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Apostila - Das lesões corporais

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Direito Penal III 
Curso de Direito
Professor: Arthur Benvindo Pinto de Souza
Das Lesões Corporais
Lesão corporal
Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
Conceito de lesão corporal: é o dano ocasionado à normalidade funcional do corpo humano, do ponto de vista anatômico, fisiológico ou mental. O delito de lesão corporal nada mais é do que a ofensa à integridade corporal ou à saúde de outrem.
Objetividade Jurídica: é a proteção do direito à integridade corporal e à saúde do ser humano.
Sujeito Ativo: qualquer pessoa.
Sujeito Passivo: qualquer pessoa.
Conduta: vem representada pelo verbo ofender, tendo como objeto a integridade corporal ou à saúde de outrem, causando-lhe mal físico, fisiológico ou psíquico.
Elemento Subjetivo: a lesão corporal é um crime que admite o dolo, a culpa e o preterdolo.
Animus laedendi e animus necandi: não se confunde o animus laedendi, que é a vontade de lesionar, configuradora do crime de lesão corporal, com o animus necandi, que é a vontade de matar configuradora do delito de homicídio.
Culpa: a culpa pode existir nas lesões corporais culposas, que têm lugar quando o sujeito ativo age com imprudência, negligência e imperícia.
Preterdolo: ocorre nas lesões corporais elencadas nos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129 do Código Penal.
Consumação: ocorre com a efetiva ofensa à integridade corporal ou à saúde física ou mental da vítima.
Lesão Corporal de Natureza Leve: o art. 129 menciona apenas as hipóteses de lesão grave, lesão gravíssima e lesão seguida de morte. Portanto, o conceito de lesão leve se dá por exclusão, ou seja, toda lesão que não for grave, gravíssima ou seguida de morte será leve.
Vias de Fato: não se confunde com o crime de lesão corporal. Nas vias de fato (art. 21, do Decreto-Lei nº. 3.688/41), não há dano à incolumidade física da vítima. Ex.: empurrão, tapa etc.
Autolesão: não constitui crime.
Autolesão e estelionato: excepcionalmente, a autolesão pode constituir meio para prática do crime de estelionato, na modalidade de fraude contra seguro (art. 171, § 2º, inc. V, do Código penal).
Autolesão para defender-se: se a vítima, agredida pelo agente, vem a defender-se e acaba por se autoferir, está consumado o crime de lesão corporal, imputável ao agressor.
Várias lesões na mesma oportunidade: se, na mesma oportunidade, pratica o agente várias lesões corporais na vítima, responde por crime único.
Exame de corpo de delito: toda lesão corporal, em regra, deve ser comprovada através de exame de corpo de delito, direto ou indireto (art. 158 do CPP), feito por dois peritos oficiais. Excepcionalmente, se os vestígios da lesão corporal houverem desaparecido, o exame de corpo de delito poderá ser suprido pela prova testemunhal (art. 167 do CPP).
Tentativa: em tese, admite-se quando o sujeito, embora empregando meio executivo capaz de causar dano à incolumidade corporal da vítima, por circunstâncias alheias à sua vontade não consegue a consecução de seu fim.
Ação Penal: é pública incondicionada.
Juizado especial Criminal: de acordo com o disposto no art. 88 da Lei nº. 9.099/95, a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas será pública condicionada à representação da vítima. 
Lesão corporal de natureza grave
§ 1º Se resulta:
Lesão corporal grave: são hipóteses previstas em lei, em que as consequências da conduta apresentam maior relevância jurídica, com penas mais rigorosas.
Laudo de exame de corpo de delito: a classificação da lesão corporal será dada pelos peritos após o exame de corpo de delito da vítima.
I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;
Ocupações habituais: são as ocupações do cotidiano da vítima, sob o aspecto formal e não somente econômico.
Licitude da ocupação: a ocupação deve ser lícita. Se for ilícita, não haverá qualificadora.
Moralidade da ocupação: há entendimentos no sentido de que se configura a qualificadora se a prostituta, por exemplo, em razão das lesões corporais, não puder retornar às suas atividades habituais (prostituição) por mais de 30 dias.
Exame de corpo de delito complementar: é necessário, após o 30º dia contado a partir da data do fato (art. 168, § 2º, do CPP).
II - perigo de vida;
Perigo de vida: probabilidade concreta e efetiva de morte.
Perícia: é imprescindível.
Sede das lesões: não autoriza a presunção de perigo.
III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;
Debilidade: redução da capacidade funcional da vítima.
Membro: parte do corpo ligada ao tronco – mãos, pés, braços e pernas.
Sentido: faculdade de percepção, constatação e comunicação – tato, olfato, visão, audição, paladar etc.
Função: atividade específica do órgão – circulatória, respiratória, locomotora, reprodutora etc.
Perda de dente: pode configurar debilidade da função mastigatória ou da função de emitir sons em algum padrão (fala).
IV - aceleração de parto:
Aceleração de parto: antecipação do nascimento do feto.
Vida do feto: é indispensável que o feto nasça vivo e continue a viver.
Morte do feto: constitui aborto, caracterizando lesão corporal gravíssima (§ 2º, inc. V).
Conhecimento da gravidez da vítima: é necessário que o agente conheça o estado de gravidez da vítima.
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 2° Se resulta:
Lesão corporal gravíssima: embora o Código Penal não adote essa terminologia, têm-se considerado as lesões previstas no § 2º do art. 129 como gravíssima, em que as consequências da conduta também apresentam maior relevância jurídica, com penas mais rigorosas.
I - Incapacidade permanente para o trabalho;
Incapacidade permanente para o trabalho: é a incapacidade para o desempenho de atividade laboral. Pode ser física ou psíquica.
II - enfermidade incurável;
Enfermidade incurável: é o processo patológico que afeta a saúde em geral, incurável.
Transmissão proposital de HIV: o STJ, considerou a transmissão proposital do vírus HIV como lesão corporal de natureza grave, sendo a AIDS considerada enfermidade incurável.
