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Constituição e Constitucionalismo

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Constituição, constitucional, constitucionalismo. 
Constitucionalismo é um termo bastante recente no vocabulário político italiano e o seu uso não está ainda totalmente consolidado. Para uma primeira definição, convém partir do significado que possuem as palavras "Constituição" e "constitucional" na ciência jurídica continental e inglesa. 
Na esfera do velho e do novo positivismo jurídico só é possível um conhecimento certo, e, se não universal, pelo menos intersubjetivo, se, na pesquisa, prescindir-se de todo o juízo avaliatório, se se desprezar toda a premissa jusnaturalista ou de valor, estranhos à ciência. Por conseguinte, tanto na escola normativa, que tem seu máximo expoente em Hans Kelsen, como na institucional, que tem na Itália seu mestre em Santi Romano, o termo Constituição possui um significado meramente descritivo, perfeitamente igual ao que possui nas ciências naturais. 
Esse significado científico é absolutamente independente e autônomo de qualquer relação com o conteúdo concreto da Constituição que, por sua vez, seria político e axiológico. A Constituição é, de fato, a própria estrutura de uma comunidade política organizada, a ordem necessária que deriva da designação de um poder soberano e dos órgãos que o exercem. Desse modo, sendo a Constituição imanente a qualquer sociedade, é necessário distinguir o juízo científico sobre as características próprias de cada Constituição, tanto sob o aspecto formal como sob o aspecto material, do juízo ideológico sobre o caráter constitucional ou não constitucional de um regime. 
Para o jurista, todos os Estados – portanto, também os absolutistas do século XVII e os totalitários do século XX – têm uma Constituição, uma vez que existe sempre, tácita ou expressa, uma norma básica que confere o poder soberano de império; que se imponham depois limites a essa soberania ou que seu exercício seja repartido por diversos órgãos pouco importa: ubi societas, ibi ius. Seria, assim, função do constitucionalismo traçar os princípios ideológicos, a base de toda a Constituição e da sua organização interna. Todavia, dado que a ciência não se pode limitar a afirmar tautologias, para ordenar seu material empírico é preciso lançar mão das classificações e tipologias; apresenta-se assim, de novo, o problema da distinção entre as diversas Constituições e, com isso, reintroduzem-se os juízos de valor que os critérios de distinção pressupõem.
A ciência jurídica usa também em suas tipologias o adjetivo "constitucional" contrapondo-o a "absoluto" e "parlamentar" para distinguir três formas diversas de monarquia; designa um sistema de Governo em que os ministros, conquanto governem baseados em um Estatuto ou Carta, são apenas responsáveis perante a Coroa, enquanto perante o Parlamento não têm senão responsabilidade penal – não política – por traição ou violação da Constituição. "constitucional" designa, em outros termos, uma forma de Estado baseada na separação dos poderes, na qual o poder é quase de parceria (para alguns, trata-se ainda de uma monarquia "dualista", para outros de um passo mais além) entre o rei e o Parlamento: uma forma de Estado que, historicamente, sucede, ou melhor, substitui a monarquia absoluta, na qual o poder está totalmente concentrado nas mãos do rei, prossegue, ou antes, evolve na monarquia ou na república parlamentar, em que o poder está nas mãos do povo, que elege a assembléia ou assembléias representativas, as quais, por sua vez, escolherão o Governo. 
Mas também aqui se admite a divisão dos poderes, na medida em que o chefe do Estado, rei ou presidente, embora não responsável, conserva ainda uma margem mais ou menos grande de poder, aquele poder indispensável à manutenção do equilíbrio entre os diversos órgãos constitucionais. Desse modo, é monarquia constitucional a forma de Estado instaurada na Inglaterra depois da Gloriosa Revolução de 1688-1689, na França da época da Restauração, na Bélgica com a Revolução de 1830, na Itália com o Estatuto de 1848, na Alemanha de Bismarck, na Rússia após a Revolução de 1905. 
Essa definição, embora apresente indubitáveis vantagens no plano tipológico, corre o risco de ser escolástica e extrínseca, na medida em que, definindo tão restritamente o termo constitucional, menos amplamente que o de Constituição, acaba por colher apenas o que é acidental nesses regimes, deixando fugir o que lhes é essencial.
Se atendermos ao significado concreto que tiveram no século XIX as palavras Constituição e constitucional, notaremos que a ciência jurídica realizou uma obra de lenta mas de inflexível depuração dos valores nelas originariamente implícitos, esvaziando-as, assim, de alcance político para garantir-lhes um uso neutro na pesquisa científica. 
Contudo, a hodierna definição de Constituição é demasiado ampla, a de constitucional demasiado restrita, para nelas basearmos o significado que hoje possui o termo constitucionalismo no pensamento e na ciência política, ou melhor, naquela parte da ciência política que se preocupa com os problemas da técnica constitucional. Constitucionalismo não é hoje termo neutro de uso meramente descritivo, dado que engloba em seu significado o valor que antes estava implícito nas palavras Constituição e constitucional (um complexo de concepções políticas e de valores morais), procurando separar as soluções contingentes (por exemplo, a monarquia constitucional) daquelas que foram sempre suas características permanentes.
Foi dito, usando uma expressão bastante abrangente, que o constitucionalismo é a técnica da liberdade, isto é, a técnica jurídica pela qual é assegurado aos cidadãos o exercício dos seus direitos individuais e, ao mesmo tempo, coloca o Estado em condições de não os poder violar. Se as técnicas variam de acordo com a época e as tradições de cada país, o ideal das liberdades do cidadão continua sendo sempre o fim último; é em razão desse ideal que se preordenam e organizam as técnicas. Entre essas podemos citar especialmente duas. 
Afirmou-se, por um lado, que o constitucionalismo consiste na divisão do poder, de modo que se impeça todo o arbítrio; mas, se a aversão ao arbítrio constitui o fim último do constitucionalismo, os modos de "divisão do poder" parecem, no entanto, não ser apenas historicamente diversos, como também seguir lógicas assaz distantes: temos a divisão do poder horizontal, a famosa separação dos poderes, e a divisão vertical, o Federalismo. 
Por outro lado, afirmou-se também que o constitucionalismo representa o Governo das leis e não dos homens, da racionalidade do direito e não do mero poder; mas também aqui são diversas as soluções históricas de "limitação do poder". Assim, para definir o termo, é necessário, antes de tudo, aceitar o valor que nele se acha implícito, um valor que poderemos resumir na defesa dos direitos da pessoa, do indivíduo, do cidadão. 
Em segundo lugar, é preciso definir tipologicamente, com base na história, as diversas soluções que, na qualidade de meios, têm sido oferecidas para alcançar tal fim e foram formalizadas mediante conceitos outros que não o de constitucionalismo, como o de separação dos poderes, garantia, estado de direito ou Rechtsstaat e Rule of law. Trata-se por isso de saber se o constitucionalismo hoje, sem negar essas experiências do passado, tem um significado particular e específico.
