Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
1 ESCOLA SUPERIOR DA MAGISTRATURA FEDERAL DE SANTA CATARINA MORGANA MACHADO JUSTIÇA RESTAURATIVA: Até onde retribuir é a melhor solução? FLORIANÓPOLIS 2015 2 MORGANA MACHADO JUSTIÇA RESTAURATIVA: Até onde retribuir é a melhor solução? Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Jurisdição Federal, no Curso de Pós Graduação Lato Sensu da Escola Superior da Magistratura Federal de Santa Catarina juntamente com a Universidade do Vale do Itajaí. FLORIANÓPOLIS 2015 3 A pena tem o dever de punir, e fazer com que quem cometeu o mal não saia impune e não volte a delinquir. Na Justiça Restaurativa o acordo visa restaurar. Se houve parte lesada, precisa ser restaurada, e aquele que lesou precisa restaurar. A cobrança de quem fez e quem não fez não vai ser feita pelo Estado, mas pelos próprios membros.” (Leonardo Amorim) 4 RESUMO A Justiça Restaurativa é um tema em ascensão, considerado como um método alternativo, na perspectiva de um Sistema Penal melhor. O objetivo da Justiça Restaurativa, não é substituir os métodos utilizados atualmente, mas contribuir de modo a proporcionar, um desafogamento em massa do Judiciário, uma vez que existem milhares de situações que podem ser resolvidas, de forma muito mais célere, ao contrário do que vem acontecendo. Tratase de um tema muito recente, têmse informações de que a primeira vez que se ouviu falar sobre o assunto foi por volta da década de 70, na Europa, tendo em vista que o sistema adotado vinha se demonstrando falho, levando em consideração que os índices de marginalidade ao invés de diminuírem, vinham apresentando números absurdos no aumento da violência e elevados índices de reincidência. O respectivo trabalho busca demonstrar que é possível criar um círculo virtuoso composto por ofensor, ofendido, comunidade e Estado, e ainda que é possível o ofensor reparar o dano por ele causado, ao contrário do que acontece nos casos em que faz uso da Justiça Retributiva, que entende ser a aplicação da pena suficiente para que o ofensor pague pelo mal por ele causado. Palavraschave: Justiça Restaurativa; Justiça Retributiva; Sistema Penal; Ofensor; Ofendido; Comunidade. 5 ABSTRACT Restorative justice is a theme on the rise, considered as an alternate method, the prospect of a better Penal System. The goal of restorative justice, is not to replace the currently used methods, but help to provide a mass bottlenecking the judiciary, since there are thousands of situations that can be resolved much more quickly, rather than been happening. As previously mentioned, this is a topic very recent, have information that the first time we heard about it was around the 70's, in Europe, in order that the system adopted had been demonstrating flawed, considering that rates of delinquency rather than diminish, had presented, in increasing numbers absurd violence, yet having high rates of recidivism. Its work aims to demonstrate that it is possible to create a circle of offender, victim, community and even the state, and that the offender can repair the damage caused by it, the opposite of what happens in cases where it makes use of retributive justice, which considers it sufficient sentencing, that the offender pay for the harm caused by it. Keywords: Restorative Justice; retributive justice; Penal System; Offender; Offended; Community. 6 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Pressupostos teóricos e axiológicos, vistos pela Justiça Retributiva e pela Justiça Restaurativa. Tabela 2 – Procedimentos adotados pela Justiça Retributiva e pela Justiça Restaurativa. Tabela 3 – Resultados apresentados pela Justiça Retributiva e pela Justiça Restaurativa. Tabela 4 – Efeitos para a vítima pelo modelo da Justiça Retributiva e pela Justiça Restaurativa. Tabela 5 – Efeitos para o infrator pelo modelo da Justiça Retributiva e pela Justiça Restaurativa. 7 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CLP Comissão Legislativa Participativa CF Constituição Federal CONSEG Conselho Comunitário de Segurança CP Código Penal CPP Código Penal Brasileiro EUA Estados Unidos da América IMCR Instituto para Mediação e Resolução de Conflito OAB Ordem dos Advogados do Brasil ONU Organização das Nações Unidas PNUD Ministério da Justiça e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil 8 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 2. MUDANÇAS PRA QUÊ? 2.1. Teoria do Direito Processual Penal e da Criminologia 2.2. História da pena privativa de liberdade ou pena de prisão 2.3. As diferentes tipologias de “justiça” 2.3.1. Justiça restaurativa 2.3.2. Justiça retributiva 2.4. Métodos alternativos de resolução de conflitos 2.4.1. Mediação como método alternativo 2.4.4. Da Arbitragem 3. Considerações gerais acerca da Justiça Restaurativa em contrapartida com a Justiça Retributiva 3.1. Marco “Inicial” da Justiça Restaurativa 3.2. Processo restaurativo no Brasil 3.3. Conceituando a Justiça Restaurativa 3.3.1. Pressupostos e Procedimentos Restaurativos 3.3.1.1. Encontro 3.3.1.2. Participação 3.3.1.3. Reparação 3.3.1.4. Reintegração 3.4. Conceituando a Justiça Retributiva 3.5. Distinguindo a Justiça Restaurativa da Justiça Retributiva. 4. Surgimento e evolução da Justiça Restaurativa no Brasil 4.1.Projetos Piloto de Justiça Restaurativa no Brasil 4.1.1. Projeto Piloto de Porto Alegre 9 4.1.2. Projeto Piloto de São Caetano do Sul/ SP 4.1.2 Projeto Piloto de Bandeirantes/ DF 4.2. Recomendações para utilização da Justiça Restaurativa no Brasil 4.2.1. Carta de Araçatuba 5. Considerações Finais Bibliografia Anexo I CARTA DE ARAÇATUBA PRINCÍPIOS DE JUSTIÇA RESTAURATIVA Anexo II CÂMARA DOS DEPUTADOS PROJETO DE LEI Nº 7006, DE 2006 10 1. INTRODUÇÃO A Justiça Restaurativa surge como uma nova alternativa, de modo a auxiliar o Sistema Judiciário. Neste trabalho esta temática será tratada dando ênfase às suas potencialidadespara o Sistema Penal, especialmente no Brasil. A escolha do tema se justifica pela dramática situação do Sistema Penal, que vêm apresentando elevados índices de reincidência. A exemplo disso temos que o Brasil conta atualmente com mais de 600 mil presos, é a quarta maior população carcerária do mundo . Podemos dizer que a palavra restaurar tem a ver com 1 “instaurar de novo”, “tornar a pôr em vigor”, “restabelecer”, “dar novo esplendor”, “consertar”, “reparar”, “retocar ”. Só se pensa em restaurar algo que está destruído ou em 2 processo de destruição ou deterioração , o que de fato vem acontecendo com o nosso Sistema 3 Penal. A Justiça Restaurativa, tem como base o consenso, onde vítima e infrator/ ofensor, e, quando necessário, outras pessoas ou representantes da comunidade atingidos pelo ato ilícito, como sujeitos centrais, participam de forma ativa e coletiva de modo a construir soluções para curar as marcas deixadas pelo ato que vai em desencontro com os bons costumes. É um processo voluntário, relativamente informal, deve ser preferencialmente realizado em espaços comunitários, contando com a participação de um ou mais facilitadores, para que se chegue a um consenso e para ambas as partes envolvidas falem e sejam ouvidas nas mesmas proporções. Porém, antes de se falar em um Sistema destruído, é necessário fazer uma abordagem sobre as origens, o que deu certo e o que deu errado, com a instituição das penas. Nesse sentido, o primeiro capítulo traz algumas considerações sobre a Teoria do Direito Processual Penal e da Criminologia, levandose em conta que seria impossível questionar as falhas do sistema, sem antes atentarmos para as suas origens e desenvolvimento, e, assim, poder identificar quais são os pontos que devemos focar para consertar essas falhas. Como 1 CANCIAN, Natalia. População carcerária, cresce 7% ao ano e soma hoje 607 mil pessoas. Disponível em: http://folha.com/n01646639. Acesso em: 30.07.2015. 