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ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL – FUNDAMENTOS E METODOLOGIAS AULA 5 Profª Diana Gurgel Pegorini 2 CONVERSA INICIAL Educação profissional tecnológica Nesta aula continuaremos falando da educação profissional, agora sobre aquela ofertada no Ensino Superior. Neste nível de ensino, a educação profissional é ofertada por meio dos cursos tecnológicos, que têm duração de aproximadamente dois anos. São cursos diferentes dos cursos de bacharelado e de licenciatura (abordaremos esse tema em breve). Iniciaremos o Tema 1 falando dos modelos de ensino que influenciaram a educação superior no Brasil. No Tema 2, discutiremos a criação das universidades no Brasil, apresentando um breve resumo de como o processo de implantação das universidades ocorreu em solo brasileiro. No Tema 3, abordaremos a educação profissional no Ensino Superior; pretendemos abordar as políticas, a estrutura, a organização e o funcionamento da educação profissional tecnológica. Como de praxe, sempre apresentamos as políticas educacionais para o nível de ensino estudado, pois acreditamos que é uma forma de você entender como o nível de ensino, sua estrutura, organização e funcionamento foram pensados. No Tema 4, discutiremos o acesso e a permanência na educação profissional, bem como os programas de assistência estudantil existentes, sobretudo nas instituições públicas de ensino. O financiamento do ensino superior (FIES) e o ProUni também serão discutidos. Por fim, no Tema 5, trataremos do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES). TEMA 1 – OS MODELOS DE ENSINO QUE INFLUENCIARAM A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL Pretendemos aqui apresentar os modelos de ensino jesuítico, (francês ou napoleônico) e alemão (ou humboldtiano, assim denominado em homenagem ao criador da Universidade de Berlim, Wilhem von Humboldt). Estes foram os modelos que influenciaram a criação da universidade brasileira, daí a importância de seu estudo. 3 1.1 Modelo jesuítico Criado pelos jesuítas, o modelo jesuítico era organizado em duas áreas de conhecimento: o trivium, que abrangia a gramática, a retórica e a dialética, e o quadrivium, que abordava a aritmética, a geometria, a astrologia e a música (Anastasiou, 1999). O ensino dessas disciplinas seguia um método dividido em duas etapas. A primeira, composta pela leitura e interpretação de um texto feita pelo professor, chamava-se lectio. Na interpretação de texto, o professor também fazia a comparação das ideias com as de outros autores (Anastasiou, 1999). Finalizada a primeira etapa, iniciava-se a segunda, denominada questio, a qual, como o nome sugere, era a etapa da investigação, ocasião em que aconteciam as perguntas didascalus (relacionadas à didática) do professor para os alunos e dos alunos para o professor (Anastasiou, 1999). Já as quaestiones surgiam em dois momentos: o das indagações e questionamentos dos alunos após as explicações do professor, e o das disputationes (“debates”), que aconteciam entre professor e alunos e, ainda, entre os próprios alunos. Os alunos precisavam fazer as reportationes (“anotações”) em seus cadernos. Essas anotações seriam estudadas posteriormente, para memorização por meio de diferentes exercícios (Anastasiou, 1999). Para a memorização dos conteúdos, um importante recurso utilizado para a aprendizagem na época, eram realizados dois exercícios bastante específicos: 1) as reparationes prandii (“repetições do meio-dia/almoço”); e 2) as reparationes coenae (“repetições no jantar”) (Pegorini, 2008). Era também utilizado o Loci Communes (“comum”), que era um caderno para fazer as anotações “de frases significativas, palavras, pensamentos, citações etc.” (Pegorini, 2020, p. 130). Havia ainda “o recurso da Glosae (espécie de glossário), que consistia em se copiar um texto no centro do pergaminho, deixando-se grandes espaços entre as linhas para a colocação das palavras mais difíceis – “Glosae Interlinerares [“glossário entre as linhas”] – e, nas margens, citações complementares de autores antigos” (Anastasiou, 1999, p. 38). 