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DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 1 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO ÂMBITO DOS ESTADOS-‐MEMBROS Sumário: 1. Introdução 2. Espécies de controle 2.1. Ações cabíveis no âmbito estadual 3. Ação direta de inconstitucionalidade no âmbito estadual 3.1. Legitimidade 3.2. Competência 3.3. Objeto de controle 3.4 Parâmetro/paradigma de controle (art. 125, §2º, CF) 3.5. Efeitos da decisão 3.6. Quadro comparativo: controle concentrado no âmbito federal x estadual 3.7. Estabilização da decisão do TJ 4. Sistema difuso no âmbito estadual 5. Ação direta de inconstitucionalidade interventiva do Estado nos Municípios 1. Introdução A CF/88 possui força normativa (Konrad Hesse). Ela é uma norma jurídica dotada de imperatividade reforçada (é super-‐imperativa). De acordo com a teoria da construção escalonada de Hans Kelsen, a CF se coloca no ápice da pirâmide normativa. Assim, é ela o fundamento de validade último das Constituições Estaduais. Regras do controle abstrato de constitucionalidade prevista na CF: ! Somente leis ou atos normativos estaduais ou municipais poderão ser objeto de controle ! Apesar de não fixar os legitimados, a CF vedou a atribuição de legitimidade apenas um único órgão ! O órgão competente para o julgamento da ação pela via principal é apenas o TJ 2. Espécies de controle Existem, dentre várias classificações, duas espécies de controle de constitucionalidade quanto ao momento em que ele é feito: controle preventivo e controle repressivo. O objetivo do controle PREVENTIVO é evitar, impedir que a norma inacabada adentre no ordenamento jurídico. A norma, aqui, ainda não é aprovada, sendo, portanto, um projeto. No Brasil, o controle preventivo se manifesta em três momentos: a) Controle preventivo feito pelo legislativo: Art. 58, §2º " Existe CCJ nas Assembléias Legislativas1. b) Controle preventivo feito pelo executivo: Art. 66, §1º " Existe o controle preventivo em sede estadual, através de veto JURÍDICO do Governador. [ Art. 66 -‐ A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. c) Controle preventivo feito pelo judiciário " Isso existe no TJ: parlamentar estadual ajuíza MS no TJ, em defesa do direito líquido e certo ao devido processo legislativo. 1 As CCJ editam parecer, nos projetos de lei, analisando a sua constitucionalidade. DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 2 Controle preventivo Poder legislativo CCJ no âmbito das Assembléias Legislativas – parecer prévio; Poder Executivo Veto jurídico do Governador; Poder Judiciário Mandado de segurança ajuizado por parlamentar no TJ, na defesa do devido processo constitucional (direito líquido e certo; controle concreto). Obs: Normas a respeito do devido processo legislativo são normas de reprodução obrigatória em sede estadual. Assim, grave (questão cobrada): os Estados-‐membros não podem inovar em sede de processo legislativo. Pergunta: qual é a importância do devido processo legislativo constitucional? A CF/88, em seu art. 5º, II, trata do princípio da liberdade de ação (ou legalidade): “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. A Constituição não se contenta com qualquer espécie de lei, devendo esta respeitar o devido processo constitucional. Veja que a legalidade, para o particular, é algo distinto da sua face para o Poder Público. Há, ainda, o controle REPRESSIVO, que visa retirar, expurgar a norma inconstitucional do ordenamento. Esse controle repressivo é jurisdicional como regra, através do sistema difuso ou concentrado (misto). O sistema concentrado se divide em 5 ações: ! Ação direta de inconstitucionalidade genérica ! Ação direta de inconstitucionalidade por omissão ! Ação direta de inconstitucionalidade interventiva ! Ação declaratória de constitucionalidade ! Argüição de descumprimento de preceito fundamental. 