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ANDRÉA LAUÉ PASSOS SANTOS BACHAREL EM ENFERMAGEM DOCENTE UNIVERSITÁRIA ESP. SAÚDE PÚBLICA COM ÊNFASE EM ATENÇÃO BÁSICA PÓS-GRADUANDA EM DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR PÓS – GRADUANDA EM SEXOLOGIA E SEXUALIDADE HUMANA Fundamentos da Saúde Pública e Coletiva Bem-vindos a esta aula sobre os Fundamentos da Saúde Pública e Coletiva, onde exploraremos os conceitos essenciais, a evolução histórica e as aplicações práticas na realidade brasileira. Examinaremos como a compreensão da saúde evoluiu de uma visão simplista para um entendimento complexo que considera os determinantes sociais. Discutiremos também as abordagens contemporâneas que moldam as políticas de saúde no Brasil, destacando o papel fundamental do Sistema Único de Saúde (SUS) na garantia da saúde como um direito constitucional e universal. Esta jornada nos levará a compreender como a saúde coletiva se estabeleceu como um campo de conhecimento e prática transformadora no contexto brasileiro. 3 Conceitos Básicos sobre Saúde Pública e Coletiva A saúde pública pode ser definida como um conjunto coordenado de medidas executadas pelo Estado, com o objetivo primordial de garantir o bem-estar mental, físico e social da população. Suas ações são direcionadas para o enfrentamento de problemas representados por óbitos, doenças e fatores de risco que afetam coletividades humanas. Saúde Pública Representa o conjunto de medidas promovidas pelo Estado para garantir o bem-estar da população, com foco no controle de doenças, vigilância epidemiológica e administração de serviços de saúde, aplicando conhecimentos científicos para resolver problemas coletivos. Saúde Coletiva Caracteriza-se como um campo científico onde se produzem saberes e conhecimentos sobre saúde, incorporando diversas disciplinas em uma abordagem interdisciplinar, analisando as relações entre saúde e estrutura social. Diferenças Fundamentais Enquanto a saúde pública concentra-se em ações administrativas coordenadas pelo Estado, a saúde coletiva expande essa visão para incluir dimensões sociais, culturais e políticas do processo saúde-doença, propondo transformações estruturais. 4 Diferenciação entre Saúde Pública e Coletiva A saúde pública tradicional está intrinsecamente vinculada ao poder estatal e suas instituições, focando-se principalmente na administração e planejamento de serviços sanitários. Seu desenvolvimento histórico está associado à medicina preventiva e social, com abordagens frequentemente verticalizadas para o controle de doenças específicas. Saúde Pública Vinculada diretamente ao aparelho estatal Foco em medidas sanitárias e controle de doenças Abordagem técnico-administrativa Ênfase em programas verticais Modelo biologicista predominante Saúde Coletiva Campo científico interdisciplinar Incorpora ciências sociais e humanas Ênfase na determinação social da saúde Valorização da participação comunitária Crítica ao modelo biomédico hegemônico A saúde coletiva emergiu como um paradigma crítico e ampliado, propondo uma abordagem interdisciplinar que reconhece a complexidade dos determinantes do processo saúde-doença e valoriza a participação social na construção de políticas públicas. 5 História da Saúde Pública no Mundo A trajetória da saúde pública no mundo remonta à antiguidade, quando civilizações como Egito, Grécia e Roma já implementavam medidas sanitárias básicas, incluindo sistemas de saneamento e aquedutos. No entanto, foi durante os séculos XVIII e XIX, impulsionada pela Revolução Industrial, que surgiram as primeiras políticas públicas de saúde sistemáticas. 1 Antiguidade Medidas sanitárias básicas implementadas por civilizações como Egito, Grécia e Roma, incluindo sistemas de drenagem e aquedutos. 2 Século XVIII-XIX Revolução Industrial e urbanização acelerada levam a epidemias e primeiras políticas sanitárias. Surgimento da medicina social e dos estudos epidemiológicos. 3 1920 Relatório Dawson no Reino Unido estabelece as bases para sistemas de saúde organizados por níveis de atenção, influenciando modelos mundiais. 4 1948 Criação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e definição ampliada de saúde como "estado de completo bem-estar físico, mental e social". 