 Separação dos poderes e governo misto. A definição mais conhecida de constitucionalismo é a que o identifica com a divisão do poder ou, de acordo com a formulação jurídica, com a separação dos poderes. A favor dessa identificação existe um precedente assaz respeitável, La déclaration des droits de l'homme et du citoyen de 1789, que tão grande influência havia de ter nas mudanças constitucionais da Europa no século XIX, preceituava no artigo 16: "Toda sociedade, em que não for assegurada a garantia dos direitos e determinada a separação dos poderes, não tem Constituição". 
De acordo com tal definição, ainda hoje é habitual, na ciência jurídica como na política, identificar o constitucionalismo com a separaçãodos poderes, com o sistema de freios e contrapesos e com a balança dos diversos órgãos. Tome-se, por exemplo, a obra já clássica de Carl Friedrich, Constitutional government and democracy, na qual se poderá ler: "O absolutismo, em qualquer das suas formas, prevê a concentração do exercício do poder; o constitucionalismo, pelo contrário, prevê que esse exercício seja partilhado". 
Diz, ainda, mais pormenorizadamente: "Com a divisão do poder, o constitucionalismo garante um sistema eficaz de freios à ação do Governo. Para estudá-lo é necessário examinar os métodos e as técnicas que permitem estabelecer e manter esses freios (a fim de garantir) o fairplay e tornar, assim, o Governo responsável". O constitucionalismo coincide, desse modo, para muitos, com a separação dos poderes. A tentação de aceitar essa identificação é muito forte, se não for por outros motivos, ao menos pelo prestígio das pessoas que a corroboraram: basta citar os nomes de Locke, Montesquieu e Kant.
Contudo, o princípio jurídico da separação dos poderes, tão freqüentemente proclamado e exaltado pela ciência jurídica, se não for aprofundado, corre o risco de se tornar um dogma ambíguo e misterioso por duas razões: de um lado, pela diversidade de maneiras como juridicamente se concretizou até hoje a exigência da divisão do poder e, do outro, pela impossibilidade de explicar, de modo suficientemente realista, a dinâmica do poder nos nossos sistemas democrático-parlamentares, partindo desse dogma, formulado no século XVIII com vistas a regimes monárquicos, quando a aristocracia ainda constituía poder político. Não só isso: é um dogma perigoso, porque não garante eficazmente a liberdade do cidadão.
No princípio da separação dos poderes vão desembocar essencialmente duas soluções, que poderemos ilustrar melhor com uma referência ao pensamento de Montesquieu e de Kant. Montesquieu iniciara o famoso capítulo do Esprit des lois (1748) sobre a Constituição inglesa, separando os poderes legislativo, executivo e judiciário. Afirmara ainda: "Tudo estaria perdido se uma só pessoa, ou um só corpo de notáveis, de nobres ou de povo, exercesse esses três poderes: o de fazer as leis, o de executar as decisões públicas e o de punir os delitos ou contendas entre os particulares".
Contudo, depois de afirmar esse princípio, à medida que se vai adentrando no exame da Constituição inglesa, o problema ou a solução vão mudando. Na técnica da separação dos poderes é introduzido um novo elemento: a divisão do poder legislativo – "o que representa a vontade geral do Estado" – entre as classes ou os Estados medievais do reino. Na realidade, o Parlamento inglês é constituído pelo rei, pela nobreza temporal e espiritual e pelo povo. 
Montesquieu, para obter o equilíbrio efetivo entre os diversos poderes, introduz em sua construção o ideal clássico do Governo misto, que fora buscar no próprio pensamento político inglês. Assim, acrescentando ao novo princípio da separação dos poderes o velho tema do Governo misto, isto é, a divisão do poder legislativo, chega a esta conclusão: "Estando o corpo legislativo dividido em duas partes, mutuamente se refrearão uma à outra com o recíproco poder impeditivo. Ambas estarão vinculadas ao poder executivo, ligado, por sua vez, ao legislativo." 
Mais que a teoria da clara distinção das funções do Estado, Montesquieu apresenta a teoria de um Governo balançado, em que os diversos órgãos, num sistema de pesos e de contrapesos, realizam um equilíbrio constitucional capaz de obstar à consolidação de um poder absoluto. Mas, se examinarmos bem esse equilíbrio, notaremos que se trata mais de um equilíbrio social do que de um equilíbrio constitucional: confundindo o poder de sentido jurídico com o poder de sentido sociológico, Montesquieu identifica um órgão do Estado com uma classe ou camada social.
Essa, que é a mais antiga versão da divisão dos poderes, é a que teve maior sucesso na Europa, na primeira metade do século XIX, por garantir, em uma fase histórica de transformações políticas, a manutenção de um certo equilíbrio social entre as classes. Em outras palavras, o poder estava dividido entre o rei, a nobreza e a burguesia, e era constitucional o regime que experimentava sua harmônica cooperação na formação da vontade do Estado. 
Além disso, o poder legislativo estava dividido, mas não limitado: podia fazer tudo o que queria, quando existia a harmonia e o concerto de vontades. O Estatuto Albertino de 1848, por exemplo, graças a uma interpretação extensiva cada vez mais liberal e democrática, que correspondia, não obstante, à mudança das relações de força, permitiu a transferência do equilíbrio constitucional: o poder executivo, antes responsável só perante o rei, tornou-se responsável perante a Câmara dos Deputados.
Poderíamos agora legitimamente perguntar o que é que ficou da fórmula de Montesquieu após o advento da democracia, que vê emanar todo o poder do povo. Menoscabada a identificação entre órgão do Estado e classe social, ficou apenas o conceito do equilíbrio constitucional, que impõe modos diversos e normas complexas à manifestação da vontade da maioria. Mas simples normas só podem frear, não limitar efetivamente tal vontade. 
A Constituição republicana italiana, ao estabelecer um sistema bicameral e manter diversas prerrogativas do chefe do Estado, é uma espécie de Constituição balançada, porquanto a vontade da maioria, tal qual resulta das eleições, é contida e refreada por complexos procedimentos, os únicos que lhe permitem expressar exigências válidas e legítimas. Quer-se uma Constituição balançada, pelo temor de que, concentrando todos os poderes numa única assembléia, isso traga o caos ou a tirania de uma maioria parlamentar.
 Separação dos poderes: leis, decretos, sentenças. A outra versão do princípio da separação dos poderes foi teorizada por Kant, mais ou menos reproduzida pela Constituição francesa de 1791. A Kant não interessava o empírico, complexo e enredado equilíbrio dos órgãos do Estado. Em Metaphysik der Sitten (1797), ele prefere antes compreender em sua natureza particular ou "dignidade" as diversas funções do Estado: legislativo, executivo, judiciário – "condições essenciais da formação do Estado (da Constituição), necessariamente derivadas da idéia deste último, são dignidades políticas". Para Kant, esses três poderes hão de ser autônomos e independentes em sua própria esfera. Devem, por isso, ser exercidos por pessoas distintas. Têm de ser coordenados e reciprocamente subordinados, "de tal maneira que um não possa usurpar as funções do outro ao qual oferece ajuda, mas tenha seu próprio princípio, isto é, ordene em qualidade de pessoa particular, embora sob a condição de respeitar a vontade de uma pessoa superior".