2.1. Ações cabíveis no âmbito estadual O art. 125, §2º, nos revela a existência do controle repressivo no âmbito estadual. O art. 125, CF, dessa forma, trata da chamada representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual. Art. 125, § 2º -‐ Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão. I. Representação de inconstitucionalidade Pedro Lenza afirma entender ser possível qualquer dos meios de controle previsto na CF, respeitando o princípio da simetria. Assim, pode-‐se concluir que a representação de inconstitucionalidade é gênero, do qual retiramos as seguintes ações: ! Ação direta de inconstitucionalidade genérica – É a única expressamente prevista na CF. ! Ação direta de inconstitucionalidade por omissão2 -‐ Segundo o STF é legítima a previsão de ADO nas constituições estaduais (RE 148283). 2 Aduz Gilmar Mendes: “se se entender que, na verdade, a ação direta por inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão têm, em grande parte, um objeto comum – a omissão parcial -‐, então parece correto admitir que a autorização DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 3 ! Ação declaratória de constitucionalidade – Apesar de não haver jurisprudência sobre o tema (pois nenhuma Constituição Estadual prevê isso) ou doutrina, como a ADC tem a mesma natureza da ADI (é uma ADI de sinal trocado), sendo cabível a ação direta de inconstitucionalidade, seria cabível também a ADC. Isso já foi questão de prova!!! Existe uma busca pela equiparação entre a ADI e a ADC, a começar pela equiparação dos legitimados, o que ocorreu com a EC n.º 45. Além disso, as decisões são as mesmas, com mesmos efeitos, na medida em que se trata de ações dúplices, conforme dispõe o art. 24 da Lei 9.868/993: Art. 24. Proclamada a constitucionalidade, julgar-‐se-‐á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-‐se-‐á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória. II. ADPF No que diz respeito à ADPF, não existe vedação para que as Constituições Estaduais criem a mesma no âmbito dos Estados-‐membros. Apesar disso, o cabimento de ADPF no âmbito estadual parece bastante difícil de ser admitido. Argumentos que impediriam: a) Constituição Estadual pode ter preceito fundamental? O conceito de preceito fundamental é fluido. Seria possível sustentar que somente a CF abriga preceitos fundamentais. b) O Estado não pode legislar sobre direito processual. Sendo assim, ele não teria competência para regulamentar a ADPF, previsto na Constituição Federal como norma de eficácia limitada. Segundo entendimento do STF, a ADPF (no âmbito federal) só é possível desde que exista uma lei regulamento a sua instituição. Essa lei é a 9.882/99. Por conta disso, caso o Estado-‐membro trate da ADPF na sua Constituição, também será necessária uma lei para regular a ação. Pergunta-‐se: essa lei, que regulará a ADPF em sede estadual, é federal ou estadual? Somente poderá ser uma lei federal, na medida em que o Estado não pode legislar sobre processo, mas sim sobre procedimento. c) Caráter subsidiário da ADPF – Como a ADPF só cabe quando não existir outro meio eficaz para sanar a lesividade, a ADPF no âmbito estadual terminaria esvaziando a ADPF federal. Controle repressivo no Estado membro – Poder Judiciário ADI Art. 125, §2º, CF (“representação de inconstitucionalidade”) ADO Art. 125, §2º, CF (“representação de inconstitucionalidade”) ADC Art. 125, §2º, CF (“representação de inconstitucionalidade”) # Isso porque existe uma tendência de equiparação da ADI com a ADC (são ações dúplices, com os mesmos legitimados). ADI interventiva Art. 35, IV CF/88 ADPF Pode existir no âmbito estadual, caso a Constituição do Estado preveja. Neste caso, é norma de eficácia limitada, sujeita aos regramentos da lei federal. contida na Constituição Federal para a instituição da representação de inconstitucionalidade no plano estadual é abrangente tanto da ação direta de inconstitucionalidade em razão de ação, como da ação direta por omissão”. 3 Conclui Gilmar Mendes: “ora, tendo a CF/88 autorizado o constituinte estadual a criar a representação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal em face da Carta Magna estadual (CF, art. 125, §2º) e restando evidente que tanto a representação de inconstitucionalidade, no modelo da Emenda n. 16, de 1965, e da Constituição de 1967/69, quanto a ação declaratória de constitucionalidade prevista na EC n. 3, de 1993, possuem caráter dúplice ou ambivalente, parece legítimo concluir que, independentemente de qualquer autorização expressa do legislador constituinte federal, estão os Estados-‐membros legitimados a instituir a ação declaratória de constitucionalidade”. DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 4 3. Ação direta de inconstitucionalidade no âmbito estadual A CF/88 dá a esta ação o nome de representação de inconstitucionalidade, termo genérico, como já vimos. 