Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DE RIBEIRÃO PRETO DEPARTAMENTO DE QUÍMICA Físico-química Experimental Experimento: Pressão de Vapor de Líquidos Puros e Misturas Discentes: Laura Sperati Bezerra, n° USP: 13691034 Luis Felipe Coutinho Ferreira, n° USP: 11871837 Mariana Figueiredo de Oliveira, n° USP: 13477215 RIBEIRÃO PRETO 2025 I. INTRODUÇÃO As moléculas de um líquido escapam para a fase gasosa mesmo em temperaturas inferiores ao seu ponto de ebulição. Quando o líquido é colocado num recipiente fechado a uma determinada temperatura, a pressão exercida pelas moléculas na fase gasosa altera-se até que o equilíbrio entre a evaporação e a condensação seja atingido. A pressão de equilíbrio é conhecida como pressão de vapor do líquido e independente das quantidades de vapor e líquido presentes e é uma característica do material. Ela aumenta com a temperatura até o ponto crítico onde o sistema bifásico (líquido/gás) se torna homogêneo. A figura abaixo mostra a dependência da pressão de vapor de diferentes líquidos em função da temperatura. Figura 1. a) Pressão de vapor de diversos líquidos em função da temperatura (Mbeychok M., 2007 Wikipedia). b) Pressão de vapor da água em função da temperatura (Fox J. N., 1993 Phys. Educ. 28 190). A pressão de vapor e a temperatura são diretamente proporcionais de modo que, com o aumento da temperatura, há maior quantidade de energia disponível para romper as forças que sustentam as moléculas unidas no estado líquido. Como consequência, haverá maior quantidade de vapor no recipiente, que se traduz no aumento da pressão de vapor. A relação de dependência entre a pressão de vapor e a temperatura pode ser representada por meio da Equação de Clausius-Clapeyron: onde pvap representa a pressão de vapor do composto, p0 é a pressão padrão, ∆vapH, é a entalpia de vaporização, R é a constante dos gases ideais e T é a temperatura absoluta do sistema. A entalpia de vaporização corresponde ao calor de vaporização à pressão constante e tem valor sempre positivo, visto que uma mudança de fase do estado líquido para vapor requer fornecimento de energia (o processo é endotérmico). O valor de ∆vapH permite avaliar a intensidade das interações atrativas existentes no líquido. Tal mudança implica em aumento significativo da distância média molecular e do grau de desordem, com consequente aumento da entropia do sistema. O segundo princípio da Termodinâmica garante que quando duas fases α e β de um sistema fechado constituído de uma substância pura encontram-se em equilíbrio, a temperatura e pressão constantes, o potencial químico da substância tem o mesmo valor em ambas as fases, ou seja: Se a temperatura (ou a pressão) do sistema bifásico for modificada, para que as duas fases continuem a coexistir em equilíbrio é necessário que a pressão (ou a temperatura) também varie. Neste caso os potenciais químicos se modificaram, mas os novos valores preservaram a igualdade estabelecida na primeira equação. O que significa que suas variações foram idênticas, isto é, No nosso caso, consideramos que a fase α é a fase líquida e β, a fase gasosa (vapor). A partir da substituição de dμ pela equação de Gibbs-Duhem, pode-se então escrever, a equação de Clapeyron: que mostra que a inclinação da curva de equilíbrio entre as duas fases (curva de pressão em função da temperatura) depende das variações de entropia e volume molares da substância na mudança de fase α → β (vaporização) . Esta equação é exata e aplica-se a qualquer curva de equilíbrio de duas fases de uma substância pura. Na equação acima temos que: Uma vez que , com o o calor de vaporização molar do líquido, na fronteira líquido/vapor a equação de Clapeyron pode ser escrita como: Suponha que então , e considerando que a fase vapor se comporta idealmente (gás ideal) temos: onde R = 8,31 J/mol.K é a constante dos gases perfeitos. Substituindo este resultado na equação anterior de Clapeyron obtemos: cuja integração desde a temperatura T0, onde a pressão de vapor é po até a temperatura T, onde a pressão de vapor é p resulta em: com a hipótese que ΔHvaporiz seja constante nesse intervalo de temperatura, resulta na equação aproximada conhecida como equação de Clausius-Clapeyron: que mostra que ln p decresce