia em área particular ou em território público. Deve-se ainda ressaltar que a concessão de uso especial para fins de moradia está preconizada sobre uma norma constitucional, conforme previsão do parágrafo único do artigo 183 da Constituição Federal. Portanto, a Medida Provisória 2.220/2001 representa apenas o diploma regulamentador de um instituto de status constitucional. Sendo assim, impende-se concluir que a Medida Provisória não traz qualquer inovação ao ordenamento jurídico, mas, como outrora mencionado, tem como escopo traçar diretrizes gerais para a construção de uma política habitacional de abrangência nacional que já está contemplada pela normativa constitucional. Postas estas razões, conclui-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo, por intermédio de um processo dialético, crítico e plural, assim como deve ser o modelo do processo de interesse público, inclinou-se a reconhecer a constitucionalidade que o estado e o município estejam subordinados às disposições normativas insertas na Medida Provisória 2.220/2001, diploma que regulamenta a concessão de uso especial para fins de moradia, franqueando eficácia e legitimidade a um dos mais importantes instrumentos para a regularização fundiária em nosso país. Em última análise, o Tribunal de Justiça de São Paulo franqueou justa interpretação, dando ênfase e proteção, assim como manda os vetores constitucionais, aos direitos fundamentais, no caso, a moradia, importante elemento que integra a dignidade humana. 41como critério valorativo, necessariamente, a avaliação técnica lastreada no mercado imobiliário, sendo indevidos os juros compensatórios. Em atenção à função social da posse, o proprietário não poderá reaver o bem, mesmo que persista na condição de seu titular, em razão de não ter recebido o pagamento fixado judicialmente (teoria da supressio, como sanção decorrente do abuso do direito de propriedade). Por outro lado, caso não seja pago o preço fixado e ultrapassado o prazo prescricional para se exigir o crédito correspondente, estará autorizada a expedição de mandado para registro da propriedade em favor dos possuidores (enunciado 311 do CJF). É possível a desapropriação judicial indireta de bem público dominical, por não incidir vedação legal (não se trata de usucapião!). Desapropriação judicial indireta (art. 1228, 4o e 5o do CC) Usucapião especial urbano coletivo (arts. 10 a 12 do Estatuto da Cidade) Extensa área rural ou urbana; Posse de boa-fé por 5 anos; Considerável número de pessoas; Realização de obras e serviços relevantes; Indenização justa; Alegação por meio de ação autônoma ou por meio de exceção substancial; Legitimidade para o requerimento dos próprios copossuidores ou do MP; Impossibilidade de decretação de ofício pelo juiz. Área urbana superior a 250 m2; Posse de boa ou má-fé por 5 anos; Somente para população de baixa renda (direito civil dos pobres); Somente para fins de moradia; Não há indenização; Alegação por meio de ação autônoma ou por meio de exceção substancial*; Legitimidade para o requerimento dos copossuidores ou da associação dos moradores (o MP só é custus legis); Impossibilidade de decretação de ofício pelo juiz. Ambos os institutos tem como fundamento a função social da posse, sendo que o usucapião tem aplicação mais ampla, e a desapropriação judicial indireta só é utilizada quando não couber o usucapião. OBS*: a súmula 237 do STF permite que qualquer usucapião seja alegado por meio de defesa processual. 5- Classificação da posse 5.1- Critério objetivo a) Posse justa: toda posse que não for injusta será considerada justa (critério da exclusão). b) Posse injusta: pode ser violenta (esbulho ou roubo), clandestina (furto) ou precária (empréstimo). A posse injusta pode se tornar justa quando houver o convalescimento ou INTERVERSÃO DA POSSE, que é a cura do vício que pesa sobre a posse. Ocorre quando cessada a causa que lhe originou ou após o prazo de ano e dia. Exceção: a posse precária não comporta convalescimento por ter natureza jurídica de mera detenção. 5.2- Critério subjetivo a) Posse de boa-fé: se dá quando o possuidor não conhece o vício que eventualmente pesa sobre ela (boa-fé subjetiva). Enunciado 303 do CJF: considera-se justo título para presunção relativa da boa-fé do possuidor o justo motivo que lhe autoriza a aquisição derivada da posse, esteja ou não materializado em instrumento público ou particular (compreensão na perspectiva da função social da posse). b) Posse de má-fé: se dá quando o possuidor sabe do vício que pesa sobre ela. O possuidor de má-fé não fica privado dos efeitos da posse, apenas sofrerá uma modificação de sua eficácia. Ex.: o possuidor de má-fé pode usucapir, mas deve observar um prazo maior. 6- Efeitos jurídicos da posse 6.1- Responsabilidade civil do possuidor Art. 1.217. O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa. (responsabilidade subjetiva do possuidor de boa-fé) Art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do reivindicante. (responsabilidade objetiva com risco integral* do possuidor de má-fé) OBS*: a expressão risco integral é imprópria porque, a rigor, não existe no direito brasileiro uma hipótese de responsabilidade objetiva que não admita qualquer excludente (a culpa exclusiva da vítima sempre afasta a responsabilidade objetiva). Assim, fala-se em responsabilidade objetiva com risco integral quando não se admite as excludentes de caso fortuito ou força maior, podendo-se admitir outras, como ocorre neste dispositivo. 6.2- Regime jurídico dos frutos Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos. Parágrafo único. Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação. Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia. Art. 1.216. O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito às despesas da produção e custeio. 6.3- Regime jurídico das benfeitorias a) Possuidor de boa-fé: Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias NECESSÁRIAS E ÚTEIS, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o DIREITO DE RETENÇÃO pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis. Para evitar um abuso em relação às benfeitorias úteis, a jurisprudência estabeleceu um limite: benfeitoria útil realizada depois da notificação para a restituição da coisa gera direito de indenização, mas não de retenção. Exceções: a) o comodatário (possuidor de boa-fé) não tem direito de indenização ou retenção pelas benfeitorias úteis (só pelas necessárias); b) só haverá indenização e retenção por benfeitorias úteis na locação se contar com a prévia autorização do locador*; c) na desapropriação, ordinariamente, todas as benfeitorias serão computadas no preço, exceto as realizadas entre a publicação do decreto e a imissão na posse do Poder Público – neste caso, serão sempre indenizáveis as benfeitorias necessárias, as voluptuárias nunca. OBS: no compromisso de compra e venda regulado pela Lei 6766/79, envolvendo a aquisição de loteamentos, aduz-se que em caso de resolução de contrato face ao inadimplemento por parte do promitente comprador, será ele indenizado pelas benfeitorias necessárias e úteis. Súmula 335, STJ*: nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção. O STJ considera o retentor apenas como detentor, e não como possuidor. Enunciado 81, CJF: o direito de retenção decorrente da realização de benfeitorias necessárias e úteis também se aplica às acessões (construções e plantações) nas mesmas circunstâncias. b) Possuidor de má-fé: Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias. OBS: em posição isolada, Alvino Lima entende que, se a ambos os possuidores é conferido o direito de indenização pelas benfeitorias necessárias, não há diferença alguma entre os possuidores nas suas relações de crédito com o proprietário. Fazer a distinção entre direitos absolutamente iguais (em relação ao direito de retenção) é dar a impressão de que o legislador concedeu ao possuidor de má-fé não um verdadeiro direito, mas um favor. 