3.1. Legitimidade A Constituição Federal não diz quais são os legitimados em sede estadual. No entanto, ela nos dá notícia de uma regra: a CF/88 veda a existência de apenas um legitimado. Isso está no art. 125, §2º, último período: § 2º -‐ Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão. A doutrina apresenta, também, como limitação da legitimidade a vedação de abertura de legitimidade para qualquer cidadão (uma espécie de ação popular). Por que a CF veda a legitimação a um único órgão? Isso ocorre porque a CRFB/88 inaugura a denominada democracia participativa. Ela se abre para a participação do cidadão na organização do Estado. Ex. dessa participação coletiva: mandado de segurança coletivo (não existia antes de 1988); mandado de injunção coletivo. O controle concentrado foi sistematizado por Kelsen em 1920, na Áustria. No Brasil, ele chegou em 1965, através da EC n. 16. De 1965 até 1988, somente o PGR detinha a legitimidade para as ações de controle de constitucionalidade. A partir da CF/88, vários legitimados surgem, à luz do ideal de democracia participativa. Em sendo o documento mais importante que temos, a CF deve ser democratizada, discutida por toda a sociedade. Em assim sendo, surge, com a lei 9.868/99 um movimento da sociedade aberta de intérpretes constitucionais (Peter Häberle) pautada no alargamento da legitimidade da ADI, na previsão do amicus curiae etc. Ao vedar a existência de um único legitimado no controle de constitucionalidade no âmbito dos Estados-‐membros, a CF democratiza o mesmo. A CF/88 não especificou quais são os legitimados. Os Estados podem adotar tanto um modelo de introversão quanto um modelo de extroversão. ! Modelo Introversão # somente órgãos do Poder Público poderia ajuizar ADI no âmbito estadual. ! Modelo extroversão # abrange entidades que não são dos Poderes Públicos. Segue o modelo de extroversão a CF/88 (que admite a legitimidade de entidades de classe, v.g.). Segundo Novelino, Pedro Lenza e o STF, os Estados não estão obrigados a seguir em simetria estrita o art. 103 do CF, justamente porque a intenção da Constituição Federal foi ampliar o rol de legitimados para a propositura da ADI. Para Pedro Taques, contudo, como se trata de manifestação do Poder Constituinte Derivado Decorrente, deve-‐se respeitar o parâmetro/paradigma, que é o art. 103 da CF. Art. 103 -‐ Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: (Alterado pela EC-‐000.045-‐2004) I -‐ o Presidente da República; II -‐ a Mesa do Senado Federal; III -‐ a Mesa da Câmara dos Deputados; DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 5 IV -‐ a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; (Alterado pela EC-‐ 000.045-‐2004) V -‐ o Governador de Estado ou do Distrito Federal; (Alterado pela EC-‐000.045-‐2004) VI -‐ o Procurador-‐Geral da República; VII -‐ o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII -‐ partido político com representação no Congresso Nacional; IX -‐ confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional. Para o STF, a previsão nas Constituições Estaduais de outros legitimados não abrigados pelo art. 103 são plenamente CONSTITUCIONAIS, em razão da autonomia organizativa do Estado-‐ membro. Exemplifica Lenza que o STF “entendeu constitucional o art. 162 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, com o seguinte teor: Art. 162 -‐ A representação de inconstitucionalidade de leis ou de atos normativos estaduais ou municipais, em face desta Constituição, pode ser proposta pelo Governador do Estado, pela Mesa, por Comissão Permanente ou pelos membros da Assembléia Legislativa, pelo Procurador-‐Geral da Justiça, pelo Procurador-‐Geral do Estado, pelo Defensor Público Geral do Estado, por Prefeito Municipal, por Mesa de Câmara