5 1978 Declaração de Alma-Ata estabelece a meta "Saúde para Todos no Ano 2000" e valoriza a atenção primária como estratégia fundamental. 6 História das Políticas Públicas de Saúde no Brasil A evolução das políticas de saúde no Brasil reflete tanto as transformações sociais e políticas do país quanto as influências internacionais. De medidas sanitárias emergenciais no início do século XX, passamos para um sistema nacional de saúde universal com a criação do SUS na Constituição de 1988. Período Colonial até 1900 Caracterizado por ações sanitárias pontuais, principalmente durante epidemias. Com a chegada da família real em 1808, foram implementadas as primeiras medidas sanitárias governamentais, incluindo a criação de escolas médicas e ações de controle de portos. Era Vargas (1930-1945) Expansão das Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) criadas pela Lei Eloy Chaves em 1923, transformando-se em Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs). Estabelecimento de um sistema de saúde previdenciário, vinculado ao trabalho formal. Período Democrático e Ditadura Militar Criação do Ministério da Saúde em 1953. Durante o regime militar, unificação dos IAPs no INPS e posterior criação do INAMPS, consolidando um modelo médico-assistencial privatista e excludente. Movimento pela Reforma Sanitária Nas décadas de 1970-1980, profissionais e movimentos sociais articulam a luta por um sistema de saúde universal e democrático, culminando na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986). Constituição de 1988 Reconhecimento da saúde como direito de todos e dever do Estado, com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), baseado nos princípios de universalidade, integralidade e equidade. 7 Criação e Consolidação do SUS O Sistema Único de Saúde (SUS) representa um marco histórico nas políticas públicas brasileiras, nascido da luta pela democratização da saúde durante o processo de redemocratização do país. Estabelecido pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 196, que definiu a saúde como "direito de todos e dever do Estado". Universalidade Garantia de acesso a ações e serviços de saúde para toda a população, sem discriminação ou barreiras, assegurando a saúde como direito fundamental. Equidade Priorização de recursos e ações para populações com maiores necessidades, reconhecendo diferenças nas condições de vida e saúde entre grupos sociais. Integralidade Consideração das necessidades de saúde em todos os níveis de complexidade, articulando ações preventivas e curativas, individuais e coletivas. Participação Social Envolvimento da comunidade na formulação, fiscalização e implementação das políticas de saúde através de Conselhos e Conferências de Saúde. Descentralização Distribuição de responsabilidades entre os três níveis de governo (federal, estadual e municipal), com ênfase na municipalização das ações. A regulamentação do SUS ocorreu através das Leis nº 8.080 e nº 8.142 de 1990, que estabeleceram sua estrutura organizacional, princípios operacionais e mecanismos de financiamento e participação social. 8 Processo Saúde-Doença A compreensão do processo saúde-doença evoluiu significativamente ao longo da história, transitando de modelos explicativos simplistas para abordagens complexas e multidimensionais. Inicialmente baseado em explicações mágico-religiosas, o entendimento passou por teorias monocausais, multicausais, até chegar à perspectiva contemporânea da determinação social. Determinação Social Reconhece o impacto das estruturas sociais, econômicas e políticas Modelo Biopsicossocial Integra fatores biológicos, psicológicos e sociais Teoria Multicausal Considera múltiplos fatores na gênese das doenças Teoria Monocausal Atribui a doença a um único agente etiológico O Brasil experimenta atualmente uma complexa transição epidemiológica, caracterizada pela coexistência de doenças infecciosase crônico-degenerativas, além de causas externas (violência, acidentes). Esta tripla carga de doenças está diretamente relacionada às transformações demográficas, com o envelhecimento populacional, e às profundas desigualdades sociais que marcam nossa sociedade. 