2 Dicionário Michaelis UOL. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portuguesportugues&palavra=restaurar. Acesso em: 26.06.2015. 3 CORRÊA, Pr. José Antônio. Neemias, o Restaurador: Primeira Parte. Disponível em: http://ibvir.net23.net/ebooks/neemias_o_restaurador_1.pdf. Acesso em 26.06.2015. 11 poderemos observar, uma questão levantada no transcorrer deste trabalho é justamente o aumento no número de reincidentes do crime. Outro fator, é a elevada demanda judicial, não raras vezes, são verificadas situações em que é determinada a extinção da punibilidade, por não ter sido julgada em tempo hábil. Como menciona H. Zehr a Justiça Restaurativa, deve ser vista com novos olhos, devemos trocar as nossas lentes, e partir da premissa de que a Justiça Restaurativa se trata de um novo conceito de Justiça. Inicialmente surge de modo à complementar o modelo de Justiça tradicional, mas nada impede, que ao longo dos anos se torne o modelo predominante em nosso ordenamento jurídico. Contudo, para que a Justiça Restaurativa seja possível no Brasil, devemos deixar de lado os nossos pré conceitos, e vermos o nosso próximo como um ser igual à nós, nem melhor, e nem pior. Dessa forma passamos a uma abordagem sobre a história da pena privativa de liberdade ou pena de prisão, salientando que num primeiro momento a história das penas é vista como um capítulo horrendo e infamante , uma vez que o delito constituise em regra 4 numa violência ocasional e impulsiva, enquanto a pena não: tratase de um ato violento, premeditado e meticulosamente preparado . Nos seus primórdios, a prisão servia apenas com 5 a finalidade de custódia, o ofensor era detido até a fase de sentença e execução . Na fase 6 prémoderna, a prisão servia para custodir e penalizar fisicamente o condenado. Antes de ser instituída a pena de prisão convencional, a Igreja Católica se utilizava da prisão canônica, que tinha por objetivo fazer com que o pecador se arrependesse do mal por ele causado, sendo este o modelo utilizado como base até hoje. Já no período préinquisitório utilizavase da privação de liberdade como meio punitivo reeducativo. No final do primeiro capítulo são apresentadas algumas considerações sobre a Justiça Restaurativa e a Justiça Retributiva. Este capítulo é encerrado com um breve comentário sobre os métodos alternativos de resolução de conflitos, dentre eles a mediação, a negociação, a conciliação e a arbitragem, que apesar de serem institutos muito parecidos, possuem suas peculiaridades próprias. 4 LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Editora Saraiva. 2012, p.64. 5 LOPES Jr., op. cit., p 64. 6 Iñaki RIVERA Beira apud Lopes Jr., ob. Cit., p.66. 12 O segundo capítulo traz algumas considerações acerca da Justiça Restaurativa em contrapartida com a Justiça e são apresentados os fundamentos e conceitos basilares destes dois modelos de Justiça. Neste capítulo também é realizado um estudo cronológico sobre a aplicação da Justiça Restaurativa no mundo e no Brasil em especial. Por fim, são trazidas de modo tabular algumas diferenças significativas entre a Justiça Restaurativa e a Justiça Restaurativa, podendose destacar quais são os procedimentos adotados por um modelo e pelo outro, sendo apresentadas algumas informações acerca dos resultados apresentados pela Justiça Restaurativa e pela Justiça Retributiva, dentre outras situações. O último capítulo faz menção ao surgimento da Justiça Restaurativa no Brasil e elenca alguns dos ProjetosPiloto e propostas legislativas que se encontram em andamento no nosso país. No que concerne à legislação, destacase a Sugestão Legislativa nº 99/2005, que foi transformada no Projeto de Lei nº 7.006/2006 e propõe alterações ao Código Penal (DecretoLei nº 2848, de 7 de dezembro de 1940), no Código de Processo Penal (DecretoLei 3.689, de 3 de outubro de 1941) e na Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995), buscando regular o uso facultativo e complementar de procedimentos de justiça criminal em casos de crimes e contravenções penais. Para concluir este introdução apontase outro ponto relevante que deve ser esclarecido, é que a propostada Justiça Restaurativa não é substituir o modelo Retributivo que é utilizado atualmente no Brasil, mas sim ser mais uma alternativa, para que tenhamos um Sistema Penal melhor e com menores índices de reincidência. 13 2. MUDANÇAS PRA QUÊ? "É chegada a hora de inverter o paradigma: mentes que amam e corações que pensam.” (Bárbara Meyer) Para tratar do tema Justiça Restaurativa e poder refletir sobre uma nova abordagem para a questão do crime e das transgressões que possibilita um referencial paradigmático na humanização e pacificação das relações sociais envolvidas num conflito , fazse necessário 7 um breve estudo histórico sobre o Direito Processual Penal, assim como a história da instituição da Pena Privativa de Liberdade, como meio de punição. Além do mais, do que serviria falar em meios de reestruturação judiciária, sem antes, atentar para os fatores que levaram o Poder Judiciário , neste caso mais precisamente o 8 Sistema Penal , até a sua situação atual? 9 No presente momento verificase que para todo e qualquer delito existe uma punição, do ponto de vista estatal, aplicável para cada situação, contudo, o que se observa, é que para o Estado, a partir do momento em que o infrator cumpre sua pena, dá por encerrado o seu caso. Deixase, portanto, de dar a devida atenção aos motivos reais, pelos quais os índices de marginalidade vem aumentando cada vez mais os invés de diminuir. 7 BRANCHER, Leoberto Narciso Justiça Restaurativa: A Cultura de Paz na Prática da Justiça, disponível em: http://jij.tj.rs.gov.br/jij_site/docs/JUST_RESTAUR/VIS%C3O+GERAL+JR_0.HTM, acesso em:28.06.2015. 8 O Poder Judiciário é um dos três poderes do Estado, suas funções estão preconizadas nos artigos 92135 da Constituição Federal de 1988. No sentido da Constituição brasileira, a função do Poder Judiciário, no âmbito do Estado democrático, consiste em aplicar a lei a casos concretos, para assegurar a soberania da justiça e a realização dos direitos individuais nas relações sociais. A estrutura do Poder Judiciário é baseada na hierarquia dos órgãos que o compõem, formando assim as instâncias. A primeira instância corresponde ao órgão que irá primeiramente analisar e julgar a ação apresentada ao Poder Judiciário. As demais instâncias apreciam as decisões proferidas pela instância inferior a ela, e sempre o fazem em órgãos colegiados, ou seja, por um grupo de juízes que participam do julgamento. Devido ao princípio do duplo grau de jurisdição, as decisões proferidas em primeira instância poderão ser submetidas à apreciação da instância superior, dando oportunidade às partes conflitantes de obterem o reexame da matéria. Às instâncias superiores cabe, também, em decorrência de sua competência originária, apreciar determinadas ações que, em razão da matéria, lhes são apresentadas diretamente, sem que tenham sido submetidas, anteriormente, à apreciação do juízo inferior. A competência originária dos tribunais está disposta na Constituição Federal. Segundo, Fernando Lima professor de Direito Penal. Disponível em: http://www.profpito.com/FIBRADCIIunidadeV.html, acesso em 28.06.2015. 9 No percurso deste estudo usase a expressão sistema penal para designar o conjunto de instituições representado pela Instituição Policial, Instituição Judiciária e Instituição Penitenciária; no mesmo sentido atribuído por Nilo Batista: BATISTA apud LOPES Jr. Direito Processual Penal. São Paulo: Editora Saraiva. 