de Vereadores, pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, por partido político com representação na Assembléia Legislativa ou em Câmara de Vereadores, e por federação sindical ou entidade de classe de âmbito estadual”. STF, ADI 558-‐9 MC Assim, algumas Constituições dão legitimidade às seguintes autoridades: i. Procurador-‐Geral do Estado; ii. Defensor Público Geral do Estado; iii. Deputado Estadual. Embora o STF entenda constitucional a ampliação do rol de legitimados em relação à Constituição Federal, não há decisões quanto à restrição. A CF somente veda a legitimação de um único órgão, então eu entendo que é possível. Pedro Lenza não deu opinião. Para a doutrina: a) O Governador, obrigatoriamente, deve constar como um dos legitimados no controle de constitucionalidade no âmbito estadual. As CEs obrigatoriamente devem dar legitimidade ao mesmo, em razão da existência de freios e contrapesos do poder. Caso a CE não inclua o Governador, ela será inconstitucional. b) Também obrigatoriamente a mesa da assembléia legislativa deve ter legitimidade para ajuizar a representação de inconstitucionalidade em sede estadual. Isso em razão defesa das minorias parlamentares. Ex: um Estado que tenha 8 Deputados Federais terá, no mínimo, 24 Deputados Estaduais. Digamos que o Governador detenha 20 DEs. Estes 20 aprovam o projeto de lei, que é sancionado pelo Governador. Estes 4 podem, através da mesa, levar ao Poder Judiciário a discussão a respeito da constitucionalidade da lei. c) A mesa da Câmara Municipal é a autoridade simétrica à Mesa da Assembléia Legislativa, prevista no art. 103, IV. Além dela, também o Prefeito Municipal deve, obrigatoriamente, constar como legitimado em controle de constitucionalidade em sede estadual, simétrico ao Governador de Estado (art. 103, IV). Justificativa para estes dois legitimados: trata-‐se do único instrumento que esta pessoa jurídica com capacidade política Município tem para debater o controle concentrado (de lei municipal ou estadual). Como cediço, não existe, como regra, o controle de constitucionalidade de lei municipal no âmbito do STF. d) A autoridade simétrica ao Procurador Geral da República (art. 103, VI) é o Procurador Geral de Justiça, legitimado obrigatório. Uma Constituição Estadual que não ofertasse legitimidade ao PGJ para ajuizar ADI em sede estadual seria inconstitucional (questão recentemente cobrada em concurso do MP). DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 6 A razão dessa inconstitucionalidade está no art. 129 da CF, que trata das atribuições do MP: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: IV -‐ promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição; e) O Conselho Estadual da OAB é o simétrico ao Conselho Federal (inciso VII). Segundo a doutrina, a legitimidade do Conselho Estadual é obrigatória. Explica: a) a OAB é uma autarquia sui generis federal, que tem papel importante na defesa da democracia. Trata-‐se da única oportunidade da pessoa jurídica União debater a constitucionalidade em sede estadual; b) A OAB representa a sociedade civil organizada. f) A CRFB/88 valoriza o partido político, a ponto de não permitir que o cidadão seja candidato, sem que seja filiado a partido político (a filiação partidária é condição de elegibilidade). Assim, o partido político com representação é também, obrigatoriamente, legitimado para debater controle de constitucionalidade em sede estadual. g) Federação sindical ou entidade de classe de âmbito estadual PODEM figurar como legitimados. A doutrina não empresta obrigatoriedade, de modo que o Estado-‐membro tem autonomia para dar-‐ lhes ou não legitimidade. 3.2. Competência Segundo o STF, a Constituição Estadual só pode atribuir competência ao TJ, não podendo atribuir competência ao STF (como tentaram algumas Constituições): ADI 717 e a ADI 1669. Assim, cabe exclusivamente ao Pleno ou Órgão Especial do TJ conhecer e julgar a representação de inconstitucionalidade, por maioria absoluta de votos (art. 97, CF). Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. EXCEÇÃO: É possível órgãos fracionários (turma/câmara/cessão) reconhecerem a inconstitucionalidade na hipótese prevista no art. 481, parágrafo único do CPC: Art. 481 -‐ Se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento; se for acolhida, será lavrado o acórdão, a fim de ser submetida a questão ao tribunal pleno. Parágrafo único -‐ Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do PLENÁRIO do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. 3.3. Objeto de controle Pode ser objeto de controle de constitucionalidade em sede de Estados-‐membros lei ou ato normativo estadual ou municipal. No caso de controle abstrato, o efeito erga omnes é automático. Assim, já se pronunciou o STF no sentido de que é inconstitucional a norma da CE que prevê a necessidade de participação do legislativo para que a execução da lei seja suspensa, pois essa previsão, na CF, é para o controle difuso. As leis federais só poderão ser objeto de controle perante o STF. Exemplo de crise federativa: A Constituição do Estado de São Paulo dispunha que o órgão especial do TJ é composto metade pelos membros mais antigos do tribunal; metade por eleição, enquanto a LOMAN (LC 35/75), lei complementar federal, dispunha que os órgãos especiais são compostos exclusivamente pelos membros mais antigos dos tribunais. Havia constitucionalidade? A questão foi para o STF, que decidiu que a Constituição Estadual de São Paulo é inconstitucional em face da Constituição Federal, por DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 7 ter tratado de competência da União. Logo, há, aqui, crise federativa e não crise de constitucionalidade (obs: veja que, posteriormente, a EC nº45 deu razão ao Estado de SP). Ademais, o STF não pode analisar lei municipal em face da Constituição Estadual, embora possa analisá-‐la em sede de ADPF em face da Constituição Federal e, excepcionalmente, no caso de RE contra decisão de ADI no TJ sobre a constitucionalidade de normas da CE de reprodução obrigatória da CF. 3.4. Parâmetro/paradigma de controle (art. 125, §2º, CF) Em sede estadual, o parâmetro (ou paradigma) de controle só pode ser a Constituição Estadual4. Lei orgânica municipal também não pode servir de parâmetro de controle de constitucionalidade. O STF não pode analisar lei municipal em face da Constituição Estadual, embora possa analisá-‐la em sede de ADPF em face da Constituição Federal. Mudança de jurisprudência As constituições estaduais abrigam normas com as seguintes características especiais: a) Normas de observância obrigatória – Normas da CF que obrigatoriamente devem ser observadas pela Constituição Estadual. Nesses casos, a CE não tem liberdade, devendo seguir o modelo da CF. EXEMPLOS: requisitos para criação da CPI, normas relativas à organização e funcionamento do TCU, princípios básicos do processo legislativo federal. b) Normas de mera repetição – Normas que a Constituição Estadual copia da CF por vontade do legislador, sem que haja obrigatoriedade nessa reprodução. Essa norma que simplesmente reproduz o que está na CF serve de parâmetro para o controle de constitucionalidade estadual? c) Normas remissivas – A Constituição Estadual não escreve o conteúdo da norma, apenas fazendo uma remissão à norma existente na Constituição Federal. Exemplo: “No âmbito do Estado do Piauí observam-‐se os direitos e garantias individuais previstos na CF”. Atualmente, o STF admite que qualquer norma prevista em Constituição Estadual, sem exceção, sirva de parâmetro para o controle de constitucionalidade no âmbito estadual, ainda que seja de reprodução obrigatória, de mera repetição ou remissiva. Contudo, quando a norma for de reprodução obrigatória, da decisão do TJ caberá RE ao STF, cuja decisão terá efeitos erga omnes, ex tunc e vinculante. 3.5. Efeitos da decisão Os efeitos da decisão do controle concentrado em sede estadual são: ! Erga omnes; ! Vinculante; ! Ex tunc. 4 Uma constituição estadual que dispusesse que o controle concentrado no TJ tenha por parâmetro de controle a Constituição Federal, será inconstitucional. DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 8 É possível a modulação ou manipulação dos efeitos da decisão, nos termos da Lei 9.868/99. O traço que diferencia o sistema concentrado do difuso diz respeito, justamente aos efeitos da decisão. Não se exige a participação legislativa. 