9 O Conceito Ampliado de Saúde A definição de saúde proposta pela Organização Mundial da Saúde em 1948 como "estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças" representou um avanço significativo na compreensão da saúde para além do modelo biomédico. No entanto, críticas posteriores apontaram seu caráter utópico e estático. 1948 Definição OMS "Estado de completo bem-estar físico, mental e social, não apenas ausência de doença" 1986 8ª CNS Brasil Saúde como resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, lazer, liberdade e acesso a serviços de saúde 1988 Constituição Federal Saúde como direito social fundamental (Art. 6º) e direito de todos e dever do Estado (Art. 196) No Brasil, a 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986) foi um marco ao definir saúde como resultado das condições concretas de vida, incluindo alimentação, moradia, educação, meio ambiente, trabalho, transporte e acesso a serviços. Esta concepção ampliada foi posteriormente incorporada à Constituição Federal de 1988, estabelecendo a saúde como direito social e como potência de vida, não apenas ausência de enfermidade. 10 Saúde Pública x Saúde Coletiva A diferenciação entre saúde pública e saúde coletiva vai além da terminologia, representando distintas concepções epistemológicas, metodológicas e políticas sobre o campo da saúde. Enquanto a primeira está mais associada ao modelo tradicional de administração sanitária pelo Estado, a segunda emerge como um campo científico crítico e uma prática social transformadora. Origem e Institucionalidade Saúde pública: vinculada ao aparelho estatal e suas instituições. Saúde coletiva: surgida de movimentos críticos e reforma sanitária no Brasil. Abordagem Metodológica Saúde pública: predominância de métodos epidemiológicos clássicos. Saúde coletiva: incorporação de métodos das ciências sociais e humanas. Relação com a Sociedade Saúde pública: ações verticais direcionadas à população. Saúde coletiva: valorização da participação social e controle democrático. Objeto de Intervenção Saúde pública: foco na doença e seus determinantes diretos. Saúde coletiva: determinação social do processo saúde-doença e transformação social. A saúde coletiva brasileira constituiu-se como um campo científico inovador, incorporando saberes da epidemiologia, planejamento em saúde e ciências sociais, além de configurar-se como movimento ideológico em torno da democratização da saúde e crítica ao modelo biomédico hegemônico. 11 Determinantes e Condicionantes em Saúde Os determinantes e condicionantes em saúde representam o conjunto de fatores que influenciam o estado de saúde dos indivíduos e coletividades. Esses fatores interagem de forma complexa, produzindo diferentes perfis epidemiológicos conforme os contextos sociais, econômicos e ambientais em que as pessoas vivem e trabalham. Fatores Socioeconômicos Incluem renda, educação, ocupação, condições de trabalho e acesso a serviços essenciais. Estão entre os determinantes mais importantes, pois estruturam as oportunidades de vida e exposição a riscos à saúde. Condições de Vida Abrangem moradia, saneamento básico, disponibilidade de alimentos, segurança pública e condições ambientais. A Lei 8.080/90 reconhece explicitamente estes fatores como condicionantes do estado de saúde. Fatores Biológicos Genética, idade, sexo e características hereditárias influenciam a suscetibilidade individual a doenças, mas interagem com os determinantes sociais, resultando em diferentes expressões de saúde e doença. Comportamentos e Estilos de Vida Incluem padrões alimentares, atividade física, consumo de álcool e tabaco. São fortemente condicionados pelo contexto socioeconômico e cultural, não sendo apenas escolhas individuais. A compreensão dos determinantes e condicionantes de saúde permite o desenvolvimento de políticas públicas intersetoriais que abordem as causas fundamentais dos problemas de saúde, não apenas seus efeitos imediatos. 