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ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 1 Estudo de caso envolvendo ataque combinado da RAA e DEF em concreto de fundação de edificação Case study involving combined attack from AAR and DEF in building foundation concrete HASPARYK, Nicole Pagan, Dra(1); KUPERMAN, Selmo Chapira, Dr (2); TORRES, José Ramalho (3) (1) ELETROBRAS Furnas (2) DESEK (3) NUTEC nicolepha@gmail.com, selmo@desek.com.br, jramalho@secrel.com.br Resumo A qualidade e durabilidade das estruturas de concreto pode muitas vezes ser afetada por ataques químicos, colocando em risco o seu desempenho e segurança. Inspeções e ensaios rotineiros podem não retratar a realidade da estrutura, sendo algumas vezes necessários ensaios complementares em laboratório de forma a auxiliar no correto diagnóstico de patologias. Isto porque muitas das inspeções em campo e ensaios apenas de resistência dão dados não conclusivos. Além disto, a causa de deterioração de determinado concreto normalmente é atribuída a apenas um fator, como por exemplo, a reação álcali-agregado (RAA), ou a um ataque por sulfatos ou mesmo à corrosão. O fato é que atualmente resultados de investigações mais apuradas tem mostrado o potencial de deterioração de estruturas de concreto a partir do ataque combinado de RAA e DEF (formação tardia de etringita). O presente estudo exemplifica este tipo de ataque combinado, mostrando alguns dos ensaios laboratoriais complementares que nortearam ao correto diagnóstico das patologias em blocos de fundação de uma edificação no Brasil. Palavra-Chave: Patologia, deterioração, concreto, RAA,DEF. Abstract Quality and durability of concrete structures can be considerably affected by chemical attacks. This situation can lead structures to risks of performance and safety. Inspections and routine tests can not always infer the reality of the structure and sometimes supplementary laboratory tests are necessary to assist a correct diagnosis of pathologies. Field inspections and compressive strength tests several times are neither enough nor conclusive. Furthermore, causes of deterioration are commonly attributed to just one factor, i.e., an alkali-aggregate reaction (RAA), a sulfate attack, or a corrosion incidence. The fact is that results of more detailed investigations have shown the potential deterioration of concrete structures by an association of AAR and DEF (Delayed ettringite formation). This paper exemplifies this type of associated attack presenting some lab supplementary tests that had lead to a correct diagnosis of those pathologies in concrete foundation blocks from a Brazilian building. Keywords: Pathology, deterioration, concrete, AAR, DEF. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 2 1 Introdução A deterioração do concreto pode ocorrer a partir da interação entre a estrutura e o meio no qual ela está inserida. Fatores associados às características dos materiais constituintes do concreto, mas também relativos às suas condições de lançamento, cura, exposição e condições de uso podem acarretar severa deterioração a partir de vários tipos de ataques. A evolução das consequências geradas reflete no desempenho e na durabilidade da estrutura em campo, e consequentemente na sua vida útil. São vários tipos de ataques possíveis de ocorrer, podendo ser divididos em processos químicos, físicos, mecânicos, eletroquímicos ou biológicos. Entretanto, na prática os fenômenos normalmente se sobrepõem, e neste caso torna-se necessário levar em conta as suas interações. Tanto fatores externos como características internas do concreto podem ser fonte responsável pelos ataques. Entre os ataques químicos de deterioração do concreto, destacam-se a reação álcali-agregado e o ataque por sulfatos. Quando se suspeita de algum problema na estrutura, o ideal é que se inicie a investigação por meio de inspeções em campo, entretanto, muitas das vezes torna-se necessária uma investigação mais criteriosa a partir da coleta de amostras em campo para estudos em laboratório além do levantamento de dados dos materiais e da estrutura e do meio no entorno de forma a auxiliar no correto diagnóstico do problema. Sabe-se que muitas das inspeções em campo e ensaios apenas de resistência podem fornecer dados não conclusivos, isto porque manifestações visuais se assemelham em alguns tipos de ataque, e a