3.6. Quadro comparativo: controle concentrado no âmbito federal x estadual Âmbito federal Âmbito estadual Previsão: art. 102, I, “a”, CF. Art. 125, §2º Competência: STF TJ Objeto: lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal Lei ou ato normativo estadual ou municipal Parâmetro: Constituição Federal Constituição Estadual Veja que a lei estadual pode ser desafiada, no que tange à sua constitucionalidade, no âmbito do STF (tendo em conta a CF) e no TJ (tendo em conta a CE). Há, assim, a simultaneidade de controle da lei estadual. Diante disso, vejamos as situações importantes: I. Foram ajuizadas, simultaneamente, duas ações: uma discutindo a constitucionalidade da lei estadual no STF e outra discutindo a constitucionalidade da mesma lei junto ao TJ. Aqui, o STF determina o sobrestamento da representação de inconstitucionalidade no TJ, até que decida a questão. ! Se o STF decidir que a lei é INCONSTITUCIONAL, haverá a perda superveniente de objeto da representação ajuizada perante o TJ. Isso porque, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei, o Supremo expurga esta do ordenamento jurídico. ! Se o STF decidir que a lei é CONSTITUCIONAL, em regra, esta decisão vincula o TJ (também é erga omnes, vinculante e ex tunc). Nada impede que o TJ declare a lei inconstitucional, com fundamento em outro parâmetro: na Constituição Estadual. Isso porque, em controle de constitucionalidade, vigora a cognição aberta (ou conhecimento aberto). QUESTÃO: E se a norma da Constituição Estadual for de observância obrigatória ou de mera repetição? Nesse caso, entra em voga a teoria dos efeitos transcendentes dos motivos determinantes. Assim, sendo os parâmetros idênticos, a decisão do TJ também terá que ser a mesma da do STF5. II. Ações não foram ajuizadas ao mesmo tempo. Primeiramente, foi ajuizada representação de inconstitucionalidade no TJ, tendo este tribunal reconhecido a inconstitucionalidade dessa lei. Pergunta-‐se: é possível ajuizamento de uma ADI no STF, discutindo a constitucionalidade dessa mesma lei em face da CF? NÃO. Se o TJ reconhece, no sistema concentrado, a inconstitucionalidade dessa lei, ela deixa de existir, sendo retirada do ordenamento jurídico. Assim, não existe possibilidade de ajuizar ADI no STF, discutindo objeto que não mais existe. III. Se o TJ reconhece, em controle concentrado, que a lei é constitucional, é possível o ajuizamento posterior de uma ADI no STF? SIM. Não há que se falar em coisa julgada, aqui, pois a causa de pedir (parâmetro) é diversa. 5 Ex: se o autor legitimado afirma que a Lei X ofende o art. 200 da CF (e o STF entende que é constitucional), o TJ pode reconhecer a inconstitucionalidade com fundamento em outros parâmetros próprios (que se encontram na Constituição Estadual). DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 9 3.7. Estabilização da decisão do TJ Uma das características do pacto federativo é que as decisões do TJ devem se estabilizar dentro do próprio território do Estado. Logo, somente excepcionalmente caberá recurso extraordinário das decisões do TJ, em sede de controle concentrado de constitucionalidade6: quando a norma da CE parâmetro for de reprodução obrigatória da CF ou norma central federal7. Súmula 280 do STF. Por ofensa a direito local, não cabe recurso extraordinário. O RE não inaugura uma nova ação, sendo, pois, continuidade da mesma relação jurídica processual. No caso em tratativa, ele não desafia uma decisão do controle difuso, mas sim concentrado. Consequentemente, a decisão do STF, em sede deste RE, terá os efeitos do controle concentrado (será erga omnes, ex tunc e vinculante, podendo o STF, naturalmente, modular os efeitos da decisão). Atente: neste caso, não se exige do Senado qualquer participação (não se aplicando o art. 52, X, CF). O art. 25 da Constituição Federal cuida do poder constituinte derivado decorrente: Art. 25. Os Estados organizam-‐se e regem-‐se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. Pelo princípio da simetria, as Constituições estaduais devem respeitar os limites da CF/88. Há comandos previstos na