12 Classificação dos Determinantes de Saúde Os determinantes de saúde podem ser classificados em diferentes níveis de acordo com sua proximidade em relação aos indivíduos e grupos sociais. Existem diversos modelos explicativos, sendo o mais conhecido o proposto por Dahlgren e Whitehead, que organiza os determinantes em camadas de influência, desde as características individuais até as condições socioeconômicas, culturais e ambientais gerais. Determinantes Distais (Macrodeterminantes) Fatores que afetam toda a sociedade: condições socioeconômicas, culturais e ambientais gerais, políticas públicas, globalização, governança Determinantes Intermediários Condições materiais de vida e trabalho, redes sociais e comunitárias, acesso a serviços públicos como educação, saúde, saneamento básico Determinantes Proximais (Microdeterminantes) Características individuais: idade, sexo, fatores genéticos, comportamentos e estilos de vida No Brasil, a Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS) adaptou o modelo de Dahlgren e Whitehead para compreender as especificidades do contexto brasileiro, destacando como as desigualdades sociais, étnico-raciais e de gênero produzem iniquidades em saúde que se refletem nos indicadores epidemiológicos do país. 13 Determinantes Sociais da Saúde Os Determinantes Sociais da Saúde (DSS) são definidos pela OMS como as condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham, incluindo os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população. Um fenômeno central na compreensão dos DSS é o gradiente social em saúde, ou "efeito escada", que demonstra como piores condições socioeconômicas estão sistematicamente associadas a piores indicadores de saúde. Este gradiente manifesta-se não apenas entre os extremos sociais, mas em toda a escala social, revelando como a distribuição desigual de poder, renda, bens e serviços afeta as oportunidades de saúde. As iniquidades em saúde são desigualdades consideradas injustas e evitáveis, resultantes de condições sociais injustas. No Brasil, essas iniquidades se expressam em diferentes expectativas de vida, taxas de mortalidade infantil e acesso a serviços de saúde entre regiões, classes sociais e grupos étnico-raciais, refletindo a profunda desigualdade social do país. 14 Educação em Saúde: Da Prevenção à Promoção A educação em saúde passou por importantes transformações conceituais e metodológicas ao longo do tempo, refletindo diferentes compreensões sobre o processo saúde-doença e o papel dos indivíduos e comunidades. Inicialmente baseada em um modelo preventivista e focado na doença, evoluiu para abordagens mais amplas de promoção da saúde. Modelo Tradicional Comunicação vertical e prescritiva, foco na doença e comportamentos individuais, população como receptora passiva de informações. Modelo Dialógico Valorização do saber popular, diálogo entre conhecimentos técnicos e comunitários, metodologias participativas. Modelo de Empoderamento Fortalecimento da autonomia e capacidade crítica, mobilização comunitária, ação sobre determinantes sociais. Modelo Intersetorial Articulação com diversos setores, políticas públicas saudáveis, ambientes favoráveis à saúde, reorientação dos serviços. A Carta de Ottawa (1986) representa um marco conceitual para a promoção da saúde, definindo-a como "o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo maior participação no controle deste processo". Esta perspectiva amplia o escopo da educação em saúde para além de mudanças comportamentais individuais, incorporando ações coletivas e políticas sobreos determinantes sociais. 15 Níveis de Prevenção e Promoção Os níveis de prevenção representam diferentes estratégias de intervenção no processo saúde-doença, classificadas de acordo com o momento da história natural da doença em que são aplicadas. Este modelo, proposto inicialmente por Leavell e Clark, foi posteriormente ampliado para incluir novos conceitos, como a prevenção quaternária e a promoção da saúde como abordagem distinta da prevenção. Prevenção Primária Ações realizadas antes da ocorrência da doença, visando eliminar ou reduzir fatores de risco. Exemplos: vacinação, saneamento básico, educação em saúde, legislação sobre uso de capacetes. Prevenção Secundária Detecção precoce e intervenção imediata para interromper a progressão da doença. Exemplos: rastreamento de câncer, controle de hipertensão arterial, teste do pezinho. Prevenção Terciária Ações para