Mas essa versão, que separa radicalmente a função legislativa da executiva, foi de escassa utilidade prática, como o demonstraram as Constituições francesas de 1791, 1795 e 1848, nas quais um poder acabou por destruir o outro, ou serviu apenas, como escreveu Kelsen, para "reservar ainda ao monarca, reduzido à metade da sua autoridade pelo movimento democrático, a possibilidade de exercer sua influência no campo executivo", isto é, no campo da diplomacia, das forças armadas e da burocracia. Todavia, com o advento das repúblicas democráticas, enquanto na América a nítida separação entre o executivo e o legislativo encontrou no regime presidencial uma aplicação totalmente original, nos regimes parlamentares europeus perdeu importância a distinção das pessoas que exercem as duas funções, na medida em que o Governo se compõe de deputados, que respondem pela sua ação, diretamente perante a assembléia ou assembléias e, só indiretamente, perante as eleições.
Poder-se-ia, porém, sustentar que a distinção entre poder executivo e poder legislativo não assenta tanto nas pessoas que desempenham uma ou outra dessas funções como, sobretudo, na sua particular natureza jurídica: tais funções seriam radicalmente diversas. Afirmou-se juntamente com Rousseau e Kant que a distinção entre poder legislativoe poder executivo coincide com a de lei e decreto. Para Kant, a lei possui um valor universal, porquanto não exprime a vontade empírica da maioria, mas a vontade unitária do povo em que "cada um decide a mesma coisa para todos"; o decreto, pelo contrário, é um ato particular para casos particulares.
Se aceitarmos o rigor filosófico e jurídico dessa distinção, teremos de concluir que hoje existe uma perigosa confusão entre lei e decreto, uma vez que a distinção não depende do conteúdo do ato, mas só da sua fonte. Com leis formais, isto é, aprovadas pelo Parlamento, estatui-se sobre conteúdos particulares que deveriam antes ser regulados por atos administrativos: é o fenômeno das leis singulares ou leis-provisões, melhor conhecidas pelos italianos sob o nome de leggine, leis que não são gerais e abstratas, mas dizem respeito a esse ou àquele indivíduo, a essa ou àquela categoria de indivíduos facilmente identificáveis. 
Por outro lado, a lei é cada vez menos o resultado de uma iniciativa autônoma do Parlamento, já que, na maioria dos casos, as assembléias representativas limitam-se a votar os projetos de lei propostos pelo Governo. Em resumo, hoje se esqueceu da distinção entre direito e política, entre o legislar e o governar; na realidade, hoje se administra e governa por meio de leis, não segundo as leis. 
Assim, o Parlamento não é mais um órgão de controle do poder executivo, mas um órgão de Governo. Por sua vez, a ciência jurídica parece secundar essa tendência. Kant fez distinção entre leis, decretos e sentenças; era uma distinção qualitativa, pois correspondia às três essências diversas das funções do Estado. Mas a ciência jurídica moderna, ao contrário, estabelece uma distinção meramente quantitativa; para ela, leis, decretos e sentenças são normas jurídicas que apenas se diferenciam hierarquicamente no âmbito da ordem jurídica.
O princípio da divisão dos poderes parece, assim, tanto na versão de Montesquieu como na de Kant, pouco útil para a compreensão do funcionamento dos nossos sistemas parlamentares, nos quais perdeu valor toda distinção entre executivo e legislativo e existe, em lugar disso, a continuidade do poder ou um processo político que começa nas eleições e termina na ação do Governo. 
Esse princípio era certamente mais adequado a um sistema social em que havia dois ou três poderes, o do rei, o da nobreza e o do povo, do que ao nosso, baseado no Governo da maioria. Além disso, o Governo da maioria pode suportar complexos procedimentos, tais como o sistema bicameral e as prerrogativas do chefe do Estado; mas tais procedimentos não constituem uma verdadeira divisão do poder. De fato, o partido que obtiver a maioria nas eleições a terá também em ambas as Câmaras e, muito provavelmente, o chefe do Estado sairá das suas fileiras. Em resumo, existe um só poder, o poder político da maioria que governa. 
É como escreve Mirkine-Guetzévitch: "A essência do parlamentarismo moderno consiste na aplicação política do princípio majoritário ou da sua tradução em termo de Governo. O povo vota, os eleitos reúnem-se, nomeiam e formam um Governo; é assim que o povo elege, mediante a assembléia, o próprio Governo". Mas tal poder, mesmo se baseado no consenso, mesmo se disciplinado por complexas normas, pode tornar-se sempre arbitrário.
  As garantias. Ao princípio da separação dos poderes, ou melhor, às duas versões que dele apresentaram Montesquieu e Kant, juntaram-se no século XIX duas teorias que hoje é freqüente identificar com o constitucionalismo: referimo-nos à teoria das garantias, na França, e ao estado de direito ou Rechtsstaat, na Alemanha.
A teoria das garantias, que tem seu principal teórico em Benjamin Constant, acentua sobremaneira, em polêmica com Rousseau e com a interpretação jacobina da vontade geral, a necessidade de tutelar, no plano constitucional, os direitos fundamentais do indivíduo, ou seja, a liberdade pessoal, a liberdade de imprensa, a liberdade religiosa e, finalmente, a inviolabilidade da propriedade privada. Desse modo, o problema da organização do Estado se subordina à necessidade de garantir a todos os indivíduos a liberdade do poder político, entendida aqui, seja a instauração de uma via legal no exercício do poder seja a afirmação de uma esfera de autonomia do indivíduo que o Estado não poderá legalmente violar. Isso leva a uma reinterpretação do conceito de soberania, cujo conteúdo, nos sistemas representativos, em que a soberania do povo é exercida em realidade por seus deputados, só pode ser definido de modo negativo. 
"Soberania", como afirma Constant em seu Cours de politique constitutionnelle (1818-1820), não significa que o rei ou o povo possam fazer qualquer coisa, mas "nenhum indivíduo, nenhuma facção, nenhuma associação particular se pode arrogar a soberania, se essa não lhe for delegada. Mas daí não se segue que a universalidade dos cidadãos, ou aqueles que estão investidos da soberania, possa dispor soberanamente da existência dos indivíduos".
Contudo, essa soberania limitada é ainda posta em ato no plano jurídico com a velha separação dos poderes, ou com a combinação dos diversos interesses dos depositários do poder, embora se comece a pressentir que, quando os poderes divididos formam coalizão, então o despotismo é inelutável. Por isso a separação dos poderes se apresenta bem mais complexa: temos o poder executivo, politicamente responsável perante o Parlamento; o poder legislativo, em mãos das duas Câmaras (isto é, o "poder representativo durável" do Senado e o "poder representativo da opinião" da Câmara dos Deputados); o poder judiciário, cuja independência se tenta robustecer com a inamovibilidade dos juízes. A novidade está num "poder neutro", de que está investido o rei, que tem a exclusiva função de ver que os outros operem em harmonia, cada um no seu âmbito peculiar, eliminando e resolvendo os possíveis desencontros e conflitos, mas sem participar das suas funções específicas. 