6.4- Tutela jurídica da posse O direito do possuidor de defender a sua posse contra terceiros – incluindo-se aí o proprietário – é uma consequência jurídica produzida pela necessidade geral de respeito à uma situação fática consolidada, na qual necessidades humanas fundamentais são satisfeitas. No transcurso da ação possessória incidirá uma espécie de condição suspensiva ao ajuizamento de qualquer ação fundada na propriedade, ante a absoluta separação temporal dos juízos em comento. Se na pendência da ação possessória uma das partes ajuizar a ação petitória caberá ao juiz extinguir o processo sem resolução do mérito, eis que ausente pressuposto processual negativo de constituição válida do processo: o trânsito em julgado da possessória. Tambémem virtude da proteção autônoma da posse, descabe a demanda de oposição na ação possessória. Não obstante a isso, não se deve conceber a proteção possessória como meramente cautelar, provisória, a depender do resultado posterior do juízo petitório, como defendiam Ihering e Carnelutti, em termos. A proteção possessória é definitiva em seus limites, e o êxito do possuidor na ação possessória só será suplantado pela ação petitória quando nesta oportunidade exiba o titular a função social da propriedade. Por outro lado, para alguns doutrinadores, o CC/02 deveria ter mantido a excepcional discussão de domínio no bojo da lide possessória, como forma de prestigiar o princípio da economia processual, tão decantado na atualidade. É vedado o ajuizamento de ação possessória pelo proprietário do imóvel que pretenda recuperar uma posse que não exercia ao tempo em que a coisa foi ocupada por outrem. Caberá a ele ingressar com a ação reivindicatória, de natureza petitória. Em princípio, são excluídos da proteção possessória os meros detentores, mas estes podem recorrer à autoexecutoriedade, em nome dos possuidores a que estão subordinados e, na modalidade de detenção independente, quando o detentor autônomo é vítima de esbulho praticado por terceiro (art. 1211). No campo prático, há certa dificuldade em se impor precisão à espécie de proteção possessória adequada, pois as agressões à posse se intensificam com rapidez, o que justifica tanto a fungibilidade quanto a duplicidade das ações possessórias. Inf. 548: nas ações possessórias, o réu poderá fazer pedido contraposto conforme prevê o art. 922 do CPC: “É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor.” Apesar de o art. 922 do CPC não prever expressamente a remoção de coisas, pessoas ou o desfazimento de construção ou plantação (remoção do ato ilícito), tal providência poderá ser determinada pelo magistrado. Isso porque vigora atualmente, em nosso sistema processual, o princípio da atipicidade dos meios de tutela das obrigações de fazer, não fazer e de entrega de coisa (arts. 461 e 461-A do CPC). Por força desse princípio, o juiz, a requerimento da parte ou até mesmo de ofício, poderá conceder a medida executiva que lhe parecer mais adequada ao caso concreto ainda que não expressamente tipificada na lei. 6.4.1- Reintegração de posse É o remédio processual adequado à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado do poder físico sobre a coisa, em virtude de violência, precariedade ou clandestinidade. O esbulho pode ser total ou parcial, neste caso referente à apenas parcela do poder de fato sobre a coisa. Diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva norteador dos contratos, na antecipação de tutela reintegratória de posse, é imprescindível prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa. Enquanto não desfeito judicialmente o negócio jurídico, injusta não pode ser considerada a posse de quem prometeu adquirir o bem. Quanto a agressão à posse partir do Poder Público, o particular também poderá intentar a ação reintegratória, com a peculiaridade da impossibilidade de obtenção de tutela liminar inaudita altera parte, exigindo-se a prévia audiência do representante da PJ. Contudo, se ao desapossamento seguir-se a realização de obra pública, o bem será incorporado ao patrimônio da PJ de direito público, não mais se permitindo a defesa com base nos interditos – restará apenas a pretensão indenizatória. Inf. 535, STJ: não tendo o autor da ação de reintegração se desincumbido do ônus de provar a posse alegada, o pedido deve ser julgado improcedente e o processo extinto com resolução de mérito. 6.4.2- Manutenção de posse Trata-se de interdito que pretende interromper a prática de atos de turbação, impondo-se ao causador da moléstia a obrigação de abster-se da prática de atos contrários ao pleno e livre exercício da posse do autor, garantindo a permanência do estado de fato. A distinção entre reintegração e manutenção da posse se insere na intensidade da agressão, pois a turbação é menos ofensiva que o esbulho, eis que não priva o possuidor do poder fático sobre o bem. A ação de reintegração de posse é classificada como ação executiva lato sensu, enquanto a ação de manutenção de posse possuirá natureza mandamental. 6.4.3- Interdito proibitório Historicamente denominado de embargos à primeira, o interdito proibitório pode ser conceituado como a defesa preventiva da posse, diante da ameaça de iminentes atos de turbação ou esbulho, objetivando impedir a consumação do ato de violência temido. O interdito proibitório é ação de cunho satisfativo e não cautelar assegurativa de outra demanda, posto que a ameaça de violência à posse é já ofensa à posse. O mandado proibitório tem natureza mandamental e é dotado de autoexecutoriedade. Caso a ameaça se concretize em agressão pelas vias de turbação ou esbulho, além da execução provisória das astreintes, converter-se-á o mandado interdital em ordem de reintegração ou manutenção, para que se restitua a coisa ao estado anterior à agressão, além de perdas e danos. De forma análoga, havendo ameaça iminente de apreensão judicial do bem (fora das hipóteses de clandestinidade, violência e precariedade) será possível deduzir em caráter preventivo os embargos de terceiro. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito. SV 5: a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada. 6.4.4- Autoexecutoriedade É uma extensão do direito às ações possessórias, sendo passível de uso em face de qualquer forma de agressão à posse, através da legítima defesa da posse (em caso de turbação) e do desforço imediato (em caso de esbulho consumado). A defesa privada é excepcional e deve ser exercida com presteza (logo) e moderação, sob pena de a conduta do possuidor converter-se em ato ilícito (delito de exercício arbitrário das próprias razões). Por questão de coerência, defere-se ao fâmulo (servidor) da posse a adoção da autoexecutoriedade, mesmo sem a presença do possuidor. OBS: há respeitáveis opiniões no sentido da inconstitucionalidade do uso do desforço imediato, pois à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, como vetor do ordenamento jurídico, torna-se inadmissível qualquer norma infraconstitucional que permita o sacrifício da integridade de pessoas na defesa de um patrimônio (também viola o devido processo legal). 6.5- Aspectos processuais das ações possessórias Ação possessória de força nova Ação possessória de força velha Interposta no prazo decadencial de ano e dia (a partir da data da agressão); Rito especial (arts. 920 e ss do CPC); Concessão de liminar sem necessidade de demonstração do periculum in mora. Interposta após findo o prazo decadencial de ano e dia (a partir da data da agressão); Rito ordinário, exceto quando o valor não ultrapasse 60 SM e nas causas de menor complexidade (rito sumário, qualquer que seja o prazo); Concessão de liminar/antecipação de tutela: necessário o fumus e o periculum (art. 273, I ou II do CPC). As ações dúplices por natureza são aquelas em que não se vislumbra predeterminação de legitimação ativa e passiva, pois o réu poderá deduzir pedido contraposto em face do autor. Assim se afiguram as ações possessórias, pois, como a lide gira em torno da melhor posse, poderá o réu na contestação (devendo fazê-lo expressamente) invocar em seu favor a proteção possessória e a consequente indenização pelos prejuízos praticados pelo autor, provando os requisitos que, normalmente, exigem-se na inicial. Por outro lado, pela fungibilidade, poderá o juiz em uma dada ação possessória adaptar a causa de pedir ao pedido e concedera proteção adequada. Como os conflitos possessórios são extremamente voláteis e as agressões intensificam-se com facilidade, seria oneroso à vítima propor um novo interdito a cada ataque deflagrado à posse. O pedido formulado em sede de ação possessória poderá ser cumulado com condenação em perdas e danos, cominação de pena para o caso de nova turbação ou esbulho e desfazimento de construção ou plantação feita em detrimento da posse. A cumulação nestes casos não terá o condão de subverter o rito especial. 6.6- A tutela da posse por outros mecanismos a) Imissão de posse: é tipicamente uma ação petitória, devendo ser adotada por quem adquire a propriedade por meio de título registrado, mas não pode investir-se na posse pela primeira vez, pois o alienante, ou um 3o a ele vinculado (detentor), resiste em entregá-la. Inf. 563, STJ: Deve ser suspensa a ação reivindicatória de bem imóvel, pelo prazo máximo de um ano (art. 265, IV, "a", do CPC 1973 / art. 313, V, “a”, do CPC 2015), enquanto se discute, em outra ação, a nulidade do próprio negócio jurídico que ensejou a transferência do domínio aos autores da reivindicatória. b) Nunciação de obra nova: trata-se de procedimento especial de jurisdição contenciosa que visa impedir o prosseguimento de obra nova prejudicial à estrutura do prédio contíguo ou as suas finalidades. Ampara os direitos de vizinhança. PROPRIEDADE 1- Noções gerais O objeto da propriedade no novo Código Civil é bem certo, determinado e tangível, já que a matéria relativa a bens incorpóreos é regulamentada em diplomas esparsos, como a Lei nº 9279/96 (Marcas e Patentes), Lei nº 9609/98 (Programas de Computador) e Lei nº 9610/98 (Direitos Autorais). Já a CF/88 conceitua o termo propriedade de forma ampla, servindo a qualquer espécie de bem aferível patrimonialmente. O direito de propriedade confere quatro poderes ao seu titular: USO, GOZO/FRUIÇÃO, DISPOSIÇÃO e REIVINDICAÇÃO. Caracteriza um direito real, com oponibilidade erga omnes – neste sentido, é um direito absoluto, amplo e perpétuo, sendo que se admite o desmembramento de um de seus poderes. A caracterização do direito de propriedade depende dos 4 poderes e também do título, que é o registro no cartório de imóveis ou a tradição para os bens móveis, em razão da oponibilidade erga omnes. O direito de propriedade é defendido por meio de ação reivindicatória, de procedimento comum e com ampla cognição. Por outro lado, o domínio é exercido sobre a coisa (e não perante a coletividade, como o é o direito à propriedade) e não exige a existência de título, estabelecendo uma sujeição da coisa ao titular. Para a defesa do domínio, tem-se a ação publiciana, de procedimento ordinário e com ampla cognição. 2- Extensão A propriedade do solo abrange também espaço aéreo e subsolo, todavia o proprietário não pode se objetar a atividades realizadas por terceiros a uma altura ou profundidade tais que não desperte o seu interesse legítimo de impedi-las. Pertencem à União as riquezas minerais e energéticas do subsolo, mas o proprietário pode utilizar os recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial. 3- A descoberta Significa encontrar coisa móvel alheia perdida (descobridor). O art. 1233 estabelece que não há aquisição de propriedade na descoberta, mas sim a obrigação de restituir, pela qual terá o descobridor direito à recompensa (achádego). Se tal não for voluntariamente convencionado, o juiz fixará em percentual não inferior a 5% do valor da coisa. O achádego tem natureza de ato-fato jurídico, sendo que seus efeitos ocorrerão independentemente da vontade das partes. Renunciar ao achádego significa renunciar a um crédito, e por isso pode significar fraude contra credores. Excepcionalmente, em duas hipóteses o descobridor poderá adquirir a propriedade da coisa: a) quando o proprietário localizado não tiver interesse na coisa e renunciar em seu favor; ou b) quando não localizado o proprietário e o Poder Público não tiver interesse sobre a coisa. Ocupação (art. 1263): ao contrário da descoberta, a ocupação é modo originário de aquisição de propriedade, que consiste em encontrar coisa móvel sem dono. Ex.: caça e pesca. 