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Radiação Eletromagnética 
 
Carlos Heitor d’Ávila Fonseca - 2002 
 
 
As equações de Maxwell mostram que uma carga elétrica irradia uma onda 
eletromagnética sempre que sofre algum tipo de aceleração. Nesse texto vamos 
apresentar expressões que descrevem a radiação emitida por uma carga acelerada 
por uma força impulsiva. 
 Levando em conta que o campo 
eletromagnético se propaga na velocidade da 
luz podemos concluir que as linhas de força 
do campo elétrico de uma carga, que sofra 
uma aceleração brusca por um curto intervalo 
de tempo, apresentam uma deformação em 
forma de bolha como na figura. Vamos supor 
que a carga esteja inicialmente em repouso, 
sofre a aceleração e depois caminha com 
velocidade constante. O raio da bolha é a 
distância percorrida pela luz desde o instante 
de aplicação da aceleração. A espessura da 
parede da bolha é a distância percorrida pela 
luz durante o curto tempo de aplicação da 
aceleração∗. 
 É importante notar que durante todo o tempo em que está se movimentando a 
carga cria um campo magnético que se afasta na velocidade da luz. Assim todo o 
volume da bolha ( de sua parede e da parte interna esférica ) está preenchido por esse 
campo magnético. Sabemos que a energia eletromagnética só pode caminhar quando 
os dois campos, elétrico e magnético, possuem componentes ortogonais, isto é, seu 
vetor de Poynting S = E×B/µ0, não é nulo. Verifique dentro das paredes da bolha† 
que o vetor de Poynting possui componente apontando para fora, requisito 
necessário para que a bolha esteja em expansão. No volume esférico interno à bolha 
o vetor de Poynting é responsável por transportar a energia eletromagnética aí 
contida, com velocidade v, junto com a carga‡. Da mesma forma que a carga 
elétrica caminha com velocidade constante, o campo com toda a energia nele 
armazenada de maneira não uniforme deve também caminhar. Finalmente, na região 
externa à bolha, o campo magnético ainda não existe e o vetor de Poynting é nulo. 
Assim as linhas de campo elétrico dessa região permanecem como estavam; ainda 
continuam apontando para o lugar onde a carga estava inicialmente. Essa região 
 
∗ A rigor as duas faces esféricas da parede da bolha não são concêntricas. A face externa tem seu 
centro no ponto onde a carga estava inicialmente em repouso. A face interna é uma esfera cujo centro 
está no ponto onde a carga terminou de sofrer aceleração. Para uma aceleração de curta duração os 
dois pontos tendem a coincidir. 
† Pode ser mostrado que o campo elétrico de uma carga movimentando-se com velocidade constante 
ainda é representado por linhas de força retas e radiais ( ver Feynman, vol. I, 28-3 ). Esse resultado 
vale mesmo em altas velocidades, quando essas linhas tendem a se concentrar no plano perpendicular 
ao vetor velocidade ( ver Berkeley, vol. 2, p. 152 ou Alaor Chaves, vol. 3, seção 31.8). 
‡ A energia, armazenada de maneira não uniforme no campo, caminha segundo as linhas do vetor de 
Poynting, um pouco arqueadas em volta da carga e no sentido de sua velocidade. Para uma carga com 
velocidade constante o vetor de Poynting não apresenta componente radial, mostrando que a energia 
do campo não pode se afastar ( ou aproximar ) radialmente da carga. Verifique esse comportamento 
do vetor de Poynting na região esférica dentro da bolha. 
 2 
ainda não sabe que a carga se movimentou. 
 Agora vamos deduzir as expressões para os campos de radiação da carga 
acelerada. Considere que a carga q, inicialmente em repouso, sofra uma aceleração 
a, constante por um intervalo de tempo curto ∆t1, percorrendo uma distância ∆x1. 
Em seguida, por um intervalo de tempo ∆t2, ela viaja uma distância ∆x2 com 
velocidade constante v. Podemos então escrever: 
v v= = =
⇒ = + = +






a t x a t x t
x x x a
t
t t
∆ ∆ ∆ ∆ ∆
∆ ∆ ∆
∆
∆ ∆
1 1 1
2
2 2
1 2
1
2 1
1
2
2
, , ;
.
 