2012, p. 25. 14 Para tanto, fazse necessária uma incursão na história e nas bases teóricas do Sistema Penal, a partir da Teoria do Direito Penal e da Criminologia contemporânea, em particular das reflexões críticas propostas por Alessandro Baratta . 10 2.1. Teoria do Direito Processual Penal e da Criminologia A Criminologia contemporânea, especialmente a partir da década de 30 do século XX, passa a ser caracterizada pelas tendências que buscam superar as teorias patológicas da criminalidade . 11 As teorias patológicas da criminalidade, baseadas sobre as características biológicas e psicológicas, concebiam esses fatores como facilitadores para diferenciar um sujeito com tendência criminosa daquele considerado normal, davase grande ênfase a características apresentadas por pessoas que eram taxadas como tendentes à prática de atos delituosos. Estas teorias encontravam inspiração na obra de Cesare Lombroso , médico italiano que no século 12 XIX desenvolveu análises e classificações de diversos biótipos humanos relacionandoos com a propensão para a prática delituosa. A teoria lombrosiana mencionava, também, ser possível identificar pessoas com tendências criminosas apenas com base na fisionomia. O que é inaceitável e levou, inclusive, o estudo da Criminologia de base lombrosiana a ser relacionado com o período Hitleriano: o líder nazista admitia apenas a permanência de “Arianos puros” na Alemanha, por isso deveriam ser “exterminados” todos aqueles que, do ponto de vista de Hitler , eram 13 10 Alessandro BARATTA, foi um filósofo, sociólogo e jurista italiano de grande influência nas décadas de 1970 e 1990 nos campos da filosofia do direito e sociólogia jurídica. 11 BARATTA, Alessandro.Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. 2º edição. Ed. Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1999, p. 29. 12 Cesare Lombroso nasceu em Verona, no ano de 1835, formouse em Medicina. O médico italiano propôs uma releitura do Direito Penal clássico e desta maneira conseguiu juntar epígonos dos mais importantes, dentre os quais: Cesare Beccaria, jurista autor de ´Dos Delitos e das Penas`. Reputado como um dos criadores da Antropologia Criminal e da Escola Positiva do Direito Penal, Lombroso desenvolveu pesquisas baseadas no crescimento social do ser humano e nos fatores criminológicos que permeiam a sociedade. Foi ele também que criou sistemas de estudos baseados na análise dos fatos e da estrutura psicológica do criminoso aliado com o ambiente em que ele se encontra envolvido. Uma das marcas indeléveis de Lombroso, é o seu estudo que finaliza com paradigma de que o criminoso possui traços que indicam sua criminalidade. Conforme VICTOR, Roberto. http://www.direitoce.com.br/15799, acesso em: 28.06.2015. 13 Hitler AdolfHitler, ditador alemão, nasceu em 1889 na Áustria. Filho de Alois Hitler e Klara Poezl, alistouse voluntariamente no exército bávaro no começo da Primeira Guerra Mundial. Tornouse cabo e ganhou duas vezes a Cruz de Ferro por bravura. Hitler seguia táticas "intuitivas", indo contra conselhos de especialistas militares, e no princípio obteve vitórias maciças. Em 1941, assumiu o controle direto das forças armadas. Como o curso da guerra mostrouse desfavorável à Alemanha, decidiu intensificar o assassinato em massa, que 15 considerados “impuros”, ou seja, quem tinha origem judia, ou outro tipo de “impureza” – por exemplo, homossexuais ou ciganos – era alvo de sua ira. Em ambas as situações têmse que, pessoas boas e pessoas más podiam ser dintigüidas com base tão somente em aparências. Inicialmente, o intuito da criação do Sistema Penal deveria ser atenuar os índices de violência apresentados. Contudo, o que se observa é que há um efeito inverso. Para muitos as causas desta inversão ou “perversão” do sistema penal são tidas como desconhecidas. Porém, podese aqui utilizar como agravante a falta de qualidade apresentada pelo sistema, que no Brasil se caracteriza pela superlotação. Um sistema caracterizado também pela inobservância do princípio da dignidade humana, previsto na Constituição Federal de 1988 em seu art. 1º, III . 14 Com relação à criminalidade crescente, o promotor Francisco Bandeira de Carvalho Melo , observa que: 15 [...] a criminalidade crescente em nosso país não será reduzida com a supressão de direitos e benefícios legais previstos para que os que delinquirem, mas sim pela certeza da punição estatal. As causas da violência são múltiplas, sendo impossível destacar existência de uma causa como determinante da criminalidade, por isso a importância do direito penal revelase pelo seu papel de último remédio da comunidade politicamente organizada, os atos mais danosos, que realmente causam prejuízos a valores representativos da sociedade, devem ser combatidos com a pena de prisão. Por este e outros motivos, que o Sistema Penal, precisa passar por uma reforma urgente, antes que haja um descontrole total da situação, ante o considerável aumento dos índices de criminalidade. culminou com o holocausto judeu. Conhecido como um dos piores massacres da história da humanidade, o holocausto termo utilizado para descrever a tentativa de extermínio dos judeus na Europa nazista teve seu fim anunciado no dia 27 de janeiro de 1945, quando as tropas soviéticas, aliadas ao Reino Unido, Estados Unidos e França na Segunda Guerra Mundial, invadiram o campo de concentração e extermínio de AuschwitzBirkenau, em Oswiecim (sul da Polônia). No local, o mais conhecido campo de concentração mantido pela Alemanha nazista, entre 1,1 e 1,5 milhão de pessoas (em sua maioria judeus) morreram nas câmaras de gás, de fome ou por doenças. Disponível em: http://educacao.uol.com.br/biografias/adolfhitler.jhtm, acesso em: 28.06.2015. 14 Art. 3º da CF A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I [...] II [...] III a dignidade da pessoa humana. Brasil. 15 MELO, Francisco Bandeira de Carvalho A Função Retributiva Da Pena Privativa de Liberdade, disponível em: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/7/docs/artigo_a_funcao_retributiva_da_pena_privativa_de_liberdade.pdf , acesso em 29.06.2015. 16 De acordo com Paulo de Tarso Brandão , há uma infinidade de autores que, nos dias 16 atuais, afirmam que o Sistema Penal é uma promessa não cumprida. Senão vejamos: Numerosos são os autores que, em nossos dias, têm afirmado que o sistema penal não passa de uma promessa não cumprida. Maria Lúcia Karam, denunciando “A fantasia do sistema penal”, afirma que ele não passa de uma propaganda enganosa e abusiva, nos termos definidos no Código de Defesa do Consumidor. Esta é uma realidade inegável, porque a prometida segurança e tranquilidade sociais não são mais do que uma visão imaginária. Cristiane Brandão Augusto entende que: 17 Os problemas relacionados à administração da Justiça no Brasil, há muito, são temas de debates acadêmicos e legislativos, por representarem um ponto obscuro no processo democrático de ampliação da cidadania. O quadro que nos é apresentado constata um Poder Judiciário centralizador da resolução de conflitos emergentes de uma sociedade, sem que, entretanto, por obstáculos conjunturais e estruturais, consiga alcançar tal centralização e atingir, verdadeiramente, a grande totalidade da população portadora de certa demanda jurídica. Com relação a ilusão vendida pelo sistema penal e pela dogmática jurídica, Vera Regina Pereira de Andrade , preleciona: 18 ..., enquanto os sistemas penais seguem a marcha de sua violência aberta e encoberta contra os sujeitos que vivem em simbiose com ele e vivemos o império da insegurança jurídica “com” uma Dogmática Penal simbólica, esta segue ancorada numa visão idealizada (ideologizada) do funcionamento do Direito Penal, na premissa de sua legitimidade e na ilusão de segurança jurídica e as Escolas de direito e os Tribunais seguem sustentando, no prolongamento da comunidade científica, a sua reprodução. Pois no fundo, a fantasia da segurança jurídica não deixa de ser também a fantasia do poder que alimenta a onipotência dogmática e dos próprios operadores jurídicos formados na sua tradição. No que tange a urgência em encontrar alternativas para que tenhamos um sistema penal, melhor Tarso Brandão entende que: 19 É urgente encontrar alternativas que substituam esta desgastada estrutura. Este já é um verdadeiro truísmo, que remonta ao século passado. O advento da Lei nº 9.099/95 é um avanço que tem como origem a discussão em torno das várias propostas de alternativas ao longo de todo esse tempo. 