Além disso, temos um "poder municipal" (das comunas e dos distritos), que não depende do poder central: em oposição ao princípio da república "una e indivisível", reafirma-se a tradição federalista que reclama centros de autogoverno e, conseqüentemente, de resistência às ambições do poder central. Como fundamento dessa complexa oscilação entre órgãos e poder, como garantia dos direitos do indivíduo, coloca-se, por fim, a liberdade política: ela deriva da liberdade religiosa, torna-se atuante por meio da liberdade de imprensa, tem como objetivo sensibilizar a opinião pública e, por meio dessa, a assembléia, que registra suas tendências e, com ela, participa da formação da vontade do Estado.
   O "Rechtsstaat". A idéia de liberdade política falta, em vez disso, no ideal do estado de direito alemão: um ideal que teve sua origem na Prússia do século XVIII, sob a influência de diversas experiências culturais e políticas. Antes de tudo, o despotismo iluminado afirmava a impessoalidade do poder: soberano não é o rei, nem é o povo, mas só e exclusivamente o Estado, que os sintetiza e supera a ambos. Todos, do rei ao mais ínfimo funcionário, são servidores do Estado, contra o qual os cidadãos não podem opor os próprios direitos originários, porquanto sua soberania não conhece limites. Por outro lado, a codificação promovida por Frederico II difunde o ideal da certeza da lei, justamente quando a formação de uma complexa máquina burocrática põe cotidianamente o cidadão em contato com a administração pública e, portanto, com seus possíveis abusos.
Segundo essa teoria, já que o Estado persegue seus fins só dentro das formas e limites do direito, ele deve garantir aos cidadãos a certeza da sua liberdade jurídica, uma liberdade sempre concedida pelo Estado. Por um lado, portanto, o Estado só pode interferir nos direitos subjetivos dos indivíduos se justificar sua ação com uma lei geral; por outro, deve manter como rigorosamente distinta a função executiva da função legislativa, operando aquela por meio de decretos que têm de estar conformes com as leis gerais: daí a necessidadede um controle constante da ação do executivo, isto é, da administração, para não serem violadas as normas abstratas e gerais impostas pelo legislativo.
O controle da atividade da administração pública é mantido, às vezes, para garantir a subordinação de um órgão do Estado a outro (ou, como ocorre na França, para garantir a obediência do executivo ao povo soberano), pela fiscalização do cumprimento da lei; outras vezes, para garantir e tornar eficaz a liberdade jurídica do cidadão. 
Essa finalidade vária repercute no órgão que há de exercer o controle: deve ser um órgão administrativo dependente do poder político, ou um órgão judiciário verdadeiramente independente nos conflitos entre o Estado e o cidadão? Quem resolveu essa controvérsia foi Rudolf von Gneist: em Der Rechtsstaat (1872), questionando a jurisprudência do Conselho de Estado francês, no que a política prevalecia sobre o direito, defendeu a necessidade de tribunais, administrativos sim, mas independentes, capazes de unir a competência, no enfrentar os delicados e complexos problemas da administração, a uma real liberdade de juízo. Sua obra contribuiu grandemente para a evolução da jurisprudência administrativa do continente.
O conceito do Estado de direito, ou da justiça na administração, possui ainda uma grande atualidade, uma vez que o Estado moderno vê multiplicarem-se enormemente suas tarefas administrativas, sobretudo no campo econômico, como conseqüência da necessidade cada vez mais ampla de uma política social. A esse propósito é preciso lembrar que a teoria do Rechtsstaat nunca afirmou o princípio liberal de que o Estado há de limitar-se a aplicar o ordenamento jurídico, sem intuitos administrativos, ou apenas a tutelar os direitos dos indivíduos. 
Contudo, ao limitar a "justiça" ao campo administrativo, excluindo-a do constitucional, essa teoria apresenta o grave inconveniente de não opor outros limites ao poder do Estado, senão os de caráter processual: os direitos individuais, teoricamente expostos por Georg Jellinek em seu System der subjektiven öffentlichen Rechte (1892), são só o resultado de uma autolimitação por parte do estado. 
Em resumo: se o Estado de direito é só um modo de exercer o poder, o direito não constituirá um verdadeiro e eficaz limite a tal poder, mas será apenas o modo de ele se externar, podendo-se chegar, assim, sem paradoxos, a uma forma de despotismo jurídico. Na verdade, a concepção do Rechtsstaat foi amadurecendo dentro do clima do positivismo jurídico, que une seu místico respeito pela lei a um modo de concebê-la absolutamente voluntarista, para o qual a lei outra coisa não é senão a imposição do soberano. 
O direito torna-se, assim, mera força, eliminando-se a fecunda antítese, fundamental em toda a história do constitucionalismo, entre o poder e os direitos individuais. Outras culturas, em vez disso, como aconteceu com a inglesa, distinguiram sempre na lei, além do fator formal, também o fator material, a ratio e não só a voluntas. Além disso, hoje, a própria justiça administrativa corre o risco de ser lograda pela maioria parlamentar: ao perder importância a distinção entre legislação e execução, entre leis e decretos, é sempre possível promulgar leis de conteúdo administrativo, a lex in fraudem legis, que priva o cidadão de toda a tutela jurídica eficaz.
   O "rule of law". Muito diferente e totalmente singular é a experiência constitucional inglesa, toda ela centralizada no princípio do rule of law, conceito tão difícil de definir como de traduzir: Governo da lei, regra do direito? Essa expressão fixa-se na Inglaterra no século XVII, mas assenta claramente em motivos medievais, para afirmar a igualdade dos cidadãos ingleses perante a lei e para combater todo o arbítrio do Governo que lesasse seus direitos legais. 
Na base do rule of law está uma experiência cultural e política do direito que é típica da Inglaterra. Enquanto a cultura alemã e a cultura continental eram levadas pelos próprios pressupostos teóricos a unir o Estado e o direito (ordenamento jurídico), a cultura inglesa desconhecia o conceito de Estado, teóricos a unir o Estado e o direito (ordenamento jurídico), a cultura inglesa desconhecia o conceito de Estado, usando antes o de Governo, que engloba as três funções clássicas, ou, pelo menos, a executiva e a legislativa. 
Além disso, ela afirmou sempre a autonomia do direito junto ou acima do Governo, ou a necessidade de subordinar o Governo ao direito.
Isso foi possível não só pela independência dos juízes em relação ao poder político, como também e sobretudo pelo caráter particular do direito inglês, que ainda hoje considera, junto com as normas de origem legislativo-parlamentar, o common law, um direito de que os juízes são conservadores e depositários: eles continuam a julgar, referindo-se aos precedentes judiciários, ou interpretando as leis do Parlamento dentro do espírito e segundo os princípios gerais do direito contidos no common law. Com a afirmação da onipotência parlamentar no século XVIII, ficou restrita à supremacia do common law, que, no início do século anterior, ainda autorizava os juízes a declararem nulas e sem efeito as leis do Parlamento contrárias ao direito e à razão. Contudo, ele revela ainda sua eficácia na autolimitação que o Parlamento põe à sua onipotência.