linearmente com 1/T e que o coeficiente angular da curva ln p em função de 1/T é proporcional ao ΔHvaporiz. Quando po = 1 atm, To é a temperatura normal de vaporização do líquido, neste caso: Observe que num gráfico ln p versus 1/T a equação acima resulta numa reta com coeficientes linear e coeficiente angular . Dessa forma, conhecendo-se o valor de β determina-se ΔHvaporiz e, a partir do valor de α e ΔHvaporiz encontra-se T0. II. OBJETIVOS Determinar a entalpia e entropia de vaporização da água por meio de medidas de pressão de vapor em diferentes temperaturas e determinar a pressão de vapor de misturas com diferentes proporções de n-propanol e água e comparar com o esperado pela Lei de Raoult. III. MATERIAIS E MÉTODOS III. I. Materiais ● Manômetro de mercúrio convencional; ● Termômetro (2); ● Barômetro; ● Chapa de aquecimento com agitação magnética (+ pulga de agitação) Béquer de 4L; ● Suporte universal; ● Garras metálicas; ● Mangueiras; ● Bomba de vácuo com controle nas saídas; ● “Dedo Frio” (sifão de segurança) + nitrogênio líquido; ● Condensador; ● Isoteniscópio em U com tubo pequeno dentro. III. II. Metodologia. Para a montagem do arranjo experimental foram adicionadas água em um béquer de 4.000 mL e colocou o isoteniscópio, com água e um tubo de ensaio, dentro desta solução. O mesmo foi acoplado em um condensador que estava ligado a um manômetro. Assim, foi possível realizar o teste de funcionamento da medida de pressão pelo manômetro. Para a montagem do equipamento, adicionou-se as mangueiras de maneira correta no condensador, preenchendo-o com água gelada. Acima do condensador, existiam três válvulas, a primeira à esquerda estava ligada a um dispenser com nitrogênio líquido para fazer vácuo, tendo interligado uma válvula de segurança. A válvula do meio permitia o controle de vácuo feito no sistema do condensador ligado ao isoteniscópio, por fim, a válvula à direita controlava a pressão com a entrada ou saída do ar atmosférico. Sendo assim, ao preparar todo o equipamento e medir a temperatura de 25ºC (298 K) deu-se início às medidas de pressão. Assim, ligou-se a bomba à vácuo, fechou-se a válvula de segurança e abriu a primeira válvula à esquerda, para que o nitrogênio líquido fizesse vácuo no sistema. Com o vácuo feito, abriu a válvula do meio para permitir que o vácuo entrasse no sistema do condensador para tirar grande parcela de ar do isoteniscópio e do tubo de ensaio. Por fim, a válvula à direita foi fechada bloqueando a entrada do ar atmosférico e fazendo com que a água presente no isoteniscópio preenchesse o tubo de ensaio, deixando apenas uma bolha de nucleação. Com a bolha de nucleação feita, deu-se início ao experimento. Assim, o controle da pressão foi feito apenas pelo controle da válvula à direita. Ou seja, quando abria a válvula, permitia o aumento da pressão no sistema, fazendo com que a água fosse retirada do tubo de ensaio e o ar entrasse. O controle da válvula foi ministrado até o equilíbrio em que a altura de água do tubo de ensaio se igualasse com a altura de água do isoteniscópio, permitindo a aferição da pressão pelo manômetro. Figura 2. Aparelhagem utilizada para medir a pressão de vapor. Autoral, 2025. III. II. I. Determinação da Entalpia e Entropia de Vaporização da Água. A partir da pressão atmosférica obtida de um barômetro (figura 3), no dia 04/04/2025 foi de 716 mmHg, pôde-se fazer os cálculos da pressão de vapor da água, entalpia e entropia. Figura 3: Barômetro do laboratório didático. Autoral, 2025.III. II. II. Determinação da pressão de vapor de misturas água/n-propanol de diferentes composições. Preparou-se 5 soluções com diferentes proporções de n-propanol e água, respectivamente, sendo as frações molares: 1; 0,75; 0,51; 0,32; 0. Sob uma temperatura de 25ºC. Seguiu-se o mesmo procedimento descrito na etapa (c), sem alteração da temperatura. IV. RESULTADOS E DISCUSSÃO IV. I. Determinação da entalpia e entropia de vaporização da água. A entalpia e entropia de vaporização da água foram determinadas a partir de um gráfico de logaritmo da pressão de vapor pelo inverso da temperatura. O procedimento adotado está descrito no item anterior da introdução. A base desse método reside no fato de que o potencial químico da fase líquida (l) e