16 BRANDÃO, Paulo de Tarso Considerações sobre as formas de alternativa ao processo penal estabelecidas na Lei 9.099/95, p. 129. 17 AUGUSTO, Cristiane Brandão Nova Justiça Penal: com ou sem juízo. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris. 2004, p. 01. 18 ANDRADE, Vera Regina Pereira A Ilusão de Segurança Jurídica do Controle da Violência à Violência do ControlePenal, Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado. 1997, p. 315 316. 19 Tarso BRANDÃO op. Cit. p. 130. 17 Como, podemos observar é fato que existe uma crise no sistema penal e que por mais se tenha tentado incorporar um sistema que objetivava menores índices de marginalidade, desde o seu início mostrouse falho. Nesse sentido, preleciona Brandão Augusto : 20 A preocupação com índices alarmantes de “evasão judiciária” e resolução alternativa das lesões ao direito levou a formulação de estudos e pesquisas, inclusive etnográficas, a respeito do papel desempenhado por este Poder Estatal, sua função no contexto do Estado Democrático e as principais causas do distanciamento social. Resultado disso foi uma vasta produção acadêmica elaborada e divulgada a partir dos anos oitenta, objetivando colaborar na identificação das falhas, detectálas e sugerir prioridades para aproximar o órgão jurisdicional dos seus jurisdicionados. Ainda sobre a existência de uma crise no Sistema Judiciário, Petrônio Calmon , 21 ensina que: A denominada “crise da justiça” ocupa um espaço crescente na agenda política e acadêmica. A sociedade, em muitos países, demonstra estar insatisfeita com o serviço público de justiça, que não atende adequadamente às necessidades, tanto na área cível como na penal. Queixase da ausência de justiça ou da sua morosidade, bem como na ineficácia de suas decisões. Resolver esse problema é um desafio a ser vencido de forma complexa e coordenada, não sendo sábio esperar que uma só iniciativa venha a servir de panaceia para males tão fortemente enraizados. Com relação a este tema a Advogada Ana Paula Faria , observa que: 22 Há muito se fala em crise do Poder Judiciário, aumento da violência, falência da pena de prisão, menor idade penal etc. Nos últimos anos, há a tentativa de simplificar as razões das crises, principalmente a do Poder Judiciário, argumentando a falta de juízes, de promotores, defensores públicos, funcionários, estrutura física etc. Enquanto isso, a sociedade espera do Estado que este a proteja das constantes ameaças e da violência. Em entrevista ao Jornal a Tarde a Promotora aposentada, Marília Lomanto Veloso , 23 faz algumas considerações bastante relevantes sobre o Sistema Penal Brasileiro, senão vejamos: Confinados num espaço mínimo, essas pessoas criam formas de controle e disputa. “O sistema penal é perverso, cruel, seletivo, desumano. Não resolve os conflitos sociais, econômicos e políticos que estão latentes”, avalia a estudiosa, que também é militante de movimentos sociais. 20 Brandão AUGUSTO op. Cit. p. 01. 21 CALMON, Petrônio. Fundamentos da mediação e da conciliação. Rio de Janeiro: Editora Forense. 2007, p. 03. 22 FARIA, Ana Paula. Justiça Restaurativa e Mediação Penal - um novo caminho na Justiça Criminal.Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12013, acesso em: 15.07.2015. 23 JORNAL A TARDE. Especialista critica modelo do sistema penal brasileiro, de 30 de julho de 2007, disponível em: http://atarde.uol.com.br/noticias/774705, acesso em: 15.07.2015. 18 Veloso defende que as rebeliões são uma forma desses sujeitos sociais darem visibilidade às suas necessidades. 24 A estudante de Direito Sara Berenice Dias de Aranda defende que: 25 O sistema penal vigente não pode ser considerado o método eficaz para que se promova a ressocialização de um indivíduo. O encarceramento do criminoso visava e acreditava numa conscientização ou correção do mesmo, entretanto, tal idéia abalouse após o advento da medida abolicionista do sistema penal. Aranda entende ainda que: A intenção do direito penal é defender, proteger, garantir e confirmar os direitos dos indivíduos com intuito de resolver as lides. Sabemos que o Estado não assegura e nem protege os bens jurídicos com a devida eficiência, já que a realidade social, oprimindo a grande maioria da sociedade, tem elevado o índice de criminosos. Porém, alguns penalistas afirmam que o fim do direito penal é a defesa dos bens jurídicos, e que deveria este ramo do direito preocupar se com a defesa de valores éticos sociais. Valendose disto, ressaltando tais valores éticossociais, a máquina penal teria sua força de coerção suprimida, já que a sociedade civil, não traria em seu bojo, uma noção particular de interesses, os quais todos respeitariam para que haja reciprocidade. Neste contexto, demonstrase evidente que também o sistema judiciário necessita de reformas, de modo que o acesso a justiça seja possível a todos, e que, especialmente no que concerne ao sistema penal, seja democrático e justo na aplicação de penas. 2.2. História da pena privativa de liberdade ou pena de prisão Antes de se falar em Justiça Restaurativa ou Reparadora, fazse necessário uma breve análise acerca da história do Direito Penal e da pena privativa de liberdade ou “pena de 26 prisão”, para que haja uma melhor compreensão do porque da necessidade, de serem revistos os métodos utilizados atualmente, em especial no ordenamento jurídico brasileiro. Num primeiro momento a história das penas aparece como um capítulo horrendo e infamante para a humanidade, e mais repugnante que a própria história dos delitos . Visto 27 que, como observa Lopes Jr., o delito constituise, em regra numa violência ocasional e 24 Idem ibidem. 25 ARANDA, Sara Berenice Dias. Análise critica Sobre o Sistema Penal Brasileiro. Disponível em: http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1128, acesso em:15.07.2015. 26 Pena Privativa de Liberdade forma de punir os delitos cometidos, segundo Bruno Landim Maia, em seu artigo “As Penas Privativas de Liberdade: Funções e Execuções”. 27 LOPES Jr., op. Cit., p. 64. 19 impulsiva, enquanto a pena não: tratase de um ato violento, premeditado e meticulosamente preparado . 28 Inicialmente a prisão servia somente com o fim de custódia , ou seja, o ofensor era 29 detido até a fase de sentença e execução, fosse ele absolvido ou condenado, levandose em consideração que as sanções se esgotavam com a morte e as penas corporais e infamantes. Nas suas origens, portanto, a prisão tinha inicialmente a função de custódia e tortura . 