CF/88 que alcançam os Estados-‐membros de forma obrigatória, inserindo-‐se, aí, as chamadas normas centrais federais. Segundo o prof. Raul Machado Horta8, as normas centrais federais são: a) Princípios da Constituição, também denominados princípios estabelecidos – Estes vinculam os Estados-‐membros, limitando sua autonomia organizativa. Ex.: arts. 1º, 2º, 3º, 37, 127, 170. b) Forma republicana, sistema representativo e direitos da pessoa humana c) Normas de competência deferidas aos Estados-‐membros – Ex: competência comum, legislação concorrente. d) Normas de pré-‐ordenação A Constituição Federal, desde já, preordena as autoridades dos Estados-‐membros. Ex.: mandato dos DE e governadores, data da posse dos governadores etc. O prof. José Afonso da Silva identifica outras normas centrais federais: a) Princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII) " São aqueles facilmente percebidos pelos sentidos, cuja observância é obrigatória, sob pena de intervenção. b) Princípios constitucionais estabelecidos (ou organizatórios) " São aqueles que limitam a autonomia organizatória do Estado. c) Princípios constitucionais extensíveis " Integram a estrutura da federação. Consistem em regras de organização que a Constituição estendeu aos Estados-‐membros. 6 “De modo geral, da decisão do TJ local em controle abstrato (ADI) de lei estadual ou municipal perante a CE não cabe recurso para o STF, já que o STF é o intérprete máximo de lei (federal, estadual ou distrital de natureza estadual) perante a CF, e não perante a CE.” (Pedro Lenza). 7 Expressão consagrada por Raul Machado Horta. 8 A classificação proposta é apenas uma das diversas existentes. DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 10 QUESTÃO: Lei municipal pode ser objeto de controle concentrado no STF? Em regra, não, mas é possível controle concentrado de lei municipal perante o STF, não só por meio de ADPF, como também através de Recurso Extraordinário de decisão proferida em controle concentrado no âmbito do TJ, quando o parâmetro for norma constitucional de reprodução obrigatória. 4. Sistema difuso no âmbito estadual a) Legitimidade – Qualquer pessoa física ou jurídica é parte legítima para alegar a inconstitucionalidade. b) Competência – Qualquer juiz, tribunal, diante de um caso concreto, pode reconhecer a inconstitucionalidade (inclusive de ofício). Nos tribunais, como cediço, exige-‐se maioria absoluta (cláusula do full bench). c) Objeto de controle – Lei ou ato normativo estadual ou municipal. d) Parâmetro/paradigma de controle – É a Constituição Estadual. e) Efeitos da decisão – No sistema difuso, os efeitos da decisão são: inter partes e ex tunc. Se o controle for difuso, a quem deverá ser comunicada a decisão para suspensão do ato, à Assembléia ou à Câmara Municipal? O STF já decidiu que cabe a cada Constituição definir. Em regra, as Constituições Estaduais definem que deve ser comunicado a Assembléia Legislativa, seja a declaração de inconstitucionalidade de lei estadual ou municipal. Os Estados do MS, RS, RN, TO e AM definiram que a declaração de inconstitucionalidade de lei estadual será comunicada à Assembléia Legislativa e; a declaração de inconstitucionalidade lei municipal será comunicada à Câmara Municipal. Obs: Gilmar Mendes lembra que o instituto da suspensão da execução de lei tem por escopo tão-‐ somente imprimir eficácia geral a uma decisão com efeitos inter partes. Assim, não pode uma Constituição Estadual condicionar a eficácia de decisão proferida em sede de controle abstrato, no âmbito estadual, à decisão de um órgão político estadual ou municipal. Tal previsão afrontaria a própria CF/88, que autoriza a instituição de um controle de constitucionalidade exercido por órgão jurisdicional, e não por órgão político. 