vapor (v) durante a evaporação é igual, uma vez que estão em equilíbrio, logo: dμ(l) = dμ(v) -Sm(l)dT + Vm(l)dp = -Sm(v)dT + Vm(v)dp [Sm(v) - Sm(l)]dT = [Vm(v) - Vm(l)]dp = 𝑑𝑝 𝑑𝑇 △𝑆 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 △𝑉 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 A equação acima é chamada de equação de Clapeyron que pode ser modificada, tendo em vista que durante um processo de equilíbrio a variação da energia livre de Gibbs é nula, fazendo com que ΔS = ΔH/T, logo: = 𝑑𝑝 𝑑𝑇 △𝑆 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 𝑇. △𝑉 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 Como a variação de volume durante a transição de líquido para vapor corresponde ao volume de vapor, o volume do gás é muito maior que o do líquido, e assumindo-se que a fase de vapor se comporta como um gás ideal tem-se que: = 𝑑𝑝 𝑑𝑇 𝑝 . △𝐻 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 𝑅𝑇2 Tendo em vista que dx/x é igual dlnx tem-se que a equação acima pode ser reescrita como: = 𝑑𝑙𝑛𝑝 𝑑𝑇 △𝐻 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 𝑅𝑇 A equação acima é a equação de Clausius-Clapeyron que mostra que o coeficiente angular de uma reta de ln de pressão por temperatura de uma transição de estado é a entropia da transição dividida pela constante dos gases ideais. Essa mesma conclusão poderia ser alcançada pela integração da equação anterior de Clapeyron: ∫ 1 𝑝 . 𝑑𝑝 = △𝐻 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 𝑅 ∫ 1 𝑇2 𝑑𝑇 𝑙𝑛 𝑝 = − △𝐻 𝑡𝑟𝑎𝑛𝑠𝑖çã𝑜 𝑅𝑇 + 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒 Em vista disso, foi gerado o gráfico de ln de pressão de vapor, que é a pressão da fase vapor sob a fase condensada, pelo inverso da temperatura conforme consta na figura 3. Os dados obtidos seguem na tabela 1, sendo que a pressão de vapor foi obtida pela diferença entre a pressão atmosférica e distância entre as extremidades de mercúrio no manômetro. Tabela 1. Dados de temperatura e pressão de vapor da água. Autoral, 2025. Figura 3. Gráfico de ln de pressão de vapor pelo inverso da temperatura. Autoral, 2025. Tendo em vista que o valor do coeficiente angular é -4763,4 tem-se que o valor da variação de entalpia de evaporação, ΔHvaporiz, para água é 39,6 KJ/mol. Sabendo-se que a variação da energia livre de Gibbs, ΔG, desse processo é nula tem-se que ΔSvaporiz = ΔHvaporiz /T. Como a água tem sua vaporização a 373 K, em 1 atm, tem-se que a variação de entalpia de vaporização encontrada é 106,17 J/(mol.K). Os erros associados aos valores de ΔHvaporização e ΔSvaporização foram de 2,59 % (Atkins,P.W.,2014). Embora os valores experimentais obtidos para a entalpia e a entropia de vaporização da água apresentem erros significativos, é possível destacar aspectos importantes do comportamento da água. De acordo com a regra de Trouton, a variação da entropia de vaporização para muitos líquidos gira em torno de 85 J/(mol·K). Contudo, a água se mostra uma exceção a essa regra. Essa exceção se deve à alta organização das moléculas no estado líquido, resultante das intensas interações intermoleculares, sobretudo das pontes de hidrogênio. Essas interações promovem uma estrutura mais ordenada, o que, em condições ideais, exige um valor de ΔS₍vap₎ consideravelmente maior (próximo a 109 J/(mol·K), conforme Atkins, 2014) do que o previsto pela regra de Trouton. IV. II. Determinação da pressão de vapor de misturas de água e n-propanol. A determinação da pressão das misturas de n-propanol e água foi efetuada conforme descrito no item anterior e tinha como objetivo comparar os valores obtidos com o esperado para a Lei de Raoult que estabelece que no processo de evaporação de uma mistura a pressão de vapor de um dos componentes é igual a pressão de vapor do componente puro vezes sua fração molar na fase condensada. Como consequência disso a pressão de vapor total é igual a soma das pressões de vapor dos componentes conforme a equação: 𝑝 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 = 𝑝 𝐴 + 𝑝 𝐵 = 𝑝 𝐴 * . 𝑥 𝐴 + 𝑝 𝐵 * . 