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- “O que é o Esclarecimento” (Kant) Conforme a minha leitura do texto de Kant, o Esclarecimento (Aufklärung) é dado como a saída do homem de sua menoridade, isto é, da incapacidade de pensar e agir por conta própria, dependendo sempre de um tutor, onde o mesmo pode estar na menoridade. Esse “fenômeno social” é dito como culpa do próprio homem, pois não decorre da falta de entendimento, mas sim da preguiça e da covardia, pois a humanidade desenvolveu o pensamento de deixar que outros decidam e pensem em nosso lugar (como autoridades políticas, religiosas ou intelectuais) do que assumir a responsabilidade de usar a própria razão, o que se define como comodidade. Kant explica que essa condição de dependência é reforçada por preceitos sociais e até por próprias instituições, que desincentivam o uso público da razão. O homem acostuma-se a ser conduzido, como alguém que paga para que outros pensem em seu lugar, e acaba desenvolvendo uma espécie de apego à sua menoridade, um amor incondicional, como se fosse parte de sua natureza. Ou seja, a dificuldade de sair dessa condição não vem da incapacidade, mas do hábito de permanecer na comodidade. No entanto, quando um indivíduo tem a coragem de usar seu próprio entendimento, ele rompe essas correntes e aprende a pensar por si mesmo, “Sapere aude!” (Ousa saber), e, após alcançar essa liberdade intelectual, dificilmente retornará à condição de submissão, isto é, voltar para o rebanho no qual estava inserido. Todavia, reconhece-se que não é fácil promover esse processo de esclarecimento em todo o corpo social, pois envolve preconceitos, fórmulas e costumes que se enraízam desde cedo, no berço do indivíduo. Entretanto, se houver liberdade de expressão e de uso público da razão (pois a razão tende a expandir-se quando encontra liberdade), um público poderá, mesmo que lentamente, esclarecer-se. Kant ainda admite que, em alguns momentos, pode haver a necessidade de revoluções, para que se realize a queda do despotismo pessoal e favoreça a criação de novos contextos que expandem e incentivam a autonomia do pensamento, isto é, preconceitos que incentivam o esclarecimento do homem. Dessa forma, o Esclarecimento nada mais exige senão a própria liberdade. O filósofo também afirma que o uso público da razão é o único que possibilita o esclarecimento, e por isso deve ser sempre livre, e ela ocorre quando um indivíduo compartilha suas ideias com o público em geral, contribuindo para o debate e o progresso da sociedade. Por outro lado, ele vê como certa limitação o uso privado da razão, que acontece quando alguém exerce sua razão dentro de um cargo ou função específica que lhe foi confiada. Nesses casos, é necessário obedecer às regras e ordens da instituição, pois a função exige disciplina e cumprimento de deveres, ou seja, “raciocinai, tanto quanto quiserdes, e sobre o que quiserdes, mas obedecei!”. Por exemplo, um oficial militar deve cumprir as ordens de seu comandante, ainda que possa refletir e até criticar essas ordens em outro espaço, no uso público por sua razão. Portanto, o uso privado da razão pode promover limitações, mas isso não significa que o indivíduo deve parar de raciocinar, mas sim que, em certas situações, ele deve conciliar obediência prática com liberdade intelectual. Contanto, Kant complementa dizendo que reconhece que governantes têm interesse em manter o povo em menoridade, mas defende que um soberano sábio, um príncipe, para tomar como exemplo, deve conceder essa liberdade, pois nada ameaça tanto seu poder quanto tentar controlar o pensamento. Quanto à religião, há críticas aos seus tutores espirituais que buscam decidir em nome dos fiéis e afirma que cada um deve ter a possibilidade de interpretar por si mesmo as questões de fé. Assim, a saída da menoridade ocorre através da liberdade de expressão e do uso público da razão, que aos poucos liberta a sociedade do comodismo, uma corrente intelectual que se prende ao homem desde cedo. Com isso, o esclarecimento é um processo um tanto quanto lento e coletivo, na qual a coragem individual e a liberdade social se unem para conduzir a humanidade rumo à sua maioridade, onde, finalmente, pode-se ter uma sociedade mais justa e democrática, o que favorece uma maior sustentabilidade do “viver humano”.