4- Função social da propriedade Decorre da CF (art. 5o, XXII e XXIII, art. 170) e do CC (art. 1228, 1o). Para Eros Grau, a função social da propriedade presente na CF corresponde à revanche da Grécia (humanismo/filosofia) sobre Roma (totalitarismo do direito de propriedade) – tem-se uma verdadeira humanização do direito a propriedade. Assim, o proprietário se obriga a dar uma destinação/finalidade à sua propriedade (função social), o que inclui a função ambiental e outras. A função social obrigacionalizou o direito de propriedade. O STF vem entendendo que a função social tem aplicação direta e imediata, independentemente de lei regulamentadora. Súmula 668, STF: é inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da EC 29/00, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana. O descumprimento da função social pode gerar restrições ou até mesmo a perda do direito de propriedade. P. ex.: desapropriação para fins de reforma agrária, IPTU progressivo, edificação compulsória, etc. Qualquer tipo de propriedade deve cumprir a função social, p. ex. a empresa. A função social é a materialização do paradigma da SOCIALIDADE da exposição de motivos do CC., Deve-se repensar a aplicação das prerrogativas da propriedade. A função social da propriedade faz com que a propriedade envolva a situação jurídica de mão dupla, ou seja, o proprietário tem direitos e deveres em relação ao não proprietário, que da mesma forma os tem em relação ao proprietário. Não há definição apriorística da função social da propriedade, ou seja, trata-se de um conceito indeterminado. A CF/88 sinalizou o que seja a função social nos artigos 182 e 186, quando respectivamente afirma que atendem à função social: a) IMÓVEL URBANO – quando atende às exigências do Plano Diretor Urbano, sujeitando-se a possíveis sanções (parcelamento e edificação compulsório, IPTU progressivo e desapropriação, nesta ordem). A desapropriação do imóvel urbano que não atende à função social se dá: I. Em títulos da dívida pública, II. Por valor venal (e não de mercado), III. Retira-se o valor da possível valorização que o imóvel tenha sofrido em decorrência de obra pública, IV. Não cabe restituição por lucro cessante e V. Não cabe o pagamento de juros compensatórios. b) IMÓVEL RURAL – quando não se verifica: a) o aproveitamento racional e adequado da propriedade (Lei 8629/93 estabelece os percentuais de aproveitamento das áreas rurais); b) a utilização adequada que preserva os recursos naturais e o meio ambiente; c) a observância das disposições que regulamentam as relações de trabalho (proteção contra o trabalho escravo ou o proprietário rural que costumeiramente descumpre as exigências trabalhistas); d) o bem estar do proprietário e dos trabalhadores. Caso não cumprida a função social, pode haver a desapropriação da propriedade rural, sendo pagamento feito com títulos da dívida agrária. Em todo caso, é proibida a desapropriação da pequena propriedade rural e da propriedade produtiva. Quando se diz que qualquer direito deve cumprir uma função social, quer-se dizer que deve atender às exigências constitucionais básicas. Nessa perspectiva, o CC/02 incorpora a preocupação com a observância do princípio da função social em muitos momentos, a começar da própria conceituação do direito de propriedade em geral, cujo exercício deverá pautar-se de acordo com finalidades econômicas, sociais e voltadas à preservação do equilíbrio ecológico, do patrimônio histórico e artístico (§1º do art. 1.228). Dada a sua importância na configuração do novo perfil do direito de propriedade no direito brasileiro, passemos a uma análise mais detida dos parágrafos artigo 1288 do CC/02, os quais introduziram novos limites ao instituto ora em análise. Art. 1.228. O proprietáriotem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 2o São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. Limitações de ordem privada: muito embora, aparentemente, seja a alteração de menor importância, ou melhor, de menor impacto, essa limitação tem por origem a faculdade do proprietário de usar e gozar da coisa. Estipula a norma a proibição de atos que não tragam comodidade ou utilidade e que "sejam animados pela intenção de prejudicar outrem". Ora, a conjunção aditiva "e" indica que a proibição vincula-se preponderantemente sobre atos que se realizem animados pela intenção de prejudicar outras pessoas, os quais ensejam a aplicação da TEORIA DO ABUSO DO DIREITO ou TEORIA DOS ATOS EMULATIVOS. Fala-se aqui de uma "finalidade humana" ou "função humana" da propriedade, pois os bens jurídicos a serem preservados são aqueles decorrentes do patrimônio individual (material, moral ou da personalidade). De fato, nos últimos anos, mormente após a Constituição de 1988, tornou-se lugar comum dizer que o direito de propriedade deve ser exercido em razão de "função social". Todavia, é possível encontrarmos um exercício regular dos direitos de propriedade, obediente à função social, porém, animado pela intenção de prejudicar outrem. Por exemplo, no caso de possuidor que opta por destruir uma benfeitoria útil, ao invés de pleitear a indenização correspondente. O exercício do direito de propriedade sobre a coisa (divisórias de madeira ou gesso, por exemplo), destruindo-a, não traria comodidade ou utilidade, e vindo a fazê-lo com a intenção de que o proprietário não venha a se servir da coisa, estará animado pela intenção de causar-lhe prejuízos. É claro que o ônus da demonstração do animus lesandi restará a cargo da outra parte (proprietário do imóvel), mas torna-se perfeitamente viável, dada a ausência, já mencionada, de comodidade e/ou utilidade. No tocante ao aspecto volitivo, entende-se não ser imprescindível, pois, para o reconhecimento da teoria do abuso de direito, que o agente tenha a intenção de prejudicar terceiro, bastando, segundo a dicção legal, que exceda manifestamente os limites impostos pela finalidade econômica ou social, pela boa fé ou pelos bons costumes. A função humana da propriedade surge assim como fator diferenciado da função social. Essa, mais ampla, atinge um maior número de pessoas. Aquela, mais restrita, surge de relações individualizadas (contratos, relações de vizinhança etc.). § 3o O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente. (limitações de ordem administrativa) § 4o. O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de 5 anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. § 5o. No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores. Limitações de ordem social: no § 4o está prevista uma possibilidade de perda da propriedade imóvel, que vem complementada no § 5o, estabelecendo o pagamento de indenização e permitindo que o título seja apto ao registro no CGI em nome dos possuidores. Essa medida é uma revelação muito nítida do PRINCÍPIO DA SOCIALIDADE é a ideia de FUNCIONALIZAÇÃO DA PROPRIEDADE. DENOMINAÇÃO: os autores estão dando nomes distintos para o instituto: DESAPROPRIAÇÃO JUDICIAL, POSSE TRABALHO, DESAPROPRIAÇÃO PRÓ-LABORE. É a medida por meio da qual o proprietário vai buscar a propriedade do imóvel e fica sem ele. REQUISITOS: I. Se aplica a imóvel URBANO ou RURAL; II. O imóvel deve ter área extensa, mas o CC/02 não tarifou, não disse o tamanho da área; o legislador considerou que a lei é nacional, e por isso, em