𝑥 𝐵 Com base nisso, foram coletados os dados experimentais e teóricos como segue na tabela 2. O gráfico correspondente segue na figura 4. (* e ** são os dados obtidos das referências [1] e [2]) Tabela 2. Dados de pressão de vapor das misturas de água e n-propanol. Autoral, 2025. Figura 4. Gráfico de pressão de vapor por fração molar de n-propanol nas misturas água/n-propanol. Autoral, 2025. Com base nos dados verifica-se que as pressões de vapor reais entre os extremos de composição (100% água e 100% n-propanol) são maiores que o previsto pela de Lei de Raoult, indicando um desvio positivo. Esse desvio ocorre devido às a formação de novas interações água-propanol de menor intensidade devido a cadeia apolar do álcool resulta na diminuição da coesão entre as moléculas e, consequentemente, diminui a entalpia de vaporização da mistura e aumento da entropia do sistema, fazendo com que a barreira para transição das moléculas do estado líquido para o gasoso seja menor, acarretando em um aumento da pressão de vapor. V. CONCLUSÃO O experimento realizado teve como objetivo estudar a pressão de vapor de líquidos puros e misturas de líquidos, aplicando a equação de Clausius-Clapeyron e verificando a lei de Raoult. Através da análise dos dados experimentais, foi possível calcular a variação da entalpia de vaporização da água, resultando em um valor de ΔHvap igual a 39,6 kJ/mol. Nas medições da pressão de vapor para soluções de água e n-propanol, observou-se uma concordância parcial com a lei de Raoult. Verificou-se que na composição de 100% de água, a pressão de vapor experimental foi maior que a prevista pela lei de Raoult, indicando um desvio positivo. Esse comportamento é atribuído à forte capacidade da água de formar ligações de hidrogênio, cuja tendência diminui com a adição de n-propanol. As novas interações formadas entre água e n-propanol são de menor intensidade comparadas às interações água-água, o que resulta em uma diminuição da coesão entre as moléculas da mistura. Essa diminuição da coesão reduz a energia necessária para a transição das moléculas do estado líquido para o gasoso, levando a uma menor entalpia de vaporização e maior pressão de vapor, especialmente nas frações molares mais elevadas de n-propanol. Os resultados experimentais indicam que a pressão de vapor aumenta com a temperatura, conforme previsto teoricamente. A relação linear observada entre o logaritmo da pressão e o inverso da temperatura confirma a validade da abordagem experimental e a precisão das medições realizadas. Em conclusão, o experimento demonstrou com sucesso a aplicabilidade da equação de Clausius-Clapeyron na determinação da entalpia de vaporização e a utilidade da lei de Raoult para prever o comportamento da pressão de vapor em misturas líquidas. As discrepâncias observadas entre os valores experimentais e teóricos destacam a complexidade das interações moleculares e a importância de considerá-las na interpretação dos dados experimentais. VI. REFERÊNCIAS [1] https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/962#section=Corrosivity. [2] https://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/compound/1031#section=Corrosivity. [3] Atkins, P. W., de Paula, J. - Physical Chemistry, 10th ed. - Oxford University Press, 2014. [4] Levine, I. N. - Physical Chemistry , 6th ed. - McGraw-Hill, 2008. [5] Lee, J. F.; Sears, F. W.; Termodinâmica, LTC: Rio de Janeiro,1969. [6] Castellan, G.; Fundamentos de Físico-Química, LTC: Rio de Janeiro, 1986. [7] Shoemaker, D. P.; Garland, C. W.; Experiments in physical chemistry, 4th ed., Mc Graw-Hill Book Company: NewYork, 1981. [8] Uma lista de autores que aborda a Equação de Clausius ou de Clausius-Clapeyron a partir de considerações da igualdade dos potenciais químicos e da dependência da entropia com as variações de pressão e temperatura é dada a seguir: Moore, W. J.; Físico-química, EDUSP/Edgar Blucher: São Paulo, 1976, vol. 1; Tinoco, I.; Sauer, K.; Wang, J.; Physical Chemistry: principles and applications in biological science, 3rd ed., Prentice-Hall: New Jersey, 1995; Alberty, R. A.; Physical Chemistry, 7th ed., John Wiley: New York, 1987; Eggers, D. F.; Gregory, N. W.; Halsey, G. D.; Rabinovitch, B. S.; Physical Chemistry, Wiley Interscience: New York, 1964; Pilla, L.; Físico-química, LTC: Rio de Janeiro, 1979, vol. 1; Rowlinson, J. S.; Liquids and Liquid Mixtures, Butterworths: London, 1959; Chagas, A. P.; Termodinâmica Química, Ed. da UNICAMP: Campinas, 1999; Castellan, op. cit..