O maior teórico do rule of law é A. V. Dicey: em The law of the Constitution (1885), ao impugnar o direito e os tribunais administrativos franceses, mostra como esse princípio fundamental da Constituição inglesa supõe a exclusão de todo poder discricionário ou arbitrário, implicando, por isso, a igualdade dos cidadãos com o Governo perante os tribunais ordinários e afastando, desse modo, a possibilidade de um direito e de tribunais administrativos de tipo francês. Faz ainda uma afirmação teórica interessante: as leis constitucionais inglesas, as normas que em outros países estão contidas em uma Constituição escrita, não são fonte, mas conseqüência dos direitos subjetivos dos indivíduos, tais como são definidos e garantidos pelas Cortes judiciárias; a Constituição deriva das normas ordinárias do país. 
Contudo, no século XX, com a expansão das atividades econômicas e sociais dos Governos laboristas, veio a verificar-se que o princípio do rule of law, tal qual havia sido formulado por Dicey, não estava sendo de fato observado, precisamente porque inaplicável a sociedades desenvolvidas. Desse modo, não obstante sua luta a favor do rule of law, o que Dicey fez foi contribuir para o atraso no desenvolvimento de instituições que pudessem sujeitar a máquina burocrática a um efetivo controle.
 Governo limitado na antiguidade e na idade média. A limitação do constitucionalismo ao princípio da separação dos poderes revela-se, como já vimos, inadequada e errada: inadequada, se se quiser compreender a dinâmica política real das nossas instituições parlamentares; errada, se se buscam novos princípios constitucionais capazes de impedir o arbítrio da maioria governativa. Na realidade, a separação dos poderes foi ideada e articulada para uma sociedade ainda aristocrática, com um regime político monárquico; hoje, em vez disso, vivemos em sociedades democráticas, de sufrágio universal, quase sempre republicanas, ou nas quais a monarquia já não conserva os antigos poderes. 
A formação da orientação política do Estado não tem mais sua origem na colaboração dos diversos órgãos institucionais que representam os interesses das classes sociais; nasce da agregação da demanda política constituída pelos partidos. Assim, a atual divisão de órgãos pode obstar ou refrear os desígnios de um partido forte ou de uma maioria estável, mas é absolutamente insuficiente para garantir os direitos das minorias e para defender os cidadãos do abuso do poder, uma vez que esses órgãos podem estar nas mãos do mesmo partido. Por outro lado, dada a extrema complexidade da vida moderna, que exige rápidas e tempestivas intervenções do Governo na economia e na sociedade, uma excessiva divisão do poder pode criar-lhe obstáculos nocumprimento das suas legítimas e indispensáveis funções.
Mais: essa limitação do constitucionalismo à separação dos poderes é imperfeita sob o ponto de vista histórico, dado que compreende apenas um dos seus aspectos, o Estado misto, dando realce à sua versão mais moderna, a divisão dos poderes. Entre os gregos, por exemplo, quando Platão e Aristóteles punham o critério da distinção entre formas corretas e degeneradas de Governo na supremacia da lei, apresentavam outro aspecto do constitucionalismo que, na história do pensamento político ocidental, teria uma importância não inferior à do ideal do Estado misto, que remonta igualmente ao mundo clássico. 
Em seu livro As Leis, ao investir contra as formas degeneradas da democracia, escreve Platão: "Segundo as leis antigas, o povo não era senhor, mas, de certa maneira, um servo voluntário das leis". E Aristóteles repetia, em seu livro Política, que há democracias nas quais é soberana a lei e outras em que, ao contrário, é soberana a massa: "Isso ocorre quando a autoridade suprema concerne antes às deliberações das assembléias populares que à lei. E isso é obra dos demagogos. 
Nos Estados democráticos em que a lei é soberana não há demagogos e quem ocupa os mais altos cargos são os melhores dentre os cidadãos; mas onde as leis não são soberanas, surgem os demagogos. Um povo assim, tal qual monarca, procura governar por si, sem se sujeitar à lei; torna-se despótico; tal democracia corresponde ao que, entre as monarquias, é tirania".
Em termos modernos, o que era constitucional para os gregos eram as formas de Governo – monarquia, aristocracia, democracia – em que o poder não estivesse legibus solutus, mas fosse limitado pela lei.
Foi no princípio do Governo limitado, mais que no do Governo misto, na soberania das leis, mais que na separação dos poderes, que se inspirou o maior historiador e teórico do constitucionalismo europeu, o norte-americano Charles Howard McIlwain. Num ensaio escrito um dia depois da deflagração da Segunda Guerra Mundial, vendo já inadiável a escolha "entre as ordenadas normas do direito e os sistemas baseados na força, aparentemente muito mais rápidos e eficientes", McIlwain define assim o constitucionalismo: "É oportuno insistir que o mais antigo, o mais persistente e duradouro dos caracteres essenciais do verdadeiro constitucionalismo continua sendo o mesmo do início, a limitação do Governo à mercê do direito".
Mais sinteticamente: "Todo Governo constitucional é, por definição, um Governo limitado". Igual observação pode ser encontrada nas páginas de outro constitucionalista norte-americano, Edward Corwin, que, referindo-se a Aristóteles, escreve: "A antítese entre o impulso do homem que governa e a racionalidade da lei constitui, na realidade, um dos fundamentos sobre o qual se baseia a doutrina norte-americana em matéria de separação de poderes e, conseqüentemente, todo sistema norte-americano do direito constitucional".
McIlwain tinha certamente razão ao afirmar que o princípio da limitação do Governo à mercê do direito era a característica mais antiga e autêntica do constitucionalismo. Dessa tese ele parte para uma revalorização do pensamento político medieval, que a muitos poderá parecer desconcertante. Escreve: "Quem tentar relacionar o termo 'medieval' com algo de reacionário, como se habituaram a fazer hoje pessoas desmioladas, que medite bem antes. 
O absolutismo político é fruto dos tempos modernos; a Idade Média não queria saber disso". Na Idade Média, encontramos, de fato, não só as mais claras apologias do Governo limitado, como também, em consonância com elas, a mais explícita reivindicação do primado da função judiciária. A base sacral do poder do rei consiste unicamente no dever de administrar aos seus súditos "uma justiça reta e imparcial", porquanto "a tarefa de julgar pertence a Deus, não ao homem"; nesse sentido, o rei, juiz supremo, era apenas um ministro e servo de Deus. 
Assim escrevia um bispo do século IX, Jonas de Orléans: "Por isso foi colocado no trono real para proferir juízos justos, para prover pessoalmente e cuidar com atenção que ninguém se afaste, ao julgar, da verdade e da eqüidade".
O rei era, pois, a fonte da justiça, o soberano juiz do seu povo, a pessoa na qual os direitos dos súditos podiam encontrar sua tutela natural e a necessária garantia. Mas a consciência dessa altíssima função, que faz do rei um vigário de Deus, está aliada ao conhecimento da profunda diferença que existe entre o rei e o tirano, entre o servo de Deus e o ministro do diabo. Basta pensar na ampla e duradoura aceitação de que gozou durante a Idade Média a célebre afirmação de Isidoro de Sevilha, um bispo que viveu entre os séculos VI e VII: "Os reis são assim chamados por sua função de governar. Como o sacerdote é assim chamado por sacrificar, é também o rei por reger. Mas não rege quem não corrige. Portanto, agindo retamente, conservará o nome de rei; pecando, o perderá. Daí esse dito entre os antigos: 'Serás rei, se procederes com justiça, do contrário não o serás' ". 