Durante esse tempo uma dobra nas linhas de força do vetor campo elétrico, ocorrida 
quando a carga foi acelerada, afasta-se na velocidade da luz. Essa deformação do 
campo elétrico adquire a forma de uma bolha esférica sendo inflada. A parede da 
bolha é a região de campo elétrico deformado e o centro da esfera está na posição 
inicial da carga. A espessura da parede da bolha vale c∆t1 e o seu raio pode ser 
escrito como r = c∆t, onde ∆t = ∆t1/2+∆t2. Nessas expressões consideramos como 
raio, a distância do centro até a metade da parede da bolha. De qualquer forma se 
∆t1<< ∆t2 tal consideração é irrelevante. Assim podemos escrever para o raio da 
bolha a expressão 
r c
t
t= +






∆
∆1 22
. 
Combinando as equações obtidas podemos então escrever 
∆
∆
x
t
a r
c1
= . 
 
 O campo elétrico nas paredes da bolha é o resultado 
do campo coulombiano E||, superposto ao campo de 
radiação E⊥. Na figura, o triângulo retângulo desenhado na 
região onde a linha de força está deformada tem um cateto* 
de tamanho ∆x senθ associado à componente E⊥ e o outro 
cateto, de tamanho c∆t1 , está associado à componente E||. 
Assim podemos escrever 
E
E
x
c t
a r
c
⊥ = =
||
sen
sen .
∆
∆
θ
θ
1
2 
 Substituindo o campo elétrico coulombiano por seu valor q/4πε0r
2, e 
sabendo que numa onda eletromagnética os módulos dos campos estão relacionados 
pela expressão E⊥ = c B⊥, podemos finalmente escrever as expressões para os 
campos de radiação numa região distante da carga, válidas se a velocidade atingida 
for baixa em comparação à velocidade da luz: 
E
c
qa
r
B
c
qa
r
⊥
⊥
=
=
1
4
1
4
0
2
0
3
πε
θ
πε
θ
sen ,
sen .
 
 O transporte da energia eletromagnética é dado pelo vetor de Poynting, 
 
* Se a carga se aproximar da velocidade da luz, o desenho das linhas de força dentro da bolha sofre 
uma contração relativística na direção de seu movimento, deixando de divergir isotropicamente da 
carga. Nesse caso uma linha de força radial dentro da bolha deixa de ser paralela ao seu 
prolongamento fora da bolha e o valor ∆x senθ deixa de ser válido para o comprimento de um dos 
catetos. 
 3 
S = E⊥×B⊥/µ0. No caso da radiação o vetor de Poynting é normal à superfície da 
bolha esférica e aponta para fora. Temos então que, a uma distância r e numa 
direção formando um ângulo θ com a aceleração da carga, a energia irradiada por 
unidade de tempo e por unidade de área é dada pela expressão 
S
q a
c r
=
2 2
2
0
3
2
216π ε
θsen
. 
 Notamos que essa energia não é irradiada de maneira isotrópica. A radiação 
se concentra nas direções perpendiculares ao vetor aceleração. A potência total 
irradiada (chamada de fórmula de Larmor) pode ser obtida 
integrando-se a expressão acima, na superfície da bolha esférica: 
P d S r rd= ⋅ = ⋅∫ ∫S A 2
0
π θ θ
π
sen 
⇒ P
q a
c
=
2 2
0
36πε
 ( Larmor ). 
Como os resultados acima foram deduzidos para uma força impulsiva, 
atuando por um curto intervalo de tempo, eles ainda são válidos no caso da carga 
sofrer uma aceleração centrípeta. No entanto, como foi comentado anteriormente, tal 
expressão deixa de valer para velocidades relativísticas, quando a carga passa a 
irradiar energia numa taxa mais alta do que a prevista por essa equação. Além disso 
todos os resultados que apresentamos para os campos de radiação e 
conseqüentemente para o vetor de Poynting e para a fórmula de Larmor, pressupõem 
que a distância r seja grande ( em comparação, por exemplo, com os comprimentos 
de onda envolvidos ). 
 
 
Exercícios 
 
1) Carga oscilando. 
a) Calcule a potência irradiada por uma carga q que, momentaneamente, esteja 
executando um movimentoharmônico dado por x(t) = xm cosω t. 
b) Mostre que a média temporal da potência irradiada é dada por 
<P> = (ω 2 q xm)2/(12πεoc3). Considere o valor médio para as funções 
senoidais ao quadrado: < cos2ωt > = < sen2ωt > = 1/2. 
 