cada região esse conceito é diferente, ou seja, o juiz do caso concreto é que irá aferir se se trata ou não de uma extensa área de terras para o fim do instituto; III. Número considerável de pessoas: mais uma vez o legislador não quantificou, mas o seu objetivo foi solucionar grandes ocupações; o juiz irá verificar o caso concreto; IV. A ocupação deve ser acima de 5 anos, de maneira ininterrupta e de boa-fé; V. O número considerável de pessoas deve ter introduzido obra ou serviço de interesse social. A ideia é a de que os possuidores tenham dado uma utilização consonante com o interesse social, o que não foi feito pelo proprietário. É evidente que a utilização dos possuidores não pode ser especulativa. VI. A existência de pedido de restituição do imóvel, o que se faz mediante ação reivindicatória. Enunciado 83 do CJF – Art. 1228: Nas ações reivindicatórias propostas pelo Poder Público, não são aplicáveis as disposições constantes dos §§ 4º e 5º do art. 1228 do NCC. VII. INDENIZAÇÃO é requisito para a sentença, que servirá de título. Quem paga? Os possuidores; na tramitação do projeto, houve uma proposta para que a indenização fosse arcada pelo poder público, mas a mesma não vingou. Essa medida difere da USUCAPIÃO exatamente porque os possuidores devem pagar uma indenização; se os possuidores não quiserem pagar a indenização, não poderão utilizar-se da medida. Enunciado 240 do CJF – Art. 1228: A justa indenização a que alude o §5º do art, 1228 não tem como critério valorativo, necessariamente, a avaliação técnica lastreada no mercado imobiliário, sendo indevidos os juros compensatórios. REQUERIMENTO: deverá ser requerida pelos possuidores? Sim, o juiz não pode reconhecer de ofício, até porque tem indenização. Enunciado 84 do CJF – Art. 1228: A defesa fundada no direito de aquisição com base no interesse social (§§ 4º e 5º do art. 1228 do NCC) deve ser arguida pelos réus da ação reivindicatória, eles próprios responsáveis pelo pagamento da indenização. REGISTRO: como há um número considerável de pessoas, como o juiz irá determinar o registro no RGI? A solução viável parece ser o registro sob a forma de CONDOMÍNIO. Enunciado 241 do CJF – Art. 1228: O registro da sentença em ação reivindicatória, que opera a transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com fundamento no interesse social (art.1228, §5º), é condicionado ao pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será fixado pelo juiz. FORMA DE AQUISIÇÃO: é forma originária ou derivada da propriedade? Há divergências, mas o melhor entendimento é o de que se trata de forma de aquisição originária da propriedade, tornando o imóvel, uma vez registrado em nome dos possuidores, insuscetível de reivindicação e liberado de quaisquer ônus, cabendo aos eventuais credores somente a sub-rogação no preço pago ao antigo proprietário. NATUREZA JURÍDICA: Observa-se, de imediato, tratar-se de dispositivo que institui uma nova forma de perda de propriedade, não antes conhecida do direito brasileiro, dada a sua peculiaridade: OBS1: a função social da propriedade implica em OBRIGACIONALIZAÇÃO do direito de propriedade. O proprietário, antes, somente tinha direitos. Hoje o proprietário tem deveres, relativos ao cumprimento da função social. Neste sentido, torna-se o direito de propriedade uma relação jurídica complexa. OBS2: dentro da função social da propriedade, encontraremos diferentes funções. Dentro dela (função social da propriedade) encontramos funções, tais como: função social ambiental, econômica, humana ... OBS3: a função social da propriedade não é, nem não pode ser, um fator de empecilho a LIVRE INICIATIVA. Veja que a função social da propriedade esta em harmonia com a livre iniciativa. Isso porque a função social não é a socialização da propriedade (como nos regimes comunistas). A CF no artigo 170 garante a livre iniciativa como fundamentoda ordem econômica. 5- Propriedade resolúvel Toda propriedade nasce para ser perpétua, entretanto o próprio CC admite a hipótese de uma propriedade que se extingue em um determinado tempo (resolubilidade). A propriedade só será resolúvel nos casos previstos em lei. Temos duas hipóteses: a) Resolubilidade originária (art. 1359): quando a causa extintiva da propriedade consta expressamente do seu próprio título aquisitivo. Ex.: propriedade fiduciária, cláusula de retrovenda. b) Resolubilidade superveniente (art. 1360): quando a propriedade nasceu para se perpetuar no tempo, porém um motivo posterior surge para gerar a sua extinção. Ex.: revogação da doação por ingratidão. Se a propriedade é resolúvel com causa originária, extinta a propriedade extinguem-se também todos os direitos constituídos em sua vigência. Se a resolubilidade é por causa superveniente, extinta a propriedade, preservam-se todos os direitos constituídos em sua vigência, p. ex. a hipoteca. 5.1- Propriedade fiduciária Ocorre quando o credor fiduciário adquire a propriedade resolúvel e a posse indireta de bem móvel recebido em garantia de financiamento efetuado pelo alienante, que se mantém na posse direita da coisa, resolvendo-se o direito fiduciário com a solução da dívida garantida. O objeto é bem móvel, por natureza, infungível, durável e inconsumível. É pacífico que o bem que já integre o patrimônio do devedor pode ser objeto de propriedade fiduciária (súmula 28 do STJ). OBS: a alienação fiduciária do Sistema Financeiro recai sobre bens imóveis (Lei nº 9514/97, art. 22). A propriedade fiduciária disciplinada no CC/02 é um novo direito real de garantia, como o penhor, mas permite ao devedor gozar do bem. A aquisição do domínio é ficta e o formalismo do ato completa-se com o registro do contrato no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do devedor ou na repartição competente para licenciamento do veículo automotor, com anotação no certificado de registro. Súmula 92 do STJ: “a terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no Certificado de Registro do veículo automotor”. STJ – Resp 214763/SP – Os bens alienados fiduciariamente, por não pertencerem ao devedor executado, mas à instituição financeira que lhe proporcionou as condições necessárias para o financiamento do veículo automotor não adimplido, não pode ser objeto de penhora na execução fiscal. A alienação fiduciária não institui ônus real de garantia, mas opera a própria transmissão resolúvel do direito de propriedade. Caso o próprio credor fiduciário seja responsabilizado por dívidas perante terceiros, no decurso do contrato, também não ficará o devedor fiduciante prejudicado. Apesar da propriedade pertencer ao credor, trata-se de patrimônio de afetação, imune à ação de terceiros, posto reservado ao titular do direito eventual, que pode praticar os atos destinados a preservá-lo. A Lei nº 9514/97, que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, instituiu a modalidade de alienação fiduciária de coisa imóvel, mediante registro no ofício imobiliário. Com o