5. Ação direta de inconstitucionalidade interventiva do Estado nos Municípios Algumas observações são importantes: ! A regra é a não-‐intervenção da União nos Estados e dos Estados nos Municípios (não existe hierarquia entre as pessoas jurídicas com capacidade política, eis que uma das características da federação é a divisão constitucional da competência). ! O Distrito Federal é uma pessoa jurídica com capacidade política, porém menos autonomia (maiores limites). Ex: a) os Estados-‐membros podem se dividir em Municípios (art. 18. §4º); o DF não pode (art. 32). b) os Estados-‐membros possuem MP próprio; o MP do DF está vinculado ao MPU. c) o DF não organiza sua Polícia, Judiciário e Defensoria Pública, que são mantidas pela União. ! A União NUNCA pode intervir nos Municípios dos Estados. Só pode intervir, excepcionalmente, nos Municípios localizados em seus territórios. ! Existem 4 exceções que justificam a intervenção dos Estados em seus Municípios: a) Determinação direta do Poder Executivo estadual; b) Solicitação do Poder Legislativo estadual; c) Requisição direta do Poder Judiciário estadual. DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 11 d) Requisição do Poder Judiciário Estadual depois de julgar procedente a representação interventiva (art. 35, IV). No art. 35, IV, CF, existem 4 motivos para que haja a intervenção: a) Observância dos princípios indicados na Constituição Estadual b) Prover a execução de lei c) Prover ordem judicial d) Prover decisão judicial Só os dois primeiros motivos possibilitam o ajuizamento da ADI interventiva do Estado nos Municípios (representação interventiva). Os dois últimos motivos ensejam direito de petição (qualquer cidadão pode manejar). Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando: I -‐ deixar de ser paga, sem motivo de força maior, por dois anos consecutivos, a dívida fundada; II -‐ não forem prestadas contas devidas, na forma da lei; III -‐ não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino; III -‐ não tiver sido aplicado o mínimo exigido da receita municipal na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) IV -‐ o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial. Ficha da ADI interventiva: a) Legitimidade – Só o Procurador-‐Geral de Justiça (art. 129, IV) tem legitimidade para ajuizar ADI interventiva dos Estados nos Municípios. b) Competência – É do TJ. c) Objeto de controle – São eles: ! Observância dos princípios indicados na Constituição Estadual; ! Execução de lei federal, estadual ou municipal; Observações: A maioria das Constituições dos Estados não traz princípios. A doutrina entende que os princípios que devem estar nas CE são aqueles previstos no art. 34, VII da CF (princípios constitucionais sensíveis). Ainda que não previstos na CE, é possível a intervenção. VII -‐ assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços DIREITO CONSTITUCIONAL – JOÃO PAULO LORDELO 12 públicos de saúde.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 29, de 2000) A lei cuja execução deve ser provida poderá ser federal, estadual ou municipal. Se o Município não prover a execução de uma lei federal, o Estado pode intervir neste, pois: a) A União não pode intervir nos Municípios. Se o Município não der provimento à lei federal, é caso de intervenção do Estado nele. Se o Estado não intervém no Município que desobedeceu a lei federal, é caso de intervenção da União no próprio Estado. b) O art. 23, I, CF dispõe: “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: I -‐ zelar pela guarda da Constituição, das leis9 e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público.”; d) Efeitos da decisão – O TJ julga procedente a ação ajuizada pelo PGJ e requisita ao Governador a intervenção. O Governador está obrigado/vinculado a expedir o Decreto, que pode trilhar um de dois caminhos possíveis: ! Suspende os atos que ensejaram a intervenção, se isto bastar (isso significa que não necessariamente será nomeado interventor ao Município. A questão, aqui, é discricionária). ! Se isto não bastar, nomeia interventor. A Lei Orgânica do Distrito Federal tem natureza constitucional. Portanto, é paradigma de controle da Lei Distrital. A Lei Orgânica do Município não ostenta natureza constitucional, mas sim de lei. Logo, não se pode dizer que uma lei municipal é inconstitucional em face da LOM. Neste caso, há crise de legalidade, e não constitucionalidade. 9 Não há especificação aqui. Assim, cabe também aos Municípios zelar pela guarda das leis federais.
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