reduzir complicações e sequelas de doenças já estabelecidas. Exemplos: reabilitação após AVC, tratamento de complicações do diabetes, reinserção social após transtorno mental. Prevenção Quaternária Proteção contra intervenções médicas excessivas ou desnecessárias. Exemplos: evitar medicação desnecessária, uso racional de exames diagnósticos, prevenção da iatrogenia. A promoção da saúde, diferentemente da prevenção, não se concentra em doenças específicas, mas na atuação sobre os determinantes amplos da saúde, exigindo articulação intersetorial e participação social. Suas estratégias incluem políticas públicas saudáveis, criação de ambientes favoráveis, fortalecimento da ação comunitária, desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação dos serviços de saúde. 16 Constitucionalização do SUS Artigo 196 "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação." Artigo 198 Estabelece as diretrizes do sistema: descentralização, atendimento integral e participação da comunidade, instituindo a rede regionalizada e hierarquizada que constitui o SUS. Artigos 199-200 Regulamentam a participação da iniciativa privada e definem as atribuições do SUS, incluindo vigilância sanitária, formação de recursos humanos e participação na produção de medicamentos. A inclusão do direito à saúde na Constituição Federal de 1988 representou uma conquista histórica da sociedade brasileira. A carta magna consolidou juridicamente os princípios defendidos pelo movimento sanitário e rompeu com o modelo anterior, baseado na medicina previdenciária e no acesso restrito. 17 Lei Orgânica da Saúde Lei 8.080/90 Conhecida como a Lei Orgânica da Saúde propriamente dita, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, além da organização e funcionamento dos serviços. Define atribuições dos três níveis de governo Estabelece o funcionamento do SUS Regula as ações de vigilância sanitária e epidemiológica Lei 8.142/90 Complementa a Lei 8.080 abordando dois aspectos fundamentais que haviam sido vetados na lei anterior pelo então presidente Fernando Collor. Institui a participação social através dos Conselhos e Conferências de Saúde Estabelece as transferências intergovernamentais de recursos financeiros Garante repasses regulares e automáticos para estados e municípios A Lei Orgânica da Saúde forneceu a estruturação jurídica necessária para a operacionalização dos princípios constitucionais do SUS, detalhando aspectos de organização, gestão, financiamento e participação social no sistema. 18 Financiamento do SUS O financiamento do SUS provém do Orçamento da Seguridade Social (OSS), com recursos da União, estados e municípios. A Emenda Constitucional 29, aprovada em 2000, estabeleceu percentuais mínimos de investimento: municípios devem aplicar 15% de suas receitas, estados 12%, enquanto a União deve manter o valor empenhado no ano anterior corrigido pela variação do PIB. Apesar dos avanços legais, o subfinanciamento crônico representa um dos maiores desafios do sistema. O Fundo Nacional de Saúde centraliza os recursos federais, que são depois transferidos para fundos estaduais e municipais através do mecanismo "fundo a fundo", garantindo maior transparência e regularidade. 19 Pacto pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão Estabelecido em 2006 Resultado de intensas negociações entre gestores dos três níveis de governo, buscando aprimorar a governança do sistema após quase duas décadas de implementação. Substituição à NOB Superou o modelo das Normas Operacionais Básicas, introduzindo uma abordagem mais flexível e integrada para a gestão compartilhada do SUS. Prioridades Articuladas Definiu um conjunto de prioridades sanitárias nacionais, com metas específicas e indicadores de monitoramento pactuados entre os gestores. Responsabilidades Compartilhadas Estabeleceu com clareza as responsabilidades sanitárias de cada ente federativo, fortalecendo a cooperação intergovernamental na implementação das políticas de saúde. O Pacto pela Vida, em Defesa do SUS e de Gestão representou um importante avanço na consolidação do Sistema Único de Saúde, promovendo uma gestão mais eficiente e compartilhada entre os entes federativos. 