advento dessa regra, o interessado na compra de um imóvel levantará, na instituição de sua preferência, o empréstimo para pagamento do preço de aquisição e, em garantia, efetuará a alienação fiduciária do imóvel ao credor, transferindo-lhe o domínio resolúvel e a posse indireta. Até a liquidação do débito, o devedor fiduciante será possuidor direito do imóvel. Na hipótese de o devedor fiduciante não purgar a mora no prazo de 15 dias, contados da intimação pelo Oficial do Registro Imobiliário, restará consolidada a propriedade em poder do credor fiduciante, após pagar o ITBI, sendo-lhe lícito aliená-la no prazo de 30 dias, a contar do registro que efetivou a consolidação. Em caso de resistência à desocupação, o credor fiduciário poderá manejar ação de reintegração de posse. Apesar da vedação do art. 1365 do CC, excepcionalmente poderá o credor imobiliário conservar a coisa em seu patrimônio, se o segundo leilão vier a frustrar-se, adquirindo, então, propriedade plena. Súmula 72, STJ: a comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente (mora ex persona). Súmula 245, STJ: a notificação destinada a comprovar a mora nas dívidas garantidas por alienação fiduciária dispensa a indicação do valor do débito. No que se refere à previsão de prisão do devedor, constante no Decreto-lei 911/69, o STJ tem jurisprudência reiterada de que a mesma não é admissível após o advento da CF/88, por se tratar de depósito atípico. Tal entendimento era contrário àquele adotado pelo STF, o qual reconhecia a constitucionalidade desta medida prisional. Entretanto, com o julgamento dos Recursos Extraordinários 466343 e 349703, os ministros da Suprema Corte começaram a rever a prisão civil para o próprio depositário infiel. A discussão foi acesa pelo ministro Gilmar Mendes em razão do Pacto de San José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário, permitir prisão civil apenas em caso de inadimplência de dívida alimentícia. Para o ministro, o pacto tem menos poder do que a Constituição brasileira, mas é hierarquicamente superior à legislação infraconstitucional. Portanto, não revoga a possibilidade de prisão civil para depositário infiel, mas revoga a lei que regulamenta essa previsão constitucional. Com base nesse entendimento, a prisão para o depositário cairia num vago legislativo e não poderia ser aplicada. Atualmente a questão está pacificada no STF, conforme se abstrai da súmula vinculante nº 25: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Leasing é diferente propriedade fiduciária, sendo que o primeiro é arrendamento mercantil, por ex., uma pessoa pede dinheiro emprestado ao banco para comprar um equipamento, ele compra o bem e irá arrendá-lo a essa pessoa, que será arrendatária e pagará prestações fixas sobre o bem, é um aluguel onde o banco/proprietário (posse indireta), faz com a pessoa que terá a posse direta, desdobra-se a posse. Logo, o Leasing é contrato misto (mútuo/empréstimo e opção de compra e venda no final) e não é apenas locação. O leasing é direito obrigacional. Já a Propriedade Fiduciária é direito real, visto que ao final do pagamento o devedor adquire a propriedade. Inf. 526, STJ: a medida de busca e apreensão prevista no art. 3o do DL 911/69 somente pode ser proposta por instituição financeira ou pessoa jurídica de direito público titular de créditos fiscais e previdenciários. Isso porque, de acordo com o art. 8o-A do referido DL, o procedimento ali previsto somente é aplicável quando se tratar de operações do mercado financeiro e de capitais ou de garantia de débitos fiscais ou previdenciários. 6- Propriedade aparente É construção doutrinária e jurisprudencial, pois não está prevista no CC. Consiste na aplicação da teoria da aparência no âmbito do direito de propriedade, com fundamento na proteção de terceiros de boa-fé que celebram negócios jurídicos com o proprietário aparente. O terceiro de boa-fé estará protegido e o proprietário aparente deverá indenizar o legítimo proprietário (direito regressivo). É irrelevante saber se o proprietário aparente sabia ou não da sua condição (boa-fé subjetiva) para a proteção do terceiro, mas para fins de indenização ao legítimo proprietário a má-fé poderá dar ensejo também a cumulação com perdas e danos. 7- Modos de aquisição de propriedade imóvel 7.1- Derivados Ocorre quando há translatividade, ou seja, relação jurídica entre as partes. Neste caso, a propriedade é adquirida com todos os vícios e gravames que pesem sobre ela. Ocorre através do registro no cartório de imóveis, que gera uma presunção relativa de titularidade. OBS: o registro torrens é a única hipótese de registro que gera presunção absoluta de propriedade. É um sistema especial de registro público, exclusivamente para propriedade rural (arts. 277 a 288 da LRP), que depende de prévia deliberação judicial. Sabendo que o registro gera uma presunção relativa de titularidade há uma preocupaçãoem proteger o 3o de boa-fé nele que confiou. Assim, o STF já reconheceu a responsabilidade civil do Estado pela evicção quando houve atuação do tabelião. O registro pode decorrer de ato inter vivos (compra e venda) ou causa mortis (testamento), gerando em qualquer caso preferência/prioridade e publicidade. Inf. 562, STJ: A compra e venda de bens IMÓVEIS pode ser feita por meio de contrato particular ou é necessário escritura pública? • Em regra: é necessário escritura pública (art. 108 do CC). • Exceção: a compra e venda pode ser feita por contrato particular (ou seja, sem escritura pública) se o valor do bem imóvel alienado for inferior a 30 salários-mínimos. Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País. Para fins do art. 108, deve-se adotar o preço dado pelas partes ou o valor calculado pelo Fisco? O valor calculado pelo Fisco. O art. 108 do CC fala em valor do imóvel (e não em preço do negócio). Assim, havendo disparidade entre ambos, é o valor do imóvel calculado pelo Fisco que deve ser levado em conta para verificar se será necessária ou não a elaboração da escritura pública. A avaliação feita pela Fazenda Pública para fins de apuração do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos, previstos em lei, os quais admitem aos interessados o conhecimento das circunstâncias consideradas na formação do quantum atribuído ao bem. Logo, trata-se de um critério objetivo e público que evita a ocorrência de fraudes. Obs: está superado o Enunciado 289 das Jornadas de Direito Civil do CJF. Usucapião tabular: gera a convalesça registral, já que, dentro da contestação da ação de invalidade ou falsidade do registro público, o interessado pode alegar em seu favor o preenchimento dos requisitos do usucapião. O juiz vai então declarar a nulidade do registro, desconstituindo-o, e mandar lavrar outro (haverá um convalescimento do registro). Muda o título aquisitivo da propriedade, de aquisição derivada para originária. Hipóteses de retificação do registro civil: a) Retificação em cartório, através de um procedimento administrativo: quando não houver interesses de terceiros. Ex.: retificação do nome do adquirente. b) Retificação em vara registral, através de procedimento de jurisdição voluntária: quando houver interesse de terceiros, mas não gerar ampliação da área do imóvel. Ex.: retificação do valor da compra e venda. c) Retificação em vara cível, através de procedimento comum ordinário: quando houver interesse de terceiros e gerar ampliação da área do imóvel. 