30 Na fase prémoderna, a prisão servia para custodir e penalizar fisicamente o condenado, as penas eram extremamente agressivas, utilizavase, inclusive, a mutilação e amputação demembros. Um exemplo emblemático das penas na antiguidade se encontra no Código de Hamurabbi : para o condenado pelo delito que hoje equivaleria ao furto e/ou 31 roubo a pena aplicável era a amputação de uma das mãos, em virtude de ser visto como um ato de gravidade relevante. Em efeito, à antiguidade remonta a “justiça privada” e o famoso ditado olho por olho e dente por dente, que detinha a finalidade de fazer com que o agressor 32 sofresse uma agressão proporcional ao dano causado, de forma que não voltasse a repetilo, servindo, ainda, como exemplo aos demais membros da sociedade – ou seja, já há muito tempo a penalização se caracterizava pela sua função “pedagógica” para a manutenção dos padrões sociais em vigor. Antes da instituição da pena de prisão convencional , a Igreja Católica se utilizava da 33 prisão canônica, que visava o encarceramento do pecador até o seu efetivo arrependimento, e não era vista como forma de destruição ou tortura, mas como uma forma de “melhorálo”. 34 No período católicoinquisitório utilizavase da privação de liberdade como meio punitivo e “reeducativo”, ou seja, podese afirmar que nos seus fundamentos já neste período 28 LOPES Jr. op. Cit., p. 64. 29 Custódia De acordo o dicionário de Língua Portuguesa, custódia significa: 1. Lugar onde se guarda com segurança alguém ou alguma coisa; 2. Proteção; guarda; escolta; 3. Prisão; detenção; 4. RELIGIÃO objeto do culto católico no qual se expõe à adoração dos fiéis a hóstia consagrada. Disponível em: http://www.infopedia.pt/linguaportuguesa/cust%C3%B3dia, acesso em: 16.07.2015. 30Iñaki RIVERA Beira apud Lopes Jr., ob. Cit., p.66. 31 Código de Hamurabi Sobre o Código de Hamurabi, diz Luiz Ricardo Pontes Gestal ser um dos mais antigos conjuntos de leis já encontrados e expõe as leis e punições caso essas não sejam respeitadas. Disponível em: http://tribunaregiao.com.br/opiniao/noticias.php?idNot=5480, acesso em: 16.07.2015. 32 Agressor adj. e s.m. Que ou aquele que ataca, que agride. Provocador. Disponível em: http://www.dicio.com.br/agressor/, acesso em 16.07.2015. 33 “Convencional” no sentido moderno atribuido ao termo. 34 Ao menos por parte das instituições, o que não significa que o mesmo ponto de vista fosse compartilhado pelo penalizado, mesmo porque muitas foram as vítimas da Igreja católica, condenadas pela “vontade de Deus” da qual os tribunais inquisitórios eram tradutores e interlocutores diretos. 20 encontravamse as bases do método utilizado atualmente – ainda que os meios fossem significativamente diferentes. Nesse sentido nos ensina Cesar Roberto Bitencourt : 35 A prisão canônica é um importante antecedente da prisão moderna, pois é lá que se encontram os princípios de uma “pena medicinal”, com o objetivo de levar o pecador ao arrependimento e à ideia de que a pena não deve servir para a destruição do condenado, senão para o seu melhoramento. Para uma melhor compreensão do porque, da instituição da pena de prisão Lopes Jr. , 36 faz menção aos métodos utilizados nos séculos de XVI e XVII, onde o meio punitivo predominante era a pena de morte, sendo que o enforcamento em praça pública era a forma utilizada com maior frequência. Por conseguinte, o Estado utilizavase de açoites, da 37 deportação e dos atos causadores da vergonha pública, como forma de punição. Por não se demonstrar um instrumento eficaz, a pena capital começa a ser questionada, diante do considerável aumento da criminalidade. Daí começa a surgir a ideia da prisão como forma de pena privativa de liberdade. A segunda metade do século XVII, na Europa, foi marcada por construções de prisões, para a efetiva correção de apenados, sendo que para tanto se utilizava do trabalho e da disciplina . Um período considerado fundamental para o desenvolvimento da pena privativa 38 de liberdade. 39 Sobre a passagem da penacustódia à prisãopena Lopes Jr. , observa que: 40 A principal causa de transformação da prisãocustódia em prisãopena foi a necessidade de que não se desperdiçaria “mão de obra”, e também para controlar sua utilização conforme as necessidades de valorização do capital. Existe uma forte influência do modelo capitalista implantado nessa época. É o controle da força de trabalho, da educação e da “domesticação” do trabalhador. Essa era a síntese dos 35 Cesar Roberto Bitencourt apud LOPES Jr., ob. Cit., p. 64. 36 LOPES Jr., op. Cit., p.65. 37 Estado dentre outras definições temos que Estado é Classe social (clero, nobreza, povo), nos antigos regimes monárquicoabsolutistas. Um povo social, política e juridicamente organizado, que, dispondo de uma estrutura administrativa, de um governo próprios, tem soberania sobre determinado território. Divisão política, administrativa e territorial de certos países (Brasil, Estados Unidos da América, México, Venezuela). O governo, a administração superior de um país. Disponível em: http://www.dicio.com.br/estado/, acesso em: 16.07.2015. 38 LOPES Jr., op. Cit., p. 65. 39 RIVERA Beira apud LOPES Jr., ob. Cit. p. 65. 40 LOPES Jr., op. Cit. p.65. 21 princípios que orientavam as worrkhouses inglesas, e também as rasphuis para 41 42 os homens e as spinhis para as mulheres em Amsterdã. 43 Historicamente, portanto, podese afirmar que foi somente no século XVIII que surgiu a privação de liberdade como “pena”, e apenas no século XIX a pena de prisão convertese na principal das penas, substituindo, dessa forma, as demais penas aplicáveis à época . 44 Neste sentido, como ensina Luigi Ferrajoli “o Direito nasce não como evolução, 45 senão como negação da vingança, daí por que não se falar em “evolução histórica” da pena de prisão.” Ainda com relação à evolução da pena, Aragonese Alonso oferece uma significativa 46 distinção entre as origens religiosas e o enquadramento civil e penal nas evoluções do Estado laico, que se revela pertinente para a reflexão proposta neste trabalho. Segundo este autor: Podese resumir a evolução da pena de seguinte forma: inicialmente a reação era eminentemente coletiva e orientada contra o membro que havia transgredido a convivência social. A reação social é, na sua origem, basicamente religiosa, e só do modo paulatino se transforma em civil. O principal é que nessa época existia uma vingança coletiva, que não pode ser considerada como pena,pois vingança e pena são dois fenômenos distintos. A vingança implica liberdade, força e disposição individuais; a pena, a existência de um poder organizado. Hoje, portanto, nos Estados democráticos sedimentase o entendimento de que a elaboração, execução e aplicação da matéria penal é uma prerrogativa da sociedade organizada representada pelas instituições públicas e pelos órgãos estatais. No sistema jurídico brasileiro, a competência para legislar em matéria penal é prerrogativa da União . O 47 sistema penal no seu conjunto, seguindo os fundamentos do direito penal moderno, formalmente se predispõe à ressocialização do infrator, seguindo no sentido de dar concreção ao princípio da dignidade humana e aos direitos humanos constitucionalmente assegurados – e que, portanto, irradiam seus efeitos em todos os ramos do Direito, inclusive no âmbito penal. 41 Workhouses traduzido para o Português, temos que Workhouses significa Asilo. 42 Rasphuis significa etimologicamente casa della sega, poiché i reclusi erano obbligati a lavorare fino a quattordici ore al giorno. 43 Spinhis Nos anos 1597 e 1600, criaramse também em Amsterdã a SPINHIS, para mulheres e uma seção especial para meninas adolescentes, respectivamente. Uma espécie de casa de detenção feminina (grifo nosso). 44 RIVERA Beira apud LOPES Jr., op. cit., p.65. 45 Luigi FERRAJOLI apud LOPES Jr., op. Cit., p.65. 46 Aragonese ALONSO apud LOPES Jr., op. Cit., p. 65. 47 Art. 22 da CF Compete privativamente à União legislar sobre: I direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho. BRASIL. 