E o critério para julgar a retidão do comportamento do rei era seu respeito pela lei. João de Salisbury, por exemplo, escrevia, no século XII, em Policraticus: "Entre um tirano e um príncipe existe essa única, ou, melhor, essa capital diferença: o príncipe obedece às leis, governando segundo seus preceitos o povo de que se considera servidor. Na verdade, a autoridade do príncipe deriva da autoridade do direito; e, mais que o poder, importa submeter às leis o poder supremo. Por isso, que o príncipe não pense que lhe é lícito o que se aparta da eqüidade e da justiça".
Alguém podia observar, não sem razão, que tais afirmações, muito comuns e assaz freqüentes na cultura medieval, pertencem à esfera teológica ou moral e não à esfera política ou jurídica. De fato, trata-se sobretudo de severas e respeitáveis admoestações, dirigidas por clérigos aos príncipes, com o propósito de lhes recordar os deveres morais e religiosos que têm para com seu soberano, que é Deus, antes do que para com seu povo. 
Na história medieval, não é raro o contraste entre os princípios éticos ou religiosos e a realidade do exercício do poder. A observação seria indubitavelmente justa e pertinente. Contudo, são precisamente esses princípios éticos aceitos na Inglaterra, desde o século XIII, quer para descrever a natureza particular do direito inglês, bem diferente do romano, quer para diferenciar o sistema de Governo britânico do francês. 
Tome-se, por exemplo, Henry de Bracton, um juiz da Corte do rei, que escreveu na primeira metade do século XIII um tratado monumental sob o título De legibus et consuetudinibus angliae, obra que se tornaria bem depressa texto clássico e seria a base da formação dos legistas ingleses até os fins do século XVII. Pois bem, Bracton afirma que "não há rei onde governa a vontade e não a lei", "que o rei não possui outro poder sobre a terra senão aquele que lhe confere o direito", "que o seu poder é o do direito, não o da injustiça". 
E é interessante cotejar esse princípio, que Bracton recalcou nos mais diversos pontos do seu tratado, com as afirmações dos glosadores bolonheses, bem conhecidas do legista inglês. Bracton afirmou claramente que "o rei está subordinado à lei, porque é a lei que faz o rei". Um século antes, em Roncaglia, o arcebispo de Milão, dirigindo-se a Frederico Barba-Roxa, dizia, inspirando-se nos mestres bolonheses: "Tua voluntas ius est", a tua vontade é direito, colocando assim o imperador acima da lei, segundo a afirmação do Digesto: "O que aprouve ao príncipe tem força de lei".
Trata-se, como vemos, de duas concepções radicalmente opostas da natureza do poder, pois uma realça a lei, que limita o poder real, a outra realça a vontade do rei, criadora da lei. São duas concepções jurídicas das quais evolveram duas formas diversas de Estado, que hoje denominamos monarquia limitada e monarquia absoluta. 
Um jurista francês, Adhémar Esmein, explica a consolidação do absolutismo na França, no século XVI, pelo sucesso quealcançou em sua pátria a obra dos glosadores bolonheses e do maior de todos eles, Accursio, na qual se encontra, tirada de Ulpiano, a famosa máxima do príncipe legibus solutus.
Essa diferença entre a monarquia "limitada" inglesa e a monarquia "absoluta" francesa era já evidente para o último grande constitucionalista inglês da Idade Média, John Fortescue. Provinha da mesma categoria de Bracton, da dos legistas, que tinham elaborado o sistema jurídico inglês do common law. Ao conhecimento do direito e da Constituição inglesa unia uma notável experiência política, por ter participado da Guerra das Duas Rosas, no séquito dos Lancaster, e por ter acompanhado Eduardo, príncipe de Gales, no exílio de Paris. Todas as obras de Fortescue insistem e tornam a insistir na mesma distinção: a distinção entre a monarquia absoluta e a monarquia limitada ou, para usar suas expressões, entre o dominium regale e o dominium politicum et regale. 
Atrás dessas definições é muito fácil descobrir a França e a Inglaterra. O critério de distinção entre os dois sistemas de Governo foi assim esboçado em De laudibus legam angliae: "O primeiro rei – o francês – pode governar seu povo com as leis que ele próprio faz; por isso, pode impor aos seus súditos, sem o seu consenso, os tributos e gravames que ele quiser. O segundo rei – o inglês – não pode governar o seu povo com leis diversas daquelas em que ele consente; não pode, por isso, impor aos seus súditos qualquer ônus sem seu consentimento".
Ora, pode-se agora perguntar o que é, para os ingleses, essa lei, tão freqüentemente invocada e proclamada, que o rei não pode de modo algum mudar sem se expor a converter-se em tirano. Não é certamente a lei no sentido moderno da palavra, isto é, a prescrição do legislador, exatamente porque, na Idade Média, era em grande parte desconhecida a redução do direito a mero preceito: a lei não era criada, mas declarada, não era feita, mas lembrada; finalmente, as leis que eram declarações por parte de órgãos ad hoc (o rei só, ou o rei no Parlamento) eram pouquíssimas. 
Na Idade Média, a palavra lei tem um significado bastante mais vasto. Para Fortescue, por exemplo, é lei, antes de tudo, a lei natural "que é a mãe de todas as leis humanas"; são lei, em segundo lugar, os costumes antiquíssimos da Inglaterra, que são ótimos, porque mais antigos que as leis de Roma; e são também, finalmente, leis, em sentido estrito, os estatutos aprovados com o consenso de todo o Reino", presente no Parlamento. Mas, se atentarmos bem, a verdadeira lei é a segunda, ou seja, o costume, que, na medida em que resistiu por longo tempo, obtendo o consenso de contínuas gerações, demonstrou ser justa; a ela se hão de adequar, portanto, as diversas leis do Parlamento, meramente declarativas do direito. 
Em suma, o valor das leis consuetudinárias reside no fato de, como escreveu Glanvill, legista do século XII, elas serem mores a populo conservati, costumes conservados pelo povo, ou, como repetiria mais tarde Bracton, serem approbatae consensu utentium, isto é, aprovadas pelo consenso dos que as usam.
É dentro dessa cultura político-jurídica que vai amadurecendo o princípio do rule of law, do Governo limitado ou da supremacia do direito, daquele direito que não é expressão da exata vontade do legislador, mas é sobretudo costume, o costume dos direitos legais dos cidadãos ingleses. O tema do Governo limitado, da supremacia do direito, é outra das idéias centrais da história do constitucionalismo, mais antiga e mais modernaque o tema do Governo misto e da separação dos poderes: não se trata de dividir o poder, mas de limitá-lo, opondo ao demonismo da política a racionalidade do direito.