resistência pode até aumentar, dependendo do fenômeno instalado, levando a conclusões errôneas a respeito da qualidade da estrutura. A causa de deterioração das estruturas normalmente é atribuída a apenas um fator, como por exemplo, a reação álcali-agregado (RAA), ou a um ataque por sulfatos ou mesmo à corrosão. O fato é que atualmente resultados de investigações mais apuradas tem mostrado o potencial de deterioração de estruturas de concreto a partir de ataques combinados, como o de RAA e DEF (formação tardia de etringita), por exemplo. Os sintomas de DEF são em geral semelhantes aos da RAA e ataque por sulfato, com a presença de fissuras, podendo ser mapeadas e preenchidas. A etringita não é estável acima de 65ºC, e pode se decompor e formar monossulfatos; posteriormente, os íons sulfato são dissolvidos propiciando a formação de nova etringita, deteriorando o concreto por DEF (Mehta, Monteiro, 2008). É sabido também que um alto pH favorece mais a presença do monossulfato do que da etringita, além de alta concentração de sulfatos tanto na solução dos poros como por adsorção na estrutura do C-S-H (Taylor, Famy e Scrivener, 2001). Entretanto, quando o pH cai, seja pela ocorrência da RAA, a partir de seu consumo, ou por lixiviação, a formação da etringita ocorre de forma favorável (Taylor, 1997; Famy et al., 2001), propiciando condição para a instalação conjunta da RAA e DEF. Entre alguns casos de deterioração combinada relatados na literatura, pode ser citado o estudo desenvolvido por SHAYAN e MORRIS (2004). O trabalho mostra um estudo de ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 3 caso de ponte na Austrália onde existem indícios de que o calor de hidratação do cimento tenha atingido 80ºC, causando DEF. A suspeita da RAA partiu desde investigações visuais, e foi confirmada por análises em laboratório, onde o agregado de origem gnáissica apresentava quartzo reativo, além das análises microscópicas, que indicaram tanto produtos característicos da RAA como fases sulfatadas associadas à etringita. Os pesquisadores acreditam que a fissuração intensa observada tenha tido como principal origem a RAA, apesar da DEF ter sido detectada nos concretos. Outro estudo em 2008 (Shayan, Al-Mahaidi e Xu) mostra a deterioração de tabuleiro de ponte pela intensa RAA e alguma DEF instaladas, com reflexos negativos no módulo, e indicando grande potencial ainda de expansão residual, apesar da resistência se apresentar adequada. DURAND et al. (2004) apresentam outro trabalho que relata ataques combinados como o ataque por sulfatos, a RAA, e o congelamento e degelo em estruturas hidráulicas de Quebec. Hipóteses como a DEF e a presença de sulfetos nos agregados parecem não ser aplicadas haja vista que os concretos não alcançaram temperaturas suficientes para tal, e as características mineralógicas/petrográficas dos agregados não se apresentarem particularizadas o suficiente. Os estudos em laboratório mostram elevado teor de álcalis capaz de causar a RAA, além da presença de sulfatos solúveis, responsável pela formação de compostos sulfatados secundários. Um outro estudo de caso (SILVA, GONÇALVES e PIPA, 2008) atribui DEF como principal fonte da fissuração e deterioração em dormentes ferroviários, pela falta de controle da temperatura de cura além do alto consumo de cimento empregado nos concretos, embora a RAA também estejapresente e interagindo com a umidade presente para futuras expansões. Outros estudos como o de OWSIAK (2008) mostram em laboratório fenômenos combinados. Além dos testes terem empregado altas temperaturas de cura (90ºC), foram usados altos teores de álcalis na presença de opala reativa em substituição à areia. Os resultados indicaram como principal causa a RAA, porém com contribuição da DEF no fenômeno expansivo. A Barragem Fagilde, em Portugal, também sofre com fissurações e deslocamentos em virtude da RAA e do ataque por sulfatos interno. Os estudos de diagnóstico foram realizados em testemunhos de concreto extraídos da barragem e analisados em laboratório, onde foi confirmada a presença de gel e etringita, caracterizando as diferentes causas da deterioração (Fernandes, Silva, Gomes, 2008). Diante do exposto, o presente trabalho aborda o ataque combinado de RAA com DEF em concretos provenientes de bloco de fundação de edificação no Brasil, mostrando alguns dos ensaios laboratoriais complementares que nortearam ao correto diagnóstico das patologias instaladas. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 4 2 Programa de Investigação Tendo como base a ocorrência de intensa fissuração em blocos de fundação de uma edificação no Brasil (Figura 1), com o objetivo de diagnosticar o problema e investigar as suas possíveis causas, investigações em campo, a partir de inspeção visual criteriosa e um programa de estudos em laboratório foram estabelecidos. Convém ressaltar que o bloco em questão encontra-se armado na forma de gaiola, ou seja, há armadura inferior, superior e nas laterais. a) b) Figura 1 – Fissuração observada no bloco de concreto: a) Vista superior; b) Vista lateral. Inicialmente foram definidos, em campo e após a inspeção visual, os locais nos quais amostras de concreto seriam extraídas. A partir das extrações dos testemunhos de concreto, as amostras foram submetidas aos estudos em laboratório, conforme descrito na sequência. 2.1 Reconstituição de traço e análises de enxofre Os estudos envolvendo a reconstituição de traço foram realizados em dois corpos de prova de concreto extraídos. As análises químicas foram quantitativas e realizadas basicamente pelo método gravimétrico, tendo sido empregada também a secagem e calcinação para análise dos voláteis, após a fragmentação dos concretos e separação das frações agregado e argamassa das amostras de concreto. As reconstituições de traço foram feitas a partir dos cálculos na base não volátil, com base no “resíduo insolúvel” a partir dos agregados presentes e, nos “anidrido silícico” e “óxido de cálcio”, a partir do cimento, tendo como referencia IPT (1940) e QUARCIONI (1998). As análises químicas específicas para determinação do enxofre também foram gravimétricas, de caráter quantitativo, obtendo-se os teores de enxofre total, na forma de sulfatos e de sulfetos presente nas amostras de agregado e argamassa. Os teores determinados representam os valores totais existentes nas amostras, a partir de ataque ácido. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 5 2.2 Análises petrográficas/mineralógicas dos agregados As investigações petrográficas/mineralógicas dos agregados constituintes dos concretos foram realizadas fazendo-se o emprego da microscopia ótica de transmitida e luz refletida. As análises por microscopia ótica de luz transmitida foram realizadas em lâminas delgadas, e permitiram a classificação de origem dos agregados presentes, identificação de seus constituintes mineralógicos com o percentual semiquantitativo, além de verificar os minerais potencialmente reativos do ponto de vista da reação álcali-agregado, segundo a NBR 15577/3, entre outras características relacionadas à textura e relações petrogenéticas. Destaca-se que uma análise visual/macroscópica precedeu as análises por microscopia ótica das amostras, antes da preparação das lâminas, observando-se características gerais do material. Já na análise por microscopia ótica fazendo-se o uso da luz refletida, foi possível identificar os minerais opacos, e mais especificamente investigar eventuais sulfetos presentes nestes opacos em seções polidas das amostras de agregados extraídos dos concretos, sendo neste caso preparadas duas seções polidas para cada concreto. Observou-se sua textura, as alterações e inter-relações entre estes minerais presentes. Nesta etapa foi realizada uma análise tanto qualitativa como semiquantitativa. 2.3 Análises petrográficas dos concretos A microestrutura dos testemunhos de concreto foi avaliada por um microscópio eletrônico de varredura (MEV) com espectrometria por energia dispersiva de raios X (EDS) acoplada, para o estudo dos elementos químicos presentes (em amostras com superfície de fratura). Foi utilizado em paralelo um difratômetro de Raios X (fração argamassa dos concretos). Ambos os estudos tiveram o objetivo de avaliar alterações microestruturais nas amostras que pudessem justificar a ocorrência importante da fissuração observada nos blocos, auxiliando, por conseguinte o diagnóstico do fenômeno instalado. Precedendo estas análises, uma criteriosa inspeção visual foi feita e, em associação, foi feito o uso do microscópio ótico para auxiliar nas análises petrográficas dos concretos. 3 Resultados e Discussões 3.1 Reconstituição de traço Os dados de reconstituição de traço obtidos a partir das análises químicas e do proporcionamento das frações pasta e agregado, podem ser observados na Figura 2. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 6 1 1,2 1,4 1,6 1,8 2 2,2 2,4 2,6 2,8 3 3,2 3,4 3,6 Concreto 01 Concreto 02 Tr aç o 1: X RI SiO2 CaO Média Figura 2 – Traços determinados na base não volátil Tendo como referência os traços determinados a partir do “resíduo insolúvel”, “anidrido silícico” e “óxido de cálcio”, observa-se que não houve grande variação entre as determinações para cada amostra e, em média, os traços obtidos foram de 1:3,1 e 1:3,2 para os concretos 1 e 2, respectivamente, tratando-se de concretos de mesma dosagem. Estimando-se o consumo de cimento destes concretos, a partir de alguns parâmetros genéricos como massa específica dos constituintes do concreto, análise química de um cimento de referência e relação a/c provável de 0,5, chega-se a um valor de 438 kg/m³ e 433 kg/m³ para os concretos 1 e 2, respectivamente. Estes estudos de reconstituição de traço foram importantes para auxiliar no diagnóstico do problema dos blocos mesmo com as limitações apresentadas pela técnica. Verifica-se que o consumo de cimento estimado representa, em média, 435 kg/m³ (considerando um fck de 35MPa). Levando em consideração um rendimento térmico de 0,12°C/kg/m³ para o tipo de concreto em questão, tem-se uma elevação adiabática da ordem de 52°C. Como este concreto não foi refrigerado, a sua temperatura de lançamento pode ter atingido a casa dos 30°C, sendo possível, portanto que temperatura máxima, adiabática, atingida no interior do bloco de concreto tenha chegado a valores próximos de 82°C. A partir do apresentado anteriormente, esta situação se mostra preocupante haja vista que temperaturas acima de aproximadamente 65°C podem deflagrar a formação de etringita tardia (DEF) em concretos de cimento Portland. Estudos anteriores realizados por MELO (2010), MELO et al. (2010; 2011) mostram esta possibilidade. Para um concreto com consumo do cimento tipo CP IV da ordem de 350 kg/m³, a elevação adiabática da temperatura foi de aproximadamente 35ºC, subindo para 45ºC quando se empregou um consumo de 450 kg/m³ com o mesmo cimento. Nestes estudos relatados na literatura, considerando-se a temperatura do concreto fresco iguala 25ºC (temperatura ambiente), o que poderia ser bem maior dependendo da região do lançamento, estima-se que o pico de temperatura seja aproximadamente 60ºC e 70ºC, respectivamente. Já para ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 7 um CP II-F, o pico de temperatura seria de 75ºC para um consumo de 450 kg/m³, isto é, pouco maior do que a do cimento pozolânico. Os concretos contendo o CP IV foram investigados por análises microestruturais, sendo confirmada a presença de DEF. Considerando o exposto, pode-se dizer que os concretos estudados e apresentados neste trabalho com consumo da ordem de 435 kg/m³ também se mostram suscetíveis à DEF. 3.2 Análises de enxofre Os resultados das análises de enxofre, expressos em %, determinadas nas frações agregado e argamassa dos concretos se encontram apresentados no gráfico da Figura 3. 0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 Agregado CP01 Argamassa CP01 Agregado CP02 Argamassa CP02 Te or d e S (% ) S sulfatos S Sulfetos S Total 00 0 0 Figura 3 – Teores de enxofre na forma de sulfeto e sulfato nos agregados e argamassas. Com base no estudo realizado por análise química, observa-se que os agregados não se mostram fonte de enxofre, seja de algum sulfato ou sulfeto, indicando fases presentes apenas na fração argamassa dos concretos, e nestas apenas como origem de sulfatos. Calculando o enxofre em termos de anidrido sulfúrico (SO3) e sulfatos (SO4) nas argamassas, considerando parâmetros estequiométricos, que é o que se usa mais correntemente, têm-se os dados apresentados na Figura 4. Os dados de SO3 chegam a valores próximos de 1,0% e 1,4%, e de SO4 aproximadamente 1,2% e 1,7% para os concretos 1 e 2, respectivamente. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 8 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 1,8 Argamassa CP01 Argamassa CP02 Te or e m % SO3 SO4 Figura 4 – Teores de SO3 e SO4 calculados para as argamassas dos concretos. Analisando o consumo de cimento médio dos concretos (435 kg/m³) obtido por reconstituição de traço, e estimando o traço empregado nos concretos, calculando-se o teor de SO3 em relação à massa de cimento, chega-se a valores aproximados de 3% e 4,5% para os concretos 1 e 2, respectivamente, mostrando certa variação entre os concretos. De qualquer forma, estes dados obtidos se apresentam relativamente elevados em se tratando de compósito a base de cimento, o que indica um favorável ataque por sulfatos. Segundo as normas brasileiras de especificação para cimento, os valores máximos admissíveis para o trióxido de enxofre no cimento é de 4% para CPI, CPII, CPIII e CPIV. Sabe-se que os concretos da obra foram confeccionados com cimento sem adição, do tipo CP II. Na especificação NBR 7211/2009 para agregados, também é feita uma nota a respeito de limites em termos de SO4, como segue: “caso o teor total trazido ao concreto por todos os seus componentes (água, agregados, cimento, adições e aditivos químicos) não exceda 0,2% ou que fique comprovado o uso de cimento Portland resistente a sulfatos, conforme a ABNT NBR 5737”, o agregado pode ser usado. Apesar desta norma tratar de sulfatos solúveis, e ainda apresentar um limite de 0,1% para o SO4 apenas no agregado, apresenta o limite acima trazido pelo concreto como um todo. Embora os agregados dos concretos não tenham apresentado qualquer contribuição de S (Figura 3), se for analisada a contribuição total do concreto no presente estudo (argamassa), os valores de SO4 se apresentam bem acima do limite de 0,2% (Figura 4) permitido, considerando neste trabalho todos os tipos de sulfato, e não apenas os solúveis, mas que podem já estar associados a fases deletérias. 3.3 Análises petrográficas/mineralógicas dos agregados As análises petrográficas realizadas nos agregados, a partir dos testemunhos de concreto indicaram, em geral, características mineralógicas semelhantes entre si a partir das análises por microscopia ótica de luz transmitida. As rochas empregadas ali como agregados são em geral de origem graníticas. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 9 Os agregados são constituídos prioritariamente por feldspatos (microclínio e plagioclásio) e quartzo, contendo também micas (biotita e muscovita), porém de forma restrita, além de alguns opacos e acessórios em menor proporção. Em relação à potencialidade mineralógica dos agregados para a reação álcali-agregado, tomando como referência a NBR 15577 (Parte 1 e 3), destaca-se que nos agregados analisados nas lâminas foram verificadas características importantes de potencialidade reativa como o quartzo deformado com extinção ondulante (variando de 15º a 35º). Foram identificados também os feldspatos potássicos (microclínio), que também podem contribuir para a reação expansiva. A Figura 5 mostra algumas das principais características mineralógicas dos agregados constituintes dos concretos. Figura 5 – Micrografia característica dos minerais constituintes dos agregados dos concretos. Legenda: Q: quartzo; Qeo: quartzo com extinção ondulante; FMc: feldspato microclínio; FPl: feldspato plagioclásio; Mb: mica biotita; Mm: mica muscovita. Na análise de opacos presentes nos agregados, foram identificados alguns destes minerais, como a ilmenita (óxido de ferro e titânio) e a pirita (sulfeto de ferro) na amostra 01 e além dos minerais anteriores, a calcopirita (sulfeto de ferro) também na amostra 02. Vale destacar a baixíssima incidência destes sulfetos encontrados por microscopia, além dos mesmos se apresentarem bem preservados, sem qualquer tipo de alteração mineralógica. 3.4 Análises petrográficas dos concretos As análises petrográficas dos concretos envolvendo inicialmente as inspeções visuais, que precedem as análises pelo microscópio eletrônico de varredura (MEV) e acompanham a preparação das amostras para o MEV indicaram características não comuns de serem encontradas em concretos normais, tanto na superfície dos concretos como no seu interior, como preenchimento parcial ou total nos poros por material branco. FMc Mm FPl Q-eo MbFPl Q FPl 0,5 mm ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 10 Foram identificadas também bordas escuras, ao redor de alguns agregados, sugestivas da reação álcali-agregado. Deve-se comentar que as duas amostras analisadas (Concreto 01 e 02) se apresentaram semelhantes pela inspeção visual. Nas Figuras 6 a 9 se encontram registradas as principais características observadas durante a inspeção visual dos concretos. Figura 6 – Deposições no interior de um poro (Concreto 01). Figura 7 – Bordas escuras no contorno dos agregados (Concreto 01). Figura 8 – Material branco preenchendo parcialmente um poro da amostra e revestindo outro poro (Concreto 02). Figura 9 – Superfície do testemunho indicando vários agregados com bordas (Concreto 02). Por microscopia ótica, além das características mineralógicas importantes observadas nos agregados, nas lâminas preparadas dos concretos foi possível verificar durante as análises petrográficas características indicativas de reação química como bordas ao redor dos agregados e poros contendo deposição de material (Figuras 10 e 11). ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 11 Figura 10 – Fragmento de agregado com borda no seu entorno (Concreto 01). Figura 11 – Poro totalmente preenchido (Concreto 02). Nas análises envolvendo a microscopia eletrônica de varredura (MEV), as duas amostras de concreto analisadas também se apresentaram bem semelhantes, e dentre as principais características observadas, se encontram: os poros (que nainspeção visual se apresentavam com deposições brancas), independente de seu tamanho, contendo produtos aciculares, na sua maioria, sugestivos de fases sulfatadas, além de formações massivas. Em algumas regiões, verificaram-se também fissuras acompanhando os poros, quando preenchidos pelos novos produtos formados. Alguns outros poros também continham material maciço gretado sílico-alcalino, característico do gel, e entre eles alguma incidência de formação botrioidal além de produtos cristalizados na forma de rosáceas e rendado, todos característicos da RAA (Hasparyk, 20011). Observou-se também a concentração das duas fases neoformadas mencionadas, de forma simultânea, em alguns pontos das amostras analisadas. Deposições aciculares sobre o agregado também foram visualizadas, sugerindo reação com o agregado. Nas bordas observadas na inspeção visual, as características indicam a reação da pasta com o agregado, seja envolvendo fases sulfatadas como a própria reação álcali-agregado. Em algumas regiões localizadas o agregado também se apresentou fragmentado, além de ter sido verificada pulverulência, bem como a incidência pontual de algumas fissuras na pasta. As micrografias apresentadas nas figuras a seguir apresentam algumas das características microestruturais observadas nos concretos analisados, além de alguns dos espectros indicando o resultado das microanálises realizadas por EDS. ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 12 Figura 12 – Cristais sulfatados mal formados dispersos na pasta (Concreto 01). Figura 13 – Borda na zona de transição preenchida por cristais massivos de etringita (Concreto 01). Figura 14 - Gel maciço gretado sílico cálcico alcalino na pasta que se apresentava esbranquiçada na inspeção visual (Concreto 01). Figura 15 - Rosáceas da RAA próximas a um poro contendo gel gretado (Concreto 01). Figura 16 – Espectro da borda na Figura 13. Figura 17 – Espectro típico das fases da Figura 15. agregado pasta ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 13 Figura 18 – Poros de tamanhos variados totalmente preenchidos por cristais aciculares sugestivas da etringita (Concreto 02). Figura 19 - Aglomerado de fases sulfatadas na pasta. (Concreto 02). Figura 20 – Cristais sílico-alcalinos da RAA dentro de um poro (Concreto 02). Figura 21 – Borda maciça gretada (Concreto 02). Figura 22 – Espectro da região destacada na Figura 18. Figura 23 – Espectro da região destacada na Figura 21. As análises realizadas por difração de raios X das amostras foram auxiliares às do MEV, e permitiram a identificação dos principais constituintes mineralógicos das argamassas dos concretos, porém destaca-se que as fases oriundas dos agregados muitas das vezes interferem e se sobrepõem às fases da pasta, dificultando/mascarando as interpretações agregado pasta ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 14 pela alta cristalinidade dos minerais. As fases detectadas como oriundas dos agregados são compatíveis com os minerais presentes, sendo as mesmas para as duas amostras analisadas, corroborando as análises mineralógicas por microscopia. Já nas fases indicadas como sendo oriundas da pasta, a etringita e a gipsita foram verificadas na amostra 01, mas apenas a etringita na amostra 02. Foram identificados também os hidróxidos e carbonatos de cálcio (portlandita e calcita) em ambas as amostras analisadas. Por esta técnica de difração de raios X, comprova-se a presença das fases sulfatadas visualizadas nas análises realizadas por microscopia eletrônica. 