20 Organização dos Pactos nos Três Níveis Nível Federal Coordenação nacional, financiamento e regulação Nível Estadual Coordenação regional e apoio técnico aos municípios Nível Municipal Execução direta das ações e serviços de saúde A governança do SUS é exercida de forma compartilhada entre União, estados e municípios, com responsabilidades específicas para cada nível. As comissões intergestores - Tripartite (CIT), Bipartite (CIB) e Regional (CIR) - funcionam como espaços de negociação e pactuação entre os gestores. Ao Ministério da Saúde cabe a formulação de políticas nacionais, o co-financiamento e a coordenação das ações de alta complexidade. Os estados assumem a coordenação regional, a regulação dos sistemas de referência e o apoio técnico aos municípios. Já os municípios têm a responsabilidade pela execução direta dos serviços, especialmente na atenção primária. 21 Ações Estratégicas e Prioritárias Atenção Primária à Saúde Porta de entrada do sistema, responsável por ordenar o cuidado e resolver até 80% dos problemas de saúde da população. A Estratégia Saúde da Família alcança cobertura de 75% da população brasileira. Rede de Urgência e Emergência Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) garantem assistência rápida em situações de emergência, reduzindo a mortalidade por causas agudas. Saúde Mental Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) oferece cuidado integrado às pessoas com sofrimento mental e necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, com foco na reinserção social. As ações estratégicas do SUS são organizadas em redes temáticas de atenção à saúde, buscando garantir a integralidade do cuidado. A expansão da Estratégia Saúde da Família tem sido fundamental para a reorganização do modelo assistencial, priorizando a prevenção e a promoção da saúde. 22 Sistema Único de Saúde (SUS): Conceito Sistema Público Rede de serviços e ações de saúde financiada integralmente por recursos públicos, oferecendo atendimento sem custo direto ao cidadão, conforme estabelecido pela Constituição Federal. Universalidade Garante atendimento a todas as pessoas residentes no Brasil, independentemente de nacionalidade, condição socioeconômica ou vínculo empregatício. Base Legal Fundamentado nos artigos 196 a 200 da Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelas Leis Orgânicas da Saúde (8.080/90 e 8.142/90), que definem sua estrutura e funcionamento. O SUS representa uma conquista histórica do povo brasileiro, fruto de um intenso movimento de reforma sanitária que culminou com sua inclusão na Constituição Cidadã. Seu surgimento transformou radicalmente o panorama da saúde no Brasil, superando o modelo excludente anteriormente vigente. 23 Organização dosServiços de Saúde Atenção Terciária Hospitais especializados e alta complexidade Atenção Secundária Especialidades médicas e ambulatórios Atenção Primária Unidades Básicas e Saúde da Família Os serviços de saúde no SUS são organizados em níveis crescentes de complexidade tecnológica. A atenção primária constitui a porta de entrada preferencial, resolvendo cerca de 80% dos problemas de saúde, enquanto os níveis secundário e terciário oferecem suporte especializado. Esta organização em rede busca garantir a integralidade da assistência, com fluxos de referência e contrarreferência entre os diferentes níveis. O sistema incorpora tanto estabelecimentos públicos quanto privados conveniados, todos seguindo os princípios e diretrizes do SUS. 24 Atenção Primária à Saúde (APS) Primeiro Contato Porta de entrada preferencial no sistema, acessível geograficamente e culturalmente, com resolutividade para os problemas mais comuns de saúde da população. Promoção e Prevenção Foco em ações educativas, vacinação, rastreamento de doenças, incentivo a hábitos saudáveis e intervenções sobre determinantes sociais da saúde. Base Organizativa Centro de comunicação das Redes de Atenção à Saúde, coordenando o cuidado e ordenando os fluxos e contrafluxos de pessoas entre os serviços. A Atenção Primária à Saúde no Brasil é orientada pelos atributos de primeiro contato, longitudinalidade, integralidade e coordenação do cuidado, com foco na família e orientação comunitária. Sua implementação mais efetiva