7.2- Originários Ocorre quando não houver translatividade (transferência jurídica), ou seja, não há relação jurídica entre as partes. Neste caso, a propriedade é adquirida livre e desembaraçada de qualquer vício ou gravame que pese sobre ela. Ocorre por dois modos: a) Usucapião: é o modo de aquisição da propriedade pelo decurso do tempo. b) Acessões: são os acréscimos feitos à propriedade, e podem ser naturais (decorrem da natureza) ou artificiais (construções e plantações). OBS: quando a construção ou plantação for realizada de boa-fé em terreno alheio e excede consideravelmente o valor do terreno inverte-se a teoria da gravitação (o acessório NÃO seguirá o principal), quando o construtor irá adquirir o terreno e o indenizará ao legítimo proprietário. 8- Modos de aquisição da propriedade móvel a) Ocupação: é o modo originário por excelência de aquisição da propriedade móvel, pelo qual alguém imediatamente apropria-se de coisas sem dono, seja porque nunca foram apropriadas (res nullius), seja porque foram abandonadas (res derelictae). b) Achado do tesouro: tesouro é o depósito antigo de coisas preciosas ocultas cujo dono é desconhecido. Se a propriedade for presumível, não é tesouro. Se o tesouro for achado pelo proprietário do terreno, a ele pertence; caso seja encontrado por outra pessoa que não seja proprietária, terá este direito à metade do tesouro. Todavia, se o descobridor penetrar no prédio alheio com o propósito de encontrar o tesouro, não terá direito a nada, pois não se permite a obtenção de vantagem quando do esbulho. c) Especificação: é modo originário de aquisição da propriedade mobiliária que se dá mediante a transformação de matéria-prima em espécie nova por meio do trabalho. d) Comissão, confusão e adjunção: são modos originários de aquisição. COMISSÃO é a mistura de coisas secas ou sólidas, pertencentes a diferentes donos, sem que possam ser separadas e sem que se produza coisa nova. CONFUSÃO é a mistura de coisas líquidas de diferentes pessoas, nas mesmas condições. ADJUNÇÃO é a justaposição de uma coisa sólida à outra, de tal modo que não possam mais ser separadas sem deterioração do bem formado. e) Usucapião; f) Tradição: é modo derivado de aquisição da propriedade móvel, consistindo na entrega de bem móvel pelo transmitente ao adquirente, com a intenção de transferir-lhe a propriedade. Pode ser real (entrega material da coisa ao adquirente), simbólica (entrega das chaves de um veículo, p.e.) e consensual (resulta do acordo de vontade dos interessados, por aposição contratual, sem qualquer alteração do mundo dos fatos – constituto possesório e tradição brevi manu). No constituto possessório o proprietário de um bem o aliena a outrem, mas continua como possuidor direto, isto é, há inversão no título da posse, já que alguém que possuía a coisa em nome próprio passa a possuir em nome alheio. Já na tradição brevi manu ocorre o contrário. Aquele que detinha o bem em nome alheio, passa a possuí-lo como proprietário. OBS: o novo código Civil não incluiu a descoberta (antiga invenção) como modo de aquisição da propriedade, visto que quem acha o bem perdido não adquire a sua propriedade. Colocou a descoberta na parte geral da propriedade. DESCOBERTA: é o fato jurídico que consiste em alguém encontrar coisa alheia perdida (art. 1233, CC). A descoberta gera para o descobridor uma obrigação de fazer consistente em entregar a coisa que saiu da esfera de proteção do titular. Cuida-se de obrigação que se origina de um ato jurídico stricto sensu. 9- Modos de perda da propriedade Em princípio, a propriedade é irrevogável, transmitindo-se aos sucessores por força da saisine. Todavia, perde-se voluntariamente por alienação, abandono e renúncia e, involuntariamente, pelo perecimento e desapropriação. Alienação: ato pelo qual o proprietário, por vontade própria, gratuita ou onerosamente, transfere a outrem seu direito sobre a coisa. Renúncia: ato unilateral pelo qual o proprietário declara formal e explicitamente o propósito de despojar-se do direito de propriedade. Só se aplica aos bens imóveis, com exceção do patrimônio móvel que se encerra no direito hereditário objeto de abdicação pelo herdeiro. Abandono: é o ato material pelo qual o proprietário desfaz-se da coisa porque não quer mais ser seu dono. Por não ser um ato expresso como a renúncia, a derrelição deve resultar de atos exteriores que atestem a manifesta intenção de abandonar. O mero desuso não implica em abandono, tem que haver o elemento psicológico. Perecimento: dá-se pela perda das qualidades essenciais da coisa. Desapropriação: modo originário de aquisição e perda da propriedade, em face da intervenção estatal na propriedade privada. Perda Involuntária: pela arrematação, adjudicação, implemento de condição resolutiva, usucapião, casamento pela comunhão universal e confisco. USUCAPIÃO 1- Introdução Usucapião é modo originário de aquisição da propriedade e de outros direitos reais pela posse contínua durante certo lapso de tempo. Com efeito a posse, unida ao tempo e aos demais requisitos legais, confere juridicidade a uma situação de fato, convertendo-a em propriedade. Inf. 527, STJ: a decisão que reconhece a aquisição da propriedade de bem imóvel por usucapião prevalece sobre a hipoteca judicial que anteriormente tenhagravado o referido bem. 2- Requisitos 2.1- Requisito material: bens suscetíveis de usucapião Os bens públicos são insuscetíveis de usucapião, já os bens de sociedades de economia mista e empresas públicas são usucapíveis. O STF (REnº 220.906) faz distinção entre as paraestatais prestadoras de serviço público e exploradoras de atividade econômica, incluindo os bens afetados à finalidade pública como submetidos ao regime jurídico de Direito Público. Bem com cláusula de inalienabilidade só pode sofrer usucapião extraordinário. Bem de família, voluntário ou legal, pode ser usucapido. Também é possível a usucapião de propriedade resolúvel. As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são inalienáveis, indisponíveis e insuscetíveis de usucapião. No caso da usucapião em favor de remanescentes das comunidades de quilombos, puderam os moradores e descendentes que começaram a possuir tais terras em posse tranqüila e pacífica com animus domini até a edição da CF/88, transmiti-la para as futuras gerações, e nesse caso recaiu até mesmo em bens públicos. O condômino pode usucapir contra os comproprietários se o condomínio for pro indiviso, ou seja, a indivisão do