2) Carga em rotação. 
a) Qual a potência irradiada por uma carga q com velocidade angular ω em 
um movimento circular de raio r? 
b) Calcule a energia irradiada numa volta completa, supondo que a velocidade 
angular e o raio sofram pouca variação durante esse período. 
c) Verifique em quais direções a radiação é máxima, ou mínima, relativamente 
à posição instantânea da carga. 
 
3) �ão isotropia da radiação emitida. 
Baseando-se no caso de uma carga em oscilação, analise a intensidade da 
radiação emitida por uma antena de dipolo elétrico orientada verticalmente. Em 
quais direções a emissão é máxima e em quais ela é mínima? Explique. 
 
4) Onda eletromagnética esférica de um oscilador 
Uma carga q é forçada a executar um movimento harmônico simples ao longo 
do eixo z, dado por z(t) = zm cosω t. 
a) Mostre, explicando cada passo, que o campo elétrico irradiado numa direção 
 4 
formando um ângulo θ com o eixo z e a uma grande distância r da carga, é 
dado por E⊥(r,θ, t) = [−q zm ω 2 senθ /(4πεoc2r)] cos(kr − ω t). 
Observação: considere que esse campo irradiado viaje na velocidade da luz, 
apresentando portanto um retardo de r/c ao caminhar a distância r. Assim o 
mais correto é substituir o t que aparece na fase da função senoidal por t − r/c. 
Use a definição k = ω /c. 
b) Escreva a expressão correspondente ao campo magnético irradiado. Justifique. 
c) Escreva a expressão para o vetor de Poynting. Note que as amplitudes dos 
campos diminuem com o inverso do raio enquanto o fluxo de energia diminui 
com o inverso do quadrado do raio. 
 
5) Espalhamento Rayleigh. 
O espalhamento das ondas eletromagnéticas num meio tênue, ao atingirem 
partículas muito menores que seu comprimento de onda e dispostas ao acaso, tende a 
ter uma intensidade proporcional à quarta potência da freqüência da onda incidente. 
Isso acontece quando a freqüência da onda é muito inferior às possíveis frequências 
de ressonância associadas às partículas. Esse fenômeno recebe a denominação de 
espalhamento Rayleigh em homenagem ao físico que em 1871 elaborou uma teoria 
para tentar explicar a dependência da intensidade com a quarta potência da 
freqüência, encontrada no espalhamento da luz solar pela nossa atmosfera. 
A medida que o tamanho da partícula que está provocando o espalhamento 
aumenta e vai se aproximando do comprimento de onda, a dependência com a 
freqüência vai desaparecendo. Isso porque os vários centros espalhadores dentro da 
partícula passam a ser excitados com diferentes fases da onda incidente. Para 
partículas muito maiores que o comprimento de onda da luz incidente, o 
espalhamento de luz deixa de depender da freqüência. Um modelo válido nesse 
último caso é o chamado espalhamento Mie. 
Observação: na parte inferior da atmosfera, onde a densidade é maior, a principal 
contribuição ao espalhamento são as flutuações de densidade, que também segue a 
mesma dependência com a freqüência. 
a) Como um modelo simplificado para o espalhamento, considere o caso de uma 
carga elétrica em oscilação forçada por uma onda senoidal. No caso da freqüência 
ω da onda incidente ser muito menor que a freqüência de ressonância, a carga 
elétrica executará um movimento harmônico da forma x(t) = xm cosωt. Mostre 
que a potência irradiada possui a mesma dependência com a freqüência citada 
acima no espalhamento Rayleigh. Escreva todas as equações envolvidas. 
b) Explique a cor azul do céu supondo que o espalhamento Rayleigh se aplique ao 
caso da luz solar atingindo as moléculas de nossa atmosfera ( as freqüências de 
ressonância de moléculas como o nitrogênio e oxigênio situam-se na faixa do 
ultravioleta ). Calcule a razão das intensidades espalhadas entre o extremo violeta 
e o extremo vermelho do espectro ( 0,38 µm < λ visível < 0,76 µm ). 
c) Explique a relação entre o vermelho do pôr do sol e o azul do céu. 
d) Você pode explicar por que a fumaça que sai de um cigarro é normalmente 
azulada? E por que depois da fumaça ser inalada e soprada ela fica 
esbranquiçada? As nuvens também são brancas. O espalhamento Rayleigh pode 
ser aplicado a esses últimos casos? Comente. 
e) Munido de um filtro polarizador você pode notar efeitos de polarização na luz 
azul do céu. A direção de polarização da luz bem como seu grau de polarização 
varia de acordo com o ponto do céu observado e sua relação com a posição do 
sol. Utilize o modelo da radiação de uma carga sujeita a uma onda 
eletromagnética para explicar esses fenômenos. Faça desenhos para mostrar a 
geometria do problema. 
 5 
 