4 Sempre, ao iniciar as aulas, acontecia o Lectionem Reddere (“retorno da leitura” ou “releitura”), que era uma espécie de retomada dos conteúdos da aula ou lição anterior. Com os elementos do modelo jesuítico que trouxemos para você até aqui, você já consegue separar os elementos centrais que o constituíam: ênfase na reprodução e na memorização obtida pela repetição, pela cópia e pela transmissão do conhecimento feita pelo professor. Um modelo de ensino, portanto, extremamente conservador. O professor era figura autoritária, detentor e guardião do conhecimento. Por consequência, não podia ser contestado, uma vez que o conhecimento que ele dispunha era absoluto. A escola, em contrapartida, era o único local de acesso a esse conhecimento. O modelo jesuítico iniciado primeiro nas escolas, foi implementado nas universidades de forma mais complexa, e recebeu o nome de Método Escolástico, cujo significado é “pertencente à escola ou mestre” (Pegorini, 2008). “Foi adotado pela Universidade de Paris, passando a ser reconhecido como modus parisienses para essa forma de trabalho” (Pegorini, 2008, p. 29). 1.2 Modelo francês (ou napoleônico) Apesar do surgimento das universidades nos países europeus, em Portugal ela aconteceu de forma diferente e tardia. Anastasiou (1999, p. 39) conta que “nunca os portugueses mostraram queda para as altas especulações filosóficas”. E chama atenção para o fato de que “a atividade dos portugueses orienta-se para um sentido positivo, para uma forma concreta de pensamento, que se afasta e diferencia dos moldes das culturas dos demais países da Europa Medieval” (Anastasiou, 1999, p. 39). É fundamental destacar essa falta de aptidão e o desinteresse português pela pesquisa, pois ela é apontada como decisiva para a escolha pelo modelo francês para as primeiras universidades brasileiras, uma vez que esse modelo foi julgado o mais adequado para os costumes locais da época (Anastasiou, 1999). Esse desinteresse talvez também explique (pelo menos em parte, pois havia outros interesses em jogo) porque a educação superior (e o ensino de forma mais abrangente) não era prioridade para os governantes portugueses em solo brasileiro. Em relação a isso, Pegorini (2008, p. 20) afirma que “talvez esse 5 fato justifique a resistência da Coroa Portuguesa em permitir a criação da Universidade no Brasil”. É importante lembrar que havia o medo de que os ideais da Revolução Francesa chegassem aqui. A adoção do modelo francês inicialmente “ocorreu também pela necessidade de importar professores desse país vindos em missão francesa para fundar as universidades do Rio de Janeiro e, em especial, de São Paulo” (Pegorini, 2008, p. 32). O modelo francês, segundo Dias Sobrinho (2002, p. 11), estava alicerçado em “uma nova forma de ver e explicar o mundo, ou seja, uma nova racionalidade, segundo a qual o saber deveria ser produtivo e objetivo, e sua utilidade seria mensurável segundo suas aplicações práticas”. Você pode perceber que a ênfase para o modelo francês era o utilitarismo, ou seja, o ensino precisava ser útil. E esse era o critério para determinar o que precisava ser ensinado e aprendido, visando ao progresso sob a tutela do Estado. 1.3 Modelo alemão (ou humboldtiano) O modelo alemão estava alicerçado na pesquisa, e apostava na formação para o alcance da formação humana. Os alemães defendiam ainda que isso trazia como “consequência a solução dos problemas da vida prática e o desenvolvimento para toda a sociedade” (Pegorini, 2020, p. 136). Bem diferente do modelo francês, como podemos observar. O modelo alemão foi adotado na Universidade de São Paulo, que apresentava as seguintes características visíveis: preocupação fundamentalcom a pesquisa e com a unidade entre ensino e investigação científica; ênfase na formação geral e humanista, em detrimento da formação meramente profissional; autonomia relativa da universidade diante do Estado e dos poderes políticos; concepção idealista e não pragmática de universidade, em detrimento da concepção de universidade como prestadora de serviços ao mercado e à sociedade; fraco vínculo entre intelectuais e poder político, ou seja, ligação não-imediata entre intelligentzia e poder; concepção liberal e elitista de universidade; estreita ligação entre a formação das elites dirigentes e a questão da nacionalidade. (Paula, 2002, p. 28) Dessa forma, conviveram em nosso país os dois modelos de ensino universitário: o francês e o alemão. Se o primeiro modelo foi mais fácil ser adaptado aqui em função dos costumes locais, o segundo atendia às aspirações presentes nas políticas educacionais da época. 