  O governo limitado dos modernos. O primado da lei é um tema comum ao Governo limitado da Idade Média e às modernas democracias constitucionais. Não podemos, porém, perder de vista as profundas diferenças existentes entre a vida jurídica medieval, hoje ainda viva e presente nos países do common law, e o direito das modernas democracias do continente: então, o direito era uma espontânea e livre expressão da sociedade, evoluindo de há séculos, no qual não podia intervir o arbítrio criador do legislador; hoje o direito é expressão da exata e consciente vontade soberana do povo, explicitada por meio de um órgão ad hoc, a assembléia representativa. Outrora, o direito era parte integrante de uma vida social espontânea; hoje, é um instrumento com que o Estado democrático intervém na sociedade para manter a paz social e prevenir as necessidades futuras. 
Enfim, outrora, o direito era quase um fato natural e espontâneo, hoje é uma criação consciente; outrora o direito era também justiça, hoje é sobretudo imposição da maioria. A diferença é, como se vê, enorme; entretanto, o mundo moderno sentiu a necessidade de manter, ou de voltar ao princípio medieval do primado da lei, reinterpretando-o de forma mais apropriada às exigências dos novos tempos.
O princípio da primazia da lei, a afirmação de que todo poder político tem de ser legalmente limitado, é a maior contribuição da Idade Média para a história do constitucionalismo. Contudo, na Idade Média, ele foi um simples princípio, muitas vezes pouco eficaz, porque faltava um instituto legítimo que controlasse, baseando-se no direito, o exercício do poder político e garantisse aos cidadãos o respeito à lei por parte dos órgãos do Governo. 
A descoberta e a aplicação concreta desses meios são próprias, pelo contrário, do constitucionalismo moderno: devem-se particularmente aos ingleses, em um século de transição como foi o século XVII, quando as Cortes judiciárias proclamaram a superioridade das leis fundamentais sobre as do Parlamento, e aos norte-americanos, em fins do século XVIII, quando iniciaram a codificação do direito constitucional e instituíram aquela moderna forma de Governo democrático sob a qual ainda vivem.
É o momento de esboçar sucintamente as três características principais que distinguem a aplicação atual do princípio do Governo limitado, a fim de que se torne mais claro o que o diferencia da herança medieval. O princípio do Governo limitado torna-se hoje atuante, em primeiro lugar, mediante uma Constituição escrita, que contém variadas normas jurídicas organicamente vinculadas entre si: essas normas não só regulam o funcionamento dos órgãos do Estado como consagram sobretudo os direitos dos cidadãos, postos como limite ao poder do Estado. A Constituição baseia sua legitimidade em um duplo fundamento: no próprio conteúdo das suas normas, que se impõem por sua intrínseca racionalidade e justiça, e em sua fonte formal, isto é, em sua emanação da vontade direta e soberana do povo, manifesta por meio de uma Assembléia Constituinte e/ou referendum. 
Se entre o século XVII e o XVIII, época do jusnaturalismo, prevaleceu o primeiro fundamento, hoje, com a redução do direito a mera prescrição, tornou-se predominante o segundo. Em segundo lugar, a Constituição moderna possui um caráter rígido e inelástico, no sentido de que suas normas não podem ser nem modificadas nem interpretadas pela vontade legislativa normal, uma vez que são hierarquicamente superiores às normas ordinárias, porquanto o poder constituinte é superior ao legislativo. 
Portanto, para modificar a Constituição há um procedimento específico a cumprir, que requer uma maioria qualificada. Existe uma terceira característica, a mais importante de todas, pois é a que torna eficaz a supremacia da lei ou, melhor, da Constituição. Trata-se do poder judiciário em conjunto, como na América, ou de um órgão ad hoc, como na Itália; em suma, de uma Corte judiciária que, além de dirimir os eventuais conflitos entre os diversos órgãos do Estado, zela pela justiça das leis, isto é, pela sua conformidade com as normas fundamentais. 
A existência desse órgão é essencial porque, de outro modo, não existiria qualquer outro remédio contra a violação da Constituição por parte do Governo-maioria, afora o direito abstrato à revolução ou uma hipotética possibilidade de recorrer à força.
Convémainda determo-nos um pouco em uma nova definição do constitucionalismo, não muito freqüente na nossa literatura política, que se baseia na oposição entre direito e poder, racionalidade e força. Parte de uma clara distinção entre Constituição e Governo. A Constituição, por ser anterior e superior ao Governo, pode limitar seu poder; quando violada, o Governo se torna anticonstitucional, arbitrário, ilegítimo. O conceito de Governo limitado é diferente do de separação dos poderes. Como já vimos, o princípio da separação dos poderes se reduz hoje a simples normas de procedimento como meio legítimo de expressão do poder da maioria. 
Mas, sempre que as regras são respeitadas e existe concordância entre os vários órgãos do Estado, a vontade da maioria do Parlamento é onipotente e não há leis que a possam limitar. Enquanto o Estatuto Albertino só punha em ato esse aspecto do constitucionalismo, a Carta fundamental da república italiana atende também ao outro, o do poder limitado pela lei, dado que não estabelece apenas regras processuais para a formação da vontade legislativa, mas impõe-lhe também limites legais bem determinados, tornando-os eficazes por meio de um órgão não político, que tem a função judiciária de vigiar e ver se a vontade da maioria, expressa em lei, está ou não em conformidade com a Constituição, e, caso não o esteja, de declarar nula e sem efeito essa lei.
Assim, em um sistema político representativo, que realize o princípio do Governo limitado, a função judiciária acabará por adquirir um peso bastante maior no equilíbrio constitucional do que em um sistema baseado na mera separação dos poderes. Voltamos assim ao outro grande tema de Montesquieu, que acompanha o da divisão do poder político entre os Estados do reino: o da independência da magistratura. Essa só poderá ser verdadeiramente efetiva em um Governo limitado; isso porque o primado do direito ou da jurisdictio sobre o poder exige o robustecimento da função que visa justamente à defesa do mesmo direito.
Essa transposição do equilíbrio constitucional do legislativo para o judiciário e essa nova relação entre o poder e o direito indicam certamente uma ruptura com a nossa tradição política mais recente, uma ruptura que não é ainda plenamente clara para a nossa cultura política. Isso era necessário para o advento da democracia. No passado, a garantia contra o poder arbitrário se achava sobretudo nos corpos representativos que controlavam o Governo. 
Hoje, ao contrário, os corpos representativos exercem uma função de controle bastante mais reduzida, porque é por meio dos deputados que o povo escolhe o Governo: as assembléias são assim parte integrante do próprio Governo. Para se encontrar uma nova garantia contra o poder arbitrário, para tutelar os direitos dos cidadãos, é mister, portanto, recorrer à função judiciária, a única capaz de tornar efetiva a supremacia da lei sobre o Governo.
É justamente na perspectiva de pôr novos limites ao poder de Governo que a temática constitucionalista adquiriu novo vigor no âmbito do Welfare State, ou Estado do bem-estar. Tem-se em vista o Estado, gestor da economia da grande família pública: levada em conta a relação entre impostos e gastos, entre receita e despesa, quer-se uma Constituição fiscal para impedir uma excessiva apropriação pública dos rendimentos, para se obter um balanço equilibrado, para combater a inflação, uma Constituição fiscal que prescreva amiúde, em tais matérias, a necessidade de maiorias qualificadas.