22 No que concerne às funções da pena restritiva de liberdade ou pena de prisão, Carvalho Melo ensina que a pena exerce duas funções: a função preventiva que parte da 48 premissa de que a prevenção geral é tanto mais eficiente quanto maior é a certeza da punição; e a função retributiva, que parte da premissa de que a finalidade da pena é o restabelecimento da ordem violada pelo delito, na medida em que a pena deve ser proporcional ao crime cometido . 49 Ainda, seguindo com o mesmo autor, é oportuno observar que a função preventiva, visa evitar que o dano seja efetivado, enquanto que, a retributiva atua como forma de castigar o infrator . Neste sentido, Carvalho Melo traz um questionamento bastante interessante, 50 51 qual seja: Analisandose a pena sob estes aspectos, sem qualquer exame dos diversos entendimentos filosóficos, é inafastável a utilidade da pena como garantia de convivência social. Perguntaríamos, então, e a função ressocializadora e de prevenção individual? É lógico que a privação de liberdade em nossos presídios não serve a esta finalidade, pois o condenado não é “reeducado” e sim “socializado” para viver na prisão de acordo com as regras próprias ali determinadas pelos apenados. Impera dentro das prisões a lei do mais forte, ou seja, quem tem força ou poder subordina os mais fracos em uma verdadeira organização criminosa. Contudo, notase que a Pena Restritiva de Liberdade ou Pena de Prisão surgiu como um meio de representatividade do Estado. Entende Carvalho Melo , que a prisão está longe de exercer a finalidade de organismo 52 de custódia, afirma ainda que a prisão passa a ser a “verdadeira escala de graduação para toda espécie de delito”. Para confirmar tal assertiva, o autor traz dados impressionantes: só no Estado de Goiás o índice de reincidência da população encarcerada girava em torno de 50%, no ano de 2008, enquanto que os índices nacionais, na mesma época, girava em torno de 76%, segundo dados da Secretaria de Estado de Justiça . 53 Dessa forma, entendese que a pena de prisão surgiu tão somente para evitar que o cidadão continuasse a fazer sua própria justiça, passando dessa forma o Estado a representar o cidadão. Como de fato acontece nos dias atuais, ainda que para isso se faça necessário o uso de medidas drásticas, como é o caso da pena de prisão. Sabese ainda que, a partir do momento que o Estado atraiu para si a responsabilidade de representar cada membro da 48 Carvalho MELO op. Cit. 49 Carvalho MELO op. Cit. 50 Carvalho MELO op. Cit. 51 Carvalho MELO op. Cit. 52 Carvalho MELO, op. Cit. 53 Carvalho MELO, op. Cit. 23 sociedade por ele representada, passou também a Legislar, ou seja, o próprio Estado passou a tipificar as condutas delituosas e definir o que é ou não considerado um ato criminoso, diante do seu parecer. Ainda com relação à pena de prisão, entendeu o Tribunal da Relação de Coimbra , 54 que: O FUNDAMENTO LEGITIMADOR DA PENA É A PREVENÇÃO NA SUA DUPLA DIMENSÃO GERAL E ESPECIAL. A CULPA DO INFRACTOR DESEMPENHA O DUPLO PAPEL DE PRESSUPOSTO (NÃO HÁ PENA SEM CULPA) E DE LIMITE MÁXIMO DA PENA A APLICAR. O fim do direito penal é o da protecção dos bens jurídico/penais e a pena é o meio de realização dessa tutela, havendo de estabelecerse uma correlação entre a medida da pena e a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes, nesta entrando as considerações de prevenção geral e especial. Pela prevenção geral (positiva) fazse apelo à consciencialização geral da importância social do bem jurídico tutelado e pelo outro no restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efectiva tutela penal dos bens tutelados; pela prevenção especial pretendese a ressocialização do delinquente (prevenção especial positiva) e a dissuasão da prática de futuros crimes (prevenção especial negativa). Em princípio, temse que a pena privativa de liberdade surgiu com a finalidade de fazer com que o ofensor pague sua dívida diante da sociedade, sendo que para isso utiliza, detre outros, de meios privativos de liberdade. Porém em momento algum o método utilizado permite que o ofensor repare o dano por ele causado. 2.3. As diferentes tipologias de “justiça” 2.3.1. Justiça restaurativa O principal intuito da Justiça Restaurativa é auxiliar o Sistema Judiciário de modo que crimes de pequeno potencial ofensivo não sejam tratados com tanto rigor, contribuindo ainda para um possível desafogamento do judiciário. Passemos agora a um breve estudo histórico sobre a Justiça Restaurativista. Segundo LeobertoNarciso Brancher o marco inicial da ideia restaurativista está relacionado com a 55 prática de mediação entre réus condenados e vítimas de seus crimes, promovida por movimentos de assistência religiosa em presídios norteamericanos a partir dos anos 70. 54 TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, Recurso Penal nº 1452/09.9PCCBR.C1, Relator: RIBEIRO MARTINS, Disponível em: http://www.trc.pt/direitopenal/5075recpen1452099pccbrc1.html, Julgado em: 10.03.2012, Acesso em: 30.06.2015). Observese que no Brasil os Recursos são julgados pelos Tribunais de Justiça, em Portugal estes são processados e julgados no Tribunal da Relação. 55 BRANCHER, op. Cit. 24 A Justiça Restaurativa, dentre outras propostas de um Sistema Penal melhor, surgiu, ante a necessidade de mudanças. Para o Sistema Penal, inúmeras alternativas foram colocadas em pauta, dentre elas a Justiça Restaurativa. Haja vista, que o cenário na década de 70 vinha demonstrando falhas. Uma das principais falhas demonstradas neste período é o fato de que os índices de criminalidade apresentavam um aumento significativo, ao invés de sofrer uma diminuição, como se esperava. Outra falha considerável era o aumento significativo de reincidentes, ou seja, temos a ideia de que o dever da pena aplicada é fazer com que o delinquente não volte a praticar atos criminosos, contudo, o que se observa é o inverso. Podese dizer que a prisão atuava como escola para o cometimento de crimes ainda piores aos já cometidos, esta realidade predomina até os dias atuais. Ou seja, o Sistema tanto da década de 70 quanto o Sistema atual, denotam a necessidade de repensar e reestruturar. Neste sentido, Francisco Gelinski Neto observa que: 56 A ponta do iceberg da crise prisional dos últimos anos tem sido a superlotação dos presídios deixando um rastro de rebeliões, mortes, fugas e imagens de insalubridade no ambiente carcerário. A superlotação é alimentada pela falta de recuperação dos egressos e pelo crescimento da criminalidade aliados à incapacidade do Estado em investir no suprimento de novas vagas ou de condições adequadas de ressocialização dos presidiários. Como se pode observar, apesar do Estado ser o detentor do Direito e do Dever , de 57 58 Punir, para este o meio mais adequado e utilizado é ainda a Pena Privativa de Liberdade. 2.3.2. Justiça retributiva Entendese por Justiça Retributiva, o método utilizado atualmente em nosso ordenamento jurídico, que visa apenas a punição do infrator, se mostrando o Estado 56GELINSKI Neto, Francisco A Crise Carcerária e a Privatização do Sistema Prisional. Disponível em: http://www.apec.unesc.net/V_EEC/sessoes_tematicas/Temas%20Especiais/A%20CRISE%20CARCER%C3%8 1RIA%20E%20A%20PRIVATIZA%C3%87%C3%83O%20DO%20SISTEMA%20PRISIONAL.pdf. Acesso em: 23.07.2015. 57 O Direito pode ser definido como um complexo de leis ou normas que regem as relações entre os homens. Ciência que estuda essas normas. Imposto, taxa: direito alfandegário. Faculdade de praticar um ato, de possuir, usar, exigir ou dispor de alguma coisa. Disponível em: http://www.dicio.com.br/direito/, acesso em: 16.10.2012. 