bem for de fato e de direito, se o apossamento recair sobre a integralidade do imóvel. Se for pro indiviso, ou seja, a indivisão for apenas jurídica, mas já houve divisão de fato entre os condôminos, um dos condôminos pode usucapir parcialmente de outras determinadas porções. Já nos condomínios horizontais, o uso da coisa comum, ainda que de forma exclusiva, não gera posse ad usucapionem. Vaga de garagem, por sua vez, se for autônoma em relação ao imóvel, com matrícula individual e designação numérica própria é suscetível de usucapião. Inf. 524, STJ: A alegação da União de que determinada área constitui terreno de marinha, sem que tenha sido realizado processo demarcatório específico e conclusivo pela Delegacia de Patrimônio da União, não obsta o reconhecimento de usucapião. Nesse caso, na sentença que reconhecer a usucapião, o juiz deverá ressalvar que a União poderá fazer uma eventual e futura demarcação no terreno. Se ficar constatado, efetivamente, que o imóvel está localizado em terreno de marinha, a União será declarada proprietária da área, não havendo preclusão sobre o tema. Aplica-se o mesmo raciocínio constante na Súmula 496 do STJ: Os registros de propriedade particular de imóveis situados em terrenos de marinha não são oponíveis à União. Com isso, não haverá prejuízo à União. 2.2- Requisitos formais a) Posse mansa e pacifica: primeiramente, quanto ao requisito da posse, tem-se que apenas a posse ad usucapionem (com ânimo de dono) pode acarretar a prescrição aquisitiva. A posse também deve ser mansa e pacífica, ou seja, exercida sem oposição. Deve ainda a posse ser contínua, sem interrupção juridicamente relevante. Não quer tanto dizer que a pessoa tenha necessariamente de permanecer no imóvel todo o tempo, já que para que se considere possuidora basta que possa exercer os poderes inerentes ao domínio. Admite-se que o possuidor acrescente à sua posse a dos seus antecessores (acessio possessionis), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos da usucapião ordinária, com justo título e boa-fé. A junção das posses pode se dar ainda pela sucessio possessionis, a aquisição a título universal, eis que o herdeiro se reputa na continuação da posse do falecido. b) Animus domini c) Tempo: os prazos exigidos se contam por anos, não por horas. Despreza-se o primeiro dia, sempre incompleto, mas se inclui o último. O CC/02 reduziu os prazos em relação do Código anterior, não mais prevendo tempo maior para os ausentes. d) Justo título: só é exigido na usucapião ordinária. O justo título é o capaz de infundir no adquirente a crença de ser dono, conquanto incapaz de transmitir o direito em razão de algum vício. Sobre o assunto, o CJF emitiu Enunciado com o seguinte teor: “art. 1242: a expressão justo título, contida no art. 1242 e 1260 do CC, abrange todo e qualquer ato jurídico hábil, em tese, a transferir a propriedade, independentemente de registro”. e) Boa-fé: só é exigida na usucapião ordinária. A boa-fé está presente se o possuidor ignora o vício ou obstáculo que impede a aquisição da coisa. Pelo art. 1.201 do Código, presume-se de boa-fé quem tem justo título. A boa-fé deve existir durante todo o prazo necessário para a usucapião. 3 – Modalidades de usucapião OBS: bens móveis só podem ser usucapidos através da modalidade extraordinária (5 anos) ou da modalidade ordinária (3 anos). USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA Tempo: 15 anos. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA REDUZIDA OU QUALIFICADA Tempo: 10 anos. Cumprimento da função social: moradia ou produtividade. USUCAPIÃO ORDINÁRIA Tempo: 10 anos. Boa-fé + justo título. USUCAPIÃO ORDINÁRIA REDUZIDA OU QUALIFICADA Tempo: 5 anos. Boa-fé + justo título. Cumprimento da função social: moradia ou produtividade. OBS: o imóvel deve ser bem adquirido onerosamente e que teve o seu registro cancelado. USUCAPIÃO FAMILIAR OU CONJUGAL (sanção ao cônjuge culpado? Inconstitucional?) Tempo: 2 anos, a contar do abandono do imóvel pelo outro cônjuge/companheiro. Imóvel de até 250 m2. Cumprimento da função social: moradia. O usucapiente não pode ser proprietário ou possuidor direto de outro imóvel, seja urbano ou rural. USUCAPIÃO ESPECIAL RURAL OU PRÓ-LABORE, CONSTITUCIONAL Tempo: 5 anos. Imóvel rural de até 50 hect. Cumprimento da função social: moradia e produtividade. O usucapiente não pode ser proprietário ou possuidor direto de outro imóvel, seja urbano ou rural. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA OU PRÓ-MISERO, PRÓ-MORADIA, PRÓ-HABITATIONE, HABITACIONAL Tempo: 5 anos. Imóvel urbano de até 250 m2. Função socialnica vez.﷽reconhecida ao mesmo possuidor uma ).: moradia. O usucapiente não pode ser proprietário ou possuidor direto de outro imóvel, seja urbano ou rural. OBS: a usucapião especial urbana só pode ser reconhecida ao mesmo possuidor uma única vez. USUCAPIÃO COLETIVA Tempo: 5 anos. Imóvel urbano com mais de 250 m2, ocupadas por população de baixa renda, não se sabendo precisar a delimitação de cada um. Função social: moradia. Os usucapientes não podem ser proprietários ou possuidores diretos de outro imóvel, seja urbano ou rural. 3.1- Usucapião Extraordinária Exige todos os requisitos da posse qualificada: animus domini, mansa e pacífica e ininterrupta, mas dispensa-se o JUSTO TÍTULO do possuidor. A posse não precisa ser atual. O artigo 1238 estabelece prazo de 15 ANOS em casos de POSSE SIMPLES (exercício de fato de alguns dos poderes da propriedade) e 10 ANOS se POSSE QUALIFICADA (posse qualificada pelo cumprimento da função social, por intermédio de moradia). É o que se denomina de USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA ESPECIAL PRO-LABORE ou HABITACIONAL. Observe-se que não se exige que o possuidor não tenha outro imóvel e nem se restringe o tamanho do imóvel. 3.2- Usucapião Ordinária É também usucapião comum e não especial, já que não faz limitação ao tamanho do imóvel ou exigências especiais em relação ao possuidor, tais como: ser proprietário de outros bens, posse voltada para fim de habitação ou utilização de interesse social, etc. Essa usucapião (artigo 1242 e p. un.) exige a configuração, além dos requisitos comuns da posse qualificada - animus domini, mansa e pacífica e ininterrupta - os requisitos de JUSTO TÍTULO e BOA-FÉ, razão pela qual o prazo será menor: 10 anos se posse simples e 5 anos se posse qualificada. São requisitos específicos: I. POSSE PRO-LABORE; II. JUSTO TÍTULO ESPECIAL (por qualquer motivo, o registro do possuidor foi cancelado). 3.3- Usucapião Especial Regulada nos artigos 191 da Constituição Federal e 1.239 do Código Civil, a USUCAPIÃO ESPECIAL RURAL ou “pro labore” ou “rústica” traz como componentes do suporte fático o não ser proprietário de imóvel rural ou urbano, a posse por cinco anos ininterruptos, sem oposição, de área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares, tornar produtiva a terra por seu trabalho ou de sua família e a moradia