III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função;
Perda: eliminação material do membro, sentido ou função.
Inutilização: perda funcional do membro, sentido ou função.
IV - deformidade permanente;
Deformidade permanente: é o defeito físico permanente, que gera dano estético de relevante monta.
Variação de acordo com a vítima: o dano ao aspecto físico-estético pode variar de acordo com o sexo e a idade da vítima.
V - aborto:
Aborto: tem que ser provocado involuntariamente pelo agente.
Conhecimento da gravidez da vítima: é necessário que o agente conheça o estado de gravidez da vítima.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
Lesão corporal seguida de morte
§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
Lesão corporal seguida de morte: define o chamado homicídio preterdoloso ou preterintencional, no qual existe dolo no momento antecedente (quanto à lesão) e culpa no momento consequente (previsibilidade quanto à morte da vítima). É indispensável a previsibilidade do resultado, ou seja, a culpa com o resultado morte. A intenção do agente é lesionar a vítima, ocasionando-lhe, porém, a morte como resultado não pretendido.
Diminuição de pena
§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
Lesão corporal privilegiada: ocorre quando o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. O juiz, nesses casos, poderá reduzira pena de um sexto a um terço. Se as lesões forem leves, nesses casos, poderá também o juiz substituir a pena de detenção pela pena de multa, nos termos do § 5º.
Substituição da pena
§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis:
I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior;
II - se as lesões são recíprocas.
Lesão corporal privilegiada: nas hipóteses do caput do art. 129, o juiz pode, em vez de apenas diminuir a pena de detenção cominada, substituí-la por pena de multa.
Lesões corporais recíprocas: ocorrem quando os agentes se agridem mutuamente, nenhum agindo em legítima defesa. Também nesse caso é possível a substituição da pena privativa de liberdade pela multa.
Lesão corporal culposa
§ 6° Se a lesão é culposa: 
Pena - detenção, de dois meses a um ano.
Lesão corporal culposa: ocorre quando o sujeito ativo age com imprudência, imperícia ou negligência, ofendendo a integridade corporal ou a saúde de outrem mediante a inobservância do cuidado objetivo necessário.
Cuidado objetivo: é a obrigação determinada a todos, no convívio social, de realizar condutas de forma a não produzir danos a terceiros.
Imprudência: é a prática de um fato perigoso. Ex.: dirigir veículo em rua movimentada com excesso de velocidade.
Negligência: é a ausência de precaução ou indiferença em relação ao ato realizado. Ex.: deixar arma de fogo ao alcance de uma criança.
Imperícia: falta aptidão para o exercício de arte ou profissão.
Lesão corporal culposa praticada na direção de veículo automotor: nesse caso, aplica-se a regra específica estampada no art. 303 da Lei nº. 9.503/97.
Ação Penal: é pública condicionada a representação do ofendido (art. 88, da Lei nº. 9.099/95).
Aumento de pena
§ 7º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se ocorrer qualquer das hipóteses dos §§ 4º e 6º do art. 121 deste Código.
Lesão corporal culposa qualificada: ocorre quando o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte de ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências de seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante.
§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121.
Perdão judicial: é admissível perdão judicial nos crimes de lesão corporal culposa, quando o juiz deixa de aplicar a pena por terem as consequências do crime atingido o agente de forma tão grave que a sanção penal se torna desnecessária.
Violência Doméstica 
§ 9º  Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
Figura típica qualificada: trata-se, em verdade, de figura típica qualificada do crime de lesão corporal dolosa, em que as relações de parentesco, maritais, de convivência e domésticas, de coabitação ou de hospitalidade são fatores determinantes do agravamento da sanção.
Juizados Especiais Criminais: por determinação do art. 41 da Lei nº. 11.340/06, aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº. 9.099/95. 
§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço).
Causa de aumento de pena: segundo esse dispositivo, a pena das lesões corporais previstas nos §§ 1º a 3º são aumentadas de um terço se praticadas nas circunstâncias indicadas no § 9º, ou seja, contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convívio, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade.
§ 11.  Na hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.
 
Causa de aumento de pena: segundo esse dispositivo, nos casos de violência doméstica tendo como vítima pessoa portadora de deficiência (física ou mental), a pena das lesões corporais é aumentada de um terço.
 
§ 12. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços. (Incluído pela Lei nº 13.142, de 2015)
“Censuraram-me muitas vezes, ainda por último, na ocasião de uma infeliz batalha pela abolição do calabouço, uma coisa que qualquer um definiria como uma ingenuidade. Oxalá que fosse isso! A verdade é que Francisco (São Francisco de Assis), justamente porque melhor do que qualquer outro interpretou Cristo, desceu mais ao fundo que qualquer outro no abismo do problema penal. Francisco, só Francisco compreendeu, beijando o leproso, o que quis dizer Jesus com o convite a visitar os encarcerados. Os sábios, os quais continuam a considerar a pena, segundo uma fórmula célebre, como um mal que sofre o delinqüente pelo mal que ele causou, ignoram ou esquecem aquilo que Cristo disse a propósito do demônio que não serve para expulsar o demônio: não é com o mal que se pode vencer o mal.”�
�. CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. Trad. de Ricardo Rodrigues Gama – 3ª edição Campinas: Russell Editoras, 2009, p. 25.

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