ocorre através da Estratégia Saúde da Família, que reorientou o modelo assistencial no país. 25 Redes de Atenção à Saúde: Definição Identificação da Necessidade Primeiro contato do usuário com o sistema, geralmente na Atenção Primária, onde suas necessidades são identificadas. Coordenação do Cuidado Definição do itinerário terapêutico mais adequado dentro da rede, com encaminhamentos conforme protocolos estabelecidos. Integração dos Serviços Articulação entre diferentes pontos da rede para garantir a continuidade do cuidado e o atendimento integral. Monitoramento e Avaliação Acompanhamento dos resultados e readequação das estratégias para melhoria contínua da assistência. As Redes de Atenção à Saúde (RAS) são arranjos organizativos de ações e serviços de saúde que buscam superar a fragmentação do cuidado. Elas se estruturam mediante a combinação de elementos como população definida, estrutura operacional e modelos de atenção às condições agudas e crônicas. 26 Rede de Atenção Básica 45.000+ Unidades Básicas de Saúde Distribuídas em todo território nacional 80% Resolutividade Dos problemas de saúde resolvidos na atenção básica 150M Brasileiros Atendidos Cobertura da Estratégia Saúde da Família A Rede de Atenção Básica constitui a espinha dorsal do SUS, composta principalmente pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e equipes de Saúde da Família. Estas unidades funcionam como primeiro ponto de atenção e principal porta de entrada do sistema, além de centro de comunicação com toda a Rede de Atenção à Saúde. As UBS são instaladas próximas de onde as pessoas moram, trabalham e estudam, desempenhando papel central na garantia de acesso à população a uma atenção à saúde de qualidade. Cada unidade é responsável por uma população adscrita, permitindo planejamento e programação descentralizada. 27 Sistema de Redes de Atenção à Saúde Atenção Primária Porta de entrada preferencial, coordenadora do cuidado e ordenadora da rede, representada pelas UBS e equipes de Saúde da Família. Atenção Especializada Ambulatórios especializados, centros de especialidades, policlínicas e serviços de apoio diagnóstico e terapêutico. Atenção Hospitalar Hospitais gerais e especializados, responsáveis por internações e procedimentos de maior complexidade. Urgência e Emergência SAMU, UPA e prontos-socorros, garantindo atendimento ágil em situações de risco à vida. A organização do SUS em redes integradas busca superar a fragmentação das ações e serviços de saúde, oferecendo atenção contínua e integral à população. Os fluxos são estabelecidos por protocolos clínicos e linhas de cuidado, que orientam o percurso dos usuários no sistema. 28 Estratégia Saúde da Família (ESF): Conceito Reorientação do Modelo A ESF representa uma mudança de paradigma na atenção básica, substituindo o modelo biomédico e hospitalocêntrico por uma abordagem preventiva, territorial e comunitária. Equipes Multidisciplinares Compostas minimamente por médico, enfermeiro, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde, podendo incluir equipes de saúde bucal e NASF. Vínculo Comunitário Estabelecimento de relações de confiança com as famílias e comunidade, permitindo conhecer seu contexto de vida e promover saúde de forma mais efetiva. A Estratégia Saúde da Família é a principal forma de organização da atenção básica no Brasil, caracterizando-se pela atuação em território definido, com responsabilidade sanitária sobre uma população específica. Suas equipes desenvolvem ações de promoção, prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação. 29 Atribuições das Equipes ESF Médico Atendimento clínico, prescrição de medicamentos, solicitação de exames, encaminhamentos especializados, visitas domiciliares a pacientes restritos ao leito. Enfermeiro Consultas de enfermagem, supervisão da equipe, ações educativas, coordenação do cuidado, gerenciamento de insumos e procedimentos. 2 Técnico de Enfermagem Procedimentos básicos, vacinação, administração de medicamentos, aferição de sinais vitais, triagem e acolhimento dos pacientes. Agente Comunitário Visitas domiciliares periódicas, cadastramento das famílias, identificação de situações de risco, orientação comunitária sobre saúde. Cada equipe de Saúde da Família é responsável por uma população de 2.000 a 4.000 pessoas, com atuação em território geográfico delimitado. A presença dos Agentes Comunitários, que residem na própria comunidade, é um diferencial que aproxima o serviço da realidade local. 