58 Dever v.t. Ter por obrigação; ter de (fazer alguma coisa). Ter dívidas: deve milhões. Seguido de um infinitivo, exprime: a) necessidade ou inevitabilidade: tudo deve acabar; b) intenção: devo viajar muito breve; c) suposição: ele deve estar muito rico; d) probabilidade: deve chegar logo mais; e) obrigação moral: ele devia dar mais assistência à família. Disponível em: http://www.dicio.com.br/dever/, acesso em: 23.07.2015. 25 despreocupado se aquele que veio delinquir está apto a retornar a sociedade após o cumprimento de sua pena. Na maioria das vezes, aquele que por falta de instrução ou por circunstâncias, muitas vezes alheias à sua própria vontade, veio a cometer um ilícito é punido por meio de privação de sua liberdade, porém o que se verifica é que na maioria das vezes, esse cidadão volta à sociedade ainda mais revoltado com “Sistema” em si, voltando a delinquir. Tendo em vista que, o Estado visa apenas a punição, deixando de lado a busca do que de fato está errado. O Estado atrai para si a responsabilidade para resolver os conflitos, aplicando penas severas para situações que poderiam ser resolvidas, de modo menos agressivo. Neste sentido Paulo de Tarso Brandão , observa que: 59 Ante o cometimento de um ilícito penal, surge para o Estado o poderdever de punir aquele que viola o ordenamento jurídico e a paz social, retribuindo o mal causado com a comissão do delito com a aplicação de medidas extremas. Assim, a pena privativa de liberdade tornouse prática constante em nosso atual sistema de justiça penal e é imposta como meio de resposta à infração penal e como medida apta a prevenir futuras condutas e ressocializar o infrator, o que, infelizmente, não acontece. Ao se falar em Justiça Retributiva, fazse necessário, trazer o entendimento de Carvalho Melo , no que diz respeito a função da pena, como podemos ver: 60 (...), quando nós operadores do Direito buscamos o fiel cumprimento da sanção penal nos graves delitos, temos a certeza de que não estamos contribuindo para “proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado ou do internado” (art. 1º, da LEP), e sim retribuir uma violação da norma de conduta. A pena privativa de liberdade não se presta a corrigir, educar ou fincar preceitos éticossociais no criminoso perigoso, mas apenas adequar a justa punição ao mal praticado pelo delinquente. Como podemos observar a Justiça Restaurativa se presta tão somente a corrigir o mal feito, porém aplicandose para tanto, métodos extremos, que, por sua vez, vêm apresentando reações adversas daquelas previstas. 2.4. Métodos alternativos de resolução de conflitos 59 Tarso BRANDÃO, op. Cit., p.129. 60 Carvalho Melo, op. Cit. 26 Com relação aos métodos alternativos de resolução de conflitos, há de se deixar claro, que não possuem o objetivo de abolir o sistema penal ou o sistema judiciário, mas sim contribuir para a construção de um sistema mais célere e mais justo. Evitando que crimes de pequeno potencial ofensivo sejam tratados com tanta rigorosidade. Restando claro que estes métodos, devem ser aplicados em situações que não exijam tanto rigor, como é o caso de um crime de furto simples , não sendo, porém o método mais61 aconselhável nos crimes de maior potencial ofensivo, como por exemplo, em caso de tentativa de homicídio ou homicídio consumado, levando em consideração que neste caso o ofensor põe vidas em risco. Passemos, agora, ao estudo dos métodos colocados à disposição do sistema judiciário, para resolução de conflitos. Apresentaremos a seguir, algumas considerações dos métodos utilizados com maior frequência, quais sejam: a mediação, a arbitragem, a conciliação e a negociação. Insta salientar que, apesar de estes métodos apresentarem muitas peculiaridades em comum, são institutos diferentes, como poderemos ver adiante. 2.4.1. Mediação como método alternativo Outro meio de resolução de conflitos utilizado atualmente é a mediação, é um dos vários métodos chamados de alternativos para a resolução de conflito e são considerados alternativos por constituírem em opções ao sistema tradicional de justiça . 62 Com relação à mediação, temos que a característica mais marcante é justamente a negociação, sendo ela considerada por Sampaio e Neto como o “instrumento primeiro e natural para solucionar os conflitos, ao qual muitas vezes recorrem seus agentes ainda que de forma inconsciente” . 63 Quando se recorre ao diálogo o que se busca é atender o reclamo de uma parte à outra. Nestes casos, não existem terceiros, apenas ofensor e ofendido, segundo Sampaio e Neto : 64 61 Art. 155 do CP Subtrair para si ou para outrem, coisa alheia imóvel. § 1º [...] §2º Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuíla de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa. BRASIL. 62 Sampaio, Lia Regina Castaldi; Neto, Adolfo Braga. O que é mediação de conflitos. São Paulo: Editora Brasiliense. 2007, p. 08. 63 Sampaio e Neto, op. Cit., p.09. 64 Sampaio e Neto, op. Cit., p.09. 27 Nestes casos, não existe o terceiro , imparcial e independente, pois a busca da solução se faz apenas por aqueles envolvidos na controvérsia, que recorrem ao diálogo e à troca de informações e impressões. Poderíamos dizer, portanto, que a negociação é uma primeira instância da tentativa de resolução de conflitos, pois, diante de solução que atenda a ambas as partes o conflito está resolvido . 65 Ainda sobre a mediação, de acordo com Lilia de Morais Sales , procede do latim 66 mediare, que significa mediar, dividir ao meio ou intervir. Para esta autora “a mediação apresentase como uma forma de amigável e colaborativa de solução das controvérsias que busca a melhor forma de solução pelas próprias partes” . 67 Segundo SALES , temos que a mediação: 68 É um procedimento em que e através do qual uma terceira pessoa age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma disputa, evitando antagonismos, porém sem prescrever a solução. As partes são as responsáveis pela decisão que atribuirá fim ao conflito. A mediação, quando oferece liberdade às partes de solucionar, agindo como meio facilitador para tal, passa não somente a ajudar na solução de conflitos, como também para prevenilos. A autora destaca que a mediação: 69 É um mecanismo de resolução de controvérsias pelas próprias partes, construindo estas uma decisão ponderada, eficaz e satisfatória para ambas. Essa decisão construída possui o mediador como facilitador dessa construção por meio do restabelecimento do diálogo pacífico. Com relação às partes no processo de mediação, Lilia de Morais Sales entende que estas “detém a gestão de seus conflitos e, consequentemente, o poder de decidir, tendo o mediador como auxiliar” , ao contrário da jurisdição estatal, onde cabe ao Estado decidir de 70 acordo com as suas convicções pautadas na normatividade vigente. Diante dos ensinamentos acerca da mediação, segundo Adofo Braga Neto , 71 Mediação é uma técnica nãoadversarial de resolução de conflitos, por intermédio da qual duas ou mais pessoas (físicas, jurídicas, públicas, etc.) recorrem a um especialista neutro, capacitado, que realiza reuniões conjuntas e/ou separadas, com o 65 Sampaio e Neto, op. Cit., p.09 10. 66 Lilia Maia de Morais SALES, Justiça e Mediação de Conflitos, Belo Horizonte: Editora Delrey, 2004, p.23. 67 Morais SALES, op. Cit., p.23. 68 Morais SALES, op. Cit. p.23 24. 69 Morais SALES, op. Cit. p.24. 70 Morais SALES, op. Cit. p.24. 71 Adolfo Braga Neto apud Morais SALES, op. Cit. p.24. 