6 Pretendia-se que a educação oferecida pelo ensino superior pudesse ser “formadora de elites dirigentes com base na constituição de uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como órgão central do ensino superior e com consequente ênfase na formação científica de cunho humanista, não pragmático (Paula, 2002, p. 28). TEMA 2 – A CRIAÇÃO DAS UNIVERSIDADES NO BRASIL A tentativa de criar universidades no Brasil foi feita, segundo Fávero (2000) ainda pelos jesuítas, no século XVI, mas a Coroa Portuguesa não autorizou a que isso acontecesse na colônia brasileira. Assim, restava aos brasileiros, ao finalizar os estudos na colônia, seguir para a Metrópole Portuguesa, para a Universidade de Coimbra ou para outras universidades europeias. Você pode imaginar o que significava em termos de custos, naquela época, manter um aluno estudando na Europa. Além do valor dos estudos, havia as despesas com moradia, alimentação, vestuário etc. Naturalmente, poucos tinham condições de fazer isso; apenas os filhos de famílias mais abastadas, como os dos senhores de engenho. Por isso, é correto afirmar que Portugal, com a recusa em abrir universidades por aqui, assumia diretamente a formação da elite brasileira. Em 1789, ocorreu, em Minas Gerais, um movimento separatista, conhecido como Inconfidência Mineira ou Conjuração Mineira. Esse movimento tinha como objetivo, além da independência de Minas em relação a Portugal – pela proclamação de uma república independente de Portugal –, criar uma universidade. Como você deve saber, essa história teve um fim trágico: a Coroa Portuguesa descobriu a revolta, em função da delação de um de seus integrantes, e reprimiu o movimento separatista, prendendo os seus líderes. A história culminou com o enforcamento de Tiradentes. Em 1808, com a vinda da Família Real ao Brasil, criou-se a possibilidade da criação de uma universidade brasileira, uma vez que foram instituídas aulas de cirurgia e de anatomia (no hospital militar) no Rio de Janeiro, e de Economia, na Bahia. Em 1809, com o objetivo de formar médicos e cirurgiões para o Exército e Marinha, foram ofertadas aulas de medicina. Em 1817, surgiu o curso 7 de Química, composto de aulas de química industrial, geologia e mineralogia; em 1818, foi criado o curso de Desenho Técnico (Saviani, 2010). Ainda assim, o ensino superior organizado em universidade só foi criado no Brasil em 1920. A primeira instituição criada foi a Universidade do Rio de Janeiro, por meio do Decreto n. 14.343, de 7 de setembro de 1920, durante o governo de Epitácio Pessoa (Romanelli, 2007). A Universidade do Rio de Janeiro era composta pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro, pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, e pela Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro, conforme o art. 3° do Decreto n. 14.343/1920. Já na primeira universidade criada, garantiu-se a sua autonomia didática e administrativa, garantia essa assegurada às universidades brasileiras mediante muita luta e resistência (Brasil, 1920). Outro fato curioso no referido documento é o art. 4°, que afirma ser da responsabilidade da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro continuar a “prover todas as suas despesas exclusivamente com as rendas do respectivo patrimônio, sem outro auxílio oficial ou vantagem para os professores além dos que lhes são outorgados pelos seus estatutos” (Brasil, 1920, p. 1). O modelo de ensino adotado foi o francês, e por vários motivos. Para Dias Sobrinho (2002, p. 13), foi porque a universidade “não se preocupava com a atividade científica”. Corrobora com isso Paula (2002, p. 62), que afirma que “no decreto que cria a Universidade do Rio de Janeiro, a pesquisa sequer é vislumbrada. Não havia nenhuma preocupação com a atividade científica como uma atividade-fim da universidade”. Não podemos nos esquecer de que havia também a questão da facilidade de se trazer professores franceses para o Brasil. Isso resolvia um grande problema, sem dúvida, de poder dispor de professores preparados e qualificados para o trabalho. A Universidade do Paraná já havia sido criada antes da Universidade do Rio de Janeiro, mas não era considerada como tal em função do Decreto-lei n. 11.530/1915 do Governo Federal, que estabelecia a abertura de escolas superiores apenas em cidades com mais de 100 mil habitantes, exigência essa que a cidade de Curitiba (Paraná) não atendia na época (Romanelli, 2007). Em 1927, no governo de Washington Luis, surge a Universidade de Minas Gerais, ainda sob a influência do modelo francês (Sguissardi, 2004). Para Marback Neto e Falcão (2007, p. 72), o período de 1808 a 1931, para o ensino 8 superior brasileiro, é marcado “pelo pragmatismo herdado da reforma na Universidade de Coimbra e pouco relação entre ensino e pesquisa [...]”