  Constitucionalismo e democracia política. Parece, à primeira vista, não ser possível identificar o constitucionalismo com a democracia, se bem que, depois, seja difícil imaginar em concreto uma democracia não constitucional. Na realidade, o pensamento democrático teve um só problema essencial: o de mostrar como a soberania é um direito inalienável e imprescritível do povo. 
Como conseqüência, buscou ou fomentou formas de convivência onde se conferisse ao povo não só a mera titularidade, como também o concreto exercício do poder soberano. Impossível em um grande Estado, a democracia direta sonhada por Rousseau se traduziu em institutos particulares, como a iniciativa legislativa popular e o referendum. Se os democratas deram maior atenção à fonte do poder soberano, os constitucionalistas puseram mais em evidência, sobretudo, o problema dos limites e dos modos de exercício de tal poder, que não podemos adjetivar de "soberano", justamente porque uma soberania limitada é quase uma contradição nos termos. 
Desse modo, se a democracia é o Governo da maioria, poder-se-ia paradoxalmente afirmar que essa forma de constitucionalismo torna efetivo o Governo da minoria. Para fazer uma lei, bastam 51 votos contra 49; e, na democracia, a minoria tem o dever de se sujeitar à vontade da maioria. Mas, em um sistema constitucional, no qual vigore o princípio do Governo limitado, há normas, precisamente as da Constituição, que uma simples maioria de 51 votos não poderá mudar, exigindo-se para tanto uma maioria de 67% dos votos; e, em certos Estados, há também normas, as que sancionam os direitos do homem e do cidadão, que nenhuma maioria pode ab-rogar. Dessa vez parece ser a vontade da maioria a ter de ceder à vontade da minoria; mas, se se pensar que com a Constituição o povo soberano entende pôr limites ao poder que, com as eleições, delega normalmente a seus representantes, compreender-se-á que essa é só uma limitação aparente do princípio democrático. 
Trata-se, de preferência, de uma limitação funcional à própria existência da democracia, como acentuou Luigi Einaudi em um ensaio aparecido em janeiro de 1945: "Esses freios têm por fim limitar a liberdade de legislar e de atuar dos grupos políticos governantes, escolhidos pela maioria dos eleitores. Aparentemente, viola-se o princípio democrático que dá o poder à maioria; na realidade, limitando-lhe os poderes, os freios defendem a maioria da tirania de quem, de outro modo, agiria em nome próprio; fazendo assim, fica implicitamente salvaguardada a maioria".
Há outra diferença que se pode observar quando se tenta determinar com exatidão o conteúdo da palavra liberdade, tão repetida nas páginas tanto dos constitucionalistas como dos democratas. Para aqueles, a palavra liberdade tem um significado essencialmente jurídico; seria, por isso, mais acertado falar de liberdades no plural, liberdades juridicamente amparadas contra o poder da maioria. Para os democratas, em vez disso, a liberdade é, em primeiro lugar, um valor ético: é a liberdade para o indivíduo, que se converte em ato por meiodo Estado, ou seja, pela direta participação na coisa pública. 
Em outras palavras: os constitucionalistas reivindicam para o indivíduo uma ampla esfera de liceidade, impondo conseqüentemente ao Estado o dever de não impedir o exercício desses direitos; os democratas, pelo contrário, querem a participação de toda a comunidade na formação da vontade do Estado, de sorte que essa coincida com a própria vontade do povo. 
Desse modo, obedecendo ao Estado, os cidadãos obedecem apenas a si mesmos: tal é a mística da vontade geral que nos vem da tradição jacobina francesa.
Para o jurista, todos os Estados – portanto, também os absolutistas do século XVII e os totalitários do século XX – têm uma Constituição, uma vez que existe sempre, tácita ou expressa, uma norma básica que confere o poder soberano de império; que se imponham depois limites a essa soberania ou que seu exercício seja repartido por diversos órgãos pouco importa: ubi societas, ibi ius. Seria, assim, função do constitucionalismo traçar os princípios ideológicos, a base de toda a Constituição e da sua organização interna. Todavia, dado que a ciência não se pode limitar a afirmar tautologias, para ordenar seu material empírico é preciso lançar mão das classificações e tipologias; apresenta-se assim, de novo, o problema da distinção entre as diversas Constituições e, com isso, reintroduzem-se os juízos de valor que os critérios de distinção pressupõem.
Trata-se, portanto, de doutrinas diversas,facilmente separáveis no plano puramente conceptual; mas não são doutrinas contraditórias, porque, embora tenha havido no passado regimes constitucionais não democráticos, não conhecemos hoje outra forma possível de democracia senão a constitucional. De fato, a liberdade positiva de participar da formação da vontade do Estado exige, como condição necessária, a liberdade negativa, isto é, que o Estado não tolha os direitos da liberdade de expressão, da liberdade de imprensa, de associação, de religião, etc.; alias, diminuiriam as próprias condições de uma participação autônoma na formação dessa mesma vontade, como acontece nos regimes totalitários, nos quais os grupos que estão no poder organizam desde cima, sob lista única, a presença das massas no Estado. 
Mais: a democracia foi definida como Governo da maioria; mas, se essa maioria tivesse um poder absoluto e ilimitado, ela poderia subverter as regras do jogo e destruir assim as próprias bases da democracia, coisa sempre possível, se pensarmos que, em um grande Estado, a própria representatividade, ao limitar o principio democrático, acarreta o perigo de que a vontade da maioria dos deputados não se ajuste sempre a vontade da maioria dos eleitores. Por conseguinte, hoje o constitucionalismo não é outra coisa senão o modo concreto como se aplica e realiza o sistema democrático representativo.
Contudo, o uso dessa nova óptica no exame dos modernos sistemas representativos, que realizam o principio do Governo limitado, implica a reorganização ou a eliminação de dois conceitos fundamentais que ainda dominam profundamente a cultura política européia. Referimo-nos aos conceitos de soberania e de povo e, conseqüentemente, ao de Estado, em cujo âmbito o constitucionalismo não tem como se desenvolver. 
Uma soberania verticalmente dividida, como nos sistemas federais, ou limitada por procedimentos que garantem a supremacia da Constituição e uma contradição nos termos, se definirmos a soberania, segundo a tradicional, como summa legibusque soluta potestas. E que essa definição ainda identifica poder e direito, ou concebe a soberania como uma força, se bem que como uma força que não pode agir senão de forma jurídica. 
O mesmo conceito de povo, próprio de grande parte da tradição democrática, parece uma abstração desencaminhada, dado que, na realidade, a vontade do povo se expressa por meio dos Partidos políticos, que tem exatamente a função de conjugar e transmitir a demanda política e de traduzi-la em orientação. Em um sistema representativo, teremos, portanto, um complexo processo de formação da vontade política que, partindo dos cidadãos, passa pelos partidos e pelas assembléias e culmina na ação do Governo, limitada pela lei constitucional. Resulta assim mais correto e útil definir esses sistemas políticos como sistemas constitucional-pluralistas.
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Fonte: Dicionário de Política – Norberto Bobbio. Verbete redigido por Nicola Matteuci.

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