28 intuito de estimulálas a obter uma solução consensual e satisfatória, salvaguardando o bom relacionamento entre elas. Dessa forma, temos que a mediação é um método utilizado, de modo a evitar um conflito ainda maior, do que aquele já existente, e para que a mediação se torne possível, fazse necessário, que tanto ofensor quanto ofendido estejam de acordo, de modo a evitar que o processo judicial se estenda por muito tempo. No que concerne aos objetivos da mediação, Sales entende que: 72 A solução de conflitos é o objetivo mais claro da mediação. A solução se dá por meio do diálogo, no qual as partes interagem em busca de um acordo satisfatório para ambas, possibilitando uma boa administração da situação vivida. A comunicação e a consequente participação dos indivíduos na resolução das controvérsias são imprescindíveis para o alcance do acordo adequado. Por mais que pareça ser um procedimento simples, Sales observa que: 73 Esse procedimento de solução de conflitos é complexo e demanda várias etapas a serem seguidas. Em primeiro lugar, devese minimizar as diferenças entre as partes, amenizando o sentimento negativo e buscando a comunicação entre elas. Para que haja esta comunicação, é necessário que se aborde a controvérsia de maneira positiva, ou seja, como meio de melhorar a vida, visto que todo crescimento, todo o conhecimento e toda a evolução estão vinculados a impasses. O diálogo pode ser facilitado quando se transforma a visão que se tem sobre o conflito. Este deixa de ser algo eminentemente mau para ser algo comum na vida de qualquer ser humano que vive em sociedade. É fruto da convivência, e sempre ocorrerá sob diferentes aspectos. Quando se percebe que um impasse pode ser um momento de reflexão e daí da transformação, tornase algo positivo. No tocante ao terceiro existente no procedimento de mediação, temos que este tem como papel apenas intermediar a negociação, agindo como facilitador, ou seja, é uma espéciede apaziguador para que a mediação se torne possível. 2.4.2. Da Negociação Tendo em vista que a negociação, a conciliação, a mediação e a arbitragem possuem aspectos muito similares – que podem inclusive levar ao equívoco de se pensar que, apesar de 72 Morais SALES, op. Cit. p.27. 73 Lilia Maia de Morais SALES, op. Cit. p.28. 29 possuírem diferentes nomenclaturas, tratase de um mesmo instituto –, é oportuno destacar que denotam institutos com peculiaridades específicas. Para tanto vale deixar claro que são institutos diferentes e aplicáveis em situações diversas. Como poderemos observar a seguir. Segundo Sales negociação: 74 (...) é um procedimento muito comum na vida do ser humano. As pessoas estão sempre negociando a qualquer tempo e lugar. Uma criança negocia com outra um brinquedo ou um postal; um professor ajusta com o coordenador a sala de aula que irá ocupar; o cantor negocia o tipo de show que apresentará, enfim, antes da negociação ser um fato jurídico, ela é um acontecimento natural. Esta autora entende que “na negociação, as partes chegam à resolução do conflito satisfatoriamente por meio do método da autocomposição” . 75 No que diz respeito à negociação ou autocomposição , muitos são os casos em que 76 este instituto demonstrase plausível e eficaz. Podemos citar aqui dois exemplos frequentes: acidentes de trânsito em que as partes, em comum acordo, chegam a um consenso no próprio local do infortúnio; ou a situação em que o credor em não havendo visto satisfeito o seu crédito, busca por meio de diálogo direto com o seu devedor, satisfazer seu débito e solucionar o problema. Com relação ao cumprimento da negociação, nos ensina Morais Sales : 77 O cumprimento das decisões apresentadas através da negociação não é obrigatório. As partes são livres para cumprilas ou não. É certo que, tendo as partes negociado conscientemente, a consequência natural é a do cumprimento da decisão. Há de ressaltar que, quando a negociação é atribuída à validade jurídica, como um contrato, o cumprimento tornase obrigatório. Entendese que para a negociação ser eficaz, tem que existir a vontade das partes, para a resolução do problema, dependendo da existência de um consenso. 74 Morais SALES, op. Cit., p.36. 75 Morais SALES, op. Cit., p.36. 76 Autocomposição Para ALCALÁZAMORA Autocomposição é a prevenção ou solução do litígio por decisão consensual das próprias pessoas envolvidas no conflito. ALCALÁZAMORAapudPetrônio CALMON, op. Cit., p. 53. 77 Morais SALES, op. Cit., p.37. 30 2.4.3. Da Conciliação Com relação à conciliação apesar desta ser muito parecida com a mediação, destaca Morais SALES que: 78 No Brasil, a conciliação é normalmente exercida por força de lei e obrigatoriamente por servidor público, que se adjudica do poder e autoridade conferidos legalmente ao seu cargo para facilitar a resolução do litígio. O conciliador privado aparece com o advento da Lei nº 9.958/00, que trouxe o conciliador, eleito pelos trabalhadores nas empresas, para compor as comissões de conciliação prévia, com os conciliadores indicados pela empresa, ou comissões intersindicais de conciliação, neste caso escolhidos pelos sindicatos dos trabalhadores e sindicatos patronais. É obrigatória a tentativa de composição de conflitos por essas comissões, antes de ingressar na via jurisdicional. Contudo, Morais SALES entende que a diferença anteriormente apontada não é a 79 mais importante, para tanto destaca que: A diferença fundamental entre a mediação e a conciliação reside no conteúdo de cada instituto. Na conciliação o objetivo é o acordo, ou seja, as partes, mesmo adversárias, devem chegar a um acordo para evitar um processo judicial. Na mediação as partes não devem ser entendidas como adversárias e o acordo é consequência da real comunicação entre as partes. Na conciliação o mediador facilita a comunicação, sem induzir as partes ao acordo. Observase, portanto, que ao pé que a conciliação tendenciona ao acordo, ainda que sob a influência de um intermediário que atua como representante estatal, para evitar o litígio, a função da mediação é que o acordo ocorra de forma espontânea, sendo que aqui também existe a figura de um intermediário, porém sua atuação é meramente como um facilitador e não cabe a este intervir nas negociações, ou seja, o interesse de se chegar a um consenso cabe tão somente às partes envolvidas. 78 Morais SALES, op. Cit., p.38. 79Morais SALES, op. Cit., p.38. 31 2.4.4. Da Arbitragem Por fim, temos o instituto da arbitragem que, segundo SALES, “é um procedimento no qual as partes elegem um árbitro para solucionar as divergências” . Sendo que neste caso as 80 partes não possuem o poder de decidir, cabendo ao árbitro o poder de decisão. A decisão arbitral não está sujeita a homologação nem é passível de recurso no Poder Judiciário . Seu cumprimento é obrigatório. O instituto da arbitragem encontra guarida na Lei 81 nº 9.037/96 . 82 Como se pode observar, existem de fato diferenças entre os institutos apresentados. E a partir do momento que visualizadas as diferenças, se torna mais fácil fazer a utilização dos métodos aqui delineados. 80Morais SALES, op. Cit., p.41. 81Morais SALES, op. Cit., p.42 82 Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1.996, dispõe sobre a arbitragem. BRASIL. 32 3. Considerações gerais acerca da Justiça Restaurativa em contrapartida com a Justiça Retributiva AJUDAME, SENHOR, a ser justo e firme, honesto e puro, comedido e magnânimo, sereno e humilde. Que eu seja implacável com o erro, mas compreensivo com os que erraram. Amigo da Verdade e guia dos que a procuram. Aplicador da Lei, mas antes de tudo, cumpridor da mesma. Não permitas jamais que eu lave as mãos como Pilatos, diante do inocente, nem atire como Heródes, sobre os ombros do oprimido a túnica do opróbrio. Que eu não tema César e nem por temor dele pergunte ao poviléu se ele prefere "Barrabás ou Jesus. In PRECE DE UM JUIZ Justiça Restaurativa consiste da promoção de encontro entre o autor do fato e a vítima, cada qual apoiado por comunidade de referência, em ambiente seguro, no qual um e outro têm a oportunidade de relatar os efeitos
Compartilhar