. A Universidade de São Paulo (USP), criada em 1934, também foi profundamente marcada pelo modelo francês, até em função dos professores que lá trabalharam. Em 1935, foram criadas as universidades do Distrito Federal (na época, no Rio de Janeiro), e de Porto Alegre. Nas décadas de 1940, 1950 e 1960, houve a implantação de universidades federais em vários estados (Marback Neto; Falcão, 2007). De 1937 a 1946 foram criadas várias entidades também de fundamental importância para o ensino superior, como o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), em 1937. TEMA 3 – A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO ENSINO SUPERIOR A educação profissional no ensino superior é ofertada por meio dos cursos tecnológicos. As políticas educacionais para o ensino superior estão também expressas nos documentos já apresentados anteriormente: a Constituição Federal (CF/88) (1988), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) (1996), e PNE (Plano Nacional de Educação) (2014-2024). Especificamente para o ensino superior, há ainda os seguintes documentos, conforme o Quadro 1. Quadro 1 – Políticas da Educação profissional e tecnológica DOCUMENTO SÍNTESE DO DOCUMENTO Decreto n. 5.154, de 23 de julho de 2004 Art. 1°, item III, estabelece que a educação profissional poderá ser ofertada na Educação Profissional Tecnológica de Graduação (Brasil, 2004b). Lei n. 11.741, de 16 de julho de 2008 Art. 39, propõe a integração das ações da educação profissional e tecnológica nos “diferentes níveis e modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da tecnologia” (Brasil, 2008, p. 1). Decreto n. 9.235, de 15 de dezembro de 2017 Art. 15, as IES serão credenciadas como: “I - faculdades; II - centros universitários; e III – universidades” (Brasil, 2017, p. 4). Fonte: Elaborado com base em Brasil, 2004b; 2008; 2017. Ao longo desta aula continuaremos a apresentar as legislações e, por consequência, as políticas da educação profissional e tecnológica. Quanto à estrutura, o ensino superior e a pós-graduação estão estruturados conforme apresentado no Quadro 2. Lembrando de que o ensino 9 superioré ofertado após a conclusão do Ensino Médio ou equivalente, para alunos a partir dos 17 anos e, a pós-graduação, é ofertada após o ensino superior. Quadro 2 – Estrutura do ensino superior e pós-graduação Tipo Duração Objetivos Ensino superior Cursos tecnólogos (trata-se dos cursos de educação profissional tecnológica) De 2 a 3 anos São os cursos para atendimento mais imediato das necessidades do mercado de trabalho e para atuação em áreas mais específicas. Ex.: Tecnologia em Massoterapia. Licenciaturas De 3 a 5 anos São cursos destinados para a formação acadêmico-profissional de professores. Ex.: Licenciatura em Pedagogia. Bacharelado De 3 a 6 anos São cursos destinados para uma formação mais ampla que os tecnólogos, por exemplo. Ex.: Bacharel em Direito. Pós- graduação Lato sensu 360 horas mínimas (duração em torno de 1 ano e meio) Lato sensu significa em “sentido amplo”. É todo curso realizado após a graduação, proporcionando aperfeiçoamento em área específica do saber ou profissão. Ex.: curso de especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional. Stricto sensu Pode ser dividido em três níveis: Mestrado: 18 a 24 meses Doutorado: 24 a 48 meses Pós-doutorado: 6 meses a 6 anos (varia conforme o país e a pesquisa a ser realizada) Stricto sensu significa “sentido específico”. São cursos que oferecem capacitação mais longa e imersão na pesquisa que precisa ser realizada. Como resultado desta pesquisa, os alunos produzem uma dissertação (para mestrado), ou uma tese (para doutorado). No Brasil, no