4 Considerações Com base no quadro fissuratório observado em campo e tendo como referência os resultados dos estudos laboratoriais nos testemunho de concreto apresentados neste trabalho, pode-se dizer que a estrutura de concreto apresenta alterações químicas que podem ter afetado a sua integridade. As análises visuais já indicaram algumas destas alterações, a partir dos vários poros com deposições que foram detectados além das bordas no contorno de alguns agregados. Nas análises microestruturais mais detalhadas, os produtos neoformados puderam ser confirmados, indicando fases tanto da reação álcali-agregado como fases sulfatadas. A característica que se destacou neste tipo de análise foi a identificação da presença simultânea dos dois tipos de patologia. Além destas constatações, as análises químicas também indicaram a presença de fases sulfatadas nas argamassas dos concretos, corroborando as análises microestruturais. Vários destes produtos já são conhecidos e se encontram relatados na literatura específica (Hasparyk, 2005, Melo, 2010). A incidência da reação álcali-agregado pode ser explicada a partir das análises petrográficas/mineralógicas dos agregados constituintes dos concretos, onde foram detectados minerais potencialmente reativos. Em relação às fontes de sulfatos, a priori, se descarta a hipótese da causa ter sido interna, e oriunda dos agregados, seja de sulfatos ou sulfetos. Na análise mineralógica específica de sulfetos, estes minerais não se mostraram tão importantes por ter causado algum tipo de ataque por sulfatos, haja vista sua baixa incidência. Nas análises químicas dos agregados, nem os sulfatos e sulfetos foram sequer detectados. Além disto, análises do solo da região convergem para baixos teores de sulfatos, o que descartaria, portanto a hipótese de um ataque externo por sulfatos. Diante do exposto, e levando em consideração os dados de reconstituição de traço, a partir do consumo de cimento estimado, e a possibilidade da massa de concreto ter atingido a casa dos 80ºC a partir do calor de hidratação, muito provavelmente os concretos experimentam, em associação com a RAA, um ataque interno por sulfatos característico da formação tardia da etringita (DEF). Sabe-se que como resultado da RAA, são formados produtos que, na presença de umidade, são capazes de expandir, gerando fissurações, deslocamentos e podendo levar a um comprometimento das estruturas de concreto” (Hasparyk, 2005). ANAIS DO 54º CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO - CBC2012 – 54CBC 15 Já as reações envolvendo os sulfatos, denominado ataque por sulfatos, também são reações químicas expansivas onde os sulfatos reagem com a pasta de cimento originando na sua maioria a etringita, podendo também ser formada a gipsita. Dependendo da fonte, grau e tipo de ataque por sulfatos, este processo também pode levar o concreto à deterioração em função das expansões, fissurações, entre outros problemas estruturais. Com base no diagnóstico da RAA e DEF, o bloco de fundação do qual foram extraídos os testemunhos de concreto encontra-se com sua durabilidade comprometida considerando que as medidas mitigadoras para os tipos de ataque envolvidos são na sua maioria paliativas. Uma análise global do mesmo bem como dos demais da edificação em questão está sendo feita, levando em consideração não só o tipo de estrutura, mas também as suas condições de exposição entre outros aspectos e características que se façam importantes com o objetivo de avaliar a influência das patologias instaladas no seu desempenho e durabilidade e a necessidade de eventuais intervenções nos mesmos. Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15577-3: Agregados - Reatividade álcali-agregado - Parte 3: Análise petrográfica para verificação da potencialidade reativa de agregados em presença de álcalis do concreto. Rio de Janeiro, 2008. ______. NBR 7211: Agregados para concreto – especificação. Rio de Janeiro, 2009. DURAND et al. A special history case about severe damages due to freezing and thawing combined with sulfate migration and ASR at Rapides-des-Quinze Hydraulic Structures,12th International Conference on Alkali-Aggregate Reaction in Concrete. 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