30 Da PSF à ESF: A Transição 1 1994 Lançamento do Programa Saúde da Família (PSF) como programa vertical focado em populações de alto risco em áreas específicas. 2 1998 Consolidação como principal estratégia de reorganização da atenção básica, com expansão para municípios de médio porte. 3 2006 Transformação em Estratégia Saúde da Família pela Política Nacional de Atenção Básica, deixando de ser programa focal para tornar-se política estruturante. 4 2011-2017 Revisões da PNAB ampliando escopo e composição das equipes, com criação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). A mudança de nomenclatura de Programa para Estratégia refletiu uma transformação conceitual importante, reconhecendo seu caráter permanente e estruturante para o sistema de saúde brasileiro, superando a ideia inicial de um programa temporário ou vertical. A eMulti é instituída em 2023, por meio da Portaria GM/MS nº 635, de 22 de maio de 2023 31 Avanços do SUS Cobertura e Acesso Expansão da atenção básica para mais de 75% da população Programas Exitosos Vacinação, HIV/AIDS, transplantes e controle do tabagismo Assistência Farmacêutica Ampliação do acesso a medicamentos essenciais e de alto custo O SUS promoveu avanços significativos nos indicadores de saúde do Brasil, com redução da mortalidade infantil de 47,1 para 12,4 por mil nascidos vivos entre 1990 e 2019. A expectativa de vida aumentou mais de 9 anos desde a criação do sistema, refletindo melhorias nas condições sanitárias e no acesso aos serviços. A implementação da Estratégia Saúde da Família contribuiu decisivamente para estes resultados, assim como programas de imunização e o controle de doenças transmissíveis. O SUS também se destaca globalmente por seus programas de HIV/AIDS e transplantes de órgãos. 32 Desafios e Perspectivas O sistema de saúde brasileiro enfrenta desafios significativos para consolidar a saúde como direito universal. Em um contexto de políticas de austeridade fiscal e disputas por modelos de desenvolvimento, torna-se fundamental defender ofinanciamento adequado do SUS e seu papel como política de Estado, não apenas de governo. O fortalecimento da participação social e do controle democrático representa outro desafio crucial, exigindo a revitalização dos Conselhos e Conferências de Saúde e o estímulo a novas formas de mobilização e engajamento comunitário. Paralelamente, o enfrentamento das iniquidades em saúde demanda políticas intersetoriais que atuem sobre os determinantes sociais e reduzam as desigualdades estruturais. Os modelos de atenção devem ser centrados nas necessidades da população, superando a fragmentação e a lógica biomédica ainda predominante. Isso implica valorizar a atenção primária como ordenadora do cuidado, fortalecer redes integradas de serviços e desenvolver práticas de cuidado que reconheçam a integralidade dos sujeitos e a complexidade do processo saúde-doença-cuidado. 33 OBRIGADO image1.png image2.png image3.png image4.png image12.png image13.png image14.png image5.png image6.png image7.png image8.png image9.png image10.png image11.png image22.png image15.png image16.png image17.png image18.png image19.png image20.png image21.png image30.png image23.png image24.png image25.png image26.png image27.png image28.png image29.png image31.png image32.png image33.png image34.png image35.png image36.png image37.png image38.png image39.png image40.png image41.png image42.png image43.png image44.png image45.png image46.png image47.png image48.png image49.png image50.png image51.png image52.png image53.png image54.png image55.png image56.png image57.png image58.png image59.png image60.png image61.png image62.png image63.png image64.png image65.png image66.png image67.png image68.png image69.png image70.png image71.png image72.png image73.png image74.png image75.png image76.png image77.png image78.png image79.png image80.png image81.png image82.png image83.png image84.png image85.png