ensino superior, as entidades que exercem as funções de regulação, supervisão e avaliação são: Conselho Nacional de Educação (CNE); Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP); e a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (CONAES). O Ministro da Educação é a autoridade máxima do sistema federal de ensino e, consequentemente, da educação (Brasil, 2017). A organização da oferta dos cursos da educação profissional e tecnológica é realizada por eixos tecnológicos1. Para o Curso Superior de Tecnologia (CST) foi criado o Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia, muito semelhante ao Catálogo Nacional de Cursos Técnicos. Trata- 1 Sugerimos consultar Pegorini, 2020, p. 146 e Brasil, 2016. 10 se de um guia com as informações sobre os profissionais tecnólogos e um instrumento disciplinador para a oferta dos cursos. TEMA 4 – ACESSO E PERMANÊNCIA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TECNOLÓGICA O Governo Federal criou o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNES) com o objetivo de garantir a permanência dos alunos nos cursos e a sua conclusão. Trata-se de uma política inclusiva e compensatória e é, portanto, uma política de Estado redistributiva, conforme estudamos anteriormente. As políticas compensatórias se justificam em função da enorme desigualdade social que se mantém perversamente em nosso país. O critério estabelecido pelo programa para o recebimento da assistência estudantil é o estudante possuir renda familiar igual ou inferior a 1,5 salário- mínimo per capita, e estar regularmente matriculado em uma universidade federal (Brasil, 2012). Como quem recebe esse benefício são os alunos socialmente mais vulneráveis, os benefícios do PNAES concentram-se nas seguintes áreas: “moradia estudantil, alimentação, transporte, atenção à saúde, inclusão digital, esporte e apoio pedagógico” (Brasil, 2022, p. 1). Apenas para que você saiba, programa semelhante também é ofertado para os cursos técnicos, com o mesmo objetivo de garantir a permanência dos alunos e a conclusão dos cursos. O Programa de Assistência Complementar ao Estudante (PACE) também possui os mesmos critérios de acesso ao benefício, e suas ações também se concentram nas mesmas áreas de atuação do PNAES. A única diferença é que no PACE o estudante precisa estar regularmente matriculado em um curso técnico de uma rede de ensino federal. Com relação aos programas de assistência ao estudante, Pegorini (2020, p. 79) afirma que eles são exitosos, mas “infelizmente não é possível atender a todos os alunos que necessitariam de auxílio. Os alunos selecionados são, portanto, os mais pobres dentre os pobres”. Também contribui para o acesso e a permanência do estudante a criação do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), que surgiu em 1999 para substituir o Programa de Crédito Educativo (PCE). Ele é destinado a “subsidiar as mensalidades de cursos de graduação de estudantes regularmente matriculados em IES privadas avaliadas positivamente nos processos conduzidos pelo governo” (Pegorini, 2020, p. 152). 11 O Programa Universidade para Todos (ProUni) é outro programa governamental que possibilita ao estudante de baixa renda o acesso e a permanência no ensino superior, tanto na rede pública, como na privada. Esse programa é destinado a alunos que possuem renda familiar per capita máxima de até três salários-mínimos. TEMA 5 – SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR (SINAES) O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) foi instituído pela Lei n. 10.861/2004 com o objetivo de “assegurar processo nacional de avaliação das instituições de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes” (Brasil, 2004). Suas finalidades são “a melhoria da qualidade da educação superior, a orientação da expansão da sua oferta, o aumento permanente da sua eficácia institucional e efetividade acadêmica e social [...]” (Brasil, 2004). Em função disso, busca avaliar as Instituições de Ensino Superior (IES) em suas dimensões de ensino, pesquisa e extensão. Os indicadores de qualidade da educação superior para 2019 são: I - Conceito Enade; II - Indicador de Diferença entre os Desempenhos Observado e Esperado (IDD); III - Conceito Preliminar de Curso (CPC); e IV - Índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição (IGC) (Brasil, 2020). Os indicadores de qualidade da educação superior se utilizam também de fontes como: I - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade); II - Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); III - Censo da Educação Superior; e V - Avaliação dos programas de pós-graduação stricto sensu da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) (Brasil, 2020). O SINAES traz como consequência para as IES aumento significativo da burocracia, pois há a necessidade da produção de inúmeros documentos. Os principais são: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), Planejamento Estratégico (PE), Projeto Pedagógico de Curso (PPC) e Avaliação Institucional (AI). Sem mencionar a necessidade de criação e manutenção de uma Comissão Própria de Avaliação (CPA). 12 NA PRÁTICA Como você pode perceber, alguns problemas atuais do ensino superior e nas universidades brasileiras são antigos. Por exemplo, o questionamento do ensino superior gratuito nas universidades federais e o seu financiamento. Há uma pressão dos organismos internacionais e de parte da sociedade para que o ensino superior deixe de ser ofertado de forma gratuita. Utiliza-se com frequência os seguintes argumentos: 1. O Estado deveria utilizar os poucos recursos da educação para a educação básica, e não usar esses recursos para o ensino superior. 2. A educação básica ofertada de forma integrada com a formação profissional gratuitamente seria o suficiente para ser oferecido para todo o cidadão brasileiro; a partir disso, os custos deveriam ser responsabilidade do estudante para cursar o ensino superior. 3. Os custos são maiores em universidades públicas; por que o Estado não deixa isso nas mãos das empresas privadas? A questão é que as universidades privadas não oferecem o mesmo serviço que as públicas. São as públicas as responsáveis pela condução de muitas pesquisas brasileiras. E não é sóisso: muitas delas só acontecem em função do financiamento público. Como o custo de realizar e manter pesquisas científicas é muito elevado, dificilmente as universidades privadas poderiam realizar esse serviço. É importante lembrar que, na área da saúde, são as universidades públicas que mantêm hospitais que prestam serviço para a comunidade. Do ponto de vista do estudante, é nas universidades públicas que ele pode ser acolhido com um programa federal de assistência estudantil, possibilitando-lhe não apenas o acesso ao ensino, como a sua permanência. São programas que ofereciam moradia, alimentação, transporte etc. Queremos chamar sua atenção acerca de como o neoliberalismo impõe para as áreas sociais (saúde, educação e segurança) os mesmos princípios de mercado: maximização do lucro, lei da oferta e da procura, recompensar o capital (investidores), relação custo-benefício etc. De modo que a pergunta é: Esses princípios de mercado deveriam também ser válidos para o estabelecimento de políticas para as áreas sociais? 13 FINALIZANDO Como você pôde constatar, os três modelos de ensino para o ensino superior aqui apresentados são bastantes diferentes. Em cada um deles é possível perceber que a concepção de ensino é muito diversa. Para os jesuítas, o ensino era reprodução, memorização, repetição e cópia. Para o modelo francês, o ensino precisava ser produtivo, objetivo, útil e mensurável; por fim, para o alemão, o ensino tinha relação com a formação humana, sendo direcionado para o cotidiano da vida prática, buscando o desenvolvimento de toda a sociedade. É revelador como a concepção de ensino diz muito sobre as intenções pedagógicas que cada modelo defendia. Você deve perceber que, mesmo no contexto atual, ainda é possível perceber a influência dos três modelos na educação brasileira. 14 REFERÊNCIAS ANASTASIOU, L. das G. C. Universidade brasileira: adoção de modelos e suas decorrências. Revista de Administração Educacional, Recife, v. 1, n. 3, p. 37- 56, jun. 1999. BRASIL. Catálogo nacional de cursos superiores de tecnologia. Brasília: MEC, 2016. Disponível em: . Acesso em: 8 fev. 2022. BRASIL. Decreto n. 14.343, de 7 de setembro de 1920. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, Seção 1, 10 set. 1920, p. 15115. Disponível em: . Acesso em: 8 fev. 2022. BRASIL. 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