6) Colapso do átomo? 
Num modelo clássico, o átomo de hidrogênio é constituído por um elétron de 
massa m e carga –e, girando com velocidade angular ω numa órbita circular de 
raio r em torno de um próton muito mais pesado e de carga +e. De acordo com a 
teoria eletromagnética de Maxwell o elétron sujeito a uma aceleração centrípeta 
deveria irradiar, perdendo energia e caindo em direção ao núcleo atômico. Considere 
nesse problema que a velocidade do elétron seja muito menor que a velocidade da 
luz de maneira a se poder usar a mecânica newtoniana. 
a) A partir da segunda lei de Newton e da lei de Coulomb mostre a relação 
ω 2 = e2/(4πε0mr3). 
b) Sabendo que a energia potencial do elétron é dada por U = (e)(–e)/(4πε0r) e 
que a velocidade vale v = rω mostre que sua energia mecânica pode ser 
escrita como E = –e2/(8πε0r). 
c) Considere que o elétron esteja irradiando devido à sua aceleração centrípeta 
a = rω 2. Suponha que cada volta de seu movimento espiral em direção ao 
núcleo seja aproximadamente circular e mostre que a equação para a 
conservação da energia dE/dt = –Pirradiada , nos leva á seguinte equação 
diferencial: 
r
2 
dr/dt = –α , onde α = e4/(12π2ε02c3m2) = 3×10–21 m3/s. 
 
7) Limitações do Eletromagnetismo Clássico. 
No modelo do átomo da questão anterior considere a queda do elétron de uma 
órbita de raio igual a 0,5×10–10 m ( 1o raio de Bohr ) até um raio 100 vezes menor. 
Utilize os resultados encontrados naquela questão para os cálculos a seguir. 
a) Verifique se é necessário usar um tratamento relativístico para os valores das 
órbitas consideradas nessa questão. Obs.: a mecânica newtoniana vale se 
(v/c)2 << 1. 
b) Verifique se nesse caso as órbitas são aproximadamente circulares, 
calculando a variação relativa do raio durante uma volta, ∆r/r. Utilize a 
equação diferencial do item (c) da questão anterior identificando dr com 
∆r e dt com T = 2π/ω. Mostre que ∆r/r = –8π/3 (v/c)3. 
c) Mostre que o tempo gasto pelo elétron para cair no intervalo de raios 
considerados é da ordem de 10–11 s (sugestão: integre a equação diferencial 
r
2 
dr/dt = –α). Apesar do raio nuclear ser da ordem de 10–15 m, o resultado 
não relativístico encontrado nessa questão vale como uma boa estimativa 
para o tempo de colapso do átomo. 
Obviamente o átomo não padece desse tipo de instabilidade. A teoria 
eletromagnética de Maxwell, apesar de já trazer consigo o germe da Relatividade, 
valendo mesmo em velocidades próximas da velocidade da luz, apresenta problemas 
quando vamos para escala atômica. Nessas pequenas escalas faz-se necessária uma 
abordagem utilizando a Física Quântica. 
 
Bibliografia 
• R. M. Eisberg e L. S. Lerner, “Física: Fundamentos e aplicações”, vol. 4, ed. Mc 
Graw-Hill (1982). 
• Alaor Chaves, “Física”, vol. 3, Reichmann & Affonso Editores (2001). 
• Curso de Física de Berkeley, vol. 2, E. M. Purcell, “Eletricidade e Magnetismo”, 
ed. Edgard Blücher (1980). 
• R. P. Feynman, R. B. Leighton,M. Sands, “The Feynman Lectures on Physics”, 
vol. I e II, ed. Addison-Wesley (1972).

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